9 Semana de História
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9 Semana de História
CADERNO DE RESUMOS
CAJAZEIRAS – PB
Outubro de 2017
2017 © Copyright Mundial
UACS – Unidade Acadêmica de Ciências Sociais. UFCG – Universidade
Federal de Campina
Grande.
Impresso no Brasil
Printed in Brazil
Formatação e organização:
Maria Joedna Rodrigues Marques
ISSN
2525-2836
COMISSÃO ORGANIZADORA
APRESENTAÇÃO
PROGRAMAÇÃO GERAL
Segunda-feira, 16 de Outubro
9:00h às 12:00h – Credenciamento
Terça-feira, 17 de Outubro
8:30h às 12:00 - Mesa redonda "Diálogos sobre os estudos pós-coloniais africanos e
latinoamericanos"
Quarta-feira, 18 de Outubro
8:30h às 12:00 – Oficina/Minicursos
Quinta-feira, 19 de Outubro
8:30 às 12:00 - Oficina/Minicurso
Sexta-feira, 20 de outubro
8:30 às 12:00 - Mesa redonda ―Desafios e experiências de ex-alunos no exercício da
profissão‖
RESUMO
Este estudo propõe uma análise da visão histórica adotada pelo escritor norte-americano
Ernest Hemingway (1899-1961) na composição do romance Adeus às Armas (1929).
Escrito de forma autobiográfica, o enredo aborda a paixão desenvolvida entre um tenente-
norte americano e uma enfermeira inglesa durante a Primeira Guerra Mundial, panorama
esse utilizado para a construção da trama e que coincide com aspectos da própria biografia
do autor. Nesta pesquisa, serão considerados alguns elementos históricos existentes na
narrativa que integraram o contexto da Primeira Guerra, estabelecendo uma relação com
contribuições de historiadores como Sondhaus (2013) e Macmillan (2014), apresentando,
desse modo, a obra como um dos grandes exemplos de ficção baseados nos eventos
ocorridos durante esse conflito mundial.
Palavras-chave: Literatura; História; Primeira Guerra Mundial.
INTRODUÇÃO
As fontes pelas quais os historiadores buscam para construir suas teorias acerca do
percurso da humanidade ao longo da história são, continuamente, exploradas quando se
1
Discente do Programa de Pós-Graduação em Literatura e Interculturalidade (PPGLI-UEPB).
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pretende verificar a veracidade das informações e dos dados coletados a partir dos métodos
utilizados por esses especialistas. De certo modo, isso conduz a uma determinação da
autenticidade do próprio historiador, uma vez que, quando suas teorias históricas são
formuladas e postas a um processo de análise e observação e, seguidamente, constatadas
enquanto fontes reais, o pesquisador adquire o reconhecimento considerável perante o
contexto acadêmico e científico em que ele se integra.
Para que essa exatidão dos dados históricos seja condicionada a uma observação
daquilo que corresponde ao real, a pesquisa se realiza pelo método comparativo, onde tais
informações são coletadas e postas, concomitantemente, com o objetivo de observar se
respectivas afirmações relacionadas a um determinado fato coincidem ao longo do relato
apresentado em cada fonte explorada pelo teórico historiador. Em meio a essa questão, se
insere o texto literário, elemento constituído de significação e que, concretamente, se torna
visível ao leitor a partir de um autor, indivíduo este que, pela arte literária, transforma suas
ideologias e suas visões de mundo em objeto de apreciação e interpretação daquilo que é
posto e, nesse sentido, o contexto histórico se revela com mais frequência à medida que o
texto se desenvolve em sua construção de conteúdo, colocando a literatura como uma
ferramenta de busca de fontes históricas.
