Direitos Humanos - Diversas Abordagens
Direitos Humanos - Diversas Abordagens
Direitos Humanos - Diversas Abordagens
Diversas Abordagens
ORGANIZAÇÃO
Aldenora Macedo
Luana Menezes Lira
Raphael Santos Lapa
Tarsila Flores
1ª Edição
Câmara Brasileira de Jovens Escritores
Esta obra está sob licença Creative
Commons CC BY-SA 4.0
Junho de 2016
Primeira Edição
Conselho Editorial
Diversas Abordagens
ORGANIZAÇÃO
Aldenora Macedo
Luana Menezes Lira
Raphael Santos Lapa
Tarsila Flores
Junho de 2016
Rio de Janeiro - Brasil
Prefácio
O ser humano tende a achar feio tudo aquilo que não é espelho, pois
a ideia da sua autoimagem é a mais antiga expressão do aceite à semelhança.
Como faço para viver em um mundo que é ao mesmo tempo acolhedor com
o meu semelhante e profundamente excludente com os diferentes de mim?
12. Analogias Assimétricas: uma breve análise acerca de argumentos populares contra
a defesa de Direitos Humanos��������������������������������������������������������������������������������������������229
Raphael Santos Lapa
A Organização����������������������������������������������������������������������������������������������������������������������245
Sobre as(os) autoras(es)�������������������������������������������������������������������������������������������������������247
Da Imagem da Capa�����������������������������������������������������������������������������������������������������������250
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Apresentação
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mentação. A DUDH, em seu processo histórico de formação, tem sofrido
diversas críticas principalmente a partir de uma noção de universalismo ad-
vindo de um processo de imposição de interesses de países do eixo norte-
-ocidental. O texto traz-nos à reflexão acerca da possibilidade de construção
de um outro fundamento para os Direitos Humanos. Uma nova fundamen-
tação que deve se consolidar em contextos diversos onde a emancipação so-
cial é central assim como a revalorização de uma sensibilidade que abarque os
múltiplos aspectos históricos e sociais não-hegemônicos.
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A análise ressalta o desenvolvimento da noção de empatia no período
europeu moderno a partir do crescimento de novos romances onde a persona-
gem central expunha seus sentimentos a ponto de despertar, em quem os leia,
certa identificação. Com isso fez-se possível o “colocar-se no lugar do outro”,
uma simpatia pela alteridade capaz de garantir direitos humanos mais básicos. A
despeito disso, conforme análise do autor, nem todas/os personagens eram per-
tencentes ao que se costuma chamar de “direitos do homem”. As mulheres, por
exemplo, encontraram resistências a sua inclusão em rol de garantia de direitos.
Reverbera-se até a atualidade essa distinção entre entes, ou seja, a despeito de uma
empatia pelo outro, essa empatia encontra ressalvas na definição de quem vem a
ser esse “semelhante” pelo qual podemos lutar por garantias de direitos.
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Ainda no que diz respeito à educação, o artigo seguinte trata de tema
pouco abordado, a despeito de sua grande importância. “Conhecendo um
pouco da história dos direitos humanos para reconhecer o direito à educa-
ção de surdos” é o capítulo de Simone Aparecida dos Santos Silva. É traçado
um perfil histórico da construção de direitos humanos como base teórica de
construção análoga à cultura dos surdos. Destacam-se os vários diálogos en-
tre duas correntes distintas nesse sentido: a primeira que salienta uma defesa
de uma educação a partir de uma escola bilíngue, trata-se de um olhar socio-
antropológico sobre a surdez; a segunda corrente, por sua vez, defende o que
se chama de oralismo, ou seja, uma visão mais clínico-terapêutica. Fazendo
uma análise sobre a reprodução do sistema da escola audista para a educação
de surdos com base nas contribuições de Pierre Bourdieu.
12
como a Polícia Militar, assim como as intervenções paraestatais relacionadas
ao crime organizado e grupos de extermínio. São expressões de novas formas
de guerra, conclui a autora. Por fim, problematiza-se a necessidade de uma
análise da questão dos homicídios no Brasil utilizando-se da noção de ge-
nocídio, ou seja, de um claro e intencional empenho em exterminar-se uma
determinada presença indesejada.
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A análise continua com a observação de que a evolução do âmbito
jurídico da questão vai de uma repressão explícita a uma intervenção norma-
tizadora. Ou seja, se antes as práticas religiosas eram criminalizadas, a norma
agora não garantiu sua liberdade religiosa, mas antes continuou um processo
de repressão exigindo uma espécie de licença junto às delegacias para que se
pudesse realizar os cultos. Tal prática, por exemplo, foi abolida somente em
1976, data muito recente, conforme nos coloca a autora. Finaliza-se a refle-
xão com a noção de que, ainda nos dias de hoje, as religiões afro-brasileiras
- a despeito de não serem exclusivas de uma única etnia, mas expressarem de
forma muito latente a cultura negra -, sofrem o racismo social perpetuado,
inclusive juridicamente como se mostrou, por tantos anos no Brasil.
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ção da criança e adolescente à sociedade e, por vezes, também a suas famílias.
Clawdemy Feitosa e Silva em seu texto “O papel do socioeducador como
agente de direitos humanos”, apresenta-nos tema bastante em voga conside-
rando uma contextualização de tentativa de diminuição da maioridade penal,
conforme observa-se em nosso Poder Legislativo.
15
para um melhor tratamento às vítimas da Síndrome de Alienação Parental.
O artigo é concluído ressaltando a inevitabilidade de uma política pública
consistente e bem elaborada em suas práticas para garantia dos direitos da
criança e da/o adolescente nesse âmbito.
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Os Direitos Humanos do Século XXI e a
Declaração Universal dos Direitos Humanos:
Reflexões sobre as Limitações da Perspectiva
Normativa
Luciana Lombas Belmonte Amaral
Introdução
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Luciana Lombas Belmonte Amaral
presido por Eleanor Roosevelt, primeira dama dos Estados Unidos da América do Norte, e integrado
por representantes da China (Pen-Chun Chang) e do Líbano (Charles Malik). Posteriormente, foram
incluídos representantes da Austrália, Chile, França e Reino Unido (UNITED NATIONS. Drafting
of the universal declaration of human right. In: Disponível em: <<http://research.un.org/en/undhr/
draftingcommittee#s-lg-box-wrapper-3426141>>. Acesso em 10.02.2016).
2 Não obstante James W. Nickel utilize o termo transnacional para definir as interações territoriais
almejadas, em 1948, pelo comitê da ONU, acredita-se que a proposta da DUDH hoje não se limita
apenas ao ambiente internacional e entre determinados países, mas objetiva uma abrangência global.
3 Para demonstrar a magnitude dessa ambiciosa proposta normativa inter ou transnacional vale ressaltar
que, segundo a ONU, atualmente, a DUDH é o documento mais traduzido do mundo, contando
com mais de 360 traduções de diferentes idiomas. (UNITED NATIONS. Global Issues. Human
Rights. In: Disponível em: <<http://www.un.org/en/globalissues/humanrights/>>. Acesso em
10.02.2016).
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Os Direitos Humanos do Século XXI e a Declaração Universal dos Direitos Humanos
4 Para Gallardo (2014, p. 20-21), “os Estados não constituem nem em sua origem nem atualmente
dispositivos de consenso, mas de dominação e fragmentação. Enquanto tais, não podem fundamentar
em si mesmos práticas e valores universais e integrais como o são (declaradamente) direitos humanos”.
20
Luciana Lombas Belmonte Amaral
p. 444) aponta que a DUDH seria uma marca ocidental liberal do discurso
dominante dos direitos humanos, isso por que:
[...] elaborada sem a participação da maioria dos povos do mundo; no
reconhecimento exclusivo de direitos individuais, com a única exceção
do direito coletivo à autodeterminação, o qual, no entanto, foi restringido
aos povos subjugados pelo colonialismo europeu; na prioridade concedida
aos direitos cívicos e políticos sobre os direitos econômicos, sociais e
culturais; na prioridade concedida aos direitos cívicos e políticos sobre
os direitos econômicos, sociais e culturais; e no reconhecimento do
direito de propriedade como o primeiro e, durante muitos anos, o único
direito econômico. Se observarmos a história dos direitos humanos
no período imediatamente a seguir à Segunda Grande Guerra, não é
difícil concluir que as políticas de direitos humanos estiveram em geral a
serviço dos interesses econômicos e geopolíticos dos Estados capitalistas
hegemônicos. Um discurso generoso e sedutor sobre os direitos humanos
permitiu atrocidades indescritíveis, as quais foram avaliadas de acordo
com revoltante duplicidade de critérios. Escrevendo em 1981 sobre a
manipulação da temática dos direitos humanos nos Estados Unidos
pelos meios de comunicação social, Richard Falk identifica uma ‘política
de invisibilidade’ e uma ‘política de supervisibilidade’ (1981:4). Como
exemplos da política de invisibilidade menciona Falk a ocultação total,
pelos media, das notícias sobre o trágico genocídio do povo Maubere em
Timor Leste (que ceifou mais que 300.000 vidas) e a situação dos cerca de
cem milhões de ‘intocáveis’ (dalits) na Índia. Como exemplos da política
de supervisibilidade, Falk menciona a exuberância com que os atropelos
pós-revolucionários dos direitos humanos no Irão e no Vietname foram
relatados nos EUA. E falk concluiu: ‘os pólos de invisibilidade e de
supervisibilidade estão intimamente correlacionados com os imperativos
da política externa norte-americana’ (1981:5). A verdade é que o mesmo
pode dizer-se dos países da União Europeia, sendo o exemplo mais gritante
justamente o silêncio mantido sobre o genocídio do povo Maubere,
escondido dos europeus durante uma década, assim facilitando o contínuo
e próspero comércio com a Indonésia.
5 Sobre as produções simbólicas como instrumentos de dominação, BOURDIEU (1989, p. 10) afirma
que “as ideologias, por oposição ao mito, produto coletivo e coletivamente (sic) apropriado, servem
de interesses particulares que tendem a apresentar como interesses universais, comuns ao conjunto
do grupo. A cultura dominante contribui para a integração real da classe dominante (assegurando
uma comunicação imediata entre todos os seus membros e distinguindo-os das outras classes); para
a integração fictícia da sociedade no seu conjunto, portanto à desmobilização (falsa consciência)
das classes dominada; para a legitimação da ordem estabelecida por meio do estabelecimento das
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Os Direitos Humanos do Século XXI e a Declaração Universal dos Direitos Humanos
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Luciana Lombas Belmonte Amaral
8 Desde a segunda metade do Século XX, diversos pensadores têm refletido sobre a questão da
hegemonia/imperialismo científico, cultural, político e econômico. As novas concepções do saber, do
ser e do compreender a vida em sociedade a partir de países fora do eixo norte-ocidental concentram-
se, especialmente, nas teorias chamadas decolonizadoras. Ao tecer críticas a uma visão exclusivamente
eurocentrista, as teorias decolonizadoras propõe, em geral, uma nova perspectiva de conhecer e atuar
no mundo. Alguns expoentes latino americanos do pensamento decolonial são Enrique Dussel,
Catherine Walsh, Anibal Quijano, Walter Mignolo e Edgardo Lander. Quanto à teoria crítica de
direitos humanos numa perspectiva latino-americana, podem-se destacar os pensadores Herrera
Flores, David Sanchez Rubio e Helio Gallardo.
