Livro Dieta EIM
Livro Dieta EIM
Erros inatos do
metabolismo
2006
ISBN 85.98353-59-0
Vários colaboradores.
CDD 617.8
IMPRESSO NO BRASIL
2006
Rua Cunha Gago, 412, 2o andar, cj. 21, Pinheiros – 05421-001 – São Paulo, SP. Fone: 11 3039-5669 • www.segmentofarma.com.br • [email protected]
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gráfico: Almir Roberto Diagramação: Renata Carvalho Variso Revisão: Lia Ando e Isabel Baio Produção gráfica: Andre Mendonça e Fabio Rangel Cód. da publicação: 3052.10.06
Cecilia Micheletti
Médica formada na Unifesp/EPM, especialista em pediatria pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e pela
Associação Médica Brasileira (AMB), especialista em genética clinica pela SBGC, mestre em pediatria pela
Unifesp/EPM e diretora clínica do Creim da Unifesp/EPM
Cecilia Micheletti
Médica formada na Unifesp/EPM, especialista em pediatria pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e pela
Associação Médica Brasileira (AMB), especialista em genética clinica pela SBGC, mestre em pediatria pela
Unifesp/EPM e diretora clínica do Creim da Unifesp/EPM
Cristina Lagreca
Nononononono
Simone
Nononono
Viviane Kanufre
Coordenadora clínica da Unidade Funcional do Serviço de Nutrição e Dietética do Hospital das Clínicas da UFMG,
nutricionista do Núcleo de Ações e Pesquisa em Apoio Diagnóstico (Nupad) da Faculdade de Medicina da UFMG,
mestre em ciências da saúde na área de saúde da criança e do adolescente pela Faculdade de Medicina da UFMG
INTRODUÇÃO ....................................................................................................13
13
idênticos é maior quando existe consangüinidade mais, o alelo normal do pai e o alelo mutante da mãe
entre os genitores. Esse é o tipo de herança apresen- ou o alelo mutante do pai e o alelo normal da mãe.)
tada pela maioria dos EIM.
Paciente com deficiência enzimática de
Herança ligada ao X herança autossômica recessiva
14
1. Saudubray, J.M.; Baulny, H.O.; Charpentire, C. in Fernandes, 5. Zschocke, J.; Hoffmann, G.F. – Vademecum metabolicum
J Saudubray, J.M. Van den Berghe, G. – Inborn Metabolic – Manual of Metabolic Paediatrics- 2nd edition – 2004.
Diseases Diagnosis and treatment – 3rd edition - 2000.
6. Applegarth DA, Toone JR, Louvry B – Lucidence of en-
2. Scriver , C.R. Beaudet, L. Sly, W.S. and Valle, D. - The Me- born errors of metabolism in British Columbia, 1969 -
tabolic and Molecular Bases of Inherited Disease, 2001. 1996. Pediatrics, 105 (1), p. e 10, 2000.
15
Fenilcetonúria
17
reciclado para a função como um catalisador na en- de lipídeos associados à mielina (Tourian e Sidbury,
zima de hidroxilação, uma rota que requer a ação da 1983). Estudos feitos com imagens obtidas por meio
proteína de estimulação da PAH. Interações entre a de ressonância nuclear magnética (RNM de crânio)
enzima PAH, seu substrato e o co-fator contribuem confirmaram os achados neuropatológicos anteriores,
para a homeostase da fenilalanina. tais como áreas de vacuolização ou desmielinização de
A reação de hidroxilação da L-fenilalanina en- substância branca (Shah et al., 1990).
volve quantidades eqüimoleculares de L-fenilala- A redução de mielina tem sido amplamente do-
nina, BH4 e oxigênio, sendo os produtos tirosina, cumentada em pacientes fenilcetonúricos não-tra-
diidrobiopterina quinonóide (qBH2) e água. A dii- tados e em modelos animais da doença. Os exames
drobiopterina redutase (DHPR) é a enzima que ca- de RNM têm demonstrado graves anormalidades
talisa a regeneração do BH4 (Figura 1). Essa reação é compatíveis com desmielinização nas áreas parietoc-
dependente de NADH (Scriver e Clow, 1980). cipital, frontal e subcortical (Weglage et al., 2000).
Além da deficiência de mielinização, a anatomia pa-
O2 + L-fenilalanina BH4 NAD+ ou NADP+ tológica da fenilcetonúria inclui gliose e redução da
arborização dendrítica (Scriver et al., 1995).
1 2 Quadro clínico
Tanto a deficiência da enzima PAH quanto o defeito
H2O+ tirosina qBH2 NADH ou NADPH
do seu co-fator BH4 promoverão o aumento da L-fe-
nilalanina e seus metabólitos secundários no sangue
Figura 1. Reação de oxidação da fenilalanina
hidroxilase (scriver). (1): fenilalanina e nos tecidos, levando aos principais sinais e sinto-
hidroxilase; (2): diidrobiopterina mas da doença que podem se manifestar em maior ou
redutase; BH4: tetraidrobiopterina;
qBH2: diidrobiopterina quinonóide. menor intensidade. São eles: atraso no desenvolvi-
mento neuropsicomotor, hiperatividade, convulsões,
alterações cutâneas como eczema, comportamento
Fisiopatologia agressivo (auto e heteroagressão) ou tipo autista,
A hiperfenilalaninemia é acompanhada por uma re- hipotonicidade muscular, tremores, microcefalia,
dução nos níveis cerebrais da tirosina e outros ami- hipoplasia dentária, descalcificação de ossos longos,
noácidos essenciais, causando um distúrbio no siste- retardo de crescimento, anormalidades no eletroen-
ma de síntese protéica (Hommes, 1989) e alterações cefalograma (tipo hipsarritmia), odor característico
no processo de mielinização (Berger et al., 1980). A na urina e suor e sinais extrapiramidais (Jervis, 1937;
inibição da captação de aminoácidos neutros pelo Fois et al., 1955; Paine, 1957; Nyhan, 1979; Pietz et
tecido nervoso por competição na barreira hemato- al., 1993; Scriver, 1995). O grau de retardo mental e
encefálica é um mecanismo que pode estar envolvido lesão neurológica está diretamente relacionado aos
na toxicidade da L-fenilalanina (Hommes, 1989). níveis de L-fenilalanina e também correlaciona-se
Exames realizados em pacientes fenilcetonúricos com a idade de início de tratamento.
revelaram redução no peso do cérebro (Alvord et al., No entanto, pacientes que têm diagnóstico pre-
1950), retração nas ramificações dendríticas das cé- coce e são tratados adequadamente também podem
lulas piramidais e redução de espinhas dendríticas no apresentar algum déficit, principalmente no desen-
córtex (Bauman e Kemper, 1982), alteração na subs- volvimento de aptidões específicas como atenção e
tância branca (Shah et al., 1972) e menor quantidade percepção. Isso determina a necessidade da conti-
18
nuidade da dieta, com controle rígido durante toda a mediante amostra em papel-filtro, soro, sangue total
vida para minimizar esses efeitos. ou urina (de acordo com a metodologia empregada
Em pacientes adultos que não fazem restrição no laboratório especializado). Os casos confirmados
dietética de L-fenilalanina, são encontrados alguns devem, então, ser encaminhados para tratamento e
sintomas como: aumento da incidência de depres- investigações adicionais em serviços de referência.
são, sintomas variados de ansiedade, agorafobia e di- O diagnóstico é feito pela detecção de altos níveis
ficuldades psicossociais, entre outros. Esses sintomas sangüíneos de L-fenilalanina, por meio de métodos
psiquiátricos não são relacionados com o controle qualitativos (semiquantitativos), como o teste de
dos níveis de fenilalanina. Por outro lado, o QI e as Guthrie e a cromatografia de aminoácidos em camada
medidas de funções executivas, que representam ca- delgada, ou métodos quantitativos, como a análise flu-
racterísticas cognitivas, apresentam correlação com orimétrica e a espectrometria de massa em tandem.
o controle metabólico. Mesmo aumentos transitó- A hiperfenilalaninemia é definida por níveis plas-
rios da concentração de L-fenilalanina no soro po- máticos de L-fenilalanina acima de 120 µM/l (2 mg/dl).
dem dar origem a déficits cognitivos transitórios. Também pode ser definida como a razão fenilalanina/
Nos pacientes que têm deficiência de BH4 ob- tirosina sangüínea persistentemente maior que 3 (a va-
servam-se deficiência mental grave, convulsões, ir- riação normal é de 0,87 a 0,92).
ritabilidade e sinais do tipo parkinsonismo. Como o Podem-se classificar as hiperfenilalaninemias em:
co-fator BH4 é também necessário para a conversão
da tirosina em diidroxifenilalanina e de triptofano a) fenilcetonúria clássica ou hiperfenilalaninemia
em 5-hidroxitriptofano, precursores da dopamina, as maligna: níveis de fenilalanina maiores que 20
manifestações clínicas são mais graves que na fenil- mg/dl (1.200 µM/l) e atividade enzimática prati-
cetonúria clássica e não são corrigidas pela restrição camente inexistente;
dietética da fenilalanina. b) fenilcetonúria leve: níveis de fenilalanina maio-
O quadro clínico apresentado na fenilcetonúria res que 10 mg/dl (600 µM/l) e atividade enzimá-
materna é caracterizado por baixo peso de nascimen- tica inferior a 1%;
to, microcefalia, retardo mental, retardo de cresci-
c) hiperfenilalaninemia persistente benigna ou perma-
mento pós-natal, agenesia/hipoplasia de corpo calo-
nente: níveis de fenilalanina entre 2 e 6 mg/dl (120 e
so, cardiopatia congênita de complexidade variável
360 µM/l). A literatura científica é controversa quan-
e dismorfias faciais (filtro longo, lábio superior curto,
to ao tratamento de pacientes com níveis de fenilala-
epicanto e fendas palpebrais pequenas (Schimdt et
nina entre 6 e 10 mg/dl; se estes valores são constan-
al., 1987). Outras anomalias menos freqüentes são
tes, parece que podem ser prejudiciais ao desempenho
estenose pilórica, gastrosquise e pé torto congênito.
intelectual do paciente. Para as meninas com valores
acima de 6 mg/dl, mesmo que não tenham sido trata-
Diagnóstico das com dieta, vão precisar fazê-lo, se engravidarem,
pelo risco de comprometimento do feto.
O diagnóstico deve ser preferencialmente realiza-
do no período neonatal, antes do aparecimento dos d) hiperfenilalaninemia transitória: níveis de feni-
sintomas, já que a lesão neurológica é irreversível. lalanina entre 2 e 10 mg/dl (120 e 600 µM/l) e
O teste de triagem neonatal deve ser coletado após atividade enzimática superior a 5%. Ocorre pela
as primeiras 48 horas de vida, ou seja, após o início imaturidade temporária da enzima PAH, leva a
da alimentação com proteínas. Os resultados altera- aumento discreto da L-fenilalanina, que regride
dos devem ser confirmados em uma segunda coleta após algumas semanas de vida, e geralmente se
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relaciona à prematuridade, ao uso de algumas dro- outras se associam a formas leves, como as hiperfe-
gas, como metotrexato e trimetropima, às doen- nilalaninemias permanentes. Assim, conhecendo-
ças renais ou ainda a uma resposta inflamatória; se o genótipo do paciente, logo após o diagnóstico,
e) deficiência de tetraidrobiopterina (BH4): deter- podem-se fazer algumas previsões em relação ao seu
minada pela deficiência do co-fator BH4 necessá- prognóstico e planejar melhor o seu tratamento.
rio para a ativação da PAH; Outro benefício do estudo das mutações é a pos-
sibilidade de identificação de portadores entre fa-
f) fenilcetonúria materna: os altos níveis de fenilala-
miliares de afetados e o diagnóstico pré-natal. No
nina são teratogênicos para o feto, mesmo que ele
entanto, é preciso alertar que o diagnóstico pré-na-
não tenha a doença. As mulheres portadoras de
tal de uma doença passível de tratamento com um
fenilcetonúria e aquelas com hiperfenilalaninemia
bom prognóstico levanta questões éticas ainda não
persistente devem ser submetidas à restrição die-
resolvidas mesmo nos países em que o diagnóstico
tética rigorosa de fenilalanina, iniciada três meses
pré-natal é rotineiro.
antes da concepção e mantida até o parto.
Ainda não há um quadro bem estruturado das mu-
tações mais freqüentes no Brasil, pois um pequeno
número de trabalhos foi desenvolvido nesse sentido
Mutações
e poucos pacientes foram estudados. Cerca de 200
O gene que codifica a síntese da fenilalanina hidro- pacientes de São Paulo, Santa Catarina, Rio Grande
xilase está localizado no braço longo do cromossomo do Sul e Minas Gerais foram estudados até o mo-
12, no locus 12q22-24.1. Abrange cerca de 90 Kb e mento. Entre esses pacientes as mutações mais fre-
tem 13 éxons. Já foram descritas mais de 440 muta- qüentes foram: R261Q, I65T, IVS10nt11, V388M,
ções nesse gene. A maioria dessas mutações é patogê- R252W, R261X, R408W, IVS2nt5. Foi observada
nica, no entanto, algumas são não-patogênicas. Essas também uma variação regional importante. Para que
mutações estão distribuídas de maneira não-uniforme se possa conhecer as mutações mais freqüentes no
no mundo, e apenas um número limitado delas está Brasil, é necessário que se estudem mais pacientes
presente em diferentes populações. As mutações que nas diversas regiões.
já foram descritas e as que vão sendo descritas podem
ser encontradas no site http://www.mcgill.ca/pahdb.
O grande número de mutações possíveis no gene, Identificação de portadores
associado ao fato de que, na maioria, os afetados são Embora ainda não realizada rotineiramente, a iden-
heterozigotos compostos (apresentam dois alelos tificação de portadores para familiares em risco já é
mutantes diferentes e, portanto, duas mutações di- possível, utilizando três métodos: análise de DNA,
ferentes), explica a grande variabilidade clínica das estudos de ligação e testes bioquímicos.
hiperfenilalaninemias.
Embora o controle do tratamento não possa ser
feito pela determinação da mutação ou mutações Tratamento dietoterápico
apresentadas pelo paciente e sim pela sua tolerân- O tratamento da fenilcetonúria é por toda a vida.
cia à fenilalanina e pelos níveis de fenilalanina plas- Estudos demonstraram que pacientes que suspende-
mática, o estudo das mutações é importante porque ram a dieta com 6 anos, 8 anos e 12 anos de idade
existe uma correlação entre mutação e fenótipo. manifestaram alterações neurológicas que se rever-
Algumas mutações associam-se a formas graves tiam quando os níveis de fenilalanina reduziam para
da doença, como a fenilcetonúria clássica, enquanto menos de 10 mg/dl.
20
acordo com a faixa etária e o peso, objetivando atingir A deficiência de tirosina ocasiona diminuição na
as recomendações de proteína em micronutrientes. síntese de dopamina e noradrenalina.
Proteína
Condutas da prescrição dietética
A recomendação de proteína é maior do que as re-
Fenilalanina comendações da Dietary Reference Intakes (DRIS),
quando a maior fonte protéica provém de L-aminoáci-
A recomendação de fenilalanina é individualizada, va-
dos, em razão da rápida absorção, rápido catabolismo
riando de paciente para paciente. Depende da atividade
e possível decréscimo na absorção total dos amino-
enzimática, idade, velocidade de crescimento e estado
ácidos. A maior parte da proteína da dieta (aproxi-
de saúde. A recomendação, de acordo com a faixa etá-
madamente 75%) deve ser suprida por fórmula de
ria, pode variar, sendo maior (20 a 50 mg/kg/dia) nos
aminoácidos enriquecida de vitaminas e minerais. O
primeiros meses de vida e declinando posteriormente
substituto da proteína dever ser dado, no mínino, três
com a diminuição da velocidade de crescimento. Ajus-
vezes ao dia; porém, o maior fracionamento, cinco
tes semanais nos primeiros seis meses podem ser neces-
vezes ao dia, promove níveis mais estáveis de feni-
sários com base no crescimento, no desenvolvimento e
lalanina. Deve ser dado preferencialmente com um
nos níveis plasmáticos de fenilalanina.
alimento natural que contenha fenilalanina.
