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#VidasNegrasImportam e libertação negra
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#VidasNegrasImportam e libertação negra
E-book534 páginas6 horas

#VidasNegrasImportam e libertação negra

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Sobre este e-book

"O racismo nos Estados Unidos sempre foi o meio utilizado pelos homens brancos mais poderosos do país para justificarem seu governo, ganharem dinheiro e manterem o resto de nós à distância. Por essa razão, o racismo, o capitalismo e o domínio de classe sempre se entrelaçaram de tal maneira que é impossível imaginar um sem o outro."

Eis uma das conclusões de #VidasNegrasImportam e libertação negra, de Keeanga-Yamahtta Taylor, que entra em pré-venda pela Editora Elefante a partir de hoje. Lançado em 2016, o livro resgata e discute o movimento #BlackLivesMatter, surgido em 2014 em reação ao assassinato do jovem negro Michael Brown pela polícia de Ferguson, no estado do Missouri.

Os protestos, que se espalharam pelo país e se estenderam até 2015, ocorreram quando a Casa Branca — "um edifício construído por escravos em 1795", lembra Keeanga — era ocupada pelo primeiro presidente negro dos Estados Unidos. As manifestações foram de encontro à ideia, então defendida por muitos, de que o país estava finalmente superando o racismo.

"Como explicar a ascensão de um jovem presidente negro, juntamente com o exponencial crescimento da classe política negra e o aparecimento de uma pequena porém expressiva elite econômica negra, concomitantemente com o surgimento de um movimento social cujo slogan é um lembrete de que 'vidas negras importam'?", questiona a autora.

"Não é preciso dizer que assassinato e brutalidade policiais são apenas a ponta do iceberg quando se trata do sistema de justiça criminal estadunidense", continua, trazendo mais uma dimensão à sua análise, aplicável também ao Brasil: "É impossível entender o intenso policiamento nas comunidades negras sem analisar as décadas de 'guerra às drogas' e o encarceramento em massa."
IdiomaPortuguês
Data de lançamento20 de nov. de 2020
ISBN9786587235172
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    Pré-visualização do livro

    #VidasNegrasImportam e libertação negra - Keeanga-Yamahtta Taylor

    Conselho editorial

    Bianca Oliveira

    João Peres

    Tadeu Breda

    Edição

    Tadeu Breda

    Preparação

    Luiza Brandino

    Revisão

    Tomoe Moroizumi

    Laura Massunari

    Capa

    Giulia Fagundes

    Guilherme Vieira

    [Estúdio Daó]

    Projeto gráfico

    Bianca Oliveira

    Diagramação

    Denise Matsumoto

    Produção Digital

    Cristiane | Saavedra Edições

    SUMÁRIO

    Capa

    Créditos

    Folha de rosto

    Prefácio à edição brasi­leira

    Natália Neris

    Carta da tradutora

    Intro­dução

    O despertar negro nos Estados Unidos de Obama

    1. Uma cultura racista

    2. Dos direitos civis ao daltoismo racial

    3. Presença negra em altos cargos

    4. As duas faces da justiça

    5. Barack Obama: o fim de uma ilusão

    6. Vidas Negras Importam: um movimento, não um momento

    7. #VidasNegrasImportam e libertação negra

    Posfácio

    Cinco anos depois, vidas negras importam mesmo?

    Referências

    Sobre a Autora

    Ficha catalográfica

    Prefácio

    à

    edição

    brasi­leira

    Natália Neris

    "Sou professora de estudos afro-estadunidenses e leciono em uma universidade de elite da Ivy League,¹ mas não me considero uma acadêmica. Sempre fui uma ativista que tenta comunicar a urgência do nosso momento político através das lentes da história e das preocupações das pessoas comuns."

    Keeanga-Yamahtta Taylor assim se definiu em uma conferência no Hampshire College em 2017.² Assisti a essa palestra, bem como ao máximo de intervenções públicas da autora que pude, antes de iniciar a leitura deste livro. Costumo buscar uma proximidade com todo autor ou autora — e esse é um caminho comum entre muitos estudantes — porque isso parece materializar as ideias de cada página. É possível imaginar a voz, os gestos de cada frase, os pressupostos das ideias, tendo em vista outras construções para além da obra escrita.

    O impacto que Taylor gerou em mim foi grande, e encontrá-la muito atuante no debate público me empolgou. Estava diante de mais uma intelectual-inspiração, da mesma geração que a minha. Achei bonita sua autodefinição, que não passa por títulos acadêmicos importantes — embora ela tenha diversas credenciais, o que é muito relevante para nós enquanto mulheres negras e jovens. Admirei a firmeza, a capacidade crítica e a ousadia da análise dos acontecimentos em curso. Comecei a aprender antes de lê-la, portanto.