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Luciana Lombas Belmonte Amaral
UNIDAS. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Ranking IDH Global 2013.
Relatório de Desenvolvimento Humanos 2014. Disponível em: <<http://www.pnud.org.br/atlas/
ranking/Ranking-IDH-Global-2013.aspx>>. Acesso em 7.12. 2015.
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Luciana Lombas Belmonte Amaral
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Os Direitos Humanos do Século XXI e a Declaração Universal dos Direitos Humanos
instituições. Não há, dessa forma, abertura para as dimensões não jurídicas
da articulação dos direitos humanos (SANCHEZ RUBIO, 2014). Quais
seriam, então, as alternativas para os direitos humanos a partir de outros
elementos fora da esfera institucional-normativa e sem redundar na proble-
mática da eficácia jurídica?
12 Essa separação, redução e abstração como efeito de um imaginário oficializado é refletido por Sanchez
Rubio a partir do paradigma da simplicidade de Edgar Morin (2014, p. 107).
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Luciana Lombas Belmonte Amaral
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Conclusão
Rerefências
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Luciana Lombas Belmonte Amaral
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Os Direitos Humanos do Século XXI e a Declaração Universal dos Direitos Humanos
draftingcommittee#s-lg-box-wrapper-3426141. Acesso em
10.02.2016
_____.Global Issues. Human Rights. Disponível em: http://www.un.org/
en/globalissues/humanrights/ Acesso em 10.02.2016.
_____.The Universal Declaration of Human Rights, 1948. Disponível em:
http://www.un.org/en/documents/udhr Acesso em 10.02.2016.
_____.Vienna Declaration and Programme of Action, World Conference
on Human Rights. Vienna, 1993. Disponível em: http://www.ohchr.
org/en/professionalinterest/pages/vienna.asp Acesso em 10.02.2016.
ŽIŽEK, Slavoj. Contra os Direitos Humanos. Trad. Sávio Cavalcante.
Londrina: Mediações, 2010. Disponível em: http://www.uel.br/
revistas/uel/index.php/mediacoes/article/view/6541/5947 Acesso
em 10.02.2016.
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A Conquista da América: A Imagem dos Povos
Indígenas através dos Tempos
Luana Menezes Lira
Introdução
Mas o que levou Colombo a querer descobrir novas terra para os reis
da Espanha? Pergunta respondida por Todorov (2010), que afirma primei-
ramente que Colombo tinha como principal motivo o desejo de enriquecer,
partindo assim para traçar um percurso a partir de vestígios de ouro que se
supõe que encontrará. Contudo, a partir das leituras dos textos de Colombo
pode-se concluir que não era ambição, mas como o ouro tem uma capacida-
de atrativa, Colombo se utiliza dessa promessa para acalmar os marinheiros
e convencer os mandatários a realizar a expedição, de acordo com Todorov
até mesmo em suas orações há pedidos para que Deus o ajude a encontrar
ouro. Baseado em seus escritos, Colombo afirma ter o desejo de encontrar o
Grande Can, ou imperador da China, para repassar os princípios da fé cristã,
pois era mais importante difundir o cristianismo do que o ouro. “A vitória
universal do cristianismo é o que anima Colombo”, por ser um homem extre-
mamente piedoso que se acha portador de uma missão divina, onde enxerga
a intervenção de Deus em tudo.
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Luana Menezes Lira
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A Conquista da América: A Imagem dos Povos Indígenas através dos Tempos
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Luana Menezes Lira
2a - São superiores
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A Conquista da América: A Imagem dos Povos Indígenas através dos Tempos
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Luana Menezes Lira
Na figura 1 temos uma obra de Bry de 1592, onde traz outro explo-
rador do período, Hans Staden, ao fundo assustado com o ritual antropofá-
gico, contudo na imagem observa-se o ritual sendo retratado como caniba-
lismo. A antropofagia é um traço cultural de alguns grupos indígenas, como
tupiniquins e tupinambás, não podendo ser uma característica ecumênica,
contudo cronistas relatavam essa prática como algo cotidiano e distorciam
todo o processo de guerra-sacrifício. Esse rito sacrificial era algo que relacio-
nava várias aldeias, já que nas batalhas aglomeravam-se inúmeros guerreiros
de diversas tribos, assim ocorria a guerra, o cativeiro e o sacrifício dos prisio-
neiros. O fim do cativeiro, que também servia para relações intertribais, era
organizado uma festa, reunindo aliados e parentes de diversas comunidades,
assim ocorrendo o sacrifício do prisioneiro.
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A Conquista da América: A Imagem dos Povos Indígenas através dos Tempos
por Experiência Própria e agora a Traz a Público com essa Impressão”, mais
conhecido como Duas viagens ao Brasil. Pelo título da obra pode-se refletir
sobre a representação dos povos indígenas
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Luana Menezes Lira
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A Conquista da América: A Imagem dos Povos Indígenas através dos Tempos
1 Darwinismo social é um nome moderno dado a várias teorias da sociedade, que surgiram no Reino
Unido, América do Norte e Europa Ocidental, na década de 1870. Trata-se de uma tentativa de se
aplicar o darwinismo nas sociedades humanas. Descreve o uso dos conceitos de luta pela existência e
sobrevivência dos mais aptos, para justificar políticas que não fazem distinção entre aqueles capazes de
sustentar a si e aqueles incapazes, de se sustentar. Esse conceito motivou as ideias de eugenia, racismo,
imperialismo, fascismo, nazismo e na luta entre grupos e etnias nacionais. O termo foi popularizado
em 1944 pelo historiador norte-americano Richard Hofstadter, mas atualmente, por causa das
conotações negativas da teoria do darwinismo social, especialmente após as atrocidades da Segunda
Guerra Mundial, poucas pessoas se descrevem como social-darwinistas, e o termo é geralmente visto
como pejorativo.
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Luana Menezes Lira
Freyre (2005) então defende que o brasileiro é a síntese das três ra-
ças, e que a riqueza do Brasil vem dessa mistura de povos, criando assim uma
democracia racial, é uma ideia de que não existe racismo no Brasil, por um
lado esse paradigma traz um enorme avanço no pensamento social brasileiro
por admitir as vantagens da miscigenação, contudo por outro lado tem um
caráter conservador, quando coloca esse apaziguamento, quando afirma que
existe uma democracia racial. Caio Parado Jr. vai defender que o Brasil está
atrasado por causa de uma questão econômica, isso é consequência do Brasil
ter sido colônia e escravizado durante muito tempo, fornecendo assim base
para o paradigma da estrutura social, tendo como discípulo Celso Furtado e
simpatia de Florestan Fernandes que tem como discípulo Fernando Henri-
que Cardoso, onde esses estudiosos afirmam que o problema do Brasil não
é racial, não é cultural e sim questão da estrutura social, que vai apontar pra
onde o Brasil está se dirigindo, de onde ele veio e por que estamos em deter-
minada situação (SCHWARCZ, 2002).
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A Conquista da América: A Imagem dos Povos Indígenas através dos Tempos
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Luana Menezes Lira
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A Conquista da América: A Imagem dos Povos Indígenas através dos Tempos
tação dos índios brasileiros nos livros didáticos é uma temática sem grande
relevância, até mesmo na área de História não se encontra muitos estudos e
aqueles que se detém a pesquisa nesta temática tem que se articular com a
Antropologia e até outras áreas das Ciências Humanas.
Por fim, vale destacar que toda a imagem que perpassa séculos
sobre os povos originários que estavam nas Américas antes e depois da
chegada dos europeus, foi construída durante o século XV, tendo como
seu principal difusor Cristovam Colombo. A imagem de um outro ser,
que não possuía a mesma cultura dos conquistadores, foi revelada ao res-
tante do mundo, mas ao mesmo tempo que foi revelada foi recusada por
não se enquadrar nos padrões europeus e cristãos. Após essa recusa, temos
até hoje a legitimação de extermínio de grupos inteiros nativos que lutam
para perpetuar sua cultura embasam-se em argumentos filosóficos, colo-
cando-os como seres bárbaros, que não são cidadãos plenos de direito, ou
seja, tutelados do Estado, fato que ocorre no Brasil.
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Luana Menezes Lira
Cabe então ressaltar que o índio é todo aquele humano que se re-
conhece e é reconhecido como parte de uma comunidade indígena, e assim
direitos indígenas são conceituados como direitos humanos. Esse enqua-
dramento não depende do reconhecimento do Estado, de estar inserido em
uma Constituição ou até mesmo da existência de mecanismos de proteção
de ataques pelo Poder Público ou por privados. Dessa forma, as questões
que dizem respeito aos índios ou as suas comunidades deverão ser analisa-
das sob normas que compõem os sistemas geral e específico de proteção
aos direitos humanos, formadoras do Direito Internacional dos Direitos
Humanos.
Então afirmar que todos seres humanos são iguais significa decla-
rar simplesmente que todos possuem ou devem possuir os mesmo direitos
fundamentais. Deve-se compreender que todos os homens não são iguais
em todos os aspectos, diferenciam-se em questões físicas e intelectuais,
contudo todos os homens devem possuir as mesmas oportunidades e di-
reitos. O tratamento igualitário deve seguir a premissa de que é necessário
não dispensar a criação de critérios que justifiquem a adoção de atitudes
diferenciadas para com os indivíduos.
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A Conquista da América: A Imagem dos Povos Indígenas através dos Tempos
Considerações finais
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Luana Menezes Lira
Referências
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A Invenção e Reinvenção dos Direitos
Humanos
Jefferson Sampaio de Moura
Introdução
1 Lynn Avery Hunt, nasceu em 1945, no Panamá e criada em Minnesota, nos Estados Unidos da
América. Fez mestrado e doutorado na Stanford University. É professora de história europeia na
Universidade da Califórnia e autora de estudos sobre a Revolução Francesa e história cultural. Tem
livros traduzidos em diversas línguas, para diversos países.
2 Publicado originalmente nos Estados Unidos por W. W. Norton & Company, Inc. Grafia atualizada
segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, que entrou em vigor no Brasil em
2009.
O que o autor não esperava é que a obra fosse fazer tanto sucesso
junto ao povo da época, bem como fosse impulsionar uma série de mudanças
no comportamento da sociedade, que perdurariam por anos.
Hunt (2009, p. 38) comenta que “os leitores do século XVIII, como
as pessoas antes deles, sentiam empatia por aqueles que lhes eram próximos
e por aqueles que eram muito obviamente seus semelhantes”, como os paren-
tes, familiares imediatos, as pessoas que frequentavam a mesma paróquia que
eles e os seus “iguais sociais” de costume diário. Todavia, o século XVIII im-
pulsionou na mudança do entendimento de empatia pelas pessoas, exigindo-
-lhes uma nova percepção.