No diagnóstico, havendo possibilidade, deve-se
excluir a fenilalanina da dieta (leite materno ou fór- Conseqüências da deficiência de proteínas
mula infantil) por um curto período de tempo para Déficit de crescimento em crianças e perda de peso
rápida queda dos níveis plasmáticos. em adultos.
21
22
Nesse período deverá ser oferecida mamadeira Tabela 4. Volume estimado de produção
de leite materno de acordo com o
contendo a fórmula metabólica, isenta em fenilala- percentil de peso para a idade
nina, e completar as necessidades energéticas com
Idade Leite materno (ml) Leite materno (ml)
carboidrato e gordura. A mãe deverá utilizar bomba (meses) (percentil de peso = 50) (percentil de peso 5 e 95)
de sucção para garantir o suprimento de leite ma- 0,2 640 510-740
0,5 660 530-780
terno tão logo esteja liberado. Quando os níveis de
1 700 560-840
fenilalanina atingirem o valor desejado ou quando 2 750 610-920
não for possível suspender o leite materno por pou- 3 830 670-1.000
4 900 720-1.060
cos dias, utilizar a técnica descrita a seguir. 5 940 760-1.160
6 1000 790-1.200
B) Calcular o volume de leite materno recomendado F) A quantidade dos outros ingredientes da mama-
que deve ser oferecido para atingir a quantidade deira deverá ser prescrita para completar a ne-
de fenilalanina estabelecida na dieta. A tabela 3 cessidade calórica da criança de acordo com o
mostra o teor de fenilalanina no leite humano. recomendado para fenilcetonúricos (Tabela 8).
Essa fórmula deverá conter, além da fórmula me-
Tabela 3. Composição do leite humano em 100 ml tabólica, amido de milho, lipídeos e polímeros
Nutrientes Leite humano de glicose para se atingir a concentração calórica
Colostro Transição Maduro final em torno de 67 kcal/100 ml. Caso seja uti-
( 1 a 5 dias) ( 6 a 10 dias) (> 10 dias)
lizada uma fórmula metabólica nutricionalmente
Energia (kcal) 67 74 75
Proteína (g) 2,3 1,6 1,1
completa, não há necessidade de adicionar outros
Fenilalanina (mg) 104 63 41 ingredientes à mamadeira .
Fonte: Greve LC e Wheeler MD, 1994.
G) Orientar inicialmente a oferta do volume total de
mamadeira, dividida em oito vezes ao dia, de três
C) Verificar o volume total estimado de leite mater- em três horas, que deverá ser modificada de acor-
no de acordo com a idade e o percentil de peso da do com a introdução de novos alimentos, idade e
criança (Tabela 4). tolerância da criança.
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H) Orientar a oferta do leite materno após a mamadeira D) Os carboidratos e os lipídeos serão prescritos
e em livre demanda no intervalo das mamadeiras. para atender à necessidade calórica da criança
(Tabela 8). A fórmula especial deverá conter
Acompanhamento amido de milho, sacarose e óleo vegetal, além
do substituto protéico.
A) Se os níveis séricos de fenilalanina estiverem
entre 2 e 6 mg/dl e a criança mantiver peso, es- E) A fórmula especial deverá conter concentração
tatura e perímetro cefálico adequados, a dieta calórica final de 67 kcal/100 ml, oferecida inicial-
deverá ser mantida. mente em intervalos de três horas. A freqüência das
mamadeiras deverá ser alterada de acordo com a in-
B) Se a dosagem de fenilalanina estiver ≥ 6 mg/dl,
trodução de novos alimentos, idade e tolerância.
recomenda-se aumentar o volume da mamadeira
com a fórmula metabólica em 25 ml do volume
total; se estiver com níveis acima de 10 mg/dl, au- Acompanhamento
menta-se o volume da mamadeira em 50% e pos- O volume, a composição e a concentração da dieta
teriormente realiza-se a adequação dos nutrientes. serão monitorados de acordo com a fenilalanina sé-
C) Se os níveis séricos estiverem ≤ 2 mg/dl, o volu- rica dosada em cada consulta.
me da fórmula especial da mamadeira deverá ser A) Se os níveis séricos estiverem entre 2 e 6 mgl/dl
diminuído para 25% do volume total para esti- e a criança mantiver peso, estatura e perímetro
mular a sucção do leite materno. cefálico adequados, a dieta deverá ser mantida.
D) Se os níveis de fenilalanina permanecerem < 2 g/dl, B) Se a dosagem estiver ≥ 6 mg/dl, diminuir a quan-
acrescentar fórmula láctea à mamadeira. tidade de fenilalanina em 15 mg da mamadeira;
se estiver acima de 10 mg/dl, diminuir 30 mg e
Em uso de mamadeira fazer os ajustes protéicos e calóricos necessários.
Não sendo possível a utilização do leite materno
C) Se os níveis estiverem ≤ 2 mg/dl, aumentar a
como fonte de fenilalanina no tratamento da fenil-
quantidade de fenilalanina em 15 mg e fazer os
cetonúria, utiliza-se uma fórmula infantil associada à
ajustes protéicos e calóricos.
fórmula metabólica oferecida em mamadeira.
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O teor de fenilalanina dos alimentos pode ser en- • Depende da atividade enzimática, idade, ganho
contrado em diversas tabelas, existentes à disposição de peso, trimestre da gestação, adequação de
energia e proteína e estado de saúde.
nas seguintes referências:
• A prescrição de fenilalanina deve ser iniciada
• tabela de composição dos alimentos da USP dispo-
pelo valor inferior das recomendações de acordo
nível em (http://www.fcf.usp.br/fenilcetonuricos); com a idade e trimestre da gestação.
• U. S. Departament of Agriculture disponível em • Recomenda-se manter níveis abaixo de 6 mg/dl
(http://www.nal.usda.gov/fnic/foodcomp). pelo menos três meses antes da concepção.
• Durante a gestação os níveis plasmáticos devem
permanecer entre 2 e 4 mg/dl, devendo ser dosa-
Recomendações diárias de
da duas vezes na semana.
nutrientes para fenilcetonúricos
Conseqüências da deficiência
Tabela 9. Recomendações diárias de ingestão de de fenilalanina
aminoácidos e proteína total para lactentes,
crianças e adultos portadores de fenilcetonúria Pode levar a um ganho de peso materno insuficiente
Idade Aminoácido Total de proteína e déficit de crescimento intra-uterino.
(anos) (g/kg/dia) (proteína fórmula X proteína natural)
0a2 3 3 Tirosina
3a5 2 2,5 • Prescrever tirosina de acordo com as recomenda-
6 a 10 2 2
ções, mantendo as concentrações plamáticas em
11 a 14 1,5
níveis adequados de tratamento (Tabela 10).
> 14 1
Obs.: 1 g de proteína = 1,2 g de aminoácidos. • Valores de tirosina dietética abaixo do recomen-
Fonte: Medical Research Council Working Party, 1993.
dado devem ser suplementados após dosagem das
concentrações plasmáticas.
Tratamento na Proteína
hiperfenilalaninemia materna • A recomendação de proteína é maior do que as reco-
A hiperfenilalaninemia materna causa efeitos teratogê- mendações da DRIS, quando a maior fonte protéica
nicos no feto durante a gestação. Esses efeitos incluem provém de L-aminoácidos, em virtude da rápida ab-
retardo mental, microcefalia, cardiopatia congênita e sorção, do rápido catabolismo e possível decréscimo
retardo de crescimento intra-uterino. A mulher com na absorção total dos aminoácidos (Tabela 10).
hiperfenilalaninemia deve planejar sua gestação, pois • Parte da proteína é proveniente dos alimentos natu-
os níveis de fenilalanina sangüíneos na pré-concepção rais e a maior porcentagem deve provir da fórmula
devem estar adequados (menor que 6 mg/dl) e devem metabólica.
se manter durante toda a gestação.
Conseqüências da deficiência
Condutas da prescrição dietética de proteínas
Fenilalanina • Estão relacionadas com déficit de crescimento e
• A recomendação de fenilalanina é individualizada, pouco ganho de peso no recém-nascido.
variando de paciente para paciente (Tabela 10). • Diminuição na tolerância de fenilalanina.
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Tabela 10. Recomendações diárias de ingestão de nutrientes para lactentes, crianças e adultos portadores de fenilcetonúria
IDADE NUTRIENTE
Fal Tir Proteína Energia Fluidos
(mg/kg) (mg/kg) (g/kg) (kcal/kg) (ml/kg)
Lactentes
0 a < 3 meses 25-70 300-350 3,5-3,0 120 (145-95) 160-135
3 a < 6 meses 20-45 300-350 3,5-3,0 120 (145-95) 160-130
6 a < 9 meses 15-35 250-300 3,0-2,5 110 (135-80) 145-125
9 a < 12 meses 10-35 250-300 3,0-2,5 105 (135-80) 135-120
(mg/dia) (g/dia) (g/dia) (kcal/dia) (ml/dia)
Crianças
1 a < 4 anos 200-400 1,72-3,00 ≥ 30 1.300 (900-1.800) 900-1.800
4 a < 7 anos 210-450 2,25-3,50 ≥ 35 1.700 (1300-2.300) 1.300-2.300
7 a < 11 anos 220-500 2,55-4,00 ≥ 40 2.400 (1650-3 300) 1.650-3.300
Mulheres
11 a < 15 anos 250-750 3,45-5,00 ≥ 50 2.200 (1.500-3.000) 1.500-3.000
15 a < 19 anos 230-700 3,45-5,00 ≥ 55 2.100 (1.200-3.000) 1.200-3.000
≥ 19 anos 220-700 3,75-5,00 ≥ 60 2.100 (1.400-2.500) 2.100-2.500
Homens
11 a < 15 anos 225-900 3,38-5,50 ≥ 55 2.700 (200-3.700) 2.000-3.700
15 a < 19 anos 295-1.100 4,42-6,50 ≥ 65 2.800 (2.100-3.900) 2.100-3.900
≥ 19 anos 290-1.200 4,35-6,50 ≥ 70 2.900 (2.000-3.300) 2.000-3.300
Fonte: Acosta PB e Yannicelli S, 1998.
27
Institute of Health de 1990, as diretrizes para ganho de suplementação de vitaminas A e D, pois doses de
peso ponderal na gravidez são fundamentadas no IMC vitamina A acima de 15.000 UI ou 4.500 µg RE
pré-gestacional conforme a tabela abaixo: apresentam efeito teratogênico.
a concepção e a cada três meses. Shah SN & Jonhson, R.C. - Effects of α-methylphenylalanine
plus phenylalanine treatment during development on mye-
• Monitorar o ganho de peso semanalmente duran- lin in rat brain- Biomedical and Life Sciences, 5 (7):1990).
te o primeiro mês e, depois, mensalmente. J. Weglage, C. Oberwittler, T. Marquardt, J. Schellscheidt, A.v.
Teeffelen-Heithoff, G. Koch and H. Gerding - Neurological
• Para pacientes que tomam quantidades adequa- deterioration in adult phenylketonuria – Journal of Inheri-
das de fórmula metabólica, é contra-indicada a ted Metabolic Diseases, 2000; 23(1): 83-4).
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Tirosinemia
Fenilalanina
Tirosina
Homogentísico
Maleilacetoacetato
Succinilacetoacetato
CO
Fumarilacetoacetato
Succinilacetona
4
5 ALA Porfobilinogênio
(aminolevulanato)
Fumarato Acetoacetato
29
30
31
- adequação da ingestão de energia e proteína; terno ou fórmula infantil de primeiro semestre e alimen-
- estado de saúde. tos sólidos. A recomendação é maior que a RDA quando
a maior fonte protéica é fornecida por aminoácidos.
• As alterações nos requerimentos devem ser feitas
A ingestão inadequada de proteína resulta em de-
com base no monitoramento de:
ficiência de crescimento, perda de peso, diminuição
- concentração plasmática de fenilalanina e tirosina; de albumina no plasma, osteopenia, alopécia e redu-
- concentrações no plasma e na urina de succini- ção da tolerância de fenilalanina e tirosina.
lacetona e ácidos para-hidroxifenil orgânicos.
Energia
A dieta é planejada utilizando leite materno ou A energia é prescrita de acordo com a RDA para pro-
fórmula infantil de primeiro semestre, fórmulas meta- porcionar um ganho ponderoestatural adequado para
bólicas isentas de fenilalanina e tirosina e algumas fór- o paciente. Recomenda-se oferecer 50% a 60% do
mulas isentas também de metionina, quando a criança valor calórico total da dieta, principalmente na forma
apresentar níveis séricos elevados desse aminoácido. de carboidratos. A energia é proveniente da fórmula
Acrescentar na dieta, a partir do quarto mês, ali- metabólica para tirosinemia, leite materno ou fórmu-
mentos sólidos, frutas e legumes de acordo com a to- la infantil de primeiro semestre e outros alimentos
lerância individual. sólidos. Deve-se prescrever a quantidade para prover
Dietas com restrição abaixo do recomendado suporte normal para ganho de peso adequado.
podem resultar em anorexia, letargia, hipotonia, Os requerimentos podem variar e ser maiores
desenvolvimento ponderoestatural inadequado em quando a proteína é suplementada na sua maioria
bebês e crianças, diminuição da concentração de fi- por aminoácidos.
brinogênio no plasma e aumento da concentração Para prevenir as crises neurológicas se o NTBC
de aminoácidos (exceto fenilalanina e tirosina). não é usado, 50% a 65% de energia deve ser deriva-
da de carboidratos. A ingestão inadequada de ener-
Metionina gia pode precipitar crises metabólicas e neurológicas
A restrição deve acontecer somente se a concentra- como resultado do metabolismo protéico muscular.
ção no plasma for maior que 40 µM/l ou 0,6 mg/dl,
ou quando está acima da referência normal para a Líquidos
idade estabelecida pelo laboratório. • Prescrever quantidade suficiente para suprir os
A ingestão inadequada de metionina resulta em requerimentos de água.
baixo ganho de peso; diminuição da concentração • Suprir quantidade maior quando a quantidade de
de metionina no plasma; aumento de fenilalanina, energia é maior.
prolina, serina, treonina e tirosina; e aumento da
concentração de colesterol. O planejamento da dieta deve ser realizado se-
Com o uso de NTBC, a concentração de metio- guindo os mesmos critérios da dieta para fenilceto-
nina no plasma retorna ao normal. Assim, a restrição núria, sendo somadas as prescrições de fenilalanina e
de metionina na dieta acaba não sendo necessária. tirosina. Os demais nutrientes devem ser calculados
da mesma forma.
Proteínas
A proteína é calculada de acordo com as recomendações Evolução da dieta
para tirosinemia, conforme a faixa etária do paciente, su- Concentração de fenilalanina, tirosina e metionina
gerida pela fórmula metabólica para tirosinemia, leite ma- a) Inicial
32
• Avaliar duas vezes na semana até a estabilização • Se a concentração do plasma continuar alta, re-
juntamente com a ingestão dietética desses três petir o processo acima até o valor atingir o pa-
aminoácidos. drão de referência do tratamento.
b) Seguimento
Seguimento clínico
• Avaliações freqüentes devem auxiliar na adesão
do planejamento dietético. No seguimento clínico da tirosinemia tipo I, exce-
tuando-se na fase de descompensação aguda ou no
• As concentrações de fenilalanina, tirosina e me-
início do tratamento até adequação do paciente e
tionina devem ser avaliadas semanalmente até 1
da família, recomendam-se consultas médicas com
ano de idade e, depois, uma a duas vezes ao mês.
exame físico completo a cada três meses em centro
c) Quando as concentrações de fenilalanina, tirosi- médico especializado e exames para monitorar fun-
na e metionina não estão aceitáveis ção hepática e função renal também trimestrais.
