Evangélico - Stanley M Horton - o Que A Bíblia Diz Sobre o Espírito Santo
Evangélico - Stanley M Horton - o Que A Bíblia Diz Sobre o Espírito Santo
Evangélico - Stanley M Horton - o Que A Bíblia Diz Sobre o Espírito Santo
http://ebooksgospel.blogspot.com
http://www.ebooksgospel.com.br
Stanley M. Horton
ESPÍRITO
SANTO
Todos os Direitos Reservados. Copyright © 1993 para a língua portuguesa da Casa
Publicadora das Assembléias de Deus.
231.3
HORo Horton, Stanley M.
O que a Bíblia Diz sobre o Espírito Santo /Stanley M. Horton - Rio de Janeiro: Casa
Publicadora das Assembléias de Deus, 1993. p. 320; cm. 14x21; v.l 1. Deus, o
Espírito Santo. I. Título
CDD 231.3
1993/1ª Edição
2ª Edição/1993
3ª Edição/1994
4ª Edição/1995
ÍNDICE
Prefácio
Introdução
1. O Espírito no Pentateuco
7. O Espírito no Dia-a-dia
Notas Bibliográficas
PREFÁCIO
No dia de Pentecoste, o apóstolo Pedro referiu-se aos fenômenos observados pelo
povo. Disse: "E nos últimos dias, acontecerá, diz Deus, que do meu Espírito derramarei
sobre toda a carne" (Atos 2.17).
Qual estudioso da Bíblia poderá duvidar que estamos vivendo os últimos dias? Os
indicadores bíblicos dos tempos do fim estão ao nosso redor. Para aqueles que não
compreendem o plano profético de Deus, esses dias são de angústia. Para os filhos de
Deus, no entanto, esses são dias de encorajamento e de esperança. A Bíblia nos dá a
certeza de que poderemos esperar um grande derramamento do Espírito antes da volta de
nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo.
É compreensível que Satanás fará o possível para impedir a obra de Deus. Se não
conseguir levar as pessoas a rejeitar o ensino das Escrituras, ele as incitará a ir além desse
ensino. Dessa maneira, por meio do encorajamento à negligência ou ao fanatismo, ele
espera impedir o plano de Deus.
Parte da resposta de Deus aos esforços de Satanás é a ênfase atualmente dada ao
Espírito Santo por muitos autores. Sem desvalorizarmos os escritos que os estudiosos
dedicados da Palavra têm fornecido, estamos especialmente gratos ao Dr. Stanley M.
Horton por essa obra monumental. Ela preencherá admiravelmente uma grande lacuna
existente na literatura pentecostal.
Santo. Conforme diz o autor: "O propósito desse livro é simplesmente passear pela
Bíblia, livro por livro, e dar uma nova olhada naquilo que ela ensina sobre o Espírito Santo
e a sua obra."
Nesta obra, você achará excelência exegética, firmeza doutrinária, e aplicação
prática. Mais do que isso, porém, você achará o toque inspiracional que tornará muito
deleitoso consultar esse livro, quer nas pesquisas, quer na leitura devocional.
Aqueles que conhecem o autor reconhecem que ele é um servo humilde e dedicado
ao Senhor, que aprecia a Pessoa e a obra do Espírito Santo. Sua vida é uma manifestação
do fruto do Espírito; seu ministério, uma manifestação do revestimento do Espírito.
Embora esse livro tenha sido escrito por um dos grandes estudiosos pentecostais dos
nossos dias, as verdades grandiosas são tratadas de tal maneira que todos podem entender
e tirar proveito da instrução contida nele. E depois de lê-lo, você terá a mesma impressão
que tenho: a de que, na providência de Deus, esse livro veio à Igreja para um tempo como
este.
Thos. F. Zimmerman
Superintendente Geral das Assembléias de Deus dos EUA
INTRODUÇÃO
"Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós" (At 15.28). Quão claramente isso indica a
realidade do Espírito Santo e o relacionamento pessoal que com Ele desfrutavam os crentes
do primeiro século!
O cenário foi o Concilio de Jerusalém, o primeiro da Igreja Primitiva. Então, surge a
pergunta: Corno os judeus cristãos mantiveram comunhão com os que não eram
circuncidados, que comiam alimentos impuros, e cuja origem era a cultura grega, altamente
imoral naqueles dias? Apóstolos, presbíteros e os demais crentes reuniram-se para resolver a
questão. Alguns judeus cristãos insistiam que os gentios convertidos deviam circuncidar-se
e guardar a Lei de Moisés. Pedro lhes fez lembrar como Deus dera o Espírito Santo aos
gentios na casa de Cornélio antes de terem a mínima oportunidade de realizar boas obras, e
muito menos de cumprir a Lei! Paulo e Barnabé contaram a respeito dos milagres que Deus
realizara através deles entre os gentios.
Tiago, irmão de Jesus, finalmente deu uma sábia palavra que agradou a toda igreja.
Passaram, então, a escrever cartas sobre o que decidiram. Não disseram, no entanto:
"Pareceu bem a Tiago, presbítero principal da igreja em Jerusalém"; nem disseram:
"Pareceu bem a Pedro e aos apóstolos"; nem sequer: "Num consenso dos irmãos, indicado
por um voto majoritário". Em toda a sua discussão (investigação, consideração, debate -
Atos 15.7), estavam conscientes da presença de uma Pessoa divina entre eles, orientando-os,
guiando-os para a verdade. Não se tratava, pois, de uma mera linguagem, quando disseram:
"Pareceu bem ao Espírito Santo e a nós".
Essa consciência da realidade do Espírito Santo permeia a Bíblia inteira desde
Gênesis a Apocalipse. Muitos escritores do Antigo Testamento se referem ao Espírito, e
somente três dos livros do Novo Testamento não se referem a Ele (e esses são todos muito
breves - Filemon, 2a e 3ª João).
É verdade que Jesus Cristo é a personagem-chave em todo o plano de Deus. O
próprio Espírito Santo focaliza a atenção em Cristo e procura glorificá-lo (Jo 15.26; 16.14).
Isso não significa, porém, que o Espírito Santo seja desconsiderado nalguma parte da Bíblia,
nem que seja tratado como uma influência vaga ou uma energia imperceptível. Ele é
reconhecido como uma pessoa real, com inteligência, sentimento e vontade.
Tanto explícita como implicitamente, a Bíblia trata o Espírito Santo como uma
Pessoa distinta. "E aquele que examina os corações sabe qual é a intenção do Espírito; e é
ele que segundo Deus intercede pelos santos" (Rm 8.27). "O Espírito penetra todas as
coisas" (1 Co 2.10). Desse modo, Ele age com inteligência e sabedoria. (Ver Efésios 1.17;
Isaías 11.2). Ele tem emoções e pode ser entristecido ou ofendido (magoado, desgostado:
Efésios 4.30; Isaías 63.10). Ele reparte dons "a cada um como quer" (1 Co 12.11). Ele guiou
a Igreja Primitiva e dirigiu os principais movimentos missionários de forma nítida,
específica e pessoal. (Ver Atos 13.2; 16.6). O apóstolo João até usa pronomes pessoais
masculinos para indicar a pessoa do Espírito. (A palavra espírito em grego é sempre neutra,
e exige, gramaticalmente, pronomes neutros).
Mais importante do que isso, a Bíblia deixa claro que homens e mulheres, os quais
foram movidos pelo Espírito, conheciam-no de modo específico e pessoal. Se
perguntássemos aos Juízes ou aos profetas do Antigo Testamento se o Espírito Santo veio
sobre eles, nunca diriam: "Acho que sim", ou "Espero que sim". Lemos que "o Espírito do
Senhor revestiu a Gideão, o qual tocou a buzina" (Jz 6.34). Esse não foi nenhum toque
suave e secreto. Quando um leão jovem rugiu contra Sansão, "o Espírito do Senhor se
apossou dele tão possantemente que o fendeu de alto a baixo, como quem fende um cabrito"
(Jz 14.6).
Quando o Espírito do Senhor veio sobre Saul, este profetizou e foi mudado em outro
homem (1 Samuel 10.6,10). Amos, depois de dar uma série de ilustrações do tipo "causa e
efeito", diz: "Bramiu o leão, quem não temerá? Falou o Senhor JEOVÁ, quem não
profetizará?" (Am 3.8). O profeta era movido por uma compulsão interior tão forte quanto o
medo que o leão põe no homem quando corre atrás dele. Miquéias sabia que era "cheio da
força do Espírito do Senhor" (Mq 3.8), para lidar com os pecados de Israel.
No Novo Testamento, também, a realidade específica da atuação do Espírito Santo
não é questão de meras suposições. Para a compreensão de João Batista, o Espírito veio
sobre Jesus em forma visível, como de uma pomba. O som do vento e as línguas de fogo
anunciaram a sua presença no dia de Pentecoste.
Embora suas outras manifestações à Igreja fossem invisíveis, não eram menos
específicas. Em três ocasiões, está registrado claramente que os crentes falaram noutras
línguas (Atos 2.4; 10.46; 19.6). Em outra oportunidade, o local onde estavam reunidos foi
sacudido (Atos 4.31), e todos saíram dali para anunciar com ousadia a Palavra de Deus. O
conforto (consolação) do Espírito Santo era um fator muito importante no crescimento da
Igreja Primitiva (Atos 9.31). Não precisavam adivinhar se Ele estava presente ou não. Eles
sabiam.
O Espírito Santo fornecia o calor, a dinâmica, e a alegria que caracterizavam todo o
movimento do Evangelho no primeiro século. Cada parte da vida diária dos crentes,
inclusive seu trabalho e sua adoração, era dedicada a Cristo Jesus como Senhor e estava sob
a orientação do Espírito Santo. Isso não significa, é claro, que a própria mente ou
inteligência deles não desempenhava algum papel, pois não eram movidos exclusivamente
pela emoção. A emoção realmente tinha "um lugar vital, que a ênfase exagerada de muitos
protestantes dos nossos dias não aprecia adequadamente".(1) Esperava-se deles, no entanto,
que perscrutassem as Escrituras; aceitassem provas razoáveis, e que fossem homens
maduros no entendimento (pensamento). (Ver 1 Coríntios 14.20; Atos 17.11; 28.23.)
Mesmo assim, a totalidade da sua vida e adoração cristãs transcendia a dimensão
meramente natural e humana. A dimensão sobrenatural fazia parte da totalidade da
experiência. Na sua vida diária, não procuravam realizar algumas coisas no nível humano e
outras no nível espiritual. As qualidades que precisavam, a fim de trabalhar juntos e
testemunhar mediante suas próprias vidas, não eram dádivas comuns, mas o fruto do
Espírito (Gálatas 5.22,23). Nunca supunham que se uma pessoa se esforçasse suficiente-
mente, poderia viver uma vida virtuosa e agradar a Deus. Sabiam que precisavam da
constante ajuda do Espírito. Na sua adoração, sabiam que eram totalmente insuficientes em
si mesmos para louvar e glorificar o Senhor. Esperavam que houvesse cânticos e orações no
Espírito, dons e ministérios do Espírito (1 Coríntios 14.15,26). Não reivindicavam bênçãos
externas diariamente, mas cada dia era uma satisfação viverem e andarem no Espírito.
Essa experiência pessoal no Espírito Santo continua sendo uma das marcas
registradas do Cristianismo. Num curso introdutório ao estudo das religiões comparadas,
meu professor informou que há ramificações cristãs que dizem coisas boas. Algumas têm
padrões morais elevados. Umas poucas enfatizam um único Deus verdadeiro. Outras até
mesmo têm algum tipo de trindade (realmente uma tríade). Muitas apresentam algum tipo
de salvação. Algumas até mesmo falam de uma ressurreição. Mas nenhuma delas oferece
nada semelhante ao Espírito Santo. Todas elas deixam as pessoas fazer, com seus próprios
esforços, as coisas boas que as religiões exigem. Seria a mesma coisa que pedir às pessoas
que se levantassem do fundo do poço, puxando os cadarços dos seus próprios sapatos.
Jesus disse: "Não vos deixarei órfãos" (Jo 14.18). Passou a prometer um Consolador,
Ajudador, Advogado, Mestre e Guia. O Espírito Santo é todas essas coisas. Ele é um Amigo
pessoal que é adequado para todas as nossas necessidades.
Um número cada vez maior de escritores e estudiosos reconhece esse fato. John V.
Taylor, num livro recente, chama a atenção ao argumento de Trevor Ling que diferencia a
religião do Antigo e do Novo Testamento das grandes religiões da Ásia, ao afirmar que "a
natureza da experiência profética... o profeta, na experiência da revelação, é mantida
consciente da natureza pessoal da realidade transcendente que dele se apoderou".(2)
A dependência do Espírito Santo e da sabedoria do alto talvez não tenha gozado de
muita popularidade entre os ensinadores e filósofos dos tempos do Novo Testamento.
Porém, Paulo advertiu Timóteo contra as oposições (objeções, contradições, antíteses) da
falsamente chamada ciência (conhecimento) (1 Timóteo 6.20). Algumas das objeções talvez
tenham sido dentro desse mesmo assunto: o de rejeitar a Pessoa do Espírito Santo e os
relacionamentos pessoais com Ele. Não demorou, pelo menos até uns falsos mestres
alegarem que o Espírito era apenas "a energia enxertada de Deus".(3) Mas todas as objeções
e antíteses desses mestres somente levam à confusão. A dependência de Cristo e do Espírito
Santo é o único caminho para a paz.
Cada vez mais, o mundo tem tirado Deus do trono e colocado o próprio eu e a razão
humana em seu lugar. A tendência é exaltar o ego com sucesso, dinheiro, posição social e
fama. Até mesmo empreendimentos, para ajudar o próximo a aliviar os sofrimentos do
mundo, são freqüentemente motivados pelo desejo da auto-satisfação por aquilo que temos
realizado. Assim como Faraó nos tempos antigos, o mundo diz: "Quem é o Senhor, para que
eu lhe obedeça?" (Ex 5.2). Para o homem secular dos nossos dias, é terrivelmente
humilhante curvar-se diante de Cristo e aceitar que é um pecador e que nada pode fazer para
salvar-se a si mesmo. Mas o fato permanece que "o alto e o sublime, que habita na
eternidade, e cujo nome é santo, e que habita no alto e santo lugar (o Céu), ainda se deleita
em vir habitar com o contrito e abatido de espírito" (Is 57.15).
O reconhecimento de que não somos auto-suficientes, mas totalmente dependentes de
Cristo e do Espírito Santo, para fazer aquilo que agrada a Deus, e a disposição de dar a Ele
todo o louvor, é o segredo do sucesso do Movimento Pentecostal hoje. Mais do que isso, os
pentecostais se mantêm firmes numa questão que demarca os crentes bíblicos dos chamados
liberais. A linha divisória não é simplesmente a aceitação do nascimento virginal, da Cruz,
ou da Ressurreição. Trata-se, sim, de todos os aspectos sobrenaturais. Aqueles que se opõem
ao Evangelho singelo de Cristo, os que procuram despir a Bíblia dos seus milagres, os que
retalham o Novo Testamento e fazem de Jesus uma figura vazia - um ensinador pálido e
enganado -, todos edificam suas teorias num preconceito anti-sobrenaturalista.
Esses anti-sobrenaturalistas argumentam que precisam remover da Bíblia o aspecto
sobrenatural, a fim de tornar o Evangelho aceitável e aplicável ao homem moderno. Na
realidade, a situação é inversa. Constantemente, conheço pessoas cujas vidas foram
transformadas e revitalizadas pelo Espírito Santo. Um exemplo recente foi um sacerdote
episcopal no Estado da Flórida. Quando lhe cabia, por dever, celebrar o rito fúnebre, falava
rapidamente em voz baixa os trechos bíblicos tais como "os mortos em Cristo ressuscitarão
primeiro. Depois nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados juntamente com eles nas
nuvens, a encontrar o Senhor nos ares" (1 Ts 4.16,17). Esperava que ninguém entendesse o
que dizia, porque ele não cria, e não acreditava que alguém pudesse crer nisso, tampouco.
Ele lia o livro do bispo Robinson, Um Deus Diferente, com outras obras dos teólogos
e filósofos existencialistas da linha "Deus morreu", procurando, conforme ele dizia: "achar
alguma desculpa para um intelectual como eu permanecer no ministério".
Certo dia, finalmente, concluiu que já dirigira seu último culto na igreja. Não queria
mais saber do ministério. Naquela noite, foi convidado para visitar um lar onde encontrou
um grupo de cristãos cheios do Espírito. Na presença genuína do Espírito Santo, todos os
seus argumentos e pressuposições se desfizeram. Ele aceitou a Cristo, recebeu o batismo no
Espírito Santo, e ingressou num ministério pentecostal. Agora, ele ama a Bíblia e aguarda
com alegria a vinda de Jesus. Poderiam ser contados centenas de incidentes assim.
Vale a pena notar, também, que todas as principais denominações nos Estados
Unidos discordaram, no seu princípio, dos credos a favor do liberalismo e da crítica
destrutiva à Bíblia. No entanto, poucas delas conseguiram manter excluído esse tipo de
incredulidade. Hoje, os pentecostais estão na linha de frente, na batalha contra o adversário
da verdade que também é o inimigo das nossas almas. O homem moderno precisa da plena
iluminação que provém da Pessoa do Espírito, quando Ele habita em nós com poder.
Graças a Deus, porque hoje há um interesse cada vez maior pelo Evangelho de nosso
Senhor Jesus Cristo e pela Pessoa e obra do Espírito Santo. Há vários anos, quando eu
estava no seminário, um dos meus professores perguntou a uma classe que estudava o Novo
Testamento, com 100 alunos de cerca de 25 denominações diferentes: "Quantos de vocês
ouviram um sermão sobre o Espírito Santo nesses últimos cinco anos?" Somente três ou
quatro entre nós levantamos a mão. O professor acrescentou: "Nos últimos dez anos?" Mais
dois ou três levantaram as mãos. Naquela época, havia poucos livros sobre o Espírito Santo.
Atualmente, devido ao testemunho fiel dos pentecostais, a situação já não é assim. Prolifera-
se a literatura sobre o Espírito Santo cada vez mais na Igreja.
O propósito desse livro é simplesmente passear pela Bíblia, livro por livro, e dar uma
nova olhada naquilo que ela ensina a respeito do Espírito Santo e de sua obra. Depois, um
capítulo final resumirá e aplicará aquilo que descobrirmos.
No Antigo Testamento, a principal ênfase recaía sobre o único Deus verdadeiro.
Israel vivia no meio de povos politeístas. Era necessário prevenir-se contra o paganismo.
Enquanto ídolos eram adorados "debaixo de cada árvore frondosa", conforme acontecia nos
dias de Jeremias e de Ezequiel, Israel não estava pronto para a plena revelação da divindade
do Messias e da pessoa do Espírito Santo. Esses assuntos, portanto, recebem mera alusão no
Antigo Testamento.
Já nos tempos do Novo Testamento, os judeus tinham aprendido a lição. Eram
conhecidos mundialmente como adoradores de Deus. Viera o tempo certo para o passo
seguinte ser dado na revelação e no plano de Deus.
1
O ESPÍRITO NO PENTATEUCO
A Bíblia nos apresenta, quase imediatamente, o Espírito de Deus. "No princípio criou
Deus os céus e a terra. E a terra era sem forma e vazia [desabitada]; e havia trevas sobre a
face do abismo [o oceano primitivo]; e o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas"
(Gn 1.1,2). Assim, o Espírito de Deus está associado à atividade criadora de Deus.
Na realidade, a Bíblia atribui todas as obras de Deus, num sentido absoluto, a cada
membro da Trindade, tanto individual como coletivamente. Cada uma das Pessoas Divinas
tem sua função específica. Todas elas, no entanto, operam em perfeita harmonia e
cooperação em todo tempo.
A criação é um exemplo perfeito. A Bíblia fala em Deus Pai como Criador do Céu,
da Terra, do Mar, e de tudo quanto neles há (Atos 4.24). Também fala do Filho (o mesmo
Verbo vivificante que se tornou carne e habitou entre nós) como o Agente secundário na
criação. "Todas as coisas foram feitas por [através de] ele, e sem [à parte de] ele nada do
que foi feito se fez" (Jo 1.3). Aqui, a fraseologia é de Deus, falando através do Filho, assim
como Ele expôs através dos profetas. Ele era o Verbo vivo através de quem Deus falou para
levar os mundos a existir. Desde o princípio, Ele era o Mediador entre Deus e o homem (1
Timóteo 2.5).
O Espírito também é reconhecido noutras passagens. O Salmista diz: "Envias o teu
Espírito, e são criados, e assim renovas a face da terra" (SI 104.30). O Espírito, portanto,
está ligado tanto com a criação como com a providência contínua de Deus. (Ver também
Isaías 40.12,13). Outros trechos que se referem ao Espírito também empregam terminologia
que indica o fôlego de Deus (Jó 26.13; 33.4; Salmo 33.6).
A Bíblia também enfatiza que o Céu e a Terra foram criados por (seu poder e
sabedoria (Salmo 136.5; Provérbios 3.19; 8.23-30; Jeremias 10.12; 51.15). Seu poder é
retratado, ao mencionar, de um modo concreto, suas mãos e seus dedos (Salmos 8.3; 95.5;
102.25; Isaías 45.12; 48.13). Essas expressões são contrabalançadas pela ênfase de que
todas essas coisas foram criadas pela sua Palavra (Salmos 33.6,9; 148.5).
A Criação do Homem
O clímax vem, quando Deus diz: "Façamos o homem à nossa imagem, conforme à
nossa semelhança" (Gn 1.26). Embora nada seja dito a respeito do Espírito Santo aqui, a
Bíblia demonstra que a imagem e a semelhança têm a ver com a natureza espiritual e moral
do homem. Paulo ora, para que os crentes sejam "corroborados com poder pelo seu Espírito
no homem interior" e passa a conclamá-los a "revestir-se do novo homem, que segundo
Deus [à imagem e semelhança de Deus] é criado em verdadeira justiça e santidade" (Ef
3.16; 4.24). É razoável, portanto, crer que o Espírito Santo era tão ativo em Gênesis 1.26-28
quanto Ele o era em Gênesis 1.2, ou talvez até mais.
Gênesis 2.7 oferece mais detalhes. Deus formou (moldou, formou assim como faria o
oleiro) o homem do pó (úmido) da terra (vermelha), e soprou nas suas narinas o fôlego de
vida (hebraico, "vidas"), e o homem foi feito alma (ser, pessoa, indivíduo) vivente. Mais
uma vez, embora o Espírito Santo não seja mencionado, é razoável crer que Ele estava ativo
juntamente com o Pai e o Filho.
Comentários mais antigos aceitam o plural hebraico, "fôlego de vidas", e entendem
que se refere à vida animal e intelectual, ou à física e espiritual.(10) A Bíblia revela, de fato,
que o espírito do próprio homem provém de Deus e voltará para Ele (Eclesiastes 12.7;
Lucas 23.46; ver também João 19.30 onde Jesus entregou seu espírito). Outros trechos
também enfatizam que Deus é a origem da vida e que o seu Espírito a produz (Jó 27.3;
33.4). Se Ele a retirasse, toda a vida chegaria ao fim (Jó 34.14,15).(u) \t Mesmo assim,
possuir "fôlego de vida" é atribuída a todos quantos morreram no Dilúvio (Gênesis 6.17;
7.22), bem como a todos os animais que entraram na arca (Gênesis 7.15). Sendo assim, uma
atitude mais lógica reconhece que o plural hebraico não fala aqui de tipos diferentes de vida.
No Hebraico, o plural é freqüentemente usado para representar plenitude, ou algo que flui.
(Água sempre está no plural em Hebraico). É usado, também, para alguma coisa que revela
muitos aspectos ou expressões. (As palavras face e céu também estão sempre no plural em
Hebraico). A atenção em Gênesis 2.7, portanto, não recai no tipo de vida tanto quanto na
origem da vida. O "fôlego de vida" pode simplesmente significar o fôlego ou Espírito de
Deus que produz a vida, que dá ao homem seu "fôlego vital" ou sua "faculdade da vida".(12)
De qualquer maneira, o Novo Testamento compara aquilo que Adão recebeu com o que
Cristo é. Ele, o Último Adão, é mais do que uma alma vivente. Ele é um Espírito vivificante
(1 Coríntios 15.45).
Abraão e os Patriarcas
Depois de o homem ter fracassado de novo na torre de Babel, quando, então, a nova
variedade de idiomas provocou confusão e dispersão, o livro de Gênesis cessa de lidar com
a humanidade como um todo. O final do livro diz respeito a Abraão e à linhagem escolhida
que provém dele. A maioria das alusões ao Espírito Santo no restante do Antigo Testamento
tem a ver exclusivamente com Israel.
Alguém tem dito: "A história da Bíblia é a narração de homens cheios do Espírito
Santo".(17) Esse fato talvez não seja muito aparente na história dos patriarcas, mas seria
muito estranho se Abraão, a quem Paulo coloca como um dos maiores exemplos da fé
(Romanos 4.1-22; Gálatas 3.6-18), não fosse um homem espiritual.
Há, na realidade, uma indicação de que Abraão era um homem espiritual, embora as
circunstâncias sejam um pouco estranhas. Abraão chamara sua esposa de irmã (ela era, na
verdade, sua meia-irmã) e permitira que ela fosse levada ao harém do rei Abimeleque. Os
costumes da época exigiam, quando era feito um pacto, para permitir que um homem
poderoso, com muitos seguidores, permanecesse num país vizinho, que o tratado fosse
selado mediante a entrega em fiança de uma filha ou irmã como refém, para garantir o bom
comportamento do hóspede. Deus levou em conta a situação real deles, e interveio para
proteger Sara, ao advertir Abimeleque que a devolvesse ao marido dela. Posto que Abraão
era profeta, ele oraria por Abimeleque (Gênesis 20.7).
Profeta significa porta-voz de Deus. (Veja Êxodo 7.1; 4.16 e note como as palavras
profeta e porta-voz são usadas alternadamente. Veja também Deuteronomio 18.18-22). No
entanto, os profetas eram homens espirituais: "os homens santos de Deus falaram inspirados
[impulsionados, levados adiante] pelo Espírito Santo" (2Pel.21).
Abraão merecia o título de profeta, pois Deus falava freqüentemente com ele, para
lhe dar orientação, e aos outros também. Os altares que ele edificava a Jeová eram convites
à adoração pública, onde ele testificava da verdade do único Deus. Sua intercessão por
Sodoma também o caracterizou como profeta. A maioria dos profetas intercedia,
especialmente Moisés (Números 14.13-20; Deuteronomio 9.20), Samuel (1 Samuel 7.5;
12.19,23), Jeremias (7.16) e Amos (7.2,5).
Deus atendeu a oração de Abraão em favor de Abimeleque (Gênesis 20.17).
Posteriormente, o salmista considerou e chamou de profetas os patriarcas Isaque, Jacó e José
(Salmo 105.9-22). A respeito deles, esse Salmo diz: "Não toqueis nos meus ungidos, e não
maltrateis os meus profetas". José, especialmente, foi reconhecido como o que tinha a unção
que esse Salmo se refere. Depois de José ter interpretado o sonho de Faraó, este disse:
"Acharíamos um varão como este, em quem haja o Espírito de Deus?" (Gn 41.38). Faraó
viu que não havia outra explicação para a sabedoria e para o entendimento que esse escravo
e ex-presidiário hebreu possuía. José era verdadeiramente um homem espiritual, equipado
pelo Espírito de Deus para a obra a que foi chamado.
Edificando o Tabernáculo
Os israelitas que seguiram José até o Egito foram escravizados, e o homem que Deus
escolheu para libertá-los também era cheio do Espírito. O próprio Deus reconheceu Moisés
como o maior profeta daqueles tempos. Outros profetas naqueles dias teriam somente a
experiência de Deus falar com eles por sonhos e visões, mas com Moisés Deus lhe falava
"boca a boca", assim como um homem que conversa com um amigo (Números 12.6-8).
É verdade que, diante da sarça ardente, Moisés se queixou de não conseguir falar
bem, e Deus designou Arão como profeta. Mesmo assim, era com Moisés que Deus falava,
e esse, então, transmitia a mensagem a Arão. No entanto, logo Moisés passaria a ser profeta
propriamente dito (Êxodo 3.4; 4.10-16).
Em cada diálogo entre Moisés e Faraó, Deus conversava antes com ele. No Sinai,
Deus falou, de fato, diretamente com o povo, quando os Dez Mandamentos foram entregues
(Êxodo 20.1-17). Porém, eles ficaram tão cheios de terror e de temor, por causa da voz de
Deus e de tudo o que viram e ouviram, que passaram para o outro lado do vale. Depois,
imploraram a Moisés que falasse com eles, em vez de Deus (Êxodo 20.18,19). Sendo assim,
somente Moisés teve a licença de subir ao monte Sinai, onde recebeu a Lei escrita em tábuas
de pedra, bem como as orientações para a construção do tabernáculo.
O tabernáculo foi um empreendimento que ensinou os israelitas a viver juntos, bem
como um lugar onde Deus manifestou continuamente a sua presença. Todos podiam
participar. Aqueles que tinham maiores recursos traziam ouro ou prata; outros ofereciam o
bronze (cobre). Precisavam de tecido nas cores azul, púrpura, escarlate e branco, mas
também de peles de bode. Além disso, contribuíam com as suas habilidades (Êxodo 25.1-9;
35.5-9, 20-26). Mas em todas as situações, sempre há pessoas que nada possuem e nada
sabem fazer. Estes se apresentavam para ser ensinados. Deus prometeu que encheria do
Espírito Santo dois homens, Bezaleel e Aoliabe, para aprimorar as suas habilidades, e para
também capacitá-los a ensinar os outros (Êxodo 31.2,3,6; 35.30,31,34).
