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UV Vis

Explicar de forma sucinta como ocorre o processo de absorção de radiação UV-vis. Aplicar a lei de Lambert-Beer para o cálculo do coeficiente de absorção molar de um composto orgânico. Exemplificar os tipos de cromóforos mais comuns indicando as principais transições eletrônicas envolvidas em cada caso. Utilizar as regras de Woodward-Fieser para predizer os valores de comprimento de onda de máxima absorvância para polienos e compostos carbonílicos. Explicar a influência do pH do meio

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Explicar de forma sucinta como ocorre o processo de absorção de radiação UV-vis. Aplicar a lei de Lambert-Beer para o cálculo do coeficiente de absorção molar de um composto orgânico. Exemplificar os tipos de cromóforos mais comuns indicando as principais transições eletrônicas envolvidas em cada caso. Utilizar as regras de Woodward-Fieser para predizer os valores de comprimento de onda de máxima absorvância para polienos e compostos carbonílicos. Explicar a influência do pH do meio

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Capítulo 2

Espectroscopia no ultravioleta e no visível

Ao concluir o estudo deste capítulo, você deverá ser capaz de:

 Explicar de forma sucinta como ocorre o processo de absorção de radiação UV-vis.


 Aplicar a lei de Lambert-Beer para o cálculo do coeficiente de absorção molar de um composto
orgânico.
 Exemplificar os tipos de cromóforos mais comuns indicando as principais transições eletrônicas
envolvidas em cada caso.
 Utilizar as regras de Woodward-Fieser para predizer os valores de comprimento de onda de
máxima absorvância para polienos e compostos carbonílicos.
 Explicar a influência do pH do meio sobre os espectros UV-vis de compostos ácidos e básicos.
 Apresentar alguns exemplos de aplicação da espectroscopia UV-visível.

1. INTRODUÇÃO
Dentre os vários métodos espectroscópicos utilizados para a elucidação da estrutura de
compostos orgânicos, a espectroscopia UV-vis é uma das mais antigas, sendo precedida apenas
por medidas de rotação específica e índice de refração.
Na primeira metade do século XX a determinação estrutural de compostos orgânicos
consistia em um processo muito laborioso que envolvia estudos de degradação. Os compostos
eram caracterizados com base em dados físicos como temperatura de fusão e análise elementar.
O preparo de diversos derivados também era um procedimento comum e importante.1 Já nos
anos 1930 a espectroscopia no UV-vis começou a ter ampla aplicação na elucidação estrutural
de compostos orgânicos. Com o advento de outras técnicas como espectroscopia no infraverme-
lho e ressonância magnética nuclear, o uso da espectroscopia UV-vis para fins de elucidação
estrutural de novos compostos orgânicos diminuiu muito em importância, sendo usada apenas

1
Veja a referência Shriner et al. (2004) para detalhes sobre preparo de derivados.

1
em algumas áreas e com aplicações muito específicas. Apesar disso, é importante lembrar que o
conhecimento dos efeitos da radiação UV-vis sobre compostos orgânicos pode ser muito útil no
entendimento de vários procedimentos e técnicas utilizadas rotineiramente em laboratório. Por
exemplo, a visualização de placas cromatográficas sob luz ultravioleta pode fornecer informa-
ções úteis sobre a natureza estrutural dos compostos investigados. A técnica de cromatografia
líquida de alta eficiência (CLAE), empregada para a identificação e quantificação de compostos
não voláteis, faz uso de diversos tipos de detectores, sendo um dos mais comuns o UV-vis. Um
detector mais moderno do tipo de arranjo de diodos (Raimundo e Pasquini, 1997) permite a
obtenção dos espectros UV-vis de cada composto separado e a comparação com espectros de
padrões auxilia na identificação de constituintes de uma mistura. Dessa forma, faremos nesse
capítulo uma apresentação breve dos conceitos e algumas aplicações da espectroscopia UV-vis.
Antes de prosseguirmos, apresentamos na Figura 2.1 como exemplo os espectros no UV de
duas cetonas -insaturadas conjugadas com um anel aromático. Na ordenada, a escala repre-
senta o logaritmo do coeficiente de absorção molar () e na abcissa o comprimento de onda em
nanômetro é representado. Na ordenada é também comum se representar os valores de de
absorvância (A)ou mesmo a porcentagem de transmitância (%T).
Os espectros no UV-visível normalmente apresentam poucas bandas, que são ge-
ralmente largas como no caso ilustrado na Figura 2.1. Note que os espectros nesses casos apre-
sentam apenas duas bandas largas. Os parâmetros médios e registrados de um espectros UV-vis
correspondem aos valores de comprimento de onda dos máximos de absorção (max) e os valores
correspondentes de coeficientes de absorção molares (max ou logmax).

Figura 2.1 – Espectros no UV da (E)-4-fenilbut-3-en-2-ona (1) e da cetona tricíclica (2) (Adaptado de J.


Am. Chem. Soc., 1947, 69, 1985).

2
Apesar da grande importância da espectroscopia no UV-visível em diversas aplicações es-
pecíficas, devemos deixar claro que uma grande limitação da técnica se deve ao fato de que
compostos diferentes podem apresentar espectros muito parecidos como ilustrado pela Figura
2.1. A curva cheia (I) corresponde ao espectro do composto (1) enquanto a pontilhada (II) ao
espectro de (2). O composto (1) apresenta temperatura de fusão de 42 ºC, enquanto o composto
(2) funde a 83 ºC. Embora com propriedades físicas completamente diferentes, como ilustrado
pela temperatura de fusão, seus espectros no UV são praticamente idênticos. Assim, muito cui-
dado deve ser tomado ao se interpretar um espectro no UV-visível. Em função da simplicidade
dos espectros, é relativamente difícil obter informações estruturais precisas, sendo que a utilida-
de desta técnica é muito maior quando já se tem outras informações sobre os compostos sendo
investigados. Em outras palavras, essa técnica, assim como as demais que discutiremos nesse
texto, deve ser utilizada em conjunto, onde cada uma fornecerá alguma informação sobre a fór-
mula estrutural do composto que está sendo analisado.

2. REGRAS DE SELEÇÃO E ABSORÇÃO DE RADIAÇÃO


ELETROMAGNÉTICA

Como visto no Capítulo 1, a faixa de comprimentos de onda que corresponde à radiação


ultravioleta próximo varia aproximadamente de 200 a 400 nm, e a faixa do visível de 400 a 780
nm. A região de 10 a 200 nm corresponde ao ultravioleta afastado, também conhecido como
ultravioleta do vácuo, não tem aplicação rotineira para fins de análise estrutural ou quantitativa.
A energia associada à radiação UV varia em torno de 595-299 kJ mol-1 enquanto na re-
gião do visível é de 299-153 kJ mol-1. Essas quantidades de energia são suficientemente grandes
para promover transições eletrônicas de um nível de energia mais baixo para um mais elevado,
conforme ilustrado na Figura 2.2.

Lembre-se que a relação


entre a energia (E) e o
comprimento de onda de
uma radiação é dada pela
equação:
ℎ𝑐
𝐸 𝑘𝐽𝑚𝑜𝑙 −1 =
1,19x105
=

Ou seja, quanto maior o


comprimento de onda da
radiação, menor será a sua
energia, e vice-versa.

Figura 2.2 – Diagrama esquemático representando possíveis transições eletrônicas do nível fundamental
(G) para o nível excitado (E). Para cada nível eletrônico são representados os subníveis vibracionais
(, representados pelas linhas grossas) e os respectivos subníveis rotacionais (linhas finas).

