Simp3 - Ventilação Mecânica em Crianças

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Simpsio: EMERGNCIAS PEDITRICAS

Captulo III

Ventilao mecnica em crianas


Mechanical ventilation in children
Fabio Carmona

RESUMO
O presente artigo apresenta ao leitor as principais indicaes de ventilao mecnica assistida em
crianas e as principais modalidades existentes, alm de trazer orientaes para o ajuste dos parmetros iniciais de ventilao de acordo com a indicao e listar as principais complicaes relacionadas
ventilao mecnica e seu tratamento imediato.
Palavras-chave: Ventilao Mecnica. Pediatria. Insuficincia Respiratria.

Introduo
A ampla utilizao da ventilao assistida fora
da sala de cirurgia ocorreu durante a epidemia de poliomielite da dcada de 50.1,2 Desde ento, as tcnicas e os aparelhos tm se tornado cada vez mais sofisticados e a ventilao assistida, antes um procedimento realizado somente em unidades de terapia intensiva (UTIs), vem sendo aplicada na sala de urgncia e at mesmo em domiclio. Mdicos em geral, sobretudo emergencistas e intensivistas, devem estar familiarizados com as tcnicas de ventilao hospitalar
e domstica para atenderem adequadamente s necessidades dos pacientes com doena aguda ou agudizao de doena crnica. Apesar da maioria dos ventiladores parecer complicada a princpio, o entendimento de alguns princpios bsicos da fisiologia respiratria e do funcionamento desses aparelhos possibilita a operao dos mesmos de maneira efetiva e segura. Entretanto, faz-se necessria a compreenso de
alguns conceitos importantes.

Conceitos-chave em anatomia e
fisiologia
O ciclo respiratrio consiste em inspirao e
expirao. A inspirao um processo ativo em que
a contrao da musculatura respiratria gera uma presso negativa intratorcica, deslocando o ar para dentro dos pulmes. A expirao, por outro lado, em condies normais, um processo passivo, onde a fora
elstica dos pulmes e da caixa torcica fora o ar
para fora dos pulmes. A quantidade de ar que entra
nos pulmes durante a inspirao depende de dois fatores: complacncia e resistncia.
Complacncia (C) a capacidade elstica do
trax (que a soma das complacncias dos pulmes
e da caixa torcica). Ela pode ser definida como a
variao do volume pulmonar (V) gerada por uma
variao de presso (P) (Equao 1). Quando a complacncia diminui, os pulmes so descritos como "duros". Doenas como a sndrome do desconforto respiratrio agudo (SDRA), a doena da membrana hialina

Docente da Diviso de Terapia Intensiva Peditrica, Departamento de Puericultura e Pediatria, Faculdade de Medicina de Ribeiro
Preto, Universidade de So Paulo.

Correspondncia:
Prof. Dr. Fabio Carmona
Avenida dos Bandeirantes 3900
14049-900 - Ribeiro Preto - SP.
[email protected]
Artigo recebido em 11/04/2012
Aprovado para publicao em 20/06/2012

Medicina (Ribeiro Preto) 2012;45(2): 185-96

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e o edema pulmonar cursam com diminuio da complacncia pulmonar.1


C = V / P (Equao 1)
Onde: C= complacncia pulmonar, V= variao de
volume, P= variao de presso.
Resistncia (R) a dificuldade na passagem
do ar pelas vias areas, podendo ser definida como a
variao de presso (P) necessria para produzir
determinado fluxo (Q) (Equao 2). Doenas como a
asma, a bronquiolite e a doena pulmonar obstrutiva
crnica (DPOC) cursam com aumento da resistncia
das vias areas.1
R = P / Q (Equao 2)

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de ar que permanece dentro dos pulmes ao final da


expirao normal. determinada por duas foras opostas: a fora elstica dos pulmes que, no fim da expirao favorece o colapso pulmonar, e a fora elstica
da caixa torcica que, no fim da expirao favorece a
expanso pulmonar.1 Volume de fechamento pulmonar (VFP) o volume pulmonar a partir do qual
comea a haver colapso das unidades alveolares. Em
adultos, a CRF maior do que o VFP. Assim, condies que aumentem o VFP ou reduzam a CRF levam
a colapso pulmonar e atelectasia. Em crianas, ao contrrio dos adultos, a CRF menor do que o VFP, o que
explica a maior propenso destes pacientes formao de atelectasias. 3 A presso positiva expiratria
final (PEEP), usada durante a ventilao assistida, aumenta a CRF acima do VFP, auxiliando a reexpanso
e prevenindo o colapso pulmonar.1 (Figura 1).

Onde: R= resistncia da via area, P= variao de


presso, Q= fluxo de gs.

Objetivos primrios da ventilao


assistida

Constante de tempo (CT) o tempo necessrio para que ocorra equilbrio de presses entre a
via area e os alvolos. Equivale ao produto da resistncia pela complacncia (Equao 3). Em um recmnascido normal, seu valor aproximado de 0,15 segundos, enquanto que no adulto normal de 0,30 segundos. Em geral, 1 CT equilibra 63% dos alvolos, 3
CT equilibram 95% dos alvolos e 5 CT equilibram
99% dos alvolos. Por isso, em geral, o tempo inspiratrio deve ser ajustado para 3 a 5 CT, o que equivale a 0,45 segundos em recm-nascidos e 1 segundo
em adultos.3

Em geral, o objetivo primrio da ventilao assistida auxiliar o funcionamento do aparelho respiratrio. Isso pode ser obtido garantindo-se a oxigenao, a ventilao e a relao ventilao/perfuso.4
Oxigenao a passagem de molculas de oxignio (O2) do espao alveolar para o sangue, cruzando a membrana alvolo-capilar. Os principais determinantes da oxigenao so a frao inspirada de
oxignio (FiO2) e a presso mdia das vias areas (PVA) (Equao 4).5

CT = R C (Equao 3)

Onde: PaO2= presso parcial arterial de oxignio,


FiO2= frao inspirada de oxignio, PVA= presso mdia
nas vias areas.

