ABC Do Desenvolvimento Urbano
ABC Do Desenvolvimento Urbano
ABC Do Desenvolvimento Urbano
Oque faz, afinal, de uma cidade uma cidade? Oque tem sido
comum a todas as cidades atravs dos tempos? Ser que a causa
bsica dos graves problemas das maiores cidades brasileiras o seu
tamanho, como teima o senso comum em insistir7 Como podem
esses problemas ser adequadamente enfrentados?
Oferecer respostas para essas e outras perguntas, de forma
no simplista, mas, ao mesmo tempo, acessvel a um pblico leigo,
O DESAFIO METROPOLITANO
Um Estudo sobre a Problemtica Scio-Espacial
nas Metrpoles Brasileiras
PRMIO JABUTI-20 01
MUDAR A CIDADE
Uma Introduo Crtica ao Planejamento e
Gesto Urbanos
ABC DO
DESENVOLVIMENTO
URBANO
2 edio
li
BERTRAND BRASIL
SUMRIO
2005
Impresso no Brasil
Printed in Brazil
CIP-Brasil. Catalogao-na-fonte
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.
Souza, Marcelo Lopes de, 1963S716a
ABC do desenvolvimento urbano I Marcelo Lopes de
2 ed. Souza - 2 ed. - Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.
192p.
ISBN 8.5-286-1013-6
ras de super-los 19
03-0521
CDD-307.76
CDU-316.334.56
A cidade em progresso
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ciellljica.
Inesquecvel, para mim, o convvio com autores capazes de traduzir em linguagem simples , mas sem banalizar demais, e, muito
menos, sem distorcer, idias muitas vezes complexssimas. o caso
do grande matemtico e filsofo Bertrand Russell, cujo ABC da relatividade devorei sofregam ente l pelos meus quatorze ou quinze
anos. O ttulo do presente livro, alis, no plgio, e sim uma espcie de homenagem ao li vro de Russell e ao que ele representa. Alm
desse, muitos outros livros os trago em boa memria: os do fsico
russo-americano George Gamow, que chegou a criar um personagem, Mr. Tompkins, para explicar aos adolescentes, em meio s suas
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Quais as razes dessa escassez, dessa quase aus nc ia? Por que o
tantssimos companheiros de adolescncia. A eles devo o meu interesse pela cincia, de um modo geral.
mim, empurrando-me para elas, e o meu interesse febril de adolescente pela histria da Segunda Guerra Mundial, logo em seguida des-
leitura.)
Nas cincias naturais, em que tudo parece to certinho, sabe-se
propriamente), devem ter influenciado a minha deciso. Com certeza, no foram os equivalentes sociolgicos, geogrficos, econmicos
ou politolgicos de Russell, Gamow, Asimov ou Mouro, pela simples razo de que eles quase no existiam. O "quase" vai aqui, na verdade, na conta de um eufemismo ou de uma concesso minha ignorncia, pois a tentao de ser mais duro grande. No terreno das c incias sociais, a nica obra realmente de divulgao cientfica, prato
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trino, genoma, sinapse, metamorfismo.fractais e, obviamente, tripanossoma cruzi ou oligoclsio (isto , em bom "quimiqus", (Na,Ca)
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sem base emprica e sem rigor reflexivo. (Em linguagem mais tcni-
facilmente quantificao, esse verdadeiro apangio da cincia positivista, cS muito ma is passvel de ser visto como "exterior" ao pesqui-
eles decidirem - sobre coisas que afetam suas vidas e seus destinos,
[ILJ
zar freqenteme nte palavras que andam de boca em boca no s ignifica que elas sej am empregadas da mesma maneira; ao menos teorica-
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dora maioria dos setores das c i ncias sociais (uma exceo parc ial e
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.....
Agora, alguns esclarecimentos ao leitor sobre a estrutura e o estilo deste li vro.
claro que, em um livro como este, q ue no foi escrito para
especialistas, deve-se evitar, ao mximo, o uso de termos tcnicos.
Entretanto, nem sempre isso possvel, e algumas vezes tampouco
aconselhvel. Em vez de explicar o sentido de determinadas palavras
e apresentar certos conceitos em notas de rodap, preferi faz-lo ao
fi nal do texto, sob a forma de um glossrio onde os termos tcnicos
se acham todos reunidos. Sempre que uma palavra aparecer em itlico, precedida pelo smbolo ~, o leitor deve consultar a seo
Termos tcnicos explicados. O smbolo s foi utilizado, porm,
quando da primeira apario da mesma palavra no texto.
A bibliografia no foi citada, no corpo do texto, dentro dos
padres acadmicos convencionais, para tornar a leitura mais escorreita e menos pesada. Q uando algum nome de autor for mencionado,
porm, o leitor ir, normalmente, encontr-lo tambm ao fi nal do
li vro, na seo Bibliografia comentada. evidente que um texto
como o presente, que aborda assuntos bem diversificados a respeito
da dinm ica urbana, dos problemas das cidades e das tentativas de
enfrentamento desses problemas, toca em temas que vm sendo estudados h geraes. Por outro lado, este livro no um tratado, mas
sim uma obra de divulgao. Por essa razo, a bibliografia foi restringida a alguns trabalhos fundamentais, de acesso relativamente fcil
para o leitor interessado. As referncias so quase todas em lngua
O presente livro deriva de uma significativa experincia de pesquisa do autor no campo dos estudos urbanos. E, no entanto, diferentemente dos meus livros anteriores, no foi algum projeto em particular, ou um conjunto de projetos, que forneceu a inspirao e o contexto mais imediato para a feitura do trabalho. Complementarmente
quilo que escrevi pginas atrs, posso dizer que a inspirao foram
as minhas muitas tentativas de explicar, para leigos e para estudantes
de graduao (os quais, ao menos quando se encontram nos perodos
iniciais, muitas vezes no apresentam uma bagagem de conhecimento especfico significativamente superior de muitos leigos), conceitos, teorias, processos empricos e instrumentos de planejamento.
Traduzir em linguagem clara todo um acervo acumulado de conhecimentos, sobre a base de minhas prprias pesquisas ou das de colegas
prximos ou distantes, de modo a informar um grande pblico, foi o
desafio que motivou a empreitada que se corporificou no livro que o
leitor tem diante si. Por isso, vou dispensar os agradecimentos de
praxe a agncias de fomento, assistentes de pesquisa etc. O grande
agradecimento vai, isso sim, para as involuntrias "cobaias" preferenciais de sempre: meus alunos da Universidade Federal do R io de
Janeiro, notadamente os de graduao. Uma "provadora" muito especial foi a economista-mais-que-economista (felizmente!) Claudia Bisaggio Soares, que, lendo a primeira verso do manuscrito, me ajudou, com seus olhos de "semileiga", a aperfeioar o estilo e, mais que
isso, a aprimorar certas argumentaes; a ela o meu muito obrigado.
Afora isso, a lembrana de algumas conversas que mantive com cole-
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INTRODUO
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Definir uma coisa que nada tem de muito simples, pois exige
um razovel, s vezes at mesmo um elevado (dependendo da complexidade daquilo que se deve definir) poder de abstrao. "Abstra\'tto" e "abstrato" no so termos pejorativos, ao contrrio do que
mui tos pensam. Raciocinar abstratamente significa buscar coisas em
rnmum, ou regularidades, entre coisas diferentes. Essas "coisas"
podem ser objetos, podem ser comportamentos, podem ser processos
l11s16ricos ... Por exemplo: se eu falo "co", estou lidando com um
11fvcl de abstrao maior do que quando falo "pastor alemo", e
11111ito maior ainda do que quando falo do "meu co Rex, que um
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uma coisa que nica (pois aquele co c hamado Rex, que o meu,
mente, se referem a fenmenos bastante ou at mesmo extremamente gerais, ou mesmo universais, como se d, em especial, nas cincias
sito de algo que sej a nico. Nas cincias, mesmo nas sociais, a pesq uisa de relaes parte essencial do trabalho, e as comparaes,
ser e nte ndi dos luz do que geral (o que no significa, absolutamen-
de nem todo " local de me rcado" ser uma cidade (basta pensar, como
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__
ncordo com a quant idade de bens e servios que ela oferta, e que
em comum, para encontrar uma definio que d conta dessa ime nsa
tt1 mo
p1tu", como ocorre com a cidade, onde a rea central de negcios (em
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lendo um aspecto ''rural", s vezes at belamente buclico ,il p111uas plantaes, muito verde, grandes espaos servindo de pasta-
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111ificados por meio da meno apenas a um dos municpios que compl)cm a aglomerao e m questo.
Se uma das cidades que formam uma aglomerao urbana cres l' e se destacar demais, apresentando-se como uma cidade grande e
rnm uma rea de influncia econmica, pelo menos, regional, ento
11n se est mais diante de uma simples aglomerao, mas de uma
11111rpole. Uma metrpole , tambm, por conseguinte, um "minis~1~1ema urbano" em escala local, polarizado, esse sistema, por uma
I Idade principal, que abriga o ncleo metropolitano (esse conceito
w 1~ explicado no C ap. 4). Conurbaes so freqentes, mas no so
1~11 itamente necessrias, da mesma maneira como no so impres< 111dfveis no caso das aglomeraes submetropolitanas: ncleos urbanos isolados podem e costu ma m faze r parte d as metrpo les . O
1111portante q ue todos os espaos urbanos se achem fortemente
I rn,iurados", especialmente com a ajuda da "linha" mais importante,
,111> l'SSe aspecto, que so os deslocamentos d irios de trabalhadores,
j'l ,111dc parte dos quais trabalha no ncleo metropolitano e reside nas
11l.1dcs vizinhas a este. Metrpo les so realidades scio-espaciais
q1w, na maioria dos pases, passam a ter sua existncia formalmente
1, 1 1111hccida: so chamadas, nos EU A, de reas metropolitanas (ou,
111 ,1 1~ prec isamente, "reas metropolitanas estatsticas padro") e, no
11 111,il , regies metropolitanas. O termo regio, adotado no Brasil,
1111<11', diga-se de passagem, l muito rigoroso, pois uma regio, conl11111w te nde a co ncordar a maioria dos autores, um espao de
d1i111'11Nf\cs normalmente maiores, situado entre a escala nacional (o
1' 11,) ,. 11 escala local (a cidade ou municpio, ou mesmo uma aglome1
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Figura 1
BRASIL: PRINCIPAIS AGLOMERAES E METRPOLES E A
MEGALPOLE SO PAULO-CAMPINAS-SANTOS
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O Megalpole
Metrpole nacional
Metrpole regional
Aglomerao
1 Porto Alegre
2 Curitiba
3
4
5
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Santos
Campinas
So Paulo
Rio de Janeiro
Belo Horizonte
Vitria
Salvador
10 Recife
11 Fortaleza
12 Belm
13 Braslia
1.000km
gestores metropolitanos, os quais no dispunham de verdadei111111nomia financeira o u poltica, te ndo servido, e m decorrncia
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111 vn11~
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111mas umas das outras e muito fortemente articuladas entre si. Megalnpoles mundialmente conhecidas so, para citar alguns exemplos, a
do Yale do Ruhr, na Alemanha; Tkio-Yokohama-Nagoya-OsakaKobc, no Japo; a "Boswash" (Boston-Washington), nos EUA; a
< 'liicago-Detroit-Cleveland-Pittsburgh, igualmente nos EUA; e a
"Sansan" (Santa Brbara-San Diego), tambm nos EUA.
E quanto ao eixo So Paulo-Rio? Formaria ele uma megalpole?
hun Gottmann j havia previsto, no comeo dos anos 70, o desenvolv11ncnto de uma megalpole ao longo desse eixo, e vrios autores
111~1umam referir-se a ele como sendo uma megalpole. Eu no diria
q11l' isso est inteiramente errado, ou que um completo absurdo;
11111\, deve-se admitir que , no mnimo, um caso duvidoso. O que
!lu las as megalpoles anteriormente mencionadas tm em comum ,
p11'l'isarnente, um "costuramento" ao longo de todo o eixo, por meio
,h l'Xcelentes rodovias e, tambm, por transporte de massa: especifiI n111entc, por meio de trens, inclusive trens de alta velocidade, que
I'' 111111cm que uma distncia de duas ou trs centenas de quilmetros
, 111 vencida em relativamente pouco tempo (duas horas, no mxi11111) Nos casos europeu e japons isso particularmente verdadeiro.
