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CIPPUS (ISSN2238-9032)

http://revistas.unilasalle.edu.br/index.php/cippus
Canoas, v. 6, n. 1, 2018

GESTÃO DE CONFLITOS TRABALHISTAS: SOLUÇÕES E PROBLEMAS POR


TRÁS DOS MÉTODOS ALTERNATIVOS DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS

Ariel de Jesus Silva1


[email protected]
Maria Carolina Padovani2
[email protected]

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

RESUMO: O presente estudo busca compreender os institutos de mediação, conciliação e arbitragem


C
I
em relação às suas peculiaridades na aplicação à Justiça do Trabalho, estabelecendo análise crítica dos
pontos positivos e negativos em vista às particularidades deste ramo do Direito. Essa temática é de suma
importância, pois estabelece formas de aprimoramento e modernização do sistema judiciário brasileiro,
mas que podem resultar em restrições aos direitos de uma classe de indivíduos altamente vulneráveis. Para
tanto, ter-se-á como base a pesquisa bibliográfica e em bancos de dados digitais a fim de compreender a

P
tratativa dada a estes institutos pela legislação, jurisprudência e doutrina nacionais por meio do método
lógico-dedutivo. Constituindo-se como resultado a identificação de métodos aptos a garantir a disposição
constitucional de acesso à jurisdição e celeridade, bem como, por outro viés, de situações passíveis de
perpetuar a desigualdade de poderio do empregador em relação ao empregado.
Palavras-chave: Mediação; Arbitragem; Conciliação; Justiça do Trabalho

MANAGEMENT OF LABOR CONFLICTS: SOLUTIONS AND PROBLEMS


BEHIND THE ALTERNATIVE METHODS OF DEMANDS RESOLUTION
P
ABSTRACT: The present study seeks comprehension of the institutes of mediation, conciliation and
arbitration in relation to its peculiarities in the application to the Labor Justice, stablishing a critical
analysis of the positive and negative points in view of the particularities of this branch of Law. These
matter are of great importance for the ways of improving and modernizing the Brazilian judicial system,
U
S
but also may result in restrictions on the rights of a highly vulnerable class of people. In order to do so, it
will be based on bibliographical research and digital databases to comprehend the way that the legislation,
doctrine and jurisprudence treats the theme, through the logical-deductive method. As a result, there is
an identification of methods able to guarantee a constitutional determination of access to jurisdiction and
celerity, as well as, on the other hand, ways to perpetuate the inequality of the employer power over the
(ISSN2238-9032)
employee.
Keywords: Mediation; Arbitration; Conciliation; Labor Justice

1 Especialista em Direito Administrativo pela Universidade Cândido Mendes (UCAM/RJ). Membro do grupo
de estudos “Trabalho Digno e Desenvolvimento Tecnológico”, vinculado ao Curso de Direito da Universidade
Federal de Mato Grosso do Sul campus Três Lagoas (UFMS/CPTL).
2 Graduanda em Direito pela Univerisdade Federal de Mato Grosso do Sul.
Silva, Pandovani 36

1 INTRODUÇÃO

O presente estudo, calcado em pesquisa bibliográfica na doutrina, legislação e jurisprudência


nacional, busca traçar um panorama dos métodos alternativos de gestão de conflitos na Justiça do Trabalho.
Dar-se-á especial enfoque às comissões de conciliação prévia, à mediação e à arbitragem. Também serão
analisadas as especificidades, divergências e convergências da aplicação destes institutos na área trabalhista
em relação às outras áreas do Direito.

A seara trabalhista, como ramo especial do Direito, possui inúmeras peculiaridades em relação à
justiça comum. No que tange aos meios alternativos de gestão de conflito, deve-se ressaltar que os institutos
da conciliação, mediação e arbitragem, embora também integrem a justiça comum (não existindo nesta a
figura específica das comissões de conciliação prévia), possuem especificidades quando aplicados à área
trabalhista.

