Educacao Jovens Adultos Trabalhadores Revendo Marcos PDF
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Educacao Jovens Adultos Trabalhadores Revendo Marcos PDF
históricos[1]
Jaqueline P. Ventura[2]
Não é suficiente conhecer o conjunto das relações
enquanto existe em um dado momento como um
dado sistema, mas importa conhecê-los
geneticamente em seu movimento de formação,
já que todo indivíduo não é somente a síntese
das relações existentes, mas também é a história
destas relações, isto é, o resumo de todo passado.
Antonio Gramsci
Todos esses movimentos, pelo fato de terem assumido um compromisso em favor das
classes trabalhadoras rurais e urbanas, e por terem orientado sua ação educativa para uma
renovação política, representam uma proposta qualitativamente diferente das campanhas e
mobilizações promovidas no início da década de 1950, das campanhas e movimentos do pós-
1964 e das que existiam em paralelo, como, por exemplo, a educação promovida pelo sistema
empresarial. Isto porque eles entendiam que a educação e a cultura popular, como canais de
conscientização, exerciam um papel central na transformação da sociedade.
Naquele contexto, atribuía-se um peso muito grande à educação, quase como a única
responsável pelo processo de transformação de uma ampla gama de questões sociais. Contudo,
apesar dos equívocos que possam ter sido cometidos, “próprios de uma época de fortes
tendências culturalistas e de otimismo pedagógico, além de limitações do nacionalismo que
privilegiava a luta antiimperialista em detrimento da discussão sobre a luta de classes no âmbito
da sociedade” (CUNHA, 1994: 34), os movimentos sociais e políticos teceram práticas que
faziam emergir a esperança de o Brasil vir a vincular-se ao mundo de forma soberana e, no
campo educacional, de que se ampliaria, de fato, o acesso às oportunidades educacionais de toda
a população, começando pela total erradicação do analfabetismo em nosso país.
No início de 1964 o governo federal institui, no Ministério da Educação e Cultura, o
Programa Nacional de Alfabetização (PNA): mediante a utilização do referencial de
alfabetização de Paulo Freire, pretendia-se alfabetizar em torno de cinco milhões de brasileiros,
tendo o próprio Paulo Freire sido convidado para coordenar o Programa. Contudo, logo em
seguida, com o golpe civil-militar, o Programa foi extinto, sob a alegação de ser de teor
subversivo[22]. Também as outras experiências de educação popular[23], que vinham sendo
desenvolvidas desde 1960, foram objeto de crítica dos defensores da ordem político-social
instalada, e quase todas foram sufocadas, reprimidas com o regime político de ditadura civil-
militar.
O único grande movimento a sobreviver foi o Movimento de Educação de Base
(MEB), sob o custo da ruptura com os compromissos da educação de classe que vinha
desenvolvendo e da revisão dos seus pressupostos teóricos e metodológicos, além da sua
mudança geográfica (deslocamento do Nordeste para a Amazônia). Paralelamente, multiplicam-
se os movimentos de desenvolvimento comunitário e os programas de extensão universitária
dedicados à educação dos adultos (PAIVA, 1983), agora ancorados em um projeto político-
ideológico completamente distinto do proposto no período anterior.
É interessante destacar a forma como o MEB se metamorfoseou para continuar com o
apoio oficial e, assim, garantir sua inclusão, em 1970, no PNA. Nessa mudança de orientação,
substituiu-se o seu papel de agente transformador pelo de evangelizador:
De 1964 até meados de 1980, as experiências no âmbito dos movimentos sociais são
proibidas e substituídas por iniciativas centralizadas pelo governo federal. Os acordos MEC-
USAID[25] encerram a fase dos movimentos de educação e cultura popular. O tecnicismo e o
economicismo na educação, principalmente por meio da difusão da Teoria do Capital Humano,
serão as marcas das experiências implementadas no período. Num primeiro momento, o
governo autoritário substituiu o PNA pela Cruzada da Ação Básica Cristã (Cruzada ABC).
Depois, implementou, com muito mais amplitude e raio de ação, o Movimento Brasileiro de
Alfabetização (Mobral); o Ensino Supletivo cresceu e ganhou legitimidade.
A Educação de Jovens e Adultos trabalhadores, inserida no contexto da ideologia da
segurança e do desenvolvimento nacional e desenvolvida através da Cruzada ABC, foi
organizada como programa de impacto norte-americano, com verbas dos acordos MEC-USAID.
A Cruzada pretendia desenvolver, a partir de uma visão de integração e subordinação ao capital
internacional, programas de alfabetização, educação continuada, comunitária e orientação
profissional. Sua prática, no entanto, acabou por significar a distribuição de alimentos, com “a
função de assegurar a atividade voluntária de professores e membros da comunidade bem como
manter elevada a freqüência integral às atividades escolares”. (PAIVA, 1998). Devido às várias
críticas recebidas[26], particularmente quanto ao recebimento de verba pública sem controle ou
devida fiscalização, a Cruzada foi extinta, em 1971, pela Portaria nº 237, que revogava toda a
legislação anterior. Nesse mesmo horizonte, a LDB de 1961, considerada demasiadamente
humanista pelos intelectuais orgânicos do capital internacional, associados ao empresariado
nacional, veio conseqüentemente, a ser apontada como incapaz de responder às exigências do
desenvolvimento do País.
