Almas, Corpos e Especiarias - Cypriano Com Notas Resumidas
Almas, Corpos e Especiarias - Cypriano Com Notas Resumidas
Almas, Corpos e Especiarias - Cypriano Com Notas Resumidas
PESQUISAS
ANTROPOLOGIA, N° 65 ANO 2007
PESQUISAS
PUBLICAÇÕES DE PERMUTA INTERNACIONAL
Diretor: Pedro Ignácio Schmitz, S.J.
Comissão Editorial
Artur Rabuske, S.J.
Josafá Carlos de Siqueira, S.J.
Pedro Ignácio Schmitz, S.J.
Carlos Alberto Jahn, S.J.
Fúlvio Vinícius Arnt
ISSN: 0553-8467
Apresentação....................................................................................................... 5
INTRODUÇÃO..................................................................................................... 9
Fontes históricas e bibliográficas consultadas .............................................. 14
João Felipe Betendorf ................................................................................... 16
João Daniel.................................................................................................... 19
José de Morais .............................................................................................. 21
Outras fontes ................................................................................................. 22
I. A FOME E A FARTURA, OU A DIVERSIDADE AMAZÔNICA ...................... 25
Amazônia....................................................................................................... 28
A fome e a fartura.......................................................................................... 34
A fome, a fartura e a complexidade do meio ambiente................................. 39
II. POPULAÇÕES INDÍGENAS DOS RIOS MADEIRA E TAPAJÓS ................ 49
Descrições das sociedades nativas nas fontes etno-históricas .................... 50
III. AS MARGENS DO RIO AMAZONAS, NOS SÉCULOS XVI - XVIII ............ 69
Interesses espanhóis na Amazônia .............................................................. 70
O domínio sobre o rio Amazonas.................................................................. 73
A implantação das missões jesuíticas sob assistência de Portugal no
Maranhão e no Grão-Pará ............................................................................ 75
A missão jesuítica do rio Amazonas e Tapajós ............................................ 77
O processo de implantação de missões jesuíticas no rio Madeira ............... 93
Conflitos em torno da mão-de-obra indígena.............................................. 101
IV. A SITUAÇÃO DE CONTATO ..................................................................... 105
Absorver, resignificar e atualizar ................................................................. 107
Cristãos fiéis, idólatras em segredo ............................................................ 128
O desprezo aos bens terrenos e a falta de ambição .................................. 140
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................. 149
Referências bibliográficas................................................................................ 158
Fontes Históricas Editadas.......................................................................... 158
Outras Fontes.............................................................................................. 159
Apresentação
1
Conforme Bourdieu (1987:XL-XLI), “o habitus deve ser encarado como um sistema de
disposições duráveis e intransferíveis que, integrando todas as experiências passadas, funciona a
cada momento como uma matriz de percepções, apreciações e ações, e torna possível a
realização de tarefas infinitamente diferenciadas, graças às transferências analógicas de esquemas
que permitem resolver os problemas da mesma forma e graças as correções incessantes dos
resultados obtidos, dialeticamente produzidas por estes resultados”
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 13
2
Como, por exemplo, os deslocamentos, o esgarçamento das redes de relações, as doenças e o
trabalho compulsório entre outros.
3
Para uma análise deste tema consultar: Henige,1986; Cook & Lovell, 1992; Lovell, 1992; Cook,
1998 e Diamond, 2001.
4
Viveiros de Castro, 2002:247; Porro in Cunha & Castro, 1992:175-196; Menéndez in Cunha &
Castro, 1992:281-296.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 15
5
Apesar de rica e interessante, a temática que envolve as transformações ocorridas na prática
missionária jesuítica, na atual região Norte do Brasil, não será enfocada por esta análise. Com
relação à evangelização no Chaco, uma análise inicial das mudanças implementadas pela
Companhia de Jesus sob Assistência de Espanha é apresentada em Cypriano (2000).
6
Contudo, é preciso salientar que seria ingênuo acreditar que estes filtros sejam sempre os
mesmos. A própria diferença existente entre os olhares e a escrita de cada autor, permite que
variados temas sejam inseridos e tratados com maior destaque. Como exemplo, é possível citar o
interesse manifestado por João Daniel (2004) tanto pela natureza, quanto por meios e mecanismos
que facilitassem a implementação da colonização na atual região Norte do Brasil.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 17
João Daniel
Outro autor que, assim como Betendorf, disponibiliza em seus registros
grande quantidade de informações é o jesuíta João Daniel que, em sua obra
Tesouro Descoberto no Máximo Rio Amazonas realiza uma compilação de
dados aos quais teve acesso durante o período em que esteve na América.
Assim como Betendorf, em diversas passagens ele transpõe comentários e
José de Morais
Outra obra sobre as missões do Amazonas, escrita por um Padre
jesuíta sob assistência de Portugal, é a História da Companhia de Jesus da
Província do Maranhão, que ás reaes cinzas da Fidelíssima Rainha Senhora
Nossa D. Marianna d’Austria, offerece seu author o Padre José de Moraes,
filho da mesma província, anno de 1759. Em sua edição no Brasil, feita por
Candido Mendes de Almeida (Morais,1860), foi publicada apenas a primeira
parte do texto, sendo a segunda parte considerada perdida. A este respeito, no
final do volume da publicação, é apresentada uma Nota do Author (p.550) onde
é afirmado, em primeira pessoa “Que foi o que pude salvar, com grande risco,
do infeliz naufrágio que padeceu toda a Companhia de Jesus; porque a
Segunda Parte naufragou no confisco, que se fez em todos os papéis”.
Em Serafim Leite (1949, t.VIII:382-383) é possível encontrar
informações acerca de Padre José de Morais. Seu nascimento foi em Lisboa
no ano de 1708 e sua entrada na Companhia de Jesus foi feita em março de
1727. A profissão solene realizou-se no Maranhão, onde trabalhou como
missionário e como Teólogo de El-Rei examinando a legitimidade dos
cativeiros. Quando foi deportado, em março de 1759, já havia sido nomeado
Cronista da Vice-Província do Maranhão e Pará em lugar de outra pessoa que
não chegou a executar esta tarefa, provavelmente o Padre João Daniel. Ainda
conforme Leite (1949, t.VIII:383), esta História havia sido escrita como parte
das comemorações pela elevação da Vice-Província a Província – fato que não
chegou a ocorrer em virtude da expulsão dos jesuítas. Já em Portugal, foi
aprisionado em locais não identificados e, em 1777, já havia voltado a usar seu
nome de família completo: José Xavier de Morais da Fonseca Pinto.
O texto de Morais trata das tentativas para estabelecimento de missões
jesuíticas junto aos indígenas do Maranhão, desde as expedições de Pedro
Coelho de Souza e Martins Soares Moreno, até o estágio por elas alcançado
no ano de 1759. A respeito das atividades desenvolvidas nos rios Madeira e
Tapajós, Morais escreve apenas no Livro VI, nos capítulos I até XI, tratando
com maior atenção das aldeias, seus nomes, localização e missionários
responsáveis. São escassos os dados sobre as sociedades indígenas, mas as
informações cronologicamente organizadas permitem uma visualização do
processo de implantação das aldeias nesta região.
Entre estes cronistas, dois foram privilegiados como fontes na
elaboração das análises. A escolha de Betendorf e de João Daniel foi feita em
função de vários pontos que os aproximam e tornam seus registros diversos,
mas complementares. Ambos eram padres jesuítas que permaneceram, por
longos períodos, evangelizando na Amazônia e publicaram seus registros após
Outras fontes
Além destas fontes publicadas, outros documentos ainda permanecem
sem a devida atenção. A maior parte da correspondência mantida entre os
Missionários jesuítas, seus Provinciais e o Padre Geral permanece sendo
consultada por um número restrito de pesquisadores que se dispõe a buscar
por ela em arquivos da Europa. No Brasil, mais precisamente na Biblioteca
Nacional, encontram-se na coleção Alberto Lamego diversos manuscritos
jesuíticos. Uma pequena parcela, ou trechos, desta correspondência relativa à
Amazônia foi publicada no Brasil por Serafim Leite em suas obras Monumenta
Brasiliae e História da Companhia de Jesus no Brasil, Cartas Jesuíticas e
Novas Cartas Jesuíticas, entre outras. Contudo, estas obras cobrem uma
pequeníssima parcela do grande conjunto ainda a ser investigado.
A elaboração de uma crítica das fontes para a análise da região entre
os rios Tapajós e Madeira, durante os séculos XVII e XVIII, demandaria uma
listagem de grande proporção e comentários que se prolongariam por muitas
páginas. Como o objetivo desta tese não é apenas o levantamento das fontes
aqui serão comentadas apenas algumas entre estas obras.
Diversos autores elaboraram listas de fontes e bibliografias que podem
fornecer informações sobre a região dos rios Madeira e Tapajós durante os
séculos XVII e XVIII e, uma das mais completas é a oferecida por Serafim
Leite. Nos volumes VIII e IX da História da Companhia de Jesus no Brasil,
apresenta uma bibliografia dos Jesuítas do Brasil e, ao longo dos outros dez
tomos desta sua obra – principalmente na introdução bibliográfica e nas notas
de rodapé – arrolou grande parte da bibliografia publicada sobre os jesuítas até
a edição de suas obras.