Onde: CT= constante de tempo, R= resistncia da


via area, C= complacncia pulmonar.
Trabalho respiratrio o esforo feito pelo
paciente para vencer a complacncia e a resistncia
do aparelho respiratrio. Assim, patologias que reduzem a complacncia ou aumentam a resistncia do
aparelho respiratrio causam aumento do trabalho respiratrio, levando ao aumento da frequncia respiratria e uso da musculatura acessria.2
O volume de ar que entra e sai dos pulmes a
cada ciclo respiratrio chama-se volume corrente (VC).
2 Em pessoas normais varia de 6 a 8 mL/kg de peso. A
capacidade residual funcional (CRF) o volume
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PaO2 ~ FiO2 PVA (Equao 4)

A reduo do contedo arterial de oxignio


chamada de hipoxemia, e a reduo do contedo tecidual de oxignio, hipxia. A hipoxemia definida
como a PaO2 < 60 mm Hg (ou SaO2 < 90 %).5
Ventilao a troca de gases entre o espao
alveolar e a atmosfera. O volume de ar que entra e
sai dos pulmes em um minuto (volume-minuto) o
principal determinante para a eliminao do dixido
de carbono (CO2) do sangue para a atmosfera, uma
vez que aquele extremamente difusvel. O volume
minuto (Vm) o produto do VC pela frequncia respiratria (FR) (Equao 5).6

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VRI

VC

Capacidade

Capacidade
Vital

Pulmonar
Total
VRE
CRF
VFP
adulto

VFP
criana

Volume Residual

Figura 1. Representao grfica dos volumes pulmonares durante a respirao normal, inspirao e expirao foradas. O crculo
tracejado mostra como o volume de fechamento pulmonar atingido durante a respirao normal em crianas. Legenda: VFP= volume
de fechamento pulmonar, CRF= capacidade residual funcional, VRI= volume de reserva inspiratrio, VC= volume corrente, VRE= volume
reserva expiratrio.

Vm = VC FR (Equao 5)
Onde: Vm= volume-minuto, VC= volume corrente,
FR= frequncia respiratria.
D-se o nome de hipercapnia ao contedo aumentado de CO2 no sangue arterial (PaCO2 > 45 mm
Hg). Acidose respiratria reduo do pH arterial
devido hipercapnia (pH < 7,40). 6
Relao ventilao/perfuso (V/Q) referese ao fato de que, para haver trocas gasosas, necessrio haver ventilao e perfuso simultaneamente nas
mesmas reas dos pulmes. H dois tipos de desequilbrio da relao V/Q: shunt e espao-morto, ambos
cursando com hipoxemia.2 Shunt ocorre quanto h
reas pulmonares perfundidas, porm no ventiladas
(pneumonia, atelectasia). Assim, o sangue no oxigenado ganha a circulao sistmica (shunt direita-es-

querda).1 Espao-morto ocorre quando h reas pulmonares ventiladas, porm no perfundidas (embolia
pulmonar, hipertenso pulmonar). Assim, o ar retorna
atmosfera sem participar de trocas gasosas.1
Falncia respiratria a incapacidade de manter oxigenao e/ou ventilao adequadas, a despeito
da utilizao de terapias conservadoras (p. ex., administrao de oxignio, broncodilatadores, etc.). 4 Pode
ocorrer na presena de hipoxemia grave (PaO2 <
60 mm Hg com FiO2 > 60 %), acidose respiratria
grave (PaCO2 > 50 mm Hg e pH < 7,25) ou ambos.
As principais causas de falncia respiratria so: baixa complacncia, alta resistncia, desequilbrio da relao ventilao/perfuso, hipoventilao (central ou
perifrica), alterao da membrana alvolo-capilar,
trauma crnio-enceflico ou torcico e reduo da
superfcie de troca pulmonar. 7
Outros objetivos da ventilao assistida incluem: controlar a respirao de maneira especfica, para
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o tratamento de doenas extrapulmonares (p. ex., hiperventilao na hipertenso intracraniana, hipoventilao na sndrome da hipoplasia do corao esquerdo
com hiperfluxo pulmonar, etc.), reduzir o trabalho respiratrio (p. ex., choque sptico ou cardiognico), ou
ainda para administrao de medicamentos (xido
ntrico, Heliox).1

Indicaes
A falncia respiratria a indicao primria
para o uso da ventilao assistida. Ressalta-se, entretanto, que os valores de PaO2, PaCO2, SaO2, FiO2 e

pH no devem ser usados de maneira absoluta para


indicar a ventilao assistida, mas sim analisados em
conjunto com a patologia presente, sua provvel evoluo, o exame fsico do paciente e a resposta s demais terapias, alm dos riscos associados ventilao
mecnica.5 Por outro lado, ao cuidar de um paciente
com desconforto respiratrio grave, melhor considerar o incio da ventilao assistida sob condies
controladas e mais favorveis do que aguardar a piora da acidose, fadiga e possvel falncia ou parada
cardiorrespiratria.4 As principais indicaes de ventilao mecnica assistida encontram-se resumidas na
Tabela 1.