Já a Lei nº 5692/71 significou a materialização desse processo, que culminou com a
alteração da lei anterior e trouxe a regulamentação da EJA. Pela primeira vez, uma legislação
específica organizou ensino de jovens e adultos em capítulo próprio, diferenciando-a do ensino
regular básico e secundário, abordando, inclusive, a necessidade da formação de professores
especificamente para ela, e trazendo avanços significativos para a EJA. Na verdade, apesar de
ter sido elaborada no auge do período de ditadura civil-militar, esse instrumento legal,
contraditoriamente, representou a ampliação, em nível legislativo, das oportunidades
educacionais[27].
No ano seguinte, 1972, dois documentos – Política para o Ensino Supletivo e o
Parecer nº 699/72[28] – estabeleciam a doutrina do Ensino Supletivo, apontando para uma nova
concepção de escola[29]. Dois anos depois, foram criados pelas secretarias estaduais de educação
os Centros de Estudos Supletivos (CES). Foi, assim, no interior de reformas autoritárias e no
ápice do processo de modernização conservadora que o Ensino Supletivo ganhou estatuto
próprio. Diante disso, há quem considere – e não são poucos – que, oferecendo o Mobral e o
Ensino Supletivo, os militares buscaram reconstruir, através da educação, sua mediação com os
setores populares.
O Mobral não parou de crescer durante toda a década de 1970 e, ao longo dos seus 15
anos de existência, gozou de enorme autonomia, estabelecendo sua estrutura em paralelo aos
sistemas de ensino existentes[30]. Perdurou durante todo o período da ditadura militar[31], com
imensa força política e financeira. Chama a atenção, mais uma vez, o fato desse Movimento ter
sua origem num período em que já havia um consenso mundial em torno da ineficiência das
campanhas de alfabetização, o que não impediu a sua reprodução. Como alerta Machado (1999),
A década de 70 marca (...) um novo descompasso na EJA em relação à
proposta de educação como um todo. Enquanto o Ministério da
Educação caminhava cada vez mais para a descentralização do Ensino
Fundamental, o MOBRAL representava uma ação centralizadora de
âmbito nacional desvinculada de uma coordenação direta do próprio
ministério (p. 6).
Como já visto, no período compreendido entre 1930 e 1980 “o Estado redefiniu suas
funções em matéria econômica, ampliando-as qualitativa e quantitativamente. (...) a principal
especificidade do capitalismo brasileiro é a profunda interferência do Estado na sua
constituição” (MENDONÇA, 1985: 101). Ou seja, a burguesia nacional sempre contou com o
Estado para crescer e desenvolver-se em seu projeto de capitalismo subordinado. A crise
capitalista, na especificidade brasileira (particularmente nos anos 1980), reconfigura tal relação:
agora, a fim de adequar-se ao novo modelo de acumulação flexível, o empresariado nacional
passa a demandar a reestruturação do Estado[33], para, conforme os ditames da globalização,
inserir-se competitivamente na economia mundial.
No campo político, os anos 1980 foram marcados por fatos de grande significação,
como a superação do regime civil-militar, a fundação das centrais sindicais, a promulgação da
Constituição de 1988, o surgimento e consolidação de várias formas de organização da
sociedade civil e a realização da primeira eleição direta para a Presidência da República desde o
fim da ditadura. Segundo Oliveira (2001), o embate eleitoral travado em 1989 produziu um
abalo no consenso das classes dominantes, como poucas vezes se viu no Brasil:
A primeira foi a abolição da escravatura, que rompeu o consenso pelo
lado conservador. (...) a segunda foi a Revolução de 1930, um ato
conduzido de fora para dentro – a emergência de uma nova classe
social (...). Depois, nós tivemos, no pré-1964, a emergência de uma
voz que tinha sido sempre calada, que é a voz do campesinato [34]. Seus
discursos e falas, postos nesta sociedade do silêncio, que aprendeu a
silenciar corpos, mentes e cérebros, foi uma das coisas mais
revolucionárias que aconteceram nos anos pré-1964. (p. 53)
Nos anos 1990, tendo como lógica que à escola cabe o "desenvolvimento de aptidões
para a vida produtiva" (Art. 39), a nova LDB (Lei nº 9.394/96) reservou um espaço privilegiado
para a educação profissional, considerada como um fator estratégico de competitividade e
desenvolvimento humano na nova ordem econômica mundial. No que tange à EJA, pode-se
dizer que também ela teve um lugar de destaque, sendo contemplada com um capítulo próprio
na nova lei, cujo conteúdo, entretanto, sofreu um claro retrocesso em relação à Constituição de
1988[40], principalmente pelo fato de referir-se à EJA como “cursos e exames supletivos” (Art.
38), retornando à concepção de educação compensatória.
No âmbito da EJA, Haddad (1998) também considera que nos anos de 1990, em
particular no começo do governo Collor, o ponto de inflexão começou a se delinear: utilizando
um discurso que valorizava o combate ao analfabetismo, em resposta ao Ano Internacional da
Alfabetização, convocado pela UNESCO, foi criado o Programa Nacional de Alfabetização e
Cidadania (PNAC), presidido pelo Senador João Calmon, caracterizado por sua grande
divulgação pelos meios de comunicação e por seu caráter, tido como demagógico. Na prática, as
comissões criadas tiveram pouco ou nenhum controle efetivo sobre os projetos apoiados e os
recursos distribuídos:
O PNAC se propôs a promover e mobilizar ações de alfabetização,
através de comissões municipais, estaduais e nacional, envolvendo os
diversos setores interessados das esferas públicas e da sociedade
civil em geral. Enquanto as comissões se mobilizaram, o governo
federal assinava convênios, repassando fundos mediante critérios
clientelistas e sem controle destas comissões, tanto do volume de
recursos, quanto do número de projetos e a quem se destinavam.