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Jefferson Sampaio de Moura
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A Invenção e Reinvenção dos Direitos Humanos
demos afirmar aqui que tais processos só se deram no século XVIII, tendo em
vista que o ser humano é um ser social, conforme afirma Luria (1990, p. 22):
as atividades cognitivas superiores guardam sua natureza sócio-histórica
e de que a estrutura da atividade mental – não apenas seu conteúdo
específico, mas também as formas gerais básicas de todos os processos
cognitivos – muda ao longo do desenvolvimento histórico.
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Jefferson Sampaio de Moura
Hunt (2009, p. 32) comenta, ainda, que “os novos tipos de leituras (e
de visão e audição) criaram novas experiências individuais (empatia), que por
sua vez tornaram possíveis novos conceitos sociais e políticos (os direitos hu-
manos)”. Ora, podemos reafirmar, com isso, que os romances foram de grande
valia para os debates e expansão dos direitos humanos. As pessoas já não eram
as mesmas dos séculos passados, dotadas de seu individualismo, mas sim novas
pessoas, com novos percepções e sentimentos, influenciando na construção de
uma nova sociedade. Surge um espírito de comunhão entre as pessoas, onde o
que não é bom para mim, pode também não ser bom para o próximo.
A reivindicação de autoevidência se baseia em última análise num apelo
emocional: ela é convincente se ressoa dentro de cada indivíduo. Além
disso, temos muita certeza de que um direito humano está em questão
quando nos sentimos horrorizados pela sua violação. (HUNT, 2009, p.
25)
Hunt (2009) diz que os direitos humanos não são mandamentos es-
tabelecidos em documentos apenas, mas que se baseiam numa disposição em
afinidade às outras pessoas, bem como um conjunto de convicções acerca de
como as pessoas são e como elas diferenciam o certo do errado, na época em
que vivem.
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A Invenção e Reinvenção dos Direitos Humanos
Nesse sentido, podemos afirmar que os direitos humanos não são fini-
tos, não se esgotam, mas que vão se adaptando e reinventando de acordo com
a realidade da época em que estão inseridos e aos grupos que os demandam.
Alegavam que para se ter direitos era necessário ter aptidão de exercê-los,
autonomia para tal. Eles se baseavam em estudos biológicos e no poder aquisitivo
das pessoas para justificar tal argumento, com isso: pessoas, “comprovadamente”,
frágeis biologicamente (como deficientes e mulheres) não podiam exercer a auto-
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Jefferson Sampaio de Moura
nomia, de outro lado, os escravos e pessoas que não detinham de capital financei-
ro não poderia ter autonomia para decisão, ambas as colocações se sustentavam
levando em consideração que esses necessitavam de outros para se alcançar e ter o
básico para sua sobrevivência, sendo assim esses outros que eram detentores de di-
reitos. Entram em jogo duas qualidades distintas, mas relacionadas: “a capacidade
de raciocinar e a independência de decidir por si mesmo” (HUNT, 200 9, p. 26).
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A Invenção e Reinvenção dos Direitos Humanos
seus direitos. Todavia, existia um grupo que sempre era eximido dos debates
e da defesa, o das mulheres.
A simpatia e a sensibilidade atuavam em favor de muitos grupos não
emancipados, mas não das mulheres. Capitalizando o sucesso do
romance em invocar novas formas de identificação psicológica, os
primeiros abolicionistas encorajavam os escravos libertos a escrever suas
autobiografias romanceadas, às vezes parcialmente fictícias, a fim de ganhar
adeptos para o movimento nascente. [...] Mas a maioria dos abolicionistas
deixou de relacionar sua causa com os direitos das mulheres. Depois de
1789, muitos revolucionários franceses assumiriam posições públicas e
vociferantes em favor dos direitos dos protestantes, judeus, negros livres
e até escravos, ao mesmo tempo que se oporiam ativamente a conceder
direitos às mulheres (HUNT, 2009, p. 67).
4 Paulo César Carbonari é formado em Filosofia pelo Instituto Berthier, Mestre em Filosofia pela
Universidade Federal de Goiás e Doutor em Filosofia pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos.
Atualmente, é professor no Instituto Berthier e tem uma extensa obra bibliográfica, com temas
voltados para os direitos humanos e a educação em direitos humanos.
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A Invenção e Reinvenção dos Direitos Humanos
5 Joaquín Herrera Flores nasceu em Triana (Sevilla, Espanã) em 1956. Fez Doutorado em Direito pela
Universidade de Sevilla, onde atuou como professor de Filosofia do Direito. Criou e coordenou o
Programa de Doutorado em “Derechos Humanos y Desarrollo”, na Universidade Pablo de Olavide
de Sevilla. Dentro de sua biografia existem diversos livros que trabalham com uma teoria crítica dos
direitos humanos, do qual destacamos aqui “La Reinvencion de los Derechos Humanos”.
6 David Sanchez Rubio é professor titular de Filosofia do Direito na Universidade de Sevilla, tem
sido codiretor do programa de Doutorado em “Derechos Humanos y Desarrollo”, organizado pela
Universidade Pablo de Olavide de Sevilla. Autor e coautor de diversos livros que trabalham a teoria
crítica dos direitos humanos.
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Jefferson Sampaio de Moura
dade em nome do todo, essa que atualmente vem se mostrado, em boa parte
do mundo, como abatida e necessitando de uma reformulação.
Para a autora, é importante que eu veja e sinta que o outro é tão im-
portante quanto eu. Aceitando, entendendo e respeitando essa importância,
é possível possibilitar ao próximo o direito à fala, que vêm junto com o direi-
to à escuta, uma escuta empática. Com tal escuta, é possível conseguir buscar
as melhores soluções para todos os grupos (os ignorados, os marginalizados,
os menosprezados, os inferiorizados e não somente os grupos que sempre são
beneficiados com as tomadas de decisões).
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A Invenção e Reinvenção dos Direitos Humanos
Por muito tempo, foi fortalecida a ideia de que nem todos eram aptos
para atuarem ativamente, isso influenciou na construção de uma sociedade reple-
ta de desigualdades, onde boa parte da população é marginalizada e excluída dos
processos de tomada de decisão. Esse quadro vem sido modificado e a tendência
é que mude cada dia mais. Conforme cita Hunt (2009, p. 27), a nossa concepção
“de quem têm direitos e do que são esses direitos muda constantemente”, isso sig-
nifica que “a revolução dos direitos humanos é, por definição, contínua”.
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A Invenção e Reinvenção dos Direitos Humanos
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Jefferson Sampaio de Moura
Referências
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Um Currículo para a Equidade de Gênero:
A Educação na Perspectiva dos Direitos
Humanos
Aldenora Macedo
Introdução
Então, a partir dessa base legal que assegura uma educação mais di-
versa, as instituições de ensino são responsáveis na construção de um am-
biente pedagógico e social que atenda a tal direito. No Artigo 210 da Cons-
tituição Federal de 1988, que trata do capítulo Educação, há a indicação de
que devem ser “fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de
maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e
artísticos, nacionais e regionais”.
outro ou outros dentro de uma relação desigual de poder, causando dor e angústia.
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Aldenora Macedo
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Um Currículo para a Equidade de Gênero:A Educação na Perspectiva dos Direitos Humanos
embora seja realmente um avanço, não basta para a garantia de boa convivên-
cia entre grupos de maioria e minoria, e é por isso que se faz preciso um olhar
sensível às demais possibilidades de organização, para com isso se alcançar
outros níveis de direitos, os Direitos Humanos. (SEEDF, 2013) Assim não se
pode deixar de se refletir se “diante desse novo cenário de direitos e de uma
realidade internacional muito mais complexa e contingente, será que a tríade
‘liberdade, igualdade e fraternidade’ surgida nos idos da Revolução Francesa
de 1789 ainda tem lugar?” (PINHEIRO, 2014)
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Um Currículo para a Equidade de Gênero:A Educação na Perspectiva dos Direitos Humanos
aos bens necessários à vida, sendo, por isso, “infinito”. (HERRERA FLO-
RES, 2009). Longe de desmerecer, portanto, a DUDH, pois, uma vez
que nessa ótica os Direitos Humanos são processuais, tal convenção legal
é um marco importante desse processo, porém esta visão universalizante
do documento denota uma ideia de direito já alcançado e adquirido, abs-
trato no sentido de ser findo em si, e com isso não apresenta um ponto
de chegada, um caminho, apenas fortalece a certeza de que “os direitos
humanos não são universais na sua aplicação.” (SANTOS, 2006, p. 442)
2 Entende-se por base nacional comum, na Educação Básica, os conhecimentos, saberes e valores
produzidos culturalmente, expressos nas políticas públicas e que são gerados nas instituições
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Aldenora Macedo
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Sendo esta temática tão real e comum a todas as pessoas, não deveria
ela ser veementemente abordada no currículo escolar? Na conta de quem de-
vem ser depositadas as mortes e as mazelas ocasionadas pela falta de informa-
em substituição à cadeia, e reduzir o direito de ampla defesa na esfera criminal, entre outras pautas
retrógradas.” (DIAP, 2014, p. 13 e 15).
5 “Disciplinas que, de acordo com o Decreto Lei 869/68, tornaram-se obrigatórias no currículo
escolar brasileiro a partir de 1969. Ambas foram adotadas em substituição às matérias de Filosofia
e Sociologia e ficaram caracterizadas pela transmissão da ideologia do regime autoritário ao exaltar
o nacionalismo e o civismo dos alunos e privilegiar o ensino de informações factuais em detrimento
da reflexão e da análise. Tais matérias foram condenadas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN), estabelecidos pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de 1996, por terem sido
impregnadas de um ‘caráter negativo de doutrinação’”. (MENEZES; SANTOS, 2002).
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Um Currículo para a Equidade de Gênero:A Educação na Perspectiva dos Direitos Humanos
ção? Se o currículo está a serviço do bem maior e do Estado, ele não deveria
abordar questões que trazem prejuízos sociais e, financeiros ao país?
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8 De acordo com um estudo realizado pelo PNAD (Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio),
realizada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) – 2012, o Brasil tem mais
mulheres do que homens. De uma população de 195,2 milhões de habitantes, 100,5 milhões – ou
51,5% - são mulheres e 94,7 milhões são homens – 48,5% do total.
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9 “Apple, ao reformular o conceito de Currículo Oculto dos anos 1960 a fim de responder as relações
de poder que permeiam o currículo, diz ser tudo aquilo que subjaz ao currículo formal, e ao que
acontece na escola, um currículo oculto, em que se escondem as relações de poder que estão na base
das supostas escolhas curriculares, sejam elas em relação ao conhecimento, sejam no que diz respeito
aos procedimentos que cotidianamente são reforçadas pelas ações curriculares. A hegemonia dessa
visão de currículo elimina um importante aspecto social: a contradição. A crença na harmonia social
daí advinda é um importante princípio que oculta as relações de poder e as desigualdades sociais”
(LOPES, MACEDO, 2011, p. 31-32).
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Um Currículo para a Equidade de Gênero:A Educação na Perspectiva dos Direitos Humanos
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Aldenora Macedo
real que o formal, como talvez o único existente, já que algumas instituições
ou Secretarias ainda não possuem um currículo próprio. A proposta é a de
reconhecer a supervalorização de valores pessoais de professoras/es e gesto-
ras/es nas práticas educacionais e por meio de formações tornar a questão da
diversidade, e pontualmente, as questões de gênero, algo tão importante que
seja considerado um valor a ser praticado. Fomentar intencionalmente uma
mentalidade educacional aberta à pluralidade.