3
Na Figura 2.2 são representados, esquematicamente, os níveis de energias eletrônicos
nos estados fundamental (G) e excitado (E). Para cada nível eletrônico são representados os
subníveis vibracionais , etc que correspondem às linhas mais grossas. Para cada nível
vibracional existem vários subníveis rotacionais que são representados pelas linhas mais finas.
Para promover transições entre níveis vibracionais e rotacionais são necessárias radiações de
menor energia, ou seja, maiores comprimentos de ondas. Essas radiações correspondem às asso-
ciadas ao infravermelho e micro-ondas.
À temperatura ambiente a maioria (nem todas) das moléculas se encontram no mais
baixo nível vibracional do nível eletrônico fundamental G. A absorção de radiação UV-vis
pode então levar à promoção de um elétron para o nível excitado E. Como a transição eletrônica
é acompanhada por transições vibracionais e rotacionais, o elétron pode ser transferido para
qualquer um dos estados excitados E etc. Em função dessas transições, as bandas de
absorção em um espectro UV-vis são geralmente largas.
Embora existam muitas possibilidades de transição, deve ficar claro que nem todas
ocorrem, e mesmo as que ocorrem possuem probabilidades diferentes de ocorrência. Existem
regras de seleção para que as transições ocorram. Essas regras se baseiam nas simetrias dos
orbitais moleculares tanto do estado fundamental quanto excitado. De forma simplificada, as
transições são permitidas se:

i) não houver mudança na orientação do spin do elétron durante o processo;


ii) as simetrias das funções inicial e final forem iguais. Essa segunda regra é conhecida como
regra de simetria e um exemplo corresponde à transição n* em uma carbonila, por
exemplo. Nesse caso o elétron do orbital n é promovido para um orbital * que é ortogo-
o
nal (a carga é movida em 90 ), resultando em uma transição proibida. Devemos chamar a
atenção que as chamadas transições proibidas podem ocorrer, todavia resultam em ban-
das muito pouco intensas. Geralmente as transições proibidas apresentam valores de 
pequenos e menores que 1000.

Para melhor ilustrar esse processo de absorção de energia e os orbitais envolvidos, observe a
Figura 2.3. Nesta figura verifica-se que a diferença de energia entre os orbitais de fronteira HOMO
e LUMO do eteno corresponde a aproximadamente 720 kJ mol-1, o que resulta em uma absorção
com um máximo de intensidade no comprimento de onda igual a 165 nm. Para o buta-1,3-dieno a
diferença de energia entre o HOMO e LUMO é menor quando comparada ao eteno.

4
Figura 2.3 – Representação dos orbitais HOMO e LUMO para o eteno e o buta-1,3-dieno. Note
que a diferença de energia entre os orbitais de fronteira do buta-1,3-dieno é menor
comparada ao eteno.

Consequentemente o buta-1,3-dieno apresenta uma banda com máximo de absorção em maior


comprimento de onda (217 nm). De um modo geral, quando maior for a extensão do sistema insa-
turado, maior será o valor do max de absorção e mais intensa será a banda.

A LEI DE LAMBERT-BEER

Leis empíricas relacionadas à absorção de radiação eletromagnética começaram a ser in-


vestigadas ainda no século XVIII por Pierre Bouguer2 (antes de 1729). Em estudos posteriores de
Johann Heinrich Lambert3 mostrou que a fração da radiação incidente absorvida por uma amostra é
independente da intensidade da fonte da radiação. Posteriormente em 1852, August Beer4 estendeu
a lei de absorção exponencial mostrando que a quantidade de radiação absorvida é proporcional ao
número de espécies (moléculas ou íons) absorventes. Esses resultados podem ser expressos pela
equação 1.1:

= −
= 10− ( )= Eq. 1.1

Onde:
Io - intensidade da radiação incidente

2
Pierre Bouguer (1698- 1758) nasceu em Croisic, na França. Destacou-se por trabalhos em matemática, geofísica e astronomia. Em
1729 publicou o livro Essai d'optique sur la gradation de la lumière, onde estabeleceu as bases do que seria conhecida mais tarde co-
mo Lei de Lambert-Beer.
3
Johann Heinrich Lambert (1728-1777), matemático, físico e astrônomo nascido em Mulhouse, então Suíça (agora faz parte da Alsa-
cia, França). Em 1760 publicou o livro Fotometria onde formulou as leis de absorção de radiação.
4
August Beer (1825–1863), físico e matemático alemão, nasceu em Trier. Obteve o PhD em 1848 e em 1855 se tornou professor de
matemática em Bonn. Em 1854 publicou o livro Einleitung in die höhere Optik que se transformou referência na área.

5
I - intensidade da radiação transmitida
c - concentração da amostra em mol L-1 ou mol dm-3
l – caminho ótico em cm
 - coeficiente de absorção molar em dm3 mol-1 cm-1 ou 100 cm2 mol-1

Na Figura 2.4 podemos ver uma representação esquemática de uma célula contendo uma
amostra, com as radiações incidentes e transmitidas representadas.

Figura 2.4 – Célula para amostras com vistas à obtenção de espectros UV-vis.

Assim, quando maior o caminho ótico, e mais concentrada for a solução, maior será a
quantidade de radiação absorvida e consequentemente menor será a transmitida. A razão I/Io é co-
nhecida como transmitância, representada pela letra T, conforme mostrado na equação 1.2.

= 100 = 100 Eq. 1.2


A absorvância (A) está relacionada com a transmitância como mostrado na equação 1.3.

1
= ( )= Eq. 1.3

Devemos deixar claro que esta relação é válida para uma radiação monocromática em
um meio isotrópico. Em outras palavras, existe um valor de coeficiente de absorção molar  associ-
ado a cada comprimento de onda .
A equação 1.3 é conhecida como lei de Lambert-Beer. Por esta equação verifica-se que
a absorvância varia linearmente com a concentração da espécie sendo estudada. Em função disso
ela é muito utilizada em análises quantitativas. Todavia existem desvios da linearidade em função
de vários fatores. Detalhes sobre esse assunto podem ser obtidos na referência Thomas et al.
(1996).
O coeficiente de absorção molar pode ser calculado pela equação 1.4.

6
 = 0, x10 Eq. 1.4

Nessa equação P representa a probabilidade de a transição ocorrer, variando de 0 a 1; o


termo a representa a área, ou melhor, a extensão do cromóforo, ou seja, do grupo que absorve a
radiação. Para um cromóforo com a = 1 nm e considerando P = 1, o valor de será 105. Na prática,
muitas transições permitidas apresentam valores de  em torno ou maior que 105. Por outro lado, as
transições proibidas apresentam valores de  1000

3. A ESCOLHA DO SOLVENTE E CÉLULAS PARA AMOSTRAS

Para a obtenção de espectros de boa qualidade é necessário o uso de solventes adequados,


como em qualquer tipo de análise química. No caso da espectroscopia UV-Vis os solventes não
devem absorver e nem conter impurezas que absorvam na faixa da leitura a ser realizada. Na Tabe-
la 2.1 são apresentados alguns solventes de uso comum para a obtenção de espectros tanto na regi-
ão do ultravioleta quanto do visível. Nessa tabela são listados os valores dos limites mínimos de
comprimentos de onda a partir dos quais os solventes começam a absorver fortemente a radiação
UV-Vis. Esses valores correspondem aos comprimentos de onda em que a absorvância do solvente
é aproximadamente 1. Ele varia com o caminho ótico. O mais comum é se utilizar células com
caminho ótico de 10 mm, entretanto em casos específicos podem ser utilizadas células mais estrei-
tas.
O etanol comercial que contem 5% de água é normalmente muito utilizado quando a amos-
tra é muito polar. Nesse caso como a água não absorve na faixa de leitura não há problemas. O uso
de etanol absoluto deve ser feito apenas no caso em que o solvente é grau espectroscópico, ou seja,
puríssimo e sem a contaminação com benzeno, que é um solvente utilizado no processo de remoção
da água do etanol comercial. Outros solventes polares comuns são a acetonitrila, metanol e água.
Para a análise de compostos pouco polares solventes como hexano e cicloexano podem ser
utilizados.

7
Tabela 2.1 – Solventes comumente utilizados em espectroscopia na região
do ultravioleta e do visível.

Solvente Limite mínimo, nma T.e./ ºCb


10 mm 0.1 mm
Acetona 330 325 56
Acetonitrila 190 180 82
Água 205 172 100
Benzeno 280 265 80
Cicloexano 205 180 81
Clorofórmio 245 235 62
Diclorometano 232 220 42
1,4-dioxano 215 205 101
Etanol 205 190 78
Éter dietílico 218 197 35
Hexano 201 173 67
Metanol 205 186 65
N,N-dimetilformamida 270 258 153
Tetracloreto de carbono 265 255 77
Tetraidrofurano 220 220 66
a
O limite mínimo corresponde ao em que a absorvância é aproximadamente 1.
Esse valor depende do caminho ótico (10 mm e 0,1 mm), conforme indicado nesta tabela.
b
Temperatura aproximada sob 1 atm de pressão.

