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RESUMO: O objetivo deste texto é, situando-se na vertente da história cultural francesa, investigar as
relações entre arte, história e história da arte, considerando-se os objetos culturais como um rico e
sofisticado instrumento de produção de representações, que contribui para a elaboração de sentidos, de
formas de olhar e ver a realidade e sobre o qual é necessário refletir.
ABSTRACT: Aligned with the French cultural history, this paper intends to investigate the relationship
between art, history and art history, considering cultural objects as a rich and sophisticated instrument to
create representations, that contribute to form senses, or in other words, ways to look and see the reality
and about which discussion is necessary.
*
Graduada em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (1987). Mestre em
História pela Universidade Federal Fluminense (1996) e doutora em História Social pela Universidade
Federal do Rio de Janeiro (2003), com bolsa de doutorado sanduíche na École des Hautes Etudes en
Sciences Sociales (2000/2001). Atualmente, é bolsista de pós-doutorado Junior/CNPq junto ao
Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal de Minas Gerais.
1
Cf. SCHORSKE, Carl. A história e o estudo da cultura. Pensando com a história: indagações na
passagem para o modernismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
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2
BURKE, Peter. O que é História Cultural? Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005, p. 7.
3
PESAVENTO, Sandra Jatahy. História & história cultural. Belo Horizonte: Autêntica, 2003, p. 7-8.
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versão tropical, uma tendência que se identifica também em países europeus e nos
Estados Unidos.
Mas será que os historiadores “falam da mesma coisa” quando se referem à
cultura? Será que eles se entendem quando afirmam estar “fazendo história cultural”?
Que conceito de cultura e de objetos culturais está por trás de cada uma das análises
propostas pelos historiadores? Esta é uma questão difícil de responder. E é Carl
Schorske que novamente pode nos dar uma “pista” para a elucidação da questão, ao
afirmar que os historiadores são singularmente estéreis na criação de conceitos, pois
são, segundo ele, dependentes conceituais. Assim, poderíamos afirmar que é justamente
nas múltiplas relações que os historiadores estabelecem com outras disciplinas como a
antropologia, a sociologia, a teoria literária, a lingüística, etc, que se estruturam e
organizam os conceitos de cultura e objetos culturais com os quais os historiadores
produzem suas narrativas. Essa afirmação poderia então nos fazer supor que haveria
tantas definições quantos fossem os encontros com outras disciplinas e tantas
abordagens quantos fossem os métodos tomados de empréstimo. Embora não considere
que essa última frase refira-se a uma situação de todo falsa, creio que há pontos de
encontro entre as múltiplas interpretações historiográficas elaboradas pelos historiadores
na última década, na qual se acredita, houve, justamente, uma (re)descoberta dos
estudos culturais.
Uma das questões postas pelos historiadores e que se tornou, na verdade, um
desafio a ser encarado, é a compreensão das representações do real elaboradas pelos
homens, ao longo do tempo, em sua experiência histórica. As imagens figurativas,
documentos, discursos poéticos, textos literários, lendas, se oferecem ao historiador
como as únicas possibilidades de acesso a um passado definitivamente perdido. Essas
representações são a porta de entrada para um país estrangeiro,4 um mundo outro que se
busca descobrir e conhecer.
Tradicionalmente, algumas correntes historiográficas consideraram, não sem
uma certa dose de ingenuidade, essas representações como reflexo da sociedade que as
produziu. A idéia era quase sempre a de que os objetos culturais funcionariam como um
certo “espelho do tempo” refletindo a sociedade e o pensamento dos homens que as
criaram.
4
Faço aqui uma referência direta ao título do livro de LOWENTHAL, David. The past is a foreing
country. Cambridge: Cambridge University Press, 1985.
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Ainda que esta seja uma relação difícil, como se pode depreender dos textos
acima, a história e as ciências sociais interessadas na análise de produções culturais
5
MENGER, Pierre-Michel; REVEL, Jacques. Présentation. Annales ESC, n. 6 (Mondes de l´art), p.