1 ~11 fnlta ao eixo Rio-So Paulo, exatamente porque falta a facilita~111 1dos fluxos de passageiros por intermdio de uma articulao fer111v1111'i u com base em trens modernos e de grande velocidade. A
111111ll' area , pelo custo do transporte, muito seletiva, notadamente
11111111 pas como o Brasil. Quanto ao transporte rodovirio (carros e
11111h11s), alm de ele no garantir com a mesma facilidade um "costu, 111w1110" macio entre espaos situados a grandes distncias um do
11111111, h que se levarem conta que a eficincia da ligao rodoviria
11111 R,o e So Paulo no a mesma de uma grande via expressa
111 ,, h umcricana ou europia. Com efeito, a barreira para movimen" 1 11111dulares para alm de cada uma das metrpoles que polarizam
" 1 11 Rio-So Paulo evidente. bem verdade que h movimentos
I" 11d11 l11rcs que extravasam os limites formais das regies metropoli111111~. l'Specialmente no mbito das tendncias recentes de "fuga da
1111 l111pnlll", em que pessoas buscam uma melhor qualidade de vida
" , ,1 l1
11,111rnm-se mais e mais do ncleo metropolitano e de sua perifed , p11l1n, embora mantendo a possibilidade de uma interao diria
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Figura 2
DO CENTRO ISOLADO A MEGALPOLE: MODELOS GRFICOS
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2
~:;:!:':PJ
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~
4
5
1 Centro isolado
5 Megalpole
(A~ seta~ indicam movimento pendular dirio
res1dnc1a---.local de trabalho---.residncia)
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111
lgico, mas uma complementao do contedo do anteOs fenmenos sociais so "densos de histria" e s so comi'" 1 11, rvcis luz da hist ria; alm disso, como se transformam, em
11.,11de parte, muito velozmente, a perspectiva histrica atenta
11111
' 111
1111 111,
,.ti para que se verifique se, ao falar de um determinado fen1k\;adas ou sculos depois, est se falando, ainda, do mesmo
1, 11,, 11w 110, ou, quem sabe, de duas coisas que, no fundo, so bem dis-
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local. A R evoluo Urbana foi situada por C hilde no terceiro mil nio
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se produzirem mais al imentos do que o q ue seria necessrio para alimentar os produto res d iretos.
llll'lllO da opresso dos produtores diretos. Os imprios da Antipll idade foram, alm disso, disseminadores de cidades, como observ, 111 G ideon Sjoberg (ver a coletnea Cidades - a urbanizao da
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3. Da cidade individual
rede urbana
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/\ exposio girou, at agora, em torno de cada cidade, indivi11i11ilmcnte considerada - sua economia, sua influncia, a gnese das
11111111:iras cidades ... No mximo, foram mencionadas essas articulai, 1)1, muito densas de cidades (a ponto de, em certo sentido, existirem
I p1,1w que como uma nica cidade) que so as metrpoles e as megal111111lcs, que se estendem, respectivamente, em escala local ("local
1111pliada", pode-se dizer) e sub-regional ou regional. Ocorre, porm,
q111 1x istem, no mundo todo, muitas dezenas de milhares de cidades,
, , 111 alguns pases muito grandes, como o Brasil, milhares de cidatl1 , Mesmo no interior de um nico pas, claro que nem todas elas
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De pequenos centros quase sem centralidade, que somente intlu' m1a111 o territrio do municpio (ou seja l o nome que, dependendo
d11 pas, tiver a unidade poltico-administrativa local) onde se encon11.1 111 c para o qual servem de sede, at grandes metrpoles, ao longo
il11 1cde urbana se d istribuem ncleos urbanos com tamanhos e cen1111l1tlades muito variadas. Dois papis so desempenhados por esses
11111lcos; para usar as felizes expresses de Armstrong e McGee (ver
lllhliografia comentada), os papis de teatros de acumulao e de
, ,111ros de difuso.
Na qualidade de teatros de acumulao, as cidades exercem v-
11,1~ funes eco nmicas. Para comear, a funo de extrao e cap1,1r,10 do excedente alim entar. O excedente alimentar extrado do
pas esto, direta ou indi retamente, ligadas s cidades de outros pases. Os bens que so consumidos, ou as informaes trocadas entre
empresas, o dinheiro enviado por emi grantes e os lucros remetidos
por fil iais de empresas multinacionais - tudo isso, e muito mais , mostra como, mesmo na escala internacional, as cidades esto articuladas
entre si. econmica, cultural e at politicamente. Em ltima anlise,
a rede urbana um fenmeno que pode e deve ser examinado em
diferentes escalas: pode fazer mu itssimo sentido em se falar de uma
rede urbana regional, especialmente em uma regio com uma forte
coerncia de identidade scio-espacial e de fluxos internos; contudo,
e la ser, ao me smo tempo. um subconjunto de uma rede urbana
maior, nacio nal, a qual, por sua vez, estar menos ou mais fortemente articul ada no interior de uma rede urbana g lobal.
1111 111s, mas sim atacadistas baseados em pequenas cidades que reco1111111 os produtos do campo e os repassam para serem distribudos
11111
11\ kvam para serem beneficiados e p rocessados. Os atacadistas assu1111111, com isso, o papel de intermedirios no processo de distribuio
, , 11111ercializao; sq os popularme nte chamados "atravessadores".
1 1111 c o campo e a mesa do consumidor final, nas cidades pequenas,
1111dias e grandes da rede, se estabelece toda uma cadeia de distribui~111 1e comercializao em que os agentes, em nmero bem varivel,
111 os comerciantes atacadistas, os transportadores (no caso de no
, 11111 os prprios atacadistas) e, por fim , os comerciantes varejistas.
1,
11111111cm de lucro. Quanto maiores as distncias mas, tambm, quan1, 1 111ais complexa for essa cadeia, mais caro sair o produto para o
11 1M11n idor final, sem que o produtor primrio esteja se beneficiand11 111m isso. Como bem lembra Roberto Lobato Corra, em se u livro
1 , ,,/" 11 rbana ( vide Bibliografia comentada), as grandes redes de
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supermercados vieram introduzir um elemento diferente nesse quadro. Possuindo esquemas prprios de distribuio e desincumbindose tanto do atacado quanto do varejo, elas simplificam a cadeia e eliminam os intermedirios. Os produtores, contudo, como salie nta
Corra, no ganham com isso ; de fato, o que ocorre que essas redes
de supermercados aufere m margens de lucro excepcionais. E em
alguns casos, at parte da produo (fazendas p rprias) e do processamento e embalagem dos produtos se d sob os seus auspcios.
A drenagem da re11dafu11diria, ou renda d a terra, outra funo
das cidades associada ao papel de teatros de acumulao. A renda da
terra o tipo de remunerao obtido pelos proprietrios rurais, via de
regra gra ndes proprietrios, que arrendam suas terras a terceiros.
Muitos proprietrios, particularmente em pases perifricos e semiperifricos, entregam suas propriedades nas mos de capatazes e administradores ou as arrendam, total ou parcialmt:nle, passando a resid ir,
a maior parte do ano, ou mesmo em carter definitivo, nas cidades.
So proprietrios ausentes quase todo o tempo de suas terras, sendo
c hamados, por isso, de absentestas. Seus rec ursos, que poderiam ser
reinvestidos no prprio campo (modernizando a lavoura e a criao,
mel horando as condiP.s de vida e de trabalho dos empregados etc.),
so, na realidade, em grande parte gastos com o prprio consumo pessoal e familiar (compra de ma nses e de bens de consumo diversos,
gastos com viagens), e, em grande parte, empregados em investimentos na prpria cidade (terras urbanas, para serem mantidas, especulativamente, como reserva de valor; apartame ntos e outros imveis para
serem alugados; investimentos no mercado fi nanceiro).
Por ltimo, mas no com menos importncia, assoma a funo
das cidades, ainda enquanto teatros de acumulao, como locais onde
se d a acumulao propriamente d e capital. Essa acumu lao de
capital se fundame nta, em princpio, na indstria de transformao, e,
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ITTllITl
rnJ
ol, , lnnto bens de consumo (ou seja, bens que sero consumidos d ire-
t,111111111c: roupas, alimentos, brinquedos, eletrodomsticos etc.) quan111 lll11s de produo (que so aq ueles bens que servem para produzir
111 11 1os bens, como mquinas industriais). J as idias podem ser as
1 1111 chamadas "inovaes" tecnolgicas (as quais, nos pases do
l 11c1,;i ro Mundo", freq entemente no passam de pacotes de tecno1111'111 j ultrapassada, comprados dos pases centrais) mas, tambm,
111111 l11s e d iretrizes e informaes das sedes de grandes empresas para
1 ~1111s fi liais e plantas industriais, alm de informaes e dados refe1, IIIL'~ u ll uxos financeiros, no interior da rede bancria.
Por ludo isso e com tudo isso, nota-se, muito faci lmente, que o
1111po se acha submetido cidade, do ponto de vista econmico, e
11,111 ~< do ponto de vista econmico - muito embora, em um pas
t 1 1111)pcrifrico como o Brasi l, e principalmente em suas regies
111111, pobres e tradicionais, a vida poltica local e regional seja muito
il11, t.1mcnte infl uenciada ou at determinada por proprietrios fundi 11 1ns (geralmente absentestas), chegando a sua infl uncia at a
, ., 11 1.i nacional.
Nilo foi sempre que a cidade .exerceu esse papel to e cada vez
111.11~dom inante. Na Europa medieval, durante a vigncia do ~ modo
,/, ,,,,,duo feudal, o campo era largamente auto-suficiente em
11111111la de produo de bens os mais diversos: de roupas simples a
11111,1111cntos, selas, ferrad uras e arados, grande parte dos bens de con111110 e produo era man ufaturada nas dependncias ou em anexos
,1111 ,1~1clo senhorial ou pe los prprios servos da gleba. Q uanto a ali1111 111os. e nto, obviamente, nem se fala: prod utos que o moderno
, 1
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lill.ITTl
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Havia, nos burgos e nas c idades, mercados, permanentes e te mporrios (as feiras), onde produtos fabricados por artesos da prpria
c idade ou oriundos de outros centros, s vezes de pases distantes e
longnquas terras, eram comercializados. Isso no era, porm, sufi-
l(llll
paralelo com essa situao pode ser enco ntrado nos grandes enge-
1111
11111111 da rede urbana nacional; no entanto, centros de nvel hierro ainda mais elevado, situados fora das fronteiras do pas, dos
11\
1 ,
econmico.
Karl Marx e seu colaborador, Friedrich Engels (ver Bil;>liografia
111 llli11l1 de Economia da UNICAMP (vide referncia na Bibliogra11,1 1 umcntada [IPENIBGE/NESUR, 1999)), c uja qualidade, po-
1 111 p11rcce ser inferior da verso dos anos 80. Apesar de possuir
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, 11111
I li
111 ,1 , 111ctodolgicas. Em decorrncia disso, o resultado dessa radio111111 d11 rede urbana brasileira foram, s vezes, posies bastante
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lill.ITTl
illJ
lidade, portanto, de natureza, acima de tudo, econmica. Uma cidad1 ,cr tanto mais complexa e possuir uma posio tanto mais elev11du na hierarquia da rede urbana, quanto mais ela possuir essa capa' 1d11dc de ofertar bens e servios e capturar uma rea de influncia
1111111,r. No entanto, primeira vista, dois tipos de situao parecem
I" 111irbar essa presuno de correspondncia entre complexidade do
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11110 urbano, centralidade e posio hierrquica na rede urbana.