Para acessar alguns documentos escritos por militares, funcionários da
Coroa Portuguesa e religiosos, uma boa fonte são os volumes das revistas
Annaes da Bibliotheca e Arquivo Publico do Pará, Anais da Biblioteca Nacional
do Rio de Janeiro e os volumes da Revista do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro. Contudo, uma das mais ricas fontes são os documentos
selecionados pelo Projeto Resgate Barão do Rio Branco. A disponibilidade
deles em meio digital, através de CD-rom ou na Internet, oportunizou a
pesquisa direta sem a necessidade de viagens a bibliotecas européias e, por
fim, para buscas em arquivos e bibliotecas nacionais um bom instrumento é o
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 23
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Entre estes autores, Viveiros de Castro cita: Forsyth 1983 e 1985; Combès 1992; Viveiros de
Castro 1993; Whitehead 1995; Grenand 1982; Whitehead 1988,1993ª, 1994; Farage 1992; Dreyfus
1993; Arvelo-Jiménez & Biord 1994; Renard-Casevitz 1992; Renard-Casevitz et al. 1986; Santos
1988 e 1993; Combès & Saignes 1991; Taylor 1992; Wright 1990,1992; Turner 1992; Hill & Wrigth
1988; Franchetto 1993; Hendricks 1993; Basso 1995.
8
Aqui é empregado o conceito de região como Santos (1996:98) o definiu: regiões são entendidas
como “subdivisões do espaço” e como “um espaço de conveniência, meros lugares funcionais do
todo”.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
I. A FOME E A FARTURA, OU A DIVERSIDADE AMAZÔNICA
A dinâmica das situações de contato que se desenrolaram entre a
sociedade colonizadora e as sociedades indígenas na Amazônia, a partir do
século XVI, ultrapassam as noções de série de eventos ou de confronto de
culturas. Entre as várias questões que podem ser formuladas a respeito desta
situação colonial, uma refere-se à relação existente entre o homem e o meio
ambiente, pois, para as sociedades indígenas, o meio ambiente tem
significados diversos dos atribuídos pela sociedade européia. Acredito ser
necessário entender as sociedades indígenas como culturas peculiares e
distintas da nossa, demandando, assim, grande cuidado para que não lhes
sejam impostas idéias ou categorias culturais que reflitam conceitos
etnocêntricos frente ao saber indígena.
Partindo desse pressuposto, este capítulo propõe analisar as
características do meio ambiente sob dupla perspectiva: a que objetiva uma
breve apresentação das características físicas mais evidentes desta região,
cujos dados apontam para a diversidade ecológica do espaço; e outra
perspectiva, que investiga esta biodiversidade, aliada às diferentes maneiras
como o saber indígena a respeito destas áreas consideradas selvagens e
improdutivas pelos agricultores ocidentais, e que se concretizam em condições
de obter abundância de recursos naturais.
Ao suster este ponto de vista, é necessário rever as afirmações feitas
por exploradores e autores que descreveram a Amazônia como um ambiente
de características extremamente diversas das que conheciam até então e, à
sua concepção, apresentavam-se desagradáveis ou, até mesmo, como
impedimentos à sobrevivência.
Realmente, com freqüência, algumas fontes primárias descreveram
esta região como uma área de difícil acesso e habitação. Contudo, é preciso
lembrar que estes relatos estavam mergulhados na percepção européia do
meio ambiente e de seu aproveitamento, e refletiam somente a impossibilidade
prática de implantar modelos de exploração ou de colonização da América na
região Amazônica. No caso específico das tentativas empreendidas por parte
dos portugueses, que optaram por uma estratégia de aldeamento das
sociedades nativas em espaços distantes de seus assentamentos originais,
esta alternativa resultou na necessidade destes grupos se adaptarem a novos
espaços, cujas características poderiam diferir de maneira drástica. Portanto,
exigiram que estas populações estabelecessem novos vínculos com o meio e
26 Doris Cristina Castilhos de Araujo Cypriano
1
Unidades de recursos naturais e Ilhas naturais de recurso são denominações utilizadas por Posey
(1986:19) para definir áreas dispersas onde se encontram determinadas plantas ou animais úteis,
que formam, segundo o autor, verdadeiros “oásis” pois podem apresentar zonas de caça,
concentrações de peixes, fontes de frutas e palmitos, materiais para flechas.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 27
Amazônia
As descrições contemporâneas da Amazônia apresentam muitos
pontos em comum. As proporções gigantescas do verde, das águas e a
variedade dos seres que a habitam, compõe um quadro de “império de
florestas equatoriais” que se estende de maneira uniforme. A um primeiro olhar,
as imagens fornecidas pelo IBGE (www.ibge.org.br ), obtidas por mosaico de
imagens coletadas pelo Lansat, confirmam este quadro de composição,
aparentemente homogêneo. Porém, apesar da maior parte do espaço total
amazônico se encaixar nesta classificação, ela é generalizante e pode
desconsiderar as peculiaridades locais.
Uma das propostas de Ab’Saber (1973, 1977) para análise de
3
ambientes são os domínios morfoclimáticos. Eles reúnem grandes
combinações de fatos geomorfológicos, climáticos, hidrológicos, pedológicos e
botânicos que, por sua relativa homogeneidade, são adotados como padrão em
escala regional. Por se tratar de combinações, eles não se tornam estanques,
pois prevêem variações nos padrões ecológicos locais ou sub-regionais.
No caso amazônico, Ab’Saber estabelece o domínio morfoclimático das
terras baixas florestadas de alta biodiversidade e propõe que se leve em conta
4
também o conceito original de ecossistema para permitir a visão das tramas
locais que servem de suporte ecológico para a existência de determinada
forma de vida.
Esta visão abrangente, o domínio morfoclimático, acrescida a
possibilidade de uma escala menor – o ecossistema – permite que o ambiente
seja incluído nesta análise não como um cenário onde se passam as ações
humanas, mas sim como trama de um mesmo tecido em constante mudança.
3
O conceito de ambiente é aqui entendido como um sistema de inter-relações que abrange desde
as estruturas e funções até a sua dimensão histórica.
4
Ab’Saber (2002:7): o conceito de ecossistema propõe a identificação dos tipos de sistemas
ecológicos naturais existentes em determinado território dentro de uma noção interdisciplinar,
envolvendo o estudo integrado de todos os fatos que criam suporte para o desenvolvimento de
biotas, ou seja, das porções vivas do meio ambiente físico.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 29
Ecossistemas
Mudando de escala é possível ver a Amazônia como um mosaico de
ecossistemas locais que, conforme Ab’Saber (2002:7-9), podem ser divididos
através de critérios de especificidade de suporte ecológico e padrão de
biodiversidade, em três categorias:
• ecossistemas contrastados de terras firmes, como os enclaves de
cerrados ilhados no meio das grandes matas;
• diferenciações intra-florestais, pela presença de manchas de areia
branca em terraços e várzeas ou, pela demorada presença de água
de transborde em planícies de rios sujeitos a fortes oscilações de
nível, como as campinaranas, campinas e igapós;
• ecossistemas extremamente localizados, como as manchas de
cerrados em Roraima, ou a incidência de cactos nas barrancas de
alguns rios.
No alto Amazonas é possível encontrar diversos ecossistemas
diferenciados: as matas baixas das anavilhanas; igapós originados a partir de
diques marginais engastados na beira alteada do rio Negro; buritizais e outras
palmáceas em faixas deprimidas dos tabuleiros regionais; campinas e
campinaranas em terraços de areia branca e as extensas florestas biodiversas
de terra firme.
Já a planície amazônica, compreendida entre a barra do rio Negro e o
golfão Marajoara, é um labirinto terra-água onde se sucedem ecossistemas de
diques marginais baixos, outrora florestados; florestas de várzeas altas em
áreas onde a planície encosta-se na base dos tabuleiros; réstias de florestas
biodiversas em diques marginais interiorizados; campinas em volutas de areia
branca, deixados por rios meândricos já desaparecidos; vegetação herbácea
ou campestre em leitos abandonados; capins nativos em bordas de lagos de
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 31
O Clima
Outro aspecto que merece ser discutido são as características
climáticas da Região Norte do Brasil. Ela está localizada dentro da área de
clima equatorial úmido, controlado basicamente pela Zona de Convergência
Intertropical (ZCIT), que apresenta baixas pressões equatoriais. A massa
Equatorial continental (Ec) é quente e instável, e exerce grande influência na
Amazônia Ocidental. Por sua vez, a massa Equatorial marítima (Em) e a ZCIT
afetam particularmente o médio e baixo Amazonas e o litoral.
A temperatura média registrada é acima de 24°C em t oda a região,
mas o regime de chuvas apresenta diferenças importantes: a Amazônia
Ocidental tem médias pluviométricas anuais de 2.500mm e ausência de
estação seca; em uma faixa diagonal que se estende de Roraima ao Sul do
Pará, chegando à Rondônia e parte do Acre, as médias pluviométricas são
menos elevadas e apresentam características de clima equatorial subúmido
alternando em estações secas e chuvosas. Por fim, no baixo Amazonas e ilha
de Marajó, as precipitações elevam-se, e o período de estiagem diminui,
alcançando apenas dois meses de duração. O clima quente da Amazônia não
apresenta temperaturas extremamente altas, mas médias regulares durante o
dia e à noite, ao longo do ano todo.
A duração dos dias varia pouco de estação para estação, e a maior
causa de variabilidade de insolação provém das nuvens. As temperaturas
médias mensais têm variação de menos de 3°C, mas as variações diárias
podem chegar a 15°C. Conforme dados IBGE(www.ibge.g ov.br) a precipitação
média da região pode variar entre 1.500 e 3.250 mm ao ano. Esta
generalização, porém, ameniza as grandes variações locais que afetam a
biodiversidade amazônica.
1997
1996
1992
1990
1988
A fauna
A riqueza de espécies também é uma característica da fauna das
florestas amazônicas. No caso específico da fauna terrestre, sua maior parte é
constituída de invertebrados que vivem no solo, enquanto que a porção de
fauna vertebrada é predominantemente arbórea – segundo Eisenberg e
Thorington Jr. (1975) abrangem entre 40% e 70% - onde as condições são
mais favoráveis.