Essa plenitude do Espírito seria a fonte de "sabedoria, e de entendimento, e de
ciência, em todo o artifício". Noutras palavras, o Espírito lhes forneceria ajuda sobrenatural
em conexão com as tarefas práticas de preparar utensílios, tanto úteis como belos, para o
tabernáculo.
Sabedoria no Antigo Testamento geralmente significa a prática e a habilidade que
possibilita a pessoa de alcançar as suas metas. Entendimento geralmente inclui percepção e
decisões inteligentes. Conhecimento inclui o "Know-how" que determina o que precisa ser
feito, e como deve ser realizado. Tudo isso vinha do Espírito. Bezaleel e Aoliabe não
podiam depender somente das suas capacidades e habilidades naturais. Trabalhariam muito,
mas, ao mesmo tempo, dependeriam do Espírito e receberiam ajuda da parte dele. Note, no
entanto, que nem todos os artífices receberam a plenitude, mas somente aqueles dois que
foram especialmente nomeados e escolhidos pelo Senhor.
A Sabedoria de Débora
Como profetisa, Débora era porta-voz de Deus, e falava conforme era inspirada
(levada adiante) pelo Espírito Santo (2 Pedro 1.21). O dom profético a qualificava a liderar,
julgar e governar a nação. (Ver Deuteronômio 17.18,19).
Débora foi, na realidade, a única a ser reconhecida e aceita como juiz antes de obter
qualquer vitória militar ou de livrar o povo de Deus dos seus inimigos. Sendo assim, muitos
comentários supõem que a única obra verdadeira nos tempos dos Juízes era produzir um
tipo de êxtase ou entusiasmo divino. Assim não acontecia no caso de Débora. Ela se
assentava debaixo de uma palmeira entre Rama e Betel (provavelmente cerca de 24 Km ao
norte de Jerusalém) e o povo vinha a ela com seus problemas, suas disputas e questões. Vi-
nham, porque reconheciam estar ela em comunhão com o Senhor. Ela era casada, e não há
indicação de que desprezava seu marido.
Mas ela achou tempo para esse ministério. O Espírito Santo lhe dava continuamente
sabedoria para exortar o povo, consolá-lo, desafiá-lo e solucionar seus problemas. Ela não
precisava de persuasão para fazer isso, para encorajar a sua fé. Muitos a consideram a mais
espiritual entre os Juízes.
Quando o Espírito Santo determinou que chegara a hora de Deus libertar Israel dos
cananeus, que então o oprimia, ela chamou Baraque, para comandar o exército. A fé dele
não estava à altura da de Débora; no entanto, ele insistiu que ela o acompanhasse. Ele não
era covarde, mas via a força do inimigo, e queria ter a certeza de ter junto de si alguém que
estava em comunhão com Deus. Outros também tiveram medo dos exércitos bem-equipados
dos cananeus, e se recusaram a juntar-se com Débora e Baraque. Sobre os habitantes de
Meroz (na tribo de Naftali) ela solicitou uma maldição porque "não vieram em socorro do
Senhor" (Jz 5.23).
Vestimentas do Espírito
Gideão, em contraste com Débora, precisou ser encorajado repetidas vezes. Pertencia
a uma família de pouca importância na tribo de Manasses. (A tribo de Efraim, embora
descendesse do filho mais novo de José, assumiu a liderança e fez com que a tribo de
Manasses se sentisse marginalizada e esquecida). Deus encorajou Gideão por meio de uma
prova com um velo de lã e do sonho de um midianita, a fim de que ele assumisse a liderança
e cresse que receberia a vitória. Obedeceu, inclusive, ao anjo que lhe apareceu e destruiu a
idolatria na casa de seu pai.
Esse ato de fé e de obediência não demorou a ser seguido por uma experiência muito
rara com o Espírito Santo. Lemos: "O Espírito do Senhor revestiu a Gideão" (Jz 6.34). Nesta
passagem, a palavra hebraica é bem diferente daquela que é traduzida por "veio sobre" em
Juízes 3.10. "Revestiu a Gideão" significa "vestiu-se de Gideão".
Muitos estudiosos bíblicos não alcançam o significado total desse fato. A
interpretação mais comum de Juízes 6.34 é que o Espírito Santo revestiu Gideão. Keil não
chega à altura, quando diz que o Espírito Santo "desceu sobre ele, e colocou-se ao seu redor
como se fosse uma armadura, ou um equipamento forte, para Gideão tornar-se invencível e
invulnerável no seu poder".(7) Semelhantemente, A.B. Davidson diz que subentende "o
envolver completo de todas as faculdades humanas na dimensão divina".(8) Knight, embora
ofereça a tradução correta do texto hebraico, interpreta-o no sentido de que Gideão "vestiu-
se do Espírito do Deus vivo! A ação poderosa que então realizou ao livrar Israel não era
apenas sua própria ação; era também a ação salvífica de Deus".(9)
O Targum judaico explica simplesmente que o Espírito da força do Senhor veio sobre
Gideão. Alguns escritores modernos tratam do assunto como apenas mais uma manifestação
repentina ou violenta do Espírito Santo,(10) ao passo que outros (tais como Bertheau, Fuerst
e Ewald) oferecem uma interpretação semelhante à de Keil.
Uns poucos reconhecem, no entanto, que o hebraico somente pode significar que o
Espírito Santo encheu Gideão. Ele não se revestiu do Espírito Santo, o Espírito Santo
revestiu-se de Gideão.(11) Para Gideão estar vestido do Espírito Santo, é mais provável que
foi usada outra forma do verbo hebraico. Gideão era apenas a roupa, "o manto exterior do
Espírito Santo que governa, fala e testifica nele".(12)
Sansão, o Nazireu
Sansão tinha todas as vantagens que Jefté não possuiu. Seus pais eram piedosos. O
anjo do Senhor apareceu a eles, proibindo a mãe de beber vinho ou bebida forte, e de comer
qualquer coisa impura, porque o filho seria nazireu desde o nascimento (Juízes 13.7,14). A
medida que Sansão crescia, o Senhor o abençoava. Mas o modo dele agir depois de crescido
não foi fácil de entender. Conforme diz Keil:
"A natureza dos atos que praticava parece muito menos aquilo que esperaríamos de
um herói impulsionado pelo Espírito de Deus. Suas ações não somente levam a marca da
aventura, da temeridade e da teimosia, ao serem examinadas exteriormente, como também
quase todas elas estão associadas com casos de amor; de modo que Sansão desonrava e
esbanjava estultamente o dom a ele confiado, tornando-o subserviente às suas
concupiscências, e, portanto, o dom abrira o caminho para sua ruína, sem ter trazido
nenhuma ajuda essencial ao seu povo."(13)
Os teólogos liberais, também olhando superficialmente os atos de Sansão, às vezes,
chamam as visitações do Espírito Santo sobre ele de "crises de fúria demoníaca", "excessos"
ou "anormalidades".(14)
Aqueles que consideram anormais as atividades do Espírito Santo não percebem a
realidade. Não precisamos olhar isso exteriormente. Do ponto de vista divino, que é sensível
para com os modos pacientes de Deus lidar com o seu povo, observamos em Sansão uma
lição prática da graça e do poder do Espírito Santo que brilha com mais fulgor por causa do
seu triste cenário. De novo, Keil expressa muito bem o caso:
"Por intermédio de Sansão, o nazireu, entretanto, não somente o Senhor decidiu
colocar diante do seu povo um homem muito acima da geração caída por possuir poder
heróico, fé firme e sólida confiança no dom que Deus lhe confiara, abrindo diante de todos a
perspectiva de renovação das suas próprias forças, de modo que, por esse exemplo, ele
despertasse a força e a capacidade que ainda dormitavam na nação; mas Sansão iria exibir
diante de toda a sua geração um quadro, de um lado, da força que o povo de Deus podia
adquirir para vencer os inimigos mais fortes, mediante a fiel submissão ao Senhor Deus e,
por outro lado, da fraqueza em que esse povo se encontrava por causa da infidelidade à
aliança e pelo convívio com os pagãos".(15)
Saul é Ungido
Uma comparação entre a unção de Saul e a de Davi ressalta algumas semelhanças e
diferenças relevantes. Em ambos os casos, Deus preparou Samuel de antemão para ungi-los.
Nos dois casos também, Deus deu, depois da ação simbólica do derramamento do óleo, um
derramamento verdadeiro do Espírito Santo.
Saul, no entanto, parece mais surpreso com a unção do que Davi. Saul, embora fosse
homem maduro, não tinha aprendido a buscar o Senhor. Foi o servo dele quem sugeriu que
procurasse Samuel como vidente (aquele que vê com discernimento sobrenatural) ou profeta
(lSamuel9.6,9). Depois de ungi-lo, Samuel disse a Saul que este se encontraria com várias
pessoas, e, em seguida, com um grupo de profetas com saltérios (harpas triangulares
pequenas), tambores, flautas e harpas (liras semelhantes a guitarras). Iriam profetizar (falar
em prol de Deus com cânticos). O Espírito do Senhor viria sobre Saul, e este profetizaria
com eles, e "seria transformado em outro homem" (1 Sm 10.6).
Na realidade, uma mudança interior sobreveio antes que Saul se encontrasse com os
profetas. Tão logo ele deixou Samuel, Deus lhe mudou o coração (1 Samuel 10.9). Por
algum tempo, passou, então, a profetizar entre esses profetas.
Outros trechos indicam que o ministério dos profetas aumentou durante esse período
(provavelmente depois do reavivamento espiritual registrado em 1 Samuel 7). Um bom
número de profetas reuniu-se em redor de Samuel, que era seu chefe nomeado por Deus (1
Samuel 19.20). Referências posteriores falam de escolas de profetas onde os homens se
reuniam para aprender dos profetas. O ensino era parte importante do ministério deles. E a
adoração também. Anteriormente, notamos como Miriã, sob a inspiração profética, tocava
tamboril (ou tanta), enquanto dirigia as mulheres na adoração. Sob a liderança de Samuel,
muitas músicas e muitos instrumentos musicais foram acrescentados, e esses profetas
aprendiam a render-se ao Espírito Santo, enquanto tocavam seus instrumentos e cantavam
louvores a Deus.
Sem dúvida, isto abriu o caminho para a ênfase aos instrumentos musicais e aos
cânticos que Davi acrescentou à adoração oficial dirigida pelos sacerdotes e levitas. Não
parece haver precedente para isso. Começou como uma espontânea atuação do Espírito de
Deus. Sendo assim, profetizar em cânticos não dizia respeito à previsão do futuro.
Tampouco as profecias de homens tais como Moisés e Samuel, ou até mesmo Isaías e
Jeremias, eram assim. A profecia era o falar em prol de Deus. A profecia feita com música e
com cânticos era simplesmente cantar e tocar para a glória de Deus, sob a inspiração do
Espírito Santo.
Davi apreciava isso de tal maneira que separou levitas para esse ministério ungido
pelo Espírito Santo e incentivou o uso de uma variedade ainda maior de instrumentos
musicais (1 Crônicas 25.1-7). Especificamente, profetizavam "louvando e dando graças ao
Senhor", porque eram "instruídos no canto do Senhor" (1 Cr 25.3,7). Isto parece indicar que
esperavam a unção do Espírito Santo nos cânticos que aprendiam de Davi.
Saul, ao ajuntar-se ao grupo dos profetas, transbordou em cânticos, não por causa do
entusiasmo deles, não por causa de um impulso de seu próprio interior, não porque tivesse
algum talento musical adormecido que aquela música inspirada havia nele despertado, mas
porque ele mesmo fora impelido pelo Espírito Santo. Dessa maneira, fora preparado pelo
Espírito Santo para a tarefa que lhe aguardava. Embora Israel tivesse errado, ao pedir um
rei, Deus deu à nação um elemento de estatura física e de parecer apresentável, o exato tipo
que o povo queria. Mas Ele fez mais do que isso. Preparou-o, transformou-o, e lhe deu do
seu Espírito. Os israelitas não poderiam dizer mais tarde que Deus não fizera por eles tudo
quanto era possível.
Davi é Ungido
A experiência de Davi foi diferente, pois quando Samuel o ungiu, "desde aquele dia
em diante o Espírito do Senhor se apoderou de Davi" (1 Sm 16.13). O mesmo verbo é usado
aqui, para a vinda do Espírito Santo, como é usado no caso de Sansão e do rei Saul. Foi com
o mesmo ímpeto de grande poder. Há, porém, uma leve diferença na preposição usada, e
uma grande diferença na experiência de Davi. O Espírito Santo veio sobre Sansão e Saul. A
experiência de ambos foram temporárias e intermitentes. Era quase como se o Espírito
Santo não estivesse presente com eles (muito embora Ele estivesse ali). O Espírito Santo
veio para Davi (ou, provavelmente, para dentro dele). O caso do filho de Jessé foi
diferente, também, no fato de não ter havido nenhuma reação ou sinal externo. Essa
quantidade de poder encheu o íntimo de Davi e começou a preparação para a liderança que
Deus lhe daria posteriormente. Mas essa experiência não terminou após alguns poucos
minutos. No dia seguinte, aquele impetuoso movimento do Espírito Santo ainda estava
presente. "Em diante" é, literalmente, "para cima". Era uma experiência ascendente, uma
experiência crescente.
Parece significante, também, que nada é dito a respeito de que foi dado a Davi um
novo coração ou foi transformado em outro homem.
Evidentemente, Davi já conhecia o Senhor. O Salmo 23 provavelmente foi escrito
quando ele era mais velho, mas certamente reflete a experiência da sua juventude. Como
menino, pastor nas colinas de Belém, contemplava o seu rebanho e dizia: "O Senhor é o
meu pastor". Nas longas vigílias da noite, sob as estrelas cintilantes, seu coração clamava:
"Os céus manifestam a glória de Deus e o firma-mento anuncia a obra das suas mãos" (SI
19.1). O coração de Davi já estava transformado, já estava aberto quando veio o Espírito
Santo. Daí, então, fluíram os cânticos que nos deram uma grande parte do hinário sacro de
Israel e da Igreja, o livro dos Salmos.
Somente por mais duas vezes a Bíblia menciona a vinda do Espírito Santo sobre
Saul, depois de sua experiência inicial. Saul não foi aceito por todos, no momento em que
foi escolhido rei. Por isso, voltou ao campo. Mas, certo dia, chegaram notícias da ameaça
dos amonitas, de que vazariam os olhos direitos dos homens de Jabes-Gileade, como preço
de um tratado de paz. Quando Saul soube disso, o Espírito Santo veio sobre ele com grande
ímpeto, e ele liderou Israel numa grande vitória que o estabeleceu no seu trono (1 Samuel
11.6,15).
Saul, no entanto, não confiou no Senhor. Com medo e teimosia, ofereceu um
sacrifício que levou Deus a retirar da família dele o direito da sucessão. Os filhos de Saul
não teriam direito ao trono. Um homem segundo o coração de Deus tomaria o lugar de Saul;
um homem que cumpriria toda a vontade de Jeová (1 Samuel 13.14; Atos 13.22). Uns
poucos anos mais tarde, Saul desobedeceu de novo, a despeito de ter sido relembrado da
unção do Senhor. Dessa vez, Deus retirou de Saul o direito de serrei. A partir de então, Saul
reinou sem o apoio nem a autoridade de Deus (1 Samuel 15.1,19,26). Fracassou, porque não
compreendia que a religião espiritual promovida no Antigo Testamento não era mera
questão de ver milagres e de obter vitórias. Era questão de obediência e de fé.
Depois de Samuel ter ungido a Davi, o Espírito do Senhor retirou-se de Saul (1
Samuel 16.14). Logo, o Espírito Santo estava com ele (disponível para ele) entre os grandes
ímpetos de poder; assim como também estivera com Sansão. Esse trecho também deixa
claro que, quando o Espírito do Senhor se retira, o próprio Senhor também vai embora. (Ver
Juízes 16.20).
O Profetizar de Saul
O "profetizar" de Saul sob a influência desse espírito sobrenatural de juízo também é
de difícil compreensão (1 Samuel 18.10). E provável que não fosse profecia normal. A
mesma forma desse verbo, às vezes, é aplicada às manifestações de delírios e de ira dos
profetas pagãos. Posto que esse espírito de juízo aterrorizava Saul (16.14), é possível que
esse "profetizar" também assumisse a forma de elocuções incontroláveis.
Devemos reconhecer, também, que esse "espírito de juízo" não está na mesma
categoria do Espírito do Senhor, embora Saul tivesse profetizado sob sua influência. Esse
espírito que foi enviado da parte do Senhor era sujeito à vontade do Senhor. O Espírito
Santo, porém, é o próprio Deus agindo diante de uma situação.C9)
Um evento ainda mais estranho é o "profetizar" de Saul diante de Samuel, quando
esse estava perseguindo Davi(l Samuel 19.20-24). Três vezes, Saul enviou mensageiros para
prender Davi. Quando, no entanto, vieram a Samuel, que estava em Rama, e dirigia um
grupo de profetas. O Espírito do Senhor veio também sobre os mensageiros de Saul e eles
começavam a profetizar. A inspiração e a bênção do Senhor levou-os a esquecer-se de sua
missão, ou a mudar de idéia a respeito disso.
Em seguida, o próprio Saul resolveu ir até Samuel e prender Davi. Vestido com suas
vestes reais, esperava descer até lá e intimidá-los. Mas o Espírito do Senhor veio sobre ele
antes que encontrasse Samuel, e começou a profetizar. Ao chegar diante de Samuel, despiu-
se de seus vestidos reais e esteve "nu" (vestido somente com sua túnica), prostrado, e
profetizou durante toda a noite.
Aqui a situação é bem diferente da ocasião em que o Espírito Santo veio sobre ele
pela primeira vez, depois de ter sido ungido. No caso presente, o Espírito Santo veio sobre
(e não "precipitou-se sobre") ele antes que ele se encontrasse com os profetas. Desta vez,
resistia ao Espírito Santo. Ao invés de ser preparado para a realeza, ele se despiu de seus
vestidos reais. Ao invés de profetizar entre os profetas, deitou-se no chão. Não há evidência
de que assim tenha feito com o intuito de se humilhar diante de Deus. Até mesmo seu
"profetizar", nesse caso, tenha sido mais como delírios provenientes de sua resistência ao
Espírito. Assim, Deus mostrou que Ele era soberano, e Davi teve a oportunidade de escapar.
Davi e os Salmos
Que o Espírito Santo continuou a habitarem Davi é indicado em sua oração, quando
ele pediu perdão a Deus, depois do seu grande pecado: "Não retires de mim o teu Espírito
Santo" (SI 51.11). A sua verdadeira atitude de arrependimento nessas coisas está em nítido
contraste com o rei Saul, que às vezes reconhecia seu pecado depois de ter sido pego em
flagrante, mas que nunca demonstrou genuíno arrependimento. Pelo contrário, Saul voltava
imediatamente a fazer as mesmas coisas.
E relevante, pois, que Davi reconhece o Espírito de Deus como o Espírito Santo. É
provável que não tenha usado o nome com pleno reconhecimento da personalidade
distintiva do Espírito Santo, que é o que vemos no Novo Testamento. Mas certamente vê
que o Espírito Santo está pessoalmente ativo em relação às necessidades dele.
A totalidade do Salmo 51 é digno de estudo nessa conexão, especialmente os
versículos imediatamente antes e depois do versículo 11. "Cria em [para] mim um coração
puro [sem mistura]" (v.10). Criar é uma palavra usada na Bíblia exclusivamente a respeito
da atividade sobrenatural de Deus, sem precedentes. Davi não poderia fazê-lo por conta
própria. O mesmo versículo continua: "Renova [restaura] em mim [no íntimo do meu ser]
um espírito reto [firme, inabalável, fiel, fidedigno]". Trata-se do seu espírito humano que o
pecado despojara do seu firme propósito de fazer a vontade de Deus e de estar pronto para
avançar juntamente com Ele. "Não me lances fora da tua presença" (v. 11). A presença de
Deus forma um paralelo com a do seu Espírito Santo. Mediante o Espírito Santo, Davi
tomava consciência da presença de Deus. O fato que o Espírito Santo ainda lidava com ele
demonstrava-lhe que Deus ainda não o expulsara, nem o abandonara completamente. (Ver 1
Coríntios 9.27). "Torna a dar-me a alegria da tua salvação" (v.12). Durante um ano, pensava
que tinha encoberto o seu pecado. Mas foi somente quando Nata o repreendeu que despertou
para a realidade: a alegria já se fora. "E sustém-me [ajuda-me] com um espírito voluntário
[teu Espírito generoso]" (v.12). O Espírito que é santo também é generoso.(20) (A palavra
voluntário é a mesma palavra que fala de corações dispostos e de ofertas voluntárias em
Êxodo 35.5,22). Davi queria a ajuda do Espírito Santo para sustentá-lo, não meramente para
guardá-lo de resvalar de novo, mas de sorte que Davi pudesse ensinar os outros e levar os
pecadores ao Senhor (v.13).
A oração de Davi foi atendida. Não somente o Senhor o restaurou, mas ele pôde
assim dizer, no fim da sua vida: "O Espírito do Senhor falou por mim [em mim], e a sua
palavra esteve em minha boca" (2 Sm 23.2). Davi ainda era o ungido de Deus, "o suave
salmista [em tocar harpa e cantar] de Israel" (2 Sm 23.1).
Davi se recusara por duas vezes a matar o rei Saul porque ele era o ungido do
Senhor. Ora, Davi era o ungido (Hebraico, meshiach. Messias) num sentido muito melhor.
Nessa condição, ele se tornou um tipo que apontava para o futuro Davi maior, que é o
verdadeiro Messias, o Profeta, Sacerdote e Rei ungido por Deus.
Há apenas algumas poucas e curtas referências sobre o Espírito Santo em relação a
Davi. 1 Crônicas 28.12 indica que a planta do templo veio a Davi pela inspiração divina do
Espírito Santo.(21)
No Salmo 139.7, Davi perguntou: "Para onde me irei do teu Espírito, ou para onde
fugirei da tua face?" Não queria dizer, com isso, que chegaria a fazer tal coisa.
Simplesmente está reconhecendo que o Espírito Santo, o poder, e a presença de Deus estão
em todos os lugares.
O Salmo 143.10 reconhece que o Espírito de Deus é bom. O versículo pode ser
traduzido: "Ensina-me [faz-me realmente aprender] a fazer a tua vontade, pois és o meu
Deus; guie-me o teu bom Espírito por terra plana" (onde não haverá tropeços, nem
impedimentos à retidão, nem barreiras ao progresso espiritual).
Uma referência adicional, em 1 Crônicas 12.18, indica que o Espírito Santo veio
sobre (vestiu como roupa, encheu) Amasai para dar uma palavra de encorajamento a Davi.
(A mesma palavra hebraica é usada no tocante a Amasai quando foi usada para Gideão em
Juízes 6.34).
Salomão
Embora Salomão conhecesse a inspiração e o dom da sabedoria que provêm do
Espírito Santo, fala uma só vez a respeito do Espírito. Em Provérbios 1.23, a Sabedoria
exclama: "Eis que abundantemente derramarei sobre [para] vós o meu Espírito, e vos farei
saber [por experiência própria] as minhas palavras". A sabedoria aqui personificada é a
sabedoria divina, a sabedoria da parte de Deus. Derramar é mais freqüentemente usado no
sentido de derramar uma torrente de palavras. E usado, também, para um derramamento
maior do Espírito Santo no futuro, derramamento este que tem ligação com um
derramamento de palavras pelas quais o Espírito Santo se expressa.
Reis e Crônicas
O Espírito Santo é mencionado no restante dos livros dos Reis e das Crônicas
somente em conexão com os profetas. Quando o reino foi dividido, após a morte de
Salomão, os reis das 10 tribos do norte (que adotaram o nome de Israel) caíram muito no
nível espiritual. Todos adoravam os bezerros de ouro que Jeroboão havia exigido em Betel e
Dã. Muitos caíram na mais grosseira idolatria. Mesmo em Judá, embora houvesse
reavivamentos sob o reinado de Asa, de Josafá, de Ezequias e de Josias, a maioria dos reis
afundou-se em práticas idolatras. Sendo assim, embora os reis tenham conduzido a trajetória
da História, os profetas falavam em prol de Deus e lançavam as bases para o futuro.
Isso se vê na própria estrutura dos livros dos Reis. Esses reis são apresentados
mediante uma fórmula fixa. Outra fórmula fixa menciona a conclusão do reino deles. Os
reis, como um todo, são apenas o arcabouço nos livros dos Reis. Para apresentar os profetas,
no entanto, não há fórmula fixa. De repente, estão aí, como se a estrutura de Reis fosse
quebrada para os profetas serem introduzidos na situação. (Ver 1 Reis 17.1).
Todos os profetas verdadeiros, naturalmente, eram inspirados e movidos pelo
Espírito Santo (2 Pedro 1.21). Um dos profetas antigos sobre quem veio o Espírito Santo,
conforme a narrativa, foi Azarias (2 Crônicas 15.1-8). Encorajou Asa a afastar os ídolos e
ajudou no seu reavivamento. Sua mensagem lembrava Asa das condições nos tempos dos
Juízes. Conforme acontecia tão freqüentemente, as mensagens dos profetas fundamentavam-
se na Palavra de Deus já revelada até então.
Mais tarde, o Espírito do Senhor veio sobre Jaaziel para encorajar Josafá a confiar em
Deus, permanecer firme, e deixar o Senhor lhes dar a vitória. Dessa vez, não haveria
necessidade de Judá lutar (2 Crônicas 20.14-17).
Ao mesmo tempo, aproximadamente, Deus estava atuando através de Elias no norte
de Israel, para levar o povo a uma decisão. Quando após três anos e meio sem chuva, Elias
se encontrou com Obadias, servo do rei Acabe, Obadias temia que o Espírito do Senhor
arrebatasse Elias para longe (1 Reis 18.12). Isso nos lembra de como o Espírito de Deus
mais tarde arrebatou Ezequiel (Ezequiel 37.1) e Filipe (Atos 8.39). Obadias, pelo menos,
reconheceu o Espírito de Deus como um tremendo poder. (Ver também 2 Reis 2.16). Mas a
evidência de que o Espírito estava realmente guiando Elias surgiu quando o fogo desceu do
céu e consumiu o sacrifício no monte Carmelo, e o povo disse: "Só o Senhor é Deus!" (1 Rs
18.36-39).
Elias precisava aprender mais uma lição, no entanto (1 Reis 19). Os milagres
necessariamente não convencem os incrédulos. Ele esperava que o fogo vindo do céu
convertesse a própria Jezabel. Quando não aconteceu assim, Elias ficou muito frustrado, e
fugiu. Com as energias de duas refeições sobrenaturais, foi andando durante 40 dias até à
região do monte Sinai. Ali, Deus permitiu que ele soubesse sobre as manifestações do seu
Espírito, as quais não eram necessariamente dramáticas e exteriores. O fogo, o terremoto, e
o vento forte não tinham sentido para Elias. Mas depois, no silêncio que se seguiu, uma voz
mansa e delicada fez com que Elias soubesse que não estava sozinho, que 7.000 não tinham
dobrado os joelhos diante de Baal, e que Deus ainda tinha trabalho para ele realizar.
Deixasse, portanto, sua auto-piedade e se pusesse a trabalhar.
Elias era de tal maneira caracterizado pelo Espírito Santo que Eliseu, quando soube
que Elias estava para ser tirado dele, pediu-lhe uma porção dobrada do seu Espírito (2 Reis
2.9). Não se referia, com isso, ao espírito humano de Elias, nem ao seu entusiasmo, mas ao
Espírito de Deus que estava sobre ele. Além disso, ao pedir uma porção dobrada do Espírito,
não estava pedindo uma quantidade dupla do Espírito (embora alguns comentaristas
indiquem que Deus operou duas vezes mais milagres registrados na Bíblia através de Eliseu
do que através de Elias). Na realidade, a dupla porção era a porção do herdeiro. Muitos
profetas, e várias escolas de profetas, foram levantados através do ministério de Elias.
Eliseu pediu o privilégio de ser o sucessor de Elias no seu ministério e na liderança das
escolas dos profetas. Isso lhe foi concedido, e os demais profetas reconheceram que o
Espírito de Elias estava sobre ele. (Ver 2 Reis 2.15).
O povo tinha Eliseu como um santo homem de Deus (2 Reis 4.9). E os reis também,
bem como Naamã, o general do exército sírio (2 Reis 5.14,15). Em certa ocasião, no
entanto, ficou tão envolvido pela incredulidade que pediu que um trovador viesse cantar e
tocar diante dele. Enquanto adorava ao Senhor, criava sua própria atmosfera de fé, e "veio
sobre ele a mão do Senhor" (2 Rs 3.15). A expressão "a mão do Senhor" é freqüentemente
usada para referir-se ao poder do Senhor, e muitas vezes subentende a atuação do Espírito
Santo. A "mão do Senhor", geralmente, refere-se ao poder do Senhor, e com freqüência
subentende a atuação do Espírito Santo.