    O livro From #BlackLivesMatter to Black Liberation foi publicado nos Estados Unidos em 2016. Sua questão central é compreender o surgimento do movimento Vidas Negras Importam justamente enquanto um homem negro ocupava a Casa Branca pela primeira vez na história. O protesto negro contra a violência policial segue vigoroso na sociedade estadunidense, e este livro chega ao Brasil num ano em que assistimos à morte de George Floyd³ por sufocamento e à tentativa de assassinato de Jacob Blake⁴ com sete tiros pelas costas, ambas cometidas por policiais — entre outros casos, ocorridos em meio a uma pandemia.

    Infelizmente, o livro não ficou obsoleto e não é preciso restringir o olhar para os Estados Unidos. No Brasil, no mesmo período, sofremos com operações policiais brutais, nas quais nem mesmo crianças foram poupadas: João Pedro Matos Pinto⁵ foi morto em sua própria casa e João Vitor da Rocha,⁶ assassinado durante uma ação comunitária de entrega de cestas básicas. Lidamos ainda com uma tentativa de sufocamento de uma mulher negra de 51 anos pela Polícia Militar num bairro periférico de São Paulo.⁷

    Faço esses paralelos para já afirmar que uma das teses presentes no trabalho de Taylor faz muito sentido: determinados eventos — como guerras ou desastres naturais, e agora uma crise sanitária sem precedentes — escancaram as contradições, a violência e as desigualdades de sociedades racistas. Mas darei um passo atrás para apontar outras teses que identifico na obra: i) o policiamento é fruto de profundas desigualdades; ii) as desigualdades são o resultado final das decisões econômicas e políticas das autoridades; e iii) o movimento negro é uma força independente, que revela as falhas da sociedade de modo não superficial, mas sistêmico.

    Compreendo que o primeiro trajeto da autora para sustentar tais teses é descrever cuidadosamente como a sociedade estadunidense narra a si mesma e se projeta para fora. Taylor desvela, portanto, as ideologias que sustentam a ideia de um excepcionalismo estadunidense, uma mitologia de conveniência que coloca o país como um líder moral do mundo, como uma democracia consolidada que permite a todo cidadão esforçado alcançar seus objetivos. A não ascensão econômica de determinados indivíduos pode ser tributada a explicações culturais. Visões preconceituosas culpam o negro pela sua própria desgraça, ocultando problemas estruturais sob um manto moral. De forma às vezes tácita, às vezes explícita, aparecem justificativas ancoradas num suposto mau comportamento das famílias negras, em sua irresponsabilidade ou incivilidade. A transformação pessoal substitui a exigência de provisão estatal de acesso a moradia, saúde, segurança ou educação de qualidade.

    Um segundo movimento da autora é acompanhar a transformação dessa narrativa, principalmente após a atuação do movimento pelos direitos civis nos anos 1960. Para além da responsabilização moral das pessoas negras por sua condição — a chamada cultura da pobreza, piorada no contexto de crise econômica dos anos 1970 —, a ideia de uma sociedade pós-racial, que ficou cega para a raça (daltonismo racial) após a extinção de leis segregacionistas, mais uma vez serve à neutralização da responsabilidade dos sistemas político e econômico dos Estados Unidos.

    Esses pressupostos, apresentados nos dois primeiros capítulos da obra, nos preparam para os capítulos subsequentes, nos quais a autora lança luz sobre uma nova etapa da sociedade estadunidense: aquela em que se pôde contar — e, mais do que isso, que incentivou — a presença negra nos quadros políticos e na gestão das cidades como alternativa estratégica e pragmática para lidar com problemas locais, como a gentrificação e a violência policial. Os capítulos 3 e 4 desvelam as contradições dessa representatividade e abordam de forma ainda mais profunda o vínculo embrionário entre suspeição e brutalidade da polícia e gestão econômica nos municípios. Taylor detecta que, mesmo sob administrações negras, recai sobre as pessoas não brancas um cerceamento financeiro desproporcional. A população negra é vítima de sanções abusivas sobre coisas tão prosaicas como infrações de trânsito ou mesmo evasão escolar. A autora chama esse punitivismo econômico, que explicita a relação contraditória entre as elites políticas negras e a comunidade de forma geral, de imposto sobre a raça.

    A obra desmantela ideários que buscam desvincular escolhas de políticas públicas em termos sociais e econômicos da condição de vida da população negra, de origem latino-americana e de brancos pobres nos Estados Unidos. Nessa análise, pode-se enxergar tanto a Taylor acadêmica quanto a Taylor militante. Metodologicamente, o estudo tem como base relatórios estatísticos, documentos oficiais e muitos documentos extraoficiais, como estudos de organizações do movimento negro, além de depoimentos e entrevistas desses atores na mídia.

