Direito Internacional Privado
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Captulo I Introduo 1. Noo e objecto do DIP O DIP o ramo da cincia jurdica onde: Se definem os princpios; Se formulam critrios; Se estabelecem as normas Tem por objecto Situaes plurilocalizadas que tm pontos de contacto com vrias ordens jurdicas. Tem como principal preocupao Perceber qual o direito que rege a situao em causa. O DIP : Direito Instrumental; Direito de norma sobre norma ou direito formal; Tem como funo determinar qual a lei aplicvel a uma situao jurdica plurilocalizada O seu problema saber qual a ordem jurdica que vai regular uma determinada situao plurilocalizada. Tem como funo Averiguar qual das ordens jurdicas em contacto possuir uma ligao mais forte com a situao, de modo a obtermos a lei tida por mais competente. Situaes jurdicas plurilocalizadas So relaes jurdicas internacionais que tm pontos de contacto com mais do que uma ordem jurdica. Para Jitta existem vrios tipos: a. Relaes puramente internas so aquelas que tm pontos de contacto apenas com a ordem jurdica do foro Vai ser o local onde a questo suscitada ou onde a questo vai ser apreciada. Ex: A, portugus e residente em Portugal, compra uma casa a B, tambm residente em Portugal, casa essa situada em Portugal;
a que deve obedecer a pesquisa de solues para os problemas emergentes das relaes privadas de carcter internacional.
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3) Doutrina Francesa DIP compreende a nacionalidade (chamadas regras de nacionalidade so aquelas que em cada Estado enumeram os factores de aquisio e perda de cidadania e definem a condio de nacional e estrangeiro. No se engloba no DIP porque so normas materiais/substantivas), a condio dos estrangeiros (so regras que definem quais os direitos atribudos no Estado local aos cidados estrangeiros em confronto com os nacionais. So normas sobre capacidade), o conflito de leis e o conflito de jurisdies. Doutrina Portuguesa Ferrer Correia inclui no DIP 3 matrias: a. Conflito de leis; b. Conflito de jurisdies so as normas que determinam a competncia dos tribunais para apreciar questes plurilocalizadas (art.65 CPC quando um tribunal portugus competente numa matria internacional; art.65-A CPC situaes em que o tribunal portugus tem competncia exclusiva e art.99 CPC as partes podem fazer pactos atributivos de jurisdio); c. Reconhecimento de sentenas estrangeiras so as normas que disciplinam na lei local a eficcia e os efeitos de sentenas estrangeiras. Reconhecer uma sentena estrangeira atribuir ao Estado do foro os efeitos que lhe competem, segundo a lei do Estado onde foi proferida a deciso. 2 Notas: Em Portugal, a aco intentada no tribunal da Relao; Esta sentena no tem que ser proferida propriamente por um tribunal. Tem que ser por uma entidade que tenha poderes judiciais. Sistemas A) Sistema de reconhecimento automtico ou ipso iure consiste no reconhecimento da sentena sem controlo ou reconhecimento prvio. Vigora em Itlia, a regra na Alemanha e em Portugal vigora no Regulamento 44/2001, do Conselho de 22 de Dezembro de 2000, o qual regula a competncia judiciria e o reconhecimento de sentenas estrangeiras em matria civil e comercial. Vincula os Estados-membros da UE mas nem todos (com a excepo da Dinamarca); B) Sistema de reviso ou controlo prvio aquele que pressupe a verificao prvia da regularidade da sentena/deciso. Subdivide-se em 2 subsistemas: a. Reviso de mrito exige que o tribunal se pronuncie sobre a boa aplicao do direito feita pelo tribunal estrangeiro ou exige a reapreciao da matria de facto. Vigorou em Frana; b. Reviso formal quando a sentena estrangeira para ser reconhecida tem que cumprir determinados requisitos formais. C) Sistema actio judicati aquele em que a deciso estrangeira no reconhecida directamente, mas parte interessada reconhecido o direito de intentar uma nova aco com o mesmo objecto em que o fundamento da aco a prpria sentena estrangeira. Neste sistema, s sero avaliados certos requisitos da deciso que no se prendam com o contedo. Funcionava nos EUA e na Inglaterra at dcada de 30; Ins Seia Neves n2257 Pgina 4