(HADDAD, 1994: 97)
Assim, o PNAC promoveu mais alarde do que ações concretas, morrendo antes
mesmo do seu efetivo nascimento, sem apoio financeiro e político, tendo simplesmente caído no
esquecimento. O terceiro Ministro da Educação do governo Collor, José Goldemberg, chegou a
fazer declarações sobre o quanto considerava a EJA desnecessária e sem importância para a
sociedade[41]. Como conseqüência, promoveu cortes nos recursos do orçamento de 1993
destinados a essa modalidade e reduziu sua importância na hierarquia interna do Ministério[42].
No governo Itamar Franco, quando da gestão de Murílio Avellar Hingel no Ministério
da Educação e do Desporto em conseqüência das obrigações constitucionais e dos
compromissos internacionais assumidos o governo federal estabeleceu em 1993 o Plano
Decenal de Educação para Todos, propondo “nos dez anos seguintes promover a escolarização
de 8,3 milhões de jovens e adultos, dos quais, 2,7 milhões de analfabetos e 4,6 milhões com
baixos níveis de escolarização”[43]. O Plano reconhece a importância da educação básica de
jovens e adultos e propõe metas ambiciosas de atendimento prioritário à população de 15 a 19
anos[44]. Contudo, os problemas desse e dos outros planos que o antecederam residiam,
principalmente, no fato de não serem previstos claramente os recursos e meios que se
utilizariam para atingir suas metas.
Embalada pelo discurso de desqualificação da EJA contido nas propostas e
orientações de alguns educadores brasileiros e assessores do Banco Mundial [45], a proposta de
Emenda Constitucional nº 233 (posteriormente transformada no Projeto de Lei nº 92/96)
introduziu uma sutil alteração no Inciso I do Artigo 208 da Constituição, o que, na prática,
significou a destituição do direito à obrigatoriedade da oferta da EJA, adquirida na Constituição
de 1988. Na primeira versão, o Artigo 208 estipulava: “ensino fundamental obrigatório e
gratuito inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria”. Após a alteração, o
governo manteve a gratuidade da educação pública de jovens e adultos, mas suprimiu a
obrigatoriedade do poder público oferecê-la. Restringindo o direito público subjetivo[46] quanto
ao acesso ao ensino fundamental apenas à escola regular, após a emenda o Artigo 208 ficou
assim: “ensino fundamental obrigatório e gratuito, assegurada, inclusive, sua oferta gratuita para
todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria”.
A LDB de 1996, portanto, completa o movimento de reforçar a educação de pessoas
jovens e adultas como uma educação de segunda classe, principalmente ao separar a educação
básica da formação profissional, particularmente no ensino médio, onde até então existia o curso
secundário profissionalizante. Essa determinação legal levou à reestruturação do sistema federal
de formação profissional, descaracterizando as escolas técnicas federais; também minimizou a
participação do Estado na execução dos cursos de formação profissional, estabelecendo que sua
gestão e financiamento deveriam caber ao Ministério do Trabalho, deixando a tarefa de
execução às diversas instituições da sociedade civil, ONGs, sindicatos e entidades empresariais
religiosas.
A indefinição de responsabilidades entre as esferas de governo e a atitude evasiva
provocada pela criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e
Valorização do Magistério (FUNDEF) – Lei nº 9.424 –, sancionado em dezembro de 1996,
foram aspectos que acentuaram a exclusão da EJA, visto que os seus alunos não foram
considerados, na contagem do censo geral das matrículas que podiam fazer jus aos recursos do
Fundo, sob a alegação de que haveria dificuldade de recenseamento e não disponibilidade de
dados estatísticos no MEC/INEP. Em outras palavras, a EJA continua ocupando um lugar
secundário no interior das políticas educacionais do ensino fundamental.
Analisando-se mais detidamente a LDB de 1996, percebe-se que seu texto trata a
modalidade da EJA como mais uma, no âmbito da educação básica, nas suas etapas fundamental
e média; contudo, apesar de substituir a expressão Ensino Supletivo pelo termo Educação de
Jovens e Adultos, de caráter mais amplo, manteve a expressão “exame supletivo” o que, aliado
ao fato de não se prever na lei a freqüência ou duração dos cursos, como também, de quem é a
obrigação de ofertá-la, deixa espaço para que, na prática, nada ou pouca coisa mude. Como
assinala Beisiegel (apud CURY, 2000, p.19), “parece estar em curso um processo de redefinição
das atribuições da educação fundamental de jovens e adultos, que vêm sendo deslocadas da
União para os Estados e, principalmente, para os Municípios, com apelos dirigidos também ao
envolvimento das organizações não-governamentais e da sociedade civil” (grifo nosso).
Ao examinarmos cuidadosamente a EJA na década de 1990, percebemos um duplo
processo de exclusão: um, construído historicamente pela descontinuidade e falta de efetivo
compromisso com a modalidade, ao longo de sua trajetória; e outro, decorrente do processo de
globalização e da forma excludente de apropriação das novas tecnologias e das novas formas do
processo de trabalho. Segundo Sonia Rummert[47], a esse quadro soma-se ainda o que se pode
chamar de uma nova etapa de desqualificação, decorrente do caráter evasivo da legislação, da
falta de vontade política e da atitude negativa por parte de alguns intelectuais em relação à
educação de jovens e adultos[48].
