Artigo - CARRETERO. As Narrativas Mestras
Artigo - CARRETERO. As Narrativas Mestras
Artigo - CARRETERO. As Narrativas Mestras
Mario Carretero
Universidad Autonoma de Madrid
Resumo
As narrativas mestras enquadram o conhecimento histórico dos alunos, possivelmente
dificultando o acesso a mais representações históricas. Uma análise detalhada das narrativas
históricas dos estudantes sobre as origens de suas próprias nações é apresentada em termos
de quatro características narrativas principais relacionadas ao tema histórico, identificação
nacional, o tema principal e o conceito de nação. As narrativas dos alunos da 8ª e 11ª séries
argentinas foram analisadas para estabelecer se ocorreu uma mudança em direção a um relato
histórico mais complexo. Os resultados mostram que o passado é entendido principalmente
em termos de narrativa mestra, mas na 11ª série as narrativas demonstram uma compreensão
mais histórica. Apenas a identificação parece ser justa constantes ao longo dos anos de
aprendizagem da história. Os resultados sugerem que, na educação histórica, primeiramente
com o objetivo e os eventos na narrativa, poderia ajudar a produzir a compreensão histórica
de um passado nacional.
Abstract
Master narratives frame students’ historical knowledge, possibly hindering access to more
historical representations. A detailed analysis of students’ historical narratives about the
origins of their own 10 nation is presented in terms of four master narrative characteristics
related to the historical subject, national identification, the main theme and the nation
Tradução livre feita pela doutoranda Lorena Marques Dagostin Buchtik e revisão feita pelos
doutorandos Thiago Miranda e Geovane Gonçalves de Oliveira estudantes do Programa de Pós-
Graduação em Educação da Universidade Federal do Paraná sob orientação da Prof.ª Dr.ª Maria
Auxiliadora Schmidt para uso na disciplina de Educação Histórica I em 2020. E-mail para contato:
<[email protected]>; <[email protected]>.
A correspondência deve ser endereçada a Mario Carretero, Universidade Autônoma de Madrid,
Faculdade de Psicologia, Cantoblanco, 28049. Madri, Espanha. E-mail: [email protected]
1
concept. The narratives of Argentine 8th and 11th graders were analyzed to establish whether
a change toward a more complex historical account occurred. The results show that the past
is mostly understood in master narrative terms but in the 11th grade narratives demonstrate a
more historical understanding. Only identification appears to be fairly constant across years
of history learning. The results suggest that in history education first aiming at a constructivist
concept of nation and then using the concept to reflect on the national historical subject and
events in the narrative might help produce historical understanding of a national past.
4
produção quanto o consumo de narrativas mestras e sua interação precisam
ser bem compreendidos. As narrativas-mestras produzidas também são
consumidas e como? Pesquisas afirmaram que, em geral, as narrativas
históricas que os estudantes constroem sobre sua própria nação se
assemelham muito às narrativas históricas mestras (Barton, 2008; Lopez,
Carretero & Rodríguez-Moneo, in press-a; Wertsch, 2002). Para estudar isto
com mais detalhes, foi proposto um modelo de produção e consumo de
narrativas históricas nacionais (ver para mais detalhes Carretero, 2011,
Capítulo 4; Carretero & Bermúdez, 2012). Quatro características das
narrativas históricas principais distinguidas nesse modelo serão consideradas
neste artigo: o tema histórico é estabelecido em termos de inclusão e exclusão,
opondo-o radicalmente a outros como um grupo coerente e homogêneo. Isto
determina a "voz" da narrativa e a exclusão de outros, bem como o curso
lógico de ação para o sujeito, muitas vezes confrontando o outro histórico. O
grupo nacional é unificado internamente e, ao mesmo tempo, é colocado à
parte como absolutamente diferente de outro grupo histórico, muitas vezes
simplificado.