D) Sistema de no reconhecimento aquele em que as sentenas estrangeiras no so reconhecidas e o interessado tem de intentar uma nova aco no foro; E) Sistema de reconhecimento sob condio de reciprocidade aquele em que o reconhecimento da sentena estrangeira est sujeito ao reconhecimento das sentenas do foro pelo pas estrangeiro. Existe em Espanha. Em Portugal vigora o sistema de controlo prvio ou de reviso formal um sistema segundo o qual uma sentena para ser reconhecida em Portugal, ter de cumprir determinados requisitos formais, previstos no art.1096 CPC Exemplos de casos de reviso de mrito (excepes) 1 Caso art.1100/2 CPC preciso que o sujeito contra quem foi proferida a sentena seja uma pessoa singular ou colectiva de nacionalidade portuguesa; preciso que, de acordo com as normas de conflito portuguesas, a ordem jurdica portuguesa fosse luz dessas normas a competente; preciso que o resultado da aco, caso tivesse sido aplicado o direito material portugus, fosse mais favorvel ao sujeito contra quem foi proferida a sentena. 2 Caso art.771 c) CPC preciso que haja apresentao de um documento novo suficiente que permita modificar a situao proferida em tribunal estrangeiro para que esta possa ser revista de forma mais favorvel. 3. Fundamento e natureza do DIP Fundamento do DIP A funo do DIP reduzir a instabilidade a um mnimo possvel, tendo o DIP como valores fundamentais a certeza e a estabilidade jurdicas. Existem 2 propsitos do DIP: Determinar a lei aplicvel situao, ou seja, escolher a lei pela qual a relao deve constituir-se ou ser regulada para que seja juridicamente vlida e possa tornar-se eficaz; Procurar que essa lei seja de reconhecimento internacional, ou seja, que a lei escolhida seja tambm aplicvel pelos demais pases. Natureza do DIP 1) O DIP um direito instrumental; direito de normas sobre normas; direito sobre direito; normas de aplicao ou de 2 grau.
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Se os tribunais devem recusar a aplicao de um preceito que seria aplicvel segundo as regras de conflito da lei do foro, mas que pelo seu contedo, colidem com normas ou princpios da Constituio a soluo seria que o tribunal portugus deve recusar a aplicao da norma quando esteja em causa uma ofensa ordem pblica internacional do Estado do foro art.22 CC; Se podem os tribunais portugueses recusar-se a aplicar o direito estrangeiro competente com fundamento na sua inconstitucionalidade perante a Constituio do pas de origem a soluo seria que o juiz do foro vai aplicar a lei e o direito como se fosse juiz do tribunal ad quem e, portanto, tudo depende do poder que o juiz detenha art.23/1 CC. Ele no vai dar palpites acerca da inconstitucionalidade da norma. Se o juiz do outro Estado no tiver poderes de fiscalizao, o juiz do nosso Estado tambm no poder suscitar esse problema. 4. Fontes do DIP As fontes so vistas como modo de criao e revelao do Direito. A questo que se coloca saber por que vias que o DIP se revela? Encontramos no DIP: Fontes Internas Fontes Internacionais
Assim, como fontes internas temos: Legislao (Cd. Civil, Comercial, etc); Costume (tem importncia maior em pases em que o DIP no est codificado ex: Frana, Blgica e Holanda); Jurisprudncia (na falta de norma legal ou direito consuetudinrio, os tribunais podem tambm criar normas de conflito); Doutrina ( discutvel a sua considerao como fonte. A sua importncia mais no sentido de contribuir para a codificao do DIP).
Como fontes internacionais temos: Costume Internacional (mais habitual no direito mercantil); Tratados Internacionais; Jurisprudncia Internacional; Fontes Comunitrias (subdivide-se em Tratados instituintes da UE e Direito Derivado, dividindo-se este em regulamentos e directivas).
5. Vias de regulamentao das situaes privadas internacionais ( o mtodo) 1) Perspectiva Clssica Europeia o DIP tem como objectivo designar a lei competente para regular ou resolver uma situao plurilocalizada determinando, desta forma, os preceitos materiais aplicveis situao em concreto. Esta concepo remonta a Savigny (finais sc.XVIII e incios sc.XIX) Deu origem ao mtodo conflitual. Nesta fase, as regras de conflito so consideradas demasiado rgidas, obrigando o juiz a utilizar um determinado elemento de conexo pr-determinado sempre que a situaao se enquadre na previso da norma. Ins Seia Neves n2257 Pgina 8
Vantagens Permite uma maior segurana e certeza jurdicas; Tem como pressuposto que o que importa a relao que existe entre a situao e a ordem jurdica, no avaliando a justeza dos preceitos materiais; Evitar a frustrao das expectativas das partes; Promove e garante a estabilidade das relaes jurdicas.
Desvantagens Dificuldade ou impossibilidade de determinar nalgumas situaes a conexo mais estreita; Desadequao das normas de direito interno para regular algumas situaes internacionais que tm contornos imprevisveis no momento da sua elaborao; Dificuldade na adopo de uma soluo que seja materialmente adequada s caractersticas especficas das situaes jurdicas plurilocalizadas.