Tabela 1
Principais indicaes de ventilao mecnica assistida.
Situao

Indicaes

Falncia respiratria

Aumento do trabalho respiratrio


Doenas do parnquima pulmonar
- Sndrome do desconforto respiratrio agudo (SDRA)
- Pneumonia
- Doena da membrana hialina
- Atelectasia
- Fibrose pulmonar
Doenas das vias areas
- Asma
- Bronquiolite
- Traqueomalcia ou broncomalcia graves
Alteraes da complacncia torcica
- Queimaduras extensas
- Traumatismos
- Ascite volumosa
Reduo da capacidade de sustentar o trabalho respiratrio
Doenas neuromusculares
Distrbios eletrolticos
- Hipocalemia
- Hipocalcemia
Alterao do controle da respirao
Traumatismo crnio-enceflico
Anestesia geral ou sedao intensa
Convulses e estado ps-ictal
Apneia da prematuridade
Doenas neurolgicas graves

Manejo de doenas extrapulmonares

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Necessidade de controle da ventilao


Hipertenso intracraniana
Cardiopatias congnitas
Hipertenso pulmonar do recm-nascido
Estados ps-operatrios
Reduo do trabalho respiratrio
Choque sptico ou cardiognico
Insuficincia cardaca grave

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Equipamentos
Para utilizar corretamente um ventilador, importante tambm entender alguns conceitos bsicos a
respeito do funcionamento desses aparelhos, bem
como das principais modalidades de ventilao existentes. 1 A Figura 2 apresenta um diagrama bsico do
funcionamento dos ventiladores.
Quando o ventilador aumenta a presso na via
area (PVA), a diferena de presso (P) ir gerar um
fluxo (Q) proporcional resistncia (R), e ir entregar um volume corrente (VC) proporcional complacncia (C) (Equao 6). 1
PVA = Q R + ( VC C ) + PEEP (Equao 6)
Onde: PVA= presso da via area, Q= fluxo de ar,
R= resistncia da via area, VC= volume corrente,
C= complacncia pulmonar, PEEP= presso positiva
expiratria final.

Na ventilao mecnica assistida, o ciclo respiratrio ser composto de quatro fases distintas: transio da expirao para a inspirao (disparo), inspirao, transio da inspirao para a expirao
(ciclagem ou ciclo) e expirao. 1
Disparo refere-se ao modo como o ventilador
inicia uma inspirao. O disparo pode ser feito por
tempo ou presso. Quando uma inspirao iniciada
porque foi atingido um limite de tempo pr-determinado, dizemos que o ventilador disparado a tempo.
Quando o ventilador detecta uma reduo na presso
do circuito causada por um esforo inspiratrio do
paciente e inicia a inspirao, dizemos que ele disparado a presso.1,3,6
Uma vez disparada a inspirao, o ventilador
dever fornecer um fluxo de ar para dentro dos pulmes at que um determinado limite pr-estabelecido
seja atingido. Isto pode ser obtido gerando-se uma
presso positiva constante no circuito, durante um tempo determinado, que ir gerar um fluxo e deslocar uma

Fluxo x Resistncia

PVA
PA

Volume x Complacncia

Paciente

Ventilador

Figura 2. Diagrama bsico do funcionamento da ventilao mecnica assistida. Legenda: PVA= presso na via area, PA= presso
alveolar.

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quantidade de ar para dentro dos pulmes. Isto se


chama ventilao limitada a presso. Se o ventilador fornece um volume ou um fluxo pr-determinado,
dizemos que a ventilao limitada a volume ou
limitada a fluxo.1,3,6
Ciclagem refere-se ao modo como o ventilador encerra a inspirao e passa para a fase expiratria do ciclo. Se a inspirao encerrada aps um tempo pr-determinado, chamamos de ciclagem a tempo. Se a inspirao encerrada ao atingir-se determinada presso ou volume, dizemos que se trata de
ciclagem a presso ou ciclagem a volume, respectivamente.1,3,6
Por fim, durante a expirao, uma vlvula
aberta no circuito do ventilador, deixando o ar sair dos
pulmes de maneira passiva, at que um novo disparo
ocorra.1,3,6
Dessa forma, os ventiladores podem ser classificados de acordo com a forma com que eles operam
nas trs primeiras fases do ciclo. Um determinado
ventilador pode ser classificado como disparado a tempo, limitado a presso e ciclado a tempo. 3
A classificao mais utilizada, entretanto, refere-se ao modo de ventilao empregado pelos diferentes ventiladores. Ventiladores modernos so capazes de operar em diferentes modos, e ter diversos
mecanismos de disparo, inspirao e ciclagem. Os
modos ventilatrios mais comumente utilizados sero
descritos a seguir.
Ventilao controlada (CV)
A ventilao controlada sempre disparada a
tempo. Cada ciclo iniciado a intervalos regulares prdeterminados de tempo. O ventilador no responde
aos esforos respiratrios do paciente. Por isso, este
modo reservado aos pacientes em apneia, muitas
vezes inconscientes ou sob anestesia geral.1,3,5,6
Ventilao assistida (AV)
Na ventilao assistida, o disparo pode ser a
presso ou a fluxo. Os ciclos respiratrios so iniciados somente pelo esforo inspiratrio do paciente,
detectado pela reduo da presso ou pelo aumento
do fluxo no circuito. Este modo permite ao paciente
interagir com o ventilador e controlar sua frequncia
respiratria de maneira sincronizada. No deve ser
usada em pacientes com apneia.1,3,5,6
Ventilao assistido-controlada (A/CV)
Este modo uma combinao dos dois anteriores, onde os ciclos respiratrios podem ser disparados
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pelo esforo do paciente (ciclos assistidos) e, caso este