Durante os tempos de Elias, Deus também usou o profeta Micaías para advertir
Acabe da batalha que traria a sua morte (1 Reis 22.17-23). Outros profetas tinham
encorajado Acabe a acreditar que voltaria vitorioso. Micaías, porém, disse que foram
impelidos por um espírito mentiroso para provocar o juízo divino contra Acabe. Zedequias,
um dos outros profetas, esbofeteou a face de Micaías, perguntando: "Por onde passou de
mim o espírito do Senhor para falar a ti?" (1 Rs 22.24). Obviamente, Zedequias
considerava-se o único que realmente era inspirado pelo Espírito Santo. O passar dos fatos
comprovou que Micaías era o profeta verdadeiro. Mesmo assim, a observação de Zedequias
indica que as pessoas entendiam ser a verdadeira profecia inspirada pelo Espírito Santo.
A Bíblia ressalta mais uma pessoa dessa época que tinha a plenitude do Espírito
Santo (2 Crônicas 24.20). Quando o rei Joás e seu povo se afastaram do Senhor, o Espírito
Santo "vestiu-se" de Zacarias e os repreendeu. Por isso, Joás mandou apedrejá-lo até à
morte - martírio esse ao qual Jesus chamou a atenção por ser o último registrado na Bíblia
Hebraica, porque ela coloca os livros de Crônicas no término (Mateus 23.35; Lucas 11.51).
Jó
Jó é o mais antigo livro da Bíblia; ele também faz referência ao Espírito Santo. Em Jó
26.13: "Pelo seu Espírito ornou [abrilhantou] os céus", é expressão que muitos intérpretes
entendem ter o Espírito Santo usado o vento para esse fim. "O sopro de Deus no meu nariz"
forma um paralelo com o "alento em mim" (Jó 27.3). "O espírito no homem" (Jó 32.8,18) é,
indubitavelmente, o espírito humano, mas o trecho (juntamente com Jó 33.4) reconhece que
o homem deve este espírito ao Espírito Santo (como em Gênesis 2.7).
Eliú (que começa a falar em Jó 32.6) acha, porém, que seu próprio espírito recebeu
uma medida maior de sabedoria e de poder do Espírito Santo do que a medida que os três
amigos de Jó possuíam. Nesse sentido, Eliú sugere que tem um dom carismático 22. Mas
isso é ignorado, entretanto, no modo de agir de Deus com Jó e seus três amigos no restante
do livro.
3
O ESPÍRITO NOS LIVROS PROFÉTICOS
Todo o Antigo Testamento considera a profecia a atividade principal do Espírito
Santo junto de seu povo. O desejo de Moisés de que todos fossem profetas dependia de
Deus colocar o seu Espírito sobre o povo (Números 11.29). A profecia de Joel diz, falando
da parte de Deus: "Derramarei o meu Espírito sobre toda a carne, e vossos filhos e vossas
filhas profetizarão" (Jl 2.28). Essa era a principal garantia de que a aliança de Deus seria
finalmente cumprida e que Israel realmente seria o povo de Deus. (Ver Êxodo 6.7; 2 Samuel
7.24; Isaías 32.15; 44.3-5; Jeremias 31.31-34; Ezequiel 11.19; 36.25-28).(!)
Joel, cuja mensagem coincide com a juventude de Joás, quando o sacerdote Joiada
estava na regência, enfatiza uma chamada ao arrependimento (1.14; 2.12-17). Deus promete
que, depois da contrição, haveria a restauração (2.25) e o reavivamento (2.28.29).
Joel fala de sinais que só aconteceriam muito depois (2.30,31) e registra juízos contra
o Egito e Edom que, na ocasião, eram inimigos de Judá (3.19). Por essa razão, alguns
afirmam que a profecia de Joel sobre o derramamento do Espírito Santo somente teria
cumprimento no futuro, e que deveria se cumprir somente com relação aos judeus no Dia do
Senhor.(2)
Um Sinal de Julgamento
Isaías teve dificuldades com os sacerdotes e os leigos que zombavam dele. Quando
falava a respeito do juízo e das glórias futuras, diziam que não eram criancinhas (Isaías
28.9). Já tinham ouvido profecias a esse respeito. Para eles, as profecias de Isaías eram
como o ABC, ou a conversa de criancinhas. (Isaías 28.10, em Hebraico, transmite um som
semelhante a "tsav ltsav, tsav ltsav, cav lcav, cav lcav", como se estivesse repetindo letras
do abecedário ou falando uma linguagem incompreensível).
A resposta de Isaías é: "por lábios estranhos e por outra língua, falará a esse povo".
Com isso, o profeta desejava dizer que se o povo não aprendesse a lição da parte do Senhor,
aprendê-la-ia dos invasores assírios, cujo idioma seria incompreensível aos ouvintes (Isaías
33.19). Deus pretendia que as profecias e a esperança da vinda do Messias e do Espírito
Santo fossem de repouso e de refrigério. Mas, agora, aquilo que o povo identificava como
linguagem incompreensível, ficaria como um sinal de juízo contra ele. O povo ouviria, e,
por causa da rejeição à mensagem de Isaías, "cairia para trás" e seria preso. Isso se cumpriu,
quando Senaqueribe conquistou as cidades de Judá (Isaías 36.1) e, segundo registro, enviou
cerca de 200.000 deles para o cativeiro, provavelmente na Babilônia.
A primeira menção que Isaías faz do Espírito Santo, está também ligada ao seu modo
de lidar como pecado. Todos os que restassem de Sião seriam santos (dedicados a Deus,
consagrados a Jeová). "Quando o Senhor lavar a imundícia [excremento] das filhas
[habitantes, homens e mulheres] de Sião, e limpar o sangue [poças de sangue provenientes
dos assassinatos] de Jerusalém do meio dela, com o espírito de justiça, e com o espírito de
ardor" - como preparativo para a glória (messiânica) vindoura (Isaías 4.3-5).
Alguns entendem que essa última expressão se refere a um vento ardente e
purificador,(9) mas é Deus quem realiza a obra. Seu Espírito traz o fogo da ira divina para
castigar a iniqüidade e para destruir os malfeitores, a fim de iniciar a era messiânica.
O Sétuplo Espírito
Em seguida, em Isaías 11.1-5, esse Filho nascido de uma virgem é identificado como
um rebento (um broto novo) do tronco (resto de árvore derrubada) de Jessé, e das suas raízes
um renovo (hebraico netser ou nezer. palavra essa que tem a mesma raiz que Nazaré e
Nazareno). Noutras palavras, antes do tempo em que esse Filho, nascido de uma virgem,
chegasse a ser Deus conosco, a glória do reino davídico já teria passado, e a família de Davi
teria sido derrubada e reduzida à pobreza. Quando, porém, o Menino crescesse, viria sobre
Ele algo melhor do que a glória terrestre: "E repousará [continuamente] sobre ele o Espírito
do Senhor, o espírito de sabedoria e de inteligência, e espírito de conselho e de fortaleza, o
espírito de conhecimento e de temor do Senhor" (11.2). Conforme indicou certo estudioso
bíblico, o Espírito do Senhor é como a haste central de um candelabro de sete braços, ou
lampadário. As demais manifestações do Espírito Santo acham-se em três grupos: primeiro,
relacionadas com a mente e o intelecto; segundo, relacionadas com a vida prática, e terceiro,
relacionadas diretamente com Deus.(10)
Cada aspecto desse sétuplo Espírito é relevante. Como o Espírito do Senhor. Ele é o
Espírito da profecia, o Espírito que opera na redenção. Sabedoria é o discernimento capaz
de ver através de uma situação e visualiza as coisas como são. (Compare João 2.24,25, onde
Jesus sabe o que há dentro do homem). Inteligência é a capacidade de discernir entre o bem
e o mal, independentemente das aparências externas. Conselho é a capacidade de ponderar
os fatos e de chegar às conclusões certas. Fortaleza é a coragem e o poder para cumprir a
vontade de Deus. Conhecimento é o conhecimento pessoal de Deus que advém da
comunhão com Ele em amor. O temor do Senhor é uma reverência que exalta a Deus e que
é o princípio de toda a sabedoria (Jó 28.28; Salmos 111.10; -Provérbios 1.7; 9.10). O
Menino nascido de uma virgem, o novo Davi, teria tudo isso como sua possessão
permanente, desde o momento em que o sétuplo Espírito descesse sobre Ele. (Ver
Apocalipse 4.5; 5.6, onde o sétuplo Espírito não somente arde diante do trono de Deus,
como também é ativo, mediante a autoridade do Cordeiro que foi morto).(u)
Porque o Espírito Santo estará sobre Ele, não "julgará segundo a vista dos seus olhos,
nem repreenderá segundo o ouvir dos seus ouvidos" (11.3). Tudo o que os homens comuns
podem fazer é decidir na base do que recebem através dos seus sentidos; sendo assim, os
Juízes e os jurados freqüentemente cometem enganos. Mas o Filho ungido pelo Espírito
Santo não cometeria nenhum engano.
A parte seguinte do capítulo (11.6-9) passa adiante, para as condições no Milênio. Os
profetas não conheciam o intervalo de tempo entre a primeira e a segunda vinda de Cristo.
Mas a ênfase de Isaías recai sobre o fato de que o ministério do Espírito Santo através do
Messias continuaria, e que as condições ideais para o porvir também seriam geradas
pelo Espírito Santo.
Naquele dia, Isaías acrescenta, "o Senhor dos Exércitos será por coroa gloriosa, e por
grinalda formosa, para os restantes de seu povo; e espírito de juízo [justiça], para o que se
assenta a julgar, e por fortaleza [força corajosa, como em Isaías 11.2] para os que fazem
recuar a peleja até à porta" (Is 28.5,6). Percebemos, com isso, que o mesmo sétuplo Espírito
que repousa sobre o Messias também ficará disponível ao povo.
O Servo Ungido
A parte seguinte do livro de Isaías fala freqüentemente do Servo do Senhor; Aquele
que realiza a sua obra. Israel fora chamado para servo de Deus (Isaías 41.8), mas Jeová tinha
uma obra de salvação que o povo israelita não podia realizar. Dentre eles, portanto, surgiria
Aquele, o Servo do Senhor, o que realmente cumpriria a totalidade da obra de Jeová e que
levaria a efeito a sua salvação.
Isaías 42.1 o apresenta como o Escolhido, em quem Deus se deleita. Jeová colocaria
sobre Ele o seu Espírito, pelo qual Ele produziria juízo (as decisões de Deus que são a base
da religião verdadeira e prática) entre os gentios (todas as nações do mundo). Esse Servo
seria o mediador do concerto de Deus, seria luz para os gentios (42.6), abriria os olhos dos
cegos, e tiraria os presos da prisão do pecado, para a liberdade (42.7).
Em Isaías 61.1 esse mesmo Servo do Senhor (12) diz a respeito de si mesmo: "O
Espírito do Senhor JEOVÁ está sobre mim; porque o Senhor me ungiu para pregar boas
novas aos mansos [pobres, humildes]; enviou-me para restaurar os contritos de coração, a
proclamar liberdade aos cativos [prisioneiros tomados nas batalhas espirituais contra o
pecado e Satanás], e a abertura [soltura, libertação] de prisão aos presos". Além disso, Ele
proclama "o ano aceitável do Senhor [o ano ou período da graça de Deus, demonstrado
pelas suas bênçãos] e o dia da vingança do nosso Deus” (61.2). Mais uma vez, Isaías, assim
como Joel, não percebe o intervalo de tempo entre a primeira e a segunda vinda de Cristo.
A ênfase nesse trecho, no entanto, recai sobre o ano aceitável do Senhor, sobre as
boas novas que o Servo ungido traria. E possível que "o ano aceitável" seja uma maneira de
dizer que o Messias faria algo maior e mais profundo do que o Ano do Jubileu representava
para Israel. No Ano do Jubileu, heranças perdidas eram recebidas de volta (Levítico 25.10-
13). A vinda do Servo ungido importaria em seu povo entrar nas bênçãos de Deus e na
herança que Ele tem para os seus.
Tudo isso subentende a salvação que Ele traz. Esse Servo, em Isaías 61.1, não é
somente Aquele de Isaías 42; Ele é o Servo que tomou sobre si as nossas enfermidades,
levou sobre si as nossas dores, e por cujas pisaduras somos sarados; Aquele que sofreu e
morreu em nosso lugar pela nossa redenção (Isaías 52.13 a 53.12).
Ele é Aquele, também, que foi enviado por Deus com seu Espírito, conforme Isaías
48.16 (onde o hebraico significa "o Senhor JEOVÁ me enviou e enviou o seu Espírito").
Deus o comissionou e o enviou para cumprir o propósito divino, e ser o Restaurador de
Israel e Luz para os gentios (Isaías 49.6). E Ele o que tem a língua erudita (porque Ele é
ensinado por Deus) para encorajar os cansados (aqueles que estão exaustos ou prontos a
desistir), e também o que dá as costas aos que o ferem (Isaías 50.4,6). Ele recupera aqueles
que estavam desesperançosamente, sem mais recursos próprios (Isaías 42.3); e Ele mesmo
"não faltará [não passará a ser luz sombria] nem será quebrantado [esmagado], até que
ponha na terra o juízo [estabeleça a justiça e a religião prática]; e as ilhas [inclusive todas as
terras distantes] aguardarão [com expectativa] a sua doutrina [a respeito dele mesmo]"
(42.4).
4
O ESPÍRITO NA VIDA E NO MINISTÉRIO DE JESUS
O que aconteceu com a religião judaica nos 400 anos após Malaquias? A opinião
comum é que degenerou em observâncias de formas e cerimônias vazias. Realmente, assim
aconteceu. Os fariseus anularam muitas exigências da Lei por meio das tradições que
desenvolveram (Mateus 15.3,6; Marcos 7.8-13). Os saduceus também tiveram as suas
tradições, bem como os essênios que copiaram os Rolos do Mar Morto.
Lucas, no entanto, desde o início do seu evangelho, deixa claro que os judeus não
perderam completamente nem o conceito nem a experiência do Espírito Santo. O Espírito
atuou nos eventos que antecederam e acompanharam o nascimento de Jesus, bem como no
seu próprio nascimento, vida e ministério. Na realidade, embora as referências ao Espírito
Santo no ministério de Cristo sejam muito relevantes, o evangelho de Lucas menciona o
Espírito mais freqüentemente nos dois primeiros capítulos do que em todo o restante do
livro.
O Poderoso Batizador
João Batista viveu no lugar predito por Isaías. (Deserto, Isaías 40.3, em hebraico é
Arabá, o nome do vale do baixo Jordão, próximo do Mar Morto). Conforme a profecia,
conclamava ao arrependimento e batizava aqueles que vinham e confessavam os seus
pecados. Recusava-se, porém, a batizar, a não ser depois que a pessoa tivesse se arrependido
sinceramente. Quando vinham os fariseus e os saduceus, João Batista, como um profeta
cheio do Espírito Santo, reconhecia que não havia mudança nas atitudes deles. Exigia que
produzissem frutos ou evidências do arrependimento, antes de batizá-los. Eram presunçosos
e autoconfiantes, pelo fato de serem descendentes de Abraão. João, porém, mostrava-lhes
que isso não os protegeria do julgamento vindouro, e declarava: "E eu, em verdade, vos
batizo com [em] água, para o arrependimento [isto é: por causa do arrependimento, visto
que já indicara que seu batismo não podia produzir arrependimento]; mas aquele que vem
após mim é mais poderoso do que eu; cujas alparcas não sou digno de levar; ele vos batizará
com [em] o Espírito Santo, e com [em] fogo" (Mt 3.11).
O Propósito do Fogo
O propósito do batismo com fogo é uma questão polêmica. Muitos dos que sustentam
um único batismo com o Espírito Santo e com fogo, dizendo que o fogo e o Espírito atuam
juntos para afetar a pessoa batizada, entendem que o fogo significa a purificação ou a
santificação do crente. Mas a obra do batismo com o Espírito Santo não parece ser
primariamente de santificação. Paulo ordenou os crentes, que foram cheios do Espírito,
considerarem-se mortos para o pecado e vivos para Deus. Não devem permitir que o pecado
reine em seu corpo (Romanos 6.11,12). É verdade que, mediante o Espírito, devemos
mortificar (fazer morrer) as ações do corpo, a fim de que vivamos. Mas, em grego, trata-se
do tempo presente contínuo. Devemos continuar mortificando as obras malignas do corpo, e
assim continuaremos a viver (Romanos 8.13). É verdade, também, que estamos mortos, e
que nossa vida está oculta com Cristo em Deus (Colossenses 3.3). Mas o próprio fato de
termos essa posição em Cristo significa que temos uma responsabilidade pessoal de
mortificar (mediante ação direta) nossos membros na
Terra (ou seja: aquilo que é terrestre em nós), que Paulo identifica com as
concupiscências da carne e do espírito (Colossenses 3.5). O próprio Jesus associa o batismo
no Espírito com o poder para o serviço, mais do que com a purificação ou a santificação
(Atos 1.8). A santificação (dedicação, consagração a Deus e à sua vontade) virá, tanto
através de atos específicos de autodisciplina, como também através da cooperação contínua
com o Espírito Santo, à medida que Ele aplica a Palavra (conforme veremos
posteriormente).
Zelo Ardente
Os que entendem ser o Espírito e o fogo uma só experiência, identificam o fogo com
zelo ou entusiasmo, juntamente com iluminação e dons espirituais.(8) Muitos deles
realmente possuem "fogo ardente" nesse sentido. Romanos 12.11 fala do fervor, do zelo
ardente no Espírito. 1 Tessalonicenses 5.19 ordena os crentes não apagarem o fogo do
Espírito. O mesmo fervor é subentendido na "ousadia" que veio como resultado da plenitude
do Espírito (Atos 4.31). Essa ousadia é confiança, liberdade, coragem e zelo ardente,
maravilhosos e jubilosos. Realmente, temos o direito de pedir que Deus mande esse fogo!
A Bíblia não fala de um batismo com fogo, quando se dirige aos crentes, no entanto.
O evangelho de João, que se dirige aos cristãos, menciona apenas o batismo com o Espírito
Santo (João 1.33). Em João, a água, e não o fogo, é o principal símbolo do Espírito. Jesus
também, ao falar com seus discípulos, menciona somente o batismo com o Espírito Santo
(Atos 1.5).
Muitos identificam as línguas de fogo no Pentecoste com um batismo de fogo.(9)
Essas línguas, no entanto, precederam o batismo pentecostal, e nada tinham a ver com ele.
Quando os 120 foram cheios do Espírito Santo, o sinal foi falar noutras línguas, e não a
manifestação do fogo (Atos 2.4). Na casa de Cornélio, o dom do Espírito, recebido pelos
gentios, é identificado com o batismo no Espírito Santo. É chamado o "mesmo" dom
(idêntico). Mas não há menção do fogo (Atos 10.44,45,47; 11.15-17). Em Atos, está
declarado que Estêvão e Barnabé eram cheios do Espírito Santo e de fé, mas nada é dito a
respeito do fogo (Atos 6.5; 11.24). De fato, nada é dito no livro dos Atos, em algum lugar, a
respeito dos crentes ficarem cheios de fogo. A terminologia é sempre que foram cheios do
Espírito Santo.
O Fogo do Juízo
Quando Jesus fala sobre o fogo, refere-se ao do juízo ou da destruição, especialmente
o Inferno (gehenna), que é o lago de fogo. (Mateus 5.22; 18.8,9). O mesmo se aplica às
epístolas (1 Coríntios 3.13; 2 Tessalonicenses 1.8; Hebreus 12.29; 2 Pedro 3.7).
No contexto da profecia de João Batista a respeito do batismo com o Espírito Santo e
com fogo, a Bíblia mostra que ele acabara de advertir a respeito da ira vindoura (Mateus
3.7). Os versículos contextuais dessa promessa do batismo com fogo falam de árvores
cortadas e lançadas no fogo, e de palha queimada com fogo inextinguível (fogo que, pela
sua própria natureza, nunca será apagado; noutras palavras: o lago de fogo). Seria estranho,
se o fogo em Mateus 3.10 e 12 significasse uma coisa, ao passo que, sem a mínima
explicação, significasse outra bem diferente no versículo 11.(10) Desde a antigüidade,
muitos têm reconhecido que o batismo no fogo realmente significa julgamento,(n) embora
essa idéia tenha causado controvérsia.
Nesse sentido, também, conservemos em mente que João Batista não sabia a
diferença cronológica entre o batismo com o Espírito Santo e com fogo. Quando ele foi
lançado no cárcere, provavelmente isso o perturbava. Jesus curava os enfermos e perdoava
pecados, mas não trazia juízo. Na realidade, Herodes e Herodias, que mereciam o juízo,
eram os que mantinham João Batista no cárcere. Por isso, ele enviou dois discípulos para
perguntar se Jesus realmente era Aquele que estava para vir, ou se era apenas outro
precursor semelhante a ele. Jesus, então, mostrou aos discípulos que realizava de fato as
obras do Prometido (Mateus 11.1-6; ver também Isaías 29.18,19; 35.5,6; 61.1).
Jesus deixava claro que não viera desta vez para condenar o mundo, mas, sim, para
salvá-lo (João 3.17). Em Nazaré, quando leu Isaías 61.1,2, deliberadamente fechou o livro
antes de chegara "o dia da vingança do nosso Deus" (Lucas 4.19,20). Sua espada era para
estabelecer a linha divisória entre os que o aceitavam, e os que não o desejavam. Não era a
do juízo nem da destruição (Mateus 10.34; Lucas 12.51).
5
O ESPÍRITO NOS ENSINAMENTOS DE JESUS
Jesus não apresentou ao povo muitos ensinamentos sobre o Espírito Santo. A maior
parte dessa doutrina foi transmitida em particular aos seus discípulos, especialmente durante
as últimas horas antes de ir ao Getsêmani, conforme registra o apóstolo João. Os demais
evangelhos, no entanto, também contêm algumas declarações significantes.
Conforme já notamos, Jesus reconhecia a inspiração do Espírito Santo nos escritos do
Antigo Testamento (Marcos 12.36; Mateus 13:14; Lucas 20.42), bem como a obra do
Espírito no tocante ao Messias. Mas, nesses evangelhos, Ele deu aos seus discípulos
ensinamentos específicos no tocante a quatro coisas sobre o Espírito Santo. Em primeiro
lugar, Ele reconhecia que o Espírito é uma dádiva de Deus, a chave para tudo quanto o
Senhor tem para nos dar (Mateus 7.7-11; Lucas 11.9-13). Em segundo lugar, Ele prometeu
que o Espírito estaria com seus discípulos para ajudá-los no ministério e ungi-los, mesmo no
meio da perseguição (Mateus 10.16-20; Marcos 13.9-11; Lucas 12.11,12; 21.12-15). Em
terceiro lugar, Ele ordenou que batizassem os crentes em nome do Pai e do Filho e do
Espírito Santo (Mateus 28.19). Em quarto lugar, Ele determinou que esperassem em
Jerusalém até serem revestidos de poder do alto (Lucas 24.49), do poder do Espírito Santo
que os transformaria em testemunhas (Atos 1.8). Além disso, há referências a símbolos tais
como o óleo nas lâmpadas das virgens (Mateus 25.3,4,8), que é considerado uma figura do
Espírito Santo presente no coração do crente.(1)
6
O ESPÍRITO EM ATOS DOS APÓSTOLOS
Atos dos Apóstolos, de início, registra que a obra de Jesus foi continuada pelo
Espírito Santo, através dos apóstolos. Eles, no entanto, não predominam no livro dos Atos,
mas o Espírito Santo.O Jesus é o assunto principal nos evangelhos e, em comparação, pouco
é dito sobre o Espírito Santo. Mas, em Atos, o Espírito Santo é o Consolador, Ajudador e
Mestre. Tudo na vida e na pregação dos apóstolos e dos crentes primitivos se centralizava
em Jesus como Salvador vivo e Senhor exaltado. O desejo de estender o Evangelho até os
confins da Terra era de Cristo (1.8). Mas o poder para realizá-lo era do Espírito Santo, igual
ao de Cristo.(2) Mesmo assim, percorre pelo livro uma nova consciência do Espírito Santo.
Provinha, não somente da sua experiência pentecostal inicial, mas da consciência diária da
presença, da orientação e da comunhão do Espírito e de muitas manifestações do seu poder.
O batismo com o Espírito Santo nunca se tornou em mera lembrança de alguma coisa que
ocorrera no passado distante. Era uma realidade sempre presente.(3)
Jesus preparou, através do Espírito Santo os apóstolos. Mas isso não significa que o
Espírito não pudesse operar através de outras pessoas, ou que a direção da Igreja fosse
entregue aos apóstolos. O Espírito Santo comandaria tudo. Ele usaria a quem desejasse.
Muitos discípulos levaram o Evangelho por onde passavam, após a morte de Estêvão, ao
passo que os apóstolos permaneceram em Jerusalém (Atos 8.1,4; 11.19-21). Ananias foi
enviado para impor as mãos sobre Saulo de Tarso (9.10,17). Tiago, irmão de Jesus, que não
era apóstolo, teve sua proposta aprovada no Concilio de Jerusalém, e assumiu a direção da
igreja em Jerusalém, no decorrer do tempo (Atos 15.13; Gálatas 2.12).
O livro de Atos demonstra, no entanto, que os apóstolos foram as primeiras
testemunhas da Ressurreição e dos ensinos de Jesus. As condições impostas para a seleção
de um sucessor de Judas esclarecem isso, pois precisava ser um dos que costumeiramente
reuniram com os doze e viajavam com eles durante o ministério terrestre de Jesus, de modo
que pudesse ser testemunha dos ensinamentos de Cristo. Tinha, também, de ser testemunha
da Ressurreição e da doutrina que Jesus ensinou após esse evento (Atos 1.21-25). Paulo fala
de seu apostolado, não pelo fato de ter sido enviado por Cristo "(apóstolo é um enviado com
uma comissão), mas por ter sido testemunha, em primeira mão, tanto da Ressurreição como
das palavras de Jesus. Ele não recebeu dos homens o Evangelho que pregava, mas do
Senhor Jesus (Gálatas 1.11,12,16-19; 2.2,9,10). Na realidade, ele freqüentemente chamava a
atenção ao fato de que podia provar o que dizia, citando declarações de Jesus (1 Coríntios
7.10).
Além disso, as visitas dos apóstolos não eram uma supervisão ou uma sanção
apostólica, mas um desejo de estabelecer igrejas. Foi assim que Pedro e João ajudaram a
Filipe (8.14). Mas não disseram o que ele deveria fazer em seguida. Primeiramente, um
anjo, e depois o Espírito Santo deu-lhe orientação (8.26,29). Quando alguns discípulos,
cujos nomes não são mencionados, levaram o Evangelho aos gentios em Antioquia, Barnabé
foi enviado para ajudá-los. Ele também era apóstolo (14.14), mas a ênfase recai no fato de
ser um homem bom e cheio do Espírito Santo e de fé (11.24). Logo, era o Espírito Santo, e
não os apóstolos, quem dava a orientação. Por essa razão, temos razões justificáveis para
nos referir a este livro como os Atos do Espírito Santo.
Desde o princípio, percebe-se a preeminência do Espírito Santo. Não somente as
últimas palavras de Jesus foram dadas mediante o Espírito Santo, mas também essas
instruções tinham a ver com Ele.
Jesus solicitou que eles não saíssem de Jerusalém (Atos 1.4). O derramamento no dia
de Pentecoste jamais teria tido aquele efeito, nem teria atraído tanta atenção, se apenas cinco
ou seis pessoas tivessem permanecido. Jesus queria que a Igreja tivesse um bom começo.
Além disso, o livro dos Atos ressalta repetidas vezes a união de um agir "unanimemente",
de maneira que o Espírito Santo cumpria a oração de Jesus em João 17. Era importante que
os discípulos estivessem juntos num só lugar, a fim de que essa união fosse fomentada e
suas bênçãos concretizadas.
A Promessa do Pai
Em seguida, Jesus mandou-lhes esperar a promessa do Pai, identificada com o
batismo no Espírito Santo. É assim chamada, porque foi Ele quem providenciou o
derramamento prometido, conforme Jesus já lhes ensinara. Ele pediria ao pai e este enviaria
o Espírito Santo.
É chamado de batismo para lembrar-lhes a profecia de João Batista, registrada em
todos os quatro evangelhos, de que Jesus os batizaria com o Espírito Santo. Embora seja o
Pai quem envia o Espírito Santo, o Filho participa nessa obra, conforme já vimos, e é Ele o
Batizador. O nome "batismo" é usado, também, para compará-lo com o de João e, ao
mesmo tempo, para distingui-lo daquele. João batizava nas águas. Jesus, com o Espírito
Santo. O crente deve submeter-se a Jesus, entregar-se a Ele, antes de ser batizado. Mas o
contraste entre a água e o Espírito é grande em todos esses textos. O batismo de Jesus nada
tem a ver com a água.