2) Crticas da doutrina americana a esta perspectiva clssica David Cavers (princpios do sc. XX) O seu pensamento divide-se em 2 fases: 1 Fase rejeio por completo das regras de conflito 2 Fase enunciao de princpios de referncia
Na 1 Fase, defende que as regras de conflito se desinteressam por completo da resoluo do caso concreto. A sua proposta que o juiz, perante um conflito plurilocalizado, deve escolher as normas materiais das ordens jurdicas em contacto com a situao e depois atender a um critrio de justia devido s partes e aos objectivos de poltica legislativa que esto presentes nas normas em concurso Estamos perante a chamada Teoria do Impressionismo Jurdico de acordo com a qual, a norma aplicvel surge da anlise do caso concreto. Esta proposta apresenta crticas, as quais so: um mtodo subjectivo e discricionrio; Imprevisibilidade das decises; Incerteza do direito. Na 2 Fase, ele elabora os chamados princpios de referncia So juzos de valor que orientariam o juiz e justificariam a preferncia dele por uma das normas. Critrios utilizados O Estado/legislador devia seleccionar as leis em concurso para cada matria; Escolhia-se um critrio para determinar a lei aplicvel a cada caso concreto ( semelhana da criao das regras de conflito), mas com referncia ao contedo dos preceitos materiais em concreto ele percebeu que era difcil fazer um princpio de Pgina 9
3) Reaces da doutrina europeia s crticas norte-americanas A) Exemplos de flexibilizao do mtodo/sistema conflitual 1 Exemplo Mecanismo do dpeage (desmembramento) as situaes jurdicas so divididas em vrias facetas para cada uma das quais ser competente uma determinada lei.
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Por vezes so chamadas ordens jurdicas diferentes para regular relaes jurdicas conexas; Para a mesma relao jurdica podem ser chamadas vrias leis, regulando cada uma delas aspectos diferentes; Podem ser chamadas ordens jurdicas diferentes devido sucesso dos estatutos reguladores.
Exs: 1 - Filho adoptivo em que o pai adoptivo nacional do Estado A e o pai biolgico nacional do Estado B. Segundo a lei do Estado A, os filhos adoptivos herdam do pai adoptivo mas no herdam do pai biolgico. Segundo a lei do Estado B, os filhos adoptivos herdam do pai biolgico mas no herdam do pai adoptivo ( dos casos onde o juiz vai ter que fazer uma adaptao) Dr. Ferrer Correia avana com o critrio da ordem cronolgica, ou seja, o filho adoptivo herda daquele que morrer primeiro. 2 - Sucesso de estatutos (leis) A, sua, com filhos, enviuvou. A lei sua permitia que se se casasse 2 vez poderia manter a administrao dos bens dos filhos. No entanto, quando A se casa 2 vez, torna-se italiana, mudando a lei que regula a relao de A com os filhos. Segundo a lei italiana, A no poderia administrar os bens dos filhos se no convocasse, antes do casamento, o conselho de famlia. 3 Exemplo normas espacialmente autolimitadas so aquelas cuja aplicao condicionada e determinada pela sua funo ou fim. Existem 2 tipos de normas: a. Normas de efeito restrito b. Normas de efeito expansivo (mais concretamente as NANI) a. So aquelas que tm um mbito de aplicao mais restrito do que o sistema de que fazem parte, sendo que estas normas no colocam qualquer entrave ao funcionamento normal das regras de conflito. b. So normas que se aplicam mesmo antes de serem convocadas as regras de conflito e de se ver qual o sistema jurdico competente e so normas que se aplicam para realizar certos valores e para tutelar interesses muito relevantes para a comunidade local. So normas com uma especial intensidade valorativa. O art.9 Regulamento de Roma apresenta uma noo pela qual nos podemos apoiar. Exs: clusulas contratuais gerais art.23/1; direito real de habitao peridica art.60/7; art.2223 CC e art.53 CRP. 6. Princpios estruturantes do DIP Estes princpios so fundamentais quando se esto a elaborar as regras de conflito. 1) Princpio da harmonia jurdica internacional segundo o qual, o legislador deve assegurar a continuidade e uniformidade de valorao das situaes jurdicas internacionais e adoptar critrios susceptveis de ser tornados universais; 2) Princpio da harmonia material mais um princpio interno do que de DIP. Exprime a ideia de que no seio do ordenamento jurdico as contradies so intolerveis. Ex: A, grego, residente em Atenas, pretende que lhe seja permitido visitar de vez em quando o seu filho, que residem com a me B, alem, residente em Hamburgo e de quem se divorciou. B ope-se. Se se, de acordo com a regra de conflitos do foro, a Ins Seia Neves n2257 Pgina 12