Então, como fazer para que esse currículo se efetive? Como atrelá-lo
ao currículo oculto, ou seja, como trazer para a prática espontânea de professo-
ras/es? Como fazer para que a ideia do plural e do diverso seja tão importan-
te quanto os demais valores que baseiam as práticas pedagógicas do currículo
oculto efetivado pela comunidade escolar? A resposta pode estar no preparo,
na formação e na obrigatoriedade e acompanhamento das determinações.
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Um Currículo para a Equidade de Gênero:A Educação na Perspectiva dos Direitos Humanos
Por fim, compreende-se que caso não haja uma mudança reflexiva e
transformativa no corpo docente e administrativo das instituições de ensino,
as práticas continuarão fomentando preconceitos e negligenciando verdades,
saberes, identidades e reconhecimentos, tornando o direito à educação uma
mera e inalcançável utopia, e o currículo diverso apenas mais um documento
engavetado.
Referências
BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo: fatos e mitos. São Paulo: Difusão
Européia do Livro, 1960.
_________________ O segundo sexo: a experiência vivida. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1980.
BRASIL. Constituição Federal, de 05.10.88. Atualizada com as Emendas
Constitucionais Promulgadas.
________. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica /
Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Diretoria de
Currículos e Educação Integral. Brasília: MEC, SEB, DICEI, 2013.
562p.
________. LDB: Lei de diretrizes e bases da educação nacional [recurso
eletrônico]: Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece
as diretrizes e bases da educação nacional. – 9. ed. – Brasília: Câmara
dos Deputados, Edições Câmara, 2014. 45 p. – (Série legislação; n.
118) Atualizada em 20/5/2014. ISBN 978-85-402-0217-7
________. Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação.
Resolução Nº 2, de 07 de Abril de 1998. Institui as Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental. Brasília:
92
Aldenora Macedo
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Um Currículo para a Equidade de Gênero:A Educação na Perspectiva dos Direitos Humanos
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Conhecendo um pouco da História dos
Direitos Humanos para Reconhecer o Direito
à Educação de Surdos
Simone Aparecida dos Santos Silva
Para se pensar a história dos direitos humanos não existe uma única
forma, e é constituída de um caráter complexo e difuso. Em uma destas formas,
temos muitos filósofos que afirmam que os direitos estão intrinsecamente li-
gados ao modo como determinamos o que é ser humano e as implicações que
isto carrega ao questionarmos a maneira que vemos o outro nesta relação. Nes-
te aspecto, configura-se que os seres humanos são possuidores de direito em
virtude de sua dignidade humana, ou seja, pelo fato de sermos humanos e ser
impossível aferir o valor de cada um. Tenho convicção que o ser humano tem
valores, já os não-humanos tem preço. Essa grande distinção tem colocado o
homem escravo do próprio homem. O ser humano é único e insubstituível,
sendo inaceitável ser determinado um preço pela sua vida. Para compreender
tal fato, basta identificar os que podem ter acesso à uma escola de qualidade, os
que são marginalizados por não serem considerados aptos às necessidades do
mercado capitalista, ou terem seu potencial subjugado. O direito à educação é
dos primeiros passos para diminuir a desigualdade social. Isto deveria ser fato,
no entanto, ainda vemos no dias de hoje uma escravidão especializada e cruel.
Para autora Lynn Hunt, em seu livro "A invenção dos Direitos Hu-
manos; uma história" - os direitos humanos têm uma história difusa e onipre-
sente na atualidade a qual exige uma história mais ampla e discutível, mas que
a autoevidência é importantíssima para compreensão do mesmo.
Acredito que a afirmação de autoevidência é crucial para a história dos
direitos humanos, e este livro busca explicar como ela veio a ser tão
convincente no século XVIII. Felizmente, ela também propicia um ponto
focal no que tende a ser uma história muito difusa. Os direitos humanos
tornaram-se tão ubíquos na atualidade que parecem requerer uma história
igualmente vasta. As ideias gregas sobre a pessoa individual, as noções
romanas de lei e direito, as doutrinas cristãs da alma... O risco é que a
história dos direitos humanos se torne a história da civilização ocidental
ou agora, às vezes, até a história do mundo inteiro. A antiga Babilônia, o
hinduísmo, o budismo e o islã também não deram as suas contribuições?
Como, então, explicamos a repentina cristalização das afirmações dos
direitos humanos no final do século XVIII? (HUNT,2009, p.18-19)
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Simone Aparecida dos Santos Silva
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Conhecendo um pouco da História Dos Direitos Humanos para Reconhecer (...) de Surdos
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Simone Aparecida dos Santos Silva
1 " Os surdos, ao defenderem a existência de uma escola bilíngue para surdos, não estão contra a
inclusão escolar, mas assumem e defendem uma proposta educacional fundada na diferença linguística
e cultural dos surdos." LOPES (2012). O Decreto nº 5.626/05, em diálogo com as reivindicações
das comunidades surdas brasileiras (FENEIS, 1999), defende a educação bilíngue, definindo-a, bem
como os espaços onde ela deve ser implantada, nos seguintes termos: São denominadas escolas ou
classes de educação bilíngüe aquelas em que a Libras e a modalidade escrita da Língua Portuguesa
sejam línguas de instrução utilizadas no desenvolvimento de todo o processo educativo. (BRASIL,
2005, Artigo 22, §1º)
2 "Segundo Skliar (2004), o oralismo subordinava se à conquista da expressão oral pelas crianças surdas
e transformava a língua de sinais em um símbolo de repressão física e psicológica, já que os sinais e o
alfabeto manual eram proibidos, devido ao entendimento de que estes poderiam levar o indivíduo
à acomodação e à não aprendizagem da fala. Nesse sentido, a premissa básica do oralismo era fazer
uma reabilitação do surdo em direção à “não surdez” e aos padrões de normalidade preconizados pela
sociedade." (LOPES & COLABORADORES, 2012).
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Conhecendo um pouco da História Dos Direitos Humanos para Reconhecer (...) de Surdos
posição da cultura dominante audista, a qual baseia sua cultura pelo ato de
ouvir, sobre a cultura dos dominados, os surdos. Bourdieu, percebendo esta
dinâmica de poder simbólico, definiu como arbitrário cultural dominante,
que nada mais é do que uma cultura se impor sobre a outra. Essas relações es-
tão em constante mudanças, tanto pelos avanços tecnológicos quanto como
a sociedade vai percebendo e relacionando com as pessoas que tem estes atri-
butos. Tudo depende de qual referencial é dado a questão. Coadunando com
a ideia de Lopes, temos que:
Como já foi desenvolvido anteriormente, enquanto que o primeiro (ser
surdo) implica a presença de conjuntos de práticas culturais que partem de
referentes surdos de formas de ser, o segundo (deficiente auditivo) implica
a presença de conjuntos de práticas, também culturais, mas que partem de
referentes ouvintes de formas de ser. Há aqui uma distância significativa
entre esses dois conjuntos de práticas. (LOPES, 2012, p. 243)
100
Simone Aparecida dos Santos Silva
surdez, nos faz pensar que se fossem apenas a questão da audição os direitos
humanos da pessoa ouvinte seriam integralmente respeitados e efetivados.
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Conhecendo um pouco da História Dos Direitos Humanos para Reconhecer (...) de Surdos
Acredito que por ter sido um marco que colocou em pauta novamen-
te o Direitos Humanos no cenário mundial, a Declaração de Viena suscitou
a Declaração de Salamanca, de 1994, a qual destaca a concepção de educação
para todos e o respeito às diferenças. Contribui também, para valorização do
que a Constituição Federal Brasileira de 1988 já afirmava em seu Capítulo
III, Artigos 205, 206 e 208. Que dizem que a educação é um direito de todos
e dever do Estado, especificando e detalhando este direito.
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Conhecendo um pouco da História Dos Direitos Humanos para Reconhecer (...) de Surdos
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Simone Aparecida dos Santos Silva
3 Gládis Perlin é Professora e Doutora Em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(1987). Possui graduação em Licenciatura em Teologia pela PUC-RS (1987), mestrado (1998) e
doutorado (2003). Foi a primeira surda a obter o título de doutora no Brasil. Atualmente é professora
adjunta na Universidade Federal de Santa Catarina. Tem experiência na área de |Educação de Surdos,
atuando principalmente com os temas: Surdo, Identidade, Alteridade, Diferença, Cultura, Educação.
4 O Decreto no 7.611/2011, dispõe sobre a educação especial, o atendimento educacional especializado
e dá outras providências, a partir da Convenção sobre o Direito da Pessoa com Deficiência
(ONU/2006).
5 A cultura dos surdos é uma cultura visual, e a língua de sinais é o código mais compartilhado, o
marcador cultural primordial, aquele que faz com que os surdos se sintam à vontade nos espaços
comunitários em que se reúnem e que permite a troca de experiências ente eles. É pela língua de sinais
que as identidades surdas vão sendo constituídas e significadas culturalmente no grupo." (LOPES &
COLABORADOES, 2012).
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Conhecendo um pouco da História Dos Direitos Humanos para Reconhecer (...) de Surdos
Referências
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Simone Aparecida dos Santos Silva
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Genocídio da Juventude Negra no Brasil:
as Novas Formas de Guerra, Raça e
Colonialidade do Poder
Tarsila Flores
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Genocídio da Juventude Negra no Brasil
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Tarsila Flores
Colonialidade do poder
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Genocídio da Juventude Negra no Brasil
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Tarsila Flores
O mesmo pode ser dito sobre o Brasil. Aqui também as relações ra-
cistas são muitas vezes mascaradas, através até mesmo do discurso de uma eli-
te econômica e intelectual, para a manutenção de um imaginário pautado na
igualdade racial, para bem do status do Brasil como um país de chances iguais
para todos e de um ideário meritocrático. Aqui evita-se falar sobre raça e a ig-
norância acerca do tema muitas vezes continua justificando atrocidades come-
tidas pelo Estado e pela sociedade contra a imensa maioria da população negra:
(...) a falta de esclarecimento, que faz com que, em muitas ocasiões e
cenários dos mais variados, às vezes discriminemos, excluamos e até
maltratemos, por motivos raciais sem ter qualquer grau de percepção
de que estamos incorrendo num ato de racismo. Se existem pelo menos
quatro tipos de ações discriminativas de cunho racista, as mais conscientes
e deliberadas não são as mais frequentes entre nós. Isto leva a que muitos
não tenhamos consciência da necessidade de criar mecanismos de correção
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Genocídio da Juventude Negra no Brasil
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Considerações finais
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Tarsila Flores
Referências
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Tarsila Flores
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Genocídio da Juventude Negra no Brasil
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A Marcha das Mulheres Negras e a Mídia
Maíra de Deus Brito
Introdução
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Maíra de Deus Brito
(formado por homens brancos) in SOARES, Sergei Suarez Dillon. O Perfil da Discriminação no
Mercado de Trabalho – Homens Negros, Mulheres Brancas e Mulheres Negras. IPEA Brasília,
novembro de 2000.