A primeira situao refere-se quelas cidades que, por serem
1
1p1111is nacionais, possuem uma rea de influncia nacional, mesmo
111 w 1cm metrpoles nacionais. , justamente, o que ocorre com
li, 1 ,Ilia. Quando observamos o panorama internacional, constatamos
1 11111110 comum a cidade-capital ser, ao mesmo tempo, a grande
111, 1, 11polc nacional - Londres, Paris, Tquio ... - ou, at mesmo, uma
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filll
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\CZ de terra
que abrigam plantas industriais onde se d a produo de bens sofisticados, distribudos nacionalmente ou at exportados para outros
,idades menos proble mticas, mas que apresentam boa infra-es trutura
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,1
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ITT1.Im
llli
pl11, para tratamento mdico), s vezes s ituado at mesmo no exte11111, queimando muitas etapas. Em contraste com isso, h aqueles
111111os, to numerosos, que, devido sua pobreza, ao no encontra111l'm sua cidade o bem ou o servio de que necessitam, simples-
i,
1i , 1.
1 , 1111
1 111
prios pases.
Por fim, registre-se que a situao em que uma pessoa, para
adquirir bens e servios no encontrados em sua cidade, d_irige:s~,
primeiramente, para o centro de hierarquia mais elevada mais prox1mo dela, e apenas no existindo a o que procura dirige-se a um centro ainda maior, largamente terica. Dificilmente pessoas que
morem em cidades de baixa posio na hierarquia da rede e que estej am situadas no entorno de um centro importante ou mesmo de.um
ncleo metropolitano pensaro em "galgar os degraus" paulatinamente, preferindo, como de se esperar, ir di retamente ao centro
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rmJ.m
rn.J
especialmente uma grande cidade, uma entidade scio1111complexa. E, no entanto, a cidade foi examinada, at agora,
111 Nt' levar em conta, com detalhes, como ela se apresenta estrutu 11 111 /11tl'fnamente. chegada a hora de nos debruarmos sobre aqui!,, q111 NC chama de a organizao interna da cidade, a qual a chave
I' 11 11 1 hegarmos aos processos sociais que animam o ncleo urbano e
1111 , ~1,lo envolvidos na dinmica da produo do espao, e que , ao
111, 11H1 lcmpo, uma chave privilegiada para observarmos e decifrar111t 1 11 N1111 complexidade enquanto produto social.
lol ,1d1,
11111
63
lill..ITTl
IJlJ
v aumentarem as distncias, e a combinao de densidade demogrfica, distncia em relao ao centro e renda da populao faz aparecerem importantes subcentros de comrcio e servios, o que evita
que os moradores dos diferentes bairros precisem, necessariamente,
se deslocar para o CBD sempre que precisarem adquirir um bem
mais sofi sticado que po, leite ou jornais. claro que, entretanto,
esse quadro varia muito de acordo com o porte da cidade: uma cidade peq uena, s vezes at uma cidade mdia, pode no ter conhecido,
dependendo do seu contexto econmico-social regional e nacional (e,
portanto, dependendo da renda de sua populao, tanto no que concerne ao seu nvel quanto no que diz respeito sua distribuio), o
desenvolvimento de verdadeiros subcentros, estando o comrcio
limitado a um CBD medocre e, afora isso, apenas a um comrcio de
bairro ou pouco mais que isso.
Em muitas circunstncias, os subcentros no s florescem mas,
gradualmente, vo "roubando a cena" do prprio CBD. um fenmeno comum nos ncleos metropolitanos brasileiros uma perda de
prestgio, ou mesmo uma visvel decadncia do CBD; o comrcio
mais chiq ue e os servios mais refinados, que antes l se encontravam concentrados, tendem a deix-lo em troca de outros locais, buscando uma maior proximidade com os consumidores de alto poder
aquisitivo. Esse fenmeno, que j vinha se notando, no Brasil, h
algumas dcadas (o caso do R io de Janeiro exemplar, com o subcentro de Copacabana, que data dos anos 60), foi intensificado q uando, a partir da dcada de 80, se estabelece solidamente e comea a
proliferar um outro smbolo da descentralizao das atividades tercirias, o shopping center. Diferentemente dos subcentros tradicionais, o shopping center no "aberto", mas , isso sim, um espao
(normalmente, um grande prdio) nitidamente separado do ambiente
externo e onde a preocupao com a segurana uma constante .
Alis, em grande parte devido ao crescente clima de insegurana reinante nas grandes cidades, no Brasil assim como em o utros pases, o
shopping center vem desbancando os subcentros tradicio nais, os
quais, algumas vezes, entram cm visvel declnio, da mesma maneira
como o prprio CBD.
64
65
ffij
lill1m
rnJ
reas pobres . Seja com o ~or, em alguns outros pases, o fator tnico
que aca ba sendo o principal de modo muito
. e 1aro.
Em termos mui to
.
denciais de uma cidadege;.1;, essa d1!erenciao entre as reas resi.
.
- i erenc1aao, em ltima an lise e
,
na de condies de qualidade de vid . 1 .
,
' m mate.
a, me um do a1 tanto aspectos
. t .. .
~;ae~\~~::::o ~o::~:eimateriais co~o prestgio e poder - reflete
.
grupos soc1a1s. Em outras palavras difere .
as econom1cas
sociais
n
fl
' de poder, d e status etc. entre diversos grupos
se
d re. . etem no espao, determinando ou, pelo menos .mfluenciando
~c1s1 vamente onde os membros de cada grupo pode'm vi ver
, .
_
. .
em uma sociedade capitalista moderna so
unao, pnme1ramente, da classe social do ind 'd
,
ver com a
ivi uo, a qual tem a
, pos1ao que ele ocupa no mundo da produo. lgico
que, al:m das grandes c lasses em sen tido estrito (sob retud
. o dos
e mpresanos o u capitalistas, isto , os proprietrios de
od ---, meios e
,
uao,
e
os
trabalhadores
assalariados
q
t.
d
ue em e vender a sua
Pf
ora
para sobreviver alm d e outras classes como os
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. trabalho
.
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independentes) subd ..
- . d essas classes
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, o, na1s
.
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as
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,
.
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.' ~ - uito ones, as vezes intransponveis, e que se refletem nas
pa1aoes dos grupos assim definidos no espao da cidad p
w por e
e. ense. .
xemp_Io, nos guetos de j udeus na Europa, durante sculos -
\l
lada descende de escravos africanos; isso mostra, muito elonqentemente, a fora de inrcia de uma 'liberdade" formalmente conquistada h mais de um sculo, mas que no veio acompanhada de condies reais de acesso qualificao profissional, educao e moradia digna, do que resultou uma reproduo, gerao aps gerao, de
um quadro geral de pobreza e estigmatizao. No Norte do pas, alm
da presena dos afrodescendentes, os descendentes de um outro
grupo oprimido, os indgenas (descendentes esses denominados de
"caboclos"), representam parcela considervel dos moradores d<=
66
!IT.P
lJ1_
s)l'.:c ulo XVI, nica rea na qual era permitido aos jude us resid'i~
111 , pe nse-se ' t1mbm
'
, nas c1d ades sul -africanas da
. d
\1111rtheid,
- possua li vre mobilidad
poca o
.
.onde a po puiaao negra nao
111,1
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Plll'1
' e
, a l e vivia confinada em reas pobres eorno a. f amosa rea pob
Sowcto,
nos
arredores
de
Johi
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.
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1111 111do~
. .
'nnes u1go; pense-se, por fim, nos
67
ITTlffil
[J1J
grupos que, devido sua pobreza, sua etnia ou a outro fator eram
desde a Antigidade. O moderno capitalismo, inicialme nte na Europa, depois em outras partes do mundo, ir, todavia, acarretar uma
1,10
11
11 de certos a_mbientes, OK; o que no correto expressar-se gene," ,1111cnte, pois corre-se o risco de esquecer que a maioria dos pobres
1
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11 l11 ns
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68
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ijjlj)]]
L1i!
70
liiLITT1
rn.J
condies de vida. Nem mesmo traficantes de drogas de varejo baseados em favelas deixam, em ltima instncia, de estar vinculados a
"escolhem" viver aqui e no ali, sendo foradas a isso. Mesmo quando, no decorrer de geraes, se percebe que os membros de determi-
dies econmicas para isso, tal fato no deve ser confundido com
de mais alto status. Esse um problema ainda muito forte nos EUA,
apesar do notvel progresso da populao negra norte-americana nas
a acreditarem que no nosso pas no h racismo, e que a nica questo relevante a ser enfrentada, em matria de (in)justia social, a da
pobreza.
Diferente mente, no caso da auto-segregao so as pessoas que
pelas quais se constri um modelo podem ser, pelo menos, duas: uma
e deixando de lado, ao menos e m um primeiro momento, traos
vinculada busca por segurana por parte das elites, embora esse no
71
imlm
IJ.iJ
reas res idenciais, aos suburbs (os quais, diferentemente dos "subr-
Insp irados na realidade americana, esses modelos, independenteme nte de seus vieses ideolgicos explicativos, no davam conta,
adequadamente, nem sequer em termos descritivos, da realidade
espacial de outras realidades q ue no a norte-americana. Com o
Figura 4
MODELO DE ORGANIZAO INTERNA
DA CIDADE OE E. BURGESS
72
ITTlffil
UlJ
73
mfil
UlJ
ficao induz a equvocos, contraproducente um modelo ser sobrecarregado com detalhes, o que o torna pesado e antididtico at para
profissionais da rea.
Figura 4
MODELO DE ORGANIZAO INTERNA
DA CIDADE DE E. BURGESS
72
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73
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Figura 5
MODELOS DE ORGANIZAO INTERNA DA C IDADE DE
H. HOYT (1) E C. HARRIS E E. ULLMAN (2)
C!J
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00
74
..
00
Suburb residencial
(status mdio/alto)
Suburb industrial
Subcentro de
comrcio e servios
75
ITTl.ITTl
IJ1J
Figura 6
mais densa, sem muita margem de manobra para especulao imobiliria horizontal em larga escala, e onde no h grande carncia de
infra-estrutura tcnica, ainda que a sua qualidade varie conforme o
status do bairro (as excees so, sem dvida, as favelas, que, no
caso do Rio, se encontram, em grande parte, encravadas no prprio
ncleo); a periferia, que aquele espao dominado, tipicamente (mas
no exclusivamente!) por~ loteamentos irregulares e grandes glebas mantidas ociosas ou subutilizadas, refletindo uma espec ulao
fundiria em grande escala; o espao de atrao da auto-segregao,
lllllll
1
2
3
4
76
rnilITl
I.IlJ
4
12km
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tas vezes (mas nem sempre, pois cada situao concreta possui suas
peculiaridades!), vis lumbrar analogias com processos semelhantes
77
lm.ITTl
[llJ
pelo tecido urbano. Mais um salto e, em meados dos anos 40, est&-se
diante de um quadro mais complexo no que se refere segregao
residencial: j se distingue com muita clareza uma periferia, onde
proliferam os loteamentos irregulares, em contraposio ao ncleo,
onde ainda se concentram as favelas que continuam a se multiplicar.
Os primeiros conjuntos habitacionais tambm j haviam surgido. No
comeo dos anos 70, o que o esquema mostra o pice do processo
de remoo de favelas, com a transferncia de suas populaes para
conjuntos habitacionais s ituados na periferia ou em subrbios distantes. A existncia de subcentros de comrcio e servios (como Copacabana, Praa Saens Pe iia, Mier e Mad ureira) , ig ualme nte, um
Figura 7
Meados
doa anos 20
Sogunda metade
do llculo XIX
Meados
dos anos 40
Comeo
doa anos 70
Estratos de renda:
Alto+ mdio-alto
O CBD em formao
Predominantemente mdio
O CBD
Baixo
o Subcentro
Predominantemenle baixo
Cortio, casa-<le-cOmodos
Baixo + mdio
Favela
Pouca diferenciao
)(
Favela removida
78
fil!i1
IJlJ
Conjunto habitacional
Transferncia forada
de populao
79
00
Figura 8
5. Problemas urbanos e
conflitos sociais
Estratos de renda:
[Il]
~
Alto+ mdio-alto
CBD
Predominantemente mdio
Subcentro
Conjunto habitacional
Cortio, casa-de-cmodos
Baixo
Baixo+ mdio
Favela
Quais so os "problemas urbanos"? Essa pergunta chega a parecer malfeita, pois o nmero de problemas , aparentemente, infinito,
especialmente em uma grande cidade do "Terceiro Mundo". E, digase (ou pergunte-se) de passagem: existem problemas especificamente urbanos, ou apenas problemas sociais gerais na cidade?