5
narrativa é baseada em nossas recentes contribuições teóricas (Carretero,
Castorina, & Levinas, 2013) e empíricas (Lopez et al., in press-a),
desenvolvendo a ideia de que conceitos e narrativas interagem nas
representações históricas dos estudantes. Os conceitos devem ser
incorporados à narrativa, e é importante prestar atenção à sua análise, pois
diferentes maneiras de utilizar os conceitos podem afetar a forma como os
estudantes constroem suas representações do passado.
6
concretas, anedóticas e personalistas em vez de explicações abstratas e
estruturais causais (Carretero, Lopez-Manjon, & Jacott, 1997). A
compreensão da complexidade dos eventos históricos varia ao longo da
adolescência e da vida adulta, mas a representação histórica permanece
estática e simples ao invés de se tornar dinâmica e complexa (Voss &
Carretero, 2000). Quando se trata de narrativas históricas, a meta-
entendimento dos estudantes se desenvolve desde a consideração histórica
como um dado adquirido (o passado é a história), passando por tomá-las como
cópias do passado com erros acidentais ou distorção deliberada, até
interpretações de historiadores com questões particulares (Lee & Ashby,
2000). No entanto, ao olhar para os relatos narrativos produzidos por
estudantes adultos, até mesmo eles não tinham compreensão histórica ao
reproduzir narrativas históricas nacionais (Carretero, Lopez, Gonzalez &
Rodríguez-Moneo, 2012; Lopez et al., in press-a).
Elaborando sobre esta tradição de pesquisa e aplicando o modelo de
quatro características narrativas mestras, este artigo considerará como os
estudantes representam sua narrativa histórica nacional e se eles progridem
de uma narrativa mestra para um relato mais histórico do passado nacional.
Como foi introduzido, nossa abordagem considera a importância de duas
possíveis influências sobre a representação do estudante. Por um lado, supõe-
se que haja uma influência das características da narrativa mestra. Por outro
lado, supõe-se que haja uma progressão da representação simples para a
complexa da história. Supomos que esta progressão esperada possa ser devida
ao impacto combinado do desenvolvimento cognitivo, do enriquecimento do
aprendizado da história e de uma crescente exposição aos relatos culturais
através da mídia e de dispositivos de socialização.
Antes de apresentar nosso estudo sobre as reconstruções dos
estudantes do passado nacional, será introduzida a narrativa mestra particular
em consideração. Mesmo que as narrativas históricas nacionais sejam comuns
em todo o mundo e compartilhem características, sabe-se que as ferramentas
culturais são específicas do contexto. A fim de contextualizar adequadamente
o estudo realizado na Argentina, e para compreender os resultados
qualitativos apresentados posteriormente, a história argentina relevante será
brevemente revisada. Como serão vistas, as quatro características narrativas
mestras são contestadas pela pesquisa histórica.
7
narrativa-mestra histórica nacional. No caso da Argentina, este é o 25 de maio
de 1810, representando a revolução que levou à independência da Espanha
(Romero, 2004; Shumway, 1991). O evento pode ser comparado com a Festa
do Chá de Boston nos Estados Unidos e outras histórias da independência no
continente americano, cujas estruturas narrativas são surpreendentemente
semelhantes.
Na Argentina, o 25 de maio é comemorado todos os anos como um
dia de independência. As crianças são expostas desde cedo. Testemunhar e
praticar atos patrióticos é obrigatório tanto nas escolas primárias públicas
quanto nas privadas. A data oficial da independência é 9 de julho de 1816,
seis anos após os eventos de 1810. O 9 de julho é também feriado nacional e
celebrado nas escolas. Como estudado por Bertoni (2001), estas celebrações
foram inventadas cerca de 40 anos após a primeira constituição e
aproximadamente 80 anos após a independência. Isto foi motivado
principalmente pelo crescente número de imigrantes importando diferentes
celebrações de seus países de origem e pela percepção da necessidade de
reunir todos os diferentes grupos e costumes. Em outras palavras, o principal
objetivo da implementação dos atos escolares patrióticos foi o de fomentar a
coesão social e a identidade nacional. Além disso, a celebração do aniversário
de 200 anos da nação em 2010 indica que 25 de maio de 1810 representa
coletivamente a origem da nação.