Os conflitos históricos que envolveram países de diferentes continentes resultaram
em acontecimentos que, até hoje, revelam as suas graves consequências, seja no contexto
mundial, econômico e cultural, de modo que as nações atingidas por essas circunstâncias
carregam, em seu trajeto histórico, imagens de divisão e destruição geradas pelos combates
que se predominaram durante essas ocorrências. Traz-se como exemplo a Primeira Guerra
Mundial (ocorrida entre 1914 e 1918), um fato que mobilizou determinados países do
globo – principalmente as grandes potências europeias – a lutarem em guerrilha, alterando
uma realidade mundial de paz para uma verdadeira arena de violência e fragmentação nas
relações humanas.
Este episódio, em especial, trouxe para o texto literário a chance de retratar, pela
ficção, ambientes hostis onde o regime de opressão e de lutas eram predominantemente
presentes no cotidiano daqueles que se integraram nas batalhas durante a guerra. Como
exemplo de autor que produziu uma literatura que abrangesse o panorama de guerra é o
escritor norte-americano Ernest Hemingway (1899-1961) que, com o romance Adeus ás
Armas (1929), utiliza a Primeira Guerra como fundamento para sua escrita. Isso é resultado
da própria biografia de quem escreveu, já que, conforme afirma Anderson (2010), a
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narrativa se associa com Hemingway que, durante a guerra, serviu como um motorista de
ambulância da força italiana, tal como o protagonista do enredo, o personagem Frederic
Henry. É possível, desde então, realizar uma pesquisa atentando em como a construção da
obra aponta para uma concepção do escritor acerca de sua participação no conflito.
Logo, este artigo tem como principal objetivo analisar a perspectiva histórica que
Hemingway se apropriou para compor o enredo em Adeus às Armas, considerando o modo
como tais informações acerca da Primeira Guerra são colocadas em concordância com
aspectos que fizeram parte deste grande embate no contexto global. Para tal fim, serão
explorados alguns registros de alguns historiadores que pesquisaram sobre a temática da
Primeira Guerra Mundial, expondo, assim, elementos desse panorama histórico que
coincidem com a narrativa americana. Seguidamente, serão examinados alguns dados
biográficos sobre a trajetória de Hemingway rumo à autoria, seu estilo de escrita e sua
relevância no âmbito literário e, por fim, será desenvolvido um estudo crítico-analítico do
corpus da pesquisa, especialmente em alguns trechos em que se apresentam algumas
observações do escritor com relação ao cenário da guerra.
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Outras causas, ainda, serviram como base para o começo dos combates entre os
países: o Pan-Eslavismo Russo, que tornava a Rússia como líder protetora de todos os
eslavos, o que caracterizou um novo nacionalismo (MACMILLAN, 2014) e auxiliou o seu
domínio imperial na Europa Oriental; a construção de uma estrada de ferro entre Berlin e
Bagdá, possibilitando o interesse dos alemães pelos lençóis petrolíferos em espaços do
Cáucaso e do Golfo Pérsico; o nacionalismo exercido pela Sérvia, ideologia esta que
emergira durante a Revolução Francesa (1789-1799) e as Guerras Napoleônicas (1803-
1815) e que se tornou predominante em potências europeias e não europeias, em domínios
britânicos, colônias e nações subalternas; embates derivados do declínio do Império Turco;
disputas entre Inglaterra, Alemanha e França pelas regiões do Marrocos; a primeira e
segunda guerra dos Balcãs contra o Império Otomano; e, por último, a tomada de posse de
colônias de outros países realizada pela Alemanha, Itália e outras regiões da Europa, de
modo que isso proporcionou a natureza global do imperialismo europeu, seu comércio e
seu poderio naval (SONDHAUS, 2013).
Dividida em três momentos, a Primeira Guerra teve suas primeiras ações na guerra
de movimento, em que as Alianças estenderam suas intenções imperialistas para outros
países com o intuito de adquirir forças para a obtenção de suas conquistas. Em seguida,
houve a guerra das Trincheiras, fase em que os alemães constroem essas escavações com o
intuito de obter estratégias de segurança e de invasão no território inimigo da França.
