A GLOBALIZAÇÃO DA COMPLEXIDADE - Pós-Modernismo e Cultura Do Consumo - Mike Featherstone

Fazer download em pdf ou txt
Fazer download em pdf ou txt
Você está na página 1de 18

A GLOBALIZAÇÃO DA

COMPLEXIDADE
Pós-modernismo e cultura do
consumo(*)
 
 
 

Mike Featherstone
 
 
Imaginemos um jovem estudante de pós-graduação começando a trabalhar em sua tese sobre o pós-
modernismo. Ele vai fazer uma busca online nos bancos de dados informatizados e depara com milhares de entradas
diferentes - talvez a mais antiga date do final dos anos 70. Mas isso já é suficiente para escrever uma história do pós-
modernismo. Imaginemos agora que você está folheando ao acaso o livro de Bertens (1995), publicado no início do
ano passado, quando vê, entre embaraçado e lisonjeado, que seu nome foi incluído, quase no fim do livro, como parte
integrante dessa história. Não deixa de ser lisonjeiro porque, afinal de contas, você não foi esquecido, mas também é
embaraçoso perceber que suas idéias foram incorporadas tão rapidamente à história. Mas, pensando bem, quem vai ler
essa história no futuro? Talcott Parsons (1937), por exemplo, perguntava na introdução de The Structure of Social
Action: “Quem hoje lê Herbert Spencer?” Mas, trinta anos depois, a situação se inverteu e uma geração mais jovem de
seus colegas americanos é que indagava: “E quem hoje lê Talcott Parsons?” Será que nossos sucessores, daqui a trinta
anos, não estarão também perguntando: “Quem hoje lê Jean Baudrillard, ou Jürgen Habermas, ou Anthony Giddens”?
 
Entretanto, o problema mais premente de nosso jovem pesquisador pode não ser o da relevância histórica, no
sentido da relatividade, mas o da seletividade: o que ele deve ler, o que deve deixar de fora, o que precisa entrar no seu
modelo de análise, como construir esse modelo. Este é um dos aspectos do problema da complexidade a que aludimos
no título deste artigo. A Internet exacerba o problema colocando ao nosso alcance uma quantidade enorme de bancos
de dados, bibliografias e grupos de discussão por BBS (afinal; de quais grupos seria melhor participar - dos de
Baudrillard, de Lyotard ou da cultura pós-moderna?). A imensa quantidade de informação disponível cria um
problema da “navegação”, ou de selecionar a informação, o problema do ciberespaço. Como veremos adiante, no
espaço cibernético há muitas maneiras de apresentar a informação, algumas aumentando e outras reduzindo a
complexidade. Mas é sempre possível alegar que o problema da complexidade não é especialmente novo. Simmel
(1960 dizia, por exemplo, que o grande acúmulo de cultura objetiva na modernidade colocava as pessoas diante de
uma tarefa impossível, já que se tornara impraticável assimilar e sintetizar o conhecimento de modo significativo. A
conseqüência disso é ficarmos expostos a um excesso de estímulos provocado “pelos milhares de adornos e itens
supérfluos que abarrotam nossas vidas e dos quais (...) não nos conseguimos livrar”. Simmel acrescenta que “tudo hoje
se arroga ter um valor cultural” (196, p. 46; ver também Featherstone, 1991 a, p. 10). Essa observação de Simmel,
escrita em 1911, é perfeitamente condizente com algumas características do que hoje denominamos pós-moderno.
Simmel chama a atenção para um crescente sentimento de arbitrariedade cultural e de incapacidade para construir
sólidas hierarquias simbólicas que nos permitam confiar em nossos julgamentos e preferências. Traduzindo essas
idéias para o discurso pós-moderno, quer dizer que não é mais possível distinguir entre cultura erudita e cultura
popular, que não se podem mais justificar os cânones dos textos sagrados. Madorna passou a ter o mesmo valor de
Shakespeare e faz igualmente jus a minuciosos estudos nos círculos universitários. A educação deixou de ser vista
como um Bildungsprozess, um processo educativo de autoformação, centrado em objetivos claros de cultivo e
construção do caráter.
 
Um verso do poema “The Second Coming”, de W. B.Yeats, costuma ser citado nas discussões sobre o pós-
modernismo para ressaltar essa sensação atual de perturbação e fragmentação cultural: “Things fall apart; the centre
cannot hold”. (1) A idéia implícita é que a cultura foi descentrada, falta-lhe coerência e unidade, não pode mais
proporcionar uma explicação satisfatória do mundo, suficiente para nos ajudar a construir ou ordenar a vida. Os dois
versos anteriores do poema de Yeats dizem o seguinte: “Turnings and turning in the widening gyre/The falcon cannot
hear the falconer”. (2) Essa impossibilidade de retornar ao familiar, ao ponto perdido de coerência e ordem, foi, sem
dúvida, um tema muito comentado durante os acontecimentos que cercaram o fim da Primeira Guerra Mundial e os
anos imediatamente posteriores, quando Yeats escreveu aquele poema.
 
Como termo, o pós-modernismo indica a impossibilidade de os artistas, intelectuais e outros grupos envolvidos
com a cultura continuarem acreditando no projeto unificador e universalizante da modernidade. A impressão atual de
fragmentação cultural se expressa no título de alguns livros recentemente publicados, tais como Off/Center [Fora do
centro] (Miyoshi, 1991), Dislocating Masculinities [Masculinidades transtornadas] (Cornwall e Lindisfarne, 1994),
Relocating Cultural Studies [Reposicionando os estudos sobre a cultura] (Blundell et al., 1993), Border Dialogues
[Diálogos de fronteira] (Chambers, 1990), Disrupted Borders [Fronteiras rompidas] (Gupta, 1993), The Nation and its
Fragments [A Nação e seus fragmentos] (Chatterjee, 1993), Decentring Leisure [Descentrando o lazer] (Rojek, 1995).
Esse tipo de percepção, portanto, não é novidade. A verdade é que há muito tempo as pessoas vêm Undoing Culture
[Desfazendo a cultura] (Featherstone, 1995), para acrescentar mais um título a essa lista em expansão. Contudo, o que
nos chama a atenção é que poucos analistas do final do século XX se dispõem a examinar outras fases semelhantes da
história, como os anos imediatamente posteriores ao final da Primeira Guerra Mundial, quando l’eats escreveu seu
poema. Essa foi uma época em que predominava uma intensa sensação de relativismo cultural e crise, como bem
demonstram os escritos de Spengler, Weber, Scheler e outros. Se quisermos recuar um pouco mais ainda, poderemos
lembrar da cultura barroca do século XVII, que tanto fascinou Walter Benjamin (1977), e outros, tais como Buci-
Glucksmann (1994) e 1Viaravall (1986). Parafraseando Adorno, acreditamos que nossa geração não é a primeira a ser
acusada de abrigar “homens (diríamos hoje, pessoas) sem memória”.
 
Pode-se dizer que a sensação de estar vivendo numa época de crise cultural, de urgência de um “diagnóstico de
nosso tempo”, sempre foi o assunto predileto dos profissionais da cultura (artistas, intelectuais e diversos tipos de
intermediário cultural). Na verdade, eles têm um interesse profissional em desfazer e refazer os nós da cultura, mas
isso não quer dizer que estejam inventando crises culturais, de modo arbitrário ou fantasioso. Certamente apenas
respondem às percepções e imagens do que acontece no mundo. Contudo, é exatamente a relação entre seu mundo
imediato, as condições de produção e de consumo intelectual e cultural em que trabalham, e esse mundo “lá fora” que
precisa ser investigada. O que chama a atenção no pós-guerra são as mudanças ocorridas no interior das práticas
intelectuais que, processando-se, até então, na forma de establishments rigidamente controlados, capazes de
monopolizar a oferta de bens intelectuais, deram lugar a uma fase de desmonopolização geradora de muitas
oportunidades para grupos estranhos ao meio.
 
Um dos argumentos de Consumer Culture and Postmodernism (Featherstone, 1991) é que não se deve
compreender o pós-modernismo apenas como uma mudança localizada numa época, ou como uma nova etapa do
capitalismo. Em vez disso, é preciso prestar atenção às mediações entre a economia e a cultura, focalizando as
atividades dos especialistas e intermediários da cultura e a expansão dos públicos (a geração do baby-boom do pós-
guerra) de toda uma nova gama de bens culturais. Contrapondo-se a algumas correntes da teoria pós-moderna que
proclamam o triunfo da cultura juntamente com o fim do social, o livro argumentava que não passamos tão facilmente
assim para um estágio de desenvolvimento da vida social, no qual o equilíbrio de forças e as interdependências que
vinculam as pessoas foram totalmente destruídos. Ao mesmo tempo, é preciso admitir que conceitos como “o social” e
“sociedade” já não prestam os mesmos serviços teóricos que antes prometiam. O processo de globalização tem ajudado
a corroer a suposta integridade e unidade dos Estados-nações, mas é preciso cuidado para não concluir que isso
explica tudo; a “sociedade” foi tanto a projeção de uma imagem do que a vida social deveria ser quanto uma realidade.
Nela apenas afloravam muitos processos sociais nunca antes domesticados, regulados e integrados.
 
O termo pós-modernismo sugere, então, uma superprodução de bens culturais, difícil de controlar e ordenar,
que desestabiliza as hierarquias simbólicas existentes. Essa tendência, que Simmel definiu como um acúmulo
exagerado de cultura objetiva, difícil de lidar, não é apenas um problema intelectual. Com o desenvolvimento da
cultura de consumo, costuma-se dizer que aumentou não só a oferta de bens como também a de imagens e signos. O
consumo ficou mais difícil de decodificar porque aumentou o problema de interpretar um campo mutável de signos. A
idéia que “hoje não há mais moda, apenas modas” (Ewen & Ewen, 1982) aponta para a fragmentação de um jogo
predominante de status, no qual todos conhecem os lances de um número maior de jogos complexos e fluidos que
transtornam e modificam os estilos. Essa afirmação que “nenhuma sociedade jamais esteve tão saturada de signos e
imagens quanto a nossa” é que persuadiu Jameson (1984) a ampliar esse argumento de Baudrillard a ponto de fazer
dele uma teoria desenvolvida das relações entre cultura de consumo e pós-modernismo. Para Jameson, o pós-
modernismo é a cultura da sociedade de consumo que nasce com a passagem do capitalismo monopolista para o
capitalismo tardio, após 1945. Contudo, essa periodização parece ser estreita demais; muitos aspectos atualmente
identificados com o pós-modernismo, tais como “a volatilidade dos signos”, a “fragmentação cultural”, a “confusão
das identidades” e a “estetização da vida cotidiana”, podem ser encontrados na história desde o nascimento dos
mercados e das cidades. Basta passar os olhos nos trabalhos de Georg Simmel e Walter Benjamin para ver que muitas
experiências e formas culturais tidas como pós-modernas já estavam presentes nos sonhos de consumo das sociedades
no final do século XIX e início do século XX.
 