Além do ensino informal através de rituais, celebrações e outros meios
de memória coletiva, a história nacional é ensinada formalmente na escola.
Os conteúdos curriculares são básicos e simples no ensino fundamental,
tornando-se mais complexos no ensino médio. Oficialmente, o dia 25 de maio
está no currículo do ensino médio no final do segundo ano (nona série).
Praticamente, na escola onde está pesquisa foi realizada, o 25 de maio é
ensinado no início do terceiro ano (10ª série) como parte da história dos
processos de independência. Os eventos são apresentados no contexto mais
amplo da Revolução Francesa, dos processos de independência na América
do Norte e no contexto mais estreito das invasões inglesas em Buenos Aires,
pouco antes de 1810.
A investigação histórica revela que nem a Argentina nem os argentinos
existiam ainda em 1810. No Vice-Reino do Rio da Prata, governado
indiretamente pelo monarca espanhol Fernando VII, existiam identidades
políticas diferentes (Chiaramonte, 1989). Supor que o nacionalismo argentino
tenha levado à independência é um anacronismo, interpretando mal os
sentimentos crioulos que alguns poderiam ter tido na época (Chiaramonte,
1991). Criollo se refere aos colonos espanhóis e seus descendentes, mas
também às identidades culturais locais diferentes da Espanha como
consequência da mistura com os nativos americanos (Shumway, 1991). Eles
não formaram um grupo homogêneo ou unânime. O que aconteceu em 1810
8
envolveu uma elite política briguenta e não pode ser indiscutivelmente
categorizada como uma ação política em direção à independência. Esta seria
uma interpretação teleológica do que na época eram as tensões entre a colônia
e a metrópole. Além disso, projetos políticos muito diversos, desde uma nova
monarquia até uma república jacobina radical, existiam entre os líderes
políticos do 25 de maio (Lynch, 2009). O que realmente aconteceu foi um
Cabildo Abierto, uma reunião do conselho municipal ampliado na cidade de
Buenos Aires. Os cabildos eram instituições políticas do período colonial com
um conselho composto por eleitos da elite local sob jurisdição do vice-rei
(Shumway, 1991). Da reunião de 25 de maio de 1810 saiu a Primera Junta.
Este foi o primeiro órgão de governo a não representar a Espanha, que, no
entanto, jurou fidelidade a Fernando VII. Independência foi formalmente
declarada em 1816, e a primeira constituição foi estabelecida em 1853, mas
mesmo então, A Argentina como nação, território e identidade não foi
consolidada. Portanto, em resposta ao quatro características narrativas
principais listadas acima, até 1810:
1. Não havia um tema histórico nacional homogêneo.
2. A identificação nacional foi formada pelas mudanças sociais e
políticas ao longo de várias décadas.
3. Não havia um objetivo comum de independência.
4. Não havia Argentina nem argentinos.
OBJETIVOS
O objetivo deste estudo foi analisar a narrativa de que os alunos do
ensino médio argentino construir cerca de 25 de maio de 1810 em termos das
quatro características que estabelecem o sujeito histórico, a identificação, os
principais eventos históricos, e a conceituação de nação. Este estudo também
analisa se existem diferenças nestas narrativas entre dois grupos: os da 8ª e
11ª série. O objetivo é explorar se as narrativas dos alunos refletem as
características narrativas mestras e se estas mudam para representações mais
sofisticadas historicamente. Além disso, se esta mudança ocorrer, este estudo
procura estabelecer quais características narrativas específicas esta mudança
está afetando. Embora este artigo trate da narrativa mestra de uma nação
específica, ele também visa fornecer um esquema de análise baseado nas
quatro características mencionadas que poderiam ser aplicadas às narrativas
9
mestras em outros países, por exemplo, no continente americano. Isto é
esclarecido pela Tabela 1, que ilustra a estratégia analítica.