A adaptação à vida florestal se revela de modo patente em diversas
espécies da fauna amazônica, como o cachorro-do-mato-de-orelha-curta e o
cachorrinho-vinagre, o coati, o jupará, os furões, o gato-do-mato, a jaguatirica,
a suçuarana e onças são especializados para habitar a floresta, onde são
predadores encarregados do controle das populações de muitos animais.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 33
Florestas antropogênicas
Conforme Morán (1990:198), hoje, ao menos 11% das florestas de
terra firme na Amazônia podem ser consideradas florestas antropogênicas,
refletindo o uso intensivo e o manejo por populações amazônicas no passado.
As sociedades indígenas modificaram o meio ambiente promovendo a
diversidade biótica e as “ilhas de recursos”, criando condições favoráveis ao
desenvolvimento de dominância de algumas espécies vegetais altamente úteis.
Entre as vegetações de possível origem antropogênica da terra firme
amazônica, Morán (1990:198) cita as florestas dominadas por palmeiras, onde
aparecem a Pupunha, que fornece palmito para alimentação; Inajá; Buriti
utilizado para fazer saias e tipóias para carregar crianças; Tucumã utilizada
para confecção de redes e outros artigos de uso diário e, cujas frutas atraem
antas e cutias; Caiauí e Babaçu, empregados como alimento e na construção
de casas, pois facilita o escoamento das águas.
A fome e a fartura
Os cronistas que descreveram as margens do rio Amazonas, a partir
do século XVI, diversas vezes relataram a penúria e a fome que passaram em
suas viagens quando os estoques iniciais de víveres acabavam. E, mesmo
acreditando que algumas características descritas foram exageradas, acredito
que a possibilidade de terem tido obstáculos pela falta de alimentos, ou em sua
busca, foi real.
Por um lado, o tamanho das embarcações não comportava grandes
quantidades de alimentos, as condições de armazenamento não eram as ideais
e as possibilidades de reabastecimento eram pequenas. Por outro, os
colonizadores sofriam pelo seu desconhecimento da flora e da fauna da
América e, como suas tentativas de compreender e aproveitar este ambiente
desconhecido eram feitas a partir de comparações com seus conhecimentos da
biodiversidade européia, elas freqüentemente resultavam em erros ou
distorções da realidade que se apresentava.
Ainda, apesar de contar com a ajuda de indígenas recrutados para
acompanhar a viagem, estes, com muita freqüência, não conheciam as fontes
de recursos alimentares de lugares distantes de seu território de origem. Os
grupos de indígenas recrutados para servirem de guias possuíam uma
considerável gama de conhecimentos a respeito da área onde habitavam mas,
à medida que se distanciavam de seu território, estes saberes tornavam-se
pouco úteis diante de ambientes diversos dos seus.
Diante deste quadro de precário abastecimento de víveres e, por
vezes, motivados pela fome prolongada, muitos exploradores adentraram as
florestas em busca de alimentos. Contudo, os resultados destas tentativas
quase sempre foram infrutíferos ou desastrosos. Carvajal (1992:108) relata um
destes episódios, em que membros da sua tripulação partem em busca de
alimentos na floresta, e, após ingerir algumas plantas “estuvieron a punto de
muerte, porque estaban como locos y no tenian seso”. Diante destas, e de
outras experiências mal-sucedidas, os colonizadores suportaram o desgaste da
falta de alimentos, e chegaram até a cozinhar pedaços de couro de seus cintos
e solas de sapato para saciarem a fome.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 35
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 37
5
Leite (1943:376) afirma que devido a diversas dificuldades - como o constante acometimento de
doenças nos missionários que atendiam as populações das margens do rio Negro, a morte de dois
padres no Cabo do Norte e o pequeno número de sujeitos disponíveis para manterem as missões
já estáveis – os Superiores da Missão declararam que não poderiam continuar com as missões no
rio Negro. Em 26 de novembro de 1694 o Rei de Portugal escreveu ao Governador solicitando que
fossem enviados religiosos da Ordem do Carmo e, em 1695 atendendo ao pedido, missionários
Carmelitas iniciaram sua obra no rio Negro.
fructas, e acabada esta sua cortezia costumada, retiraram-se outra vez, sem
esperar o retorno” (Betendorf, 1909:260).
Visitas realizadas entre os grupos, ou entre parcelas de um mesmo
grupo, igualmente eram iniciadas com a troca de presentes. Transcrevendo
anotações de Padre João Ângelo, enquanto este missionou junto aos Iruri no
rio Madeira, Betendorf (1909:465) fornece detalhes de uma visita realizada pelo
principal Paraparixama ao principal Mamoriny: “começaram a vir para a aldêa
com grande numero de índios carregados de mil curiosidades, de assentos, de
bordões, tapiocas e beijus”. Após esta chegada, a comitiva
logo veiu com todo o seu acompanhamento á porta da casa da residência,
porém elle só entrou dentro fez-lhe a visita, e dahi tornou outra vez para a
casa do Paricá, onde de todas as casas da aldêa lhe foi um presente para o
jantar, e jantaram alegremente todos. (Betendorf, 1909:466.)
Nesta variante do mito, Betendorf deixa claro que a mãe dos cinco
filhos foi surpreendida comendo o peixe moqueado e, tomada de vergonha por
não ter partilhado da refeição, parte para não mais retornar. Mesmo sem
intenção de analisar este mito, é necessário destacar que ele parece salientar a
atitude inadvertida e reprovável da mãe ao negar a partilha do alimento com
seus filhos.
6
Aqui a palavra dádiva é empregada apenas como um sinônimo de doação e presente, e não
como o conceito de dádiva e de dom, conforme Mauss (2001) enunciou. Apesar desta tese não
pretender analisar esta troca de presentes a partir de seus múltiplos significados políticos, tal
investigação poderia revelar aspectos bastante interessantes destes grupos estudados.
parte dos Andirazes, parte do rio das Amazonas, vai dar pelos Curiatós”, pois
uma praga de mosquitos assolava o antigo território dos Tupinambarana.
Quanto a este ponto, é interessante frisar a importância atribuída à
agricultura pelos jesuítas. O cultivo organizado de alimentos, principalmente
aqueles conhecidos pelos europeus, era considerada a única maneira de
garantir a subsistência dos grupos aldeados por longos períodos e a duração
destas empresas missionárias.
Para o jesuíta, a complexidade do meio ambiente era considerada um
entrave à agricultura. Para o indígena, a mesma complexidade era o motivo da
fartura de alimentos, pois sua subsistência era garantida por um cultivo agrícola
baseado na experiência e no uso de recursos disponíveis em cada período do
ano. Como afirmou Sahlins (2001:176), a questão que envolve esta
discrepância na compreensão do meio está vinculada às maneiras como as
experiências são organizadas, de acordo com cânones sociais de relevância.
As variações nestes cânones permitem variadas formas de perceber, conhecer
e classificar as coisas, visto que, tanto a objetividade do jesuíta, que desejava
implementar o sistema agrícola, quanto a objetividade das sociedades nativas,
estavam baseadas em suas experiências, conhecimentos prévios e percepção
do meio.
Ao contrário do Padre João Felipe Betendorf, que em sua Chronica
concentrou esforços para apresentar a Companhia de Jesus como protagonista
e agente em terras do Estado do Maranhão, o Padre João Daniel em sua obra
Tesouro Descoberto no Máximo Rio Amazonas, centraliza seu foco sobre a
própria região Amazônica. Dividindo a atenção com ação missionária, Daniel
descreveu nas cinco partes de sua obra o meio ambiente amazônico que
cercou o trabalho dos jesuítas, as populações que nele habitavam, as formas
como era aproveitado o entorno – tanto pelas populações nativas quanto pelos
colonizadores – e, ainda, sugeriu estratégias e mecanismos que poderiam ser
implementados para extrair as inumeráveis riquezas que encontrou.
No proêmio da quinta parte do Tesouro Descoberto João Daniel
(2004:133) esclarece o título de sua obra:
São as riquezas do rio Amazonas, e o tesouro de que falo, a grande
fertilidade das suas terras, as preciosas especiarias de suas matas, e as
copiosas colheitas dos seus frutos, porque nos frutos da terra e bens estáveis
consiste a mais estimável riqueza dos homens, e não nos ouros, pratas, e
preciosas gemas, que de repente se podem perder e desaparecer em um
momento.
Para além destas riquezas nomeadas por João Daniel, fontes estas
baseadas em sua perspectiva de que somente a agricultura organizada era
capaz da manutenção dos homens, as sociedades nativas atribuíam à
diversidade biológica da região Amazônica o seu tesouro.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 41
das casas, principalmente das partes do mar”. Para a caça, eram preferidas a
anta, o javali, o porco do mato, o tatu, as capivaras, os veados, cotias; mas,
alguns insetos também faziam parte da dieta, como os cupi, as minhocas e os
vermes que se alimentavam de madeiras. As abelhas eram apreciadas pela
produção de mel, em particular as iruçu, as tocana ira e outra, cujo nome
Daniel (2004:231. v.1) não recorda, mas tem como característica fazer seus
favos enterrados sob o solo.
Algumas espécies de sapos eram valorizadas por produzirem
ingredientes que fariam parte de venenos usados nas flechas ou, ainda, como
componentes de antídotos (Daniel, 2004:237. v.1.).
Quanto aos macacos, João Daniel (2004:199.v.1) nomeia e descreve
várias espécies, mas não cita aquelas empregadas pelos grupos indígenas em
sua alimentação. Apenas registra uma afirmação que ouviu junto a uma
sociedade e a emprega como um reforço à sua crítica ao emprego excessivo
da mão-de-obra indígena:
E os naturais do Brasil, e também alguns da África, dizem que os macacos
são gente, e que se disfarçam, não querendo falar para que os brancos não
os obriguem, como aos índios, a remar nas suas canoas.
