O Que É Ciências (MBARGA FLEURY, 2010)
O Que É Ciências (MBARGA FLEURY, 2010)
O Que É Ciências (MBARGA FLEURY, 2010)
Lição 5
O que é ciência?
5.1 Introdução
A ciência tem transformado nosso mundo moderno de maneira profunda e espetacular. Ela mexeu
tanto com cada pedacinho da vida que é impossível escapar às suas garras, para o bem ou para o mal.
Nesta lição, vamos descobrir o que é ciência. Primeiro, revisaremos os princípios e significados básicos
que têm feito da ciência a melhor maneira de definir a realidade (seção 2). Depois, introduziremos alguns
pensadores do século XX que destacaram os limites e perigos da ciência (seção 3). E terminaremos a lição
com um olhar sobre aspectos muito específicos da ciência como é praticada hoje.
Nesta parte da lição, você vai aprender sobre o método de produção do conhecimento científico e verá
como distinguir a ciência de outras formas de acúmulo de conhecimento, incluindo o jornalismo científico.
É uma preocupação legítima, nesta etapa, perguntar-se o que é essa coisa chamada ciência, quando
ela começa e até onde ela vai.
“Saber” é tão natural e direto que tentar definir o que isso significa pode parecer estranho. Mas, na
verdade, explicar o que queremos dizer com “saber” pode ser extremamente complexo, já que este
conceito pode ter muitos significados.
Se fizermos uma lista de sinônimos, veremos que “saber” pode significar conhecer, compreender, ler
ou ver, sentir, avaliar, reconhecer, considerar, analisar, praticar ou dominar.
“Conhecer” alguém significa que encontramos uma pessoa (pessoalmente ou por meio de seus
feitos), que podemos reconhecê-la dentro de um grupo e que estamos cientes de sua existência.
Mas, para realmente conhecer alguém, você deve conhecer a pessoa de tal forma que possa prever
seu comportamento e suas reações, assim como compreendê-la o bastante para explicar sua
personalidade a terceiros.
“Conhecer” um tema, fato ou fenômeno significa que você pode descrevê-lo visual e virtualmente,
explicar como ele interage com outros objetos ao seu redor e dizer como ele influencia seu ambiente e
é influenciado por ele.
* Nota do tradutor: A palavra em inglês “know” pode ser traduzida tanto por “conhecer” quanto por “saber”. A tradução foi feita nesta lição ora
por uma palavra, ora por outra, considerando as especificidades do português.
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O que é ciência?
Na maioria das vezes, o conhecimento torna possível usar a razão e eventualmente desenvolver
argumentos racionais.
Razão não é o mesmo que intuição, sensação, reação espontânea, emoção ou crença. A razão começa
com o senso comum e se desenvolve por meio da habilidade de contar, medir, ordenar, organizar,
classificar, explicar e argumentar.
O discurso racional, então, é aquele que é coerente, ponderado e construído numa espécie de
“cálculo” lógico, o que é bem diferente de uma opinião pessoal. Este tipo de discurso deve ser
universalmente verdadeiro.
A irracionalidade, porém, se recusa a estar submetida à razão. Um indivíduo irracional não segue a
lógica e age segundo propósitos desordenados. Suas decisões são frequentemente incoerentes. O
mundo irracional pode ser relacionado também ao mundo do desconhecido, da superstição, do
misticismo e do inacessível, incluindo o que acontece contra a razão.
O conhecimento objetivo ocorre quando analisamos as coisas como elas são, mantendo uma certa
distância das nossas opiniões pessoais. É um modo erudito de conhecimento e avaliação, que traz em
si um tipo de poder de rejeitar, refutar, adotar, manter certa distância e até modificar a maneira como
as coisas são. O conhecimento vem com a obrigação de fazer perguntas e desafiar nossa ignorância.
“Conhecer” alguma coisa torna possível aplicar a razão, observar e analisar.
Uma forma diferente de conhecimento são as crenças. Crenças são uma maneira de explicar o
universo atribuindo-lhe capacidades, qualidades, sentimentos e emoções. Crenças dão às coisas
um significado intrínseco. Por exemplo, para algumas pessoas, o número 13 é considerado um mau
agouro. Em algumas culturas, o arco-íris é um aviso de que coisas ruins estão para acontecer – ele
é a espada de Deus –, enquanto, em outras, ele pode indicar onde está escondido um tesouro – é,
portanto, um bom presságio.
Crenças requerem aceitação e compromisso imediatos; elas criam raízes no nosso íntimo. Crenças
religiosas são uma busca pessoal e íntima pela verdade. As declarações e proposições que vêm
com as crenças precisam ser aceitas por seu valor intrínseco. O conhecimento religioso requer
aceitação de fatos e enunciados que não podem ser demonstrados. A existência de Deus não é um
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Curso On-line de Jornalismo Científico
objeto da ciência, mas uma crença, já que não há maneira de demonstrá-la ou negá-la. Budismo,
judaísmo, hinduísmo, cristianismo e islamismo são algumas das grandes religiões que influenciaram e
continuam influenciando a história da humanidade.
Na prática, “saber” exige fazer perguntas, duvidar e checar os fatos, objetos e ideias.
Mas podem existir diferentes graus de questionamento. Na vida diária, os objetos com os quais
interagimos nos dão uma experiência concreta e imediata das coisas. Nossos sentidos, por meio do
que vemos, tocamos, cheiramos, provamos e ouvimos automaticamente – sem pensar –, nos dão
respostas diretas, evidentes e familiares sobre a realidade. Essas respostas têm sua raiz na tradição.
Construímos o conhecimento de senso comum por meio de acasos com que nos deparamos ao longo
da vida. Grande parte dele passa de uma geração para a outra sem evoluir.
