Teoria da Matéria Algorítmica: fundamentos para a física do terceiro milênio
De Paulo Fraga
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Sobre este e-book
O espaço-tempo é real?
As partículas subatômicas são entidades que possuem natureza estatística?
Este livro discute essas e outras questões sob um ponto de vista bem particular e propõe uma nova teoria para explicar a natureza do cosmos em todas as escalas imagináveis.
Com a visão de um observador que não integra o meio acadêmico-científico, o autor convida filósofos, cientistas e leigos a um mergulho revolucionário nas entranhas da matéria e do universo.
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Teoria da Matéria Algorítmica - Paulo Fraga
CAPÍTULO I
A CRÍTICA AO ESPAÇO-TEMPO
Revolução da física no século XX
No início do século passado, Albert Einstein tornou-se um dos principais expoentes de uma revolução científica que ajudou a formatar a sociedade tecnológica em que vivemos hoje. Vários cientistas ensaiaram a substituição de alguns conceitos newtonianos por correspondentes relativísticos, mas pouca coisa se compara à ruptura provocada por Einstein em concepções fundamentais como gravitação, espaço, tempo e suas interações com a matéria e a energia.
Em 1905 Einstein apresentou a teoria que ficou conhecida como Relatividade Especial ou Restrita, apoiando-se em trabalhos de Maxwell, Fitzgerald e Lorentz, tendo sido precedido em grande parte por Poincaré, ainda que se discuta se o trabalho deste extraordinário filósofo, físico e matemático francês influenciou Einstein diretamente ou não. Talvez o grande diferencial de Einstein em relação a Poincaré na paternidade da Relatividade Especial tenha sido a convicção com que o teórico alemão considerou desnecessária a existência de qualquer tipo de éter como referencial absoluto para a explicação dos fenômenos físicos fundamentais, rompendo com a ideia adotada pelos teóricos que o antecederam na virada para o século XX.
Não satisfeito com a abrangência ainda limitada da Relatividade Especial, Einstein divulgou em 1915 a Relatividade Geral, teoria segundo a qual a matéria distorce o espaço-tempo, substrato não granulado cuja curvatura determina o efeito gravitacional, alterando o ritmo do tempo e influenciando a trajetória dos objetos materiais e da luz.
As duas teorias da relatividade de Einstein ainda hoje não foram superadas como paradigmas no estudo do movimento e da gravitação em escalas macroscópicas.
Einstein também participou, no rastro de Max Planck, do surgimento da Mecânica Quântica, teoria física fundamental na descrição dos fenômenos que se processam em escalas ultramicroscópicas, que recebeu contribuições decisivas de Niels Bohr, Erwin Schrödinger, Werner Heisenberg, Paul Dirac, Wolfgang Pauli, Frank de Broglie, David Bohm, Max Born, Richard Feynman e de toda uma legião de cientistas que tem procurado desenvolvê-la até os dias atuais.
Neste início do século XXI, o Santo Graal da física moderna parece estar na formulação de uma teoria capaz de conciliar com a elegância possível duas teorias amplamente bem sucedidas e profundamente contraditórias entre si: a Relatividade Geral, que define o fenômeno gravitacional como uma interação entre os objetos com massa e o tecido espaço-tempo proposto por Einstein, e a Mecânica Quântica, desenvolvida para explicar e explorar o mundo microscópico das partículas atômicas e subatômicas.
O próprio Einstein nunca deixou de acreditar na existência de uma explicação unificadora para as discrepâncias identificadas no modo como a matéria e o espaço parecem se comportar quando observados nos níveis macro e microscópico. Tal explicação deveria emergir de um modelo conceitual ainda não estabelecido, que os cientistas têm chamado de Teoria de Tudo. Os desenvolvedores da Teoria das Cordas (ou Supercordas) acreditam estar no caminho de encontrar este modelo conciliador e reivindicam o título potencial de Teoria de Tudo para o conjunto de suas versões, conhecido como Teoria M, ainda em desenvolvimento.
O jovem Einstein
Imaginemos que Einstein estivesse com vinte e poucos anos de idade no mundo de hoje e que a Relatividade Geral, tal como é conhecida atualmente, houvesse sido formalizada por algum outro grande cientista no início do século passado. Em tal hipótese o atualmente jovem Einstein não teria qualquer vínculo com a criação daquela teoria e gozaria de total liberdade para rever todas as suas premissas, à luz dos avanços teóricos e de novas pistas que a investigação científica tem produzido com auxílio da tecnologia do presente. Seria muito difícil supor que aquele jovem e inquieto cientista permaneceria inerte diante das informações de que hoje dispomos, como aquelas que levaram à aceitação quase unânime de algo como a matéria escura. Possivelmente, com base nessas novas pistas, o jovem Einstein seria um dos grandes questionadores dos pressupostos fundamentais estabelecidos pela Relatividade Geral e pela Mecânica Quântica. Contra essa última, a versão real do grande cientista certa vez de fato se insurgiu, apesar de figurar como um de seus fundadores, com a célebre frase Não acredito que Deus jogue dados com o universo
– as palavras exatas provavelmente não foram estas –, e considerou a Mecânica Quântica uma teoria incompleta.