O cultivo da Mandioca
Analisando sob outras perspectivas, é possível especular que a opção
das sociedades nativas pelo cultivo da mandioca, em detrimento de outros
alimentos, pode ter levado em conta outras vantagens além do aproveitamento
quase total da planta. Dados atuais de Johnson (1982), envolvendo uma roça
Machiguenga apontam para outros dois benefícios: o primeiro que, durante os
três anos de maior produtividade de uma roça, a mandioca atinge uma
produção de 10 milhões de kilocalorias por hectare, enquanto o milho alcança
uma produção de 4,7 milhões de kilocalorias por hectare. O segundo beneficio
é devido ao fato de que, com a colheita do milho, são obtidos cerca de 1500
kilocalorias de comida por hora de trabalho, ao passo que, com a mandioca,
são alcançados mais de 4 000 kilocalorias por hora de trabalho. Além disso, a
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 45
A coleta
A coleta, considerada aqui conforme Posey (1986:19) a caracterizou,
ou seja, a obtenção de plantas silvestres, animais e produtos animais, bem
como diversos elementos inertes adequados à alimentação, ao uso de
matérias-primas manufatureiras e remédios, é parte importante da vida das
sociedades indígenas.
Os insetos são essenciais não apenas na ciclagem de nutrientes, mas
também são apreciados por diversos grupos indígenas como fonte de proteína
e gordura. Larvas de inseto têm importância na composição alimentar: as que
crescem na palmeira de babaçu Pachymerus cardo e a Cariobruchus, além das
espécies que crescem em troncos em decomposição, como a Rhunchophorus
palmarum e a Rhina barbirostris são consumidas diretamente ou em sopas
ainda hoje. As formigas Atta também são consumidas em grande quantidade
na época da revoada.
As abelhas, principalmente as da família Apidae subfamília Meliponinae
que não possuem ferrão, são apreciadas pelo mel, larvas e a cera. Padre
Acuña (1865:197) chega a se surpreender com o fato de que o mel era obtido
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 47
em quantidades tais que permitia, não somente seu uso medicinal, mas
também “sustentando-se com elle por ser de agradável gosto”.
Para a pesca, as técnicas mais comuns, registradas pelos cronistas,
são o arco e a flecha e o uso de Timbó. Nesta modalidade de pesca, os cipós
timbó são cortados em pedaços e batidos na água com um pedaço de madeira
dura, liberando, nesse processo, uma substância que asfixia os peixes e os faz
boiar, tornando a obtenção do pescado muito simples. Os peixes mais
procurados são a piranha, o pacu, o piau, o surubim, o pirarucu e o mandi.
Os rios também eram procurados para a caça do peixe-boi e da
tartaruga. Padre Acuña (1865:190-2) descreve as formas de obtenção do
peixe-boi:
Conserva mui pouco o fôlego debaixo d’água (...) os índios, logo que o vêm,
seguem nas canoas pequenas, e esperam que elle, querendo respirar, deite
fora a cabeça, e, cravando-o com arpões, que fazem de conchas, lhe tiram a
vida
7
Meggers (1987) e Lathrap (1970) iniciaram um debate sobre a possibilidade, ou não, da
Amazônia suprir de alimentos grandes populações. Analisando aspectos do solo, regime de
chuvas, tipos de águas, fertilidade do solo, biomassas e capacidades de nutrição, chegaram a
conclusões diametralmente opostas. A presente análise se abstém desta discussão pelo fato de
levar em consideração apenas as possibilidades de determinados grupos, em uma região
específica e um período de tempo delimitado, conseguirem manter a si mesmos e a grupos de
colonizadores europeus com fartura de alimentos.
8
Sahlins. 1977:10.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
II. POPULAÇÕES INDÍGENAS DOS RIOS MADEIRA E
TAPAJÓS
Todo este mundo novo (chamemos-lhe assim) está habitado de bárbaros em
distinctas províncias e nações; as de que posso dar fé, nomeando-as com os
seus nomes, e designando-lhes seus districtos .... passam de 150, todas de
línguas diferentes, tão dilatadas e povoadas (Acuña, 1865:190-192)
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 51
e volta a Belém, feita pelo capitão português Pedro Teixeira durante a vigência
da União Ibérica (1580-1640). Ambos autores são jesuítas: Alonso de Rojas
que deixou a Relação do descobrimento do rio das Amazonas, hoje S.
Francisco de Quito e declaração do mapa onde está pintado (In: Carvajal,
Rojas & Acuña, 1941), e Cristóbal de Acuña, que redigiu o Novo
Descobrimento do Grande Rio das Amazonas (In: Carvajal, Rojas & Acuña,
1941).
Esta viagem de Pedro Teixeira foi executada após a chegada de dois
leigos franciscanos vindos de Quito a Belém. Domingos de Brieva e Andrés de
Toledo haviam deixado a expedição de Juan de Palacios aos Encabellado e,
em outubro de 1636, iniciaram a navegação pelo rio Amazonas. Conforme
Maldonado (1960:75), ao atingirem Gurupá, no mês de fevereiro de 1637, os
religiosos causaram grande surpresa aos habitantes da fortaleza. Como
resposta a esta expedição, os portugueses prontamente organizaram uma
empresa para, em companhia de um destes missionários espanhóis, refazerem
a viagem e alcançarem Quito navegando pelo Amazonas.
Em seus registros desta viagem, Rojas (Carvajal, Rojas & Acuña
1941:108) comenta a numerosa população que habita as margens do
Amazonas, afirmando que:
Todos são idólatras, que adoram deuses falsos. Não tem ritos nem
ceremônias para venerá-los, nem templos para seus ídolos, nem sacerdotes.
Temem aos feiticeiros, aos quais consultam, e estes ao Demônio, de quem
recebem oráculos, e com embustes enganam os miseráveis índios.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 53
Estes agasalharam aos religiosos e soldados e por sinais lhes disseram que
fossem com eles por um rio acima, em cuja margem encontraram uma
grande aldeia. Meteram-nos em uma casa muito grande, com madeiras
lavradas, forradas de mantas de algodão, entretecidas de fios de diversas
côres, onde puzeram uma rede para qual dos seus hóspedes, feita de folhas
de palmeira e bordada de diversas cores, e lhes deram para comer caça,
aves e peixes. Nesta aldeia viram os soldados caveiras de homens,
arcabuzes, pistolas e camisas de pano. Disto deram depois notícia aos
portuguêses e lhes disseram que aqueles índios tinham morto alguns
holandêses que chegaram até áquelas províncias, sendo deles aquelas
caveiras e armas. (Carvajal, Rojas & Acuña 1941:113)
1
Dos mil escravos prometidos, os Tapajó conseguiram reunir apenas 200, pois supostamente
durante o ataque português muitos teriam fugido. (Acuña, 1941:274)
2
Porro (1995:60-63) relaciona esta ação de Bento Maciel com a contínua necessidade de mão-de-
obra dos moradores do Pará, a incapacidade de condições financeiras destes para obterem
escravos negros e o baixo rendimento das expedições de apresamento.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 57
A numerosa população
Diante das promissoras notícias a respeito desta população nativa,
multiplicaram-se as expedições de apresamento de índios para servirem de
mão-de-obra. Como afirmou Betendorf (1909:114), no ano de 1658, a colônia
contou com o descimento de “mais de dois mil índios, entre escravos e livres”
mas, “nem por isso ficaram jamais satisfeitos seus moradores”.
Os colonos do Estado do Maranhão e Grão-Pará buscavam
3
incessantemente por escravos , primeiramente em locais mais próximos, como
as margens do rio Tocantins (Leite, 1943:337), e depois, como resultado do
despovoamento desta área (Fausto, 2001), dirigindo suas ações para locais
mais distantes, como as margens dos rios Tapajós, onde as empresas
preadoras ainda não haviam atingido as populações com tanta intensidade.
Quanto aos habitantes das margens do rio Madeira, e Amoroso (1991 e
2002:297-310) relacionam a relativa manutenção de seus contingentes com os
interesses da Coroa nas minas do Mato Grosso e Goiás. Temerosa de que
este rio servisse como escoadouro do contrabando de metais provenientes
destas minas, a Coroa teria resguardado a população indígena de ações
preadoras ou repressivas mais efetivas, impedindo por meio de ordem régia, de
1733, o trânsito pelo rio Madeira e, ainda, colaborado na difusão da imagem de
índios bravos habitando. Apesar de todas estas ações serem parte de uma
estratégia para intimidar aventureiros e evitar a livre circulação por esta região,
diminuindo os riscos de perdas por tráfico de metais preciosos, elas acabaram
por permitir que as sociedades nativas adiassem os contatos mais intensos
com a sociedade colonial.
3
Como afirmou Betendorf (1909:114), no ano de 1658, a colônia contou com o descimento de
“mais de dois mil índios, entre escravos e livres” mas, “nem por isso ficaram jamais satisfeitos seus
moradores”.
Quinze dias após embarcar no rio começaram a ver povoações e daí por
diante não havia um único dia em que não vissem alguma; geralmente viam
muitas num mesmo dia. Viram cidades nas quais [contaram] trezentas
cabanas (...) nas quais moravam muitas famílias. (...) Calcularam que uma
das aldeias tinha mais de 150 mil almas
4
Análises pontuais sobre aspectos relativos à mão-de-obra escrava na Amazônia estão presentes
em artigo de Flávio dos Santos Gomes (2002), em especial a escravidão dos negros. Apresenta
grande número de fontes sobre esta temática.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 61
LOCALIZAÇÃO ETNÔNIMO
Oanta, Guajari, Purupuru, Guarece, Capaná, Jãoen,
Rio Madeira – parte Norte
Pama, Cajaripuná e Guarajú;
5
A respeito destas informações, deixadas por Padre Rodrigues, Menéndez (1981 e 1982) faz
algumas considerações, procurando relacionar os grupos e os nomes atuais dos rios com dados de
outras fontes.