O conhecimento de senso comum aparece do nosso contato diário com o ambiente e com a maneira
como as culturas descrevem o universo. Ele é construído e transmitido pelas nossas famílias, parentes,
amigos, vizinhos, parceiros, tribos ou comunidades. É essa comunidade humana, nossa comunidade
mais importante, que compartilha suas formas de viver, alegrias, preocupações, dores, desejos para o
futuro, percepções do presente e lembranças acerca do passado e das tradições. E esse conhecimento
do senso comum envolve superstição.
No que diz respeito ao que aprendemos pelos sentidos – no contexto do conhecimento do senso
comum –, nós atribuímos à natureza virtudes e emoções, intenções e reações similares às dos
seres humanos.
Apesar das limitações do conhecimento de senso comum de nossa tribo ou comunidade, a vida não
seria possível sem esse conhecimento. Nós racionalizaríamos o tempo todo, hesitando e sempre
decidindo tarde demais. O conhecimento de senso comum oferece respostas prontas para questões
corriqueiras, cotidianas, frequentes.
Conhecimentos de senso comum existem em todas as culturas e civilizações. Cada um de nós entra
em contato com o conhecimento de senso comum em nossas vidas diárias e interações com os outros
membros da comunidade. Os próprios cientistas começam com o conhecimento de senso comum,
mas vão além dele.
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Lição 5
O que é ciência?
É muito fácil ver ou experimentar o conhecimento de senso comum. Basta comentar algum achado
recente em alguma questão muito comum com um colega. Por exemplo: “Em algumas estradas
alemãs há sinais de redução do limite de velocidade e estudos mostram que o resultado é um fluxo
mais rápido de veículos”.
A primeira reação do seu interlocutor, em geral, é rejeitar essa nova informação e defender o que ele
ou ela acredita como verdade – que reduzir o limite de velocidade vai resultar num fluxo mais lento de
veículos. Este é um exemplo de conhecimento do senso comum.
Conhecimento em profundidade?
A pessoa decide, então, observar de forma mais sistemática, por exemplo, dando mais atenção
a detalhes comuns ou imaginando novas dimensões, aprofundando os detalhes do nosso
conhecimento, procurando por características incomuns. Em outras palavras, vai além das aparências
e repetições.
O conhecimento sistemático requer ir além dos caminhos já viajados e de fácil acesso. Ele não tenta
ser definitivo. Aceita ser questionado. Desvenda respostas. Com o conhecimento sistemático, as coisas
e suas descrições são aprimoradas.
Diferentemente do conhecimento cotidiano, que é extraído todos os dias daquilo que nos cerca,
o conhecimento sistemático forma instituições. Requer disciplina pessoal, até sacrifícios. Deve ser
aprendido passo a passo em aprendizagens e formações e tem que ser apoiado pela pesquisa. A
aprendizagem tem de seguir uma pedagogia que será a garantia de que o conteúdo será transmitido,
incluindo as atitudes necessárias de objetividade, humildade diante dos fatos, paciência e abnegação.
O conhecimento sistemático pretende criar, imaginar e descobrir o que não conhecemos. Ele não se apoia
na tradição e não suporta monotonia. Ele critica. Examina e questiona sua própria forma de olhar, tocar
e sentir. Seu principal instrumento é a razão e não há lugar para a superficialidade. O conhecimento
sistemático constantemente testa as abordagens que usa para analisar e criar. Ele tem um método próprio.
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O conhecimento sistemático está nas mãos de intelectuais, artistas, artesãos, autores de “trabalhos
intelectuais” e cientistas.
Há semelhanças entre cientistas, artistas e escritores, por exemplo Albert Einstein, Wolfgang Amadeus
Mozart e William Shakespeare? À primeira vista, pode não haver nenhuma. Mas olhe de novo.
Os três observaram, provaram e descreveram o mundo em profundidade por meio de seu trabalho. Os
três se recusaram a ver ou fazer coisas da forma como elas normalmente eram vistas e feitas. Os três
tentaram alcançar novos patamares do conhecimento em suas respectivas áreas.
Mas faz sentido colocar seus estilos de conhecimento numa mesma categoria? Na verdade, há
diferenças entre suas diferentes formas de saber, e o conhecimento científico tem suas peculiaridades.
A ciência, como a arte, é uma forma de conhecimento sistemático, mas há diferenças cruciais entre as duas.
Somente uma pessoa dotada de expertise suficiente pode apreciar uma verdadeira obra de arte.
Somente aqueles que podem reconhecer um estilo específico, com suas formas, simbolismos, locais
de produção e período de tempo podem compreender o que ela significa. Os trabalhos da mente
são subjetivos. Eles são amarrados aos seus autores e deles dependem.
O conhecimento científico pretende entender a natureza e o universo em que vivemos por meio de
elementos conhecidos, concretos e objetivos.
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O que é ciência?
A ciência moderna começa com a dúvida sistemática ou o que o sociólogo norte-americano Robert K.
Merton denominou “ceticismo organizado”.
A ciência ideal fornece resultados claros, lógicos e isentos de ambiguidade. Sua validade pode ser
verificada ou refutada usando argumentos e razão (este ponto é abordado com mais profundidade na
seção sobre o conceito de falseabilidade de Karl Popper). Resultados científicos devem sobreviver a
testes duros e meticulosos. Isso é racionalidade científica.
A ciência moderna deduz a verdade a partir de fatos verificados pela experimentação metódica.
Experimentos medem as coisas e os fenômenos, dizem quanto pesam, quanto tempo duram, em que
direção estão indo etc. Experimentos fornecem informações matemáticas.
Enquanto a ciência antiga procurava explicar o “porquê” das coisas, a ciência moderna pretende
responder “como” as coisas funcionam.
Antes de descrever o método científico, vejamos que outros métodos estão disponíveis para
compreender o mundo.
