ROCHA, Sergio Andre. Interpretacao Dos Tratados para Evitar A Bitributacao Da Renda
ROCHA, Sergio Andre. Interpretacao Dos Tratados para Evitar A Bitributacao Da Renda
ROCHA, Sergio Andre. Interpretacao Dos Tratados para Evitar A Bitributacao Da Renda
2ª EDIÇÃO
2ª EDIÇÃO
ISBN 85-7674-648-4
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INTRODUÇÃO, 23
1
AS CDTRS:
Evolução Histórica, Natureza Jurídica, Posição Hierárquica
no Ordenamento Jurídico Brasileiro, Qualificação como
Normas Especiais de Tributação e Objetivos, 39
2
BASES HERMENÊUTICAS DA PRESENTE PESQUISA, 91
3
INTERPRETAÇÃO DOS TRATADOS E SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS
NO DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO, 131
4
A QUESTÃO DAS QUALIFICAÇÕES NA TEORIA GERAL DO
DIREITO E NO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO, 171
6
A QUESTÃO DAS QUALIFICAÇÕES NO ÂMBITO DAS CDTRS, 229
7
A QUEBRA DO TRATADO PELA INTERPRETAÇÃO:
Os Casos Brasileiros da Tributação das Remessas ao
Exterior Decorrentes da Prestação de Serviços sem
Transferência de Tecnologia e Aquelas Recebidas por
Residentes Brasileiros de ETVEs Espanholas, 245
8
INSTRUMENTOS PARA A SOLUÇÃO DE DIVERGÊNCIAS
HERMENÊUTICAS NO CAMPO DAS CDTRS, 259
CONCLUSÃO, 297
PREFÁCIO
É surpreendente e, ao mesmo tempo, muito gratificante observar que
minha tese de doutorado sobre a “Interpretação e Aplicação dos Acordos Interna-
cionais contra a Bitributação”, defendida (e aprovada!) há quase 30 anos na
Faculdade de Direito da USP, continua sendo consultada e citada pelos tribu-
taristas pátrios, que se aventuram explorar este campo tão complexo do já difícil
Direito Tributário. E agora até me trouxe a alegria de prefaciar a brilhante tese
de doutorado, apresentada pelo tributarista Sergio André Rocha na UGF sobre
a mesma temática.
A obra de Sergio André, baseada em vasta bibliografia nacional e
internacional, representa um estudo sistemático dos acordos contra a
bitributação internacional e de sua interpretação. Inicia sua exposição com
a evolução histórica, natureza jurídica, posição hierárquica e objetivos dos
acordos internacionais, que o Autor prefere denominar de “Convenções para
Evitar a Dupla Tributação da Renda”, cuja sigla “CDTRS” passo a adotar neste
prefácio. Com clareza e segurança, o Autor examina os conceitos envolvidos
e as divergências existentes em relação à matéria, apresentando sempre sua
opinião pessoal, devidamente fundamentada.
Depois das noções propedêuticas, o Autor entra no estudo da interpretação
das CDTRS com sua problemática específica: regras de interpretação, as
qualificações, o conceito de “contexto”, os comentários à Convenção-Modelo
da OCDE, os “parallel treaties”, o “new approach” e outras questões relacionadas
com a interpretação e aplicação das CDTRS. Diante das divergências existentes
na doutrina, o Autor se posiciona de maneira coerente, mesmo quando contraria
a opinião dominante.
A presente obra serve, pois, tanto como introdução aos iniciantes nesta
matéria, como convida à reflexão aqueles com ela familiarizados. Para mim
pessoalmente, representou um estímulo para reexaminar minhas próprias
conclusões sobre os “velhos e sempre novos” problemas das CDTRS e as
questões e colocações mais recentes. Como prova disso, quero apresentar alguns
exemplos de assuntos controvertidos, que me chamaram atenção.
aos impostos visados. Na opinião de Michael Lang, isto impede que as CDTRS
sejam consideradas como meios genéricos de prevenção da bitributação e que,
portanto, sejam aplicadas genericamente. Para decidir se a CDTR deva ser
aplicada ou não a determinado caso, o interprete não pode, pois, partir da
máxima de interpretação no sentido de que as CDTRS sempre devam eliminar
a bitributação, de qualquer maneira.
Seguindo esta linha de raciocínio, não posso aceitar a caracterização
das CDTRS como concretização de um “princípio da não bitributação
internacional”, que possa servir como princípio genérico ou máxima apriorística,
a ser observada na interpretação da CDTRS.
Além disso, concordo perfeitamente que a problemática da dupla não
tributação, da qual Vogel distingue a dupla isenção, não se inclui entre os
objetivos das CDTRS, pois nem sempre a dupla não tributação constitui uma
consequência de desarmonia hermenêutica no campo das CDTRS.
Ainda conforme Michael Lang, citado por Sergio André, os métodos de
isenção e do crédito previstos nas CDTRS, combinados com a legislação interna
dos estados contratantes, podem levar à dupla não tributação, sem que isto
constitua uma violação das CDTRS. Daí conclui Lang, que não há nenhuma
base para supor a existência uma máxima de interpretação no sentido de que
as CDTRS sempre devam ser interpretadas de tal forma, que não deixem os
rendimentos sem tributação.
Também Vogel considera completamente normal que um estado con-
tratante não faz uso da competência que lhe foi atribuída pela CDTR e que,
assim, nenhum dos dois estados tributa o rendimento.
Se a finalidade precípua das CDTRS consiste, pois, na segurança jurídica e
na repartição das receitas tributárias, objetivos esses que as medidas unilaterais dos
estados, por natureza, não conseguem alcançar, isto, evidentemente, tem reflexos
importantíssimos sobre sua interpretação, que é eminentemente teleológica.
1 Como alerta Adilson Rodrigues Pires, “hoje, no mundo, não existe economia fechada. A produção
de cada país não é suficiente para satisfazer as necessidades básicas de consumo da população.
Essa é a razão pela qual o comércio exterior é matéria de interesse geral e o sistema de trocas
internacionais uma preocupação de todos. A cada dia são celebrados acordos visando o
intercâmbio de bens e serviços, novos blocos econômicos são criados e os interesses dos países
já não mais são vistos como um interesse particular, mas de todos” (PIRES, Adilson Rodrigues.
Práticas Abusivas no Comércio Internacional. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 19).
2 Segundo Gerd Willi Rothmann, “no Direito Tributário Internacional, a expressão ‘elemento
de conexão’ refere-se a determinado evento, a partir do qual a norma vincula a atribuição da
competência tributária a determinado Estado. Deixando de lado a nacionalidade, que caiu em
desuso (praticamente só é adotado pelos Estados Unidos, Filipinas e Turquia), os principais
elementos de conexão são: domicílio e residência, sede e direção, estabelecimento permanente,
situação do bem, fonte do rendimento, país de origem ou do destino” (ROTHMANN, Gerd Willi.
Tributação Internacional sem Sujeito Passivo: uma Nova Modalidade do Imposto de Renda sobre
Ganhos de Capital? In: ROCHA, Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes Questões Atuais do Direito
Tributário – 10º Volume. São Paulo: Dialética, 2006. p. 110). Sobre necessidade da existência de um
elemento de conexão para a legitimação da tributação, ver: SCHOUERI, Luís Eduardo. Princípios
no Direito Tributário Internacional: Territorialidade, Fonte e Universalidade. In: FERRAZ, Roberto
(Coord.). Princípios e Limites da Tributação. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 334; LANG, Michael.
Introduction to the Law of Double Taxation Conventions. Wien: Linde, 2010. p. 23.
3 Cf. BÜHLER, Ottmar. Principios de Derecho Internacional Tributario. Tradução Fernando Cervera
Torrejon. Madrid: Editorial de Derecho Financiero, 1968. p. 44; XAVIER, Alberto. Direito Tributário
Internacional do Brasil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. pp. 22-23; VOGEL, Klaus. Derecho
Tributario Internacional. In: AMATUCCI, Andrea (Coord.). Tratado de Derecho Tributario. Bogotá:
Themis, 2001. t. I. p. 722-724; HENSEL, Albert. Derecho Tributario. Tradução Leando Stok e Francisco
M. B. Cejas. Rosario: Nova Tesis, 2004. pp. 97 e 98; VILLEGAS, Héctor B. Curso de finanzas, derecho
financiero y tributario. 7. ed. Buenos Aires: Depalma, 1999. p. 483-484; SCHOUERI, Luís Eduardo.
Tratados e Convenções Internacionais sobre Tributação. Revista Direito Tributário Atual, São Paulo,
n. 17, 2003, p. 26; UCKMAR, Victor. Tratados Internacionales en Materia Tributaria. In: AMATUCCI,
Andrea (Coord.). Tratado de Derecho Tributario. Bogotá: Themis, 2001. t. I. pp. 743; SERRANO
ANTÓN, Fernando. Los Principios Básicos de la Fiscalidad Internacional y los Convenios para Evitar
la Doble Imposición Internacional: Historia, Tipos, Fines, Estructura y Aplicación. In: SERRANO
ANTÓN, Fernando (Coord). Fiscalidad Internacional. Madrid: Centros de Estudios Financieros,
2001. p. 96; DAVIES, David R. Principles of International Double Taxation Relief. London: Sweet &
Maxwell, 1985. pp. 1 e 2; PIRES, Manuel. International Juridical Double Taxation of Income. Deventer:
Kluwer Academic Publishers, 1989. pp. 33-34; MOREIRA JÚNIOR, Gilberto de Castro. Bitributação
Internacional e Elementos de Conexão. São Paulo: Aduaneiras, 2003. p. 45; GIL, Jesús Sol. La Doble
Imposición Internacional. In: PISTONE, Pasquale; TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Estudios de
Derecho Tributario Constitucional Internacional: Homenaje Latinoamericano a Victor Uckmar.
Buenos Aires: Editorial Ábaco de Rodolfo Depalma, 2005. pp. 854-855; BORGES, Antônio de
Moura. Considerações Sobre a Dupla Tributação Internacional. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n.
51, out. 2001. Disponível em <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2088>. Acesso em:
02 fev. 2007; BIANCO, João Francisco. Transparência Fiscal Internacional. São Paulo: Dialética,
2007. pp. 140-141.
4 OECD. Model Tax Convention on Income and on Capital. Paris: OECD, 2010. p. 7.
5 Cf. TOSI, Loris; BAGGIO, Roberto. Lineamenti di Diritto Tributario Internazionale. 3. ed. Milano:
CEDAM, 2011. p. 11; VOGEL, Klaus. Introduction. In: VOGEL, Klaus (Coord.). On Double Taxation
Conventions. London: Kluwer Law International, 1997. p. 10; MUNRO, Alastair. Tolley’s Double
Taxation Relief. 6th. ed. London: LexisNexis, 2003. p. 1; ROHATGI, Roy. Basic International Taxation.
2nd. ed. Richmond: Richmond, 2005. p. 2; XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do
Brasil, 2010, p. 24; PIRES, Manuel, International Juridical Double Taxation of Income, 1989, p. 34;
GIL, Jesús Sol, La Doble Imposición Internacional, 2005, pp. 854-855; ROTHMANN, Gerd W.
Bitributação Internacional. In: DÓRIA, Antônio Roberto Sampaio; ROTHMANN, Gerd W. Temas
Fundamentais do Direito Tributário Atual. Belém: CEJUP, 1983. pp. 126-127; GARBARINO, Carlo.
Manuale do Tassazione Internazionale. [S.L.]: IPSOA, 2005. p. 54; GOUTHIÈRE, Bruno. Les Impôts
dans les Affaires Internationales. Paris: Editions Francis Lefebvre, 1989. p. 94. Ao invés de se referir
à distinção entre dupla tributação jurídica e econômica, D. Juch e Gerard Coulombe referem-se
à dupla tributação direta e indireta (Cf. JUCH, D. General Report. In: IFA. Cahiers de Droit Fiscal
International: Unilateral measures to prevent double taxation. Deventer: Kluwer Law International,
1981. v. 66b. p. 15; COULOMBE, Gerard. O Sistema Tributário Canadense e a Eliminação da
Bitributação da Renda. In: TAVOLARO, Agostinho Toffoli; MACHADO, Brandão; MARTINS, Ives
Gandra da Silva (Coords.). Princípios Tributários no Direito Brasileiro e Comparado: Estudos em
Homenagem a Gilberto de Ulhôa Canto. Rio de Janeiro: Forense, 1988. p. 234). Argumentando
ser a teoria da dupla tributação econômica decorrência de equívoco doutrinal, ver: TÔRRES,
Heleno. Pluritributação Internacional sobre as Rendas de Empresas. 2. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2001. pp. 406-408.
identidades, nem sempre se mostra de fácil consecução6. Ainda assim, esta pode
ser considerada a teoria dominante a respeito da matéria.
Como bem pontuou Héctor Villegas, a dupla tributação internacional é
decorrência da utilização de elementos de conexão de natureza distinta para a
atribuição de poder tributário aos diversos Estados, fato que pode ser reconduzido
mesmo aos diferentes papéis pelos mesmos desempenhados no comércio mundial,
se primordialmente importadores ou exportadores de capital7.
Segundo notado por Victor Uckmar, a dupla (ou múltipla)8 tributação
internacional, na medida em que onera as transações vinculadas por elementos
de conexão ao poder tributário de mais de um Estado, tem um efeito inibidor
sobre o comércio internacional, podendo acarretar uma volta dos agentes
internacionais para seus mercados internos9.
Dessa forma, a dupla tributação está na contramão do processo de globa-
lização econômica mundial, sendo um entrave à livre movimentação de bens,
serviços, capital e pessoas10.
6 Cf. XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, p. 23; TÔRRES, Heleno,
Pluritributação Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, pp. 391-392.
7 VILLEGAS, Héctor B., Curso de finanzas, derecho financiero y tributario, 1999, p. 483. Também
destacando a dupla tributação como decorrência da disparidade de princípios utilizados pelos
diversos países: CORASANITI, Giuseppe. La Nozione e Le Cause Della Doppia Imposizione. In:
UCKMAR, Victor et al. Diritto Tributario Internazionale. 2 ed. Milano: CEDAM, 2012. p. 47; DAVIES,
David R., Principles of International Double Taxation Relief, 1985, p. 1; PIRES, Manuel, International
Juridical Double Taxation of Income, 1989, pp. 66-69; ROHATGI, Roy, Basic International Taxation,
2005, p. 14-16; VOGEL, Klaus, Derecho Tributario Internacional, 2001, p. 722; UCKMAR, Victor,
Tratados Internacionales en Materia Tributaria, 2001, p. 743-744; CHRISTIAANSE, Jan H. Recentes
Progressos no Direito Tributário Internacional. In: TAVOLARO, Agostinho Toffoli; MACHADO,
Brandão; MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coords.). Princípios Tributários no Direito Brasileiro
e Comparado: Estudos em Homenagem a Gilberto de Ulhôa Canto. Rio de Janeiro: Forense,
1988. p. 431; DORNELLES, Francisco Oswaldo Neves. Acordos Para Eliminar a Dupla Tributação
da Renda. Revista de Direito Tributário, São Paulo, jan.-mar. 1978, p. 251; FERNANDES, Edison
Carlos. Considerações sobre Planejamento Tributário Internacional. In: PEIXOTO, Marcelo
Magalhães; ANDRADE, José Maria Arruda de (Coords.). Planejamento Tributário. São Paulo: MP
Editora, 2007. pp. 14-15. Sobre o tema, ver: BORRÁS, Alegria. La Doble Imposición: Problemas
Jurídico-Internacionales. Madrid: Instituto de Estudios Fiscales, 1974. pp. 22-24.
8 Embora utilizemos os termos bitributação ou dupla tributação, não desconsideramos que no
mundo globalizado contemporâneo podemos estar diante de situações de pluritributação (ver:
TÔRRES, Heleno, Pluritributação Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, p. 374-375).
9 UCKMAR, Victor, Tratados Internacionales en Materia Tributaria, 2001, p. 744. Ver também:
MUNRO, Alastair, Tolley’s Double Taxation Relief, 2003, p. 2; ROHATGI, Roy, Basic International
Taxation, 2005, p. 2; MOREIRA JÚNIOR, Gilberto de Castro. Bitributação Internacional e Elementos
de Conexão. São Paulo: Aduaneiras, 2003. p. 54; DORNELLES, Francisco Oswaldo Neves, Acordos
Para Eliminar a Dupla Tributação da Renda, 1978, p. 251.
10 Conforme destacam Cassius Vinicius Carvalho e Elidie Palma Bifano, “a dupla incidência de
tributos é um inibidor do progresso econômico, do intercâmbio de tecnologias e do comércio
internacional, pois pode resultar, em algumas situações, na geração de gravames sobre o
próprio capital aplicado. Essas consequências desastrosas, por certo, são um desestímulo à
internacionalização da economia e dos negócios. Considerando a importância do comércio,
17 Devido aos variados propósitos desses tratados, atualmente a OCDE não mais faz referência a
convenções para evitar a dupla tributação da renda, mas sim a convenções sobre a tributação
da renda e do capital.
18 Estudo interessante sobre as convenções brasileiras pode ser encontrado em: VITA, Jonathan
Barros. As Convenções para evitar a Dupla Tributação Brasileiras: Técnicas de Negociação e
Análise Estrutural segundo os Modelos OCDE e ONU. Revista Direito Tributário Atual, São Paulo,
n. 24, 2010, pp. 302-319.
19 Cf. WILLIAMS, David W. General Report. In: IFA. Cahiers de Droit Fiscal International: Practical
issues in the application of double tax conventions. Deventer: Kluwer Law International, 1998.
v. 83b. pp. 23-24.
20 Cf. XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasili, 2010, p. 72. Tendo este fato em
consideração, o presente estudo encontra-se baseado na análise do texto da Convenção Modelo
da OCDE e das CDTRs celebradas pelo Brasil.
21 Ver: XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, pp. 134-167; TÔRRES, Heleno,
Pluritributação Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, pp. 638-662; GONZAGA, Livia Leite
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ESTRUTURA DA TESE
Seguindo essa lógica, no primeiro capítulo deste trabalho serão apresen-
tados comentários gerais sobre as CDTRs, partindo de sua evolução histórica25
e sua natureza jurídica, e examinando a sua inserção no ordenamento jurídico
brasileiro e os objetivos pelas mesmas visados.
Todos esses pontos representam topoi a serem considerados por ocasião
da interpretação das CDTRs, de forma que são pontos de partida que devem
ser estudados preliminarmente.
Em seguida, tendo em vista o propósito desta tese de inserir a interpretação
das CDTRs no contexto das discussões hermenêuticas contemporâneas, serão
apresentados comentários acerca das principais influências hermenêuticas
deste trabalho, buscando estabelecer as balizas teóricas que sustentarão as
considerações posteriores.
23 Cf. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 15. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004. v. I. pp. 254-257; PEREIRA, Bruno Yepes. Curso de Direito Internacional Público. São
Paulo: Saraiva, 2006. pp. 78; ACCIOLY, Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E do. Manual
de Direito Internacional Público. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. pp. 33-34; REZEK, J. F. Direito
Internacional Público. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. pp. 90-93; MAZZUOLI, Valerio de Oliveira.
Curso de Direito Internacional Público. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. pp. 139-140.
24 MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito Constitucional Internacional. 2. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2000. pp. 17-35.
25 Sobre a importância a análise da formação histórica das CDTRs, ver: OLIVER, J. David B. The
Relevance of Tax Treaty History. Intertax, Amsterdam, v. 33, Nov. 2005, p. 484.
26 Nas palavras de Antônio Augusto Cançado Trindade: “Não há como pretender interpretar de
modo uniforme todo e qualquer tipo de tratado, independentemente de sua natureza. Os
tratados de Direitos Humanos, por exemplo, em razão de seu caráter especial e da natureza
essencialmente objetiva das obrigações que incorporam, acarretam uma interpretação própria”
(TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1999. v. II. p. 32). No mesmo sentido: RAMOS, André
de Carvalho. Teoria Geral dos Direitos Humanos na Ordem Internacional. Rio de Janeiro: Renovar,
2005. pp. 93-159.
27 Vale a pena observar que usaremos neste trabalho a locução elementos de interpretação, em
linha com a terminologia cunhada por Friedrich Carl von Savigny. Destaque-se, entretanto, que
tal nomenclatura não é pacífica, sendo que, como noticia Ricardo Lobo Torres, há autores que
referem-se a cânones hermenêuticos (Schleiermacher e Coing), técnicas (Tércio Sampaio Ferraz
Júnior), pontos de vista (Larenz). O próprio Ricardo Lobo, seguindo a denominação prevalecente
na doutrina, fala em métodos de interpretação (Cf. TORRES, Ricardo Lobo. Normas de Interpretação
e Integração do Direito Tributário. 4. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 153).
28 Veja-se, por todos: XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, p. 141.
29 VOGEL, Klaus, Introduction, 1997, p. 39; VOGEL, Klaus, Problemas na Interpretação de Acordos
de Bitributação, 2003, pp. 963-964; VOGEL, Klaus, Harmonia Decisória e Problemática da
Qualificação nos Acordos de Bitributação, 1998, p. 73. Nesse mesmo sentido: VAN RAAD, Kees,
International Coordination of Tax Treaty Interpretation and Application, 2002, p. 230; ROHATGI,
Roy, Basic International Taxation, 2005, p. 39; REIMER, Ekkehart. Tax Treaty Interpretation in
Germany. In: LANG, Michael (ed.). Tax Treaty Interpretation. London: Kluwer Law International,
2000. p. 130; VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., General Report, 1993, p. 55; HEINRICH,
Johannes; MORITZ, Helmut, Interpretation of Tax Treaties, 2000, p. 147; SALOMÃO, Raphael
Palmieri. A Interpretação dos Tratados Internacionais para Evitar a Dupla Tributação. Revista de
Direito Tributário Internacional, São Paulo, n. 11, abr. 2009, p. 185; ROHATGI, Roy. Tax Treaties –
The Legal Framework. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito Tributário e Ordem Econômica:
Homenagem aos 60 Anos da ABDF. São Paulo: Quartier Latin, 2010. p. 669.
30 Cf. VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., General Report, 1993, p. 55.
31 Conforme destaca Mario Züger, embora tal harmonia decisória seja aconselhável, não há uma
norma de Direito Internacional que a torne obrigatória (Cf. ZÜGER, Mario. Arbitration under Tax
Treaties - Improving Legal Protection in International Tax Law. Amsterdam: IBFD, 2001. pp. 1-2).
32 Cf. BAKER, Philip. Double Taxation Conventions. London: Thompson, 2005. pp. E-23-E26.
33 Cf. XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, pp. 141-142; BELLAN, Daniel
Vitor, Interpretação dos Tratados Internacionais em Matéria Tributária, 2005, p. 611; SANTIAGO,
Igor Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos, 2006, p. 93;
GARCÍA NOVOA, César, Interpretación de los Convenios de Doble Imposición Internacional,
2006, p. 65-66.
34 Cf. OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 314; VOGEL, Klaus. Conflicts
of Qualification: The Discussion is not Finished. Bulletin for International Taxation, Amsterdam,
Feb. 2003, p. 41; RUST, Alexander. The New Approach to Qualification Conflicts has its Limits.
Bulletin for International Taxation, Amsterdam, Feb. 2003, p. 45; JONES, John F. Avery. Conflicts of
Qualification: Comment on Prof. Vogel’s and Alexander Rust’s Articles. Bulletin for International
Taxation, Amsterdam, May 2003, p. 184.
As CDTRs:
Evolução Histórica, Natureza Jurídica,
Posição Hierárquica no Ordenamento
Jurídico Brasileiro, Qualificação
como Normas Especiais de
Tributação e Objetivos
35 SELIGMAN, Edwin R. A. Double Taxation and International Fiscal Cooperation. New York: The
Macmillan Company, 1928. pp. 32-35.
36 Cf. DAVIES, David R., Principles of International Double Taxation Relief,1985, p. 28; SCHOUERI, Luís
Eduardo, Tratados e Convenções Internacionais sobre Tributação, 2003, p. 27; SERRANO ANTÓN,
Fernando, Los Principios Básicos de la Fiscalidad Internacional..., 2001, p. 105; ROHATGI, Roy,
Basic International Taxation, 2005, p. 64; BAKER, Philip. A Tributação Internacional no Século XXI.
Tradução Elise M. Sakane. Revista Direito Tributário Atual, São Paulo, n. 19, 2005, p. 41; EASSON,
Alex. Do We Still Need Tax Treaties? Bulletin for International Taxation, Amsterdam, Dec. 2000,
p. 619. Para maiores detalhes sobre o tratado entre Áustria e Prússia, ver: SELIGMAN, Edwin R.
A., Double Taxation and International Fiscal Cooperation, 1928, p. 55. Em sentido diverso, vale a
pena mencionar o posicionamento de Ottmar Bühler, para quem “antes de 1914 não se celebrou
nenhum TDI amplo que fundamentalmente tivera por objeto a regulação da imposição sobre
a renda e sobre as sociedades” (BUHLER, Ottmar, Principios de Derecho Internacional Tributário,
1968, p. 69).
37 Em textual: “Isso [inexistência de tratados de bitributação antes do Século XX] resulta explicável,
pois se é certo que diferentes formas de tributação da renda já então haviam começado a
serem utilizadas em não poucos países europeus – Inglaterra, Alemanha, Noruega, Suécia,
França, Áustria, Holanda, Itália – assim como nos Estados Unidos desde 1913, também é certo,
como bem recorda Brewer Richman, ‘que antes da Primeira Guerra Mundial os impostos sobre
a renda, ali onde se aplicavam, foram-no geralmente segundo alíquotas baixas e, portanto, a
seriedade do problema gerado pela imposição múltipla não assumia as proporções adquiridas
depois, quando alíquotas muito maiores foram estabelecidas durante a guerra’” (ATCHABAHIAN,
Adolfo. Derecho Tributario Internacional. In: BELSUNCE, Horacio A. García (Coord.). Tratado de
Tributación. Buenos Aires: Astrea, 2003. t. I. v. II. p. 530. Sobre o surgimento do imposto de renda,
permitimo-nos transcrever a seguinte passagem de Pierre Beltrame: “Nascido em Inglaterra
em 1979, o imposto sobre o rendimento (Income Tax), ‘imposto atroz e digno de Robespierre’,
tinha atingido os Estados Unidos, o Japão e a Alemanha antes de 1914. Estendeu-se em seguida à
Europa (França, 1914-1917; Países Baixos, 1914-1918; Bélgica, 1919). Imposto de classe, pago pelos
mais ricos e tornado quase sempre necessário pelas despesas de uma economia de guerra, o
imposto sobre o rendimento converte-se, com o aumento do produto nacional, num imposto
de massas pago praticamente por todos os titulares de rendimentos. Nos Estados Unidos, por
exemplo, obrigação de apresentar uma declaração de rendimentos respeitava a cerca de 4%
da população durante os anos 1930 e a 75% atualmente” (BELTRAME, Pierre. Os Sistemas Fiscais.
Tradução J. L. Da Cruz Vilaça. Coimbra: Almedina, 1976. p. 62). Para uma breve perspectiva
histórica do Imposto de Renda, ver: PIRES, Adilson Rodrigues. Contradições no Direito Tributário.
Rio de Janeiro: Forense, 1994. pp. 47-48.
42 SELIGMAN, Edwin R. A., Double Taxation and International Fiscal Cooperation, 1928, pp. 121-123.
43 Cf. SELIGMAN, Edwin R. A., Double Taxation and International Fiscal Cooperation, 1928, p. 136.
44 Cf. DAVIES, David R., Principles of International Double Taxation Relief, 1985, p. 33.
45 Cf. DAVIES, David R., Principles of International Double Taxation Relief,1985, p. 34; SCHOUERI, Luís
Eduardo, Tratados e Convenções Internacionais sobre Tributação, 2003, p. 28.
46 Cf. DAVIES, David R., Principles of International Double Taxation Relief,1985, p. 35; SCHOUERI,
Luís Eduardo, Tratados e Convenções Internacionais sobre Tributação, 2003, p. 28; SERRANO
ANTÓN, Fernando, Los Principios Básicos de la Fiscalidad Internacional..., 2001, p. 106.
49 Nas palavras de Brian J. Arnold e Michael J. McIntyre: “A Convenção Modelo da OCDE favorece
países exportadores de capital sobre países importadores de capital. Freqüentemente ela elimina
ou mitiga a dupla tributação requerendo que o país da fonte abdique parcial ou totalmente da
tributação sobre certas categorias de rendimentos auferidos por residentes do outro Estado
contratante. Esta característica da Convenção Modelo da OCDE é apropriada se o fluxo de
comércio e investimento entre os países é razoavelmente equilibrado e o país de residência
tributa qualquer rendimento isento no país de fonte” (ARNOLD, Brian J.; MCINTYRE, Michael J.
International Tax Primer. 2nd. ed. The Hage: Kluwer Law International, 2002. p. 108). Ver também:
SANDLER, Daniel. Tax Treaties and Controlled Foreign Company Legislation. 2nd. ed. The Hage:
Kluwer Law International, 1998. p. 86; DAVIES, David R., Principles of International Double Taxation
Relief,1985, p. 41; MUNRO, Alistair, Tolley’s Double Taxation Relief, 2003, p. 7; SCHOUERI, Luís
Eduardo. Imposto de Renda e o Comércio Eletrônico. Revista Direito Tributário Atual, São Paulo,
n. 16, 2001, p. 148; SCHINDEL, Angel; ATCHABAHIAN, Adolfo. General Report. In: IFA. Cahiers de
Droit Fiscal International: Source and Residence: new configuration of their principles. Deventer:
Kluwer Law International, 2005. v. 90a. p. 45.
50 Por intermédio da Portaria nº 214/07, o Ministério da Fazenda criou um grupo de trabalho para
avaliar a possibilidade de ingresso do Brasil na OCDE.
51 ROHATGI, Roy, Basic International Taxation, 2005, p. 66.
52 Ver: BAKER, Philip, Double Taxation Conventions, 2005, p. A-7; SCHOUERI, Luís Eduardo, Tratados
e Convenções Internacionais sobre Tributação, 2003, p. 29; LEONARDOS, Gabriel Francisco.
Tributação da Transferência de Tecnologia. Rio de Janeiro: Forense, 2001. pp. 38-41; SCHOUERI, Luís
Eduardo, Imposto de Renda e o Comércio Eletrônico, 2001, p. 149; VOGEL, Klaus. A Importância
do Direito Tributário Internacional para os Países em Desenvolvimento. In: TAVOLARO, Agostinho
Toffoli; MACHADO, Brandão; MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coords.). Princípios Tributários
no Direito Brasileiro e Comparado: Estudos em Homenagem a Gilberto de Ulhôa Canto. Rio
de Janeiro: Forense, 1988. p. 476-481; DORNELLES, Francisco Neves. O Modelo da ONU para
Eliminar a Dupla Tributação da Renda e os Países em Desenvolvimento. In: TAVOLARO, Agostinho
Toffoli; MACHADO, Brandão; MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coords.). Princípios Tributários
no Direito Brasileiro e Comparado: Estudos em Homenagem a Gilberto de Ulhôa Canto. Rio de
Janeiro: Forense, 1988. pp. 195-232. Segundo Heleno Tôrres “o modelo da ONU (the UN Model),
publicado em 1980, privilegia o princípio da territorialidade, em face do análogo Modelo da
OCDE, constituindo, de certa forma, um compromisso de relacionamento congruente entre
aquele princípio e o da tributação da renda mundial – o da universalidade. Ou seja, mesmo
sendo o da renda mundial (universalidade) o princípio adotado pelos Estados contratantes, as
Vale a pena destacar, por fim, que alguns países como os Estados Unidos,
Bélgica e Holanda possuem seu próprio modelo de convenção. Segundo Joseph
Isenbergh o modelo americano não difere muito da convenção OCDE. Todavia,
tal modelo tem particular atenção com aspectos que preocupam os Estados
Unidos, como o tratamento de paraísos fiscais53.
Feitos esses comentários, vale a pena deixar registrado que atualmente a
maioria das CDTRs celebradas seguem o modelo OCDE54. Este é o caso das
CDTRs celebras pelo Brasil, as quais seguem a Convenção Modelo da OCDE,
mesmo não sendo o país membro desta organização.
56 DINH, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain. Direito Internacional Público. Tradução Vítor
Marques Coelho. 2. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003. p. 96. Sobre o dualismo
jurídico, ver também: TRUYOL, Antonio. Noções Fundamentais de Direito Internacional Público.
Tradução de Ehrhardt Soares. Coimbra: Armenio Amado, 1952. pp. 108-111; BOSON, Gerson
de Britto Mello. Direito Internacional Público. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2000. pp. 135-137;
DOLINGER, Jacob. Direito Internacional Privado. 6. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 89;
DALLARI, Pedro B. A. Constituição e Tratados Internacionais. São Paulo: Saraiva, 2003. pp. 8-9;
ARIOSI, Mariângela. Conflitos entre Tratados Internacionais e Leis Internas. Rio de Janeiro: Renovar,
2000. pp. 62-70; REUTER, Paul. Introducción al Derecho de los Tratados. Tradução Eduardo L. Suárez.
México: Fondo de Cultura Económica, 1999. p. 31; PEREIRA, André Gonçalves; QUADROS, Fausto
de. Manual de Direito Internacional Público. 3. ed. Coimbra: Almedina, 2002. p. 84-85; MELLO,
Celso D. de Albuquerque, Curso de Direito Internacional Público, 2004, p. 121-123; BORGES, José
Souto Maior. Direito Comunitário. São Paulo: Saraiva, 2005. pp. 81-82; VALLADÃO, Haroldo.
Direito Internacional Privado. 5. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1980. pp. 51-52; GOUVEIA,
Jorge Bacelar. Manual de Direito Internacional Público. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. pp. 294-295;
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
p. 16; STERN, Klaus. Derecho del Estado de la Recpublica Federal Alemana. Tradução Javier Pérez
Royo e Pedro Cruz Villalón. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1987. p. 808; REZEK,
J. F., Direito Internacional Público, 2000, pp. 4-5; MAZZUOLI, Valerio de Oliveira, Curso de Direito
Internacional Público, 2006, pp. 48-52.
57 MARTINS, Pedro Baptista. Da Unidade do Direito e da Supremacia do Direito Internacional. Rio de
Janeiro: Forense, 1998. p. 28.
58 Cf. MELLO, Celso D. de Albuquerque, Curso de Direito Internacional Público, 2004, p. 122; PEREIRA,
André Gonçalves; QUADROS, Fausto de, Manual de Direito Internacional Público, 2002, p. 84;
RIBEIRO, Patrícia Henriques. As Relações entre o Direito Internacional e o Direito Interno. Belo
Horizonte: Del Rey, 2001. pp. 40-41; ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de Direito Internacional
Público. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995. p. 44; MIRANDA, Jorge. Curso de Direito Internacional
Público. Cascais: Principia, 2002. p. 139.
59 Sobre o monismo jurídico, ver: DINH, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain, Direito
Internacional Público, 2003, p. 96; TRUYOL, Antonio, Noções Fundamentais de Direito Internacional
Público, 1952, pp. 111-114; BOSON, Gerson de Britto Mello, Direito Internacional Público, 2000,
pp. 137-141; DOLINGER, Jacob, Direito Internacional Privado, 2001, p. 90; DALLARI, Pedro B.
A., Constituição e Tratados Internacionais, 2003, pp. 10-13; ARIOSI, Mariângela, Conflitos entre
Tratados Internacionais e Leis Internas, 2000, pp. 73-96; REUTER, Paul, Introducción al Derecho de los
Tratados, 1999, p.31; PEREIRA, André Gonçalves; PEREIRA, André Gonçalves; QUADROS, Fausto
de, Manual de Direito Internacional Público, 2002, pp. 85-86; MELLO, Celso D. de Albuquerque,
Curso de Direito Internacional Público, 2004, pp. 123-125; BORGES, José Souto Maior, Direito
Comunitário, 2005, pp. 78-81; VALLADÃO, Haroldo, Direito Internacional Privado, 1980, pp. 53-55;
GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito Internacional Público, 2005, pp. 295-298; BARROSO,
Luís Roberto, Interpretação e Aplicação da Constituição, 1999, p. 16; STERN, Klaus, Derecho del
Estado de la Recpublica Federal Alemana, 1987, p. 808; REZEK, J. F., Direito Internacional Público,
2000, p. 4-5; FRAGA, Mirtô. O Conflito entre Tratado Internacional e Norma de Direito Interno. Rio
de Janeiro: Forense, 2001. p. 6-10; MAZZUOLI, Valerio de Oliveira, Curso de Direito Internacional
Público, 2006, pp. 52-59.
60 No dizer de Wilson Accioli: “Antes de oferecermos a contestação dos monistas a essa concepção
dos dualistas, faz-se necessário esclarecer, desde logo, que aqueles sustentam a teoria da unidade
da ordem jurídica, dividindo-se, no entanto, em duas correntes: a dos monistas que propugnam
pela supremacia do direito interno e a dos monistas que propendem para a prevalência do
direito externo” (ACCIOLI, Wilson. Instituições de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Forense,
1984. pp. 160-161).
61 XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, p. 79.
62 Salientam André Gonçalves Pereira e Fausto de Quadros que “o monismo de Direito Internacional,
concepção hoje preponderante, resulta da rejeição do voluntarismo, sendo a corrente mais
satisfatória do ponto de vista intelectual e a mais consentânea com o estado atual das relações
jurídicas na Comunidade Internacional.
A Ordem Jurídica interna cede, em caso de conflito, perante a internacional. Esta traça limites
da competência daquela. O legislador não pode criar regras internas contrárias ao Direito
Internacional” (PEREIRA, André Gonçalves; QUADROS, Fausto de, Manual de Direito Internacional
Público, 2002, p. 86). Nesse mesmo sentido: RIBEIRO, Patrícia Henriques, As Relações entre o Direito
Internacional e o Direito Interno, 2001, p. 66; BOSON, Gerson de Britto Mello, Direito Internacional
Público, 2000, p. 143.
63 ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim, Curso de Direito Internacional Público, 1995, p. 46.
64 Apud, BARROSO, Luís Roberto, Interpretação e Aplicação da Constituição, 1999, p. 16.
74 Sobre o tema, ver: FRAGA, Mirtô. A obrigatoriedade do tratado na ordem interna. Revista de
Informação Legislativa, Brasília, n. 162, abr.-jun. 2004, pp. 311-328.
75 Cf. MELLO, Celso D. de Albuquerque, Curso de Direito Internacional Público, 2004, p. 131;
CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 20. ed. São Paulo:
Malheiros, 2004. p. 215; ARAUJO, Nadia de. Direito Internacional Privado. 3. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2006. p. 151; BINENBOJM, Gustavo. Monismo e Dualismo no Brasil: uma Dicotomia
Afinal Irrelevante. Revista Forense, Rio de Janeiro, v. 350, 2000, p. 47; MAZZUOLI, Valerio de
Oliveira, Curso de Direito Internacional Público, 2006, p. 49; TÔRRES, Heleno, Pluritributação
Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, p. 577.
