Ilíada
Ilíada
Ilíada
Esta publicação consiste numa transcrição da aula do Professor José Monir Nasser,
disponível em https://www.youtube.com/watch?v=L1DdAjjPAnc . Algumas partes
foram complementadas com informações mencionadas em outras aulas do
professor e com trechos do resumo que não puderam ser lidos devido à limitação do
tempo da aula. Ao final desta publicação, estão disponíveis as tabelas com os
nomes das personagens gregas e troianas.
[INÍCIO DA TRANSCRIÇÃO]
Muitos dos pedaços da obra podem ter sido mudados à medida em que eram
preservados apenas oralmente. Os acontecimentos que esta obra retrata estão
todos ligados à queda de Troia. A cidade de Troia não é uma cidade fictícia, ela
realmente existiu. Hoje, acredita-se que lá pelo ano 1200 a.C. tenha ocorrido de fato
uma guerra de Troia. Outro nome para Troia é Ílion, por isso que esta obra que nós
conheceremos hoje se chama “Ilíada”.
Então, o que nós sabemos sobre essa obra? Sabemos que em 1200 a.C., portanto
há 3200 anos, houve um grande conflito no Mediterrâneo envolvendo essa cidade,
que era mais do que apenas uma cidade, representava um conjunto de povos, cujos
resquícios estão todos hoje na Turquia, na Ásia Menor. A dificuldade é que existem
várias camadas de detritos simultaneamente, o que faz com que haja alguma dúvida
sobre qual deles é Troia. Descobertas arqueológicas modernas realizadas por um
alemão chamado Schliemann não foram muito conclusivas. Elas indicam que Troia
existiu, de fato, naquele lugar que estava previsto na obra de Homero. No entanto,
pela análise de seus resquícios, aparentemente não se tratava de um lugar muito
grande e nem muito poderoso – é claro que puderam ocorrer modificações nesse
tempo todo.
Essa guerra envolveu os ditos gregos – Grécia é uma entidade moderna, não havia
Grécia naquela época, mas sim apenas povos de cultura semelhante, que são
chamados por vários nomes. Reparem que vocês receberam aí o mapa das
principais personagens. Os gregos são chamados de dânaos, aquivos, aqueus,
acaios, argivos e helenos, todos nomes que se davam àqueles habitantes ali,
aqueles povos que se associaram na guerra contra Troia. Os troianos não têm
muitos nomes, há aqui um pequeno resumo dos nomes dos troianos: teucros, troas
e frígios; todos nomes que se atribuíam aos troianos e aparecem na obra.
Um problema que nós teremos que resolver aqui é que durante o resumo vai
aparecer uma enxurrada de nomes, vocês provavelmente terão alguma tendência a
confundi-los. Eu não consigo resolver esse problema, por mais que eu faça esforços
aqui, porque é da natureza desta exuberância de personagens, mas eu farei todo o
possível para tentar esclarecer. Agora, só se resolve esse problema mesmo se você
fizer o esforço de ler a obra inteira com calma até ter domínio completo da história.
A história não é muito complexa, ela parece um pouco decepcionante porque todo
mundo pensa na guerra de Troia e automaticamente lembra do cavalo de Troia, que
teria sido aquele estratagema que os gregos usaram para adentrar as fortificações.
Infelizmente, na Ilíada não há nenhuma palavra sobre isso.
Essa história do Cavalo de Troia não é contada na Ilíada: ela é contada na Odisseia.
Odisseia é a história subsequente, que se segue a essa aqui, cujo herói é Odisseu,
um dos gregos que está sitiando Troia. Portanto, é apenas nesse segundo livro que
Odisseu, ao nos contar suas façanhas, finalmente nos relata como é que foi que os
gregos haviam conseguido derrotar os troianos. Ou seja, o estratagema do cavalo
de Troia não é nem mencionado nesse livro.
Antes da gente começar, eu preciso ainda dizer uma porção de outras coisas, mas
também preciso ter certeza de que vocês estão compreendendo o que eu estou
dizendo. Alguém tem alguma dúvida? Lembrem-se que a regra geral do nosso
programa aqui é que é proibido não entender. Pode discordar à vontade, o que não
pode é não entender; porque até mesmo para poder discordar é preciso antes
entender a história.
Portanto, o que nós vamos ver aqui é a história de um conflito armado entre gregos
e troianos. Os gregos sitiaram durante 10 anos a cidade de Troia, muito bem
fortificada. A Ilíada é a história dos últimos 51 dias de cerco. Portanto, há 10 anos de
história que são apenas referidos no meio, não realmente contados
cronologicamente. Nós apenas veremos alguns pedaços da história narrados aqui,
pois os acontecimentos trágicos da Ilíada acontecem apenas nos últimos 51 dias. Há
a destruição e então uma segunda história em que o Odisseu (e apenas o Odisseu
porque os seus companheiros não demoraram tanto tempo) passa mais 10 anos
para voltar para sua casa, Ítaca, uma das ilhas gregas. O que você precisam sempre
lembrar é que nós não estamos falando de Grécia no sentido moderno da palavra,
mas sim de uma coalizão de cidades-Estado: essas cidades a que se resume uma
certa sociedade; todas elas dotadas da cultura grega, portanto não há diferenças
grandes em termos culturais, embora sejam cidades independentes.
Ou seja, isso que ataca a Troia é uma coalizão de cidades gregas irmanadas porque
havia um acordo que as obrigava a atacarem Troia. Então, eu preciso contar para
vocês como é que essa encrenca começou. Ela começa com o rei e da rainha de
Troia, o rei Príamo e a rainha Hécuba, que tinham 19 filhos – dentre esses, várias
das personagens que são centrais nessa história. Após o nascimento de um desse
filhos, chamado Páris, a mãe foi fazer lá uma consulta com um oráculo (um
sacerdote ou sacerdotisa que interpreta a vontade dos deuses), que lhe diz que
aquele menino ia ser responsável pela destruição de Troia. Exatamente como
aconteceu com Édipo, cujo pai tinha medo que o filho cumprisse a profecia do
Oráculo, Príamo e Hécuba desterraram o menino, dando-lhe de presente para os
pastores que moravam numa ilha distante nas imediações de Troia. Esse menino,
nascido Paris, foi rebatizado como Alexandre. Ele era um menino excepcionalmente
bonito e todos os deuses olharam para ele com uma certa reverência.