Os seres humanos desejam controlar a natureza e explicar o comportamento dos homens. Entre as
muitas abordagens possíveis, a religião forneceu algumas respostas e foi vista como uma maneira de
buscar a verdade. Ela pretende responder a perguntas como: quem somos nós? Onde estamos? Para
onde estamos indo? Qual é o propósito da vida na Terra? Ainda hoje, as grandes religiões propõem,
cada uma, uma visão do universo, de sua criação ao fim dos tempos. O jornalista que escreve sobre
ciência deve respeitar as religiões, pois elas fazem parte dos indivíduos e situam seus trabalhos em
outras áreas além da religião.
A religião, às vezes, discorda da ciência. Há casos famosos de cientistas condenados por terem
proposto uma verdade diferente daquela endossada pela religião. Por exemplo, Copérnico e Galileu
foram condenados pela Igreja Católica porque disseram que a Terra era uma esfera e que não estava
no centro do universo.
Outro meio de oferecer uma compreensão do mundo tem sido o argumento autoritário. Em
essência, isso significa que se um pensador grego famoso e de prestígio disse alguma coisa, então ela
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é válida para sempre. Isso aconteceu com o trabalho de grandes filósofos como Platão, Aristóteles e
Pitágoras, ou grandes místicos como Hermes Trismegisto.
Atualmente, em nossas comunidades, temos feiticeiros, curandeiros e monges que também propõem
sua própria visão de mundo. Muitos deles trazem consigo o conhecimento empírico ou místico de
seu meio. Outros seguem certas superstições e ilusões, enquanto outros, ainda, criam sistemas de
conhecimento paralelos.
Em essência, a ciência moderna estabelece o conhecimento por meio dos seguintes passos:
a. Observação
b. Experimentos
c. Explicação
d. Generalização e previsão
a. Observação rigorosa
c. Explicação cuidadosa
Quando os cientistas explicam, eles têm que:
• Discutir observações prévias contraditórias, se houver.
• Demonstrar relações entre as novas observações e as observações prévias.
• Explicar por que certa causa tem determinado efeito.
• Certificar-se de que não há falhas em seu argumento.
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O que é ciência?
Os métodos apresentados anteriormente podem ser aplicados, em princípio, em todas as ciências – tanto
nas ciências naturais (ciências “duras”) quanto nas humanidades ou ciências sociais (ciências “leves”) como
sociologia, psicologia, ciências políticas, história, geografia, teologia, economia e até medicina.
No entanto, as diferentes etapas do método científico podem levar a certas dificuldades quando
aplicadas a algumas dessas ciências “leves” e seus objetos de pesquisa. Por exemplo, não se pode
realizar experimentos em seres humanos como se faz com plantas e minerais. Da mesma forma, a
ciência que estuda a sociedade pode encontrar dificuldade ao tentar fazer generalizações e previsões.
Em geral, os princípios básicos da abordagem científica permanecem válidos, mas as ciências “leves”
usam algumas de suas metodologias mais do que outras. Assim, o método científico permanece
válido em todos os campos de estudo que se pretendem científicos.
O treinamento rigoroso necessário para se tornar cientista e o linguajar específico de seus métodos
têm feito da ciência um domínio exclusivo de uns poucos iniciados. A ciência se tornou um
tipo particular de conhecimento fascinante, mas difícil, e que supera todas as outras formas de
conhecimento, sobretudo porque chega mais perto da verdade e pode ser usado para transformar a
realidade de tal maneira que foi capaz de moldar o mundo moderno. De forma espetacular, a ciência
remodelou a saúde, as comunicações, as moradias, a energia, a agricultura, a guerra e a própria vida.
Grande parte de nosso mundo existe como uma manifestação da ciência – e também pode ser
destruída por ela.
Apesar de tudo, a ciência moderna não é uma panacéia ou um livro de mágicas que pode resolver
qualquer problema. Ela não usa métodos misteriosos. Ainda que, às vezes, alguns resultados de
experiências sejam mantidos em sigilo por medo de que sejam roubados, os métodos científicos não
são secretos. De forma nenhuma se apoiam na tradição. Se eles se prendem a qualquer tradição, pelo
contrário, é para destruir qualquer coisa que poderia se tornar uma tradição.
Embora pareça se insinuar por todos os cantos e deter poderes que antes eram privilégios dos deuses,
a ciência não é uma religião e os cientistas não são sacerdotes de uma seita. A grande e dispendiosa
infraestrutura que a ciência requer parece tê-la tornado exclusiva de alguns países, mas os cientistas
não pertencem a raça, sexo, idade, religião, cor de pele ou classe social determinados.
Mesmo que a ciência busque a verdade, os resultados científicos não são verdades definitivas nem
nada parecido com mandamentos divinos; os cientistas estão sempre questionando e nunca ficam
satisfeitos com sua própria verdade. Além disso, a publicação de resultados é sempre um convite para
que outros pesquisadores verifiquem sua precisão.
Como um esforço humano, a ciência tem suas fraquezas. Erros, mesmo fraudes, acontecem.
Algumas experiências são compradas e seus resultados, fabricados. É um mundo com sua parcela de
rivalidades, ambições, ilusões e truques sujos, sobretudo em relação a quem foi o primeiro a inventar
isso ou aquilo. Mas a força única da ciência – e que a distingue – é a sua habilidade de rastrear erros e
corrigi-los com experimentos extras.
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Curso On-line de Jornalismo Científico
O método jornalístico
Já que este curso é voltado a jornalistas que exercem a profissão, não aprofundaremos aqui os
fundamentos do jornalismo.