Sobre a conceituação dos institutos em destaque, pode-se dizer que constituem métodos de gestão
de conflitos substitutos ao processo judicial. E, embora não sejam a via mais comum, estão disponíveis em
nosso ordenamento jurídico como alternativa extremamente viável devido as suas vantagens em relação ao
moroso processo judicial.

Em suma, estes meios buscam a solução do litígio com uma participação maior das partes e sem
uma dependência tão grande do judiciário. Embora se tratem de meios de gestão heterocompositivos
(determinado por terceiros), demonstram grande progresso no que tange ao respeito à autonomia das partes,
pois valorizam o diálogo entre as mesmas.

A busca da conciliação é inerente à Justiça do Trabalho brasileira desde o início do século passado,
com os Conselhos Permanentes de Conciliação e Arbitragem (1907). Porém, mesmo com o passar do tempo
e aprimoramento do Poder Judiciário, a preocupação com a conciliação persistiu, tornando-se essencial no
âmbito trabalhista e chegando a constituir fase obrigatória no processo judicial.

Os meios alternativos ao processo judicial fazem parte da dicção constitucional garantista à qual o
ordenamento jurídico brasileiro está subordinado. Desta forma, o processo do trabalho e seus institutos de
solução alternativa da lide são essenciais para ampliar o acesso à justiça e garantir a celeridade processual.
Podendo, segundo a vertente filosófica que apregoa a adoção do bloco de constitucionalidade, constituir um
direito fundamental.

Logo, pode-se dizer que se trata de tema de grande importância no direito do trabalho, pois abarca
questões constitucionais de direitos fundamentais. Assim, como o tema apresenta grande relevo social, é
imprescindível estabelecer os parâmetros de sua aplicação ao processo trabalhista.

2 ALGO SOBRE A GESTÃO DE CONFLITOS TRABALHISTAS

Tendo como pressuposto que as controvérsias são inerentes à vida e que o Direito, de forma geral,
busca a solução destes entraves, é possível afirmar que, no que tange ao Direito Processual do Trabalho, o
principal foco é a solução dos conflitos trabalhistas e não meramente o atendimento às regras processuais.
Para tanto, no desenvolvimento deste ramo do Direito, surgiram formas específicas adaptadas às relações
laborais.

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A solução dos conflitos trabalhistas é tema bastante estudado pela doutrina nacional e, malgrado
haja certa divergência de abordagens, pode-se classificar os tipos de solução de conflitos em autodefesa,
autocomposição e heterocomposição.

A autodefesa constitui uma forma de solução na qual os próprios interessados, segundo seu
entendimento e, em regra, sem interferência de terceiros, atuam para solver a divergência de interesses. As
formas mais conhecidas de autodefesa no âmbito trabalhista são a greve e o lockout, mas o poder de disciplina
do empregador e a autotutela sindical também constam no rol de métodos de autodefesa (NASCIMENTO,
2013, p. 40). Pode-se compreender, portanto, que a autodefesa é o meio pelo qual o conflito é solucionado
pelas próprias partes litigantes com a sobreposição dos interesses de uma delas, o que nem sempre é tolerado
pelo ordenamento jurídico.

Nesse sentido, vislumbra-se a proibição genérica do exercício arbitrário das próprias razões e com
o fato de o Estado ser o único passível de exercer coerção sobre alguém para cumprimento de obrigações
(MARTINS, 2012, p. 857). Desta forma, malgrado esta possa parecer uma ferramenta simples, este tipo de
método guarda controvérsias.

No que tange a greve, o legislador constituinte sabiamente concedeu exceção à regra proibitiva de
autotutela e a dispôs como direito social, assegurando “o direito de greve, competindo aos trabalhadores
decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender” (BRASIL,
1988, CF, art.9). Assim, sobremaneira demonstrada que, para utilização da autodefesa, é necessária
autorização normativa.