Normalmente os espectros são obtidos com amostras diluídas (10-2 a 10-5 mol L-1), utili-
zando-se um solvente que não reaja com os compostos em estudo. Conforme veremos mais
adiante, os valores de máximo de absorção podem ser alterados em função do tipo de solvente
empregado. De um modo geral, para a obtenção de um bom espectro a porcentagem de transmi-
tância deve variar de 20% a 65% na maioria dos casos. Nos casos de amostras muito concentra-
das a quantidade de radiação transmitida pode ser muito baixa, aumentando a possibilidade de
erros nas medidas.
Na tabela 2.1 são também apresentados os valores aproximados das temperaturas de
ebulição dos solventes. De um modo geral, solventes com temperatura de ebulição muito baixos
como éter dietílico devem ser evitados, uma vez que pode evaporar durante o manuseio e obten-
ção dos espectros, resultando em alteração na concentração da amostra.
Para leituras na região do ultravioleta devem ser utilizadas células ou cubetas de quar-
tzo, geralmente com caminho ótico de 10 mm. Células de 0,5 mm ou menores podem também
ser empregadas.

Para leituras na região do visível as células ou cubetas para as amostras devem ser de
Pirex® ou vidros semelhantes que sejam transparentes até aproximadamente 380 nm.
Tanto para leituras na região do ultravioleta quanto do visível, as células devem ser
limpas de maneira adequada antes de cada leitura. Para isso, deve-se lavar a célula várias vezes
(em torno de 10) com o mesmo solvente utilizado para dissolver a amostra.
Deve-se ainda tomar o cuidado de não tocar nas janelas de transmissão, por onde a radi-
ação vai passar. Mesmo sem perceber, pequenas quantidades de impurezas incluindo gordura
das mãos podem ficar aderidas nessas janelas resultando em problemas nas leituras.

8
4. CROMÓFOROS E OUTROS TERMOS

Como em qualquer área do conhecimento, o estudo da espectroscopia UV-visível en-


volve o uso de vários termos com significado específico. Para o entendimento do assunto é fun-
damental que o leitor tenha conhecimento preciso do significado de algumas palavras dentro do
contexto da espectroscopia. Assim apresentaremos a seguir alguns termos mais utilizados.
Cromóforo: de acordo com a IUPAC, o termo cromóforo é utilizado para descrever o sistema
(átomo ou grupo de átomos) responsável pela absorção de radiação na região UV-vis. O
termo foi inicialmente utilizado para se referir a grupos ou parte de moléculas responsáveis
pela cor de compostos utilizados na indústria de corantes. Todavia, já há algum tempo o
termo passou a ser utilizado também para descrever grupos que absorvem na região do ul-
travioleta.
Auxócromo: outro termo que foi utilizado no passado, e que ainda aparece em vários textos é
auxócromo. Esse termo é utilizado para descrever um átomo ou grupo de átomos que quan-
do ligados a um cromóforo resulta em um aumento no comprimento máximo de absorção
(efeito batocrômico), podendo também resultar em aumento na intensidade da banda (efeito
hipercrômico). Esse termo não é mais recomentado pela IUPAC, tornando-se obsoleto, uma
vez que ao se ligar um grupo de átomos em um cromóforo, o que se obtem é um novo cro-
móforo, tornando sem sentido o uso do termo.
Deslocamento batocrômico: corresponde ao deslocamento de uma banda de absorção para uma
região de maior comprimento de ondas devido à influência de substituição no cromóforo ou
a outras alterações no ambiente em que a amostra se encontra, como, por exemplo, variação
na polaridade do solvente ou alteração do pH do meio. É comum se referir a esse efeito
como deslocamento para o vermelho.
Deslocamento hipsocrômico: se refere ao deslocamento de uma banda de absorção para uma re-
gião de menor comprimento de onda, também conhecido como deslocamento para o azul.
Esse efeito ocorre também em função de alterações estruturais no cromóforo, variação de
polaridade do solvente e de pH.
Efeito hipercrômico: É o termo utilizado para descrever o aumento na intensidade de uma banda
de absorção. Pode ser devido a substituintes ou interações com o meio.
Efeito hipocrômico: Corresponde à diminuição na intensidade de uma banda de absorção devido
a substituintes ou interações com o meio.
Ponto isosbéstico: Se refere ao comprimento de onda no qual a absorvância total de uma amostra
não muda durante uma reação química ou a uma mudança física na amostra.

9
Na Tabela 2.2 apresentamos os valores de max e max aproximados para alguns cromóforos
simples.

Tabela 2.2 – Dados aproximados de absorção* para alguns cromóforos simples comuns.
Exemplo Transição eletrônica max/nm max Banda#
1-iodobutano n* 257 486
Acetona * 150 -
n* 190 1.860
n* 280 15 R
Água * 167 7.000
Benzeno * 180 60.000 E1
 * 200 8.000 E2
 * 254 215 B
Buta-1,3-dieno * 217 21.000 K
Dibutil sulfeto n* 210 12.000
Etano * ~140
Eteno * 165 10.000
Etino * 173 6.000
HOH * 167 7.000
Metanol * 213 7.080 K
n* 320 21 R
Metil vinil cetona n* 185 500
Trimetilamina n* 199 3.950
* Os valores exatos dos máximos de absorção dependem do solvente utilizado. # Essas letras cor-
respondem à classificação das bandas propostas por Burawoy. Banda R de radicalar; B de ben-
zenoide; E de etilênica; K de conjugada.

Conforme discutimos no início deste capítulo, a absorção de radiação na região do ul-


travioleta e do visível por uma molécula orgânica resulta em transições eletrônicas. Os cromó-
foros, grupos responsáveis por essas absorções, podem possuir elétrons n, sigma e pi. Na Tabela
2.2 são apresentados exemplos de alguns cromóforos simples, com a indicação das transições
eletrônicas ocorridas em cada caso. Os valores de  são também apresentados e indicam clara-
mente que algumas absorções são muito intensas e outras são fracas. Essas absorções fracas são
referentes a transições proibidas, conforme já discutimos.

Também deve ser observado nos exemplos desta tabela que várias transições ocorrem
em comprimentos de onda menores que 200 nm. Essas absorções não podem ser registradas na
maioria dos aparelhos comuns em laboratórios de análise, cujos limites inferiores de análise
geralmente são 200 nm. Além disso, conforme já discutido, a maioria dos solventes utilizados
também absorvem abaixo de 200 nm.

As transições comuns são do tipo *, n* e * sendo que as energias relati-
vas dessas transições são ilustradas na Figura 2.5. Como se pode ver nesta figura, as transições
 * envolvem maior energia e, portanto, ocorrem em menores valores de comprimento de
onda. Essas transições são comuns em alcanos e outros compostos saturados. Nos alcanos essas
transições podem envolver as ligações C-C e C-H.

10
Figura 2.5 – Representação esquemática das energias dos orbitais mais comumente
envolvidos em transições eletrônicas.

No caso de alquenos muitas transições podem ocorrer, mas a mais importante é a


*. No caso de alquenos com ligações C=C não conjugadas essas absorções ocorrem em
torno de 170-190 nm, sendo, portanto, sem qualquer valor diagnóstico para esse tipo de cromó-
foro. Quando o alqueno apresenta mais de uma ligação dupla conjugada, conforme ilustrado nas
Figuras 2.3 e 2.5, a diferença de energia entre o HOMO e LUMO diminui, resultando em uma
absorção referente à transição * em maior comprimento de onda. No caso do buta-1,3-
dieno (Tabela 2.2), essa transição ocorre com um máximo em 217 nm.
Compostos saturados que possuem heteroátomos como álcoois, éteres, haletos de alqui-
la, sulfetos, tióis, aminas etc, apresentam em seus espectros bandas referentes às transições
n*. Na maioria dos casos essas transições ocorrem em comprimentos de onda menores que
200 nm, não apresentando qualquer valor diagnóstico para a presença do cromóforo. Em alguns
casos como sulfetos e tióis essas transições podem ocorrer acima de 200 nm (Tabela 2.2).
Em compostos carbonílicos podem ocorrer transições *, n* e n* como ilus-
trado para o caso da acetona na Tabela 2.2. Dessas transições a única que ocorre acima de 200
nm é a n*, geralmente observada em torno de 290-300 nm. Essa transição é proibida, sendo
muito fraca e de pouca importância no estudo da espectroscopia UV-visível.
Para cetonas e outros compostos carbonílicos -insaturados a transição * ocorre
acima de 200 nm, sendo geralmente muito intensa. No caso da metil vinil cetona, essa transição
ocorre em 213 nm (max = 7.080). Como no caso de alquenos, a extensão da conjugação em
compostos carbonílicos também resulta em absorções em maiores comprimentos de onda. Como
regra geral, quanto mais extenso for o sistema insaturado, maior será o valor do comprimento
de absorção máximo.