Basta dizer que, como o trabalho de qualquer cientista contemporâneo, o trabalho do(a) jornalista
é baseado na observação de fatos. Como os jornalistas dizem: “Os fatos são sagrados, a opinião é
livre”. Como os cientistas, os jornalistas tentam permanecer neutros e objetivos, uma vez que eles têm
que deixar de lado seus próprios interesses pessoais e preconceitos de sua comunidade.
Quando coletam informações e produzem notícias, os jornalistas colocam a verdade acima de tudo.
Esta é outra característica comum entre cientistas e jornalistas.
Mas um jornalista é, acima de tudo, uma testemunha; jornalistas relatam eventos para um público que
não os presenciou. Jornalistas não publicam para outros jornalistas, mas para audiências massivas.
E também não relatam fatos isolados. Um bom jornalista retrata também o contexto e explica as
implicações do fato sobre política, educação, leis, justiça, ética e vida das populações. Os melhores
jornalistas fazem com que os fatos falem por si mesmos. Eles também dão voz a atores importantes e
tornam os fatos inteligíveis.
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O que é ciência?
Além disso, há jornalistas científicos que, fascinados pela ciência, desejam dividir sua paixão e os feitos
científicos do momento.
Jornalistas científicos habilidosos fazem um esforço para disseminar e traduzir os trabalhos dos
cientistas, explicando os mecanismos da ciência, conectando o mundo da ciência com o mundo
em geral, fazendo com que as pessoas se interessem pela ciência e criando uma atitude positiva em
relação a ela.
Um jornalista científico, por outro lado, quer levar a ciência aos cidadãos e ajudá-los a se beneficiar da
ciência. Claro, a maioria dos jornalistas científicos admira a ciência, mas cultiva, sobretudo, a arte de
duvidar, para ter certeza de que o público não se vai tornar vítima da ciência de má qualidade, falsa
ou fraudulenta. O filósofo francês Gaston Bachelard disse que jornalistas científicos têm um pé no
mundo em que vivem as ideias e outro no mundo em que nós vivemos.
Como o crítico de arte ou literatura, o jornalista científico é um crítico da ciência. Ser um crítico
significa fazer perguntas e examinar, selecionar, descrever, verificar e explicar fatos científicos
de modo a descobrir o que está faltando e comentar as descobertas. Ele ou ela analisa a ciência sob
diferentes perspectivas – econômica, sociológica, política, ética e legal. No final, o jornalista científico
pode questionar a relevância, a importância e a utilidade da ciência.
Acima de tudo, o jornalista científico faz a ponte entre os resultados da ciência e as necessidades e
preocupações dos cidadãos.
Um jornalista científico deve justificar seu trabalho tornando possível para os cidadãos compreender
a ciência e fazer algum uso dela em benefício da sua vida cotidiana. Isso requer mais do que apenas
traduzir a ciência em palavras comuns por meio de analogias geniais, metáforas e gráficos animados.
Como crítico da ciência, o jornalista científico contemporâneo deve explicar como a verdade científica
é construída. Graças ao bom jornalismo científico, as pessoas poderão então descobrir em que
cientistas devem acreditar ou não; quando acreditar na ciência e quando desconfiar.
O jornalismo científico não deve ser desprezado no mundo do jornalismo. Ele requer muito talento,
abertura, criatividade, imaginação, fascinação com a realidade, ambição e... humildade.
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5.3.1 Introdução
No século XX, testemunhou-se o triunfo da ciência – culminando com a chegada do homem à Lua –,
mas também sua capacidade de permitir a autodestruição da humanidade.
No início do século, os movimentos eugênicos tentaram melhorar a raça humana por meio da
procriação seletiva, justificando a esterilização de pessoas mentalmente incapazes. Durante a Segunda
Guerra Mundial, as bombas atômicas – assustadores desdobramentos da genialidade de Einstein,
o mais famoso dos cientistas – caíram sobre Hiroshima e Nagasaki, no Japão. Atualmente, o poder
da informática e da internet ameaça a vida privada, no mesmo momento em que estamos tornando
nosso planeta inabitável.
Essa capacidade ambivalente que a ciência tem de tornar a vida mais fácil e, simultaneamente,
multiplicar nossos meios para acabar com ela torna necessário avaliar com cuidado essa coisa
chamada ciência – “de mãos dadas com o demônio” ou “fonte de conhecimento”.
Filósofos tentaram determinar a verdadeira natureza da ciência. No final do século XX, pontos de vista
antagônicos sobre a ciência levaram ao que chamamos de “guerras científicas”. Por sorte, as únicas
vítimas foram uns poucos acadêmicos com credibilidade e prestígio feridos.
Resumindo a história, essas guerras confrontaram, sobretudo, pesquisadores das ciências naturais
e um grupo de sociólogos, historiadores, filósofos e feministas supostamente de esquerda e que
descreviam a ciência como uma ferramenta de repressão, capitalismo selvagem e machismo. Não
interessados em se juntar aos cientistas, mas em expor os usos excessivos e nefastos da ciência, esses
intelectuais fizeram o melhor que puderam para tirar a ciência do pedestal onde ela permanecia como
único método para encontrar a verdade.
Eles viraram a primeira parte desta lição de cabeça para baixo. Pegaram as afirmações científicas e
voltaram a questionar como elas foram feitas. Para eles, a ciência não é uma descrição verdadeira
da realidade. A ciência é mais uma religião, com seus rituais, crenças, dogmas, seitas concorrentes e
sacerdócios. Eles assumiram a missão de desconstruir o templo da ciência, expor a verdadeira natureza
do conhecimento científico – reduzido ao status de conhecimento comum – e desmistificar as práticas
dos cientistas.
Os parágrafos a seguir vão tentar introduzir, em poucas palavras, o pensamento de alguns filósofos da
ciência contemporâneos e protagonistas das guerras científicas.
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O que é ciência?