Certo dia, no Olimpo (não estranhem, por favor, nessa história os deuses e os
homens estão todos misturados) há um concurso de beleza entre as três deusas
mais bonitas (Afrodite, a deusa do amor; Hera, a mulher de Zeus; e Atena, a deusa
da sabedoria). Como não havia jeito de saberem quem era a mais bonita, elas
elegem um terceiro (claro que tudo isso certamente já estava combinado a título de
estratagemas maliciosos dos deuses gregos) para decidir. O juiz seria Alexandre.
Por que o Alexandre, que era apenas um pastor em uma ilha que não tinha
nenhuma importância? Obviamente, para poder gerar essa desgraça toda,
cumprindo a profecia.
Como foi que o Menelau acabou como marido da Helena? Todos queriam casar com
ela, então o pai humano da Helena combinou com ela, que concordou com isso (ou
seja, não foi imposto), que ela escolheria entre os pretendentes (conta-se que eram
mais de cem pretendentes) com quem ela se casaria. Para impedir que houvesse
problemas de retaliação depois da escolha, todos os pretendentes fizeram o
juramento de que a decisão de Helena fosse de alguma maneira desrespeitada por
um dos pretendentes, os demais defenderiam os direitos do escolhido sobre Helena.
E foi exatamente o que aconteceu: Helena escolheu o Menelau porque quis; ele em
determinado momento foi viajar, deixando a mulher sozinha, e apareceu o Paris
bonitão, que veio lá buscar o seu prêmio por ter escolhido Afrodite como a mais
bonita das deusas e, teoricamente, ele a rapta.
O rapto, no sentido jurídico, não é como o sequestro. No sequestro, você leva a
pessoa para pedir um resgate. O rapto tem um sentido de você levar a pessoa sem
querer obter vantagens com o resgaste, mas com fins libidinosos, por exemplo. É
claro que aí surge uma polêmica imensa, pois as aparências dessa história são de
que a Helena fugiu com o Paris, e não que ela teria sido raptada de verdade. Para
fins da exemplificação oficial que se dá para os outros pretendentes, ela foi raptada
pelo Paris e levada para Troia.
Na Odisseia, Helena diz que estava enfeitiçada pela deusa Afrodite e que de fato
não foi ela a responsável pela fuga com Paris. Há uma outra personagem feminina
que aparece na Odisseia: a Penélope, a mulher do Odisseu, que fica 20 anos
esperando a volta do marido (os 10 anos que o marido vai para Troia, mais os 10
anos que ele demora para voltar) Odisseu ou Ulisses é a mesma pessoa, são
respectivamente as formas grega e romana do mesmo nome. O que há de
interessante é que enquanto Helena é o protótipo da mulher infiel, Penélope é o
protótipo da mulher fiel, pois todas as noites ficava tecendo uma mortalha para o seu
sogro, a qual destecia durante o dia, argumentando que quando terminasse o
trabalho ela escolheria entre os pretendentes – tudo isso para enrolá-los.
Esse Agamenon, por ser o mais velho, é quem vai dirigir essa fronta contra Troia,
que fica ao norte do território grego, para recuperar a mulher do irmão. A coisa já
começa muito errado no caminho, porque eles param num lugar chamado Áulis
(uma enseada, navega-se com muita lentidão e você tem um exército imenso que
tem que ser alimentado) e com todos os navios parados na enseada os soldados
vão caçar ou roubar animais (azar de quem tinha uma vaca gordinha) para fazer um
churrasco. Um dos soldados mata uma corça sagrada de Ártemis (a deusa Diana
dos latinos), que é a deusa virgem da caça, e ela fica furiosa. Ártemis era uma
mulher muito vingativa, tanto é que há um episódio na vida dela em que foi flagrada
tomando banho de cachoeira nua por um caçador que apenas topou com ela, mas
ela ficou com tanta raiva dele que o transformou numa corça que foi devorada por
seus próprios cachorros. Tão vingativa é essa Ártemis! E Ártemis aqui então fica tão
furiosa com aquele negócio de matar a corça que ela roga uma praga que cria uma
calmaria, o que impedia que os navios saíssem do golfo e continuassem a viagem.
A ideia de sacrifício humano para os gregos é uma ideia abominável, como também
é para um judeu, tanto é que Deus não deixa que Abraão mate Isaac na última hora,
substitui-lo por um cordeiro, que de acordo com a tradição é o mesmo cordeiro que
Bel sacrifica a Deus no início dos tempos.
Há duas versões: uma em que ele mata a filha de fato, e outra em que na hora
Ártemis aparece e coloca no lugar um animal, impedindo que aquilo acontecesse.
Seja como for, a Clitemnestra ficou absolutamente furiosa com o marido (Não é para
menos, não é? Mesmo considerando todas questões de Estado…) e começa a urdir
uma vingança contra ele. Mas os ventos retornam e a expedição retoma a viagem
para a Troia.
Vocês estão conseguindo imaginar tudo isso? Um dos truques mais importantes
para ler obras ficcionais é imaginar tudo como um filme: imaginem todos aqueles
barquinhos gregos vindo numa enorme esquadra, cheia de soldados, dentre todos
eles o mais importante é Aquiles; do outro lado, esperando os gregos chegarem
para defender a cidade, estão os troianos, entre eles o Paris, curtindo muito a lua de
mel com a Helena e o irmão dele, Heitor, assumindo a defesa da cidade. É assim
que tudo começou.
É muito importante vocês compreenderem que esta é uma história da tradição oral,
uma história de façanhas, sem grande preocupação de minúcias e de
verossimilhança como tem um romance moderno. Basta vocês compreenderem que
aí os deuses e os humanos estão misturados o tempo todo. Os deuses é que
começaram essa encrenca toda, com aquele concurso de qual é a deusa mais
bonita. Tudo é mítico nesse momento: há uma mistura entre deuses e homens mais
o fato de que lá em Troia está o casal apaixonado e o irmão esperando praticamente
toda a força militar do Mediterrâneo para vir buscar a mulher à força. Esses são os
fatos que ocorreram 10 anos antes do que a Ilíada está nos contando.