11
5. ABSORÇÕES CARACTERÍSTICAS DE ALGUMAS CLASSES DE
COMPOSTOS ORGÂNICOS

A seguir, discutiremos com um pouco mais de detalhes as absorções típicas de alguns


cromóforos comuns. Também apresentaremos algumas regras empíricas para a estimativa dos
valores de absorção máximos para alguns tipos de cromóforos.

Alquenos e alquinos

A maioria dos alquenos absorve na região do ultravioleta distante, ou seja, abaixo de


200 nm. Como já discutimos essa absorção não possui grande importância prática para o quími-
co orgânico interessado em elucidação estrutural. Já para os dienos conjugados a transição
* resulta em uma absorção intensa acima de 200 nm. A posição do máximo dessa absorção
varia em função da estrutura do dieno. Grupos alquila ligados aos carbonos sp 2 causam deslo-
camento batocrômico na banda. Esse deslocamento é devido ao efeito de hiperconjugação en-
volvendo elétrons dos orbitais moleculares das ligações C-H com os elétrons dos orbitais . A
extensão da conjugação do dieno com outras ligações C=C também resulta em deslocamento
batocrômico da banda. No caso de polienos e poliinos, se observam várias bandas de absorção
que são típicas desse tipo de cromóforo, conforme ilustrado na Figura 2.6.
OCH 3

O
(I)
OCH3

(II) O

(III)

(IV)

(V)

Figura 2.6 – Espectros de poliinos (I, II) e polienos conjugados (III, IV, V).

Nessa figura se observam os espectros de cinco compostos poiinsaturados. Observe que


os espectros dos compostos I e II são muito parecidos, destacando-se que para o composto II
existe um deslocamento batocrômico em relação às bandas do composto I. Além disso, as ban-
das de maior comprimento de onda também são mais intensas, ou seja, apresentam coeficientes

12
de absorção molares (max) maiores. Isso se deve ao fato de que, embora ambos os compostos
apresentem três ligações tríplices conjugadas com uma dupla, no caso do composto II existe
uma conjugação adicional com a carbonila do grupo éster, o que estende o cromóforo.
À direita da Figura 2.6 se observam os espectros dos polienos III, IV e V, cujos dados
de absorção também podem ser vistos na Tabela 2.3.

Tabela 2.3 – Dados de absorção para alguns alquenos


Composto max (nm)* max (L mol-1 cm-1) Solvente
Hex-1-eno 179 12.000 Hexano
Hexa-1,3-dieno 224 26.400 Hexano
Hexa-1,3,5-trieno 268 43.000 2,2,4-trimetilpentano
Octa-1,3,5,7-tetraeno 304 77.000 Cicloexano
Deca-1,3,5,7,9-pentaeno 334 121.000 2,2,4-trimetilpentano
* São apresentados apenas dados para a banda mais intensa em cada caso.

Conforme já comentado, quanto maior o número de ligações duplas conjugadas, maior


o número de onda de absorção máxima e mais intensas são as bandas. Verifica-se isso claramen-
te pela Figura 2.6 e pela Tabela 2.3. O hex-1-eno, por exemplo, apresenta um máximo de absor-
ção em 179 nm, com max = 12.000, enquanto o hexa-1,3-dieno, absorve em 224 nm com max =
26.400. Para os demais compostos com 3, 4 e 5 ligações duplas conjugadas os valores de max e
max também aumentam. Note pela figura que as curvas de absorção para os alquenos III, IV e V
são muito parecidas, com vários máximos de absorção.

O efeito do deslocamento batocrômico causado pela extensão da conjugação por uma ou


mais ligações duplas ou tríplices pode também ser ilustrado pelos espectros apresentados na
Figura 2.7.
SCH3
H3CS
S
S
TMS
(I)

i) K2CO3, THF/MeOH
SCH3 ii) CuI, TMEDA, TMSA
CH2Cl2, 25 ºC, 12 h
H3CS 82%
S
S
(II) TMS

i) K2CO3, THF/MeOH
ii) CuI, TMEDA, TMSA
SCH3 CH2Cl2, 25 ºC, 12 h
59%
H3CS
S
S
TMS
(III)

Figura 2.7 – Espectros dos poliinos I, II e III obtidos em solução de clorofórmio e reações de preparo dos
mesmos (Adaptado de J. Org. Chem., 2011, 76, 2701).

13
Com o intuito de estudar as propriedades de poliinos conjugados com um anel benzêni-
co ligado a uma unidade tetratiofulveno, o composto I foi convertido em II pela remoção do
grupo TMS (trimetilsil) em meio básico. O alquino terminal resultante foi submetido a um pro-
cesso de acoplamento com trimetilsililacetileno (TMSA) catalisado por CuI. O produto espera-
do II teve sua estrutura confirmada pela análise de vários dados espectroscópicos, incluindo o
espectro no UV-visível. O composto II foi submetido ao mesmo tratamento resultando na for-
mação de III. Observa-se na Figura 2.7 que os espectros dos três compostos são muito pareci-
dos, com evidente deslocamento batocrômico de aproximadamente 40 nm para a banda mais
intensa ao se passar de I para II e deste para III.

Regras empíricas para o cálculo do comprimento de onda de maior absorvância em polienos.

Na primeira metade do século XX muitos espectros no UV-visível de polienos e outras


classes de compostos foram obtidos. Vários químicos contribuíram para o desenvolvimento da
aplicação da espectroscopia UV-visível na elucidação da estrutura de compostos orgânicos, mas
talvez os mais importantes sejam Robert Woodward e Louis Fieser5. Baseado na análise cuida-
dosa de um grande número de dados eles estabeleceram um método empírico para se estimar o
valor do max de absorção para polienos. Eles observaram que grupos alquila ou resíduos de anel
ligados aos átomos de carbono sp2 causam deslocamento batocrômico na banda de aproxima-
damente 5 nm; ligações duplas exociclicas a anéis também resultam em deslocamento batocrô-
mico de 5 nm; se a ligação for exocíclica em relação a dois anéis o valor do deslocamento bato-
crômico será de 10 nm; ligações duplas C=C estendendo a conjugação resultam em deslocamen-
to batocrômico de 30 nm; vários outros grupos polares como –OR, -SR, -NR2, halogênios tam-
bém promovem deslocamento batocrômico quando ligados aos carbonos do cromóforo. Um
resumo dessas regras é apresentado na Tabela 2.4. Deve-se notar que se dois cromóforos estive-
rem presentes, o calculo deve ser baseado no que resultar na absorção com maior comprimento
de ondas.

5
Louis Frederick Fieser (1899-1977), químico americano nascido em Columbus, Ohio. Graduado em química pelo Williams
College (1920), concluiu o PhD na Universidade de Harvard (1924). Desenvolveu pesquisas na Universidade de Oxford (Inglater-
ra) e na Alemanha, tendo sido professor da Universidade de Harvard. Além da síntese de diversos compostos orgânicos, contribu-
iu também para o desenvolvimento de regras empíricas para o cálculo do máximo de absorção no espectro de ultravioleta de al-
quenos e enonas. Essas regras são conhecidas como regras de Woordward-Fieser.

14
Tabela 2.4 – Regras de Woodward-Fieser para dienos conjugados
Valores básicos# , nm
Dieno acíclico 217*
Dieno heteroanular 214
Dieno homoanular 253
Incrementos para:
Extenção de conjugação (por C=C) 30
Ligação C=C exocíclica 5
Substituinte alquila ou resíduo de anel 5
Grupos Polares:
-OC(O)CH3 0
-OR 6
-Cl, -Br 5
-NR2 60
-SR 30
Correção de solvente 0
#
Estas regras funcionam razoavelmente para sistemas conjugados com até quatro ligações
duplas. *Em algumas referências os valores para dienos acíclicos e heteroanulares aparecem
como sendo iguais a 214 ou 215 nm.

Na Figura 2.8 encontra-se ilustrado o conceito de ligação dupla exocíclica. O prefixo exo
significa “para fora”. Assim, observando o dieno heteroanular, verificamos que em relação ao
anel que se encontra no círculo pontilhado, a ligação dupla à esquerda não é exocíclica uma vez
que os dois átomos de carbonos sp2 fazem parte deste anel. Observando agora a outra ligação
dupla, onde os átomos de carbono foram marcados com um ponto cada, verificamos que um
deles pertence ao anel circulado, enquanto o outro está fora deste anel. Assim esta segunda liga-
ção dupla é exocíclica em relação ao anel no círculo. Mas note que ela é endocíclica (dentro do
ciclo) em relação ao anel que se encontra fora do círculo.