Moll (1998) apresenta dados que denunciam a insuficiência da atuação do MEC em
relação à demanda da população adulta existente nos anos 1990. Embora longo, transcrevemos,
a seguir, a análise e o confronto que a autora faz entre oferta e demanda do ensino supletivo do
então 1º grau, no Brasil:
Para o ano de 1995 (MEC 1998) o total de matrículas no ensino
supletivo de 1º grau, para o Brasil era de 224.041 (...). A rede pública
oferecia a maior parte das matrículas, somando 79% das vagas
distribuídas em 59,1% na rede estadual, 19,1% na rede municipal e
0,8% na rede federal. A rede privada oferecia 21% das vagas do
ensino fundamental supletivo de adultos, portanto, superava a oferta
pública municipal.
A caracterização do ridículo se dá pela oferta ínfima diante da
demanda gigantesca. Pelos números do IBGE (PNAD), tínhamos em
1990: 20.178.087 brasileiros e brasileiras com 10 anos e mais,
analfabetos ou incapazes de ler e escrever um bilhete simples; e,
46.681.581 com menos de 4 anos de estudo, patamar mínimo definido
pela UNESCO para que alguém seja considerado
alfabetizado.Confrontando estes dados com as matrículas apresentadas
pelo MEC para o ensino supletivo, teríamos um atendimento a 0,33%
da demanda. Digo teríamos porque, certamente, há resultados não
mapeados e não computados de inúmeros programas desenvolvidos
por diferentes setores da sociedade civil e pelo próprio Estado.
Apesar desta ressalva, para fins ‘oficiais’, os dados são escandalosos.
Assim, somados os dados de ‘improdutividade’ da escola regular de
crianças e jovens, com os dados do analfabetismo e da
subescolarização adulta, milhões, talvez um pouco mais da metade da
população, sejam os candidatos a programas de
‘supletividade’ (MOLL, 1998:112/113, grifos nossos).
Tal debate assume, na década de 1990, papel de destaque no discurso dos grupos
hegemônicos, defensores de um desenvolvimento dependente para o Brasil, com conseqüências
nas políticas governamentais pensadas por aqueles que se preocupam com uma formação
profissional e educacional voltadas para atender, exclusivamente, às necessidades imediatas do
mercado de trabalho, frente às exigências impressas pelas novas tecnologias e formas de
organização da produção e do trabalho (SINGER, 1995). As políticas educacionais
desenvolvidas pelo governo, como parte das políticas sociais, orientam-se, fundamentalmente,
para a conformação de uma estrutura que seja veículo de efetivação das exigências do modelo
neoliberal. Na modalidade de EJA, especificamente, com a extinção do Mobral, em 1985,
percebe-se que:
O Brasil viveu uma década de intensos debates em torno da EJA, seja
no âmbito da Fundação Educar que o sucedeu; nas discussões em
torno da Constituição de 1988, durante o Ano Internacional da
Alfabetização (1990); nas reflexões das Comissões Nacionais de EJA;
nos encontros e seminário nacional preparatórios para a V
Conferência Internacional de Educação de Adultos na Alemanha em
1997 (MACHADO, 1999: 8)
No que tange à sua organização, esse tipo de educação foi estruturada para
ser desenvolvida em articulação com o ensino regular ou em diferentes modalidades que
contemplem estratégias de educação continuada. O Decreto nº 2208/97 redefinia a educação
profissional, conceituando novas modalidades de ensino:
Art. 3º A educação profissional compreende os seguintes níveis:
I – básico: destinado à qualificação, requalificação e
reprofissionalização de trabalhadores, independente de escolaridade
prévia;
II – técnico: destinado a proporcionar habilitação profissional a alunos
matriculados ou egressos do ensino médio (...);
III – tecnológico: corresponde a cursos de nível superior na área
tecnológica, destinados a egressos do ensino médio e técnico
(BRASIL, 1997, grifos nossos)
Quanto ao MEC, parece-nos que compartilhando a visão do Banco Mundial pela qual
educar jovens e adultos no mundo “globalizado e competitivo” é infértil, procura resolver o
“problema” como mandam os financistas internacionais: valorizando a universalização do
ensino fundamental voltado para as crianças de 7 a 14 anos e transferindo para a esfera privada
a responsabilidade pela EJA, utilizando o discurso da necessidade de parcerias.
O caminho da destituição de direitos e da deslegitimação da EJA como política
pública e gratuita veio acompanhada pelo crescimento, nos diferentes meios de comunicação de
massa, de reportagens como O triste exército de Brancaleone[53], da qual reproduzimos o trecho
abaixo[54]:
NA GUERRA DA GLOBALIZAÇÃO, O BRASIL ENTRA COM
EFETIVO DE
20 MILHÕES DE ANALFABETOS
Estudar a “nova” identidade da EJA[56] parece levar-nos, cada vez mais, a vê-la como
bastante ampla, fragmentada, heterogênea e complexa: além das diferentes entidades que
propõem alguma atividade na área, destaca-se o grande número de experiências desenvolvidas
com recursos provenientes do Fundo de Amparo do Trabalhador (FAT). Tais ações parecem
estar voltadas para inúmeras iniciativas: – alfabetização, educação básica e/ou cursos
profissionalizantes (educação profissional de nível básico) –, todas orientadas pelo mesmo
princípio: o de empregabilidade[57].