Tome-se o exemplo da violncia urbana. claro que a violncia
tem se manifestado desde sempre tanto na cidade como no campo, e
nas mais diferentes formas possveis: guerras convencionais, guerras
civis, revolues, crimes polticos, crimes passionais, latrocnios (ou
80
00
81
lill.[l11
[l1J
Paulo), nos anos 90, quanto o de Eldorado dos Carajs, que vitimou
IJiJ
82
lill.ITTl
83
00
84
mm
[li
lucros gerados pela atividade, c uja gesto escapa ao seu poder deci-
proble mas ambientais, que iro causar tragdias sociais (como des-
q uanto, sem dvida, a influncia da poderosssima indstria automobilstica e seus interesses. Mesmo o transporte coletivo intra-urbano,
que tem como clientela bsica a populao pobre, se baseia quase que
uma encosta urbana para construir casas de favela sem levar em con-
dades que geram os impactos e, por fim, os que menos tm cond ies
85
ITT1.ITTl
[J
te, mu ito menor! Infelizmente somos, para variar, tambm aqui, mais
pode at soar paradoxal entre ns, j que a imagem que temos dos
acaba, no fundo, sendo ruim para quase todos, at mesmo para a clas-
86
00
mas, para agudizar a problemtica de declnio dos padres de sociabilidade e qual idade de vida experimentados, de forma to dramtica,
massa sobre trilhos, e que o resultado deve ser uma soluo de com-
deveria ser uma regra de ouro entre ns, habitantes de cidades onde a
87
00. .
crime seja visto como desculpvel e algo que, sim, pode compensar, o
que significa que fatores culturais e institucionais desempenham um
papel crucial. certo, alm disso, que no so somente certos tipos de
reao protagonizados pelos pobres urbanos que colaboram antes para
piorar a situao do que para resolv-la: a auto-segregao, por exemplo, no passa de uma pseudo-soluo escapista.
As tenses se vo avolumando medida que os problemas so-
e cada vez mais vai se assemelhando a uma coleo de compartimentos quase estanques j ustapostos. Favelas e outros espaos residenciais segregados vo, como no Rio de Janeiro (e, em grau um pouco
menor, em So Paulo, e em grau muito menor em vrias outras cidades bras ileiras), sendo control ados (ou, como se diz tecnicamente,
"territorializados") por quadrilhas de traficantes de drogas, que intimidam ("lei do sil ncio"), impem regras de uso do espao ("toque
de recolher", proibio de crimes comuns como roubos e estupros) e
punem severamente os que transgridem essas regras. Na o utra ponta
do espectro social, multiplicam-se os condomnios exclusivos, com
88
ITTl..ITTl
[11J
89
ITTl..ITTl
[11J
seus dispositi vos de segurana, funcionando como "bolhas de proteo" que, em uma gerao inteira de adolescentes e jovens, j contri-
tos pela classe mdia como uma alternativa muito mais confortvel e
tos e outras normas de ocupao do espao que consolidam a segregao, atua, tambm, como agente repressor, via de regra na tentati-
cial; ela uma expresso que designa um processo que abrange tanto
90
00
91
ITTl1m
[IlJ
93
imlm
[1lJ
ofertar bens e servios cada vez mais variados, ao ver se multiplicarem subcentros de comrcio e servios e ao apresentar uma centralidade cada vez maior; uma cidade, alis, onde a oferta cultural crescente, com cada vez mais cinemas, teatros, casas de espetculos, galerias de arte etc. A isso se poderia acrescentar toda uma lista de trun-
94
00
95
ffiITT1
UiJ
96
iIBlITJ
r.:ru
97
miffil
[llJ
rio. Considere-se seriamente a existncia de mecanismos econmicos perpetuadores das desigualdades internacionais (hiato tecnolgico crescente entre os pases centrais e aqueles tipicamente perifricos, barreiras protecionistas importao de produtos dos pases
perifricos etc.); leve-se em conta, tambm, a existncia de fatores
geopolticos que igua lmente contri buem para manter o u reforar
essas desigualdades (presses diplomticas, apoio a golpes de Estado
e at ameaa de intervenes militares por parte das potncias hegemnicas, sempre que os seus interesses estratgicos so ou podem vir
a ser feridos em decorrncia de mudanas polticas e econmicas em
algum pas do "Terceiro Mundo"); e leve-se em considerao, por
fim, os li mites ecolgicos a uma expanso planetria dos padres de
consumo dos pases centrais: ao se pr tudo isso na balana, no fica
difcil ver que, com as regras do jogo existentes, um ou outro pas
pode at subir de posio no ra11ki11g internacional (como vem ocorrendo com a Coria do Sul), mas prometer uma reduo muito significativa dos desnveis internacionais vender uma iluso.
Se o desenvolvimento econmico, por si s, insuficiente, ou
pode at mesmo estar sendo conduzido de modo social e ecologicamente inadequado, que tipo de desenvolvimento, ento, interessa ao
indi vduo comum, no pertencente s elites econmicas do planeta?
Falar de desenvol vimento social parece, prime ira vista, razovel,
desde que se explic ite que o adjetivo, aqui, est abrangendo a totalidade social em suas vrias dimenses: economia, poltica (no sentido
amplo de relaes de poder) e cultura. Contudo, falta algo: aquilo que
se pode chamar de a dimenso espacial da sociedade. O espao
social foi, com freqncia, totalmente o u quase totalmente esquecido
pelos tericos do "desenvolvimento", e, mesmo naqueles casos em
que a dimenso espacial foi ou tem sido lembrada e prestigiada, a sua
importncia e o seu alcance tm sido, via de regra, subestimados. E o
que mais decepcionante: tanto por conservadores quanto, at
mesmo, por crticos da ideologia capitalista do desenvolvimento econmico. Isso porque, mesmo naqueles casos em que a dimenso
espacial foi o u bastante valorizada, comumente trata-se de uma
viso muito parcelar da espacialidade: o espao reduzido a uma de
98
mi..ITTl
WJ
suas facetas, como o "espao econmico", que nada mais que a projeo abstrata da dimenso econmica no espao, ignorando os fatores polticos e culturais (caso de certas teorias econmicas do desenvolvime nto regional), ou o espao natural, que o meio ambiente
(caso do antigo "ecodesenvolvimento" dos anos 70, nos anos 80
substitudo pelo rtulo "desenvolvimento sustentvel"). O espao
social, que a natureza transformada pelas relaes sociais, porm,
vai muito alm disso. E h razes de sobra para ele ser levado em
conta adequadamente.
O espao social no um simples "dado" sem maior importncia para a vida social. O espao social , ao mesmo tempo, um produto das relaes sociais, e um condicionador dessas mesmas relaes. A organizao espacial e as formas espaciais refletem o tipo de
sociedade que as produziu, mas a organizao espacial e as formas
espaciais, uma vez produzidas, influenciam os processos sociais subseqentes. Aquilo que, em linguagem mais tcnica, corresponde ao
substrato espacial, ou seja, as formas espaciais concretas, materiais
(um campo de cultivo, o solo urbano etc.), representa tanto um produto da sociedade quanto um condicionador das relaes sociais na
medida em que: a) no qualquer coisa que se pode fazer com qualquer estrutura espacial, e uma estrutura produzida por determinadas
relaes sociais para atender a determinados interesses pode no se
prestar a satisfazer adequadamente outros propsitos; b) a produo
do espao de uma determinada maneira exclui outras possveis alternativas, algumas vezes at em carter permanente, seja devido ao elevadssimo custo (financeiro e, mais amplamente, para a sociedade)
de se reestruturar inteiramente o espao, seja devido destruio,
muitas vezes irreparvel, do patrimnio natural ou histrico-arquitetnico. Mas ... no s o espao em seu sentido material que condiciona as relaes sociais ! Tambm as relaes de poder projetadas no
espao (espao enquanto territrio) e os valores e smbolos culturais
inscritos no espao (espao como espao vivido e sentido, dotado de
significado pelos que nele vivem), tudo isso serve de referncia para
as relaes sociais: barreiras e fronteiras fsicas ou imaginrias; espaos naturais o u construdos que, por razes econmicas, polticas ou
99
ffiJ
socioespacial), mas transformao das relaes sociais e do espao social, simultaneamente. Na minha convico, o desenvolvimento , nos seus termos mais simples, um processo de mudana para
melhor, um processo incessante de busca de mais justia social e
e isso exige, tanto em matria de anlise de problemas quanto de formulao de estratgias para a superao dos problemas, no somente
a considerao das vrias dimenses que compem as relaes
sociais, mas tambm uma viso de como essas relaes se concretizam no espao.
No estou ignorando que, nas ltimas trs dcadas, avolumaramse e radicalizaram-se as crticas ao chamado "mito do desenvolvimento", a ponto de alguns crticos no se restringirem a uma crtica
da ideologia capitalista do desenvolvimento ( econmico), passando,
implcita ou explicitamente, a rejeitar a prpria "idia" de desenvolvimento em si (e, por tabela, at a palavra). Para esses analistas,
como se falar em desenvolvimento, sempre e necessariamente, significasse endossar a ideologia capitalista do desenvolvimento econmico, ou, pelo menos, uma viso da histria como se todas associedades tivessem de percorrer os mesmos "estgios" ao longo de um
processo de "desenvolvimento" predeterminado, viso essa, ainda
por cima, eurocntrica (ou seja, que assume ser o mundo ocidental
um modelo a ser imitado por todas as culturas e todas as sociedades).
S que, insisto eu, no precisa ser assim. A palavra desenvolvimento
suficientemente plstica, sendo capaz de ser moldada, conceitualmente, de forma alternativa sua captura pela ideologia capitalista.
E, se assim, por que falar de "mudana social positiva", ou, mais
precisamente, de "mudana social positiva que , simultaneamente,
IJ1J
100
ITTl]TI]
desenvolvimento scio-espacial na e da cidade: vale dizer, a conquista de melhor qualidade de vida para um nmero crescente de pessoas e de cada vez mais justia social. Se uma cidade produz mais e
mais riqueza, mas as disparidades econmicas no seio de sua populao aumentam; se a riqueza assim produzida e o crescimento da cidade se fazem s custas da destruio de ecossistemas inte iros e do
patrimnio histrico-arquitetnico; se a conta da modernizao vem
sob a forma de nve is cada vez menos tolerveis de poluio, de
estresse, de congestionamentos; se um nmero crescente de pessoas
possui televiso em casa, para assistir a programas e filmes de qualidade duvidosa e que, muitas vezes, servem de inspirao para atos de
violncia urbana, violncia urbana essa que prospera de modo alarmante; se assim, falar de "desenvolvimento" ferir o bom senso.
101
ITTl]TI]
IJ1J
Pode-se, em um tal caso, falar de crescimento urbano, complexificao da cidade e at mesmo modernizao do espao urbano e dos
padres de consumo ; mas seria um equvoco tomar isso por um processo de desenvolvimento urbano autntico, vale dizer, por um processo de desenvolvimento scio-espacial na e da c idade coerente e
ise nto de grandes contradies.
Visto isso, estamos preparados para enfrentarmos juntos o desafio de refletir sobre as maneiras de se pr em marcha rumo a um
desenvolvimento urbano autntico. Ou, parafraseando o ex-jogador
de futebol Dario, o "Dad Maravilha", integrante da seleo tricampe em 1970: depois de anal isar a problemtica, preciso passar
"soluciontica" ... Isso vai ficar, entretanto, para a partir do Cap. 8.
Antes disso vou me deter, no prximo captulo, em algumas falsas
explicaes sobre os problemas urbanos e em algumas falsas receitas
de superao desses problemas, dignas de figurar em uma das memorveis antologias humorsti cas da srie "FEBEAP", quer dizer,
"Festival de Besteira que Assola o Pas", de autoria do saudoso jornalista e escritor Srgio Porto, mais conhecido como "Stanis law
Po nte Preta".