O lockout, em suma, refere-se à uma paralisação por parte do empregador na qual este impede
seus empregados de exercerem suas atividades, visando “frustrar negociação ou dificultar o atendimento de
reivindicações” destes (BRASIL, 1989, L.7.783, art. 17). Em tese, apesar da diferença social existente entre
empregado e empregador, constitui a mesma forma de solução de conflitos que a greve. No entanto, foi
defeso pela legislação nacional no mesmo texto que regulamenta o exercício da greve.

Desta forma, é possível determinar que a adoção deste tipo de método é limitada, haja vista sua total
dependência do reconhecimento pela esfera legislativa para ser considerada legítima. Ademais, consideradas
as limitações de articulação por parte dos empregados e a concentração de poder do empregador que pode
gerar sanções indiretas posteriormente, verifica-se a incompatibilidade deste instituto para solução eficaz e
harmoniosa dos conflitos trabalhistas.

A autocomposição é caracterizada pela participação das duas partes envolvidas no conflito (MARTINS,
2012, p. 857). As técnicas autocompositivas podem, ainda, ser subdivididas em unilaterais, quando apenas
uma parte renuncia sua pretensão, ou bilaterais, quando há renúncias de ambas as partes. As principais
formas autocompositivas no ordenamento jurídico trabalhista brasileiro são as convenções e acordos
coletivos, ambas previstas na Constituição de 1988 (BRASIL, 1988, CF, arts. 7º, XXVI, VI e XIII, e 8º, VI).
Segundo entendimento doutrinário, trata-se de negociação realizada diretamente pelas partes envolvidas, na
qual, por meio do diálogo, sanam-se os conflitos.

Os acordos coletivos derivam de negociação feita entre sindicato representante dos empregados
e uma ou mais empresas, e são dotados de eficácia inter partes, limitando-se aos participantes.
Enquanto as convenções são celebradas pelos sindicatos representantes das duas classes (empregados e
empregadores) e têm eficácia erga omnes, ou seja, para todos os representados daquele setor econômico

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(MARTINS, 2012, p. 857). Assim, pode-se considerar que se trata de um meio de gestão de conflitos
altamente recomendável por embasar a solução no diálogo direto entre as partes.

No entanto, apesar de todo mérito que carregam tais institutos, sua aplicação envolve questões
problemáticas, dentre as quais está a unidade sindical. Isso porque ela dificulta o estabelecimento de
negociações mais democráticas, por limitar a criação de apenas um sindicato representativo de uma categoria
em determinada base territorial.

Ademais, este tipo de solução é incompatível com os dissídios individuais (maior causa de lentidão da
justiça trabalhista). Ou seja, apesar da importância deste meio como forma de negociação e da independência,
relativa, do judiciário, ainda existem desafios a serem superados para sua aplicação com maior eficácia.

Em contrapartida, a heterocomposição se configura com a participação de um terceiro, alheio ao


conflito em análise, que auxilia na administração da solução da controvérsia. Esta técnica é a mais difundida
forma de gestão de conflitos porque abarca em suas acepções o popular processo judicial.

Para Amauri Mascaro Nascimento, é possível observar que este tipo de solução de conflito, via de
regra, se mostra o mais adequado, haja vista a maior sensação de segurança quando a parte que gere o conflito
é imparcial (NASCIMENTO, 2013). No entanto, o Estado não deve ser o único apto a executar esta função,
vez que o dinamismo das relações sociais, inclusive, das de trabalho e emprego, exige uma flexibilidade que
o processo judicial ainda não dispõe.

Dentre outras formas heterocompositivas estão a mediação, as comissões de conciliação prévia e a


arbitragem. Estas formas alternativas de gestão de conflitos unem a valorização da participação das partes
à imparcialidade da atuação de um terceiro alheio ao conflito. Logo, sua adoção, em geral, além de garantir
maior celeridade que o processo judicial, propicia harmonização de teses e não de imposições coercitivas.

3 MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO COMO ALTERNATIVAS VIÁVEIS À RESOLUÇÃO DE DE-


MANDAS TRABALHISTAS

A mediação é a forma de gestão de conflitos pela qual um terceiro alheio ao conflito, porém
convocado pelas partes, administra a negociação realizada por elas, de acordo com as propostas expostas,
sem poder coercitivo para impor seu entendimento.