O batismo de João era mera preparação para a nova dispensação do Espírito Santo,
ao passo que o batismo de Jesus realmente é uma parte dela. Alguns pensam que a
expressão "batismo no Espírito Santo" não é usada nas epístolas a respeito dos crentes, e
limitam o batismo com o Espírito Santo à própria inauguração da nova dispensação no dia
de Pentecoste. Supõem, também, que outras referências em Atos ao batismo com o Espírito
Santo sejam meramente uma extensão daquela inauguração, primeiramente aos samaritanos
(onde é subentendido em Atos 8.15,16), e depois aos gentios na casa de Cornélio (11.16).(4)
Baseados nisto, alguns entendem que o batismo com o Espírito Santo foi dado uma
só vez, e que não houve mais batismos, senão "enchimentos". Supõem que Deus supriu à
Igreja com o Espírito Santo de uma só vez. Interpretando desse modo, a Igreja seria a fonte
de onde tiramos as reservas do Espírito.(5)
Deus, no entanto, não deu o Espírito Santo no propósito de colocá-lo na Igreja como
se Ele estivesse separado do Céu, ou no sentido de doá-lo. Quando recebemos o Espírito
Santo, não há falta dele no Céu. Ele está no Céu, na Igreja e em nossos corações ao mesmo
tempo. Deus é o Doador, e Jesus, o Batizador. A Igreja não é um reservatório que recebeu
uma única doação do Espírito, para todo o sempre. (6) Jesus pede ao Pai, à medida que nos
apresentamos e este nos concede o Espírito Santo. É importante lembrar que o batismo com
o Espírito é imersão num relacionamento com uma pessoa divina, e não em um fluido ou
numa influência. É um relacionamento que pode continuar a crescer e expandir-se. Sendo
assim, o batismo é apenas um começo, um envolvimento num ato distinto de obediência e
de fé, da nossa parte.
Mas o que aconteceu no dia de Pentecoste não foi somente batismo. Muitos outros
termos são empregados, pois o Espírito Santo é uma pessoa, e o batismo pode retratar um só
aspecto da experiência. A Bíblia emprega freqüentemente uma variedade de figuras de lin-
guagem para ressaltar vários aspectos da experiência e do relacionamento. A Igreja é uma
noiva, uma esposa, um corpo, um edifício, um templo, uma vinha, uma videira, uma coluna
e uma assembléia de cidadãos. Nenhuma figura de linguagem pode, isoladamente, ressaltar
tudo quanto ela é. Os cristãos são filhos, herdeiros, adotados, renascidos, nova criação,
servos, amigos, irmãos. Da mesma forma, nenhum termo isolado pode ressaltar todos os
aspectos dos nossos relacionamentos. Logo, nenhum termo isolado pode ressaltar todos os
aspectos do que aconteceu no dia de Pentecoste.(7)
Foi, de fato, um batismo, mas a Bíblia também diz que foi um enchimento. "E todos
foram cheios do Espírito Santo" (2.4). Foi um derramamento do Espírito sobre eles,
conforme profetizou Joel (2.28-32). Foi um recebimento (uma aceitação ativa) de uma
dádiva (2.38); um cair sobre (8.16; 10.44; 11.15); um derramamento do dom (10.45); e uma
vinda sobre (19.6). Com todos esses termos empregados, é impossível supor que o batismo
se refira a algo diferente de enchimento ou plenitude, ou que a experiência pentecostal foi
limitada ao dia de Pentecoste. Nem devemos supor que a falta do uso da expressão "batismo
no Espírito" nas Epístolas é relevante.
Talvez seja possível, porém, ver no termo batismo outra comparação com João
Batista. Ele continuava a batizar nas águas, enquanto as pessoas vinham a ele pedir o
batismo. Devemos reconhecer que o batismo é algo que acontece aos indivíduos. Embora
todos fossem cheios no mesmo momento no dia de Pentecoste, a própria plenitude foi uma
experiência individual. Devemos esperar, portanto, que Jesus, tendo em vista a profecia de
João Batista, continue a batizar com o Espírito Santo, enquanto os cristãos venham a Ele
para recebê-lo.
Esperando
A ordem de Jesus, para que os discípulos não se ausentassem de Jerusalém, foi
necessária somente para essa ocasião. Não havia mais necessidade de protelação, depois do
dia de Pentecoste. Mas o Pentecoste, com seu simbolismo de colheita, era importante no que
o propósito do batismo no Espírito era poder para o serviço, especialmente nas searas deste
mundo (1.8).
Foi um período de preparação? Alguns entendem assim. Mas a evidência é que a
preparação foi feita durante os 40 dias, pelo próprio Jesus. Ele os ensinou, lidou com Pedro,
renovou a comissão deles, e depois ordenou-lhes que não iniciassem o ministério até que
fossem revestidos de poder. Esse não era um empreendimento humano. Não deviam
empregar sua própria engenhosidade para conquistar novas maneiras de difundir o
Evangelho. Deviam ser guiados pelo Espírito Santo que assumiria o comando.
Dedicaram-se às orações e súplicas no período de espera; todos participavam
unanimemente. Já estavam unidos uns com os outros em Cristo (1.14). Todos continuavam
alegres e (especialmente nas orações da manhã e da tarde) estavam continuamente no
Templo, louvando e bendizendo (agradecendo) a Deus (Lucas 24.52). O Espírito Santo já
operava na vida deles, mas ainda esperavam pelo batismo, o revestimento de poder (Lucas
24.49).
Além disso, dedicavam-se à Palavra, e o Espírito Santo, que falou por intermédio de
Davi, dirigiu-lhes para a profecia sobre Judas (1.16). Quando o Espírito Santo dirige a
atenção à Palavra, espera que ela seja correspondida, e, portanto, eles fizeram algo a
respeito e escolheram Matias como substituto de Judas. (Alguns argumentam que essa
escolha foi precipitada, pois Matias não é mais chamado pelo nome. Mas a maioria dos
discípulos também não é mencionada pelo nome em Atos, e Matias, certamente, é incluído
como parte dos doze em Atos 6.2).
Vento e Fogo
Não façamos distinção entre as plenitudes do Antigo e do Novo Testamento, nem
entre o batismo inicial e "os enchimentos" que se seguem. Embora a experiência pentecostal
fosse um avanço singular, nem o livro de Atos nem as epístolas paulinas contêm qualquer
sugestão de que o Espírito Santo fosse diferente do Espírito de Deus que atuou nos santos
do Antigo Testamento.(8)
Os sinais que antecederam o derramamento pentecostal fazem uma conexão entre ele
e as experiências do Antigo Testamento, bem como com as promessas daquela aliança. O
dia de Pentecoste era a festa da colheita dos frutos da terra. Para a Igreja, marcava o dia em
que a colheita espiritual, esperada há tanto tempo, começaria. Mas, antes de vir o
derramamento do Espírito Santo, dois sinais incomuns estabeleceram maior relação com o
simbolismo do Antigo Testamento. Primeiro, vem do céu um som, como de um vento
veemente e impetuoso. Embora não houvesse vento físico, o som encheu a casa. No Antigo
Testamento, o vento era um símbolo constante do Espírito Santo. O som de um vento
impetuoso, de um vento que traz em si poder, sugere que era mais do que "o respirar do
Espírito" na regeneração que traz a nova vida. Mais uma vez, trata-se do poder para o
serviço.
Surgiram, então, "línguas repartidas como que de fogo, as quais pousaram sobre cada
um deles". A palavra "repartidas" significa "distribuídas". Apareceu algo semelhante a uma
grande chama sobre os discípulos. Em seguida, desfez-se, e repartiu-se em várias línguas
que pousaram sobre as cabeças de cada um deles.
Esse não foi, em nenhum sentido, um batismo de fogo. Nem era julgamento ou
purificação, como alguns supõem.(9) Tratava-se de pessoas cujos corações e mentes tinham
sido abertos para os ensinamentos do Jesus ressurreto, pessoas cheias de alegria e de louvor
a Deus, pessoas que já tinham sido purificadas, que já atentavam a sua Palavra, que já
estavam de comum acordo. O fogo aqui deve ser relacionado, não com o julgamento ou a
purificação, mas com o simbolismo do Antigo Testamento.
O Antigo Pacto registra um progressivo desenvolvimento no tocante à adoração.
Antes, era realizada diante de um altar, como no caso de Abraão. Depois, Deus ordenou que
seu povo edificasse o Tabernáculo no deserto. O fogo desceu do Céu sobre um sacrifício
que ali estava, como prova de que Jeová aceitava o novo santuário. Mas isso só aconteceu
uma vez. O evento se repete quando Salomão edificou o Templo. Novamente, o fogo desceu
e consumiu o sacrifício, como aprovação daquela obra. Mas também aconteceu uma só vez.
Os prédios edificados por Zorobabel e Herodes eram reconstruções do mesmo Templo, de
modo que o sinal não mais se repetiu.
O Templo estava para ser destruído. (Deus concedera-lhe mais alguns anos de
existência, até 70 d.C.) Os cristãos, unidos fraternalmente, eram sacrifícios vivos (Romanos
12.1), além de sacerdotes e pedras vivas para o Templo (1 Pedro 2.5). Este novo edifício
tem duplo sentido. O Corpo dos cristãos em união é o templo (santuário) para a habitação de
Deus, pelo seu Espírito Santo (Efésios 2.21,22; 1 Coríntios 3.16). Além disso, o corpo de
cada um, individualmente, é um templo ou santuário do Espírito Santo (1 Coríntios 6.19). A
aparência do fogo veio sobre o grupo, para indicar a aceitação, por Deus, do Corpo Místico
como um templo. Depois, repartiu-se, como línguas sobre cada cabeça, para demonstrar a
aceitação, por Deus, do corpo de cada um deles como um templo do Espírito Santo.
Esses sinais não faziam parte do batismo pentecostal, nem dos dons do Espírito. Não
foram repetidos, da mesma forma que o fogo veio uma só vez sobre cada santuário nos
tempos do Antigo Testamento. Na casa de Cornélio, as línguas de fogo não estavam pre-
sentes, embora Pedro tenha identificado a experiência com a promessa de Jesus de que
seriam batizados com o Espírito Santo, e o tivesse chamado "o mesmo dom", idêntico com o
que os 120 receberam quando o Espírito Santo foi derramado no Pentecoste (Atos 11.15-
17). As línguas de fogo mostram que antes de o Espírito Santo ter sido derramado, os
crentes foram reconhecidos por Deus como o templo, o corpo de Cristo. A Igreja agora
estava em plena existência, tendo o Cristo glorificado como sua Cabeça. Os membros do
Corpo agora estavam prontos para receber a promessa.
Outras Línguas
Um só sinal fazia parte do batismo pentecostal. Todos os que foram cheios do
Espírito Santo começaram a falar em outras línguas, conforme o Espírito Santo lhes
concedia que falassem. Isso quer dizer que faziam uso das suas línguas, dos seus músculos.
Falavam. Mas as palavras não brotavam das suas mentes ou do seu pensamento. O Espírito
lhes concedia que falassem, e expressavam as palavras com ousadia, em voz alta, e com
unção e poder.
Isso é interpretado de várias maneiras. Alguns se detêm no versículo 8 ("Como pois
os ouvimos, cada um, na nossa própria língua em que somos nascidos?") e supõem que
todos os discípulos falaram em sua língua materna, aramaico, e que se tratava de um milagre
de audição ao invés de fala. Mas os dois versículos anteriores são muito claros. Cada um os
ouvia falar na sua própria língua, sem o sotaque galileu.
Outros chegam a um meio-termo, e dizem que os discípulos falavam em línguas
desconhecidas, que o Espírito Santo interpretava nos ouvidos de cada um dos ouvintes em
sua própria língua. Mas Atos 2.6,7 exclui essa interpretação, também. Os 120 falavam em
idiomas que foram compreendidos por pessoas de diversas nações. Esse fato testemunhou a
universalidade do dom e da unidade da Igreja.
Outro equívoco é a suposição de que essas línguas eram propícias para a pregação e o
ensino do Evangelho, a fim de favorecer sua rápida disseminação. Mas não há evidência de
semelhante emprego de línguas. Teria sido útil para Paulo em Listra, onde ele não entendia
o idioma, e tinha de pregar e ensinar em grego (Atos 14.11-18).
No dia de Pentecoste, o falar em outras línguas realmente atraiu a multidão, mas o
que foi ouvido não consistia em discursos nem pregações. Tratava-se, pois, das grandezas
(obras grandiosas, magníficas, sublimes) de Deus. É possível que houvesse exclamações de
louvor, dirigidas a Deus. Certamente era adoração, e não pregação. Se fosse pregação, teria
levado à salvação de pelo menos alguns (1 Coríntios 1.21). Mas ninguém foi salvo por causa
das línguas.
Pelo contrário, as pessoas se maravilhavam (ficaram atônitas) e em suspense
(perplexas, sem jeito), totalmente sem compreender de que se tratava (2.12). Entendiam o
significado das palavras, mas não o propósito. Ficaram confusas com o que ouviram.
Outros começaram a zombar, dizendo que os que falavam (homens e mulheres)
estavam cheios de vinho (não suco de uva, mas de um vinho inebriante, feito de uva doce).
O alvo da zombaria deles era o que ouviam. Há quem fala bastante, e em voz alta, quando
bebe. Não devemos, no entanto, supor que havia algum tipo de frenesi que caracterizava a
devassidão das bebedeiras pagas. Os 120 mantinham pleno controle das suas faculdades.
Sua emoção principal ainda era alegria. E todos pararam de falar, quando os apóstolos se
puseram de pé.
A medida que os 120 falavam em línguas, a zombaria aumentava; por isso, Pedro
levanta-se e começa a falar (2.15). À proporção que a multidão crescia, ficou mais difícil
distinguir cada idioma. É possível, também, que muitos, os quais se ajuntaram à multidão,
não estavam perto de quem falava um idioma que lhes era compreensível. Com a confusão,
cessaram-se as línguas, uma bênção para os cristãos, um sinal para os incrédulos, mas não
realizaram, nem poderiam realizar, a obra do Espírito Santo, a de convencer o mundo do
pecado, da justiça e do juízo. Até esse momento, somente os cristãos haviam recebido a
plenitude. O Espírito Santo, que os levou a glorificar a Deus em outras línguas, revelou-lhes
as verdades aos seus corações, de modo que sua alegria e emoção brotavam de uma
renovada apreciação de Deus e de Cristo.(12)
A obra do Espírito Santo, de convencer o mundo, começou quando Pedro se colocou
em pé e falou. O que proferiu não foi um sermão. Ele não o estudou, nem se preparou, nem
fez três divisões em sua preleção. "Levantou a voz" traduz o mesmo verbo que é usado em
2.4, quando o Espírito Santo concedia que falassem em línguas. Desta vez, porém, o
Espírito Santo usou Pedro em seu próprio idioma, o aramaico, que a multidão entendia. Em
outras palavras, em vez de um sermão, era a manifestação do dom de profecia (1 Coríntios
12.10; 14.3). Os 120 glorificavam a Deus a respeito das suas obras. Porém, Pedro falava aos
homens para edificação e exortação (Atos 2.40).
Que Faremos?
Quando o Espírito Santo convenceu a muitos, e revelou a culpa deles, perguntaram:
"Que faremos?" A resposta de Pedro também fez parte do pronunciamento profético do
Espírito Santo na forma de exortação: "Arrependei-vos [mudando de opinião e de atitude
básica quanto ao pecado, à justiça e ao juízo], e cada um de vós seja batizado em nome de
[segundo a autoridade de] Jesus Cristo [conforme é expressada em Mateus 28.19], para [por
causa de] perdão dos pecados; e recebereis [tomareis] o dom do Espírito Santo" (At 2.38).
Tenhamos em mente que o batismo nas águas é um testemunho, uma declaração, do que já
aconteceu no íntimo de cada um. Esse batismo não produz e nem transmite o perdão dos
pecados. A expressão grega faz um paralelo com o batismo de João, "para o
arrependimento", que significa "por causa do arrependimento", conforme demonstra o
contexto.
A palavra de Pedro foi, primeiramente, para o arrependimento, significando a
mudança da incredulidade para a fé. Porque creram, foram purificados e perdoados. O
batismo nas águas declarou a sua identificação com Cristo na sua morte (Romanos 6.3).
Logo, o próximo passo era (tomar, de modo real e ativo) o batismo com o Espírito Santo.
Fazendo Discípulos
Desde o dia de Pentecoste, vemos o Espírito Santo operando na Igreja - no ensino,
nos milagres, nas plenitudes, nos batismos, mas, acima de tudo, na disseminação do
Evangelho e no estabelecimento da Igreja.
A primeira evidência da obra do Espírito Santo foi a capacitação dos apóstolos a
fazer discípulos, verdadeiros estudantes, dos 3.000 que se converteram. Esse discipulado foi
desenvolvido mediante vários tipos de experiências: conhecimento da doutrina dos
apóstolos, comunhão, partir do pão e orações (Atos 2.42).
Parte dessas atividades realizava-se no Templo, pois muitos crentes o freqüentavam
diariamente (Atos 2.46), e os apóstolos lá compareciam todos os dias, ensinando e contando
as boas novas de Cristo (do Messias) Jesus (3.1,12-26; 5.42). Mas faziam a mesma coisa
diariamente, de casa em casa (5.42).
A doutrina dos apóstolos não era apenas teórica, no entanto. O Espírito Santo era
realmente quem ensinava. Ele usava o ensinamento da verdade para levá-los à comunhão
cada vez mais estreita, não meramente uns com os outros, mas primeiramente com o Pai e o
Filho (1 João 1.3,7; 1 Coríntios 1.9). Essa comunhão também era um compartilhar
espiritual, uma comunhão no Espírito Santo (2 Coríntios 13.13; Filipenses 2.1). Pode ter
sido incluída, ali, a participação da Ceia do Senhor. Mas a ênfase aqui não recai sobre o
ritual. O resultado da obra do Espírito Santo foi levar o povo a uma nova união (Atos 4.32).
Conforme indica Ezequiel 11.19, um só coração, a união de mente e de propósito,
acompanha a nova experiência no Espírito.(16)
Essa comunhão, essa união no Espírito, deu-lhes fé, amor e solicitude uns pelos
outros, que os levava a compartilhar seus bens com os que precisavam. (Ver Tiago 2.15,16;
1 João 3.16-18; 4.7,8,11,20). Nesse sentido, "tinham tudo em comum" (Atos 2.44,45). Não
se tratava de comunismo. "Comum" simplesmente significa "repartido". Ninguém dizia:
"Isso é tudo meu. Você não poderá ter parte nisso". Sempre que viam um irmão passando
necessidade, compartilhavam tudo quanto tinham (4.32). Alguns realmente vendiam
propriedades e davam o dinheiro da venda aos apóstolos, para distribuição (2.44; 4.37). Mas
não eram obrigados a fazer isso (Atos 5.4).
Boa parte desse compartilhar era realizada na comunhão à mesa. Ao partirem o pão,
nos seus lares, dividiam a comida com alegria e simplicidade de coração, louvando a Deus,
e gozando do favor com o povo, ou seja, com a maioria da população dos judeus em
Jerusalém (Atos 2.46,47). E o Senhor acrescentava à Igreja todos os dias os que iam sendo
salvos!
Períodos de oração também marcavam o discipulado deles. Estavam regularmente no
Templo, para as orações da manhã e da tarde. Um prolongado tempo era dedicado a oração,
quando enfrentavam a oposição e o perigo (Atos 2.42; 4.24-30; 12.5,12).
Os milagres, sinais que indicam a natureza e o poder de Jesus, e maravilhas que
mostram a presença de Cristo no meio deles, fortaleciam os crentes. Também fizeram com
que o medo, um espírito de temor e reverência, viesse sobre o povo (Atos 2.43). Mas o
poder do Espírito Santo, expresso nos milagres, fazia parte da vida espiritual. As pessoas
não percebiam que viviam em dois níveis - espiritual e natural. O Espírito Santo envolvia
suas vidas por inteiro.
A adoração, a comunhão com Deus, o partir do pão, o evangelismo e os milagres,
todas essas coisas concretizavam uma experiência unificada no Espírito Santo.(n)
A atuação do Espírito Santo na maioria dos crentes encorajava, assim, sua obra na
minoria. As necessidades e os perigos que tinham em comum levavam-nos a congregar-se
juntos. Era necessário o testemunho no Templo. Também era preciso o testemunho nos
grupos que se reuniam nos lares. Desde o início, o Espírito Santo os ajudava a manter o
equilíbrio sem incorrer nas formas vazias do ritualismo.
Plenitudes Renovadas
Evidência marcante de supervisão na Igreja pelo Espírito Santo era a concessão dos
dons espirituais, com o propósito de satisfazer novas necessidades e de enfrentar novos
desafios. O livro de Atos cita alguns exemplos destas bênçãos sobre indivíduos em
particular, e sobre a coletividade. Por falta de espaço, Atos cita apenas alguns exemplos do
que acontecia freqüentemente. A cura do coxo na Porta Formosa é uma amostra dos muitos
sinais e maravilhas realizados pelos apóstolos (Atos 2.43; 3.1-10).
O primeiro exemplo de renovação do poder é o de Pedro diante do Sinédrio que
condenara Jesus à morte. Amedrontado, Pedro anteriormente negara o seu Senhor. Dessa
vez, colocando-se em pé, cheio do Espírito Santo, deu uma resposta que proclamou a
verdade e glorificou a Jesus (Atos 4.8,10-12). A forma do verbo grego indica claramente
que essa foi de fato, uma nova plenitude. Ervin supõe que não podia ser assim, porque Pedro
já recebera a plenitude.(I8) Mas a idéia não é que tenha perdido alguma coisa da plenitude
anterior. Deus simplesmente aumentou a sua capacidade e derramou sobre ele o Espírito
Santo de novo, com toda a sua sabedoria e poder.
A mesma forma do verbo é usada em Atos 13.9, quando Paulo, "cheio do Espírito
Santo", enfrentou Elimas, o encantador, e o repreendeu. Paulo não repreendia usualmente as
pessoas dessa maneira. Mas a repreensão era do Espírito Santo, de forma especial. O castigo
sobre Elimas foi, portanto, a mão de Deus, o poder divino, e passou a ser a obra do Espírito
Santo para convencer o procônsul (governador provincial) de Chipre. Não foi o milagre por
si só que o convenceu, no entanto. O acontecido simplesmente deu testemunho do ensino e
da pregação, ungidos pelo Espírito, que lhe antecederam (13.7,12).
Depois do primeiro testemunho de Pedro diante do Sinédrio, ele e João "foram para
os seus", para o Cenáculo, onde se hospedavam e se reuniam. Então, depois de orarem,
"moveu-se o lugar em que estavam reunidos; e todos foram cheios do Espírito Santo, e
anunciavam com ousadia a Palavra de Deus" (Atos 4.31). Mais uma vez, a forma do verbo
indica uma nova plenitude. O Sinédrio lhes ordenara "que absolutamente não falassem, nem
ensinassem no nome de Jesus". Uma nova plenitude lhes deu a ousadia, a coragem e a
alegre confiança de falar a Palavra claramente. Aqui, também, a terminologia não é o que
importa. Plenitudes renovadas, novos enchimentos, novas unções, novas atuações do
Espírito, novas manifestações da mão ou do poder de Deus sempre estão disponíveis nas
necessidades.
Lutas Internas
Além das perseguições, a Igreja enfrentava lutas internas. Ananias e Safira tentaram
obter prestígio na Igreja ilicitamente. Essa foi a primeira manobra política que, às vezes,
coloca igrejas nas mãos de pessoas não-espirituais. Realmente, foi Satanás que encheu seus
corações para mentirem ao Espírito Santo, que é a mesma coisa que mentirem a Deus (Atos
5.3,4). O discernimento ou conhecimento de Pedro a respeito do que fizeram foi uma
manifestação do Espírito Santo.
O julgamento divino contra eles não somente livrou a Igreja do perigo, mas também
insuflou o temor a Deus nos crentes e nos incrédulos. Os cristãos foram despertados para
uma nova unidade no Espírito. Os demais cidadãos de Jerusalém não ousaram juntar-se com
eles sem mais, nem menos. Mas eram somente os insinceros que sentiam esse medo. Os
altos padrões de verdade e de honestidade levavam a maioria do povo a ter os apóstolos em
grande estima. Demonstravam isso ao trazerem seus enfermos para serem curados. "E a
multidão dos que criam no Senhor, tanto homens como mulheres, crescia cada vez mais"
(Atos 5.13-16).
Mais Ministérios
Estêvão e Filipe são exemplos de que essa plenitude do Espírito Santo, da sabedoria e
da fé levava a mais um ministério (Atos 6.5,8,10). Os sinais e as maravilhas que operavam
entre o povo eram nas mesmas proporções dos que foram operados pelos apóstolos (6.8;
8.5-8). Embora o testemunho de Estêvão o levasse à morte, ele permaneceu cheio do
Espírito Santo até o fim, e testificou da glória de Jesus como seu Senhor (7.55,56).(19)
Filipe, por outro lado, foi levado pelo Espírito Santo, não somente para testemunhar
na S amaria, mas também para evangelizar um eunuco etíope (8.29,38). Um antigo
manuscrito grego diz que o Espírito Santo veio, então, sobre o eunuco, e lhe deu outro
motivo para continuar jubiloso o seu caminho.(20) Ao mesmo tempo, o Espírito Santo
arrebatou e conduziu Filipe até a beira-mar. Passando por Cesaréia, fez dessa cidade seu
"quartel-general" para o prosseguimento de seu ministério. Anos mais tarde, era chamado o
evangelista. E não negligenciou a evangelização de sua família. Suas quatro filhas eram
cheias do Espírito Santo e profetizavam (Atos 21.8,9).
Barnabé também foi chamado um homem bom (nobre, digno), cheio do Espírito
Santo e de fé. Ele, também, exerceu um ministério ininterrupto. Sendo assim, não só
existiam plenitudes específicas para necessidades especiais; havia uma riqueza contínua, um
revestimento constante e poderoso do Espírito Santo, que destacava alguns como cheios do
Espírito.(21)
Rompendo Barreiras
Inicialmente, o Evangelho propagou-se somente entre os judeus e os prosélitos.
Embora o Antigo Testamento prometesse bênçãos e restauração para todas as nações, os
judeus desconsideravam esse fato. Preconceitos de longa data levantavam obstáculos entre
eles e os samaritanos, de um lado; e os gentios, do outro. Uma das obras mais importantes
do Espírito Santo para a propagação do Evangelho foi o rompimento dessas barreiras.
O primeiro passo foi dado como resultado da morte de Estêvão. Ao invés de impedir
o testemunho a respeito de Cristo, a perseguição resultante simplesmente espalhou a chama
em todas as direções (Atos 8.1). O livro de Atos menciona uma dessas direções como
exemplo. Filipe foi para Samaria. Ali, sua pregação e seus milagres convenceram o povo.
Muitos foram batizados nas águas para testemunho de sua fé (8.12). Nenhum deles, porém,
recebeu o batismo com o Espírito Santo. Não houve a experiência de o Espírito "descer"
sobre eles como no dia de Pentecoste (Atos 8.16,20).
Para os que sustentam que tudo é recebido através do batismo nas águas, este fato
apresenta uma dificuldade. Alguns supõem que o Espírito Santo foi recebido e que a
deficiência foi corrigida rapidamente. Mas é impossível explicar por que houve essa
deficiência nesse caso. Outros supõem que a fé dos samaritanos não era real, ou que não era
salvífica até que Pedro e João chegassem e orassem. Filipe, no entanto, era um homem
cheio do Espírito e de sabedoria. Ele, com certeza, teria discernimento e sabedoria
suficientes para não batizar as pessoas antes que verdadeiramente cressem em Jesus.
Outros sugerem que talvez Filipe não tivesse pregado a eles o Evangelho integral.
Porque os samaritanos tinham rivalidade com os judeus, é possível que os preconceitos de
Filipe o tenham impedido de contar aos samaritanos a respeito de todos os benefícios que
Cristo, como Salvador e Batizador com o Espírito Santo, oferece ao crente. Entretanto, não
se pode conceber esta idéia mediante o que achamos em Atos. Os discípulos não seriam
capazes de esconder uma parte da mensagem. Disseram: "Não podemos deixar de falar do
que temos visto e ouvido" (Atos 4.20). Filipe pregava a Palavra, anunciava a Cristo (8.4,5).
Os samaritanos creram no que ele ensinava sobre o reino (soberania) de Deus e do nome
(autoridade) de Jesus. Essas coisas estão, muitas vezes, associadas com a promessa do
Espírito Santo. Filipe deve ter incluído a exaltação de Jesus ao trono e à promessa do Pai.
O problema parece estar com os próprios samaritanos. Reconheciam que tinham sido
enganados, não somente por Simão, o mago, mas também por falsas doutrinas. É possível
que, decepcionados, achassem difícil dar o passo seguinte da fé. Quando Jesus deparava
com a fé, produzida por sua Palavra. Ele a chamava de grande, e as coisas aconteciam
(Mateus 8.10). Quando a fé se colocava acima dos empecilhos e das provações, Jesus a
chamava também de grande, e as coisas aconteciam (Mateus 15.28). Mas quando a fé era
fraca, Ele não destruía o pouco que havia: Ele a ajudava, às vezes, mediante a imposição de
suas mãos.
Quando os apóstolos vieram, impuseram sobre os samantanos as mãos, e eles
receberam o batismo com o Espírito Santo (8.15,17). Simão, o mago, ao contemplar isso,
recaiu na sua antiga cobiça e ofereceu dinheiro em troca da autoridade de impor suas mãos
nas pessoas para receberem o Espírito Santo.