TABELA 1
Critérios de Caracterização Narrativa
MÉTODO
Participantes
10
sua situação na cidade e o perfil profissional dos pais dos alunos, os alunos
têm acesso acima da média aos recursos culturais. Os estudantes foram
selecionados aleatoriamente após o consentimento dos pais, que informaram
sobre os objetivos da pesquisa em termos muito amplos, tinha sido devolvido.
A amostra é mais bem definida em termos da nacionalidade argentina dos
estudantes; a amostra representa a população mais ampla na qual existe uma
mistura de origens étnicas tanto devido ao período colonial quanto à
imigração da Europa do início do século XX. As narrativas de dois estudantes,
que se identificaram como bolivianos e parte brasileiros respectivamente,
foram retiradas da análise.
Como foi indicado na introdução, os alunos da 8ª série estão
familiarizados com o 25 de maio através da memória coletiva, a celebração
patriótica realizada na escola primária todos os anos, e a história básica
nacional argentina no currículo da escola primária. Os alunos da 11ª série
haviam sido expostos aos eventos com mais detalhes históricos no início do
terceiro ano (10ª série) do ensino médio. Ou seja, o 25 de maio foi ensinado
cerca de um ano antes de os alunos serem entrevistados. Os livros de história
que são usados apresentam material historicamente rico, já que os
historiadores estavam envolvidos em sua produção (Cristofori, 2010;
Giordano, 2012). O currículo do ensino médio prescreve duas aulas
obrigatórias de história por semana, num total de 2 horas e 40 minutos, da 8ª
à 12ª série. O prestígio social e cultural que a história desfruta na Argentina
se reflete nesta ênfase na história durante todo o ensino médio. Nenhum
programa de intervenção particular de ensino de história estava sendo
implementado nesta escola na época do estudo.
Procedimento
11
tivesse mencionado primeiro. Se necessário, a fim de convidar os estudantes
a elaborar sua representação, foi-lhes pedido
Estratégia analítica
RESULTADOS
13
mais questionados para que o entrevistador pudesse ter uma ideia adequada
sobre sua representação narrativa. Muitas vezes eles sabiam mais do que
espontaneamente afirmavam. Estas primeiras declarações poderiam ser tão
concisas como "Foi quando nos liberamos dos espanhóis, muito importante,
com o aniversário de 200 anos e tudo". Através das perguntas do
entrevistador, estas minis narrativas iniciais puderam ser elaboradas. Todos
os estudantes reconheceram o quadro e souberam o que ele representava
coletivamente, em termos de revolução ou independência.
Abaixo os resultados por elemento narrativo serão apresentados
primeiro, ilustrados com entrevista trechos dos dois grupos. Todos os nomes
relatados nos fragmentos da entrevista são pseudônimos. Em segundo lugar,
serão apresentados os padrões narrativos e a relação entre os elementos
narrativos encontrados.
Entrevistador: Você está dizendo que também havia argentinos que não queriam se
tornar independentes?
TABELA 2
Tema histórico do Narrativo por nível de graduação
Violeta (16 anos de idade): [. . .] aqui estava um grupo que talvez não quisesse, que
queria manter a mesma ideologia. E então, quase a grande maioria . . . o povo, digamos,
queria a independência.
[. . . ]
Entrevistador: Há pessoas que pensam que eram colonos espanhóis ou criollos. O que
você acha?
Violeta: Eu acho que é a mesma coisa [. . .]. Era principalmente o propósito do que eles
14
estavam fazendo, [. . .] eles estavam lutando todos os juntos com o mesmo propósito.
Identificação
TABELA 3
Identificação na Narrativa por Nível de Grau
16
TABELA 4
Eventos históricos da Narrativa por Nível de Grau
Entrevistador: Você estava dizendo algo sobre liberdade. O que isso tem a ver com a
Revolução de Maio?
Laura (13 anos de idade): Que o povo estava procurando ser livre, então é como, como
colocar isso, eles deram a liberdade de começar a expressar o que os estava
incomodando.
Entrevistador: O que os estava incomodando?
Laura: Não ser livre. [...]
Entrevistador: Livre de quem, de quê?