Voltando discusso sobre o tamanho urbano: estou acostu mado a ouvi r, do taxista, do barbeiro e at de estudantes na universidade, que o tamanho maior ou menor de uma cidade explica a intensidade maior ou menor de seus problemas. primeira vista, isso parece fazer muito sentido: afinal, se uma cidade maior, ela possui mais
habitantes, mais automveis, e portanto mais vtimas de assalto em
potencial, mais assaltantes em potencial etc. etc. etc., sendo sensato
esperar que ela seja mais pol uda, mais violenta, mais insegura etc.
etc. etc .. Certo? Errado. Ou, pelo menos: estd longe de ser to simples assim. Se tudo o que parece ser primeira vista se confirmasse
aps um exame mais atento e criterioso, ainda estaramos falando
102
lill.im
[l1J
103
ffiJ
[l1J
Se o tamanho explicasse, por si s, alguma coisa, a regio metropolitana de Londres, com doze milhes e meio de habitantes (a
e nquanto tal, mas sim "n" tipos diferentes de crimes violentos, cada
qual com a sua prpria " lgica": como comparar, por exemplo, o
104
f;JJ11
WJ
qualquer base lgica? Bem, nem tanto ao mar, nem tanto terra.
que o Rio de Janeiro, coisa que no se d. Isso eu pude, pessoalmente, constatar, em 1997, ao caminhar, no ite, pelas ruas de Calcut,
tamente os mais pobres, que muito mais reagem do que agem, pela
105
ITTLITTl
IJlJ
existncia dos problemas. E ncontrar bodes expiatrios , como sempre, mais fcil e mais cmodo do que discernir e enfrentar as causas
mais profundas.
No que se refere po breza como alimentadora da criminalidade
violenta, certo que ela , em certa medida, um fator relevante. Longe
de mim pretender negar isso ! O que se deve, uma vez mais, contextualizar a contribuio explicativa potencial da pobreza e da desig ualdade. Sem a considerao da cultura e das instituies policiais e
judicirias de uma sociedade, fica impossvel proceder a uma anlise
satisfatria e, partir da, tirar concluses que sirvam de fundamento
para recomendaes em matria de estratgias de soluo.
106
muni
111.J
Outras hipersirnplificaes muito comuns, freqentemente realimentadas pela grande imprensa, incluem os famosos "o problema a
falta de planejamento" e "o problema a falta de vontade poltica".
Existem muitas explicaes, dadas por estudiosos o u no mbito do
senso comum, que so, em si mesmas, falsas; j outras no so problemticas por serem totalmente equivocadas, mas sim porque, embora ajudem a explicar urna problemtica complexa, so postas corno
se fosse, cada urna delas, a explicao, a verdade, e no uma parte da
verdade. Por isso so, tecnicamente, falaciosas, ainda que no sejam
inteiramente absurdas. As hipersimplificaes "o problema a falta
de planejamento" e "o problema a falta de vontade poltica" fazem
parte deste rol.
A "falta de planejamento" (ou melhor: falta de densidade, falta
de tradio, despreparo tcnico e dificuldades organizacionais no que
se refere ao planejamento) um problema real. Se eu no acreditasse
nisso no teria publicado um livro de 556 pginas sobre planejamento e gesto urbanos (refiro-me ao li vro de 2002, que aparece na
Bibliografia comentada), sem contar as muitas outras atividades,
entre projetos de pesquisa, preparao de textos, cursos, palestras e
consultorias, que tenho dedicado ao assunto desde muitos anos. A
limitao reside em se achar que mais planejamento e que um planejamento melhor (tecnicamente) seriam como que a chave para abrir a
porta da superao das dificuldades concernentes aos problemas
urbanos. preciso considerar o seguinte: 1) a escassez de planeja-
107
!rnlfl1
111.J
pobres urbanos. Diante disso, parece estar claro que uma frase como
"o problema a falta de planejamento" bastante ingnua. Pre-
illJ
108
fill.l.l1]
109
ITTilIT1
illJ
do planejamento e da gesto das cidades, mesmo que isso seja entendido de forma bem aberta e ampla (ou seja, sem reduzir o planejamento urbano ao Urbanismo e s preocupaes tipicamente urbansticas com a remodelao das formas espaciais, por razes funcionais
e estticas). E, no entanto, por razes prticas, o que eu posso fazer,
aqui, me deter um pouco sobre a escala local e aquilo que possvel fazer dentro dos limites dessa escala, mobilizando os recursos
(econmicos, polticos, intelectuais ...) a disponveis. Algo, porm,
me conforta: a escala local no tudo, mas est longe de ser irrelevante. A estratgia da reforma urbana, apresentada a segui r, exige
que se explore ao mximo a margem de manobra possvel existente
110
111
ml.ITTl
00
ITIJ
nial, com suas ruas apertadas e sua paisagem arcaica); outro, de natureza poltica, ou sociopoltica ("limpar" a rea central dos cortios e
espacial intra-urbana: 1) garantir segurana jurdica para para as populaes residentes em espaos carentes de regularizao fundiria, tais
A Reforma Passos foi autoritria em seus mtodos e conservadora em seus objetivos. A meta era modernizar a cidade, em funo de
imperativos econmicos, polticos e ideolgicos, no torn-la mais
justa. Para fazer isso, sacrifcios foram impostos a proprietrios de
imveis, a negociantes e, acima de tudo, aos moradores pobres, cuja
sorte no interessava muito ao Estado. Autoritria e conservadora, a
Reforma Passos representa, no fundo, o inverso do esprito da reforma urbana, no sentido que passarei, agora, a apresentar. Melhor seria
cham-la de uma reforma urbanstica, socialmente conservadora
ainda por cima.
A reforma urbana, no sentido do presente li vro, no se circunscreve a uma remodelao do espao fsico. Ela uma reforma social
estrutural, com uma muito forte e evidente dimenso espacial, tendo
por objetivo melhorar a qualidade de vida da populao, especialmente de sua parcela mais pobre, e elevar o nvel de justia social.
Enquanto uma simples reforma urbanstica costuma estar atrelada a
um entendimento estreito do que seja o desenvo lvimento urbano,
pode-se dizer que o objetivo geral da reforma urbana, em seu sentido
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mUJil
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00
dam, ah, isso ajudam ... E muito. Sua existncia no uma condio
suficiente, mas , sim, uma condio necessria.
mente, remetem a escalas mais abrangentes que a local, onde as decises de poltica econmica, tributria e trabalhista so tomadas.
O fato de diferir bastante de sua irm mais velha, a reforma agrria, no que diz respe ito sua capacidade de gerar renda, no quer dizer
nal mais a mplo, as brec has que e le oferece e as restries que ele
tos, a real idade) de o local de moradia vir a ser uti lizado como supor-
dio do qual ele aufere sua re nda. J o solo urbano s meio de pro-
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mJl1
rn.J
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de algum modo, inseridos no contexto geral de um programa de reforma urbana (ver, mais adiante, o que diz o Cap. l l sobre "economia
popular"). Tais iniciativas podem, para alm de representarem um alvio imediato para uma populao que sofre com altas taxas de ---1
desemprego aberto e disfarado, conter, em alguns casos, um grande
potencial de gerao de conscincia crtica e desenvolvimento de formas mais solidrias e cooperativas de coexistncia.
Falta ainda, porm, fazer a pergunta: quem pode mudar o qu?
Quem so os protagonistas da reforma urbana? Ser que tudo depende do Estado, do Poder Pblico? Certamente que no. O aparelho de
Estado tem um papel muito importante a cumprir, especialmente em
um pas marcado por crassas disparidades sociais e espaciais como o
Brasil. Seria absurdo imaginar que os mecanismos de mercado, por si
ss, possam corrigir as distores geradas no interior do prprio capitalismo, garantindo, sem interferncia, reduo da inj ustia social e
das agresses contra o meio ambiente. No fundo, o capitalismo um
modo de produo timo para gerar riqueza, mas pssimo para
distribu-la com justia e com ateno para a necessidade de proteo
ambiental ... Tambm seria pouco razovel imaginar que os grupos da
sociedade civil, por si ss, e revelia do Estado, conseguiriam, no
mdio prazo, muita coisa: afinal, certas mudanas podem ser conseguidas (e outras tantas s podem ser conseguidas) com mudanas dos
marcos legais e institucionais. O aparelho de Estado possui competncias regulatrias e normatizadoras que no podem ser ignoradas;
mesmo em um pas onde certas leis "pegam" e outras "no pegam",
conq uistar marcos legais adequados uma tarefa importante a ser
perseguida. Alm disso, certas intervenes precisam, para serem
realizadas, de recursos, cujas captao e mobilizao tornam o auxlio por parte do Estado, ao menos em um primeiro momento, quase
imprescindvel. Isso no significa que, no longo prazo, se deva continuar apostando, indefinidamente, em auxlios estatais. E, como o
longo prazo se constri aqu i e agora, cabe sociedade civil buscar
conquistar e manter espaos autnomos de ao, onde aes e planejamentos alternativos possam florescer - s vezes a despeito do
Estado, nos interstcios do sistema; s vezes contra o Estado, resistin-
11 6
mm
[lli
do; s vezes, em circunstncias favorveis, com o Estado, mas sempre mantendo uma vigilncia crtica.
O Estado, por sua margem de manobra econmica e poltica,
deve ser encarado como uma instncia importante, a ser capturada
pelo campo progressista, de um ponto de vista pragmtico. Por que,
porm, "de um ponto de vista pragmtico"? Porque, em uma sociedade capitalista, marcada pela explorao do trabalho pelo capital, fundada sobre a separao entre trabalhadores e meios de produo, as
desigualdades tendem a ser "estruturais", ou seja, a existncia de
pobres, de populaes segregadas, de desemprego etc. no fortuita
ou ac idental, mas um componente tpico da "lgica" do sistema.
Nesse ambiente, o aparelho de Estado tende a ser no um "j uiz neutro", pairando acima das classes sociais e acima do bem e do mal, mas
uma instncia de poder muito complexa e, ainda que influenciada por
diversos interesses e submetida a muitas presses, inclusive dos setores populares, a tendncia geral a de que o contedo da ao do
Estado seja conforme aos interesses mais amplos das classes dominantes e, sem dvida, da perpetuao do prprio sistema. Por isso, o
Estado possui limitaes intrnsecas enquanto promotor de justia
social, pelo menos em ltima anlise. Pragmaticamente, contudo,
importante conquistar a mquina do Estado para promover, por meio
dela, alguns avanos relevantes. O que no quer dizer que somente
isso tenha importncia, ou que o Estado deva se intrometer demais nos
assuntos da sociedade civil. As organizaes da sociedade civil (de
associaes de moradores a entidades profissionais) precisam estabelecer alianas, cooperar entre si e desenvolver a capacidade de elaborar propostas de ao e polticas pblicas, capazes de servir como ferramentas para pressionar o Estado e baliz:u a ao estatal, e realizar,
autonomamente, aes e projetos. Mesmo em situaes em que o
Estado se apresenta mais democratizado e transparente, mais permevel participao popular, uma certa tenso entre a ao estatal e as
organizaes da sociedade civil dever permanecer (e saudvel que
isso ocorra, pois, sem esse "controle externo", o risco de corrupo e
intransparncia da mquina estatal cresce); necessrio que essas
organizaes defendam e mantenham o mximo de independncia em
relao ao Estado, o qual deve, por sua vez, respeit-la.
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mm
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ml.ITTl
lllJ
1? - O Plano Diretor, aprovado pela Cmara Municipal, obrigatrio para cidades com mais de vinte mil habitantes, o instrumento bsico da poltica de desenvolvimento e de expanso urbana.
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UlJ
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UlJ
no nosso pas, um peso menor que nos EUA para explicar a segregao residencial e as injustias sociais, no autoriza a concluir pela
inexistncia de preconceitos de fundo tnico ou presumir que a agenda da reforma urbana pode, tranqilamente, passar ao largo da questo do racismo.