A repreensão que Pedro fez a Simão, porque este pensava que o dom de Deus
pudesse ser comprado por dinheiro, é freqüentemente interpretada no sentido do mago
desejar colocar o dom à venda. Mas essa explicação não parece encaixar-se nos fatos, pois
os apóstolos nada cobravam, pois reconheciam que vinha da parte de Deus. Parece, pelo
contrário, que Simão simplesmente queria restaurar o seu prestígio entre o povo, ao tornar-
se um distribuidor autorizado do dom do Espírito Santo. Assim como alguns teólogos
modernos(22) entendeu erroneamente o que acontecera, e concluiu apressadamente que a
imposição das mãos era necessária para o batismo com o Espírito Santo. Muitos outros
trechos demonstram que não há necessidade disso. No Pentecoste e na casa de Cornélio, não
houve imposição de mãos. Quando Ananias impôs as mãos em Saulo (o apóstolo Paulo), foi
para a cura e não para o batismo com o Espírito Santo (23)
O que Pedro dá a entender é que tudo quanto é necessário para orarmos pelo
próximo, é recebermos primeiro para nós mesmos o dom. Simão, ao invés de reconhecer a
sua necessidade e pedir ajuda, ofereceu dinheiro para alcançar o dom. Não compreendia
esse assunto; não tinha parte nem sorte nele.
Alguma coisa, porém, aconteceu, quando Pedro e João impuseram as mãos sobre os
crentes; senão, Simão não compraria algo que surgia da autoridade deles. Simão já vira os
milagres de Filipe. O dom da profecia seria exercido no idioma dele, de sorte que o
sobrenatural não se destacaria. Permaneceria apenas o que atraiu a atenção da multidão no
dia de Pentecoste: O Falar noutras línguas conforme o Espírito lhes concedia que falassem
(Atos 2.4,33). As línguas, aqui, não eram a causa do problema. Por isso Lucas nada diz a
respeito delas, para chamar a atenção do erro de Simão.
Semelhantemente, Ananias disse que Jesus o enviou, a fim de que Paulo recuperasse
a vista e fosse cheio do Espírito Santo (9.17). Mesmo assim, a narrativa que se segue não
oferece pormenores a respeito de como Paulo recebeu a plenitude, nem menciona que ele
falou noutras línguas. Mas, da mesma forma, nos versículos anteriores que registram as
instruções que o Senhor deu a Ananias, Lucas não registra a promessa de que Paulo seria
cheio do Espírito Santo (9.11-16). Conforme acontece freqüentemente, Lucas não registra
detalhes, principalmente quando algo que aconteceu fica claro noutras passagens. (Por
exemplo, ele não menciona o batismo nas águas, quando registra uma conversão). Logo, o
que está escrito em Atos 2.4 por certo é aplicável aqui, pois Paulo afirmou posteriormente:
"Dou graças ao meu Deus, porque falo mais línguas do que vós outros" (1 Co 14.18).
Evidência Convincente
Em certa ocasião, a evidência da plenitude do Espírito, ou do batismo com o Espírito
Santo, tornou-se de grande valia. Nenhum outro preconceito, nenhuma outra barreira à
comunhão nunca foi tão grande como à que existia entre os judeus e os gentios. Embora
Jesus tivesse preparado seus discípulos para a divulgação do Evangelho em todas as nações,
e dado ordens nesse sentido, eles, segundo parece, entendiam que se tratava apenas dos
judeus espalhados entre as nações. O preconceito de Pedro era tão grande, que o Senhor lhe
repetiu uma visão três vezes, a fim de torná-lo sensível à voz do Espírito para entrar na casa
do centurião romano, Cornélio (Atos 10.16,19).
Pedro sabia que tal fato não seria aceito por seus companheiros, de Jerusalém. O
tornar-se cristão nunca remove imediatamente os preconceitos. Então, convidou seis cristãos
judeus como testemunhas (10.23; 11,12).
Enquanto ele pregava, o Espírito Santo desceu sobre todos, estando presentes os
amigos e os parentes de Cornélio. Os companheiros de Pedro ficaram atônitos, porque o
dom do Espírito Santo era concedido também aos gentios (10.45). A evidência que os
convenceu foi que "os ouviam falar línguas, e magnificar a Deus".
Pedro não se enganara quanto à recepção dele em Jerusalém. Tão logo retornou,
muitos o criticaram, por ele ter entrado na casa de um gentio e sentado à mesa, onde lhe
serviram alimentos impuros (11.3). Pedro contou, então, que o Espírito Santo veio sobre os
gentios como também sobre eles no princípio. Enfatizou, também, que se tratava do
cumprimento da promessa de Jesus, de que batizaria com o Espírito Santo sem acepção de
pessoas. Era, na realidade, o dom idêntico ao que eles tinham recebido (11.15-17).(24) Com
isso, os de Jerusalém cessaram suas objeções, e reconheceram que "até aos gentios deu Deus
o arrependimento para a vida" (11.18).
Mediante esta evidência, Pedro, então, afirmou: "Pode alguém porventura recusar a
água, para que não sejam batizados estes, que também receberam como nós o Espírito
Santo?" (10.47). Alguma coisa demonstrou que aquele acontecimento era idêntico ao que se
registrou em Atos 2.4, antes dos cristãos em Jerusalém se darem por satisfeitos. Pedro não
disse: "Espero que tenham recebido o derramamento, a experiência transbordante do
Pentecoste"; "Os gentios o aceitaram pela fé, de modo que acho que o receberam, creio que
receberam". Ele sabia que tinham recebido a plenitude, não porque eles testificavam, mas
por causa da manifestação do Espírito Santo através deles. O Espírito Santo ofereceu a
evidência: "Falavam em línguas, e magnificavam a Deus" (exatamente como em Atos
2.4,11).
Obviamente, o falar em línguas foi a evidência convincente. E nestes dias em que
vivemos, quando tantas pessoas buscam, esperam, crêem, e depois duvidam do recebimento
do batismo no Espírito, talvez ainda seja necessária uma evidência maior!
Há, no entanto, outros pormenores na interpretação desse trecho.
Alguns supõem que o fato de o Espírito Santo descer sobre os gentios, enquanto
Pedro ainda pregava, significa que a sua experiência de conversão e derramamento do
Espírito Santo era idêntica à do Pentecoste. Já notamos, no entanto, que em Jerusalém e
Samaria, os que receberam o dom já eram crentes antes de o Espírito Santo ter sido
derramado sobre eles. Posto que Pedro identifica o que aconteceu na casa de Cornélio como
o dom do Pentecoste, deve haver alguma distinção entre sua conversão e o dom do Espírito
Santo.
A solução se acha em Atos 10.36,37. A palavra que Cornélio e seus amigos
conheciam a respeito de Jesus tinha sido divulgada por toda a Judéia. "Vós" (v.37)é enfático.
Isso parece indicar que esses mesmos gentios conheciam os fatos a respeito de Jesus, que
incluiriam a promessa do Espírito Santo. A palavra de Deus prometida a Cornélio, por
intermédio de Pedro, não era simplesmente o Evangelho, mas as boas-novas "de que todos
os que nele [em Cristo] crêem, receberão o perdão dos pecados pelo seu nome" (10.43).
Alguns acreditam que Cornélio não somente conhecia o Evangelho, mas também
desejava aceitar a Jesus. Porque o Evangelho era pregado somente aos judeus, é possível
que ele tenha desejado converter-se ao Judaísmo, a fim de, posteriormente, tornar-se cristão.
Quer seja assim, quer não, fica claro que ele conhecia o Evangelho. Fica claro, ainda, que
Deus, através de um anjo, o deixou preparado para aceitar a mensagem que Pedro traria
(10.22,30-33). Isso significa, também, que os corações desses ouvintes estavam receptivos
para acolher o que Deus preparara para eles. Em uma fração de segundo, creram e foram
salvos. Em outro breve momento, receberam o derramamento, que Pedro entendeu ser o
batismo com o Espírito Santo. Logo, embora não houvesse um longo período de tempo,
tudo indica que foram dois eventos separados.
Pedro, no Concilio de Jerusalém (Atos 15.8), informou que o dom do Espírito Santo
foi a maneira de Deus dar testemunho dos gentios. Isso subentende que já eram convertidos.
O batismo com o Espírito Santo testificou que já eram crentes. Atos 15.9 menciona que
Deus purificara os seus corações pela fé. Mas o propósito de Pedro, ao mencionar esse fato
no fim do seu relato, não era o de indicar a ocasião em que aconteceu, mas para lhe dar
ênfase. A questão em pauta em Atos 15.9 era a da necessidade de os gentios guardarem a
Lei e serem circuncidados; por isso Pedro não estabelece um relato cronológico dos eventos.
Outros supõem que Atos 10.47 indica que a água era necessária para completar a
experiência. Mas os seus corações foram purificados pela fé, e não pela água (Atos
15.9).(25) O batismo nas águas, aqui referido, era tanto um reconhecimento pela Igreja de
que Deus aceitara esses gentios, como um testemunho diante do mundo de que eles
realmente se tornaram membros da Igreja. (26) Assim, pelo Espírito Santo, a barreira foi
rompida. Os gentios eram agora membros da Igreja em pé de igualdade com os judeus.(27)
Alguns problemas, quando estão ligados a preconceitos, tendem, porém, a surgir. A
conferência de Jerusalém se tornou necessária, quando os judeus cristãos voltaram a impor
restrições aos gentios e à sua salvação. Mas quando Pedro relembrou a obra do Espírito
Santo em Cesaréia; Paulo e Barnabé testificaram a respeito do que Deus realizava entre os
gentios, e Tiago transmitiu a palavra de sabedoria no Espírito Santo, os crentes concordaram
(Atos 15.8,9,12-29). A presença do Espírito Santo no meio deles foi suficiente para a
solução de quaisquer problemas, e estavam dispostos a atribuir a Ele o crédito por isso (Atos
15.28). (28)
7
O ESPÍRITO NO DIA-A-DIA
O livro de Atos demonstra que Paulo e seus companheiros estavam repletos
(continuavam cheios) de alegria e do Espírito Santo (Atos 13.52). As perseguições e as
aflições só os faziam avançar com mais alegria. Os convertidos também estavam cheios do
mesmo gozo (Atos 16.34). Era uma alegria que vinha, à medida que o Espírito Santo
elevava honra e glória a Jesus.
Paulo também glorificava a Jesus. Sua mensagem, seu ministério e sua vida
centralizavam-se em Jesus. Ele nunca se esqueceu da visão celestial (Atos 26.19). Falava
constantemente a respeito do estar com Cristo. Recusava-se a contentar os judeus com
sinais, ou os gregos com sabedoria (filosofia). Simplesmente pregava Cristo crucificado (1
Coríntios 1.22,23; 2.2). Então, seguiam-se os sinais na demonstração do Espírito Santo e do
poder (1 Coríntios 2.4). Ou seja: os sinais se seguiam, não para convencer os céticos, mas
como resposta à fé daqueles que creram. Um bom exemplo disso é a correspondência do
coxo em Listra à pregação de Paulo e à sua ordem (Atos 14.7-10).
Os escritos de Paulo revelam que o Espírito Santo era tão real e pessoal para ele
como também Jesus o era. Reconhecia o lugar de destaque que o Espírito Santo ocupava no
seu ministério, na Igreja, e na vida dos cristãos. Ele também ensinou sobre o Espírito Santo
e seus dons, especialmente em Romanos, 1 Coríntios e Efésios.
Romanos e Gálatas enfatizam o contraste entre a vida no Espírito Santo e a no mérito
pessoal sob a Lei, bem como a velha vida do pecado. Coríntios e Efésios destacam a obra do
Espírito Santo, tanto nos corações dos crentes como na Igreja. Mas em todas as Epístolas
paulinas, fica evidente a obra do Espírito Santo, mesmo em Filemom, que não menciona
especificamente o Espírito Santo. Assim acontece com os demais livros do Novo
Testamento, inclusive o Apocalipse.
Recebido pela Fé
Romanos e Gálatas tratam também dos mesmos assuntos. Gálatas, no entanto, foi
escrita no fragor da luta de Paulo contra os judaizantes. Romanos foi escrita posteriormente,
como um tratado mais generalizado do significado do Evangelho, a fim de preparar os
crentes em Roma para a chegada do apóstolo.
Paulo ficou surpreendido com os Gálatas. Como esses novos convertidos podiam
ouvir a pessoas que desejavam convencê-los a salvar-se pelos seus próprios esforços? Que
valor teria para eles guardarem a Lei e seguir os costumes judaicos de então? Jesus tinha se
revelado publicamente entre eles como o Crucificado. Isso era o suficiente para a salvação
deles.
Paulo, então, fez uma pergunta que lhes permitia uma resposta conclusiva:
"Recebestes o Espírito pelas obras da lei ou pela pregação da [que pedia somente] fé?"
(Gálatas 3.2; comparar Hebreus 4.2, "a palavra da pregação", e 1 Tessalonicenses2.13:"a
palavra da pregação da parte de Deus, que é transmitida por nós").
Obviamente, nada havia de vago ou indefinido no tocante à experiência dos crentes
Gálatas. Tinham recebido o Espírito Santo de uma forma gloriosa. Sabiam disso. Paulo
também. Ele nunca usaria a experiência deles nessa argumentação, se ela não fosse tão
específica quanto as experiências em Atos 2.4; 10.46; e 19.6.(3) E provável que tenham
correspondido à pregação de Paulo, com fé, aceitando a Cristo e também o batismo com o
Espírito Santo.
Paulo, então, pergunta: "Sois vós tão insensatos [destituídos de inteligência]? tendo
começado [feito um começo] no Espírito, agora sois aperfeiçoados mediante a carne?"
Alguns entendem que "começado no Espírito" se refere ao momento de se tornar cristão (o
mesmo sentido de "começar" que parece estar em Filipenses 1.6, onde afirma ter Deus
começado boa obra em nós, e a completará).(4) Parece, no entanto, que Paulo se refere ao
início de suas vidas cristãs, enquanto estava no meio deles. Ele compara aquele período,
cornos esforços atuais deles, carnais e humanos, de aperfeiçoar-se por meio de tentativas de
guardar a Lei.
O que se destaca no argumento de Paulo é o fato de que a fé é a chave de nossa
participação em toda a obra do Espírito Santo. Deus lhes concede o Espírito (continua dando
o Espírito em abundância, isto é, no transbordar pentecostal)? Ele opera milagres
(obras de tremendo poder) entre vocês? Em que base Ele faz isso: nas obras da Lei
ou na pregação da fé (ou seja: na base da fé na mensagem ouvida e na obediência a essa
mensagem)?(Gl 3.5)
A Lei, ao invés de trazer bênção, traz maldição. Desta, Cristo nos resgatou: "Para que
a bênção de Abraão chegasse aos gentios por Jesus Cristo, e para que pela fé nós recebamos
a promessa do Espírito" (3.14). Sendo assim, dois propósitos graciosos da redenção em
Cristo unem todos quantos compartilham da fé de Abraão. A bênção que ele desfrutava
agora é nossa, bem como o Espírito Santo prometido.(5)
Posto que a bênção de Abraão e a promessa do Espírito Santo estão coordenadas
aqui, alguns entendem que Paulo identificava as duas entre si. A bênção dada a Abraão (a
justificação pela fé, Gênesis 15.6) e a bênção prometida para todas as nações (Gênesis 12.3)
ficam sendo nossas, portanto, mediante o Espírito Santo prometido. Essa é uma provável
interpretação.(6) Mas é preferível entender que o Espírito Santo não somente se coordena
com as bênçãos de Abraão, como também forma um clímax, ligado especificamente com
Gálatas 3.2. A bênção de Abraão, portanto, é para todas as nações, por meio de Cristo.
Logo, tanto os judeus como os gentios que tiverem fé, poderão receber o Espírito Santo. O
Que maravilhosa garantia é essa, esse desejo de Deus para com todas as nações,
inclusive os judeus! O batismo com o Espírito Santo, pois, oferece evidência clara, positiva
e identificável, de que Deus aceitou os gentios por causa da fé que possuem, e de que não
exige que guardem a Lei. Foi exatamente essa a conclusão tirada pela Igreja, como resultado
da experiência de Pedro na casa de Cornélio (Atos 10.44-47; 11.15-18). Além disso, Deus
derramava o seu Espírito Santo sobre os gentios que agiam pela fé, mas não guardavam a
Lei, e operava milagres em favor deles (Gálatas 3.5). Verdadeiramente, as experiências
registradas em Atos, e a doutrina nas Epístolas de Paulo, têm estreito relacionamento entre
si.
Aba, Pai
Para ressaltar a mesma verdade de outra forma, Paulo diz que Deus enviou Jesus
(como homem) para viver debaixo da Lei, a fim de remir os que estavam debaixo da Lei,
para que todos (judeus e gentios) recebessem a adoção de filhos (Gálatas 4.5). Por "adoção",
ele quer dizer: entrar nos privilégios e nas responsabilidades da filiação. Ele emprega essa
palavra, também, para a filiação de Israel (Romanos 9.4). Gálatas 4.1,2 indica que o filho e
herdeiro de uma família rica, nos dias de Paulo, seria tratado como escravo até atingir a
maioridade. Então, ele receberia "a adoção", ou seja: todos os direitos, os privilégios, e as
responsabilidades que pertenciam a um membro adulto daquela família. "Adoção" era
usada, também, no sentido moderno, de modo que os gentios, que não eram "filhos" de
Abraão, seriam, pela fé, os verdadeiros herdeiros, os filhos legítimos de Deus. Jesus morreu,
não somente para nos salvar do Inferno, mas para nos conceder todas as bênçãos que
pertencem ao membro da casa (família) de Deus (Efésios 2.19).
Depois, porque somos filhos, e todas as bênçãos da filiação agora nos pertencem,
Deus enviou o Espírito Santo que nos incentiva a clamar: "Aba, Pai" (Gálatas 4.6; Romanos
8.15). A razão por que o Espírito Santo é chamado, nesta passagem, o Espírito do seu Filho,
é para nos fazer lembrar as palavras de Jesus em Lucas 24.49. Ali, Ele empregou o mesmo
verbo, "enviar", para dizer: "Enviarei sobre vós a promessa do meu Pai".
Esse envio do Espírito é claramente o batismo com o Espírito Santo, conforme
explicam Atos 1.4,5; 2.4. Não é estranho que Paulo se refira a isso como a vinda do Espírito
Santo aos corações. Ele ainda tem em mente a mesma vinda específica do Espírito já
referida em Gálatas 3.2. Além disso, já vimos em Atos a variedade de expressões que a
Bíblia usa para a vinda do Espírito Santo na experiência pentecostal.
É de suma importância observar, no entanto, que Paulo declara o fato de sermos
filhos, o fundamento para o envio do Espírito Santo. Alguns tentam reinterpretar Gálatas 4.6
de tal maneira que evite uma diferença entre a experiência do novo nascimento e o envio do
Espírito Santo. Mas o versículo é claro e simples, que não pode ser interpretado diferente.
(8) Alguns dão a entender que os "filhos" são também os que ainda não nasceram de novo,
mas isso não passa de mais um argumento habilidoso para fugir do real significado. É certo
que a filiação deve anteceder o envio do Espírito Santo no cumprimento do Pentecoste.
Que Paulo ainda tinha em mente uma experiência distintiva pela qual as pessoas
podem saber se são ou não batizadas com o Espírito Santo, vê-se no versículo seguinte
(4.7): "Assim que já não és mais servo, mas filho". Ao afirmar isso, Paulo dá a entender
claramente que o fato de ter alguém experimentado o batismo com o Espírito Santo é a
confirmação de que ele é realmente um filho e herdeiro, e não um escravo da Lei.
Isso é confirmado pelo próprio Espírito Santo, que nos leva constantemente a clamar:
"Aba, Pai". "Clamar", usualmente, significa gritos, brados, do tipo dos que são necessários
para chamar a atenção num mercado ou numa praça pública Expressa a intensidade de
fervor e de urgência, em que o Espírito Santo dentro de nós nos leva a clamar a Deus como
Pai.
A repetição do brado aumenta a seriedade.(9) Freqüentemente se diz hoje que Abba
era o equivalente aramaico de "Papai!", como forma familiar de trato. Realmente, é
agradável pensar em termos o privilégio da mais íntima comunhão com o Pai, mediante o
Espírito Santo. Na realidade, Abba é uma palavra aramaica para"0 Pai" ou "Ó Pai!" Era
usada no círculo familiar. Mas, naquela sociedade, os filhos não diziam: "Papai". Com
muito respeito, diziam: "Pai". Não é uma familiaridade descuidada ou frouxa, nos clamores
incentivados pelo Espírito Santo.
Uma explicação melhor talvez seja que os crentes primitivos ouviram Jesus dirigir-se
a Deus em aramaico, usando a palavra Abba. Ela passou a ser utilizada nas orações, e foi
adotada pelos gregos. Mas podia facilmente se tomar sem significado, especialmente para os
que não falavam aramaico. No entanto, o Espírito Santo dirige seus corações a Deus,
chamando-o pelo precioso nome de Abba, acrescentando a palavra "Pai" em sua própria
língua. Ele queria que sentissem ser Deus realmente o Pai deles.
"Abba, Pai" não era, fica claro, algo falado em línguas estranhas, mas o próprio
clamor interior do Espírito Santo. Fica subentendido, no entanto, que isso desperta uma
resposta no coração do crente, de modo que ele, também, clama a Deus como Pai. Porque
esses gritos são genuínos e significantes, dão ao crente garantias adicionais de ser ele um
filho e herdeiro.
A Justiça pela Fé
Não somente a abundância do Espírito Santo, que o Pai nos dá, comprova que somos
filhos; ela deve, ainda, nos tornar conscientes de que nada precisamos acrescentar às
provisões divinas. Os que ensinavam ter os gentios de guardar a Lei, diziam, aparentemente,
que somente pela guarda da Lei alguém pode ser justo diante de Deus. Paulo indica que
nossa esperança se fixa numa justiça melhor (Gálatas 5.5). A Lei não tem a mínima
esperança de alcançar a verdadeira justiça, nem mesmo de ajudar a alcançá-la.
Os gentios, que acreditavam nos judaizantes, confiavam na circuncisão (como sinal
da Antiga Aliança) para terem boa posição diante de Deus. Com isso, na realidade,
rejeitavam a Cristo e tinham caído da graça. Não precisamos da Lei: "Porque nós, pelo
espírito da fé, aguardamos [ansiosamente] a esperança da justiça. Porque em Jesus Cristo
nem a circuncisão nem a incircuncisão têm virtude alguma; mas sim a fé que opera por
caridade" (Gálatas 5.5,6). A fé é a chave. A fé realiza coisas que a Lei não pode fazer,
quando ela é operante, eficaz por amor (ou: numa atmosfera de amor). Só podemos esperar,
portanto, a justiça que agrada a Deus, pelo Espírito Santo, mediante a fé (ou, pelo Espírito
que é recebido pela fé energizada pelo amor).(10)
As Obras da Carne
As obras da carne estão classificadas em quatro grupos. Primeiro: adultério,
fornicação, impureza e lascívia (atentados irrefreados e deliberados contra toda a decência),
relacionados com a imoralidade sexual. Boa parte disso nem sequer era considerada pecado
pela sociedade em geral. Segundo: idolatria (tanto as imagens como os deuses que
representavam) e feitiçaria (inclusive a magia, os encantamentos e o uso de drogas nos
rituais religiosos) relacionadas com as religiões de origem humana. Terceiro: inimizades
(ódio), porfias (contendas, discórdia, brigas, discussões), emulações (inveja daquilo que os
outros têm), iras (explosões de raiva, perda da paciência), pelejas (intrigas por motivos
mercenários, devoção aos próprios interesses, como na busca de empregos públicos),
dissensões (como as que existem entre os partidos políticos), heresias (diferenças de
opinião, especialmente as levadas ao ponto de causarem divisões), invejas (expressadas em
termos de má vontade e de malícia) e homicídios (resultantes dos motivos citados: ver
Mateus 5.21-23; 1 João 3.14,15). Todas essas coisas relacionam-se com os conflitos que
surgem dos nossos próprios impulsos e desejos egoístas. Quarto: bebedices e glutonarias
(com as orgias, farras e pândegas).
São esses os nossos impulsos naturais que guerreiam contra os desejos que o Espírito
tem para o nosso bem. A civilização, a educação, a cultura, a criação numa boa família
podem revestir essas coisas de uma camada superficial, para deixar o descrente com boa
aparência. Usualmente, porém, pouca coisa já basta para fazer essas obras da carne romper a
superfície.
O cristão, ao identificar-se com o Salvador crucificado, realmente crucificou a carne
com as suas concupiscências. Mas aquela vitória, que é potencialmente nossa, deve se tornar
ativa e real. Nós, como cristãos, vivemos no Espírito no sentido de termos nossa vida
mediante o Espírito. Mas também devemos andar no Espírito para as tendências, os
impulsos, e os desejos da carne serem realmente purificados na nossa experiência diária
(Romanos 8.4,5).
O Fruto do Espírito
Nada demonstra isso mais do que nosso relacionamento uns com os outros. Se
cobiçarmos a vangloria (se nos tornarmos jactanciosos, com ambição excessiva),
provocamos e invejamos uns aos outros (Gálatas 5.26). Se formos espirituais (vivendo no
Espírito, andando no Espírito, vivendo em comunhão ativa com Ele), seremos humildes. Em
vez de rebaixarmos nosso próximo, de buscarmos nossa própria vontade, levemos as cargas
uns dos outros e sejamos solícitos em restaurar o irmão caído (6.1,2).
Realmente, essa é uma ilustração do fruto do Espírito que começa com o amor e que
se resume no amor. É chamado fruto do Espírito, porque brota do Espírito. Não cresce
naturalmente do solo da nossa carne humana.(u) O amor é idêntico ao que Deus demonstrou
no Calvário, quando Ele enviou seu Filho para morrer por nós, enquanto ainda éramos
pecadores (Romanos 5.8). É descrito em 1 Coríntios 13.4-7 como sofredor (paciente com os
que nos provocam e nos lesam), benigno (que paga o mal com o bem), livre de inveja
(inclusive a malícia, a má vontade), humilde, sem se encher de sua própria importância,
sempre cortês, nunca egoísta nem cobiçoso, nunca irritável nem facilmente provocado,
nunca levando em conta os danos que sofre, nem se alegra nas falhas ou nas desgraças
alheias. Suporta firme com fé e esperança todas as circunstâncias da vida. Não é de se
admirar que nunca fracassará, nunca cessará!
O gozo é algo que o mundo não conhece. Muitos estão numa corrida louca atrás dos
prazeres. Alguns acham certa medida de felicidade ou satisfação. Mas nem sequer poderão
imaginar a experiência de ter o gozo profundo e ininterrupto que é o fruto do Espírito. Esse
gozo brota em nós, à medida que o Espírito Santo torna Jesus e sua obra de salvação cada
vez mais real para nosso coração. É expressado num regozijo ativo no Senhor (Filipenses
3.1). Mas está presente, nutrido pelo Espírito, quer sejam alegres as circunstâncias
exteriores, quer não. (Ver também Romanos 14.17; 15.13; 1 Tessalonicenses 1.6; Filipenses
1.25).
A paz verdadeira somente vem do Espírito Santo. Inclui um espírito tranqüilo, mas é
mais do que isso. É a consciência de que estamos num relacionamento certo com Deus; é
um senso de bem-estar espiritual. Inclui a garantia de que podemos confiar em Deus, para
suprir todas as nossas necessidades "segundo as suas riquezas em glória, por Cristo Jesus"
(Filipenses 4.19 ARA). Além do amor e do gozo, é necessária a ajuda do Espírito para o
desenvolvimento do restante do fruto.
Longanimidade é ter paciência com as pessoas que deliberadamente procuram
magoar-nos ou causar-nos dano. Os incrédulos talvez façam o possível para nos lesar ou nos
deixar irados. Mas o Espírito nos ajuda a agüentar tudo com amor, com o gozo no Senhor.
Não há, portanto, tentação para a vingança (Efésios 4.2; Tiago 1.19; Romanos 12.19).
A benignidade é a generosidade que procura ver as pessoas da melhor maneira
possível. É compassiva e dá a resposta branda que, segundo disse Salomão, desvia a ira, ou
evita explosões de raiva (Provérbios 15.1).
A bondade dá a idéia do desenvolvimento de um caráter bom, reto, fidedigno, sem
deixar de ser generoso e amigável com o próximo. É isso que nos transforma na nobreza de
Deus. A melhor maneira de descrevê-lo é sermos semelhantes a Jesus. (Ele incorporou todo
o fruto do Espírito em sua vida e seu ministério).
A fé, como fruto do Espírito, é freqüentemente distinguida da que traz a salvação e a
que opera milagres.(12) A fé, tanto no Antigo Testamento como no Novo, inclui a fidelidade
e a obediência. Aqui, posto que a palavra é um complemento e parte constituinte do amor, e
está contrastada com as obras da carne, a ênfase recai sobre a fidelidade, não somente para
com Deus, mas também com o próximo. Mesmo assim, esse fato não a deixa diferente da fé
salvífica, pois ela envolve tanto a confiança como a obediência. O fruto do Espírito precisa
crescer. A fé também deve crescer e desenvolver-se dentro de nós.
A mansidão não é auto-rebaixamento ou fazer pouco de si mesmo. Pelo contrário, é
uma humildade genuína que não se considera importante demais para realizar as tarefas
humildes. Não assume ares de grandeza ou imponência no sentido de deixar de ser cortês,
atencioso e gentil com todas as pessoas. É modesta, mas bem disposta a dar sua contribuição
quando algo precisa ser feito.