76 TIBURCIO, Carmen. A EC N. 45 e Temas de Direito Internacional. In: WAMBIER, Teresa Arruda
Alvim et. al. (Coords.). Reforma do Judiciário: Primeiras Reflexões sobre a Emenda Constitucional
N. 45/2004. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 125; FRAGA, Mirtô, O Conflito entre
Tratado Internacional e Norma de Direito Interno, 2001, pp.131-133; ARIOSI, Mariângela. Conflitos
entre Tratados Internacionais e Leis Internas. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 211; PAGLIARINI,
Alexandre Coutinho. Constituição e Direito Internacional: Cedências Possíveis no Brasil e no Mundo
Globalizado. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 166; DALLARI, Pedro B. A., Constituição e Tratados
Internacionais, 2003, pp. 106-107.
Há até mesmo quem sustente que o sistema brasileiro seria misto, sendo
monista em relação a algumas matérias e dualista no que se refere a outras77.
Acompanhamos o segundo entendimento acima, no sentido de que o
sistema brasileiro deve ser considerado monista moderado, embora se deva
esclarecer que o mesmo não adere a nenhuma das duas subdivisões clássicas
da teoria (prevalência do direito interno ou do Direito Internacional).
Na verdade a orientação forjada no ordenamento jurídico pátrio desde
o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal do Recurso Extraordinário nº
80.004 é de um monismo com paridade entre o direito interno e o internacional,
de forma que a solução de antinomias entre normas das duas ordens se faz
não pela aplicação do critério hierárquico, mas pela aplicação dos critérios
cronológico e de especialidade.
Com efeito, a despeito da tendência mundial no sentido de reconhecer
a supremacia do direito internacional sobre as normas internas, insta salientar
que a Constituição Brasileira não traz regra expressa acerca do relacionamento
entre a ordem jurídica interna e as normas internacionais (salvo pelos §§ 2º e
3º de seu artigo 5º).
Como bem destaca Mariângela Ariosi, ao se omitir sobre o tema em
tela a Constituição Federal de 1988 segue a mesma linha das Constituições
brasileiras anteriores, as quais nunca veicularam regra específica tratando do
relacionamento entre o direito interno e o direito internacional78.
Esse traço característico da Constituição brasileira foi ressaltado, igual-
mente, por juristas estrangeiros, conforme se pode inferir da seguinte passagem
de Dromi, Ekmekdjian e Rivera:
Nada obstante, esta Constituição [a brasileira] tem sido destacada
no direito constitucional comparado como um exemplo contrário
à tendência generalizada à abertura dos mercados, em especial em
77 Cf. HUSEK, Carlos Roberto. Curso de Direito Internacional Público. 6. ed. São Paulo: Ltr, 2006.
p. 33.
78 Em suas palavras: “Como fora visto, ao se analisar a evolução jurídico-constitucional brasileira,
no capítulo anterior, verificou-se uma verdadeira ausência de dispositivos constitucionais
acerca de uma definição da norma a ser aplicada em caso de conflito que envolvesse tratados
internacionais e leis internas. Não apenas a Constituição brasileira de 1988 pecou por omissão
nesta matéria, mas, como oportunamente fora observado, nunca houve, em nenhum texto
constitucional da história das Constituições brasileiras, qualquer orientação acerca de uma
direção, seja esta, monista – radical ou moderada, ou dualista para os conflitos entre tratados
e leis internas” (ARIOSI, Mariângela. Conflitos entre Tratados Internacionais e Leis Internas. Rio de
Janeiro: Renovar, 2000. p. 158).
79 DROMI, Roberto; EKMEKDJIAN, Miguel A.; RIVERA, Julio C. Derecho Comunitario. 2. ed. Buenos
Aires: Ediciones Ciudad Argentina, 1996. p. 45.
80 Sobre essa questão, afirma Luís Roberto Barroso: “No Brasil não existe disposição constitucional
a respeito do tema, o que tem suscitado críticas diversas. Não obstante, no que diz respeito
ao conflito entre tratado internacional e norma interna infraconstitucional, a doutrina, como
assinalamos pouco atrás, é amplamente majoritária no sentido do monismo jurídico, com
primazia para o direito internacional” (BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da
Constituição. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 18), Nesse sentido: ACCIOLY, Hildebrando;
NASCIMENTO E SILVA, G. E do, Manual de Direito Internacional Público, 2000, p. 62 e 63;
VALLADÃO, Haroldo. Direito Internacional Privado. 5. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1980. p.
96; MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 15. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004. p. 135; TENORIO, Oscar. Direito Internacional Privado. 11. ed. Rio de Janeiro: Freitas
Bastos, 1976. p. 95; FRAGA, Mirtô. O Conflito entre Tratado Internacional e Norma de Direito Interno:
Estudo analítico da situação do tratado na ordem jurídica brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 2001.
p. 128; RIBEIRO, Patrícia Henriques. As Relações entre o Direito Internacional e o Direito Interno:
Conflito entre o ordenamento brasileiro e normas do MERCOSUL. Belo Horizonte: Del Rey,
2001. p. 209; SILVA, Agustinho Fernandes Dias da. Introdução ao Direito Internacional Privado.
Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1975. pp. 32 e 33.
81 ROCHA, Sergio André. Treaty Override no Ordenamento Jurídico Brasileiro: O Caso das Convenções
para Evitar a Dupla Tributação da Renda. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 25.
82 Nesse sentido foi a decisão proferida no Recurso Extraordinário nº 196.560 (publicação no Diário
da Justiça em 10 de maio de 1999.
83 ROCHA, Sergio André, Treaty Override no Ordenamento Jurídico Brasileiro [...], 2007, pp. 58-69.
84 Cf. TRINDADE, Antonio Augusto Cançado. Memorial em prol de uma nova mentalidade quanto
à proteção dos direitos humanos nos planos internacional e nacional. In: Direito Internacional em
um Mundo em Transformação. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 712; PIOVESAN, Flávia. Direitos
Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Max Limonad, 1997. p. 82. Apoiando
a posição sustentada por Flávia Piovesan, ver: MELLO, Celso D. de Albuquerque. O § 2° do art.
5° da Constituição Federal. In: TORRES, Ricardo Lobo (Org.). Teoria dos Direitos Fundamentais.
Rio de Janeiro: Renovar, 1999. p. 25; MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Hierarquia constitucional
e incorporação automática dos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos no
ordenamento brasileiro. Revista de Informação Legislativa, Brasília, n. 148, out.-dez. 2000, p. 239;
SCHOUERI, Luís Eduardo. Anotações sobre Temas do Direito Tributário Internacional. In: DE
SANTI, Eurico Diniz; ZILVETI, Fernando Aurelio; MOSQUERA, Roberto Quiroga (Coords.). São
Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 257. Em sentido contrário manifesta-se José Souto Maior Borges:
“Não será pertinente sustentar portanto que, enquanto os demais tratados internacionais têm
força hierárquica infraconstitucional, os que versam sobre direitos humanos revestem a natureza
de norma constitucional. A paridade hierárquica entre os atos legislativos (leis ordinárias federais)
e os tratados verificar-se-ia, dentre todas as matérias do art. 5°, § 2°, in fine, exceto com relação
aos tratados sobre direitos humanos. Como fundamentar porém esse discrime?” (BORGES, José
Souto Maior. Direitos Humanos e Tributação. In: Anais das XX Jornadas do ILADT. Brasil: ABDF,
2000. p. 628).
85 Cf. XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, pp. 85-87; SCHOUERI, Luís
Eduardo. Acordos de Bitributação e Lei Interna – Investimentos na Ilha da Madeira – Efeitos da
Lei nº 9.249/95. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 17, fev. 1997, p. 97; SCHOUERI,
Luís Eduardo. Preços de Transferência no Direito Tributário Brasileiro. São Paulo: Dialética, 1999.
pp. 154-156; MATTOS, Aroldo Gomes de. PIS/COFINS: a Não-cumulatividade e os Tratados
Internacionais. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 104, maio 2004, p. 11; SILVEIRA,
Rodrigo Maitto da. Aplicação de Tratados Internacionais contra a Bitributação: Qualificação de
Partnership Joint Ventures. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 90.
86 ROCHA, Sergio André, Treaty Override no Ordenamento Jurídico Brasileiro [...], 2007, pp. 59-67.
87 ROCHA, Sergio André, Treaty Override no Ordenamento Jurídico Brasileiro [...], 2007, p. 67.
88 Nas palavras de Daniel Sandler, “as regras de direito internacional não proíbem a dupla tributação.
O direito internacional permite a tributação de rendimentos de fonte estrangeira desde que
uma conexão suficiente exista entre o contribuinte e o país tributante, como por exemplo a
residência ou cidadania do contribuinte ou a fonte de seu rendimento. Não há um princípio
territorial de direito internacional que proíba a aplicação da lei doméstica para a tributação
doméstica de rendimentos de fonte estrangeira. Costume internacional não proíbe a dupla
tributação enquanto a legislação de cada país envolvido é consistente com o direito internacional.
Evidentemente, esse princípio encontra-se sujeito às limitações para que um país torne efetiva
a tributação, em primeiro lugar e principalmente porque um país não irá dar efetividade a uma
lei tributária de outro” (SANDLER, Daniel. Tax Treaties and Controlled Foreign Company Legislation.
2nd. ed. London: Kluwer Law International, 1998. p. 16). Segundo J. Van Hoorn Jr., “qualquer que
seja a forma de bitributação – jurídica ou econômica no sentido estrito, ou econômica no caso
de coexistirem diferentes tipos de impostos – a questão é saber se há algum princípio jurídico
segundo o qual um país esteja obrigado a evitá-la. Um princípio jurídico dessa natureza não
existe. Cada país é soberano também em assuntos tributários e não há princípios ou regras gerais
internacionais que limitem o soberano poder de tributar além daqueles poucos que limitam
a soberania de um país em geral. Assim, a atitude de um país em relação à bitributação – e em
relação ao direito tributário internacional em geral – depende muito, se não inteiramente,
de seus interesses econômicos nacionais, na estrutura da sua posição internacional diante
de outros países. Isto é assim em especial para quaisquer regras unilaterais. A tributação da
renda mundial (ou global) bem como da estritamente territorial é uma função de uma situação
internacional do país como país que exporta ou importa capital e tecnologia. Assim ocorre com
as medidas unilaterais especiais para evitar a bitributação (jurídica), e também, naturalmente,
com a legislação fiscal de incentivos que objetiva a criação de um clima tributário favorável em
benefício de investimento estrangeiro e de transferência de tecnologia” (VAN HOORN JR., J. O
Papel dos Tratados no Comércio Internacional. In: TAVOLARO, Agostinho Toffoli; MACHADO,
Brandão; MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coords.). Princípios Tributários no Direito Brasileiro
e Comparado: Estudos em Homenagem a Gilberto de Ulhôa Canto. Rio de Janeiro: Forense,
1988. pp. 420-421). No mesmo sentido, ver: SCHOUERI, Luís Eduardo. Planejamento Fiscal Através
de Acordos de Bitributação. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. p. 1; ROTHMANN, Gerd W.,
Bitributação Internacional, 1983, pp. 131-132; ROTHMANN, Gerd W., Interpretação e Aplicação
de Acordos Internacionais contra a Bitributação, 1978, p. 77. Sobre o tema, ver, ainda: BORRÁS,
Alegria, La Doble Imposición: Problemas Jurídico-Internacionales, 1974, pp. 163-170.
92 COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 3. ed. São Paulo: Saraiva,
2004. p. 66 e 67. Na mesma linha, ver: DERZI, Misabel Abreu Machado. Direitos Humanos e
Tributação. In: XX Jornadas do Instituto Latinoamericano de Derecho Tributario – ILADT. Brasil: ABDF,
2000. v. I. p. 216.
93 Sobre esta matéria vale a pena acompanhar o julgamento do Recurso Extraordinário nº 466.343,
atualmente em curso perante o Supremo Tribunal Federal.
94 “PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL EM FACE DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE
DIREITOS HUMANOS. INTERPRETAÇÃO DA PARTE FINAL DO INCISO LXVII DO ART. 5O DA
CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE 1988. POSIÇÃO HIERÁRQUICO-NORMATIVA DOS TRATADOS
INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO. Desde
a adesão do Brasil, sem qualquer reserva, ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos
(art. 11) e à Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de San José da Costa Rica
(art. 7º, 7), ambos no ano de 1992, não há mais base legal para prisão civil do depositário infiel,
pois o caráter especial desses diplomas internacionais sobre direitos humanos lhes reserva
lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da
legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos
subscritos pelo Brasil torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela
anterior ou posterior ao ato de adesão. Assim ocorreu com o art. 1.287 do Código Civil de 1916
e com o Decreto-Lei n° 911/69, assim como em relação ao art. 652 do Novo Código Civil (Lei n°
10.406/2002). ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. DECRETO-LEI N° 911/69. EQUIPAÇÃO
DO DEVEDOR-FIDUCIANTE AO DEPOSITÁRIO. PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR-FIDUCIANTE EM
FACE DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. A prisão civil do devedor-fiduciante no âmbito
do contrato de alienação fiduciária em garantia viola o princípio da proporcionalidade, visto que:
a) o ordenamento jurídico prevê outros meios processuais-executórios postos à disposição do
credor-fiduciário para a garantia do crédito, de forma que a prisão civil, como medida extrema de
coerção do devedor inadimplente, não passa no exame da proporcionalidade como proibição
de excesso, em sua tríplice configuração: adequação, necessidade e proporcionalidade em
sentido estrito; e b) o Decreto-Lei n° 911/69, ao instituir uma ficção jurídica, equiparando o
devedor-fiduciante ao depositário, para todos os efeitos previstos nas leis civis e penais, criou
uma figura atípica de depósito, transbordando os limites do conteúdo semântico da expressão
“depositário infiel” insculpida no art. 5º, inciso LXVII, da Constituição e, dessa forma, desfigurando
o instituto do depósito em sua conformação constitucional, o que perfaz a violação ao princípio
da reserva legal proporcional. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.”
95 Nesse mesmo sentido: SANTIAGO, Igor Mauler. Relações entre o Direito Interno e o Direito
Internacional em Matéria Tributária. Revista Internacional de Direito Tributário, Belo Horizonte, v.
3, jan.-jun. 2005, p. 182.
96 Essa linha de entendimento não é compartilhada por alguns especialistas, que sustentam a
inconstitucionalidade do § 3º do artigo 5º da Constituição Federal sob o argumento de que
este está a limitar a proteção dos direitos humanos no ordenamento jurídico pátrio, já que,
segundo entendem, os §§ 1º e 2º do artigo 5º já garantiriam a incorporação imediata e o status
constitucional dos tratados de direitos humanos. Nesse sentido, ver: PASSOS, Jorge Luiz Ieski
Calmon de. Direitos Humanos na Reforma do Judiciário. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim
et. al. (Coords.). Reforma do Judiciário: Primeiras Reflexões sobre a Emenda Constitucional N.
45/2004. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 353; FERREIRA, Luiz Alexandre; TÁRREGA,
Maria Cristina Vidote Blanco. Reforma do Judiciário e Direitos Humanos. In: WAMBIER, Teresa
Arruda Alvim et. al. (Coords.). Reforma do Judiciário: Primeiras Reflexões sobre a Emenda
Constitucional N. 45/2004. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 457. Também comentando
a questão sem, contudo, afirmar a inconstitucionalidade do § 3º: GABRIEL, Amélia Regina
Mussi. Hierarquia jurídica da norma internacional de direitos humanos em face do art. 5º, § 3º,
da Constituição brasileira. Revista de Informação Legislativa, Brasília, n. 165, jan.-mar. 2005, pp.
263-264. Valerio de Oliveira Mazzuoli tenta superar a incompatibilidade entre os §§ 2º e 3º do
artigo 5º da Constituição Federal sustentando que mesmo a partir da vigência deste último os
tratados internacionais de proteção a direitos humanos permanecem como normas de status
constitucional, embora não possam ser considerados “equivalentes” a emendas constitucionais,
a não ser que sigam o procedimento previsto no § 3º (Cf. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. O
novo § 3º do art. 5º da Constituição e sua eficácia. Revista de Informação Legislativa, Brasília, n.
167, jul.-set. 2005, pp. 111-112).
97 TIBURCIO, Carmen, A EC N. 45 e Temas de Direito Internacional, 2005, p. 126.
Feitos esses comentários, temos que nossas conclusões aqui são iguais
àquelas alcançadas no item anterior: há tratados que versam sobre matéria
tributária que veiculam direitos humanos do homem-contribuinte, os quais, caso
sigam o processo legislativo previsto no § 3º do artigo 5º, serão incorporados
ao direito interno como emendas constitucionais, todavia, evidentemente esse
não é o caso das CDTRs98.
A superação do § 2º do artigo 5º da Constituição pelo seu § 3º deixa
evidente não haver que se falar na estatura constitucional de tais tratados
internacionais, duvidando-se absolutamente que alguma CDTR venha a
ser apresentada ao Congresso Nacional para aprovação em nível de emenda
constitucional, tal como preconiza o § 3º.
98 Entendimento diverso é manifestado pelo professor Luís Eduardo Schoueri (Preços de Transferência
no Direito Tributário Brasileiro. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2006. pp. 271-272).
99 CANTO, Gilberto de Ulhôa. Legislação Tributária, sua Vigência, sua Eficácia, sua Aplicação,
Interpretação e Integração. Revista Forense, Rio de Janeiro, v. 267, jul.–set. 1979, p. 27.
100 Sobre a criação do artigo 98 ver: ROCHA, Sergio André. Gênese histórica do artigo 98 do Código
Tributário Nacional. Revista de Direito Tributário Internacional, São Paulo, n. 12, ago. 2009, 215-222.
Janeiro: Forense, 2001. p. 639; MORAES, Bernardo Ribeiro de. Compêndio de Direito Tributário.
3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. v. II. p. 29.
102 TÔRRES, Heleno, Pluritributação Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, p. 581. Ver,
ainda: VELLOSO, Carlos Mario da Silva. O Direito Internacional e o Supremo Tribunal Federal.
In: BRANT, Leonardo Nemer Caldeira (Org.). O Brasil e os Novos Desafios do Direito Internacional.
Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 424.
103 ROCHA, Sergio André, Treaty Override no Ordenamento Jurídico Brasileiro [...], 2007, pp. 79-80.
104 Sustentando também a inconstitucionalidade do artigo 98 (ou sua não recepção pela Constituição
de 1988), ver: CARRAZZA, Roque Antonio. Mercosul e Tributos Estaduais, Municipais e Distritais.
Revista de Direito Tributário, São Paulo, n. 64, 1995, p. 186. Do mesmo autor, ver: CARRAZZA, Roque
Antônio, Curso de Direito Constitucional Tributário, 2004, p. 218 e 219; LOURENÇO, Vladimir Rossi.
Tratados, Convenções Internacionais e Tributação. Revista de Direito Tributário, São Paulo, n. 37,
jul.-set. 1986, p. 172; HORVATH, Estevão; CARVALHO, Nelson de Ferreira. Tratado Internacional,
em Matéria Tributária, pode Exonerar Tributos Estaduais? Revista de Direito Tributário, São Paulo,
n. 64, 1995, p. 267; AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 9. ed. São Paulo: saraiva, 2003.
p. 178; CHIESA, Clélio. A Competência Tributária do Estado Brasileiro: desonerações nacionais e
imunidades condicionadas. São Paulo: Max Limonad, 2002. pp. 62-63.
105 Ver as decisões proferidas nos seguintes processos: Recurso Especial nº 34.932 (publicação no
DJU em 13 de setembro de 1993); Recurso Especial nº 37.065 932 (publicação no DJU em 21 de
fevereiro de 1994); Recurso Especial nº 45.759 (publicação no DJU em 06 de junho de 1994);
Recurso Especial nº 47.244 (publicação no DJU em 27 de junho de 1994); Agravo Regimental
no Agravo de Instrumento nº 67.007 (publicação no DJU em 28 de abril de 1997); e Recurso
Especial nº 196.560 (publicação no DJU em 10 de maio de 1999).
106 Para um exame detido dos fundamentos dessa decisão, ver: ROCHA, Sergio André, Treaty
Override no Ordenamento Jurídico Brasileiro [...], 2007, pp. 92-104; ELALI, André. Direito Tributário
numa Economia Globalizada – Tributação e Integração Econômica Internacional: um exame do
entendimento do STJ sobre os acordos que impedem a dupla tributação da renda no âmbito
internacional. Revista Tributária e de Finanças Públicas, São Paulo, n. 68, mai.-jun. 2006.
107 Sobre o GATT, ver: PIRES, Adilson Rodrigues. Práticas Abusivas no Comércio Internacional. Rio de
Janeiro: Forense, 2001. pp. 33-53.
108 Sobre o tema, com referência aos defensores de ambas correntes doutrinárias sobre a matéria,
ver: SILVA, Sergio André R. G. da. Possibilidade Jurídica da Concessão de Isenções de Tributos
109 DOLINGER, Jacob. As Soluções da Suprema Corte Brasileira para os Conflitos entre o Direito
Interno e o Direito Internacional: Um Exercício de Ecletismo. Revista Forense, Rio de Janeiro, v.
334, abr.-jun. 1996, p. 101.
110 SCHOUERI, Luís Eduardo, Preços de Transferência no Direito Tributário Brasileiro, 1999, pp. 166-168.
111 AMARO, Luciano, Direito Tributário Brasileiro, 2003, p. 174-177.
112 GODOI, Marciano Seabra de, Os Tratados ou Convenções Internacionais para Evitar a Dupla
Tributação e sua Hierarquia Normativa no Direito Brasileiro, 2003, p. 1000.
113 TÔRRES, Heleno, Pluritributação Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, pp. 593 e 594.
114 BARRETO, Paulo Ayres, Imposto sobre a Renda e Preços de Transferência, 2001, p. 169.
115 GRUPENMACHER, Betina Treiger, Tratados Internacionais em Matéria Tributária e Ordem Interna,
1999, p. 118.
116 MALERBI, Diva. Tributação no Mercosul. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Tributação
no Mercosul. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 79.
117 PONTES, Helenilson Cunha. Tributação no Mercosul. In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.).
Tributação no Mercosul. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 365. PONTES, Helenilson
Cunha. A tributação dos lucros do exterior e os tratados para evitar a dupla tributação da renda.
In: PIRES, Adilson Rodrigues; TÔRRES, Heleno Taveira (Org.). Princípios de Direito Financeiro e
Tributário: Estudos em Homenagem ao Professor Ricardo Lobo Torres. Rio de Janeiro: Renovar,
2006. pp. 874-877.
118 MACIEL, Taísa Oliveira. Tributação dos Lucros das Controladas e Coligadas Estrangeiras. Rio de
Janeiro: Renovar, 2007. p. 151.
119 LEONARDOS, Gabriel Francisco, Tributação da Transferência de Tecnologia, 2001, p. 29.
120 ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. Imposto de Renda das Empresas. São Paulo: Atlas, 2004. p. 293.
121 SANTIAGO, Igor Mauler. Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução de Conflitos. São
Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 56.
122 AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues do; YAMASHITA, Douglas. Norma Antielisão: Tributação
de Lucros no Exterior. Disponibilidade da Renda e Tratados Internacionais. In: SCHOUERI, Luís
Eduardo (Coord.). Direito Tributário: Estudos em Homenagem a Alcides Jorge Costa. São Paulo:
Quartier Latin, 2003. pp. 912-913.
123 VOGEL, Klaus. The Domestic Law Perspective. In: MAISTO, Guglielmo (Org.). Tax Treaties and
Domestic Law. Amsterdam: IBFD, 2006. p. 3.
124 LANG, Michael. Introduction to the Law of Double Taxation Conventions. Wien: Linde, 2010. p. 33.
125 PIRES, Manuel, International Juridical Double Taxation of Income, 1989, p. 221.
126 BOBBIO, Norberto. Teoria do Ordenamento Jurídico. 10. ed. Tradução Maria Celeste Cordeiro
Leite dos Santos. Brasília: UNB, 1999. p. 108.
127 RÁO, Vicente. O Direito e a Vida dos Direitos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 343.
128 Nesse sentido: SCHOUERI, Luís Eduardo, Preços de Transferência no Direito Tributário Brasileiro,
1999, p. 168; SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução de
Conflitos, 2006, p. 56.
129 DAVIES, David R., Principles of International Double Taxation Relief,1985, p. 4.
135 SERRANO ANTÓN, Fernando, Los Principios Básicos de la Fiscalidad Internacional..., 2001, p.
120.
136 SERRANO ANTÓN, Fernando, Los Principios Básicos de la Fiscalidad Internacional..., 2001, pp.
119-121.
137 SAINZ DE BUJANDA, Fernando. Sistema de Derecho Financiero I. Madrid: Facultad de Derecho
de la Universidad Complutense, 1985. v. II. p. 477.
138 COSTA, Ramón Valdés. Instituciones de Derecho Tributario. 2. ed. Buenos Aires: Depalma, 2004.
p. 34.
139 SCHOUERI, Luís Eduardo. Preços de Transferência no Direito Tributário Brasileiro. 2. ed. São Paulo:
Dialética, 2006. p. 260. Ver também: TOSI, Loris; BAGGIO, Roberto, Lineamenti di Diritto Tributario
Internazionale, 2011, p. 12; ROTHMANN, Gerd W. Bitributação Internacional, 1983, p. 138;
ROTHMANN, Gerd W., Interpretação e Aplicação de Acordos Internacionais contra a Bitributação,
1978, p. 149; GARBARINO, Carlo, Manuale di Tassazione Internazionale, 2005, p. 148; GOUTHIÈRE,
Bruno, Les Impôts dans les Affaires Internationales, 1989, p. 24.
140 Sobre os princípios aplicáveis no âmbito do Direito Internacional Tributário, ver: ROCHA,
Sergio André. Princípios Gerais do Direito Internacional Tributário. Revista Dialética de Direito
Tributário, São Paulo, n. 199, abr. 2012, pp. 107-120; PEREIRA, Paula Rosado. Princípios do Direito
Fiscal Internacional: Do Paradigma Clássico ao Direito Fiscal Europeu. Coimbra: Almedina, 2010.
141 SILVA, Virgílio Afonso da. A Constitucionalização do Direito: Os direitos fundamentais nas relações
entre particulares. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 35.
142 Segundo Alexy, “o ponto decisivo para a distinção entre regras e princípios é que os princípios
são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das
possibilidades jurídicas e reais existentes. Portanto, os princípios são mandados de otimização,
que estão caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferentes graus e que a
medida devida de seu cumprimento não apenas depende das possibilidades reais, mas também
das jurídicas” (ALEXY, Robert. Teoría de los Derechos Fundamentales. Tradução Ernest Garzón
Valdés. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2001. p. 86). Com suas próprias
peculiaridades, lição semelhante é encontrada em Ronald Dworkin, principalmente na distinção
apresentada entre uma política e um princípio, sendo que este estabeleceria um objetivo a ser
alcançado por ser uma exigência de justiça ou alguma outra dimensão moral (DWORKIN, Ronald.
Taking Rights Seriously. Cambridge: Harvard University Press, 1999. p. 22). Sobre o tema, ver:
HECK, Luís Afonso. Regras, Princípios Jurídicos e sua Estrutura no Pensamento de Robert Alexy.
In: LEITE, George Salomão (Coord.). Dos Princípios Constitucionais: Considerações em torno
das normas principiológicas da Constituição. São Paulo: Malheiros, 2003. pp. 52-100; ÁVILA,
Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São Paulo:
Malheiros, 2003. pp. 15-77; SILVA, Virgílio Afonso da, A Constitucionalização do Direito: Os direitos
fundamentais nas relações entre particulares, 2005, pp. 29-37; TORRES, Ricardo Lobo. Tratado
de Direito Constitucional Financeiro e Tributário: Valores e Princípios Constitucionais Tributários.
Rio de Janeiro: Renovar, 2005. v. II. pp. 275-283.
143 OECD. The Application of the OECD Model Tax Convention to Partnerships. In: OECD. Model Tax
Convention on Income and on Capital. Paris: OECD, 2000. v. II. p. R(15)-20/21. Sobre a dupla não
tributação, ver: TEIXEIRA, Alexandre Alkmin. Dupla Não-Tributação: Entre o Poder de Tributar
e as Convenções Internacionais em Matéria Fiscal. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito
Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2007. v. IV. pp. 241-270.
144 LANG, Michael. General Report. In: IFA. Cahiers de Droit Fiscal International: Double Non-taxation.
Deventer: Kluwer Law International, 2004. v. 89a. p. 81.
145 Segundo Alberto Xavier tal afirmação é particularmente verdadeira no que concerne aos tratados
celebrados pelo Brasil. Segundo o professor “pode-se dizer que, para o Brasil, a dupla não-
-tributação não é considerada um objetivo a ser alcançado por meio de tratados tributários. De
fato, não só tal objetivo não é mencionado no título ou em qualquer outra passagem dos textos
das convenções, como o Brasil favoreceu ativamente a adoção de cláusulas de créditos presumido
e fictício, as quais privilegiam o efeito de incentivos econômicos a investimentos estrangeiros
e não o objetivo de evitar a dupla não-tributação” (XAVIER, Alberto. [Brazilian Report]. In: IFA.
Cahiers de Droit Fiscal International: Double Non-taxation. Deventer: Kluwer Law International,
2004. v. 89a. p. 227).
146 Nas palavras de Celso Cláudio Hildebrand e Grisi Filho, “no espírito dos tratados bilaterais para
evitar a dupla-tributação remanesce a meta de que os países signatários negociariam soluções
para distribuir entre eles o direito de tributar os diversos tipos de rendimento, e, portanto, eles
adotariam conjuntamente uma determinada política fiscal recíproca.
Desta forma, três métodos principais estariam à disposição dos negociadores de tratados para
evitar a dupla-tributação, quais sejam: (i) tributar o rendimento estrangeiro sem limitação;
(ii) tributar até uma alíquota máxima ou (iii) não tributar de nenhuma forma o rendimento
estrangeiro” (GRISI FILHO, Celso Cláudio de Hildebrand e. Uma Perspectiva Econômica sobre
a Negociação das Convenções Internacionais para Evitar a Dupla-Tributação. Revista de Direito
Tributário Internacional, São Paulo, n. 4, out. 2006, p. 51).
147 MARQUES, Mercedes Pelaez. El Convenio Hispano-Argentino. Buenos Aires: Quorum, 1998. p. 15.
Ver também: ROCCATAGLIATA, Franco. Proposte di simplificazione delle procedure applicative
delle Convenzione per evitare le doppie imposizioni. In: UCKMAR, Victor; GARBARINO, Carlo
(Coords.). Aspetti Fiscali delle Operazioni Internazionali. Milano: EGEA, 1995. p. 438; DAVIES,
Daniel R., Principles of International Double Taxation Relief, 1985, p. 4; PIRES, Manuel, International
Juridical Double Taxation of Income, 1989, p. 214; ROHATGI, Roy, Basic International Taxation, 2005,
p. 3; ISENBERGH, Joseph, International Taxation, 2005, p. 230; VASCONSELLOS, Roberto França
de. Aspectos Econômicos dos Tratados Internacionais em Matéria Tributária. Revista de Direito
Tributário Internacional, São Paulo, n. 1, out. 2005, p. 155-156; GARBARINO, Carlo, Manuale di
Tassazione Internazionale, 2005, p. 31.
148 Sobre o tema, ver: PISTONE, Pasquale. Tax Treaties with Developing Countries: a Plea for New
Allocation Rules and a Combined Legal and Economic Approach. In: TÔRRES, Heleno Taveira
(Coord.). Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2012. v. VI. pp. 99-125;
SACCHETTO, Claudio. Política de Tratados em Matéria Tributária para Países Emergentes Vis-à-vis
Países Desenvolvidos e em Via de Desenvolvimento. Revista Direito Tributário Atual, São Paulo, n.
23, 2009, pp. 72-87; THURONYI, Victor. Tax Treaties and Developing Countries. In: LANG, Michael
et al (Coords.). Trax Treaties: Building Bridges Between Law and Economics. The Netherlands: IBFD,
2010. pp. 441-455.
149 Ver: ROHATGI, Roy, Basic International Taxation, 2005, p. 3; DAVIES, Daniel R., Principles of
International Double Taxation Relief, 1985, p. 4.
Já o spare credit é atribuído com vistas a evitar que benefícios fiscais concedidos
pelo país da fonte sejam anulados pela tributação no país da residência153. Nas
palavras de Alberto Xavier:
Enquanto a cláusula de “tax sparing” pressupõe incentivo preexistente
que visa a preservar, a cláusula de “matching credit” atribui o direito
à dedução no Estado de residência de um crédito fixado “a fortait”.
Seja qual for a política fiscal do outro Estado, estabeleça ele ou não
um imposto reduzido ou até mesmo uma isenção: é este o significado
da expressão “o imposto será sempre considerado como tendo sido
pago à alíquota de...”.154
A eficácia das cláusulas de créditos fiscais presumidos ou fictícios para
incentivar a investimentos em países em desenvolvimento vem sendo questionada
no âmbito da própria OCDE, conforme se verifica pela análise do relatório
publicado no ano de 1997, intitulado Tax Sparing: A reconsideration155. Esta posição
foi recentemente refutada com extrema felicidade por Luís Eduardo Schoueri,
que analisou o crédito presumido de imposto não mais sob a perspectiva de
incentivo a investimentos estrangeiros, mas sim sob o prisma de mecanismo de
realização do princípio da territorialidade156.
Contudo, independentemente da posição da OCDE parece ter razão
Victor Thuronyi, quando afirma que as cláusulas em questão permanecem
sendo utilizadas em diversas CDTRs157. Tal consideração tem plena pertinência
na realidade brasileira, havendo cláusulas de tax sparing e matching credit em
diversas convenções celebradas pelo Brasil.
Embora reste evidenciada, portanto, a relevância das CDTRs enquanto
mecanismos de divisão de receitas tributárias, inclusive no que tange ao
153 Cf. XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, p. 648.
154 XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, p. 648. Sobre Tax Sparing, ver:
TOAZE, Deborah. Tax Sparing: Good Intentions, Unintended Results. Canadian Tax Journal, v.
49, n. 4, 2001, pp. 880-882; HINES JR., James R. “Tax Sparing” and Direct Investment in Developing
Countries. Cambridge: National Bureau of Economic Research, 1998. p. 2.
155 OECD. Model Tax Convention on Income and on Capital. Paris: OECD, 2000. v. II. p. R (14)-4-R(14)72.
Sobre a questão, ver: GRISI FILHO, Celso Cláudio de Hildebrand e, Uma Perspectiva Econômica
sobre a Negociação das Convenções Internacionais para Evitar a Dupla-Tributação, 2006, pp.
59-62. Para um estudo detido das diferenças entre tax sparing e matching credit, ver: MARINHO,
Anapaula Trindade; FERREIRA, Vanessa Arruda. Crédito de Imposto Fictício: de uma noção
nebulosa a um regime jurídico incerto. Revista de Direito Tributário Internacional, São Paulo, n.
11, 2009, pp. 9-48.
156 SCHOUERI, Luís Eduardo. Tax Sparing: uma Reconsideração da Reconsideração. Revista Direito
Tributário Atual, São Paulo, n. 26, 2011, pp. 93-108.
157 THURONYI, Victor, Comparative Tax Law, 2003, p. 22.
158 Esse aspecto das CDTRs pode ser inferido da seguinte passagem de Fernando Sainz de Bujanda,
que, mesmo longa, vale a pena ser integralmente transcrita: “O contraste entre as tendências
aludidas é enérgico. Enquanto uns autores destacam a função limitativa da soberania estatal,
que se cumpre através das normas do Direito Tributário Internacional, outros pensam que este
Direito tem precisamente como propósito concreto e inescusável a consagração positiva dos
princípios que robustecem a potestade do Estado. O contraste não é, contudo, puramente doutrinal.
Tem raízes mais profundas, de caráter essencialmente político. A noção de Direito Tributário
Internacional, como limitação da soberania impositiva dos Estados, está a serviço de uma
tese política e econômica: a conveniência de favorecer o comércio internacional e a inversão
de capitais sem risco de incorrer na dupla tributação. A doutrina direcionada a robustecer a
potestade tributária do Estado está a serviço de uma tese político e econômica radicalmente
contrária: a conveniência de proteger aos Estados economicamente débeis (sous arriérés, na
terminologia em voga), frente às grandes potências e frente ao capitalismo internacional. A
explicação deste fenômeno é clara. Os problemas modernos de tributação internacional não têm
uma simples dimensão técnica ou jurídica; são, como antes apontava, essencialmente políticos.
Com efeito, o capitalismo moderno, em seu processo de máxima concentração, adota formas
jurídicas que lhe permitem manejar e explorar riquezas de países de escasso desenvolvimento
político sem cair na órbita da soberania fiscal dos Estados em que fisicamente aparecem as
riquezas. As holdings e as empresas organizadas em forma de ‘sociedades em cadeia’ são a figura
jurídica que permite a consecução de tais objetivos. Mas como o domicílio dessas entidades
pode ser livremente escolhido pelas mesmas, o procedimento para escapar à soberania fiscal
do Estado em que se localizam fisicamente as riquezas exploradas consiste, como é lógico,
em domiciliarem-se em Estados que, por sua peculiar estrutura social, política e econômica,
concedem as maiores vantagens fiscais a esta classe de entidades. A disputa entre o princípio
da territorialidade – conforme o qual se submetem à tributação no país de origem os capitais
e as rendas – e o princípio do domicílio – segundo o qual a tributação corresponde ao Estado
em que reside juridicamente a pessoa física ou a empresa exportadora daquelas riquezas – não
é, portanto, uma pergunta puramente teórica, mas sim uma expressão da dramática luta entre
o capitalismo internacional, que busca expansão e domínio, e a soberania dos chamados
estados débeis ou atrasados. A missão do novo Direito Tributário Internacional deve consistir
em harmonizar ambos os princípios, inspirando-se em critérios de justiça internacional. [...]”
(SAINZ DE BUJANDA, Fernando. Hacienda y Derecho. Madrid: Instituto de Estudios Políticos,
1975. v. I. pp. 471-472).
159 Cf. TÔRRES, Heleno Taveira. A Convenção Brasil-Alemanha e sua Aplicação em Face do Direito
Brasileiro. Revista de Direito Tributário, São Paulo, n. 83, 2002, p. 10; VOGEL, Klaus; PROKISCH,
Rainer G., General Report, 1993, p. 55.
163 Cf. XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, p. 213; OKUMA, Alessandra.
Princípio da Não-Discriminação e a Tributação das Rendas de Não-Residentes no Brasil. In:
TÔRRES, Heleno (Coord.). Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin,
2003. pp. 263-267; TÔRRES, Heleno Taveira. Princípio da Territorialidade e Tributação de Não-
Residentes no Brasil. Prestações de Serviços no Exterior. Fonte de Produção e Fonte de Pagamento.
In: TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier
Latin, 2003. pp. 108 e 109; GRAETZ, Michael J. Foundations of International Income Taxation. New
York: The Foundation Press, 2003. p. 436.
164 TÔRRES, Heleno. Capital estrangeiro e o princípio da não-discriminação tributária no direito
interno e nas convenções internacionais. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 87,
dez. 2002, pp. 45-46.
165 Ver: ROHATGI, Roy, Basic International Taxation, 2005, p. 179-182; ARESPACOCHAGA, Joaquín
de. Planificación Fiscal Internacional. 2. ed. Madrid: Marcial Pons, 2002. p. 391-395; CARMONA
FERNÁNDEZ, Néstor. No Discriminación, Procedimiento Amistoso e Intercambio de Información.