O autor dessa conversa chama-se Homero, uma dessas personagens míticas que
ninguém sabe se existiu. Ninguém sabe onde nasceu, há uma meia dúzia de
cidades gregas que reivindicam o mérito de ser seu local de nascimento, mas a
única informação biográfica sobre Homero é que ele seria cego. O que há de
interessante nessa característica biográfica é que a cegueira de Homero não seria
de nascença, mas sim atribuída ao fato de que ele insinua na Ilíada que a Helena
havia sido infiel de propósito, ou seja, ele não responsabiliza a Afrodite pelo
encantamento da mulher infiel. Helena, que tem vinculações no Olimpo por ser filha
de Zeus, vingou essa calúnia de Homero – é claro que isso é tão folclore que você
não deve atribuir muita importância…
Então, a esquadra chega e inicia o cerco a cidade, que pelas descrições homéricas
é uma cidade muito bem protegida. Os historiadores mais materialistas obviamente
já estabeleceram a tese de que no fundo a guerra nada tem a ver com a Helena, que
eles queriam mesmo era impedir o comércio troiano no Mediterrâneo – mas eu nem
preciso dizer isso porque vocês certamente sabem que, se alguém ainda não disse,
ainda dirão, visto que são essas interpretações que dominam hoje o mundo da
historiografia. Como essa história é muito pouco documentada, trata-se mais de mito
do que de verdade. Não há muitos debates em torno disso, porque afinal trata-se
muito mais de uma história mítica do que um fato histórico.
Apesar disso, sabe-se que Troia não foi mito e que houve de fato uma guerra em
torno de 1.200 a.C. Ninguém sabe ao certo quando esse poeta Homero teria escrito
a história, mas é alguma data entre 950 e 850 a.C. Isso significa que este poeta, se
é que existiu, escreveu a história 300 ou 400 anos depois de a guerra ter acontecido.
Ou seja, a história foi escrita com base em conhecimentos que foram transmitidos
oralmente durante 400 anos, o que é tempo suficiente para mudar qualquer história.
A verdade é que como não se sabe de fato quem foi Homero, durante muitos anos
uns filólogos alemães extremamente rigorosos (gente, assim, que é capaz de passar
dois anos tentando descobrir se é “a” ou “e” que está escrito) fizeram pesquisas tão
profundas ao ponto de descobrir que na verdade a Ilíada tem vários autores, não se
sabe quantos mas algo em torno de três ou quatro, e que alguém compilou essas
três ou quatro histórias separadas e arrumou para dar uma unidade à obra.
A nossa história começa quando o Aquiles, o mais importante dos guerreiros gregos,
briga com o Agamenon porque numa daquelas incursões militares aos arredores de
Troia (lembrem que era necessário sustentar todas aquelas tropas e que o soldado
dessa época era o soldado mercenário, que luta pelo estupro e pelo saque), cada
um dos dois pegou uma sacerdotisa de Apolo. O Aquiles tomou uma moça chamada
Briseida e o Agamenon a Criseida, transformando-as em escravas sexuais, só que a
tal da Criseida, cujo pai também era um sacerdote de Apolo, vai lá e diz que quer a
filha de volta de qualquer jeito. Como não devolvem, ele faz lá um pedido a Apolo
para mandar uma peste, que começa a dizimar o exército.
Quando Agamenon vê que aquele velhinho tinha poder, ele devolve a filha, só que
daí, ao invés dele ficar sem ninguém, ele pega a Briseida. O Aquiles então,
feridíssimo por ter sido espoliado da Briseida, decide se mandar – ficar lá quietinho
no seu navio e sair da guerra. O Aquiles já tinha ido à guerra de Troia meio a
contragosto porque a mãe dele tinha recebido uma profecia de que seu filho teria
uma vida breve e morte gloriosa, ou uma longa vida e uma velhice medíocre. Como
ela desejava que o filho vivesse mais, resolveu escondê-lo num harém junto com as
moças. Odisseu, o herói grego mais esperto, descobriu o estratagema e convenceu
o Aquiles a vir para a guerra. O Aquiles de certo modo já estava condenado, porque
na guerra estaria mais próximo de uma vida gloriosa e curta do que de uma vida
longa e medíocre, não é?
Ilíada
Homero
Resumo da Narrativa
Na prática, isso era cantado na Grécia, não era simplesmente lido. Então, chegava o
sujeito na praça e dizia assim: “Canta-me a Cólera – ó deusa! – funesta de Aquiles
Pelida” [imaginem o professor cantando isso]
Canto I
A Peste e a Ira
“Invocação às Musas. Crises, sacerdote de Apolo, vem ao campo dos gregos para
recuperar sua filha, que era escrava de Agamémnone. Não o conseguindo, e sendo
até insultado pelo rei, pede a Apolo para ser vingado. Uma peste é então enviada a
toda a tropa grega. Aquiles convoca a assembleia e Calcante, um adivinho, revela a
causa da peste e indica o remédio: devolver a filha de Crises. Ocorre uma briga
entre Agamémnone e Aquiles. Agamémnone devolve Criseide, mas leva Briseide, a
escrava de Aquiles. Este, irado contra o ultraje, sai da guerra de Troia. Tétis, sua
mãe, a seu pedido, vai até Zeus para pedir que os gregos saiam perdedores na
guerra para que todos vejam a falta que Aquiles faz. Zeus concede a Tétis que os
troianos saiam vencedores. Ocorre uma briga entre Hera e Zeus sobre o destino da
guerra”.
Tétis, uma ninfa do mar, pede a Zeus que ele dê poder aos troianos para ajudar a
vingar o filho, isso é muito importante porque vocês repararão que o tempo todo os
homens lutam juntos dos deuses. Até mesmo no campo de batalha, às vezes
aparece um deus dando espadadas no outro lado. Há uma divisão dos Deuses em
dois grupos: um grupo pró-troianos e outro pró-gregos. A razão pelos quais os dois
grupos se formam são as mais fúteis do mundo.
Quem é Pelida? Pelida é o nome de Aquiles, porque o pai dele se chamava Peleu.