A temperança não é apenas moderação. É controle próprio. O verbo correspondente é
usado para os atletas que precisam se controlar em tudo, para serem vitoriosos (1 Coríntios
9.25). O Espírito nem sempre remove todos os desejos da carne, e, certamente, nem todos os
impulsos e tendências da carne. Mas parte do seu fruto é que Ele nos ajuda a desenvolver o
auto-controle que domina esses desejos, impulsos, paixões e apetites.
O auto-controle não aparece automaticamente. O que o Espírito faz é ajudar-nos a
disciplinar a nós mesmos. O medo é outra coisa que pode surgir da carne. Mas, conforme
disse Paulo a Timóteo: "Deus não nos deu o espírito de temor [covarde]; mas de [tremendo]
poder, e de amor, e de moderação [auto-disciplina]" (2 Timóteo 1.7). Não é sentados diante
do Sol, ou bebendo a água das chuvas, que nos livraremos desses temores que nos impedem
de testemunhar do Senhor ou de praticar a sua vontade. Precisamos saber o que é certo a ser
feito, e então fazê-lo. Noutras palavras, precisamos cooperar com o Espírito, ao
disciplinarmos a nós mesmos, pois é assim que cresce o fruto do auto-controle.
Essa cooperação com o Espírito é necessária para o crescimento e o desenvolvimento
do fruto do Espírito. Alguns supõem que pelo fato de termos vida no Espírito, ou sermos
batizados com o Espírito Santo, o fruto aparecerá sozinho. Mas tudo o que cresce sozinho,
na maioria dos jardins, é erva daninha. Se o fruto é desejado, deve ser cultivado. Deus faz
parte dessa obra (João 15.1). Mas temos a nossa parcela de contribuição.(13)
Pedro, tratando do mesmo fruto do Espírito, nos conclama a aplicar toda a diligência
para acrescentar a virtude à nossa fé (2 Pedro 1.5-7). Isso significa que fornecemos, através
de nossa fé, virtude (força moral). Ou, melhor, significa que devemos exercer a nossa fé de
tal maneira que produzamos todas as demais virtudes de uma só vez: conhecimento,
temperança (controle próprio), paciência (perseverança diante das dificuldades), piedade (na
adoração e na religião prática), na bondade fraternal e na caridade (o amor que é o fruto do
Espírito). Esse é o verdadeiro andar no Espírito, e corresponde com sua orientação, através
da obediência e da fé.
Paulo afirma que se essas coisas estão em nós em abundância, não seremos ociosos
nem infrutíferos no conhecimento (pessoal) de nosso Senhor Jesus Cristo. Se, porém, tais
coisas faltarem em nós, estamos em perigo (2 Pedro 1.8-10). Ele acrescenta que se
satisfizermos nossa carne, colheremos dela a corrupção (a destruição eterna), ao passo que
se vivermos no Espírito, ceifaremos dele a vida eterna (Gálatas 6.8). Em seguida, Paulo dá
uma palavra de encorajamento: "A seu tempo ceifaremos, se não houvermos desfalecido".
Com a ajuda do Espírito, o fruto crescerá e dará uma colheita abundante. E não esperaremos
até o fim, para saborear o fruto. Enquanto cresce e se desenvolve, experimentemos o amor e
a alegria que jorra em nós mediante o Espírito. Sintamos a realidade da paz interior, mesmo
quando a morte nos ameaça. Apoiemos todo o nosso peso no Espírito Santo e recebamos
sua ajuda, quando as coisas desandarem e outros se aproveitarem de nós. Sigamos o
caminho da paz, quando outros procuram contendas e divisões. Assim, o fruto não será algo
secreto e oculto que não evidencia sua presença. Podemos saber se ele está se
desenvolvendo em nós. E os que estão ao nosso redor também o saberão (Mateus 12.33).(14)
O Espírito de Santidade
A Epístola aos Romanos tinha em vista a evangelização dos gentios (Romanos 1.13;
15.28). Logo, ressaltava que o cristão está livre da Lei, assim como os Gálatas também.
Muitos dos seus ensinamentos, a respeito do Espírito Santo, também formam um paralelo
com a Epístola aos Gálatas.
Paulo sempre mantém Jesus Cristo como enfoque central. A primeira referência ao
Espírito Santo em Romanos relaciona-se com Cristo (1.4). A expressão é, literalmente,
segundo "o Espírito da santificação". Por causa de outra expressão paralela, "segundo a
carne" no v. 3, muitos entendem que se trata do espírito humano de Cristo que era sem
pecado (Hebreus 4.15).(15) Ou acham que se trata do seu espírito humano como "o assento
da sua natureza divina".(16) Dessa forma, não acham que o Espírito Santo seja o Agente
ativo de sua ressurreição. Pelo contrário, sua impecabilidade deixou a morte impossibilitada
de detê-lo (conforme alguns interpretam 1 Timóteo 3.16). Há veracidade nisso, é claro. Mas
"o Espírito de santidade" é semelhante a expressões tais como "o Espírito da verdade". Nada
há contra a idéia do Espírito Santo como o Agente ativo, por meio do qual Deus ressuscitou
Jesus dentre os mortos.O7)
Na realidade, não há contraste entre o corpo e o espírito humano de Jesus. Mas, sim,
entre sua humildade, durante seu ministério terreno, e sua atual glória no Céu.(18) Romanos
1.3-5 registra a primeira vinda de Cristo, como o Filho de Davi, o Renovo que brota das
raízes de uma árvore abatida, em terra seca (Isaías 11.1; 53.2). Mas aquela existência
humilde na Terra já terminou. Já não podemos considerar Cristo (do ponto de vista humano)
como um Homem na Terra, com relacionamentos físicos e terrestres (2 Coríntios 5.16). Ele
foi declarado o poderoso Filho de Deus, pela Ressurreição dentre os mortos. (Ver Filipenses
2.9). O derramamento no Pentecoste e os ministérios do Espírito também dão testemunho
disso.(19).
Paulo teve sua experiência pessoal de que Cristo ressuscitou e agora está exaltado no
Céu, não somente mediante o aparecimento de Jesus na estrada de Damasco, que fez dele
uma testemunha ocular da ressurreição, mas também mediante a graça e o apostolado que
ele recebeu. O mesmo tipo de experiência vem a cada crente que é batizado com o Espírito
Santo segundo Atos 2.4. Jesus prometeu que pediria ao Pai, e este enviaria o Espírito Santo.
Quando recebemos o Espírito Santo com a evidência do falar em línguas, tornamo-nos
testemunhas, em primeira mão, de que Jesus realmente está entronizado no Céu, realizando
o que Ele prometeu que faria.
"Segundo o Espírito Santo" também pode significar "conforme foi predito pelo
Espírito"(20) ou "na dimensão do Espírito".(21)
Agora, Jesus se manifesta a nós, não na sua existência física, mas no poder do
Espírito Santo. É a prova do poder triunfante da Ressurreição do Cristo glorificado à
disposição de todo cristão, por meio do Espírito Santo.(22)
Autênticos Judeus
Paulo, ao tratar do Evangelho que é o poder de Deus para a salvação (Romanos
1.16), reconhece que os gentios se afastaram do Criador e que necessitam de boas novas.
Mas os judeus também precisam. A circuncisão deles, o sinal do Antigo Concerto, é
destituída de significado, por causa do pecado. Deus queria a justiça, e não as formas
religiosas (Romanos 2.26). Sendo assim, o autêntico judeu não é o que exteriormente parece
ser judeu (pela circuncisão). Mas o que é interiormente, pela circuncisão do coração (uma
dedicação a Deus, no íntimo) realizada pelo Espírito Santo. (Ver Gálatas 6.15, onde o que
vale é ser uma nova criatura ou criação. Ver também Filipenses 3.3, onde isso é
demonstrado pela adoração a Deus no Espírito). "Judeu" (derivado de Judá) significa
"homem de louvor", no sentido de quem é louvado pelos seus irmãos (Gênesis 49.8). Mas o
louvor do autêntico judeu provém, não dos homens, mas de Deus (Romanos 2.28,29).
Essa obra interior do Espírito Santo é realizada pela graça, mediante a fé (Efésios
2.8). A que traz uma esperança e certeza de compartilhar da glória de Deus (Romanos 5.2).
Essa esperança não nos fará passar vergonha por termos esperado assim. Isto é: nunca nos
decepcionará. Temos certeza disso, porque o amor de Deus é derramado abundantemente
em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado (5.5).
O dom do Espírito refere-se ao batismo com o Espírito Santo. O amor de Deus é o
que Ele derramou supremamente no Calvário. Mas o derramamento daquele amor não
terminou na Cruz. Paulo afirma que o Deus, o qual nos amou ao ponto de enviar seu Filho
para morrer por nós, certamente nos ama suficientemente para colocar à nossa disposição
tudo quanto necessitamos, para nos levar à glória (Romanos 5.8-10; 8.37-39).(23)
A Redenção do Corpo
O problema está em nosso atual corpo mortal. Nossa filiação nos promete algo mais,
até mesmo do que a cura do nosso corpo, por maravilhoso que isso seja. Porque a parte que
é curada continua a envelhecer e decair, e segue para a morte. A cura divina é, de fato, uma
maneira maravilhosa de o Espírito Santo romper o poder do inimigo na enfermidade e na
dependência das drogas, mas, naquela filiação, também há uma redenção do nosso corpo.
Na ocasião da Ressurreição e do arrebatamento (1 Tessalonicenses 4.16) seremos
transformados (1 Coríntios 15.51,52). Nosso atual corpo será absorvido por um novo corpo
tão diferente do que temos agora, como o pé de trigo é diferente do simples grão. Será um
corpo espiritual, não no sentido de ser etéreo ou irreal, mas em estar adaptado para ser o
templo do Espírito Santo. O Espírito Santo opera em nós agora, a despeito da nossa fraqueza
e incapacidade. Mas nosso novo corpo será instrumento perfeito para a expressão da vida no
Espírito (1 Coríntios 15.43.44).
Alguns pensam que é possível possuir a redenção do corpo agora, mediante o
Espírito. Mas, embora ela nos seja garantida, continua sendo uma esperança, e não será
parte da nossa experiência até a Segunda Vinda de Jesus (Romanos 8.24,25). De fato, agora
mesmo, somos filhos de Deus, mas "ainda não é manifestado o que havemos de ser". Na
volta de Cristo é que seremos semelhantes a Ele no seu estado glorificado. (1 João 3.2).
Entrementes, gememos em nossa fraqueza com o restante da criação, esperando aquele dia
em que receberemos a adoção, a redenção do nosso corpo.
Permanecemos na fraqueza do nosso atual corpo. Mas o Espírito Santo está conosco.
Embora nossa experiência com Ele no futuro será maior do que a que desfrutamos agora,
Ele ainda está conosco em pessoa, disposto a nos ajudar de uma maneira real e pessoal.
Embora Paulo não use, para o Espírito Santo, o nome de Consolador, Paracleto, ele entende
que o Espírito Santo é nosso Ajudador. Ele está bem presente para nos ajudar em nossa
fraqueza. Freqüentemente, por causa das nossas limitações, não sabemos quais são nossas
necessidades. Queremos realizar a vontade de Deus, mas nem sequer sabemos orar
conforme deveríamos. Então, o Espírito vem nos socorrer, intercede por nós (em nosso
lugar) com gemidos inexprimíveis.
Esses gemidos não são expressos em palavras, nem sequer em língua estranha
(embora seja bem possível que o Espírito Santo interceda através desses gemidos
inexprimíveis, enquanto falamos em línguas, ou oramos, ou louvamos a Deus). Mas não
precisam ser expressos em palavras. O mesmo Deus, o Pai Celestial, que sabe o que está em
nosso coração, também entende o que está na mente do Espírito Santo. Há, portanto,
perfeita comunicação entre o Pai e o Espírito Santo, sem a necessidade de palavras. Além
disso, o Espírito Santo sabe qual é a vontade de Deus, de modo que temos a certeza de que a
sua intercessão é de conformidade com a vontade do Pai. Noutras palavras, temos a certeza
de que nossas orações são atendidas, pois, conforme afirma Paulo, nada nos poderá separar
do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor.
Uma Consciência Iluminada
Os capítulos 9 a 11 de Romanos tratam da tristeza de Paulo, por terem os judeus
rejeitado a Jesus, pois tinham o espírito de sonolência, em vez do Espírito Santo (11.8).
Porque Paulo se voltou aos gentios no seu ministério, alguns pensam que eleja não se
importava com os judeus. Mas ele sempre se dirigiu primeiramente aos judeus (até mesmo
em Roma: Atos 28.17). Além disso, ele tinha uma profunda e contínua preocupação,
conforme sua consciência testemunhava no Espírito Santo (9.1-3).
Isso significa que sua consciência era orientada e iluminada pelo Espírito Santo, que
conhece a vontade de Deus.í29) Nossa consciência nunca é orientada suficientemente por si
mesma. Precisa da Palavra, da iluminação do Espírito Santo para nos ajudar. Paulo sabia
que, pela Palavra e pelo Espírito Santo, Deus ainda tinha solicitude pelos judeus; portanto,
Paulo também. Logo, o Espírito Santo também deixou-o entender que sua consciência
estava certa e sua solicitude também. A preocupação dele era mais do que um sentimento de
solidariedade com seu próprio povo. Provinha do amor de Deus.
A Adoração Espiritual
Depois de demonstrar que Deus tinha misericórdia para com os judeus e os gentios
que crerem, Paulo transmite um ensinamento prático aos cristãos. Os sacrifícios no templo
já não eram necessários. Cristo os cumpriu de uma vez por todas (Hebreus 9.11,12,25-28).
Mas isso não significa que podemos relaxar, ou seguir nossa própria vontade. Deus ainda
nos conclama a apresentar, não sacrifícios de animais imolados, mas sacrifícios vivos,
nossos próprios corpos (Romanos 12.1). Corpos santificados (separados para Deus e
dedicados a seu serviço) são os únicos sacrifícios que agora são aceitos por Ele e que são
nosso serviço lógico (ou culto espiritual). Conforme diz Pedro, nós, que viemos a Cristo,
somos também um sacerdócio santo, para oferecer sacrifícios espirituais agradáveis a Deus
por Jesus Cristo (1 Pedro 2.5).(30) Essa também é obra do Espírito Santo, porque a palavra
espiritual, aqui, significa: causado pelo Espírito Santo, ou cheio do Espírito Santo, ou
correspondente a Ele.
8
O ESPÍRITO NA VIDA CRISTÃ
Desde o início de 1 Coríntios, Paulo chama a atenção aos dons espirituais. Ele
agradece a Deus pela graça que lhes foi dada por Jesus Cristo, porque em tudo foram
enriquecidos por Ele, especialmente nos dois dons estimados pelos gregos: a palavra
(expressões vocais) e o conhecimento (1 Coríntios 1.5). De fato, o testemunho de Cristo foi
confirmado neles de tal maneira que não lhes faltava nenhum dom (dom espiritual,
charisma). Paulo, no entanto, estava igualmente interessado no fruto do Espírito. Ele lembra
aos coríntios que Cristo os confirmará (fortalecerá, estabelecerá) até o fim, para que sejam
irrepreensíveis "no dia de nosso Senhor Jesus Cristo" (quando chegar esse momento e
comparecermos diante do seu tribunal: Romanos 14.10; 2 Coríntios 5.10).
Paulo volta à questão dos dons espirituais nos capítulos 12 a 14. Mas, nos 11
primeiros capítulos, ele dedica a maior parte de sua mensagem aos problemas que surgem
pela falta do fruto do Espírito.
O problema principal tinha a ver com divisões e contendas na Igreja, coisas que
provinham da carne, e não do Espírito. Os cristãos baseavam-se nas suas preferências
pessoais por Paulo, Apoio e Cefas (Pedro) com o intuito de estabelecer partidos quase
políticos. Alguns até mesmo se consideravam superiores aos demais, e se entitulavam do
partido de Cristo. Com essas divisões, rompiam a comunhão espiritual da igreja e
provocavam discórdias.
A preocupação de Paulo no tocante à comunhão e à união do corpo de Cristo
percorre toda a Epístola. Estabelece-se a seguinte divisão: Primeiro, mostra que advêm da
falta de assimilação da significância da Cruz. Segundo, prova que ele e Apoio são meros
cooperadores do Senhor. São servos que estão a serviço do povo que pertence a Cristo (1
Coríntios 3.22,23).
A falta de assimilação do significado da Cruz surgiu porque ainda olhavam as coisas
espirituais do ponto de vista humano. Os coríntios, como gregos que eram, tinham a tradição
de buscar e exaltar a sabedoria, resultado de deduções e aplicação de filosofias humanas.
Devido ao amor que tinham a essa sabedoria, consideravam a Cruz uma loucura (antes de
descobrirem a realidade de Cristo, através da pregação do Evangelho: 1 Coríntios 1.18).
Mas, mesmo aceitando o Cristo da Cruz, ainda não o viam na plenitude do seu
significado, como expressão da sabedoria divina e exemplo do amor e da humildade. Nem
tinham deixado de lado suas tendências de interpretar tudo à luz do que o homem chama de
sabedoria. Para cada membro dos grupos que se formavam na igreja, parecia lógica a sua
lealdade a um determinado ensinador. Os que eram leais a Paulo provavelmente pensassem
ser justa e sábia a lealdade ao fundador da igreja. Os que se apegavam a Apoio talvez
argumentassem que seus conhecimentos bíblicos foram úteis para o crescimento da igreja, e
sua eloqüência promovera o avanço da causa (Atos 18.25,27).(') Os partidários de Pedro
como seu estandarte provavelmente dissessem que o honravam como o principal apóstolo.
Tudo era razoável e lógico, idêntico ao desejo de Pedro, quando quis construir três
tabernáculos no monte da Transfiguração. De repente, uma nuvem fez cessar a revelação, e
ouviu-se uma voz: "Este é o meu amado Filho, em quem me comprazo: escutai-o" (Mateus
17.3-5). Os coríntios precisavam obter uma nova visão de Cristo crucificado, o poder e a
sabedoria de Deus (1 Coríntios 1.24).
A Sabedoria de Deus
Para corrigir a dependência que os coríntios tinham da sabedoria humana, Paulo a
contrasta com a de Deus. Ele os faz lembrar que sua pregação "não consistiu em palavras
persuasivas de sabedoria humana, mas em demonstração [comprovação convincente] do
Espírito e de poder [tremendo]" (1 Coríntios 2.4). O que Paulo os transmitiu não era
simplesmente mais um ensino, outra filosofia, ou algumas idéias humanas para discutir. Eles
já tiveram bastante dessas coisas quando pagãos. Paulo os levou ao laboratório do Espírito
Santo e lhes mostrou o poder de Deus. Ele os encorajou a avançar no mesmo poder, a fim de
que sua fé se confirmasse com poder (inclusive com os dons do Espírito Santo).(2)
A obra de Deus era um mistério, por não ter sido revelada em toda a sua plenitude
antes da Cruz, e pelos homens não a terem compreendido por sua sabedoria ou seu
raciocínio humano. Se tivessem agido diferente, "nunca crucificariam ao Senhor da glória"
(1 Coríntios 2.8).
Paulo explica esse fato através de uma paráfrase baseada em Isaías 64.4 (à luz de
Isaías 52.15): "As coisas que o olho não viu, e o ouvido não ouviu, e não subiram ao
coração [inclusive a mente e a imaginação] do homem, são as que Deus preparou para os
que o amam" (1 Coríntios 2.9). As coisas que Deus tem preparado, nesse texto, não são
essencialmente as glórias do céu, mas as glórias da Cruz e de tudo quanto ela significa no
plano divino. Incluem o que já desfrutamos pelo Espírito.
O significado da Cruz em relação com a vida cristã, no presente, e a celestial, no
futuro, não pode ser entendido pela mente natural. Mas nós, como cristãos, não estamos no
escuro. Deus nos revelou a totalidade do seu plano, pelo seu Espírito. E claro que agora
temos esse plano registrado no Novo Testamento, mas Paulo indica que compartilhamos da
mesma revelação pela iluminação e explicação dessas verdades ao nosso coração, através do
Espírito Santo.
Tenhamos confiança no que o Espírito nos torna real, pois o Espírito Santo sabe o
que Deus tem para nós no seu coração, porque "o Espírito penetra todas as coisas, ainda as
profundezas de Deus" (1 Coríntios 2.10). Pense em todas as coisas contraditórias que as
filosofias humanas dizem a respeito da natureza de Deus. A mente humana não pode mesmo
penetrar as profundezas. Mas o Espírito pode.
Paulo ilustra o que o Espírito faz, comparando-o com o espírito humano. Ninguém
sabe o que o homem realmente está pensando, mas o seu próprio espírito sabe o que está
acontecendo dentro dele (1 Coríntios 2.11). Assim, ninguém, que observa Deus segundo a
sabedoria humana, pode calcular o que está acontecendo na mente do Criador. Mas o
Espírito de Deus sabe. Não podemos levar essa analogia muito longe. O relacionamento
entre o Espírito Santo e o Deus Pai não é exatamente igual ao que se registra entre nosso
espírito e nós mesmos, pois o Espírito Santo é uma pessoa distinta da do Pai. Mas Ele
conhece Deus por dentro. Por isso, Ele pode revelar corretamente quais são os pensamentos
e propósitos do Senhor. (3)
O que recebemos, mediante o Espírito Santo, não é como o espírito do mundo. Os
grandes pensadores talvez sejam gênios. Mas, em se tratando das coisas que realmente
contam, só fazem conjeturas. Não precisamos adivinhar ou imaginar o que está na mente de
Deus, porque o Espírito Santo, que recebemos da parte dele, veio "para que pudéssemos
conhecer o que nos é dado gratuitamente por Deus" (1 Coríntios 2.12). Paulo inclui seus
leitores nestas palavras. A mesma certeza da verdade que ele recebeu do Espírito Santo está
disponível a todo cristão.(4)
Para demonstrar ainda melhor a diferença entre a sabedoria humana e a celestial,
Paulo disse que ele falou "não com palavras de sabedoria humana, mas com as que o
Espírito Santo ensina, comparando as coisas espirituais com as espirituais" (1 Coríntios
2.13). Isto é: Paulo não usava o tipo de retórica, de lógica, ou de pensamento dedutivo que
caracterizava a sabedoria humana. Não começava do ponto de vista da sabedoria humana
para então chegar à sabedoria espiritual, passando do conhecido para o desconhecido.
Simplesmente apresentava o que o Espírito Santo ensina, inclusive o que o Espírito Santo
traz do Antigo Testamento e dos ensinos de Jesus. (Um exame dos sermões de Paulo no
Livro de Atos demonstra o quanto o Espírito Santo empregava o Antigo Testamento. Ver
Atos 13.17-42).(5)
A expressão "comparando as coisas espirituais com as espirituais" é de difícil
interpretação. Alguns entendem assim: "explicando verdades espirituais a pessoas
espirituais". Outros: "comparando dons e revelações espirituais que já possuímos com
aqueles que recebemos, e julgando os novos à luz dos antigos". Ainda outros entendem:
"ajuntando as verdades espirituais numa forma espiritual". O grego não é conclusivo. Em 1
Coríntios 2.6,7, Paulo diz que falava a sabedoria de Deus entre os perfeitos (maduros), o que
parece significar os que são espirituais, cheios do Espírito e por Ele guiados. Os vv. 14 e 15
fazem uma comparação entre o homem natural e o espiritual. Isto se encaixaria com a
primeira explicação dada anteriormente. Mas no próprio v. 13 Paulo compara as palavras da
sabedoria humana com as que o Espírito Santo ensina. Isto indica a terceira interpretação
sobre as verdades espirituais. Talvez seja este um caso em que dois significados são
possíveis, porque Paulo tinha as duas em mente.
O que o Espírito Santo ensina, não satisfaz o homem natural (carnal, não espiritual)
que se norteia exclusivamente por este mundo. Ele não acolhe os dons do Espírito de Deus,
porque lhe parecem loucura (tolice). Ele não tem a mínima capacidade de captar seu
verdadeiro significado, porque devem ser discernidas (examinadas e julgadas) segundo a luz
que o Espírito Santo concede. (Discernir é o mesmo verbo que aparece no v. 15, e traduzido
por "examinar", em Atos 17.11, onde os bereanos perscrutavam as Escrituras.)
Em contraste com o homem natural, de mentalidade mundana, "o que é espiritual
discerne [examina] bem tudo, e ele de ninguém é discernido [julgado]". Daí, não precisamos
submeter o que aprendemos do Espírito Santo à inspeção e ao julgamento dos sábios deste
mundo. Com toda a sua sabedoria, não conhecem a mente do Senhor. É possível que
queiram nos instruir. Mas são presunçosos, pois acham que vão instruir a Deus. É realmente
isso que procuram fazer, quando tentam avaliar a Bíblia como se fosse mera literatura
humana, como as peças de teatro de Shakespeare. O cristão, no entanto, tem a mente de
Cristo. Isto é: tem a plenitude da revelação de Deus. O Espírito Santo revela a Cristo e nos
capacita a ver as coisas espirituais do ponto de vista divino.
No entanto, não devemos limitar 1 Coríntios 2.15 às coisas espirituais ou até mesmo
religiosas. "Tudo" pode significar que a pessoa cheia do Espírito Santo, e orientada por Ele,
está capacitada para julgar e avaliar tudo. Nisso, a Bíblia não estabelece uma linha
demarcatória entre o sagrado e o secular. Deus se ocupa tanto com as maravilhas da
natureza e as glórias das estrelas como com o próprio Céu. Ele controla os reinos e as
nações, e realiza os seus propósitos no mundo dos homens (sem destruir o livre arbítrio
destes) tanto quanto na Igreja. A pessoa dirigida e iluminada pelo Espírito Santo vê tudo por
um prisma diferente do que o mundano percebe.
Necessidade de Entendimento
Paulo registra a passagem a respeito dos dons espirituais (1 Coríntios 12-14) dizendo:
"Acerca dos dons espirituais, não quero, irmãos, que sejais ignorantes". Com isso, ele não
queria dizer que eram ignorantes a respeito. Já dissera que não lhes faltava nenhum dom (1
Coríntios 1.7). Ele desejava que os conhecessem melhor, a fim de que tivessem verdadeiro
entendimento sobre os dons e sua finalidade.
Em certo sentido, Paulo não está mudando de assunto. Mesmo nesse exame dos dons
espirituais, Ele se ocupa com o fruto do Espírito. O capítulo 12 registra os dons. Não há
classificação sistemática, nem descrição detalhada dos dons individuais, nem estudo de sua
natureza, ou exemplificação mediante a qual pudéssemos identificá-los melhor. Os dons
eram sobrenaturais e da parte de Deus. Paulo nunca questiona os dons que possuíam. Nada
havia de errado nos dons em si. Mas estavam sendo empregados erroneamente.(12) Essa é a
razão da ênfase dada ao amor no capítulo 13, e da consideração detalhada de como usar as
línguas e a profecia no capítulo 14.
Paulo reconhece que o Espírito Santo está ativo na igreja mediante os dons. Mas seu
propósito principal era o de lidar com as divisões e as contendas causadas pela carnalidade e
imaturidade deles. Como "nenês em Cristo", a mesma falta de fruto do Espírito que os levou
a deixar de "discernir o corpo" nos seus irmãos na fé (1 Coríntios 10.17; 11.21,29,33,34),
levou-os a exercer os dons do Espírito sem conhecer a unidade do corpo de Cristo.
Parece que muitos deles pensavam que os dons eram para ser empregados como
desejavam. Outros exaltavam um dos dons como se fosse mais importante do que os outros.
Ainda outros deixaram de reconhecer a necessidade e a interdependência de todos os dons.
Outros estavam na direção oposta, e consideravam desnecessários certos dons.
Isso talvez pareça estranho, hoje, para alguns que persistem "em imaginar que
aqueles que desfrutavam desses dons sobrenaturais do Espírito eram modelos da perfeita
santidade e maturidade espiritual".(13) Deve ser lembrado que o fruto é algo que cresce,
precisa ser encorajado, e leva tempo para desenvolver-se. É necessário ter em mente,
também, que os Coríntios não tinham a boa formação bíblica e ética que homens tais como
o apóstolo Paulo possuíam. Deus sempre começa com as pessoas exatamente onde estão,
dá-lhes tudo quanto a sua fé é capaz de receber, e as conduz adiante.
O que Deus concede é sempre uma boa dádiva. Diante do tribunal de Cristo, seremos
julgados mediante nossas obras (2 Coríntios 5.10). Agora, porém, a dádiva é o dom gratuito.
Não seria dom, se houvesse a necessidade de boas obras como condição prévia para recebê-
lo. As pessoas tendem a esquecer-se de que os dons espirituais devem ser recebidos na
mesma condição que o dom da salvação e o recebimento do Espírito Santo: "Porque pela
graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus. Não vem das obras,
para que ninguém se glorie" (Efésios 2.8,9). Quando o coxo, na Porta Formosa, foi curado,
as pessoas olharam para Pedro e João, atônitas e cheias de temor. Pedro precisava
repreendê-las: "Por que olhais tanto para nós, como se por nossa própria virtude ou
santidade fizéssemos andar este homem?" (Atos 3.12).(14)
Os dons espirituais, que são pela graça, mediante a fé, encontram-se na palavra grega
mais usada para descrevê-los: charismata, "dons livre e graciosamente concedidos", palavra
esta que se deriva de charis, graça, o imerecido favor divino. Os carismas são dons que
recebemos sem os merecermos. Dão testemunho da bondade de Deus, e não da virtude de
quem os recebem.