Este instituto é trabalhado tanto pela justiça comum quanto pela trabalhista e já foi apreciado pela
doutrina e jurisprudência nacionais. No que tange à área trabalhista, é válido ressaltar que, embora nesta
seara jurídica exista uma especial preocupação com a oralidade, informalidade e com uma simplificação
geral do processo, persiste uma divergência quanto a sua aplicabilidade.

Conforme aponta Paumgartten, esta problemática sobre a aplicabilidade da mediação ao conflito


trabalhista tem origem em uma omissão legislativa, pois o legislador pátrio não fez opção expressa pela adoção
desta técnica na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Porém, esta omissão, que poderia configurar uma
não recepção ao método da mediação, contrapõe-se à não vedação pelo texto constitucional de 1988 e à
aplicação subsidiária dos procedimentos da justiça comum (PAUMGARTTEN, 2014, p.420). Desta forma
haveria lacuna para a aplicação do método na seara trabalhista, o que acarretaria numa necessidade da
atuação hermenêutica.

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De acordo Amauri Mascaro do Nascimento, é possível verificar que a simplicidade deste instituto
é totalmente compatível e indicada às soluções de conflitos trabalhistas. Podendo ser caracterizada como
“composição dos conflitos caracterizada pela participação de um terceiro, suprapartes, o mediador, cuja
função é ouvir os litigantes e formular propostas” (NASCIMENTO, 2013, p. 50). No tocante ao aparato
normativo brasileiro, a mediação possui ampla abordagem. Malgrado não exista previsão constitucional
afirmando ou negando-a, é inconteste sua associação a todos os direitos fundamentais ligados ao acesso à
justiça.

Em consonância a este instituto, o Conselho Nacional de Justiça dispõe que compete ao judiciário
“oferecer mecanismos de soluções de controvérsias, em especial os chamados meios consensuais, como a
mediação e a conciliação, bem assim prestar atendimento e orientação ao cidadão” (BRASIL, CNJ, 2010, art.
1º, parágrafo único). Atualmente, a mediação nos conflitos trabalhistas está regulamentada no Decreto nº
1.725 de 1995. Dentre outras disposições, o referido diploma traz a necessidade de indicação, pelas partes,
de um mediador para atuação no conflito. Todavia, também permite que, quando houver impossibilidade de
indicação, as próprias partes, de comum acordo, solicitem ao Ministério do Trabalho que o faça.

Demonstrando a necessidade de adaptação deste procedimento à área trabalhista, o legislador se


preocupou com a hipótese de uma relação não equânime na escolha do mediador. Conforme o texto legal, “a
parte que se considerar sem as condições adequadas para, em situação de equilíbrio, participar de negociação
direta, poderá, desde logo, solicitar ao Ministério do Trabalho a designação de mediador” (BRASIL, 1995, D.
1.572, art. 2º, § 2). Nota-se uma convergência entre a mediação e o princípio protetor que busca neutralizar
a diferença social entre empregado e empregador. Por meio deste princípio, a justiça trabalhista concede
direitos materiais específicos ao empregado, tendo em vista sua condição de dependência e hipossuficiência
em relação ao empregador, favorecendo-o nos meios de acesso ao judiciário.

Logo, sob esta perspectiva, a mediação se torna uma ferramenta importante na aplicação das
garantias ligadas ao pleno acesso à justiça. Podendo ser considerada tanto um meio de auxílio ao judiciário,
esmiuçando o número de demandas, como também um método com potencial para ser aplicado como
solução autônoma, podendo inclusive ser mais efetivo e produtivo que o processo, haja vista a valorização do
diálogo para composição da resposta.

Para Amauri Mascaro Nascimento, trata-se da “prévia ao ingresso da ação no Judiciário, sendo via de
regra colegiada por um órgão com atribuições para esse fim, que é sindical ou não” (NACIMENTO, 2014, p.
48). Nota-se que a conciliação, em sentido amplo, refere-se à deliberação mútua das partes envolvidas para
a solução da lide. Esta característica a torna passível de ser classificada como método de solução de conflito
autocompositivo.