ÁREA
RELIGIOSO RIO TAPAJÓS RIO MADEIRA
INTERMEDIÁRIA
Patuarana,
Iruri, Onikoré,
P. João Felipe Tapajó e Ururucu, Tupinambarana,
Aripuanã, Parapixâna
Betendorf Carossiraz, Quaxinaz Maraguaze, Andiraze,
e Torerizes
Curiato e Abacaxi
48 etnônimos, 2 para
P. Bartolomeu de
aldeia dos Andirá e 8
Rodrigues (1714)
para a aldeia dos 27 etnônimos
(ver Tabela 2.1)
Tupinambarana
Margem direita:
Mawé, Urupá,
Tapacoraria ou
Tapacora
P. João de São José Margem esquerda:
(1762-3) Jakareguá, Sapupé,
Surinâna e Periquito.
Cita ainda, os
Arapiyú, Muriva e
Amanaju
Mura, Orupa, Arara,
Sapupé, Comany, Marupá, Pama, Tura,
Além dos já citados
Urupá e Mawé; Tocuma, Mami,
P. Monteiro Noronha por São José, nomeia
Aitouaria, Acaraiuara, Cauaripuna, Yuqui,
(1768) os Carary, Yavaim e
Brauara, Curitia e Matanauí ou
Uarapiranga.
Muturucu. Matanawi e
Yauretiuara.
Tabela 2.2. Localização dos grupos indígenas na região dos rios Madeira e
Tapajós, durante os séculos XVII e XVIII, conforme dados dos religiosos João
Felipe Betendorf, Samuel Fritz, Bartolomeu Rodrigues e Monteiro Noronha.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 63
Chegou uma tarde ao porto da aldêa com grande numero de canôas, e sem
desembarcar alma viva mandou um mensageiro dar parte ao principal
Mamoriny como era chegado o principal Paraparixana, e assim, estando
todos dentro de suas canoas, sem se bullir em couza alguma, pela manhã
tornou a mandar segundo recado, pedindo licença de sair para terra. Estes
recados todos trazia logo o principal missionários aos padres pedindo-lhes
seu consetimento; com elle finalmente começaram a vir para a aldêa com
grande numero de índios carregados de mil curiosidades, de assentos, de
bordões, tapiocas e beijus e estes eram os mimos que o principal
Paraparixana mandava adiante de si a todos os moradores daquella aldêa.
Atráz destes ia uma tropa de mancebos pintados a mil maravilhas, os quaes
andavam dous em dous, com grande modéstia e compostura, e, levando
seus arcos e fréchas pela mão, se encaminharam para a casa do Paricá;
após delles começaram a vir os moradores da aldêa do Paraparixana, os
quaes traziam nas mãos umas varas rachadas e abertas pela ponta, em
signal que tinham vassallos e eram fidalgos entre os seus e por isso também
cada qual delles levava uns pagens adiante de si com arcos e fréchas pelas
mãos; finalmente ao cabo de todos estes fidalgos vinha o Paraparixana,
vestido de seda verde, com um terçado arvorade em a mão, e assim como
levava diante de si grande número de pagens, também o seguia em ordem
uma grande multidão de vassallos.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 65
Passou toda esta procissão pela porta de residência dos padres e não
obstante estarem lá elles e o principal Mamoriny que lhes estava explicando
os passos daquela entrada e os nomes dos principaes, comtudo nenhum
delles se atreveu a fallar nem a olhar para elles, e assim foram á caza do
Paricá, onde se lhes armaram as redes e os jacázes, e assentados aqui
todos pedio o principal Mamoriny licença aos padres de os ir visitar, assim
como elle foi foram também em sua companhia os mais principaes da aldêa,
e, assentados uns defronte dos outros, mandou logo o principal Paraparixana
dizer ao Padre João Ângelo que elle era chegado, e que elle desejava
summamente que viesse. Elle logo veiu com todo o seu acompanhamento á
porta da casa da residência, porém elle só entrou dentro fez-lhe a visita, e
dahi tornou outra vez para a casa do Paricá, onde de todas as casas da aldêa
lhe foi um presente para o jantar, e jantaram alegremente todos, porém sem
vinhaça alguma, e ahi estiveram quatro ou cinco dias, sem nunca entrarem
em casas daquella aldêa, não obstante que tinham ahi seus parentes mais
chegados por estarem casados uns com os outros; finalmente quando se
quizeram ir para a canoa, então foram correndo todos juntos, por todas as
casas donde as mulheres lhes davam seus mimos para a viagem.
que os Iruri organizavam para ofertar, conforme a percepção dos jesuítas como
Betendorf (1909:465), bebidas e alimentos aos demônios que os molestavam.
Apesar de valorizarem as informações a respeito dos Iruri, e registrá-
las em sua Chronica, Betendorf e outras fontes disponíveis não informam sobre
a língua falada por este grupo. Como afirmado inicialmente, Loukotka
(1968:165-166) classifica o Iruri como uma língua isolada.
Ao cumprir sua obrigação institucional de escrever relatando suas
experiências na catequese e prestando contas aos seus superiores do
andamento de suas obras, os missionários acabaram por tornar-se fontes, não
somente sobre a ação, neste caso, jesuítica, mas igualmente, em seus
documentos, é possível acessar informações sobre os grupos Tapajó,
Tupinambarana e Iruri, ao longo de um período que abrange desde as
primeiras missões, no ano de 1661, até a expulsão da Companhia de Jesus em
1757.
Desta forma, uma das primeiras informações que estes registros dos
religiosos permitem acessar, diz respeito ao fato de numerosas populações
estarem habitando tais margens. Do mesmo modo, que os espaços vazios
deixados por parcelas dizimadas, ou que fugiam para locais distantes, eram
posteriormente ocupados por populações vindas do interior.
Por outro lado, apesar da movimentação gerada pela coleta das
“drogas do sertão” e das tropas de resgate, os aldeamentos jesuíticos foram a
única presença branca constante na área Madeira-Tapajós. E mesmo
concordando com Fausto (2001:47), quanto ao fato destes aldeamentos
partilharem da lógica do deslocamento de populações inteiras e constituírem-se
em locais de fácil propagação de epidemias, é necessário levar em conta que
as ações dos missionários tiveram um efeito menos efetivo na diminuição das
populações ribeirinhas que aqueles provocados pelos descimentos e tropas de
resgate.
Os custos das buscas por novos escravos indígenas aumentavam, na
mesma proporção em que eram maiores as distâncias a serem percorridas.
Portanto as sociedades nativas, cujos territórios estavam próximos das áreas
de colonização, como é o caso daquelas assentadas no rio Tocantins, sofreram
primeiro e mais intensamente a ação dos preadores. Somente mais tarde,
quando as populações destes locais tornaram-se menos abundantes ou de
difícil apresamento, é que as viagens em busca de escravos em rios mais
distantes, como o Madeira, passaram a ser empreendidas com maior
freqüência.
A partir das informações reunidas neste capítulo, é possível antever um
quadro no qual são marcantes as referências a uma grande população
habitando as margens dos rios Madeira e Tapajós. Contudo, ao longo da
situação colonial, as transformações ocorridas nesta região tiveram drásticas
conseqüências para a população indígena e lhe imprimiram grande mobilidade
no território. É possível concordar com Menéndez (Cunha & Castro, 1992:290),
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 67
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1
Serafim Leite (1943, v. IV, p. 333-359.) arrola 63 expedições, realizadas entre 1607 e 1756,
fornecendo o nome dos missionários, sua nacionalidade e alguns dados adicionais.
2
Litterae P. Gasparis Mish, ex Para in América ad Flumen Amazonum, 28 Julii 1662. In:Leite, 1943,
t. III, p. 358.
3
Betendorf (1909:168), ao narrar suas atividades na aldeia, registrou que ”alguns já haviam sido
batizados antes pelos padres Thomé Ribeiro e Gaspar Misseh que por ali estiveram de passagem”.
4
Este episódio corrobora a hipótese de que os Tapajó tivessem uma língua própria visto que,
apesar de Betendorf ter permanecido seis meses aprendendo a língua geral antes de ir ao Tapajós
e, principalmente, pelo fato de que o irmão Teixeira foi recomendado por Padre Vieira como um
língua bastante capaz, ambos tiveram dificuldade em comunicar-se com o grupo.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 79
5
Em maio de 1661 colonos portugueses organizaram um levante em São Luis do Maranhão contra
os jesuítas, os quais eram considerados como empecilhos ao acesso à mão-de-obra indígena.
Padre Antonio Vieira e a maioria dos missionários da Companhia de Jesus foram presos e
embarcados de volta para Portugal.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 81
6
Para Nimuendajú (1949:96-97) parece evidente que ambos grupos não falavam Tupi. Sua
argumentação se baseia em vários pontos: primeiro no fato de que Betendorf dominava o Tupi e,
portanto, não necessitaria de um tradutor ou de um catecismo específico; de que Heriarte havia
salientado a diferença entre as línguas faladas pelos Tupinambaranas, próximas à língua geral, e a
falada entre os Orucucuzes e Condurizes. Finalmente, Nimuendajú afirmou que três vocábulos
atribuídos aos Tapajó não encontram explicação em Tupi: são os nomes próprios do grupo, da
liderança Orucurá e do diabo, Aura.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 83
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 85
7
Apesar do silêncio de Betendorf, alguns dos grupos que compartilhavam este espaço em 1678,
então chamado de Aldeia de Todos os Santos, são citados na Epistolae Maragnonenses como
quatro nações principais das línguas “Aretuses, Arapiunses e Tapiruenses ou Serranos” (da Serra
de Gurupatuba). Bras. 26, 53. In Leite, 1943:360. Nenhuma destas quatro línguas recebeu
classificação lingüística no mapa etno-histórico de Curt Nimuendajú (1987), sendo consideradas
por este como de filiação desconhecida.
8
Como lembra Schmitz (1999:404) “Os aldeamentos tinham uma pesada servidão: eles não viviam
exclusivamente para si, como as reduções da Província do Paraguai, mas tinham de fornecer mão-
de-obra para os colonos e efetivos militares para o governo.”