Apesar da relevância e da efetividade do conceito de falseabilidade de Karl Popper (que será descrito
na seção 3.3), o mais conhecido dos filósofos da ciência contemporâneos é Thomas Kuhn, autor de The
Structure of Scientific Revolutions (A estrutura das revoluções científicas), publicado em 1962 e até hoje
muito popular.
Kuhn disse que a busca por uma verdade objetiva não é o real objetivo da ciência, mas que a ciência
é, em essência, um método para resolver problemas usando, para isso, um sistema de crenças da
atualidade. Esse sistema de crenças e valores se manifesta por meio de uma série de procedimentos
experimentais que produzem resultados que, por sua vez, reforçam o sistema original de crenças e
valores. Kuhn chama esses sistemas de paradigmas. De uma maneira geral, os cientistas passam a
maior parte do tempo fazendo ciência normal, ou seja, trabalhando com um paradigma específico.
Mas, às vezes, pessoas como Nicolau Copérnico, Isaac Newton, Charles Darwin e Albert Einstein nos
trazem novos sistemas de crenças que disparam revoluções científicas. Respectivamente, seus
sistemas remodelaram o universo de forma que seu centro estivesse ocupado pelo Sol, não pela Terra;
submeteram a mecânica dos corpos celestes às mesmas leis da mecânica terrestre; mudaram de um
mundo criado por Deus para outro, sem propósito e sempre inacabado; mudaram de uma física em
que o fluxo do tempo era sempre absoluto e uniforme para uma nova física, em que o fluxo do tempo é
elástico e varia de acordo com as velocidades relativas do experimentador e do objeto de observação.
Kuhn argumentou que novos paradigmas assumem o comando não por causa de seu mérito científico,
mas porque seus adversários eventualmente perecem: a relatividade geral de Einstein se tornou aceita
como uma descrição verdadeira da natureza após a decadência da ordem proposta por Newton.
Kuhn destruiu um pouco da imagem ingênua segundo a qual a ciência descobriria a realidade de
maneira gradual, linear e racional. A ciência perdeu uma aura que estava enganando apenas os filósofos;
os cientistas inovadores já sabiam muito bem o quão difícil é fazer com que suas ideias sejam aceitas.
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Curso On-line de Jornalismo Científico
Karl Popper ainda tem a definição de ciência mais incisiva e eficaz: a ciência é o conhecimento que se
pode provar ser falso – em seu jargão, ciência é o que pode ser falseado.
Na prática, a maioria dos cientistas se contenta, na maior parte do tempo, em repetir experimentos e
confirmar resultados prévios. Por outro lado, eles também sonham em encontrar a falha que poderia
levar a uma nova teoria. Os milhares de cientistas que esperam impacientemente o primeiro teste
do Grande Colisor de Hádrons (LHC, na sigla em inglês) da Organização Europeia para Investigação
Nuclear (CERN, na sigla original em francês) estão provavelmente mais interessados em encontrar
uma “nova física” – que abre novos caminhos – do que em usar o colisor para confirmar a existência do
famoso bóson de Higgs, uma partícula elementar prevista pelo Modelo Padrão da Física.
Durante a primeira parte da Lição 5, descobrimos que as leis e as teorias científicas são “generalizações”. Por
exemplo, uma barra de cobre aumenta de volume quando aquecida, assim como uma barra de aço e uma barra
de alumínio. Os três são metais. O método científico leva à generalização e à conclusão de que o volume de metais
aumenta quando eles são aquecidos.
A generalização – ou, para usar o termo técnico, indução – consiste em propor uma lei científica como “todos os
metais aumentam de volume quando aquecidos”, baseada em uma série de observações em que determinados
metais aumentaram de volume quando aquecidos a diferentes temperaturas e em diferentes ambientes.
A fragilidade da indução começa pelo fato de que qualquer lei baseada nela está à mercê de uma exceção. Leis
científicas não podem invocar o poder da lógica e da dedução.
Na dedução, a verdade do enunciado “metais aquecidos expandem” é dada como garantida, como o enunciado
“o cobre é um metal”. Então, usando o poder da lógica, é uma dedução simples que o volume de um pedaço de
cobre vai expandir caso seja aquecido.
A utilidade e os limites da ciência repousam no fato de que a ciência não está no reino etéreo da pura razão lógica.
Ao contrário de uma verdade formal, a ciência não pode avançar apenas pela lógica; ela é uma verdade material
que deve se basear em conjuntos de resultados experimentais, observações e exemplos.
Como os cientistas nunca podem ter a certeza de que examinaram todos os metais, a indução abre naturalmente
as portas à falseabilidade. A genialidade de Karl Popper foi fazer dessa vulnerabilidade a essência da ciência.
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O que é ciência?
Explicação e generalização
Hipótese Previsões
MÉTODO CIENTÍFICO
Este diagrama foi adaptado do livro What is this thing called Science? (O que é essa coisa chamada
ciência?), de Alan Chalmers, University of Queensland Press, Open University Press, 1999.
Ele mostra como os cientistas constroem teorias e leis usando indução e, então, deduzem novos
fatos e novas previsões baseados nessas leis e teorias. Suas deduções são lógicas, mas essas verdades
intelectuais se apoiam em teorias e leis que são verdades materiais.
Agora um leve toque de anarquia. Nos anos 1960, quando era professor em Berkeley (Estados Unidos),
Paul Feyerabend costumava convidar bruxas, criacionistas, darwinistas e adivinhos para explicar sua
“ciência” e debater a verdade com os alunos. Para Feyerabend: “Tudo vale”.
Segundo Feyerabend, os fins justificam os meios no mundo da ciência. Galileu, por exemplo, valeu-se
de mentiras, distorções de dados e propaganda tanto quanto das observações que fez pelo telescópio
que inventou, disse Feyerabend.