1337-1345, nov./dec. 1993.
6
FRANCASTEL, Pierre. Problèmes de la sociologie de l´art. In: CHARTIER, Roger et al. La sensibilité
dans la histoire. Paris: Gérard Monfort, 1987, p. 141.
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7
Ver a esse respeito: SALGUEIRO, Heliana Angotti. Introdução à edição brasileira. In: BAXANDALL,
Michel. Padrões de intenção: A explicação histórica dos quadros. São Paulo: Companhia das Letras,
2006.
8
É bom lembrar, como faz Heliana Angotti, que essa aproximação tão produtiva estava mesmo no
programa de renovação dos estudos históricos proposto pelo famoso editorial da revista dos Annales,
Histoire et sciences sociales: un tournant critique? publicado em 1988. Neste texto, a história da arte
constava entre as disciplinas que os historiadores destacavam como interessantes para a busca de
alianças que levassem a renovação de sua prática. Ver: SALGUEIRO, Heliana Angotti. Introdução à
edição brasileira. In: BAXANDALL, Michel. Padrões de intenção: A explicação histórica dos
quadros. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
9
GINZBURG, Carlo. De Warburg a E. H. Gombrich: notas sobre um problema de método. In: ______.
Mitos, emblemas e sinais. Morfologia e História. São Paulo: Companhia das Letras, 1989, p. 63.
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da arte, nos séculos XIX e XX, para que possamos, posteriormente, identificar
possibilidades de aproximação com os procedimentos dos historiadores da cultura.
10
Cf. MENGER, Pierre-Michel; REVEL, Jacques. Présentation. Annales ESC, n. 6 (Mondes de l´art),
nov./ dec. 1993.
11
Cf. ZERNER, Henri. A arte. In: LE GOFF, Jacques; NORA, Pierre (Orgs.). História: novas
abordagens. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976, p. 144-159.
12
Ibid., p. 145.
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13
A esse respeito ver: DUTRA, Eliana de Freitas. A tela imortal. O catálogo da exposição de História do
Brasil de 1881. Anais do Museu Histórico Nacional, v. 37, 2005; e VENANCIO, Giselle. As flores
raras do jardim do poeta. O catálogo da coleção Eurico Facó. Fortaleza: Secult/Museu do Ceará,
2006.
14
ZERNER, Henri. A arte. In: LE GOFF, Jacques e NORA, Pierre (Orgs.). História: novas abordagens.
Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976, p. 145.
15
Ibid., p. 146.
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processo de validação como obra de arte. Assim é que, aos esforços de organizar
imagens artísticas e decodificar simbolicamente seus significados que vinham sendo
realizados, pelo menos desde o século XVI, somaram-se os de tomar a arte e suas
imagens para refletir sobre aspectos mais gerais da cultura de uma sociedade,
desembocando, no século XIX, na iconografia como prática científica.16
Dessa forma, os autores ligados ao Instituto Warburg destacam-se por suas
reflexões que, a despeito das diferenças de abordagem, buscavam considerar um
problema de método central e circunscrito: a utilização de testemunhos figurativos
como fontes históricas.17
Comecemos analisando a produção do próprio Warburg fundador, em
Hamburgo, da famosa biblioteca depois transferida para Londres e consolidada no
Warburg Institute.
