As Vítimas Algozes
As Vítimas Algozes
As Vítimas Algozes
Sua personalidade era ingratido perversa, indiferena selvagem, inimizade, raiva, vcios,
era vadio, dissimulado, ladro, tinha instintos animais e era atrevido.
Seus senhores eram: Domingos Caetano, Anglica, Florinda e Hermano de Sales. Eram
bons e humanos, tinham delicadeza de sentimentos e sentimentos generosos. Honestos e
trabalhadores.
O autor constri um perfil aterrorizante para o escravo, misto de tigre e serpente, de vtima
e algoz, capaz de atacar quando menos se espera. Claramente procura amedrontar os
brancos senhores de escravos e sugere como soluo o fim da escravido. Soluo que
configura a tese bsica que passa pela concluso de cada um dos trs quadros da
escravido.
A novela no tem por final um desfecho romanesco, mas a reafirmao da tese do autor:
Simeo
foi
o
mais
ingrato
e
perverso
dos
homens.
Pois eu vos digo que Simeo, se no fosse escravo, poderia no ter sido nem ingrato,
nem
perverso.
A escravido degrada, deprava, e torna o homem capaz dos mais medonhos crimes.
O narrador didata: ele explicita a conduta, a forma de agir a ser adotada pelo leitor: Se
quereis matar Simeo, acabar com Simeo, matai a me do crime, acabai com a
escravido.
2 narrativa - "Pai-Raiol"
O feiticeiro. Algumas consideraes do autor: o feitio, como sfilis, veio da frica; o
escravo africano o rei do feitio.
Paulo Borges era um rico fazendeiro. Casara-se aos quarenta anos com Teresa, uma
senhora ainda jovem que j lhe dera 2 filhos.
A compra de 20 escravos, entre eles Pai Raiol e Esmria. o ano fatal de Paulo Borges.
Acontece o adultrio.
Os personagens so:
Paulo Borges - 46 anos. Alto, cabelos castanhos e crespos; fronte baixa sob sobrancelhas
bastas; olhos pretos e belos, nariz aquilino; boca rasgada, lbios grossos e erticos; rosto
oval e bronzeado; seco de msculos; peitos largos e mos engrandecidas e calejadas pelo
trabalho. O tipo do lavrador honesto que hoje raramente se encontra, do pobre rico que se
subtraia ao mundo, e s queria conhecer a roa e a casa, os escravos e a famlia,
trabalhando sempre, gastando pouco, ajuntando muito, e no pesando a nenhum outro
homem como ele. No comprava homens, comprava mquinas; queria braos e no
coraes; gabava-se de senhor severo e forte, entrava nos seus timbres amansar os
negros altanados e incorrigveis.
Teresa - Jovem, simples de costumes, honesta, laboriosa, afeita vida rural dos
fazendeiros. Dirigia a dispensa, a enfermaria, e a grosseira rouparia dos escravos.
Os filhos Lus e Ins
Pai Raiol - Negro africano de 30 a 36 anos; baixa estatura, corpo exageradamente maior
que as pernas; cabea grande; olhos vesgos, mas brilhantes e impossveis de se resistir
fixidez do seu olhar pela impresso incmoda do estrabismo duplo e por no sabermos
Lourena denuncia Esmria e prova a verdade a Paulo. Pai-Raiol morto em uma luta
pelo tio Alberto que alforriado por Paulo. Esmria presa. Paulo Borges arrasta sombria
velhice atormentado pelos remorsos.
3 narrativa - "Lucinda - A mucama"
o terceiro e ltimo romance em As vtimas-algozes.
Os personagens so:
Lucinda - "Engomo, coso, penteio e sei fazer bonecas"; a mulher escrava, uma filha da
me fera, uma vtima da opresso social, uma onda envenenada desse oceano de vcios
obrigados, de perverso lgica, de imoralidade congnita, de influncia corruptora e falaz,
desse monstro de criaturas humanas, que se chama escravido. Tem 12 anos, um pouco
magra, de estatura regular, ligeira de movimentos, afetada sem excesso condenvel no
andar. Muito viva e alegre com pretenses a bom gosto no vestir; com aparncias de
compostura decente nos modos; diligente e satisfeita no trabalho. Trazia dissimuladamente
escondidos os conhecimentos e noviciados dos vcios e das perverses da escravido;
corrupta, licenciosa, imoral; indigna de se aproximar de uma senhora honesta, quanto mais
de uma inocente menina.