In: SERRANO ANTÓN, Fernando (Coord.). Fiscalidad Internacional. Madrid: Centro de Estudios
Financieros, 2001. pp. 579-584; AMATUCCI, Fabrizio. El Tratamiento Discriminatorio en el
Modelo OCDE (art. 24). In: UCKMAR, Victor (Coord.). Curso de Derecho Tributario Internacional.
Tradução Cristian J. Billardi; Juan O. Zanotti Aichino. Bogotá: Temis, 2003. v. II. p. 59-99; LANG,
Michael. Os trabalhos da OECE e da OCDE para a criação das vedações de discriminação.
Revista de Direito Tributário Internacional, São Paulo, n. 3, jun. 2006, pp. 221-241; ADONNINO,
Pietro. General Report. In: IFA. Cahiers de Droit Fiscal International: Non-discrimination rules in
international taxation. Deventer: Kluwer Law International, 1993. v. 78b. pp. 34-40; SACCHETTO,
Claudio. [Italian Report]. In: IFA. Cahiers de Droit Fiscal International: Non-discrimination rules in
international taxation. Deventer: Kluwer Law International, 1993. v. 78b. pp. 493-500. No direito
Como destaca Kees van Raad, tal dispositivo “compreende quatro normas
distintas contra o tratamento tributário menos favorável: uma que proíbe o
tratamento menos favorável baseado na nacionalidade estrangeira (parágrafo
1º) e três que proíbem o tratamento menos favorável que seja baseado na não-
residência, tanto na forma direta (parágrafo 3º) quanto indireta (parágrafos
(4º e 5º)”166.
Uma forma comum de treaty shopping consiste no uso das chamadas conduit
companies, as quais consistem em empresas criadas em um determinado país
apenas para que sua controladora, residente em outro, possa tirar proveito do
tratado celebrado entre o país de residência da conduit e terceiro país.
Há duas formas de conduit companies, as direct conduit e as “stepping stone”
conduits, as quais se encontram descritas pela OCDE nos seguintes termos:
1. Direct conduits
Uma empresa residente no Estado A recebe dividendos, juros ou
royalties do Estado B. De acordo com o tratado entre os Estados A
e B, a empresa sustenta que se encontra total ou parcialmente isenta
da incidência da retenção na fonte no Estado B. A empresa é pertence
integralmente a um residente em um terceiro Estado, o qual não tem
direito aos benefícios do tratado entre os Estados A e B. Ela foi criada
com o propósito de tirar vantagem dos benefícios deste tratado e por
tal razão os ativos que dão origem aos pagamentos de dividendos,
juros ou royalties foram para a mesma transferidos. O rendimento é
isento no Estado A, por exemplo, no caso de dividendos, em razão
de um regime aplicável a controladas e subsidiárias de acordo com a
legislação doméstica do país A, ou na convenção celebrada entre os
Estados A e B.
2. “Stepping stone” conduits
A situação é a mesma do exemplo 1. Entretanto, a empresa residente
no Estado A é sujeita à tributação naquele país. Ela paga altos
juros, comissões, serviços e despesas semelhantes para uma segunda
relacionada conduit company, estabelecida no Estado D. Esses
pagamentos são dedutíveis no Estado A e isentos no Estado D, onde
a empresa tem um regime tributário especial.175
Com vistas a evitar o treaty shopping por meio de conduit companies as
CDTRs passaram a prever disposições anti-abuso, como as regras de beneficiário
efetivo176 e as cláusulas de limitação de benefícios (cláusulas LoB)177.
A cláusula de beneficiário efetivo busca desconsiderar empresas interpostas
(conduit companies) em um dos Estados contratantes por outra que não teria
direito a se valer das regras do CDTR178. Já as cláusulas LoB, conforme destaca
Luís Eduardo Schoueri, “pressupõe a existência de uma lista de situações às
quais o acordo não se estende”179.
Até a edição da Lei nº 12.249/2010 a legislação brasileira não definia
beneficiário efetivo. Tal definição veio no § 1º do artigo 26 da referida lei,
segundo o qual “para efeito do disposto no inciso I do caput deste artigo,
considerar-se-á como efetivo beneficiário a pessoa física ou jurídica não
constituída com o único ou principal objetivo de economia tributária que
175 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2000, v. II, p. R(6)4.
176 Ver: BIANCO, João Francisco; NEWTON, Raquel. Beneficiário Efetivo. Revista Direito Tributário
Atual, São Paulo, n. 26, 2011, pp. 253-270.
177 Ver: VEGA BORREGO, Félix Alberto. Limitation on Benefits Clauses in Double Taxation Conventions.
The Netherlands: Kluwer Law International, 2006; SERRANO ANTÓN, Fernando. Las Medidas
Antiabuso en los Convenios para Evitar la Doble Imposición Internacional y su Compabilidad con
las Medidas Antiabuso de Carácter Interno y el Derecho Comunitario. In: TÔRRES, Heleno (Coord.).
Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2003. pp. 165-182; CARMONA
FERNÁNDEZ, Néstor. Medidas Antielusión Fiscal: Medidas Antiabuso en los Convenios sobre
Doble Imposición. In: SERRANO ANTÓN, Fernando (Coord.). Fiscalidad Internacional. Madrid:
Centro de Estudios Financieros, 2001. p. 162-171; TÔRRES, Heleno, Direito Tributário Internacional:
Planejamento Tributário e Operações Transnacionais, 2001, pp. 362-374; SCHOUERI, Luís Eduardo.
Questões Atuais da Tributação e da Cooperação Internacionais. Revista de Direito Tributário
Internacional, São Paulo, n. 2, fev. 2006, p. 53; MELLO, Nivaldo Edson Machado de. O uso impróprio
das convenções bilaterais de dupla tributação. Revista de Direito Tributário Internacional, São Paulo,
n. 2, fev. 2006, pp. 91-99.
178 Para uma análise específica da cláusula de beneficiário efetivo, ver: CATÃO, Marcos André Vinhas.
A “cláusula de beneficiário efetivo”. Limites à sua qualificação. In: TÔRRES, Heleno (Coord.).
Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2003. v. II. pp. 424-436.
179 SCHOUERI, Luís Eduardo, Questões Atuais da Tributação e da Cooperação Internacionais, 2006,
p. 53.
auferir esses valores por sua própria conta e não como agente, administrador
fiduciário ou mandatário por conta de terceiro.”
O artigo 26 veiculou regra de restrição de dedutibilidade de despesas em
determinados casos de pagamentos feitos a paraísos fiscais e regimes fiscais
privilegiados180. Contudo, mesmo não sendo uma regra geral a respeito da
apuração do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido,
parece-nos que este dispositivo deve ser considerado para fins de determinação
do conceito de beneficiário efetivo para fins domésticos e de aplicação dos
tratados internacionais brasileiros.
180 Sobre o tema, ver: ROCHA, Sergio André. Comentários sobre a Restrição à Dedutibilidade de
Despesas Prevista no artigo 26 da Lei n. 12.249/2010. Revista Dialética de Direito Tributário, São
Paulo, n. 188, maio 2011, pp. 120-128.
Bases Hermenêuticas
da Presente Pesquisa
2.1. INTRODUÇÃO
Antes de iniciarmos a análise de questões específicas relacionadas à
interpretação dos tratados internacionais em geral e das CDTRs em especial,
é importante assentarmos as bases hermenêuticas sobre as quais se sustentarão
tais comentários.
Como é sabido, a teoria hermenêutica desenvolveu-se consideravelmente
ao longo dos Séculos XIX e XX, existindo várias escolas de pensamento que
se alternaram em relevo e preponderância ao longo deste período de tempo.
No presente trabalho não nos filiamos a nenhuma escola de pensamento em
particular, partindo de influências de variadas teorias, extraindo pontos de
partida de posições teóricas que podem até mesmo ser consideradas antagônicas.
No itens seguintes apresentaremos comentários acerca das principais
influências hermenêuticas deste trabalho, entre as quais se destacam a teoria
da interpretação de Hans Kelsen, a teoria da textura aberta da linguagem de
Herbert Hart, a hermenêutica filosófica de Hans-Georg Gadamer, a abertura
do direito para os princípios juntamente com a tópica jurídica e a teoria da
argumentação181.
Consideramos que há, em cada uma dessas linhas de pensamento, aspectos
complementares para a formação do pensamento hermenêutico, de forma que
a filiação a qualquer dessas teorias, com a exclusão das demais, parece-nos
reduzir demasiado a complexidade da interpretação jurídica.
181 Uma versão mais extensa dos comentários apresentados neste capítulo pode ser encontrada em:
ROCHA, Sergio André. Evolução Histórica da Teoria Hermenêutica: Do Formalismo do Século
XVIII ao Pós-Positivismo. In: ELALI, André; MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito; TRENNEPOHL,
Terence. (Org.). Direito Tributário: Homenagem a Hugo de Brito Machado. São Paulo: Quartier
Latin, 2011. pp. 167-214.
182 FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Por que ler Kelsen, hoje. In: COELHO, Fábio Ulhoa. Para
Entender Kelsen. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. XIII.
183 Assim leciona Karl Larenz, para quem “foi Hans Kelsen quem, com admirável energia e improbo rigor
de pensamento, se desempenhou de semelhante missão. A sua ‘teoria pura do Direito’ constitui
a mais grandiosa tentativa de fundamentação da ciência do Direito como ciência – mantendo-se
embora sob o império do conceito positivista desta última e sofrendo das respectivas limitações
– que o nosso século veio até hoje a conhecer” (LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito.
3.ed. Tradução José Lamego. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997. p. 92).
184 KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 6. ed. Tradução João Baptista Machado. Coimbra: Armenio
Amado, 1984. p. 17.
185 Cf. KELSEN, Hans, Teoria Pura do Direito, 1984, pp. 100-102.
186 Cf. KELSEN, Hans. O Problema da Justiça. Tradução João Baptista Machado. São Paulo: Martins
Fontes, 1998. p. 65.
187 António Manuel Hespanha ressaltou os méritos da teoria pura do direito, ao afirmar que: “A
teoria pura do direito teve a virtude de, num período de intenso debate político-ideológico
(os anos ’30 a ’50 do século XX), ter sublinhado a autonomia do saber jurídico e a sua relativa
indisponibilidade em relação aos projetos de poder. Nesta medida, culminou as preocupações
da pandectística em estabelecer que nem tudo quanto é querido pelo poder, útil ao povo ou
a uma classe, ou funcional em relação a um objetivo social, é automaticamente aceite como
justo (i.e., conforme ao direito). A juridicidade parece decorrer de valores internos ao discurso
do direito, valores que a vontade política ou a utilidade social não podem substituir.
Neste sentido, embora se possa acusar a teoria pura do direito de aceitar como direito tudo o
que provém da vontade do Estado, o certo é que o seu sentido mais profundo é o de constituir
um manifesto contra os totalitarismos políticos do seu tempo, que, num sentido ou noutro,
procuravam funcionalizar o direito em relação às conveniências do poder, legitimando-o a
partir de considerações políticas, como o domínio de classe (estalinismo) ou as necessidades
vitais de uma raça (nacional-socialismo). Há que pense que este manifesto é ainda útil contra
outro tipo de funcionalizações do direito, nomeadamente, a tendência para justificar como
justas as medidas – formal ou informalmente corretas – de um poder legitimado pelo voto, ou
as medidas dirigidas à consecução de finalidades de desenvolvimento social ou econômico”
(HESPANHA, António Manuel. Cultura Jurídica Européia: Síntese de um Milénio. Mem Martins:
Europa-America, 2003. p. 310).
188 KELSEN, Hans, Teoria Pura do Direito, 1984, p. 463.
(certas). Assim como da Constituição, através de interpretação, não podemos extrair as únicas
leis corretas, tão-pouco podemos, a partir da lei, por interpretação, obter as únicas sentenças
corretas” (KELSEN, Hans, Teoria Pura do Direito, 1984, p. 469).
192 KELSEN, Hans, Teoria Pura do Direito, 1984, p. 470.
193 HART, H. L. A. The Concept of Law. 2nd. ed. New York: Oxford University Press, 1997. p. 128. Sobre
a textura aberta da linguagem, ver: STRUCHINER, Noel. Direito e Linguagem: Uma Análise da
Textura Aberta da Linguagem e sua Aplicação ao Direito. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
194 HART, H. L. A, The Concept of Law, 1997, p. 129.
200 GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método I: Traços de uma hermenêutica filosófica. 5. ed.
Tradução Flávio Paulo Meurer. Petrópolis: Vozes, 2003. p. 29.
201 Cf. RICOEUR, Paul. Hermeneutics & the Human Sciencies. Tradução de John B. Thompson.
Cambridge: Cambridge University Press, 1998. p. 60.
202 Cf. GADAMER, Hans-Georg. Gadamer in Conversation. Tradução de Richard Palmer. New Haven/
London: Yale University Press, 2001. p. 41.
208 Cf. NEVES, A. Castanheira. Metodologia Jurídica: Problemas Fundamentais. Coimbra: Coimbra
Editora, 1993. p. 28.
209 GÉNY, François. Método de Interpretación y Fuentes em Derecho Privado Positivo. Madrid: Editorial
Réus, 1925. p. 26.
210 Cf. MÜLLER, Friedrich. Métodos de Trabalho do Direito Constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2005. pp. 27-30.
211 Sobre o tema, ver: STRECK, Lenio Luiz. O Efeito Vinculante das Súmulas e o Mito da Efetividade:
Uma Crítica Hermenêutica. In: Crítica à Dogmática: Dos Bancos Acadêmicos à Prática dos
Tribunais. Porto Alegre: Instituto de Hermenêutica Jurídica, 2005. p. 92; STRECK, Lenio
Luiz. A hermenêutica filosófica e as possibilidades de superação do positivismo pelo (neo)
constitucionalismo. In: STRECK, Lenio Luiz; ROCHA, Leonel Severo (Orgs.). Constituição, Sistemas
Sociais e Hermenêutica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 167.
212 GRAU, Eros Roberto. Ensaio e Discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito. São Paulo:
Malheiros, 2002. p. 90 e 91.
213 MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 18. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
p. 9. A ideia de que a interpretação consiste em uma atividade voltada para a descoberta do
“verdadeiro” sentido de um texto legal encontra-se presente nos trabalhos de estudiosos da teoria
geral do direito e nos compêndios gerais dos diversos “ramos” jurídicos, como em: MÁYNEZ,
Eduardo García. Introducción al Estudio del Derecho. 53. ed. México: Editorial Porrúa, 2002. p.
327; COING, Helmut. Elementos Fundamentais da Filosofia do Direito. Tradução Elisete Antoniuk.
Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2002. p. 326; GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao
Estudo do Direito. 26. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 219; DINIZ, Maria Helena. Compêndio
de Introdução à Ciência do Direito. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 381; LOPES, Miguel Maria de
Serpa. Curso de Direito Civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1989. v. I. p. 114; RODRIGUES,
Silvio. Direito Civil. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 1989. v. I. p. 24; ESPÍNOLA, Eduardo. Sistema de
Direito Civil. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1977. p. 157; BEVILAQUA, Clovis. Teoria Geral do Direito
Civil. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1975. p. 45; JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. 19. ed. São Paulo:
Saraiva, 1995. v. I. p. 27; MIRABETE, Julio Fabrini. Manual de Direito Penal. São Paulo: Atlas, 1998.
v. I. p. 51; DANTAS, Ivo. Princípios Constitucionais e Interpretação Constitucional. Rio de Janeiro:
Lúmen Júris, 1995. p. 83.
214 Para Maria Margarida Lacombe Camargo, “Gadamer legitima a pré-compreensão na tradição
como processo histórico que o intérprete experimenta. A autoridade da tradição, no entanto,
não tira a liberdade do intérprete, uma vez que passe a ser racionalmente conhecida, pois, a
partir do momento que formamos uma consciência metódica da compreensão, somos capazes
de controlá-la. Mas a compreensão não consiste em uma busca do passado feita por uma
razão independente, como procedia o romantismo histórico, considera Gadamer. Consiste,
outrossim, na determinação universal do estar aí, isto é, na futuridade do estar aí, feita por uma
razão comprometida historicamente. O estar aí faz parte de um processo histórico enquanto
experiência humana da qual participamos” (Hermenêutica Jurídica e Argumentação: Uma
Contribuição ao Estudo do Direito, 2001, p. 57 e 58).
215 Verdade e Método I: Traços de uma hermenêutica filosófica, 2003, p. 374. Vale a pena mencionar
aqui as palavras de David E. Linge sobre a importância da pré-compreensão na hermenêutica
jurídica gadameriana: “Não é de surpreender que a noção de pré-conceitos de Gadamer seja
um dos aspectos mais controvertidos de sua filosofia. Mais do que qualquer outro elemento
de seu pensamento, ela indica sua determinação em reconhecer as insuperáveis finitude e
historicidade do compreender, assim como em exibir o papel positivo que os mesmos têm em
cada transmissão humana de significado. Para Gadamer, o passado tem um poder pervasivo
sobre o fenômeno da compreensão, e tal poder foi completamente ignorado pelos filósofos que
dominaram a cena antes de Heidegger. O papel do passado não pode ser restringido meramente
ao fornecimento de textos e eventos para a composição de ‘objetos’ da interpretação. Como os
pré-conceitos e a tradição, o passado também define o ponto que o próprio intérprete ocupa
quando compreende” (LINGE, David E. [Introduction to Gadamer’s Philosofical Hermeneutics].
In: GADAMER, Hans-Georg. Philosofical Hermeneutics. Tradução David E. Linge. Berkeley/Los
Angeles/London: University of California Press, 1997. p. xv).
216 Verdade e Método I: Traços de uma hermenêutica filosófica, 2003, p. 360.
217 Essa questão foi muito bem analisada e exposta por Eduardo C. B. Bittar, na passagem a seguir
transcrita: “O ser-no-mundo carrega esta experiência de estar-aí (Dasein) da qual não pode se
desvincular; não posso modificar minha compreensão-de-mundo, pois ela é já determinada pela
minha história-de-mundo, da qual não posso me alhear. As condições existenciais (ek-sistere),
estar-aí) em que sou posto determinam também as condições com as quais interpreto e com-
vivo com o mundo. A existência ou não dos “pré-conceitos” na determinação de todo sentido
apreendido do mundo não depende da vontade humana. Os “pré-conceitos” existem, no sentido
deste estar-aí contra o qual não se pode lutar, e estão presentes na avaliação de cada peça de
nossa interação com o mundo. A vontade pode dizer não e renunciar aos “pré-conceitos”,
mas esta é já uma postura claramente carregada de “pré-conceitos” e de tomadas de posição
próprias de um sujeito histórico e gravado por uma experiência particular” (BITTAR, Eduardo C.
B. Hans-Georg Gadamer: a experiência hermenêutica e a experiência jurídica. In: BOUCAULT,
Carlos E. de Abreu; RODRIGUEZ, José Rodrigo. Hermenêutica Plural. São Paulo: Martins Fontes,
2002. p. 184 e 185). Segundo Konrad Hesse, “o intérprete não pode compreender o conteúdo da
norma de um ponto situado fora da existência histórica, por se assim dizer, arquimédico, senão
somente na situação histórica concreta, na qual ele se encontra, cuja maturidade enformou seus
conteúdos de pensamento e determina seu saber e seu (pré)-juízo. Ele entende o conteúdo da
norma de uma (pré)-compreensão, que primeiramente lhe torna possível olhar a norma com
certas esperanças, projetar-se um sentido do todo e chegar a um anteprojeto que, então, em
penetração mais profunda, carece de confirmação, correção e revisão até que, como resultado
de aproximação permanente dos projetos revisados, cada vez, ao “objeto”, determine-se
univocamente a unicidade do sentido” (HESSE, Konrad. Elementos de Direito Constitucional da
República Federal da Alemanha. Tradução Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris,
1998. p. 61 e 62).
compreensão deve ser pensada menos como uma ação da subjetividade e mais
como um retroceder que penetra num acontecimento da tradição”218.
De fato, em primeiro lugar deve-se ter em conta que os valores trazidos
pela tradição não são experenciados com exclusividade pelo sujeito-intérprete,
mas por toda a coletividade, a qual compartilha determinada tradição.
Por outro lado, o fato de que somos guiados por pré-conceitos, dados
pela tradição, não significa que nunca tenhamos qualquer controle sobre os
mesmos ou, melhor dizendo, que não devamos questioná-los. Assim, como
observa Gadamer:
[...] Aquele que quer compreender não pode se entregar de antemão
ao arbítrio de suas próprias opiniões prévias, ignorando a opinião do
texto da maneira mais obstinada e consequente possível – até que este
acabe por não poder ser ignorado e derrube a suposta compreensão.
Em princípio, quem quer compreender um texto deve estar disposto
a deixar que este lhe diga alguma coisa. Por isso, uma consciência
formada hermenêuticamente deve, desde o princípio, mostrar-se
receptiva à alteridade do texto. Mas essa receptividade não pressupõe
nem uma “neutralidade” com relação à coisa nem tampouco um
anulamento de si mesma; implica antes uma destacada apropriação
das opiniões prévias e preconceitos pessoais. O que importa é dar-se
conta dos próprios pressupostos, a fim de que o próprio texto possa
apresentar-se em sua alteridade, podendo assim confrontar sua
verdade com as opiniões prévias pessoais.219
Ponto dos mais importantes presentes na passagem acima consiste,
portanto, na necessidade de o intérprete não se fechar em suas opiniões prévias,
abrindo-se para a alteridade do texto220.
em geral, o que H.G. Gadamer chama de mendacidade. Na esfera hermenêutica, isso quer dizer
a exclusão do outro da comunicação por causa da inconsequência consigo mesmo e, dessa
forma, a ação hermenêutica se torna baldia por falta de entendimento. Precisamente, por isso,
o intérprete deve se livrar dos próprios prejuízos negativos, a fim de que o texto surja em sua
outreidade. O contrário, o reforço dos prejuízos pela repetição obstinada, com excelência diz
H.G. Gadamer, é próprio do dogmatismo, que é conhecido sob o pretexto de conhecimento
sem pressupostos e de objetividade da ciência (jurídica), pela mera transferência do método de
outras ciências como, por exemplo, a física, principalmente, quando a ciência é invocada como
instância suprema de processos de decisão social. Nisso se encontra a tensão entre o objetivismo
ingênuo e o desconhecimento da verdade, i.e., dos interesses agregados ao conhecimento.
Particularmente, por isso, considera-se a tarefa hermenêutica suprema; por seu intermédio é
possível compreender, explicar e, por conseguinte, dissolver hábitos e prejuízos sociais arraigados
imperantes, sobretudo a influência desses na atuação dos profissionais da área jurídica, embora
seja uma tarefa difícil, porque colocar em dúvida o que é dogma provoca sempre a resistência de
todas as evidências práticas” (SILVA, Kelly Susane Alflen da. Hermenêutica Jurídica e Concretização
Judicial. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2000. p. 269). Ver, também: CUNHA, José
Ricardo. Fundamentos Axiológicos da Hermenêutica Jurídica. In: BOUCAULT, Carlos E. de Abreu;
RODRIGUEZ, José Rodrigo. Hermenêutica Plural. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 321.
221 Verdade e Método I: Traços de uma hermenêutica filosófica, 2003, p. 473.
222 Cf. GADAMER, Hans-Georg. La hermenêutica y la escuela de Dilthey. In: El Giro Hermenéutico.
Tradução Arturo Parada. Madrid: Ediciones Cátedra, 1995. p. 146.
223 Segundo Gadamer: “[...] o processo descrito por Heidegger de que cada revisão do projeto
prévio pode lançar um outro projeto de sentido; que projetos conflitantes podem posicionar-se
lado a lado na elaboração, até que se confirme de modo mais unívoco a unicidade de sentido;
que a interpretação começa com conceitos prévios substituídos depois por conceitos mais
adequados. Em suma, esse constante projetar de novo é o que perfaz o movimento semântico
de compreender e de interpretar. Quem procura compreender está sujeito a errar por causa
das opiniões prévias, que não se confirmam nas coisas elas mesmas. Dessa forma, a constante
tarefa do compreender consiste em elaborar projetos corretos, adequados às coisas, isto é,
ousar hipóteses que só devem ser confirmadas ‘nas coisas elas mesmas’. Aqui não há outra
‘objetividade’ além da elaboração da opinião prévia a ser confirmada. Faz sentido afirmar que
o intérprete não vai diretamente ao ‘texto’, a partir da opinião prévia pronta e instalada nele. Ao
contrário, põe à prova, de maneira expressa, a opinião prévia instalada nele a fim de comprovar
sua legitimidade, o que significa, sua origem e sua validade” (GADAMER, Hans-Georg. Sobre
o Círculo da Compreensão. In: Verdade e Método II. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2004. p. 75). Esse
aspecto circular da compreensão é ressaltado por Gregorio Robles: “[...] a interpretação ‘projeta’,
já que em todo momento começa com um ‘projeto de compreensão’ (pré-compreensão) que irá
verificar-se e contrastar-se com a experiência. Este contraste mostrará a insuficiência do projeto
emitido e a necessidade de substituí-lo por outro. Neste ir e vir da compreensão, para utilizar a
expressão de Engisch, radica o chamado círculo hermenêutico” (ROBLES, Gregorio. Introducción
a la Teoria del Derecho. 9. ed. Barcelona: Debate, 2003. p. 192).
224 BLEICHER, Josef. Hermenêutica Contemporânea. Tradução Maria Georgina Segurado. Lisboa:
Edições 70, [s/d]. p. 161.
232 Cf. GADAMER, Hans-Georg, Gadamer in Conversation, 2001, p. 37; GADAMER, Hans-Georg,
Verdade e Método I: Traços de uma hermenêutica filosófica, 2003, p. 407.
233 GADAMER, Hans-Georg, O problema da consciência histórica, 1998, p. 57. Ver também: GADAMER,
Hans-Georg. Hermenêutica clássica e hermenêutica filosófica. In: Verdade e Método II. 2. ed.
Petrópolis: Vozes, 2004. p. 131.
234 BLEICHER, Josef, Hermenêutica Contemporânea, [s/d], p. 170.
235 Nas palavras de Eros Grau: “Interpretação e aplicação não se realizam autonomamente. O
intérprete discerne o sentido do texto a partir e em virtude de um determinado caso dado; a
interpretação do direito consiste em concretar a lei em cada caso, isto é, na sua aplicação. Assim,
existe uma equação entre interpretação e aplicação: não estamos aqui diante de dois momentos
distintos, porém frente a uma só operação. Interpretação e aplicação consubstanciam um processo
unitário, se superpõem” (Ensaio e Discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito, 2002, p. 76).
Ver também: STRECK, Lenio Luiz, O Efeito Vinculante das Súmulas e o Mito da Efetividade: Uma
Crítica Hermenêutica, 2005, p. 162; TORRES, Ricardo Lobo, Normas de Interpretação e Integração
do Direito Tributário, 2006, p. 61.
pensamento teórico que ‘flutua’ sobre os objetos do mundo, apto a dar sentido
ao ‘mundo sensível’. O sentido é algo que se dá; ele acontece”236.
236 STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição Constitucional e Hermenêutica: Uma Nova Crítica do Direito. 2. ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 32.
237 LARENZ, Karl. La Filosofía Contemporánea del Derecho y del Estado. Tradução E. Galán Gutiérrez; A.
Truyol Serra. Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1942. p. 98. A jurisprudência valorativa
de Larenz se reflete em sua definição de princípios jurídicos, constante na passagem a seguir: “Os
princípios jurídicos são os pensamentos diretores de uma regulação jurídica existente ou possível.
Em si mesmos, não são, todavia, regras suscetíveis de aplicação, mas podem transformar-se em
regras. Quando remetem a um conteúdo intelectivo que conduz a uma regulação, são princípios
‘materiais’, ainda que lhes falte, todavia, o caráter formal de proposições jurídicas, representando
a conexão entre um ‘pressuposto de fato’ e uma ‘consequência jurídica’. Os princípios indicam
apenas a direção na qual está situada a regra que deve ser encontrada. Podemos dizer que são
um primeiro passo para a obtenção da regra, que determina os passos posteriores. Como ao
estabelecer as regras de comportamento humano se escolhe entre diferentes possibilidades e,
para tanto, realiza-se uma valoração – este se estima mais do que outro –, os princípios contém
pré-decisões sobre os valores posteriores que se tem que encontrar e que se têm que manter
dentro do marco assinalado pela pré-decisão, que deve dar satisfação ao princípio” (LARENZ,
Karl. El Derecho Justo. Tradução Luis Díes-Picazo. Madrid: Civitas, 2001. pp. 32-33).
238 RADBRUCH, Gustav. Filosofia do Direito. 6. ed. Tradução L. Cabral de Moncada. Coimbra: Arménio
Amado, 1997. p. 45.
de tal modo que toda a lei que os contrarie não poderá deixar de ser privada
de validade”239.
Uma teoria jurídica voltada à realização de valores implica uma reforma
na própria forma de legislar, uma vez que se faz necessária uma maior abertura
dos textos legais com a delegação de maior atribuição ao julgador para ponderar
os valores em jogo em cada caso concreto.
Torna-se então cada vez mais comum a utilização nos textos legais de
conceitos indeterminados e tipos, os quais impõem uma mudança na própria
forma mediante a qual os operadores jurídicos devem examinar o fenômeno
hermenêutico.
A jurisprudência dos valores, na medida em que impõe uma interpretação
jurídica que não se limita ao direito positivo, impõe a ponderação de valores
extralegais. Como destaca Karl Larenz, “a passagem a uma ‘jurisprudência
de valoração’ só cobra, porém, o seu pleno sentido quando conexionada na
maior parte dos autores com o reconhecimento de valores ou critérios de
valoração ‘supralegais’ ou ‘pré-positivos’ que subjazem às normas legais e para
cuja interpretação e complementação é legítimo lançar mão, pelo menos sob
determinadas condições”240. O sistema jurídico seria então, segundo Canaris,
uma ordenação axiológica241.
Questão relevante no campo da jurisprudência dos valores consiste na
fundamentação da decisão judicial. De fato, considerando que, como dito, as
valorações partem de aspectos não auferíveis pela lógica subsuntiva, impõe-se
então o desenvolvimento de novas fórmulas de justificação das decisões judiciais,
como a tópica e a teoria da argumentação.
Esta evolução da teoria jurídica desenboca no chamado pós-positivismo,
termo que não designa uma corrente uniforme de pensamento, referindo-se
às correntes jurídicas contemporâneas decorrentes da reaproximação entre
direito e valores242.
243 RAWLS, John. A Theory of Justice. Cambridge: Harvard University Press, 2001. p. 6 e 7.
244 RAWLS, John, A Theory of Justice, 2001, pp. 397-405.
245 RAWLS, John, A Theory of Justice, 2001, pp. 102-160.
246 RAWLS, John, A Theory of Justice, 2001, p. 53.
247 Em textual: “A superação histórica do jusnaturalismo e o fracasso político do positivismo abriram
caminho para um conjunto amplo e ainda inacabado de reflexões acerca do Direito, sua função
social e sua interpretação. O pós-positivismo é a designação provisória e genérica de um ideário
difuso, no qual se incluem a definição das relações entre valores, princípios e regras, aspectos
da chamada nova hermenêutica constitucional, e a teoria dos direitos fundamentais, edificada
sobre o fundamento da dignidade humana. A valorização dos princípios, sua incorporação,
explícita ou implícita, pelos textos constitucionais e o reconhecimento pela ordem jurídica
de sua normatividade fazem parte desse ambiente de reaproximação entre Direito e Ética”
(BARROSO, Luís Roberto; BARCELLOS, Ana Paula de. O começo da história. A nova interpretação
constitucional e o papel dos princípios no direito brasileiro. In: BARROSO, Luís Roberto (Org.).
A Nova Interpretação Constitucional: Ponderação, Direitos Fundamentais e Relações Privadas.
Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 336). Nas palavras de Marcus Abraham: “O pós-positivismo
reintroduz no ordenamento jurídico positivo as idéias de justiça e legitimidade, através do
constitucionalismo moderno, com o retorno aos valores e com a reaproximação entre moral,
ética e o direito, materializados em princípios jurídicos abrigados na Constituição, que passam
a ter maior efetividade normativa, influenciando sobremaneira a teoria da interpretação do
direito e, inclusive, do direito tributário” (ABRAHAM, Marcus. O Planejamento Tributário e o
Direito Privado. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 96).
248 CAMARGO, Maria Margarida Lacombe, Hermenêutica Jurídica e Argumentação: Uma Contribuição
ao Estudo do Direito, 2001, p. 141.
249 DWORKIN, Ronald. Taking Rights Seriously. Cambridge: Harvard University Press, 1999. p. 22.
250 ALEXY, Robert. Teoria de los Derechos Fundamentales. Tradução Ernesto Garzón Valdés. Madrid:
Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2001. p. 86.
251 ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. São
Paulo: Malheiros, 2003. p. 70.
252 DWORKIN, Ronald. Law’s Empire. Cambridge: Harvard University Press, 1999.
253 CALSAMIGLIA, Albert, Postpositivismo, 1998, p. 212.
254 MacCORMICK, Neil. Argumentação Jurídica e Teoria do Direito. Tradução Waldéa Barcellos. São
Paulo: Martins Fontes, 2006. p. 201.
255 MacCORMICK, Neil, Argumentação Jurídica e Teoria do Direito, 2006, p. 209.
256 Conforme salienta Paulo Bonavides, “a tópica tem que ser compreendida portanto no quadro
das consequências advindas da reação ao positivismo jurídico clássico e no clima de inteira
descrença quanto a uma reestruturação jusnaturalista, como a que se intentou na Alemanha
no fim da década de 40, após as feridas abertas na consciência do Ocidente pela tragédia da
Segunda Grande Guerra Mundial” (BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 13. ed.
São Paulo: Malheiros, 2003. p. 497). No mesmo sentido: BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de.
Tópica e argumentação jurídica. Revista de Informação Legislativa, Brasília, n. 163, jul.-set. 2004,
pp. 154-155.
257 Ver: VIEHWEG, Theodor. Tópica e Jurisprudência. Tradução Tercio Sampaio Ferraz Jr. Brasília:
Departamento de Imprensa Nacional, 1979.
258 HESPANHA, António Manuel, Cultura Jurídica Européia: Síntese de um Milénio, 2003, pp.
338-339. Leciona Tercio Sampaio Ferraz Jr. que “quando se fala, hoje, em tópica pensa-se, como
já dissemos, numa técnica de pensamento que se orienta para problemas. Trata-se de um estilo
de pensar e não, propriamente, de um método. Ou seja, não é um conjunto de princípios de
avaliação da evidência nem de cânones para julgar a adequação de explicações propostas, nem
ainda critério para selecionar hipóteses. Em suma, não se trata de um procedimento verificável
rigorosamente. Ao contrário, é um modo de pensar, problemático, que nos permite abordar
problemas, deles partir e neles culminar. Assim, pensar topicamente significa manter princípios,
conceitos, postulados com caráter problemático visto que jamais perdem sua qualidade tentativa.
Veja, por analogia, o que acontece com a elaboração de um dicionário, em que muitos verbetes,
pela diversidade de acepções, exigem abordagens, que, partindo de distintos pontos de vista,
não fecham nem concluem, embora dêem a possibilidade de compreender a palavra em sua
amplitude (problemática)” (FERAZ JR., Tercio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito. 3. ed. São
Paulo: Atlas, 2001. pp. 323-324).
259 OLIVEIRA ASCENÇÃO, José de, Introdução à Ciência do Direito, 2005, p. 464.
260 PERELMAN, Chaïm, Lógica Jurídica, 2000, p. 120.
266 MENDONÇA. Paulo Roberto Soares de. A Tópica e o Supremo Tribunal Federal. Rio de Janeiro:
Renovar, 2003. p. 100.
267 BUSTAMANTE, Thomas da Rosa de, Tópica e argumentação jurídica, 2004, p. 159.
268 GARCÍA AMADO, Juan Antonio, Tópica, Derecho y Método Jurídico, 1987, p. 174. Ver, ainda:
CRISTÓVAM, José Sérgio da Silva. Colisões entre Princípios Constitucionais. Curitiba: Juruá: 2006.
p. 129.
269 WARAT, Luiz Alberto. Introdução Geral ao Direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1994.
v. I. p. 88. Há que se concordar com as ponderações de Antonio Nedel, quando afirma que o
que “parece mais importante ressaltar no que concerne à tópica jurídica não são os topoi e o
fundamento metafísico que eles suscitam, mas, sim, o caráter dialético e as possibilidades crítico-
-criativas que a sua índole retórico argumentativa propicia, enquanto método de resolução dos
concretos problemas jurídicos, elevando, como o valor mais relevante do direito, a prospecção
dialógica que pode conduzir, no âmbito das controvérsias, sua elucidação racional-consensual”
(NEDEL, Antônio. Uma Tópica Jurídica: clareira para a emergência do direito. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2006. p. 222).
270 VIEHWEG, Theodor, Tópica e Jurisprudência, 1979, p. 71.
271 CAMARGO, Maria Margarida Lacombe, Hermenêutica Jurídica e Argumentação: Uma Contribuição
ao Estudo do Direito, 2001, p. 262.
272 VIEHWEG, Theodor, Tópica e Jurisprudência, 1979, p. 71.
273 ATIENZA, Manuel, As Razões do Direito: Teorias da Argumentação Jurídica, 2002, p. 333.
274 Conforme destaca Humberto Ávila, “[...] Uma teoria jurídica da argumentação não se confunde
com uma teoria racional da argumentação, que opta, entre os argumentos que podem ser
utilizados, pelo mais racional, plausível ou sustentável. Uma teoria jurídica da argumentação
procura fundamentar no próprio ordenamento jurídico a escolha entre os argumentos” (ÁVILA,
Humberto. Sistema Constitucional Tributário. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 203).
275 MacCORMICK, Neil, Argumentação Jurídica e Teoria do Direito, 2006, p. 326.
276 MacCORMICK, Neil, Argumentação Jurídica e Teoria do Direito, 2006, p. 327.
277 PERELMAN, Chaïm. Ética e Direito. Tradução Maria Emantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes,
2002. pp. 569-570.
278 PERELMAN, Chaïm, Lógica Jurídica, 2000, p. 115. Em outra passagem, afirma Perelman que “em
nítida oposição aos métodos da lógica formal, vimos que toda argumentação deve partir de
teses que têm a adesão daqueles a que se quer persuadir ou convencer. Negligenciando esta
condição, o orador, aquele que apresenta uma argumentação, arrisca-se a cometer uma petição
de princípio” (PERELMAN, Chaïm, Lógica Jurídica, 2000, p. 158). Ver: GARCÍA AMADO, Juan
Antonio, Tópica, Derecho y Método Jurídico, 1987, p. 174; CRISTÓVAM, José Sérgio da Silva,
Colisões entre Princípios Constitucionais, 2006, p. 129; CRETTON, Ricardo Aziz. Os Princípios da
Proporcionalidade e da Razoabilidade e sua Aplicação no Direito Tributário. Rio de Janeiro: Lúmen
Júris, 2001. p. 38.