A concepção de EJA, aligeirada e submetida à lógica imediata do mercado, defendida
pelas forças conservadoras, hegemônicas nos anos 1990, mantém o caráter descontínuo,
irregular, fragmentado e compensatório da política educacional brasileira dirigida para essa
modalidade. Acompanhando essa lógica, as diretrizes do MEC caracterizaram-se por incentivar
outros setores do governo e da sociedade civil a assumir ações nessa área. Isto fez com que,
entre outros problemas, as fontes de financiamento governamentais se dispersassem,
desequilibrando a distribuição de recursos, conforme o I Encontro Nacional de Educação de
Jovens e Adultos, realizado no Rio de Janeiro, em setembro de 1999, já ressaltava:
A inexistência de uma política nacional de EDJA, coerente e
articulada, contribui para fragmentar e dispersar a alocação de
recursos para a área. Conseqüentemente, registra-se no âmbito da
EDJA, uma distribuição desigual de recursos entre entidades públicas
e privadas acarretando a existência de programas, projetos e outras
ações que dispõem de significativo montante de verbas e de outros
que se realizam com absoluta precariedade de recursos. Um exemplo
dessa desigual distribuição de recursos está nas verbas alocadas pelo
Fundo de Amparo ao Trabalhador – FAT ao MTb, para a execução de
programas de qualificação profissional, em contraste com os recursos
alocados para a EDJA pelo MEC. (p. 4).
[1] Este artigo constitui a adaptação do Capítulo II da Dissertação O PLANFOR e a Educação de Jovens e
Adultos Trabalhadores: a subalternidade reiterada, apresentada ao Curso de Pós-Graduação em
Educação da Universidade Federal Fluminense, em 2001, como requisito parcial para obtenção do Grau
de Mestre. Área de Concentração: Trabalho e Educação.
[2] Doutoranda na Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense.
[3]
Segundo Freitag (1995: 47), no primeiro período, que abrangeria de 1500 a 1930 – caracterizado pelo
modelo agro-exportador da economia, “não havia nenhuma função de reprodução da força de trabalho a
ser preenchida pela escola”. Quanto às funções de reprodução das relações de dominação e de reprodução
da ideologia dominante, a Igreja Católica as preenchia através das escolas jesuíticas.
[4]
O próprio termo “campanha” remete a algo emergencial, provisório, à parte do sistema regular de
ensino.
[5]
Dados os objetivos e limites deste trabalho, não é possível abordar as iniciativas de educação gestadas
pelos próprios trabalhadores. Contudo, cabe registrar que, desde o início do século, os trabalhadores
organizados implementavam iniciativas de educação de adultos, inclusive com manutenção de escolas
próprias, destacando-se, principalmente, a atuação dos anarquistas. Sua estratégia combinava luta política
e educação da classe trabalhadora, esta última entendida como ampla formação cultural. A respeito, ver
Canêdo (1991).
[6]
Grosso modo, se considerarmos da Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA) até o
término do Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), pode-se afirmar que tivemos no Brasil mais
de 30 anos de campanhas alfabetizadoras de massa.
[7]
Os índios e os escravos foram os primeiros aprendizes de ofício, o que contribuiu para que o início da
formação do trabalhador brasileiro fosse marcado fortemente pelo estigma da servidão.
[8]
Antes da década de 1930 existiram escolas profissionalizantes; contudo, estas não tinham por objetivo
preparar para o mercado industrial em expansão. “A primeira notícia de um esforço governamental em
direção à profissionalização data de 1808, quando um Decreto do Príncipe Regente, futuro D. João VI,
criou o ‘Colégio das Fábricas’, logo após a suspensão da proibição de funcionamento de indústrias
manufatureiras em terras brasileiras. A partir de 1840, foram construídas dez Casas de Educandos
Artífices em capitais de província. Posteriormente, o Decreto Imperial de 1854 criava estabelecimentos
especiais denominados Asilos da Infância dos Meninos Desvalidos. Na segunda metade do século
passado [século XIX] foram criadas, ainda, várias sociedades civis destinadas a amparar crianças órfãs e
abandonada. As mais importantes delas foram os “Liceus de Artes e Ofícios”, dentre os quais os do Rio
de Janeiro (1858), Salvador (1872), Recife (1880), São Paulo (1882), Maceió (1884) e Ouro Preto
(1886).” (BRASIL, 2000). Segundo Kuenzer (1991), em 1909 foram criadas pelo governo federal 19
escolas de aprendizes artífices; no entanto, seu surgimento também não foi decorrente da necessidade de
mão-de-obra qualificada. Visto o caráter incipiente do desenvolvimento industrial naquele período, de
acordo com a autora, “a motivação que justificou a criação dessas escolas foi a preocupação do Estado
em oferecer alguma alternativa de inserção no mercado de trabalho aos jovens oriundos das camadas mais
pobres da população” (p. 7).
[9]
A proclamação da República, em 1889, e a instituição do sistema federativo de governo consagraram
também a descentralização do ensino e a dualidade de sistemas, delegando à União o controle do ensino
superior e do ensino secundário; aos estados coube criar o ensino primário e o ensino profissional. Em
1906 foi aprovado um crédito do governo federal para que os estados criassem escolas técnicas
profissionais. Durante o governo Nilo Peçanha foram criadas escolas profissionalizantes em todas as
capitais. “A preocupação com o ócio e a desordem era muito grande e educar um indivíduo pobre era
criar nele o hábito pelo trabalho” (GOMES, 1994:25).
[10]
A educação funcional era entendida como “um processo global e integrado, de formação técnica e
profissional do adulto – em sua forma inicial – feito em função da vida e das necessidades do trabalho;
um processo educativo diversificado, que tem por objetivo converter os alfabetizados em elementos
conscientes e eficazes na produção e no desenvolvimento em geral. Do ponto de vista econômico, a
alfabetização funcional tende a dar aos adultos iletrados os recursos pessoais apropriados para trabalhar,
produzir e consumir mais e melhor. Do ponto de vista social a facilitar-lhes sua passagem de uma cultura
oral a uma cultura escrita, a contribuir para a sua melhoria pessoal e do grupo”(LEAL,1985: 12).