• Se a concentração de fenilalanina, tirosina e me-
tionina não é detectada e o paciente está ingerin-
Tirosinemia tipo II
do o que foi prescrito:
- aumentar a prescrição da quantidade de aminoá- É causada por um defeito na enzima citosol tirosina
cidos não-detectados para 25% a mais, por três ou aminotransferase; como conseqüência, eleva os ní-
quatro dias, e avaliar a concentração plasmática. veis de tirosina no plasma e líquido cefalorraquidia-
• Se a concentração plasmática continuar não-de- no. É caracterizada por alterações oculares (75% dos
tectada, repetir o processo descrito acima até o va- casos), lesões de pele (80% dos casos) e complicações
lor atingir o padrão de referência do tratamento. neurológicas (60% dos casos) ou a combinação des-
ses. A doença usualmente apresenta-se na infância,
• Se a concentração de fenilalanina < 35 µM/l ou
mas pode manifestar-se em qualquer idade. As lesões
0,58 mg/dl, a concentração de tirosina < 40 µM/l
oculares, por depósito de cristais de tirosina, levam
ou 0,72 mg/dl, ou a concentração de metionina
a lacrimejamento, sensação de queimação, fotofobia
< 18 µM/l ou 0,27 mg/dl, e o paciente está inge-
e lesão de córnea. As lesões de pele são limitadas a
rindo toda a prescrição:
zonas de pressão como a palma da mão e sola dos pés
- aumentar a quantidade de aminoácidos prescri- com intensa queratose e ocasionalmente bolhas. As
tos que está abaixo de 5% a 10% e avaliar a con-
alterações neurológicas manifestam-se com déficit
centração do plasma a cada três a quatro dias.
de linguagem, problemas na coordenação motora,
• Se a concentração do plasma de fenilalanina, ti- retardo mental e automutilação.
rosina e metionina continua abaixo, repetir o
processo anterior até o valor atingir o padrão de Diagnóstico
referência do tratamento. A concentração plasmática de tirosina de 500 a
• Se o plasma apresenta fenilalanina > 90 µM/l ou 1.200 µM/l, associada ao quadro clínico e à ausência
1,49 mg/dl, tirosina > 80 µM/ l ou 1,45 mg/dl, ou de succinilacetona no plasma e/ou urina, é compatí-
metionina > 40 µM/l ou 0,6 mg/dl, e o paciente não vel com o diagnóstico .
está ingerindo mais ou menos proteína e energia:
- diminuir a quantidade prescrita de aminoácidos
Tratamento
elevados de 5% a 10% e avaliar a concentração A tirosinemia tipo II é tratada com uma dieta bai-
do plasma depois de três a quatro dias. xa em fenilalanina e tirosina para reduzir a concen-
33
34
35
36
Homocistinúria
37
Os pacientes que têm o diagnóstico precocemen- pode ser remetilada em metionina por meio da beta-
te, no período assintomático, e são tratados adequa- ína homocisteína metiltransferase. A homocisteína
damente, apresentam uma evolução mais benigna e é convertida na cistationina pela transulfuração, por
melhor prognóstico do que os pacientes não tratados meio da enzima cistationina beta-sintase, que é de-
ou tratados tardiamente. pendente de vitamina B6, e posteriormente em ciste-
ína por meio da enzima gama-cistationase. A cisteína
é, então, catabolizada em sulfato e excretada na urina
Bioquímica (Andria et al., 2000; Espinoza et al., 2003; Mudd et
A metionina, proveniente das proteínas ingeridas na al., 2001; Wilcken et al., 1997) (Figura 1).
dieta, sofre ação da metionina adenosil transferase e
dá origem à S-adenosil metionina, que é a principal
doadora de radicais metil para o metabolismo celu- Diagnóstico laboratorial da
lar (síntese de colina, creatinina e adrenalina, me- homocistinúria por deficiência
tilação do DNA etc.). A reação de metilação libera de cistationina-beta-sintase
a S-adenosil homocisteína, que é então hidrolisada
em homocisteína. A metionina sintase, uma enzima Diagnóstico bioquímico
dependente de vitamina B12, é a principal enzima Em indivíduos normais a eliminação urinária de
envolvida na remetilação da homocisteína em me- homocistina e metionina é considerada desprezí-
tionina. O doador do grupo metil nessa reação é o vel. Assim, a presença dessas substâncias na urina já
5-metil-tetraidrofolato, que é regenerado no ciclo do pode ser considerada sugestiva de homocistinúria.
ácido fólico, envolvendo a 5,10-metil-tetraidrofolato Na realidade, normalmente os indivíduos homocis-
redutase e outras enzimas. A homocisteína também tinúricos não apresentam aumento da metionina na
Proteína
Metionina 4
Tetraidrofolato S-adenosil-metionina
Receptor
Dimetil-glicina
3
5,10-metileno-tetrahidrofolato 2
5 Receptor
Betaína Colina metilado
S-adenosil-homocisteína
5-metileno-tetraidrofolato
Homocisteína Adenosina
Serina 1
4
1 Cistationina ß-Sintase Cistationina
2 5-metil-tetraidrofolato homocisteína metiltransferase α-cetobutirato
5
3 Betaína-homocisteína metiltransferase
Cisteína
4 Metionina adenosiltransferase
5 γ-cistationinase 6
6 Sulfito oxidase Sulfito
38
urina porque os rins são mais eficientes na reabsor- cb1E, cb1F e cb1G podem aumentar os níveis de ho-
ção dessa substância do que na reabsorção de homo- mocistina, mas normalmente não elevam a metioni-
cistina (Mudd et al., 2001). na (Mudd et al., 2001).
A detecção de homocistina na urina (homocistinú-
ria) pode ser realizada pelas provas de turvação, como Diagnóstico enzimático
o teste do cianeto-nitroprussiato ou o teste de Spaeth- A dosagem da atividade da enzima CBS é conside-
Barber (Spaeth e Barber, 1967), bem como por croma- rada diagnóstica e pode ser realizada em fibroblastos
tografia líquida de aminoácidos tradicional. Tais exames cultivados, mostrando atividade nula ou pratica-
apenas detectam a presença de homocistina, mas não a mente ausente nos homozigotos e inferior a 50% nos
quantificam e estão sujeitos a diversos resultados falso- heterozigotos (Mudd et al., 2001).
positivos ou negativos, devendo servir, portanto, apenas
como exames de triagem. Outros exames, como a croma- Diagnóstico molecular
tografia em camada gasosa, espectrometria de massa ou O gene da CBS está localizado no cromossomo
ensaios imunoenzimáticos, são mais sensíveis e precisos. 21q22.3, contém 2.554 nucleotídeos organizados em
A despeito do nome homocistinúria, as alterações 23 éxons, sendo o polipeptídeo final codificado ape-
bioquímicas mais marcantes dessa condição ocorrem nas pelos éxons 1 a 16 e consistindo em 551 amino-
no plasma, sendo esta a amostra preferencial para o ácidos (Mudd et al., 2001).
diagnóstico (Kahler e Fahey, 2003). Na homocisti- Mais de 130 mutações diferentes foram identifi-
núria por deficiência de CBS ocorre aumento tanto cadas no gene da CBS (Moat et al., 2004). Os indi-
da homocistina quanto da metionina: os níveis plas- víduos afetados são, em sua maioria, heterozigotos
máticos de homocistina são maiores que 100 µM/l compostos para mutações missense privadas. Apenas
ou 3 mg/dl (para valores normais de 5 a 15 µM/l ou duas mutações são mais freqüentes: I278T e G307S,
até 0,03 mg/dl) e de metionina, maiores que 50 µM/l ambas no éxon 8, e, juntas, responsáveis por metade
ou 0,7 mg/dl (para valores normais de 10-40 µM/l ou dos casos. A primeira tem distribuição pan-étnica e
0,2 a 0,6 mg/dl) (Smith et al., 1998). Além dessas responde por cerca de 25% dos alelos mutados. A se-
alterações principais, homocistinúricos podem apre- gunda, que responde por outros 25%, é freqüente em
sentar elevação da concentração de ornitina plasmá- descendentes de populações das ilhas britânicas, da
tica duas a três vezes acima do normal, bem como do França e de Portugal, não tendo sido identificada em
cobre e da ceruloplasmina plasmáticos até 1,4 vez o populações de origem italiana ou da Europa Central
normal (Mudd et al., 2001). (Mudd et al., 2001; Moat et al., 2004).
A concentração plasmática de homocistina varia A mutação I278T confere um fenótipo responsi-
conforme a idade e o sexo, sendo menor nas crianças vo à piridoxina, tanto em homozigose quanto em he-
e nas mulheres, as quais apresentam elevação dos ní- terozigose. Por outro lado, a mutação G307S parece
veis após a menopausa (Mudd et al., 2001). ser não-responsiva à piridoxina, tanto em homozigo-
O encontro de resultados falso-positivos para hi- se quanto em heterozigose. Indivíduos heterozigotos
per-homocisteinemia podem ocorrer na insuficiên- compostos para ambas as mutações são não-responsi-
cia renal, síndrome de Immerslund, anormalidades vos à piridoxina. Quanto às demais mutações, todas
da transcobalamina II, deficiência de folato ou de infreqüentes, não foi possível estabelecer uma cor-
B12, uso de drogas antagonistas do folato, óxido ni- relação genótipo–fenótipo apropriada. Além disso,
troso e outros (Mudd et al., 2001). irmãos homocistinúricos podem apresentar quadros
Mutações que alterem a atividade da MTHFR, clínicos e respostas à piridoxina distintos, ou seja,
especialmente a mutação C677T, e da cb1C, cb1D, genótipos idênticos na CBS nem sempre resultam
39
em um mesmo fenótipo, mesmo em uma única famí- Cerca da metade dos pacientes com deficiência da
lia (Mudd et al., 2001; Moat et al., 2004). CBS responde parcialmente a altas doses de pirido-
É importante mencionar que o estudo molecular xina. Em pacientes que são completamente responsi-
do gene da CBS, apesar de custoso e trabalhoso pelo vos, a homocistina plasmática em jejum desaparece,
fato de muitos indivíduos apresentarem mutações há redução da hipermetioninemia e aumento da cisti-
privadas, é extremamente específico, pois nenhum nemia a valores compatíveis com a normalidade, após
outro fenótipo anormal foi associado a mutações no o período de algumas semanas tomando-se piridoxi-
na, com doses variando desde alguns miligramas até
CBS e é confiável para a detecção de heterozigotos
1 grama. Na literatura, as doses são variáveis, porém
(Mudd et al., 2001).
Wilckem e Wilckem concluíram que a melhor res-
Diagnóstico pré-natal posta ocorre com doses de 100 a 200 mg/dia. Evita-se
o uso de doses acima de 1 grama de piridoxina pelos
O diagnóstico pré-natal pode ser feito por dosagem seus efeitos colaterais, principalmente a neuropatia
da atividade enzimática em cultura de amnióci- periférica. Deve-se administrar ácido fólico 5 a 10 mg/
tos, mas não em vilos coriônicos (Fowler e Jakobs, dia no início do tratamento, pois a resposta à piridoxi-
1998). A quantificação da homocisteína no líquido na só ocorrerá se não houver depleção de folato.
amniótico também é possível, bem como o estudo Administra-se também a betaína via oral (dose
molecular do DNA fetal (Rabier et al., 1996). máxima de 150 mg/kg/dia) nas principais refeições,
em três doses diárias, pois ela é um importante doa-
Triagem neonatal dor de radical metil para a remetilação da homocis-
Poucos países implantaram programas de triagem teína em metionina.
neonatal para homocistinúria, e alguns descontinua- Em pacientes que não respondem à piridoxina,
deve ser instituída uma dieta pobre em metionina e
ram em razão da baixa incidência dessa condição
rica em cistina. O objetivo do tratamento é manter
(Accinni et al., 2003; Walter, 2003).
níveis de homocisteína plasmática total abaixo de
O método mais utilizado é o ensaio de inibição
60 µM/l, porém são aceitáveis níveis abaixo de 100
bacteriana em amostras de sangue seco em papel-
µM/l (Mudd et al., 2001).
filtro para identificação da metionina. Esse método,
entretanto, é passível de resultado falso-negativo por
ingestão insuficiente de metionina nos primeiros dias Tratamento dietético
de vida, baixa concentração de metionina no leite
Suporte nutricional
materno e em algumas formulações ou coleta muito
precoce, bem como pela presença de antibiótico no 1. Restringir a metionina da dieta na quantidade tolera-
sangue do recém-nascido que pode inibir o cresci- da pelo paciente, mantendo-se os níveis plasmáticos
de acordo com as recomendações de tratamento.
mento bacteriano. Além disso, mutações no gene da
MTHFR, muito mais freqüentes que as mutações da 2. Suplementação de cistina, se necessário, para ma-
CBS, não costumam alterar de modo significativo os nutenção normal da concentração plasmática.
níveis de metionina (Accinni et al., 2003).
Objetivos do suporte nutricional
1. Manter concentração sangüínea de homocisteína
Tratamento dentro da faixa recomendada (até 100 µM/l de homo-
O objetivo do tratamento é reduzir os níveis de homo- cisteína total, porém o ideal é abaixo de 60 µM/l).
cisteína plasmática para o mais próximo do normal e 2. Manter concentrações de metionina dentro do
manter a taxa de ganho ponderoestatural adequada. recomendado (20 a 40 µM/l).
40
41
Açúcar 30 g – – – 120
Exemplo de dieta
Água 1.000 ml – – – –
Criança de 3 meses de idade com homocistinúria, Total/dia 0 690 27 454
pesando 5.400 g.
Outros alimentos que compõem a dieta
Recomendação diária de nutrientes Met Cis Prot Energia
Alimento Porções
(mg) (mg) (g) (kcal)
Metionina 15 mg/kg
Cereais e
Cisteína 300 mg/kg 2 60 40 4,0 180
tubérculos
Proteína 3 g/kg Legumes 4 32 40 1,8 180
Energia 120 kcal/kg Vegetais 2 8 30 0,6 10
Proteína 16,2 g Obs.: Suplementar cisteína somente se necessário, de acordo com a concentração plasmática.
42
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44
Doenças do ciclo
da uréia (DCU)
45
Via metabólica
2. Ornitina transcarbamilase
2 5. Arginase
5
Degradação de proteínas
Fenilbutirato
3. Argininosuccinato sintase
3 6. N-acetilglutamato sintetase
6
Fenilacetato
Fenilacetatilglutamina
Glutamina
Alanina
Aspartato Benzoato Benzoil-CoA
Glicina Hipurato
Glutamato
6
acetilCoA
NH3
Aspartato
N-acetilglutamato Ácido
1
orótico
Citrulina Citrulina
Orotidina
Carbamilfosfato 3 Argininosuccinato
Arginina Fumarato
2 5
Ornitina Ornitina
Uréia
Urina
Mitocôndria Citosol
46
De maneira geral, crianças com defeitos no ciclo da uréia ou 25%, num total de 150 a 200 kcal/kg/dia. O uso de
apresentam valores plasmáticos acima de 400 ug/dl. benzoato de sódio oral ou intravenoso na dose de 500
Entre os cuidados na coleta de amostras para dosa- mg/kg/dia ou de fenilbutirato de sódio na dose de 600
gem de amônia, recomenda-se centrifugar o sangue co- mg/kg/dia cria uma rota alternativa, diminuindo con-
letado e congelar o plasma, se não for ser dosado na mes- sideravelmente os níveis plasmáticos de amônia (ver
ma hora, pois hemólise mínima já altera os resultados, ciclo). Cada molécula de benzoato de sódio depura
portanto aconselha-se a realização de várias dosagens. uma molécula de amônia, enquanto cada molécula de
fenilbutirato consegue depurar duas de amônia.
Tabela 1. Quadro-resumo com as alterações É contra-indicado o uso de corticóides no edema
mais comuns do ciclo da uréia
cerebral secundário à hiperamonemia, enquanto o
Enzima Doença Aminoácidos
Ácido de manitol é discutível. A melhora se dá 12 horas
orótico
↑ Glutamina e alanina
após a diminuição dos níveis de amônia plasmática
CPS Def. de CPS Normal
↓ Citrulina e arginina com as medidas mencionadas.
↑ Glutamina e alanina
OTC Def. de OTC ↑↑
↓ Citrulina e arginina
AS Citrulinemia
↑↑ Citrulina
↑
Objetivos da terapia nutricional
↓ Arginina
↑ Citrulina • Estabilizar as alterações metabólicas.