    A partir do Capítulo 5, em que a autora narra a ascensão de Barack Obama, o livro fica ainda mais dinâmico, relacionando as expectativas da comunidade negra diante dos discursos do presidente sobre as manifestações, principalmente em Ferguson, Baltimore e Nova York. As lentes da história e a preocupação das pessoas comuns se unem quando começam a vir à tona limites importantes da representatividade. Uma comunidade já cansada de ser agredida se vê quase traída por um presidente negro que se atenta mais à reação popular do que à violência institucional que a causou — e pior: nos termos da ideologia latente da sociedade estadunidense, que evocam os mitos da cultura da pobreza e da sociedade pós-racial.

    Os capítulos 6 e 7 tratam respectivamente da caracterização do movimento Vidas Negras Importam e da reflexão sobre seus desafios futuros. É nesse momento do livro que deparamos com o rosto feminino e queer desse protesto. Por trás de sua configuração de gênero, reside um triste problema conjuntural: os homens negros estão presos ou mortos. Essa característica, junto com a ação intensa nas redes sociais (principalmente Facebook e Twitter) e a descentralização organizativa, encarna uma diferença importante em relação a movimentos do passado, e isso obviamente influencia e determina seu modus operandi.

    O olhar atento para o passado faz a autora apontar para os perigos do foco na institucionalidade e para os riscos prementes da perda do controle da própria agenda, principalmente quando o movimento realiza concessões e suas ações são financiadas por instituições filantrópicas.

    Taylor também aponta para o desafio da definição de demandas do movimento: Conectar a violência policial ao devastador efeito do racismo institucional é o ponto forte do movimento atual, mas também se corre o risco de que as reformas que poderiam ser alcançadas agora fiquem submersas na luta generalizada para transformar a natureza da sociedade estadunidense. Nesse sentido, a autora explora uma possibilidade interessante de distinção entre reformas possíveis agora e a luta pela revolução, que é um projeto de longo prazo. Indo além do diagnóstico e apontando para a estratégia, Taylor chama a atenção para a necessidade de colaboração e solidariedade intramovimentos e a necessidade de aliança, principalmente com trabalhadores mal remunerados. Nesse ponto, ela aponta a urgência da união com brancos e latino-americanos da classe trabalhadora, porque essa mobilização coletiva teria também o efeito de escancarar os antagonismos de classe que foram apagados entre os brancos estadunidenses.

    Se estes tempos são de tristeza e revolta por nossa vulnerabilidade extrema, a leitura deste livro também revela que, sem luta incessante, as ideias-sustentáculos de um sistema capitalista, racista e militarizado seguiriam a justificar nossa morte. A atuação do movimento negro ontem e hoje colocou a olho nu as falhas sistêmicas e profundas da nossa sociedade.

    Taylor mais uma vez me entusiasma num contexto desesperador, porque me ajuda a lembrar do potencial transformador da luta antirracista e, longe de me incentivar a realizar uma leitura que mimetiza e transfere experiências estadunidenses para compreender a realidade brasileira, me mobiliza a olhar para as ideias-força que justificam nossa vulnerabilidade por aqui (sobejamente refletidas sobretudo por nossos intelectuais negros e negras), a tensionar e a manter um olhar crítico em relação a nossa aposta na institucionalidade, e a me lembrar de que, no Brasil, principalmente nas suas margens, há resistência anticapitalista e antirracista solidária e projetada para a revolução. A leitura deste livro me faz projetar também uma resistência afro-norte-centro-sul-americana-diaspórica.

    Taylor nos convida a comunicar as urgências deste momento político.

    natália neris é pesquisadora, doutoranda em direitos humanos na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, e ativista.

    1 Ivy League é o grupo formado por oito universidades de elite (em termos de excelência acadêmica, mas também por serem frequentadas por membros da elite econômica) dos Estados Unidos: Brown, Columbia, Cornell, Dartmouth College, Harvard, Universidade da Pensilvânia, Princeton e Yale. [

    n.e.

    ]

    2 Keeanga-Yamahtta Taylor Delivers Keynote at Hampshire College’s 2017 Commencement Ceremony, YouTube, 20 maio 2017. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=6ljTRRVuUjM.

    3 George Floyd, negro de 46 anos, assassinado em Minneapolis, Minnesota, Estados Unidos, em 25 de maio de 2020, pelo policial Derek Chauvin, que se ajoelhou sobre seu pescoço durante aproximadamente nove minutos. A cena foi filmada e sua divulgação provocou uma onda de protestos dentro e fora do país. [

    n.e.

    ]

    4 Jacob Blake, negro de 29 anos, ferido após ser atingido por quatro dos sete tiros disparados contra suas costas pelo policial Rusten Sheskey na cidade de Kenosha, Wisconsin, Estados Unidos, em 23 de agosto de 2020. A cena foi filmada e sua divulgação provocou protestos em algumas cidades do país. [

    n.e.

    ]

    5 João Pedro Matos Pinto, negro de catorze anos, assassinado com um tiro na barriga em São Gonçalo, região metropolitana do Rio de Janeiro, em 18 de maio de 2020, durante operação conjunta das polícias Federal e Civil contra o tráfico de drogas. [

    n.e.