[11]
A Lei Orgânica do Ensino Industrial, Decreto-lei nº 4.073 de 30 de janeiro de 1942, veio estabelecer
as bases da organização e do regime do ensino profissional em todo país. Até a criação das leis orgânicas
do Ensino, a partir de 1942, o ensino profissional, à exceção das escolas federais, não tinha nenhuma
regulamentação.
[12]
Ver Rodrigues (1998b).
[13]
Vale registrar que o governo era, e ainda é, o responsável pelo recolhimento dessa contribuição. Na
realidade, tal contribuição é efetuada pela sociedade, e não pelos industriais: ao se comprar produtos
industrializados vem embutida no preço final a contribuição destinada à formação profissional.
[14]
Os programas desenvolvidos, principalmente no meio rural e no Nordeste, foram considerados de
baixa qualidade e extremamente rudimentares. No final dos anos 1950, o Ministro da Educação, tentando
defendê-la, utilizou o argumento de que a CEAA “pelo menos servia para o esclarecimento dos pais
quanto à necessidade da freqüência das crianças à escola, e de que era um programa de pequeno custo”.
(PAIVA, 1981: 89).
[15]
Paulo Freire esteve no Congresso, apresentando o trabalho Educação de adultos e as populações
marginais: o problema dos mocambos, em que relacionava o problema do analfabetismo à situação de
miséria a que estava submetida grande parte da população brasileira (SANTOS, 1998: 20).
[16]
“Embora muito heterogêneas, quer pelas suas origens, quer pelos propósitos que desejam atingir – tipo
de sociedade que querem construir – bem como quanto à forma e aos caminhos para sua concretização, as
esquerdas se aglutinam em torno da bandeira das reformas de base” (BRUM, 1993:134).
[17]
Diz-nos Brum: “Sob o rótulo de Reformas de Base coloca-se um conjunto de medidas consideradas
necessárias, pelas esquerdas e pelos progressistas, para superar o atraso histórico, sair da crise global em
que a nação está mergulhada, integrar as populações marginalizadas na vida nacional e encaminhar o país
decididamente no rumo do desenvolvimento” (1993: 134). Dentre as reformas de base estão: a reforma
agrária, urbana, eleitoral, bancária, educacional etc.
[18]
Outro exemplo democratizante foi a Campanha em Defesa da Escola Pública, ocorrida em 1961,
durante a tramitação da Lei de Diretrizes e Bases – Lei 4024/61.
[19]
“O apoio da União à iniciativa do episcopado foi fixado nos termos do Decreto nº 50.370, de 21 de
março de 1961, e compreendia o financiamento das operações, a cessão de funcionários e a cooperação de
todos os órgãos federais que, de qualquer forma, pudessem auxiliar na realização dos serviços”
(BEISIEGEL, 1974: 158).
[20]
As organizações de jovens católicos, nesse período, rompem com a evangelização desvinculada do
contexto social, econômico e cultural e, em sua grande maioria, engajam-se em uma perspectiva de
atuação política visando a mudanças estruturais na sociedade brasileira.
[21]
Como exemplo, podemos citar a proposta do teatro popular (Teatro do Oprimido): “um teatro que seja
realmente libertador e que comece por libertar o espectador de sua passividade, da sua condição de
testemunha, e que o converta em ser ativo (...). Todo teatro é político, ainda que não trate de temas
especificamente políticos. Dizer ‘teatro político’ é um pleonasmo, como seria dizer ‘homem humano’.
Todo teatro é político, como todos os homens são humanos, ainda que alguns se esqueçam disso” (BOAL,
1995: 9 e 15).
[22]
O PNA, que chegou a ser operacionalizado em Brasília, no projeto-piloto nordeste (Sergipe) e projeto-
piloto sul (Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro) foi extinto em abril de 1964, 14 dias após o golpe de
Estado pelo Decreto nº 53.886 (CUNHA, 1994).
[23]
A ampliação dos movimentos de cultura popular por todo Brasil ficou evidenciada no I Encontro
Nacional de Alfabetização e Cultura Popular, realizado em 1963, em Recife, no qual “estiveram presentes
77 movimentos, dos quais 44 desenvolviam atividades de alfabetização de adultos” (CUNHA, 1994: 31).
[24]
No processo de revolução-restauração, o Estado buscava, por todos os meios, "quebrar os organismos
da sociedade civil e obter o consenso, ao assimilar e dar respostas a algumas das demandas dos grupos
sociais derrotados em 1964 - consenso este, no entanto, obtido de maneira passiva, ao ter como
pressuposto a atomização das massas”. (NEVES, 1997:45).
[25]
Série de convênios assinados entre o MEC e a USAID (United States Agency for international
Development). Sobre o assunto, ver Arapiraca (1982).
[26]
As principais críticas e oposições à Cruzada ABC vinham, por um lado, da Igreja Católica, insatisfeita
com a ampliação da atuação educacional de um organismo ligado à Igreja Evangélica, principalmente
levando-se em conta o momento de dispersão e refluxo (forçado) do MEB. Por outro lado, os setores
nacionalistas criticavam o fato de a Cruzada ser implementada diretamente por uma entidade privada
norte-americana: “Como combinar o estímulo a sentimentos patrióticos, a propaganda do Brasil Grande, a
imagem da nação forte que vive o ‘milagre econômico’ e aspira tornar-se potência mundial, com a
existência de um programa de educação de massa orientado e dirigido por estrangeiros?” (PAIVA, 1981:
97).
[27]
Com a Lei nº 5692/71 inicia-se um período de intenso investimento público no ensino
supletivo, estruturado a partir de quatro funções: suplência, suprimento, aprendizagem e qualificação.