São muito populosas estas missões castelhanas, por não terem as pensões
das portuguesas na repartição dos índios aos brancos, e ausências de suas
casas. Vivem pois muito descansados, com muita paz e sossego, sem os
inconvenientes, distúrbios, e diminuição dos índios do domínio lusitano; e por
isso descem sem dificuldade muitos outros do gentilismo, porque não tem a
remora de haver ir servir aos brancos
João Maria, sem nunca poder effectuar o que com tanto zelo procurava, sem
embargo de ter já ajuntado o que lhe parecia necessário para os descer.
(Betendorf, 1909:673)
9
Após 1758 passou a ser chamada Vila Franca. Ainda, conforme Serafim Leite (1943 t.III:363), a
aldeia de Santo Inácio, no Tapajós, deriva da Aldeia de Tupinambaranas. O autor acredita que a
mudança deve ter ocorrido por volta de 1737, informação apresentada antes por Padre José de
Morais (1860:509-510).
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 93
10
Conforme Betendorf (1909:36) o Padre Antonio da Fonseca, mudou novamente o local da Aldeia
dos Tupinambarana mais “para riba, e acrescentou com índios novos chamados Pataruanas,
fazendo sua residência com egreja e casas de Santo Ignácio”.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 95
Essa ação dos preadores repercutiu em queixas, tanto por parte dos
Iruri, quanto por parte dos missionários. Temporariamente, os jesuítas
decidiram abandonar esta missão no interior do rio Madeira (Leite, 1943
t.III:393), para concentrarem atenção na Aldeia dos Tupinambarana e na
implantação da Aldeia dos Abacaxi, a qual, somente no ano de 1696, recebeu
residência e teve como seu primeiro missionário o Padre João da Silva.
Andirazes, parte do rio das Amazonas, vai dar pelos Curiatós”, na expectativa
de fugirem da “praga dos mosquitos” que os assolava.
E é neste local que chega o Padre Antonio da Fonseca, enviado como
primeiro missionário de assento, no final do ano de 1688. O principal dos
Tupinambarana era João Cumarú, “índio afamado nas guerras, e por essa
razão feito Capitão Mór dos seus”. Sem informar a causa, Betendorf (1909:36-7
e 476) afirma que a localização da Aldeia foi transferida novamente, desta vez
conduzida pelo Padre Fonseca, “mais para riba, e acrescentou com índios
novos chamados Pataruanas, fazendo sua residência com egreja e casas de
Santo Ignácio” e, mais tarde, atendendo também aos Andirá.
Por volta de 1693, o Padre Antonio da Fonseca ainda permanecia
como missionário dos Tupinambarana e, assim como havia acontecido com
Betendorf durante o período que esteve à frente da Aldeia dos Tapajó, ele era
acompanhado, não por outro sujeito da Companhia de Jesus, mas sim por
Sebastião Vieira, homem branco que segundo Betendorf (1909:498) era muito
versado em língua geral.
Com ajuda desse seu companheiro, Padre Antonio havia descido mais
pessoas, construído casas e “mandado fabricar todo o muro em o sitio mais
alto de um outeiro, que olhava para um bello e espaçoso lago, pelo qual, rio
abaixo se vai aos Curiatos, e rio para riba aos Andirazes e Maraguazes e,
atravessando por um igarapé, ao rio das Amazonas” (Betendorf, 1909:498). A
Aldeia estava instalada em um sítio que dispunha de caça, de peixes, de áreas
onde era cultivada a mandioca e contava, ainda, com um curral de mil
tartarugas, construído em suas proximidades.
Somente por volta do ano de 1697, o Padre Antonio da Fonseca foi
substituído por outro missionário, o Padre João Justo Luca (Betendorf,
1909:610). E, no ano de 1723, o missionário da Aldeia de Tupinambarana
passou a ser o Padre Manuel dos Reis.
Além desta Aldeia, outras ações eram desenvolvidas pelos
missionários jesuítas às margens do rio Madeira. Em carta datada de 1714, o
Padre Bartolomeu Rodrigues (Leite, 1943 t. III:394), então missionário da
Aldeia de Tupinambarana, presta informações sobre a população da área,
levantando os grupos que a habitam, as aldeias e os descimentos feitos. Entre
todos os dados, é interessante salientar que o jesuíta faz referência à
densidade com que a região é povoada:
Daqui para cima se não sabe de mais Gentio, não é porque não o haja;
porque, assim como até aqui tudo é povoado de Gentio, será verossímil que
o seja também para cima. Abacaxi, Chichirinins, Jaguaretus, Purerus,
Curupus e Manis ocupam estas nações o espaço de dois meses de viagem,
donde se poderá inferir o quanto são populosas. Entra aqui o Rio Ipitiá,
povoado todo da nação Arara, tão numerosa, que igualam os que tem
penetrado o seu sertão, às folhas do mato em que habitam. Depois os Toras
ou Toratoraris, que são em tanta multidão, que as mais nações lhe chamam
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PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
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Já, em 1723, havia um grupo de três Aldeias dos Abacaxi ligadas entre
si, e chamadas Nossa Senhora, São Francisco Xavier e São Lourenço, onde
atendia o Padre João Sampaio. A respeito da atuação do Padre Sampaio, Leite
(1943 t.III:388) afirma que primeiro ele estabeleceu-se na Aldeia de Cunamã
para, mais tarde, mudá-la para os Abacaxi onde “ergueu casa de sobrado,
cômoda, e uma famosa igreja. Tinha grandes malocas à moda indígena, onde
moravam 100 pessoas em cada qual” .
A Aldeia sofreu diversas mudanças ao longo dos anos. No Catálogo,
ela aparece com vários nomes diferentes: no ano de 1730 está registrada a
Aldeia de Canumã com 425 habitantes, e Aldeia dos Abacaxi com 932
habitantes; no catálogo de 1745 é citada a Aldeia de Santa Cruz e, conforme
Leite (1943 t.III:388), desta data em diante ambos nomes, Santa Cruz e
Abacaxi, alternam-se sem que ambas apareçam ao mesmo tempo. Em 1757
ela passa a ser a Vila de Serpa.
Com base nestes dados esparsos, é possível montar uma tabela da
população de Aldeias do rio Madeira (Tabela 3.1) e do rio Tapajós (Tabela 3.2).
1558 25 0 1720 - 64
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 101
1
Compreendo cultura como Viveiros de Castro (2002:209) definiu, ou seja, que “Cultura não é um
sistema de crenças, mas antes – já que deve ser algo – um conjunto de estruturações potenciais
de experiência, capaz de suportar conteúdos tradicionais variados e de absorver novos: ela é um
dispositivo culturante ou constituinte de processamento de crenças.”
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 107
2
Como afirmou Sahlins (2004:450), a continuidade não é, necessariamente, sinônimo de
imobilidade, assim como “a mais rigorosa continuidade pode consistir da lógica da mudança
cultural.”
3
Daniel (2004:327. v.1) registra o caso afirmando que “um missionário que com eles viveu muitos
anos, e tão incansável, que não faltava de manhã e de tarde a doutrinar os seus neófitos, quando
por vezes os examinava do seu progresso, ficava tão desconsolado, que exclamava perdidimus
oleum et operam!” Já em outra passagem (Daniel, 2004:66.v.2) o jesuíta repete a expressão com
pequena variação: perdere oleum, et operam, ou seja, perder óleo e trabalho.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 109
evidenciam que, na maior parte das aldeias criadas pelos missionários, assim
como nas missões itinerantes, os grupos contatados não se abstiveram de
participar dos rituais cristãos, de conviver em aldeias seguindo a rotina
negociada pelos jesuítas ou, até mesmo, de professarem a fé cristã, de
aceitarem o batismo e de confessarem-se.
Os elogios à maneira como os diversos grupos aceitavam a presença
do missionário e participavam das doutrinações e catequese são numerosos, e
entre muitos outros, é possível citar Betendorf (1909:38, 161, 464, 466 e 467).
Mas também são freqüentes os registros de queixas quanto à fé morta, e
pouco firme dos indígenas catequizados, como em Daniel (2004:327. v.1).
Também é encontrado o mesmo juízo em Nóbrega (1556-57:II,322); Gandavo
(1576:122 e 142); Vasconcelos (1663:I, 103) e Varnhagen (1854:51) entre
outros.
Esta relação de algumas populações indígenas com a religião cristã,
apresentada nos relatos de manifestações de profunda fé e outros de pouca
perseverança e credulidade, perturbava os missionários, tendo inspirado
Antonio Vieira (1957, v. 5:.205-255) a inserir, no Sermão do Espírito Santo, a
comparação da doutrina da fé nas diversas nações com as estátuas de
4
mármore e as de murta .
No caso específico dos grupos aqui analisados, desperta atenção a
transformação que ocorreu com a compreensão da figura do missionário e dos
poderes a ele atribuídos. Entre as grandes recepções amistosas feitas para o
padre Betendorf, e a decepção que permitiu afirmar que foi perdido o óleo e o
trabalho executado junto a estas populações, estão registros deixados por
missionários que permitem acompanhar esta transformação.
4
Em Viveiros de Castro (2002:183-184) é feita uma análise deste sermão, enfocando o caso dos
Tupinambá e a inconstância, ou constância, atribuída a este grupo.
5
Ver capítulo 2 a respeito das hipóteses relativas às migrações deste grupo. A documentação
consultada sugere que este grupo habitava o atual estado brasileiro de Pernambuco e, na tentativa
de evitar o contato mais intenso com os portugueses, migrou, chegando a alcançar a Cordilheira
dos Andes. Neste local, desentendimentos com colonizadores espanhóis teriam motivado o grupo
a novamente se deslocar e povoar uma ilha, localizada no médio rio Amazonas, onde, então,
teriam iniciado os contatos com os missionários jesuítas aceitando aldeamentos.
6
Um exemplo destes tratados foi formalizado entre os missionários jesuítas e o grupo Uruati, os
registros feitos por Betendorf (1909:286) incluem detalhadamente as condições e cláusulas deste
acordo.