Na verdade, Aquiles era filho de Zeus e de Tétis. Zeus, marido de Hera, fica tendo
filho com outras mulheres o tempo todo; quando ele tem filhos com outras deusas,
esse são deuses; quando ele tem filhos com mulheres mortais (ou ninfas), esses são
mortais. Para não ficar chato, ele inventa um “pai humano postiço” para os seus
filhos mortais. O pai de Aquiles se chama Peleu, e os gregos o chamam de Pelida
porque ele é filho de Peleu – é uma maneira de fazer o patronímico 1.
Canto II
Canto III
“Alexandre (Páris) provoca os Gregos mais fortes para que lutem com ele, mas
acaba recuando diante de Menelau. Heitor o reprova veementemente e Alexandre
decide combater Menelau. É feito um juramento, sancionado por Príamo, que aquele
que vencer a batalha levará Helena. Esta sobe a muralha do palácio e aponta a
Príamo os heróis gregos. No combate de Alexandre e Menelau, este último sai
vencedor; no entanto Afrodite salva Alexandre e o leva aos braços de Helena, a
salvo atrás das muralhas de Troia. Helena o reprova e Agamémnone reclama
vitória”.
Canto IV
“Hera, na assembleia dos deuses, obtém de Zeus que a luta recomece entre Gregos
e Troianos e que estes últimos paguem pela derrota de Páris. Atena desce à Terra e
faz com que Pândaro, o Lício, desrespeite o juramento, acertando Menelau com
uma flecha. Atena salva a vida de Menelau, que fica apenas ferido. As duas partes
se preparam para a guerra e Agamémnone faz a revista de sua tropa, distribuindo
elogios e reprovações. Começa uma batalha terrível, onde Ares e Apolo estão ao
lado de Troia e Atena e outras divindades ao lado dos gregos”.
pois vai custar-lhes a vida e das próprias esposas e filhos. (pág. 122)
tal era a grita e o trabalho dos dois combatentes exércitos. (pág. 130)
Canto V
faz ela o herói avançar para o ponto mais denso da pugna. (págs. 135-136)
ou, vivo embora, sem ânimo, aos golpes da lança de bronze”. (págs. 160-161)
Canto VI
“O exército Troiano começa a se curvar diante das forças gregas. Heitor vai, pelo
conselho de Heleno, pedir à sua mãe que invoque a proteção de Atena para que ela
retire Diomedes da guerra. Diomedes encontra-se com Glauco, e reconhecem que
são descendentes de famílias amigas. Os heróis trocam armas. As mulheres
troianas seguem em procissão até o Templo de Palas Atena. Heitor exorta Páris a
retornar ao combate, e procura, então, sua esposa, Andrômaca, e a encontra perto
das Portas Céias”.
esquecer-se-ia minha alma, por certo, dos males presentes” (pág. 171)
Canto VII
“Como é que vem aqui fazer um muro no mar sem pedir minha autorização?”. Então,
Poseidon está furioso com os gregos e é nesse momento que ele entra no lado dos
troianos, pois acha um desaforo o que fizeram com ele. Depois, ele ficará o tempo
todo da Odisseia perseguindo o Ulisses, porque Ulisses também faz um desaforo
com um dos filhos dele. Eu disse a vocês que esse deuses são meninos muito
sensíveis, não é? O Heitor lutará então com o Ajaz Telamônio, que é o segundo
maior guerreiro. Os grandes guerreiros gregos são o Aquiles, que se retirou; o
Diomedes, o mais esperto e nobre; o Ulisses, que é o “espertalhão”; e o Ajaz
Telamônio, que é o melhor guerreiro que restou.
para os Aqueus? Não tens pena, bem sei, dos Troianos que morrem.
Canto VIII
A Luta Interrompida
“Zeus proíbe futuras intervenções dos deuses na guerra e vai ao Monte Ida assistir
aos combates. Os troianos, então, sobrepujam os gregos. Diomedes tenta, sem
sucesso, recuperar a vitória para os gregos. Estes são empurrados até suas naves.
Hera e Atena, descendo para ajudar os gregos, são impedidas por Zeus, enviando
Íris, que as obriga a voltar para o Olimpo. A noite interrompe a batalha”.
do Hades sombrio quanto há de permeio entre a Terra e o Céu vasto. (págs. 195-
196)
360.Mas para os Dânaos meu pai não se mostra benigno, o insensato! (págs. 205-
206)
“Para onde, assim, vos lançais? Que furor vos agita o imo peito?
Canto IX
contra tua idéia insensata, sem que isso provoque tua cólera.
té que Ílio santa destruamos, que um deus favorável nos trouxe”. (págs. 214-215)
110.o prestantíssimo herói, que até os deuses honrar têm por hábito,
como dizer bons discursos e grandes ações pôr em prática”. (pág. 226)
Canto X
só pela estirpe levado ou, quiçá, por tratar-se de um príncipe”. (pág. 242)
o arco recurvo, a hasta longa e, por último, a pele de lobo. (pág. 248)
Canto XI
Os Feitos Heróicos de Agamémnone (Aristia de Agamémnone)
“Logo que surge a Aurora, Agamémnone prepara seu exército para o combate. Do
outro lado, Heitor caminha contra as tropas dos gregos. Heitor, aconselhado por
Zeus, se retira da luta até Agamémnone fazer o mesmo. Este realiza feitos heróicos
e mata muitos troianos. É, no entanto, ferido e tem de deixar a batalha. Os troianos
retomam a vantagem e os principais gregos são feridos: Odisseu, Diomedes e o
médico Macáon. Nestor, então, suplica a Aquiles que volte à batalha ou que
empreste sua armadura para Pátroclo poder lutar. Pátroclo ajuda Eurípilo, ferido na
guerra”.
Pátroclo era o melhor amigo de Aquiles e, embora isto não esteja explicitado, há
certamente uma conotação homossexual, como se eles fossem amantes. É preciso
que vocês sempre lembrem que isso já não era incomum na Grécia, embora não
fosse algo aceito de maneira incontestável – era algo tolerado. Esse Pátroclo era
aparentemente namorado de Aquiles e resolve então se meter nessa briga usando
as armas do próprio Aquiles.
80.O pai dos deuses, porém, não lhes dava atenção; a departe
185. “Íris veloz, dize a Heitor, sem mais perda de tempo, o seguinte:
a apodrecer, tão-só abutres atrai, não mais belas mulheres”. (págs. 264-265)
401.Fica sozinho o lanceiro galhardo Odisseu; nenhum Dânao
sem mais ninguém, que nos Dânaos o Crônida medo ora infunde.