9. Os instrumentos da
reforma urbana
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ITT1lni
IJ1J
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ITT1lni
IJ1J
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00
,,km da regulamentao por lei federal, tambm uma lei munici pal (a
I ida
uma notificao de que deve dar um desti no sua propriedade, partclando o u edificando; se ele nada fizer, poder-se-, ento, ultrapas-
a dar a este um destino que atenda, minimamente que seja, ao princpio consti tucional da " funo social da propriedade", e a d esapro-
Constit uio brasi leira s veio a ocorrer e m 200 l : 0 Art. 182 foi
regulamentado por meio do Estatuto da Cidade (Lei n? 10.257, de
tuto da Cidade.
tempo pelo Estado, com finalidades diversas, sem pre ditas de " utili-
especi ficar que " facultado ao Poder Pblico mun icipal, media nte
lei especfica para rea includa no plano diretor, exigir, nos te rmos
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ITTI.Ifll
rnJ
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ITTL[ITJ
illJ
privi legiada da populao, acarretam uma sobrecarga nada desprezvel sobre a infra-estrutura instalada, a qu al foi paga pelo conjunto dos
contribuintes. bem verdade que o IPTU j deve trazer embutidas,
em si, vrias das caractersticas do imvel que determinam o seu valor
de mercado, referentes ao seu tamanho, sua localizao etc.; isto no
necessidades bsicas. O Decreto-Lei n~ 195, de 24/02/1967, ao arrolar as obras passveis de j ustificarem o lanamento do tributo, inclui
coisas como a pavimentao, a ilumi nao, a arborizao e mesmo os
esgotos pluviais e outros mel horamentos bsicos de logradouros
pblicos, o que me parece inaceitvel. O tributo da contribuio de
melhoria interessante, pelo seu potencial de progressividade; ou
seja, de recapturar para os cofres pblicos pelo menos parte da valorizao imobiliria decorrente de intervenes do Estado. Porm, se
no se restringir a sua aplicao a bairros privilegiados e a certos
tipos de obras, corre-se o srio risco de introduzir um tributo regressivo, causador mais de novos problemas que de solues. A contribuio de melhoria um tributo muito antigo, previsto na legislao
brasileira desde os anos 30; entretanto, raramente foi utilizado. As
razes so menos de ordem propriamente tcnica (como dificuldades
de clculo) que de ordem gerencial (pois h a necessidade de se ter
um acompanhamento adequado do mercado imobilirio) e poltica.
Ainda um outro instrumento digno de meno a outorga onerosa do direito de construir, mais conhecida pelo seu apelido: "solo
criado". A expresso "solo criado" vem do fato de que, ao se construir um prdio, cada pavimento ou piso para alm do trreo correspo nde a uma espcie de solo artificial; como se se "criasse solo",
portanto. O solo criado corresponde a uma espcie de tributo ou contraprestao que o incorporador imobilirio paga municipalidade.
A lgica a seguinte: prdios altos, via de regra construdos para
atender s necessidades residenciais ou de negcios de uma camada
' de construir. O primeiro , em uma sociedade capitalista, inviolvel; isso no significa, porm, que ele no possa ser, mesmo em uma
1al sociedade, limitado por razes de interesse coletivo, por exemplo
reg ulando-se e restringindo-se o segundo. (A propsito: o parcela!llento e a edificao compulsrios, o IPTU progressivo e a desapropriao com fins punitivos correspondem a um outro tipo de limitao do d ireito de propriedade: a restrio do "direito de nada fazer"
~om um imvel urbano ou de deix-lo subutilizado.) O solo criado
lcm sido objeto de diferentes controvrsias, como aquela em torno da
~ua natureza de tributo em sentido estrito ou no. , tambm, um inslrumento complexo, interessante e multifacetado, cuja aplicao, se
hem gue no seja simples e exija cuidados, pode valer a pena.
.
A reduo do nvel de disparidade socioeconmico-espac1al
lntra--urbana no um objetivo simples (como, alis, o combate
1~pec-ul.a o imobiliria tampouco o ). Para alcan-lo, instrumentos
1omo
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fmll1l
[fiJ
grandes distncias), e essa expanso desordenada foi, com freq ncia, um subproduto de zoneamentos de uso do solo inadequados, que
respaldam os interesses especulativos. Aquela rigidez e o incentivo
"cidade espraiada" so incompatveis com o espri to da reforma
buscando uma cidade compacta mas no superadensada, pode-se lanar mo de instrumentos que visem a limitar a atividade construtiva
mu lher) possui u, "como sua, rea urbana de at duzentos e cinqenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposi-
vidual ou coleti vo, isto , se dar sob a forma de um ato que beneficia,
00
do regul arizao da propriedade da terra e investimentos em infraestrutura; podem ser, tambm, reas de preservao ambiental. O ass unto dos zoneamentos exige, contudo, um pouco mais de detalhe.
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00
II
11overnantes.
O leitor talvez esteja se perguntando: mas, de que valem tantos
Instrumentos e mecanismos, mesmo que amparados em lei, se esta111os em um pas onde, como se diz, h algumas leis que "pegam" e
outras que " no pegam"? De que valem leis se as leis no so respei111das? Essa uma questo muito importante. Antes de mais nada,
preciso deixar claro que, independentemente de q ualquer coisa,
muito melhor existir uma lei, e uma boa lei, que lei alguma. Se a lei
i;xiste, ela pode ser at desrespeitada, mas ela est l, pelo menos
omo uma arma em potencial, para ser usada pela populao para
defender seus direitos. Entretanto, claro que isso no basta. E para
que leis "peguem" e instrumentos sejam implementados, muito
importante que a sociedade civil esteja informada e se mobilize para
exigir e fiscalizar o cumprimento da lei. Vou retornar a esse assunto
dos obstculos para a implementao da reforma urbana no prximo
aptulo, mas fundamental ressaltar, j aqui, que a partic ipao
popular no planejamento, que , como se viu, um dos trs pilares
constitutivos da reforma urbana, pode contribuir decisivamente para
a efetiva implementao das leis, j que, estando direta e fortemente
en volvida no processo, a sociedade civil ir colaborar muito mais efi-
130
mWll
rn.J
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00
to urbano, ter princpios, objetivos e uma estratgia; preciso munirse de instrumentos adequados para implementar as propostas". Por
outro lado, no se pode, em absoluto, pensar que basta pr em um
plano diretor uma boa quantidade de instrumentos "progressistas"
para que se logre avanar muito. Os instrumentos, mesmo aqueles
menos ambguos ou ambivalentes, de pouco ou nada adiantam se no
existirem as condies polticas, sociopolticas e poltico-culturais
para que eles sejam aplicados, e bem aplicados. Com isso se reforam duas coisas: para o analista, a exigncia de nunca descurar a anlise da sociedade em favor de uma supernfase sobre os instrumentos
e os marcos legais; e, para todos, o lembrete de que a democratizao
do planejamento e da gesto, longe de ser apenas um detalhe , o u um
simples ingrediente a mais, o que d sentido e vida a todo o resto.
IPTU
PROGRESSIVO
iw.lm
[fi.j
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ITTl1m
[fiJ
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menso tcnica. Negar isso, e afirmar que " tudo no passa de uma
de, por meio da propaganda, e utilizando-se da mdia, "fazerem a cabea" da opinio pblica e, muitas vezes, dos prprios tcnicos e estudio-
tempo em que o senso comum costuma crer que o grande problema das
mento, mesmo q uando at relativamente tmido em matria de combate especulao imobiliria e ao superadensamento, pode ser noci-
135
imlTil
ITLJ
tenha, antes, de "negociar" com este e obter sua anuncia. No entanto, precisamente quando se trata de pensar em democratizar o planejamento e a gesto, introduzindo esquemas de participao popular, que a fragmentao do tecido sociopoltico-espacial e o utros
impactos do trfico de drogas se mostram poderosos obstculos: que
participao "voluntria" e minimamente " li vre" se pode esperar da
populao de uma favela tutelada por traficantes, os quais, de acordo
com sua convenincia, restringem a liberdade dos moradores ("toque
de recolher" e congneres), instrumentalizam e manipulam lderes
comunitrios e, quando estes no colaboram, os ameaam, expulsam
e mesmo matam? De certo modo, o planejamento urbano precisa ser
pensado, nesses casos, articuladamente com uma poltica de segurana pblica arejada e progressista. No possvel, hoje em dia, falar
de reforma urbana sem fazer referncia explcita, clara e destacada a
esse problema; as condies de hoje no so, tambm sob esse aspec10, as mesmas do comeo dos anos 80.
Como se viu, no so poucos os obstculos para uma reforma
urbana digna desse nome. E, apesar de todas essas barreiras, de todos
1sses empecilhos, lcito, mesmo assim, perguntar: ser a reforma
urbana suficiente? Qual o alcance de uma reforma urbana a ser conduzida no interior da ordem social capitalista, e ainda por cima em
11111 pas semiperifrico?
Existem vrias "escalas de problemas" no que diz respeito aos
p1 oblemas enfrentados pelos moradores das cidades brasileiras.
Alguns so especficos da prpria cidade, ou tm, pelo menos, a ver
1111n particularidades de cada cidade;j outros, se no so exclusivos
,k um estado ou de uma regio, so, pelo menos, influenciados, posillvnmente (amenizados) ou negativamente (agravados) por fatores
11onmicos, polticos e culturais em escala estadual ou regional,
, 111110 a pujana econmica e a conjuntura poltica. Vrios problemas
1111portantes nos remetem escala nacional: so aqueles que, s vezes
lrndo razes multisseculares, e remetendo vez por outra ao prprio
jlil\Sado colonial, se referem s particularidades e margem de ma1111hra econm ica e poltico-institucional do pas, alm de terem a ver,
t 1111hm, com especificidades de ordem cultural. A cada escala se
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iwll1l
ITIJ
00
associa uma certa margem de manobra para o Estado ou a prpria sociedade civil (movimentos sociais, organizaes diversas etc.) tentai
superar problemas; e cada escala "filtra', por assim dizer, as influncias que emanam de outras escalas: por exemplo, circunstncias
muito favorveis em nvel local, estadual ou regional (administraes
eficientes e comprometidas com uma agenda que priorize a justia
social, pujana econmica, sociedade civil bem organizada etc.)
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liil.ITTl
rnJ
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q uc
pcogr fico, mas tambm, eve ntualmente, reunies "setoriai s", por
imlJll
IJ1J
1.:sse conselho que ir con solidar, para todo o muni cpio, as demandas
e.las bases sociais, ve rific ando possve is proble mas (como demandas
Santa Catarina), ainda nos anos 70, e em Pelotas (Rio Grande do Sul)
140
Militar, embora em sua fase final), no chegaram a ter grande alcance, nem ge rar um efeito multiplicador significativo. Elas pertencem,
madamente, o seguinte: primeirame nte, a Prefeitura informa a populao sobre a realidade oramentria prevista para o prximo ano,
mento participat ivo"(ou, e m alguns casos, o equi vale nte disso sob
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imlJll
IJ1J
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ITTL[n]
Ui'
mais rgido) so, ainda que, em alguns casos imperfeitame nte, aten-
urbano foram os mesmos que, desde o comeo dos anos 90, pensaram e pe nsam os oramentos participativos. Apenas recentemente se
uma s vez: a informao circula muito mal, o que faz com que os
muito conhecimen to de causa, podendo ser muito facilmente manipulados; muitos critrios, s vezes todos, so definidos previamente
pelos tcnicos e administradores, em gabinete; o percentual das despesas disponibilizado para a esfera da participao popular peque-
sionais como gegrafos e soci logos, sendo que, nos ltimos anos, os
maior parte das experincias no parece ser, pelo que mostra a m inha
experincia de pesq uisa com o assunto, muito e ntusiasmante. Isso
caso, 0 dos orame ntos participativos, a maioria dos traba lhos tem
sido realizada por soci logos e cientistas polticos, com al guma par-
se obtenha um bom resultado. O xito de uma experincia de oramento participati vo, assim como de qualquer experincia de partici-
143
m
lliJ
da dos pobres urba nos por postos de trabalho, demanda essa impo~-
que se esquece que o interesse de vrios em regulamentarem os orame ntos participativos por meio de leis tem a ver com um desejo de
enfraquecer, e no de fortalecer esse tipo de experincia (por exemplo, no caso de vereadores in teressados e m preservar, como uma
espcie de " reserva de mercado", um percentual dos investime ntos
para ser loteado da ma neira tradicional, na base d e acertos entre eles
e entre eles e o prefeito, mediante emendas proposta oramentria
enviada Cmara). E violncia porque uma das caractersticas essen-
[J1J
144
ITT1J}ll
informal seja, em grande parte, uma vlvula de escape para a ~emansvel de ser completamente satisfeita pelo setor formal em um pais
p erifrico ou semiperifrico, ele abarca, tambm, atividades que possuem um impacto ambguo sobre a vida dos pobres urba_n~~ moradocomo o comrcio de drogas ihc1tas), alm
res d e espaos segregados (
.