apresente um perodo de apneia e um intervalo de tempo pr-determinado seja atingido, o ventilador tambm
ir disparar (ciclos controlados). Este modo especialmente til em pacientes com variao do nvel de
conscincia ou da fora muscular, como por exemplo,
pacientes recuperando-se de anestesia geral.1,3,5,6
Ventilao mandatria intermitente (IMV)
Este modo de ventilao assemelha-se ao modo
ventilao controlada, exceto pelo fato de que o paciente consegue respirar espontaneamente nos intervalos entre os ciclos controlados. , portanto, disparado
a tempo. Para que o paciente possa respirar entre os
ciclos, o ventilador pode gerar um fluxo contnuo de
gs no circuito, ou um fluxo intermitente liberado pela
abertura de uma vlvula em resposta ao esforo do
paciente.1,3,5,6
Ventilao mandatria intermitente sincronizada (SIMV)
A SIMV similar IMV, exceto pelo fato de
que os ciclos controlados so disparados de maneira
sincronizada aos esforos respiratrios do paciente
(disparo a presso ou fluxo). Caso o paciente no apresente esforo respiratrio aps um intervalo de tempo
pr-estabelecido o ventilador tambm ir disparar um
ciclo (disparo a tempo). O paciente pode respirar espontaneamente entre os ciclos. A vantagem deste
modo a maior interao com o ventilador, proporcionando maior conforto para o paciente. bastante
similar ao modo A/CV.1,3,5,6
Ventilao com presso de suporte (PSV)
A PSV consiste em ciclos respiratrios disparados a presso, limitados a presso e ciclados a fluxo. Quando o paciente apresenta um esforo respiratrio o aparelho detecta e fornece uma presso constante no circuito at que o fluxo de ar para o paciente
caia a uma frao do fluxo inicial, que marca o fim da
inspirao. Este modo permite ajustar a quantidade
de suporte que o paciente precisa. Alm disso, a
ciclagem a fluxo permite que o paciente controle o
tempo inspiratrio e o volume corrente. Este modo
pode ser associado ao SIMV.1,3,5,6
Presso positiva contnua nas vias areas
(CPAP)
Este modo refere-se aplicao de uma presso constante na via area, objetivando aumentar a
CRF, mantendo as vias areas abertas, abrindo unida-

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des alveolares colapsadas e prevenindo atelectasias.


Isso resulta em complacncia mais alta, melhor relao ventilao/perfuso e menor trabalho respiratrio. A CPAP pode ser aplicada de maneira no-invasiva, por meio de prongas nasais (em recm-nascidos
ou lactentes) ou, menos frequentemente, mscaras
nasais ou faciais (crianas maiores, adolescentes e
adultos). A CPAP aplicada em cnulas traqueais no
recomendada, pois o circuito gera resistncia e espao morto muito grandes.1,3,5,6,8
Presso positiva contnua nas vias areas em
dois nveis (BiPAP)
Este modo combina a aplicao de CPAP com
PSV de maneira no-invasiva, por meio de mscaras
nasais ou faciais. Em geral, utilizado em crianas
maiores, adolescentes e adultos.1,3,5,6

Ajustes iniciais do ventilador


Antes do incio da ventilao assistida, deve ser
realizada a obteno de uma via area avanada. A
intubao orotraqueal o mtodo mais utilizado.
mandatrio confirmar a posio correta do tubo traqueal, por ausculta, radiografia de trax e determinao do CO2 exalado. O dimetro interno do tubo traqueal pode ser estimado dividindo-se a idade em anos
por quatro, e depois somando-se quatro. A posio de
fixao do tubo traqueal ao nvel do lbio superior pode
ser estimada multiplicando-se o dimetro do tubo traqueal por trs.7
Depois de assegurar a via area, escolher o
ventilador apropriado e o modo a ser utilizado, necessrio fazer os ajustes iniciais. importante salientar que estes ajustes so apenas um ponto de partida.
O mdico dever ajustar o modo e os parmetros do
ventilador de maneira individual, de acordo com as
caractersticas de cada paciente e da condio que
levou necessidade de ventilao assistida.1,3,5,6,9
Os ventiladores limitados a volume geralmente
so utilizados para ventilar pacientes adultos ou crianas com mais de 10 kg de peso. Os ventiladores limitados a presso geralmente so utilizados em recmnascidos e lactentes. Essa regra, entretanto, no
absoluta. Aparelhos modernos so capazes de oferecer diversos modos ventilatrios em todas as faixas
etrias. A seguir, descreveremos os passos necessrios para ajustar adequadamente um ventilador.
1. Montagem. Em geral, a montagem do equipamento feita pela equipe de enfermagem ou de fisiote-