3 "Quando a Folha de S. Paulo fez aquela pesquisa de opinião em 1995, perguntaram para muitos
brasileiros se existe racismo no Brasil. Mais de 80% disseram que sim. Perguntaram para as mesmas
pessoas: ‘você já discriminou alguém?’. A maioria disse que não. Significa que há racismo, mas sem
racistas. Ele está no ar…", disse Kabengele Munanga em entrevista à Revista Carta Capital. Disponível
em: http://www.cartacapital.com.br/politica/a-educacao-colabora-para-a-perpetuacao-do-racismo.
Acesso em: 22 nov. 2015.
4 Blogueiras negras. Bem vindos ao Brasil colonial: a mula, a mulata e a Sheron Menezes. Disponível em:
<http://blogueirasnegras.org/2014/01/02/vindos-brasil-colonial-mula-mulata-sheron-menezes/>.
Acesso em 6 jan. 2016.
5 Revista Capitolina. Nicki Minaj e o incômodo com a mulher negra que fala. Disponível em: <http://
revistacapitolina.tumblr.com/post/124759386378/nicki-minaj-e-o-inc%C3%B4modo-com-a-
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A Marcha das Mulheres Negras e a Mídia
A análise
130
Maíra de Deus Brito
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A Marcha das Mulheres Negras e a Mídia
10 Correio Braziliense. Faixas da Via S1 serão interditadas para Marcha das Mulheres Negras.
Disponível em:,http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2015/11/18/interna_
cidadesdf,507002/faixas-da-via-s1-serao-interditadas-para-marcha-das-mulheres-negras.shtml>.
Acesso em 22 nov. 2015.
11 Correio Braziliense. Marcha das Mulheres Negras interdita Eixo Monumental. Disponível
em: <http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2015/11/18/interna_
cidadesdf,507013/marcha-das-mulheres-negras-interdita-eixo-monumental.shtml>. Acesso em 22
nov. 2015.
12 Correio Braziliense. Mulheres negras são alvo de explosões e tiros na Esplanada dos Ministérios.
Disponível em: <http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2015/11/18/interna_
cidadesdf,507082/confusao-entre-manifestantes-causa-tumulto-na-esplanada-dos-ministerio.
shtml>. Acesso em 22 nov. 2015.
13 Correio Braziliense. Defensores do impeachment e marcha das mulheres negras entram em conflito.
Disponível em: <http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2015/11/18/
internas_polbraeco,507092/defensores-do-impeachment-e-marcha-das-mulheres-negras-entram-
em-confl.shtml>. Acesso em 22 nov. 2015.
14 Correio Braziliense. Marcha das Mulheres Negras termina com dois policiais detidos no DF.
Disponível em: <http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2015/11/18/interna_
cidadesdf,507123/policial-que-atirou-durante-marcha-na-esplanada-alega-que-se-defendia.shtml>.
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Maíra de Deus Brito
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A Marcha das Mulheres Negras e a Mídia
A história da marcha
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Maíra de Deus Brito
Racismo e emancipação
18 HOBSBAWN, Eric. A era dos extremos. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
19 HEILBORN, Maria Luiza; ARAÚJO, Leila; BARRETO, Andreia (org.). Gestão em Políticas
Públicas em Gênero e Raça | GPP – GeR: Módulo II. Rio de Janeiro: CEPESC, Brasília: Secretaria
de Políticas para as Mulheres, 2010.
135
A Marcha das Mulheres Negras e a Mídia
Porém, não levou muito muito tempo para que feministas negras ga-
nhassem voz e apontassem limitações ao feminismo “tradicional”, predominan-
temente branco. Em “Mulheres negras: moldando a teoria feminista”20 (“Black
women: shaping feminist theory”), bell hooks destaca os problemas da obra de
Friedan. Para a intelectual negra norte-americana, aquelas falas só alcançam
um grupo específico, formado por mulheres brancas, casadas, com formação
universitária e de classe média alta. Como hooks afirma, "donas de casa ente-
diadas com o lazer, a casa, os filhos, as compras, que queriam mais da vida".
20 HOOKS, bell. Moldando a teoria feminista. Revista Brasileira de Ciência Política, n.1. Brasília jan./
abr. 2015. p.193-210.
136
Maíra de Deus Brito
21 GONZALEZ, Lélia. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Revista Ciências Sociais Hoje, Anpocs,
1984, p. 223-244.
137
A Marcha das Mulheres Negras e a Mídia
Metodologia
22
Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/ministeriodacultura/
albums/72157659046165934>. Acesso em 1 mai. 2016.
138
Maíra de Deus Brito
23 ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise do discurso: princípios e procedimentos. 6 ed. Campinas, SP:
Pontes, 2005.
24 BENETTI, Marcia. Metodologia de pesquisa em jornalismo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003.
139
A Marcha das Mulheres Negras e a Mídia
Conclusão
140
Maíra de Deus Brito
Por último, fica o questionamento: por que o Brasil não quis noticiar
a Marcha das Mulheres Negras? Porque ao invisibilizar o indivíduo negro
e negra, cria-se o mecanismo de negação da condição de cidadão e porque
noticiar o evento seria presumir que temos um Estado/Nação/Território ra-
cista. Negar esta realidade é negar o racismo e uma maneira de continuar
sendo racista. A Marcha trouxe à luz um tema que costuma incomodar país.
Quando 10 mil pessoas marcham na capital federal clamando por demandas
já citadas, elas nos confirmam o Brasil como um país racista, preconceituoso
e sexista.
Referências
141
A Marcha das Mulheres Negras e a Mídia
142
Maíra de Deus Brito
com.br/noticias/geral,mulheres-negras-pedem-saida-de-cunha-em-
protesto-na-porta-do-plenario-da-camara,10000002238>. Acesso
em 22 nov. 2015.
GONZALEZ, Lélia. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Movimentos
sociais urbanos, minorias étnicas e outros estudos. Brasília: ANPOCS,
1983. p. 223-244.
HEILBORN, Maria Luiza; ARAÚJO, Leila; BARRETO, Andreia (org.).
Gestão em Políticas Públicas em Gênero e Raça | GPP – GeR:
Módulo II. Rio de Janeiro: CEPESC, Brasília: Secretaria de Políticas
para as Mulheres, 2010.
HOBSBAWN, Eric. A era dos extremos. São Paulo: Companhia das Letras,
1995.
HOOKS, bell. Moldando a teoria feminista. Revista Brasileira de Ciência
Política, n.1. Brasília jan./abr. 2015. p.193-210.
MARCONDES, Mariana Mazzini.(Org.) Dossiê mulheres negras : retrato
das condições de vida das mulheres negras no Brasil. Brasília : Ipea,
2013.
O Globo. Mulheres negras marcham em Brasília contra o racismo e a
violência. Disponível em: <http://oglobo.globo.com/sociedade/
mulheres-negras-marcham-em-brasilia-contra-racismo-a-
violencia-18080993>. Acesso em 22 nov. 2015.
ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise do discurso: princípios e procedimentos.
6 ed. Campinas, SP: Pontes, 2005.
Revista Capitolina. Nicki Minaj e o incômodo com a mulher negra
que fala. Disponível em: <http://revistacapitolina.tumblr.com/
post/124759386378/nicki-minaj-e-o-inc%C3%B4modo-com-a-
mulher-negra-que>. Acesso em 6 jan. 2016.
Revista Carta Capital. Entrevista “A educação colabora para a perpetuação
do racismo” com Kabengele Munanga. Disponível em: http://
www.cartacapital.com.br/politica/a-educacao-colabora-para-a-
perpetuacao-do-racismo. Acesso em: 22 nov. 2015.
SANTOS, Ivair Augusto Alves dos. Direitos humanos e as práticas de
racismo. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2013.
Correio Braziliense. Faixas da Via S1 serão interditadas para Marcha das
143
A Marcha das Mulheres Negras e a Mídia
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Religiões Afro-Brasileiras: uma Luta por
Reconhecimento Jurídico
Nailah Neves Veleci
Introdução
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Nailah Neves Veleci
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Religiões Afro-Brasileiras: Uma Luta Por Reconhecimento Jurídico
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Nailah Neves Veleci
Para Santos (2006), Gilberto Freyre, assim como Artur Ramos (alu-
no de Nina Rodrigues) substituíram a noção de raça de Nina Rodrigues por
cultura. Para estes teóricos, agora era a cultura do negro que era primitiva e
inferior, sendo a mestiçagem e o sincretismo a salvação da cultura negra.
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Religiões Afro-Brasileiras: Uma Luta Por Reconhecimento Jurídico
1 Esse apagamento constituiu-se na transição da Macumba para a Umbanda, processo descrito por
Berkenbrock (1999): “A Umbanda estava adaptada à nova mentalidade dos descendentes africanos
no Brasil. [...] A nova geração de descendentes de africanos tinha consciência de que era preciso lutar
para subir na sociedade. Era uma geração esclarecida em comparação à do tempo dos escravos. Numa
sociedade onde a liderança estava nas mãos de brancos, era necessário se aproximar destes para se ter
a chance de se conseguir algo. [...] A Macumba, lugar onde tradicionalmente se invocava os espíritos,
onde se faziam sacrifícios sangrentos de animais, onde se cultivavam o transe selvagem, foi classificado
aos olhos da sociedade (branca) como sinal de primitividade. O espiritismo com suas ideias religiosas
e sua reivindicação científica trouxe uma certa valorização e racionalização no sentido da sociedade
branca para a Umbanda” (BERKENBROCK, 1999, p. 153).
150
Nailah Neves Veleci
Cabe a essas religiões apenas regular as relações de cada fiel com sua
divindade. Sob este pensamento, de acordo com Prandi (2000) estas religiões
costumam ser apresentadas como religião libertária, sobretudo no que diz
respeito à sexualidade. O teórico destaca que já nos anos 1930 havia relatos
do campo antropológico que “sublinhavam as liberdades de escolha sexual de
homens e mulheres dos terreiros de Salvador, não parecendo haver restrições
sobre a conduta sexual, fosse ela referida a preferências hetero ou homossexu-
ais.” (PRANDI, 2000, p. 86).
151
Religiões Afro-Brasileiras: Uma Luta Por Reconhecimento Jurídico
152
Nailah Neves Veleci
De acordo com Araújo (2007), a organização teve como seu primeiro ato “a
denuncia da realidade racista que permeava o cotidiano da população negra
no Brasil, desconstruindo o mito da democracia racial e expondo os campos
de atuação do dispositivo de racialidade/biopoder.” (ARAÚJO, 2007, p. 82).