Warburg iniciou seus trabalhos observando que os artistas do Renascimento
remontavam, invariavelmente, para as representações do movimento dos corpos, às
obras da antiguidade clássica. A partir dessa questão pontual, Warburg decidiu buscar
compreender o significado que a arte da antiguidade possuía para os pintores e deu
início a uma pesquisa que incluiu uma documentação bastante variada e heterogênea:
testamentos, cartas de mercadores, tapeçarias, etc. Por meio dessa investigação e
partindo de uma questão tão pontual quanto à representação do movimento das vestes e
das cabeleiras, Warburg remontou as atitudes fundamentais da civilização renascentista,
vista – seguindo os passos de Burckhardt a quem ele reconhecia filiação intelectual –,
na sua oposição radical à Idade Média.18
Os estudos de Warburg desenvolveram-se então articulando dois princípios
básicos: de um lado, uma tentativa de identificar e sistematizar características das
expressões figurativas renascentistas e, de outro, baseando-se numa rica “imaginação
histórica” e num conceito quase antropológico de cultura (que incluía além das artes, da
16
É importante salientar que Francis Haskell, em seu livro History and its images. Art and the
interpretation of the past. (New Haven: Yale University Press, 1993) chama a atenção para o fato de
que, desde os séculos XVI e XVII, os antiquários tenham utilizado moedas, esculturas, pinturas de
catacumbas, etc, como forma de obter informações sobre sociedades do passado.
17
GINZBURG, Carlo. De Warburg a E. H. Gombrich: notas sobre um problema de método. In: ______.
Mitos, emblemas e sinais. Morfologia e História. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
18
No tratamento da escola warburguiana, seguimos os passos da explicação apresentada por Carlo
Ginzburg em texto já anteriormente referido.
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PANOFSKY Apud GINZBURG, Carlo. De Warburg a E. H. Gombrich: notas sobre um problema de
método. In: ______. Mitos, emblemas e sinais. Morfologia e História. São Paulo: Companhia das
Letras, 1989, p. 65. Ginzburg, no entanto, faz questão de ressaltar que na reedição [deste texto], “foi
suprimida a palavra ‘inconsciente’”. Isso, segundo ele, faz parte da revalorização que Panofsky passou
a reconhecer na intervenção de programas racionais e conscientes da atividade artística.
23
GINZBURG, Carlo. De Warburg a E. H. Gombrich: notas sobre um problema de método. In: ______.
Mitos, emblemas e sinais. Morfologia e História. São Paulo: Companhia das Letras, 1989, p. 41-90.
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Num texto escrito no início dos anos 80 intitulado Por uma sociologia
histórica das práticas culturais,25 Roger Chartier define o que se pode considerar, em
linhas gerais, um programa de renovação dos métodos e estudos históricos que ficaria,
posteriormente, conhecido como história cultural. Declarando inicialmente uma
insatisfação com a história que se praticava na França naquele momento – tanto a que se
intitulava história das mentalidades quanto à história quantitativa –, Chartier destaca o
fato de que ambas haviam se originado da resposta dada pelos historiadores aos desafios
lançados por disciplinas como, entre outras, a lingüística ou a psicologia. Segundo ele, a
resposta dos historiadores havia sido de dois tipos: por um lado, buscaram constituir
novos territórios, objetos e abordagens a partir da anexação de métodos de outras
disciplinas o que levou a um retorno a noção de utensilagem mental, proposta muitos
anos antes por Lucien Febvre, o que acabou por originar a chamada história das
mentalidades ou uma certa psicologia histórica; mas, por outro lado, os historiadores
constituíram essa história aplicando a novos objetos os princípios de inteligibilidade já
utilizados nas histórias econômicas e das sociedades, campo privilegiado do trabalho
dos historiadores. Dessa forma, os historiadores estabeleceram, em seus estudos, uma
divisão, naquele momento, aparentemente insuperável: ou se fazia uma história baseada
24
Cf. ZERNER, Henri. A arte. In: LE GOFF, Jacques; NORA, Pierre (Orgs.). História: novas
abordagens. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1976, p. 144-159.
25
CHARTIER, Roger. Por uma sociologia histórica das práticas culturais. In: ______. História Cultural:
entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990, p. 13-28.
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CHARTIER, Roger. Por uma sociologia histórica das práticas culturais. In: ______. História Cultural:
entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990, p. 19.
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Essas idéias, desenvolvidas por Chartier, podem, a meu ver, ser bastante úteis
para uma interpretação das imagens pensadas como representações, isto é, como uma
das formas de uma dada sociedade se dar a ler. Nesse sentido o trabalho dos
historiadores tem alguns traços que o distingue do tradicionalmente realizado pelos
historiadores da arte tout court, ao mesmo tempo, que se caracteriza por formas de
aproximação com o trabalho desenvolvido pelos últimos.