Carmona F. Ventilao mecnica em crianas

rapia respiratria. Entretanto, o mdico deve estar


familiarizado com esses procedimentos, podendo
auxiliar a montagem, ou mesmo faz-lo em situaes excepcionais. Verifique, em especial, as conexes do circuito respiratrio, a conexo rede eltrica e s redes de ar comprimido e de oxignio.
2. Selecionar o modo de ventilao. Os modos disponveis dependero do modelo que estiver sendo
utilizado. Os modos mais utilizados so SIMV+PSV
ou A/CV.
3. Ajustar a frequncia respiratria. A FR deve
ser ajustada de acordo com a idade do paciente
(Tabela 2). Em geral, pode-se iniciar a ventilao
com uma frequncia um pouco mais alta e ir reduzindo medida que a capacidade respiratria do
paciente for melhorando, de forma que haja mais
ciclos assistidos do que controlados.1
4. Ajustar o volume corrente ou a presso inspiratria de pico
a. Nos modos limitados a volume, deve-se ajustar o
VC para 6 a 8 mL/kg. Assegure-se de que a presso inspiratria de pico (PIP) no ultrapasse 35
cm H2O. VC maiores podem ser necessrios em
caso de escape de ar ao redor da cnula traqueal
ou se o circuito for muito compressvel.
b. Nos modos limitados a presso, deve-se selecionar um valor de PIP que produza expanso torcica adequada e murmrio vesicular bem audvel
ausculta. Em geral este valor entre 15 e 20
cm H2O. Nos ventiladores capazes de medir o
volume expirado, certifique-se de que esteja entre 6 e 8 mL/kg. Em alguns ventiladores, no
possvel regular diretamente a PIP, mas sim a
presso motriz, ou presso controlada (driving
pressure ou P), que a presso a ser aplicada
acima da PEEP. Assim, com uma PEEP de 5 cm
H2O, aplicar uma P de 10 cm H2O ir gerar
uma PIP de 15 cm H2O.6
5. Ajustar o tempo inspiratrio. Dependendo do
modelo do ventilador, pode ser possvel ajustar tanto o tempo inspiratrio (TI) quanto a relao
inspirao:expirao (I:E) (Tabela 2).
a. O TI pode ser calculado da seguinte forma. Dividindo-se 60 segundos pela FR obtemos a durao de cada ciclo. Para manter uma relao I:E
de 1:2, o TI deve corresponder a um tero da
durao do ciclo. Certifique-se de que o TI corresponda a pelo menos 3 CT, caso contrrio pode
ser necessrio utilizar uma FR mais baixa.
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Tabela 2
Ajustes iniciais sugeridos para ventilao mecnica, de acordo com a faixa etria.
Faixa etria

PIP

VC

PEEP

FR

TI

Recm-nascidos (at 1 ms)

1520

68

3040

0,40,6

Lactentes (at 2 anos)

1520

68

2030

0,50,7

Pr-escolares (at 6 anos)

1520

68

1525

0,70,9

Escolares (at 10 anos)

1520

68

1220

0,81,0

Adolescentes (at 21 anos)

1525

68

1015

1,01,3

Adultos

2025

610

810

1,21,5

Legenda: PIP= presso inspiratria de pico (cm H 2O); VC= volume corrente (mL/kg); PEEP= presso positiva expiratria final (cm H2O);
FR= frequncia respiratria (ipm); TI= tempo inspiratrio (s).

b. Quando for possvel ajustar a relao I:E, certifique-se de que seja de 1:2 ou menor (1:3 ou 1:4),
certificando-se de que o TI corresponda a pelo
menos 3 CT; caso contrrio pode ser necessrio
utilizar uma FR mais baixa ou uma relao I:E
maior (no mximo 1:2). 5
6. Ajustar a presso de suporte. Se o modo selecionado for SIMV+PSV ou somente PSV, deve-se
ajustar o seu valor inicial para 10 cm H2O, ou o
mesmo valor da P.
7. Ajustar a sensibilidade. Nos modos em que o
disparo pode ser iniciado pelo paciente, importante ajustar a sensibilidade do aparelho. Isso significa
determinar que a intensidade de esforo detectado
pelo ventilador ser interpretada como esforo inspiratrio do paciente. O esforo pode ser detectado
atravs de variaes na presso da via area ou no
fluxo do circuito. Em geral, uma sensibilidade entre
2 e 3 cm H2O ou 2 a 4 L/min adequada.
8. Ajustar a concentrao de oxignio. A FiO2 deve
ser ajustada, inicialmente, para 100%. Depois pode
ser reduzida, objetivando-se manter a SaO2 90%
com FiO2 60%.1
9. Ajustar a presso positiva expiratria final. A
PEEP deve ser inicialmente ajustada para 5 cm
H2O. Este valor deve ser ajustado de acordo com a
patologia de base, buscando-se determinar a PEEP
ideal, onde anlise da curva presso volume pode
ser til.1
10. Testar o ventilador. Aps o ajuste dos parmetros da ventilao, o funcionamento do aparelho
deve ser testado, conectando-se o circuito a um
balo de testes ("pulmo artificial") ou a uma luva
estril, selando bem o escape de ar, para verificar
o disparo, a inspirao, a ciclagem e a expirao.
11. Obter o consentimento. Caso o paciente esteja
192

consciente, indispensvel obter seu consentimento antes de conect-lo ao ventilador, informandoo do que ir ser feito, dos desconfortos que poder sentir, dos riscos e dos benefcios esperados.
Esse procedimento poder ser reduzido ou omitido em situaes de urgncia e emergncia.4
12. Conectar o ventilador ao paciente. Antes de
conectar o ventilador, o paciente dever estar sendo
ventilado com dispositivo do tipo bolsa-valva e oxignio a 100%. Realize uma aspirao da via area com tcnica estril. Desconecte a bolsa-valva
e conecte o circuito do ventilador cnula traqueal do paciente.6
13. Examinar o paciente. Imediatamente aps conectar o ventilador ao paciente, deve-se examinar
o paciente com nfase nos aparelhos respiratrio
e cardiovascular. Verifique o nvel de conforto do
paciente, o grau de expanso torcica, a colorao das mucosas e dos leitos ungueais, a presena
de escape de ar ao redor da cnula traqueal, a
sincronia entre o ventilador e o paciente, ausculte
o trax e certifique-se de haver murmrio vesicular bilateral. Faa tambm ausculta cardaca, palpe
os pulsos centrais e perifricos e verifique a frequncia cardaca, a presso arterial e o tempo de
enchimento capilar. O uso de ventilao com presso positiva pode levar a deteriorao cardiovascular pela reduo do retorno venoso ao trio direito e aumento da ps-carga do ventrculo direito.
Podem ser necessrias expanses de volume com
soluo isotnica em alquotas de 10 a 20 mL/kg.7
14. Verificar o funcionamento do ventilador. Verifique se aps a conexo com o paciente o ventilador est operando corretamente e com os parmetros ajustados inicialmente por voc. Faa os
ajustes necessrios.