Acidúria
AC ↑ Ác. argininosuccínico ↑
Argininosuccínica
↑ Arginina • Evitar o catabolismo protéico.
Arginase Def. Arginase ↑↑ Arginina Normal
• Evitar agravos neurológicos.
Diagnóstico diferencial deve ser feito com outros • Suprir as recomendações de nutrientes e energia
erros inatos do metabolismo que aumentam os níveis para garantir o crescimento e o desenvolvimento
de amônia, como as acidúrias orgânicas e doenças em crianças e a manutenção de peso em adultos.
mitocondriais.
Tratamento a longo prazo
Fase aguda A terapia nutricional dos defeitos do ciclo da uréia
O objetivo do tratamento das DCU é fazer a depura- tem como objetivo principal manter a concentração
ção da amônia, levando seus níveis para concentra- plasmática de amônia o mais próximo possível do
ções não-tóxicas. Pode-se dividir o tratamento em normal, por meio de dieta adequada em proteína,
duas situações: emergencial e crônico. aminoácidos e outros nutrientes essenciais.
Recém-nascido ou criança gravemente enferma e
Restrição dietética de proteína
com nível de amônia igual ou acima de 600 µg/dl ne-
cessita de suspensão imediata das proteínas da dieta e A restrição de proteína na dieta deve atender à to-
de diálise peritoneal, hemodiálise ou hemofiltração. lerância individual, evitando a hiperamonemia e o
A suplementação de L-arginina (300 mg/kg/dia) e catabolismo protéico e propiciando o crescimento e
L-carnitina (200 mg/kg/dia) é recomendada até a o ganho de peso adequado para crianças e a manu-
definição diagnóstica. tenção de peso em adultos.
Na presença de descompensação metabólica, reco-
menda-se suspender as proteínas da dieta por 48 a 72 Concentração plasmática de aminoácidos
horas. A reintrodução deve ser lenta e progressiva com Manter a concentração plasmática de duas a quatro ho-
0,25 a 0,5 g/kg/dia. A manutenção do aporte calórico ras pós-prandial, nas concentrações abaixo ou nas quan-
por via parenteral central deve ser com glicose 10% tidades normais determinadas pelo laboratório local.
47
48
Carboidratos
Energia: 550 calorias/dia
A quantidade de carboidratos não deve propiciar Proteína: 10 g/dia
mais que 50% do total de energia, pois freqüen- L-citrulina: 850 mg/dia
temente é encontrado aumento de triacilglicerol
plasmático. A fórmula metabólica e a fórmula láctea para a
idade devem atender à restrição de proteína na die-
Água
ta, considerando a tolerância individual e evitando a
A dieta deve proporcionar a quantidade de água re-
hiperamonemia e o catabolismo protéico.
comendada para crianças e adultos saudáveis.
49
Alimentos Quantidade
Fórmula metabólica 13 g Outros tratamentos
Açúcar e/ou maltodextrina 100 g
Anticonvulsivantes são necessários, muitas vezes, mas
Amido de milho 10 g
Óleo de soja 15 ml
não se deve utilizar valproato de sódio, pois pode levar
Água 1.000 ml a uma descompensação fatal. Transplante hepático é
Rendimento: 5 mamadeiras de 220 ml/dia contra-indicado em caso de presença de lesão neuroló-
Água ............................... 20 ml gica grave e irreversível e em outras condições clínicas
L-citrulina (pó) .............. 2.000 mg desfavoráveis, como imunodeficiência adquirida.
Modo de preparo: misturar a fórmula em água fervida e fria.
Cereais e tubérculos 1 porção/dia
Legumes 2 porções/dia
Acompanhamento
Verduras 2 porções/dia Controles com consultas médicas, nutricionais e exa-
Frutas 4 porções/dia mes subsidiários devem ser realizados a cada três meses,
Óleo vegetal 10 g/dia como rotina; nas intercorrências, seguir o recomenda-
Porções de frutas Porções de Verduras do da fase aguda. Os exames subsidiários incluem he-
Abacate – 30 g Acelga – 10 g mograma, gasometria venosa, eletrólitos, função renal
Abacaxi – 150 g Agrião – 15 g
e hepática, ácido orótico, dosagem sérica de proteína
Ameixa vermelha – 150 g Alface – 25 g
(incluindo pré-albumina) e imagens de sistema nervo-
Amora – 50 g Almeirão – 15 g
so central ou abdominal, quando necessário.
Banana-maçã – 40 g Escarola – 15 g
Banana-nanica – 45 g Pepino – 40 g
Caju – 70 g Repolho – 20 g
Bibliografia
Caqui – 100 g Tomate – 25 g
1. Batshaw ML, MacArthur RB, Tuchman M. Alternative
Goiaba – 50 g
pathway therapy for urea cycle disorders: twenty years
Jabuticaba – 100 g later. J Pediatri 2001;138(Suppl):S46-55.
Laranja-pêra – 100 g
2. Berry GT, Steiner RD. Long-term management of patients with
Maçã – 170 g urea cycle disorders. J Pediatri 2001;138(Suppl):S56-61.
Mamão – 120 g
3. Brusilow SW, Horwich AL. Urea cycle enzymes in scriver. In:
Manga – 150 g Beaudet CR, Sly L, Valle D. The metabolic and molecular
Melancia – 120 g bases of inherited disease. New York, McGraw Hill, 2001.
Melão – 75 g 4. Brusilow SW, Maestri NE. Urea cycle disorders: diagnosis,
Nêspera – 150 g pathophysiology, and therapy. Adv Pediatri 1996;43:127-70.
Pêra – 100 g 5. Burtons BK. Pediatric Liver: helping adults by treat-
Tangerina – 75 g ing children: urea cycle disorders. Clinics in Liver Disease
Uva (média) – 40 g 2000;4(4).
Porções de legumes Porções de cereais e tubérculos 6. Colombo MC, Cornejo VE, Raiman EB. Erroes innatos em el
Abóbora – 50 g Arroz branco cru – 25 g metabolismo del niño. 2 ed. 2003.
Abobrinha – 60 g Batata – 100 g 7. Elsas LJ, Acosta FB. Nutritional support of inherited me-
Berinjela – 60 g Batata-doce – 90 g tabolic disease. In: Shils ME. Modern nutrition in heal-
th and disease. 9 ed. Philadelphia, Lea & Febinger, pp.
Beterraba – 20 g Mandioca – 100 g
1003-56, 1999.
Cebola – 35 g Mandioquinha – 120 g
8. Fernandes J, Saudubray JM, Van den Berghe G. Inborn
Cenoura – 50 g
metabolic diseases diagnosis and treatment. 3 ed. 2000.
Chuchu – 25 g
9. Leonard JV. The nutritional manangement of urea cycle
Couve-manteiga – 40 g
disorders. J Pediatri 2001;138(Suppl):S40-6.
Couve-flor – 25 g
10. Maestri NE, Clissold D, Brusilow SW. Neonatal onset orni-
Escarola – 35 g
thine transcarbamylase deficiency: a retrospective analy-
Espinafre – 20 g
sis. J Pediatri 1999;134(3):255.
50
11. National Research Council. Dietary reference intakes for 15. National Research Council. Dietary reference intakes for
calcium, phosphorus, magnesium, vitamin d, and fluori- vitamin c, vitamin e, selenium, and carotenoids. USA, Na-
de. USA, National Academy Press, 1997. tional Academy Press, 2000.
12. National Research Council. Dietary reference intakes for 16. Summar M, Tuchman M. Proceedings of a consensus
energy, carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol, conference for the management of patients with urea
protein, and amino acids (macronutrients). USA, National cycle disorders. J Pediatri 2001;138(Suppl):S6-10.
Academy Press, 2002. 17. Summar M. Current strategies for the manangement of ne-
13. National Research Council. Dietary reference intakes for onatal urea cycle disorders. J Pediatri 2001;138:S30-9.
iron, vitamin a and K, arsenic, boron, chromium, copper, 18. Thoene JG. Treatment of urea cycle disorders. J Pediatr
iodine, manganese, molybdenum, nickel, silicon, vana- 1999;134(3):255-6.
dium, and zinc. USA. National Academy Press, 2001.
19. Wilcken B. Problems in the manangement of urea
14. National Research Council. Dietary Reference Intakes for cycle disorders. Molecular Genetics and Metabolism
Thiamin, Riboflavin, Niacin, Vitamin B6, Folate, Vitamin 2004;81(Suppl):S86-91.
B12, Pantothenic Acid, Biotin, and Choline. USA. Natio-
nal Academy Press, 2000.
51
Leucinose: doença do
xarope de bordo
Via metabólica
Leucina Isoleucina Valina
53
54
55
56
57
Chuang DT, Shih VE. Maple syrup urine disease. In: Scriver Serra JD. Enfermidade de orina de jabre arce. In: Sanjurjo P,
CR, Beaudet AL, Sly WS, Valle D. The metabolic & mo- Baldellou A. Diagnóstico y tratamiento de las enfermida-
lecular bases of inherited disease. 8 ed. International edi- des metabólicas hereditárias. Madrid: Eddiciones Ergon,
tion. New York: McGraw-Hill, 2001, pp. 2971-2006. 2001, pp. 239-46
58
Acidemias propiônica,
metilmalônica e isovalérica
Via metabólica
Leucina Isoleucina Valina
3-metilcrotonil-CoA
Acetil-CoA Propionil-CoA
Acetoacetato
2 Propionil-CoA carboxilase 3
59
60
61
• aumento discreto de glicina no plasma (espe- • Suspender o aporte protéico e evitar o catabolismo
cialmente na acidemia propiônica); mediante maior aporte calórico.
• a acidemia metilmalônica pode estar associada • Forçar a diurese: utilizar soluções glicosadas a
à homocistinúria. 10%, com eletrólitos (150 a 200 ml/kg/dia), com
ou sem diuréticos.
3. Análise de carnitina livre e esterificada:
• diminuição da carnitina livre e aumento de • Tratamento das infecções intercorrentes.
acilcarnitinas; • Eliminação de toxinas de forma rápida: se a diu-
• acidemia isovalérica – aumento de isovaleril- rese forçada não for suficiente, pode-se utilizar
carnitina; exsangüinotransfusão, diálise ou hemofiltração.
• acidemia propiônica – aumento de propionil- • Prova terapêutica:
carnitina.
- carnitina: 100 a 400 mg/kg/dia
62
e com parâmetros laboratoriais, como a dosagem de • determinar a cetonúria a cada micção; se positiva,
proteínas totais. controlar a ingesta protéica e aumentar o aporte
Além disso, deve ser feito um controle bioquími- calórico. Se necessário, usar sonda nasogástrica de-
co regular por meio dos seguintes exames: vido à anorexia;
• Dosagem de ácidos orgânicos: em nenhuma das • aumentar doses de carnitina até 400 mg/kg/dia;
três acidemias os metabólitos que definem o diag- • hospitalização, se houver piora clínica.
nóstico desaparecem totalmente. Recomendam
manter os seguintes níveis: Para os pacientes que apresentarem sinais de de-
sidratação, cetoacidose e níveis aumentados de amô-
- APP – propionato no plasma < 0,05 µM/l;
nia, medidas mais rigorosas devem ser instituídas:
- AMM – metilmalonato na urina < 2.000 µM/
mol creatinina; • suspender aporte protéico por 24-48 horas;
- AIV – isovalerilglicina < 2.000 µM/mol creatinina. • quando a amônia estiver em torno de 80 µM/l,
reintroduzir a fórmula metabólica e acompanhar
• Dosagem quantitativa de aminoácidos no plas-
a tolerância;
ma e na urina: é importante monitorar os níveis
• fornecer glicose e bicarbonato (manter pH em
de aminoácidos restringidos na dieta para evitar
7,25 com reserva alcalina maior que 12 mEq);
suas deficiências.
• insulina e alanina podem ser úteis para evitar o
Esses exames bioquímicos devem ser repetidos catabolismo protéico;
periodicamente com base na estabilidade clínica e
• se necessário, introduzir alimentação parenteral.
idade do paciente. Em pacientes com menos de 2
anos, recomendam-se controles mensais e, nos com
Tratamento dietoterápico nas acidemias
idade acima de 2 anos, os exames podem ser feitos
propiônica e metilmalônica: fase crônica
a cada trimestre, desde que a criança não apresente
O tratamento dietético tem como objetivo reduzir
sinais de descompensação.
a produção de propionato mediante a restrição dos
aminoácidos precursores, isoleucina, metionina,
Tratamento dietoterápico treonina e valina, além de evitar o jejum para limi-
tar a oxidação dos ácidos graxos de cadeia ímpar.
Tratamento dietoterápico nas acidemias É importante ressaltar que aproximadamente
propiônica e metilmalônica: fase aguda 50% do propionato é formado pelo catabolismo da
Os pacientes portadores de acidemias orgânicas isoleucina, metionina, treonina e valina; 25% são
podem apresentar descompensações agudas. Esses produzidos pelas bactérias aeróbicas do intestino e,
episódios são freqüentemente desencadeados por provavelmente, 25% provêm da oxidação dos ácidos
infecções, imunizações, febre, vômitos, anorexia, graxos de cadeia ímpar.
cirurgia e uso de fármacos, como o propionato de A restrição dos aminoácidos envolvidos na pato-
eritromicina. logia é realizada com dieta restrita em proteína. A
Os sintomas iniciais sugestivos de uma descom- dieta deve ser suplementada com fórmula metabóli-
pensação aguda são anorexia, vômitos, sonolência, ca isenta de isoleucina, metionina, treonina e vali-
hipotonia e taquipnéia. na, mas enriquecida de vitaminas e minerais. A dieta
Algumas medidas podem ser iniciadas diante des- deve ser fracionada de três a quatro horas, durante o
sas situações, tais como: dia, e, à noite, pode ser utilizado amido de milho cru
63
na dose de 1,5 a 1,75 mg/kg para minimizar a lipólise quadas resultam em déficit de crescimento, perda de
(dose única que dura 6 horas). peso e aumento nas concentrações de ácidos graxos
de cadeia ímpar.
Recomendações na
prescrição dietética Ácidos graxos de cadeia curta
Devem ser evitadas as fontes desses ácidos graxos
Isoleucina, metionina, treonina, valina
como: manteiga, creme, óleo de oliva, banha e ex-
A recomendação dos aminoácidos é individualizada
cesso de ácidos graxos poliinsaturados.
e depende da idade do paciente, do seu peso corpo-
ral, do crescimento, da adequação do valor energéti- Jejum
co e da proteína e do estado de saúde. Longos períodos de jejum devem ser evitados para
limitar a produção de propionato pela oxidação dos
Deficiências
ácidos graxos de cadeia curta. A mobilização dos áci-
Isoleucina: perda de peso, vermelhidão da mucosa
dos graxos deve ser evitada, oferecendo refeições a
da boca, fissuras no canto da boca, tremores nas ex-
cada três ou quatro horas, inclusive durante a noite,
tremidades, diminuição plasmática de colesterol e
ou com a utilização de amido cru.
isoleucina, aumento de lisina, fenilalanina, serina,
tirosina e valina e descamação da pele.
Metionina: diminuição das concentrações plasmáti- Prescrição dietética
cas de metionina, colesterol, e aumento de fenilala- As proteínas naturais (fórmula infantil, frutas e vege-
nina prolina, serina treonina e tirosina. tais) devem ser oferecidas entre 0,8 e 1,5 g/kg/dia e,
para lactentes, de 1,2 a 1,7 g/kg/dia, complementando
Treonina: pouco ganho de peso, glossites, vermelhi-
dão da mucosa da boca e redução nos níveis plasmá- a recomendação com fórmula metabólica sem os qua-
ticos de treonina e globulinas. tro aminoácidos, em um total de 2,5 a 3 g/kg/dia.
Deve ser calculada a quantidade de isoleucina, va-
Valina: redução do apetite, irritabilidade excessi-
lina, treonina e metionina dos alimentos, adequan-
va, perda de peso, sonolência e queda na concen-
do-os às recomendações. Calcular a quantidade de
tração de albumina.
energia proveniente da fórmula infantil, fórmula me-
tabólica e de outros alimentos (frutas e vegetais), caso
Proteína
já tenham sido introduzidos na dieta. Suplementar o
A recomendação de proteína é maior que a RDI,
déficit calórico com polímeros de glicose, açúcar ou
quando a maior fonte protéica provém de L-aminoá-
outros alimentos isentos de proteína.
cidos, em razão de rápida absorção, rápido catabolis-
mo e possível decréscimo na absorção total.