279 O debate quanto à ponderação foi introduzido no cenário jurídico nacional no âmbito da discussão
quanto à solução da colisão entre princípios, notadamente quando o intérprete está diante dos
chamados casos difíceis (Cf. SARMENTO, Daniel. A Ponderação de Interesses na Constituição Federal.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. p. 99). Como salienta Ana Paula de Barcellos, “de forma muito
geral, a ponderação pode ser descrita como uma técnica de decisão própria para casos difíceis (do
inglês hard cases), em relação aos quais o raciocínio tradicional da subsunção não é adequado”
(BARCELLOS, Ana Paula de. Alguns Parâmetros Normativos para a Ponderação Constitucional.
In: BARROSO, Luís Roberto (Org.). A Nova Interpretação Constitucional: Ponderação, Direitos
Fundamentais e Relações Privadas. Rio de Janeiro/São Paulo: Renovar, 2003. p. 55).Todavia,
como destaca a própria Ana Paula, “já é possível identificá-la [a ponderação] como uma técnica de
decisão jurídica autônoma que, aliás, vem sendo aplicada em diversos outros ambientes que não
o do conflito entre princípios” (BARCELLOS, Ana Paula de, Alguns Parâmetros Normativos para
a Ponderação Constitucional, 2003, p. 56). Nas palavras de Humberto Ávila, “a ponderação não
é método privativo de aplicação dos princípios. A ponderação ou balanceamento (weighing and
balancing Abwägung), enquanto sopesamento de razões e contra-razões que culmina com a decisão
de interpretação, também pode estar presente no caso de dispositivos hipoteticamente formulados,
cuja aplicação é preliminarmente havida como automática (no caso de regras, consoante o critério
aqui investigado), como se comprova mediante a análise de alguns exemplos” (ÁVILA, Humberto,
Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos, 2003, p. 44). Sobre a
ponderação como postulado hermenêutico, ver: BARROSO, Luís Roberto. O Começo da História.
Nova Interpretação Constitucional e o Papel dos Princípios no Direito Brasileiro. In: BARROSO, Luís
Roberto (Org.). A Nova Interpretação Constitucional: Ponderação, Direitos Fundamentais e Relações
Privadas. Rio de Janeiro/São Paulo: Renovar, 2003. pp. 344-350; CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito
Constitucional e Teoria da Constituição. 3. ed. Coimbra: Almedina, [s/d]. pp. 1161-1165; BARCELOS,
Ana Paula. Ponderação, Racionalidade e Atividade Jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.
280 Cf. CALSAMIGLIA, Albert, Postpositivismo, 1998, p. 215.
281 ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação: A Teoria do Discurso Racional como Teoria da Justificação
Jurídica. Tradução de Zilda Hutchinson Schild Silva. São Paulo: Landy, 2001.
282 GÜNTHER, Klaus. Teoria da Argumentação no Direito e na Moral: Justificação e Aplicação. Traducão
Cláudio Molz. São Paulo: Landy, 2004.
283 PERELMAN, Chaïm; OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. Tratado da Argumentação. Tradução Maria
Ermantina Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 2000;.
284 TOULMIN, Stephen. Os Usos do Argumento. Tradução Reinaldo Guarany. São Paulo: Martins
Fontes, 2001.
287 Nas palavras de Rogério Gesta Leal, há que se ter em conta que “quem dá efetividade à interpretação
é um ser racional e também histórico, que fala, se comunica dentro da história e de uma história
determinada, de uma cultura determinada, de um contexto determinado. Desta forma, o processo
de constituição do significado do texto está profundamente marcado pelos elementos discursivos
e categoriais erigidos pelo tempo daquela história” (LEAL, Rogério Gesta. Perspectivas Hermenêuticas
dos Direitos Fundamentais no Brasil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000. p. 133).
288 É pertinente aqui a seguinte passagem de Joseph Raz: “A saída para esse impasse, a forma de
reconciliar a existência de uma multiplicidade de interpretações que competem entre si com
a objetividade, dirige-se à idéia que freqüentemente é posta metaforicamente dizendo que ‘o
significado do objeto não está no objeto’. A útil sugestão da metáfora é esta: se a interpretação
depende de algo fora de seu objeto, então, possivelmente, há uma pluralidade de tais objetos
adicionais, os quais dão conta da pluralidade de boas interpretações. O subjetivismo com sua
pretensão de que qualquer interpretação se sustenta é, sem embargo, uma forma extremada de
se entender a metáfora. De acordo com ela, a maneira que qualquer intérprete mira o objeto de
interpretação, em qualquer tempo, como se expressa na interpretação, determina seu significado.
Este é o porque todas as interpretações são igualmente boas quando são boas. Mas a metáfora
mesma permite explicações mais sensatas que identificam outros fatores como os que determinam,
em parte, os significados dos objetos, desta maneira determinam suas interpretações apropriadas”
(RAZ, Joseph. ¿Por Qué Interpretar? Isonomía, México, n. 5, Out.-1996, pp. 29-30).
289 GUASTINI, Ricardo. Das Fontes às Normas. Tradução Edson Bini. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
p. 35. Ver, também: GUASTINI, Ricardo. Teoria e Dogmatica delle Fonti. Milano: Giuffrè, 1998. p.
17; GRAU, Eros Roberto, Ensaio sobre a Interpretação/Aplicação do Direito, 2002, p. 30; GRAU,
Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 153.
290 DWORKIN, Ronald, Taking Rights Seriously, 1999, pp. 279-290. Comentando a teoria de Dworkin,
diz Wayne Morrison: “Talvez a mais controvertida das idéias associadas à obra inicial de Dworkin
esteja em sua afirmação de que a prática jurídica envolve, necessariamente, a aceitação da idéia de
haver sempre uma resposta certa aos dilemas jurídicos e morais. Dworkin apresenta duas maneiras
de se chegar a essa conclusão: (i) uma envolve a afirmação relativamente fraca de que, como a
natureza do direito implica o envolvimento em litígios e sua solução, faz parte do raciocínio prático
do direito o fato de que a resposta a um litígio deve ser clara – se disséssemos o tempo todo ‘está
empatado’, a natureza prática das soluções jurídicas não teria sentido algum.; (ii) a outra consiste
em procurar os pressupostos racionais envolvidos no próprio processo e nas próprias práticas de
argumentação jurídica e política. Dworkin quer que consideremos em profundidade o que os
advogados estão realmente fazendo em termos de prática nos casos difíceis, e nos pede para usar
seu próprio discurso como ponto de partida. O direito parece incerto; não parece haver nenhuma
resposta jurídica óbvia. Qual é, porém, a racionalidade dos diferentes aspectos das práticas sociais
em questão? Vejamos um caso comum. As partes instruíram os advogados e talvez, depois de várias
trocas de cartas, alegações e alegações em contrário, os dois lados decidem resolver a questão em
juízo. Se os dois conjuntos de advogados estiverem agindo como agentes jurídicos sérios (isto é, se
não estiverem às voltas com atos desnecessários), ambas as partes acreditam que estão certas em
sua interpretação e sua crença de que o direito está do seu lado. Na verdade, ambas acreditam que
há uma resposta a ser encontrada, e que se trata de uma resposta jurídica. Por que ir ao tribunal se
você não acredita que seu lado é o certo? Isto é, que seus argumentos podem convencer o juiz
a decidir que o direito é aquilo que você reivindica?” (MORRISON, Wayne. Filosofia do Direito:
Dos Gregos ao Pós-modernismo. Tradução Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes,
2006. pp. 505-506).
291 Cf. STRECK, Lenio Luiz. Verdade e Consenso: Constituição, Hermenêutica e Teorias Discursivas.
Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. pp. 183-195.
292 Nesse mesmo sentido, negando a possibilidade de se alcançar uma única resposta correta
ao cabo da interpretação jurídica, ver: AARNIO, Aulis. Sobre la Ambigüedad Semántica en la
Interpretación Jurídica. Doxa. Cuadernos de Filosofía del Derecho, Alicante, n. 4, 1987, pp. 109-117;
AARNIO, Aulis. La Tesis de la Única Respuesta Correcta y el Principio Regulativo del Razonamiento
Jurídico. Doxa. Cuadernos de Filosofía del Derecho, Alicante, n. 8, 1990, pp. 23-38; BARRAGÁN,
Julia. La Respuesta Correcta Única y la Justificación de la Decisión Jurídica. Doxa. Cuadernos de
Filosofía del Derecho, Alicante, n. 8, 1990, pp. 64-74; FARALLI, Carla. A Filosofia Contemporânea
do Direito: Temas e Desafios. Tradução Candice Premaor Gullo. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
pp. 46-47; KELSEN, Hans, Teoria Pura do Direito, 1984, p. 100-102; FREITAS, Juarez. A Melhor
Interpretação Constitucional versus a Única Resposta Correta. Revista Latino-Americana de Estudos
Constitucionais, Belo Horizonte, n. 2, jul.-dez. 2003, p. 313.
293 MacCORMICK, Neil, Argumentação Jurídica e Teoria do Direito, 2006, p. 321. Ver também: GRAU,
Eros Roberto, Ensaio e Discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito, 2002, pp. 100-102.
294 GRECO, Marco Aurélio. Planejamento Fiscal. São Paulo: Dialética, 2004. p. 377.
295 Leciona Paulo de Barros Carvalho: “A missão do exegeta dos textos jurídico-positivos, ainda que possa
parecer facilitada pela eventual coincidência da mensagem prescritiva com a seqüência das fórmulas
gráficas utilizadas pelo legislador (no direito escrito), oferece ingentes dificuldades, se a proposta for a
de um exame mais sério e atilado. E, sendo o direito um objeto da cultura, invariavelmente penetrado
por valores, teremos, de um lado, as estimativas, sempre cambiantes em função da ideologia de
quem interpreta; de outro, os intrincados problemas que cercam a metalinguagem, também inçada
de dúvidas sintáticas e de problemas de ordem semântica e pragmática.
Tudo isso, porém, não nos impede de declarar que conhecer o direito é, em última análise,
compreendê-lo, interpretá-lo, construindo o conteúdo, sentido e alcance da comunicação
legislada. Tal empresa, que nada tem de singela, como vimos, requer o envolvimento do exegeta
com as proporções inteiras do todo sistemático, incursionando pelos escalões mais altos e de
lá regressando com os vetores axiológicos ditados por juízos que chamamos de princípios”
(CARVALHO, Paulo de Barros. Proposta de Modelo Interpretativo para o Direito Tributário. Revista
de Direito Tributário, São Paulo, n. 70, 1995, pp. 41-42). Para Eros Roberto Grau, “em síntese: a
interpretação do direito tem caráter constitutivo – não, pois, meramente declaratório – e consiste
na produção, pelo intérprete, a partir de textos normativos e dos fatos atinentes a um determinado
caso, de normas jurídicas a serem ponderadas para a solução desse caso, mediante a definição de
uma norma de decisão. Interpretar/aplicar é da concreção [=concretizar] ao direito. Neste sentido,
a interpretação/aplicação opera a inserção do direito na realidade; opera a mediação entre o
caráter geral do texto normativo e sua aplicação particular; em outros termos, ainda: opera a sua
inserção na vida. A interpretação/aplicação vai do universal ao particular, do transcendente ao
contingente; opera a inserção das leis [=do direito] no mundo do ser [=mundo da vida]. Como ela
se dá no quadro de uma situação determinada, expõe o enunciado semântico do texto no contexto
histórico presente, não no contexto da redação do texto. Interpretar o direito é caminhar de um
ponto a outro, do universal ao particular, conferindo a carga de contingencialidade que faltava
para tornar plenamente contingencial o particular” (GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na
Constituição de 1988. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 163).
296 É pertinente transcrever a lição de Luís Roberto Barroso que, embora voltada para a interpretação
constitucional, a este campo não se restringe: “A moderna interpretação constitucional diferencia-
-se da tradicional em razão de alguns fatores: a norma, como relato puramente abstrato, já não
desfruta de primazia; o problema, a questão tópica a ser resolvida passa a fornecer elementos
para a sua solução; o papel do intérprete deixa de ser de pura aplicação da normas preexistente e
passa a incluir uma parcela de criação do Direito do caso concreto. E, como técnica de raciocínio
e de decisão, a ponderação passa a conviver com a subsunção. Para que se legitimem suas
escolhas, o intérprete terá de servir-se dos elementos da teoria da argumentação, para convencer
os destinatários do seu trabalho de que produziu a solução constitucionalmente adequada para
a questão que lhe foi submetida. [...]” (BARROSO, Luís Roberto. Colisão entre Liberdade de
Expressão e Direitos da Personalidade. Critérios de Ponderação. Interpretação Constitucional
adequada do Código Civil e da Lei de Imprensa. In: PEIXINHO, Manoel Messias; GUERRA, Isabella
Franco; NASCIMENTO FILHO, Firly (Orgs.). Os Princípios da Constituição de 1988. 2. ed. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2006. pp. 258-259). Sobre a função criativa da interpretação, ver: RECASÉNS
SICHES, Luis. Nueva Filosofia de la Interpretacion del Derecho. México: Editorial Porrua, 1980. pp.
211-213; COSSIO, Carlos. El Derecho em el Derecho Judicial. Las Lagunas del Derecho. La Valoración
Judicial. Buenos Aires: Librería El Foro, 2002. pp. 121-122; TORRES, Ricardo Lobo, Normas de
Interpretação e Integração do Direito Tributário, 2006, p. 45; LATORRE, Angel, Introdução ao Direito,
2002, p. 109-111; GRAU, Eros Roberto, Ensaio sobre a Interpretação/Aplicação do Direito, 2002,
pp. 73-75; STRECK, Lenio Luiz, Hermenêutica Jurídica e(m) crise: uma exploração hermenêutica
da constituição do direito, 2003, pp. 91-92; SCHROTH, Ulrich. Hermenêutica Filosófica e
Jurídica. In: KAUFMANN, A.; HASSMER, N. (Orgs.). Introdução à Filosofia do Direito e à Teoria do
Direito Contemporâneas. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002. pp. 383-384; GADAMER,
Hans-Georg, Verdade e Método: traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica, 2003, pp.
432-433; LARENZ, Karl, Metodologia da Ciência do Direito, 1997, pp. 283-284; ROSS, Alf, Direito e
Justiça, 2000, p. 139; RADBRUCH, Gustav, Filosofia do Direito, 1997, pp. 230-231; TÔRRES, Heleno
Taveira. Interpretação e Integração das Normas Tributárias – Reflexões e Críticas. In: TÔRRES,
Heleno Taveira (Coord.). Tratado de Direito Constitucional Tributário: Estudos em Homenagem a
Paulo de Barros Carvalho. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 112; CARDOZO, Benjamin N. The Nature
of the Judicial Process. New Haven: Yale University Press, 1991. pp. 112-115; ABRAHAM, Marcus, O
Planejamento Tributário e o Direito Privado, 2007, pp. 118-119.
297 GRAU, Eros Roberto, Ensaio sobre a Interpretação/Aplicação do Direito, 2002, p. 72-73.
298 Marco Aurélio Greco destaca a dificuldade de interpretar o direito com base no instrumental
da lógica binária, em longa passagem a seguir transcrita: “Esta dificuldade enfrentada pela
doutrina tem sua origem na premissa de que seria possível reconduzir roda realidade sempre
a duas categorias opostas e, por consequência, a interpretação deveria orientar-se no sentido
de identificar a qual delas pertenceria o objeto. Esta idéia de interpretar a realidade, inclusive
jurídica, a partir de categorias opostas (lícito/ilícito; direito interno/internacional; vigência/
não-vigência; tributo/não-tributo, etc.) retrata um modelo de compreensão do mundo
apoiado numa lógica bivalente que, em última análise, encontra sua origem no princípio
da não-contradição formulado por Aristóteles. Admitida a idéia de uma lógica bivalente é,
então, possível criar uma tabela de verdade das afirmações feitas sobre a realidade. De fato,
se algo não pode ser e não ser ao mesmo tempo, determinada conduta, se for lícita, não será
ao mesmo tempo ilícita, e assim por diante.
Ocorre que esta visão bivalente está passando por uma profunda revisão. Todo modelo teórico de
compreensão da realidade implica uma simplificação do objeto para fins de permitir seu exame, a
partir de elementos que constituiriam seu núcleo essencial. Esta lógica bivalente (sim/não; certo/
errado; 0/1 etc.) está se demonstrando insuficiente ou inadequada para explicar a realidade por
corresponder a uma simplificação exagerada de um mundo complexo (simplificação, portanto,
irreal).
Aliás, inúmeras são as dificuldades que uma lógica bivalente traz ao intérprete do ordenamento
jurídico positivo (ou seu aplicador) que pretenda utilizá-la rigorosa e cegamente diante de
uma situação concreta. Basta lembrar que, se a experiência jurídica se resumisse a uma lógica
formal redutível a padrões absolutos de verdade, não existiria uma quantidade tão elevada de
divergências e litígios.
Atualmente, estão em andamento vários estudos teóricos que partem de uma lógica não-
-bivalente e que se reúnem no conjunto que se convencionou denominar de “lógicas deviantes”
a que pertence o sistema de lógica fuzzy, particularmente adequado para explicar a experiência
jurídica, pois ela parte da idéia da imprecisão da linguagem e de que – por isso – os conceitos
sempre apresentam certa margem de vaguedade” (GRECO, Marco Aurélio. Planejamento
Tributário. São Paulo: Dialética, 2004. pp. 374-375).
299 KAUFMANN, Arthur. Filosofía del Derecho. Tradução Luis Villar Borda. Bogotá: Universidad
Externado de Colombia, 1999. p. 82.
300 HAACK, Susan. Deviant Logic. Fuzzy Logic. Chicago: The University of Chicago Press, 1996. p. 234.
301 Cf. HAACK, Susan. Filosofia das Lógicas. Tradução Cezar Augusto Mortari; Luiz Henrique de Araújo
Dutra. São Paulo: Editora UNESP, 2002. pp. 222-223.
307 Sobre a jurisdição una pátria, ver: ROCHA, Sergio André. Processo Administrativo Fiscal: Controle
Administrativo do Lançamento Tributário. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. pp. 102-104.
308 Nas palavras de Castanheira Neves: “O centro metodologicamente referente está, pois, no juízo
e não diretamente na norma – a norma será convocada, na sua normatividade, em função da
problemática normativo-jurídica do juízo decisório, i. é, convocada pelas possibilidades que a
sua normatividade ofereça como critério normativo-jurídico para uma normatividade fundada
e problematicamente adequada – e assim com normativo-jurídica justeza – decisão judicativa.
O pensamento jurídico de orientação tradicionalmente hermenêutica via o prius metodológico
na norma, a determinar, por isso mesmo, em termos hermenêuticamente autônomos:
interpretada primeiro a norma na sua autonomia abstrata, antes e independentemente da
sua referência à decisão do caso concreto, seria ela depois ‘aplicada’ ao caso com o sentido
ou a significação daquele modo determinados, sem consideração das exigências justificativas
emergentes do problema do caso decidendo. Eram assim a ‘interpretação’ e a ‘aplicação’ atos
metodologicamente de todo diferentes e autônomos. Pelo contrário, deverá reconhecer-se que
o juízo da realização concreta do direito, e pelas suas exigências normativo-decisórias, é que dá
sentido, conexiona e assimila num processo intencional-metodologicamente unitário todos os
elementos que nele concorrem – daí que a determinação do sentido normativo-jurídico da norma
apenas se consuma no juízo e pelo juízo, só no juízo e pelo juízo a sua normatividade, sempre de
uma aberta indeterminação em abstrato, se vai concretamente determinando. A ‘interpretação’ e
a ‘aplicação’ não podem, pois, separar-se, antes se conjugam numa indissolúvel unidade – melhor,
essa distinção deixa de ter sentido num processo que refere a norma, desde o princípio, em
função do problema judicativo-decisório e realiza o juízo mediante as possibilidades de critério
que para ele ofereça a normatividade da norma” (NEVES, A. Castanheira. O Actual Problema
Metodológico da Interpretação Jurídica – I. Coimbra: Coimbra Editora, 2003. pp. 344-345).
Interpretação dos
Tratados e Solução de
Controvérsias no Direito
Internacional Público
309 Nesse sentido: COMBACAU, Jean; SUR, Serge. Droit International Public. 6. ed. Paris:
Montchrestien, 2004. p. 168.
310 Sobre essa questão, destaca Aurora Ribes Ribes: “Nessa ordem de idéias, a função
interpretativa a que nos referimos corresponde aos Estados partes, constituindo o trabalho
diário dos Ministérios de Assuntos Exteriores. Em princípio, pode-se supor que se o tratado
é expressão da vontade comum de quem o subscreve, estes chegarão a um resultado similar
em suas respectivas interpretações. Todavia, a prática internacional demonstra que são
extraordinariamente numerosas as controvérsias internacionais em razão de divergências
interpretativas. O bom funcionamento das relações internacionais em todos os sentidos
requer, como é evidente, que tais conflitos sejam solucionados posto que, de outra maneira,
isso repercutiria negativamente na aplicação das normas internacionais” (RIBES RIBES, Aurora,
Convenios para Evitar la Doble Imposición Internacional: Interpretación, Procedimiento Amistoso
y Arbitrage, 2003, p. 72).
311 Nesse mesmo sentido, ver: MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Tratados Internacionais. 2. ed. São
Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2004. p. 135.
312 ROUSSEAU, Charles. Droit International Public. Paris: Librarie du Recueil Sirey, 1953. pp. 48-49.
313 Como destaca Paul Reuter: “O fato de que diferentes entidades devam interpretar o tratado não
afeta em princípio a maneira como deve realizar-se a interpretação. O que muda de uma situação
para outra é a amplitude das faculdades do intérprete, e também os efeitos da sua interpretação.
O direito para interpretar um tratado, no que respeita aos governos que são partes em um
tratado não é questionável, mas não se pode dizer o mesmo dos tribunais, cujas faculdades
estabelecidas por sua constituição nacional, variam consideravelmente de um Estado para
outro, e ocasionalmente de um tribunal para outro dentro do mesmo país. [...]” (REUTER, Paul,
Introducción al Derecho de los Tratados, 1999, p. 117). Ver também: VAN RAAD, Kees, International
Coordination of Tax Treaty Interpretation and Application, 2002, pp. 218-219.
314 ACCIOLY, Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E do, Manual de Direito Internacional Público,
2000, p. 33. Esse entendimento encontra eco na doutrina de Verdross (Cf. VERDROSS, Alfred,
Derecho Internacional Publico, 1955, p. 153) e de Julio Diena (Cf. DIENA, Julio. Derecho Internacional
Público. Tradução J. M. Trias de Bes. Barcelona: Bosch, 1946. p. 434). Em sentido contrário:
MONACO, Riccardo. Manuali di Diritto Internazionale Pubblico e Privato. Torino: Editrice Torinese,
1949. p. 315-316.
319 Essa característica foi salientada por Klaus Vogel no que se refere aos tratados tributários. Em
suas palavras: “Como qualquer preceito de Direito Administrativo ou Tributário, devem ser
diferenciados, do ponto de vista sistemático, três níveis no procedimento interpretativo. Em
primeiro lugar, o contribuinte e seu consultor interpretam o acordo, no momento em que
eles entregam a declaração de imposto de renda, ou mesmo antes, quando eles planejam
seus negócios do ponto de vista tributário. O segundo intérprete é, então, a administração
tributária; sua interpretação será a decisiva, caso não se preveja qualquer meio jurídico contra a
sua decisão, caso o contribuinte fique resignado com ela, ou caso a administração tributária e o
contribuinte consigam chegar a um acordo. No caso de ele se valer de um meio jurídico contra
a decisão, então cabe às cortes a decisão, como terceiros intérpretes” (VOGEL, Klaus, Problemas
na Interpretação de Acordos de Bitributação, 2003, p. 966).
320 No campo tributário, essa tendência a uma discordância interpretativa foi apontada por Klaus
Vogel e Rainer Prokisch (Cf. VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., 1993, p. 55) e também por
Kees van Raad (Cf. VAN RAAD, Kees, International Coordination of Tax Treaty Interpretation and
Application, 2002, p. 222).
321 Para uma análise dos reflexos negativos desta característica do Direito Internacional, ver:
MORGENTHAU, Hans. J. A Política entre as Nações: A luta pelo poder e pela paz. Tradução Oswaldo
Biato. Brasília: UNB, 2003. pp. 521-523.
322 Sobre o tema ver, por todos: SANTIAGO, Igor Mauler. Direito Tributário Internacional: Métodos
de Solução dos Conflitos. São Paulo: Quartier Latin, 2006.
323 MIRANDA, Jorge, Curso de Direito Internacional Público, 2002, p. 129. Nesse sentido: REZEK, J. F.,
Direito Internacional Público, 2000, pp. 91-92. Em sentido contrário, José Augusto Fontoura Costa
sustenta que “a interpretação dos tratados deve apresentar características peculiares, seguindo,
portanto, métodos específicos” (COSTA, José Augusto Fontoura. Normas de Direito Internacional:
Aplicação Uniforme do Direito Uniforme. São Paulo: Atlas, 2000. p. 126).
324 Cf. PEREIRA, André Gonçalves; QUADROS, Fausto de, Manual de Direito Internacional Público,
2002, p. 241; GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito Internacional Público, 2005, pp. 210-211;
REIMER, Ekkehart. Interpretation of Tax Treaties. European Taxation, Dec. 1999, p. 459.
325 Cf. RAMOS, André de Carvalho. Teoria Geral dos Direitos Humanos na Ordem Internacional. Rio
de Janeiro: Renovar, 2005. p. 93-120; TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de Direito
Internacional dos Direitos Humanos. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1999. v. II. p. 32
326 REZEK, J. F., Direito Internacional Público, 2000, p. 92.
327 Nas palavras de Jorge Bacelar Gouveia, “a CVDTE, como vai sucedendo cada vez mais com
outros instrumentos convencionais emblemáticos, para muitos Estados que não emitiram uma
vontade de ratificar ou de aderir, pode bem ser considerada globalmente vinculativa como
em países em que a mesma não tenha sido ratificada, sua aplicação no Brasil
se daria como costume internacional.
Tal posicionamento foi sustentado por G. E. do Nascimento e Silva, Chefe
da Delegação do Brasil à Conferência de Viena sobre o Direito dos Tratados,
conforme se pode inferir da passagem abaixo transcrita:
Dentro desta linha de considerações, é importante também prever as
consequências da Convenção sobre o Direito dos Tratados, mesmo
no tocante àqueles Estados que não a ratificaram ou aceitaram. De
conformidade com as normas de direito internacional vigentes, em
tal caso, as relações entre dois ou mais Estados serão reguladas pelo
direito internacional consuetudinário. Mas cumpre não perder de vista
que até 1968-1969 o direito costumeiro a respeito caracterizava-se
por inúmeras incertezas; com a existência da Convenção, mesmo
não-ratificada ou mesmo antes de sua entrada em vigor, a doutrina
e a prática internacionais poderão indicar a Convenção como a
consolidação do direito internacional em matéria de tratados. Não
poderá ser invocada com o mesmo rigor, mas passará a constituir
a principal fonte a respeito, mesmo dentre os Estados a ele não
vinculados. Neste sentido, cumpre lembrar que o artigo 38 da
328 NASCIMENTO E SILVA, G. E. do. Conferência de Viena sobre o Direito dos Tratados. Brasília: Ministério
das Relações Exteriores, 1971. p. 56.
329 GUTMANN, Daniel. Tax Treaty Interpretation in France. In: LANG, Michael (Coord.). Tax Treaty
Interpretation. The Hage: Kluwer Law International, 2000. p. 107.
330 ENGELEN, Frank, Interpretation of Tax Treaties under International Law, 2004, pp. 54-57.
331 TÔRRES, Heleno, Pluritributação Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, p. 650.
332 TORRES, Ricardo Lobo, Normas de Interpretação e Integração do Direito Tributário, 2006, p. 21.
Ver, ainda: RIBEIRO, Ricardo Lodi. Justiça, Interpretação e Elisão Tributária. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2003. p. 124; LIMA, Maria Ednalva de. Interpretação e Direito Tributário. Rio de Janeiro:
Forense, 2004. p. 170; GIANNINI, Massimo Severo. Scritti. Milano: Giuffrè, 2000. v. I. p. 47;
HARTZ, Wilhelm. Interpretação da Lei Tributária. Tradução Brandão Machado. São Paulo: Resenha
Tributária, 1993. pp. 58-59.
333 ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. Interpretação e Aplicação de Normas de Direito Tributário. São
Paulo: Editora CID, 2002. p. 200. Em sentido contrário é a posição de Ruy Barbosa Nogueira,
anterior ao Código Tributário Nacional, embora destaque este a ressalva de Massimo Severo
Giannini, a qual se encontra em linha com a posição sustentada neste estudo: “Como não foram
ainda promulgadas normas gerais em obediência a essa outorga constitucional, não temos assim
uma legislação ordinária que trace mais detalhes ou complemente as normas constitucionais
tributárias vigentes, sabendo-se que, lamentavelmente, o projeto do Código Tributário Nacional
se encontra no Congresso, com sua tramitação quase paralisada, desde 1954.
Se existem em alguns regulamentos tributários normas específicas da técnica de sua aplicação
(por exemplo os arts. 10 a 12 da atual Lei do Imposto de Consumo ou o cap. IV da vigente Tarifa das
Alfândegas), não há, entretanto, em nosso país, disposições legais sobre critérios de interpretação
a serem empregados no campo tributário, como os há, por exemplo, na Alemanha.
É verdade que certos autores condenam mesmo a elevação de critérios interpretativos à categoria
de normas, achando mais conveniente que esta matéria fique somente a cargo da doutrina.
Veja-se, por exemplo, a crítica do Prof. Massimo Severo Giannini ao célebre § 9º do Código
Tributário da Alemanha: ‘Em si, portanto, o parágrafo, aparecera como uma daquelas tantas
normas com que os ordenamentos pretendem disciplinar a técnica interpretativa, quando isto
é, ao reverso, campo que refoge a qualquer normalização, em que todo dispositivo desse gênero
se torna supérfluo, e mesmo inútil, por necessariamente incompleto’” (NOGUEIRA, Ruy Barbosa.
Da Interpretação e Aplicação das Leis Tributárias. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1965. pp.
14-15). As normas interpretativas também são defendidas por Emilio Betti, que lhes dedica um
capítulo inteiro de sua obra sobre interpretação (Cf. BETTI, Emilio. Interpretación de la Ley y de los
Actos Jurídicos. Tradução José Luis de los Mozos. Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado,
[s/d]. pp. 217-232). Escrevendo antes da CVDT, Dionisio Anzilotti sustentava a necessidade de
uma harmonização das regras de interpretação no Direito Internacional, como forma de se evitar
que cada Estado interpretasse o tratado de acordo com sua própria tradição metodológica (Cf.
ANZILOTTI, Dionisio. Corso di Diritto Internazionale. 4. ed. Padova: CEDAM, 1964. v. I. p. 104). Para
uma análise dos debates acerca da inclusão de regras interpretativas na CVDT, ver: NASCIMENTO
E SILVA, G. E. do., Conferência de Viena sobre o Direito dos Tratados, 1971, pp. 32-34.
334 BROWNLIE, Ian, Princípios de Direito Internacional Público, 1997, p. 650. Em sentido contrário,
destacando a relevância das regras de interpretação no campo do Direito Internacional, ver:
BELLO, Andrés. Principios de Derecho Internacional. Buenos Aires: Editorial Atalaya, 1946. p. 233.
335 TORRES, Ricardo Lobo, Normas de Interpretação e Integração do Direito Tributário, 2006, pp. 22-23.
Artigo 32
Meios Suplementares de Interpretação
Pode-se recorrer a meios suplementares de interpretação, inclusive aos
Artigo 33
Interpretação de Tratados Autenticados em Duas ou Mais Línguas
1. Quando um tratado foi autenticado em duas ou mais línguas, seu
texto faz igualmente fé em cada uma delas, a não ser que o tratado
disponha ou as partes concordem que, em caso de divergência,
prevaleça um texto determinado.
2. Uma versão do tratado em língua diversa daquelas em que o texto
foi autenticado só será considerada texto autêntico se o tratado o
previr ou as partes nisso concordarem.
3. Presume-se que os termos do tratado têm o mesmo sentido nos
diversos textos autênticos.
4. Salvo o caso em que um determinado texto prevalece nos termos do
parágrafo 1, quando a comparação dos textos autênticos revela uma
diferença de sentido que a aplicação dos artigos 31 e 32 não elimina,
adotar-se-á o sentido que, tendo em conta o objeto e a finalidade do
tratado, melhor conciliar os textos.
Verifica-se que se encontram contemplados nos artigos acima os principais
elementos de interpretação, seguindo a metodologia desenvolvida a partir da
teoria de Savigny, conforme se passa a analisar.
3.5.1.1. O ELEMENTO GRAMATICAL
O texto é o ponto de partida de qualquer esforço hermenêutico, servindo,
ainda, de limite ao labor interpretativo336. Como destaca Karl Larenz, “toda
336 Vale mencionar a advertência feita por Eusebio Gonzáles García, para quem “a interpretação
é algo elástico, como uma mola que pode esticar e encurtar, mas sempre tem um limite além
do qual não pode dilatar-se ou encolher-se, este limite é a letra da lei” (GONZÁLES, Eusebio.
Interpretación de las Normas Tributarias. Revista de Direito Tributário, São Paulo, n. 76, 1999,
p. 20).
337 LARENZ, Karl, Metodologia da Ciência do Direito, 1997, pp. 450-451.
338 Cf. PEREIRA, André Gonçalves; QUADROS, Fausto de, Manual de Direito Internacional Público,
2002, p. 242; GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito Internacional Público, 2005, p. 210.
339 Esse cânone já era sustentado por Oppenheim (Cf. OPPENHEIM, L., International Law: A Treatise,
1952, p. 858).
340 Sobre o pluralismo metodológico na interpretação do tratados internacionais em geral, ver:
COMBACAU, Jean; SUR, Serge, Droit International Public, 2004, p. 174. Sobre o pluralismo
metodológico na interpretação das CDTRs, ver: RIBES RIBES, Aurora, Convenios para Evitar la Doble
Imposición Internacional: Interpretación, Procedimiento Amistoso y Arbitrage, 2003, p. 84. Sobre o
pluralismo metodológico na interpretação das leis tributárias, ver: VANONI, Ezio, Natureza e
Interpretação das Leis Tributárias, [s/d], p. 209; TORRES, Ricardo Lobo, Normas de Interpretação
e Integração do Direito Tributário, 2006, pp. 153-154; ROTHMANN, Gerd W., Interpretação e
Aplicação de Acordos Internacionais contra a Bitributação, 1978, p. 121; PIJL, Hans, The Theory of
the Interpretation of Tax Treaties, with Reference to Dutch Practice, 1997, p. 541.
341 ENGELEN, Frank, Interpretation of Tax Treaties under International Law, 2004, p. 141. No mesmo
sentido: VOGEL, Klaus, Introduction, 1997, p. 37. Sobre as implicações texto-contexto, ver:
ALMEIDA JÚNIOR, Fernando Osório de. Interpretação Conforme a Constituição e Direito Tributário.
São Paulo: Dialética, 2002. pp. 38-39.
342 VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., General Report, 1993, p. 68.
343 CASADEVANTE ROMANÍ, Carlos Fernandez de. Interpretación de las Normas Internacionales.
Panplona: Aranzadi, 1996. p. 85.
344 Sobre o tema, ver: VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., General Report, 1993, p. 62; VAN RAAD,
Kees, International Coordination of Tax Treaty Interpretation and Application, 2002, p. 224; TÔRRES,
um projeto de fácil realização, tendo em vista que a linguagem pode até ser
internacional, porém o horizonte hermenêutico do intérprete será sempre a
sua própria cultura.
Não se pode deixar de mencionar, ainda, a existência de um complicador
que não pode ser ignorado: o fato de normalmente encontrarem-se os tratados
internacionais vertidos em mais de uma língua.
Essa questão, objeto de regramento específico no artigo 33 da CVDT
torna ainda mais difícil a noção de uma linguagem comum, já que esta teria
que superar não apenas as barreiras culturais das distintas pré-compreensões
dos intérpretes de cada Estado, mas também as próprias diferenças das línguas
em que vertidos os textos que servirão de base para o labor interpretativo.
Diante dos comentários anteriores deve-se ter em conta, partindo das
lições de Karl Larenz, que:
A flexibilidade, a riqueza de cambiantes e a capacidade de adaptação
da linguagem geral constituem ao mesmo tempo a sua força e a
sua fraqueza, o que tem como consequência que do uso linguístico,
apenas, não se obtém um sentido literal inequívoco. Em lugar disso,
encontramos um número maior ou menor de significados possíveis
e de variantes de significado, a partir donde aquilo que é pensado em
concreto só se obtém com base na conexão do discurso, da coisa de
que ele trata ou das circunstâncias acompanhantes. [...].345
Em conclusão, reitera-se que a interpretação realiza-se a partir do texto
do tratado internacional, mas a atribuição de sentido ao mesmo depende de
outros fatores além da mera análise linguística de seus termos, de forma que
a construção da regra constante no tratado depende da conjugação de outros
elementos de interpretação.
3.5.1.2. ELEMENTO SISTEMÁTICO (O CONTEXTO DOS TRATADOS)
Socorrendo-nos uma vez mais nas lições de Karl Larenz é possível afirmar
que “qual, de entre as múltiplas variantes de significado que podem corresponder
a um termo segundo o uso da linguagem, deva em cada caso ser considerada
Heleno, Pluritributação Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, pp. 659-660; PROKISCH,
Rainer. Does it Make Sense if we Speak of an “International Tax Language”? In: VOGEL, Klaus
(Coord.). Interpretation of Tax Law and Treaties and Transfer Pricing in Japan and Germany. The Hage:
Kluwer Law International, 1998. pp. 103-110.
345 LARENZ, Karl, Metodologia da Ciência do Direito, 1997, pp. 451-452.
resulta, em regra, se bem que não sempre, com a maior exatidão possível do
contexto em que aquela é usada”. Na seara internacional afirmam Dinh, Daillier
e Pellet, com propriedade, que o texto é “indissociável do contexto”346. Conforme
destaca Gerd Rothmann:
Os termos não devem ser tomados isoladamente, mas sim no seu
contexto, que pode atribuir-lhes um significado diferente ou particular.
O contexto é o conjunto do tratado, cada uma de suas partes e todas
elas interrelacionadas em sí. O exame do contexto leva a examinar
também os fins e o objeto do tratado. O contexto abrange todo o
tratado, constituído do corpo, do preâmbulo e dos anexos347.
O artigo 31, item 2, da CVDT atribuiu papel de destaque ao contexto em
que se encontra inserido o tratado internacional, mencionando expressamente
que fazem parte de tal contexto, além do texto, seu preâmbulo e anexos:
a) qualquer acordo relativo ao tratado e feito entre todas as partes
em conexão com a sua conclusão; e
b) qualquer instrumento estabelecido por uma ou várias partes em
conexão com a conclusão do tratado e aceito pelas outras partes
como instrumento relativo ao tratado.