Dieno homoanular Dieno heteroanular Conf ormação s-trans Conf ormação s-cis
 max = 263 nm  max = 234 nm max = 217 nm
 max = 5.000-10.000  max = 10.000-20.000  max = 10.000-20.000

Figura 2.8 – Exemplos de dienos homoanular e heteroanular. Conformações s-cis e s-trans para o
buta-1,3-dieno.

Observe ainda na Figura 2.8 que o buta-1,3-dieno pode, a princípio, existir nas conformações s-
trans e s-cis e, que correspondem aos dienos heteroanular e homoanular, respectivamente. O que se
observa é que nos quatro exemplos ilustrados na Figura 2.8, ocorrem transições *. No caso do
buta-1,3-dieno a conformação s-trans predomina em relação à conformação s-cis. Esse fenômeno é
observado geralmente para dienos acíclicos, embora existam casos em que conformação s-cis predo-
mine. Já no caso dos dienos cíclicos mostrados na Fig. 2.8, observa-se que o dieno homoanular absorve
em maior comprimento de onda que o heteroanular. Uma observação geral é que dienos homoanulares

15
sempre absorvem em maior comprimento de onda que os correspondentes heteroanulares. Uma expli-
cação clara para esse fenômeno não é conhecida.
Outra observação relevante é que as bandas de absorção para dienos homoanulares apre-
sentam menores coeficientes de absorção (max = 5.000 a 10.000) comparados aos dienos hetero-
nucleares (max = 10.000 a 20.000). Isso se deve à menor extensão do sistema conjugado no caso
dos dienos homonucleares, conforme mostrado pela Eq. 1.4.
Para ilustrar a aplicação das regras de Woodward-Fieser considere os exemplos a seguir:

H 3C COOH H3C COOH


a
a
b b
H 3C H 3C
d CH 3 d CH 3
c c
(1) CH 3 (2) CH3
Valor base: 214 nm Valor base: 253 nm
Resíduos de anel: 4x5 = 20 Resíduos de anel: 4x5 = 20
Ligação dupla exocíclica: 5 Ligação dupla exocíclica: 5
239 nm 278 nm

Observado: max= 241 nm ( max= 23.636) Observado: max= 276 nm ( max= 12.727)

O composto (1) é o ácido abiético. O seu cromóforo corresponde a um dieno heteroanular


contendo quatro resíduos de anel (a, b, c, d). Possui ainda uma ligação dupla exocíclica (marca-
da com um ponto) em relação ao anel da direita. Adicionando todas as contribuições listadas na
Tabela 2.4 encontramos o valor de max = 239 nm, muito próximo do valor experimental de 241
nm.
O composto (2) é o ácido levopimárico, isômero do ácido abiético. Nesse caso o cromóforo
corresponde a um dieno homoanular contendo quatro resíduos de anel (a, b, c, d). Esse compos-
to possui também uma ligação dupla exocíclica (marcada com um ponto), só que em relação ao
anel central. Para esse composto o valor calculado de max é 278 nm, próximo do valor experi-
mental de 276 nm.
Embora as regras sumarizadas na Tabela 2.4 sejam muito úteis para análise de vários die-
nos e polienos, elas se restringem à banda mais intensa e não se aplicam em diversos casos,
onde fatores diversos podem influenciar no valor da absorção. Por exemplo, no caso de cromó-
foros distorcidos por motivos estruturais os valores calculados para max não correspondem aos
valores observados como ilustrados nos casos dos compostos 3 e 4.

16
a a

b
b
(3) (4)
Valor base: 217 nm Valor base: 217 nm
Resíduos de anel: 2x5 = 10 Resíduos de anel: 2x5 = 10
Ligação dupla exocíclica: 5 Ligação dupla exocíclica: 2x5 = 10
232 nm 237 nm

Observado:  max= 245 nm Observado:  max= 220 nm ( max= 5.500)

Note que o composto (3) deve ser considerado um dieno acíclico e utilizando os valores
da Tabela 2.4 o valor calculado está muito abaixo do experimental. Por outro lado, o composto
(4) tem uma configuração parecida com um dieno homoanular, mas é na realidade um dieno
acíclico com dus ligações duplas exocíclicas. Utilizando então os valores da Tabela 2.4, o resul-
tado encontrado é bem acima do experimental. Se fosse utilizado o valor base para um dieno
homonuclear a discrepância seria maior ainda.
Em resumo, essas regras empíricas devem ser utilizadas com cuidado e não devem ser
vistas como sendo absolutamente gerais e infalíveis.
Valores de max para alguns outros dienos são apresentados a seguir:

max = 239 nm  max= 256 nm  max= 248 nm


max= 3.400  max =8.000  max = 7.500

Regras de Fieser-Kuhn para Polienos Conjugados

Quando o número de ligações duplas conjugadas aumenta, o comprimento de onda com


máximo valor de absorção se aproxima da região do visível, chegando a resultar em compostos
coloridos. Normalmente para sistemas desse tipo o espectro apresenta muitas outras bandas, sendo
típico de polienos e também para poliinos, como ilustrado anteriormente na Figura 2.6.
Uma vez que as regras de Woodward-Fieser não se mostraram adequadas para a estimativa
dos valores de max para polienos com muitas duplas, vários estudos teóricos e práticos foram feitos
para se tentar correlacionar o valor do comprimento de onda de absorção máximo com a extensão
do sistema insaturado, entretanto nenhum resultado geral satisfatório foi até o momento obtido. O
que se pode dizer é que o valor de max aumenta com o comprimento do polieno ou poliino, com
uma tendência de convergência à medida que o sistema se torna muito grande.

17
Para muitos polienos com mais do que quatro ligações duplas conjugadas, como no caso dos
carotenóides, as regras de Fieser-Kuhn dadas pelas equações 2.5 e 2.6 permitem a estimativa dos
valores de max e max , respectivamente.
max = 114 + 5M + n(48,0 – 1,7n) – 16,5Rendo - 10 Rexo Eq. 2.5
onde:
n = número de ligações duplas conjugadas.
M = número de grupos alquila ou semelhantes ligados ao sistema conjugado.
Rendo = número de anéis com ligações duplas endocíclicas no sistema conjugado.
Rexo = número de anéis com ligações duplas exocíclicas.

max = (1,74 x 104) n Eq. 2.6


Considere por exemplo o caso do -caroteno, um dos pigmentos responsáveis pela colo-
ração amarelo-alaranjado da cenoura, mamão, moranga e outros vegetais. Os valores calculados
e obtidos experimentalmente para esse tetra-terpeno são apresentados na Figura 2.9. Observe
que a concordância entre os valores experimentais e calculados é muito boa.
Na Figura 2.9 apresentamos ainda os espectros do -caroteno e da -criptoxantina, dois
compostos da classe dos carotenóides. Esses espectros foram obtidos por meio de uma análise
de extratos de pequi por cromatografia líquida de alta eficiência utilizando um detector de arran-
jos de diiodo. A única diferença entre esses compostos está na hidroxila presente (em destaque)
na -criptoxantina. Como o cromóforo nos dois casos é o mesmo, espera-se que os espectros
sejam muito parecidos, conforme de fato é observado.

CH 3
CH3 CH3 CH 3 CH 3

CH 3 CH3 CH3 H3C


H3C

Calculado:  max= 114 + 5x10 + 11 (48 - 1,7x11) - 16,5x2 - 10x0 = 453,3 nm


 max= 1,74x104x11 = 1,91x105
Observado:  max= 425, 452, 478 nm (em hexano)

 max
452
= 1,52x105

CH 3
CH 3 CH 3 CH3 CH 3

HO
CH 3 CH 3 CH3 H 3C
H 3C
-criptoxantina
 max= 425, 450, 475 nm

Figura 2.9 – Espectros UV-vis para o -caroteno (I) e a -criptoxantina (II). Os valores de max são apre-
sentados abaixo das respectivas fórmulas estruturais.