Laura: Do governo. Eles queriam ter seu próprio governo patriótico. [...]
Entrevistador: Por quê? O que o senhor quer dizer com governo patriótico?
Laura: Algo a ver com o cockade [escarapela, um símbolo da nação argentina] ... que
eles queriam ser ... eles queriam depender de si mesmos, de seu próprio povo e não de
outros países [...] eles queriam ser argentinos por causa de toda esta questão de . . .
não tinham a liberdade de poder ser quem eram.
Diego (16 anos de idade): O povo se organizou e decidiu ser independente da vice-
reitoria governante.
Entrevistador: Por quê?
Diego: Porque eles sentiam que já podiam ser independentes, não queriam ser
dominados por ninguém, provavelmente por isso. [ ]
Entrevistador: Houve benefícios em se tornar independente, é isso que você está
dizendo?
Diego: O benefício é poder fazer o que eles queriam. [ Se eu pensar sobre isso a
partir de uma perspectiva talvez não fosse tão boa assim, [ ] mas liberdade é
liberdade mesmo assim.
Entrevistador: O que eles estavam procurando no dia 25 de maio? Para que eles
estavam fazendo isso?
Alex (13 anos de idade): precisavam ter independência econômica do monopólio,
como era para a classe alta. É por isso que muitos deles apoiaram [os revolucionários],
porque isso se beneficiou economicamente. É dito que as famílias de classe alta
disseram "Sim à Primera Junta, não à independência porque eles queriam a Primera
Junta, porque era mais indireta do governo e eles poderiam ter uma economia mais
fluente. Mas a independência não os beneficiou, pois eles teriam que cuidar das coisas
por conta própria.
TABELA 5
Conceito de Nação no Nível Narrativo por Grau
Padrões Narrativos
TABELA 6
Padrões Narrativos
DISCUSSÃO
23
Ainda que haja uma mudança em direção a relatos históricos mais sofisticados
de 6% na 8ª série a 40% na 11ª série, esta última porcentagem ainda é menos
da metade das narrativas contadas pelos alunos mais velhos. Isto é muito,
considerando que os estudantes estão na fase educacional em que estão
expostos ao material histórico mais complexo sobre o passado nacional com
o qual a maioria deles jamais serão confrontados. Não haverá muito mais
aprendizagem formal da história na maior parte de suas vidas. Portanto, é
plausível esperar que os adultos não desenvolvam representações muito mais
sofisticadas. Isto é confirmado em estudos que indicam que os adultos
reproduzem mais de uma narrativa magistral sobre sua própria nação
(Carretero, López, et al., 2012; Wertsch, 2002).
Agora, as narrativas mestras em geral foram consideradas em
pesquisas anteriores, mas esta pesquisa oferece um olhar mais detalhado sobre
quatro dimensões diferentes da narrativa. Distinguindo estas quatro, a
mudança pode ser vista por característica narrativa e em comparação umas
com as outras. No caso do tema histórico e dos eventos históricos, os
resultados são semelhantes, com a grande maioria dos alunos do 8º ano (89%
em ambas as características) e aproximadamente metade dos alunos do 11º
ano (50% e 40%, respectivamente) demonstrando a característica narrativa
principal. Uma diferença significativa semelhante é encontrada entre os
alunos da 8ª e 11ª série no que diz respeito ao conceito de nação. Entretanto,
esta característica é encontrada com menos frequência do que as outras duas
características. A menor porcentagem de alunos de 8ª série (67%) e 11ª série
(25%) demonstrando um conceito de nação essencialista indica uma
compreensão histórica da nação geralmente mais desenvolvida do que a do
assunto e dos eventos históricos. Como foi mencionado anteriormente, o
aprendizado da história com relação ao conceito de nação parece um pouco
mais fácil do que com relação a estas duas outras características narrativas.