7
Como lembra Viveiros de Castro (2002:206-7), além dos benefícios econômicos, que poderiam
advir de genros e cunhados que se apresentavam como senhores de tantos bens, outros aspectos
não-materiais, como a honra, eram considerados de valor primordial.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 113
acudia muita gente assim de índios como de índias, dentro de três para quatro
dias ficou toda a obra feita e coberta”.
Esta aceitação da presença do inaciano, e da implementação de suas
obras, obviamente não impedia que o grupo continuasse a compreender o
mundo a partir de seus próprios parâmetros. Ciente disso, o próprio Betendorf
(1909:169) procurou aproximar as vivências do grupo às interpretações cristãs:
Á noite antecedente da festa em que se havia de por o altar, houve uns
trovões, relâmpagos e coriscos, tão terríveis que todos os índios sahiram
para fora das casas, e parecia que se ia acabando o mundo. Disseram-me
depois que tinham visto em o Céu uma mão com um lenço branco que ia
limpando o sangue derramado pelo Céo; em dia seguinte lhes fiz uma pratica
sobre a Conceição da Immaculada Virgem Nossa Senhora, e disse que este
signal foi alguma cousa, foi prognóstico de um grande castigo que a Senhora
havia de remediar.
8
Todavia, anos mais tarde, João Daniel (2004:284. v.1) ainda relata ter encontrado o mesmo tipo
de casamento e de costumes vigendo entre os grupos, mesmo aqueles aldeados:”Contudo vivem
os casados de modo ordinário só com suas mulheres, e têm só uma pela maior parte: mas os seus
caciques ou principais têm quantas querem, o que não é pequeno impedimento para abraçarem a
nossa Santa Fé, por se virem obrigados a ficar só com uma.”
Com o apoio do Principal Roque, que optou por casar-se com Maria
Moacara, “princeza desde seus antepassados, de todos os Tapajoz”, Betendorf
(1909:172) pode interferir até mesmo na situação da mãe de Maria,
recomendando que esta permanecesse no estado de “viúva honrada” ao invés
de viver com um homem mais jovem que ela.
Apesar de reconhecer que não existem dados que possam confirmar a
extensão e duração desta decisão dos Tapajó de adotar a monogamia, é
importante notar que outros grupos, como é o caso daqueles do Cabo do
Norte, reagiram de forma diferente a estas propostas dos jesuítas. Por volta de
1689, o Padre Antonio Pereira foi enviado para a ilha de Camunixary, onde, ao
invés da negociação, ou mesmo da recusa através da fuga, parcelas dos
grupos aldeados optaram por matar ao missionário e seus ajudantes que
9
haviam tentado impedir a prática das bebedeiras e da poligamia pelo grupo.
Também mudanças de assentamento foram realizadas por sugestão
dos religiosos. Apesar destas transferências exigirem que o grupo ocupasse
áreas que, por vezes, diferiam em muito de seus ambientes anteriores e
necessitassem distanciamento de seus sítios sagrados, elas foram executadas.
Este foi o caso dos Tupinambarana, que localizavam-se em uma ilha mas,
devido a uma praga de mosquitos foram aconselhados a trasladarem-se.
Esta situação, já referida anteriormente quando, antes de aceitarem a
mudança de sitio, o grupo buscou negociar com o missionário a expulsão dos
mosquitos, evidencia que aceitavam a sugestão do missionário e lhe atribuíam
prestígio. Mas, ao mesmo tempo, é clara a forma como os Tupinambarana
compreendiam o missionário. Seus poderes não estavam restritos aos homens
e, talvez ele pudesse, a exemplo de seus xamãs, agir também sobre a
natureza.
Essa disparidade de interpretações sobre o meio ambiente surpreendia
tanto ao missionário, quanto ao indígena. Como exemplo, a própria Chronica
(1909:318) apresenta o relato de um líder Teremembé que expressou sua
9
Betendorf (1909: 430) revela que “O motivo que tiveram para se atreverem a uma tão horrenda
acção, foi o ódio á nossa santa fé e pregação evangélica, com que lhe tiravam seus excessos em
beber, seus amancebamentos e ritos gentílicos, e esta se presume ter sido a mesma causa que os
induziu a tirar a vida até dos domésticos que acompanhavam os padres.”
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 117
discordância com a forma como o padre rendia louvores ao céu. Para esta
liderança
nicatui ibaca, ibinho, ycatú, quer dizer: Céo, não presta para nada, só a terra
sim, esta é boa. Mas disse aquillo como bárbaro, porque como do Céo lhe
vinham e abrazavam calmas, e a chuva que o molhava, achava que não
prestava, como a terra lhe dava fructas, peixe, carne, e outros mantimentos,
que só esta era boa.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 119
A descoberta deste corpo foi feita pelo Padre Antonio Pereira que,
prontamente, ordenou que fosse queimada a casa onde ele era guardado.
Betendorf (1909:354) revela os resultados desta ação, bem como a
responsabilidade dele próprio diante do caso, afirmando que:
Sentiram os índios Tapajoz isso por extremo, porém vendo que já não tinha
remédio, aquietaram-se por medo dos brancos que já conheciam tomar em
bem o que o padre missionário tinha obrado. Folguei eu muito quando me
chegou a notícia daquella tão generosa ação, porque desde o anno de 1661,
em que eu tinha sido missionário, primeiro entre os Tapajoz e feito sabedor
daquelle corpo mirrado, sempre tive desejo de consumil-o, e não o fiz, porém,
por não ter tempo commodo de o poder executar, pois estava por então toda
aquella aldêa povoadíssima de índios, que não convinha alterar logo em
aquelles primeiros princípios.
Monhangarypy, mas havia optado por não tomar nenhuma atitude devido ao
grande número de habitantes indígenas no aldeamento naquela ocasião. O
jesuíta reconheceu a importância atribuída ao corpo guardado, porém temia
uma reação do grupo e, sem contar com o apoio de militares ou de um forte,
decidiu-se por relevar o culto. Nesta situação citada, é possível identificar que,
ciente de suas limitações, a evangelização dos indígenas também custou aos
missionários uma parcela de flexibilidade.
Entretanto, esta não é a única situação em que os jesuítas precisaram
relevar ou serem condescendentes com as populações nativas. Desde a
primeira missão no rio Amazonas e Tapajós, Betendorf (1909:156) já havia sido
instruído pelo Padre Antonio Vieira para que não usasse de extrema
severidade com os indígenas. Diante do conhecimento de que vários grupos
praticavam a poligamia, Vieira recomendava que fosse permitido a cada
homem escolher entre as suas esposas apenas uma, que seria a partir de
então reconhecida como xerimirêcó, e não que o Padre impusesse que apenas
a mais antiga fosse reconhecida como tal.
Mesmo nos aldeamentos jesuíticos, algumas cerimônias, como no caso
citado abaixo, continuavam sendo executadas
Os tapuias já domesticados, posto que tenham já alguma melhor economia,
também são muito dados a estas festas, e beberronias, não só nos dias dos
seus casamentos, mas em muitos outros, que celebram com rito primæ
classis. Um deles é o dia em que alguma filha sai da sua estufa e rigoroso
regimento da sua primeira regra, (...) porque tirada ou descida da cumeeira
da casa, depois de alguns dias nos quais se preparam as bebidas, e se
testam as igaçabas, ainda lhe resta outra ridícula cerimônia, indispensável, e
rigorosa cura, que é chamar-se logo o cirurgião ou barbeiro, oficial público,
para sangrar a dita rapariga, para o que vem preparadas as lancetas, que
algumas vezes são os mais agudos dentes de cotia (...) Chegado pois o
barbeiro onde está a padecente, puxa logo por um dente, e dá-lhe uma
sangria de pés a cabeça, porque a jarreta, e sarja desde a cabeça até os pés,
de sorte que fica toda sarjada, e ensangüentada; e por mais que lhe custe,
não há de dizer não quero, porque as velhas, que são as mestras da
cerimônia, lhe põe as ordenações às costas, para que não fique feia,
descorada, e mofina. (Daniel, 2004:286-287)
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
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PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 127
pagã), pelo que se via como envergonhada com as mais, o que já não lhe
sucedia depois de batizada.
chamam iguaçabas, e há iguaçaba que leva uma boa pipa” ; assim como:
“Pondo-se então algumas mais velhas mais graves ao pé das iguaçabas com
os copos, isto é cuias, na mão, vão enchendo bem as medidas a quantos vem
chegando, repartindo a cada um sem medida, e de quando em quando também
elas vão bebendo. (...) Enxutas as iguaçabas, cada um busca o seu caminho,
enquanto as velhas vão fazer nas roças novo provimento.” Betendorf
(1909:239), em sua Chronica, também relata esta influência das mulheres mais
velhas em um caso em que, após terem sido resgatados por uma tropa, a
mulher mais velha rebelou-se e capitaneou todos os indígenas na volta para
suas aldeias. Complementando, João Daniel (2004:269.v.1) afirma que
É bem verdade que os filhos obedecem com muita sujeição aos pais, os mais
moços aos mais velhos, tendo-lhes tanta veneração, e às velhas, que juram
nas suas palavras; e o que elas dizem são para eles oráculos, e evangelhos,
de sorte que ainda convertidos e domésticos mais depressa acreditam o que
lhes dizem as velhas do que o que lhes pregam os missionários. E se alguma
velha levantou a voz e diz morram os missionários, tenham estes paciência,
porque lhes será muito difícil escapar; e pelo contrário quando os índios
amotinados querem matar algum europeu, basta uma para os aquietar. Deste
grande respeito que tem aos velhos e velhas nasce o terem em grande
veneração os seus contos, que vão passando por tradição de uns aos outros,
como é notícia do dilúvio universal, e outras
10
Em Daniel (2004:304.v.1) é feita referência a “lei velha, isto é, dos seus antepassados”. Neste
capítulo, além de versar sobre idolatria, é descrito com detalhes todo o processo e que envolve a
guerra de vingança e a cerimônia de antropofagia.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 133
Estes pajés de assopros são dos mais embusteiros, posto que os chamem
pajé catu; porque fingindo que dão saúde aos doentes, todos recorrem a eles,
e os presenteiam, não só com ofertas, mas ainda com lhos entregarem suas
filhas para abusarem delas; uns pela fé cega que neles têm, crendo que têm
virtude superior e que falam com o diabo; outros lhas levam por não caírem
na sua indignação; e de todas abusa o pajé com a capa de as curar. (Daniel,
2004:338.v.1.)