Exemplos de dietas
A ingestão inadequada de proteína resulta em dé-
ficit de crescimento em crianças, perda de peso em Criança de 3 meses de idade, pesando 5.400 g
adultos, osteopenia, perda de cabelo e diminuição na Recomendação diária de nutrientes
tolerância à isoleucina, metionina, treonina e valina. Isoleucina 90 mg/kg
Metionina 35 mg/kg
Energia Treonina 75 mg/kg
A recomendação energética deve ser suficiente para Valina 85 mg/kg
64
Alimentos Quantidade
Fórmula metabólica 70 g Tratamento dietoterápico na
Açúcar 40 g acidemia isovalérica: fase aguda
Fórmula infantil 62 g
Amido de milho 20 g
Durante a fase aguda, deve ser proporcionado um
Gordura vegetal 10 ml tratamento nutricional intensivo com o objetivo de
Água 600 ml corrigir a acidose metabólica:
Rendimento: 3 copos de 200 ml • por via parenteral oferecer 120 a 150 kcal/kg/dia de
Cereais e tubérculos 4 porções/dia
soro glicosado a 15%; havendo resposta à glicose,
Legumes 2 porções/dia
Verduras 4 porções/dia
após 2 a 3 dias, adicionar 2 a 4 g/kg/dia de lipídeos;
Frutas 3 porções/dia • por via enteral dar L-glicina 150 a 300 mg/kg/dia,
Óleo vegetal 10 ml/dia
para que se una ao ácido isovalérico, formando
65
O objetivo nutricional nessa fase é manter as pro- 3. Cornejo.V. Raimann E. Hiperfenilalaninemias en errores
innatos en el metabolismo del ninõ. 2 ed. 1999, pp. 71-9.
teínas naturais em 1,2 a 1,5 g/kg/dia em lactentes
e 1 g/kg/dia em crianças maiores, devendo a reco- 4. Ensenauer R, Vockley J, Willard J-M et al. A common mu-
tation is associated with a mild, potentially asymptomatic
mendação protéica ser complementada com fórmula
phenotype in patients with isovaleric acidemia diagnosed
de aminoácidos isenta de leucina. A introdução de by newborn screening. Am J Hum Genet 2004;75:1136-42.
leucina deve ser iniciada quando os níveis estiverem 5. Fenton WA, Gravel RA, Rosenblatt DS. Disorders of pro-
entre 50 e 100 µM/l, com oferta de leite materno ou pionate and methylmalonate metabolism. In: Scriver CR,
fórmula infantil. Beaudet AL, Sly W, Valle D. The metabolic & molecular
bases of inherited disease. 8 ed. New York: McGraw-Hill,
2001, pp. 2165-94.
Tabela 1. Recomendação diária de nutrientes
da acidemia isovalérica 6. Pérz-Cerdá C, Merinero B. Acidemia isovalérica y otras
alteraciones en el catabolismo de leucina y valina. Déficit
Idade Leucina Proteína Energia Líquidos múltiple de carboxilases. In: Sanjurjo P, Baldellou A. Diag-
(mg/kg) (g/kg) (kcal/kg) (ml/kg)
nóstico y tratamiento de las enfermidades metabólicas
0-3 meses 80-150 3,5-3,0 120 (145-95) 150-125
hereditárias. Madrid: Ediciones Ergon, 2001, pp. 263-74.
3-6 meses 70-140 3,5-3,0 115 (145-95) 160-130
7. Sanjurjo Crespo P. Acidemias metil-malónica e propióni-
6-9 meses 60-130 2,5-3,0 110 (135-80) 145-125
ca. In: Sanjurjo P, Baldellou A. Diagnóstico y tratamiento
9-12 meses 50-120 2,5-3,0 105 (135-80) 135-120
de las enfermidades metabólicas hereditárias. Madrid:
(mg/dia) g/dia (kcal/dia) (ml/dia) Ediciones Ergon, 2001, pp. 247-56.
1 < 4 anos 500-600 ≥ 30 1.300 (900-1.800) 900-1.800
8. Sweetman L, Willians JC. Branched chain organic aci-
4 < 7 anos 600-900 ≥ 35 1.700 (1.300-2.300) 1.300-2.300
durias. In: Scriver CR, Beaudet AL, Sly W, Valle D. The
7 < 11anos 700-900 ≥ 40 2.400 (1.650-3.300) 1.650-3.300
metabolic & molecular bases of inherited disease. 8 ed.
Fonte: Acosta PB, Yannicelli S. New York: McGraw-Hill, 2001, pp. 2125-64.
66
Introdução Fisiopatologia
A acidúria glutárica tipo 1 (AG-1) é um distúrbio do A glutaril-CoA desidrogenase é uma enzima intra-
metabolismo da lisina, hidroxilisina e triptofano cau- mitocondrial que utiliza os dinucleotídeos adenina e
sado pela deficiência da glutaril-CoA desidrogenase. flavina, catalisando tanto a desidrogenização da glu-
É de herança autossômica recessiva e sua incidência taril-CoA como a descarboxilização da glutaconil-
mundial é de 1:30.000 a 1:40.000 nascidos vivos. No CoA para crotonil-CoA. Sua deficiência, portanto,
entanto, apresenta particularmente uma freqüência leva ao acúmulo de glutaril-CoA, que, em parte, é
muito maior entre a comunidade amish na Pensilvâ- esterificado pela carnitina, causando, assim, uma
nia, Estados Unidos (1:400 nascidos vivos). deficiência secundária de carnitina, provavelmente
sendo esse um fator importante nas crises metabóli-
Via metabólica cas apresentadas pelos pacientes.
Ocorre também um acúmulo de ácidos dicarbo-
xílicos, o que leva à alteração da função mitocon-
Lisina
drial e da oxidação de ácidos graxos. O mecanismo
de destruição das estruturas cerebrais tem sido ainda
Ácido
motivo de grande discussão.
aminoadípico
Quadro clínico
Ácido
Triptofano
cetoadípico A evolução das manifestações clínicas da AG-1 é va-
riável, podendo-se dividi-las em quatro categorias:
67
68
Para redução do período de jejum e adequação da AG-1. Existem grupos realizando estudos comparati-
necessidade de energia, a solução deve ser dada ini- vos dessa evolução, mas, pela diversidade de apresen-
cialmente a cada duas ou três horas durante o dia e à tação clínica, é difícil a comparação de tratamento.
noite. O regime de emergência não deve permanecer Quando se opta pela introdução do tratamento die-
por longos períodos, pois não oferece uma nutrição tético, este deve proporcionar 50% dos requerimentos
adequada (Tabela 1). de proteínas provenientes de alimentos naturais (1
a 1,5 mg/kg/dia) e 50% de uma fórmula metabólica
Tabela 1. Regime de emergência
isenta de lisina e triptofano. Mantém-se o triptofano
Concentração do
Idade (anos)
polímero de glicose
Volume do dia plasmático entre 55 e 65 µM/l, pois restrições extremas
0-0,5 10% 150-200 ml/kg causam efeitos colaterais, como sonolência, irritabili-
0,5-1 12% 120-150 ml/kg dade e inapetência. A lisina deve permanecer entre 45
1-2 15% 1.200 ml e 90 µM/l (Colombo et al., 2003).
2-6 20% 1.200-1.600 ml
6-10 20% 1.600-2.000 ml
> 10 25% 2.000 ml Bibliografia
Colombo MC, Cornejo VE, Raiman EB. Erroes innatos em el me-
tabolismo del niño 2 ed. 2003. Santiago, Editorial Universi-
Tratamento a longo prazo tária, págs 82-85
69
Glicogenoses
Glicogênio
amilopectina Ligações ramificadas
5
6
4
Glicose -UDP Glicose - 1-P 7
1 3 2
GLUT 2 Glicose Glicose - 6-P Glicose GLUT 2 1
1. Glicoquinase-hexoquinase
Via das pentoses
2
2. Glicose-6-fosfatase
Ribose- 5-P
Glicolise Gliconeogenese
3
3. Fosfoglucomutase
7
7. Enzima desramificadora
Ciclo do ácido tricarboxílico Triglicérides
71
72
73
74
Carne, frango
3 colheres Carne de boi magra No caso da GSD Ib, o controle de hemograma
(sopa) ou pescada
inicialmente deve ser mensal e o de mielograma,
1 pires raso
Espinafre Acelga, escarola
(cru) anual (Visser et al., 2002).
1 colher (chá)
Margarina sem leite Margarina sem leite
rasa
Lanche I Glicogenose tipo II
Isolado protéico de soja
Água
8,8 g
100 ml
(doença de Pompe)
Bolacha de água e sal 4 unidades
1 unidade de pão francês A glicogenose do tipo II, chamada doença de Pompe ou
com margarina sem leite
deficiência da maltase ácida, resulta de deficiência da
18 horas
Amido cru 27,5 g –
hidrolase lisossômica alfa-glicosidase ácida em todos os
Água 55 ml – tecidos, levando ao depósito de glicogênio no lisossomo
Jantar e, conseqüentemente, à destruição do tecido muscular.
Macarrão
4 colheres
Arroz A doença tem herança autossômica recessiva.
(sopa) (cru)
2 colheres Carne de frango ou
As manifestações clínicas da doença de Pompe
Carne boi magra
(sopa) pescada variam de acordo com a idade de início dos sintomas,
1 pires raso
Escarola
(cru)
Acelga, espinafre grau de comprometimento muscular e dos outros ór-
1 colher (chá) gãos envolvidos. São classificados na forma precoce
Margarina sem leite Margarina sem leite
rasa
(< 2 anos de idade) e forma tardia (> 2 anos de idade).
24 horas
Os exames complementares geralmente revelam o
Amido cru 27,5 g –
envolvimento do tecido muscular esquelético. A do-
Água 55 ml –
Lanche II
sagem de enzimas musculares mostra resultados variá-
Isolado protéico de soja 8,8 g veis. Na forma precoce, freqüentemente, observam-se
Água 100 ml aumentos significativos da creatinofosfoquinase (até
Amido de milho
15 g 2.000 IU/l), enquanto em pacientes com a forma adul-
(engrossar)
ta essa enzima pode se mostrar normal. A eletromio-
Acompanhamento grafia evidencia um padrão miopático. Nesse exame,
o achado de descargas miotônicas sem correspondên-
O acompanhamento clínico deve ser realizado com con-
cia clínica é muito sugestivo de glicogenose. A biópsia
sultas completas (médica e nutricional) a cada três meses.
muscular com estudo histoquímico revela a presença
Nos pacientes com menos de 2 anos de idade o acompa-
de miopatia vacuolar com acúmulo de glicogênio (PAS
nhamento mensal faz com que a adesão ao tratamento positivo). Nota-se ainda uma grande reatividade na rea-
e controle metabólico sejam melhores. A realização dos ção com a fosfatase ácida, que é indício de alteração da
exames subsidiários de controle deve seguir a freqüência: atividade lisossomal nas fibras musculares.
• A cada três meses: transaminases hepáticas, gama Nos pacientes com comprometimento cardíaco,
GT, gosfatase alcalina, glicemia, gasometria ve- na chamada forma clássica, observa-se cardiomega-
nosa, lactato, ácido úrico, colesterol, triglicérides, lia à radiografia de tórax. O eletrocardiograma mos-
microalbuminuria, uréia, creatinina, atividade de tra diminuição do intervalo PR e complexo QRS au-
protombina. mentado e alargado. O ecocardiograma revela espes-
75
samento da parede com obstrução do fluxo de saída A fraqueza muscular está relacionada ao compro-
de VE. metimento do tecido muscular esquelético, mas tam-
A confirmação do diagnóstico pode ser feita pelo bém pode ser decorrente do envolvimento das célu-
estudo da atividade da enzima alfa-glicosidase em fi- las do corno anterior da medula, simulando a forma
broblastos, leucócitos e, mais recentemente, em go- tipo I da amiotrofia espinhal progressiva (doença de
tas de sangue seco em papel-filtro. Werdnig-Hoffmann). A diferenciação dessas duas
A forma infantil clássica caracteriza-se pelo iní- condições pode ser feita de acordo com alguns acha-
cio precoce dos seguintes sintomas: cardiomegalia, dos do exame físico que estão resumidos na tabela 1.
hipotonia acentuada associada a fraqueza muscular
progressiva, macroglossia e hepatomegalia. Os pa- Tabela 1. Diagnóstico diferencial entre doença
de Pompe e AEP tipo I
cientes com essa forma apresentam-se como “bebês
AEP tipo I Doença de Pompe
hipotônicos”, podendo mostrar um período inicial de
Músculos da Musculatura Musculatura acessória
desenvolvimento normal ou sintomas desde o nas- respiração envolvidos acessória e diafragma
cimento. Apesar da acentuada hipotonia e fraqueza Tórax em sino Presente Ausente
76
formas de glicogenoses (tipos III, IV e V) também suplementação e de alimentos pelos pacientes e con-
devem ser consideradas no diagnóstico diferencial. seqüente, ganho de peso excessivo, levando à piora
O óbito ocorre por volta da terceira década de da função respiratória.
vida, geralmente devido à insuficiência respiratória. Recentemente, foi observada a diminuição do re-
A forma adulta da doença de Pompe caracteriza-se querimento energético em repouso e do catabolismo
por um quadro de fraqueza muscular apendicular pro- protéico com a suplementação de L-alanina durante
gressiva associada ou não à insuficiência respiratória. quatro semanas, quando comparados com os de um
O comprometimento da musculatura cardíaca não é grupo-controle.
descrito nessa forma. Os sintomas podem surgir entre a As controvérsias sobre os resultados no tratamen-
segunda e a sexta década de vida. Em um terço dos ca- to dietético da glicogenose II sugerem uma avaliação
sos predominam os sintomas associados ao comprome- cuidadosa e individualizada para definir o procedi-
timento da musculatura respiratória. O principal diag- mento adequado.
nóstico diferencial dessa forma é o com polimiosite.
77
78
79
boidratos de rápida absorção; durante o dia, evitan- DRIs - Institute of Medicine, Food and Nutrition Board. Di-
etary Reference Intakes for Energy, Carbohydrates, Fi-
do as alterações pós-prandiais, e amido cru à noite
bers, Fat, Fatty Avids Cholesterol, Protein, and Amino
prevenindo a hipoglicemia. Orientações nutricionais Acids (Macronutrients). Washington DC: National Acad-
semelhantes às da GSD IIIa (Chen, 2001). emy Press, 2002.
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Hout HMP, Hop W, Diggelens OP et al. The natural course of
Na realidade essa doença não é uma enfermidade de infatile Pompe’s disease: 20 original cases compared with
depósito de glicogênio por alteração de enzimas de seu 133 cases from the literature. Pediatrics 2003;112:32-340.
ciclo, e sim um defeito no transportador de dissacarí- Kiechl S et al. Different clinical aspects of debrancher deficien-
deos chamado GLUT 2, presente em fígado, pâncreas, cy myopathy. J Neurol Neurosurg Psychiatry 1999; 67:364-8.
intestino e rins. Apresenta hipoglicemia de jejum e hi- Latger-Carnar V et al. Neutrophil adherence receptor deficien-
cy regressing with granulocyte-colony stimulating factor
perglicemia pós-prandial, assim como tubulopatia com therapy in a case of glycogen storage disease type Ib. Eur
quadro de síndrome de Fanconi renal (Chen, 2001). J Pediatr 2002;161:87-93.
O tratamento dietético é semelhante ao da GSD Moses SW. Historical highlights and unsolved problems in gly-
I. Há necessidade de utilização de medicações, prin- cogen storage disease type 1. Eur J Pediatr 2002;161:S2-9.
cipalmente pela alteração renal e conseqüente ra- National Research Council. Dietary reference intakes for en-
ergy, carbohydrate, fiber, fat acids, cholesterol, protein,
quitismo. Indicam-se: reposição de água, eletrólitos, and amino acid (macronutrients). National Academy
vitamina D e cálcio (Santer et al.,1998). Press, 2002.