de se fazerem em associao espria com parcelas da econom'.a formal e mesmo do aparelho de Estado (financiamento do tr'.1co de
drooas de fora para dentro das favelas, lavagem de dinheiro SUJO, cor,1 . 1 t ) Quanto ao chamado "terceiro setor" , trata-se, ai,
rupao po 1cia e e ..
de uma expresso de inspirao norte-americana, que recobre u~
conjunto de atividades teoricamente sem fins lucrativ?s, mas de ut'.-
za consiste, j ustamente, na possibilidade de a sociedade civil instituir, e la prpria. as regras (ou seja, a " lei" em um sentido amplo),
modificando -as anualmente, se necessrio, para aprimo r-las; uma
vidades levadas a cabo pelos pobres urbanos, com ou sem algum tipo
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00
de apoio estatal, no contexto de algum tipo de organizao estimuladora de solidariedade e, quem sabe, de novas for mas de sociabilidade (cooperativas e outras modalidades de associao de trabalhadores). H, portanto, um ingrediente de juzo de valor, alm de algumas
diferenas factuais, que distinguem a economia popular da economia
informa l: a economia popular gerida pelos prprios pobres, embora estes possam (e, em algumas circunstncias ou em alguns casos,
devam) contar com o apoio do Estado e de organizaes da socieda-
tador de valores ou criador em potencial de novas formas de sociabilidade; ele seria algo puramente reativo. Sua conceituao se dava,
basicamente, em funo do que lhe falta (acesso a crdito formal,
fatias da economia informal); alm disso, as organizaes de economia popular envolvem, ou deveriam envolver, uma certa preocupao explcita com a construo de novas formas de relacionamernto
solidria (a qual tem se tornado comum no Bras il), em vez de, simplesmente, economia popular. Uma vez que esta ltima expresso
de um pouco limitada.
J se vi u, no Cap. 8, que o fato de a reforma urbana diferir da reforma aorria no que se refere sua capacidade de gerar renda para
porm, que se fazer uma ou outra ressalva. O "circuito inferior" descrito por Milton Santos s aparece despido de menes s atividades
fortemente criminosas porque, por um lado, isso foi um certo descuido, e, por outro, porque, de fato, elas no tinham, h trinta ou vinte e
cinco anos, a importncia q ue tm hoje nas grandes cidades de um
pas como o Brasil. Alm do mais, Milton Santos via o "circuito infe-
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rnJ
preos fixos, relaes impessoais com a clientela, ajuda governamental importante etc.), e no por conta do que ele poderia trazer de
ITTL[ITj
nomia urbana aparec iam como muito bem demarcados (o que torna
os seus benefic irios no quer dizer que nada pode ser feito em materia de gerao de emprego e renda no contexto de uma reforma urbana. Essa articulao pode se dar de uma maneira mais simples e
emergencial, logo muito limitada, sob a forma de "frentes de trabaIho" e de recrutamento organizado de pessoas desempregadas e
subempregadas para serem ocupadas, justamente, com coisas como
um esforo de urbanizao de favelas e de construo de moradias
populares em larga escala; o u, de maneira mais duradoura e con.sistente, sob a forma do estmulo e do apoio do Estado e de orgamzaes da sociedade civil formao de cooperativas e ao desenvolvi-
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mITl
UiJ
Seja como for, Estado e sociedade civil no se confundem, sendo instncias dife rentes da sociedade. Essa d istino s desaparecer e m
zar mais e mais, buscando solues. O Estado pode, aqui e ali, apoiar,
sar qualquer tutela e lutar para manter o controle sobre suas ativida-
popular precisar de planos de md io e longo prazo, a serem e laborados como inic iativa e responsab ilidade conjuntas da sociedade civil e
do Estado, pragmaticamente.
algumas diferenas, tal vez mais aparentes que reais. O Estado preci-
em grande escala, sem esquecer da constante necessidade de alterao e adaptao de legis lao e do aporte de recursos em volume
poderia ser aquela da bri ncadeira de Millr Fernandes: " uma casa
ticipati vos, por exem plo, como "coisa de pobre", em parte por j ter
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[li
lffillll
UlJ
fazer para se tornar (se fazer) mais li vre, mais autnoma. Ainda que
a partic ipao do Estado (com suas leis, seus recursos e tc.) no deva
te os mesmos.
popular carrega suas controvrsias, a esse respeito), construir alternativas ao prprio s istema, ainda que se comece limitadamente e a par-
tucio nal existente para certos avanos. Assim como a reforma urbana e o oramento participativo, a economia popular opera dentro dos
marcos da sociedade existente: portanto, e la no e limina o capitalismo, nem o pe fora de combate. Contudo, ela tampouco o confirma
ou legitima. Ela prospera nas margens, l, onde o sistema revela mais
agudamente o seu fracasso - ou, em ltima anlise, o preo do seu
"sucesso", que sempre o sucesso de uma minoria. Mas, assim como
a reforma urbana e o o ramento participativo, a economia popular
pode contribui r, hoje, um pouco modestamente, para construir um
amanh mais ambicioso; a sua dimenso poltico-pedaggica. Foi
a isso que eu desejei fazer referncia ao enfatizar o desenvolvimento
de teias de solidariedade e de novas formas de cooperao e sociabilidade. Assim como no caso da reforma urbana e do oramento parti-
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mill11
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ITTl.ITTl
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? ? ?
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vez mais. Pela riqueza de estmulos intelectuais e de meios de expresso poltica e cultural e de satisfao de necessidades que as cidades
aos espaos de produo agropecuri a a ltamente moderna que sobrarilJm, embora bastante despovoados) cobrisse toda ou quase toda a
cidades de tamanhos diferentes e articuladas por modernssimas tecnologias de trans portes e comunicaes... No me interessa, aqui, e
mesmo por princpio, esse tipo de exerccio de futurologia, que beira
parte da frica ao sul do Saara, por exemplo) permanecer sabotando esse tipo de utopia a respeito da urbanizao da Terra como um
abrigo e refgio), a capacidade de mudar a superfcie da terra (promovendo aterros, expandindo o tecido urbano, abrindo tneis, demo-
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humanidade "em sua melhor forma". As sociedades humanas possuem contradies e conflitos, especialmente aquelas sociedades - a
esmagadora maioria delas, no decorrer da histria - onde a opresso
e a explorao de uns sobre outros era ou um fato constitutivo essenc ial da vida social. tambm nas cidades onde se concentram tais
contradies e confli tos. Diante da magn itude de certos problemas,
somos tentados, inc lusive, a pensar que a capacidade humana de
resolver problemas foi ig ualmente acompanhada pela tendncia de
permanncia e at de agravamento de certos tipos de problemas, ou
pela capacidade que os seres humanos tm de criarem novos embaraos e dificuldades para si prprios.
A pesquisa cientfica sobre a dinmica scio-espacial nascidades e sobre as causas dos problemas urbanos avanou muito ao longo
do sculo XX, mas muitos temas permanecem controvertidos. A produo intelectual a propsito das possveis solues (literatura sobre
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mITl
lliJ
mudana social em geral, incluindo aquela sobre movimentos sociais) tamb m se avolumou enormemente, sobretudo na segunda
Portanto, enquanto algumas das controvrsias so mais especfimas que influenciam muito de perto as pesquisas empricas e as for-
com que, muitas vezes, teorias e anlises muito antigas, que se julga-
lidade de vida realmente boa, uma vez que as pessoas no foram fei-
da densificao excessiva, como a saturao da infra-estrutura tcnica e social, os congestionamentos etc .. As populaes da Europa e
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lilllm
UlJ
vez que isso exigir percursos mais longos (com decorrente gasto de
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lilllm
UlJ
fragmentao, que, como foi dito no Cap. 5, atualiza mas vai alm da
uma maximizao dos inte resses coletivos. Isso correto, mas uma
viso muito s imples. Em primeiro lugar, porque, em uma cidade
dncias unifam iliares espaosas, mesmo que desej assem (coisa que,
cidades teriam de percorrer; mas pode, por outro lado, ser uma opor-
tun idade para interessantes simulaes, tendo por base uma abordagem flexvel mediante a construo de alguns cenrios provveis,
tipo de vio lncia. De minha parte, estou convencido de q ue, sem uma
revert-lo.
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possui apenas um lado ruim (embora, na atual conjuntura, ele predomine), que o de ser comandado pelo grande capital e servir aos seus
interesses, mas tambm possui aspectos interessantes e socialmente
a construo de um "clima de negcios" favorvel, tornando a cidade mais e mais competitiva aos olhos de potenciais investidores
positi vos, como o da potencial facilidade extraordinria de comunicao e transporte - potencial, deve-se sublinhar, porque nem todos
possuem os meios econmicos para estar plugado na internet ou desfrutar de viagens internacionais. Na verdade. no contexto da globalizao econmico-financeira atual, os benefcios eventuais para a parcela majoritria da populao que no est diretamente vinculada aos
des continua alimentando acaloradas discusses. H os que argumentam que essa participao desejvel e totalmente legtima, por se
tratar de um direito (especialmente considerando os limites e as deficincias da democracia representativa) e, mesmo, por razes de eficincia (argumenta-se que, sobre a base da participao popular, as
mobilidade do capital e a facilidade das transaes econ micofinanceiras, devendo, portanto, ser abolidas. (No se chega, ao con-
IJlJ
te, naqui lo que ele ainda guarda de socialmente til , por ser uma ins-
rrnIIT1
160
dar a criar, com seu aparato policial e militar, um mnimo de segurana para os negcios.) Para muitos autores, que endossam acrtica-
o estaro sendo mais bem info rmadas, luz das necessidades reais
da populao, reduzindo-se, assim, o desperdcio; argumenta-s~,
161
rmIIT1
IJlJ
im.rnl
WJ
Fernandes observou, certa vez, que "ainda est para nascer o erudito
que se contenha em saber s o que sabe". O conhecimento tcnico, o u
tcnico-cie ntfico, , sem dvida, relevante, no raro muitssimo
importante; o problema comea q uando o "especialista" se mete a
querer desejar pelos outros, sentir pelos outros ... e a imaginar que
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respeito esto por trs das diferenas entre vertentes de planejamentO e gesto urbanos que, atualmente, disputam a preferncia dos estu-
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sua viabilidade? comum a retrica em torno das "cidades sustentveis" e da "sustentabilidade urbana" colocar no centro das atenes
os vnculos entre sociedade e natureza, secundarizando ou banal izando a anlise das relaes sociais e, com isso, subestimando o fato de
que, para alm de questes como a crescente poluio ambiental nas
cidades, a formao de ilhas de calor e os problemas quanto ao desti no do lixo urbano, ou como a contribuio das cidades para o aquecimento global, as cidades se tornam, tambm ou, acima de tudo, em
um sentido estritamente social, cada vez mais insustentveis (crescentes disparidades socioeconmicas no espao, violncia urbana
etc.) ...
Qual o significado e quais so as conseqncias da competiio interurbana'? Apesar de a mdia e os "especialistas" martelarem,
a todo momento, a tecla da globalizao, com alguns tendo chegado
a afirmar que ela decretou o "fim do espao" ou dos "territrios", o
fato que, como alguns outros, mais argutos, vm chamando a ateno. a globalizao relativiza a importncia das distncias fsicas,
mas no, propriamente, a das vantagens locacionais. As vantagens
locacionais mais importantes de hoje no so mais, em grande parte,
as de dcadas atrs; mas, nem por isso os atributos do espao ou do
que ele "contm" deixam de ser importantes. Pelo contrrio: com o
capital dotado de muito maior mobilidade, diversos agentes econmicos e po lticos territorialmente referenciados (em um municpio,
em um estado ou provncia, em um pas), como prefeitos, no caso da
escala local. passam a liderar uma competio para atrair grandes
investidores. Estes se apresentam com a promessa de trazer "desenvolvimento" e de gerar empregos, razes pelas quais, e buscando
prestgio e ganhos poltico-eleitorais, administradores pblicos rivalizam entre si para ver quem oferece mais em matria de renncia fiscal (iseno de IPTU por muitos anos, por exemplo), de fornecimento de infra-estrutura, e por a vai. Para as grandes empresas, nacionais
e, sobretudo, multinacionais, com um enorme poder de barganha e
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mas, ao que indicam muitas evidncias, os ganhos so menos importantes do que se poderia supor, e os prejuzos, no agregado e no longo
prazo, so considerveis.