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Curso On-line de Jornalismo Científico
“Galileu”, ele argumentou, “prevalece por causa de seu estilo e de suas técnicas de persuasão
inteligentes, porque ele escreve em italiano e não em latim, e porque recorre a pessoas que fazem
oposição às velhas ideias e aos padrões de aprendizagem a elas ligados”.
Se os cientistas conseguem argumentos por meio das mesmas ferramentas que todo mundo, a
verdade científica não é mais sólida do que a verdade do astrólogo, do leitor de mãos ou do místico.
Assim, Feyerabend disse que todas essas abordagens são igualmente válidas – ciência, sobretudo a
ciência institucionalizada, nada mais é do que um fenômeno histórico; dogmas científicos podem ser
até mesmo perigosos; a sociedade deveria quebrar o feitiço dessa ciência totalitária.
Por que não seria um bom objeto para os antropólogos observar o comportamento dos cientistas
como se eles formassem uma tribo particular? A pesquisa antropológica procura minimizar a
importância do que as pessoas dizem ou escrevem, enfatizando o que elas realmente fazem.
Baseado nessa ideia, o construtivismo sociológico afirma que a ciência é um produto puro da
sociedade. Seus adeptos concluem que a sociedade determina em grande parte as crenças dos
cientistas: um cientista pode se apoiar em suas publicações e seus estudos; é o contexto cultural que
determina a crença da população numa determinada teoria científica.
Um exemplo de construtivista sociológico é Bruno Latour, um sociólogo francês que descreveu o que ele
chama de “ciência em ação”, em que a ciência é reduzida à descrição dos gestos de cientistas em laboratórios.
Em sua descrição de ciência, não está claro o que os cientistas veem quando olham por um
microscópio. Ninguém pode saber realmente. Claro, os cientistas afirmam: “Vejo bactérias”. Mas
bactérias não falam, não se identificam. Para Latour e partidários da “ciência em ação”, muito da ciência
é pura ficção, construção das mentes dos cientistas.
A abordagem sociológica, como a de Kuhn, pelo menos coloca as descobertas científicas de volta
em seu contexto histórico. Ela explica o que aconteceu com a descoberta de Gregor Mendel sobre a
hereditariedade e a teoria dos movimentos continentais de Alfred Wegener, as duas muito à frente de seu
tempo. Nenhuma foi levada a sério ou teve muito impacto até décadas depois de terem sido elaboradas.
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O que é ciência?
Hossein Nasr, um famoso estudioso islâmico que agora leciona em Harvard (Estados Unidos), diz que
a ciência como existe atualmente é o produto de um mundo ocidental decidido a colocar a natureza
a seu serviço, sob “tortura”, se necessário. Ele diz que uma ciência islâmica seria diferente porque a
natureza é sagrada segundo o Islã. Na Índia, alguns esperam criar uma ciência diferente, baseada nos
conceitos hindus de espaço, tempo, lógica e natureza.
Se a ciência é um produto sociocultural, ela pode ser usada por diferentes grupos para promover seus
próprios interesses, a custo de outras culturas, do ambiente e da paz?
5.4.1 Introdução
Esta parte da lição introduz a ciência como ela é construída, dia a dia, na vida real, e como a verdade
científica é colocada na prática.
Você vai aprender como a ciência é construída por meio da publicação de artigos científicos em
revistas especializadas. Você vai aprender sobre o mecanismo de checagem dos fatos em que está
baseado o sistema de publicação das revistas científicas, e vai aprender também sobre suas limitações.
Concluímos esta parte com a apresentação de outro mecanismo científico de busca da verdade que
exerce papel importante nas decisões sobre temas complexos e cruciais para a humanidade.
Nossa expectativa é que, após esta lição, você domine alguns conceitos que lhe ajudarão a averiguar
a credibilidade de cientistas e suas publicações. Veja também a Lição 2: Encontrando e avaliando
notícias científicas.
Se você perguntar a um pesquisador ou pesquisadora o que ele ou ela faz, eles podem responder:
“Eu escrevo artigos para revistas científicas”. Podemos dizer, então, que a ciência é o que está nas
revistas científicas.
A validade dessa definição baseia-se no fato de que publicar é vital para qualquer cientista – eles devem
publicar ou perecer. Um cientista que não publica não tem status, financiamentos e, provavelmente,
logo ficará sem emprego. Depois que um cientista se forma na universidade, sua carreira depende de
uma série contínua de artigos publicados, e, sobretudo, do número de artigos publicados nas principais
revistas científicas – aquelas com maiores índices de citações e fator de impacto.
Artigos científicos publicados nas melhores revistas passam por dois testes. Primeiro, o editor da
publicação avalia por alto a qualidade, mas também a importância do artigo. Depois, cópias do texto
são enviadas para alguns especialistas do mesmo campo – conhecidos como “pares”; por isso esses
artigos e revistas são chamados “peer-reviewed” (revisados por pares).
Todas as revistas científicas sérias têm seus artigos revistos por pares antes da publicação.
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Curso On-line de Jornalismo Científico
A revisão por pares é o processo pelo qual manuscritos submetidos a revistas científicas são
avaliados por especialistas qualificados (geralmente anônimos para o autor), de modo a determinar
se os textos estão aptos para publicação. Esses especialistas observam sobretudo a relação entre a
metodologia e as conclusões do artigo.
Um índice de citações é uma base de dados de artigos que indica quantas vezes o trabalho de um autor
foi referido ou citado por outros autores, e onde. Ele é uma indicação da importância do trabalho.