Uma falácia que freqüentemente engana as pessoas é a idéia de como Deus abençoa
ou usa alguém; isso significa que Ele aprova tudo o que a pessoa faz ou ensina. Mesmo
quando parece haver uma "unção", não há garantia disso. Quando Apoio chegou a Éfeso
pela primeira vez, não somente era eloqüente em sua pregação; era também "fervoroso de
espírito". Tinha o fogo. Mas Priscila e Áquila perceberam que faltava algo. Logo, o levaram
(provavelmente para casa, a fim de participar de uma refeição), e lhe explicaram com mais
exatidão o caminho de Deus (Atos 18.25,26).
Era, pois, o caminho de Deus a respeito dos dons espirituais, que Paulo, como um
pai, desejava explicar com mais exatidão aos coríntios. A esses dons ele dá o nome de
"espirituais" em 1 Coríntios 12.1 (a palavra dom não se encontra no grego). A palavra, por si
mesma, inclui algo dirigido pelo Espírito Santo e expresso através de crentes cheios do
poder. Nesta passagem, porém, Paulo limita a palavra ao sentido dos dons gratuitos, ou
carismas, que passam a ser mencionados repetidas vezes (12.4,9,28,30,31; 14.1). Todos os
escritores cristãos primitivos entendiam que a palavra espirituais significava dons
espirituais e, portanto, reconheciam que eram dons sobrenaturais, tendo por origem imediata
o Espírito Santo.(15)
Honrando a Jesus
Antes de apresentar os dons, Paulo chama a atenção ao fato de que o Espírito Santo
sempre glorificará a Jesus (1 Coríntios 12.3). Já notamos que Paulo manteve Cristo no
centro do seu ministério. Foi orientado pelo Espírito Santo a proceder assim, porque Ele
desejava honrar a Jesus, a Palavra viva. Ele veio para nos revelar Deus e os seus caminhos
(João 1.14,18). Agora, Jesus está no Céu, mas o Espírito Santo faz com que Ele seja a
Palavra de Deus para nós. Que contraste com o estado anterior dos coríntios, que antes eram
levados pelos ídolos mudos, coisas sem valor que não tinham algum sentido nem palavra
para eles (12.2)! Essa falta de relevância ulterior é a situação de tudo quanto está fora de
Cristo.
A palavra que o Espírito Santo transmite, pode ser testada pelo fato de que Ele
sempre reconhece Jesus como o Senhor divino, exaltado acima de todo poderio e
autoridade, real ou imaginário, que os homens reconhecem. Ele é Rei dos reis e Senhor dos
senhores (1 Coríntios 8.5,6; 15.24,25; Filipenses 2.9-11; Romanos 14.9). Por outro lado,
ninguém, que fala pelo Espírito Santo, dirá: Jesus é anátema!" Alguns acham que essa
maldição é a expressão de algum espírito demoníaco. Outros pensam que seria falada por
falsos mestres os quais, no espírito do Anticristo, faziam diferença entre o homem Jesus e o
Cristo espiritual. (Ver 1 João 4.2,3).(18) Outros acreditam que partia de ouvintes ignorantes
ou incultos que não tinham compreendido o ensino de Paulo a respeito de Cristo, feito
maldição por nós (Gálatas 3.13).(19)
Não somente o Espírito Santo exalta a Jesus: ninguém pode sinceramente dizer
"Jesus é Senhor!" senão pelo Espírito Santo. Qualquer pessoa pode pronunciar as palavras,
naturalmente. Mas serão vazias e destituídas de sentido, a não ser que o Espírito Santo
pessoalmente faça com que Jesus seja o Senhor divino em nossa vida, quando
correspondemos a Ele. ("Senhor" é o título comum que os judeus atribuíam a Deus). Logo,
em todo o nosso testemunhar, precisamos da iluminação, da unção e dos dons espirituais. É
o Espírito quem dá sabedoria e que aplica a verdade aos corações (Efésios 1.17).
Há, também, encorajamento para nós, aqui. Jamais tenhamos medo de buscar o
Espírito Santo e seus dons! Render-nos a Ele nunca nos desencaminhará, porque Ele sempre
exaltará a Jesus e honrará o seu senhorio. O exercício dos dons espirituais torna-se uma
oportunidade de honrar a Jesus.
Manter Jesus no centro, portanto, ajudar-nos-á a ver a maravilhosa unidade que
percorre toda a variedade dos dons espirituais. Essa unidade é vista, também, na maneira de
a Trindade cooperar para levar toda a diversidade dos dons a uma bela harmonia de
expressão (1 Coríntios 12.4-6).
A variedade é sempre necessária, e os coríntios a possuíam. Mas, por causa das suas
divisões e contendas, desviavam-se em todas as direções, de modo que os dons não traziam
o proveito e a utilidade que Deus pretendia para eles. Precisavam ver a harmonia e a
cooperação da Trindade como a própria fonte dos dons.
Paulo refere-se ao Espírito Santo como o que dirige a operação dos dons em nossa
vida (1 Coríntios 12.11). Depois, ele fala do
Senhor (Jesus), que concede autoridade ao Espírito Santo para operar no mundo hoje;
e, finalmente, do Deus pai, que é o derradeiro Doador de toda boa dádiva e dom perfeito
(Tiago 1.17).
Três termos são aplicados a esses dons, quando Paulo se refere a eles na sua
variedade de expressão e de distribuição (1 Coríntios 12.4,5). Há diversidade de dons
(carismas), mas o mesmo Espírito, diversidade de ministérios (modos de serviços), mas o
mesmo Senhor, diversidade de operações (atividades) mas é o mesmo Deus que opera tudo
em todos. (Ver Efésios 3.20; Colossenses 1.29).
Nisso também fica claro que Deus não transfere sua graça e seus dons a um único
grande depósito. Não há um reservatório destes dons na Igreja nem no indivíduo. Para cada
dom, precisamos olhar de novo para a sua fonte originária. Fica evidente, também, que os
vários dons envolvem ministério e serviço voluntários da nossa parte. Deus não nos obriga a
corresponder através dessas atividades. Os dons espirituais são necessários para que a Igreja
continue a obra de Jesus segundo seu plano para esta dispensação. Mas Ele não nos obriga a
entrar nesses ministérios, contrários à nossa vontade. Nem o Espírito Santo nos domina para
nos obrigar a exercer esses dons ou carismas. Ele não dá seus dons aos que não os desejam,
nem sequer aos que não os procuram com zelo. São demasiadamente valiosos para serem
desperdiçados.
Os dons são dados, de fato, com a intenção divina de que todos recebam proveito
deles (1 Coríntios 12.7). Isso não significa que todos têm um dom específico, mas há dons
(manifestações, revelações, meios pelos quais o Espírito se torna conhecido) que são dados
(continuamente) para o que for útil (proveitoso, para crescimento). "Útil" significa algo que
ajuda, especialmente na edificação da Igreja, tanto espiritualmente como em número de
membros. (O Livro de Atos tem um tema de crescimento numérico e geográfico. Deus quer
que o Evangelho seja divulgado em todo o mundo). Pode ser ilustrado pelo mandamento do
Senhor: "Negociai até que eu venha" (Lucas 19.13). Ao partirmos para o ministério dos seus
dons, Ele nos ajuda a crescer na eficiência e na eficácia, assim como fizeram os que usaram
devidamente o que o Senhor lhes deu, na Parábola das Dez Minas (Lucas 19.15-19).(20)
Um só Corpo
Ao voltar para a ênfase principal de 1 Coríntios 12.13, vemos que, apesar de vários
membros no Corpo, há um só Espírito e um só Corpo. Se uma pessoa está em Cristo, faz
parte do Corpo, mesmo que pense ser membro de algum partido: de Apoio, de Cefas, ou
mesmo "de Cristo". É óbvio que qualquer igreja ou denominação que afirma ser a única,
está desviada nos seus pensamentos. Mas, mesmo assim, faz parte do Corpo, se seus
membros nasceram de novo pelo Espírito.
Paulo compara essa situação com o corpo humano (1 Coríntios 12.14-20). O pé não
pode dizer que não faz parte do corpo, porque não é uma parte da mão. Nem o ouvido pode
dizer que não é do corpo, porque não faz parte do olho. Se todas as partes do corpo tivessem
a mesma função, se consistissem num só olho ou ouvido, não seria um corpo e não
conseguiria funcionar. Logo, uma igreja onde todos tivessem o mesmo dom ou ministério
seria uma monstruosidade, e não o corpo de Cristo em funcionamento.
Ao conduzir a analogia mais adiante, Paulo enfatiza a interdependência do corpo. Há,
de fato, muitos membros, mas um só corpo, sendo que cada membro tem necessidade dos
demais. O olho não pode dizer que não precisa da mão, nem a cabeça que não necessita dos
pés. Até mesmo as partes do corpo que parecem ser mais fracas ou menos importantes são
necessárias. Deus formou e uniu os membros do nosso corpo de tal maneira que trabalham
juntos em perfeita harmonia e interdependência. Quando um membro do corpo dói, todo o
corpo (de nossa pessoa) sente. Quando um membro é honrado, o corpo se regozija. Idêntica
situação é a do corpo de Cristo e dos seus membros individualmente (1 Coríntios 12.27).
Exatamente, para que ninguém deixe de entender a lição, Paulo entra em maiores
detalhes a respeito do corpo de Cristo. Assim como Deus formou o corpo humano de tal
maneira que houvesse unidade e harmonia, Ele colocou na Igreja primeiramente apóstolos,
em segundo lugar profetas, em terceiro lugar doutores, depois milagres (ações de grande
poder), depois dons de curar, socorros, governos, variedades de línguas (1 Coríntios 12.28).
Alguns entendem que a enumeração aqui segue a ordem do valor, de maneira que os
profetas e doutores são mais importantes que os milagres, e os apóstolos os mais
importantes de todos.(28) Mesmo se for assim, ainda devemos nos lembrar que cada membro
do Corpo é tanto necessário quanto importante. Mesmo se o último na lista, o dom de
línguas, fosse menos importante, não deixaria de ser necessário tanto quanto o ministério
dos apóstolos, dos profetas e dos doutores ou mestres. É, de fato, fácil enxergar a
importância dos apóstolos; por isso, é necessário dedicar mais atenção a honrar os últimos
quatro da relação, que estão agrupados.
O próprio Paulo pergunta: "Porventura são todos apóstolos? são todos profetas? são
todos doutores? são todos operadores de milagres? Têm todos o dom de curar? falam todos
diversas línguas? interpretam todos?" Essas perguntas são postuladas de tal maneira que
pedem a resposta: "Não!" Deus, deliberadamente, concedeu dons e ministérios a pessoas
diferentes. Ele quer que reconheçamos ser necessário precisarmos uns dos outros. A Igreja,
como corpo, não deve contentar-se meramente com os primeiros dons. O Espírito Santo
quer usar todo membro, e introduzir a variedade que edificará a Igreja na unidade.
Não há aqui, tampouco, intenção de estabelecer distinções entre os clérigos e os
leigos, nem entre os ministérios permanentes e temporários. Todos cooperam através da
orientação do Espírito Santo, conforme Ele quer. Fica claro que alguns serão regularmente
usados nos ministérios específicos. Alguns são profetas, outros são doutores ou mestres. Os
verbos usados em 1 Coríntios 12.30 estão no presente contínuo. Alguns continuam a
ministrar dons de curar. Outros ministram regularmente ao corpo as variedades de línguas.
Alguns regularmente interpretam essas línguas para a congregação. Deve ser notado aqui
que, se estes verbos falam dos ministérios regulares ao Corpo, o fato de que as perguntas
pedem uma resposta negativa não deve ser enfatizado. A razão de que nem todos têm um
ministério no âmbito dos dons de curar, não significa que Deus não possa usá-los,
ocasionalmente, para ministrar a cura aos enfermos. O fato de que nem todos têm um
ministério de línguas não significa que todos não possam falar em línguas ocasionalmente
ou nas suas devoções particulares. Nem exclui as línguas como a evidência física do
batismo com o Espírito Santo, conforme Atos 2.4.
Paulo desafia, então, os coríntios a procurar com zelo os melhores dons, a esforçar-se
para obter os dons espirituais mais valiosos (carismas). Essa exortação dificilmente se refere
à enumeração feita em 1 Coríntios 12.28. Pode referir-se, provavelmente, a quaisquer dons
que sejam mais necessários e edificantes na ocasião. Esse mandamento também reenfatiza o
fato de que não temos os dons automaticamente, simplesmente porque temos o Espírito
Santo. São necessários os passos da fé. Além disso, fica claro aqui que embora tenhamos
um dom ou um ministério, não precisamos ser limitados só a ele para sempre. De fato, o
Espírito Santo distribui os dons "como Ele quer", mas não desconsidera as necessidades que
surgem. E Ele não viola a integridade da nossa personalidade, obrigando-nos a aceitar um
dom pelo qual não temos um desejo ardente (1 Coríntios 12.31).
9
O ESPÍRITO NO MINISTÉRIO DA IGREJA
Tendo em mente o amor, 1 Coríntios 14 transmite orientação prática para o exercício
de dois dons espirituais - o das línguas e o da profecia - na Igreja. Ao estudarmos este
capítulo, veremos repetidas vezes que o amor é a fonte de onde fluem essas instruções. Não
devemos limitar somente às línguas e à profecia o que é dito. A maioria das instruções
básicas pode ser aplicada a outros dons, também.
Como no Pentecoste
Muitos fazem distinção entre as línguas em Corinto e as concedidas pelo Espírito
Santo no dia de Pentecoste. Algumas versões bíblicas traduzem "falar em línguas" de modo
diferente em Atos e em Coríntios. Em Atos, dizem que se trata do falar noutros idiomas. Em
Coríntios, afirmam que é o falar em êxtase, com sons estranhos. Não há, porém, evidência
de que os coríntios estivessem em êxtase. Os espíritos dos profetas estão sujeitos aos
mesmos. As instruções que Paulo deu no tocante à cortesia, e o amor e as limitações às
línguas não fariam sentido se os que falavam não tivessem pleno controle dos seus sentidos
e consciência do que acontecia em redor deles.(3)
A verdade é que o que acontecia em Corinto forma um paralelo com o que aconteceu
no dia de Pentecoste. No Pentecoste, a multidão ficou atônita no início, mas ninguém foi
Salvo pelas línguas. Passado algum tempo, enquanto os 120 falavam em línguas estranhas,
muitos não percebiam algum motivo" para o que os crentes faziam, e diziam que estavam
cheios de vinho novo (doce e muito inebriante). Era simplesmente outra maneira de dizerem
que pareciam estar fora de si, loucos. Há ocasiões hoje em que os incrédulos ouvem línguas
faladas em seus próprios idiomas, contando as obras maravilhosas de Deus como no Pente-
coste (Atos 2.11).(4) Mas Paulo torna claro que nas reuniões* ordinárias, em que não há
pessoas que só entendam idiomas estrangeiros, o propósito e o uso das línguas estranhas são
bastante restritos.
O dom de profecia, por outro lado, não é um sinal (sobrenatural) para o incrédulo (1
Coríntios 14.22). Sinal, aqui, é uma das palavras bíblicas para "milagre". Porque a profecia
está no seu próprio idioma, o incrédulo não a considera obviamente sobrenatural. Nem por
isso a profecia deixa de ser um sinal para o crente. Ele está em harmonia com o Espírito
Santo. Não precisa de línguas para deixá-lo saber que o sobrenatural está presente. Quando
o dom de profecia se manifesta, o crente o reconhece como uma obra sobrenatural do
Espírito Santo, cheia do seu poder.
Posto que o Espírito Santo opera através da verdade, aplicando-a aos corações na sua
obra de repreender e de convencer (João 16.8), o incrédulo consegue entender o que o
Espírito está transmitindo. Precisa passar pela sua mente, a fim de alcançar o seu coração.
Sendo assim, a profecia, dada no idioma que é compreendido por todos, leva os incrédulos
ou os ignorantes ao ponto de se verem à luz do Evangelho e de reconhecerem que a
mensagem provém de Deus. Isso os leva a prostrar-se em adoração diante de Deus,
prestando-lhe as devidas honras. Ao invés de dizerem que estamos fora de nós mesmos,
reconhecem que Deus está verdadeiramente entre nós (1 Coríntios 14.25).
Essa também foi a situação no dia de Pentecoste. Quando Pedro se levantou para
falar, não citou seus próprios pensamentos. Ele anunciou conforme o Espírito Santo lhe
concedeu que falasse, mas, desta vez, em profecia, e não em línguas. A palavra profética
falou aos corações deles, conforme demonstra Atos 2.37,41.
Mediante a comparação com o dia de Pentecoste, vemos que a igreja não gastou todo
o seu tempo falando em línguas, mas "perseverava na doutrina [ensino] dos apóstolos, e na
comunhão, e no partir do pão, e nas orações" (Atos 2.42). A palavra de Deus crescia, e se
multiplicava o número dos discípulos (Atos 6.7). Estêvão, "cheio de fé e de poder, fazia
prodígios e grandes sinais... E não podiam resistir à sabedoria, e ao espírito com que falava"
(Atos 6.8,10). Desde o início, uma variedade de dons espirituais manifestava-se na Igreja.
Paulo reconhecia que é normal essa variedade de expressão. As palavras "que fareis,
pois, irmãos?" (1 Coríntios 14.26) demonstram que Paulo desejava que os coríntios
percebessem esse fato. A primeira regra para a expressão dos dons espirituais, conforme
indica o capítulo 12, é que nenhum dom está destituído de importância, e que nenhum deve
ser deixado de lado. "Cada um de vós" significa que todos devem ter algo para contribuir
para a edificação do Corpo. Ninguém deve simplesmente acomodar-se no gozo do que
recebe. Não está subentendido, tampouco, alguma distinção entre o aspecto natural e
sobrenatural no ministério dos cristãos. Tudo provém do suprimento de Cristo (Efésios
4.16), e é ministrado pelo Espírito Santo e através dele.(5)
Quando os crentes se reúnem, pois (usualmente numa casa), um pode ter um salmo
(provavelmente um salmo do livro de Salmos) cantado sob a unção do Espírito Santo
(usualmente, com acompanhamento musical). Outro pode trazer uma doutrina (ensino), ou
seja: instrução iluminada pelo Espírito, tirada da Palavra de Deus. Outro pode apresentar
uma revelação, ou seja: um dos dons de revelação, tal como uma palavra de sabedoria ou de
conhecimento.
Ainda outro pode transmitir uma mensagem em línguas, e outro, uma interpretação.
Não há uma "ordem do culto" predeterminada nesse quadro de uma reunião cristã, segundo
o Novo Testamento.(6)
O Penhor do Espírito
2 Coríntios também tem essa visão do futuro. Juntamente com Efésios, fala do
penhor (primeira prestação) do Espírito, e o liga com o selar pelo Espírito. Depois de
enfatizar que Deus nos estabeleceu em Cristo e nos ungiu, Paulo diz que Ele também nos
selou e nos deu o penhor do Espírito em nossos corações (2 Coríntios 1.22). Posteriormente,
depois de falar da ocasião em que receberemos nossos novos corpos, diz (2 Coríntios 5.5):
"Ora, quem para isto mesmo nos preparou foi Deus, o qual nos deu também o penhor do
Espírito".
Efésios 1.12, depois de falar no propósito de Deus e em nossa herança, registra que
os crentes 'confiaram em Cristo depois de ouvirem a palavra da verdade, o Evangelho da sua
salvação, "Em quem [melhor, "por quem", por Cristo] também vós estais, depois que
ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação; e, tendo nele também crido,
fostes selados com o Espírito Santo da promessa. O qual é o penhor da nossa herança, para
redenção da possessão de Deus, para louvor da sua glória" (Efésios 1.13,14). Depois,
Efésios 4.30 informa que não devemos entristecer o Espírito Santo de Deus, no qual fomos
selados "para o dia da redenção".
Alguns traduzem "penhor" como "sinal", mas "primeira prestação" é preferível.
Assim como as primícias são uma parte real da colheita, também a primeira prestação faz
parte integrante da herança, e é a garantia do que receberemos posteriormente, em medida
maior.(13) Nossa herança é mais do que uma esperança. Agora, no meio da corrupção,
decadência e morte da era presente, desfrutamos do Espírito Santo, e através dele, do
começo da nossa herança propriamente dita.(14) Na realidade, o próprio Espírito Santo é o
penhor, embora todos os seus dons e bênçãos sejam indubitavelmente incluídos.
O selo relaciona-se com o pensamento de 1 João 3.2. Embora já sejamos filhos de
Deus, ainda não há glória exterior. Temos esses corpos mortais com todas as suas
limitações. Ainda possuímos dificuldades, tristezas e problemas que são comuns entre os
homens. Mas temos o presente do Espírito, que é o selo de garantia de que somos filhos de
Deus e de que a nossa esperança não nos decepcionará (Romanos 5.5). Quando Jesus vier,
seremos transformados na sua semelhança e compartilharemos da sua glória e do seu trono.
Entrementes, desfrutamos de uma parte real da nossa herança no Espírito Santo.
A Ocasião da Selagem
Tendo em vista Efésios 1.13: "Em quem [por Cristo]...tendo nele também crido,
fostes selados com o Espírito Santo da promessa", alguns chamam a atenção ao fato de que
é Cristo quem nos sela, depois de termos crido. Logo, identificam a selagem com o batismo
no Espírito Santo. Neste versículo, Dunn reconhece que o particípio aoristo, passado (forma
usada aqui com o verbo "crer", da mesma forma que em Atos 19.2), usualmente significaria
que o crer vem antes do selar.(17) Mas, da mesma forma que a maioria dos comentaristas diz
que o contexto exige que o crer e o selar aconteçam ao mesmo tempo. Isto é: a maioria
entende que a selagem se refere à vinda do Espírito na regeneração.(18)
O argumento é que o contexto centraliza sua atenção na vida espiritual, e não no
poder para o serviço. Mas em 2 Coríntios 1.21,22, é alistada a unção, que usualmente
significa serviço ou ministério. Outros dizem que pertencemos ao Senhor no momento em
que somos salvos, e que não podemos fazer com que esse relacionamento com Deus
dependa de uma experiência posterior.(19) Mas esse argumento não é aceitável. O selo não
era a causa da propriedade, mas apenas o reconhecimento da propriedade. Sendo assim, o
sangue de Cristo é o preço do resgate. Pela fé, cremos, e passamos a ser dele. Depois, o
batismo no Espírito Santo vem como o selo, a certeza dada por Jesus de que Deus aceitou a
nossa fé.
Alguns entendem que o selo é uma designação invisível.(20) Mas isso não parece
encaixar-se no significado normal de um selo que tinha o propósito de oferecer identificação
visível para os outros verem. O selo certamente é algo mais do que o ato de crer.(21) A
maioria dos comentaristas se esquece, também, que o batismo no Espírito Santo era a
experiência normal de todos os crentes dos tempos do Novo Testamento. Por isso, Paulo
não faz distinção entre os crentes selados e os que não têm este privilégio. Entende que
todos os crentes tiveram essa experiência, e que, portanto, estão incluídos.
Até mesmo a selagem dos 144.000 em Apocalipse 7.3 pode envolver o selo do
Espírito. É verdade que são selados com uma marca na testa. Mas mesmo no Antigo
Testamento, Deus não ordenava um sinal exterior, sem a realidade interior para acompanhá-
la. Davi foi ungido com óleo, mas também o Espírito Santo veio sobre ele daquele dia em
diante (1 Samuel 16.13).
O penhor, no entanto, fala de uma primeira prestação da nossa herança futura. Logo,
deve incluir a contínua atuação e poder do Espírito em nossa vida. Isso é algo importante
para conservarmos em mente. Encaixa-se, também, no terceiro capítulo de 2 Coríntios, onde
Paulo considera que a vida dos novos convertidos completa as suas epístolas, não escritas
com tinta, mas com o Espírito de Deus; não escritas em tábuas de pedra (como no caso da
Lei de Moisés, mas nos corações deles: 2 Coríntios 3.2,3).
Um só Templo, Um só Corpo
Na sua Epístola aos Efésios, Paulo ora pelos crentes, a fim de que Deus lhes dê o
espírito de sabedoria e de revelação no conhecimento dele (Efésios 1.17), não meramente
para a satisfação dos seus próprios desejos, mas a fim de que possam ver Cristo como Ele é:
o Cabeça da Igreja, ressuscitado e exaltado (Efésios 1.20-23).
Paulo tinha o mesmo desejo, a fim de que as igrejas na Ásia percebessem que a obra
do Espírito é manter a unidade do corpo de Cristo. Em Corinto, o problema foi que surgiram
facções numa igreja preponderantemente gentia. Em Éfeso e nas igrejas da Ásia, parece que
existia um grande número de judeus cristãos entre os novos convertidos gentios. Dessa
maneira, a linha divisória era primeiramente entre os judeus e os gentios. Precisavam ser
lembrados que a Igreja era única, mediante a morte de Cristo que derribou a parede (a Lei)
que fazia separação entre os judeus e os demais povos. Agora, por meio dele (Hebreus
10.20) ambos têm acesso ao Pai em um mesmo Espírito (Efésios 2.18). Agora estamos
reunidos, crescendo juntos para formar um só templo "para morada de Deus em Espírito"
(Efésios 2.22).
Paulo também lhes faz lembrar que a decisão de os gentios serem co-herdeiros com
os judeus fora tomada em tempos passados. O Antigo Testamento deixa muito claro que os
gentios compartilhariam da bênção. (Gênesis 12.3, por exemplo). Mas não ficara claro que
Deus consideraria tanto os judeus como os gentios sendo pecadores, que os colocaria na
mesma categoria, e depois demonstraria sua misericórdia ao deixar os dois grupos entrarem
na Igreja na mesma base: pela graça, mediante a fé.
Esse mistério não foi revelado somente a Paulo, mas a todos os santos apóstolos e
profetas da Igreja Primitiva, mediante o Espírito (Efésios 3.5). Paulo, no entanto, foi feito o
principal proclamador dessas boas novas aos gentios. Através dele, e por meio da conversão
dos gentios, a multiforme sabedoria de Deus fica conhecida aos principados e às potestades
nos céus. Não foi nenhum pensamento tardio. Foi segundo o eterno propósito que Deus fez
em Cristo Jesus nosso Senhor (Efésios 3.10,11). Sendo assim, Deus revela, através da
Igreja, o seu eterno propósito.
Tendo isso em mente, Paulo ora a Deus, a fim de que conceda aos crentes um
fortalecimento pelo poder do seu Espírito Santo no homem interior (Efésios 3.16). O poder
(sobrenatural) não é para os milagres, mas para o maior de todos: o de Cristo habitar nos
seus corações pela fé. Ajuda-os, também, a serem arraigados e fundados em amor, para que
compreendam a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade do plano de Deus, e
conheçam o amor de Cristo e sejam cheios de toda a plenitude do Senhor. Porque Ele é
poderoso para fazer muito mais do que o que pedimos ou pensamos, segundo o poder que
opera em nós (Efésios 3.17-20). Que conceito maravilhoso! Não somente Deus quer que
tenhamos uma vista panorâmica do seu plano! Ele quer nos dar a sua plenitude, que
forçosamente significa sua natureza, santidade, graça e seu amor.
Nós, no entanto, temos nossa parte no esforço para guardar a unidade do Espírito
pelo vínculo da paz, porque devemos cultivar o fruto do Espírito, especialmente o amor
(Efésios 4. 2,3). Essa unidade também é mantida por meio do reconhecimento de que há um
só Corpo, e um só Espírito, assim como fomos chamados em uma só esperança da nossa
vocação (isto é: a chamada que nos leva a avançar pressurosamente para o alvo em Cristo).
Isso importa em honrar um só Senhor (Jesus), em confessar uma só fé (um só Evangelho,
um só corpo de crenças), um só batismo (provavelmente não o batismo nas águas, mas o
batismo em Cristo pelo Espírito que nos une em um só), um Deus e Pai de todos (Efésios
4.6). A ênfase recai em um só Deus, um só Cristo, um só Espírito Santo e, portanto, um só
Corpo. Aqui, o destaque não significa algo que seja exterior. A variedade e a diversidade
devem trazer bênçãos e forças ao corpo, e não dividi-lo em facções. A cada um de nós, pois,
é dada a graça segundo a medida do dom de Cristo (Efésios 4.7). Isto, naturalmente, inclui
dons do Espírito, sem os quais "a igreja não poderá subsistir no mundo".(26)
Derramado Abundantemente
Boa parte da instrução dada por Paulo a Tito é semelhante à que Timóteo recebeu.
Há, porém, em Tito 3.5-7 uma magnífica declaração em forma compacta do que Cristo tem
feito por nós: "Não pelas obras de justiça que houvéssemos feito, mas segundo a sua
misericórdia, nos salvou pela lavagem [banho] da regeneração [novo nascimento] e
renovação do [pelo] Espírito Santo. Que abundantemente [ricamente] ele derramou sobre
nós por Jesus Cristo nosso Salvador; Para que, sendo justificados pela sua graça, sejamos
feitos herdeiros segundo a esperança da vida eterna".
Muitos entendem que se trata do batismo nas águas e supõem que aqui Paulo mudou
de idéia a respeito da salvação. Mas a ênfase continua sendo a mesma, pois a salvação não é
pelas obras. A lavagem, ou o banho, é o novo nascimento. A mesma palavra é usada em
Efésios 5.26: "A lavagem da água, pela palavra". Relaciona-se com Romanos 10.8,9, a
palavra que está junto de ti, na tua boca e no teu coração, ensinada por Paulo: "Se com a tua
boca confessares ao Senhor Jesus, e em teu coração creres que Deus o ressuscitou dos
mortos, serás salvo". O banho, mesmo o de água, é a Palavra que o Espírito Santo usa, pois
Ele é o Espírito da Verdade, não o da água. (Comparar também João 13.10; 15.3).