O que hoje parece, de fato, diferente dos mundos de consumo descritos por Benjamin e Simmel é o
desenvolvimento e a difusão, a partir da década de 60, de novas tecnologias de comunicação, como a televisão e os
computadores. Já se assinalou a tendência da cultura de consumo para substituir os bens materiais por imagens, signos
e experiências. A fotografia, o cinema e a televisão estimulam um certo deslocamento no mundo dos bens à medida
que coisas e lugares não vistos, ocultos ou despercebidos se tornam agora transportáveis. Isso acarreta não só uma
ampliação das noções de tempo-espaço, com a redução das distâncias físicas e uma maior percepção da
simultaneidade, do “estar lá”, de ter a experiência de novos lugares e novas sensações; a dinâmica da cultura de
consumo também impõe novas imagens e novas experiências. O novo pode aparecer associado ao exótico, pois este foi
definido como coisa fora do lugar, sugerindo que vivemos cada vez mais em mundos nos quais as imagens da matéria
podem ser facilmente transportadas: elas invadem e transtornam nosso lugar. Uma conseqüência disso é a crescente
estetização da vida - a que se fez referência como um “adoçamento do real com o influxo da estética” (Welsch, 1996).
Movemo-nos por entre os mundos da cultura de consumo, em que a superfície do tecido urbano tende a ser planejada
e simulada nos shopping centers, passamos por pessoas cujos corpos e cujos modos de se apresentar são cada vez mais
estilizados. Mas o fato de que os narizes sejam mais perfeitos, os corpos mais bonitos e as fachadas mais lindas não é
um aspecto inconseqüente da superestrutura cultural. Essas mudanças são viabilizadas por tecnologias materiais,
principalmente o Computer-aided Design.
 
Os críticos da cultura têm voltado sua atenção nos últimos anos para os temas do ciberespaço e da realidade
virtual (Peatherstone, 1996). Para aqueles que trabalham, se divertem ou residem nos espaços tridimensionais
simulados, a novidade não está na capacidade de observar, mas de deslocar-se através de mundos fabricados com
extremo realismo, que não só arrebatam os sentidos humanos como também permitem a interação com outras pessoas.
A realidade virtual baseia-se na digitalização das imagens fotográficas ou de outros tipos. Isso possibilita não só a
reprodução e duplicação, a simulação de pessoas e coisas no “mundo real”, quanto facilita sua desconstrução e
reconstrução para criar novas imagens e mundos - o “hiper-real”, a cópia sem original. Elvis está vivo! - ele será
simulado e poderemos interagir e estar com ele no ciberespaço.
 
Outro aspecto importante desse espaço cibernético nos traz de volta ao nosso pobre estudante de doutorado que
esteve pacientemente à espera, pensando em como escrever sua tese sobre o pós-modernismo. O ciberespaço não alivia
muito, pois também é um espaço de armazenamento de informações. Toda a cultura coletiva da humanidade está
contida dentro dele: todos os textos impressos, todas as imagens (artísticas, fotográficas, cinematográficas,
televisionadas), todos os sons gravados. O ciberespaço proporciona rapidez de acesso, pois os bancos de dados são
construídos a partir de formas arquitetônicas tridimensionais, como “cidades de dados”. Se isso ajuda a diminuir a
complexidade em termos de navegação, não resolve o problema da seletividade: o que se deve colocar dentro de um
modelo de análise, o que deixar de fora?
 
A nova tecnologia das comunicações, seja como “internet” ou como “superhighway”, o ciberespaço nascente,
deve ser entendida não só como um veículo de globalização, que permite a circulação de textos, imagens e dinheiro
através do mundo e nos torna participantes do que Virilio (1993 ) chamou de “a cidade do mundo”. Além disso, o
ciberespaço cria um mundo paralelo, não como pós-modernidade, mas como paramodernidade. Um mundo que não
substitui o existente, mas que tem potencialidade para transtorná-lo. Um mundo que, embora proporcione ambientes
simulados e estetizados, também comporta jogos de poder. A informação é uma forma de poder e o ciberespaço, como
o imagina o romancista William Gibson, não é só um mundo de informação: implica também um campo de lutas entre
os grandes interesses econômicos em torno da capacidade de controlar o acesso (para uma rápida introdução a esse
mundo, recomendo o filme baseado em um seus contos, Johnny Mnemonic, direção de Robert Longo, roteiro do
próprio William Gibson, 1995).
 
A importância do pós-modernismo está, então, em chamar a atenção para o problema de como organizar uma
quantidade crescente de informações numa situação em que os próprios princípios de organização foram postos em
questão e se tornaram difíceis de justificar. Alguns analistas consideram o pós-modernismo como um processo cultural
que coloca em dúvida, e destrói progressivamente, a viabilidade do projeto da modernidade de submeter a vida social
à ordem e ao progresso. Outros o tomam como uma dimensão cultural associada ao desenvolvimento de uma nova
etapa do capitalismo ou da modernidade (capitalismo tardio, pósfordismo, modernidade reflexiva), como encontramos
nas teorias de Jameson (1984), Harvey (1989), e Lash &Urry (1987). Nesta última vertente, o capitalismo é retratado
como portador de tendências globalizadoras intrínsecas. A extensão da competição em escala mundial dá origem a
uma crescente desregulação e desorganização, de modo que as nações e coletividades vão se enfraquecendo cada vez
mais sob o impacto da expansão do fluxo de dinheiro, mercadorias, tecnologias, informações e imagens. A metáfora
dos fluxos (Castells, 1994; Lash & Urry, 1993; Appadurai, 1990; Luke, 1995) é de grande importância, porque esses
fluxos são entendidos como forças de descentramento, deslocamento no espaço e desmaterialização, promovendo a
fragmentação cultural e a transposição dos valores. De acordo com essa perspectiva, a globalização e, com ela, o pós-
modernismo são uma consequência da modernidade (ver Robertson, 1992; Featherstone, 1995). Existe, porém, um
outro modo de pensar que vê o pós-modernismo mais como um produto do processo de globalização e inverte a
perspectiva anterior. Nesse caso, o relativismo cultural e a perda de confiança no projeto da modernidade, típicos do
pós-modernismo, são vistos como fazendo parte de um processo de globalização que provocou um deslocamento do
equilíbrio mundial do poder para fora do Ocidente. Em vez de associar o pós-modernismo a uma seqüência universal
de etapas do desenvolvimento - da tradição para a modernidade e desta para o pós-modernismo -, a ênfase se desloca
do tempo para o espaço, acentuando as origens da modernidade e seu projeto, ou projeção, no Ocidente. Se o “resto”
do mundo for capaz de retrucar ao Ocidente no âmbito global, estará aberta a possibilidade de outras histórias, outras
modernidades e outras explicações do desenvolvimento histórico mundial ser reveladas. Isso não apenas lembra o
prognóstico do entrechoque de valores e civilizações de que falaram Weber e outros, como também desperta a atenção
para as percepções daqueles que não estão nem dentro nem fora da esfera dos valores culturais dominantes. Esta
última é a posição defendida pela teoria pós-colonialista, que enfatiza a mobilidade da cultura e o ponto de vista das
sociedades fronteiriças. Na próxima seção nos ocuparemos dessas questões, que ampliam a percepção da complexidade
da cultura global.
 
Cultura global e outros locais
 
A integração global pode ser fortalecida pela expansão da atividade econômica, na medida em que formas
usuais de produção industrial, mercadorias, comportamentos de mercado, comércio e consumo também se generalizam
por todo o mundo. Um exemplo notório da difusão do consumo global é o enorme sucesso das franquias de fast food,
como o MacDonald’s. George Ritzer analisou esse fenômeno, que chamou de “mcdonaldização”, isto é “o processo
pelo qual os princípios do restaurante de fast food vêm predominando em setores cada vez mais amplos da sociedade
americana, bem como no resto do mundo”. A cadeia MacDonald’s, inaugurada em 1955, possuía, em 1991, mais de 12
mil pontosde-venda. Na opinião de Ritzer, o MacDonald’s é um exemplo do processo inexorável de racionalização
imaginado por Max Weber. A cadeia de lojas oferece, em primeiro lugar, eficiência: a comida, conforme sugere o
termo fast food, pode ser rapidamente “preparada”; em segundo lugar, fornece comida e serviços facilmente
quantificáveis e calculáveis - o que significa refeições baratas; em terceiro lugar, oferece previsibilidade, um produto
idêntico é servido no mundo inteiro; e, por último, proporciona controle tecnológico tanto sobre a fragmentação das
tarefas da mão-de-obra quanto sobre a mudança de preferência dos consumidores, limitando-a a um conjunto de
opções básicas, o que facilita o rápido escoamento do público: ninguém fica muito tempo numa loja do McDonald’s.
Ritzer afirma que estamos diante de uma “mcdonaldização” da sociedade e do mundo - um processo que se encontra
presente não só na alimentação, como também na manutenção de carros, na educação, na assistência às crianças, nos
supermercados, nas lojas de aluguel de vídeos, nos cinemas, nos parques de diversão e no sexo. Faz parte de uma
burocratização maciça da vida cotidiana, acarretando uma progressiva padronização, que não pode ser facilmente
integrada às definições do pós-moderno, como veremos a seguir.
 