    ]

    6 João Vitor da Rocha, negro de dezoito anos, assassinado na Cidade de Deus, bairro da zona oeste do Rio de Janeiro, em 20 de maio de 2020, durante uma operação policial. [

    n.e.

    ]

    7 Episódio ocorrido em julho de 2020, no bairro de Parelheiros, zona sul de São Paulo. A ação policial foi filmada por moradores e divulgada pelo Fantástico, programa semanal da Rede Globo. [

    n.e.

    ]

    Carta

    da

    tradu

    tora

    #VidasNegrasImportam e libertação negra apresenta o movimento negro no decorrer da história dos Estados Unidos e aproxima o leitor das características específicas do racismo naquele país. Mas serão tão específicas assim? Durante a leitura, podemos refletir como padrões racistas e a opressão em geral se reproduzem de maneira semelhante em diversas partes do mundo ocidental. A razão por trás desse fato é o sistema econômico e social, que conduz a sociedade a se comportar de acordo com os desejos da grande elite. O racismo foi incutido nos valores sociais para o benefício de poucos; porém, está enraizado em nossa sociedade e, muitas vezes, passa despercebido. Seja no Brasil, seja nos Estados Unidos, temas pejorativos sobre o cabelo dos negros, subempregos ou classe social, por exemplo, são abordados por pessoas que reproduzem esse preconceito sem sequer saber sua origem.

    Este livro, entretanto, aborda única e exclusivamente a história dos Estados Unidos. A autora faz menção a fatos e pessoas estadunidenses que podem não ser familiares ao leitor brasileiro. Por isso, nossa tradução traz notas de rodapé elucidativas da cultura daquele país, apresentando fatos, curiosidades e informações históricas relevantes, a fim de enriquecer a leitura e o entendimento sobre o tema.

    Para incentivar a pesquisa e o aprofundamento em assuntos de interesse do leitor, mantivemos os nomes de instituições, títulos de livros e siglas em inglês, acompanhados de sua tradução, de modo a encorajar o interesse do público pelo movimento negro.

    Assim como o original, o livro traduzido possui linguagem simplificada e de fácil entendimento, com o intuito de que todos possam ter acesso à informação, independentemente do nível acadêmico ou da classe social. Apresentamos, também, alguns termos referentes à raça, um vocabulário antirracista que pode ser adotado em nossa vida cotidiana.

    O termo "people of color foi traduzido como pessoas de cor" e se refere a minorias étnicas. Historicamente, esse termo tem conotação pejorativa, mas a linguagem muda com o passar dos anos e a expressão tem sido adotada em debates contemporâneos populares, ativistas e acadêmicos. É um termo que sugere explicitamente a relação social entre minorias racializadas, e de maneira abrangente, pois engloba raça, nacionalidade e etnia. Salvador Vidal-Ortiz¹ argumenta que a descrição de uma pessoa baseada em como ela é vista pela sociedade não deve se limitar à cor da pele — e era essa uma das lutas do movimento pelos direitos civis da década de 1960 nos Estados Unidos. Por isso, a natureza política da expressão de cor deve ser entendida em um contexto mais amplo: como as minorias racializadas, através de etnia ou raça, vêm sendo idealizadas e tratadas pelo Estado no decorrer da história.

    É também a razão pela qual evitamos usar o termo não branco/não branca para descrever raça ou etnia. Ele foi empregado algumas vezes nesta tradução apenas quando condizia com o contexto original. Audre Lorde afirma que o desejo de definir uma pessoa (nós mesmos ou os outros) vem do desejo de limitação, não de expansão.² Não devemos limitar raças exclusivamente a branca ou não branca. Tatiana Nascimento corrobora a afirmação ao explicar que o termo não branco é colonizador, já que a raça branca é tida há séculos como o único referente viável, possível e pronunciável.³ A expressão não branco/não branca apenas reafirma que pessoas de cor são diferentes do referencial hegemônico (branco), contando com um simples não para abarcar uma imensa multiplicidade racial e étnica.

    Já o termo em inglês "brown não possui correspondência em língua portuguesa. Ele não diz respeito apenas à miscigenação de negros e brancos (como muitas pessoas considerariam o termo pardo); abrange, sim, negros e brancos miscigenados, mas também árabes, indianos, paquistaneses e até indígenas. Não se trata, aqui, de um termo político, mas unicamente um descritor da cor da pele humana. Nossa tradução adotou o termo marrom", já que outros termos atualmente em uso no Brasil não fariam jus à ideia que a autora pretende transmitir.

    As palavras americano e americana, referentes à nacionalidade estadunidense, e latino/latina, referentes a pessoas provenientes da América Latina, são criações dos estadunidenses, decorrentes da Doutrina do Destino Manifesto (abordada no primeiro capítulo). Assim como fizemos nesta tradução, sugerimos que o leitor não reproduza o imperialismo e substitua esses termos por estadunidense e latino-americano/latino-americana, respectivamente.

    Boa leitura.