Esse ensino teve uma enorme expansão, crescendo paralelamente à estrutura regular do MEC (na época 1º
e 2º graus regulares).
[28]
No Parecer nº 699/72, CE de 1º e 2º graus, aprovado em 6/7/72, o conselheiro e relator Valnir Chagas
coloca para o então Ministro da Educação, Jarbas Passarinho, que o ensino supletivo constitui “um
manancial inesgotável de soluções para ajustar, a cada instante, a realidade escolar às mudanças que se
operam em ritmo crescente no País e no mundo”. (MEC/SDU. Legislação do Ensino Supletivo. Brasília.
Departamento de Documentação e Divulgação, 1978).
[29]
Contudo, segundo Haddad (1991: 56), a lei, fruto de um período contraditório, também contribuía para
a incorporação de concepções assistencialistas, compensatórias, propondo-se a recuperar o atraso.
[30]
Na década de 1970, a educação de adultos, principalmente sob a forma de Ensino Supletivo, assume
um tal nível de complexidade e abrangência que levou à criação, em 1973, de um organismo federal com
a função de coordená-lo: o Departamento de Ensino Supletivo (DSU) do MEC (VARGAS, 1984).
[31]
Apesar dos limites deste trabalho, não se pode deixar de registrar que: “Numa conjuntura de
consolidação da ditadura militar, experiências de resistência, e de autonomia dos trabalhadores
emergiram, mostrando que estes não estavam totalmente subjugados, e que tinham clareza acerca da
educação que lhes interessava. Durante a década de 1970, vários operários se organizaram em grupos de
estudo alternativos; tal organização tinha por fim viabilizar possíveis alternativas de educação popular, a
partir da perspectiva de resistência (...). Contando com recursos e financiamentos dos próprios
trabalhadores e com o apoio da Igreja Católica, organizaram materiais e metodologias próprias,
desenvolvendo atividades que variavam desde cursos de qualificação até supletivos de 1º e 2º graus. No
final de década de 70 alguns núcleos de operários, como, por exemplo, o de São João de Meriti/RJ,
passaram a organizar seminários para trabalhadores em várias regiões do País. As experiências de
organização dos trabalhadores para sua própria educação deram origem a diversas iniciativas como, por
exemplo, a fundação da ONG CAPINA - Cooperação e Apoio a Projetos de Inspiração Alternativa, e a
constituição do Conselho das Escolas de Trabalhadores” (VENTURA, 1997: 51-52).
[32]
Sobre o desacerto do Mobral e o seu caráter de retorno às experiências já comprovadamente
insatisfatórias, ver: Paiva, 1981.
[33]
A reestruturação do Estado sustenta-se, basicamente, em três estratégias: desregulamentação
(supressão de leis e regulamentações que asseguram direitos adquiridos), descentralização (transferência
aos agentes econômicos, sociais e educacionais da responsabilidade de disputa no mercado, a venda de
seus produtos e serviços) e, por fim, a privatização (que submete as empresas estatais e os serviços
públicos à gerencia das leis do mercado).
[34]
Oliveira (2001) explica ainda: “As ligas camponesas e os sindicatos rurais abalaram o consenso das
classes dominantes porque abalaram o grande latifúndio e, portanto, o equilíbrio entre o grande latifúndio
e a grande burguesia industrial. Não foi à toa que a força do golpe de 1964 veio exatamente para reprimir
no Nordeste, que era o coração, o epicentro desse terreno” (p. 53).
[35]
As constituições que a antecederam tratavam da educação como um direito individual e de
convivência mútua. (NEVES, 1997).
[36]
Ver, por exemplo, Kuenzer (1991) e Frigotto (1993). Para uma abordagem internacional, ver
Manacorda (1990; 1991).
[37]
Explica Frigotto (1998): “Nessa compreensão, independentemente da forma histórica que assume,
trabalho e relações materiais de produção social da existência são fundantes da especificidade humana à
medida que é pelo trabalho que a espécie humana se produz. (...) O ser humano se contrapõe e se afirma
como sujeito num movimento e ação teleológica sobre a realidade objetiva. Modificando a realidade que
o circunda, modifica-se a si mesmo. Produz objetos e, paralelamente, altera sua maneira de estar na
realidade objetiva e de percebê-la. E – o que é fundamental – faz a sua própria história. Toda a chamada
história mundial – assegura Marx – ‘não é senão a produção do homem pelo trabalho humano’. É dentro
desta compreensão que o sujeito humano em Marx e posteriormente de forma ainda mais desenvolvida
em Gramsci, é entendido não como sujeito individual mas resultado de um processo histórico, de relações
sociais concretas.” (p. 29)
[38]
Ver Machado (1989) e Nosela (1991; 1992).
[39]
Ver, por exemplo, Saviani (1995) e Rodrigues (1998).
[40]
No que se refere às bases legais da EJA, a Constituição de 1988 trouxe avanços significativos, na
medida em que o ensino fundamental passou a ser considerado como direito público subjetivo (Art. 208).
[41]
Em entrevista ao Jornal do Comércio, em 1991, declarou, por exemplo, que “O adulto analfabeto já
encontrou seu lugar na sociedade. Pode não ser um bom lugar, mas é o seu lugar. (...) Alfabetizar o adulto
não vai mudar muito sua posição dentro da sociedade e pode até perturbar. Vamos concentrar os nossos
recursos em alfabetizar a população jovem” (Apud HADDAD, 1994: 7)
[42]
“Ao longo de 21 anos de existência legal, o ensino supletivo decaiu três degraus no organograma do
MEC. Cada um desses degraus representa não só a perda de técnicos e prestígio, mas principalmente a
redução de autonomia político-financeira e da capacidade de coordenação das políticas e ações das redes
estaduais e municipais de ensino” (DI PIERRO, 1992: 24).