18
Compostos carbonílicos

Na Figura 2.10 é representado o espectro de absorção da carvona, um monoterpeno


encontrado no óleo essencial de muitas plantas, incluindo Carum carvi, cujo óleo é utilizado
como flavorizante e em aromaterapia. Esse composto apresenta dois cromóforos, sendo um
deles uma ligação dupla isolada, que não absorve acima de 200 nm. O outro cromóforo corres-
ponde a uma cetona -insaturada. Esse cromóforo, como ilustrado anteriormente, possui elé-
trons  e elétrons não-ligantes no átomo de oxigênio. Como consequência as principais transi-
ções eletrônicas nesse caso são ne  resultando em duas bandas principais de absor-
ção como ilustrado na Figura 2.10, que corresponde a um exemplo típico de um espectro de
absorção de enonas e também de aldeídos -insaturados.

Figura 2.10 – Espectro de absorção da carvona em etanol

A seguir faremos uma discussão um pouco mais detalhada das características estruturais
que afetam as transições ne em compostos carbonílicos.

Transição * para aldeídos e cetonas

Assim como no caso de dienos e polienos, extensivos estudos por Woodward, Fieser,
Scott e outros, especialmente envolvendo terpenos e esteroides, resultaram no estabelecimento
de regras empíricas para a estimativa dos valores do comprimento de onda de maior absorção
(max) para aldeídos e cetonas -insaturadas, correspondente à transição *. Essas regras
incluem valores médios para cada tipo de grupo ligado ao cromóforo, sendo aplicadas a com-

19
postos cíclicos e acíclicos, conforme apresentado na Tabela 2.5. Essas absorções * geral-
mente são muito intensas, com valores de max usualmente maiores que 10.000.
Os valores listados na Tabela 2.5 permitem o cálculo de max em etanol. Exemplos da
aplicação dessas regras são apresentados para os casos dos compostos 5, 6 e 7.
Alguns exemplos da aplicação dos dados dessa tabela são apresentados a seguir:

C8H 17
CH3 O

H3C  CH3
CH 3
 
(5)
O   (6)
Valor base: 215 nm OEt
Grupo alquil em : 10 Valor base: 215 nm
Grupo alquil em : 2x12 24 Resíduo de anel em  : 12
249 nm Resíduo de anel em : 18
Observado: EtOH
max = 249 nm Grupo polar em : 17
Ligação C=C ext. conjugação: 30
Ligação dupla exocíclica: 5
C8H 17 Correção solvente (Et2 O): -7
290 nm
 max = 295 nm
Et2O
Observado:

C8H 17

   O ( 7)
1
2
Valor base: 215 nm 
5
Resíduo de anel em : 12 O 3 
(8)
Resíduo de anel >: 18 4

2 xLigação C=C ext. conjugação: 60 Valor base: 215 nm


Ligação dupla exocíclica: 5 2 x Resíduo de anel em  : 24
Componente dieno homoanular: 39 Ligação dupla exocíclica: 5
349 nm EtOH
244 nm
EtOH

Observado:  max = 348 nm ( max = 11.000) Observado:  max = 245 nm

20
Tabela 2.5 - Regras para estimativa do valor do máximo de absorção (max, transição *)
para compostos carbonílicos -insaturados.

Valores básicos , nm
 O   O

 
X X
  
Cetonas acíclicas -insaturadas (X = R) 215
Cetonas cíclicas de seis membros -insaturadas (X = R) 215
Cetonas cíclicas de cinco membros -insaturadas (X = R) 202
Aldeídos -insaturados (X = H) 210
Ácidos carboxílicos e ésteres -insaturados (X = OH) 195

Incrementos para:
Extenção de conjugação (por C=C) 30
Ligação C=C exocíclica 5
Componente dieno homoanular 39
Substituinte alquil ou resíduo de anel  10
 12
 ou superior 18
Grupos Polares:
-OH  35
 30
 50
-OC(O)CH3  6
-OCH3  35
 30
 17
 31
-Cl  15
 12
-Br  30
 25
-NR2  95
Correção para o solvente*
Etanol 0
Metanol 0
Água +8
Clorofórmio -1
Éter dietílico -7
Cicloexano -11
Dioxano -5
Hexano -11
* Se o espectro for obtido em solvente diferente que etanol ou metanol, os valores corres-
pondentes para a correção do solvente devem ser adicionados.

Observe que como o valor observado para o composto 6 foi obtido em éter dietílico, o
valor calculado deve ser corrigido de -7, conforme valores para correção de solventes apresen-
tados na Tabela 2.5.
No caso do composto 7, além da contribuição da ligação dupla exocíclica (marcada com
um ponto), existe um resíduo de anel na posição e outro superior a . O composto apresenta
também duas ligações C=C estendendo a conjugação e um componente dieno homoanular, que
causa um deslocamento batocrômico adicional de 39 nm. Como esse composto é um polieno,
seu espectro apresenta-se complexo com várias bandas de absorção com os seguintes máximos:

21
230 nm ( = 18.000), 278 nm ( = 3.720) e 348 nm ( = 11.000). Note que o último valor está
em excelente concordância com o calculado.
O composto 8 apresenta dois cromóforos, sendo que um envolve os carbonos 1 e 2 e o
outro os carbonos 4 e 5. Nesse caso, o cálculo deve ser feito considerando o cromóforo que
resulta em maior valor de max, conforme ilustrado acima.

Transição * para ácidos carboxílicos e derivados.


Os ácidos e ésteres carboxílixos -insaturados apresentam comportamento semelhan-
tes aos aldeídos e cetonas quando submetidos à radiação ultravioleta. Observa-se, entretanto,
que os máximos de absorção para esses compostos ocorrem em valores de comprimentos de
onda ligeiramente menores. As bandas geralmente apresentam valores de coeficientes de absor-
ção acima de 10.000.
Na Tabela 2.6 são apresentadas regras para a estimativa dos valores de comprimento de
onda de máxima absorção para ácidos e ésteres.

Tabela 2.6 – Estimativa dos valores de max para a transição * de alguns ácidos e ésteres
carboxílicos -insaturados#

Substituição em:  (±5 nm)*


ou-monossubstituídos 208
ou-dissubstituídos 217
-trissubstituídos 225
Incrementos para:
i) -insaturação exocíclica +5
ii) -insaturação endocíclica em anéis de 5 ou 7 membros +5
iii) Ligação dupla C=C estendendo a conjugação +30
#
Compilado de: J. Org. Chem. (1957). *Valores menores podem ser encontrados para compostos que apresen-
tam algum tipo de impedimento espacial. Essa redução é também acompanhada por menores valores de .

De um modo geral, ácidos carboxílicos insaturados e derivados correspondentes


como amidas e ésteres apresentam uma absorção forte entre 205-230 nm. Ácidos alifáticos com
apenas um substituinte em  absorvem geralmente abaixo de 208 nm, enquanto os que possuem
um substituinte na posição  geralmente absorvem acima de 208 nm. Compostos cíclicos não
tensionados absorvem aproximadamente na mesma região que os compostos acíclicos corres-
pondentes. Todavia a tensão nos anéis de cinco e sete membros com dupla endocíclica resulta
em deslocamento batocrômico, de modo que o máximo de absorção geralmente ocorre em torno
de 222 nm.
Para compostos com ligações duplas exocíclicas em conjugação com o grupo carboxí-
lico se observa um deslocamento batocrômico de aproximadamente 5 nm em relação ao com-
posto com cromóforo similar acíclico.

22
Em vários casos tem se observado que qualquer efeito estéreo que impeça ou reduza a
coplanaridade das ligações duplas (C=C e C=O), resulta em diminuição na intensidade da ab-
sorção correspondente.
O excelente trabalho de Nielsen (1957) corresponde à mais completa compilação de da-
dos de absorção de ácidos carboxílicos e derivados -insaturados.

Transição n* para aldeídos, cetonas e outros compostos carbonílicos.

Conforme já vimos no início deste capítulo, além da transição * os compostos car-
bonílicos apresentam também uma transição proibida n*. No caso dos aldeídos e cetonas
saturados essa absorção ocorre em torno de 270-290 nm e para ácidos carboxílicos e derivados
ocorre em torno de 200 a 240 nm conforme ilustrado pelos dados na Tabela 2.7

Tabela 2.7 – Valores de max para a transição n* de alguns


compostos carbonílicos.