De fato, Germán (idade 13) mostrou como uma nação construída é mais fácil
de aceitar do que uma identidade nacional construída. A identidade nacional
é salvaguardada na narrativa de um tema histórico homogêneo com um curso
lógico de ação. A nação argentina pode não ter estado lá desde sempre, mas
foi, no entanto, o objetivo predestinado e antecipado do sujeito histórico e dos
eventos históricos. Muitos alunos da 11ª série demonstram um entendimento
do 25 de maio semelhante ao de Germán. Dos alunos da 8ª série, 33% já têm
uma visão mais construtivista da nação, em comparação com os 75% da 11ª
série. Esta última é a porcentagem mais alta de uma representação mais
disciplinar sobre as quatro dimensões estudadas. A maioria dos alunos da 11ª
série sabe que não existia uma nação argentina há 200 anos. A educação
histórica, combinada com o desenvolvimento cognitivo e uma crescente
exposição a dispositivos culturais, provavelmente tem sido eficaz na produção
de uma mudança conceitual. No entanto, muitos mal-entendidos permanecem
24
com relação ao tema histórico e aos eventos históricos.
Com relação à característica narrativa de identificação, foram obtidos
resultados bastante diferentes em comparação com as outras três
características. Não foi encontrada diferença entre os alunos do 8º e 11º ano;
portanto, falar de nós no passado não parece desaparecer com o efeito
combinado da educação histórica, do desenvolvimento cognitivo e de outras
influências culturais. Esta voz coletiva penetrante, transcendendo processos
históricos, foi encontrada por outros pesquisadores na área (Barton, 2008;
Wertsch, 2002). A nação se tornou tão real e enraizada nas práticas e discursos
atuais do dia a dia que é aplicada indiscriminadamente. Billig (1995) já
sugeriu isto ao introduzir sua ideia de nacionalismo banal. No entanto, deve-
se levar em conta que o nacionalismo em uma parte do mundo antes
colonizada é muito diferente do nacionalismo dos colonizadores. A teoria
pós-colonial (Young, 2001) elucida as diferenças nos contextos históricos
para estes nacionalismos. Isto também pode explicar por que o conceito de
nação não é tão essencialista, mas que o tema narrativo é, em sua maioria,
simplificado em torno da busca pela liberdade: A nação argentina não existia,
mas era visada pelos revolucionários. Os resultados, no entanto, indicam uma
omnipresença da ferramenta cultural narrativa mestra em termos de
identificação. Ao nos utilizar ao descrever os protagonistas de eventos
históricos de mais de 200 anos atrás, o passado e o presente se confundem. A
educação histórica deve gerar uma compreensão da relação entre passado e
presente. Se os estudantes não compreendem que passado e presente são
mundos epistemológicos muito diferentes (Carretero & Solcoff, 2012;
Lowenthal, 1985), isto não é apenas uma confusão, mas também uma
concepção errada em oposição ao desenvolvimento do pensamento histórico
(Levesque, 2008; Seixas, 2004; Wineburg, 2001) e, finalmente, uma
compreensão limitada do complexo e dinâmico presente. Neste sentido, a
identificação é concebida para ser um possível inibidor do entendimento
histórico. Entretanto, é provável que a identificação também desempenhe um
papel positivo no aprendizado da história, em termos de abordagem do
passado ou da alteridade. As identidades sociais têm sido encontradas como
possíveis facilitadores e inibidores de um complexo aprendizado de história
(Bellino & Selman, 2012; Epstein & Schiller, 2005; Goldberg, 2013;
Goldberg, Baruch, & Porat, 2011; Hammack, 2010). Outro estudo empírico
em nossa linha de pesquisa (López, Carretero, & Rodríguez-Moneo, em
press-a) indica que ao contar a narrativa de uma nação que não é sua própria,
os estudantes apresentam uma narrativa histórica mais elaborada. Isto pode
ser porque esta narrativa não está comprometida em apoiar sua identidade
nacional. Estas descobertas não implicam necessariamente que o ensino não
deve mais visar a construção da identidade. Ao contrário, de um ponto de vista
instrucional, parece que seria útil apresentar narrativas mestras em um
25
contexto comparativo, onde os alunos podem analisar narrativas mestras de
diferentes nações.