Malgrado o referido posicionamento tenha validade, a perspectiva apresentada por Sérgio Pinto
Martins é mais adequada para apreciação do instituto em tela. Isto posto, a conciliação, em si, é um termo
abstrato, podendo integrar quaisquer das outras formas de gestão de conflito, bem como se colocar como
corolário de algumas delas.

Embora possua acepção ampla e, nas vias fáticas, constitua uma parte fundamental do processo
judicial trabalhista, este estudo focará em apenas uma das vertentes da conciliação, a comissão de conciliação
prévia.

Trata-se de método trabalhado pela própria CLT, no artigo 625-A ao 625-H, no qual a solução dos

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conflitos individuais é resolvida por representação paritária. Nesta forma de gestão de conflitos, os sindicatos
e as empresas têm a faculdade de instituí-la, de acordo com sua livre autonomia (MARTINS, 2012, p. 859). O
procedimento não é obrigatório, mas a opção de realizá-lo busca concretizar a igualdade material.

Segundo o texto da lei:


As empresas e os sindicatos podem instituir Comissões de Conciliação Prévia, de composição
paritária, com representante dos empregados e dos empregadores, com a atribuição de tentar
conciliar os conflitos individuais do trabalho. Parágrafo único. As Comissões referidas no
caput deste artigo poderão ser constituídas por grupos de empresas ou ter caráter intersindical
(BRASIL, 1943, CLT, art. 625-A).

A respeito da composição desta comissão, é válido mencionar que, além da paridade, há critérios
de estabilidade para os membros, visando inibir práticas coercitivas por parte do empregador. O número de
participantes deve ser de, no mínimo 2 e, no máximo 10 (BRASIL, 1943, CLT, art. 625-B). Demonstrando
que busca resguardar os direitos dos trabalhadores.

No entanto, o capítulo que trata das referidas comissões apresenta uma problemática no que tange ao
acesso à justiça. Isso porque, para incentivar a utilização desta ferramenta e desafogar o judiciário, o diploma
prevê que “qualquer demanda de natureza trabalhista será submetida à Comissão de Conciliação Prévia
se, na localidade da prestação de serviços, houver sido instituída a Comissão no âmbito da empresa ou do
sindicato da categoria” (BRASIL, 1943, CLT, art. 625-D). O entendimento literal deste artigo poderia levar a
uma limitação desarrazoada do acesso à justiça, sobretudo por parte do empregado. Tornando a Comissão
de Conciliação Prévia etapa obrigatória e o processo judicial subsidiário a ela, poderia se obstar o acesso à
justiça ou torná-lo mais moroso, o que vai de encontro às disposições humanitárias e garantistas de nossa
Constituição.

Sob este prisma, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao se deparar com a questão, compreendeu não
haver tal obrigatoriedade. O tema foi o cerne da ADI 2.160 e ADI 2.139. A decisão, dada por maioria e em
caráter liminar, reconheceu que a exigência feita pelo legislador mais limita do que facilita o acesso à justiça.

Cabe ressaltar que, para o ministro Cezar Peluso, a posição adotada pela Corte caminha na
contramão da história, pois, em outros Estados, a condição de recorrer a outras formas de solução da lide
antes de adentrar o sistema judiciário é entendida como meio de incentivo às formas alternativas de gestão
de conflitos.

Embora ambos os posicionamentos tenham validade, a tese apresentada por Peluso se mostra fraca,
diante da condição de subsidiariedade tida como absoluta, uma vez que a Justiça do Trabalho lida com
relações não equânimes e das quais dependem uma série de direitos fundamentais básicos, ligados, em
muitos casos, à subsistência do indivíduo.