410.que é resistir decidido, quer fira, quer seja ferido”. (pág. 265)
Os membros ágeis, agora, o vigor com que outrora os movia. (pág. 272)
Canto XII
O Ataque aos Muros
por mão dos fortes Aquivos, não deves ter medo da Morte,
Canto XIII
“Enquanto Zeus se vira e olha para outras regiões, Posido vai até a planície de
Troia. Disfarçado, ora com Calcante, ora com generais gregos, incita-os coragem
para guerrear. Os gregos se fortalecem e começam a se sobressair. Idomeneu e
Meríones defendem a esquerda dos navios e os dois Ajazes a direita. Um sangrento
combate se dá, onde gregos e troianos morrem. Idomeneu, combatendo Enéias, faz
prodígios na batalha. Os troianos começam a recuar, mas Heitor decide continuar a
luta. Ajaz Telamônio desafia Heitor e aparece um bom presságio para os gregos”.
Por mais furioso que esteja e ainda mesmo que Zeus o estimule”. (pág. 297)
Ainda que o queira, ninguém luta mais do que a força o permite”. (págs. 317-318)
Canto XIV
Aparecem duas personagens importantes novas aqui. Uma é Idomeneu, que é muito
conhecido porque Mozart tem uma ópera com o mesmo nome que conta o episódio
em que esse personagem promete, para conseguir regressar vivo a casa, matar em
sacrifício aos deuses a primeira pessoa que encontrasse ao chegar. A primeira
pessoa que ele encontra na praia é a sua própria filha, que ele mata para manter
sua palavra para com os deuses. Essa tragédia é contada de uma forma
maravilhosa nessa ópera de Mozart.
A segunda personagem é Enéas, um comandante dos troianos que ainda não havia
aparecido porque os troianos são sempre desprezados nas descrições, uma vez que
essa história é contada pelos gregos. Até então, nós apenas conhecíamos os
troianos Heitor e o seu irmão metrossexual Paris. O Enéas, que não é propriamente
um troiano, mas um comandante que se associa a eles, escapará da destruição do
fim da guerra e fundará Roma. O poeta Virgílio escreve uma obra chamada
“Eneida”, que é a descrição da vida de Enéas depois que escapou de Troia e
acabou chegando a Itália. Obviamente, não coincide muito com aquela história dos
livros de história, que tinha lá o Rapto das Sabinas2, Rômulo e Remo. Mas de certo
modo Virgílio escreveu essa história para enobrecer um pouquinho o povo. Isto é,
em vez de ser um grupo de saltimbancos e salteadores que fundaram Roma, ele
inventou a tese de que esse Enéas teria sido o fundador de Roma para melhorar um
pouquinho a aparência da história, já que os romanos não queriam aceitar que eles
eram descendentes de ladrões de mulheres. Com essa luta que ocorre por
interferência de Poseidon (que mudou de lado, antes estava contra os gregos, agora
está a favor), obviamente contra a opinião de Zeus, há uma melhoria na situação
dos gregos, que agora não estão assim tão ameaçados quando estavam antes, o
que nós leva então à demonstração de como é que os deuses resolveram tapear
Zeus de uma vez por todas.
O Engano de Zeus
“Nestor, que curava Macáone, sai para ver uma gritaria e encontra Agamémnone,
Diomedes e Odisseu feridos. Então, fazem uma reunião e Agamémnone decide
fugir. Odisseu é contra e Diomedes sugere voltar ao combate. Posido acalma
Agamémnone. Hera, então, se prepara para seduzir Zeus. Pedindo emprestado um
cinto de Afrodite e pedindo ajuda ao Sono, acaba conseguindo adormecer o esposo.
Posido insufla força aos gregos, que ganham vantagem. Ajaz fere Heitor, que se
retira da batalha. Os gregos expulsam os troianos para longe dos navios, e Ajaz, o
Oileu, os persegue com muito furor”.
Antes, bem via que aos Dânaos, benigno, ele sempre auxiliava;
onde o mar for mais profundo, firmando-as com as pedras das âncoras,
“Zeus, acordando, percebe que foi enganado por Hera. Depois de ameaçá-la e
relatar-lhe todos os acontecimentos até o final da batalha, ordena-lhe que vá ao
Olimpo e envie Íris e Apolo para ajudar os troianos. Ares toma conhecimento da
morte do seu filho, Ascálafo, mas Atena o consola. Íris vai pedir a Posido que se
retire da batalha e Apolo cura Heitor, que retorna com toda força ao acampamento
dos gregos, com Apolo na frente das falanges troianas. Pátroclo deixa Eurípilo e vai
implorar ajuda a Aquiles. Os gregos fazem uma defesa desesperada enquanto
Heitor se prepara para incendiar o navio de Protesilau”.
que tanto lhe a alma excruciam. Deve ele, também, nos Aquivos
com o que lhe coube por sorte, por mais poderoso que seja.
Seu forte braço temor não me incute, que medo não tenho.
na obrigação de lhe as ordens cumprir, muito embora não o queiram”. (pág. 343)
Canto XVI
Pátroclo implora pelas armas de Aquiles, que as concede, mas com a condição de
apenas proteger os navios gregos e de não levar mais adiante a ofensa contra os
troianos. O navio de Protesilau é incendiado. Quando Pátroclo surge com o exército
dos Mirmídones, os troianos o confundem com Aquiles. Sarpédone é morto por
Pátroclo e grande luta é feita ao redor do seu corpo. Fogem, então, os troianos.
Pátroclo se esquece da promessa a Aquiles e os persegue até às muralhas de Troia.
Apolo defende Troia e reanima Heitor, que marcha contra Pátroclo. Este faz grande
chacina, mas acaba sendo desarmado por Apolo e morto por Heitor.
O Heitor, que havia sido ferido no episódio anterior, agora foi curado por Apolo, que
é defensor de Troia porque havia lá um santuário a ele. Agora, novamente a
situação se inverte e os troianos começam a vencer e parece agora que vão vencer
mesmo. Contudo, acontece agora o fato que muda toda a história: o Pátroclo será
morto em batalha (fato narrado no canto XVI). Ele veste a armadura de Aquiles, de
modo que os troianos pensam que Aquiles retornou à guerra. Pátroclo é morto por
Heitor. Na hora em que Aquiles fica sabendo que “o namorado” morreu, decide
retornar à guerra (canto XVIII).