Entre as novas pistas, talvez a mais importante seja a própria descoberta da possibilidade da existência da chamada matéria escura. A mera aceitação desta hipótese pela comunidade científica conduz à necessidade de se promover uma revisão geral nas principais suposições da física moderna. Obriga-nos a todos os interessados, na ausência do grande mestre alemão, sejamos filósofos, físicos ou matemáticos, profissionais ou não, estudantes e demais interessados, a pedir licença e procurar com afinco por qualquer limitação nas formulações atualmente aceitas, reavaliar novas e antigas ideias e, se necessário, buscar algo novo em algum lugar do passado, tentando encontrar qualquer eventual desvio de rota que tenha resultado no impasse científico de nossos dias.
A contradição entre a Relatividade Geral e a Mecânica Quântica mergulha a física moderna em uma crise conceitual que se arrasta por décadas. Este tipo de crise, em ciência, costuma propiciar o surgimento de um novo modelo que possa reorientar a produção científica, sem as amarras decorrentes do esgotamento dos modelos anteriores. Isto não significa deixar de reconhecer o mérito dos avanços mais remotos ou recentes do conhecimento, mas procurar identificar seus limites e eventualmente questionar alguns de seus fundamentos mais duradouros, como ocorreu no início do século passado.
Uma nova teoria da gravidade e do tempo
Uma teoria explanatória simples, que descreve um universo razoavelmente elegante, é o que acredito poder apresentar neste momento, fato que impõe a importante tarefa de afirmar, com a mais profunda convicção, a absoluta ausência de necessidade da existência real de um substrato contínuo como o espaço-tempo, na forma como foi concebido por Einstein, para explicar o efeito gravitacional e a relatividade do tempo. A possibilidade de substituição do espaço-tempo por um conceito com maior poder explicativo da realidade física torna o continuum concebido por Einstein uma imagem aproximada da realidade, que tem cumprido um extraordinário papel na evolução da representação do mundo real pela ciência. Não tenho dúvidas de que a efetiva substituição do modelo einsteiniano pelo modelo que estou prestes a propor irá escancarar as portas para explicações extremamente mais consistentes, abrangentes e profundas sobre os mais variados fenômenos do mundo natural, em todas as escalas que pudermos imaginar.
O espaço-tempo é real?
Analisemos sob alguns aspectos o conceito einsteiniano do continuum espaço-tempo. É tempo de desafiar a aceitação de sua natureza ontológica, a partir de uma nova perspectiva teórica, que representa a evolução de um princípio muito antigo, que remonta pelo menos a Descartes. A este princípio podemos chamar de princípio algorítmico. Antes de prosseguir devo dizer que a premissa teórica que irei adotar implica também a necessária negação do princípio da incerteza, um dos principais pilares da vigente concepção quântica do universo.
O princípio da incerteza e o continuum espaço-tempo são categorias tão fortemente aceitas e influentes nos dias atuais que sua superação definitiva exige uma articulação teórica tão abrangente quanto consistente, um novo e poderoso esquema principiológico corroborável e refutável, capaz de evidenciar a necessidade de se atribuir àquelas categorias a condição de importantes dogmas científicos de nossa época.
O conceito de continuum espaço-tempo, por exemplo, influencia praticamente todas as concepções correntes sobre o modo como funciona o universo, inclusive a Mecânica Quântica e a Teoria das Cordas. Diz o conceito que o universo é formado por um tecido espaço-tempo
, contínuo, que se curva ou deforma na presença de matéria (ou energia), resultando, dessa curvatura, todo o efeito gravitacional, que implica uma distorção tanto no espaço quanto no tempo, grandezas indissociavelmente impressas no próprio substrato contínuo (espaço-tempo) que forma a parte mais vazia do universo, o vácuo espacial onde tudo está imerso.
A ideia do tecido espaço-tempo guarda relação com a noção de campo, introduzida por Faraday¹ e desenvolvida matematicamente por Maxwell, que sistematizou as equações fundamentais do eletromagnetismo. A noção de campo surgiu como uma representação gráfica das linhas de força associadas às cargas elétricas e magnéticas e evoluiu da noção de um mero recurso de representação para um conceito físico², que informa o comportamento do espaço, ou seja, do vácuo espacial, sua capacidade física de reagir à presença da carga elétrica em movimento e transmitir ondas eletromagnéticas³, em uma região de alcance ilimitado (campo), onde se manifestam os efeitos potenciais dessa carga em movimento, de forma decrescente à medida que aumenta a distância em relação à carga, até que seus efeitos se tornem muito pequenos e desprezíveis. De modo análogo o vácuo espacial reage à presença da matéria e da massa associada à matéria. Então, além do campo eletromagnético haveria um campo gravitacional compartilhando cada porção do vazio do universo. Hoje em dia, a física parece considerar esses campos sobrepostos e independentes, compartilhando o tecido cósmico também com outros campos, como o campo de Higgs, de modo que o campo eletromagnético reage às partículas com carga ou às ondas eletromagnéticas, o campo gravitacional reage à massa e o campo de Higgs reage à matéria. Campos superpostos e independentes. Veremos que Einstein não gostava disso…
O espaço-tempo significa um importante ponto de inflexão filosófica na física. O espaço deixa de ser um palco inerte, newtoniano, onde ocorrem os fenômenos físicos, e passa a assumir um protagonismo ativo, interagindo com a matéria e com a energia (atualmente concebida como um estado da matéria), deformando-se em sua presença, influenciando, por sua vez, o movimento translativo dos objetos materiais e também da luz.