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15. Ajustar os alarmes. Os modelos mais modernos


de ventilador so equipados com alarmes que detectam mudanas nas presses das vias areas,
no volume inspirado ou expirado, na frequncia
respiratria, na complacncia pulmonar, entre outros. Esses alarmes devem estar sempre ligados e
regulados de acordo com limites de tolerncia prdefinidos pela equipe mdica.
16. Monitorizao. O paciente em ventilao mecnica deve estar com monitor cardaco, pulsoxmetro e monitorizao no-invasiva da presso arterial. Adicionalmente, pode-se acrescentar medida
do CO2 exalado (ETCO2) por um capngrafo, medida invasiva da presso arterial e/ou da presso
venosa central (PVC), entre outros. O uso da
capnografia pode reduzir o nmero de coleta de
gasometrias arteriais. Deve-se tambm coletar gasometria arterial e solicitar uma radiografia do trax. Alguns modelos de ventilador oferecem monitorizao da dinmica ventilatria em tempo real.
17. Ajuste adicionais. Os parmetros da ventilao
devem ser ajustados constantemente para se adequar s necessidades do paciente, de acordo com
o exame clnico, a monitorizao e a anlise da
radiografia de trax e da gasometria arterial.

Sedao e analgesia
O desconforto causado pela presena da cnula traqueal, procedimentos dolorosos, a presso positiva intratorcica, associados ansiedade e a caractersticas da patologia de base geralmente tornam necessria a sedao do paciente. Alm disso, a sedao
pode reduzir o trabalho respiratrio e o consumo de
oxignio, auxiliando a teraputica. Em geral, infuso
contnua de um benzodiazepnico (midazolam, 0,1 a
0,3 mg/kg/h) associado a um opioide (fentanil, 1 a
3 g/kg/h) suficiente para a maioria dos pacientes.7
A associao com um bloqueador neuromuscular (vecurnio, 1 a 3 g/kg/min) reservada a casos selecionados.

Complicaes agudas
O paciente sob ventilao mecnica pode apresentar complicaes agudas que podem ser fatais, se
no houver interveno imediata. Frente a um paciente sob ventilao mecnica assistida com deteriorao sbita, desconecte o ventilador imediatamente
e inicie ventilao com bolsa-valva e oxignio a 100%.
Em seguida, verifique as seguintes situaes, que po-

Carmona F. Ventilao mecnica em crianas

dem ser lembradas atravs da regra mnemnica


DOPE 7 :
(D) Deslocamento da cnula. Verifique a posio da cnula traqueal e ausculte o trax do paciente. A cnula pode ter se deslocado para fora da
laringe, e o paciente est extubado, ou pode ter se
deslocado para dentro, e o paciente est com intubao seletiva de um dos brnquios-fonte (em geral o direito). No primeiro caso, remova a cnula,
inicie ventilao com bolsa-valva-mscara e realize nova intubao. No segundo caso, tracione cuidadosamente enquanto ausculta o paciente at que
se oua murmrio vesicular bilateralmente.
(O) Obstruo da cnula. Verifique se a cnula
traqueal no est dobrada ou obstruda por rolhas
de secreo espessa. Realize uma aspirao da cnula com tcnica estril. Em raras situaes pode
ser necessrio trocar a cnula por uma de maior
calibre.
(P) Pneumotrax. Verifique se o trax expande
de maneira simtrica e se o murmrio vesicular pode
ser auscultado bilateralmente. Caso haja reduo
ou abolio em um dos hemitrax, a percusso do
trax poder auxili-lo a diferenciar o pneumotrax
de efuso pleural volumosa ou consolidao pulmonar extensa. A drenagem torcica o tratamento
de escolha. Entretanto, caso o paciente esteja instvel ou seu estado se deteriorando, pode-se fazer
uma puno de prova com agulha de grosso calibre
em selo d'gua (na seringa), na face anterior do
hemitrax comprometido, na linha hemiclavicular,
segundo espao intercostal (borda superior da costela inferior). Caso haja sada de ar, aspire o mximo possvel e depois abra o sistema para o ambiente. Isso transformar o pneumotrax fechado (e
hipertensivo) em pneumotrax aberto, e com isso a
ventilao com bolsa-valva pode promover a
reexpanso pulmonar. A drenagem torcica deve
ser realizada o mais rpido possvel.
(E) Falha do equipamento. Verifique novamente
o funcionamento do ventilador, os ajustes, a conexo com as fontes de ar comprimido e de oxignio,
a conexo rede eltrica, a presena de conexes
defeituosas, vazamentos de ar, etc. Se tudo estiver
aparentemente funcionando e o paciente no tolerar ser reconectado, o ventilador dever ser substitudo por outro.
Pode ainda haver comprometimento hemodinmico e baixo dbito cardaco por causa da presso
positiva intratorcica. Alguns pacientes podem se be193