Pós ter falado, assentou sobre o morto um dos pés e a hasta longa
que os imortais a Peleu tinham dado, bem longe o puseram. (pág. 386)
Canto XVII
“Menelau mata Euforbo, que tentava levar as armas de Pátroclo. Então, chama Ajaz
para defender o cadáver da investida de Heitor e este último cede.
Os soldados gregos e romanos tinham o direito de ficar com as armas dos inimigos
que matavam. É uma demonstração de que você incorporou o inimigo, como o
sujeito que pinta no avião quantos inimigos ele derrubou.
No entanto, retorna animado por Glauco e pelos melhores troianos. Ocorre longa
luta ao redor do cadáver de Pátroclo. Os cavalos de Aquiles são feridos e Zeus tem
piedade. Apolo ajuda os troianos e Atena os gregos. Com os gregos em
desvantagem, Ajaz pede auxílio a Zeus. Menelau manda Antíloco avisar Aquiles da
desgraça. Menelau e Meríones acabam por conseguir pegar o corpo de Pátroclo,
protegidos pelos dois Ajazes”.
Canto XVIII
540.e arrebatavam das mãos uns dos outros os corpos dos mortos.
Preta era a terra que atrás lhes ficava, apesar de ser de ouro,
Pós ter o artífice o escudo maciço, desta arte, aprontado… (págs 425-429)
Canto XIX
A Renúncia à Ira
“Tétis entrega as novas armas a seu filho e cuida do corpo de Pátroclo. Aquiles
convoca uma assembleia, declara seus sentimentos e pede para retornar à batalha.
Agamémnone reconhece seus erros e se lamenta, enviando de volta Briseide e ricos
presentes a Aquiles, que os recebe das mãos de Odisseu. Atena lhe infunde grande
força, ele veste sua armadura e sobe em seu carro. Xanto, seu cavalo, lhe prevê a
morte em breve, logo após matar Heitor”.
21.”Mãe, estas armas que Hefesto me enviou, dizem bem com os trabalhos
Canto XX
“É convocado o conselho universal dos deuses. Zeus diz que todos os deuses estão
livres para tomar o partido de quem lhes aprouver na guerra. Os deuses se
espalham pelo campo de batalha. Apolo aconselha Enéias a se valer contra Aquiles
e Posido sugere que os deuses apreciem a batalha. Antes de Enéias morrer, Posido
o salva. Furioso, Aquiles mata muitos troianos, inclusive Polidoro, filho caçula de
Príamo. Heitor, vingando seu irmão, quer lutar com Aquiles, mas Apolo o impede.
Depois de Aquiles matar vários troianos, Heitor ataca Aquiles, mas quando o filho de
Príamo fica em perigo, é salvo por Apolo”.
Canto XXI
“Os troianos fogem. Licáone, filho de Príamo, morre. Alguns troianos fogem para
dentro do rio Xanto e há ali uma chacina. Aquiles luta contra o rio Xanto. Posido e
Atena encorajam Aquiles. Hera envia seu filho, Hefesto, para livrar Aquiles das
ondas do Xanto. Os deuses lutam uns contra os outros. Depois retornam ao Olimpo,
menos Apolo, que fica cuidando dos troianos. Estes entram pelas muralhas de Troia.
Agenor e Aquiles lutam”.
Canto XXII
A Retirada de Heitor
“Aquiles, percebendo a farsa de Apolo, que havia se disfarçado de Agenor, luta com
Heitor. Este permanece do lado de fora dos muros de Troia, mesmo com os rogos
da mãe e do pai. Ao chegar Aquiles, no entanto, Heitor foge com medo e os dois dão
três voltas ao redor da cidade. Zeus pesa numa balança o destino dos heróis e a
sorte de Heitor é lançada. Atena desce à Terra para ajudar Aquiles e engana Heitor
se disfarçando como Deífobo. Batalha de Heitor e Aquiles, com a morte do primeiro.
Aquiles, então, ultraja o corpo de Heitor e o leva para junto dos navios para sepultar
Pátroclo. Os parentes de Heitor se desesperam”.
ser-lhe baluarte algum dia, nem ele de amparo servir-te. (pág. 495)
Canto XXIII
Canto XXIV
O Resgate de Heitor
“Aquiles, ainda muito triste com a morte do amigo, ultraja o corpo de Heitor todo o
dia, dando três voltas ao redor do túmulo de Pátroclo. Os deuses, principalmente
Apolo, se indignam com tamanho ultraje e pedem a Zeus que o faça parar. Zeus,
então, envia Tétis para acalmar Aquiles e Íris para dizer a Príamo que pague um
resgate pelo corpo do seu filho. Príamo concorda e é conduzido por Hermes até a
tenda de Aquiles, que o recebe muito bem, aceitando os presentes e devolvendo o
corpo de Heitor. Aquiles concede onze dias de luto pela morte de Heitor. Tristeza
das mulheres de Troia, Hécuba, Andrômaca e Helena. É feita uma fogueira no
túmulo de Heitor”.
para que no ato de ser arrastado não viesse a ferir-se. (págs. 525-526)
filhinho ainda infante, bem como Príamo e o povo Troiano, que logo
morto por ti, sem poder, nem, por isso, outra vez dar-lhe vida.
com os seus raios benignos assalta, e a quem tira a existência”. (pág. 547)
[INTERPRETAÇÃO DA OBRA]
A história que acabamos de ler foi essa, agora o importante é perguntar qual o seu
sentido. Parece uma história de aventuras, mas é muito mais que apenas isso. A
primeira coisa interessante que há nessa história é que o grego não tem o mesmo
sentido de patriotismo que nós temos: não há aí uma luta por valores nacionais (país
versus país, cidade versus cidades). O que há é uma noção de luta por valores
divinos, luta por determinados princípios revelados pelos deuses. Isso é muito
diferente de uma guerra moderna, em que você está interessado em defender o país
contra os inimigos. Eu queria perguntar para vocês se sentem mais empatia pelo
Aquiles ou pelo Heitor.
[COMENTÁRIOS DE ALUNOS]
Algum de vocês que prefere o Heitor, pode tentar me dar uma ideia da razão?