Dois motivos principais parecem ter seduzido Einstein para esta inflexão. As equações do campo eletromagnético, sistematizadas por James Clerk Maxwell, que na visão de Einstein parecem explicar a propagação do eletromagnetismo sem a necessidade da existência de um meio particulado, o suposto éter, e a ausência de uma concepção satisfatória associada a esse meio hipotético, cuja existência foi defendida por vários cientistas, cada qual a seu modo, como o éter de Christiaan Huygens, imaginado para explicar a natureza ondulatória da luz. A famosa experiência de Michelson-Morley ajudou a sepultar no meio científico, sem que essa fosse a intenção original daqueles dois experimentalistas, a hipótese de existência do éter luminífero de Huygens, que se opunha à teoria corpuscular da luz, defendida por Isaac Newton. O éter eletromagnético – diferente do éter luminífero de Huygens – sobre o qual o próprio Maxwell edificou sua bem-sucedida teoria do eletromagnetismo, também perdeu força no início do século XX, em especial a partir da ascensão dos modelos de Einstein, embora o próprio Einstein defenda que os modelos de éter perderam força gradualmente em virtude da ascensão do conceito de campo eletromagnético e da dificuldade de se construir um modelo de éter com funcionamento aceitável.
Nossas tentativas de descobrir as propriedades do éter conduziram a dificuldades e contradições. Após essas experiências más, é tempo de esquecermos o éter completamente e jamais tentarmos mencionar seu nome. Diremos: o nosso espaço tem a propriedade física de transmitir ondas, omitindo, assim, o uso de uma palavra que decidimos evitar.⁴
Como as concepções do éter surgidas até então não foram consideradas consistentes com os resultados da experiência de Michelson-Morley, apesar da defesa apresentada por Fitzgerald, e endossada por Lorentz, com base na extraordinária ideia da contração da distância e do tempo à medida que as velocidades aumentam, Einstein encontrou razões para propor a desconsideração completa de um meio cósmico formado por partículas e empreendeu notável esforço para literalmente banir o uso da palavra éter na física. Valendo-se de argumentação pautada em uma lógica bastante atraente, estendeu a aplicação do conceito de campo ao fenômeno gravitacional, com a proposição do continuum espaço-tempo dotado de quatro dimensões, consistente com a rigorosa base matemática riemanniana para estruturas geométricas curvas.
Era o início do reinado da Relatividade Geral, cujas consequências especulativas mais recentes incluem a possibilidade de que o espaço-tempo não tenha apenas quatro dimensões, mas, quem sabe, mais de uma dezena de dimensões ocultas e minúsculas, matematicamente justificadas, como propõe a Teoria das Cordas. Outra decorrência do conceito de continuum espaço-tempo é a noção basilar em Mecânica Quântica, derivada do princípio da incerteza de Heisenberg, de que o tecido espaço-tempo sofre oscilações microscópicas de energia responsáveis pela constante criação e aniquilação de partículas de matéria e antimatéria que quase instantaneamente se destroem aos pares, no chamado frenesi quântico, fenômeno teórico também apelidado de espuma quântica. O frenesi quântico parte da premissa da existência do continuum espaço-tempo, mas não parece de todo incompatível com um meio cósmico granulado.
De qualquer modo, a física moderna dominante está edificada sobre o alicerce do continuum espaço-tempo, ente físico-matemático que interage com a matéria, considerada um estado condensado da energia, podendo tal tecido não apenas ser moldado pela matéria, como também propagá-la em seu interior e, na concepção quântica atual, condensar aleatoriamente a energia e transformá-la em pares de partículas de matéria e antimatéria, que logo em seguida colidem, se desintegram e liberam aquela energia que estava condensada. Seguem-se constantes transformações de porções de espaço-tempo em energia, energia em matéria, matéria novamente em energia, estabilizando-se novamente o espaço-tempo até nova criação aleatória de partículas por geração espontânea de energia. Provavelmente não pesquisei o suficiente para perceber se existe alguma proposição explanatória convincente a respeito de como o espaço-tempo, que em essência se trata de um tecido geométrico, cria energia não condensada e a transforma em partículas de matéria, suposição amplamente aceita pelos teóricos da física Quântica e pela academia em geral.
Voltando ao macrocosmo parece inegável, dentro de certos parâmetros, a existência de extraordinária relação descritiva entre a geometria curva da Relatividade Geral e o fenômeno