A “mcdonaldização” tem ainda um outro aspecto não examinado por Ritzer: ela gera não só ganhos de
eficiência econômica (na forma de tempo/dinheiro), por meio da padronização do produto e do fornecimento, mas
também contém em si uma mensagem cultural. O hambúrguer não é só consumido fisicamente como substância
material, ele também é consumido culturalmente como uma imagem e um ícone de determinado estilo de vida. Embora
o MacDonald’s não se empenhe em nenhuma sofisticada imagética publicitária, o hambúrguer é evidentemente
americano, um representante do american way of life. É um produto proveniente de um centro global superior, que há
muito tempo representa a si mesmo como o centro. Para os que estão na periferia, o produto oferece as vantagens
psicológicas de se identificar com o mais poderoso. Ao lado do Homem de Marlboro, da Coca-Cola, de Hollywood, da
Vila Sésamo, do rock, do futebol americano, o McDonald’s é um dos vários ícones do estilo de vida americano. Todos
esses ícones estão associados a uma série de temas centrais na cultura do consumo e passíveis de transposição:
juventude, boa forma, beleza, luxo, romance e liberdade. Os sonhos americanos do melhor da vida. A exportação
dessas imagens e artefatos para o mundo inteiro sugere, na opinião de alguns intérpretes, uma homogeneização da
cultura, em que a tradição cede lugar a todo um repertório derivado da cultura americana de consumo de massa. Na
visão desse modelo de imperialismo cultural (Mattelart, 1979; Schiller, 1976), a influência do poder econômico das
grandes empresas americanas, apoiadas pelo mais poderoso Estado do mundo, é suficiente para assegurar pontos de
entrada nos mercados nacionais em todo o mundo. Efetivamente, a cultura segue o rastro da economia.
 
Esse é um aspecto fartamente documentado nas memórias de viagens em que os escritores se aventuram pelo
mundo afora, visitando lugares desconhecidos para descobrir, no fim de tudo, que a parafernália da cultura americana
chegou lá primeiro. Pico Iyer, por exemplo, diz em seu livro Vicleo Nights in Katmandu, cujo subtítulo é Reports from
the Not-So-Far-East, ter observado que “de fato, em toda a parte, os sonhos de prazer e lucros traziam estampado o
rótulo ‘Made in America’” (1988, pp. 23-4). O texto da contracapa afirma que em Bali há cortes de cabelo no estilo
mohawk; em Gungzhou, na nova China, uma lanchonete servia pratos que tinham o nome de “Yes, Sir Cheese My
Baby” e “Ike and Tuna Turner”. Cabe notar também que o idioma mundial da cultura de consumo de massa é o inglês.
Para citar um segundo exemplo, um dos mais importantes autores de livros de viagens da atualidade, Paul Theroux
(1992, p. 178), narra em The Happy Islands of Oceania que, até nos lugares mais remotos das ilhas do Pacífico, as
pessoas vinham procurá-lo para falar das últimas notícias da Guerra do Golfo, ouvidas pelo rádio. Além disso,
‘Theroux descobriu que, na pequena ilha de Savo, no arquipélago de Salomão, Rambo era um grande herói popular. O
único gerador da ilha era usado exclusivamente como fonte de energia para ligar os aparelhos de vídeo. Não demora
muito e a ilha de Savo terá seu próprio satélite de recepção de tevê, ou seus microcomputadores, que colocarão a ilha
em conexão com o mundo inteiro via net. Mas, se a globalização assinala a maneira como os avanços tecnológicos
facilitaram a comunicação e a superação das restrições devidas à localização espacial, em áreas nas quais a norma era
a co-presença e a comunicação face a face, substituindo-as pela velocidade e facilidade como as imagens, as pessoas e
as coisas podem ser agora transportadas através do mundo inteiro, será mesmo que o resultado de tudo isso deverá ser
a uniformidade, ou que o padrão de uma cultura global homogeneamente integrada terá de ser o americanizado? Não
será possível que a globalização também acentue as diferenças, o localismo e a complexidade cultural, sem o
necessário prognóstico de uma transformação ou integração final?
 
A cultura das organizações transnacionais constitui um bom exemplo para responder a essa pergunta. A Apple
Computer é uma das mais bem-sucedidas empresas de tecnologia de ponta das últimas duas décadas; passou por uma
enorme expansão na década de 80 e hoje compete com a IBM, que domina o mercado. A cultura organizacional que a
Apple desenvolveu na sede do Sillicon Valley era nitidamente californiana, com sua ênfase na invenção, na
informalidade, na ausência de sinais visíveis de status e outras ressonâncias da contracultura. O termo Apple foi tirado
dos Beatles, a estrutura da organização dava pouca importância à hierarquia e privilegiava a criatividade. Um gerente
técnico assim definiu a cultura da organização:
 
Trabalhar na Apple é muito mais do que trabalhar, é um estilo de vida. Nós partilhamos tantas coisas aqui na
Apple, nós compartilhamos a nós mesmos. É como se fosse uma família. Para todo canto que vou, estou
respirando a Apple. É mais do que um sonho (...) Talvez seja quase uma religião (citado em Garsten, 1994, p.
82).
 
Essa ideologia também estava presente nos escritórios da Europa e em todos os lugares do mundo em que os
americanos formavam uma minoria na equipe multinacional. As organizações transnacionais tendem a reproduzir a
cultura da sociedade de origem nas suas filiais no exterior, mas no caso da Apple havia todo um estímulo à
flexibilidade, no sentido de entender que as periferias às vezes podiam ser os centros. O sentimento de comunidade
que se criava era muito mais uma “comunidade imaginada”, mantida pela rede de computadores por meio da qual se
processava o fluxo de informações e pela permanente circulação de pessoas pelos diferentes escritórios.
 
Essa capacidade de trabalhar no interior de uma determinada sociedade, sem pertencer a ela, no sentido de que
a cultura organizacional é, na realidade, transnacional, ou seja, que as referências e os mecanismos de orientação das
pessoas provêm de coletividades externas, tem se ampliado muito desde a década de 80. A integração dos principais
mercados de capital do mundo, que permitiu a realização de transações durante 24 horas por dia, depois do Big Bang
de 1985, oferece um dos exemplos mais significativos de grupos de profissionais de classe média envolvidos nesse
tipo de vida ocupacional deslocada (Dezalay, 1990). Acrescente-se a isso a expansão dos grupos de profissionais de
classe média nos campos de publicidade, design, moda, cinema, televisão, turismo e outras indústrias culturais que
cada vez mais se orientam no sentido de uma “comunidade global”, desenvolvendo atividades em escala mundial
através das cidades globais (King, 1990; Sassen, 1991).
 
Culturas desse tipo, que desenvolveram um grau razoável de independência das fontes nacionais, podem ser
chamadas de “terceiras culturas” (Gessner & Schade, 1990). A independência pode se dar tanto em termos de práticas
organizacionais quanto de orientações valorativas (um exemplo das últimas seria a Corte Internacional de Haia ou a
Corte Européia de Justiça de Estrasburgo).
 
São poucos ainda os exemplos de autênticas “terceiras culturas”, mas as que existem indicam a possibilidade de
que muitas culturas transnacionais diferentes estejam se afastando das influências nacionais sem que, ao mesmo
tempo, revelem sinais de se integrar a um processo dominante de reprodução mundial da cultura de um determinado
Estado-nação. A tese da americanização da cultura mostra evidentes dificuldades quando se desce a questões de
recepção e uso, conforme veremos a seguir. Entretanto, mesmo que se acredite que as culturas fluem feito água e
diluem facilmente as diferenças encontradas pelo caminho, resta o problema da presunção de que os Estados Unidos
constituem o centro, a partir do qual tudo emana para a periferia. Essa idéia pode ter sido até certo ponto verdadeira,
sobretudo como uma convincente representação, até os anos 70, mas hoje é difícil de sustentar. Os Estados Unidos
ainda dominam as indústrias da cultura e da informação que se difundem para o mundo inteiro, mas há uma crescente
consciência da multipolaridade e do aparecimento de centros concorrentes. Não há dúvida de que o Japão e o Leste
asiático são áreas de crescente importância mundial, principalmente em termos financeiros e na produção de bens de
consumo, mais do que de imagens e informações. A apologia da identidade nacional japonesa, ou Nihonjiron, foi
silenciada no pós-guerra, ou se voltou para dentro, mas isso pode nem sempre ser o caso. Os bens de consumo
japoneses não buscam vender um estilo de vida japonês. A verdade é que se a expressão japonização do mundo
significa alguma coisa é em termos de uma estratégia de mercado sustentada na noção de dochcaku, ou “glocalismo”,
isto é, uma estratégia global que não visa impor um produto ou imagem padrão, mas que, ao contrário, procura se
adaptar às demandas do mercado local. Essa estratégia vemse tornando popular entre as multinacionais que atuam em
outros lugares do mundo e procuram adotar a retórica do localismo. Por isso a Coca-Cola afirma: “Não somos apenas
uma multinacional, somos uma multilocal”.
 
Além dos processos globais de americanização e japonização, ou ocidentalização e orientalização, também é
possível falar de uma “brasileirização do mundo”. Vários comentaristas têm feito referência ao surgimento de “cidades
duais” (Mollenkopf & Castells, 1991), como outra forma de justaposição entre novos-ricos e novos pobres. Em sua
análise do desenvolvimento de Los Angeles, Mike Davis (1992, p. 20) chama a atenção para a natureza altamente
segregada da cidade, dividida em zonas que incluem um núcleo fortificado cercado por conjuntos de prédios de classe
média e alta, isolados e protegidos contra qualquer contato com os guetos étnicos de classe baixa e as zonas de crime
e desordem social. Apesar de ser uma “cidade da informação” (Castells, 1994), Davis afirma que Los Angeles revela
muitas semelhanças com a cidade de expansão descontrolada e desorganizada descrita por William Gibson em sua
novela de ficção científica Neuromancer. É uma trajetória que mostra que Los Angeles começou a se tornar mais
parecida com São Paulo do que com o complexo Tóquio-Yokohama pósmoderno. Esta seria uma forma de
“brasileirização”, com base no modelo de cidades perigosas, segregadas em zonas fortificadas (ver Banck, 1994, para
uma análise da invasão da cultura elitista da praia pelos favelados). O que não deixa de ser uma alternativa interessante
à imagem cultural do Brasil como terra de Carmem Miranda, samba e praia (ver Enloe, 1989, para uma análise da
globalização da imagem de Carmem Miranda).
 
Por isso, não se pode mais explicar os processos globais a partir de um só centro que domine as periferias. Ao
contrário, há muitos centros competitivos que vêm impondo mudanças ao equilíbrio mundial do poder entre Estados-
nações e blocos, e criando novos tipos de interdependência. Não quero insinuar com isto que haja igualdade de
condições entre os participantes, mas que novos parceiros entraram no jogo, exigindo acesso aos meios de
comunicação e reivindicando o direito de ser ouvidos. A expansão e a velocidade dos meios de comunicação
aumentam a dificuldade dos governos para vigiar e controlar o volume de informações e o fluxo de imagens que
atravessam suas fronteiras.
 