Plcido Rodrigues - padrinho de Cndida, o mais opulento fazendeiro e capitalista do
lugar; pai de Frederico.
Frederico - perdeu a me ao nascer e foi amamentado por Leondia. Inteligente e
estudioso. Reflexo fria e segurana de juzo. Foi juntamente com Liberato Europa para
fazer estudos regulares de agricultura e pretendiam continuar os estudos nos Estados
Unidos. Fronte magnfica, a face porm descarnada, de ossos salientes, plida,
desproporcionada e melanclica, os olhos ardentes. Dedicado aos amigos e na dedicao
capaz de ir at a heroicidade. Muito racional. Era ele o planejado noivo de Cndida.
Cndida - loura, olhos azuis e belos, olhar de suavidade cativadora; rosto oval da cor da
magnlia com duas rosas a insinuarem-se nas faces; os lbios quase imperceptivelmente
arqueados, lindssimos, os dentes iguais, de justa proporo e de esmalte purssimo; as
mos e os ps de perfeio e delicadeza maravilhosas; o pescoo e o corpo com a
gentileza prpria de sua idade. Cndida antes de Lucinda tinha 11 anos e com a perfeita
inocncia de sua primeira infncia; esprito cheio de luz suave e idias serenas e
preciosas; eeu corao era um altar adornado pelo amor de seus pais. Cndida de pois de
Lucinda era capaz de ser ardilosa e dissimulada para enganar a me; "prendeu a alma s
palavras venenosas, s explicaes necessariamente imorais da escrava".
Florncio da Silva - honrado, inteligente e rico negociante; um pouco agricultor por
distrao e gosto: bom, afvel e generoso, repartindo as sobras da riqueza que acumulava
com os pobres que no eram vadios; tinha poderosa e legtima influncia eleitoral e
poltica na sua comarca.
Leondia - esposa modelo; me extremosa.
Liberato - irmo mais velho de Cndida; bonito de rosto e elegante de figura; fazia seus
estudos preparatrios na Corte; muito amigo de Frederico, inteligente e estudioso; possua
brilhantismo de imaginao.
Alfredo Souvanel - Amigo de Liberato e Frederico. Encontraramse na Sua. Tinha 26
anos, estatura regular, louro, de olhos cintilantes, era de aspecto agradvel, bem talhado
de corpo. Esmerava-se no trajar, embora no tivesse muitos recursos. Tinha instruo
superficial, mas inteligncia fcil, esprito, e gnio alegre. Habilssimo pianista e excelente
voz de bartono. Era francs, mas esperava ganhar dinheiro no Brasil ensinando piano e
canto. Era o mais alegro, travesso, original, espirituoso e endiabrado companheiro de
folganas. Tornou-se professor de Cndida.
A narrativa conta a histria de Cndida, filha de honrado negociante e agricultor do interior
da provncia do Rio de Janeiro. Em seu aniversrio de onze anos, a menina recebera de
presente do padrinho, Plcido Rodrigues, o mais opulento fazendeiro e capitalista do
lugar, uma escrava crioula chamada Lucinda, de doze anos, que havia sido enviada
Corte para aprender a servir de mucama. A mucama logo conquistou a senhorinha ao dizer
que sabia fazer bonecas e pente-las. O padrinho empenhara-se em conseguir uma
escrava que pudesse agradar a afilhada porque sabia que a menina andava triste devido
recente partida de Joana, uma boa senhora, mulher pobre, mas livre e de sos costumes,
que fora sua ama de leite e a idolatrava como seus pais. Joana, que enviuvara ainda
moa, encontrara segundo noivo num laborioso e honrado lavrador, deixando por isso a
sua adorada Cndida com o maior pesar.
Macedo oferece uma primeira ilustrao de sua tese no romance ao contrastar a
virtuosssima Joana com a mucama Lucinda. Joana descrita como uma segunda me,
criada amiga, companheira do seu quarto de dormir, mulher simples, boa e religiosa.