Logo, consideradas tais peculiaridades da seara trabalhista, põe-se, como corolário desta proposição,
um entrave desnecessário para se obter o processo judicial nos casos em ele possa ser a via mais indicada.
Afinal, o objetivo dos métodos alternativos não é suprimir a atuação do judiciário, mas aprimorá-la e
modernizá-la. Por isso, estes métodos devem ser compreendidos como direito e não como dever.

Para tanto, faz-se mister o incentivo às formas alternativas de gestão de conflitos no ordenamento
jurídico brasileiro, bem como a sua implementação e a produção científica a seu respeito. O objetivo não
deve ser substituir autoritariamente as formas existentes de gestão de conflito, mas complementar, tornando-
as mais céleres e eficazes, oferecendo, e não impondo, maneiras mais adequadas.

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4 ARBITRAGEM: A FERRAMENTA DE SOLUÇÃO EM PROL DO PATRONATO

Por fim, a arbitragem é um dos métodos de gestão de conflitos disponíveis em nosso ordenamento
jurídico. Trata-se, numa análise sucinta, de uma variação da atividade jurisdicional do Estado na qual as
partes, baseadas no princípio da autonomia da vontade, escolhem terceiro que mediará possíveis conflitos
advindos da relação jurídica em questão.

Em nosso arcabouço legislativo, as disposições específicas a respeito do tema estão, em maior parte,
na Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996. No entanto, já havia previsão constitucional sobre sua aplicação:
Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às
mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a
Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção
ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente (BRASIL, CF, 1988, art. 114, § 2º).

Apesar de a tratativa legal referida ser relativamente nova, o instituto da arbitragem se faz presente
nas sociedades organizadas desde as sociedades antigas.

Segundo Morgana de Almeida Richa em obra conjunta com Antonio Cezar Peluso, a utilização
desta técnica é muito anterior às modernas aplicações do Direito, por volta de 3.000 a. C, época em que se
destinava às tratativas comerciais.

No Brasil, sua presença é ainda de maior importância, tendo em vista o Tratado de Tordesilhas,
documento destinado a solucionar o conflito sobre a propriedade das terras latino-americanas recém-
descobertas, que foi alvo de justiça arbitral, tendo como árbitro, para a divisão das terras entre Portugal
e Espanha, o Papa Alexandre VI, em 1494 (PELUSO e RICHA, 2011, p.164). Constata-se, assim, que o
instituto da arbitragem é tido como equivalente jurisdicional, ou seja, embora tenha participação das partes
envolvidas para ter validade (caráter autocompositivo), há de se levar em conta que o árbitro selecionado terá
característica suprapartes, ou seja, a decisão será impositiva (caráter heterocompositivo).

Trata-se de mecanismo autônomo de gestão de conflitos, dependente da vontade das partes,


com previsão e amparo legal e constitucional, que busca solucionar conflitos de uma relação de natureza
patrimonial, cuja externalização das vontades o tenha previsto. As partes envolvidas na relação jurídica
dotam um terceiro de poder para solucionar possíveis conflitos.

Conforme as lições de René David, tomadas por Richa, para suas explanações acerca do tema, pode-
se dizer que arbitragem é:
Técnica que visa dar solução de questão interessando às relações entre duas ou várias pessoas,
por uma ou mais pessoas - o árbitro ou os árbitros - as quais têm poderes resultantes de
convenção privada e decidem, com base nessa convenção, sem estar investidos dessa missão
pelo Estado (DAVID apud RICHA, 2011, p. 168).

Para Amauri Mascaro Nascimento, cabem ainda algumas classificações sobre o tema. Quais sejam:
Primeiramente, quanto à obrigatoriedade, esta classificação pode ser subdividida em
Facultativa e privada ou Obrigatória e oficial (NASCIMENTO, 2013, p. 50). Logo, a primeira
tem utilização a critério das partes enquanto, na segunda, o Estado a aproxima de sua atividade
jurisdicional tornando-a obrigatória.
Também pode ser feita divisão quanto ao procedimento. Sob esta análise há o tipo “Por oferta
final” e o tipo “Livre” (NASCIMENTO, 2013, p. 50). Em ambos as decisões são tomadas pelo
árbitro, porém as características distintivas são, sucessivamente, possibilidades de decisão
previamente estabelecidas pelas partes e autonomia para fazer suas determinações, não

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estando, necessariamente, vinculado a algo predeterminado.