O fator de impacto mede a frequência com a qual um “artigo médio” da revista tem sido citado em
determinado ano ou período; é um índice calculado pela divisão do número de citações ao longo de
um ano pelo número de itens publicados naquela revista durante os dois anos anteriores. Ele pretende
eliminar as tendências que favorecem algumas grandes revistas. Fatores de impacto de várias revistas
científicas podem ser conferidos em http://www.sciencegateway.org/rank/index.html . Esse site, em
inglês, é uma mina de informações sobre a produção científica dos pesquisadores, universidades e
países, assim como a página [http://sciencewatch.com/].
Mas o verdadeiro teste sobre a veracidade do artigo só vai acontecer quando outros cientistas
obtiverem os mesmos resultados usando as mesmas metodologias. A validade dos artigos revisados
por pares é apenas temporária; enquanto outros experimentos não tiverem confirmado suas
conclusões, é recomendável manter cautela em relação a elas.
Certamente, a revisão por pares não é à prova de enganos, não é impossível de falsificar. A falha
do sistema de revisão por pares mais espetacular dos últimos tempos é o artigo do sul-coreano
Hwang Woo-suk, que fingiu ser o primeiro a clonar com sucesso um embrião humano e produzir
células-tronco a partir dele. A edição da revista Science, publicada pela Associação Americana para
o Avanço da Ciência (AAAS, na sigla em inglês), que continha o artigo foi deliberadamente lançada
simultaneamente à reunião anual da instituição em 2004, em Washington. A publicação trouxe
enorme publicidade para a AAAS e para a Science. Mas o dano à reputação das duas foi ainda maior
quando a fraude foi descoberta. [http://www.sciencemag.org/sciext/hwang2005/]
John Rennie, editor-chefe da Scientific American, dá quatro conselhos sobre cuidados a serem tomados
em relação às revistas revisadas por pares, afirmando que elas são suscetíveis a:
• Possibilidade de um erro: O conteúdo de um artigo revisto por pares é confirmado apenas depois
que outros cientistas reproduziram os mesmos resultados usando a mesma metodologia.
• Fraude: É quase impossível para os revisores desmascarar fraudes deliberadas; toda a atividade de
publicação científica está apoiada na boa fé dos pesquisadores. Mas os jornalistas científicos são mais
complacentes com as revistas científicas como fontes do que os jornalistas que cobrem economia são
com os relatórios financeiros.
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O que é ciência?
• Preconceitos e desonestidade: Os autores podem ter feito um acordo com editores e anunciantes
com quem têm afinidade – neste caso, editores podem aceitar publicar materiais que não deveriam
ser publicados.
• Pressão política: Por exemplo, quando o governo dos Estados Unidos diz às revistas que não
publiquem artigos do Irã, Líbia ou Sudão.
Porém, mesmo com essas reservas, Rennie conclui que as raras ocasiões em que revistas científicas
revisadas por pares falham não devem impedir os jornalistas de fazer dessas publicações suas fontes
privilegiadas de informação.
(Na Lição 2 deste curso você também pode achar uma lista de perguntas a fazer para ajudar você a
julgar a validade das afirmações de um cientista.)
Atualmente, jornalistas científicos fazem notícias sobre questões que são importantes para
toda a humanidade.
Governos no mundo inteiro têm que lidar com ameaças relacionadas ao clima, aos recursos hídricos,
às reservas de energia, à vida privada e à saúde. Pessoas responsáveis por tomar decisões e políticos
deparam-se com escolhas vitais com impactos potenciais enormes em empregos, na saúde, na riqueza
e mesmo em estilos de vida das populações.
Ao mesmo tempo, é quase impossível descobrir o estado exato dos recursos do planeta em relação a água,
comida, petróleo, gás, florestas e terras cultiváveis, e mais difícil ainda saber com certeza as tendências para
esses recursos em curto, médio e longo prazos, o clima e potenciais soluções tecnológicas.
Diante desses desafios globais sem precedentes, especialistas e governo têm colocado em prática
alguns mecanismos para avaliar os problemas e, às vezes, fazer recomendações. Essas abordagens
unem os maiores especialistas na área e lhes oferecem apoio para encontrar, investigar e documentar
as questões e publicar suas conclusões e recomendações de forma independente.
Esses mecanismos podem variar de um pequeno comitê convocado para verificar o estado da arte
sobre hábitos alimentares a um comitê de academias nacionais de ciências, de uma comissão
especial formada para descobrir por que uma ponte caiu a uma equipe mundial de milhares de
especialistas como o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em
inglês), que ganhou o prêmio Nobel da Paz em 2007.
O IPCC mobiliza milhares de cientistas. Eles não recebem salário e a maioria trabalha de forma
anônima. Eles concordaram em ler e refletir sobre dados extremamente complexos, escrever artigos
de revisão sintetizando textos especializados, viajar para conferências a fim de estabelecer consensos
sobre a interpretação dos dados, conclusões e recomendações. Além disso, os cientistas do IPCC
precisaram que seus governos aprovassem cada um de seus relatórios. Foi um trabalho cansativo, mas
os cientistas participantes tiveram a oportunidade de avaliar suas pesquisas e inserir-se no que há de
melhor no mundo nessa área.
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Curso On-line de Jornalismo Científico
5.4.5 Fontes
Questão 1:
Responda brevemente às questões a seguir:
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O que é ciência?
Questão 2:
Considere o seguinte e escreva respostas curtas:
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Curso On-line de Jornalismo Científico
cc. Que informação você tem sobre a pesquisa científica em seu país: instituições, laboratórios e
instrumentos de pesquisa, cientistas e seus achados, políticas de ciência e tecnologia?
dd. Liste três razões que fazem da ciência uma ameaça à humanidade e três razões que fazem da
ciência sua salvação.
ee. Se a mídia contribui na construção de culturas, os jornalistas contribuem também? Há diferenças
entre o jornalismo científico praticado na África, na Ásia, no mundo árabe, no mundo ocidental? Se
houver, quais são?
ff. Descubra quantos artigos científicos são publicados pelos pesquisadores do seu país.
gg. Cite algumas revistas científicas publicadas em seu país, sendo algumas com revisão por pares e
outras, não.
hh. Você concorda com John Rennie?
ii. Dê um exemplo de fraude científica em seu país.
jj. Cite um comitê científico do seu país.
kk. Dê um exemplo de recomendações científicas que foram aceitas ou rejeitadas em sua região ou
seu país.
ll. O seu país tem uma academia de ciências?
mm. Os comitês científicos e as academias de ciência falam a verdade?