Cndida perdera a companhia da mulher que era nobre, porque era livre e que servia
com o corao cheio de amor generoso, algo s possvel quando a liberdade exclui toda
imposio de deveres forados por vontade absoluta de senhor. Em substituio, a
menina recebera a crioula quase de sua idade, a mulher escrava, uma filha da me fera,
uma vtima da opresso social, uma onda envenenada desse oceano de vcios obrigados,
de perverso lgica, de imoralidade congnita, de influncia corruptora e falaz, desse
monstro desumanizador de criaturas humanas, que se chama escravido. Diante desse
quadro os acontecimentos desenrolam-se naturalmente, sendo que o maior desafio
entender o porqu de Macedo ter achado necessrio escrever quase quatrocentas pginas
para contar essa histria. A mucama tem uma influncia nefasta sobre a donzela, de quem
se torna a nica confidente nos anos seguintes. Ensina-lhe o que ocorre quando a menina
vira moa, desperta-lhe a curiosidade pelos rapazes, ministra-lhe lies de flerte e namoro,
mostra-lhe ser mais divertido namorar vrios rapazes ao mesmo tempo, e assim por
diante, num desfilar constante de idias destinadas a excitar os sentidos da donzela
cndida e pura. As lies de amor da mucama eram inspiradas pelo sensualismo brutal,
em que se resume todo o amor nos escravos; portanto, a mucama escrava ao p da
menina e da donzela o charco posto em comunicao com a fonte lmpida.
Com a mucama escrava infiltrada no quarto da donzela, foi possvel a um conquistador
barato, um francs estrina e ladro, insinuar-se aos amores de Cndida, conquist-la
efetivamente e tirar-lhe o maior smbolo da honestidade feminina. Lucinda, criatura ruim
como nunca se viu mesmo em folhetins televisivos hodiernos de horrio nobre, tornara-se
ela mesma amante de Souvanel, tramara tudo com ele, e at abrira o quarto da virgem
para a consumao do delito. A idia dos biltres era forar o casamento de Souvanel com
Cndida; dado o golpe do ba, Lucinda ganharia a liberdade e ficaria teda e manteda do
francs. No final, Frederico, criatura virtuosa como nunca se viu mesmo em folhetins
televisivos hodiernos de horrio nobre, filho do padrinho de Cndida, apaixonado por ela
desde menino, perdoa o erro da amada e casa com ela. Descobrira-se que Souvanel era
na verdade Dermany, criminoso procurado na Frana. O vilo preso e deportado.
Lucinda e o pajem do pai de Cndida, tambm envolvido na trama para aproximar
Souvanel da donzela, fogem dos senhores, so capturados, mas acabam abandonados ao
poder pblico pela famlia. Frederico, o anjo, fecha o romance e o nosso martrio com um
discurso abolicionista que aqui transcrevo, para martirizar o leitor, ou ao menos para dividir
com ele o meu sofrimento. O discurso aparece nas pginas 388 e 389 do segundo volume
de As vtimas-algozes (o primeiro volume, com outras duas histrias). Referindo-se a
Lucinda e ao pajem, esses dous traidores e perversos, Frederico disse:
- rvore da escravido deram seus frutos. Quem pede ao charco gua pura, sade
peste, vida ao veneno que mata, moralidade depravao, louco. Dizeis que com os
escravos, e pelo seu trabalho vos enriqueceis: que seja assim; mas em primeiro lugar
donde tirais o direito da opresso? ...em face de que Deus vos direis senhores de homens,
que so homens como vs, e de que vos intitulais donos, senhores, rbitros absolutos? ...
e depois com esses escravos ao p de vs, em torno de vs, com esses miserveis
degradados pela condio violentada, engolfados nos vcios mais torpes, materializados,
corruptos, apodrecidos na escravido, pestferos pelo viver no pantanal [patanal, no
original] da peste e to vis to perigosos postos em contato convosco, com vossas
esposas, com vossas filhas, que podereis esperar desses escravos, do seu contato
obrigado, da sua influncia fatal? ...Oh! bani a escravido!... a escravido um crime da
sociedade escravagista, e a escravido se vinga desmoralizando, envenenando
[evenenando, no original], desonrando, empestando, assassinando seus opressores. Oh!
...bani a escravido! bani a escravido! bani a escravido!....
Nota: Ainda que Macedo atribua os defeitos morais de Lucinda e seus pares instituio
da escravido, a sua descrio dos cativos to impiedosamente desfavorvel que tornase difcil pensar na possibilidade de que essas pessoas, uma vez libertas, possam usufruir
de direitos de cidadania e participar da vida poltica. De fato, uma caracterstica intrigante
de vrios pronunciamentos favorveis lei de 1871 era a descrio dos escravos como
seres quase destitudos de humanidade, pois a violncia da instituio os desprovia de
cultura, de regras de comportamento; por conseguinte, no desenvolviam laos de famlia,
relacionavam-se sexualmente como animais, atacavam os senhores como bestas feras.
Enfim, pareciam condenados a uma espcie de coisificao moral, resultado direto de sua
condio de propriedade, de sua representao como coisa no direito positivo.