Em vez de ocasionar o aparecimento de uma cultura global unificada, o processo de globalização tende a
prover um cenário para a expressão de diferenças: não só revelando “um arquivo mundial de culturas”, em que os
exemplos do exótico remoto são trazidos diretamente para a esfera do familiar, mas oferecendo um espaço para O
confronto mais drástico entre culturas. Se, de um lado, estão em curso processos de integração cultural no plano global,
de outro a situação vem tendendo ao pluralismo, ou ao politeísmo, um mundo de muitos deuses em competição, no
sentido discutido por Weber em seu ensaio “A ciência como vocação”. Essa situação já foi definida como uma babel
global, em que “o resto do mundo cada vez mais se contrapõe ao Ocidente” e, coral o declínio relativo do poder
ocidental, exige que ouçam sua voz. Para as nações ocidentais, não é mais tão simples sustentar a superioridade de sua
“missão civilizadora” no resto do mundo, uma missão que relega as demais nações às fileiras inferiores de uma
hierarquia simbólica que são treinadas para escalar passo a passo, a fim de seguirem o exemplo de seus superiores.
Aliás, essa imagem modernista, integrante do núcleo da teoria da modernização, tem sido acoito discutida e contestada.
Como veremos mais à frente, o termo pós-modernismo alude a esse processo de fragmentação e colapso cultural das
hierarquias simbólicas, cuja origem, a meu ver, se encontra mais na consciência de unta modificação do valor do poder
simbólico e do capital cultural do Ocidente do que na passagem para unta nova etapa da história, a “pós-
modernidade”, ela mesma baseada em um modelo desenvolvimentista da tradição e da modernidade que se apóia na
experiência ocidental. É neste sentido, portanto, que o pós-modernismo aponta para o descentramento da cultura e a
introdução da complexidade cultural.
 
Assim, o processo de globalização não parece estar produzindo uniformidade cultural; ao contrário, ele vem nos
tornando mais conscientes de novos níveis de diversidade. Se existe uma cultura global, seria melhor entendê-la não
como uma cultura comum, mas conto um campo no qual se manifestam diferenças, conflitos e disputas por prestígio
social. Algo próximo a unta forma subjacente que permite o reconhecimento e a manifestação de diferenças no sentido
atribuído por Durkheim aos aspectos não-contratuais do contrato, ou na análise de Simmel do terreno comum das
coisas evidentes, que fundamenta o conflito social. Por essa razão, a globalização nos faz ver as dimensões, a
diversidade e a natureza multiforme da cultura; revela que os sincretismos e os híbridos são muito mais a regra do que
a exceção - levando-nos a colocarem questão as origens e a manutenção da imagem peculiar da cultura, com a qual
vimos trabalhando nas ciências sociais. Não se pode dizer, portanto, que a globalização elimine o localismo, porque,
paradoxalmente, ela pode fortalecer as identificações locais.
 
Vejamos alguns exemplos. Já se previu que o turismo se tornaria a maior atividade comercial do mundo por
volta de 1996 (Urry, 1993). O turismo baseia-se na idéia de transportar um brande número de pessoas pelo mundo
afora, sendo que algumas dessas pessoas não querem muito mais do que o que têm em casa (are only after home plus,
Hannerz, 1990), isto é, querem os confortos do lar, a comida e a bebida a que estão acostumadas, além de um pouco
de sol, mar e areia. É o conhecido pacote de férias do turismo de massa, que se encontra em toda a região do
Mediterrâneo. Mas, aléns deste, vem crescendo nos últimos anos unta forma diferente de turismo, às vezes chamado de
“turismo pósmoderno” ou “pós-turismo” (Urry, 1990). Trata-se, neste caso, de buscar novas experiências, vivenciar o
autêntico, ou sua simulação, conto algo a interpretar e analisar. É o mercado das “verdadeiras férias”, especialmente
importante para a nova classe média à cata de aventura e experiências novas. (Munt, 1994). Sempre se pode alegar, é
claro, que por mais cautelosos que sejam os membros desse grupo social quando viajam para regiões longínquas do
planeta, sempre carregam consigo a cultura ocidental. Se existe alguma dose de verdade nessa afirmação, ela não
explica tudo, porque deixa de lado a maneira pela qual os países hospedeiros se utilizam do turismo.
 
Hoje é possível comprar urna viagem de férias para passar um mês junto a uma tribo inuíte numa remota ilha
do Alasca. O atrativo desse tipo de viagem é “viver como os nativos”, participar integralmente da nova cultura. Mas as
tribos inuítes incentivam o turismo porque determinam suas condições e porque, além disso, essa atividade representa
uma útil fonte de renda, com a qual podem comprar armas para caçar focas e adquirir outros suprimentos. O turismo é
utilizado para manter um modo de vida tradicional. Outro exemplo é o dos aipo, um povo caçador/coletor que habita o
norte da ilha japonesa de Hokkaido. Com o processo de japonização e sua integração ao moderno Estado japonês, a
identidade étnica afino foi rejeitada. Mas, durante a década de 70, constituiu-se um movimento cultural afino que
levou à reconstrução das aldeias e à criação de escolas autônomas para restabelecer a cultura original. Os turistas
foram convidados a visitar as aldeias, assistir aos festivais e observar o modo de vida tradicional desse povo, a
comprar suas comidas típicas, artesanatos etc. (Friedman, 1990, 1994). Neste caso, em vez de a forma de mercadoria
eliminar as diferenças locais, serviu para reconstituir uma identidade cultural.
 
Estratégias desse tipo devem ser interpretadas como parte de um processo mais amplo de reinvenção das
identidades locais e tribais. Na América do Norte, a população antigamente conhecida como “índia”, e que agora deve
ser tratada, segundo o jargão politicamente correto, como “americanos da primeira nação”, dobrou entre 1970 e 1980,
passando de um total de 700 mil para 1,4 milhão. Cabe notar, neste caso, a recusa de um povo de etnicidade mista em
“fazer-se passar” (no sentido de Goffman) por membro de um grupo étnico branco dominante e a redescoberta de suas
identidades tribais. Minoria dentro de seu próprio país, a população dos havaianos vem crescendo nos últimos anos em
conseqüência da adesão de muitos semi-havaianos, que redescobriram suas identidades étnicas no movimento cultural
desse povo (Friedman, 1990, 1994). A força da iden tificação e da busca de novos membros é tão grande que, em
certos casos, pessoas de etnia branca (especialmente estudantes da nova classe média) se integraram a movimentos
culturais étnicos. Foi o que aconteceu com alguns neozelandeses; um grupo de dança maori que se apresentou no
Havaí em trajes tribais típicos incluía várias pessoas brancas.
 
Muitos comentaristas têm chamado a atenção para a facilidade com que as pessoas adotam e abandonam
identidades étnicas (AbuLughod, 1991). Contrastando com os modelos de assimilação, ou do melting pot, que
impingiam marcadas distinções entre insider e outsider, cujas identidades eram consideradas fixas, existe hoje um
reconhecimento mais amplo de que as pessoas podem muito bem viver com identidades múltiplas. Daí as mudanças
encontradas tanto na atitude valorativa quanto na terminologia usada para nomear as pessoas que correm o mundo
como migrantes e vivem em meio a diferentes culturas. Penso na situação dos membros da terceira geração de
brasileiros de origem japonesa, que vivem em São Paulo e vão para o Japão em busca de emprego como operários
imigrantes - os chamados “nisseis”. Não é mais sufidente explicá-los como uso de categorias como “homem marginal”
ou “halfies” [meio-japoneses, meio-brasileiros]. Ao contrário, sua situação adquire uma conotação positiva quando
indicada pelo termo “duplos”.
 
Esse termo reproduz o conceito de “dupla consciência”, empregado por Paul Gilroy (1993) em seu livro Black
Atlantic. Refere-se à situação dos negros no interior da modernidade ocidental, onde não havia lugar para sua
participação na construção das identidades nacionais e nunca lhes foi permitida a assimilação. Por isso, os negros
conservaram um sentimento ambivalente de cultura, apoiado nas origens africanas e, desde logo, transnacional no
sentido de que ultrapassava os limites de um Estado-nação. Os negros constituíram um dos mais numerosos grupos
deslocados e forçados a migrarem conseqüência da modernidade - embora haja uma certa imprecisão nos termos, ou
melhor, a palavra migração parece ser totalmente insuficiente para descrever o transporte de escravos através do
Atlântico.
 
Esses fatos sugerem que uma parte importante dos processos responsáveis pela intensificação da globalização
deve ser interpretada pelo prisma da movimentação das populações através do mundo. Há mais pessoas vivendo hoje
no meio de culturas diferentes, ou na fronteira delas; as nações européias, assim como as demais que anteriormente
procuravam erigir um sólido e exclusivo senso de identidade nacional, precisam enfrentar a realidade de que são
sociedades multiculturais, depois que “o resto do mundo” retornou ao Ocidente, na era posterior a 1945. As minorias
que fazem questão do respeito a suas culturas, assim como os diversos nacionalismos e subnacionalismos reprimidos
(escoceses, irlandeses, bascos, catalãos etc.), estão exigindo respeito às identidades locais e regionais. A percepção que
temos das culturas nacionais vai se tornando mais complexa à medida que grupos distintos buscam libertar suas
tradições nacionais e inventar novas tradições, ou declaram abertamente sua capacidade e seu direito de construir
culturas sincréticas, híbridas ou mescladas, inconciliáveis sob uma só identidade integrada. Nossa imagem da cultura
vai ficando mais complexa. Contudo, isso também levanta importantes questões acerca da imagem de cultura que por
tanto tempo predominou nas ciências sociais. Ela pode ter sido excessivamente simplificadora, representando a cultura
como algo de integrado, unificado, estabelecido e estático, forjando a visão bem-comportada de uma coisa que servia
para impulsionar a vida social numa sociedade ordenada. Se hoje consideramos tal imagem insatisfatória para dar conta
da etapa atual da globalização, com seus processos deformadores dos Estados-nações, como foi que ela surgiu e
ganhou tamanha influência? Se ela esteve associada à construção de culturas nacionais, ao lado dos processos de
formação do Estado, não teria sido sempre um ideal, mais uma intenção do que uma realidade? Não terá sido ela
responsável pela supressão dos diferentes níveis de complexidade e diferença já inerentes às sociedades modernas?
Vejamos mais de perto as imagens de cultura associadas com a vida social nos campos da sociologia e da
antropologia.
 