[43]
Informativo GIZ/ VEREDA, n.13, ano 5, jul., 1999.
[44]
Apesar do Ministro sempre reafirmar que a prioridade é a infância: “No Plano Decenal de Educação
para Todos, a prioridade não pode deixar de ser a criança. É a criança o objetivo maior das preocupações
do Plano, uma vez que o atendimento integral às necessidades da criança há de ser a garantia da formação
plena, de forma que problemas que ainda afligem a sociedade brasileira, como o problema do
analfabetismo, sejam estancados na sua origem, na sua própria razão de ser”. (In: Encontro Latino-
Americano sobre Educação de Jovens e Adultos Trabalhadores, 1993).
[45]
É exemplar a declaração de Cláudio Moura e Castro, economista e então consultor do Banco
Mundial: “Isso não funcionou em lugar nenhum, a não ser em condições excepcionais (...) que não podem
ser reproduzidas no Brasil. Nós não temos recursos para colocar um analfabeto por dez horas todos os
dias na escola. É simples: não adianta oferecer a ele uma segunda chance dentro do mesmo sistema no
qual já fracassou. Melhor investir para que o sistema de educação básica passe a funcionar” (VEJA, 05
maio 1993: 9). Outro exemplo, de Sérgio Costa Ribeiro, pesquisador do IPEA: “Alfabetizar adultos é um
suicídio econômico; um adulto que não sabe ler já se adaptou a esta situação”(VEJA, 23 junho 1993).
[46]
Fávero (1996) assim conceitua o direito público subjetivo: “tal direito se diz do poder de ação que a
pessoa possui de proteger ou defender um bem considerado inalienável e ao mesmo tempo legalmente
reconhecido. Daí decorre a faculdade, por parte da pessoa, de exigir a defesa ou proteção do mesmo
direito da parte do sujeito responsável”. (p. 67)
[47]
Palestra “Políticas e programas públicos de educação do trabalhador”, proferida na CUT/RJ em 08 de
outubro de 1999.
[48]
Podemos citar como exemplos, além das já citadas a afirmação do professor Darcy Ribeiro: “Deixem
os velhinhos morrerem em paz”, ou a do ministro José Goldemberg: “O analfabeto já encontrou o seu
lugar na sociedade”.
[49]
Segundo Machado (1998), “o Programa Alfabetização Solidária sequer foi colocado em debate no
Seminário Nacional de Educação de Jovens e Adultos, realizado em Natal [em setembro de 1996], onde
seus delegados foram surpreendidos com tal lançamento. Traçando um paralelo entre as duas concepções
de EJA (a do documento final do Seminário e a do Programa Alfabetização Solidária), a autora elabora
um quadro apontando as características e divergências de cada uma das concepções” (p. 6-8).
[50]
Faz-se necessário ressaltar que, ao longo do ano 2000, ocorreram audiências públicas e reuniões com
diferentes membros da comunidade educacional brasileira, principalmente com aqueles que se dedicam à
EJA, para a elaboração De suas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos,
aprovadas em 10/05/2000. Tal documento, cujo relator foi Carlos Roberto Jamil Cury, em vários
aspectos, demarca questões relevantes quanto aos objetivos e conteúdos da EJA, contribuindo, sob o
aspecto legal, para a possibilidade de avanços nas práticas dessa modalidade educacional. Ver: BRASIL,
2000b.
[51]
Di Pierro (1992) chama a atenção para o fato de o Brasil ser signatário desta Declaração: sendo “um
dos nove países com mais de dez milhões de analfabetos adultos, foi selecionado pelas Nações Unidas e
pelo Banco Mundial para obtenção de financiamentos especialmente destinados à educação básica, dos
quais não se beneficiou por não ter apresentado até meados de 1993 um plano consistente de
alfabetização” (p. 26).
[52]
Neves subdivide as políticas governamentais para a formação do trabalho simples em dois tipos:
formação da atual geração de trabalhadores e formação das próximas gerações de trabalhadores.
[53]
Nehedeff, Nassin. O triste exército de Brancaleone. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 19 ago. 1996,
grifos nossos.
[54]
Observa-se nos discursos veiculados um deslocamento da responsabilidade social para o plano
individual. Assim, os indivíduos é que devem adquirir competências, habilidades e atitudes que os tornem
competitivos e empregáveis. Nessa lógica, os desempregados precisam buscar qualificar-se ou
“requalificar-se” para se tornaram empregáveis ou capazes de se auto-empregarem no mercado informal
ou na economia popular.
[55]
Frigotto (1998) chama a atenção para o quanto é grave, no contexto do desemprego estrutural e de
precarização do trabalho que estamos vivendo, o governo, mediante propaganda intensiva, transmitir a
idéia mistificadora de que esses cursos são a garantia para manter-se no emprego, reintegrar-se no
mercado de trabalho ou capacitar-se para o autotrabalho.
[56]
Este foi o interesse específico do trabalho de Dissertação de Mestrado por nós realizado (VENTURA
2001).
[57]
“O conceito de empregabilidade tem sido utilizado para referir-se às condições subjetivas de
integração dos sujeitos à realidade atual dos mercados de trabalho e ao poder que possuem de negociar
sua própria capacidade de trabalho, considerando o que os empregadores definem por competências”
(Machado apud FIDALGO,1999a: 22).
[58]
Ver Rodrigues (1997).