Sobre essa época, Sondhaus (2013) afirma que as trincheiras de comunicação projetadas
em ângulo reto perante as principais se conectavam e facilitavam o movimento dos
soldados sem se expor aos combatentes inimigos. Ainda, eram por elas que eles tinham
acesso a alimentos, munições e outros provimentos. Logo após, como uma terceira etapa,
vieram as Ofensivas dos Cem Dias, período final da guerra pelo qual os Aliados lançaram
ofensivas contra os Impérios Centrais do Ocidente. Nesse contexto, os combatentes
tinham a ideia de que assumir a ofensiva e tomar uma decisão era essencial para vencer a
guerra, como aponta Macmillan (2014).
Ademais, as disputas entre os países facilitaram a entrada do Japão e da Itália, porém
o império japonês se retirou do conflito logo após agir ambiciosamente contra a China,
tomando terras alemãs e outras colônias. Depois, no ano de 1916, houve a Batalha de
Somme, que resultou em ―[...] 650 mil aliados mortos, feridos ou desaparecidos.‖
(MACMILLAN, 2014, p. 683), além de 400 mil alemães; no mesmo ano, surge a Batalha
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de Verdun entre Alemanha e França e, conforme Sondhaus (2013, p. 235), ―[...] foi a mais
prolongada sangria geograficamente concentrada da guerra, já que quase todos os seus
mortos caíram dentro de uma área de 26 km 2, na qual foram disparados 10 milhões de
projéteis, equivalentes a 1,35 milhão de toneladas de aço.‖. Essas e muitas outras
ocorrências se integraram ao longo da ―Grande Guerra‖.
O fim oficial dessa guerrilha ocorreu com a instauração do Tratado de Versalhes
(1919), que foi um tratado de paz assinado após seis meses de negociações pelos países
que compunham o potencial europeu. Ele ―[...] serviu de modelo para os tratados da
Conferência de Paz de Paris em relação a Áustria, Hungria e Bulgária [...].‖ (SONDHAUS,
2013, p. 497). Porém, a Alemanha acabou entrando em uma grande crise econômica com
as penas impostas, dentre elas a perda das colônias, a atribuição de culpa pela ocasião da
guerra e o pagamento de uma indenização aos países vencedores do combate. Porém, nada
foi mais marcante do que as sequelas deixadas na memória daqueles que presenciaram
pessoalmente a Primeira Guerra, seja diretamente, na condição de soldado, ou
indiretamente, na posição de cidadão residente dentre os países abrangidos.
A vida de Ernest Hemingway sempre foi dedicada à escrita literária. Grande parte da
produção de suas obras se originou pelos dados biográficos do próprio autor e que, por
isso, algumas de suas composições possuem certa proximidade com a sua trajetória
enquanto compositor de literatura. Isso significa que, ao analisar alguns traços da biografia
do escritor, se poderá obter uma compreensão mais ampla acerca do conjunto de textos de
sua autoria.
Nascido nos Estados Unidos em 21 de julho de 1899, mais precisamente na cidade de
Illinois, ele era filho de Clarence Hemingway, médico, e de Grace Salão Hemingway,
professora de música e cantora. Iniciou sua carreira como repórter para um jornal intitulado
Kansas City Star, o que contribuiu para a determinação de sua escrita literária no que se
refere ao modo conciso em que os textos se adequam com a escrita jornalística. Depois, se
voluntariou como soldado na Primeira Guerra Mundial, porém, por apresentar uma visão
limitada, acabou sendo restringido ao combate na arena de guerra, sendo alocado como
motorista de ambulância na Cruz Vermelha da Itália, como já introduzido neste estudo.
Mesmo assim, acabou sendo ferido ao longo das batalhas, se submetendo a um processo
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cirúrgico e ao total repouso e, com isso, facilitou o autor na sua dedicação na escrita de
suas obras literárias, dedicando-se, principalmente, na produção em prosa, conferido no
conjunto de contos e romances publicados.