Desenvolvendo implicações tanto para a educação histórica quanto
para a aprendizagem, deve ser levado em conta que persistem conceitos
errôneos ou narrativas históricas nacionais simplificadas. Isto é
provavelmente devido a muitas fontes informais de informações históricas,
como a mídia e tradições cheias de estereótipos históricos. Ao mesmo tempo,
foi encontrada uma mudança significativa nas narrativas, uma vez que pode
ser observado ao comparar os alunos argentinos da 8ª série com os da 11ª
série. Especialmente no que diz respeito ao conceito de nação, é encontrado
um melhor entendimento histórico disciplinar. Isto sugere um primeiro passo
para melhorar toda a representação narrativa. Em outros lugares (López et al.,
em press-a) a ideia de que o processo de mudança de conceitos históricos
poderia ser melhor entendido se fosse desenvolvido e apoiado empiricamente
nas narrativas históricas. Assim, a melhoria das representações dos estudantes
começa por ajudá-los a desenvolver uma noção mais construtiva de nação
passa a refletir sobre o assunto histórico homogêneo e os eventos
unidirecionais. Se os estudantes e os cidadãos em geral são capazes de
distinguir as diferentes dimensões de uma narrativa mestra, eles podem
aproximar-se de uma visão disciplinar da nação com mais sucesso. Assim,
eles poderiam ser capazes de entender que a nação é o resultado de um
processo histórico, político e social em vez de uma entidade preexistente com
um destino teleológico. Além disso, eles poderiam aprender com mais
facilidade que tanto as narrativas nacionais quanto as nações são ferramentas
de representação que podem ser refletidas com o histórico consciência e
habilidades de pensamento, como comparar fontes e contextualizar (Seixas,
2004; Wineburg, 2001).
As narrativas históricas mais disciplinares dos estudantes indicam que
o aprendizado da história é possível, mas ao mesmo tempo os resultados
apoiam a ideia da narrativa histórica nacional como uma poderosa ferramenta
cultural. As narrativas dos estudantes que foram entrevistados coincidem em
grande parte com uma narrativa principal, de acordo com a comparação entre
as narrativas históricas nacionais produzidas e consumidas (Carretero &
Bermúdez, 2012). Além disso, estes resultados apoiam análises empíricas e
teóricas anteriores (Wertsch, 1998, 2002). Entretanto, como Wertsch já
indicou, as narrativas mestras podem ser contestadas e, portanto, a ênfase
educacional em uma abordagem histórica mais disciplinar pode mudar
gradualmente as representações históricas nacionais. Para poder compreender
melhor o processo por trás da mudança ou perseverança da narrativa histórica
nacional durante a adolescência e até a idade adulta, será necessário realizar
estudos transversais e longitudinais adicionais.
Este estudo contribuiu analisando as narrativas com mais detalhes. Ele
26
sugere que as narrativas podem ser avaliadas em termos das informações
históricas que elas fornecem e que as informações adquiridas pela pesquisa
histórica podem ser introduzidas. A história faz um trabalho particularmente
bom na investigação de mudança. A história até reflete sobre si mesma, e
sobre os conceitos e narrativas que ela produz, como mudanças (Koselleck,
1975/2004). A investigação histórica pode assim introduzir mudanças na
representação coletiva. Reconhecendo que mesmo a narrativa nacional e seu
tema podem mudar, estamos um passo mais próximos de entender o mundo
dinâmico em que vivemos. De modo mais geral, podemos aceitar que a
informação histórica tenha um formato narrativo, desde que a narrativa seja
refletida com a atitude histórica crítica adequada. Isto é algo que Marguerite
Yourcenar já disse com muito mais elegância.
Agradecimento
Este artigo foi escrito com o apoio dos projetos EDU-2010-17725 DGICYT,
Espanha) e PICT-2008-1217 (ANPCYT, Argentina), coordenado pelo
primeiro autor. Somos gratos por esse apoio. Também queremos agradecer à
Dra. Alicia Barreiro e ao Dr. Cesar López por sua colaboração na realização
deste artigo.
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