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80
Galactosemia
GALE
UDP-glicose UDP-galactose
GALK
Galactitol
+ +
+ ATP GALT
GALACTOSE Galactose-1-fosfato Glicose-1-fosfato
+P
Galactonato
UDP-galactose UDP-glicose
GALE
Glicoproteínas
Glicolipídeos
81
ções principais, esse sinal ocorre apenas em 10% dos Quando a atividade enzimática ocorre em níveis in-
pacientes nessa idade, e sua visualização só é possível termediários, o indivíduo é assintomático e não ne-
com o uso de lâmpada de fenda para detecção das cessita de restrição dietética.
alterações características, na forma de lesões punc- A deficiência acentuada de GALE caracteriza-se
tuadas no núcleo do cristalino. por atividade de menos de 10% em fibroblastos e ainda
Crianças que sobrevivem ao período neonatal e se menor em leucócitos e eritrócitos. Nesses casos, possui
mantêm em dieta inadequada desenvolvem retardo clínica idêntica à forma clássica da galactosemia, por
mental e alterações corticais e cerebelares. Mesmo isso deve ser considerada em pacientes com quadro clí-
quando a terapia é iniciada precoce e corretamente, nico de galactosemia clássica, nos quais a atividade da
o seguimento prospectivo dessas crianças tem mos- GALT esteja normal. O tratamento deve ser realizado
trado que elas podem apresentar catarata, apraxia nos mesmos moldes da galactosemia clássica.
verbal, déficit ponderoestatural, baixo rendimento
escolar e déficits neurológicos, predominantemente
Diagnóstico
alterações piramidais e ataxia, além de falência ova-
riana (Waggoner et al., 1990). Triagem neonatal
A triagem neonatal para a galactosemia não é ofe-
Deficiências parciais da GALT
recida na rede de saúde pública do Brasil. Alguns
Diminuição parcial da atividade da GALT (conheci- laboratórios privados oferecem a triagem ampliada
da como variante Duarte), entre 5% e 20%, está rela- para erros inatos do metabolismo, que pode abran-
cionada clinicamente a catarata precoce, retardamen- ger a galactosemia. O exame utiliza uma pequena
to mental leve com ataxia, retardo de crescimento e quantidade de sangue em papel de filtro e consiste
alterações de fala. Nas mulheres, pode ser observada na quantificação da galactose e galactose-1-fosfato
ainda amenorréia ou menopausa precoce. na mesma amostra.
82
83
distúrbios de coagulação. A coagulopatia pode estar mia, apesar de sua limitada eficácia na prevenção de
presente mesmo sem evidências de doença hepática, complicações a longo prazo. Apesar de a maioria dos
devendo ser solicitado coagulograma antes de pro- pacientes adultos não seguir corretamente as orien-
cedimentos invasivos. Hiperbilirrubinemia direta tações dietéticas, não se observaram evidências de
(não-conjugada) não costuma ser grave o suficiente doença hepática e/ou renal.
para indicar fototerapia e/ou exsangüinotransfusão, Nas gestantes de fetos sob risco de desenvolver
no entanto, crianças com galactosemia têm maior galactosemia não houve vantagens em relação a
risco de Kernicterus se os níveis de albumina esti- complicações precoces ou tardias quando as mães fo-
verem baixos em decorrência da doença hepática. ram tratadas com restrição de lactose ou galactose.
Além disso, para prevenir resultados falso-negativos
em análises enzimáticas, deve-se coletar sangue an-
tes de procedimentos hemoterápicos. Tratamento
A ocorrência de sepse por E. coli com curso fulmi-
Aspectos gerais
nante sugere que pacientes com galactosemia apre-
sentam uma inibição da atividade bactericida dos O tratamento de portadores de galactosemia deve
leucócitos (Holton et al., 2001). Assim, presume-se ser feito em centros especializados, preferencial-
que o paciente está em sepse por Gram-negativo e mente com equipe multidisciplinar constituída por
deve-se iniciar antibioticoterapia endovenosa. pediatra, hepatologista, endocrinologista, geneticis-
Se o estado da criança estiver comprometido a ta, nutricionista, fonoaudióloga, psicóloga e assis-
ponto de ela não tolerar alimentação enteral por tente social.
mais de um ou dois dias, deve ser considerada a nu- Quando houver suspeita clínica de galactosemia,
trição parenteral, que tem de ser prescrita com cau- ou em casos assintomáticos com triagem neonatal
tela se houver doença hepática e trombocitopenia. positiva, a lactose deve ser removida da dieta mesmo
Quando em condições clínicas de nutrição ente- antes da confirmação bioquímica do diagnóstico.
ral, se houver doença hepática significativa, devem Quando há atividade da GALT menor que 10%
ser usadas, até melhora do quadro, fórmulas com tri- do controle normal, está indicada intervenção die-
glicérides de cadeia média contendo hidrolisado de tética imediata. Como o leite humano contém 6%
proteína sem galactose. a 8% de lactose, o leite de vaca tem 3% a 4% e as
Após a estabilização do quadro clínico, especial- fórmulas lácteas convencionais apresentam 7%, eles
mente das alterações hepáticas, são recomendáveis devem ser substituídos por fórmula livre de lactose,
as fórmulas de soja com adição de cálcio, que são as como fórmula de soja com adição de cálcio.
mais apropriadas no manejo dietético. Cuidado especial deve ser tomado em relação ao
Após exclusão da galactose da dieta, a maioria uso de medicamentos com lactulose em sua formu-
das crianças apresenta melhora clínica global. He- lação (por conter lactose) no tratamento de hipera-
patomegalia, alteração da função hepática e doença monemia associada a doença hepática.
tubular renal resolvem-se usualmente em uma a duas Diversas outras medicações contêm lactose e isso
semanas. Algumas crianças que apresentam catara- deve ser considerado ao prescrevê-las aos pacientes
ta nessa fase podem demorar mais para apresentar com galactosemia. Entretanto, a quantidade pode
melhora do quadro, mas em sua maioria as seqüelas ser insignificante, principalmente se o medicamento
regridem completamente. for usado por tempo restrito.
A restrição dietética de galactose permanece As restrições dietéticas devem continuar por toda
como o único tratamento efetivo para galactose- a vida. Por esse motivo, deve ser prescrita suplemen-
84
tação com cálcio, na dose de 500 mg/dia no primeiro Nos primeiros anos, o seguimento deve ser a cada
ano de vida e 1.200 mg/dia após essa idade. quatro meses, passando a semestral. Deve ser monito-
Além dos cuidados nutricionais, alguns experi- rado o desenvolvimento físico e estatural, idade ós-
mentos apontam para a possibilidade de novas es- sea, e realizada a ecografia pélvica para acompanhar
tratégias terapêuticas, particularmente em pacientes as dimensões uterinas anualmente, além da medida
que têm atividade residual de GALT, como o uso de de pressão arterial a cada consulta. No caso de uso de
progesterona, pois trabalhos experimentais em ratos reposição hormonal, deve-se ter um cuidado especial
e humanos indicaram a possibilidade de aumento da com história familiar de trombose venosa, acidente
oxidação da galactose, em parte pelo aumento na vascular encefálico, sobrepeso e fumantes.
atividade da GALT, com o uso de progesterona, na
dose de 10 a 20 mg/dia. Além dela, o uso do ácido
fólico pode aumentar a atividade da GALT. Terapia nutricional
Embora a galactose seja necessária para a produção
Manejo da falência ovariana
de galactolipídeos e cerebrosídeos, estes podem ser
A maioria das pacientes com galactosemia desenvol- produzidos por uma via alternativa, mesmo que toda
ve falência ovariana precoce, podendo-se manifestar a galactose seja omitida dos alimentos ingeridos.
como amenorréia primária, amenorréia secundária, Como a lactose é precursora da galactose, o leite e
oligomenorréia e hipogonadismo hipergonadotrófico. seus derivados, incluindo o leite humano, bem como
O reconhecimento e o tratamento dessas com-
alimentos que contenham lactose, são estritamente
plicações devem ser incluídos no seguimento das
proibidos. Alguns estudos sugerem, inclusive, a res-
pacientes com galactosemia, com acompanhamen-
trição de frutas e vegetais que contêm quantidades
to endocrinológico a partir de 10 anos. FSH, LH e
significativas de galactose, como tâmaras, mamão
estradiol devem ser solicitados aos 6 meses, 10 e 12
papaia, caqui, tomate e melancia, que contém mais
anos de idade e, se necessário, anualmente.
de 10 mg de galactose por 100 g de produto fresco
De acordo com o recomendado pela British
(Gross e Acosta, 1991).
Society for Paediatric Endocrinology and Diabetes,
A efetiva restrição de galactose torna essencial
a terapia de reposição hormonal deve-se iniciar em
a cuidadosa leitura de rótulos de todos os alimentos
pacientes com gonadotrofinas basais elevadas e ní-
produzidos. Leite é adicionado a muitos produtos e
veis de estradiol baixos aos 12 ou 13 anos se a crian-
ça ainda não alcançou uma altura razoável. É sugeri- lactose aparece com freqüência, revestindo os table-
do o protocolo descrito na tabela 1. tes de medicamentos.
Quando os alimentos sólidos são introduzidos na
Tabela 1. Protocolo de tratamento de reposição dieta dos lactentes, deve-se tomar cuidado ao ler os
hormonal em mulheres com galactosemia
rótulos de produtos contendo lactose, como leite seco
Ano de
tratamento
Conduta sólido não-gorduroso, caseína, soro de leite ou soro de
Etinilestradiol 2 mg/dia (se o avanço puberal for leite sólido. Alimentos contendo lactato, ácido lácti-
1o
muito lento, passar para nova fase após 6 meses)
co e lactoalbumina são seguros para incluir na dieta.
2o Etinilestradiol 5 mg/dia
Etinilestradiol 10 mg/dia (nessa fase podem
3o ocorrer sangramentos vaginais, sendo Objetivos do suporte nutricional
indicado progestágeno no início do mês)
Anticoncepcional oral contendo aproximadamente Medidas gerais
20 mg de etinilestradiol e progestágeno, prescrito
4o em diante
usualmente (se houver sangramento no meio do 1) Prover suporte para crescimento e desenvolvi-
ciclo, considerar ACO com 30 mg de etinilestradiol)
mento normais em bebês e crianças e manter o
85
menor que 2 mg/dl, medida em eritrócitos, por Pão francês sem leite (um terço) unidade
Margarina sem leite 5g
duas a quatro horas no período pós-prandial. Pa-
Lanche I
cientes bem tratados com galactosemia mantêm
Fórmula de soja 150 ml
níveis menores que 3 g/dl (Pennington, 1989). Amido de milho 10 g
lactose. Sacarose 10 g
Cereal sem leite 50 g Bolacha sem leite
2) Proteína: a ingestão recomendada é a mesma para Jantar
bebês, crianças e adultos saudáveis (DRIS, 2002). Arroz 1 ½ colher (sopa) Macarrão sem leite
Carne de boi, peixe
3) Energia: a recomendação energética é a mesma para Carne bovina 5 colheres (sopa)
ou 2 ovos
bebês, crianças e adultos saudáveis. A ingestão deve Beterraba 50 g
86
87
de proteína em 5% a 10%, devendo-se reavaliar Gross KC, Acosta, PB. Fruits and vegetables are a search of
galactose: implications in planning the diets of patients
após um mês e repetir o aumento do aporte até a with galactosaemia. J Inher Metab Dis 1991;14:253-8.
normalização. Esse seguimento deve ser semestral Holton JB, Walter JH, Tyfield LA. Galactosemia. In: Scriver
até o primeiro ano de vida e depois anual. CR, Beaudet AR, Sly W, Valle D (eds.). The metabolic and
molecular bases of inherited disease. 8 ed. New York: McGraw-
4) Ferritina plasmática: se abaixo dos níveis normais, Hill, 2001.
deve-se aumentar o aporte de ferro com 2 mg/kg Jakobs C, Schweitzer S, Dorland B. Galactitol in galactose-
mia. Eur J Pediatr 1995;154(7Suppl 2):S50-2.
de sulfato ferroso até normalizar. Deve ser dosada
de rotina no 6o, no 9o e no 12o meses de vida e, a National Research Council. Dietary reference intakes for
energy, carbohydrate, fiber, fat acids, cholesterol, pro-
cada seis meses, após o segundo ano de idade. tein, and amino acid (macronutrients), National Acade-
my Press. 2002.
5) Como parte do monitoramento endocrinológico
Nelson D. Verbal dyspraxia in children with galactosemia. Eur
nas meninas, FSH, LH e estradiol devem ser soli- J Pediatr 1995:154(Suppl):56-7.
citados aos 6 meses de idade, aos 10 e 12 anos e, Pennington JAT. Food values of portions commonly used. 5
se necessário, anualmente. ed. New York: Harper and Row, 1989.
Schweiter S, Shin Y, Bodehl J. Long term outcome in 134 pa-
tients with galactosemia. Eur J Pediatr 1993;152:36-43.
Monitoração do crescimento Segal S. Disorders of galactose metabolism. In: Scriver CH
et al. The metabolic and molecular basis of inherited disease. 7 ed.
1) Verificar mensalmente o peso e o comprimento New York: McGraw-Hill, 1995.
até 1 ano de idade. Segal S. Galactosaemia today: the enigma and the challen-
ge. J Inher Metab Dis 1998;455-71.
2) Fazer essa verificação a cada três meses até 4 anos.
Waggoner DD, Buist NR, Donnell GN. Long-term prognosis
3) Continuar verificação de peso e comprimento a in galactosemia: results of a survey of 350 cases. J Inherit
Metab Dis 1990;13:802.
cada seis meses após 4 anos.
Wat R, Gibson JB. Update: newborn screening for galactose-
4) Colocar os dados na curva de normalidade (NCHS). mia. J Arkansas Med Scri 1996;92:539.
88
Frutosemia
89
trointestinal, tais como vômitos, diarréia, distensão tares considerados estranhos e não compreendidos
abdominal e flatulência. por outras pessoas. Além disso, é curioso notar que
Quanto à frutose efetivamente absorvida, o organis- muitos adultos com frutosemia são completamente
mo consegue utilizar apenas determinadas quantidades, livres de cáries e que o diagnóstico dessa condição é
pois o excesso pode ser tóxico mesmo em indivíduos freqüentemente suspeitado pelo dentista.
normais, causando hiperuricemia e acidose láctica. Em outros casos, indivíduos com intolerância à
Isso ocorre porque a frutose-1-fosfato não-clivada so- frutose recebem infusões intravenosas de frutose ou
fre acúmulo e inibe a frutoquinase, causando elevação sorbitol, por exemplo, durante procedimentos cirúr-
da frutose sangüínea, o que altera a razão celular da gicos, e podem falecer em decorrência da intoxicação
ATP/AMP com aceleração da produção de ácido úri- aguda. Por essa razão, pacientes com intolerância à
co. Além disso, a competição entre urato e lactato pela frutose ou seus responsáveis legais devem informar à
excreção pelos túbulos renais faz com que ocorram aci- equipe médica sobre sua condição para evitar o uso de
demia láctica e acidose tubular proximal, complicada soluções contendo frutose, sorbitol ou açúcar inverti-
por aminoacidúria, glicosúria e fosfatúria. A disfunção do. Tal medida pode diminuir o número de iatroge-
hepática, de outro lado, deve ser decorrente de toxici- nias, incluindo lesão hepática e até mesmo óbito.
dade celular e degeneração citoplasmática.
Diagnóstico
Quadro clínico
Triagem neonatal
Clinicamente, a deficiência da aldolase B causa sin-
tomas como hipoglicemia, choque e intoxicação he- A triagem neonatal para intolerância hereditária à
pática (com hepatomegalia, icterícia, ascite, melena frutose não é realizada na maioria dos países em razão
e hematêmese, além de tremores, edema e palidez) e da baixa prevalência desse distúrbio e ao fato de que
renal (com oligúria, anúria e raquitismo), bem como o quadro clínico, embora potencialmente grave, não
dificuldade em ganhar peso e baixa estatura. caracteriza urgência nos primeiros meses de vida.