Ademais, difere-se ainda quanto à pessoa do árbitro que pode ser Unipessoal ou Colegiado
(NASCIMENTO, 2013, p. 50). Sob esta perspectiva pode haver um único indivíduo - seja
pessoa natural ou jurídica; ou pluralidade de pessoas - como em um tribunal.
Por fim, há a divisão quanto à natureza das questões apreciadas, pode se ser “De Direito” ou “De
Equidade” (NASCIMENTO, 2013, p. 50). Nesta, resolvem-se interesses e não necessariamente
direitos. Já naquelas, a solução é dada face à interpretação normativa (o mais indicado nestes
casos é o próprio Poder Judiciário).

Conforme assevera Nascimento, acompanhado da maioria quase uníssona da doutrina pátria, a


arbitragem desafoga o judiciário e aparenta ser mais democrática, pois leva em conta a vontade das partes na
escolha do árbitro e, ainda, “(...) pode ser mais ampla e célere (que a jurisdição estatal) na medida em que não
comporta recursos” (NASCIMENTO, 2013, p. 54). Assim, a justiça arbitral, quanto a sua aplicação na justiça
comum, é um meio de extrema importância para gestão de conflitos jurídicos.

No entanto, em disparidade aos benefícios mencionados, sua utilização no âmbito trabalhista suscita
receios e problemáticas, sobretudo quando contrapomos o princípio da autonomia da vontade (aplicado
com maior relevo pela seara civil do Direito) com o princípio protetor (especificidade da seara trabalhista).

A justiça arbitral, desde sua origem, vincula-se especialmente aos direitos de cunho patrimonial, dos
quais as partes podem dispor de acordo com seus interesses. Quando se leva em consideração que o processo
trabalhista lida, na maior parte das vezes, com direitos indisponíveis, pode-se notar uma incompatibilidade
entre o sistema arbitral e os direitos laborais.

Certo é que, os níveis de autonomia das partes expostos em um contrato regido pelo Código Civil,
por exemplo, têm poucas semelhanças com os pactos laborais regidos pela CLT, posto que, no primeiro
caso, se pressupõe certa equidade entre as partes para celebração do negócio jurídico. Logo, sob a égide do
brocardo “pacta sunt servanda”, o contrato faz lei entre as partes, sendo legítimo que elas possam escolher a
forma como se resolverão os conflitos posteriores decorrentes deste contrato.

Por outro lado, o pacto laboral infere numa relação de hipossuficiência do trabalhador. A doutrina
entende que a relação de emprego, regulada pela CLT, carece de requisitos, dentre os quais figuram a
dependência e a submissão (do empregado em relação ao seu respectivo empregador). A desigualdade é
requisito necessário, dado pré-concebido, cabendo ao Estado dispor de meios que o equiparem, protegendo,
na medida do necessário, o trabalhador de relações que possam suprimir seus direitos.

Vale destacar que o Tribunal Superior do Trabalho (TST) noticiou que o trabalhador tem o direito a
recorrer à Justiça do Trabalho mesmo quando tenha assinado a cláusula em que se compromete a resolver os
litígios na arbitragem, por esta estar em conflito com o direito individual do trabalho. Vejamos:
Todo o trabalhador tem direito a recorrer à Justiça do Trabalho mesmo que tenha assinado
cláusula se comprometendo a submeter possíveis litígios à arbitragem. Para os ministros da
Oitava Turma, a arbitragem não opera efeitos jurídicos no âmbito do Direito Individual do
Trabalho. Um trabalhador da Brazil Properties S/C Ltda ajuizou ação trabalhista pedindo
o reconhecimento de relação de trabalho. Mas o juízo de origem extinguiu o processo sem
resolução do mérito porque no contrato de prestação de serviços assinado pelo autor havia
uma cláusula compromissória estabelecendo que as partes se submeteriam à arbitragem sobre
possíveis querelas decorrentes dos serviços prestados. O trabalhador recorreu ao Tribunal
Regional do Trabalho do Ceará que afastou a extinção do processo e determinou que os autos
fossem julgados pela Vara do Trabalho. (BRASIL. TST. Arbitragem é incompatível com o
direito do trabalho afirmam ministros. 2015. Disponível em <http://www.tst.jus.br/noticias/-/