A) Podem ser: a. Subjectivos ou pessoais prendem-se com circunstncias ligadas aos sujeitos da relao jurdica Exs: arts.25 e 62 CC; b. Objectivos ou reais prendem-se com a situao da coisa Ex: art.46 CC;
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Numa situao fctica Ex: art.46 CC (lugar da situao da coisa) D) Dentro destas, as conexes podem ser:
E) So expresses que se reportam a circunstncias que auxiliam a norma de conflitos a operar a ligao entre uma categoria normativa e a ordem jurdica competente para disciplinar o respectivo regime. Deste modo, podemos ter: a. Conexo descritiva ex: art.46 CC; b. Conexo tcnico-jurdica aquela que constituda por conceitos j elaborados pela cincia jurdica ex: art.53/1 CC. 2. A qualificao Qualificar uma situao significa operar ao seu enquadramento num determinado conceito. Da delimitao do mbito do conceito-quadro, surge a necessidade de o interpretar e de, no momento certo, o integrar. Podemos dizer assim que nos surgem 2 momentos da qualificao, sendo eles: 1 Momento interpretao do conceito-quadro 2 Momento saber quais as normas materiais do ordenamento jurdico competente que so subsumveis ao conceito-quadro da regra de conflitos que considerou essa ordem jurdica competente. Em relao ao 1 momento existem 4 teorias que nos pretendem auxiliar a resolver o problema da interpretao: 1) Teoria da lex fori (lei do foro) segundo a qual a delimitao do conceito-quadro faz-se recorrendo aos conceitos homlogos vigentes no direito material. Crticas: Viola o princpio da igualdade de tratamento; A teleologia das regras de conflito no a mesma das normas materiais, no se devendo ter uma viso puramente nacionalista/interna das regras de conflito;
2) Teoria da lex causae (lei da causa) segundo a qual caberia lei da causa a delimitao do conceito-quadro. Crticas: O juiz j teve que perceber o que que a norma previa; D-se lei da causa competncia para interpretar o conceito-quadro, quando a determinao dessa mesma competncia est necessariamente dependente do processo prvio de qualificao e da prvia interpretao do conceito-quadro.
3) Teoria comparatista segundo a qual os conceitos usados pela regra de conflitos devem ser interpretados em funo dos direitos dos vrios ordenamentos a que podero ser aplicados. A inteno era encontrar um denominador comum entre as vrias ordens jurdicas. Ins Seia Neves n2257 Pgina 15
Crticas: Nem todos os pases tm os mesmos institutos; Est-se a pressupor que existe um denominador comum nos institutos existentes nas vrias ordens jurdicas, o que no pode acontecer; impossvel conseguir estudar e analisar todos os institutos e figuras de todas as ordens jurdicas de forma a criar um conjunto de regras de conflito completo.
4) Teoria teleolgica ou da lex formalis fori (posio adoptada) segundo a qual o mbito dos conceitos deve ser interpretado de acordo com os interesses e objectivos que visam acautelar, devendo o critrio de interpretao ser procurado e encontrado na ordem jurdica do foro ( o chamado princpio hermenutico jurdico se a regra de conflitos interna, tem que ser encontrado nessa norma). A interpretao : Formal porque a regra de conflitos formal e no material; Autnoma porque independente do instituto homlogo portugus; Teleolgica porque deve ter em conta os fins e as funes que o legislador teve em mente aquando da criao das regras de conflito. Relativamente ao 2 momento, neste os preceitos materiais da ordem jurdica competente s so aplicveis se corresponderem categoria normativa prevista na regra de conflitos, sendo que a luz das regras de interpretao desse ordenamento competente que se vai saber quais so em concreto as normas materiais que caem na previso do conceito-quadro art.23 CC. O juiz do foro, quando estiver a determinar quais as normas materiais da ordem jurdica competente que se integram no conceito-quadro da regra de conflitos, deve ter em conta as funes e o fim da norma, as suas caractersticas e a sua natureza. Conflitos de qualificao Estes podem ser: 1) Positivos so aqueles que acontecem quando a situao tem contacto com mais de um ordenamento e foram utilizadas normas de conflito diferentes que apontaram para mais do que um ordenamento jurdico e das 2 uma:
Ou os 2 ordenamentos em causa arrogam a competncia para regular a situao relativamente aos mesmos aspectos;
No que concerne a estes, Ferrer Correia defende que se dever operar uma hierarquizao entre as qualificaes conflituantes. As orientaes preconizadas por este autor so as seguintes:
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