Imagens da cultura na vida social
 
Em sociologia, estamos habituados a trabalhar com uma imagem fixa da vida social. O termo sociedade sugere
uma coisa confinada, estruturada e ordenada. É uma imagem que torna difícil lidar com relações entre sociedades, com
o inter-sodetário e com a nova dimensão trans-sodetária da vida social. As teorias da vida social, por exemplo, sempre
negligenciaram a migração, preferindo conceituá-la como imigração e estudá-la pelo ângulo da assimilação dos
migrantes à sociedade hospedeira e a sua cultura. O período entre 1870 e 1914 foi descrito como “the great
swarming”,(3) um período de “febre migratória” durante o qual cerca de 60 a 70 milhões de pessoas entraram ou
saíram da Europa através do Atlântico. Mas o volume de migração no período de auge seguinte, após a Segunda
Guerra Mundial, foi tão grande que o contingente total da população migrante, em 1992, representava duas a três vezes
mais do que em 1914, ponto máximo da onda migratória anterior. A segunda fase teve um alcance muito mais global
do que a primeira (Morowska & Spohn, 1993). Afirmamos anteriormente, e voltaremos a argumentar mais adiante,
que as explicações teóricas do fluxo de pessoas na fase atual de globalização estão mais atentas à complexidade e
hibridez cultural, procurando superar uma visão da cultura atrelada ao Estado-nação. Mas esse processo de construção
da nação e de desenvolvimento de culturas nacionais fortemente integradas e exclusivas. Nessa época, o movimento de
formação dos Estados europeus impelia os países a uma espiral cada vez mais estreita de interdependências e
mudanças no equilíbrio de forças, que culminou com a Primeira Guerra Mundial. Predominava a tendência a suprimir
as diferenças entre culturas locais, regionais e étnicas e a desenvolver ou inventar tradições nacionais, como as que
alimentavam a idéia dos franceses ou alemães como entidades distintas (ver E. Weber, 1976, sobre o processo de
conversão dos camponeses em franceses). O modelo vigente achava-se impregnado das teorias evolucionistas e dos
conceitos de superioridade da civilização européia.
 
A mesma tendência manifestava-se nos processos de integração do Estado em outros lugares do mundo. No
Japão, o processo de integração do Estado-nação, iniciado com a Restauração Meiji, acompanhou essa lógica, visando
inventar os japoneses pela reconstrução de tradições e pela eliminação de minorias étnicas. A adoção dos padrões de
comportamento civilizado do Ocidente, com toda sua pompa e acessórios, serviu para legitimar o processo. Em
conseqüência disso, a construção da identidade japonesa se processou em duas frentes: primeiro, pelos padrões
ocidentais, tomados por empréstimo, o que gerou uma postura subordinada; depois, pelos padrões do Leste asiático,
onde o Japão, considerando-se superior e mais civilizado, encontrou justificativas para assumir uma atitude de
superioridade, equivalente à dos europeus diante de seu país. Prevalecia, então, uma crença geral na importância das
distinções de in-group e out-group e na integridade das culturas nacionais, aliada a uma opinião de que cada cultura
tinha seu lugar próprio na escala evolucionista.
 
A imagem de sociedade que se formou no final do século XIX pendia também a favor da noção de integração.
Já se afirmou que o termo “social” tem como referente o comunal e que o modelo de vida social indicado por esse
conceito é distorcido pelo problema de inventar novos formatos institucionais para substituir as formas comunais
tradicionais (Nisbet, 1967). Essa nostalgia das formas tradicionais de ordem e integração normativa pode ser
encontrada nas obras de Coorte e Durkheim, e é também notória na idealização da Genzeinschcrft que caracteriza a
importante tipologia de Tõnnies, em Gemeinschaft and Gesellschaft (1887), obra que já foi definida como “a carta de
fundação da sociologia moderna” (Lascb, 1991, p. 139).
 
Nessas análises, a cultura aparece sob a forma de normas e valores que constituem o cimento social
indispensável para manter a sociedade unida diante das ameaças de destruição trazidas pela industrialização, pelo
capitalismo e pela modernização. A interpretação de que a sociedade necessita de uma cultura comum ou de uma
ideologia dominante, ou que ela age por meio destas, tem sido muito criticada (Abercrombie et al., 1980; Featherstone,
1991). Reduzindo o foco da sociologia única e exclusivamente à sociedade, entendida como um objeto sui generis, a
unidade básica da vida social, essa interpretação deu origem também a uma concepção teórica unilateral, que analisava
a vida social por meio de conceitos do tipo subsistema, subcultura ou estruturas sociais, sempre tornados como
elementos genéricos e vigentes em qualquer época e lugar. O resultado foi a negligência dos processos inter e
transsodetários como o religioso, o político e o econômico, que transpõem fronteiras; o menosprezo do papel da guerra
e do colonialismo, das levas de migrantes, refugiados e exilados. A sociologia privilegiou a definição da mudança
social como fenômeno causado por mecanismos estruturais que operam no interior das sociedades. Contudo, pode-se
argumentar que a natureza das sociedades é sempre afetada pela situação externa (ver Tenbruck, 1994, que pensa de
modo muito semelhante a Max Weber).
 
Uma imagem igualmente holística e integrada da cultura pode ser encontrada na antropologia, imagem esta que
até recentemente exerceu grande influência sobre a concepção de cultura predominante nas ciências sociais e nos
estudos da cultura. Com base na hermenêutica do final do século XIX e na filosofia alemã influenciada por pensadores
como Boas, presumiu-se que as tribos possuem culturas bem definidas, formando complexos singulares que devem ser
interpretados e explicados em seus próprios termos. Supunha-se que as sociedades tribais existiam em isolamento, que
suas culturas formavam um padrão singular em que as diversas partes se ajustavam a um todo unificado. Ruth
Benedict, por exemplo, em seu livro The Chrysanthemum and The Sword (1946), afirma que a cultura é formada por
muitos detalhes que compõem um padrão coerente.
 
As hipóteses de Benedict sobre a unidade e a singularidade das culturas são rejeitadas pelos antropólogos
contemporâneos, que sublinham a natureza pluralista, controvertida, processual, desunida e fragmentada da cultura. A
antropologia sustentou por muito tempo que a cultura se forma pela ação de algum tipo de força ou tendência para a
integração lógico-estética. Contestando essa noção, Eric Wolff (1990) salienta o fato de que todas as sociedades são
plurais, formadas a partir das diferentes percepções de homens, mulheres, crianças, senhores, escravos, guerreiros,
sacerdotes etc. É errado presumir que essas diferentes perspectivas possam se integrar de modo harmônico. Ao
contrário, devemos formular a seguinte pergunta: “Que grupos têm interesse em representar para si mesmos um mundo
coeso e coerente, e como eles mantêm essa representação?”
 
A chamada “virada pós-moderna” na antropologia enfatiza ainda leais esse ponto, concentrando-se na
imposição de uma imagem coesa da cultura pelos diversos modos de “escrever a cultura”, questionando a viabilidade
do “paradigma do selvagem” e sua intenção de apreender e redimir uma outra cultura (Clifford & Marcus, 1986;
Clifford, 1988; Marcus & Fischer, 1986; Crapanzo, 1992; Taussig, 1987). As convenções do realismo e sua tendência
para a totalidade são rejeitadas em troca de uma abordagem muito mais experimental, em que os vários processos de
contração são desvendados na elaboração de um relato textual, intencionalmente fragmentado e incompleto. O
modernismo e o surrealismo tiveram, nesse sentido, uma poderosa influência, pela introdução de justaposições
inesperadas e pela valorização de fragmentos alegóricos. Importante pioneiro dessa visão foi Walter Benjamin (1982),
especialmente seu livro Das Passagen-Werk. É interessante ressaltar que Benjamin colaborava com alguns membros
do College de Sociologie de Paris nos anos 30, como, por exemplo, Bataille, Griaule e Leiras. O estudo deste último,
intitulado L’Afrique .fantôme, era propositadamente um “antilivro”, de leitura aberta, assistemático e cheio de
sincretismos.
 
Deve-se assinalar também que a descrição antropológica das culturas costumava deixar de fora temas como a
mobilidade. Uma característica desses estudos era excluir a menção aos meios de transporte usados pelo antropólogo
para chegar à aldeia, suas relações com a capital e as diversas entradas e saídas do campo por parte dos nativos,
pesquisadores e intermediários. De fato, já se afirmou que a descrição de Lm1 nativo preso à aldeia, sem contato com
outros grupos, sempre foi uma peça de ficção (Appadurai, 1988). Contudo, a idéia de pessoas enclausuradas numa
localidade, mantendo relações duradouras com um determinado lugar, é uma imagem de grande influência na vida
social, uma imagem que foi muito incentivada na Europa pela redescoberta e pela invenção de histórias étnicas,
tradições e culturas populares feita por artistas e intelectuais no final do século XVIII, acompanhando 0
desenvolvimento de identidades nacionais (Burke, 1978). Isso pode ter ajudado a formular a metáfora orgânica da
cultura como algo integrado, confinado e distinto. As identidades nacionais sempre enfatizaram o sangue e o solo
pátrio, utilizando metáforas de enraizamento. Keith Thomas (1983, p. 220) reconstruiu a história do carvalho como um
emblema do povo britânico (ver Malkki, 1992, p. 27). Acentuando as metáforas naturais de raiz, solo, mãe-pátria e
terra natal, as identidades nacionais proporcionam não só um sentimento de enraizamento, mas também de
exclusividade - só se pode pertencer a uma árvore genealógica nacional.(4) Esses breves comentarios sugerem que é
possível encontrar a origem da formação de metáforas sedentárias na territorialização de nossas identidades,
paralelamente ao crescimento do Estado e ao desenvolvimento dos pressupostos sobre os direitos e as obrigações dos
cidadãos e súditos. O conceito de nação como “homeland”, como um lugar de residência, um lar, do qual se parte em
aventuras, mas para o qual sempre se deseja voltar, é unta outra metáfora poderosa, visto que se opõe à concepção de
que a modernidade induz à triste situação de “homelessness” [“sem lar”].(5)
 
A volumosa literatura sobre pós-modernismo e pós-colonialismo contém um número crescente de críticas às
noções de identidade e cultura imobilizadas e uma ênfase cada vez maior na fragmentação, hibridização e sincretismo
(ver Featherstone, 1995). Em oposição às concepções estáticas e estabelecidas de cultura, observa-se uma utilização
mais freqüente de metáforas de movimento e marginalidade. Há referências a viagens, ao nomadismo, à migração, ao
cruzamento de fronteiras, ao viver na fronteira. O nomadismo e a migração não são apresentados apenas como
características do mundo contemporâneo, mas como elementos centrais da linguagem. Chambers (1990, 1994), por
exemplo, refere-se à experiência nômade da linguagem que deixa de ser um instrumento de precisão e clareza. O
pensamento vagueia e migra: em vez de ter uma base ou um lar fixo, ocupa um habitat móvel que produz
descontinuidades e experiências fragmentadas. O nômade tornouse uma categoria importante nesse tipo de estudos
culturais da literatura. Especialmente influentes nessa área foram Deleuze & Guattari (1983, 1987), não só pela análise
do “pensamento nômade” e da “arte nômade”, como também por sua crítica geral das categorias e identidades fixas.
Por sua apologia do retorno às fornias pré-cognitivas de experiência e seu conceito de “fluxos”, Deleuze & Guattari
exerceram uma grande influência sobre toda uma nova geração de estudiosos da cultura. Boa parte da literatura sobre o
ciberespaço e “a net” (a rede de informações computadorizada) tem sido influenciada por seus conceitos de poder
disperso, rizóide e fluxos.
 