A hipoglicemia não tende a ser tão exacerbada
Exames de triagem
nem duradoura, passando muitas vezes despercebida
por toda a infância. Na ausência da ingestão de fru- Além do quadro clínico, o diagnóstico de frutosemia
tose, esses indivíduos são assintomáticos e saudáveis. pode ser considerado quando exames de triagem mos-
Por essa razão, bebês alimentados com leite materno trarem a presença de substâncias redutoras na urina,
tendem a não apresentar sintomas até a introdução detectáveis por testes como Benedict ou Seliwanoff.
de papinhas de vegetais e frutas. De outro lado, os Tais exames, entretanto, não são específicos para a
recém-nascidos que recebem fórmulas lácteas que frutose e podem ser positivos para qualquer outro
contenham frutose podem desenvolver doença gra- açúcar, devendo ser feito diagnóstico diferencial,
ve com risco de morte. Quanto menor a idade do principalmente com diabetes, pela utilização conco-
indivíduo e quanto maior a quantidade de frutose, mitante de uma tira reagente para glicose (glicose
mais graves tendem a ser os sintomas. Os pacientes oxidase ou glicofita). A reação de Benedict pode ser
desenvolvem aversão a alimentos doces. positiva também com ácido homogentísico e com-
Muitas crianças e seus pais acabam descobrindo, postos fenólicos, assim como diversos medicamen-
por tentativa e erro, quais alimentos podem ser con- tos como PAS, isoniazida, estreptomicina (usados
sumidos e quais devem ser evitados. Por essa mesma no tratamento da tuberculose), salicilatos (como a
razão, muitas crianças desenvolvem hábitos alimen- aspirina comum) e ácido ascórbico (vitamina C),
90
além de vários antibióticos e quimioterápicos, como al., 2001), FRLP (Paolella et al., 1987) ou por PCR
cefalosporinas, penicilinas e ácido nalidíxico. A rea- (Kullberg-Lindh et al., 2002).
ção de Seliwanoff também pode ser falso-positiva em
amostras de urina com pH alcalino. Diagnóstico pré-natal
Em indivíduos que apresentam teste de Benedict po- O diagnóstico pré-natal só é disponível por estudo
sitivo com glicofita negativa, a investigação prossegue molecular porque a aldolase B começa a se expressar
com a distinção da frutose em relação aos demais açúca- nos primeiros meses de vida, não sendo possível fazer
res por técnicas de cromatografias em amostras de urina, ensaios enzimáticos em células fetais.
direcionando a investigação laboratorial a seguir.
É importante mencionar que a frutosúria depende Diagnósticos diferenciais
do tempo e da quantidade de frutose ingerida, sendo, Clinicamente, a frutosemia deve ser diferenciada de
portanto, um evento inconstante. Por essa razão, um re- outras causas de desconforto gastrointestinal, como tu-
sultado negativo em exames de triagem por testes para
mores intestinais, obstrução do intestino delgado, in-
substâncias redutoras ou cromatografias não deve ser
suficiência pancreática, síndromes mal absortivas e sín-
totalmente desconsiderado. Testes de sobrecarga de fru-
dromes dispépticas, bem como a intolerância à lactose
tose por via oral ou intravenosa apresentam risco de hi-
(Choi et al., 2003). No primeiro ano de vida é freqüen-
poglicemia grave e, se houver a opção por esse método,
te que os pacientes sejam encaminhados para investi-
devem ser feitos em ambiente hospitalar. Laboratorial-
gar vômitos de causa indeterminada, refluxo gastroe-
mente pode ocorrer diminuição da glicemia e da potas-
semia e elevação de magnésio, uréia, alanina, lactato e sofágico e intoxicação exógena. Em crianças maiores,
ácidos graxos não-esterificados, bem como proteinúria, é freqüente o encaminhamento por hepatomegalia ou
aminoacidúria, aumento das transaminases hepáticas e retardo de crescimento. Em muitos casos são conside-
de bilirrubinas, que podem perdurar por vários dias. rados os diagnósticos de hepatite, infecção congênita,
septicemia, tumor hepático, galactosemia, tirosinoses e
Diagnóstico enzimático doença de Wilson (Steinmann et al., 2001).
O diagnóstico bioquímico de confirmação é feito pela
dosagem da atividade enzimática em tecido hepáti-
Suporte na fase aguda
co, mostrando sua redução, variando de 0,13 a 0,82
UI/g (para valores normais de 2,07 a 3,79 UI/g). Do- Além de retirar as fontes de frutose e sacarose, as
sagem da atividade da aldolase B também pode ser medidas de suporte para os comprometimentos re-
feita em amostras de mucosa jejunal ou córtex renal nal e hepático devem ser instaladas rapidamente. A
(Steinmann et al., 2001). recuperação das funções hepáticas e renais pode le-
var alguns dias, especialmente nas crianças menores,
Diagnóstico molecular mas, uma vez restabelecidas, o indivíduo tem desen-
O gene da aldolase B está localizado no cromosso- volvimento intelectual e somático normal.
mo 9q22.3. Mais de 20 mutações diferentes foram
descritas, porém estudos moleculares demonstraram
Tratamento para deficiência
que três mutações (A149P, A174D e N334K) são
responsáveis pela maioria dos alelos anômalos. Desse
de aldolase B
modo, mais de 95% dos casos de intolerância heredi- Objetivos do suporte nutricional:
tária à frutose são passíveis de detecção rápida e se- 1. Prover suporte para crescimento e desenvolvi-
gura com o uso de um painel de ASO (Steinmann et mento em bebês e crianças.
91
2. Manter peso para estatura adequado nos adultos e mg/kg de peso/dia (Mock et al., 1983). A tolerân-
manter o estado nutricional normal. cia é individual e deve ser monitorada por ava-
3. Manter os índices laboratoriais normais de bicar- liação do crescimento, indicativos laboratoriais e
bonato, fatores de coagulação, lactato, glicose, função hepática e renal.
enzimas hepáticas, metionina, tirosina, fósforo, 2. Suplementação de vitaminas e minerais: a suple-
potássio, proteínas e uratos. mentação de vitamina C (ácido ascórbico) é ne-
4. Manter normais as funções hepática e renal. cessária em conseqüência da restrição dietética.
Outras suplementações devem levar em conta a
A terapia nutricional consiste na restrição de fru- dieta orientada, o consumo alimentar e a avalia-
tose e exclusão de sacarose e sorbitol da dieta. Quando ção nutricional (DRIS, 2002).
a dieta é estabelecida, usualmente ocorre uma dramá-
3. Energia: a ingestão calórica recomendada é a mes-
tica melhora dos sintomas. O pronto tratamento na
ma para bebês, crianças e adultos saudáveis. A in-
infância pode evitar agressões viscerais permanentes,
gestão deve ser suficiente para manter o ganho de
assim a dieta deve ser introduzida sempre que ocorre a
peso normal para bebês e crianças e manter o peso
suspeita diagnóstica (Steinmann et al., 2001).
para estatura adequado para adultos (DRIS, 2002).
• Para assegurar a restrição de frutose, é necessária
4. Líquidos: a quantidade a ser prescrita deve suprir
a eliminação de todas as frutas e da maioria dos
os requerimentos de água. Em situações anormais,
alimentos vegetais.
deve ser ofertado no mínimo 1,5 ml para neona-
• A dieta foge do padrão habitual de nutrição em
tos para cada kcal ingerida.
crianças, visto que os hábitos alimentares infantis e
a introdução de alimentos sólidos para os lactentes Exemplo de dietas
contêm elevadas quantidades de frutose e sacarose. 1. Criança do sexo feminino, com 1 mês de idade e
• A adesão à dieta depende basicamente da cons- peso de 3,5 kg: se utilizado aleitamento materno,
cientização dos pais e demais familiares para a real livre demanda até 6 meses de idade. Na impossi-
necessidade da restrição, bem como o conheci- bilidade de aleitamento materno, utilizar fórmula
mento sobre os alimentos que fornecem frutose. láctea para a idade, sem frutose e sacarose.
• O aleitamento materno é seguro e deve ser en- 2. Criança do sexo feminino, com 3 anos e 11 meses
corajado. Atenção especial na introdução de fór- de idade, 100 cm de estatura e peso de 15.100 g:
mulas infantis, pois muitas acrescentam frutose e ver cardápio a seguir.
sacarose como fonte de carboidratos.
Alimentos Quantidades Substituições
• A frutose pode entrar na dieta “escondida”, por me-
Café da manhã
dicamentos industrializados e remédios caseiros. O
Leite 150 ml Iogurte natural
sorbitol é freqüentemente encontrado na formula-
Dextrose 15 g
ção de produtos dietéticos e medicamentos. Pão francês 1/3 unidade
Queijo prato 10 g
Dieta Margarina a gosto
Lanche I
1. Frutose: os alimentos que representam fontes de
Leite 100 ml Iogurte natural
frutose devem ser excluídos em crianças com me- Amido de milho 20 g
nos de 3 anos. A partir dos 3 anos a quantidade Dextrose 20 g
de frutose tolerada pode ser em torno de 10 a 20 (cont.)
92
93
• A frutose pode entrar na dieta “escondida” por medica- livre demanda até 6 meses de idade. Na impossi-
mentos e remédios caseiros (Bell e Sherwood, 1987). bilidade do aleitamento materno, utilizar formu-
• O sorbitol é freqüentemente encontrado na for- lação láctea para a idade sem frutose ou sacarose.
mulação de produtos dietéticos e medicamentos. Utilizar amido cru entre as mamadas somente a
• Introduzir, se necessário, amido cru para o con- partir do 4º mês de idade se necessário.
trole da glicemia na dose de 1,75 a 2,5 g/kg de 2) Criança do sexo feminino, com 4 anos e 2 meses
peso na proporção de 1:2 partes de água à tempe- de idade, 100 cm de estatura e peso de 16.000 g:
ratura ambiente. ver cardápio a seguir.
de carboidratos na forma de polissacarídeos (ami- Óleo de milho 1 colher (chá) rasa Margarina
Escarola 1 pires raso cru Acelga ou espinafre
do), evitando e/ou excluindo fontes de mono e
Amido cru 30 g + água 60 ml por dose
dissacarídeos (sacarose, frutose e sorbitol).
7. Líquidos: a dieta deve proporcionar a quantidade Idade
Amido cru
Lipídeos Proteína
Energia*
(g/kg/dose) kcal/dia
de água recomendada para crianças e adultos sau-
20% a 25% 10% do
1,75
dáveis (DRIS, 2002). 3 a 8 anos
(6/6 horas)
do total de total de 1.400
calorias/dia calorias/dia
Fonte: Mock, 1983); *DRIS, 2002.
Exemplo de dietas
1) Criança do sexo feminino, com 1 mês de idade e Energia: 1.400 calorias/dia
peso de 3,5 kg: se utilizado aleitamento materno, Amido cru: 30 g/dose
94
95
Adrenoleucodistrofia
ligada ao X
97
Proteína transportadora
de VLCFA para o interior Diagnóstico
do peroxissoma
Deficiente na X-ALD
O diagnóstico é feito por meio de ensaios bioquí-
micos que demonstram níveis anormalmente eleva-
dos de VLCFA saturados em cultura de fibroblastos,
O2 NAD
2 5 leucócitos, hemácias, plasma, amniócitos e cultura
H2O2 NADH+H
de células musculares (conforme demonstrado na
O O tabela 1). Se os três índices dos níveis de VLCFA
R–C–CH2–C–SCoA R–C–CH2–C–SCoA
(C26:00; C26:00/C22:00 e C24:00/C22:00) apre-
H2O H2O sentam apenas um desvio-padrão do valor de con-
3 6
trole, está afastado o diagnóstico de X-ALD apenas
OH O OH O com base no ensaio enzimático plasmático. Se o in-
R–C–CH2–C–SCoA R–C–CH2–C–SCoA divíduo tem alto risco devido ao quadro ou histó-
ria familiar e apresenta VLCFA na faixa duvidosa,
NAD NAD
3 7 orienta-se estudo em cultura de fibroblastos.
NADH+H NADH+H
Tabela 1. Níveis séricos de VLCFA nos diferentes
O O O O fenótipos da X-ALD (média ± desvio-padrão)
R–C–CH2–C–SCoA R–C–CH2–C–SCoA
C26:00 C26:00/ C24:00/
u/ml C22:00 u/ml C22:00 u/ml
CoASH CoASH Infantil cerebral 1,36 ± 0,48 0,066 ± 0,025 1,57 ± 0,25
4 8
Adrenomielopatia 1,39 ± 0,59 0,061 ± 0,025 1,58 ± 0,23
O O O O Adolescente
1,19 ± 0,45 0,054 ± 0,016 1,51 ± 0,21
cerebral
R–C–SCoA+CH3–C–SCoA R–C–SCoA+CH3–C–SCoA
Adulto cerebral 1,36 ± 0,52 0,067 ± 0,033 1,57 ± 0,35
Insuficiência
1,18 ± 0,4 0,062 ± 0,023 1,52 ± 0,24
adrenal isolada
1.
1 Acil-CoA sintetase 5.
5 Fatty acil-CoA Pré-sintomático 1,41 ± 0,6 0,074 ± 0,033 1,58 ± 0,21
desidrogenase
2.
2 Acil-CoA oxidase Assintomático 1,23 ± 0,045 0,063 ± 0,024 1,53 ± 0,25
6.
6 Enoil-CoA hidratase Controle 0,24 ± 0,16 0,014 ± 0,0056 0,81 ± 0,09
3 Bifuncional enoil-CoA
3.
hidratase/3-hidroxiacil-CoA 7 3-hidroxiacil-CoA
7.
desidrogenase desidrogenase
Diagnóstico molecular
4 β-cetotiolase
4. 8 β-cetotiolase
8.
O gene ABCD1 (ou ALDP) está localizado no cromos-
Figura 1. β-oxidação nos peroxissomos e mitocôndria. somo Xq28 e codifica uma proteína transportadora, da
98
100
mesma categoria das proteínas transportadoras, como co bioquímico. Além dessa indicação, há ainda a situa-
CFTR e MDR, com 662 mutações descritas atualmente. ção do preparo dos casos de pré-transplante, os quais
também costumam receber o óleo de Lorenzo.
Diagnóstico diferencial O transplante de medula óssea está indicado em
Nos quadros de deterioração intelectual na infância pacientes pouco sintomáticos, no início da doença.
deve ser feito diagnóstico diferencial com outras en- O racional para esse tratamento reside no fato de que
cefalopatias involutivas, como mucopolissacaridose a medula óssea contém células precursoras da oligo-
tipo 3, doença de Niemann-Pick tipo C, doença de dendróglia, que migrariam ao SNC do afetado, onde
Wilson, panencefalite subaguda esclerosante, escle- seriam capazes de metabolizar os VLCFA acumula-
rose múltipla e neurolipofucsinose ceróide. dos. Esse procedimento somente é indicado em pa-
cientes que tenham: (a) alterações sutis no seu exa-
me neurológico; (b) QI de execução superior a 80 e,
Tratamento preferencialmente, superior a 90; e (c) evidências de
O tratamento da alteração da função supra-renal deve desmielinização na ressonância nuclear magnética ce-
ser considerado desde o início com a substituição de hor- rebral, desde que se tenha certeza de que o fenótipo
mônios esteróides. Foi demonstrada a possibilidade de em questão envolve o encéfalo. As lesões desmieli-
normalização dos níveis de VLCFA com o tratamento nizantes também não devem ser extensas, existindo
dietético, no qual se utiliza uma mistura de ácidos graxos uma forma de quantificá-las, pelo índice de Loes.
monoinsaturados (oléico e erúcico), pois estes competi- O uso de outras medicações já estudadas demonstrou:
riam com os precursores saturados, evitando o alonga- • lovastatina em início levou à diminuição dos ní-
mento das cadeias até os VLCFA (Colombo, 2003). veis de VLCFA, além da ação antiinflamatória,
A mistura dos dois ácidos graxos, oléico e erú- mas estudos mais recentes não comprovaram ne-
cico, na proporção de 4:1, respectivamente, é co- nhuma eficácia (Moser et al., 2004);
nhecida com o nome de óleo de Lorenzo e utilizada • butirato de arginina (endovenoso) reduz níveis
na quantidade de 1 a 2,5 mg /kg/dia do óleo oléico. de C26:00, mas nada altera no quadro clínico;
Cada 100 ml do óleo de Lorenzo contém 73,9 mg de • Estudos sobre terapêuticas continuam existindo,
oléico. Além disso, a dieta dever ser restrita, no má- mas requerem um melhor entendimento da pro-
ximo, em 10% a 20% de gordura do total de energia dução defeituosa do produto do gene e da pato-
e suplementada com ácidos graxos poliinsaturados gênese da diferença de velocidade de progressão
ômega 6 e 3 na razão 4:1 até 10:1. dos fenótipos (Moser et al., 2004).