[COMENTÁRIOS DE ALUNOS]
O Aquiles se mostra muito bravo, muito intolerante, não é? O Heitor parece mais
humano. A violência com que o Aquiles trata o Heitor no final horripila um pouco,
ficamos achando que o sujeito é meio animalesco. Vocês sentem que esses dois aí
lutam por causas boas? A causa que deflagrou a história é de uma futilidade sem
par, é o tal do pomo da Discórdia (Discórdia é a deusa que foi lá provocar como
vingança a disputa entre as deusas). Mas com relação a esses dois, a principal
razão de estarem lutando é por causa disso? Ou estão brigando por outra coisa?
Estão lutando por princípios, não é? Tanto é que a Helena desaparece
completamente.
[COMENTÁRIOS DE ALUNOS]
Na verdade, Aquiles não queria participar da guerra desde o início porque a mãe
dele sabia da tal da profecia e o escondeu junto às mulheres. O Ulisses, que é o
espertalhão da história, arruma um jeito de descobrir e vai lá fazer chantagem
emocional: “Você quer ficar aqui feito uma mulherzinha? Você é homem!”. Então, o
Aquiles entra na guerra, é ofendido e sai; depois apenas retorna quando quer
realmente vingar a morte de Pátroclo. Eu tenho uma simpatia muito maior pelo
Heitor, que é um homem assim como nós. Contudo, o Aquiles não é um sujeito mau,
ele sabia de antemão, por exemplo, que morreria; precisa ter uma grande
quantidade de heroísmo também. Ele foi morto por um estratagema de Apolo, para
cumprir a profecia.
Em comparação com esses dois, a motivação dos deuses para armar essas
confusões todas são do mesmo grau de valor moral? Não, são uma brincadeira,
uma futilidade. “Não temos nada para fazer hoje, então vamos arrumar uma guerra
entre Israel e Síria”. Quer dizer, os deuses lá no Olimpo se divertem gerando
situações assim, da qual acham graça. Não há uma grande disparidade entre as
motivações dos deuses e dos humanos?
O Zeus, porque era o deus coordenador, tentava botar um pouco de ordem naquilo,
mas no final, quando tudo é deflagrado, ele liberou os deuses para fazerem o que
quisessem. Isto é, ele não conseguiu que os deuses ficassem controlados. O
conceito de deus grego não é o do Deus cristão. Nós iremos ver “Teogonia” aqui no
nosso programa, que foi escrito por Hesíodo, contemporâneo de Homero, que conta
como é que os deuses nasceram. Zeus é o terceiro líder na sequência de gerações,
Cronos (o titã do tempo) já havia matado o pai Urano, que fora o primeiro. Ou seja,
Urano é o primeiro líder, depois o seu filho mais novo (Cronos) o mata, e o o filho
mais novo de Crono (Zeus) também mata o pai.
Vocês nunca sentiram que as suas vidas são dirigidas por coisas que vocês não
controlam e que podem ser de uma futilidade e de uma falta de cabimento
absolutas? Vocês nunca se sentiram assim? Vocês nunca repararam que de vez em
quando a gente faz tudo certo (acorda cedo, escova os dentes, paga os impostos) e
mesmo assim tudo dá errado no final? Não é exatamente isso que acontece com o
Aquiles e o Heitor?
A primeira coisa a reparar aqui é que houve o embate entre duas forças
gigantescas: as forças dos gregos e dos troianos, que estão lutando para vencer
moralmente um ao outro, ou seja, eles estão lutando para defender os valores que
lhe parecem justos. No entanto, essa luta humana contrasta tremendamente com
uma certa futilidade, falta de sentido, que os deuses representam aí como autores
desse processo. Isso significa na prática que a vida humana tem um componente
trágico completamente indissociável dela; significa que a gente luta e faz todo o
possível para fazer o certo, mas nós não somos capazes de garantir o sucesso do
resultado. No final das contas, tanto Aquiles quanto Heitor morrem.
A tragédia da humanidade é que, mesmo tendo feito tudo certo, você acaba sendo
sacrificado no processo de um jeito ou de outro. É por isso que a Ilíada gera depois
a tragédia grega, que será produzida por Ésquilo, Sófocles e Eurípedes, esses três
grandes trágicos gregos, muito tempo depois (esses já são dos anos 500-400 a.C.).
Ou seja, 700 anos depois dos acontecimentos da guerra de Troia e 200-300 anos
depois de Homero ter compilado essa obra junto da Odisseia, nasce dentro da
Grécia o conceito de tragédia.
O conceito de tragédia deve ser diferenciado de uma vez por todas do conceito de
drama, porque hoje em dia esquecemos a diferença e misturamos tudo. Uma
tragédia, rigorosamente falando, é quando todo mundo faz tudo o que pode para
fazer da melhor maneira possível, todos se esforçam, e no final das contas tudo dá
errado. Por exemplo, um motorista de caminhão que precisa pagar as contas para
sustentar a família, que exagera na quantidade de horas de trabalho, sofre um
acidente e mata uma família inteira. Ele queria matar a família? Não. Ele tinha algum
problema? Não. Ele apenas queria sustentar a família e fazer as coisas certas.
Diferente dessa situação, é o drama, que é aquilo que Shakespeare escreve. Por
exemplo, em Otelo tem lá um sujeito chamado Iago, que é um sujeito mau e quer
acabar de qualquer jeito com o casamento do Otelo e da Desdêmona, que é o
exemplo da mulher mais perfeita e carinhosa que alguém possa imaginar. Ela era
casada com Otelo, um amor perfeito, e Iago fica infeliz com aquilo e quer arruinar
esse amor. Então, no drama, há alguém malignamente interferindo para as coisas
darem errado, mas na tragédia não. Não há forças negativas na tragédia: é a
constatação de que o ser humano existe num quadro de poderes que o condicionam
que são inexplicáveis e muito maiores do que a capacidade que o ser humano tem
de controlar. Isso é algo fundamental de nós compreendermos
Eu queria dar um exemplo fácil para todos vocês compreenderem. Peguem a teoria
feminista, a ideia que algumas mulheres intelectuais têm de que o mundo é
dominado pelos homens, os quais montaram um plano maligno de controlar as
mulheres, fazendo com que elas se tornem uma espécie de escravas sexuais, entre
outras coisas, restringindo assim a liberdade feminina. Essa é a teoria feminista, ela
supõe que a condição feminina seja dramática ou trágica? Pressupõe que a
condição seja dramática, porque ela é o resultado de uma manipulação deliberada
dos homens que querem retirar vantagens dela. Essa interpretação pressupõe que
haja uma malignidade masculina contra as mulheres.