E chego, com isso, ao fi nal do livro. No pretendo ter focalizado
todas as questes importantes referentes aos problemas urbanos e s
maneiras de super-los; desejo, to-somente, ser sido feliz no tratamento das questes que selecionei. Espero, apesar disso, que as pginas precedentes tenham s ido uma introduo segura e clara ao assunto, alm de, tanto quanto possvel, agradvel de se ler. E, se o leitor
chegou at aqui, porque, provavelmente, consegui alcanar meu
obj etivo.
ostras, crustceos e peixes. As atividades secundrias so simbolizadas pela indstria de transformao, em que so produzidos bens
econmicos a partir da transformao, pelo trabalho, e utilizando-se
mquinas e ferramentas, de matrias-primas oriundas de atividades
extrativas, agrcolas ou de criao animal (a chamada indstria da
construo civil tambm faz parte do setor secundrio). Por fim, as
ati vid ades tercirias englobam o comrcio e os servios. Embora no
seja to comum, usa-se, tambm, o termo setor quatemrio para
referir-se, especificamente, aos servios mai s sofisticados. "de
ponta", como consultorias econmicas internacio nais e pesquisa
cientfica e tecnolgica.
Cidades globais: a expresso '"cidades globais" (global cities)
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apareceu alguns anos mais tarde, e, tendo sido traduzido para o portugus, se acha citado na Bibliografia comentada). Uma cidade global um centro de gesto do territrio em escala p lanetria, vale
dizer, um ponto de comando na economia internacional; concentra
sedes de empresas multinacionais e de bancos em um volume desproporcionalmente grande, concentrando, por tabela, servios de ponta,
o mercado financeiro e a produo de inovaes tecnolgicas. Poucas
so as cidades globais "plenas" ou indiscutveis; as trs mais citadas
so Nova Iorque, Londres e Tquio. Centros de alcance igualmente
internacional, mas menos importantes ou completos, so, apenas para
exemplificar, Frankfurt e Paris, mas tambm Hong Kong e So
Paulo. Pode-se dizer que h, hoje em dia. um razovel nmero de
cidades g lobais no mundo, que so todas aquelas que exercem um
papel de destaque na economia mundial, embora, s vezes com uma
abrangncia meramente continental (como So Paulo ou Cidade do
Mxico); e, no entanto, cidades globais em sentido forte ("cidades
globais plenas"), que so os verdadeiros centros nevrlgicos da economia globalizada, so pouqussimas, e seguramente no incluem
nenhuma cidade de pas semiperifrico ou perifrico.
Constructo: os constructos so abstraes que sintetizam um
nmero muito grande de aspectos particulares, os quais so acessveis observao e, s vezes, mensurao usando-se uma escala
mais poderosa que simplesmente a ordi nal (ver o verbete escalas de
me11suracio, mais adiante neste glossrio). Ilustrando: "qualidade de
vida" um constructo bastante abstrato e complexo, c uja interpreta-
Conurbao: termo criado pelo escocs Patrick Geddes ( 18541932), significa o resultado do "encontro" de dois ou mais tecidos
urbanos em expanso. Nesse caso, mesmo que os limites formais
entre dois municpios permaneam, no h mais descontinuidade de
tecido urbano edificado entre eles, pois os seus ncleos urbanos principais cresceram at se tocarem e formarem uma verdadeira coalescncia, uma mancha nica de espao construdo.
Dficit habitacional: o dficit habitacional consiste na quantid ade de moradias condizentes com a dignidade humana (ou seja: rea
compatvel, materiais de qualidade pelo menos razovel, localizao
em rea saneada e dotada de infra-estrutura e boa acessibilidade) que
se fazem necessrias para substituir as habitaes inadequadas em
que vive a maior parte dos pobres urbanos. Por habitao inadequada
podem-se entender tanto as moradias precrias e, no raro, insalubres
de favelas e loteamentos irregulares, como, tambm, moradias muito
antigas, decrpitas, ainda que situadas em bairros comuns ou mesmo
prximas rea central da cidade. Deve-se considerar, por fim, a
massa dos sem-teto que vivem em condies de extrema precariedade e improvisao, muitas vezes ao relento; nesse ltimo caso, contudo, no se faz necessria apenas uma reforma estrutural como a reforma urbana (e o utras), mas sim, so imperativos programas emergenciais para combater a indigncia, q ue o estrato mais baixo da pobreza absoluta.
Democracia direta/democracia representativa: a democracia
padres culturais gerais de referncia; entre seus numerosos componentes esto o nvel de poluio ambiental, o grau de liberdade pol-
lida, a todo momento, com constructos, no podendo deles prescindir: "carisma", "poder" e "status" so alguns exemplos.
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es de poder e a perpetuao de indivduos em determinadas posies. J na democracia representativa moderna, os cidados escolhem seus representantes, os quais iro represent-los na administrao e no parlamento, decidindo em seu nome. A democracia representativa, diversamente da direta, torna estrutural e permanente uma
separao entre diri gentes e dirigidos. Poder-se-ia argumentar que,
e m princpio, todos (ou quase todos, excetuando-se os menores de
idade, os criminosos presos etc.) tm o direito de se candidatar a um
cargo pblico; entretanto, em uma sociedade desigual, marcada por
diferenas de classe e, especialmente no Terceiro Mundo, por crassas
disparidades socioecon micas e por vrias deformaes polticoculturais ("coronelismo", "voto de cabresto" etc.), as chances reais
de que um cidado comum pobre, sem vncu los o u acordos com
mquinas polticas estabelecidas e sem um financiamento de sua
campanha, conquiste um cargo pblico pela via eleitoral, so pequenas. Alm disso, a pouca transparncia do aparelho de Estado ("razes de Estado", decises tomadas a portas fechadas etc.), mais as
dificuldades para a perda de mandato do representante improbo o u
co rrupto, fazem com que a democracia representativa, no fundo,
s irva mais para perpetuar o status quo econmico-social vigente do
que para, com base nela, corrigi-lo. bem verdade que, por outro
lado, a democracia representativa possui uma inclinao wziversalista, coisa que no ocorria na plis clssica, j que existia a escravido
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mesmo produto e m uma mesma rua, cria ndo, para a cidade inteira o u
ser uma fico em numerosssimos casos: " zero" poder, "zero" sta-
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mente dotao de infra-estrutura e regularizao fundiria, o problema da pobreza e, tambm, o desafio representado pelos elementos
racistas e estigmatizantes presentes no imaginrio e associados s
imagens de certos lugares.
Loteamentos irregulares: um loteamento considerado irregular quando ele no obedece ao que prev a legislao que dispe
sobre o parcelamento do solo, especialmente a Lei Federal 6.766/79,
conhecida como "Lei Lehmann" em homenagem ao senador (Otto
Geom etria dos fractais: a Geo metria dos fractais busca demonstrar que estruturas naturais de complex idade aparentemente
infinita, como nuvens e galx ias, apresentam, no fundo, uma surpreendente regularidade, a chamada "invarincia de escala". Ou seja:
cumprirem com a sua parte no que se refere a certas obras e melhorias infra-estruturais; com isso, deixam para trs parcelamentos irre-
tos bsicos. Para alguns analistas, cidades poderiam ser "decodificadas" com a ajuda dessa nova "linguagem" matemtica. Esquecem-se
cou aprovar um projeto de loteamento junto Prefeitura, o loteamento, alm de irregular, denominado de clandestino. Em alguns casos,
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assentam a extrao da mais-valia e o processo de explorao econmica de uma parcela da sociedade por outra.
Modelos gravitacionais: a tentao do formal ismo levou, j h
vrias dcadas, economistas regionais e gegrafos quantitativos a
quererem analisar fenmenos scio-espaciais com a ajuda de analogias com as leis da Fsica e mediante a importao de mtodos dessa
cincia. O exemplo mais conhecido e clssico a anlise de migraes e interaes espaciais por meio de "modelos gravitacionais", em
que a interao vista como decorrente de uma relao entre "massas" e "distncias", a atrao (no caso, de populao) se dando na
razo direta das massas envolvidas e na razo inversa do quadrado da
distncia.
Modo de produo: Parece simplesmente pleonstico, mas no
: o modo de produo a maneira como bens econmicos so produzidos, combinando relaes de produo determinadas com certas
foras produtivas. As relaes de produo compreendem as relaes
de trabal ho, que so as relaes que os trabalhadores estabelecem
entre si e com os proprietrios dos meios de produo (no caso de no
serem eles mesmos os proprietrios), e os sistemas de propriedade. J
as foras produtivas abrangem os meios de produo e a prpria fora
de trabalho. O conceito acha-se muito marcado pelo pensamento marxista, mas passou a ser usado mesmo por pessoas que, a rigor, no so
marxistas, o que, em princpio, no oferece maiores problemas, desde
que as modificaes e adaptaes sejam explicitadas e no conduzam
a uma "salada de frutas" terico-conceitua!. Por exemplo, a fora de
trabalho est muito longe de ser uma simples fora produtiva, uma vez
que os trabalhadores resistem, de vrios modos, aos imperati vos do
processo de produo, no mbito do prprio quotidiano da fbrica ou
empresa, coisa usualmente subestimada pelo marxismo. Outro problema, mais abrangente, o da incipincia (e, s vezes. inexistncia) da
crtica marxista s foras produtivas capitalistas, como se fosse possvel e desejvel que uma sociedade ps-capitalista, pretendidamente
mais justa, simplesmente aproveitasse toda a matriz tecnolgica e a
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alm, pois diz respeito imbricao das dimenses econmica, po ltica e c ultural no seio de um dado tipo de sociedade.
tos sociais, no rmal mente sendo visto como tal pela sociedade e,
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Bibliografia comentada
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CH ILDE, Yere Gordon ( 1973 [ 194 1]): O que aconteceu na histria. Rio de
peito das mculas que pesam contra o seu autor, no plano moral ou
5~ ed.
Ambos os livros do a rquelogo australiano V. Gordon Chi Ide so clssicos absolutos. Escritos como livros de divulgao c ientfica para um
pblico de no-especialistas e m Arqueologia ou Pr-Histria. so le ituras. ao mesmo tempo. e nriquecedoras e envolventes, porque acessveis.
Mesmo tendo os avanos posteriores nos estudos arqueolgicos levado
obsolescncia de certas interpretaes de Childe, sem contar certas
imprecises conceituais (como a designao por "totalitrio" do tipo de
Estado teocrtico-autoritrio do antigo Egito faranico, ou da sociedade
espartana), o panorama geral descortinado por ele sobre o surgimento
das cidades continua valendo a pena ser lido. Embora a editora carioca
Zahar no mais exista, seus li vros costumam ser encontrados com facilidade em bibliotecas e sebos.
CHR IST ALLER, W alter ( 1966 (1933]): Ce11tral Places in So111hem
Germany. New Jersey: Prentice-Hall.
No existe uma trad uo da obra clssica de Christaller Die zentrale11
One in Sddeutschland (As localidades cemrais na Alemanha Meridional) para o portugus. Dou, ento, a referncia de uma traduo para o
ingls, j que o alemo inacessvel para a esmagadora maioria dos leitores brasileiros. O li vro de Christaller leitura obrigatria para que m
se interessar mais a fundo pelo assunto das redes urbanas. Muito embora muita coisa tenha sido publicada desde que Christaller lanou seu
li vro, h setenta anos (em parte criticando o u revendo aspectos da teo-
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Sobre as ilustraes
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