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Religiões Afro-Brasileiras: Uma Luta Por Reconhecimento Jurídico
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Nailah Neves Veleci
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Religiões Afro-Brasileiras: Uma Luta Por Reconhecimento Jurídico
direito humano coletivo. Lindgren fez uma análise de como este artigo deve
ser lido:
Subdividido em três parágrafos, o artigo 2º da Declaração de Viena reafirma o
direito à autodeterminação com a mesma linguagem dos pactos, esclarecendo,
em seguida, situações específicas em que ele precisa ser qualificado. A
primeira explicitação diz respeito à “situação particular dos povos submetidos
a dominação colonial ou outras formas de dominação estrangeira”, que têm
o “direito de tomar medidas legítimas, em conformidade com a Carta das
Nações Unidas, para garantir seu direito inalienável à autodeterminação”,
acrescentando-se que a denegação do direito à autodeterminação “constitui
uma violação dos direitos humanos”. A segunda, motivada por causas
diversas, mas que se ajusta às preocupações da época com a fragmentação de
Estados plurinacionais, recorre à Declaração sobre os Princípios do Direito
Internacional concernentes às Relações Amigáveis e à Cooperação entre
Estados, adotada por consenso pela Assembléia Geral da ONU em 1970,
para ressalvar que nem o direito à autodeterminação, nem sua primeira
explicitação pode ser entendida como “autorização ou encorajamento a
qualquer ação destinada a desmembrar ou prejudicar, total ou parcialmente,
a integridade territorial ou a unidade política de Estados soberanos e
independentes” que se comportem corretamente. (LINDGREN, 2001, p.
117-118)
156
Nailah Neves Veleci
ram escritos num contexto ocidental e que por isso encontramos dificuldades
de sua aplicação e que para Boaventura os direitos podem ser concebidos e
praticados, tanto como localismo globalizado2, como cosmopolitismo insur-
gente e subalterno3; ou seja, podem ser como globalização hegemônica ou
como globalização contra-hegemônica. Acredito que essa perspectiva pode
ser utilizada para analisar as legislações nacionais, só que invés de globaliza-
ção seriam grupos de interesses.
2 “[...] é o processo pelo qual determinado fenômeno, entidade, condição ou conceito local é globalizado
com sucesso. [...] Neste processo de produção de globalização o que se globaliza é o vencedor de uma
luta pela apropriação ou valorização de recursos, pelo reconhecimento hegemônico de uma dada
diferença cultural, racial, sexual, étnica, religiosa ou regional, ou pela imposição de uma determinada
(des)ordem internacional. Esta vitória traduz-se na capacidade de ditar os termos da integração, da
competição/negociação e da inclusão/exclusão.” (SANTOS, 2006, p. 438)
3 “[...] consiste na resistência transnacionalmente organizada contra os localismos globalizados e os
globalismos localizados. Trata-se de um conjunto muito vasto e heterogêneo de iniciativas, movimentos
e organizações que partilham a luta contra a exclusão e a discriminação sociais e a destruição ambiental
produzidas pela globalização neoliberal, recorrendo a articulações transnacionais tornadas possíveis
pela revolução das tecnologias de informação e de comunicação. As atividades cosmopolitas
incluem, entre outras, diálogos e articulações Sul-Sul; redes transnacionais de movimentos anti-
discriminação, pelos direitos interculturais, reprodutivos e sexuais; redes de movimentos indígenas,
ecológicos ou de desenvolvimento alternativo; etc. [...] O cosmopolitismo subalterno e insurgente
não implica uniformização ou homogeneização, nem se rege por uma teoria geral de emancipação
social que neutralize as diferenças, autonomias e identidades ideológicas, regionais culturais entre os
movimentos ou associações.” (SANTOS, 2006, p. 439-440)
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Religiões Afro-Brasileiras: Uma Luta Por Reconhecimento Jurídico
Conclusão
Referências
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Nailah Neves Veleci
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Religiões Afro-Brasileiras: Uma Luta Por Reconhecimento Jurídico
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Audiência de Custódia: uma Questão de
Tolerância e Empatia com os Direitos
Humanos dos Presos Provisórios no Brasil
Pedro de Araújo Yung-Tay Neto
Primeiras linhas
1 O sítio eletrônico do Conselho Nacional de Justiça – CNJ informa que “Em fevereiro de 2015, o
CNJ, em parceria com o Ministério da Justiça e o TJSP, lançou o projeto Audiência de Custódia, que
consiste na garantia da rápida apresentação do preso a um juiz nos casos de prisões em flagrante. A
ideia é que o acusado seja apresentado e entrevistado pelo juiz, em uma audiência em que serão ouvidas
também as manifestações do Ministério Público, da Defensoria Pública ou do advogado do preso.
Durante a audiência, o juiz analisará a prisão sob o aspecto da legalidade, da necessidade e da adequação
da continuidade da prisão ou da eventual concessão de liberdade, com ou sem a imposição de outras
medidas cautelares. O juiz poderá avaliar também eventuais ocorrências de tortura ou de maus-tratos,
entre outras irregularidades. O projeto prevê também a estruturação de centrais de alternativas penais,
centrais de monitoramento eletrônico, centrais de serviços e assistência social e câmaras de mediação
penal, que serão responsáveis por representar ao juiz opções ao encarceramento provisório. A
implementação das audiências de custódia está prevista em pactos e tratados internacionais assinados
pelo Brasil, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção Interamericana
de Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San Jose”. Disponível em <http://www.cnj.jus.br/
sistema-carcerario-e-execucao-penal/audiencia-de-custodia>. Acesso em 03 de fevereiro de 2016.
2 Nos termos do art. 35, inciso I, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN, são deveres do
Magistrado: “cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais
e os atos de ofício”.
Compreendendo o problema
162
Pedro de Araújo Yung-Tay Neto
163
Audiência de Custódia: uma Questão de Tolerância e Empatia (...) dos Presos Provisórios no Brasil
cas delitivas e virem a ser presas indevidamente, prisão essa que, na forma do
ordenamento jurídico brasileiro atual, só poderá ser corrigida por um Magis-
trado regularmente investido de jurisdição.
5 O art. 282, § 4o, do Código de Processo Penal brasileiro dispõe, expressamente, que “no caso de
descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do
Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em
cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único)”.
164
Pedro de Araújo Yung-Tay Neto
6 A Constituição da República Federativa do Brasil dispõe, em seu art. 102, que “compete ao Supremo
Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da constituição (...)”. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 07 de fevereiro de
2016.
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Audiência de Custódia: uma Questão de Tolerância e Empatia (...) dos Presos Provisórios no Brasil
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Pedro de Araújo Yung-Tay Neto
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Audiência de Custódia: uma Questão de Tolerância e Empatia (...) dos Presos Provisórios no Brasil
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Pedro de Araújo Yung-Tay Neto
Certo é que qualquer cidadão que não tenha cometido nenhum ato
criminoso – em um desses inexplicáveis equívocos de sincronicidade do Uni-
169
Audiência de Custódia: uma Questão de Tolerância e Empatia (...) dos Presos Provisórios no Brasil
verso que sempre acreditamos que nunca acontecerá conosco – poderia vir a
ser preso em flagrante e ficar custodiado provisoriamente, e por tempo inde-
terminado, pelo Estado.
Um triste exemplo
170
Pedro de Araújo Yung-Tay Neto
171
Audiência de Custódia: uma Questão de Tolerância e Empatia (...) dos Presos Provisórios no Brasil
Ocorre que, dias depois, descobriu-se que tais rumores eram falsos e
não passavam de boatos. Ou seja, não havia nenhuma sequestradora de crian-
ças em Morrinhos ou mesmo no Guarujá. Mas, aí, já era tarde demais e mes-
mo as tentativas de desmentir os fatos, veiculadas nas mesmas redes sociais,
não surtiram qualquer efeito: Fabiane foi cruelmente linchada até a morte,
sem ter praticado qualquer crime e sem ter sido sequer julgada, apenas por-
que a população, em uma análise preliminar e provisória – exatamente igual à
que costuma ser feita quando alguém é preso em flagrante delito – acreditou
que ela pudesse ser a suposta autora de um crime fictício, criado por um mero
boato que circulou nas redes sociais. A reportagem, novamente, esclarece os
lamentáveis fatos:
No dia 29 de abril, terça-feira, a página do Guarujá Alerta divulgou um
post extenso, com três links, mostrando dessa vez que era tudo boato.
Não havia nenhuma sequestradora de crianças no Guarujá nem nas
redondezas. Morrinhos podia continuar sua vida em paz. Já na abertura,
o post afirmava que muitos usuários não leriam o comunicado até o fim,
mas dizia que deveriam fazê-lo para não sair ‘por aí ajudando a espalhar
ainda mais um boato’. Dizia que não havia nenhum boletim de ocorrência
de criança sequestrada, nem de crianças encontradas mortas sem coração.
Um link dava acesso a uma matéria que afirmava que o boato vinha do Rio
de Janeiro. Outro mostrava que a foto da ‘sequestradora’ era usada por uma
‘página de humor no Facebook’ que já fora curtida por ‘mais de 937.000’
pessoas. O terceiro link levava a uma reportagem que informava que na
cidade de Três Rios, no Rio de Janeiro, circulava o mesmo boato com o
mesmo retrato falado. E alertava: ‘Infelizmente, muitas pessoas usam as
redes sociais sem nenhuma responsabilidade’. E terminava frisando: ‘Então,
mais uma vez, tudo isso não passa de uma enorme mentira para assustar
a população. (...). Diante da força diabólica dos boatos e da credulidade
apressada de uma população desamparada, nenhum desmentido surtia
efeito. (VEJA, 2016, p. 84).
172
Pedro de Araújo Yung-Tay Neto
E as audiências de custódia?
O ideal, talvez, é que tais afirmações não devessem estar sendo difun-
didas por agora, até porque, considerando o pouquíssimo tempo em que o
Distrito Federal iniciou tais audiências – em 14 de outubro de 2015 – ainda
não houve a possibilidade de realização de nenhum estudo científico sério e
capaz de correlacionar, ou não, eventual aumento da criminalidade com o
início das audiências de custódia.
173
Audiência de Custódia: uma Questão de Tolerância e Empatia (...) dos Presos Provisórios no Brasil
A culpa, se é que essa seria a palavra mais adequada à questão, está muito
mais relacionada com o próprio sistema de justiça criminal e com a ausência do Es-
tado e de políticas públicas de distribuição de riquezas e de acesso aos bens da vida
a todas as camadas da população do que com a ideia simplista e maniqueísta do
encarceramento versus a liberdade provisória. Aliás, e é importante que se esclareça,
a afirmação de que “a polícia prende e o Juiz solta” é absolutamente falaciosa.
174
Pedro de Araújo Yung-Tay Neto
De todo modo, e mesmo com uma das mais elevadas taxas de encar-
ceramento e manutenção de pessoas presas do planeta (INFOPEN, 2014),
ainda assim a criminalidade não para de crescer no país e no Distrito Federal,
o que atesta que a questão é muito mais complexa do que a mera alegação
da necessidade de se prender mais ou se manter por mais tempo as pesso-
as presas. Note-se, por outro lado, que os panfletos alarmantes que somente
buscam servir como arautos da catástrofe, insistem em chamar de criminosos
indivíduos que sequer foram acusados pelo Ministério Público e, muito me-
nos, julgados pelo Poder Judiciário.
Mas isso, ao que tudo indica, não auxiliaria em nada a melhoria das
condições de vida da população brasileira. Aliás, o recém-divulgado Rela-
tório Mundial 2016: Brasil, da internacionalmente conhecida instituição
Human Rights Watch, descreveu, com detalhes, violações crônicas de direi-
tos humanos que assolam o Brasil, “incluindo execuções extrajudiciais pela
polícia, a superlotação das prisões, tortura e maus-tratos a pessoas detidas”8.