Além disso, o item 3 desse mesmo artigo determina que “serão levados
em consideração, juntamente com o contexto:
a) qualquer acordo posterior entre as partes relativo à interpretação
do tratado ou à aplicação de suas disposições;
b) qualquer prática seguida posteriormente na aplicação do
tratado, pela qual se estabeleça o acordo das partes relativo à sua
interpretação; e
346 DINH, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain, Direito Internacional Público, 2003, p.
266. No mesmo sentido: VISSCHER, Charles de. Problèmes D’interprétation Judiciaire em Droit
International Public. Paris: Éditions A. Pedone, 1963. p. 59.
347 ROTHMANN, Gerd W., Interpretação e Aplicação de Acordos Internacionais contra a Bitributação,
1978, p. 172. Salienta Humberto Ávila que “os argumentos contextuais dizem respeito às outras
normas que, juntamente com a norma objeto de interpretação, fazem parte do sistema jurídico
e devem ser consideradas na interpretação” (ÁVILA, Humberto. Argumentação Jurídica e a
Imunidade do Livro Eletrônico. In: TORRES, Ricardo Lobo (Org.). Temas de Interpretação do
Direito Tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 121). Nas palavras de Ruy Barbosa Nogueira “o
Direito não é escrito apenas por meio de textos mas também de contextos, ou textos interligados,
compondo uma estrutura ou sistema de normas gerais, especiais e específicas” (NOGUEIRA, Ruy
Barbosa. Curso de Direito Tributário. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 1994. p. 91).
348 Cf. PEREIRA, André Gonçalves; QUADROS, Fausto de, Manual de Direito Internacional Público,
2002, p. 241; GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito Internacional Público, 2005, p. 211;
CALIENDO, Paulo, Estabelecimentos Permanentes em Direito Tributário Internacional, 2005, p. 265.
349 Cf. CASADEVANTE ROMANÍ, Carlos Fernandez de, Interpretación de las Normas Internacionales,
1996, pp. 89-91.
350 Sobre a interpretação autêntica dos tratados internacionais, vale a pena mencionar a lição de
Francisco Rezek: “Quando proporcionada pelas próprias partes pactuantes, a interpretação
se diz autêntica. A voz das partes, no caso, é a dos respectivos governos, visto que tribunais e
parlamentos não se exprimem na cena internacional. Essa interpretação autêntica pode tomar a
forma de um novo acordo, de índole puramente interpretativa: é esse um dos poucos casos em
que um sistema constitucional como o do Brasil pode tolerar o acordo executivo, não sujeito à
aprovação do Congresso Nacional” (REZEK, J. F., Direito Internacional Público, 2000, p. 90). Julio
Diena destaca que “os melhores intérpretes dos tratados são as mesmas partes contratantes as
quais, se conseguem se por de acordo sobre o ponto controvertido, realizam uma interpretação
que se pode chamar autêntica” (DIENA, Julio, Derecho Internacional Público, 1946, p. 434). Sobre
a interpretação autêntica, ver ainda: ANZILOTTI, Dionisio, Corso di Diritto Internazionale, 1964,
101-102.
351 ENGELEN, Frank, Interpretation of Tax Treaties under International Law, 2004, p. 200.
354 Cf. ENGELEN, Frank, Interpretation of Tax Treaties under International Law, 2004, p. 220.
355 ENGELEN, Frank, Interpretation of Tax Treaties under International Law, 2004, p. 241.
356 Cf. GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito Internacional Público, 2005, p. 211; PEREIRA,
André Gonçalves; QUADROS, Fausto de, Manual de Direito Internacional Público, 2002, p. 242;
CASADEVANTE ROMANÍ, Carlos Fernandez de, Interpretación de las Normas Internacionales,
1996, p. 93; REIMER, Ekkehart. Tax Treaty Interpretation in Germany. In: LANG, Michael (Coord.).
Tax Treaty Interpretation. The Hage: Kluwer Law International, 2000. p. 126; ENGELEN, Frank,
Interpretation of Tax Treaties under International Law, 2004, p. 172.
Os fins que o legislador intenta realizar por meio da lei são em muitos
casos, ainda que não em todos, fins objetivos do Direito, como a
manutenção da paz e a justa resolução dos litígios, o “equilíbrio” de
uma regulação no sentido da consideração otimizada dos interesses
que se encontram em jogo, a proteção dos bens jurídicos e um
procedimento judicial justo. Além disso, todos nós aspiramos a
uma regulação que seja “materialmente adequada”. Só quando se
supuser esta intenção da parte do legislador se chegará, por via da
interpretação, a resultados que possibilitam uma solução “adequada”
também no caso concreto.
Deste modo resultam dois grupos de critérios de interpretação
teleológico-objetivos, que têm que ser decisivos em todos aqueles
casos em que os critérios até agora discutidos não sejam capazes
ainda de dar uma resposta isenta de dúvidas. Por um lado, trata-se
das estruturas do âmbito material regulado, dados factuais, em relação
aos quais nem o legislador pode alterar o que quer que seja, e que
ele toma em consideração de modo racional a propósito de qualquer
regulação; por outro lado, trata-se dos princípios ético-jurídicos, que
estão antepostos a uma regulação, nos quais a referência de sentido
dessa regulação à ideia de Direito se torna apreensível, manifesta.
Chamo-os de teleológico objetivos porque não dependem de se o
legislador sempre teve consciência da sua importância para a regulação
por ele conformada, conquanto esta só se deixe compreender na sua
globalidade enquanto por eles condicionada.357
A respeito do uso do elemento teleológico de interpretação no campo do
Direito Internacional Público, trazemos a seguinte passagem de Ian Brownlie:
A Comissão do Direito Internacional e a Convenção de Viena
restringiram prudentemente a abordagem textual ao permitirem o
recurso a outros meios de interpretação quando aquela “conduz a um
resultado que é manifestamente absurdo ou desrazoável à luz do objeto
e do fim do tratado”. Algo distinto deste processo é a abordagem
teleológica, mais radical, segundo a qual um tribunal determina qual
o objeto e fim do tratado, resolvendo então qualquer ambiguidade do
sentido através da importação da substância “necessária” para atribuir
efeitos aos fins do tratado. Tal pode implicar uma implementação
366 Vale a pena transcrever aqui o magistério de Ricardo Lobo Torres o qual, embora tendo o
Direito Tributário como ponto de partida, pode ser aplicado a todo e qualquer ramo jurídico:
“A interpretação do Direito Tributário se subordina ao pluralismo metodológico. Inexiste a
prevalência de um único método. Tampouco ocorre a duplicidade imaginada pelo CTN, em
que o método sistemático se aplica aos conceitos de estatura constitucional e o teleológico aos
conceitos da legislação ordinária. O que se observa é a pluralidade e a equivalência, sendo os
métodos aplicados de acordo com o caso e com os valores ínsitos na norma: ora se recorre ao
método sistemático, ora ao teleológico, ora ao histórico, até porque não são contraditórios, mas
se complementam e se intercomunicam. [...] Os métodos de interpretação, por conseguinte,
devem ser estudados dentro da visão pluralista. Entre eles não existe hierarquia. Têm igual
peso, variando a sua importância de acordo com o caso e com as valorações jurídicas na época
da aplicação, como sempre reconheceu a doutrina não extremada, seja no Direito em geral,
seja nos ramos especializados do Constitucional e do Tributário. [...]” (TORRES, Ricardo Lobo,
Normas de Interpretação e Integração do Direito Tributário, 2006, pp. 153-154). Não discrepam
desse entendimento Dihn, Dailler e Pellet, ao afirmarem que “muito mais do que ao espírito
geométrico, a interpretação dos tratados faz apelo ao espírito de sutileza. Os diversos meios e
métodos descritos supra constituem mais diretrizes gerais do que regras rígidas. Compete ao
intérprete aplicá-las com flexibilidade e ordená-las. Fá-lo em função de considerações muito
diversas que se prestam mal a uma síntese e, se a doutrina se divide a esse respeito em escolas
de pensamento muito claramente caracterizadas, podemos melhor extrair da prática o esboço
de certas tendências gerais” (DINH, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain, Direito
Internacional Público, 2003, p. 269).
367 Sobre a utilização dos trabalhos preparatórios como elemento de interpretação, ver: OPPENHEIM,
L., International Law: A Treatise, 1952, pp. 862-863; MONACO, Riccardo; Manuali di Diritto
Internazionale Pubblico e Privato, 1949, p. 318; NASCIMENTO E SILVA, G. E. do., Conferência de
Viena sobre o Direito dos Tratados, 1971, p. 36.
368 VISSCHER, Charles de, Problèmes D’interprétation Judiciaire em Droit International Public, 1963, p.
74.
369 VISSCHER, Charles de, Problèmes D’interprétation Judiciaire em Droit International Public, 1963,
pp. 114-115.
370 PEREIRA, André Gonçalves; QUADROS, Fausto de, Manual de Direito Internacional Público, 2002,
p. 241.
371 GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito Internacional Público, 2005, pp. 211-212. Nesse sentido
também: PEREIRA, André Gonçalves; QUADROS, Fausto de, Manual de Direito Internacional
Público, 2002, p. 241.
372 ZOLLER, Elisabeth. La Bonne Foi en Droit International Public. Paris: Éditions A. Pedone, 1977.
pp. 202-205.
373 ZOLLER, Elisabeth, La Bonne Foi en Droit International Public, 1977, p. 205.
374 ZOLLER, Elisabeth, La Bonne Foi en Droit International Public, 1977, p. XXI.
375 Cf. ENGELEN, Frank, Interpretation of Tax Treaties under International Law, 2004, p. 125; VISSCHER,
Charles de, Problèmes D’interprétation Judiciaire em Droit International Public, 1963, p. 50.
376 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira, Curso de Direito Internacional Público, 2006, pp. 139-140.
377 RUBINSTEIN, Flávio. Interpretação e Aplicação dos Acordos de Bitributação: o Papel da Boa-fé
Objetiva. Revista de Direito Tributário Internacional, São Paulo, n. 3, jun. 2006, p. 70.
378 Cf. ACCIOLY, Hildebrando, Tratado de Direito Internacional Público, 1956, pp. 628 e 629.
379 Ver: CASELLA, Paulo Borba. Comunidade Européia e seu Ordenamento Jurídico. São Paulo: Ltr, 1994.
pp. 119-121; DROMI, Roberto; EKMEKDJIAN, Miguel A.; RIVERA, Julio C., Derecho Comunitario,
1996, p. 590; CASTILLO, Antonio López. Constitución e Integración. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 1996. p. 45-62.
380 REZEK, J. F., Direito Internacional Público, 2000, p. 327. Charles Rousseau caracteriza este tipo de
divergência como sendo de ordem jurídica (Cf. ROUSSEAU, Charles. Droit International Public.
Paris: Librarie du Recueil Sirey, 1953. p. 477). Tratando do mesmo tema, sob a ótica do Direito
Tributário Internacional, Igor Mauler Santiago afirma que “os conflitos atinentes ao direito
tributário internacional decorrem basicamente, não exclusivamente, da interpretação dos
tratados contra a dupla tributação internacional. Pode ser que um país interprete o tratado
de um jeito, um outro contratante de outra maneira, e aí, apesar do tratado que se voltava
a evitar a dupla tributação, ou que se voltava a evitar a dupla não-tributação, teremos dupla
tributação ou dupla não-tributação” (SANTIAGO, Igor Mauler. Arbitragem Tributária Interna
e Internacional. Revista Internacional de Direito Tributário, Belo Horizonte, v. 6, jul-dez 2006,
p. 126).
381 MIRANDA, Jorge, Curso de Direito Internacional Público, 2002, p. 254.
382 Cf. REZEK, J. F., Direito Internacional Público, 2000, p. 330-357; PEREIRA, Bruno Yepes, Curso de
Direito Internacional Público, 2006, p. 200-211; SANTIAGO; Igor Mauler. Métodos de Solução
de Conflitos Fundados em Convenções contra a Dupla Tributação da Renda. In: TÔRRES,
Heleno (Coord.). Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
p. 673; HUSEK, Carlos Roberto, Curso de Direito Internacional Público, 2006, pp. 222-227;
MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. 15. ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004. v. II. p. 1426. Essa classificação é acolhida por Valerio de Oliveira Mazzuoli, que
acrescenta uma quarta categoria, a dos meios quase-jurisdicionais de solução de controvérsias,
onde se enquadraria a arbitragem (Cf. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira, Curso de Direito
Internacional Público, 2006, pp. 625-627). Para uma análise das distintas classificações dos
meios pacíficos de solução de controvérsias, ver: ARANA, Josycler. Uma Breve Apresentação
dos Meios Pacíficos de Solução de Controvérsias no Direito Internacional na Atualidade. In:
ARANA, Josycler; CACHAPUZ, Rozane da Rosa (Coords.). Direito Internacional: Seus Tribunais
e Meios de Solução de Conflitos. Curitiba: Juruá, 2007. pp. 152-153.
383 Sobre o tema, ver: ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim, Curso de Direito Internacional Público, 1995,
pp. 331-337; MELLO, Celso D. de Albuquerque, Curso de Direito Internacional Público, 2004, pp.
1459-1468.
384 Cf. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira, Curso de Direito Internacional Público, 2006, p. 624; SANTIAGO,
Igor Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos, 2006, p. 122;
REZEK, J. F., Direito Internacional Público, 2000, p. 329.
385 Afirma Hildebrando Accioly que “o meio usual, o geralmente o de melhores resultados para
a solução de divergências entre Estados, é o da negociação direta entre as partes” (ACCIOLY,
Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E do, Manual de Direito Internacional Público, 2000,
p. 401).
386 DINH, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain, Direito Internacional Público, 2003, p. 844.
Ver também: SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos
Conflitos, 2006, pp. 124-126; MIRANDA, Jorge, Curso de Direito Internacional Público, 2002, p.
262; GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito Internacional Público, 2005, p. 553; ARAÚJO,
Luis Ivani de Amorim, Curso de Direito Internacional Público, 1995, p. 317; RODRÍGUEZ CARRÍON,
Alejandro J. Lecciones de Derecho Internacional Públicos. 6. ed. Madrid: Tecnos, 2006. p. 505.
387 Cf. ACCIOLY, Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E do, Manual de Direito Internacional Público,
2000, p. 405; SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos
Conflitos, 2006, p. 124; REZEK, J. F., Direito Internacional Público, 2000, p. 333; ARAÚJO, Luis Ivani
de Amorim, Curso de Direito Internacional Público, 1995, p. 319.
388 Cf. GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito Internacional Público, 2005, p. 553; ACCIOLY,
Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E do, Manual de Direito Internacional Público, 2000, p.
402; MELLO, Celso D. de Albuquerque, Curso de Direito Internacional Público, 2004, p. 1428; DINH,
Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain, Direito Internacional Público, 2003, p. 849; REZEK, J.
F., Direito Internacional Público, 2000, p. 332; SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário Internacional:
Métodos de Solução dos Conflitos, 2006, p. 126; ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim, Curso de Direito
Internacional Público, 1995, p. 318; VERDROSS, Alfred, Derecho Internacional Publico, 1955, p. 347;
SCELLE, Georges. Droit International Public. Paris: Les Éditions DomatMontchrestien, [s/d]. p. 536;
RODRÍGUEZ CARRÍON, Alejandro J., Lecciones de Derecho Internacional Públicos, 2006, pp. 506-507.
389 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira, Curso de Direito Internacional Público, 2006, p. 628. Ver também:
DINH, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain, Direito Internacional Público, 2003, p.
-849; MELLO, Celso D. de Albuquerque, Curso de Direito Internacional Público, 2004, pp. 1459-
1468; MIRANDA, Jorge, Curso de Direito Internacional Público, 2002, p. 262; GOUVEIA, Jorge
Bacelar, Manual de Direito Internacional Público, 2005, p. 554; SANTIAGO, Igor Mauler, Direito
Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos, 2006, pp. 127-128; ARAÚJO, Luis
Ivani de Amorim, Curso de Direito Internacional Público, 1995, p. 318; VERDROSS, Alfred, Derecho
Internacional Publico, 1955, p. 348; ROUSSEAU, Charles, Droit International Public, 1953, p. 480;
SCELLE, Georges, Droit International Public, [s/d], p. 536.
390 Cf. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira, Curso de Direito Internacional Público, 2006, pp. 628-629;
PEREIRA, Bruno Yepes, Curso de Direito Internacional Público, 2006, p. 203; SANTIAGO, Igor
Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos, 2006, pp. 128-129;
REZEK, J. F., Direito Internacional Público, 2000, p. 335; GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito
Internacional Público, 2005, p. 554; DINH, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain, Direito
Internacional Público, 2003, p. 852; RODRÍGUEZ CARRÍON, Alejandro J., Lecciones de Derecho
Internacional Públicos, 2006, p. 507.
391 Cf. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira, Curso de Direito Internacional Público, 2006, p. 629; PEREIRA, Bruno
Yepes, Curso de Direito Internacional Público, 2006, p. 203; SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário
Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos, 2006, p. 129-130; REZEK, J. F., Direito Internacional
Público, 2000, p. 336; GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual de Direito Internacional Público, 2005, p. 554;
DINH, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain, Direito Internacional Público, 2003, p. 850.
392 Cf. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira, Curso de Direito Internacional Público, 2006, pp. 630-633;
PEREIRA, Bruno Yepes, Curso de Direito Internacional Público, 2006, p. 203-205; SANTIAGO, Igor
Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos, 2006, pp. 130-135;
REZEK, J. F., Direito Internacional Público, 2000, pp. 336-338; GOUVEIA, Jorge Bacelar, Manual de
Direito Internacional Público, 2005, p. 554; DINH, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain,
Direito Internacional Público, 2003, pp. 855-878.
393 CÂMARA, Alexandre Freitas. Arbitragem. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2002. pp. 9-10. Ver
ainda: SZKLAROWSKY, Leon Frejda. Arbitragem – Uma Nova Visão. Revista Tributária e de Finanças
399 Cf. REZEK, J. F., Direito Internacional Público, 2000, pp. 3346-357; DINH, Nguyen Quoc; DAILLER,
Patrick; PELLET, Alain, Direito Internacional Público, 2003, pp. 907-917; SANTIAGO, Igor Mauler,
Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos, 2006, pp. 154-168; GOUVEIA,
Jorge Bacelar, Manual de Direito Internacional Público, 2005, pp. 557-560. Sobre a corte, ver:
CASELLA, Paulo Borba; MÜLLER, Leonardo. Corte Internacional de Justiça. In: ARANA, Josycler;
CACHAPUZ, Rozane da Rosa (Coords.). Direito Internacional: Seus Tribunais e Meios de Solução
de Conflitos. Curitiba: Juruá, 2007. pp. 279-325.
400 Segundo Francisco Rezek, “quando proporcionada pelas próprias partes pactuantes, a
interpretação se diz autêntica. A voz das partes, no caso, é a dos respectivos governos, visto que
tribunais e parlamentos não se exprimem na cena internacional. Essa interpretação autêntica
pode tomar a forma de um novo acordo, de índole puramente interpretativa: é este um dos
poucos casos em que um sistema constitucional como o do Brasil pode tolerar o acordo
executivo, não sujeito à aprovação do Congresso Nacional” (REZEK, J. F., Direito Internacional
Público, 2000, p. 90). Essa mesma lição é encontrada em Hildebrando Accioly, para quem
“pode dizer-se que existe um princípio geralmente admitido e contra o qual nada há de opor:
é que ninguém tem mais competência para interpretar um tratado do que as próprias partes
contratantes: são estas os intérpretes naturais dos tratados. Sua interpretação, aliás, é chamada
autêntica, não só por ser dos próprios autores, mas ainda no sentido de que é certa e digna de
crédito, por provir de quem tinha mais autoridade para fornecê-la. Assim, quando elas adotam
uma interpretação, não se deve procurar outra” (ACCIOLY, Hildebrando, Tratado de Direito
Internacional Público, 1956, pp. 624-625). Clovis Bevilaqua evidencia que apenas a interpretação
levada a efeitos pelos Estados contratantes tem caráter autêntico, não tendo tal caráter, por
403 MELLO, Celso D. de Albuquerque, Curso de Direito Internacional Público, 2004, p. 257.
404 Em sentido contrário é a lição de Lafayete Rodrigues Pereira: “O poder judiciário é obrigado a
cumprir e observar nas suas decisões e julgados as cláusulas dos tratados que contém princípios
e regras referentes aos assuntos de sua competência, como são as que consagram disposições
sobre o direito criminal, sobre direitos e interesses particulares. No desempenho deste dever
é evidente que ele não pode deixar de interpretar as cláusulas dos tratados, porque ninguém
pode executar e aplicar leis ou contratos sem previamente entende-los. É esta a interpretação
denominada usual, a qual entra na atribuição de toda autoridade, a quem incumbe executar
leis e convenções.
Mas se ocorrerem dúvidas sobre a inteligência das cláusulas por obscuridade, lacuna,
amphibologia ou impropriedade de expressão; se o governo entende que o poder judiciário
dá aos tratados inteligência errônea, ou se a inteligência pelo mesmo poder dada, é contestada
pela nação que é parte no tratado: ao governo, que é órgão das relações exteriores, compete
indubitavelmente fixar a inteligência que reputa verdadeira e o poder judiciário é obrigado a
segui-la e observar nas suas decisões. [...]” (PEREIRA, Lafayete Rodrigues. Princípios de Direito
Internacional. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos Editor, 1902. pp. 348-349).
405 Asseveram Dihn, Dailler e Pellet: “[...] as autoridades nacionais são freqüentemente levadas a
interpretar os tratados em que o Estado é parte, quando surgem dificuldades de aplicação não
na esfera internacional, mas na ordem interna. Então o problema põe-se principalmente perante o
juiz interno”. (DINH, Nguyen Quoc; DAILLER, Patrick; PELLET, Alain, Direito Internacional Público,
2003, p. 260).
A Questão das
Qualificações na Teoria
Geral do Direito e no
Direito Internacional
Privado
406 TORRES, Ricardo Lobo, Normas de Interpretação e Integração do Direito Tributário, 2006, pp.
309-310.
407 GUASTINI, Ricardo, Das Fontes às Normas, 2005, p. 73. A separação entre interpretação e aplicação
para Guastini aparece também em: GUASTINI, Ricardo, Teoria e Dogmatica delle Fonti, 1998, p. 9.
408 ASCENSÃO, José de Oliveira, Introdução à Ciência do Direito, 2005, pp. 600-601.
409 XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, pp. 141-142.
Por fim, destaca-se posição, neste mesmo sentido, manifestada por Isabel
de Magalhães Collaço:
Ao estudar a problemática da interpretação de determinadas
categorias de conceitos técnico-jurídicos, não se há de esquecer, por
certo, que a interpretação de dado conceito, em si mesma, se não
confunde com aquela operação que se traduz em subsumir nesse
conceito um certo substrato concreto – ou seja, com a qualificação
de algo à luz desse conceito.
Em princípio, não parece difícil distinguir os planos em que hão de
mover-se essas duas atividades. A interpretação cifra-se em definir
por via geral e abstrata todos os possíveis conteúdos de um dado
conceito, enquanto a qualificação, incidindo sobre um quid concreto e
traduzindo-se por uma decisão de espécie, contende já com a aplicação
da norma de direito.410
Quer-nos parecer que essa linha de entendimentos não é compatível
com a posição por nós adotada no segundo capítulo deste estudo.
Com efeito, registramos entendimento no sentido de que o processo
hermenêutico jurídico envolve o texto normativo, o intérprete e os fatos
em questão, rejeitando-se a ideia de que o texto seria interpretado de forma
autônoma para somente após ser aplicado aos fatos411.
Esse entendimento parece-nos inquestionável, ao menos no que se
refere à interpretação/aplicação por um órgão de aplicação, ou seja, um órgão
qualificado para criar uma norma jurídica individual e concreta que vincule os
interessados412.
410 COLLAÇO, Isabel de Magalhães. Da Qualificação em Direito Internacional Privado. Lisboa: [s.n.],
1964. p. 142-143. Ver, ainda: GARCÍA NOVOA, César, Interpretación de los Convenios de Doble
Imposición Internacional, 2006, p. 1-2; PERELMAN, Chaïm, Lógica Jurídica, Fontes, 2000, pp. 45-
-46; RIBES RIBES, Aurora, Convenios para Evitar la Doble Imposición Internacional: Interpretación,
Procedimiento Amistoso y Arbitrage, 2003, p. 37; PÉREZ ROYO, Fernando. Derecho Financiero y
Tributario. 10. ed. Madrid: Civitas, 2000. p. 96; BERGEL, Jean-Louis, Teoria Geral do Direito, 2001, p.
399; SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. Teoria e Prática das Isenções Tributárias. 2. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1999. pp. 191-192; BELLAN, Daniel Vitor. Direito Tributário Internacional: Rendimentos
de Pessoas Físicas nos Tratados Internacionais contra a Dupla Tributação da Renda. São Paulo:
Saraiva, 2010. pp. 55-56.
411 Ver: CAMARGO, Maria Margarida Lacombe, Hermenêutica Jurídica e Argumentação: Uma
Contribuição ao Estudo do Direito, 2001, pp. 21-22; NEVES, A. Castanheira, O Actual Problema
Metodológico da Interpretação Jurídica – I, 2003, pp. 344-345.
412 Vale a pena destacar a lição de Hans Kelsen, para quem “se por ‘interpretação’ se entende a
fixação por via cognoscitiva do sentido do objeto a interpretar, o resultado de uma interpretação
jurídica somente pode ser a fixação da moldura que representa o Direito a interpretar e,
consequentemente, o conhecimento das várias possibilidades que dentro desta moldura existem.
Sendo assim, a interpretação de uma lei não deve necessariamente conduzir a uma única solução
como sendo a única correta, mas possivelmente a várias soluções que – na medida em que
apenas sejam aferidas pela lei a aplicar – têm igual valor, se bem que apenas uma delas se torne
Direito positivo no ato do órgão aplicador do Direito – no ato do tribunal, especialmente. Dizer
que uma sentença judicial é fundada na lei, não significa, na verdade, senão que ela se contém
dentro da moldura ou quadro que a lei representa – não significa que ela é a norma individual,
mas apenas que é uma das normas individuais que podem ser produzidas dentro da moldura
da norma geral” (KELSEN, Hans, Teoria Pura do Direito, 1984, p. 467). Sobre a dinâmica passagem
da norma geral para a norma individual, ver: KELSEN, Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado.
Tradução Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2000. pp. 195-198.
413 GUASTINI, Ricardo, Das Fontes às Normas, 2005, p. 73.
414 GRAU, Eros Roberto, Ensaio e Discurso sobre a Interpretação/Aplicação do Direito, 2002, p. 79.
texto, sendo inviável a segregação desses dois momentos, salvo em casos como
os mencionados por Ricardo Guastini na primeira passagem antes transcrita,
nos quais órgãos ou pessoas distintas estão encarregados da interpretação das
questões de fato e de direito.
Como brevemente mencionado anteriormente, a questão das qualificações
tem papel de destaque no campo do Direito Internacional Privado, sendo que
os teóricos do Direito Internacional Tributário foram lá buscar o substrato
para a importação da questão das qualificações para o campo da interpretação
das CDTRs, sendo muito comum falar-se em qualificação nesta seara (a este
tema será dedicado o sexto capítulo).
Por tal razão, justifica-se a análise dos debates acerca da qualificação no
campo do Direito Internacional Privado, o que se passa a fazer a seguir.
416 BEVILAQUA, Clóvis. Princípios Elementares de Direito Internacional Privado. Campinas: Red Livros,
2002. p. 7.
417 STRENGER, Irineu. Direito Internacional Privado. 6. ed. São Paulo: Ltr., 2005. pp. 30-31.
418 ARAÚJO, Luís Ivani de Amorim. Curso de Direito Internacional Privado. Rio de Janeiro: PROCAM,
1998. p. 14. Ver, ainda: STRENGER, Irineu, Direito Internacional Privado, 2005, pp. 39-57;.
419 TENÓRIO, Oscar. Direito Internacional Privado. 11. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1976. v. I.
p. 13.
420 VALLADÃO, Haroldo. Direito Internacional Privado. 5. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1980.
v. I. p. 4.
421 Segundo A. Ferrer Correia, “o Direito Internacional Privado (DIP) é o ramo da ciência jurídica
onde se definem os princípios, se formulam os critérios, se estabelecem as normas a que deve
obedecer a pesquisa de soluções adequadas para os problemas emergentes das relações
privadas de caráter internacional. São essas relações (ou situações) aquelas que – expressão
de uma atividade jurídica que se não comporta nas fronteiras de um único Estado – entram em
contato, através de seus elementos, com diferentes sistemas de direito. Não pertencem a um
só domínio ou espaço legislativo: são relações ‘plurilocalizadas’” (CORREIA, A. Ferrer. Lições de
Direito Internacional Privado. Coimbra: Almedina, 2000. v. I. p. 11).
422 Nas palavras de Jacob Dolinger: “A principal fonte do Direito Internacional Privado é a legislação
interna de cada sistema, razão porque não cabe falar em direito internacional, uma vez que a
autoria de suas regras é interna e não internacional. Denota-se assim a perfeita distinção entre o
Direito Internacional Público e o Direito Internacional Privado, pois enquanto aquele é regido
primordialmente por Tratados e Convenções, multi e bilaterais, controlada a observância
no âmbito traçado por tal conceito que opera a conexão escolhida pela
norma, sendo esta conexão representada, como dissemos, por um dos
elementos ou circunstâncias da factualidade concreta. Ao elemento
de conexão cabe a tarefa de “localizar” a situação jurídica num espaço
legislativo determinado: de a “situar”, pelo que toca à valoração de
tal ou tal dos seus aspectos ou perfis, no quadro de um certo sistema
de direito. Quanto à consequência jurídica, por último, ela consiste
justamente na declaração de aplicabilidade de preceitos jurídico-
-materiais da lei que for designada pelo elemento de conexão.425
Ao se tratar da qualificação no Direito Internacional Privado estamos no
campo do primeiro dos elementos estruturantes acima mencionados, no campo
do objeto da conexão.
Com efeito, ao falarmos em objeto da conexão estamos lidando com a
situação plurilocalizada em exame, seja ela o casamento, o divórcio, a sucessão, a
celebração de um contrato, etc., sendo certo que a aplicação da regra de conflitos
e a determinação da lei a ser aplicada ao caso concreto depende da recondução
de certo fato ao ordenamento jurídico cujo Direito Internacional Privado será
aplicado. Por exemplo, para que se apliquem as regras brasileiras de conflitos
a respeito do casamento a dada situação tem-se que estabelecer se a mesma,
ocorrida fora do Brasil, é qualificável como casamento. É neste campo que se
fala em qualificação426.
Segundo Jabob Dolinger, “a qualificação é um processo técnico-jurídico
sempre presente no direito, pelo qual se classifica ordenadamente os fatos da
vida relativamente às instituições criadas pela Lei ou pelo Costume, a fim de
bem enquadrar as primeiras nas segundas”427.
Já Irineu Strenger enuncia que “toda regra jurídica tem uma hipótese e
uma disposição, e as regras de direito internacional privado não fogem a essa
estrutura; mas a hipótese de direito internacional privado é uma categoria
jurídica. Desse modo, toda vez que temos de indagar qual é o direito (se
429 Nas palavras de Jacob Dolinger “como dizem Loussouarn e Bourel, a escolha da lei a ser chamada
para governar uma relação jurídica dependerá da etiqueta que se lhe coloque em função de
sua natureza jurídica. François Rigaux explica que o conflito de qualificação pressupõe uma
situação litigiosa submetida a juízes de Estados diferentes, que possuem as mesmas regras de
conflito de leis, mas, por não atribuírem o mesmo significado aos conceitos utilizados (estado
da pessoa, sucessões), acabarão conectando a mesma situação a sistemas jurídicos diferentes”
(DOLINGER, Jacob, Direito Internacional Privado, 2001, p. 363).
A Interpretação
das CDTRs
430 Vale a pena lembrar a noção de topoi, examinada no segundo capítulo, valendo-nos das palavras
de Daniel Sarmento: “O conceito de topoi é fundamental para a compreensão da tópica. Os
topoi configuram lugares comuns na argumentação discursiva, que não vinculam o juiz, mas
apenas apresentam-lhe alternativas possíveis para a solução de determinado problema. São,
em suma, diretrizes retóricas reveladas pela experiência, que objetivam servir de fio condutor
para a descoberta de uma resposta razoável para o caso concreto. A decisão, na tópica, resulta
no confronto dialético entre os diversos topoi pertinentes ao caso, devendo prevalecer aquele
que contribuir para a construção da solução mais justa.
Os topoi não são certos ou errados, mas apenas mais ou menos adequados para a solução
de determinado problema. Assim, o estilo tópico é essencialmente casuístico e prático, não
se assentando sobre verdades apodíticas e incontroversas, mas sobre premissas razoáveis”
(SARMENTO, Daniel, A Ponderação de Interesses na Constituição Federal, 2002, p. 129).
431 Nesse sentido parece ser também o entendimento de Giovanni B. Galli e Anna Miraulo (Cf.
GALLI, Giovabbi B.; MIRAULO, Anna. [Italian Report]. In: IFA. Cahiers de Droit Fiscal International:
que tais regras, assim como quaisquer outras regras de interpretação, têm função
extremamente limitada no que tange ao controle da atividade do intérprete.
Assim sendo, embora, conforme aponta a doutrina, as CDTRs sejam uma
espécie de tratado cuja aplicação em âmbito doméstico se faz sentir de forma
acentuada, por funcionarem as mesmas como limites à tributação dos Estados
contratantes434, tal fato não pode obscurecer a caracterização das mesmas como
tratados internacionais. Como destaca Luís Eduardo Schoueri, “acordos de
bitributação pertencem ao direito internacional público. Uma vez promulgados,
por meio de Decreto (‘ordem de execução’ – ‘Anwendungsbefehl’), são adotados
pelo ordenamento interno, sem, entretanto, perder sua natureza internacional”435.
Seguindo essa linha de entendimento, a doutrina majoritária reconhece a
aplicação das regras de interpretação presentes na CVDT às CDTRs436. Assim
434 Cf. GARCÍA NOVOA, César, Interpretación de los Convenios de Doble Imposición Internacional,
2006, pp. 8-9.
435 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário Internacional. Acordos de Bitributação. Imposto de
Renda: Lucros Auferidos por Controladas e Coligadas no Exterior. Disponibilidade. Efeitos do
Artigo 74 da Medida Provisória nº 2.158-35 – Parecer. Revista Direito Tributário Atual, São Paulo,
n. 16, 2001, p. 193.
436 Cf. DEUTSCH, Robert; ARKWRIGHT, Roisin; CHIEW, Daniela. Principles and Pratice of Double
Taxation Agreements. London: BNA International, 2008. p. 6; GARBARINO, Carlo, Manuale
di Tassazione Internazionale, 2005, p. 173; GOUTHIÈRE, Bruno, Les Impôts dans les Affaires
Internationales, 1989, p. 125; HEINRICH, Johannes; MORITZ, Helmut, Interpretation of Tax Treaties,
2000, p. 147; GARCÍA NOVOA, César, Interpretación de los Convenios de Doble Imposición
Internacional, 2006, p. 17; TÔRRES, Heleno, Pluritributação Internacional sobre as Rendas de
Empresas, 2001, p. 650; ARESPACOCHAGA, Joaquín de, Planificación Fiscal Internacional, 2002,
pp. 114-115; SCHOUERI, Luís Eduardo, Preços de Transferência no Direito Tributário Brasileiro, 2006,
p. 261; CALIENDO, Paulo, Estabelecimentos Permanentes em Direito Tributário Internacional, 2005,
p. 264; RIBES RIBES, Aurora, Convenios para Evitar la Doble Imposición Internacional: Interpretación,
Procedimiento Amistoso y Arbitrage, 2003, pp. 81-82; SILVEIRA, Rodrigo Maitto da, Aplicação de
Tratados Internacionais contra a Bitributação: Qualificação de Partnership Joint Ventures, 2006,
p. 114; VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., General Report, 1993, p. 66; BELLAN, Daniel Vitor,
Interpretação dos Tratados Internacionais em Matéria Tributária, 2005, p. 613; XAVIER, Alberto,
Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, p.135; CHICO DE LA CÁMARA, Pablo, Interpretación
y Calificación de los Convenios de Doble Imposición Internacional, 2001, p. 131; REIMER, Ekkehart,
Tax Treaty Interpretation in Germany, 2000, p. 122; HOFBAUER, Ines. Tax Treaty Interpretation
in Austria. In: LANG, Michael (ed.). Tax Treaty Interpretation. London: Kluwer Law International,
2000. pp. 22-23; BIZIOLI, Gianluigi. Tax Treaty Interpretation in Italy. In: LANG, Michael (ed.).
Tax Treaty Interpretation. London: Kluwer Law International, 2000. p. 208; BORGES, Ricardo
Henriques da Palma; RESENDE, Raquel Maria Maymone. Tax Treaty Interpretation in Portugal.
In: LANG, Michael (ed.). Tax Treaty Interpretation. London: Kluwer Law International, 2000. pp.
284-285; JONES, John F. Avery. Tax Treaty Interpretation in the United Kingdom. In: LANG, Michael
(ed.). Tax Treaty Interpretation. London: Kluwer Law International, 2000. p. 362; BAKER, Philip,
Double Taxation Conventions, 2005, p. E-2; LEHNER, Moris. Interpretation of Tax Treaties According
to German Theory and Practice. In: VOGEL, Klaus (Org.). Interpretation of Tax Law and Treaties and
Transfer Pricing in Japan and Germany. The Hague: Kluwer Law International, 1998. p. 90; PIRES,
Manuel, International Juridical Double Taxation of Income, 1989, pp. 229-230; WOUTERS, Jan;
VIDAL, Maarten. The International Law Perspective. In: MAISTO, Guglielmo (Org.). Tax Treaties
and Domestic Law. Amsterdam: IBFD, 2006. p. 14; LEONARDOS, Gabriel Francisco, Tributação
da Transferência de Tecnologia, 2001, p. 47; SANDLER, Daniel. Tax Treaties and Controlled Foreign
Company Legislation. 2nd. ed. London: Kluwer Law International, 1998. p. 54; BORRÁS, Alegria,
La Doble Imposición: Problemas Jurídico-Internacionales, 1974, pp. 102-103; AULT, Hugh J. The
Role of the OECD Commentaries in the Interpretation of Tax Treaties. Intertax, Amsterdam, Apr.
1994, p. 144; SINCLAIR, Ian. [Panel Discussion of Seminar B at IFA Congress in London held on
11 September 1985. Interpretation of Tax Treaties]. Bulletin for International Taxation, Amsterdam,
1986, p. 75; ZILVETI, Fernando Aurelio; TORO, Carlos Eduardo Costa M. A.; BRITO, Bianca Maia
de. Interpretação de Tratados Internacionais. In: DE SANTI, Eurico Marcos Diniz; ZILVETI, Fernando
Aurelio; MOQUERA, Roberto Quiroga (Coords.). Tributação Internacional. São Paulo: Saraiva,
2007. pp. 133-135; OKUMA, Alessandra. As Convenções para Evitar a Dupla Tributação e Elisão
Fiscal e os Meios de Solução de Controvérsia. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito
Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2007. v. IV. p. 411.