Questão 1:
a. “Conhecer” um objeto significa estar apto a descrever suas características visíveis e invisíveis em
relação a outros objetos do mesmo ambiente.
b. A palavra “razão” vem da palavra latina ratio, que significa cálculo. Comportar-se de forma racional
significa agir calculando os efeitos de suas ações.
c. Islamismo, cristianismo, judaísmo, budismo e hinduísmo.
d. No conhecimento comum, enunciados acumulados não podem mudar e permanecem iguais para sempre.
e. Cientistas têm como ponto de partida o conhecimento comum em suas vidas cotidianas.
Eventualmente, “quebram seu feitiço” por meio de seu trabalho.
f. O conhecimento comum é construído e transmitido por nossas famílias, parentes, amigos próximos,
vizinhos, parceiros, tribos e comunidades.
g. O conhecimento sistemático começa quando alguém decide não ficar mais satisfeito apenas com as
informações imediatas de nossos sentidos e deixa de confiar nelas. Então, temos que cavar um pouco mais
fundo. Depois, ficamos viciados em fazê-lo e começamos a olhar para as coisas de maneira diferente.
h. O conhecimento sistemático busca olhar para as coisas de forma diferente daquela que a tradição
recomenda. Ele nos lança em uma jornada de criação, imaginação e descoberta. Faz com que
rejeitemos a monotonia e paremos de nos apoiar na tradição. Ele questiona tudo.
i. O verdadeiro trabalho artístico só pode ser compreendido por alguém que conhece estilos, tipos,
formas, simbolismos, locais de produção e história da arte.
j. O conhecimento científico profundo está relacionado à verdade a que a natureza obedece.
k. A ciência experimental é baseada em fatos. Checa os fatos, é objetiva, impessoal, universal e racional.
l. A busca da verdade foi algumas vezes respondida pela religião, argumento de autoridade,
misticismo e senso comum (conhecimento comum).
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O que é ciência?
m. A ciência moderna segue esses passos: observação, experimentação, explicação, generalização e previsão.
n. Embora pareça poderosa e não aparente ter limites, a ciência não é religião. Uma infraestrutura
grande e dispendiosa torna a ciência mais presente em alguns grupos ou populações, mas os
cientistas não pertencem a raça, sexo, idade, religião, cor de pele ou classe social determinados.
o. Um fato jornalístico deve ser verdadeiro, real, conectado a eventos atuais, novo, significativo e interessante.
p. O jornalismo científico é visto como um meio de disseminar a ciência e seus conceitos, traduzindo
o que os cientistas dizem para uma linguagem que o público leigo possa compreender. Ele também
tem sido visto como um meio de ligar o mundo da ciência ao mundo dos cidadãos, incrementar a
educação científica do público e criar uma atitude positiva em relação à ciência.
q. O jornalista científico contemporâneo é um crítico da ciência. Seu papel é explicar como a verdade
científica é produzida de modo a tornar possível aos cidadãos descobrir em quem acreditar ou não,
quando acreditar em um cientista ou não. O jornalista científico competente comunica o verdadeiro
estado da ciência, se ela avança, muda de direção, regride ou está estagnada.
r. Peça cópias de seus artigos e veja se eles foram publicados em revistas científicas revisadas por pares.
s. Descubra, por um índice de citações, quantas vezes seus artigos foram citados, e verifique o fator de
impacto das revistas em que os textos foram publicados.
t. 1) A possibilidade de erros, já que eles lidam com verdades temporárias. 2) A possibilidade de fraude,
por exemplo, com fotos adulteradas. 3) A possibilidade de serem tendenciosos e desonestos. 4)
Pressão política impedindo a revista de usar apenas critérios científicos para decidir a favor ou contra
determinado artigo.
u. Contras: carga de trabalho, muito a ler e sintetizar, pouco reconhecimento, necessidade de chegar
a consenso passando por inevitáveis tensões e conflitos, viagens frequentemente sem reembolso
financeiro. Prós: oportunidade de entrar em contato com as pesquisas mais recentes e confiáveis,viajar,
encontrar com os melhores especialistas da área e possibilidade de validar a própria pesquisa.
Questão2:
Muitas respostas são possíveis. Discuta-as com o seu tutor, se você tiver um, ou com um colega.
Exercício 1:
Descubra o que os cientistas de seu país pensam sobre os jornalistas científicos locais.
Exercício 2:
Clique no link [http://www.techno-science.net/?onglet=glossaire&definition=2892]. Escreva um artigo
breve sobre a pesquisa científica: sua definição, sua história, os problemas que ela traz à sociedade,
sua ética.
Exercício 3:
Entre Kuhn, Popper e Feyerabend, escolha seu filósofo da ciência preferido e diga por quê.
Exercício 4:
Em uma página, explique se a ciência é o produto de uma determinada cultura ou um
conhecimento universal.
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Curso On-line de Jornalismo Científico
Exercício 5:
Entreviste um cientista que tenha artigos aceitos (ou rejeitados) por uma revista científica revisada por
pares. Pergunte por que o artigo foi aceito ou não; se publicado, quanto tempo demorou para isso e
qual foi o impacto em sua carreira.
Exercício 6:
Compare uma revista científica revisada por pares e uma que não faz essa revisão. Quais são as diferenças?
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