8 Human Rights Watch, Relatório Mundial 2016: Brasil. Disponível em: <https://www.hrw.org/sites/
default/files/brasil.pdf>. Acesso em 02 de fevereiro de 2016.
175
Audiência de Custódia: uma Questão de Tolerância e Empatia (...) dos Presos Provisórios no Brasil
serviço mataram 494 pessoas nos primeiros nove meses do ano, um aumento
de 1 por cento em relação ao mesmo período de 2014. Com frequência, a
polícia registra essas mortes como resultantes de confrontos com criminosos.
Enquanto algumas mortes resultam do uso legítimo da força pela polícia,
outras não, um fato documentado pela Human Rights Watch e outros grupos
e reconhecido pelos agentes do sistema de justiça criminal brasileira. Policiais
de vários estados também foram acusados de participar em chacinas. No estado
do Pará, 10 pessoas foram assassinadas em novembro de 2014 após a morte de
um policial que, de acordo com a investigação conduzida pelo legislativo do
estado, liderava uma milícia. Os promotores denunciaram 14 policiais militares
por não socorrerem as vítimas nem perseguirem os autores do crime. No
estado do Amazonas, 12 policiais e três civis foram detidos por supostamente
fazerem parte de um grupo de extermínio que matou pelo menos oito pessoas
em julho, durante um fim de semana em que 36 pessoas foram assassinadas
em Manaus, a capital do estado. Em São Paulo, oito policiais foram presos sob
acusação de envolvimento com os assassinatos de 19 pessoas, incluindo dois
adolescentes, poucas horas após a morte de um policial, em agosto. Também
em São Paulo, três policiais foram presos pelo envolvimento com as mortes, em
setembro, de dois adolescentes de 16 anos e dois rapazes de 18. Investigadores
acreditam que as mortes foram uma vingança contra os jovens, pelo suposto
roubo da bolsa da esposa de um dos policiais detidos (Relatório Mundial
2016: Brasil. Human Rights Watch).
176
Pedro de Araújo Yung-Tay Neto
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Audiência de Custódia: uma Questão de Tolerância e Empatia (...) dos Presos Provisórios no Brasil
des provisórias que têm sido autorizadas nas inúmeras audiências de custódia
que se realizam pelo país. Tanto nos programas de auditório e nas entrevistas
veiculadas pelos meios de comunicação quanto nos comentários de cidadãos
em sítios eletrônicos, jornais, revistas e outros veículos informativos, as críti-
cas às liberdades concedidas e os gritos por cadeia e pela prisão imediata de
quem quer que tenha sido preso em suposto estado de flagrância são constan-
tes e, muitas vezes, desnecessariamente ofensivos aos Magistrados encarrega-
dos, unicamente, de cumprir e fazer cumprir a constituição e as leis editadas
pelo parlamento e de preservar os direitos fundamentais da pessoa humana.
Mas não para por aí. Essa mesma sociedade exige que o Estado, além
de infligir boa dose de sofrimento ao bandido infrator, recupere e ressocialize
o preso. Afinal, devem pensar, esse ambiente de dor e sofrimento, de convívio
com toda a sorte de maldade e malfeitores contumazes e habituais, deve fazer
a pessoa que foi presa, em especial aquela presa provisoriamente, apenas para
aguardar seu julgamento, repensar a sua vida e escolher o caminho do bem,
escolher “andar na linha” e seguir as regras do bom convívio social.
Devem pensar, ainda, que essa mesma dor e sofrimento de dias in-
findáveis passados no cárcere, apenas aguardando o dia do julgamento, será
absolutamente suficiente para agradecer e recusar, peremptoriamente, os
(nada) gentis convites que diuturnamente recebem para ingressar e integrar
facções criminosas da mais alta periculosidade.
Imagino que, com o passar do tempo, essas pessoas que deveriam fi-
car apenas provisoriamente custodiadas, por poucos dias, mas acabam amar-
gando meses e, quiçá, anos, encarceradas aguardando julgamento, devam ser
invadidas por diversos sentimentos contraditórios e paradoxais, que os afas-
tem de qualquer realidade ou mesmo esperança da vida em sociedade.
178
Pedro de Araújo Yung-Tay Neto
Na verdade, parece cada vez mais claro e evidente que boa parte
da sociedade atual não enxerga as pessoas em conflito com a lei como
seres humanos, muito menos como pessoas. Mas isso não é uma novi-
dade do século XXI. Muito pelo contrário. Desde muito tempo até o
final do século XVIII, começo do século XIX, era comum a existência
de verdadeiras “festas de punição” abertas ao público (FOUCAULT,
2008, p. 12).
179
Audiência de Custódia: uma Questão de Tolerância e Empatia (...) dos Presos Provisórios no Brasil
utilizados não estavam afeitos à tração; de modo que, em vez de quatro, foi
preciso colocar seis; e como isso não bastasse, foi necessário, para desmembrar
as coxas do infeliz, cortar-lhe os nervos e retalhar-lhe as juntas... Afirma-se que,
embora ele sempre tivesse sido um grande praguejador, nenhuma blasfêmia lhe
escapou dos lábios; apenas as dores excessivas faziam-no dar gritos horríveis
(FOUCAULT, 2008, p. 9).
9 A Constituição da República Federativa do Brasil, em seu art. 5º, inciso XLVII, alínea “a”, afirma que,
no Brasil, não haverá penas “de caráter perpétuo”.
180
Pedro de Araújo Yung-Tay Neto
tico para germinar e inspirar, treze anos mais tarde, após a queda da Bastilha,
a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (HUNT, 2009, p. 13).
181
Audiência de Custódia: uma Questão de Tolerância e Empatia (...) dos Presos Provisórios no Brasil
preso ou prisioneiro é levado a condições de vida que nada têm a ver com as
de um adulto: é privado de tudo que o adulto faz ou deve fazer usualmente
em condições e com limitações que o adulto não conhece (fumar, beber, ver
televisão, comunicar-se por telefone, receber ou enviar correspondência,
manter relações sexuais, etc.). Por outro lado, o preso é ferido em sua
auto-estima de todas as formas imagináveis, pela perda de privacidade,
de seu próprio espaço, submissões a revistas degradantes, etc. A isso
juntam-se as condições deficientes de quase todas as prisões: superlotação,
alimentação paupérrima, falta de higiene e assistência sanitária, etc., sem
contar as discriminações em relação à capacidade de pagar por alojamentos
e comodidades. O efeito da prisão, que se denomina prisionização, sem
dúvida é deteriorante e submerge a pessoa numa ‘cultura de cadeia’, distinta
da vida do adulto em liberdade (ZAFFARONI, 2001, p. 135-136).
10 O art. 7º, inciso IV, da Constituição da República Federativa do Brasil afirma que são direitos dos
trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: “IV –
salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais
básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene,
transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo
vedada sua vinculação para qualquer fim”. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 05 de fevereiro de 2016.
182
Pedro de Araújo Yung-Tay Neto
E para que esse tom possa ser um “Tom Maior”, em clave de Sol, e to-
dos possamos viver em paz e harmonia nossa sociedade, talvez, precise come-
çar, emocional e racionalmente, a identificar-se, em verdadeira ressonância
interna na alma de cada indivíduo, com a questão dos direitos humanos dos
habitantes deste planeta.
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Audiência de Custódia: uma Questão de Tolerância e Empatia (...) dos Presos Provisórios no Brasil
Considerações finais
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Pedro de Araújo Yung-Tay Neto
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Referências
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O Papel do Socioeducador como Agente de
Direitos Humanos
Clawdemy Feitosa e Silva
Introdução
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Clawdemy Feitosa e Silva
191
O papel do socioeducador como agente de direitos humanos
Para Bobbio (2004, p. 30) “os direitos do homem nascem como di-
reitos naturais universais, desenvolvem-se como direitos positivos particu-
lares, para finalmente encontrarem sua plena realização como direitos po-
sitivos universais”. Pensar em direito é pensar além da Justiça, além do que
é justo, é pensar naquilo que é devido, numa relação correlata para com o
Outro (sujeito) não só de direito, mas também de dever, é pensar na própria
vida humana, na dignidade incondicional, mas que nem sempre chega a sua
plenitude, pois não tem alcançado verdadeiramente a afirmação universal e
positiva entre todos os povos e nações, mas em muito contribuiu quando
as revoluções liberais das constituições (EUA e Francesa) proclamaram os
direitos humanos.
192
Clawdemy Feitosa e Silva
Queremos ser vistos como humanos, mas não dispensa o mesmo tra-
tamento para o Outro, a este, o desejo de estar na condição de subservientes a
nossa vontade, aos nossos deleites, sem contar a que toda violência sob suas “di-
versas formas, desrespeitam os direitos fundamentais do ser humano” passando
a ser então simplesmente como objeto de troca. A vida, a liberdade, a dignidade
tem perdido o seu real valor e significado, o preconceito não tem sido desenvol-
vido para efetivamente rompermos com os grilhões da indiferença.
193
O papel do socioeducador como agente de direitos humanos
gos entre o público alvo deste processo, o socioeducador que neste caso irá ser
mais um neste novo processo das medidas socioeducativas, pois o que se tem
visto desde a doutrina da situação irregular (Código de menores) à doutrina
de proteção integral (ECA) é que as medidas no regime de internação em sua
grande maioria não tem sido eficaz.
194
Clawdemy Feitosa e Silva
O que pensar deste Outro que não se adequa, não se adapta às neces-
sidades e exigências sociais? Muitos são compelidos à violência na própria fa-
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O papel do socioeducador como agente de direitos humanos
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Clawdemy Feitosa e Silva
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O papel do socioeducador como agente de direitos humanos
1 Quando digo o Outro, refiro-me a obra de Todorov A conquista das Américas sempre visto como
“colonizador diante do colonizado”, ou então apenas cumpridor de suas funções administrativas.
Podem-se descobrir os outros em si mesmo, e perceber que não se é uma substância homogênea, e
radicalmente diferente de tudo o que não é si mesmo; eu é um outro. Mas cada um dos outros é
um eu também, sujeito como eu. Somente meu ponto de vista, segundo o qual todos estão lá e eu
estou só aqui, pode realmente separá-los e distingui-los de mim. Posso conceber os outros como uma
abstração, como uma instancia da configuração psíquica de todo indivíduo, como o Outro, outro ou
outrem em relação a mim. Ou então como um grupo social concreto ao qual nós não pertencemos.
(TODOROV, 2010, p.3)
198
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O papel do socioeducador como agente de direitos humanos
promoção de suas atividades enquanto a escola nacional ainda não está efeti-
vamente construída.