A renovação pelo Espírito Santo provavelmente tem a ver com novos
relacionamentos, pois a palavra regeneração significa uma vida nova. Pode falar do batismo
para dentro do corpo de Cristo, mediante o Espírito (1 Coríntios 12.13). Depois, como
pensamento adicional, o Espírito Santo é Aquele a quem Deus derramou ricamente sobre
nós, por meio de Jesus Cristo nosso Salvador. Esse derramamento por Jesus refere-se a Atos
2.33 e Joel 2.28. Mas a referência principal não diz respeito ao dia de Pentecoste, pois tanto
Paulo como Tito estão incluídos. Cada um tem seu próprio Pentecoste concedido por Jesus
Cristo.(30) Com isso, fica claro que cada novo convertido pode ter seu Pentecoste pessoal,
sua experiência do batismo no Espírito Santo, que pode tratar-se do mesmo derramamento
outorgado em Atos 2.4.
O fato de que Paulo passa a dizer: "...sendo justificados pela sua graça, sejamos feitos
herdeiros", não afeta essa certeza. Conclui, simplesmente, o pensamento, ao reconhecer que
a justificação pela graça (e, logicamente, mediante a fé; Efésios 2.8) é o que nos possibilita a
ser herdeiros. De fato, o versículo 7 é uma simples amplificação da expressão "segundo a
sua misericórdia nos salvou", no versículo 5.Í21)
Ciúmes
A Epístola de Tiago menciona o Espírito Santo uma só vez: "O espírito que em nós
habita tem ciúmes?" (Tiago 4.5). O contexto trata do fato de que a amizade com o mundo
nos torna inimigos de Deus, e da necessidade de submeter-nos a Deus e a sua graça. E
possível interpretá-lo no sentido de que Deus anseia com zelo pelo Espírito Santo que em
nós habita, desejoso de que lhe concedamos a oportunidade de desenvolver seu fruto e de
nos dar os seus dons. É possível, também, interpretá-lo no sentido de que o próprio Espírito
Santo anseia por nós e deseja que cooperemos com Ele no seu fruto e nos dons. O efeito é o
mesmo, seja qual for dessas interpretações adotada.
Tiago também nos fala de toda boa dádiva vinda do Pai, que "segundo a sua vontade
nos gerou pela palavra da verdade" (Tiago 1.17,18). Isso indica que o que Paulo e João
atribuem ao Espírito Santo realmente é provindo de Deus Pai. Mas isso é apenas mais uma
prova da cooperação entre a Trindade.
10
O ESPÍRITO NAS DEMONSTRAÇÕES
SOBRENATURAIS
O ministério do Espírito Santo na Igreja Primitiva foi realizado numa atmosfera de
grande expectativa. Não somente esperavam, diariamente, a bênção e a manifestação dos
dons espirituais, mas não se esqueciam, tampouco, que o Pentecoste era uma festa em que
se ofereciam as primícias. O Pentecoste não fazia parte da colheita final. Sendo assim,
antegozavam a futura volta de Cristo. De dentro da sua própria experiência pentecostal
surgiu a senha: Maranata, "Nosso Senhor, vem!" Nem sequer o passar do tempo ofuscou a
esperança deles. Paulo, perto de sua partida, percebeu que não viveria até contemplar o dia
glorioso em que os mortos em Cristo ressuscitariam. Mas nem por isso diminui-se a sua
certeza de que Jesus viria (2 Timóteo 1.12; 2.10,13; 4.7,8).
Essa esperança de ver Jesus novamente, tornou os cristãos primitivos mais
conscientes do que nunca da necessidade de continuar a sua obra no poder do Espírito
Santo. Nessa dispensação, o Espírito Santo é o Único que nos pode ministrar a vida, o poder
e a Pessoa de Jesus. Quer Ele seja chamado o Espírito de Deus, de Cristo, da paz, da
verdade, do poder, da graça ou da glória, é sempre o mesmo Espírito Santo que torna Jesus
real e realiza a sua obra.
Mesmo assim, Ele se distingue de Jesus como outro Consolador ou Ajudador, e
como Aquele que testifica de Cristo mediante os seus ensinos (João 14.16,26; 16.13,14) e os
seus atos poderosos (Atos 2.43; Romanos 15.18,19). Ele também se distingue do Pai, e é
enviado tanto pelo Pai como pelo Filho (Gálatas 4.6; João 14.26; 15.26; 16.7). Ele tem sua
divindade demonstrada por tudo quanto faz, especialmente pelo fato de conhecer os
mistérios de Deus (1 Coríntios 2.10,11), e roga por nós de acordo com a vontade de Deus
(Romanos 8.27).
Ele também ajuda no atendimento das orações por meio da direção, tanto dos
indivíduos como da Igreja,'segundo a vontade de Deus. Ele dirigiu Filipe a um eunuco
etíope, e Pedro à casa de Cornélio, e deu à igreja em Antioquia ordens para enviar Paulo e
Barnabé como missionários. Todo cristão deve tudo ao Espírito Santo que rompeu todas as
barreiras e ajudou, pelo menos alguns, a vencer seus preconceitos embutidos e a avançar
para alcançar o mundo.
O Dom do Espírito
Devemos, no entanto, evitar a idéia de que, em nossa vida cristã, nosso objetivo
principal seja o nosso aperfeiçoamento. A verdade é que conseguimos mais crescimento,
enquanto servimos. O santo (dedicado, consagrado) não é o que passa todo o seu tempo no
estudo, na oração e nas devoções, por mais importante que isso seja. Os vasos no
tabernáculo não podiam ser usados para outros fins, mas não foi a separação do uso comum
que os tornou santos. Não eram santos até serem usados no serviço de Deus. Logo, o santo é
aquele que não somente é separado do mal, mas também separado para Deus, santificado e
ungido para o uso do Mestre. Isto era simbolizado, no Antigo Testamento, pelo fato de que
o sangue era aplicado primeiro, e depois, o óleo sobre o sangue. A purificação, portanto, era
seguida por uma unção simbólica que representava a obra do Espírito na preparação para o
serviço. De modo que nós também somos ungidos, assim como o foram os profetas, os reis,
e os sacerdotes da antigüidade (2 Coríntios 1.21; 1 João 2.20).(2)
Os meios e o poder para o serviço provêm através dos dons espirituais. Mas é
necessário fazer distinção entre os dons e o dom do Espírito. O batismo com o Espírito
Santo era necessário antes de os primeiros discípulos saírem de Jerusalém ou até mesmo
cumprirem a Grande Comissão. Precisavam de poder, e o próprio nome do Espírito Santo
tem ligação com força.(3) Ele se manifesta como o Dom e o Poder. Ele mesmo é as
primícias da grande colheita, e veio para iniciar a tarefa que trará alguns de cada raça,
língua, povo e nação para estar junto do trono (Apocalipse 5.9). O mesmo batismo foi
experimentado por outros, em pelo menos quatro ocasiões, registradas em Atos, conforme já
vimos, bem como por alguns, posteriormente, de conformidade com Tito 3.5.
No dia de Pentecoste o recebimento do dom do Espírito foi marcado pela evidência
física (ou exterior, posto que não era totalmente física) do falar em outras línguas (idiomas
diferentes), conforme o Espírito concedia que falassem. Baseado no fato em que as línguas
são a evidência oferecida, e especialmente no motivo em que as línguas foram a evidência
convincente na casa de Cornélio ("Porque os ouviam falar línguas", Atos 10.46), há um
argumento a favor da consideração das línguas como evidência física (ou exterior) do
batismo com o Espírito Santo.(4)
Conforme muitos reconhecem, é difícil comprovar, pelo livro de Atos, que o falar em
outras línguas não é a evidência do batismo com o Espírito Santo.(5) A maioria dos que
desconsideram as línguas como a evidência do batismo apela para as Epístolas, procurando
provas teológicas para seu ponto de vista.(6) Mas as Epístolas não estão tão divorciadas
assim das experiências de Paulo e das pessoas para quem as escrevia. Considerá-las
totalmente teológicas, para contrastar com o livro de Atos, não se encaixa com os fatos.
Mesmo quando as Epístolas oferecem verdades proposicionais, tais como a justificação pela
fé, relaciona-se com a experiência anterior de Abraão (Romanos 4). Conforme já vimos, boa
parte do que Paulo diz a respeito do Espírito Santo nas suas
Epístolas forma um paralelo com as experiências no livro de Atos.
O argumento contra as línguas como evidência baseia-se na pergunta: "Falam todos
diversas línguas?" (1 Coríntios 12.30). Já vimos que esse é um argumento muito fraco,
mormente porque o verbo está no presente contínuo: "Todos continuam falando em
línguas?" que significa: todos têm um ministério perante a igreja de falar em línguas?
O valor das línguas como um sinal, na edificação pessoal, nos ensina a corresponder
ao Espírito Santo, de modo singelo e com a fé de uma criança. O próprio fato de que não
sabemos o que dizemos nos ajuda a corresponder ao Espírito, sem imiscuir nossas próprias
idéias e vontades, porque falamos conforme o Espírito nos concede que pronunciemos.
Usualmente, não há algum registro em nosso cérebro, quanto ao que devemos dizer. Pelo
contrário, nossas mentes estão cheias de louvor, e simplesmente (mas de modo ativo)
entregamos nossos órgãos vocais, nossa boca e língua, ao Espírito Santo e falamos o que Ele
concede.(7) (Alguns dizem que o Senhor lhes deu poucas palavras, antes de serem
pronunciadas por eles. Quando obedeciam e falavam o que lhes vinha à mente, o Espírito
Santo lhes concedia a capacidade e a liberdade de falar em línguas).
No livro de Atos, também, as línguas se manifestavam quando o dom do Espírito era
recebido. Pode haver, ou não, um intervalo de tempo entre o crer para a salvação e o receber
o Dom. A pessoa deve exercer a sua fé e receber o Dom tão logo se torne crente. Mas
nenhum intervalo é indicado em Atos entre o receber o dom do Espírito e o receber a
evidência do falar em línguas. Donald Gee fala da experiência de seu batismo com o
Espírito Santo "pela fé" e, posteriormente, depois de duas semanas, da nova plenitude em
sua alma, ao "começar a pronunciar palavras em uma nova língua".(8) Muitos outros têm
testificado de uma experiência semelhante. Na minha própria experiência, o Espírito Santo
tornou Jesus tão real que não tive consciência de estar falando em línguas. (Embora outras
pessoas dissessem que eu falava). Na noite seguinte, simplesmente disse ao Senhor que se
havia liberdade no dom de línguas, eu queria possuí-la. Imediatamente, as línguas se
derramaram em abundância. Talvez seja essa uma questão de "o vento sopra onde quer".
Temos a certeza, no entanto, que quando falamos em línguas recebemos o Dom, a respeito
do qual a Bíblia fala. Sendo assim, ela é nossa bússola, e devemos julgar pela mesma a
nossa experiência.
Isso não quer dizer que as línguas devam ser procuradas. Nossa atenção deve fixar-se
no poderoso Batizador, no próprio Senhor Jesus Cristo. A fé que faz cumprir a sua promessa
é a chave para sermos batizados com o Espírito Santo. Posto que o Batismo é para o serviço,
a consagração e dedicação a Deus, sempre são a atitude certa (Romanos 6.13; 12.1). Mas
não podemos programar a maneira de Ele chegar até nós. Toda ocasião mencionada no livro
de Atos era diferente uma da outra. Às vezes, Ele veio a despeito do que fazemos, o mesmo
caso de "o vento sopra onde quer" (João 3.8). Ele pode vir mansamente, com o mínimo
sussurro. Pode vir como o som de um vento impetuoso. Estejamos dispostos a deixá-lo vir
conforme Ele deseja.
Deve ser reconhecido, também, que falar em línguas é apenas a evidência do batismo
com o Espírito Santo. Outras evidências se seguirão, à medida que o Espírito transborda
para todos os aspectos da vida (João 7.37,39; Atos 4.8). Podemos esperar, também, que haja
profunda reverência a Deus (Atos 2.43; Hebreus 12.28); uma dedicação e consagração mais
intensa ao Senhor e à sua Palavra (Atos 2.42); um amor sempre maior e mais ativo a Cristo,
à Bíblia, e aos perdidos (Marcos 16.20).
De fato, sempre deve ser levado em consideração que o batismo com o Espírito Santo
não é uma experiência final. Assim como o próprio Pentecoste era apenas o início da
colheita, e trouxe os homens para a comunhão da adoração, do ensino e do serviço, também
o batismo com o Espírito Santo é apenas a porta de entrada para um relacionamento
crescente com o Espírito e com os outros
crentes. Leva a uma vida de serviço em que os dons do Espírito fornecem poder e
sabedoria para a propagação do Evangelho e o crescimento da Igreja. Esse fato é
evidenciado pela divulgação rápida do Evangelho em muitas áreas do mundo atual. Novas
plenitudes e diretrizes para o serviço devem ser esperadas, à medida que surgem novas
necessidades, e à medida que Deus, na sua vontade soberana, leva a efeito o seu plano.
A Fé
A fé, como um dom, é obviamente diferente da salvífica e da fidelidade que é o fruto
do Espírito. Alguns entendem que se trata da fé que move montanhas, ou do tipo da que foi
demonstrada pelos heróis da fé em Hebreus 11.(25) Mas assim como uma palavra de
sabedoria é dada à Igreja para satisfazer a necessidade de um item específico de sabedoria,
também este dom pode ser a transmissão de fé ao Corpo. O Espírito Santo pode usar um
cântico, uma oração, um testemunho, ou a pregação como um canal para comunicar a fé ou
erguer o nível da fé na Igreja. Essa comunicação da fé fez de Paulo um ministro capaz do
Novo Testamento (novo concerto) (2
Coríntios 3.4-6). Capacitou-o a ajudar outros a receber o Espírito mediante a
pregação da fé (Gálatas 3.2,5). Certamente, também, foi manifestada na oração uníssona que
produziu um novo derramamento do Espírito em Jerusalém (Atos 4.31). Possivelmente,
também tem sido expressada na forma de poder para levar a efeito outros tipos de
ministério.
Dons de Curas
No grego, as palavras dons e curas estão no plural. Alguns entendem que isso
significa que há uma variedade de formas desse dom.(26) Entre os que pensam assim, há
quem entenda que certas pessoas têm um dom de curar um tipo de doença ou enfermidade,
ao passo que outros curam outro tipo. Filipe, por exemplo, foi especialmente usado para
curar os paralíticos e os coxos (Atos 8.7). Outros, ainda, entendem que Deus dá a uma
pessoa um dom na forma de um suprimento de curas numa ocasião específica, ao passo que
outro suprimento é dado em outra ocasião, talvez a outra pessoa, mais provavelmente no
ministério do evangelista.(27) A cura do coxo na porta Formosa é considerada um exemplo
disso (Atos 3.6,7).
Ainda outros entendem que toda cura é um dom especial(28), isto é, o dom é para o
enfermo que tem a necessidade. Logo, segundo esse ponto de vista, o Espírito Santo não
torna os homens curadores. Pelo contrário, Ele providencia um novo ministério de cura para
cada necessidade, à medida que ela surge na Igreja. Por exemplo, a virtude (poder) que fluiu
para dentro do corpo da mulher com o fluxo de sangue trouxe para ela um gracioso dom de
cura (Mateus 9.20-22). Atos 3.6 diz, literalmente: "O que tenho, isso te dou". Isso está no
singular e indica um dom específico dado a Pedro para este dar ao coxo. Não parece
significar que tinha um reservatório de dons de curas dentro de si mesmo, mas um novo
dom para cada enfermo a quem ministrava.
Não há evidência de que os apóstolos conseguiam curar sempre
quando se sentiam dispostos, mediante algum poder residente de cura. Nem
consideravam a cura o seu ministério principal. Lemos a respeito de milagres
extraordinários pelas mãos de Paulo em Éfeso (Atos 9.11). Isso dá a entender que, em
conexão com o estabelecimento das sete igrejas na Ásia, através do ministério de Paulo em
Éfeso, foram realizados milagres incomuns que não aconteciam em todos os lugares. Sendo
assim, Paulo não possuía em si mesmo nenhum dom automático que o tornasse um curador.
Em Éfeso, Deus usou lenços (suadouros) e aventais (de serviço) tirados de Paulo, enquanto
fazia tendas. Os milagres realizavam-se, à medida que esses objetos se tornaram
instrumentos para os enfermos expressarem a sua fé. Não é fácil para um doente mostrar a
sua fé, e Jesus freqüentemente fazia algo para encorajar a expressão ativa da fé. Em certa
ocasião, até mesmo a sombra de Pedro foi um desses meios (Atos 5.15,16). Mas as maneiras
empregadas sempre variavam entre si, e nunca lhes era permitido tornar-se em formas ou
cerimônia. Deviam depositar sua fé no Senhor, e não nos meios usados para ajudá-los.
Isso nada tem a ver diretamente com os dons de curas. A ênfase em 1 Coríntios 12.9
recai na expressão desse dom, através dos vários membros individuais do Corpo. Não
precisamos procurar um evangelista. (A obra dele visa primeiramente os pecadores). Talvez,
nem sempre seja possível chamar os presbíteros (Tiago 5.14,15). Mas os dons de curas estão
disponíveis a todos os membros da Igreja para ministrarem aos enfermos.
Operações de Maravilhas
Aqui, os dois substantivos em grego estão no plural e, de novo, a idéia é que muitas
variedades de milagres ou atos de poder estão disponíveis. Maravilhas é o plural da palavra
virtude [ou poder] em Atos 1.8, e significa atos de grande poder sobrenatural que vão além
de qualquer coisa realizada pelo homem. São intervenções divinas que se distinguem das
curas.
Palma afirma que operações é usada quase exclusivamente para a atividade de Deus
(Mateus 14.2; Marcos 6.14; Gálatas 3.5; Filipenses 3.21) ou de Satanás (2 Tessalonicenses
2.7,9; Efésios 2.2). Sugere, portanto, que esse dom é especialmente operativo em conexão
com o conflito entre Deus e Satanás. Esses atos de poder, que levam Satanás à derrota,
podem incluir o castigo da cegueira imposto a Elimas (Atos 13.9-11) e a expulsão de
demônios.(29)
Alguns entendem que esse dom envolve a ressuscitação dos mortos ou os milagres na
natureza inanimada, tais como acalmar a tempestade e andar sobre as águas.(30) Mas Donald
Gee informa que faltam milagres sobre a natureza inanimada, tanto em Atos como nas
Epístolas. Paulo sofreu quatro naufrágios. A descrição daquele em Malta demonstra que a
providência divina conduziu todos à terra firme, mas a nado, e não mediante um milagre (2
Coríntios 11.25-27; Atos 27.43; 28.5). Há, apenas, dois registros de ressurreição de mortos
(Atos 9.40; 20.10). Nos outros casos, foi-lhes indicado o consolo da ressurreição e da volta
de nosso Senhor (1 Tessalonicenses 4.13-18).(31)
Tanto os dons de curas como os de operações de milagres demonstram-nos, e ao
mundo em nosso derredor, que Jesus realmente é o Vitorioso. Na Cruz, o preço foi pago e a
condenação de Satanás foi confirmada. Mas os resultados finais de tudo isso só serão vistos
quando formos transformados e recebermos nosso corpo imortal e incorruptível, e Satanás
for lançado no lago do fogo e o último inimigo, a morte, destruída (1 Coríntios 15.51-54;
15.26; Apocalipse 20.10-14). Entrementes, há dons espirituais a nossa disposição, para nos
conceder um antegozo disso em curas e milagres, não conforme as exigências que fazemos,
mas conforme o Espírito Santo deseja (1 Coríntios 12.11).
A Profecia
A natureza desse dom já foi estudada em conexão com 1 Coríntios 14 e com o
profeta. Tudo quanto precisa ser enfatizado
aqui é que o dom estava à disposição de qualquer membro da congregação, e não
apenas dos que tinham o ministério profético. De fato, por causa da edificação que a Igreja
recebe através desse dom, todos são encorajados a buscá-lo. A profecia relaciona-se,
também, com a iluminação dos mistérios do Evangelho. Além disso, pode haver uma
variedade de expressões do dom.(32) Mas, na maioria dos casos, parece ser dirigido ao corpo
dos crentes reunidos. O sermão de Pedro, conforme já foi indicado, foi um cumprimento da
promessa de Joel a respeito do dom de profecia. Mas Pedro classificou as línguas, também,
como parte daquele cumprimento e, conforme indica 1 Coríntios 14, elas precisam de
interpretação, para edificarem. Tendo em vista, porém, a natureza do sermão de Pedro, é
possível que durante a pregação em outras ocasiões em Atos, o dom de profecia tenha
estado em operação. O pregador precisa mesmo preparar-se, mas ainda poderá haver
ocasiões em que o Espírito Santo lhe dará alguma coisa a mais do que aquilo que tem nas
suas anotações. Se a experiência dos profetas do Antigo Testamento serve como orientação,
vemos que Deus freqüentemente lidava com eles, enquanto estavam a sós com Ele, e depois
os enviava para profetizar, para falar em nome dele. Através da profecia, o Espírito Santo
toca nos pontos sensíveis, revela o que está oculto, e produz a convicção e a adoração, bem
como o encorajamento e o estímulo à ação.C3)
Os Discernimentos de Espíritos
Mais uma vez, os plurais indicam uma variedade de formas em que este dom pode
manifestar-se. Envolve um "distinguir entre" espíritos. Posto que é mencionado
imediatamente depois do dom de profecia, sugere-se que está envolvido no julgar
mencionado em 1 Coríntios 14.29.(34) O fato é que a palavra discernimento significa formar
um juízo e se relaciona com a palavra usada para julgar profecias. Envolve uma percepção
que é dada de modo sobrenatural, para diferenciar entre os espíritos, bons e maus, genuínos
ou falsos, a fim de chegarmos a uma conclusão.
João diz que não devemos crer em todos espíritos, mas prová-los (1 João 4.1). Às
vezes, um dom do Espírito é necessário para fazer isso. A Bíblia, na realidade, fala em três
espíritos: o de Deus, o do homem e o do Diabo (com os maus espíritos ou demônios com ele
associados). Na operação deste dom na congregação, parece que o espírito do homem talvez
cause mais problemas. Mesmo com as melhores intenções, é possível que algumas pessoas
tenham a impressão de que seus próprios sentimentos são a voz do Espírito Santo. Ou, por
causa do zelo excessivo ou da ignorância espiritual de como a pessoa se rende ao Espírito
Santo, seu espírito possa intrometer-se.(35)
Como os demais dons, este não ergue o indivíduo a um nível mais alto de
capacidade. Nem oferece a alguém o poder de olhar as pessoas e dizer de que espírito são. É
um dom apropriado para uma ocasião específica. Alguns exemplos podem ser achados,
possivelmente, em Atos 5.3; 8.20-23; 13.10; 16.16-18.
Administração (Governos)
O plural parece indicar uma variedade de expressões do dom para cumprir as
necessidades de uma posição de liderança ou de administração (1 Coríntios 12.28). Outros
usos dessa palavra fora do Novo Testamento subentendem transmitir conselhos sábios. Um
substantivo estreitamente correlato significa o timoneiro ou piloto do navio (Atos 27.11).
Parece que subentende dirigir os negócios de uma congregação, bem como liderar
espiritualmente.
Provavelmente, esse era o dom do Espírito especialmente para o principal
administrador, chamado o ancião ou presbítero, em comparação com os chefes das
sinagogas, e chamado bispo ou superintendente na língua grega. Tratava-se de um oficial
eleito que devia ser escolhido, não por politicagem nem pela influência de poder, mas
mediante a sabedoria do Espírito dada à Igreja. Então, ele era equipado com os dons do
Espírito e dependeria deles, e não apenas da sua capacidade de líder.
O plural também pode indicar que o dom estava à disposição de outros cargos que
envolviam liderança ou administração.
Exortação
Embora 1 Coríntios 14.3 inclua esse dom dentro do de profecia,
Romanos 12.8 relaciona-o como um dom distintivo. Abrange as idéias de conclamar,
desafiar ou fazer um apelo. É possível, também, que o verbo tenha a idéia de conciliar,
encorajar amizade, levar a efeito a unidade do Espírito.
A exortação específica de perseverar até o fim e de conservar diante de nós a
esperança da vinda de Cristo é outro aspecto importante desse dom. Nossa esperança é um
elemento vital em nossa vida cristã, e embora o estudo das Escrituras seja importante para
mantê-la (Romanos 15.4), o dom do Espírito pode encorajar-nos à luz dessa esperança, e
pode fazê-la viver.
Contribuir, Repartir
Trata-se de dar uma parte daquilo que possuímos, compartilhar com outros,
especialmente conceder aos necessitados (Efésios 4.28). Conforme indica Efésios, não se
trata primeiramente de um dom do Espírito para ajudar os ricos a distribuir as suas riquezas.
Os pobres são conclamados a trabalhar com as mãos, a fim de poderem compartilhar com os
necessitados. Era esse o dom ou ministério do Espírito em que todos participaram
imediatamente após o Pentecoste (Atos 2.44,45; 4.34,37). Devia ser feito com singeleza,
sinceridade e generosidade. Barnabé foi um dos melhores exemplos, ao passo que Ananias e
Safira demonstraram o contrário.
Exercer Misericórdia
Esse último dom na lista de Paulo (Romanos 12.8) tem a ver com o ministério da
prática de atos de misericórdia, da ajuda ao próximo de modo gracioso e compassivo.
Envolve o cuidado pessoal dos necessitados, dos enfermos, dos famintos, dos nus (daqueles
que têm insuficiência de roupas) e dos encarcerados. É um dos dons mais importantes,
conforme Jesus declarou (Mateus 25.31-46).
Podemos também incluir o ministério exercido por Dorcas (Atos 9.36-39). Mas,
percorrendo as Escrituras, vemos o cego clamando a Jesus, pedindo um ato de misericórdia
para que ele enxergasse (Marcos 10.47,51). O rico, no Hades, pediu que Lázaro fosse
enviado, numa missão de misericórdia, para levar uma gota de água e refrigerar a sua língua
(Lucas 16.24). O samaritano evidenciou atos de misericórdia ao homem que caiu entre
salteadores (Lucas 10.37). Mas a mesma palavra é freqüentemente usada a respeito da
misericórdia de Deus ao dar salvação, bênçãos e ministério (Romanos 11.30; 1 Pedro 2.10;
2 Coríntios 4.1). O Senhor, portanto, é rico em misericórdia (Efésios 2.4). Esse dom,
portanto, pode ministrar a misericórdia e ajuda de Deus aos necessitados, quer a necessidade
deles seja física, financeira, mental ou espiritual.
Esse dom deve ser transmitido com alegria, bom ânimo e graça. Cumprir esses atos
de misericórdia por mero senso de dever, ou na esperança de obter uma recompensa, ou
como uma expressão de bondade humana, não bastará. De fato, a eficácia de um ato de
misericórdia freqüentemente depende mais da maneira de ser feito do que exatamente o quê
ou quanto é feito. É necessário o dom do Espírito para ter um ministério desse tipo. Mesmo
assim, esse dom, juntamente com o de repartir, é acessível a todos nós e, de fato, é útil para
todos nós. Bom seria se todo cristão lesse Mateus 25.31-46. Não importa o modo de
interpretação dessa passagem: os princípios estão sempre ali. Embora a nossa salvação não
dependa de obras, se ela for real, entrará em ação. O Espírito, que glorifica a Jesus, nos
ajudará a fazer todas essas coisas.
CONTRACAPA
"Este volume é literalmente um comentário sobre o Espírito Santo... Nele, você
achará excelência exegética, firmeza doutrinária e aplicação prática. Mais do que isso,
encontrará o toque inspiracional que tornará muito deleitoso consultá-lo, quer nas
pesquisas, quer na leitura devocional." (Thos. F. Zimmerman, ex-superintendente Geral das
Assembléias de Deus nos E.U.A.). Escrito sob um prisma evangélico e uma perspectiva
pentecostal, este livro conduz o leitor a passear pela Bíblia, livro por livro, e concede uma
nova visão sobre o que as Escrituras ensinam acerca do Espírito Santo. E o resultado de uma
vida dedicada ao estudo da Palavra de Deus por um dos mais respeitados eruditos
pentecostais dos nossos dias, e tornar-se-á um texto permanente de consulta neste campo
doutrinário. O autor descreve sobre o Espírito Santo na atualidade, no Pentateuco, na
História de Israel, nos livros proféticos, na vida e no ministério de Cristo, no livro de Atos,
na vida cristã, no ministério da Igreja e nas demonstrações sobrenaturais.
Dr. Stanley M. Horton, neto de Elmer Fisher, (um dos líderes do Avivamento
Pentecostal registrado em Los Angeles no ano de 1906), professor do Central Bible College
por 30 anos, titular das disciplinas Bibliologia e Teologia no Seminário Teológico das
Assembléias de Deus em Springfield, Missouri, comentador da revista de professor de
adultos da Escola Dominical, autor dos livros Conhecendo toda Verdade, O Livro de Atos,
Sempre Pronto, Está Ficando Tarde e Seja Bem-vindo, Jesus!