    Thalita Bento

    Julho de 2020

    1

    vidal-ortiz

    , Salvador. People of color [Pessoas de cor]. In:

    schaefer,

    Richard T. Encyclopedia of Race, Ethnicity, and Society [Enciclopédia de raça, etnia e sociedade], v. 1. Los Angeles: Sage, 2008, p. 1.037-9.

    2

    lorde

    , Audre. Self-definition and my poetry [Minha poesia e autodefinição]. In:

    byrd

    , R.;

    cole

    , J. B. &

    guy-sheftall

    , B. (Eds.). I Am Your Sister: Collected and Unpublished Writings of Audre Lorde. Nova York: Oxford University Press, 2009. p. 156-7. [Ed. bras.:

    lorde,

    Audre. Sou sua irmã: escritos reunidos e inéditos. São Paulo: Ubu, 2020.]

    3

    nascimento

    , Tatiana. Quem nomeou essas mulheres ‘de cor’? Políticas feministas de tradução que mal dão conta das sujeitas negras traduzidas, Translation: Tradução e Diásporas Negras, n. 13, p. 127-42, jun. 2017.

    Aos pais, irmãos, irmãs, parceiros, parceiras, amigos e amigas daqueles que foram mortos pela polícia, ou sofreram outras formas de violência sancionada pelo Estado, e ainda permanecem comprometidos com a luta por um mundo justo

    Descubra aquilo a que as pessoas silenciosamente se submetem e você terá encontrado a medida exata da injustiça e das maldades que pode impor sobre elas, e estas continuarão até que encontrem resistência, seja com palavras, com golpes, ou ambos. Os limites dos tiranos são prescritos pela tolerância daqueles que são oprimidos por eles.

    — Frederick Douglass (1857)

    Intro­dução

    O despertar

    negro

    nos Estados

    Unidos

    de Obama

    Não estou triste porque os negros estadunidenses estejam se rebelando; isso não era apenas inevitável, mas eminentemente desejável. Sem esse fermento magnífico entre os negros, os velhos pretextos e protelações teriam continuado indefinidamente. Homens negros fecharam, com força, a porta para um passado de passividade mortal. Exceto pelos anos de Reconstrução dos Estados Unidos, eles nunca, em sua longa história em solo estadunidense, lutaram com tamanha criatividade e coragem pela sua liberdade. Estes são nossos anos favoráveis à eclosão; embora sejam dolorosos, não podem ser evitados. [...] Diante dessas circunstâncias difíceis, a revolução negra é muito mais do que uma luta pelos direitos dos negros. Está forçando os Estados Unidos a enfrentar todas as suas falhas inter-relacionadas — racismo, pobreza, militarismo e materialismo. Está expondo os males que estão profundamente enraizados na estrutura de nossa sociedade como um todo. Revela falhas sistêmicas em vez de superficiais e sugere que a reconstrução radical da própria sociedade é o verdadeiro tópico a ser enfrentado. [...] Os dissidentes de hoje dizem a uma maioria complacente que chegou o tempo, que evadir-se ainda mais da responsabilidade social em um mundo turbulento vai atrair desastre e morte. Os Estados Unidos ainda não mudaram, porque muitos acham que não precisam mudar, mas essa é a ilusão dos condenados. Os Estados Unidos devem mudar porque 23 milhões de cidadãos negros não vão mais viver intensamente em um passado miserável. Eles deixaram o vale do desespero; eles encontraram força na luta. Acompanhados por aliados brancos, eles vão balançar os muros da prisão até cair. Os Estados Unidos devem mudar.

    — Martin Luther King (1969)

    Martin Luther King escreveu essas palavras em 1969, semanas antes de seu assassinato, enquanto a eminentemente desejável rebelião negra surgia pelas ruas dos Estados Unidos, provando que a retórica triunfalista do American dream [sonho americano] não fazia sentido. Embora os Estados Unidos sejam considerados uma sociedade rica, para a grande maioria dos negros estadunidenses desemprego, subemprego, moradia abaixo do padrão e brutalidade policial constituíam o que Malcolm X uma vez descreveu como American nightmare [pesadelo americano]. De fato, o ônus implacável dessas condições impulsionaria mais de meio milhão de afro-estadunidenses — quase o mesmo número de soldados enviados para lutar no Vietnã — a se rebelar na terra da liberdade ao longo dos anos 1960.

    Estabelecer comparações entre épocas distintas raramente é útil, e é ainda menos útil olhar para o passado e dizer que nada mudou. Mas, nas palavras de King, são as continuidades dolorosas entre o presente e o passado que nos lembram de que, em alguns casos, o passado ainda não é passado. Ao longo de dez meses, do verão e do outono de 2014 até o inverno e a primavera de 2015, os Estados Unidos foram sacudidos por protestos em massa, liderados por afro-estadunidenses em resposta ao assassinato de Michael Brown, jovem negro morto pela polícia. No calor de agosto, as pessoas de Ferguson, no estado do Missouri, fizeram levantes e chamaram a atenção do mundo à crise das práticas policiais racistas nos Estados Unidos. Oito meses depois, a cerca de 65 quilômetros da capital do país, a cidade de Baltimore, em Maryland, explodiu em fúria contra a morte do jovem Freddie Gray, também assassinado pela polícia.