437 Cf. XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, p. 111. Para uma análise da
questão tendo em conta diferentes sistemas tributários, ver: BAKER, Philip, Double Taxation
Conventions, 2005, p. B1-B4. Michael Lang, entretanto, pondera que “não existe regra internacional
que proíba a criação de obrigações tributárias a partir de uma CDTR. Na prática, entretanto, CDTRs
servem como limitação a obrigações tributárias. Isso não significa, contudo, que a aplicação de
uma CDTR não possa priorar a posição de um contribuinte” (LANG, Michael, Introduction to the
Law of Double Taxation Conventions, 2010, p. 32).
438 VAN RAAD, Kees. Cinco Regras Fundamentais para a Aplicação de Tratados para Evitar a Dupla-
-Tributação. Tradução Helena de Rezende Grabenweger. Revista de Direito Tributário Internacional,
São Paulo, v. 1, out. 2005, p. 197.
439 Nas palavras de Heleno Tôrres: “As convenções não podem criar novas obrigações tributárias
nem tampouco ampliar as já existentes, como não podem derrogar in totum qualquer disposição
de direito interno, quer do sistema formal, quer a fortiori das garantias aos contribuintes. Elas
buscam tão-só oferecer uma pauta de critérios para resolver possíveis concursos de pretensões
impositivas entre os signatários, uma vez que predispõem um tratamento mais favorável nas
relações que envolvam ‘residentes’ dos respectivos Estados contratantes, apenas quanto aos
rendimentos e tributos nela discriminados.
Visam, desta feita, a permitir uma ampliação eficacial do princípio da segurança jurídica, para
imprimir uma maior certeza do direito para os residentes de um ou do outro Estado contratante
na composição dos seus negócios jurídicos transnacionais que impliquem em formação de
elementos redituais e que, pela estrutura impositiva de ambos os Estados, possam ensejar a
formação de bitributações.
Destarte, a partir do momento da entrada em vigor de uma convenção, todas as relações
tributárias porventura surgidas entre um residente de um dos Estados contratantes ante o outro
Estado contratante, em matéria de tributação de renda ou capital transnacional, passam a ser
regidas, cumulativamente, pelas normas de direito interno e pelas regras convencionais. Assim, o
Estado da fonte aplica a convenção tanto, conforme suas cláusulas, quando dispõe do direito de
tributar, com exclusividade, determinadas categorias de rendas; como quando deve isentar uma
certa categoria reditual ou mesmo limitar as suas alíquotas de retenção na fonte, por exemplo”
(TÔRRES, Heleno Taveira. A Convenção Brasil-Alemanha e sua Aplicação em Face do Direito
Brasileiro. Revista de Direito Tributário, São Paulo, n. 83, 2002, p. 104).
440 GONZÁLEZ GARCÍA, Eusebio. La Interpretación de las Normas Tributarias. Pamplona: Aranzadi, 1997.
p. 13. Nesse mesmo sentido: VANONI, Ezio, Natureza e Interpretação das Leis Tributárias, [s/d], pp.
181-182; TORRES, Ricardo Lobo, Normas de Interpretação e Integração do Direito Tributário, 2006, pp.
48-49; RIBEIRO, Ricardo Lodi, Justiça, Interpretação e Elisão Tributária, 2003, p. 91; FALCÃO, Amílcar.
Introdução ao Direito Tributário. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. pp. 61-64; LIMA, Maria Ednalva
de, Interpretação e Direito Tributário, 2004. p. 169; ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira, Interpretação
e Aplicação de Normas de Direito Tributário, 2002, p. 175; JARACH, Dino. Finanzas Públicas y Derecho
Tributario. 3. ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, [s/d]. p. 393; MARTÍNEZ, Soares. Direito Fiscal. 10.
ed. Coimbra: Almedina, 2000. p. 131; NABAIS, José Casalta. Direito Fiscal. Coimbra: Almedina,
2001. p. 189. Em sentido contrário: VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., General Report, 1993,
p. 57. Nesse sentido, abordando especificamente a questão dos tratados tributário: TROTABAS,
Louis; COTTERET. Droit Fiscal. 8. ed. Paris: Dalloz, 1997. p. 97; BECKER, Alfredo Augusto Becker.
Teoria Geral do Direito Tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 1998. p. 111.
441 Cf. BAUMGARTNER, Max. Suisse. In: Cahiers de Droit Fiscal International: Interpretation judiciaire
dês conventions de doubles impositions et necessite ou opportunité d’une jurisdiction fiscale
internationale. Zürich: Imprimerie Berichthaus, 1951. v. XVIII. pp. 77-78 e 81, apud, SANTIAGO,
Igor Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos, 2006, p. 82.
Como noticia Gerd Rothmann, “conforme verifica Van Houtte, a interpretação restritiva dos
acordos internacionais freqüentemente tem sido considerada normal, porque eles sempre
representam uma limitação do princípio da soberania dos Estados. ‘Exceotio est strictissimae
interpretationis’ seria o princípio de interpretação dos tratados internacionais, especialmente
em matéria tributária, na opinião destes autores. Como descreve P. Sibille, no relatório belga
ao 14º Congresso da IFA em Basiléia, nunca se pode perder de vista que cada linha do acordo
interestatal representa uma limitação dos direitos soberanos de um estado” (ROTHMANN, Gerd
W., Interpretação e Aplicação de Acordos Internacionais contra a Bitributação, 1978, p. 179).
442 Cf. VANONI, Ezio, Natureza e Interpretação das Leis Tributárias, [s/d], p. 209; ROTHMANN, Gerd
W., Interpretação e Aplicação de Acordos Internacionais contra a Bitributação, 1978, p. 121; TORRES,
Ricardo Lobo, Normas de Interpretação e Integração do Direito Tributário, 2006, pp. 153-154.
443 ROTHMANN, Gerd W., Interpretação e Aplicação de Acordos Internacionais contra a Bitributação,
1978, p. 108.
444 VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., General Report, 1993, p. 62. VAN RAAD, Kees, International
Coordination of Tax Treaty Interpretation and Application, 2002, p. 224; TÔRRES, Heleno,
Pluritributação Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, pp. 659-660; PROKISCH, Rainer.
Does it Make Sense if we Speak of an “International Tax Language”? In: VOGEL, Klaus (Coord.).
Interpretation of Tax Law and Treaties and Transfer Pricing in Japan and Germany. The Hage: Kluwer
Law International, 1998. pp. 103-110.
445 PROKISCH, Rainer, Does it Make Sense if we Speak of an “International Tax Language”?, 1998,
p. 106.
446 Cf. VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., General Report, 1993, p. 62.
e tipos dos quais se vale, de forma que a base textual para a interpretação é de
ordinário encontrada no próprio texto convencional.
Há que se repetir aqui o que já foi dito, no sentido de que a harmonia
hermenêutica é tributária não só da linguagem, mas também e principalmente
do horizonte cultural do intérprete.
Dessa forma, por mais que a remissão ao direito interno de cada um dos
Estados contratantes seja excepcional, conforme se verá adiante, não se pode
deixar de considerar que o intérprete de cada Estado não consegue se distanciar
completamente de sua pré-compreensão no momento da interpretação da
CDTR, como se por um instante passasse a ser um cidadão internacional.
Tal nível de harmonização pode sim ser alcançada, mas apenas no âmbito
da harmonização legislativa que se dá nos processos de integração econômica
e, mesmo assim, não de forma instantânea, mas ao cabo de longos anos de
construção de um ambiente cultural harmônico.
5.3.1.1. O ITEM 2 DO ARTIGO 3º DA CONVENÇÃO MODELO DA OCDE
E O REENVIO AO DIREITO INTERNO DOS ESTADOS CONTRATANTES
447 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 81.
448 Isso afirma Luís Eduardo Schoueri ao destacar que o alcance do item 2 do artigo 3º das CDTRs
“se restringe à determinação do significado de uma expressão, não definida no acordo de
452 Cf. BAKER, Philip, Double Taxation Conventions, 2005, p. E-26; TÔRRES, Heleno, Pluritributação
Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, p. 658; WATTEL, Peter J.; MARRES, Otto. The
Legal Status of the OECD Commentary and Static or Ambulatory Interpretation of Tax Treaties.
European Taxation, Amsterdam, July-Aug. 2003, p. 222; GARCÍA NOVOA, César, Interpretación
de los Convenios de Doble Imposición Internacional, 2006, pp. 60-61; BELLAN, Daniel Vitor,
Interpretação dos Tratados Internacionais em Matéria Tributária, 2005, p. 640.
453 Cf. BAKER, Philip, Double Taxation Conventions, 2005, p. E-26; TÔRRES, Heleno, Pluritributação
Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, p. 658; WATTEL, Peter J.; MARRES, Otto, The
Legal Status of the OECD Commentary and Static or Ambulatory Interpretation of Tax Treaties,
2003, p. 223; GARCÍA NOVOA, César, Interpretación de los Convenios de Doble Imposición
Internacional, 2006, p. 61; BELLAN, Daniel Vitor, Interpretação dos Tratados Internacionais em
Matéria Tributária, 2005, p. 640; XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010,
p.140.
454 Cf. ROHATGI, Roy, Basic International Taxation, 2005, p. 51.
Todavia, tal parece ser o risco não apenas da interpretação dinâmica, mas
de toda e qualquer interpretação convencional.
Na verdade, no momento em que nos separamos das ilusões confortáveis
do formalismo jurídico para cairmos no mundo mais aberto da argumentação
jurídica, a possibilidade de interpretações divergentes ensejarem conflitos passou
a ser intrínseca ao próprio sistema, não sendo a interpretação das CDTRs
diferente neste respeito.
O que se espera neste campo é que as interpretações desenvolvidas pelos
Estados contratantes o sejam dentro dos marcos da boa-fé internacional e que
sejam apresentadas interpretações justificáveis perante o auditório.
Não é despiciendo destacar, com Ekkehart Reimer, que tendo em vista
que apenas o Estado que está aplicando (interpretando/aplicando) o tratado
fará o reenvio ao direito interno, não prevê a regra em comento qualquer forma
de aplicação extraterritorial da legislação dos Estados contratantes455.
A partir de 1995 a Convenção Modelo da OCDE passou a encampar de
forma expressa a teoria do reenvio dinâmico, como se infere da leitura do item
2 do artigo 3º do modelo em vigor (acima transcrito)456.
As convenções celebradas pelo Brasil não possuem uniformidade no que
se refere à redação desse dispositivo.
A maioria das convenções seguem o modelo anterior à alteração de 1995,
não fazendo qualquer opção pela remissão estática ou dinâmica para o direito
interno. Modelo de cláusula nesse sentido temos na Convenção celebrada com
a Bélgica, cuja redação é a seguinte:
Para aplicação da Convenção por um Estado Contratante, qualquer
expressão não definida de outro modo terá, a não ser que o contexto
exija interpretação diferente, o significado que lhe é atribuído pela
legislação desse Estado Contratante relativa aos impostos que são
objeto da Convenção.
Essa cláusula é também encontrada nas CDTRs celebradas com os seguintes
países: Bélgica, Canadá, China, Coreia do Sul, Dinamarca, Espanha, Filipinas,
Finlândia, França, Holanda, Hungria, Índia, Itália, Japão, Luxemburgo, Noruega,
Repúblicas Tcheca e Eslovaca e Suécia.
457 Cf. VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., General Report, 1993, p. 75; COELHO, Cristiane.
Interpretação dos Tratados Internacionais em Matéria Tributária: doutrina e prática na América
Latina. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito Tributário e Ordem Econômica: Homenagem
aos 60 Anos da ABDF. São Paulo: Quartier Latin, 2010. p. 705.
458 Cf. XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, pp. 138-139.
459 Cf. GARCÍA NOVOA, César, Interpretación de los Convenios de Doble Imposición Internacional,
2006, p. 52; REIMER, Ekkehart, Interpretation of Tax Treaties, 1999, p. 473.
460 BAKER, Philip, Double Taxation Conventions, 2005, p. E-23.
461 GIULIANI, Federico Maria, La Interpretación de los Convenios Internacionales para Evitar la
Doble Imposición sobre las Rentas, 2003, p. 125.
462 GARBARINO, Carlo, Manuale di Tassazione Internazionale, 2005, p. 178.
468 Cf. VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., General Report, 1993, p. 81.
469 Cf. LANG, Michael, Introduction to the Law of Double Taxation Conventions, 2010, p. 51; GOTLIB,
Gabriel; VAQUERO, Fernando M. Aspectos Internacionales de la Tributación Argentina. Buenos
Aires: La Ley, 2009. p. 260; ENGELEN, Frank, Interpretation of Tax Treaties under International
Law, 2004, p. 477; ROHATGI, Roy, Basic International Taxation, 2005, p. 49; BIZIOLI, Gianluigi,
Tax Treaty Interpretation in Italy, 2000, p. 221; BORGES, Ricardo Henriques da Palma; Resende,
Raquel Maria Maymone, Tax Treaty Interpretation in Portugal, 2000, pp. 293-294; XAVIER, Alberto,
Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, p. 139.
Com efeito, pode-se identificar uma linha de pensamento que sustenta que
o reenvio ao direito interno deve ser sempre a última alternativa470, de forma
que o termo contexto previsto no item 2 do artigo 3º da Convenção Modelo da
OCDE deveria ser interpretado de forma mais abrangente do que o disposto
no item 2 do artigo 31 da CVDT.
Busca-se aqui evitar o reenvio ao direito interno dos Estados contratantes,
já que neste caso, como destaca Vogel, as divergências entre os mesmos podem
ser inevitáveis471.
Para os defensores desta linha de entendimento, o contexto do item 2 do
artigo 3º seria equivalente ao resultado da interpretação mediante a utilização
de todos os elementos que o interprete tenha à sua disposição. É o mesmo
que dizer que, caso seja possível a interpretação da CDTR sem a remissão ao
direito interno, isso mediante a utilização dos outros elementos de interpretação,
evita-se que a mesma ocorra.
Defensor desta corrente, sustenta Federico Maria Giuliani que “o contexto
de que fala o artigo 3º (2) do Modelo OCDE poderia ser entendido como
compreensivo de tudo aquilo a que é possível recorrer na interpretação dos
tratados internacionais, segundo as normas contidas na Convenção de Viena”472.
A mesma opinião é manifestada por Manuel Pires, para quem “o sentido
das cláusulas [da CDTR] deve ser estabelecido de acordo com as regras para a
sua interpretação e apenas no caso de não se obter uma definição ou sentido
apropriado para tal propósito é que a lei do Estado que esteja aplicando a
convenção será usada”473.
470 Cf. HEINRICH, Johannes; MORITZ, Helmut, Interpretation of Tax Treaties, 2000, p. 152.
471 Cf. VOGEL, Klaus, Introduction, 1997, p. 42.
472 GIULIANI, Federico Maria, La Interpretación de los Convenios Internacionales para Evitar la
Doble Imposición sobre las Rentas, 2003, p. 128.
473 PIRES, Manuel, International Juridical Double Taxation of Income, 1989, pp. 231-232. Nesse mesmo
sentido é o entendimento de Edwin van der Bruggen, para quem o contexto do item 2 do artigo
3º da Convenção Modelo deve ser interpretado como determinando um esgotamento dos
elementos de interpretação contidos nos artigos 31 e 32 da CVDT para que seja possível a
remissão ao direito interno dos Estados contratantes (Cf. VAN DER BRUGGEN, Edwin. Unless
de Vienna Convention Otherwise Requires: Notes on the Relationship Between Article 3(2) of
the OECD Modelo Tax Convention and Articles 31 and 32 of the Vienna Convention on the Law
of Treaties. European Taxation, Amsterdam, May 2003, p. 155). No mesmo sentido, ver: TÔRRES,
Heleno Taveira. El Derecho Internacional Tributario: Trados y Disposiciones Internas. In:
PISTONE, Pasquale; TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Estudios de Derecho Tributario Constitucional
Internacional: Homenaje Latinoamericano a Victor Uckmar. Buenos Aires: Editorial Ábaco de
Rodolfo Depalma, 2005. p. 893-894; ROTHMANN, Gerd W., Interpretação e Aplicação de Acordos
Internacionais contra a Bitributação, 1978, p. 158.
474 TÔRRES, Heleno, Pluritributação Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, p. 653. No mesmo
sentido: OKUMA, Alessandra, As Convenções para Evitar a Dupla Tributação e Elisão Fiscal e os
Meios de Solução de Controvérsia, 2007, p. 413; SALOMÃO, Raphael Palmieri. A Interpretação dos
Tratados Internacionais para Evitar a Dupla Tributação. Revista de Direito Tributário Internacional,
São Paulo, n. 11, abr. 2009, p. 204.
475 Wattel, Peter J.; MARRES, Otto, The Legal Status of the OECD Commentary and Static or
Ambulatory Interpretation of Tax Treaties, 2003, p. 234.
476 JONES, John F. Avery; ELLIS, Maaten J.; MAISTO, Guglielmo et. al. The Interpretation of Income Tax
Treaties with Particular Reference to the Commentaries on the OECD Model. Amsterdam: IBFD, 2006.
477 JONES, John F. Avery; ELLIS, Maaten J.; MAISTO, Guglielmo et. Al., The Interpretation of Income
Tax Treaties …, 2006, p. 3.
478 JONES, John F. Avery; ELLIS, Maaten J.; MAISTO, Guglielmo et. Al., The Interpretation of Income
Tax Treaties …, 2006, pp. 6-7. Nesse sentido, os comentários se caracterizariam como soft law, a
qual é definida por Salem Hikmat Nasser nos seguintes termos: “Já soft law é um norma genérico
que recebe um fenômeno multifacetado. Pode-se, no entanto, pensá-lo sinteticamente, como
dois tipos de manifestação normativa em Direito Internacional: as normas moles, flexíveis,
ambíguas, desprovidas de previsão e de sanção de uma lado, e os instrumentos normativos
que, por não serem tratados celebrados em boa e devida forma entre os Estados, a rigor não
obrigam juridicamente” (NASSER, Salem Hikmat. Direito Internacional do Meio Ambiente, Direito
Transformado, Jus Cogens e Soft Law. In: NASSER, Salem Hikmat; REIS, Fernando Baldy dos (Orgs.).
Direito Internacional do Meio Ambiente: Estudos em Homenagem ao Prof. Guido Fernando Silva
Soares. São Paulo: Atlas, 2006. p. 25). Ver também: GARBARINO, Carlo, Manuale di Tassazione
Internazionale, 2005, p. 37; NASSER Salem Hikmat. Fontes e Normas do Direito Internacional: Um
Estudo sobre a Soft Law. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2006; SACCHETTO, Claudio. Direito Internacional
Tributário. Revista de Direito Internacional Tributário, São Paulo, n. 5, 2007, p. 144.
479 JONES, John F. Avery; ELLIS, Maaten J.; MAISTO, Guglielmo et. Al., The Interpretation of Income
Tax Treaties …, 2006, p. 8. Nesse mesmo sentido: PIJL, Hans. Os Comentários da OCDE como
Fonte do Direito Internacional e o Papel do Poder Judiciário. Tradução Luiz Carlos de Andrade
Jr.; Clóvis Panzarini Filho. Revista de Direito Tributário Internacional, São Paulo, n. 4. out. 2006, pp.
207-208; BLOKKER, Niels. Skating on the Ice? On the Law of International Organizations and the
Legal Nature of the Commentaries on the OECD Model Tax Convention. In: DOUMA Sjoerd;
ENGELEN, Frank (Coords.). The Legal Status of the OECD Commentaries. The Netherlands: IBFD,
2008. pp. 24-25.
480 JONES, John F. Avery; ELLIS, Maaten J.; MAISTO, Guglielmo et. Al., The Interpretation of Income
Tax Treaties …, 2006, p. 113.
481 JONES, John F. Avery; ELLIS, Maaten J.; MAISTO, Guglielmo et. Al., The Interpretation of Income Tax
Treaties …, 2006, p. 112. No mesmo sentido: ENGELEN, Frank. How “Acquiescence” and “Estoppel”
can Operate to the Effect that the States Parties to a Tax Treaty are Legally Bound to Interpret the
Treaty in Accordance with the Commentaries on the OECD Model Tax Convention. In: DOUMA
Sjoerd; ENGELEN, Frank (Coords.). The Legal Status of the OECD Commentaries. The Netherlands:
IBFD, 2008. p. 55; WARD, David A. Is There an Obligation in International Law of OECD Member
Countries to Follow the Commentaries on the Model? In: DOUMA Sjoerd; ENGELEN, Frank
(Coords.). The Legal Status of the OECD Commentaries. The Netherlands: IBFD, 2008. pp. 92-93.
482 ENGELEN, Frank, How “Acquiescence” and “Estoppel” can Operate to the Effect that the States Parties
to a Tax Treaty are Legally Bound to Interpret the Treaty in Accordance with the Commentaries on
the OECD Model Tax Convention, 2008, pp. 71-72. Crítica a essa posição pode ser encontrada em:
PIJL, Hans. Beyond Legal Bindingness. In: DOUMA Sjoerd; ENGELEN, Frank (Coords.). The Legal
Status of the OECD Commentaries. The Netherlands: IBFD, 2008. pp. 124-126.
483 XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, p. 139. Ver, também: VERSTRAETEN,
Axel A. Los Comentarios al Modelo de Convenio para Evitar la Doble Imposición de la OCDE
como Medio de Interpretación. In: GARCÍA, Fernando D. (Coord.). Convenios para Evitar la Doble
Imposición Internacional: Aspectos Controvertidos. Buenos Aires: La Ley, 2010. p. 71.
484 VANN, Richard J. Interpretation of tax treaties in new Holland. In: ARENDONK, Henk van;
ENGELEN, Frank; JANSEN, Sjaak (Coords.). A Tax Globalist: Essays in Honour of Maarten J. Ellis.
The Netherlands: IBFD, 2010. pp. 157-158.
485 Nesse mesmo sentido: ROHATGI, Roy, Basic International Taxation, 2005, p. 58, REIMER, Ekkehart,
Interpretation of Tax Treaties, 1999, p. 468.
486 Conforme destaca Adolfo J. Martin Jiménez: “O tema dos efeitos dos Comentários da OCDE
nos sistemas tributários nacionais, como ferramentas interpretativas dos tratados, tem recebido
grande atenção de especialistas tributários, mesmo que eles não concordem completamente
com os fundamentos jurídicos que permitem que os Comentários da OCDE sejam levados
em consideração na interpretação de tratados. De uma perspectiva de direito internacional,
entretanto, está claro que os Comentários são ‘soft law’ (regras que não têm força vinculante,
mas são pretendidas para produzir efeitos práticos) as quais podem se tornar ‘hard law’ quando
os Comentários são aplicados dentro de um sistema nacional pelas autoridades tributárias e os
tribunais. De um ponto de vista nacional os Comentários da OCDE simplesmente não existem
como normas; eles somente podem ter efeitos quando da interpretação de tratados” (MARTÍN
JIMÉNEZ, Adolfo J. The 2003 Revision of the OECD Commentaries on the Improper Use of Tax
Treaties: A Case of Declining Effect of the OECD Commentaries? Bulletin for International Taxation,
Amsterdam, Jan. 2004, p. 27-28). Nesse mesmo sentido, ver: MORENO GONZÁLEZ, Saturnina;
SÁNCHEZ LÓPEZ, María Esther. Impuesto sobre la Renta de No Residentes y Convenios de Doble
Imposición. In: MORENO GONZÁLEZ, Saturnina (Coord.). Fiscalidad Internacional. Navarra:
Civitas, 2010. p. 75.
487 SOLER ROCH, Maria Teresa; RIBES RIBES, Aurora, Tax Treaty Interpretation in Spain, 2000, p.
309-310. Nesse mesmo sentido, ver: HOLMES, Kevin. International Tax Policy and Double Tax
Treaties. IBFD: The Netherlands, 2007. p. 76.
da CVDT. Esta é a posição que será adotada neste estudo, conforme será examinado
de forma mais detida adiante.
Há três aspectos adicionais sobre os Comentários à Convenção Modelo
da OCDE que não podem deixar de ser analisados.
O primeiro consiste na posição externada por alguns especialistas no
sentido de que os mesmos estariam inseridos na CVDT, juntamente com
a própria Convenção Modelo, não como contexto, mas sim como linguagem
ordinária ou especial para fins dos itens 1 e 4 do artigo 31, respectivamente.
É importante, então, contextualizarmos tal debate à realidade brasileira,
considerando que o Brasil não é parte da OCDE, analisando-se a importância
dos Comentários para países não membros da mencionada organização488.
Por fim, vale a pena analisar questão, semelhante a tema já examinado
anteriormente, consistente em saber quais Comentários devem ser levados em
consideração pelo intérprete, aqueles em vigor quando da celebração do tratado
ou os existentes quando da interpretação/aplicação da CDTR.
5.3.2.1.1. OS COMENTÁRIOS À CONVENÇÃO MODELO COMO
SIGNIFICADO ORDINÁRIO OU ESPECIAL DOS TERMOS UTILIZADOS
NA CDTR
488 OLIVER, J. David B. The OECD Model and Non-Member Countries. Intertax, Amsterdam, 1997,
pp. 178-179.
489 VOGEL, Klaus. The Influence of the OECD Commentaries on Treaty Interpretation. Bulletin for
International Taxation, Amsterdam, Dec. 2000, pp. 612-616.
490 VOGEL, Klaus, The Influence of the OECD Commentaries on Treaty Interpretation, 2000, p. 616.
491 VOGEL, Klaus, The Influence of the OECD Commentaries on Treaty Interpretation, 2000, p. 616.
492 VOGEL, Klaus, The Influence of the OECD Commentaries on Treaty Interpretation, 2000, p. 616.
493 VOGEL, Klaus, The Influence of the OECD Commentaries on Treaty Interpretation, 2000, p. 616.
494 JONES, John F. Avery; ELLIS, Maaten J.; MAISTO, Guglielmo et. Al., The Interpretation of Income
Tax Treaties …, 2006, p. 19.
495 VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., General Report, 1993, p. 65; VOGEL, Klaus, Introduction,
1997, p. 45. Sobre o tema, ver: BELLAN, Daniel Vitor. Direito Tributário Internacional: Rendimentos
de Pessoas Físicas nos Tratados Internacionais contra a Dupla Tributação da Renda. São Paulo:
Saraiva, 2010. pp. 94-96.
496 BAKER, Philip, Double Taxation Conventions, 2005, p. E-19.
Mas do que isso, uma pesquisa nas decisões proferidas pelos tribunais
superiores pátrios500 evidencia que tais Comentários não são normalmente
levados em consideração ao serem proferidas decisões sobre questões
internacionais501.
Dessa forma, é possível concluir que na interpretação das CDTRs
celebradas pelo Brasil não há fundamentos para a consideração dos Comentários
à Convenção Modelo da OCDE como “contexto” para fins do item 2 do artigo
3 da referida convenção.
5.3.2.1.3. UTILIZAÇÃO ESTÁTICA OU DINÂMICA DOS COMENTÁRIOS
Surge, no âmbito da utilização dos Comentários à Convenção Modelo
da OCDE, questão semelhante à já examinada quando da análise da remissão
ao direito interno, consistente em se definir por um uso estático de ditos
Comentários, recorrendo-se àqueles em vigor à época em que celebrada a
CDTR, ou um uso dinâmico dos mesmos, buscando-se os Comentários vigentes
quando da interpretação/aplicação da convenção. Uma terceira via, apontada
por Manuela Santamaria, seria a utilização dinâmica dos Comentários apenas
quando os mesmos tivessem natureza “interpretativa”502.
Conforme aponta John Avery Jones, a recusa em levar os Comentários
mais recentes em consideração pode levar a um congelamento hermenêutico,
com a recusa de uma adaptação às modificações em termos de negócios e
tecnologia, bem como à possibilidade de diferentes interpretações de CDTRs
que possuam a mesma redação apenas em razão da data em que as convenções
foram celebradas503.
Por outro lado, ainda nas palavras do especialista britânico, há argumentos
também para que se negue aplicabilidade aos Comentários alterados pos-
teriormente à celebração da CDTR, já que “como decisões judiciais são
500 Não há no Brasil um histórico muito grande de discussões judiciais envolvendo a aplicação de
tratados internacionais, sendo que em pesquisa não localizamos nenhum julgamento em que
os Comentários à Convenção-modelo tenham sido levados em consideração pelo julgador.
Nem mesmo naquele que pode ser considerado o principal julgamento de uma corte superior
envolvendo um tratado tributário, o Recurso Especial nº 426.945 (publicação no Diário de Justiça
em 25.08.2004), qualquer menção aos Comentários foi feita.
501 Não é possível apresentar uma mesma estatística em relação às decisões administrativas, em
razão da falta da disponibilização da íntegra das decisões na internet.
502 SANTAMARIA, Manuela. Fiscalità Internazionale. Milano: Giuffrè Editore, 2009. p. 187.
503 JONES, John F, Avery. The Effect of Changes in the OECD Commentaries after a Treaty is
Concluded. Bulletin for International Taxation, Amsterdam, Mar. 2002, p. 103. No mesmo sentido:
GARBARINO, Carlo, Manuale di Tassazione Internazionale, 2005, p. 181. Ver, também: HOLMES,
Kevin. International Tax Policy and Double Tax Treaties. IBFD: The Netherlands, 2007. p. 78.
504 JONES, John F, Avery, The Effect of Changes in the OECD Commentaries after a Treaty is Concluded,
2002, pp. 103-104. No mesmo sentido: Wattel, Peter J.; MARRES, Otto, The Legal Status of the
OECD Commentary and Static or Ambulatory Interpretation of Tax Treaties, 2003, pp. 222-223.
505 Nesse mesmo sentido, ver: ARNOLD, Brian J. Tax Treaties and Tax Avoidance: The 2003 Revisions
to the Commentary to the OECD Model. Bulletin for International Taxation, Amsterdam, June
2004, p. 260. Solução interessante é proposta por Kees van Raad, que sugere que modificações
substanciais nos Comentários sejam objeto de um tratado multilateral, por intermédio do qual
os signatários incorporariam as modificações a seus tratados bilaterais (Cf. VAN RAAD, Kees.
Options for Greater International Coordination and Cooperation in the Tax Treaty Area. Bulletin
for International Taxation, Amsterdam, June 2002, p. 249).
506 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 81.
507 BORGES, Ricardo Henriques da Palma; Resende, Raquel Maria Maymone, Tax Treaty Interpretation
in Portugal, 2000, p. 293. Ver: WATTEL, Peter J.; MARRES, Otto. Characterization of Fictitious
Income under OECD-Patterned Tax Treaties. European Taxation, Amsterdam, Mar. 2003, p. 71.
511 Cf. BORGES, Ricardo Henriques da Palma; Resende, Raquel Maria Maymone, Tax Treaty
Interpretation in Portugal, 2000, p. 293; WATTEL, Peter J.; MARRES, Otto, Characterization of
Fictitious Income under OECD-Patterned Tax Treaties, 2003, pp. 71-72.
512 Cf. BIZIOLI, Gianluigi, Tax Treaty Interpretation in Italy, 2000, p. 221; SKAAR, Arvid Aage.
[Norwegian Report]. In: IFA. Cahiers de Droit Fiscal International: Interpretation of Double Taxation
Conventions. Deventer: Kluwer Law International, 1993. v. LXXVIIIa. p. 504.
513 Vários autores destacam a importância das decisões tomadas por autoridades do outro Estado
contratante como elemento de interpretação. Neste sentido: BELLAN, Daniel Vitor. Direito
Tributário Internacional: Rendimentos de Pessoas Físicas nos Tratados Internacionais contra a
Dupla Tributação da Renda. São Paulo: Saraiva, 2010. pp. 88-89; BAKER, Philip, Double Taxation
Conventions, 2005, p. E-27; GIULIANI, Federico Maria, La Interpretación de los Convenios
Internacionales para Evitar la Doble Imposición sobre las Rentas, 2003, pp. 132-134; ROHATGI,
Roy, Basic International Taxation, 2005, p. 47; BELLAN, Daniel Vitor, Interpretação dos Tratados
Internacionais em Matéria Tributária, 2005, p. 646.
514 Nesse mesmo sentido: GALLI, Giovabbi B.; MIRAULO, Anna, [Italian Report], 1993, p. 395;
HEINRICH, Johannes; MORITZ, Helmut, Interpretation of Tax Treaties, 2000, p. 149.
do que ele faz no direito interno”515. Com isso, sustenta Avery Jones que apenas
o país da fonte aplica a CDTR para fins do dispositivo em questão, sendo
que somente este remeteria a questão ao seu direito interno, devendo o país
de residência aceitar interpretação do país da fonte. Em outra passagem, o
professor britânico explicita melhor seu entendimento:
A qualificação do tipo de renda pela legislação interna no país de
residência é irrelevante. Este estado deve, pelo Artigo 23, isentar ou
conceder crédito tributário sobre rendas que, de acordo com as regras
desta Convenção, possam ser tributados no outro Estado Contratante.
Considere que há rendas que, sob o Artigo 15, o estado da fonte pode
tributar. Um aperto de mão dourado, por exemplo. De acordo com o
Artigo 3(2) em uma primeira instância cabe ao estado da fonte decidir
se o mesmo se enquadra na definição de renda que pode ser tributado
em tal estado de acordo com o tratado. Se tal categoria se enquadrar
na definição de renda que tal estado pode tributar de acordo com o
tratado, trata-se de renda que de acordo com a Convenção pode ser
tributada no estado da fonte; se tal categoria não se enquadrar em
tal definição de renda, então a renda não será tributável na fonte.
Esta é a única pergunta que o estado de residência faz, e isenção (ou
credito) ou tributação (de permitida sob o direito internacional) segue
automaticamente [...].516
A vantagem do entendimento sustentado por John Avery Jones consiste
em reduzir as possibilidades de divergência interpretativa entre os Estados
contratantes517.
De fato, considerando que um dos problemas de interpretação no campo
do Direito Internacional é a falta de um órgão de aplicação, caso se estabelecesse
uma competência exclusiva do país da fonte para interpretar/aplicar a CDTR,
com a consequente obrigação do Estado de residência de acolher a posição
do primeiro, estaria resolvido tal problema, ao menos no que se refere à
categorização de rendimentos.
515 JONES, John F. Avery, Tax Treaty Interpretation in the United Kingdom, 2000, p. 371.
516 JONES, John F. Avery, [British Report], 1993, p. 608. Ver, ainda: JONES, John F. Avery, The “One
True Meaning of a Tax Treaty”, 2001, p. 220.
517 Ver: MESSINEO, Alejandro E. Principios Generales para la Aplicación e Interpretación de los
Tratados. La Interacción de la Normativa de Derecho Interno Anti-Abuso Frente a los Convenios
para Evitar la Doble Imposición Internacional. In: GARCÍA, Fernando D. (Coord.). Convenios para
Evitar la Doble Imposición Internacional: Aspectos Controvertidos. Buenos Aires: La Ley, 2010. p. 41.
Todavia, a questão não parece ser se a solução seria ou não positiva, mas
sim se a mesma encontra ou não respaldo no item 2 do artigo 3º da Convenção
Modelo.
Partindo da leitura do mencionado dispositivo da Convenção Modelo,
não se encontra fundamento para tal interpretação, sendo certo que uma eleição
como a pretendida por Avery Jones deveria estar expressamente prevista no
texto.
É evidente que o país da residência também interpreta/aplica a CDTR
para definir se possui competência, exclusiva ou cumulativa, para tributar a
renda, bem como para determinar que forma de medida para a evitar a dupla
tributação, isenção ou crédito, será concedida518.
Dessa forma, não cremos haver como evitar os potenciais conflitos
hermenêuticos atribuindo-se uma suposta competência interpretativa exclusiva
ao Estado da fonte. A essa questão retornaremos no capítulo seguinte, ao
analisarmos a questão da qualificação no campo das CDTRs.
518 Conforme destaca destaca Heleno Tôrres: “Do momento seguinte à entrada em vigor do tratado,
as categorias de rendimentos e respectivos impostos, previstos no art. 2º, § § 2º e 3º (Modelo
OCDE), passam a ser regidos em cumulatividade: pela legislação interna e pelas normas
convencionais, ante a necessária subsidiariedade destas em relação àquela. Mas, impõe dizer,
este é o segundo momento da aplicação da convenção: de execução, de aplicação no que diz
respeito ao uso por parte dos contribuintes; posterior à aplicação primária, que se dá sobre a
legislação tributária do Estado contratante, de aplicação para fins de vinculação dos Estados ao
objeto do acordo.
Deste modo, o Estado não aplica a convenção apenas quando se encontra limitado em sua
competência tributária, mas sempre (nos casos previstos convencionalmente) para fins de prover
o exercício do direito aos benefícios previstos na convenção para os residentes. Estes, os residentes
de um ou outro Estado contratante, ao reclamarem tal direito aos respectivos Estados, o farão
porque dotados de direito subjetivo público àquele tratamento mais vantajoso. E, além disso, aos
direito de tributar uma determinada categoria reditual distribuída a um dos Estados contratantes
correspondente, em contrapartida, o dever do outro de abster-se de fazer aplicar suas normas
de localização ou qualificação com o fito de alcançar a mesma para compor a regra-matriz de
incidência, definindo, internamente, uma obrigação tributária para os sujeitos envolvidos. E estas
são também formas de aplicação de uma convenção em matéria tributária” (TÔRRES, Heleno
Taveira, A Convenção Brasil-Alemanha e sua Aplicação em Face do Direito Brasileiro, 2002, p.
105). Nesse sentido: VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., General Report, 1993, p. 79; BIZIOLI,
Gianluigi, Tax Treaty Interpretation in Italy, 2000, p. 222; SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário
Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos, 2006, p. 105; ENGELEN, Frank A.; PÖTGENS,
Frank P. G. Report on “The Application of the OECD Model Tax Convention to Partnerships” and
the Interpretation of Tax Treaties. European Taxation, Amsterdam, July, 2000, p. 257.
quando da gênese do tratado, razão pela qual a legislação interna das partes e
os Comentários então vigentes serão sempre um elemento de interpretação a
ser levado em conta.
519 SCHOUERI, Luís Eduardo, Preços de Transferência no Direito Tributário Brasileiro, 2006, p. 262.
Conforme destaca Gerd Rothmann, “os tratados devem ser interpretados de boa-fé, isto é,
sem o ânimo de burlar suas disposições ou fugir ou permitir que se fuja à sua execução. É um
princípio fundamental de ética internacional” (ROTHMANN, Gerd W., Interpretação e Aplicação
de Acordos Internacionais contra a Bitributação, 1978, p. 165). Ver também: PIJL, Hans, The Theory
of the Interpretation of Tax Treaties, with Reference to Dutch Practice, 1997, p. 540.
520 BERNHART, Ernst. Encyclopedia of Public International Law, 1995, v. II, p. 1419, apud, REIMER,
Ekkehart, Interpretation of Tax Treaties, 1999, p. 462.
524 VAN DER BRUGGEN, Edwin, Unless de Vienna Convention Otherwise Requires: Notes on the
Relationship Between Article 3(2) of the OECD Modelo Tax Convention and Articles 31 and 32
of the Vienna Convention on the Law of Treaties, 2003, p. 145. Na mesma linha é a lição de Julio
Diena, para quem “a primeira e mais importante regra de interpretação dos tratados é a de que
estes devem ser interpretados de boa-fé e que portanto não é lícito a uma das partes apegar-se
à ambigüidade de uma frase para não cumprir integralmente o quanto havia entendido pactuar”
(DIENA, Julio, Derecho Internacional Público, 1946, p. 434).