É certo que muitas vezes saram os doentes sem darem parte aos seus
párocos; porque os mesmos doentes, não obstante o récipe dos seus pajés,
se aplicam a si mesmos alguns remédios; (Daniel, 2004:338.v.1)
Há diversas classes destes pajés aíbas; porque uns dizem que têm no seu
poder e à sua obediência os astros, sol, lua, estrelas, ventos, e tempestades;
outros, que têm domínio sobre os jacarés, e quando sucede a desgraça de
algum jacaré apanhar alguém, a ele se atribui a culpa. (Daniel,
2004:339.v.1.)
Mas isto não impedia que praticassem seu discurso, provocando ações
determinadas por parte dos jesuítas:
E já tem havido alguns missionários que, tendo notícia de algum destes
embusteiros nas suas missões, e sabendo o tempo, e horas em que ele com
estas gritarias e maranhas finge falar com o diabo, e que entre outras cousas
lhe descobre os segredos, e cousas ocultas, para também serem tidos por
adivinhos, acompanhados de alguns índios mais confidentes, de repente lhes
têm entrado pela porta dentro, e os têm apanhado in suffraganti, e então
fazendo-lhes os exorcismos com bons açoutes, desenganam aos mais índios
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 137
dos seus embustes; pois com todos eles não puderam adivinhar o que lhes
estava para vir por casa, para se livrarem das mãos, e castigo do padre.
(Daniel, 2004:339-340.v.1)
11
Como afirmado nas citações, o pajé era uma figura com características peculiares. Pompa
(2002:173) já havia apontado o fato de negarem os princípios da vida social ao negarem a troca
lingüística, mantendo o silêncio ou cantando; social, por serem solitários ou polígamos; alimentar,
por não produzirem, apenas recebe excedentes ou, ainda, por manterem-se errantes e
permanentemente cruzando os limites entre o humano e o divino.
12
Cunha (1999:229) sintetiza bem a tarefa que ele desempenha: “O trabalho do xamã, sua esfera
de competência, é essa tentativa de reconstrução do sentido, de estabelecer relações, encontrar
íntimas ligações. Não é, portanto, a coerência interna do discurso que se procura; sua consistência
advém antes do reforço mútuo dos planos em que se exprime, do habitus, em suma.”
de sorte que quanto maior empenho sentem em querer tirar alguma cousa
deles, tanto mais eles a encobrem (...) porque são tais nestes seus segredos,
ainda nas cousas que sucedem nas mesmas povoações, que não só é
impossível obrigá-los a descobri-las, mas antes ainda eles impossibilitam que
outros as declarem. (Daniel, 2004:302-303.v.1)
13
Viveiros de Castro, 2002:195.
14
Sahlins, 1997:126.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
ALMAS, CORPOS E ESPECIARIAS. A EXPANSÃO COLONIAL NOS RIOS TAPAJÓS E MADEIRA 139
Quanto às mulheres,
é a proporção seu dote e alfaias. Vem a ser uma cuia, um pequeno cabaço
de jequitaia, ou malagueta, que lhes serve de tempero em todos os seus
guisados; uma pequena panela, um ralador, que é um pedaço de tábua de
pau mole, em que embutem uns espinhos ou dentes para ralarem a raiz de
mandioca, ou algumas outras frutas de que fazem farinha; e um guturá, certo
gênero de cestos que tecem os maridos, em que metem todo este enxoval
quando vão de casa mudada de uma para outras partes (Daniel, 2004:274-
275. v.1)
matam, e com elas tecem vistosas grinaldas, com que ornam e enfeitam as
cabeças; outros fazem cíngulos, que cingem na cintura, e arremedam
bastantemente os atafais de furtacores dos almocreves, ao menos têm com
eles alguma semelhança, e os ditos jaezes são gala e ornato delicado só às
suas maiores festas, e solenes aparatos. (Daniel, 2004:278. v.1)
Em sua relação com o outro, morrer em mãos inimigas era uma honra
para o indivíduo e, ao mesmo tempo, uma afronta ao seu grupo. Assim, ao
admirar os dentes de um colar – ou os nomes, as flautas e as tatuagens – não
viam apenas seus feitos e a memória do grupo, mas, também, o seu futuro, na
certeza da desafronta que seguiria a cada morte provocada.
Tamanhos significados permaneciam vivos mesmo dentro dos
aldeamentos, mas, a execução dos cativos não era feita na presença do
missionário:
Porém os já domésticos não só não comem carne humana, mas já se
envergonham de tais adornos, posto que alguns tem havido que ainda depois
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
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sítios vão plantando algodão, e outras drogas), contudo nada menos; porque
ainda isso deixam perder. (Daniel, 2004:275. v.1)
justificada, não apenas por ser casada com a liderança deste grupo, mas,
também, pelo fato de que ”costumavam os índios além de seus principais
escolher uma mulher de maior nobreza, a qual consultam em tudo como um
oráculo, seguindo-a em seu parecer”.
16
Desfrutando deste prestígio, Maria Moacara recebia visita e presentes
do Governador e negociava pazes como representante, não apenas de seu
grupo mas, também, dos missionários:
veiu Maria Moacara, principaleza, com os principais e cavalleros, visitar-nos,
mostrando uma bella golla de seda toda, que o novo Governador lhe tinha
dado em a visita que lhe tinha feito; deu-me também parte de umas pazes
que ia fazer com umas nações, dizendo necessitava para isso de um frasco
de aguardente, o qual mandei dar logo, para esse fim. (Betendorf, 1909:261)
16
Maria Moacara havia sido casada com o principal dos Tapajós, cujo nome de batismo era Roque,
no ano de 1659. Conforme Leite (1943:360. tomo III), após a morte de seu marido, em 1669, ela já
vestia à portuguesa e, não queria casar com outro índio. Somente no ano de 1671, casou com
Rafael Gonçalves, português do Brasil em cerimônia feita pelo padre Pier Consalvi.
17
Conforme a suspeita do jesuíta, ao assumir o papel de missionário, Teixeira pode ter sido pouco
flexível, ou intolerante com os costumes, gerando antipatia e desejo do grupo em eliminá-lo. Mas,
não apenas este pode ter sido o motivo. Além da necessidade de tolerância para com os
indígenas, é preciso lembrar que a situação de Teixeira era bastante ambígua: ele era um homem
branco, ex-missionário e casado com uma índia Tapajó. Já havia sido expulso da aldeia por,
supostamente, desejar que sua esposa ocupasse um papel de liderança e, ao retornar, ocupar o
lugar de catequista.
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
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Novo e seus habitantes, estes eram vistos como desafios a serem apropriados
e conquistados; para os segundos, o europeu configurava-se antes como um
elemento a ser organizado em sua teia de relações, precisando ser acomodado
em seu sistema simbólico como parte de uma trama, cujas interações em
níveis espaciais e temporais, influíram de modo importante no desenrolar desta
situação colonial.
Esta compreensão demanda ultrapassar a lógica do proveito
adaptativo, ou da manutenção do sistema de interação dentro de limites
naturais de viabilidade, com objetivo de salientar a qualidade distintiva do
homem de viver em um mundo material de acordo com um esquema
significativo criado por si próprio. Neste caso, a relação do homem com o
ambiente passa a ser entendida como uma conformação às pressões
materiais, feitas a partir de um esquema simbólico definido que nunca é o único
possível, mas que indica que o valor funcional de cada elemento sempre será
relativo a um esquema cultural particular, e não uma resposta limitada por
contingências ou determinada por um campo circunscrito de alternativas.
Um exemplo destas variadas compreensões do meio ambiente pôde
ser demonstrado com relação às formas de obtenção de alimentos por parte
dos indígenas e dos europeus. A diversidade biológica da Amazônia oferecia
múltiplas possibilidades para a subsistência dos grupos que a habitavam. A
complexidade era o motivo da fartura de alimentos, pois sua subsistência era
garantida pela caça, pela pesca e por um cultivo agrícola baseado na
experiência e no uso de recursos disponíveis em cada período do ano. Porém,
esta capacidade potencial não foi devidamente aproveitada pelos portugueses,
devido a forte tendência manifestada de impor conhecimentos e práticas
adequadas a regiões da Europa, em um ambiente de características
absolutamente diversas, levando a crer que tal diversidade biológica fosse um
entrave à agricultura.
Como foi observado, realmente a caça e a pesca forneciam aos
Tupinambarana, Tapajó e Iruri a maior parte das proteínas de sua alimentação,
mas a base de suas dietas permaneceu sendo obtida através do cultivo da
mandioca brava em roças que, após serem utilizadas por três ou quatro anos
eram abandonadas. Sob o ponto de vista dos missionários, o método de corte
e queima, a periódica mudança do local das plantações, a preferência pela
mandioca e o desprezo pelo cultivo de cereais como o trigo, o milho e o arroz,
eram consideradas escolhas equivocadas, cujos resultados eram o número
maior de horas trabalhadas e uma dieta pobre.
É possível supor que estas opções agrícolas dos indígenas não foram
tomadas levando em conta apenas as condições de total aproveitamento da
mandioca ou o desconhecimento dos cereais. Estudos atuais demonstraram
que a produtividade da mandioca por hectare é capaz de superar a do milho,
de fornecer um número maior de quilocalorias de comida por hora de trabalho e
PESQUISAS, ANTROPOLOGIA
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