A teoria do pós-colonialismo coincide com vários pressupostos da crítica pós-moderna da identidade. Do ponto
de vista do pós-modernismo, a modernidade é responsável pela imposição das concepções de unidade e universalidade
sobre o pensamento e o mundo. Na verdade, sua missão é impor ordem á desordem, domar a fronteira. Contudo, o
deslocamento do equilíbrio global de poder para fora do Ocidente e a existência de maior número de vozes retrucando
ao Ocidente reforçam a opinião geral de que a modernidade não será universalizada. Isso porque a modernidade é
entendida tanto como um projeto ocidental quanto como uma projeção para o mundo dos valores do Ocidente. Foi
Bauman (1991, p. 12) quem observou que “a modernidade permitiu aos europeus projetarem sua civilização, sua
história, seu conhecimento, como civilização, história e ciência überhaupt [em geral]”.
 
Em vez da certeza de que é possível construir uma teoria e classificar o mundo a partir do ponto de segurança
representado pelo centro, geralmente visto como mais elevado e mais avançado em termos reais e simbólicos, o
pósmodernism0 e O pós-colonialismo pensam a teoria como algo que se move ou que se constrói a partir de uma
posição excêntrica, de algum lugar de fronteira. O movimento de pessoas a partir das fronteiras globais para o centro é
comparado a um deslocamento da teoria para a fronteira, a um rebaixamento de sua capacidade de falar pelas pessoas
em geral, ao reconhecimento da natureza limitada e local de suas afirmativas.
 
A própria idéia que se pode fazer uma análise comparativa tomando como base culturas nacionais homogêneas,
tradições consensuais ou comunidades étnicas “orgânicas” vem sendo refutada e redefinida. Como diz Homi Bhabha
(1994, p. 5):
 
(...) há evidências indiscutíveis de uma percepção mais transnacional e transladável da hibridez das
comunidades imaginadas. O teatro contemporâneo no Sri Lanka representa o conflito mortal entre os tâmeis e
os cingaleses por meio de referências alegóricas à brutalidade do Estado na África do Sul e na América Latina;
o padrão anglo-céltico da literatura e do cinema australianos vem sendo reescrito a partir da perspectiva dos
imperativos políticos e culturais dos aborígines; os romances sul-africanos de Richard Rive, Bessie Head,
Nadine Gordimer e John Coetzee falam de uma sociedade dividida pelo ccpcrrtheid que impõe à comunidade
intelectual internacional fazer a mediação entre os mundos assimétricos e desiguais que existem em outros
lugares; Salman Rushdie constrói a historiografia imaginária da fase pós-independência da Índia e do Paquistão
em Midnight’s Children e em Shame, só para nos fazer lembrar, em The Satanic Verses, que o olhar mais
verdadeiro talvez esteja contido hoje na dupla visão do migrante; em Beloved, Toni Morrison revive o passado
escravista e seus rituais assassinos de possessão e autopossessão para tecer uma fábula contemporânea, a
história de uma mulher que é simultaneamente a narrativa de uma memória afetiva e histórica de uma nova
esfera pública de homens e mulheres iguais.
 
Essa mistura consciente de tradições e cruzamentos de fronteiras ressalta que, sob formas diferentes, o resto do
mundo, agora tão obviamente visível no Ocidente, na verdade sempre fez parte desse mesmo Ocidente. Seu efeito é
destruir as imagens unitárias, assépticas e coesas da modernidade que foram projetadas a partir dos centros ocidentais.
A situação pós-colonial, como assinala Bhabha (1994, p. 6), acentua as perspectivas híbridas e sincréticas daqueles que
estiveram confinados em fronteiras, meio dentro e meio fora da modernidade. Isto sugere, na opinião de Bhabha, a
existência de uma contramodernidade pós-colonial, visível tanto no Sul quanto no Norte, não só no campo, como
também nas cidades do mundo inteiro.
 
Essa opinião faz eco à descrição de Paul Gilroy (1993, p. 36) da cultura e da música negras conto unta
contracultura bem definida da modernidade, por sua rejeição à “separação ocidental moderna entre ética e estética,
cultura e política”. Para Gilroy, as análises sobre a modernidade raramente mencionam a escravidão e a diáspora
africanas, assim conto, poderíamos acrescentar, o colonialismo não entra nas análises sociológicas da modernidade, de
orientação intra-sodetária, realizadas por eminentes teóricos como Giddens e Habermas. Não é só que a modernidade
seja associada ao barbarismo pelo degradante transporte de escravos africanos através do Atlântico. Não é que a figura
de Cristóvão Colombo nunca apareça ao lado da dupla Lutero e Copérnico, como os personagens essenciais da
modernidade, ou que o relato de Bartolomé de las Casas (1992) do genocídio na América Latina seja raramente
comparado ao de Auschwitz, que reproduz em escala menor. Não se trata também de que os relatos sobre a escravidão
fiquem de certa forma restritos à história dos negros, e não à história intelectual do Ocidente conto um todo. Ou que a
escravidão seja muitas vezes analisada sociologicamente conto elemento integrante de uma economia de plantation,
vista colho resíduo pré-moderno fundamentalmente incompatível com o capitalismo e a racionalidade moderna.
 
Todos esses fatores justificam uma revisão da categoria; contudo, o maior problema é o fato de que os negros
estão ao mesmo tempo dentro e fora do desenvolvimento da cultura ocidental na modernidade. Gilroy (1993, p. 54)
afirma que a escravidão é a premissa da modernidade; ela expõe a nu o etnocentrismo fundamental do projeto
iluminista e sua idéia de universalidade, fixidez de significados e coerência do sujeito. O problema é que a escravidão
gerou membros da sociedade que representam desmentidos vivos da validade desse projeto. Por muito tempo os
negros tiveram negada sua própria existência no interior da sociedade, ou a possibilidade de ser admitidos como
pessoas ou cidadãos. Contudo, os negros são tanto americanos quanto negros, ou igualmente europeus e negros,
participam de uma cultura e de um conjunto de memórias coletivas que não podem ser integradas ou limitadas às
culturas do Estado-nação em que residem. Sua cultura é africana e ocidental e sua identidade é vivida na forma de
uma “dupla consciência”, enraizada em experiências simultaneamente internas e externas ao Ocidente, internas e
externas à modernidade.
 
Entender isto certamente exige um conceito de cultura que dê conta dos deslocamentos inerentes ao cerne da
modernidade e que a teoria pós-colonial vem progressivamente fazendo emergir; requer unta concepção de cultura que
não só torne visível a crescente complexidade da fase atual da globalização, como também leve em consideração as
fases anteriores e sua relação com a modernidade. O que temos em mente é a necessidade de investigar como se
geraram determinadas noções européias de cultura no interior da modernidade, noções através das quais a Europa
representou sua cultura como sendo unificada e integrada e que negligenciaram as relações espaciais com o resto do
mundo criado pelo colonialismo; melhor dizendo, o lado sombrio da modernidade que tornou possível esse sentido de
unidade.
 
Conclusão: por uma teoria da complexidade cultural
 
A sociologia sempre considerou como seu objeto de estudo a sociedade, um conceito cuja origem localizamos
em um determinado ponto do século XIX, quando as nações estavam preocupadas com sua integração como parte do
processo de formação dos Estados-nações. A ênfase nos mecanismos intra-sodetários de integração tornou-se
particularmente acentuada no momento em que as nações eram impelidas a uma organização fortemente competitiva,
que deu origem a uma vigorosa afirmação das identidades nacionais. Hoje em dia, os conflitos e as interdependências
globais que cortam as fronteiras dos Estados tornam mais difícil justificar a herança dessa divisão artificial do
trabalho.
 
Pós-modernismo e pós-colonialismo são expressões que ressaltam o problema da complexidade cultural e da
crescente projeção da cultura na vida social por meio do crescimento da produção, da mescla e do sincretismo de
culturas antigamente mantidas isoladas e firmemente atreladas às relações sociais. As implicações mais radicais do
pós-modernismo e do póscolonialismo são o questionamento da própria idéia de social, da unidade da modernidade e
das metanarrativas da tradição do Iluminismo ocidental, com sua crença no universalismo e no progresso. Isso leva a
crer numa relativização espacial do Ocidente em um mundo que deixa de ser uma projeção sua, ou um reflexo de sua
imagem (ver Said, 1978). Obras como a de Said nasceram do fato de que: a) um maior número de pessoas vem
transpondo fronteiras e mantendo múltiplas afiliações, o que coloca em dúvida os estereótipos mais estabelecidos; b)
houve uma mudança no equilíbrio mundial de forças, de tal maneira deslocado para fora do Ocidente que este já não
pode deixar de ouvir o “outro”, nem supor que o “outro” esteja em uma etapa inferior de desenvolvimento.
 