Carmona F. Ventilao mecnica em crianas

neficiar de expanses de volume intravascular ou de


drogas inotrpicas, como a milrinona ou a dopamina,
em doses baixas.7

Situaes especiais
Doena parenquimatosa pulmonar
Em pacientes com doenas graves do parnquima pulmonar, em que a complacncia est muito
reduzida, a reduo da CRF pode levar ao colapso de
grande parte das unidades alveolares, levando a hipoxemia refratria. Para restaurar a relao ventilao/
perfuso e expandir as unidades alveolares colapsadas
deve-se utilizar a PEEP em nveis mais elevados. De
maneira geral, a PEEP deve ser aumentada em 2 cm
H2O a cada 3 a 5 minutos, at que a oxigenao melhore e seja possvel manter a SaO2 90% com FiO2
60%. Lembre-se de que a PEEP pode reduzir o
retorno venoso direito e aumentar a ps-carga do ventrculo direito, levando a baixo dbito cardaco. Podem ser necessrias novas adequaes da volemia
com expanses de soluo isotnica em alquotas de
10 a 20 mL/kg.1,6
Obstruo das vias areas inferiores
Doenas que cursam com obstruo das vias
areas inferiores, como a asma e a bronquiolite, que
levam ao aumento acentuado da resistncia das vias
areas, cursam tambm com hiperinsuflao pulmonar, que pode ser agravada pela presso positiva. A
hiperinsuflao das unidades alveolares, que tambm
so mal-ventiladas e, portanto, hipxicas, leva a compresso dos capilares pulmonares e aumento da resistncia vascular pulmonar. Com isso, h aumento da
ps-carga do ventrculo direito e reduo do retorno
venoso para o trio esquerdo, contribuindo para baixo
dbito cardaco sistmico. Para evitar esses efeitos,
devem-se usar os mnimos valores possveis de PIP
ou VC e PEEP. Alm disso, o tempo necessrio para
completar a expirao pode ser muito maior do que o
habitual, devido ao aumento da resistncia da via area. Por isso, uma nova inspirao pode ser iniciada
antes que a expirao termine e atinja a capacidade
residual funcional, levando a um "empilhamento" de
ciclos respiratrios. Esse fenmeno, conhecido como
PEEP inadvertida ou auto-PEEP, agrava a hiperinsuflao e aumenta a presso mdia das vias areas.
Para evitar isso, deve-se reduzir a frequncia respiratria ao mnimo possvel (mais eficaz) e reduzir a rela194

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o I:E para 1:3 ou 1:4 (menos eficaz), aumentando


assim o tempo expiratrio.1,6

Ventilao pr
otetor
a
protetor
otetora
Em algumas situaes, podemos utilizar estratgias conhecidas como ventilao protetora, que consiste em tolerar alguns parmetros da gasometria arterial fora dentro de limites mais amplos do que os da
normalidade, em especial a PaCO2 e o pH arterial. A
ventilao protetora permite a utilizao de ajustes
mais "conservadores" no ventilador, de modo a evitar
complicaes relacionadas ao uso de altas presses e
volumes, como por exemplo, pneumotrax e baixo
dbito cardaco, e tambm reduzir a incidncia e a
gravidade das leses pulmonares agudas e crnicas
induzidas pela ventilao mecnica.1,6 De maneira
geral, as estratgias de ventilao protetora so divididas em dois grandes grupos:
Hipercapnia permissiva
Esta estratgia consiste em usar VC abaixo do
recomendado para o peso do paciente (cerca de 4 a 5
mL/kg) e/ou PIP de, no mximo, 35 cm H2O. O menor volume minuto ir levar a hipercapnia, que em geral
bem tolerada, desde que se mantenha a PaCO2 abaixo de 50-55 mm Hg e, principalmente, o pH acima de
7,20.
Hipoxemia permissiva
Esta estratgia consiste em usar FiO2 de at
60%, para evitar os efeitos txicos do oxignio em
altas concentraes, e limitar a PEEP em at 15 cm
H2O, tolerando-se uma SaO2 de pelo menos 85%.

Medidas adicionais
Conforto fsico. Deve-se atentar para o posicionamento confortvel do paciente no leito, com controle de temperatura ambiente, luminosidade e rudos.10
Ajustar a temperatura do umidificador. A
temperatura ideal do umidificador deve estar entre 30
e 34 C.2
Fisioterapia respiratria e aspirao da cnula traqueal. A fisioterapia respiratria fundamental para a utilizao segura e eficaz da ventilao mecnica. A comunicao e cooperao entre o mdico
e o fisioterapeuta podem ser extremamente benficas
para o paciente. A aspirao das secrees traqueais
deve ser realizada no mnimo a cada 4 horas, ou mais

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frequentemente, se necessrio, podendo ser realizada


por fisioterapeutas, pela equipe de enfermagem ou pelo
prprio mdico. Podem ser necessrias doses adicionais de sedativos e/ou analgsicos para o procedimento. Atentar para a tcnica estril.10

Concluso
Com o entendimento de conceitos bsicos da
fisiologia respiratria e treinamento adequado, o mdico generalista ou pediatra geral pode iniciar a ventilao assistida mecnica em crianas de maneira rpida e segura, sobretudo em situaes de urgncia e
emergncia, favorecendo a estabilizao do quadro
antes da transferncia para uma UTI peditrica ou
neonatal.

Casos clnicos
Caso 1
Recm-nascido com 10 dias de vida, 3 kg,
trazido sala de urgncia com histria de sonolncia e
recusa das mamadas h 12 horas. Ao exame encontra-se hipoativo, ciantico, com frequncia cardaca de
180 bpm, presso arterial de 50 x 30 mm Hg, pulsos
centrais fracos, tempo de enchimento capilar de 5 segundos, frequncia respiratria de 10 ipm, com retraes intercostais, subcostais e de frcula, batimento
de aleta nasal e movimentos do tipo "gasping". Ausculta pulmonar normal, sopro cardaco sistlico +4/+6.
Pergunta-se:
a. Qual o diagnstico?
Resposta: O diagnstico de recm-nascido
com choque circulatrio, que pode ser sptico ou
cardiognico (cardiopatia congnita), e falncia
respiratria. Nessa faixa etria, as causas mais
comuns so o choque sptico e a presena de
uma cardiopatia congnita.
b. Qual deve ser o atendimento inicial?
Resposta: O atendimento inicial deste paciente
inclui a abertura das vias areas (posicionar e aspirar), ventilao com presso positiva usando dispositivo bolsa-valva-mscara e oxignio a 100%,
monitorizao completa e obteno de acesso
venoso de grosso calibre e fazer expanso com
soro fisiolgico 0,9% 5 mL/kg em 15 minutos, at
que se consiga uma radiografia de trax para verificar o tamanho da rea cardaca; se aumentada, sugere choque cardiognico e a infuso de