525 RUBINSTEIN, Flávio, Interpretação e Aplicação dos Acordos de Bitributação: o Papel da Boa-fé
Objetiva, 2006, p. 75.
526 Ver também: ENGELEN, Frank, Interpretation of Tax Treaties under International Law, 2004, pp.
128-129.
527 RUBINSTEIN, Flávio, Interpretação e Aplicação dos Acordos de Bitributação: o Papel da Boa-fé
Objetiva, 2006, p. 76.
528 RUBINSTEIN, Flávio, Interpretação e Aplicação dos Acordos de Bitributação: o Papel da Boa-fé
Objetiva, 2006, p. 89.
529 VOGEL, Klaus, Problemas na Interpretação de Acordos de Bitributação, 2003, pp. 966-967.
Ver também: VAN RAAD, Kees, International Coordination of Tax Treaty Interpretation and
Application, 2002, p. 218.
530 Como destaca Peter Häberle, em seu estudo sobre hermenêutica constitucional, “todo aquele
que vive no contexto regulado por uma norma e que vive com este contexto é, indireta ou, até
mesmo diretamente, um intérprete desta norma” (HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional: A
Sociedade Aberta dos Intérpretes da Constituição: Contribuição para a Interpretação Pluralista e
“Procedimental” da Constituição. Tradução Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio
Fabris Editor, 1997. p. 15).
531 ROUSSEAU, Charles, Droit International Public, 1953, pp. 48-49.
ser observada por todos os demais intérpretes. Dessa forma, são as partes
contratantes que têm a primazia na concretização da regra jurídica decorrente
do tratado celebrado.
É evidente que qualquer ato interpretativo tem que ser igualmente
interpretado. Todavia, tal ato de aplicação será necessariamente mais concreto,
tendendo a superar a eventual abertura do texto interpretado.
Na hipótese de os Estados contratantes não terem editado qualquer
ato conjunto interpretativo das previsões contidas no tratado internacional,
cabe àqueles sujeitos aos seus mandamentos sua interpretação. Assim sendo,
considerando os escopos das CDTRs, tanto os contribuintes quanto as
autoridades fiscais seriam intérpretes destes tratados.
O processo hermenêutico empreendido pelos contribuintes e pelas
autoridades fazendárias, desenvolvido no âmbito da pré-compreensão dos
intérpretes, pode levar ao nascimento de um conflito de interesses entre ambos,
o qual, ao menos no ordenamento jurídico brasileiro, deve ser solucionado pelo
Poder Judiciário.
Assim sendo, na falta de uma interpretação autêntica por parte dos Estados
contratantes, havendo divergências interpretativas entre os contribuintes e
as autoridades fazendárias de um dos Estados, é provável que a questão seja
apresentada ao Poder Judiciário, a quem caberia, ao menos internamente,
determinar a exegese de um dado dispositivo contido no tratado internacional.
Neste caso seria o Poder Judiciário o órgão interno que acabaria por assumir
a função de órgão de aplicação para fins da criação da norma jurídica individual
e concreta aplicável.
A adoção pelo Poder Judiciário pátrio de uma interpretação distinta
daquela sustentada pelo outro Estado contratante pode levar à dupla tributação
ou à dupla isenção, sendo possível que tal situação dê ensejo ao chamado
judicial treaty override, o qual, segundo Ian Roxan, “pode surgir em razão da
não aceitação por parte do juiz de uma mesma regra prevista num tratado
internacional que ele considere conflitante com o sistema tributário nacional, ou
simplesmente porque o julgador está menos familiarizado com a interpretação
dos tratados internacionais do que com a interpretação da lei interna, e considera
mais fácil aplicar ao caso concreto as regras tributárias internas”532.
532 ROXAN, Ian. Sobreposição Judicial de Tratados para Evitar a Dupla Tributação: o Caso de um
Estabelecimento Permanente. Revista Direito Tributário Atual, São Paulo, n. 19, 2005, p. 64. Ver,
Com vistas a se evitar o judicial treaty override é que, como foi anteriormente
mencionado, é importante que as cortes de cada um dos Estados contratantes considere
como elementos de interpretação a legislação e as decisões proferidas sobre a mesma
matéria pelas autoridades do outro Estado.
A busca de tais elementos se justificaria a partir de uma interpretação
teleológico-axiológica da CDTR, com fulcro na premissa de que tais
convenções se prestam a evitar a dupla tributação da renda, o que depende de
uma interpretação/aplicação harmônica por parte dos Estados contratantes.
Uma das características do judicial treaty override, ao menos no ordena-
mento jurídico brasileiro, é que ele tende a se limitar ao caso concreto objeto de
julgamento, ou seja, apenas em determinado caso concreto vai se materializar
eventual divergência de entendimentos entre a autoridade judicial brasileira e
a autoridade, administrativa ou judicial, estrangeira.
Percebe-se, portanto, que as discussões acerca de harmonização decisória
têm maior relação com a possibilidade de um legislative ou um executive treaty
override do que propriamente de um judicial treaty override, já que nos primeiros
casos é possível que se tenha a edição de uma regra que disponha em sentido
contrário à interpretação que o outro Estado contratante a respeito de certo
dispositivo contido na CDTR.
Nesta assentada, não é equivocado afirmar que mecanismos para a solução
de controvérsias a respeito da interpretação de dispositivos das CDTRs buscam
mais evitar situações de legislative ou executive override, sendo, todavia, de
limitada valia no que toca à prevenção do judicial override.
do mesmo autor: ROXAN, Ian. United Kingdom. In: MAISTO, Guglielmo (Org.). Tax Treaties and
Domestic Law. Amsterdam: IBFD, 2006. pp. 340-342.
A Questão das
Qualificações no
Âmbito das CDTRs
6.1. INTRODUÇÃO
A questão da qualificação foi examinada com mais vagar no quarto
capítulo, quando foram apresentadas duas noções distintas quanto à matéria.
Uma primeira, segundo a qual a qualificação estaria presente em todo
processo de aplicação do direito. Conforme este entendimento, que tem como
ponto de partida a aplicação silogística das normas jurídicas, esta dependeria
de duas atividades distintas: a interpretação do texto legal, que formaria a
premissa maior, e a valoração dos fatos envolvidos, que comporiam a premissa
menor, a ser subsumida naquela.
A crítica então apresentada é que esta divisão pretendida entre inter-
pretação do texto e valoração factual tem matriz em um ultrapassado
formalismo jurídico, sendo que a raiz problemática da teoria hermenêutica
contemporânea não abre espaço para a separação rígida, pretendida pelas
teorias formalistas, entre texto, fato e intérprete, este inserido em seu ambiente
cultural axiológico533.
Essa crítica torna-se ainda mais evidente quando se leva em conta a
interpretação/aplicação jurídica por um órgão de aplicação do direito, o qual,
ao interpretar um texto normativo, terá sempre em consideração os fatos
envolvidos, de maneira que fatos e texto implicar-se-ão mutuamente.
Como vimos, esta primeira noção acerca da qualificação encontra reflexo
na doutrina do Direito Internacional Privado, sendo que as mesmas críticas
são então cabíveis.
A segunda noção de qualificação, por nós defendida, seria particular às
regras de conflitos, consistindo na remissão, à regra de conflitos, do resultado
da interpretação/aplicação do direito interno de cada um dos países aos quais
determinada situação se encontra vinculada por elementos de conexão.
533 Na lição de Dino Jarach, “[...] ‘não há interpretação da lei tributária que esteja fora da aplicação
concreta da própria lei tributária’. Interpretação e aplicação não são termos antitéticos – dos
quais o segundo seja a consequência do primeiro – porque a interpretação da lei é sempre a
interpretação da realidade dos fatos, à luz de conceitos normativos da lei, para a sua aplicação
em caso concreto; de modo que não há oposição entre a interpretação da lei e a interpretação
do fato imponível (como dizemos, na terminologia espanhola que se adotou agora); sempre
existe a interpretação de um e de outro [...]” (JARACH, Dino. Hermenêutica no Direito Tributário.
In: MORAES, Bernardo Ribeiro de, et. al. Interpretação no Direito Tributário. São Paulo: Saraiva,
1975. p. 84).
534 Vale a pena destacar, com Klaus Vogel, que embora o termo tenha sido apropriado do Direito
Internacional Privado, a qualificação no Direito Internacional Tributário não é equivalente
ao mesmo fenômeno naquele campo de estudos. Em textual: “Problemas especiais surgem
quando um tratado usa termos legais que simultaneamente são termos da legislação dos Estados
contratantes. Para referir a tais problemas, a expressão ‘qualificação’ começou a ser utilizada,
particularmente na literatura alemã sobre tributação internacional e em outros lugares, como
um termo emprestado do direito internacional privado (direito de conflitos). Tratados tributários,
contudo, não contém regras de conflitos. Eles não determinam se um Estado deve aplicar a
legislação doméstica ou estrangeira, antes impõem suas próprias regras distributivas que são
fundamentalmente diferentes dos conflitos de normas do direito internacional privado (VOGEL,
Klaus, Introduction, 1997, p. 52).
535 BELLAN, Daniel Vitor, Interpretação dos Tratados Internacionais em Matéria Tributária, 2005,
p. 611.
536 BELLAN, Daniel Vitor, Interpretação dos Tratados Internacionais em Matéria Tributária, 2005,
p. 612.
537 SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito Tributário Internacional – Qualificação e Substituição –
Tributação, no Brasil, de Rendimentos Provenientes de Sociedade de Pessoas Residente na
Alemanha. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 54, mar. 2000, p. 133.
538 OKUMA, Alessandra, As Convenções para Evitar a Dupla Tributação e Elisão Fiscal e os Meios
de Solução de Controvérsia, 2007, p. 416.
Estado contratante e não de uma etapa da aplicação das regras contidas nas
CDTRs543.
Esse entendimento encontra eco em Roy Hohatgi, que trata a questão
referente aos ditos conflitos de qualificação no campo do item 2 do artigo 3º
da Convenção Modelo. Eis seu entendimento:
Segundo a Convenção Modelo, o artigo 3(2) é a regra de interpretação
do tratado. Este artigo permite um Estado a usar o significado de sua
legislação doméstica quando um termo não está definido no tratado, a
não ser que o contexto disponha de forma diversa. A regra estabelece
uma escolha entre o significado de acordo com a legislação doméstica
e um autônomo ou independente significado. Embora seja preferível,
para se atingir uma interpretação comum, um significado autônomo,
este nem sempre é possível. Ademais, não raro os Estados preferem
suas definições domésticas (“lex fori”) ao aplicar um tratado, por
conveniência e facilidade de uso. Eles podem também preferi-las pois
as mesmas evitam uma renúncia de seus soberano poder de tributar de
acordo com o tratado, conforme previsto em sua legislação doméstica.
Uma das razões para a dupla tributação (ou dupla não-tributação)
quando a legislação doméstica é aplicada é a diferença de qualificação
ou caracterização (também chamada classificação ou categorização),
da mesma renda nos dois Estados. O tratado usa termos derivados das
legislações domésticas, mas os mesmos têm diferentes significados.
Esses termos indefinidos do tratado podem ser interpretados para
terem os significados de cada um dos Estados contratantes, ou
mesmo um terceiro significado. O problema que surge quando os dois
Estados contratantes aplicam regras distributivas diferentes sobre a
mesma renda e contribuinte em razão de diferentes significados dos
termos do tratado nos dois Estados contratantes é chamado “conflito
de qualificações” no direito tributário internacional. Semelhante
problema também ocorre em um “conflito de atribuições”, quando
ambos Estados contratantes aplicam as mesmas regras distributivas
a contribuintes distintos.544
543 Ver: VOGEL, Klaus, Introduction, 1997, p.52; GARBARINO, Carlo, Manuale di Tassazione
Internazionale, 2005, p. 179.
544 ROHATGI, Roy, Basic International Taxation, 2005, p. 53.
Também neste sentido, afirma Heleno Taveira Tôrres que “no Direito
Internacional Tributário considera-se que exista um problema de qualificação
quando uma convenção acolhe expressões que, no direito nacional dos Estados
contratantes, são compreendidas em modo diverso”545.
Nesta assentada, afastando a ideia de qualificação como referente à
subsunção fática, temos que no campo do Direito Internacional Tributário há
que se falar em qualificação apenas nas situações em que houver uma remissão
ao direito interno dos Estados contratantes, e somente neste caso. Nas hipóteses
em que se estiver diante de divergências interpretativas de disposições de dada
CDTR não haverá que se falar em conflito de qualificações, mas sim de conflito
de interpretação.
545 TÔRRES, Heleno, Pluritributação Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, p. 660.
546 SILVEIRA, Rodrigo Maitto da, Aplicação de Tratados Internacionais contra a Bitributação: Qualificação
de Partnership Joint Ventures, 2006, p. 165. No mesmo sentido: VOGEL, Klaus, Introduction,
1997, p. 56; ROTHMANN, Gerd W., Interpretação e Aplicação de Acordos Internacionais contra a
Bitributação, 1978, p. 57.
547 JONES, John F. Avery. The Interaction Between Tax Treaty Provisions and Domestic Law. In:
MAISTO, Guglielmo (Org.). Tax Treaties and Domestic Law. Amsterdam: IBFD, 2006. pp. 126-127.
548 Sobre o tema, ver: SILVEIRA, Rodrigo Maitto da, Aplicação de Tratados Internacionais contra a
Bitributação: Qualificação de Partnership Joint Ventures, 2006, pp. 174-184; SCHAFFNER, Jean.
The OECD Report on the Application of Tax Treaties to Partnerships. Bulletin for International
Taxation, Amsterdam, May. 2000, pp. 218-226; ENGELEN, Frank A.; PÖTGENS, Frank P. G.,
Report on “The Application of the OECD Model Tax Convention to Partnerships” and the
Interpretation of Tax Treaties, 2000, pp. 250-269; VOGEL, Klaus. Conflicts of Qualification:
The Discussion is not Finished. Bulletin for International Taxation, Amsterdam, Feb. 2003, pp.
41-44; RUST, Alexander. The New Approach to Qualification Conflicts has its Limits. Bulletin
for International Taxation, Amsterdam, Feb. 2003, pp. 45-50; JONES, John F. Avery. Conflicts of
Qualification: Comment on Prof. Vogel’s and Alexander Rust’s Articles. Bulletin for International
Taxation, Amsterdam, May 2003, p. 184-186; JONES, John F. Avery, The “One True Meaning of a
Tax Treaty”, 2001, pp. 220-224; RUSSO, Raffaele. The OECD Approach to Partnerships – Some
Critical Remarks. European Taxation, Amsterdam, Apr. 2003, pp. 123-128; ROHATGI, Roy, Basic
International Taxation, 2005, pp. 53-56.
549 Ver: OECD. The Application of the Model Tax Convention to Partnerships. In: Model Tax Convention
on Income and on Capital, 2000, v. II, p. R(15)-41.
550 Klaus Vogel traz nota acerca da gênese histórica desses métodos, nos seguintes termos: “Como
todos estudiosos de direito tributário internacional sabem, há dois meios para evitar a dupla
tributação: isentar as rendas estrangeiras da tributação doméstica e conceder um crédito para
tributos do exterior. Quando as primeiras convenções para evitar a dupla tributação foram
concluídas 100 anos atrás - de fato, o primeiro tratado dessa natureza, entre Estados que não
estavam unidos em uma federação, Áustria e Prússia, data de 21 de junho de 1899 – era lógico
para os dois Estados distribuir bens e eventos tributáveis entre si de forma a tornar cada bem
ou evento tributável apenas em um Estado; dessa forma, cada bem ou evento tornou-se isento
de tributação no outro Estado contratante. Até a Segunda Guerra Mundial, este era o método
unanimemente aplicado por todas as convenções de dupla tributação entre países da Europa
continental.
O método de crédito, em contraste, foi originalmente ‘inventado’ – se posso assim dizer – pelo
Reino Unido, mas até a década de 40 era o mesmo restrito aos tributos cobrados por estados
do Império Britânico, particularmente a Índia. Um crédito por tributos pagos no exterior foi
introduzido em 1918 pelos Estados Unidos. A tal época, entretanto, era uma medida unilateral
em favor de cidadãos americanos e, sujeito à reciprocidade, a residentes não-americanos.
Como um dispositivo convencional o método de crédito foi considerado pelos modelos da Liga
das Nações de 1928 como uma alternativa ao método da isenção (como foi subsequentemente
adotado pela Convenção Modelo da OCDE). Ainda durante os anos 20 e 30, ambos os Estados
que utilizavam o crédito, os Estados Unidos e o Reino Unido, eram relutantes em concluir
tratados de dupla tributação. Portanto, os tratados tributários utilizavam o método da isenção
quase exclusivamente até os Estados Unidos e os estados da Comunidade Britânica decidiram
criar uma rede própria de tratados. Desde esta época, o método de crédito tornou-se popular
em alguns Estados do continente Europeu, que adotaram o mesmo seja como um método
unilateral, como a Alemanha, ou para seus tratados, como os países escandinavos e, mais
recentemente, a França” (VOGEL, Klaus. Which Method Should the European Community
Adopt for the Avoidance of Double Taxation? Bulletin for International Taxation, Amsterdam,
Jan. 2002, p. 4).
551 SCHOUERI, Luís Eduardo, Normas Tributárias Indutoras e Intervenção Econômica, 2005, p. 215. Ver
também: JUCH, D., General Report, 1981, pp. 18-20.
552 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 314.
553 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 314.
554 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 315. Sobre o tema, ver: RUSSO,
Raffaele. O Tratamento Dispensado pela OCDE às Partnerships – Uma Análise Crítica. Tradução
Helena de Rezende Grabenweger; Luiz Fernando Mascaro. Revista de Direito Tributário
Internacional, São Paulo, n. 4, out. 2006, p. 239.
555 PÖTGENS, Frank P. G. Article 15 (2) (b) of the OECD Model: Problems Arising from the Residence
Requirement for Certain Types of Employers. European Taxation, Amsterdam, June-July 2002,
p. 220.
556 Cf. OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 331
pelas ordens nacionais, à luz do contexto do tratado, não é uma solução para
o problema da qualificação”562.
Dessa forma, caso um dia seja alcançado o desiderato do desenvolvimento
de uma linguagem fiscal internacional563, tornando-se as CDTRs suficientes como
moldura textual, ter-se-ia acabado de vez com o problema da qualificação e
dos conflitos de qualificação.
A Quebra do Tratado
pela Interpretação:
Os Casos Brasileiros da
Tributação das Remessas ao Exterior
Decorrentes da Prestação de Serviços
sem Transferência de Tecnologia e
Aquelas Recebidas por Residentes
Brasileiros de ETVEs Espanholas
7.1. INTRODUÇÃO
Por tudo que o foi tratado até o presente momento nesta tese, é possível
que uma CDTR celebrada pelo Brasil tenha suas regras descumpridas (a) em
razão de uma regra especifica que venha a ser editada pelo legislador interno,
determinando expressamente que aquela estabelecida no tratado perdeu sua eficácia
(legislative override); (b) pelo fato de os tribunais brasileiros emprestarem à regra
pactícia uma interpretação distinta daquela que os tribunais do outro Estado
contratante lhe atribuem (judicial override) e, por fim, (c) em consequência de
os próprios órgãos de aplicação estatais, no caso brasileiro, as autoridades da
Secretaria da Receita Federal, interpretarem as disposições da CDTR de forma
evidentemente desbordante de sua moldura textual. Esta seria uma quebra do
tratado pela sua interpretação (hermeneutic override).
Veja-se que não estamos tratando aqui de meros conflitos hermenêuticos,
mas sim de uma manipulação do processo interpretativo de forma a se criar regra
jurídica que evidentemente não pode ser extraída do tratado.
É claro que a decisão quanto à presença ou não da regra nos limites textuais
da CDTR é também uma decisão hermenêutica, todavia, como um estudo de
casos irá demonstrar, é possível, de forma casuística, identificar situações em
que se buscou um hermeneutic override do tratado, ou seja, um descumprimento
da CDTR decorrente de uma artificial manipulação de sua interpretação, fora
dos marcos de sua moldura.
570 XAVIER, Alberto. O Imposto de Renda na Fonte e os Serviços Internacionais – Análise de um Caso
de Equivocada Interpretação dos arts. 7° e 21 dos Tratados. Revista Dialética de Direito Tributário,
São Paulo, n. 49, out. 1999, p. 10. Do mesmo autor, ver: XAVIER, Alberto, Direito Tributário
Internacional do Brasil, 2010, p. 563. Segundo Luciana Rosanova Galhardo, “a regra geral trazida
pelo artigo VII do tratado estabelece que os lucros de uma empresa de um Estado Contratante
só podem ser tributados nesse Estado, a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro
Estado Contratante por meio de um estabelecimento permanente ali situado” (GALHARDO,
Luciana Rosanova. Serviços Técnicos Prestados por Empresa Francesa e Imposto de Renda na
Fonte. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 31, Abr. 1998, p. 42). No mesmo sentido:
SCHOUERI, Luís Eduardo; RIBEIRO, Ricardo Pereira. New Withholding Taxes on Imported Services.
International Transfer Pricing Journal, Amsterdam, Sept.-Oct. 2004, p. 197. Posição em sentido
contrário é sustentada por Gabriel Francisco Leonardos, para quem “o único objetivo do art.
7º, no que diz respeito à inibição da atuação do Fisco de um dos países contratantes, consiste
na vedação de tributação dos lucros auferidos no outro país. Assim, por exemplo, o Governo
Brasileiro não pode tributar lucros auferidos pela empresa francesa na França, ou em outros
países estrangeiros, mas poderia tributar os lucros do estabelecimento permanente (i.e. filial)
que esta mantivesse em nosso país” (LEONARDOS, Gabriel Francisco. O Imposto de Renda de
Fonte sobre os Pagamentos ao Exterior por Serviços Técnicos – Análise de um Caso de Renúncia
Fiscal do Brasil. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 40, Jan. 1999, p. 39).
571 Vejam-se, por exemplo, as seguintes decisões: “Processo de Consulta nº 35/05. Órgão:
Superintendência Regional da Receita Federal – SRRF / 8a. Região Fiscal. Assunto: IMPOSTO
SOBRE A RENDA RETIDO NA FONTE – IRRF. Ementa: REMESSA AO EXTERIOR - Serviços Técnicos
Especializados e de Consultoria. Diante do disposto no parágrafo 3 do Artigo 12 do Decreto nº
76.975, de 2 de janeiro de 1976 (promulgou a Convenção destinada a Evitar a Dupla Tributação
e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos sobre a Renda Brasil/Espanha) e no item
5 do Protocolo (parte integrante da Convenção), a remuneração paga, creditada, entregue,
empregada ou remetida, a cada mês, a residente ou domiciliado no exterior pela prestação de
serviços técnicos especializados e de consultoria, caracteriza royalties. Por força do disposto no
item 4 do Protocolo (parte integrante da Convenção), tais importâncias sujeitam-se à incidência
do imposto de renda na fonte à alíquota de 12,5% (doze e meio por cento). Dispositivos Legais:
Art. 98 da Lei nº 5.172, de 25.10.1966 (Código Tributário Nacional); alínea “b” do parágrafo 2 e
parágrafo 3 do artigo 12, c/c os itens 4 e 5 do Protocolo da Convenção Internacional Brasil/Espanha
(promulgada pelo Decreto nº 76.975, de 2.01.1976); e Ato Declaratório Interpretativo SRF nº 27,
de 21.12.2004. Outros Tributos ou Contribuições INCIDÊNCIA - Contribuição de Intervenção
no Domínio Econômico-Cide. A empresa que pagar, creditar, entregar, empregar, ou remeter
importâncias ao exterior a título de royalties, está sujeita ao pagamento da Contribuição de
Intervenção no Domínio Econômico instituída pela Lei nº 10.168, de 2000. Dispositivos Legais:
Art. 2º da Lei nº 10.168, de 29.12.2000 (alterado pelo art. 6º da Lei nº 10.332, de 19.12.2001) e
art. 10 do Decreto nº 4.195, de 11.04.2002. AMILTON FERNANDO CASTARDO – Chefe (Data da
Decisão: 10.2.2005 14.04.2005)”. Processo de Consulta nº 119/99. Órgão: Superintendência
Regional da Receita Federal - SRRF / 7a. Região Fiscal. Assunto: Imposto de Renda Retido na
Fonte - IRRF. Ementa: REMESSAS PARA O EXTERIOR. CONVENÇÃO BRASIL E ESPANHA. ROYALTIES
E SERVIÇOS TÉCNICOS. Nas remessas a empresa domiciliada na Espanha aplicam-se as normas
veiculadas na respectiva Convenção Internacional, em detrimento da lei interna. Por força do
Protocolo, que é parte integrante do Tratado firmado, dá-se à remuneração relativa a prestação de
serviços técnicos o mesmo tratamento dispensado ao pagamento de royalties. Sobre a remessa
de numerário em pagamento à prestação de serviços técnicos de engenharia incide a alíquota
de quinze por cento. DISPOSITIVOS LEGAIS: CTN, art. 98; Decreto Legislativo 62/75; RIR, art.
685; Portaria MF 45/76. MARY LÉA BARROS MACEDO – Chefe (Data da Decisão: 12.5.1999
03.08.1999)”. Processo de Consulta nº 074/99. Órgão: Superintendência Regional da Receita
Federal - SRRF / 9a. Região Fiscal. Assunto: Imposto sobre a Renda Retido na Fonte – IRRF. Ementa:
Remessa a empresa domiciliada no exterior. Convenção Brasil-França. Prestação de assistência
e serviços técnicos. Lucros. Os pagamentos efetuados a empresa domiciliada na França que não
possua estabelecimento permanente no Brasil, referentes à prestação de assistência e serviços
técnicos não enquadrados no conceito de know how, são tributados pelo imposto de renda
exclusivamente naquele País. Programas de computador. Licença de uso. “Royalties”. Incide o
imposto de renda na fonte sobre os pagamentos efetuados a empresa domiciliada na França a
título de licença de uso, configurando royalties, de programas de computador (softwares) criados
e destinados ao atendimento de necessidades específicas do usuário. DISPOSITIVOS LEGAIS:
Convenção Brasil-França; Decreto nº 70.506/72, arts. VII e XII; RIR/1999, art. 710; Portaria-MF
nº 181/1989; Portaria nº 287/1972, item I, “a”. MARCO AURÉLIO CHICHORRO FALAVINHA
Chefe da Divisão (Data da Decisão: 12.7.1999 03.08.1999)”. “Processo de Consulta nº 011/99.
Órgão: Superintendência Regional da Receita Federal - SRRF / 9a. Região Fiscal. Assunto:
Imposto sobre a Renda Retido na Fonte - IRRF. Ementa: Remessa a empresa domiciliada no
exterior. Prestação de serviços. Convenção Brasil-França. Os pagamentos efetuados a empresa
domiciliada na França que não possua estabelecimento permanente no Brasil, referentes à
prestação de assistência e serviços técnicos não enquadrados de know how, são tributados pelo
imposto de renda exclusivamente naquele País. Dispositivos Legais: Convenção Brasil-França;
Decreto nº 70.506/72, arts. VII e XII. MARCO AURÉLIO CHICHORRO FALAVINHA - Chefe de
Divisão (Data da Decisão: 10.2.1999 15.04.1999)”. “Processo de Consulta nº 369/98. Órgão:
Superintendência Regional da Receita Federal - SRRF / 7a. Região Fiscal. Assunto: Imposto
sobre a Renda Retido na Fonte – IRRF. Ementa: REMESSA DE DIVISAS. SERVIÇOS TÉCNICOS.
TRIBUTAÇÃO CONVNEÇÃO INTERNAIONAL. Aos rendimentos decorrentes de contrato de
prestação de serviços de natureza técnica e gerencial, celebrado entre empresa brasileira e
empresa domiciliada na Espanha (prestadora), sem qualquer estabelecimento em nosso país,
e que não se configurem em pagamento de royalties, de transferência de know-how, ou coisa
do gênero, nem se apresentem como rendimentos de “profissão independente” exercida por
profissionais liberais em nosso país, dar-se-á o tratamento de lucro, recaindo o direito de tributar
ao país onde está estabelecida permanentemente a empresa prestadora. DISPOSITIVOS LEGAIS:
Lei 5.172/66 (CTN); Convenção Internacional Brasil-Espanha (Decreto nº 76.975/76); RIR/94.
MARY LEA BARROS MACEDO – Chefe (Data da Decisão: 28.12.1998 23.03.1999)”.
572 A partir de maio de 2001, a alíquota incidente sobre os rendimentos do trabalho e da prestação
de serviços passou a ser tributado à alíquota de 15% (quinze por cento).
573 Vale observar aqui que as CDTRs celebradas pelo Brasil divergem da Convenção Modelo no
que se refere ao artigo de Rendimentos não Expressamente Mencionados”. De fato, enquanto as
CDTRs brasileiras atribuem a ambos os Estados contratantes o direito de tributar tais rendimentos,
a Convenção Modelo estabelece uma competência exclusiva do Estado da residência para
tributa-los.
574 Cf. SCHOUERI, Luís Eduardo; RIBEIRO, Ricardo Pereira, New Withholding Taxes on Imported
Services, 2004, p. 198; TÔRRES, Heleno Taveira. Princípio da Territorialidade e Tributação de Não-
residentes no Brasil. Prestações de Serviços no Exterior. Fonte de Produção e Fonte de Pagamento.
In: TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier
Latin, 2003. pp. 100-104; SILVA, Sergio André Rocha Gomes da. O Ato Declaratório nº 1/2000 e
a ilegalidade da obrigação de retenção do imposto de renda na fonte. Revista Dialética de Direito
Tributário, São Paulo, n. 58, jul. 2000, pp. 100-108; NEVES, Márcio Calvet. O imposto de renda
na fonte nos pagamentos por prestação de serviços técnicos por residentes no exterior, o Ato
Declaratório CST nº1/00 e as convenções celebradas pelo Brasil para evitar a dupla tributação
da renda. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 58, jul. 2000, p. 69-74; XAVIER,
Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, pp. 566-570; BELLAN, Daniel Vitor.
Algumas Considerações sobre a Tributação dos Royalties Pagos a Beneficiários Residentes ou
Domiciliados no Exterior. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito Tributário Internacional
Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2003. pp. 373-375.
575 Nas palavras de Heleno Tôrres: “Se é verdade que em matéria de pagamentos feitos a residentes
no exterior, residentes em país com o qual o Brasil tenha tratado para evitar a dupla tributação,
devem ser aplicadas as normas do tratado, não é menos correto afirmar que, em se tratando de
pagamento por serviços técnicos, o dispositivo dos tratados que se aplica (considerando que
todos os tratados firmados pelo Brasil o foram com base na convenção modelo da OCDE) é o
artigo 7º, que trata do ‘Lucro da Empresa’ [...].
No que concerne aos rendimentos do art. 21 do Modelo OCDE de convenções [...]. Já afirmamos,
esta cláusula geral aplica-se a todos os rendimentos não qualificados expressamente nas
hipóteses de rendimentos especificados e classificados nas cláusulas específicas, incluída, entre
estas, aquela dos lucros das empresas (art. 7º). Dedique-se a empresa à indústria, ao comércio
ou à prestação de serviços. Não importa” (TÔRRES, Heleno Taveira. Princípio da Territorialidade
e Tributação de Não-residentes no Brasil. Prestações de Serviços no Exterior. Fonte de Produção
e Fonte de Pagamento, 2003, pp. 100-101).
576 Cf. AVI-YONAH, Reuven S.; CLAUSING, Kimberly A. Business Profits (Article 7 OECD Model
Convention). In: LANG, Michael et al (Coords.). Source versus Residence. The Netherlands: Wolters
Kluwer, 2008. pp. 9-10; BAKER, Philip, Double Taxation Conventions, 2005, pp. 7-2; CALDERÓN
CARRERO, José Manuel. La Tributación de los Beneficios Empresariales. In: GODOY F., Juan
Pablo. Estudios de Derecho Internacional Tributario: Los Convenios de Doble Imposición. Bogotá:
LEGIS, 2006. p. 151; TUNDO, Francesco. Las Rentas Empresariales en el Modelo OCDE. In:
PISTONE, Pasquale; TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Estudios de Derecho Tributario Constitucional
Internacional: Homenaje Latinoamericano a Victor Uckmar. Buenos Aires: Editorial Ábaco
de Rodolfo Depalma, 2005. pp. 920-921; ARESPACOCHAGA, Joaquín de, Planificación Fiscal
Internacional, 2002, p. 201-204; ARNOLD, Brian J. Threshold Requirements for Taxing Business
Profits under Tax Treaties. Bulletin for International Taxation, Amsterdam, Oct. 2003, p. 478;
MUNRO, Alistair, Tolley’s Double Taxation Relief, 2003, p. 189.
577 Cf. OEPEN, Wolfgang. A Alemanha Denuncia seu Tratado de Dupla Tributação com o Brasil –
Razões e Conseqüências da Denúncia do Tratado sob um Ponto de Vista Alemão. Revista de
Direito Tributário Internacional, São Paulo, 2005, pp. 217-218.
578 Cf. DAGNESE, Napoleão. Is Brazil ‘Developed’? Termination of the Brazil-Germany Tax Treaty.
Intertax, Amsterdam, v. 34, Apr. 2006, pp. 195-196.
579 SCHOUERI, Luís Eduardo; RIBEIRO, Ricardo Pereira, New Withholding Taxes on Imported Services,
2004, p. 198.
580 Apenas os tratados celebrados com Finlândia, França, Japão e Suécia não possuem tal previsão
no protocolo.
581 Nesse sentido: NEVES, Andrea Nogueira; CALAZANS, Fernanda Junqueira. Remessas de
Contraprestação por Serviços Técnicos para o Exterior Vis–à-Vis aos Tratados para Evitar a Dupla
Tributação. In: TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Direito Tributário Internacional Aplicado. São
Paulo: Quartier Latin, 2005. v. III. pp. 767-770.
583 Ver, por exemplo: Apelação no 2004.50.01.001354-5 (TRF da Segunda Região); Apelações
n o 2002.61.00.001530-0 e 2004.51.01.003852-0 (TRF da Terceira Região); Apelação n o
2002.71.00.006530-5 (TRF da Quarta Região).
584 Ver, por exemplo: Apelação no 2004.51.01.005795-2 (TRF da Segunda Região).
585 Sobre este caso que está sendo apreciado pelo STJ, ver: MATARAZZO, Giancarlo Chamma;
ARAÚJO, Joana Franklin de. Caso Copesul. In: CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e (Coord.).
Tributação Internacional: Análise de Casos. São Paulo: MP Editora, 2010. pp. 247-257. ROCHA,
Sergio André. Caso Copesul: Tributação pelo IRRF da Prestação de Serviços sem Transferência
de Tecnologia Prestados por Não Residentes. In: CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e
(coord.). Tributação Internacional: análise de casos: Vol. 2. São Paulo: MP Editora, 2013 (no prelo);
UCKMAR, Victor; GRECO, Marco Aurélio; ROCHA, Sergio André et al. Manual de Direito Tributário
Internacional. São Paulo: Dialética, 2012. p. 349-354.
Instrumentos para a
Solução de Divergências
Hermenêuticas no
Campo das CDTRs
8.1. INTRODUÇÃO
Segundo Giuseppe Melis, a interpretação das CDTRs deve se pautar pela
uniformidade de métodos hermenêuticos, a qual possibilitaria uma identidade
de conteúdo entre as interpretações dos Estados contratantes586.
A crença no método como forma de correção interpretativa, contudo, é de
todo ilusória, conforme se buscou demonstrar ao longo das páginas precedentes.
Sendo assim, é de se afirmar que nenhuma metodologia é capaz de
evitar eventuais conflitos hermenêuticos entre os Estados contratantes, sendo
certo que é no campo da argumentação jurídica que devem os mesmos ser
solucionados.
A resolução pacífica de controvérsias no campo do Direito Internacional
Público foi analisada com mais pormenor no terceiro capítulo desta tese, sendo que
as considerações então apresentadas servirão de base para os comentários a seguir.
Cabe, aqui, a ressalva feita por Igor Mauler Santiago, que destaca que
“de todos os mecanismos oferecidos pelo Direito das Gentes para a solução
de litígios internacionais, somente três têm-se revelado apropriados para o
trato das questões vinculadas a convenções tributárias: a negociação direta, a
arbitragem e a submissão a cortes permanentes”587.
Assim sendo, serão examinados neste capítulo, como formas de solução de
conflitos hermenêuticos entre os Estados contratantes, o procedimento amigável,
a arbitragem e a submissão de tais divergências a uma corte internacional
permanente, analisando-se a pertinência da criação de um órgão internacional
ao qual seria entregue tal tarefa, ou seja, uma corte internacional tributária.
Após uma breve análise destes que são os principais meios de solução de
controvérsias estudados na doutrina pátria e estrangeira, apresentaremos nossos
comentários a respeito da matéria.
586 MELIS, Giuseppe. Vincoli internazionali e norma tributaria interna. In: TÔRRES, Heleno Taveira
(Coord.). Direito Tributário Internacional Aplicado. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 564.
587 SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos,
2006, p. 175.
588 Cf. GARBARINO, Carlo, Manuale di Tassazione Internazionale, 2005, p. 198; SANTIAGO; Igor
Mauler, Métodos de Solução de Conflitos Fundados em Convenções contra a Dupla Tributação da
Renda, 2005, pp. 675-676; BIZIOLI, Gianluigi, Tax Treaty Interpretation in Italy, 2000, pp. 225-226;
XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, p. 164-165; ARESPACOCHAGA,
Joaquín de, Planificación Fiscal Internacional, 2002, p. 410; DOMINICI, Remo. Las Reglas para
la Resolución de los Conflictos en Matéria de Doble Imposición Internacional. In: UCKMAR,
Victor (Coord.). Curso de Derecho Tributario Internacional. Bogotá: Themis, 2003. v. I. p. 142;
TÔRRES, Heleno, Pluritributação Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, pp. 688-691;
RIBES RIBES, Aurora, Convenios para Evitar la Doble Imposición Internacional: Interpretación,
Procedimiento Amistoso y Arbitrage, 2003, p. 374; KOCH, Karl. General Report. In: IFA. Cahiers de
Droit Fiscal International: Mutual Agreement – Procedure and Practice. Deventer: Kluwer Law
International, 1981. v. 66a. p. 99.
590 Cf. ENTERRÍA, Eduardo Garcia de; FERNÁNDEZ, Tomás-Ramón. Curso de Derecho Administrativo.
10. ed. Madrid: Civitas, 2000. v. I. p. 457.
591 ENGISCH, Karl. Introdução ao Pensamento Jurídico. Tradução J. Baptista Machado. 7. ed. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 1996. pp. 208 e 209. Sobre a vaguedade dos conceitos jurídicos,
ver: CARRIÓ, Genaro R. Notas sobre Derecho y Lenguage. 4. ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot,
1994. p. 31. Sobre os conceitos jurídicos indeterminados ver, ainda: MAURER, Hartmut. Elementos
de Direito Administrativo Alemão. Tradução Luís Afonso Heck. Porto Alegre: Sergio Antonio
Fabris Editor, 2001. p. 54; DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade Administrativa
na Constituição de 1988. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 97; KRELL, Andreas J. A Recepção das
Teorias Alemãs sobre “Conceitos Jurídicos Indeterminados” e o Controle da Discricionariedade
no Brasil. Interesse Público, Porto Alegre, n. 23, jan.-fev. 2004, p. 21-49; COSTA, Regina Helena.