A auto-imagem do Ocidente, assim como a do “outro” passivo, estão, desse modo, sujeitas a crescente
contestação. Não surpreende, então, que uma das forças associadas ao pósmodernismo seja o pós-colonialismo
(Spivak, Minh-ha, Bhabha, Gilroy, Hall et al.). Pode-se dizer que a mudança das condições mundiais ao longo do
processo de globalização provocou uma reação peculiar do Ocidente na forma do pós-modernismo, o qual se dedicou a
um profundo questionamento da sua própria tradição, embora a tenha concebido de um modo geral em termos
internos, e não em termos das relações espaciais entre o Ocidente e o resto do mundo.
 
O crescimento das interdependências e as mudanças no equilíbrio de forças hoje conhecidos como globalização
nos tornam mais conscientes de que as teorias são formuladas a partir de determinados lugares, de certas localizações
espaciais no mundo, e que a falta de referências espaciais claras de boa parte das antigas teorias do Ocidente se deveu
à presunção de que deste Ocidente é que se originava o mundo e de que a história ocidental era a própria história do
mundo. É por isso que “todas as teorias globalizadoras são auto-representações de um ponto de vista dominante”
(King, 1995). Também está claro que chegamos a um ponto no qual as pessoas começam a refletir sobre o
aparecimento de outros pontos de vista dominantes e sobre a possibilidade de que suas teorias ocupem um lugar nas
lutas intelectuais e acadêmicas globais.
 
Se admitirmos a natureza potencialmente controversa das imagens do mundo e da modernidade, dentro e fora
da academia, quais serão suas implicações para o processo de construção de teorias? Será que isso levará ao
relativismo ou a uma percepção das evidentes relações entre conhecimento e poder, à medida que tomamos ciência das
novas mudanças na disputa global pela hegemonia? Ou será possível explicar esse processo do ponto de vista
sociológico?
 
Um dos problemas de construir modelos é lidar com um novo nível de complexidade, que deve incorporar mais
dados, justamente no momento em que a disposição geral, especialmente no caso do pós-modernismo, é respeitar o
particular e o local, chegando-se ao ponto de aceitar a igualdade de seu direito de falar. Será que a introdução da
cultura não acarretará o perigo de nos fazer submergir numa voragem de desconceituação, à medida que tomamos
consciência dos diferentes níveis de complexidade e diferença que, por outro lado, devemos respeitar?
 
Uma alternativa seria trabalhar com os conceitos da teoria dos jogos (Elias, 1978), que chamam a atenção para
o aumento das relações binárias, ternárias e quaternárias produzidas pela introdução de um número maior de atores em
um jogo. Além disso, é preciso estar atento ao problema de que o uso do termo “globalização” muitas vezes introduz
uma falsa impressão de concretude - presumimos que as pessoas vão se associar e interagir. Em lugar de um sistema
dotado de diferentes modalidades de associação e integração, O mundo aluda contém muitas características de um
“amontoado” ou de uma “massa informe” - a justaposição em um mesmo campo de entidades e agregados que não
aderem entre si.
 
Entretanto, colho sociólogos, somos chamados a generalizar e construir modelos, apesar de nossa consciência
da complexidade cultural. Um modelo possível consiste em examinar o modo pelo qual nossos conceitos sobre o
mundo se modificam junto com as mudanças na hegemonia. O modelo pluralista do mundo, que vem se tornando cada
vez mais comum no Ocidente, pode ser uma forma específica de conceituar a atual fragmentação do sistema, do ponto
de vista ocidental. Nesta fase, grande parte das nações do Ocidente está redescobrindo sua diversidade e suas
diferenças culturais e repensando as questões das tradições, dos dialetos e das formas vernáculas reprimidas. Não
quero dizer que seja este o único processo global, pois outras nações podem estar engajadas na formação do Estado e
na afirmação nacionalista.
 
O par conceitual established e outsiders (Elias & Scotson, 1994) costuma ser útil em sociologia. Quando o
grupo established detém um firme controle, as relações com os grupos outsiders são geralmente mais hierárquicas e o
que governa tem condições de se tornar colonizados do mais fraco, a partir de seus próprios padrões de conduta. O
grupo established desenvolve uma “we-image” [“imagem plural”] baseada em seu carisma e em sua superioridade,
cuja contrapartida é a estigmatização dos outsiders, que muitas vezes internalizam um sentimento de “desonra de
grupo” - a sensação de não terem valor, de serem todos “sujos, preguiçosos e moralmente não-confiáveis”.
 
Uma segunda fase, em que a colonização é substituída pela democratização, representa maiores dificuldades
para que os grupos established controlem os outsiders, que adquirem poder e confiança, acabando por gerar aumento
das tensões sociais. É razoável pensar que, no âmbito global, estamos entrando na segunda fase, isto é, numa etapa em
que as concepções de mundo até recentemente dominantes vêm sendo questionadas e muitos pressupostos universais
são agora vistos como decorrentes de um tempo e um lugar limitados. Nessa fase, é de esperar que surjam problemas
de complexidade cultural, pois muitas vozes até então subjugadas agora afirmam claramente que foram classificadas
de modo equivocado pelas teorias dominantes e exigem uma correta representação (nos dois sentidos da palavra)
nacional, social e científica.
 
NOTAS
 
*. Esta é uma versão revisada do artigo preparado para o 19º Encontro daANPOCS, em Caxambu, em outubro de 1995. Uma parte do material
utilizado na elaboração deste artigo foi extraída de meu livro Undoing Culture: Globalization. Postmodernism nnd Consumption.
 
1 “Tudo esboroa, o centro não segura.” W.B. Yeats, Poemas, tradução de Paulo Vizioli. São Paulo, Companhia das Letras, 1992 [NT].
 
2. “Rodando em bico cada vez mais largo/o falcão não encontra o falcoeiro.” Idem, ibidem [NT].
 
3. Literalmente, “o grande enxame”. [NT]
 
4. Deleuze & Guattari (1987, p. 1 8) observam: “É curioso como a árvore domina a realidade ocidental e todo o pensamento ocidental, da botânica
a biologia e à anatomia, mas também a gnosiologia, a teologia, a ontologia e toda a filosofia (...): a raiz fundadora, Grund, racine, fondement. O
Ocidente tem uma relação especial com a floresta e o desflorestamento (...)” (citado em Malkki, 1992, p. 28). O lugar da floresta no pensamento
intelectual e na cultura popular alemães é particularnlente importante.
 
5. Não cabe nos limites deste artigo analisar a importante questão das relações entre a formação de sólidas identidades nacionais na fase posterior a
1 870, de grande competição entre os Estados, que produziu fortes imagens das nações como “comunidades imaginadas”, cada uma com sua
própria homeland e suas próprias heranças c tradições, e sua migração. A época dos “great swarmings”, da grande intensificação das migrações do
período entre 1880 e 1920, foi também uma fase em que os países entraram em pânico diante das “crises migratórias” e da necessidade de construir
fronteiras e identidades sólidas. Debates exaltados ocorreram nos Estados Unidos no final do século XIX, discutindo os méritos do modelo de
assimilação, em comparação com os modelos pluralistas de tolerância da diversidade étnica (Lasch, 1991). A fase de intensa mobilidade também
foi, portanto, uma fase de preocupação com “a pátria” e a identidade; mas, é difícil descobrir imagens positivas da mobilidade e da migração,
embora, sem dúvida, elas existam. As diversas correntes contraculturais da modernidade, como o modernismo na arte, os círculos boêmios etc.,
com seu interesse pelas viagens e pelo estrangeiro, e as histórias de imigrantes, escravos e refugiados fornecem essas fontes. A relação entre
viagem e lar é por isso muito complexa. Determinados povos desenvolveram, paralelamente ao processo de formação do Estado, imagens positivas
e negativas da viagem e do grau de confinamento e fechamento da nação. Os portugueses, por exemplo, desde as viagens de exploração dos
séculos XV  e XVI, formularam uma acentuada orientação para o mundo, em oposição ao Estado-Nação, como uma unidade espacial. A palavra
saudade sempre esteve associada, entre os portugueses, a uma infindável sede de viagens (Feldman-Bianco, 1992). Remeti; ao duplo sentido de um
interesse em viajar e perambular, mas também a uma memória de Portugal como comunidade imaginada. É possível encontrar em outros lugares
esse mesmo sentimento de identidade nacional como movimento e mobilidade. Wang Gungwu (1993), por exemplo, afirmou que isso também é
encontrado no Sudeste Asiático, em contraposição ao Leste Asiático, onde a mobilidade e a migração são consideradas limitadas e marginais, no
contexto de uma sociedade agrária estática, apoiada no peitismo confucionista e em estruturas burocráticas. Seria interessante reconstruir elementos
das identidades nacionais de várias nações ocidentais à luz dessas observações. Eyreman & Lofgren (1995) apresentam uma análise preliminar,
comparando os Estados Unidos com a Suécia, do ponto de vista das atitudes em relação ao fascínio “pela estrada”, tomando como base os “road
movies”.
 
BIBLIOGRAFIA
 
ABERCROMBIE, N., HILL, S. & TURNER, B.S. (1980), The Dominant Ideology Thesis. Londres, Allen and Unwin.
 
ABU-LUGHOD, J. (1991), “Going Beyond the Global Babble”, in A.D. King (org.), Culture, Globalization and the WorId-System. Londres,
Macmillan.
 
APPADURAI, Arjun. (1988), “Putting Hierarchy in Its Place”. Cultural Anthropology 3, 1.
 
________________.(1990), “Disjunction and Difference in the Global Cultural Economy”. Theory, Culture and Society 7, 2/3.
 
BANCK, G. A. (1994), “Mass Consumption and Urban Contest in Brazil: Some Reflections on Lifestyle and Class”. Bulletin of Latin American
Research 13, 1: 45-60.
BAUMAN, Zigmund. (1991), Modernity and Ambivalence. Cambridge, Polity.
 
BENEDICT, Ruth. (1934), Pattens of Culture. Boston, Houghton Mifflin.
 
_____________. (1946), The Chrysanthemum and the Sword. Boston, Houghton Mifflin.
 
BENJAMIN, Walter. (1977), The Origin of German Tragic Drama. Londres, New Left Books.
 
_______________. (1982), Die Passagen-Werk. 2 volumes. Frankfurt, Surhkamp.
 
BERTENS, H. (1995), The Idea of the Postmodern: A History. Londres, Routledge.
 
BHABHA, Homi. (1994), The Location of Culture. Londres, Routledge.
 
BLUNDELL, V et al. (1993), Relocating Cultural Studies. Londres, Routledge.
 