Embora o uso do óleo de Lorenzo corrija as con-
centrações plasmáticas dos VLCFA, os estudos clí- Além disso, preconizam-se a investigação e o
nicos descritivos até agora realizados demonstraram aconselhamento genético para a família de todo e
que tal medida não foi eficiente para modificar o curso qualquer afetado detectado, pois somente essa inves-
clínico dos indivíduos clinicamente comprometidos. tigação será capaz de detectar os meninos em risco de
desenvolverem a grave forma cerebral em tempo.
Apenas nos meninos ainda assintomáticos, em geral
diagnosticados no curso da investigação de uma famí- Exemplo de dieta para
lia, o óleo de Lorenzo modificou efetivamente a ex- adrenoleucodistrofia ligada ao X
pectativa de início dos sintomas (Moser et al., 2004). Idade: 7 anos
Por isso, seu uso é preconizado para essa categoria de Peso: 24 kg
indivíduos: meninos assintomáticos e com diagnósti- Estattura:124cm
99
Defeito de oxidação
de ácidos graxos
3-OH-acil-CoA
bém produzirá ATP levando-o à cadeia respiratória, LCAD NAD
o que ocorrerá em todas as células. SCHAD NADH
101
102
103
104
Transaminase L-leucina
Ácido isovalérico
Ácido 2-Ceto-isocapróico Isovalerilglicina
Ácido 3-hidroxisovalérico
Ácido 4-hidroxisovalérico
Branched-chain Ácido mesacônico
α-cetoácido desidrogenase Metilsuccínico
Isovaleril-CoA
Isovalerilglucuronida
Ácido isovalerilglutâmico
Isovaleril-CoA desidrogenase Isovalerilalanina
Isovalerilsarcosina
Ácido 3-hidroxiso-hepatônico
Isovalerilcarnitina
Ácido 3-metilcrotônico
3-metilcrotonil-CoA 3-metilcrotonoglicina
Ácido 3-hidroxisovalérico
3-metilcrotonil-CoA carboxilase
Ácido 3-metilglutacônico
3-metilglutaconil-CoA Ácido 3-metilglutárico
3-metilglutarilcarnitine
3-metilglutaconil-CoA hidratase
Ácido mevalônico
(mevalonolactona)
Colesterol
105
106
107
Requerimentos de energia
Prescrição dietética
O fornecimento adequado de energia é de fundamental
importância para garantir a manutenção das funções A fim de manter uma adequada oferta de macro e mi-
básicas do organismo, favorecendo o perfeito cresci- cronutrientes e ao mesmo tempo limitar a ingestão de
mento e desenvolvimento infantil. Os requerimentos LEU dos pacientes, deve-se utilizar fórmula metabólica
energéticos variam amplamente e podem ser maiores específica para os distúrbios do metabolismo da leucina
que o normal quando a maior parte da proteína dieté- (isenta desse aminoácido), que irá garantir um adequa-
tica é fornecida sob a forma de L-aminoácidos. Uma do aporte protéico, facilitando a adequação da dieta em
vez estabelecida a dieta, deve-se garantir que as calorias relação à quantidade de leucina e proteína.
não-protéicas sejam fornecidas em quantidades sufi-
Tabela 2. Recomendação diária de nutrientes
cientes a fim de evitar que as proteínas sejam desviadas
Leucina Proteína Energia Líquidos
da sua função (crescimento e formação de tecidos) para Idade
(mg/kg) (g/kg) (kcal/kg) (ml/kg)
a produção de energia, por isso se recomenda realizar 0-3 meses 80-150 3,5-3 120 (145-95) 150-125
o cálculo da relação calorias/nitrogênio (kcal/N2) da 3-6 meses 70-140 3,5-3 115 (145-95) 160-130
dieta. Essa relação deve manter-se entre 200 e 300 kcal 6-9 meses 60-130 2,5-3 110 (135-80) 145-125
para cada grama de nitrogênio da dieta . 9-12 meses 50-120 2,5-3 105 (135-80) 135-120
(mg/dia) g/dia (kcal/dia) (ml/dia)
No diagnóstico e durante a acidose metabólica
1 < 4 anos 500-600 ≥ 30 1.300 (900-1.800) 900-1.800
precipitada por um quadro infeccioso ou trauma, as
4 < 7 anos 600-900 ≥ 35 1.700 (1.300-2.300) 1.300-2.300
necessidades energéticas dos pacientes podem estar 7 < 11 anos 700-900 ≥ 40 2.400 (1.650-3.300) 1.650-3.300
aumentadas em torno de 25% a 40% dos valores re- Fonte: Acosta PB e Yannicelli S, 2000.
108
109
de crescimento, hipoglicemia, hiperamonemia, A forma mais leve e/ou tardia pode ser de diagnósti-
quadros de encefalopatia (que pode ser progres- co muito mais difícil, pois em algumas fases da vida do
siva) e de miopatia proximal que pode iniciar na paciente, acidose metabólica, que é o achado básico que
infância ou adolescência (Frerman e Goodman, geralmente leva à pesquisa de ácidos orgânicos em urina,
2002). Há pelo menos um relato de manifestações pode não estar presente. Além disso, a acidúria orgânica
extrapiramidais nessa forma clínica (Loehr et al., é menos pronunciada, podendo ter padrão intermitente,
1990). Pancreatite aguda (Coskun et al., 1997) observável somente em períodos de acutização.
ou recorrente (Liang et al., 2004) pode ocorrer Embora de difícil obtenção e raramente realizados
nessa variante. Na forma leve os ácidos orgânicos (não disponíveis rotineiramente em nenhum cen-
urinários podem estar normais entre os episódios tro), estudos do metabolismo de compostos radioati-
de descompensação metabólica (Clarke, 2002). vos (oxidação de compostos marcados pelo carbono
14) em fibroblastos podem ter valor pelo menos para
programas de pesquisa.
Aspectos patológicos O diagnóstico específico, uma vez que há duas
causas para a doença, só pode ser estabelecido pela
A alteração patológica básica presente em todas as
demonstração da deficiência de ETF ou ETF-QO
variantes é a infiltração gordurosa, envolvendo co-
em fibroblastos ou outro tecido apropriado. Tais de-
ração, fígado e rins. Nos pacientes submetidos à au-
monstrações tampouco são realizadas na investiga-
tópsia, observaram-se, em todos os casos relatados,
ção rotineira. Várias mutações patogênicas em am-
alterações degenerativas gordurosas microvesicula-
bas as proteínas já são conhecidas.
res acometendo parênquima renal, túbulos renais
proximais e miocárdio. Alterações patológicas des- Diagnóstico pré-natal
critas em cérebros de afetados incluem displasias
O diagnóstico pré-natal é possível por meio da de-
focais do córtex cerebral; redução do número de gi- tecção de concentrações elevadas de ácido glutári-
ros em lobos frontais, temporais e parietais; além de co em líquido amniótico (Mitchell et al., 1983), na
evidências microscópicas de anomalias de migração urina materna ou pela oxidação deficiente do subs-
neuronal (Lyon et al., 1996). trato por amniócitos. A detecção de perfil anormal
das acil-carnitinas em líquido amniótico também
Diagnóstico foi proposto como método de diagnóstico pré-natal
(Shigematsu et al., 1996).
Como nas demais acidemias orgânicas, é o perfil ca-
racterístico de ácidos orgânicos na urina do paciente
que estabelece o diagnóstico de acidemia glutárica Tratamento
tipo 2. Em geral, a pesquisa é realizada em neonato Tratamento oral com riboflavina (100 a 300 mg/dia),
ou lactente com acidose metabólica e hipoglicemia. L-carnitina, glicina (100 a 150 mg/kg/dia) e dietas
São observados aumentos de ácidos glutárico e etil- hipoprotéicas e com restrição de lipídeos podem
malônico (mais característicos da doença), além de trazer importante benefício aos pacientes com va-
elevações na concentração urinária dos ácidos lác- riantes mais benignas. Essas medidas não mostraram
ticos, dicarboxílicos e outros ácidos orgânicos de efeito significativo nos casos mais graves de início
menor significado na doença. Secundariamente, há precoce (Lyon et al., 1996). O D-3-hidroxibutirato
deficiência de carnitina livre urinária e a excreção foi recentemente introduzido de forma experimental
de acil-carnitinas é normal ou aumentada. (Zschocke e Hoffmann, 2004).
110
• prover energia para ganho de peso e crescimento ade- Fórmula infantil 4 medidas
111
112
Deficiência do complexo
piruvato desidrogenase
113
114
como bossa frontal, ponte nasal alargada, narinas do lactato e piruvato no líquor (e se possível de áci-
antevertidas, filtro longo e apagado, lembrando sín- dos orgânicos), pois pode haver um desequilíbrio en-
drome fetal-alcoólica. tre metabólitos séricos e no líquor em pacientes com
Casos com fenótipo mais grave podem ocorrer em doença primária de SNC.
pacientes com deficiência de PDH associada a defeitos O padrão-ouro para o diagnóstico definitivo é a
de cadeia respiratória. Entretanto, esse achado é raro. determinação da atividade enzimática da PDH por
Os pacientes com deficiência de PDH podem meio da cultura de fibroblastos (Robisson, 2001). Essa
apresentar malformações do SNC, sendo a princi- metodologia não é simples e até o momento está dis-
pal delas agenesia parcial ou total do corpo caloso. ponível apenas no exterior. Portanto, apesar de ser
Há relatos de polimicrogiria cortical difusa. Outras necessária a confirmação do diagnóstico pela dosagem
alterações encontradas à ressonância magnética de enzimática, o tratamento pode ser iniciado baseando-
crânio (RM) são cistos hemisféricos, atrofia cortical, se nos exames laboratoriais de triagem descritos ante-
anormalidades simétricas em gânglios da base e tron-
riormente (Clarke, 2002; Kerr et al., 2000).
co cerebral, além do envolvimento difuso e simétri-
co da substância branca. À espectroscopia por RM, Tabela 1. Alterações laboratoriais na deficiência da PDHC
é possível encontrar o pico de lactato e há relato da
Exame laboratorial
Freqüência (% dos casos)
presença de pico de piruvato associado. alterado (aumentado)
Lactato sérico > 75%
Relação L/P < 25%
Diagnóstico Alanina plasmática 25%-75%
Amônia plasmática normal
O exame laboratorial mais importante para a iden-
Ácido lático na urina 25%-75%
tificação de possíveis portadores de deficiência da Ácido 2-cetoglutárico na urina < 25%
PDH é a dosagem de lactato e piruvato no plasma. Outros ácidos tricarboxílicos na urina < 25%
A dosagem de lactato e piruvato no líquor e a análi- Hipoglicemia ausente
115
Até o momento foram descritas cerca de 78 mutações mente existem 12 proteínas Glut responsáveis pelo
que incluem deleções, inserções e mutações de ponto. transporte de monossacarídeos em diversos tecidos.
A maioria ocorre nos éxons 10 e 11. O quadro clínico dessa síndrome é secundário à
baixa quantidade de glicose no líquido cefalorraqui-
Diagnóstico pré-natal diano e, portanto, no cérebro. Consiste em encefa-
Não há muito sucesso na tentativa de diagnóstico pré-na- lopatia epiléptica de início na infância associada a
tal das deficiências do complexo PDH. Alguns trabalhos atraso no desenvolvimento neuropsicomotor, desace-
relatam medidas da atividade enzimática em vilo coriô- leração do crescimento do perímetro cefálico, levan-
nico e/ou cultura de aminiócitos (Kerr et al., 2000). do à microcefalia, incoordenação e espasticidade.
Os primeiros pacientes foram descritos por De
Vivo et al., em 1991; por esse motivo, a enfermidade
Tratamento e prognóstico era chamada de doença de De Vivo. Como, além
Apesar de o prognóstico para pacientes com deficiên- dos sintomas descritos, os pacientes apresentavam
cia de PDH ser limitado e o tratamento pouco eficaz, níveis de glicose e lactato baixos no líquor com gli-
este deve ser empregado na tentativa temporária de cemia normal, os autores sugeriram a existência da
melhora dos sintomas. Contudo, não há nenhum es- deficiência de transporte que apenas foi comprovada
tudo prospectivo que demonstre que a dietoterapia por Wang et al., em 2005.
altere o dano cerebral progressivo. O gene consiste em 10 éxons e 9 íntrons locali-
A tiamina deve ser administrada em altas doses zados no cromossomo 1p34.2, pertencendo à família
(500 a 2.000 mg/dia), pois alguns pacientes apresen- dos 12 genes SCL2A, designada assim pelo HUGO
tam aparente melhora clínica e diminuição de lacta- Gene Nomenclature Committe.
to sérico. O uso de tiamina não é eficaz nos casos de Wang et al., em 2005, descreveram 16 pacientes
deficiência do componente E1. e propuseram a classificação em cinco fenótipos di-
A principal estratégia para tratar deficiência de ferentes, conforme uma hipotética função residual
PDH é a dieta cetogênica. A oxidação dos ácidos do Glut-1, sendo:
graxos, 3-hidroxibutirato e acetoacetato é uma al- 1. fenótipo mínimo (75% a 100% de função resi-
ternativa para formar acetil-CoA não-derivada da dual): associado com uma mutação missense, so-
rota do piruvato. Alguns estudos mostram melhora mente tendo sintomas com estresses, como febre
dos sintomas, contudo, a longo prazo, não é susten- e outros fatores (algumas medicações, como eta-
tável para o organismo. O principal objetivo do tra- nol e cafeína, entre outras, poderiam diminuir a
tamento é a manutenção de uma cetose significativa atividade do Glut-1);
(4 a 6 mM), porque os ácidos graxos não cruzam a 2. fenótipo leve (50% a 75% de atividade residual):
barreira hematoencefálica. mutação missense;
116
• Assegurar corpos cetônicos na urina em níveis 1. Total de calorias – Determinar o total de calorias
desejados (pelo menos ++ ou 4 a 6 µM). multiplicando o peso da criança pelas calorias re-
comendadas para a idade.
• Garantir concentrações normais de lactato, ala-
nina e piruvato. 68 x 15 = 1.020 calorias por dia
117
2. Unidade dietética – Dividir o número de calorias 8. Fracionamento das refeições – Dividir a quanti-
de cada unidade dietética para determinar o nú- dade de gordura, proteína e carboidratos do dia
mero de unidades dietéticas permitidas no dia. em três ou quatro refeições. É essencial que a ra-
Razão 4:1 = 40 calorias zão exata de gordura para proteina + carboidrato
seja mantida para cada refeição.
1.020 calorias dia ÷ 40 =
9. Recomendação dietética do dia e por refeições
25,5 unidades dietéticas por dia
Diária Por refeição (4 refeições)
Proteína 15 g 3,75 g
3. Gordura – Multiplicar o número de unidades die- Gordura 102 g 25,5 g
téticas do dia pela unidade de gordura prescrita Carboidrato 10,5 g 2,62 g
na razão cetogênica para determinar as gramas de Calorias 1.020 calorias 255 calorias
118
Refeição para desjejum e lanche (7h e 17h) Canafoglia L et al. Epileptic phenotypes associated with mito-
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Mamão 15 g 25 g melancia
20 g melão Colombo M, Cornejo V, Raimann EE. Deficit del complejo pi-
Gema 10 g 10 g maçã ruvato desidrogenase (PDH). In: Campbell MC, Espinoza
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