200
Clawdemy Feitosa e Silva
Até porque segundo Lynn Hunt (2009, p. 24) “os direitos huma-
nos são difíceis de determinar porque sua definição, e na verdade sua própria
existência, depende tanto das emoções quanto da razão”, e como tem sido o
ambiente diário entre socioeducador e interno? É importante atentar quanto
importância dos socioeducadores em sua prática em relação ao Outro, não se
pode permanecer com a mesma perspectiva de repressão-punição, ser agente
socioeducador é ir além da leitura e conhecimento em direitos humanos, é
ir além dos fundamentos e questões pessoais ou profissionais, é ser sujeito
de alteridade, sujeito de direitos humanos, desta forma, segundo nos ensina
Freire (2016, p.58):
O respeito a autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e
não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros. Precisamente
porque éticos podemos desrespeitar a rigorosidade da ética e resvalar para
a sua negação, por isso é imprescindível deixar claro que a possibilidade do
desvio ético não pode receber outra designação senão a de transgressão. O
professor que desrespeita a curiosidade do educando, o seu gosto estético,
a sua inquietude, a sua linguagem, mais precisamente, a sua sintaxe e a sua
prosódia; o professor que ironiza o aluno, que minimiza, que manda que
“ele se ponha em seu lugar” ao mais tênue sinal de sua rebeldia legitima, tanto
quanto o professor que se exige do cumprimento de seu dever de ensinar,
de estar respeitosamente presente à experiência formadora do educando,
transgride os princípios fundamentalmente éticos de nossa existência.
201
O papel do socioeducador como agente de direitos humanos
202
Clawdemy Feitosa e Silva
Conclusão
203
O papel do socioeducador como agente de direitos humanos
ainda mais sua formação, e que não esteja apenas dentro de uma conduta
“bancária” de execuções das atividades profissionais tão somente, mas per-
ceba o desafio que está em suas mãos, o pensar em direitos humanos, requer
muito além da teorização, mas da escuta do Outro, da ética, pois estar na
condição de interno requer reflexões de nossas condutas, os estigmas sociais
que conduzimos independente dos nossos atos, e sendo assim, cabe aos atores
(agentes) promover processos não inibidores mas de “cultivo da humildade e
tolerância” (FREIRE, 2016, p. 65).
Referências
204
Clawdemy Feitosa e Silva
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/
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justicagovbr/mjdivulga-novo-relatorio-sobre-populacao-carceraria-
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206
Alienação Parental: Reflexões Sobre os
Desafios para o Enfrentamento
Lara Iara Gomes Borges
Sidelmar Alves da Silva Kunz
Introdução
208
Lara Iara Gomes Borges e Sidelmar Alves da Silva Kunz
Ainda nesta esteira de ideias, cabe pontuar que para Carvalho (2000)
é verificado um aumento crescente do percentual relativo a famílias que de-
positavam nas mulheres a responsabilidade de chefiá-las. Esse quantitativo
altera-se de 19,7% em 1993 para 28,8%, em 2006. Veja que esse aspecto cor-
robora a ideia de uma tendência em curso que repercute em alguma medida
num maior poder de decisão para as mulheres, ao mesmo que o contexto po-
lítico cultural brasileiro não acompanha esse movimento e deixa configurar
situações de precarização da vida e do trabalho feminino (DIAS; PEREIRA,
2002).
209
Alienação Parental: Reflexões sobre os Desafios para o Enfrentamento
não podem ficar alheios aos novos meandros que refletem a estrutura social
como um todo. Nesse tocante, vale a pena registrar o entendimento de Acos-
ta e Vitalle. (2003, p. 271):
A Família como expressão máxima da vida privada é lugar da intimidade,
construção de sentidos e expressão de sentimentos, onde se exterioriza o
sofrimento psíquico que a vida de todos nós põe e repõe. E percebida como
nicho afetivo e de relações necessárias á socialização dos indivíduos, que
assim desenvolvem o sentido de pertença a um campo relacional iniciador
de relações excludentes na própria vida em sociedade. É um campo de
mediação imperdível.
210
Lara Iara Gomes Borges e Sidelmar Alves da Silva Kunz
recasado. De acordo com Costa e Fontes (s/d), costuma-se haver para o novo
casal uma dimensão residual da relação familiar anterior, fato que repercute
em variados graus no recasamento e, por conseguinte, no seu funcionamento.
211
Alienação Parental: Reflexões sobre os Desafios para o Enfrentamento
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Lara Iara Gomes Borges e Sidelmar Alves da Silva Kunz
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Alienação Parental: Reflexões sobre os Desafios para o Enfrentamento
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Lara Iara Gomes Borges e Sidelmar Alves da Silva Kunz
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palavras não condizentes à sua faixa etária (M.S., 40 anos, Assistente Social
do Poder Judiciário, 2012).
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andar com minhas próprias pernas. Ela não tem culpa tudo que faz é
para me proteger eu sei, só que me sinto deprimida por muitas vezes
não poder dizer o que penso quero fazer ou sinto, tenho medo de ser
mal interpretada ou ser julgada por isso. (M.C.G., 28 anos).
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Gráfico 3 – Principal dificultador para que os direitos da criança e do adolescente sejam garantidos após
a denúncia
Fonte: Dados da pesquisa.
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Conclusão
Foi possível entender que mesmo não existindo cortes nem feridas
expostas, ou seja, sendo intangível fisicamente, a Alienação e a Síndrome de
Alienação Parental provocam sofrimentos psíquicos imensuráveis.
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Referências
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Lara Iara Gomes Borges e Sidelmar Alves da Silva Kunz
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Analogias Assimétricas: uma Breve Análise
acerca de Argumentos Populares contra a
Defesa de Direitos Humanos
Raphael Santos Lapa
Introdução
A matriz de possibilidades estabelecidas pela noção de Direitos Hu-
manos não pode negar uma perspectiva a partir dos argumentos populares
referentes ao que se entende pelo tema. Usualmente os argumentos na so-
ciedade contemporânea colocam que os defensores de direitos humanos, em
termos gerais, defendem bandidos. Ou ainda que sistemas de reparação his-
tórica como as cotas raciais são, na realidade, “racismo reverso”. E, ainda mais
além, que avanços nos direitos das mulheres se tratam de doutrinação femi-
nista advinda de pura ideologia. Questões como essas podem ser observadas
fartamente em debates privados e públicos.
Uma negação dessa perspectiva por parte dos estudos acadêmicos pa-
rece ser desastrosa na análise de direitos humanos no contexto contemporâ-
neo brasileiro. Como destacado por Gallardo os “Direitos humanos possuem
seu “fundamento”, ou seja, sua matriz, na conflituosidade social inaugurada e
desdobrada pelas formações sociais modernas”. (GALLARDO, 2014, p. 21).
Sendo assim é impossível retirar-se da discussão acerca da popularização dos
argumentos e imaginário popular do que vem a ser considerado como avanço
na defesa de direitos.
A lógica informal pode ser entendida como o disposto por Leo Groarke:
A Lógica Informal é uma tentativa de desenvolver uma lógica que possa
ser usada para avaliar, analisar e aprimorar os raciocínios informais
que ocorrem em relacionamentos interpessoais, propagandas, debates
políticos, argumentos legais e nos comentários sociais encontrados em
jornais, televisão, Internet e outras formas de comunicação de massa.
(GROARKE, 2003)1
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Tipos de analogias
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4 No original: “Consider an analogy offered by Samuel Johnson to illustrate the difference between
argument and testimony: “Argument is argument. You cannot help paying regard to their arguments,
if they are good. If it were testimony you might disregard it. ... Testimony is like an arrow shot from a
long bow; the force of it depends on the strength of the hand that draws it. Argument is like an arrow
from a cross-bow, which has equal force though shot by a child.”
Dr. Johnson effectively marks the difference between testimony and argument by means of afigurative
analogy. His analogy illustrates and does not argue for that distinction. If you are not independently
convinced that testimony depends for its reliability on its source, while argument must stand or fall
on its own merits, then Johnson's analogy offers nothing to persuade you.”
5 No original:
“Deductive arguments by analogy have the following form:
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analogia que é modesta quanto as suas premissas, pois os outros cinco amigos
chegaram a mesma conclusão.
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Para além dos pontos colocados, deve-se destacar que uma analogia
tenta ressaltar um ponto em comum, ou seja, a ideia é de que haja simetria na-
quilo que é relevante quanto ao que se quer destacar. É a ideia de um núcleo
comum que havia sido colocada anteriormente.
8 No original: “There are thus three types of case in which an assumption may lack contextual effects,
and be irrelevant, in a context. In the first, (...), the assumption may contribute new information, but
this information does not connect up with any information present in the context. In the second, (...),
the assumption is already present in the context and its strength is unaffected by the newly presented
information; this newly presente information is therefore entirely uninformative and, a fortiori,
irrelevant. In the third type of case, (...), the assumption is inconsistent with the context and is too
weak to upset it; processing the assumption thus leaves the context unchanged”
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Analogias Assimétricas: (...) argumentos populares contra a defesa de Direitos
A igualdade está presente naquilo que pode ser colocado como so-
ciedade política, conforme citado pelo autor anterior. O que é chamado de
igualdade cidadã, referente aos direitos políticos. Nesse sentido, pode-se falar
de igualdade ou de busca da mesma. A despeito das críticas e falhas de represen-
tatividade em um sistema de democracia representativa, deve-se ter em mente
que a igualdade é a melhor lógica por trás de uma saúde societal política.
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Isto pois uma analogia que se pretende à simetria não pode ter como
núcleo um simples contraponto imaginário. Para além do discurso, da dispu-
ta dialógica de um debate, o que se coloca nos pleitos de cada lado é a exis-
tência real, uma situação inseparável de sua condição real, ainda que tenha
perspectivas distintas.
Conclusão
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Não se trata somente de uma invalidade lógica, pois embora incorretos po-
dem ser psicologicamente persuasivos. Ou seja, a falácia está em um contexto
tanto semântico quanto pragmático. Sendo assim, o contexto de uso de uma
analogia é também relevante. A abordagem pragma-dialética (WALTON)
aqui utilizada coloca a falácia com as seguintes características:
1 - Falácias não são erros lógicos, mas sim falsos passos de comunicação
3 - São atos de fala que contam com uma violação de regras para a
discussão.
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Analogias Assimétricas: (...) argumentos populares contra a defesa de Direitos
Referências
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A Organização
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Raphael Santos Lapa - Mestrando em
Direitos Humanos e Cidadania na Univer-
sidade de Brasília - UnB. Bacharel e licen-
ciado em Filosofia pela Universidade de
Brasília - UnB.
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Sobre as(os) autoras(es)
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ral- SEEDF. Área de estudo: marcos legais e políticos da educação especial,
educação de surdos, direitos humanos, cidadania, ciências exatas e da terra.
E-mail: [email protected]
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rança Pública pela Universidade Católica de Brasília. Áreas de estudo: Direi-
tos Humanos, Educação, Cidadania, Infância e Juventude. E-mail: asotieff@
gmail.com
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Da Imagem da Capa
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Sobre o Livro
Formato: 16x24cm
Mancha: 37p9,543x54p3,969
Tipologia:
Várias
Papel:
Offset 75g/m2 (miolo)
Supremo 250g/m2 (capa)
Equipe de Realização
Projeto Editorial
Raphael Santos Lapa
Editoração
Raphael Santos Lapa
Impressão e Encadernação
Câmara Brasileira de Jovens Escritores
CBJE