BUCI-GLUCKSMANN, C. (1994), Baroque Reason, Londres, Sage.
 
BURKE, Peter. (1978), Popular Culture in Early Modern Europe. Londres, Temple Smith.
 
CASAS, Bartolomé de las. (1992), A Short Account of the Destruction Of the Indies. Harmondsworth, Penguin.
 
CASTELLS, 1VI. (1994), “European Cities, the Informational Society and the Global Economy”. New Left Review, 204: 19-32.
 
CHAMBERS, I. (1990), Border Dialogues: Journeys in Postmodernity. Londres, Routledge.
 
____________. (1994), Migrancy, Cultuie and Identity. Londres, Routledge.
 
CHATTERJEE, P. (1993), The Nation and its Fragments. Princeton: Princeton University Press.
 
CLIFFORD, J. (1988), The Predicantent of Culture. Cambridge, Harvard University Press.
 
__________. (1989), “Notes on Travel and Theory”. Insciiptions, 5: 177-88.
 
CLIFFORD, J. & MARCUS, George (orgs.). (1986), Writing Culture. Berkeley, California University Press.
 
CORNWALL, A. & LINDISFARNE, N. (1994), Dislocating, Masculinites. Londres, Routledge.
 
CRAPANZO, V.  (1980), Tuhcrmi: Portrait of Maroccan. Chicago, Chicago University Press.
 
____________. (1992), Hermes’ Dilemma and Hamlet’s Desire. On the Epistemology, of Interpretation. Cambridge, Harvard University Press.
 
DAVIS, Mike. (1992), “Beyond Blade Runner: Urban Control and the Ecology of Fear”. Open Magazine Pamphlet Series. Westfield, N. J.
 
DELEUZE, G. & GUATTARI, F. (1983), AntiOedipus. Minneapolis, Minneapolis University Press.
 
_______________________. (1987), A Thousand Plateaus.- Capitalism and Schizophrenia. Minneapolis, Mineapolis University Press.
 
DEZALAY, Y. (1990), “The Big Bang and the Law”, in M. Featherstone (org.), Global Culture. Londres, Sage.
 
ELIAS, Norbert. (1978), What is Sociology? Londres, Hutchinson.
 
ELIAS, Norbert & SCOTSON, J. (1994), The Established and the Outsiders. Londres, Sage.
 
ENLOE, C. (1989), Bananas, Beaches and Bases: Making Sense of Feminist International Politics. Berkeley, California University Press.
 
EWEN, S. & EWEN, E. (1982), Channels of Desire, New York, McGraw-Hill.
 
EYREIVIAN, R. & LOFGREN, O. (1995), “Road Movies”. Theory, Culture  and Society 12, 1.
 
FEATHERSTONE, Mike. (1991), Postmodeinism and Consumer Culture. Londres, Sage.
 
___________________(1991a), “Special Issue on Georg Simmel”. Theory, Culture and Society 8, 3.
 
___________________. (1995), Undoing, Culture: Globalization, Postmodernism and Identity. Londres, Sage.
 
FEATHERSTONE, Mike & BURROWS, R. (orgs.). (1996), Cyberspace, Cyberbodies, Cyber-punk: culltures of Technological Embodiment.
Londres, Sage.
 
FEATHERSTONE, Mike & LASH, S. (1995), “Globalization, Modernity and the Spacialization of  Social Theory”, in M. Featherstone et al.
(orgs.), Global Modernities. Londres, Sage.
 
FELDMAN-BIANCO, Bella. (1992), “Multiple Layers of Time and Space: The Construction of Class, Ethnicity and Nationalism among
Portuguese Immigrants”, in N.G. Schiller et al. (orgs.), Towards a Transnational Perspective on Migration: Race, Class, Ethnicity and
Nationalism Reconsidered. Annals of the New York Academy of Sdence, vol. 645. Nova York, New York Academy of Sciences.
 
FRIEDMAN, J. (1990), “Global ization and Localization”, in IVI. Featherstone (org.) Global Culture. Londres, Sage.
 
_____________. (1994), Cultural Identity and Global Process. Londres, Sage.
 
GARSTEN, C. (1994), “Apple World: Core and Periphery in a Transnational Organizational Culture”. Estocolmo, Stockholm Studies in
Anthiopology 33.
 
GESSNER, V & SCHADE, A. (1990), “Conflicts of Culture in Cross-border Legal Relations”. Theory, Culture and Society 7, 2-3.
 
GIDDENS, A. (1994), “Living in a Post-Traditional Society”, in U. Beek et al. (orgs.), Reflexive Modernization. Oxford, Polity.
 
GILROY, Paul. (1993), The Black Atlantic. Londres, Verso.
 
GUNGWU, Wang. (1993), “Migration and its Enemies”, in Mazlish, B. & Buultjens, R. (orgs.), Conceptualizing Global History. Boulder/Oxford,
Westview Press.
 
GUPTA, S. (1993), Disrupted Borders. Londres, Rivers Oram Press.
 
HANNERZ, U. (1990), “Cosmopolitan and Locals in World Culture”. Theor-3; Culture and Society 7, 2-3.
 
HARVEY, David. (1989), The Condition of Postmodernism. Oxford, Blackwell.
 
IYER, Pico. (1988), Video Nights in Katmandu. Londres, Black Swan.
 
JAMESON, F. (1984), “Postmodernism and the Consumer Society”, in H. Foster (org.) Postmodern Culture. Londres, Pluto.
 
KING, A. (1990) “Architecture, Capital and the Globalization of Culture”, in M. Featherstone (org.), Global Culture. Londres, Salte.
 
________. (1995), “The Times and Spaces of Modernity (or Who Needs Postmodernism’?)”, in M. Featherstone et al. (orgs.), Global Modernines.
Londres, Salte.
 
LASCH, C. (1991), The True and Only Heaven: Progress and Its Critics. Nova York, Norton.
 
LASH, S. & URRY, J. (1987), The End of Organized Capitalism. Cambridge, Polity. ,
 
________________. (1993), Economies of Signs and Spaces. Londres, Salte.
 
LUKE, T. (1995), “New World Order or New World Orders’? Power Politics and Ideology in the Informationalizing Global Order”, in M.
Featherstone et al. (orgs.), Global Modernization. Londres, Salte.
 
MALKKI, Liisa (1992) “National Geographic: The Rooting of Peoples and the Territorialization of National Identity among Scholars and
Refugees”. Cultural Anthropology 7: 24-44.
 
MARAVALL, J. A. (1986), Culture of the Baroque. Manchester, Manchester University Press.
 
MARCUS, George & FISCHER, M.J. Michael. (1986), Anthropology as Cultural Critique. Chicago, Chicago University Press.
 
MATTELART, A. (1979), Multinational Corporations and the Control of Culture. Brighton, Harvester.
 
MINH-HA, Trinh T. (1989), Women, Native, Other Writing Postcoloniality and Feminism. Bloomington, Indiana University Press.
 
MIYOSHI, M. (1991), Off/Center: Power and Culture Relations between Japan and the United States. Cambridge, Harvard University Press.
 
MOLLENKOPF, J. & CASTELLS, M. (orgs.). (1991), Dual City. Reestructuring New York. Nova York, Russel Salte Foundation.
 
MOROWSKA, Eva & SPOHN, Willfried. (1993), “European Comings and Goings in the 19th and 20th Centuries”. Terceira Conferência
Internacional sobre História Global, Hong Kong.
 
MUNT, I. (1994), “The ‘Other’ Postmodern Tourism: Culture, Travel and the New Middle Classes”. Theory, Culture and Society 11, 3.
 
NISBET, R. (1967), The Sociological Tradition. Londres, Heinemann.
 
PARSONS, Talcott. (1937), The Structure of Social Action. Glencoe, Free Press.
 
RITZER, George. (1993), The McDonaldization of Society. Londres, Salte.
 
ROBERTSON, R. (1992), Globalization. Londres, Salte.
 
ROJEK, C. (1995), Decentring Leisuz-e. Londres, Salte.
 
SAID, E. W. (1978), Orientalism. Harmondsworth, Penguin.
 
SASSEN, S. (1991), Global Cities.- New York, London, Tokyo. Princeton, Princeton University Presa.
 
SCHILLER, H. I. (1976), Communications and Cultural Domination. Nova York, Sharpe.
 
SIMMEL, Georg. (1968), “On the Concept of the Tragedy of Culture”, in The Conflict in Modern Culture and Other Essays. Nova York, Teachers
College Press
 
TAUSSIG, M. (1987), Shamanism, Colonialism and the Wild Man: A Study of Terror and Healing, Chicago, Chicago University Press.
 
TENBRUCK, F. (1990), “The Dream of a Secular Ecumene”, in M. Featherstone (org.), Global Culture. Londres, Salte.
 
_____________. (1994), “Internai History of Society or Universal History”. Theory, Culture and Society 11, 1.
 
THEROUX, Paul (1992), The Happy Islands of Oceania. Nova York, Putnam.
 
THOMAS, Keith. (1983), Man and the Natural World. Haarmondsworth, Allen Lane.
 
TÖNNIES, Ferdinand. (1955), Community and Association. Londres, Routledge.
 
URRY, J. (1990), The Tourist Gaze. Londres, Salte.
 
______. (1992), “The Tourist Gaze and the Environment”. Theory, Culture and Society 9, 3.
 
VIRILIO, P. (1994), The Vision Machine. Bloomington, Indiana University Press.
 
WALLERSTEIN, 1. (1974), The Modern WorldSystem 1. Londres, Academic Press.
 
______________ . (1980), The Modern World-System I I. Londres, Academic Press.
 
WEBER, Eugen. (1976), Peasants into Frenchmen: the Modernization of Rural France, 1870 - 1914. Stanford, Stanford University Press.
 
WEBER, Max (1948), “Science as a Vocation”, in H.H. Gerth & C. Wright Mills (orgs.), From Max Weber: Londres, Routledge.
 
WELSCH, W. (1996), “A estheticization Processes: Phenomena, Distinctions and Prospecta”. Theory, Culture and Society 13, 1.
 
WOLFF, Eric R. (1990), “Distinguished Lecture: Facing Power - Old Insights, New Questiona”. American Anthropologist 92, 3.
 
ZOLBERG, A. (1995), “The Great Wall Against China: Responses to the First Immigration Crisis, 1885-1925”, in W. Gungwu (org.), Global
History anti Migrations. Boulder, CO, Westview Press, no prelo.
 

Você também pode gostar