Composto max, nm max Solvente

O
293 12 Hexano
H 3C H
O
279 15 Hexano
H3C CH 3
O
236 54 Hexano
H 3C Cl

O
214 65 Água
H 3C NH 2
O
204 40 Água
H 3C OH

O
205 62 Etanol
H3C OCH3

Essa transição pode ser um pouco mais intensa e ocorrer em maiores comprimentos de
onda no caso de compostos carbonílicos com insaturação conjugada à carbonila. Ela sofre des-
locamento hipsocrômico quando o espectro é obtido em um solvente mais polar conforme dis-
cutido a seguir.

23
Efeito do solvente nas transições * e n* de compostos carbonílicos

Como vimos anteriormente, o solvente tem pouco efeito sobre as posições de absorções
dos alquenos e alquinos. Todavia, a banda de absorção associada à transição * de compos-
tos carbonílicos -insaturados sofrem deslocamento batocrômico quando o espectro é obtido
em um solvente mais polar, conforme ilustrado pelos dados da Tabela 2.5. Por outro lado a ban-
da associada à transição n* sofre um deslocamento hipsocrômico quando o espectro é obtido
em solvente mais polar. Esses efeitos podem ser mais facilmente entendidos observando o dia-
grama de energia apresentado na Figura 2.10.

Energia

s E 1s < E 1
E 1 E 2
E 1s E 2s E 2s > E 2
n
Como E = hc/  temos:
ns

    < s s  deslocamento batocrômico


s  n  >  ns s  deslocamento hipsocrômico
Solvente: menos polar mais polar

Figura 2.10 – Efeito da solvatação nas energias relativas dos orbitais n, , e * de compostos carbonílicos
-insaturados.

Esse diagrama apresenta as energias relativas (não está em escala) dos orbitais n, , e
*, considerando dois solventes de polaridades diferentes. Ao se dissolver o composto em um
solvente mais polar, a interação deste com o solvente ocasiona certa estabilização dos orbitais,
com consequente redução de suas energias. Essa interação ou solvatação envolve interações do
tipo dipolo-dipolo, forças de van der Walls e ligações de hidrogênio. Solventes polares como
etanol, metanol e água, interagem fortemente com compostos carbonílicos por meio de ligações
de hidrogênio. O resultado dessa interação é uma grande estabilização dos orbitais n. Dentre os
orbitais * e , os primeiros são mais estabilizados, presumivelmente devido ao fato de serem
mais polares. Assim, como se observa na Figura 2.8, a energia da transição * (E2) aumen-
ta em solvente mais polar, e com isso o valor de max diminui, resultando em um deslocamento
hipsocrômico para essa transição. Já para a transição n* (E1) diminui em solvente mais
polar, resultando em um aumento no valor de max, o que causa um deslocamento batocrômico
para essa transição.

24
Compostos aromáticos

O benzeno é o mais simples dos hidrocarbonetos aromáticos. O seu espectro no ultravi-


oleta apresenta três bandas de absorção conforme ilustrado na Figura 2.11.
Diferentemente do hexa-1,3,5-trieno em que todas as transições eletrônicas resultam em
bandas intensas, duas das bandas correspondentes às transições * no caso do benzeno
ocorrem abaixo da faixa de leitura da maioria dos equipamentos (em 184 nm e 204 nm), sendo
uma delas de intensidade média ( = 7.400). Outra banda, com máximo de absorção em 254 nm
(é associada à uma transição proibida. Ela aparece com estrutura fina devido à intera-
ção dos níveis de energia eletrônicos com modos vibracionais. Essa estrutura fina é geralmente
perdida se o espectro for obtido em um solvente polar ou se algum grupo estiver ligado ao anel
aromático.
Para fins de ilustração, na Figura 2.11 apresentamos uma representação esquemática dos
orbitais moleculares  do benzeno.

c) Espectro do benzeno

Figura 2.11 – Representação esquemática dos (a) orbitais moleculares dos (b) estados de energia
para o benzeno; e espectro de absorção em heptano.

O orbital de menor energia corresponde à combinação em fase de todos os seis orbitais


p dos carbonos, enquanto o de mais alta energia todos os orbitais estão fora de fase. Os demais
quatro orbitais ocorrem em pares degenerados e possuem dois planos nodais cada. Os três orbi-
tais de mais baixa energia são ocupados com dois elétrons cada.

25
Conforme ilustrado nesta figura, são possíveis quatro transições eletrônicas, todas com a
mesma energia. Todavia a situação é mais complexa que isso em função de repulsões entre elé-
trons e também por questões associadas à simetria dos orbitais. Isso resulta em alterações nos
níveis de energia associados às transições eletrônicas conforme representado na Figura 2.10b.
As três transições são ilustradas nessa figura juntamente com as designações espectroscópicas
para cada nível de energia.
As bandas de absorção associadas aos compostos derivados do benzeno recebem as
designações comuns E, K, B e R, conforme apresentado na Tabela 2.8. Essa designação tem
mais valor histórico e não tem justificativa teórica.

Tabela 2.8 – Nomenclatura comum para as bandas de absorção de derivados do benzeno.

Benzeno, max max Banda Benzeno substituído, max max Banda


184 60.000 E 180-200 >30.000 E
204 7.400 K 200-240 ~10.000 K
254 204 B 260-280 ~300 B
320-330 ~50 R
*As faixas de maxe de max são aproximadas e variam muito com a natureza do substituinte.

A presença de grupos ligados ao anel benzênico geralmente causa deslocamento bato-


crômico em algumas das bandas de absorção conforme ilustrado pelos dados apresentados na
Tabela 2.9 para o caso de compostos monossubstituídos.
Nesses casos não existem regras empíricas que permitam estimar os valores esperados
para os máximos de absorção. Todavia, algumas considerações gerais podem ser feitas conside-
rando-se a natureza dos grupos substituintes.
Grupos alquila causam efeito batocrômico da ordem de 5 nm e também resultam em
uma diminuição dos modos vibracionais, ou seja, reduzem as estruturas finas das bandas de
absorção. Por outro lado, grupos doadores de elétrons que possuem elétrons não ligantes (elé-
trons n) como –OR, -NR2, -SR, causam um efeito mais significativo, nas bandas K e B. Esse
efeito se deve à extensão da conjugação por meio de ressonância dos elétrons n com o sistema 
do anel.

26
Tabela 2.9 – Valores de absorção para compostos benzênicos monossubstituídos.
Substituintes E K B R Solvente
(>30.000) (6.000-20.000) ( 100-800) (0)
Doadores de elétrons
-H 184 204 254
-R 189 208 262 Hexano
-OH 211 270 H2O
-OR 217 269
-NH2 230 280 CH3OH
Retiradores de elétrons
-F 204 254 EtOH
-Cl 210 257 EtOH
-Br 210 257 EtOH
-I 207 258 Hexano
-NH3+ 203 254 Ac. aq.
Ligação conjugada
-C=CH2 248 282 Hexano
-CCH 202 248 278 Hexano
-C6H5 250 Hexano
-CHO 242 280 328 Hexano
-C(O)R 238 276 320 Hexano
-CO2H 226 272 EtOH
-C=CHCO2H 273 * EtOH
-CN 224 271 H2O
-NO2 252 280 330 Hexano
*Sob a banda K que é muito intensa e larga.

Grupos retiradores de elétrons como -Cl, -Br, -F causam pouco efeito sobre a posição da
banda K mas causam um deslocamento batocrômico significativo na banda B.
Grupos que possuem elétrons  em conjugação com o anel aromático resultam em um
expressivo deslocamento batocrômico nas bandas K e B. Esse deslocamento é maior quanto
mais estendido for o sistema insaturado. Por exemplo, a banda B do benzeno aparece em 204
nm; para o ácido benzoico e o cinâmico ocorre em 226 nm e 273 nm, respectivamente. A banda
K do benzeno apresenta um máximo em 254 nm, enquanto para o ácido benzoico ela aparece
em 271 nm. Para o ácido trans-cinâmico (trans-3-fenilpropenoico) essa banda não é facilmente
observada já que fica submersa na banda K que é muito larga e intensa.
Na Tabela 2.10 são apresentados os dados de absorção para alguns compostos benzêni-
cos dissubstituidos em diferentes posições (orto, meta, para). Quando os grupos substituintes
estão em posição para e possuem propriedades eletrônicas complementares (um doador e outro
retiradores de elétrons) observa-se um pronunciado efeito batocrômico na banda principal, em
relação aos efeitos causados pelos substituintes isolados como observado na Figura 2.12.