No que se refere aos traços que particularizam o trabalho dos historiadores,
alguns aspectos são ressaltados por Chartier. Em primeiro lugar, os historiadores
preocupam-se com uma ampla diversidade de objetos – cerâmicas gregas, imagens de
propaganda, fotografias, etc. -, destacando materiais tradicionalmente negligenciados
pela história tradicional da arte, “seja porque suas formas repetitivas não sejam em
absoluto portadoras de invenção estética, seja porque não se enquadram em uma visão
clássica e restritiva do que foi designado como produção artística”.27 A abordagem
histórica da imagem não é tributária, segundo Chartier, da categoria do belo, “porque
ela leva em conta objetos que pertencem a gêneros considerados sem finalidade ou
qualidade estética ou que, num gênero com dignidade artística, são obras médias e não
[necessariamente] obras primas”.28 Em segundo lugar, os historiadores trabalham,
preferencialmente, com a análise em série das coleções apreendidas em um local dado,
unificadas pelo gênero, pela localização ou pelo tema.29
Para o historiador, a obra de arte não é apenas resultado do trabalho de um
artista iluminado e genial, mas ela resulta também dos constrangimentos e
condicionamentos sociais que possibilitam a sua produção. Daí se deduz que, para a
história cultural, a imagem é, ao mesmo tempo, transmissora de mensagens enunciadas
claramente, que visam a seduzir e a convencer, e tradutora, a despeito de si mesma, de
convenções partilhadas que permitem que ela seja compreendida, recebida e decifrável.
Assim, não basta identificar as intenções do artista ou o “significado por trás da obra”, é
preciso também investigar as formas de apropriação e uso das imagens para se
27
CHARTIER, Roger. Imagem. In: BURGUIÈRE, André (Org.). Dicionário de ciências históricas. Rio
de Janeiro: Imago, 1993, p. 406.
28
Ibid., p. 406.
29
Ibid.
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compreender as relações que estas mantém com as convenções sociais30. Nas palavras
de Chartier,
[...] a atenção se desloca da análise serial ou não, dos materiais
iconográficos, para a apreensão dos usos e das compreensões
possíveis destes. É assim esboçada uma história (difícil) das
interpretações da imagem situada numa encruzilhada de uma
sociologia histórica dos sistemas de percepção e de uma explicitação
das convenções inscritas na obra e conhecidas (mais ou menos) por
aquele que a produz e por aqueles que a vêem.31
30
CHARTIER, Roger. Imagem. In: BURGUIÈRE, André (Org.). Dicionário de ciências históricas. Rio
de Janeiro: Imago, 1993, p. 407.
31
Ibid.
32
Poderia-se pensar aqui também uma possível genealogia dos conceitos utilizados nas abordagens da
história cultural francesa. Alguns deles têm origem em trabalhos de membros do Warburg Institut. Um
dos exemplos possíveis seria tomar o conceito de habitus, desenvolvido por Bourdieu (e apropriado
por Chartier), que foi parcialmente inspirado nos trabalhos de Panofsky.
33
CHARTIER, 1993, op. cit., p. 405-408.
34
A esse respeito, ver: HANSEN, João Adolfo. Ler & ver: pressupostos da repesentação colonial.
Veredas, 3-1, Porto, 2000 e SCHORSKE, Carl. Introdução. In: ______. Viena: fin de siècle. São
Paulo: Companhia das Letras, 1990.
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ultrapassa os estreitos limites de uma história dos objetos culturais e estabelece-se como
uma história “cultural e social indissociavelmente”.35
35
Faço, aqui, referência direta ao título do texto de Antoine Prost, Sociale et culturelle indissociablement,
publicado no livro organizado por Jean-Pierre Rioux e Jean-François Sirinelli, Pour une histoire
culturelle. Paris: Éditions du Seuil, 1997.