Por exemplo, as pessoas naturalmente ficam muito doentes com pouca idade. No
entanto, hoje em dia há essa mania de achar que tudo está justificado de alguma
maneira. Você fica doente e aparece um cara falando assim: “O doente é culpado da
própria doença. O que se faz é o que se paga”. Essa conversa é a coisa mais
absurda que se pode imaginar, é aquela conversa dos amigos tentando incriminar
Jó, quando na verdade a nossa existência não pode ser incriminada assim, porque
no fundo você não controla nada que acontece com você. Você está condenado a
fazer o melhor possível, mas você não tem nenhuma possibilidade de esperar
garantias da vida de que será recompensado com alguma coisa dentro das suas
expectativas.
[COMENTÁRIOS DE ALUNOS]
Simone Weil dizia que a Ilíada é a única grande tragédia ocidental, todas as demais
são suas imitações3. A Odisseia é muito mais plástica, vocês vão descobrir a
diferença quando lerem: é como um livro de aventuras. Essas complexidades de
linguagens incluídas no resumo são um pouco por minha culpa, porque eu achei
melhor preservar os trechos do que contar a história de um modo narrativo, como eu
fiz com a Odisseia. A Ilíada é uma história mais profunda do que a Odisseia, é o livro
mais definitivo e influente, que gerará toda a tragédia grega. A Odisseia, por sua
vez, gera a comédia, o Aristófanes.
Ou seja, tudo aquilo que virá em seguida é basicamente filho da Ilíada. Nenhuma
outra obra tem tanta influência na história do ocidente como essa, exceto a Bíblia.
Se há duas obras que juntas estabeleceram uma influência na vida humana são
essas duas. Essa aí nos contando que a vida humana é uma vida de tragédia,
porque nós somos na verdade muito fracos, nada podemos contra os deuses, que
até se divertem das nossas desgraças. A Bíblia já é a história da tragédia e da
salvação, a história completa da possibilidade humana, mas daí é outra coisa que
não vamos entrar aqui, porque é muito diferente da Ilíada.
A Ilíada é uma obra literária, embora tenha sido cantada mais do que apenas lida
durante toda a história; ela é a obra que melhor revela a desgraça da existência
humana frente a vida, que é esse fato de que apesar de fazermos tudo aquilo que é
certo, no fundo somos apenas joguetes dos deuses. Não sabemos o que é que nos
está destinado e precisamos viver com essa pequenez. Se essa incerteza é o que
coordena nossas vidas, a nossa única possibilidade existencial é sermos o mais
nobres possível.
Homero começa o livro contando por que é que Aquiles sai da briga e termina, “Os
funerais estes foram de Heitor, domador de cavalos”. No final, há uma espécie de
declaração de respeito, uma homenagem a bravura humana, à capacidade de os
seres humanos enfrentarem o seu destino, por pior que ele seja.
Então, só nos resta uma possibilidade: sermos o mais nobre possível. Dentro dessas
incertezas, nós não podemos ser como os deuses, nós precisamos ter uma nobreza
implícita em nós. Essa nobreza, por exemplo, são as coisas pelas quais o Dom
Quixote luta, mas aí também já é outra história que nós teremos a chance de
conhecer4.
[COMENTÁRIOS DE ALUNOS]
É isso mesmo, é o que depois no Livro de Jó, Deus pede: “Jó, diga-me uma coisa:
onde é que você estava quando eu inventei o mundo? Foi você que fez as árvores?
Foi você que inventou o Leviatã e o Behemoth? Foi você que fez as descobertas?
Foi você que construiu o mundo? Não foi, então não enche o saco. Você não sabe
nada, é um pobre coitado. Por que é que você tá querendo discutir os meus
desígnios? Na hora em que você for capaz de inventar uma planta, um mundo igual
a esse, você fala comigo de novo” É isso que Deus fala a Jó, não é isso? Jó tenta se
lamentar do seu destino, mas isso não é areté; a virtude está em você ir até a morte,
enfrentando o seu destino com o tamanho da sua existência, é isso o que nos
transforma um pouco em deuses.
Essa situação é ilustrada por uma das versões do final da história do Édipo Rei, o
sujeito que cega os próprios olhos porque descobre que se casou com a mãe, com
quem teve quatro filhos: Etéocles, Ismênia, Antígona e Polinices; e matou o pai. Ele
não sabia o que realmente estava fazendo, então todo mundo dizia para ele: “Édipo,
mas você não sabia, por que você está cegando os próprios olhos?”, contudo ele
não aceita o fato de que ele não sabia. Em uma versão alternativa à de Sófocles,
quando Édipo morre e vai sendo levado ao sepulcro (assim, num enterro muito
vagabundo porque ele era um rei criminoso e cego que já não governava nada), os
deuses do Olimpo começam a baixar e seguir o enterro.
Todos acham aquilo muito estranho, porque são deuses acompanhando o enterro
de um homem, até que uma hora desce Zeus em pessoa. Os demais perguntam a
ele: “Zeus, por que você está aqui em pessoa seguindo o enterro desse desgraçado
do Édipo, que fez um monte de merda? Como é que pode uma coisa dessa?”. Daí,
ele diz assim: “Na hora em que Édipo aceitou a responsabilidade pela sua própria
vida, ele se transformou em um de nós; eu vim aqui prestar homenagem a um de
meus pares”. Pois a possibilidade de santidade humana está na aceitação do
destino com os melhores valores possíveis, com os sacrifícios que forem preciso
para que nossos valores sejam preservados. É isso o que a Ilíada quer contar para
as crianças na Grécia; é com essa conversa que toda uma geração de gregos foi
incorporando um espírito helênico, o espírito do areté, da virtude pessoal como fator
orientador da vida (o que é contado no livro “Paideia”, de Werner Jaeger)
“That’s all Folks!”
Gregos
Troianos