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asset_publisher/89Dk/content/turma-considera-invalido-acordo-firmado-em-tribunal-
arbitral-obre-verbas-rescisorias >).

Ademais, esta mesma Corte, ao julgar agravo interposto por empresas do mesmo grupo econômico,
demonstrou a invalidade deste instituto, mesmo antes do implemento da condição estabelecida na justiça
arbitral. A decisão considerou inválido o acordo individual de trabalho, firmado pelo trabalhador no Tribunal
Arbitral, em que dava a quitação das verbas rescisórias:
A empresa alegava que o gráfico foi por livre espontânea vontade ao juízo arbitral para
solucionar os conflitos trabalhistas entre as duas partes, o que garantiria a legalidade ao ato
jurídico. Os ministros do TST, porém, mantiveram decisão do Tribunal Regional do Trabalho
da 2ª Região (SP), que considerou nulo o termo de decisão arbitral por entender que a empresa
“se valeu de forma inapropriada da arbitragem para efetuar o pagamento das verbas rescisórias”.
Para o Regional, “o Juízo Arbitral não se aplica aos contratos individuais de trabalho, porque
neles estão garantidos direitos indisponíveis, não havendo falar que a ausência de vício de
consentimento convalida o ato” (BRASIL. TST. AIRR Nº 248400-43.2009.5.02.0203, rel. min.
Alexandre de Souza Agra Belmonte. 2015).

Desta forma, pode-se deduzir que este instituto tem muitas ressalvas a serem consideradas quando se
volta para a lide trabalhista. Com base nos princípios norteadores do direito do trabalho e no posicionamento
jurisprudencial dos tribunais superiores, torna-se perceptível a incompatibilidade da arbitragem com a seara
trabalhista, não devendo ser considerada opção para solução de conflitos no pacto laboral individual.

5 CONCLUSÃO

Pode-se dizer que a utilização dos métodos alternativos de gestão de conflitos é de suma importância
para uma revitalização do sistema judiciário e do Direito em si, tendo em vista a massificação da cultura que
entende o Direito como forma de oficializar o conflito e não de solvê-lo.

Ademais, os benefícios proporcionados não se limitam ao judiciário, afetando a sociedade como um


todo, pois possibilita uma solução dos conflitos com participação das partes, reduzindo a necessidade de
atuação estatal e promovendo uma economia para a máquina pública.

No que tange a sua aplicação na justiça trabalhista, faz-se necessário uma ressalva, haja vista a
necessidade de igualdade entre as partes que alguns dos institutos demandam. A escolha do árbitro, por
exemplo, é resultado da combinação de vontades dos envolvido. Logo, quando se tem uma parte com mais
poder (empregador) e outra submissa a este poder (empregado), as bases deste instituto se corrompem,
tornando-o não recomendável e prejudicial à efetivação da justiça.

No entanto, este impasse não deve obstar a adoção destas práticas como um todo, pelo contrário,
deve servir de fomento para que, no plano fático, a sua aplicação se adeque cada vez mais às especificidades
da seara trabalhista.

Logo, pode-se concluir que, pelas vantagens obtidas com a utilização dos métodos alternativos de
gestão de conflitos, existem nestes institutos não apenas meios de solução da lide, mas direitos que devem ser
garantidos e ampliados diante da importância na construção e acesso a outros direitos fundamentais.

REVISTA CIPPUS – UNILASALLE Canoas/RS ISSN: 2238-9032 v. 6 n. 1 maio/2018


Silva, Pandovani 44

REFERÊNCIAS
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