Conceitos indeterminados e discricionariedade administrativa. Revista de Direito Público, São
Paulo, jul.-set. 1990, pp. 125-138.
592 MAZZEI, Rodrigo Reis. Notas Iniciais à Leitura do Novo Código Civil. In: ALVIM, Arruda; ALVIM,
Theresa (Coords.). Comentários ao Código Civil Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2005, v. I, p.
LXXXII.
593 BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Teoria Geral dos Conceitos Indeterminados. Cadernos de
Direito Tributário e Finanças Públicas, São Paulo, n. 27, p. 99.
594 OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Legalidade Tributária - O Princípio da Proporcionalidade
e a Tipicidade Aberta, Revista de Direito Tributário, n. 70, 2003, p. 114; DOMINGUES, José Marcos.
Direito Tributário e Meio Ambiente. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 129. No mesmo sentido:
CARNÉ, Maria Dolors Torregrosa. Técnicas Procedimentales Alternativas en los Supuestos de
Aplicación de Conceptos Jurídicos Indeterminados. In: MESTRES, Magin Pont; CLEMENTE, Joan
Francesc Pont (Coords.). Alternativas Convencionales en el Derecho Tributario. Madrid/Barcelona:
Marcial Pons, 2003. p. 241.
601 VOGEL, Klaus; PROKISCH, Rainer G., General Report, 1993, p. 55. Ver também: KOCH, Karl,
General Report, 1981, pp. 95-96; VAN RAAD, Kees, International Coordination of Tax Treaty
Interpretation and Application, 2002, p. 222.
602 Sobre a vinculação entre a difusão de meios alternativos de solução de controvérsias e a
litigiosidade no campo fiscal, com ênfase da incapacidade do Poder Judiciário de cumprir
propriamente sua função, ver: BERTAZZA, Humberto J.; ORTIZ, José A. Díaz. La Relación Fisco
Contribuyente. Buenos Aires: ERREPAR, 2003. pp. 107 e 108.
603 LAPATZA, José Juan Ferreiro. Solución Convencional de Conflictos en el Ámbito Tributario: una
Propuesta Concreta. In: TORRES, Heleno (Coord.). Direito Tributário Internacional Aplicado. São
Paulo: Quartier Latin, 2004. v. II. p. 295. Nesse mesmo sentido: RODRÍGUEZ, Eleonora Lozano.
Arbitraje Internacional en Materia Tributaria. Bogotá: Editorial Temis, 2009. p. 53; RIBAS, Lídia
Maria Lopes Rodrigues; RIBAS, Antonio Souza. Arbitragem como meio Alternativo na Solução
de Controvérsias Tributárias. Revista Tributária e de Finanças Públicas, São Paulo, n. 60, jan.-fev.
2005, pp. 224 e 225; EZCURRA, Marta Villar. La Aplicación del Arbitraje a las Causas Tributarias.
Revista de Direito Tributário, São Paulo, n. 86, 2003, p. 166; TESO, Ángeles de Palma del. Las
Técnicas Convencionales en los Procedimientos Administrativos. In: MESTRES, Magin Pont;
CLEMENTE, Joan Francesc Pont (Coords.). Alternativas Convencionales en el Derecho Tributario.
Madrid/Barcelona: Marcial Pons, 2003. p. 22; PÉREZ, Juan Zornoza. ¿Qué Podemos Aprender de
las Experiencias Comparadas? Admisibilidad de los Convenios y otras Técnicas Transaccionales
en el Derecho Tributario Español. In: PISARIK, Gabriel Elorriaga (Coord). Convención y Arbitraje
en el Derecho Tributario. Madrid: Marcial Pons, 1996. p. 167.
604 Cf. KELSEN, Hans, Teoria Pura do Direito, 1984, p. 464.
605 Vale a pena mencionar o entendimento dissonante do professor argentino José Osvaldo Casás,
para quem os problemas decorrentes da utilização de conceitos indeterminados não devem
ser solucionados pela utilização de mecanismos alternativos de solução de conflitos, mas pela
elaboração de uma legislação que possibilite uma maior certeza das relações entre Fisco e
contribuinte. Eis sua lição: “Entendemos, por outro lado, que a transação não é o meio adequado
para resolver outras situações de incerteza, as quais têm origem nos preceitos tributários
aplicáveis, como as que se derivam da utilização de conceitos jurídicos indeterminados, pois que
o que alí está em jogo não são os fatos, mas o direito. Nesse caso, como em outros análogos, a
solução deve ser alcançada por outros meios tais como: a) uma transparente técnica legislativa,
garantindo a intervenção de juristas na redação dos projetos; e b) o ditado de normas gerais
de interpretação, a pedido dos contribuintes, responsáveis e ou entidades que os agrupem e
representem, como um meio de garantir a previsibilidade da ação estatal” (CASÁS, José Osvaldo.
Los Mecanismos Alternativos de Resolución de las Controversias Tributarias. Buenos Aires: Ad-Hoc,
2003. pp. 282-284).
606 BELLAN, Daniel Vitor, Interpretação dos Tratados Internacionais em Matéria Tributária, 2005,
pp. 661-662.
607 Solución Convencional de Conflictos en el Ámbito Tributario: una Propuesta Concreta, 2004,
p. 301. Ver, também: LAPATZA, José Juan Ferreiro. Arbitrage sobre Relaciones Tributarias. In:
PISARIK, Gabriel Elorriaga (Coord). Convención y Arbitraje en el Derecho Tributario. Madrid:
Marcial Pons, 1996. p. 264. Nesse mesmo sentido, são precisas as palavras do Professor Heleno
Taveira Tôrres: “Perplexidade – essa é a sensação de todos que iniciam leituras mais atentas
sobre as propostas de aplicação de mecanismos pactícios ou soluções típicas de regimes de
direito privado nos campos em que s permita mediação, conciliação, transação ou, mesmo,
a adoção de medidas arbitrais na composição de conflitos em matéria tributária. Na verdade,
esta sensação decorre mais do modo equivocado como estes argumentos são apresentados
do que propriamente das contingências que eles projetam sobre os princípios alegados como
sendo afetados na sua construção axiológica, como os da isonomia, preservação da capacidade
contributiva, indisponibilidade do crédito tributário e legalidade material (tipicidade) – os
maiores elementos de resistência para que se possa estender aos domínios das lides tributárias
os citados mecanismos.
De fato, se encarados como meios ordinários disponíveis para qualquer modalidade de
conflito, seria algo deveras preocupante, tendo em vista as implicações com o princípio da
legalidade estrita em matéria tributária. Cabe estabelecer, portanto, antes que uma cortina de
preconceitos, os limites para a adoção desses regimes, como bem já o fizeram outros países de
bases democráticas sólidas como França (Conciliation; Transaction; Régler Autrment les Conflicts,
de 1984), Alemanha, Itália (Accertamento com Adesione e Conciliazione Giudiciale), Inglaterra
(Alternative Dispute Resolution – ADR) e Estados Unidos (Alternative Dispute Resolution Act, de 1990;
Closing Agreement, Sec. 7, 121, IRC), empregando-os de forma prévia à utilização da via judicial
ou no seu curso, como nos casos de conciliação.
Tal como houve mudanças nos mecanismos de arrecadação e cobrança dos tributos devidos,
passando de um regime baseado exclusivamente em lançamentos de ofício ou por declaração
para um modelo típico de tributação de massa, como é o regime de antecipação do pagamento
por autolançamento (sujeito à homologação e controle por parte da Administração), onde o
contribuinte declara, qualifica o fato jurídico, quantifica e liquida a dívida; o que se quer é que
tais medidas de simplificação fiscal alarguem-se em seus horizontes, como prática de justiça,
nos moldes do que ocorreu com o instituto da compensação, sem que se tenha qualquer notícia
de prejuízo para o Erário Público.
Esses meios propostos serão sempre úteis para resolver conflitos baseados na interpretação
do texto normativo, naquilo que não for claro e determinável, quando sirvam para resolver
os problemas decorrentes do uso excessivamente prolixo, casuístico e obscuro da linguagem
das normas tributárias, propositadamente ambígua e imprecisa, repleta de indeterminações e
vaguezas. Aplicando-se onde a Administração não tenha certeza da ocorrência do fato jurídico
tributário, na interpretação dos fatos jurídicos, portanto, especialmente nos casos sujeitos a
regimes de presunções, quando houver dificuldade de demarcação dos conceitos fáticos,
quando não houver provas ou sejam estas insuficientes” (TÔRRES, Heleno Taveira. Transação,
Arbitragem e Conciliação Judicial como Medidas Alternativas para Resolução de Conflitos
entre Administração e Contribuintes – Simplificação e Eficiência Administrativa. Revista de
Direito Tributário, São Paulo, n. 86, 2003, pp. 47-50). Nesse mesmo sentido: SERRANO ANTÓN,
Fernando. La Resolución de Conflictos en el Derecho Internacional Tributario: Procedimiento Amistoso
y Arbitrage. Navarra: Civitas, 2010. p. 67.
608 Ver: MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e Controle Jurisdicional. 2. ed. São
Paulo: Malheiros, 2001. p. 14; SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. Princípios Fundamentais do Direito
Administrativo Tributário: A Função Fiscal. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 6 e 7; ROCHA,
Sergio André. Processo Administrativo Fiscal: Controle Administrativo do Lançamento Tributário.
2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. pp. 20-21;
609 Para um breve apanhado sobre essas posições ver: MASSANET, Juan Ramallo. La Eficacia de la
Voluntad de las Partes en las Obligaciones Tributarias. In: PISARIK, Gabriel Elorriaga (Coord).
Convención y Arbitraje en el Derecho Tributario. Madrid: Marcial Pons, 1996. p. 217.
610 Nesse sentido, ver: RIBAS, Lídia Maria Lopes Rodrigues; RIBAS, Antonio Souza, Arbitragem como
meio Alternativo na Solução de Controvérsias Tributárias, 2005, pp. 237 e 238; FALCÓN Y TELLA,
Ramón. El Arbitraje Tributario. In: PISARIK, Gabriel Elorriaga (Coord). Convención y Arbitraje en el
Derecho Tributario. Madrid: Marcial Pons, 1996. p. 260.
611 Cf. TORRES, Ricardo Lobo, Normas de Interpretação e Integração do Direito Tributário, 2006,
pp. 59-60; AMATUCCI, Andréa. L’interpretazione della norma di Diritto Finanziario. Napoli:
Casa Editrice Dott. Eugenio Jovene, 1965. pp. 241-244; ROTHMANN, Gerd W., Interpretação e
Aplicação de Acordos Internacionais contra a Bitributação, 1978, p. 122; SOUZA, Rubens Gomes
de. Normas de Interpretação no Código Tributário Nacional. In: MORAES, Bernardo Ribeiro
de, et. al. Interpretação no Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1975. pp. 369-371; BARROS, José
Eduardo Monteiro de. Interpretação Econômica em Direito Tributário. In: MORAES, Bernardo
Ribeiro de, et. al. Interpretação no Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1975. p. 171; ROSA JR., Luiz
Emygdio F. da. Manual de Direito Financeiro e Direito Tributário. 17. ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2003. pp. 482-483.
612 Nas palavras de Igor Mauler Santiago: “Sendo celebrado pelas autoridades fiscais dos Estados-
-contratantes, que sequer estavam obrigadas a atingi-lo, parece-nos natural que o acordo
resultante de um procedimento amigável as vincule, enquanto estas não o alterem ou revoguem
[...]” (SANTIAGO; Igor Mauler, Métodos de Solução de Conflitos Fundados em Convenções contra
a Dupla Tributação da Renda, 2005, p. 680). No mesmo sentido: OECD, Model Tax Convention on
Income and on Capital, 2010, p. 370. Em sentido contrário: BELLAN, Daniel Vitor, Interpretação
dos Tratados Internacionais em Matéria Tributária, 2005, pp. 661-662.
613 Cf. XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, p. 168; SANTIAGO, Igor Mauler,
Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos, 2006, p. 265.
614 Não havendo regra interna que regule os efeitos dos acordos decorrentes de procedimentos
amigáveis, certamente o contribuinte poderá questionar os mesmos perante o Poder Judiciário.
Este é o caso também no Reino Unido, como noticia Avery Jones (Cf. JONES, John F. Avery, The
“One True Meaning of a Tax Treaty”, 2001, p. 223).
615 XAVIER, Alberto, Direito Tributário Internacional do Brasil, 2010, p. 168.
616 SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos, 2006,
pp. 251-252. Do mesmo autor, ver: SANTIAGO; Igor Mauler, Métodos de Solução de Conflitos
Fundados em Convenções contra a Dupla Tributação da Renda, 2005, p. 680.
617 BORGES, Ricardo Henriques da Palma; Resende, Raquel Maria Maymone, Tax Treaty Interpretation
in Portugal, 2000, p. 296; BIZIOLI, Gianluigi, Tax Treaty Interpretation in Italy, 2000, p. 226;
GUTMANN, Daniel, Tax Treaty Interpretation in France, 2000, p. 115; REIMER, Ekkehart,
Interpretation of Tax Treaties, 1999, p. 466.
Conforme destaca Klaus Vogel, trata-se esta de matéria que deve ser
examinada diante da Constituição de cada país618, sendo que, considerando o
ordenamento brasileiro, divergimos do entendimento de Alberto Xavier e Igor
Mauler Santiago pelas seguintes razões.
Em primeiro lugar, parece-nos que realmente a celebração de acordos
executivos de caráter estritamente interpretativo não desborda os limites
impostos pela Constituição Federal para a vinculação do Brasil na esfera
internacional.
Com efeito, como vimos defendendo, ao acordo das partes contratantes
a respeito da norma contida no texto convencional deve ser sempre atribuída
primazia como interpretação autêntica, vinculante para os demais intérpretes
da norma internacional, até mesmo como forma de se evitar o treaty override
e de se alcançar a tão falada harmonia decisória.
Conforme mencionado por Igor Mauler Santiago, essa posição é
sustentada por Francisco Rezek619, devendo-se mencionar, contudo, que este
não está isolado no que se refere a tal entendimento.
Segundo Celso Albuquerque Mello, esta questão dividiu a doutrina
pátria em duas correntes. A primeira, que admite os acordos executivos em
algumas situações, inclusive quando tais acordos “consignam simplesmente
a interpretação de cláusulas de um tratado já vigente”, seria sustentada por
Hildebrando Accioly, Levi Carneiro, João Hermes Pereira de Araújo e Geraldo
Eulálio Nascimento Silva. Já a segunda, que nega qualquer possibilidade
de acordos executivos no Brasil, teria entre seus adeptos Haroldo Valladão,
Marota Rangel, Afonso Arinos, Pontes de Miranda, Themístocles Cavalcanti
e Carlos Maximiliano620. O saudoso professor filiou-se à primeira corrente, a
qual, segundo ele, “é a que melhor atende às finalidades práticas da questão”621.
618 VOGEL, Klaus, Introduction, 1997, p. 47. Neste sentido, Alessandra Okuma destaca que “embora
a solução do procedimento amigável seja vinculante para ambos os Estados contratantes, o
Poder Judiciário dos Estados contratantes só estará obrigado a aceitar tal solução se houver
norma juridical assim determinando, no sistema jurídico interno do Estado em referência. Caso
contrário, o Poder Judiciário não está adstrito à decisão do procedimento amigável, podendo
interpreter livremente o tratado, em face do sistema jurídico interno” (OKUMA, Alessandra, As
Convenções para Evitar a Dupla Tributação e Elisão Fiscal e os Meios de Solução de Controvérsia,
2007, p. 424).
619 REZEK, J. F., Direito Internacional Público, 2000, pp. 62-64.
620 MELLO, Celso D. de Albuquerque, Curso de Direito Internacional Público, 2004, p. 236.
621 MELLO, Celso D. de Albuquerque, Curso de Direito Internacional Público, 2004, p. 237. Ver
também: MELLO, Celso D. de Albuquerque. Os Tratados na Constituição. In: BONAVIDES, Paulo;
CAVALCANTI, Themístocles Brandão; DALLARI, Dalmo de Abreu et. al. As Tendências Atuais do
Direito Público: Estudos em Homenagem ao Prof. Afonso Arinos. Rio de Janeiro: Forense, 1976.
pp. 154-156.
622 Esse entendimento é adotado por Mercedes Peláez Marques, para quem “sendo uma norma
convencional, há que entender que os acordos tomados em um procedimento amigável estão
acima das decisões dos Tribunais ordinários de cada Estado ou de suas respectivas administrações.
É dizer, foi o tratado que legalizou esta via procedimental especial, pelo que cabe aplicar o
princípio constitucional, adotado neste caso tanto pela Espanha como pela Argentina, de
prevalência dos tratados sobre as leis nacionais ordinárias e, como consequência, deve-se
outorgar prioridade e plena validez a estas resoluções frente as de qualquer órgão do Estado
(administrativo e/ou judicial) e ao que disponham outras normas legais (de procedimento
contencioso-administrativo) a respeito, de hierarquia inferior aos tratados internacionais”
(MARQUES, Mercedes Peláez. El impuesto sobre el patrimonio en los convenios hispanoamericanos
para evitar da doble imposición. Buenos Aires: Editorial Ábaco de Rodolfo Depalma, 2006. p. 175).
Embora, como vimos no primeiro capítulo, não se possa falar de uma superioridade hierárquica
das CDTRs sobre as leis ordinárias domésticas brasileiras, a sua mera paridade hierárquica,
aliada a seu caráter de lex specialis parece ser bastante para que a conclusão aqui seja a mesma
alcançada por Peláez Marques diante dos ordenamentos jurídicos espanhol e argentino.
623 Cf. ROCHA, Sergio André, Processo Administrativo Fiscal: Controle Administrativo do Lançamento
Tributário, 2007, pp. 23-24.
624 BAKER, Philip, Double Taxation Conventions, 2005, pp. 25-12. Ver, também: OECD, Model
Tax Convention on Income and on Capital, 2000, p. C(25)-16; TÔRRES, Heleno, Pluritributação
Internacional sobre as Rendas de Empresas, 2001, p. 694.
625 No mesmo sentido, ver: SCHOUERI, Luís Eduardo. Arbitragem no Direito Tributário Internacional.
Revista Direito Tributário Atual, São Paulo, n. 23, 2009, p. 305.
626 Ver: SERRANO ANTÓN, Fernando. La Resolución de Conflictos en el Derecho Internacional Tributario:
Procedimiento Amistoso y Arbitrage. Navarra: Civitas, 2010. pp. 278-287; RODRÍGUEZ, Eleonora
Lozano. Arbitraje Internacional en Materia Tributaria. Bogotá: Editorial Temis, 2009. p. 101;
ZÜGER, Mario. The ECJ as Arbitration Court for the New Austria-Germany Tax Treaty. European
Taxation, Amsterdam, March 2000, p. 101; ISMER, Roland. Compulsory Waiver of Domestic
Remedies before Arbitration under a Tax Treaty – a German Perspective. Bulletin for International
Taxation, Amsterdam, Jan. 2003, p. 18; CARMONA FERNÁNDEZ, Nestor, No Discriminación,
Procedimiento Amistoso e Intercambio de Información, 2001, p. 586; MIZUNO, Tadatsune.
Advance Pricing Agreements, Mutual Agreements, and Arbitration in Japan. In: VOGEL, Klaus
(Org.). Interpretation of Tax Law and Treaties and Transfer Pricing in Japan and Germany. The Hague:
Kluwer Law International, 1998. p. 187; SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário Internacional:
Métodos de Solução dos Conflitos, 2006, p. 212-214; GOUTHIÈRE, Bruno, Les Impôts dans les
Affaires Internationales, 1989, p. 727; AZZI, John. Tackling Tax Treaty Tensions: Time to Think
About an International Tax Court. Bulletin for International Taxation, Amsterdam, Aug.-Sept.
1998, p. 346; MONTEIRO, Alexandre Luiz do Rêgo. Métodos de Solução de Controvérsias entre
Estados Soberanos no Âmbito do Comércio Internacional. Análise dos Mecanismos Instituídos
pela OMC e Contidos na Convenção-Modelo para Evitar a Dupla Tributação da OCDE. In:
CASTRO, Leonardo Freitas de Moraes e (Coord.). Tributação, Comércio e Solução de Controvérsias
Internacionais. São Paulo: Quartier Latin, 2011. p. 451.
627 Segundo Maarten Ellis este seria o principal ponto de crítica do procedimento amigável como
forma de solução de controvérsias no campo das CDTRs (Cf. ELLIS, Maarten J. General Report.
In: IFA. Cahiers de Droit Fiscal International: Advance rulings. Deventer: Kluwer Law International,
1999. v. 84b. p. 48).
628 Cf. FALCÓN Y TELLA, Ramón; PULIDO GUERRA, Elvira. Derecho Fiscal Internacional. Barcelona:
Marcial Pons, 2010. p. 190.
629 RIBES RIBES, Aurora. Compulsory Arbitration as a Last Resort in Resolving Tax Treaty Interpretation
Problems. European Taxation, Amsterdam, Sept. 2002, p. 300.
630 Cf. SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos,
2006, p. 214. Do mesmo autor: SANTIAGO; Igor Mauler, Métodos de Solução de Conflitos
Fundados em Convenções contra a Dupla Tributação da Renda, 2005, p. 6681-682; CALDERÓN,
José M.; DOLORES PIÑA, M., Interpretation of Tax Treaties, 1999, p. 383.
631 TILLINGHAST, David R. Issues in the Implementation of the Arbitration of Disputes Arising under
Income Tax Treaties. Bulletin for International Taxation, Amsterdam, March 2002, p. 90.
632 TILLINGHAST, David R., Issues in the Implementation of the Arbitration of Disputes Arising under
Income Tax Treaties, 2002, p. 90. Esse mesmo ponto de vista é sustentado por Roland Ismer,
que destaca que a despeito de todo interesse pela arbitragem até aquele momento nenhuma
arbitragem havia sido efetivamente concluída (ISMER, Roland. Compulsory Waiver of Domestic
Remedies before Arbitration under a Tax Treaty – a German Perspective, 2003, p. 18). No mesmo
sentido: RIBES RIBES, Aurora, Convenios para Evitar la Doble Imposición Internacional: Interpretación,
Procedimiento Amistoso y Arbitrage, 2003, p. 427; RODRÍGUEZ CARRÍON, Alejandro J., Lecciones
de Derecho Internacional Públicos, 2006, p. 504.
633 ELLIS, Maarten J. Issues in the Implementation of the Arbitration of Disputes Arising under Income
Tax Treaties – Response to David Tillinghast. Bulletin for International Taxation, Amsterdam, March
2002, p. 100.
634 Cf. TILLINGHAST, David R., Issues in the Implementation of the Arbitration of Disputes Arising
under Income Tax Treaties, 2002, p. 92; RIBES RIBES, Aurora, Compulsory Arbitration as a Last
Resort in Resolving Tax Treaty Interpretation Problems, 2002, p. 303; SANTIAGO; Igor Mauler,
Métodos de Solução de Conflitos Fundados em Convenções contra a Dupla Tributação da Renda,
2005, pp. 682; LINDENCRONA, Gustaf. Recent Development in Tax Treaty Arbitration. In: IFA.
Resolution of Tax Treaty Conflicts by Arbitration. Deventer: Kluwer Law and Taxation Publishers,
1994. p. 7-8; GARCÍA FRÍAS, M. Ángeles. El Arbitrage Tributario Internacional. Una apuesta de
futuro para la resolución de conflictos llena de cuestiones pendientes de resolver. In: PISTONE,
Pasquale; TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Estudios de Derecho Tributario Constitucional
Internacional: Homenaje Latinoamericano a Victor Uckmar. Buenos Aires: Editorial Ábaco de
Rodolfo Depalma, 2005. p. 613.
635 ZÜGER, Mario. ICC Proposes Arbitration in International Tax Matters. European Taxation,
Amsterdam, June 2001, p. 223.
636 RIBES RIBES, Aurora, Compulsory Arbitration as a Last Resort in Resolving Tax Treaty Interpretation
Problems, 2002, p. 303.
637 ELLIS, Maarten J., Issues in the Implementation of the Arbitration of Disputes Arising under
Income Tax Treaties – Response to David Tillinghast, 2002, p. 101.
638 SANTIAGO; Igor Mauler, Métodos de Solução de Conflitos Fundados em Convenções contra a
Dupla Tributação da Renda, 2005, p. 684.
639 RIBES RIBES, Aurora, Compulsory Arbitration as a Last Resort in Resolving Tax Treaty Interpretation
Problems, 2002, p. 303.
640 Brian J. Arnold, Jacques Sasseville e Eric M. Zolt, reportando os debates do Seminário realizado
pelo International Bureau of Fiscal Documentation em 23-25 de outubro de 2001 relataram
as preocupações com a legitimidade da OCDE para seguir guiando as questões relativas à
tributação internacional em um mundo em que cada vez mais países passam a participar do
comércio internacional de bens e serviços (Cf. ARNOLD, Brian J.; SASSEVILLE, Jacques; ZOLT,
Eric M. Summary of the Proceedings of na Invitational Seminar on Tax Treaties in the 21st Century.
Bulletin for International Taxation, Amsterdam, June 2002, p. 233).
641 Para uma análise da composição da câmara arbitral, ver: TILLINGHAST, David R., Issues in the
Implementation of the Arbitration of Disputes Arising under Income Tax Treaties, 2002, p. 97.
642 SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos,
2006, p. 265.
643 GARCÍA FRÍAS, M. Ángeles. El Arbitrage Tributario Internacional. Una apuesta de futuro para
la resolución de conflictos llena de cuestiones pendientes de resolver. In: PISTONE, Pasquale;
TÔRRES, Heleno Taveira (Coord.). Estudios de Derecho Tributario Constitucional Internacional:
Homenaje Latinoamericano a Victor Uckmar. Buenos Aires: Editorial Ábaco de Rodolfo Depalma,
2005. p. 614. Nesse sentido: ZÜGER, Mario, The ECJ as Arbitration Court for the New Austria-
-Germany Tax Treaty, 2000, p. 103; TILLINGHAST, David R., Issues in the Implementation of the
Arbitration of Disputes Arising under Income Tax Treaties, 2002, p. 94.
644 Cf. MAZZUOLI, Valerio de Oliveira, Curso de Direito Internacional Público, 2006, p. 635; ACCIOLY,
Hildebrando; NASCIMENTO E SILVA, G. E do, Manual de Direito Internacional Público, 2000, pp.
422-423; MELLO, Celso D. de Albuquerque, Curso de Direito Internacional Público, 2004, p. 1444;
ARAÚJO, Luis Ivani de Amorim, Curso de Direito Internacional Público, 1995, p. 329; REZEK, J. F.,
Direito Internacional Público, 2000, p. 343; HUSEK, Carlos Roberto, Curso de Direito Internacional
Público, 2006, p. 224.
645 OECD. Improving the Resolution of Tax Treaty Disputes. Disponível na internet em: Acesso em 10
de setembro de 2007.
646 OECD, Improving the Resolution of Tax Treaty Disputes, p. 4.
647 OECD, Improving the Resolution of Tax Treaty Disputes, p. 4.
o que teve como efeito o aumento nos ajustes dos mesmos decorrentes e,
assim, ajustes correspondentes e disputas fiscais; (b) a entrada em vigor, em 01
de janeiro de 1995, da Convenção de Arbitragem da União Europeia; e (c) a
mudança de atitude do Senado Norte Americano em relação à arbitragem649.
Da maneira como posta na Convenção Modelo, a arbitragem aparece não
como uma alternativa ao procedimento amigável, mas como um prolongamento
do mesmo650.
Embora, como notado por Carlo Garbarino e Marina Lombardo, note-
-se um aumento no número de tratados celebrados que prevejam a regra de
arbitragem651, a verdade é que, na prática, ainda não escassos os casos em que
uma divergência interpretativa tenha sido solucionada via arbitragem.
De acordo com o § 5º do artigo 25 da Convenção Modelo, passados
dois anos sem que a questão seja solucionada via procedimento amigável,
instaura-se a arbitragem. Segundo os Comentários da OCDE “este processo
não é dependente de autorização prévia pelas autoridades competentes: uma
vez que os requisitos procedimentais tenham sido observados, as questões não
resolvidas que impedem a conclusão do procedimento amigável devem ser
submetidas à arbitragem”652.
Preocupada com a eficácia da arbitragem, a OCDE, em seus Comentários,
ressalta que esta cláusula só deve ser incluída em convenções “quando cada
Estado conclui que o processo pode ser efetivamente implementado”653.
O procedimento sugerido pela OCDE para a implementação da
arbitragem está previsto no Modelo de Acordo Arbitral, anexo aos Comentários
ao artigo 25. Encontram-se lá regras como as seguintes:
a) A necessidade de o pedido de arbitragem ser feito por escrito,
sendo possível apenas dois anos após a apresentação do caso à
autoridade competente para solução via procedimento amigável654.
649 AULT, Hugh J. Recent Treaty Developments in the Arbitration of International Tax Disputes. In:
BAKER, Philip; BOBBET, Catherine (Coords.). Tax Polymath: Essays in Honour of John F. Avery
Jones. IBFD: The Netherlands, 2010. pp. 298-299.
650 Cf. CASTAGNÈDE, Bermard. Précis de Fiscalité Internationale. 3 ed. Paris: Presses Universitaires de
France, 2010. p. 337.
651 GARBARINO, Carlo; LOMBARDO, Marina. Arbitration of Unresolved Issues in Mutual Agreement
Cases: The New Para. 5, Art. 25 of the OECD Model Convention, a Multi-Tiered Dispute Resolution
Clause. In: LANG, Michael et al (Coords.). Trax Treaties: Building Bridges Between Law and
Economics. The Netherlands: IBFD, 2010. p. 464.
652 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 371.
653 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 372.
654 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 381.
655 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 382.
656 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 382-383.
657 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 384.
658 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 385.
659 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 385.
660 OECD, Model Tax Convention on Income and on Capital, 2010, p. 387.
661 SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos, 2006,
p. 154. Nesse sentido: RIBES RIBES, Aurora, Convenios para Evitar la Doble Imposición Internacional:
Interpretación, Procedimiento Amistoso y Arbitrage, 2003, p. 407; TAVOLARO, Agostinho Toffoli.
A Solução dos Conflitos de Dupla Tributação Jurídica Internacional. In: TAVOLARO, Agostinho
Toffoli; MACHADO, Brandão; MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coords.). Princípios Tributários
no Direito Brasileiro e Comparado: Estudos em Homenagem a Gilberto de Ulhôa Canto. Rio de
Janeiro: Forense, 1988. p. 16.
662 SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos,
2006, pp. 236-237.
663 ELLIS, Maarten J., Issues in the Implementation of the Arbitration of Disputes Arising under
Income Tax Treaties – Response to David Tillinghast, 2002, p. 101.
664 AZZI, John, Tackling Tax Treaty Tensions: Time to Think About an International Tax Court, 1998,
p. 349.
665 AZZI, John, Tackling Tax Treaty Tensions: Time to Think About an International Tax Court, 1998,
p. 355.
666 Cf. RIBES RIBES, Aurora, Convenios para Evitar la Doble Imposición Internacional: Interpretación,
Procedimiento Amistoso y Arbitrage, 2003, pp. 408-409; SANTIAGO, Igor Mauler, Direito Tributário
Internacional: Métodos de Solução dos Conflitos, 2006, p. 238. Agostinho Toffoli Tavolaro sustenta
que “de um ponto de vista ideal, um Tribunal Fiscal Internacional que tivesse por objeto dirimir
os litígios de dupla tributação internacional seria, a nosso ver, a solução que melhor atenderia
aos reclamos de todos os cultores do direito.
Representa ele, todavia, como de resto representam todos os tribunais internacionais, ideal
somente atingível com o aprimoramento do homem e das nações, fruto de um estágio de
civilização que ainda estamos distantes, alguns mais que outros, conforme o país em que se
encontrem” (TAVOLARO, Agostinho Toffoli, A Solução dos Conflitos de Dupla Tributação Jurídica
Internacional, 1988, p. 18).
667 Posição em sentido contrário é sustentada por John Azzi, para quem a criação de uma corte
tributária internacional seria importante para a defesa dos interesses dos países menores e
em desenvolvimento contra aqueles dos países desenvolvidos e das grandes corporações (Cf.
AZZI, John, Tackling Tax Treaty Tensions: Time to Think About an International Tax Court, 1998,
p. 355-356).
668 VAN RAAD, Kees, International Coordination of Tax Treaty Interpretation and Application, 2002,
pp. 221-223. Ver também: VAN RAAD, Kees. Interpretation and Application of Tax Treaties by Tax
Courts. Bulletin for International Taxation, Amsterdam, Jan. 1996, p. 6.
669 É importante que no Brasil vejamos através destas posições que são apresentadas pelos países
desenvolvidos como satisfatórias para todos, quando, na verdade, parecem vantajosas para
apenas uns poucos países. Sobre esse tema destaca-se a seguinte passagem do Embaixador
Samuel Pinheiro Guimarães, a qual aborda, inclusive, o papel da OCDE: “No processo de
implementação de seus objetivos, procuram [as grandes potências] manietar a capacidade dos
grandes Estados da periferia de executar estratégias de superação do subdesenvolvimento e
da dependência, pois estas podem afetar seus interesses, a partir da construção de uma teia
de acordos e de agências que consagrem aqueles privilégios e dêem a eles natureza e status
jurídico internacional, revestidos da sacralidade do princípio pacta sunt servanda (os acordos
devem ser cumpridos). Nessa estratégia, procuram obter a participação dos Estados periféricos,
essencial para conferir a aparência de legitimidade e universalidade a construções jurídicas
extremamente assimétricas como a própria Organização Mundial do Comércio (OMC), o
Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP) e o Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis
(MTCR), que são apresentados como vitórias progressistas e pacifistas da humanidade, mas
cuja finalidade é manter privilégios econômicos e edulcorar a violência unilateral contra os
Estados que resistem a se deixar cooptar, absorver e submeter.
Nessa estratégia está sempre presente a idéia, ainda que implícita, de integrar territorialmente ou
desarticular politicamente os grandes Estados periféricos pelo estímulo a rivalidades regionais,
raciais e religiosas onde elas existem, e, de outro lado, impedir que os grandes Estados se
articulem, nos planos regional e internacional, para enfrentar a ação e a pressão das grandes
negociação, qualquer interpretação de uma CDTR que não seja aquela que
leva à maior tributação possível670.
Ora, a negociação de uma CDTR, em qualquer momento, é ato
diplomático, que deve ser levado a termo por agentes diplomáticos, ou seja,
negociadores com hábito e competência para a transação.
Supostamente, a participação das autoridades fazendárias diretamente
no procedimento amigável seria importante mecanismo para suprir eventuais
deficiências técnicas dos diplomatas, certamente menos conhecedores da
matéria fiscal. Contudo, nada impede que os técnicos forneçam ao corpo
diplomático as informações técnicas necessárias para que este desempenhe
sua função.
Parece-me que toda essa discussão acerca da aplicação de meios
jurisdicionais de solução de controvérsias no campo das CDTRs se deve a uma
visão muito centrada na figura do contribuinte que estaria sendo duplamente
tributado em um caso específico, quando, na verdade, a celebração de tais
convenções, da maneira como vemos, tem muito mais a ver com as relações entre
Estados do que com uma proteção do contribuinte em situação em particular.
É só ver, no caso brasileiro, que o Brasil não possui uma CDTR com
seu principal parceiro comercial, os Estados Unidos da América, nem por isso
argumenta-se de uma violação de direitos dos residentes de lá e daqui671. O
mesmo se diga em relação ao Reino Unido, outro país com o qual não temos
tratado ou, mais recentemente, a Alemanha.
A legislação interna brasileira é munida com mecanismos unilaterais de
prevenção da dupla tributação que faz com que o tratamento de não residentes,
situados em países com ou sem CDTR com o Brasil, não seja muito distinto,
exceto pelos benefícios concedidos em algumas convenções, como os créditos
presumido e fictício.
Com efeito, o artigo 395 do Regulamento do Imposto de Renda traz regra
geral que permite que as pessoas jurídicas compensem, no Brasil, o imposto
pago no exterior. Por outro lado, ao examinarmos as alíquotas do Imposto
670 Cf. BELLAN, Daniel Vitor, Interpretação dos Tratados Internacionais em Matéria Tributária, 2005,
pp. 661-662.
671 Para uma análise das possíveis razões que impedem a celebração de um tratado entre Brasil e
Estados Unidos, ver: CARVALHO, André de Souza. Acordo Brasil-EUA: o que ainda falta para a
sua conclusão? Revista de Direito Internacional Tributário, São Paulo, n. 4, 2006, pp. 9-42.
utilizados na CDTR não estejam definidos em seu texto e nem sejam inferíveis
de seu contexto.
Este (o reenvio ao direito interno) é mais uma causa de potenciais
divergências no que tange à interpretação/aplicação das CDTRs, havendo
dúvidas quanto à solução dos conflitos de qualificação pelo new approach da
OCDE a respeito da matéria.
Uma conclusão importante extraível a partir da inserção dos debates a
respeito da interpretação das CDTRs no âmbito da argumentação jurídica, é no
sentido da relativização de diversas das discussões que se travam nesse campo.
Como vimos, reenvio ao direito interno estático ou dinâmico, posição
da Convenção Modelo e dos seus comentários no campo hermenêutico, bem
como seu uso estático ou dinâmico, a consideração de parallel treaties, decisões
dos tribunais do outro Estado contratante ou de sua legislação interna são, na
verdade, discussões que merecem uma diferente abordagem.
Todos esses são pontos de partida para a interpretação das CDTRs, não
havendo que se buscar uma hierarquização de tais elementos, como forma de
se estabelecer uma prevalência apriorística.
Assim, por exemplo, tanto os Comentários da OCDE à sua Convenção
Modelo vigentes quando da celebração da CDTR, quanto aqueles em vigor
no momento da interpretação/aplicação da convenção podem ser considerados
pelo intérprete, parecendo-nos inerte a tentativa de fazer uma seleção a priori
que estabeleça o que se deve considerar e o que não se deve levar conta.
Sustentamos aqui, portanto, que a interpretação das CDTRs deve se dar
nos marcos da argumentação jurídica, sendo que na construção de sentido
a partir dos textos convencionais os Estados contratantes não têm o seu
agir hermenêutico pautado por uma hierarquização rígida dos elementos de
interpretação, tendo, contudo, o dever de justificar a decisão tomada.
A grande diretriz hermenêutica que deve reger a interpretação das CDTRs
é, desta forma, o princípio da boa-fé, no sentido de que nenhum dos Estados
contratantes deve buscar inadimplir suas obrigações, ou criar para a outra parte
deveres que não tenham sido pactuados.
Há que se distinguir, todavia, a possibilidade de divergências hermenêuticas
quanto à interpretação de uma CDTR da eventual tentativa de se descumprir
as obrigações assumidas no tratado internacional sob tal pretexto, no que
designamos como um hermeneutic override da convenção.
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