    As palavras de King poderiam facilmente descrever o surgimento desse movimento de protestos. O que começou em Ferguson como uma luta local de negros — que por mais de cem dias fecharam, com força, a porta para a passividade mortal na busca de justiça para Brown — transformou-se em um movimento nacional contra a brutalidade policial e os assassinatos de afro-estadunidenses desarmados cometidos diariamente pela polícia. Não é exagero dizer que homens e mulheres de farda, patrulhando as ruas dos Estados Unidos, receberam licença para matar — e demonstraram consistente propensão a usá-la. A violência policial, incluindo homicídio e tentativa de homicídio, é frequentemente dirigida a afro-estadunidenses. O caso da Filadélfia é um exemplo: a cidade da Pensilvânia é o berço da democracia estadunidense, e também abriga uma das polícias mais brutais do país. Quando o Departamento de Justiça dos Estados Unidos conduziu uma investigação sobre o Departamento de Polícia da Filadélfia, entre 2007 e 2013, constatou-se que 80% das pessoas nas quais os policiais da Filadélfia atiraram no período eram afro-estadunidenses, embora eles representem menos da metade da população da cidade.¹ No entanto, talvez a descoberta mais importante seja que, apesar dos disparos policiais contra pessoas desarmadas, violando os próprios padrões e regras da tropa, é praticamente impossível punir — muito menos indiciar, prender ou processar — a polícia por esse comportamento criminoso. Por exemplo, na Filadélfia, nos 382 tiroteios que tiveram participação da polícia, apenas 88 policiais foram considerados transgressores da política do departamento. Em 73% desses casos, não houve suspensão dos policiais ou rescisão de seus contratos de trabalho.²

    Não é preciso dizer que assassinato e brutalidade policiais são apenas a ponta do iceberg quando se trata do sistema de justiça criminal estadunidense. Por que um novo movimento tem a frase vidas negras importam como slogan quando é tão óbvio que, para a polícia, vidas negras não importam nem um pouco? De fato, é impossível entender o intenso policiamento nas comunidades negras sem analisar um contexto mais amplo de décadas de campanha de guerra às drogas e os efeitos do encarceramento em massa. Hoje, os Estados Unidos representam 5% da população mundial, mas 25% da população carcerária do mundo. Há mais de um milhão de afro-estadunidenses na prisão, já que negros são encarcerados numa proporção seis vezes maior do que brancos. A excessiva e sistemática prisão de pessoas negras, e de homens negros em particular, tem confundido raça com risco e criminalidade — o que legitima a inspeção minuciosa nas comunidades negras, bem como as consequências dessas inspeções. Como Michelle Alexander apontou no livro A nova segregação: racismo e encarceramento em massa, a prisão de homens negros os conduziu ao estigma social e à marginalização econômica, deixando boa parte deles com poucas opções de sobrevivência, exceto o envolvimento em atividades criminosas. Quando a probabilidade de homens brancos com antecedentes criminais conseguirem um emprego é igual à de homens negros sem antecedentes criminais, só se pode imaginar as poucas perspectivas de trabalho legítimo para os negros que retornam de presídios e penitenciárias. Todo o sistema de justiça criminal opera à custa de comunidades afro-estadunidenses e da sociedade como um todo.

    Essa crise vai além das altas taxas de encarceramento; na verdade, é a perpetuação de estereótipos profundamente enraizados, que retratam os afro-estadunidenses como particularmente perigosos, imunes à dor e ao sofrimento, descuidados e despreocupados, isentos de empatia, solidariedade ou humanidade básica, que permite que a polícia mate negros impunemente. Quando o policial Darren Wilson, de Ferguson, testemunhou ao júri sobre seu confronto com Mike Brown, ele parecia descrever uma briga contra um monstro, não com uma pessoa de dezoito anos. Apesar de Wilson e Brown terem a mesma altura, Wilson disse que sentiu como se estivesse sendo jogado para lá e para cá, como uma boneca de pano, e que se Brown lhe desse um soco na cara, seria fatal. Wilson então descreveu Brown como um demônio que fez grunhidos antes de, inexplicavelmente, decidir atacar um policial que já havia atirado nele uma vez e estava pronto para atirar novamente.³ Wilson atribuiu uma força sobre-humana a Brown, e relatou que Brown atravessava uma chuva de balas, deixando o policial sem alternativa, senão continuar atirando.⁴ É uma história inacreditável, que se apoia na completa falta de crença na humanidade de Brown, em sua natureza humana.