Carmona F. Ventilao mecnica em crianas

volume deve ser cuidadosa. Aps ventilar o paciente por aproximadamente 1 minuto, se no houver recuperao de ventilao espontnea efetiva, deve-se proceder intubao. Aps a intubao, poderemos selecionar um ventilador disparado a tempo, limitado a presso e ciclado a tempo, operando em modo IMV. Os parmetros iniciais sero: PIP 15 cm H2O, PEEP 5 cm H2O,
FR 30-40 ipm, TI 0,5 s (I:E ~1:2), FiO2 100%.
Atentar, neste caso, para o diagnstico possvel
de cardiopatia congnita, onde a utilizao de oxignio em altas concentraes pode agravar o quadro pelo fechamento do canal arterial. Portanto,
deve-se providenciar o ecocardiograma o mais
rpido possvel, para esclarecimento diagnstico.
Caso 2
Lactente de 6 meses de idade, 8 kg, com histria de febre alta (40 C), tosse produtiva, espirros e
coriza h 4 dias, e queda do estado geral e dispneia
com piora progressiva h 2 dias. Ao exame, encontrase em regular estado geral, ativo, ciantico, com frequncia cardaca de 130 bpm, presso arterial de 80 x
50 mm Hg, pulsos centrais fortes, tempo de enchimento
capilar de 2 segundos, frequncia respiratria de 60
ipm, com retraes intercostais, subcostais e de frcula
e batimento de aleta nasal. ausculta, murmrio vesicular reduzido e soproso em todo o hemitrax direito.
Pergunta-se:
a. Qual o diagnstico?
Resposta: O diagnstico de pneumonia bacteriana com falncia respiratria. A histria de quadro infeccioso das vias areas superiores seguido de desconforto respiratrio sugestiva de infeco bacteriana secundria (pneumonia). A
ausculta pulmonar compatvel.
b. Qual deve ser o atendimento inicial?
Resposta: O atendimento inicial deste paciente
inclui abertura das vias areas (posicionamento e
aspirao) e administrao de oxignio a 100 %
(mscara no reinalante). Caso no haja melhora da SaO2, est indicada a intubao e ventilao mecnica. Como o provvel mecanismo da
hipoxemia shunt, a presso positiva intratorcica pode ser extremamente til. Aps a intubao, podemos selecionar um ventilador disparado
a tempo e presso, limitado a presso e ciclado a
tempo e fluxo, operando em modo SIMV. Os ajustes iniciais sero: PIP 15 cm H2O, PEEP 5 cm
195

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H2O, FR 20-30 ipm, TI 0,6 s (I:E ~1:2), FiO2


100%. Alm disso, a sensibilidade de disparo ser
de 2 cm H2O e a presso de suporte de 10 cm
H2O. A seguir, deve-se aumentar a PEEP gradativamente at obter uma SaO2 90% com FiO2
60%. Em geral, uma PEEP entre 7 e 10 cm
H2O suficiente. A PIP deve ser ajustada de
modo a oferecer um volume corrente de 5-6 mL/
kg (40-50 mL), limitando-se a PIP a 35 cm H2O.
Caso 3
Adolescente de 15 anos, 60 kg, asmtico, tem
histria de crise de dispneia iniciada h 8 horas. Diversos familiares encontram-se gripados. Ao exame
encontra-se extremamente ansioso, plido, ciantico,
frequncia cardaca de 120 bpm, presso arterial de
130 x 80 mm Hg, pulsos centrais fortes, tempo de enchimento capilar de 2 segundos, frequncia respiratria de 30 ipm, com retraes intercostais, subcostais e
de frcula, com esforo expiratrio. ausculta, murmrio vesicular abafado, com raros sibilos expiratrios
e tempo expiratrio bastante aumentado.
Pergunta-se:
a. Qual o diagnstico?
Resposta: O diagnstico de asma aguda gra-

ve com falncia respiratria. A histria clnica e o


exame fsico sugerem fortemente este diagnstico. Em pacientes com asma, a ventilao mecnica deve ser evitada ao mximo, pois o manejo
muito difcil.
b. Qual deve ser o atendimento inicial?
O tratamento inicial deste paciente inclui abertura das vias areas, oferecimento de oxignio a
100% (mscara no reinalante), administrao
imediata de corticosteroides, broncodilatadores
inalados ou endovenosos, podendo-se considerar
terapias de exceo, como o sulfato de magnsio. Caso no haja melhora da hipoxemia e/ou da
hipercapnia, este paciente dever ser intubado.
Podemos escolher um ventilador disparado a tempo e fluxo, limitado a volume e ciclado a volume e
fluxo, operando em modo SIMV. Os ajustes iniciais sero: VC 300-360 mL (5-6 mL/kg), PEEP 35 cm H2O, FR 10-15 ipm, TI 1-1,5 s (I:E ~1:31:4), FiO2 100%, sensibilidade de disparo de 3 L/
min e presso de suporte de 8 cm H2O. Muita
ateno para o desenvolvimento de auto-PEEP.
Em geral requer uso de bloqueadores neuromusculares. O paciente deve ser extubado o mais rpido possvel.

ABSTRACT
The present article presents to the reader the main indications for mechanical ventilation in children and
the most common modalities; it also gives orientation for the initial ventilator settings according to the
indication, and lists the main ventilation-related complications and their immediate treatment.
Keywords: Ventilation, Mechanical. Pediatrics. Respiratory Failure.

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