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NO2
NH 2 NH2 NH2

NO2
O N O O N O

EtOH
max = 260 nm
EtOH EtOH
 max = 375 nm max = 280 nm
 max = 16.000  max = 1.430  max = 13.000

Figura 2.12 – Dados de absorção para p-nitroanilina, anilina e 1,4-dinitrobenzeno.

Conforme pode ser visto pelos dados da Figura 2.12, o valor de max para a p-
nitroanilina, onde os grupos estão em conjugação, é muito maior que o observado para a anilina
ou mesmo para o 1,4-dinitrobenzeno. Também se observa que o valor do coeficiente de absor-
ção molar é maior quando os grupos são conjugados e apresentam propriedades eletrônicas
complementares.
Observe na Tabela 2.10 que para a m-nitroanilina o valor de max é aproximadamente
igual ao observado para a p-nitroanilina, todavia o valor de max (1.500) é muito menor que o
encontrado para o derivado para-substituído (16.000).

Tabela 2.10 – Valores de absorções (transições *) para compostos


benzênicos dissubstituídos

R R' Orientação Banda K Banda B


max max max max
-OH -OH orto 214 6.000 278 2.630
-OCH3 -CHO orto 253 11.000 319 4.000
-NH2 -NO2 orto 229 16.000 275 5.000
-OH -OH meta 277 2.200
-OR -CHO meta 252 8.300 314 2.800
-NH2 -NO2 meta 235 16.000 373 1.500
-OH -OH para 225 5.100 293 2.700
-OCH3 -CHO para 277 14.800
-NH2 -NO2 para 229 5.000 375 16.000
-Ph -Ph meta 251 44.000
-Ph -Ph para 280 25.000

Para compostos benzênicos que possuem um grupo carbonílico conjugado com o anel
aromático, alguma relação quantitativa entre a natureza e as posições dos grupos substituintes
conforme ilustrado pelas regras apresentadas na Tabela 2.11.

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Tabela 2.11 – Valores para cálculo da banda principal (transição
*) em compostos benzênicos do tipo ArCOX*

Valores Base max/nm


Cetona: X = alquil ou resíduo de anel 246
Aldeído: X = H 250
Ácido ou éster: X = OH, OR 230
Incremento para cada substituinte: orientação#
-Alquil ou resíduo de anel o,m 3
p 10
-OH, -OCH3, -OR o,m 7
p 25
-O- o,m 11
p 20
-Cl o,m 0
p 10
-Br o,m 2
p 15
-NH2 o,m 13
p 58
-NHC(=O)CH3 o,m 20
p 45
-NHCH3 p 73
-N(CH3)2 o,m 20
p 85
* Valores para cálculo de maxem etanol. # Note que as denominações
orto, meta e para se referem às posições dos grupos em relação ao
átomo de carbono do anel que se encontra ligado à carbonila.

Dois exemplos da aplicação das regras apresentadas na Tabela 2.11 são apresentados a
seguir:

O O
O H3C
H 3C OH
H 3C
O

Valor base: 246 nm Valor base: 230 nm


Resíduo de anel em orto: 3 Grupo alquil em meta: 3
Grupo OCH3 em meta: 7 Grupo OCH3 em p ara: 25
256 nm 258 nm
 max = 258 nm  max = 259 nm
EtOH EtOH
Observado: Observado:

Observe que na Tabela 2.11 não são incluídos grupos retiradores de elétrons como NO2,
-CN, -SO3H e similares. Isso se deve à falta de boa correção experimental entre a presença de
tais grupos e a posição da banda de absorção.

Efeito do pH do meio sobre o espectro de absorção de compostos aromáticos

Como mencionado anteriormente, o espectro no ultravioleta de alguns compostos pode


sofrer influência do pH do meio. Dois exemplos típicos são os fenóis e as aminas aromáticas
conforme ilustrado na Figura 2.13.

29
Em meio básico (pH mais elevado) os fenóis são convertidos em fenóxido. O espectro
no ultravioleta dos fenóxidos apresentam as bandas de absorção deslocadas para comprimentos
de onda maiores quando comparadas às observadas para o fenol. Como pode ser observado
pelos dados apresentados na Figura 2.13, o fenol absorve em 210 e 270 nm, enquanto o fenóxi-
do em 235 e 287 nm. Para as duas bandas se observa também a ocorrência de efeito hipercrômi-
co.

OH O Na

+ NaOH (aq)

NH 2 NH 3 Cl

+ HCl(aq)

Composto max/nm max max/nm max


Fenol 210 6.200 270 1.450
Fenóxido 235 9.400 287 2.600
Anilina 230 8.600 280 1.430
Anilinium 203 7.500 254 170

Figura 2.13 – Fórmulas estruturais do fenol e da anilina e os


respectivos sais. Os dados das absorções no UV são apresen-
tados

Para a anilina (assim como para outras aminas aromáticas) e ao se reduzir o pH do


meio, ela é convertida no íon anilinium. Como nesse íon o grupo substituinte (-NH3+) não possui
um par de elétrons não ligantes que possa ser conjugado ao anel benzênico como no caso do –
NH2, se observa um deslocamento hipsocrômico acompanhado de efeito hipocrômico das ban-
das de absorção K e B (Figura 2.13).
O efeito do pH do meio sobre o espectro de absorção da o-toluidina é muito bem ilus-
trado pela Figura 2.14.

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Figura 2.14 – Dados de absorção para a o-toluidina em soluções
aquosas com diferentes valores de pH. (I) pH = 10,29; (II) pH =
4,19; (III) pH = 2,73; (IV) solução de HCl 2 mol L-1. (Adaptado de
J. Am. Chem. Soc., 1950, 50, 44).

Observa-se nesta figura que em pH = 10,29 a banda B ocorre em um máximo de 284


nm (curva I). Mesmo em pH = 4,19 o máximo de absorção ocorre no mesmo comprimento de
onda, mas com um menor coeficiente de absorção molar (curva II). Em pH 2,73 e em solução
aquosa de HCl 2 mol L-1 verifica-se que o máximo de absorção ocorre em max = 250 nm, com o
valor do coeficiente de absorção molar maior para a solução mais ácida. Essa variação é decor-
rência da transformação do grupo –NH2 (com um par de elétrons não-ligantes que pode entrar
em ressonância com o anel, estendendo a conjugação) no grupo -NH3+.

Referências Gerais

1. CREWS, P.; RODRÍGUES, J.; JASÁRS, M. Organic structure analysis. Oxford: OUP, 1998. 552 p.
2. THOMAS, M. J. K.; ANDO, D. J.; DENNEY, R. C.; SINCLAIR, R. Ultraviolet and visible spec-
troscopy. Chichester: John Wiley., 1996. 229
3. JAFFÉ, H.H.; ORCHIN, M. Theory and applications of ultraviolet spectroscopy. London: John
Wiley and Sons, 1962. 624 p.
4. KEMP, W. Organic spectroscopy. 3. ed. London: MacMillan Education, 1991. 393 p.
5. SHRINER, R.; HERMANN, C. K. F.; MORRILL, T. C.; CURTIN, D. Y.; FUSON, R. C. The sys-
tematic identification of organic compounds. 8. ed. New York: John Wiley, 2004. 723 p.

Referências específicas

1. RAIMUNDO, I. M.; PASQUINI, C. Espectrofotometria multicanal e arranjos de fotodiodos. Quimi-


ca Nova, v. 20, p. 83-88, 1997.

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2. WILDS, A.L.; BECK, L.W.; CLOSE, W.J.; DJERASSI, C.; JOHNSON, J.A.; JHONSON, T.L.;
SHUNK, C.H. The ultraviolet absorption spectra of -unsaturated ketones conjugates with an aro-
matic nucleus. J. Am. Chem. Soc., v.69, p. 1985-1990, 1947.
3. CHEN, G.; MAHMUD, I.; DAWE, L.N.; DANIELS, L.M.; ZHAO, Y. Synthesis and properties of
conjugated oligoyne-centered -extended tetrathiafulvalene analogues and related macromolecular
systems. J. Org. Chem., v.76, p. 2701-2715, 2011.
4. NIELSEN, A.T. Correlation of ultraviolet absorption spectra with structure of -unsaturated acids
and derivatives. J. Org. Chem., v.22, p. 1539-1548, 1957.
5. PICKETT, L.W.; GROTH, M.; DUCKWORTH, S.; CUNLIFFE, J. The ultraviolet absorption spec-
tra of substituted bitolys. J. Am. Chem. Soc., v.72, p. 44-48, 1950.

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