    Os Estados Unidos são frequentemente chamados de sociedade com daltonismo racial⁵ ou, ainda, de sociedade pós-racial,⁶ na qual, no passado, a raça pode ter sido um obstáculo para uma vida bem-sucedida. Hoje dizem que a raça não importa. A discriminação racial, sancionada por lei no Sul e praticada normalmente e com políticas públicas no Norte do país durante grande parte do século xx, causou disparidades entre negros e brancos no que diz respeito a empregos, pobreza, qualidade de moradia e acesso à educação. Mas, depois das lutas pela libertação negra nos anos 1960, remover o fator racial da lei e mudar atitudes em relação à raça deveriam conduzir a um novo período de sucesso e conquistas sem restrições para os negros. O fato de uma família afro-estadunidense habitar a Casa Branca, um edifício construído por escravos em 1795, é um exemplo poderoso da transformação da realidade dos Estados Unidos e das atitudes do país em relação à raça. Além da presidência de Barack Obama [2009-2017], milhares de políticos negros eleitos, uma camada de diretores executivos negros, membros da alta sociedade de Hollywood e atletas profissionais multimilionários negros dão vida a essa paisagem pós-racial. O sucesso de um número relativamente pequeno de afro-estadunidenses dá suporte ao espírito de daltonismo racial no país, bem como à ideia de que o racismo ficou no passado. Destratar alguém com base na raça é visto como produto de um comportamento pessoal e moral obsoleto, mas não é mais natural ou sancionado por leis e hábitos costumeiros, como sugeriu o presidente Obama em um discurso comemorativo dos cinquenta anos da Lei dos Direitos de Voto.⁷

    É exatamente por isso que o espetáculo descontrolado de assassinatos e brutalidade policial se transformou em uma crise política. Afinal, os Estados Unidos não afirmam passivamente ser uma sociedade racialmente daltônica: o país promove ativamente o daltonismo racial como exemplo de suas tradições democráticas e de sua autoridade para policiar o mundo. A Casa Branca e políticos de ambos os partidos⁸ têm usado isso como desculpa para cortar programas sociais e outros tópicos do setor público, negando a condição crucial de que a discriminação prejudica a vida negra nos Estados Unidos. Em outras palavras, se a demanda central do movimento pelos direitos civis nos anos 1960 era a intervenção federal para agir contra a discriminação e atuar afirmativamente a fim de melhorar a qualidade de vida de negros estadunidenses, promover os Estados Unidos como um país racialmente daltônico ou pós-racial levou ao caminho oposto, pois essa afirmação é usada para justificar o desmantelamento da capacidade do Estado de intimidar a discriminação.

    A Suprema Corte fez precisamente isso em relação ao direito ao voto, decretando, essencialmente, que o racismo não prejudica mais o acesso à votação, como clara e comprovadamente acontecia na era das leis Jim Crow.⁹ Ao revogar a Lei dos Direitos de Voto, John Roberts, presidente da Suprema Corte, disse: Nosso país mudou nos últimos cinquenta anos, acrescentando que o Congresso precisava falar sobre as condições atuais.¹⁰ É certo que o país mudou, mas a passagem do tempo por si só não garante uma mudança para melhor. A justiça não é uma parte natural do ciclo de vida dos Estados Unidos, tampouco é um produto da evolução: é sempre resultado de luta.

    Esses ataques não têm apenas consequências para cidadãos negros comuns, mas também são um cavalo de Troia que oculta um ataque muito mais amplo contra todas as pessoas da classe trabalhadora, incluindo brancos e latino-americanos. Certamente, os afro-estadunidenses são mais desfavorecidos em decorrência do fim do Estado de bem-estar social, mas, em um país com crescente desigualdade econômica, a restrição de orçamentos e os ataques políticos ao bem-estar social deixam vulneráveis todos os cidadãos comuns. É um exemplo de como, contraditoriamente, cidadãos comuns brancos também têm interesse em expor a natureza racista da sociedade estadunidense, pois isso legitima a demanda por um regime de bem-estar social amplo e robusto, destinado à redistribuição da riqueza e dos recursos dos ricos de volta à classe trabalhadora, composta por negros, marrons¹¹ e brancos. Por outro lado, é também por isso que as elites políticas e econômicas têm tanto interesse em investir no daltonismo racial e na perpetuação do mito de que os Estados Unidos são uma meritocracia.

    Os holofotes que agora incidem no abuso generalizado da polícia, do qual fazem parte contínuos espancamentos, mutilações e assassinatos de negros, desestabilizam a ideia de daltonismo racial nos Estados Unidos e, assim, restabelecem uma base para o fortalecimento de diretrizes de fiscalização e medidas contra a discriminação. Nesse processo, de modo inevitável, surgem grandes questões quanto à natureza de uma sociedade que permite que a polícia ataque e mate descaradamente tantos afro-estadunidenses. Por essa razão, o problema constante da violência policial é fulminante, especialmente neste momento histórico tão particular de suposto daltonismo racial no auge do poder negro na política. De fato, tendo um presidente, um procurador-geral¹² e um chefe de polícia da Filadélfia negros,¹³ a nação foi levada a discutir sobre a reforma da polícia. No entanto, com os meios de comunicação exibindo relatos quase diários de brutalidade e assassinatos cometidos pela polícia, essa demonstração sem precedentes do poder negro na política parece significar muito pouco na vida de cidadãos negros comuns, que possuem quase nenhuma força.

    Duas sociedades negras:

    separadas e desiguais

    Como explicar a ascensão de um presidente negro, ao lado do exponencial crescimento da classe política negra e do surgimento de uma pequena, porém significativa, elite econômica negra, juntamente com a emergência de um movimento social cujo slogan mais conhecido é um lembrete e uma advertência de que vidas negras importam? Exemplos de ascendência negra têm sido usados para louvar a grandeza dos Estados Unidos, assim como reiterou Obama ao afirmar que, enquanto eu viver, nunca esquecerei de que em nenhum outro país da Terra minha história seria igualmente possível.¹⁴ Ao mesmo tempo, pobreza, aprisionamento e mortes prematuras da população negra são amplamente vistos como produtos de insolência e de responsabilidade pessoal relapsa dos negros. Na realidade, essas experiências divergentes são motivadas por profundas diferenças de classe entre os afro-estadunidenses, o que permitiu o prestígio de alguns, enquanto a grande maioria definha em um desespero impulsionado pela desigualdade econômica que permeia toda a sociedade. Aqui, como no resto do mundo, com a era neoliberal de reforma do livre-mercado, a redução de gastos em programas sociais e a diminuição de impostos para grandes corporações, os ricos produziram uma desigualdade que não se via desde a década de 1920, no mínimo. Como apontou o Occupy Wall Street¹⁵ em 2011, 1% da população mais rica controla 40% da riqueza dos Estados Unidos. De 1978 a 2013, a remuneração de diretores executivos, ajustada pela inflação, aumentou 937% em comparação com o insípido aumento de 10% na remuneração de um trabalhador comum no mesmo período.¹⁶ Como sempre, a desvantagem econômica e a desigualdade social têm um impacto desproporcional sobre os negros estadunidenses.

    De fato, a diferença entre ricos e pobres é ainda mais acentuada entre os negros. Os brancos mais ricos têm 74 vezes mais riqueza do que uma família branca convencional. Mas, entre afro-estadunidenses, as famílias mais ricas têm, surpreendentemente, duzentas vezes mais riqueza do que uma família negra convencional. O 1% dos estadunidenses mais ricos é composto por 1,4% de negros — cerca de dezesseis mil entre os catorze milhões de famílias negras dos Estados Unidos. O patrimônio médio de cada uma dessas famílias é de 1,2 milhão de dólares, em contraste aos seis mil dólares de uma família negra convencional.¹⁷ Essas diferenças de classe influenciam a maneira de vivenciar o mundo e as conclusões políticas dessas experiências. Diferenças de classe sempre existiram entre afro-estadunidenses, mas o manto de racismo instituído legalmente em uma era preliminar criou um vínculo entre os negros, dando origem à comunidade negra. Hoje, a ausência de barreiras formais às conquistas políticas e econômicas por parte dos negros tem permitido um maior contraste entre os afro-estadunidenses e desgastado as noções de comunidade.

    Isso não significa que as elites negras possam transcender completamente o racismo. A elite negra é muito menor do que a elite branca: seus membros têm dívidas maiores e patrimônios menores quando comparados aos brancos ricos. Mas isso significa que, de modo geral, eles vivenciam a desigualdade racial de maneira diferente em comparação aos afro-estadunidenses pobres e da classe trabalhadora, e tiram conclusões também diferentes sobre o significado dessas experiências. Em 2007, uma pesquisa do Pew Research Center mostrou que 40% dos negros estadunidenses afirmam que, devido à diversidade dentro de sua comunidade, os negros não podem mais ser vistos como uma única raça (Pew Research Center & National Public Radio, 2007). Além disso, 61% dos negros estadunidenses disseram que os valores dos negros da classe média e os valores dos negros mais pobres tornaram-se diferentes. Negros mais instruídos, em comparação a negros que receberam menos educação formal, têm mais probabilidade de dizer que a disparidade de valores dentro da comunidade negra se expandiu durante a última década. Por último, ainda segundo a pesquisa, negros estadunidenses de baixa renda sugerem que as diferenças de valores e de identidade entre os negros são mais percebidas pelos negros da camada socioeconômica mais baixa (Pew Research Center & National Public Radio, 2007).

    O sucesso das elites negras, especificamente, valida a base política e econômica da sociedade estadunidense, reafirmando os aparentes defeitos pessoais daqueles que não tiveram sucesso. Culpar os negros pelas desigualdades sociais sofridas pela população negra não é um argumento novo: os movimentos sociais da década de

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