Ainda, a vida pessoal de Hemingway é caracterizada pela existência de diversos
relacionamentos, tanto no que diz respeito ao casamento como aos casos extraconjugais
vivenciados por ele. Nomeado como ―mulherengo‖ e ―boêmio‖, ele tinha uma rotina
constante de viagens, visitando países como França, África, Espanha, Cuba, Itália, dentre
outros, e esses espaços também foram consideráveis para a escrita de seus textos, já que
alguns deles se situaram nesses territórios. Cada um, em sua construção, apresenta suas
particularidades com relação ao contexto cultural, histórico e social existente nos cenários
e temas apresentados pelo autor.
Cronologicamente, os trabalhos de Hemingway na literatura começaram em 1919,
quando ele tentou publicar alguns contos produzidos em casa. Juntamente com T.S. Eliot
(1888-1965), James Joyce (1882-1941), dentre outros, eles formaram o grupo de escritores
denominado A Geração Perdida, composto por artistas literários americanos expatriados
que viajaram dos Estados Unidos a Paris em busca de inspiração e distanciamento da
Grande Depressão Econômica (ou crise de 1929), que atingiu a população norte-
americana. É pelo seu primeiro romance em O Sol Também se Levanta (1926) que
Hemingway irá tratar deste contexto, construindo personagens que, assim como ele,
presenciou o estilo de vida na capital francesa.
A escrita de Hemingway também acompanhou as mudanças do período modernista,
período que abrangeu todos os movimentos artísticos e culturais do século XX em que se
buscavam novas formas de produzir arte, tendo como ponto central o desapego ao
tradicional, considerado pelos integrantes como algo ultrapassado. A literatura, nesse
cenário, adquire algumas alterações, especialmente ao modo como a ficção seria exposta
ao leitor. Gray (2004) revela que os críticos defendiam uma leitura mais aprofundada do
texto e o uso de práticas literárias distintas, a exemplo da inserção de figuras de linguagem
e o surgimento do fluxo de consciência executado pelo narrador.
Têm-se registrado, então, inúmeras obras publicadas de sua autoria: as coleções de
contos Homens sem Mulheres (1927), O Vencedor Nada Leva (1933), e As Cinquenta
Colunas e as Primeiras Quarenta e Nove Histórias (1939), e alguns dos seus romances
mais lembrados pela crítica literária: O Sol Também se Levanta, comentado anteriormente
neste estudo, o romance de guerra Adeus às Armas - resultado de suas experiências durante
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a Primeira Guerra Mundial e utilizado como objeto para esta análise - além de Morte na
Tarde (1932), Ter e Não Ter (1937), Por Quem os Sinos Dobram (1940), Do Outro Lado
do Rio, entre as Árvores (1950), e sua obra consagrada O Velho e o Mar (1952), de modo
que este último lhe concedeu o Prêmio Nobel de Literatura e o Prêmio Pulitzer, sendo este
atribuído a artistas reconhecidos pela sua excelência na literatura, no jornalismo, e em
outras áreas. Ademais, outros textos do autor foram publicados após sua morte, como os
romances Paris é uma Festa (1964), As Ilhas da Corrente (1970), O Verão Perigoso
(1985) e O Jardim do Éden (1986).
Não obstante, seu sucesso literário não o impediu de sofrer problemas de saúde
associados à depressão causados por dois acidentes em um avião na África, além de que o
estado depressivo se constituiu de algo bastante presente na linhagem de sua família.
Acreditando que estava perdendo o dom da escrita e vivenciando divergências no núcleo
familiar, o autor cometeu suicídio em 02 de julho de 1961, atirando com uma pistola em si
mesmo. De fato, ele deixou suas narrativas como marcas registradas de seu talento de
escrita em língua inglesa no contexto literário estadunidense. Isso está em concordância
com a afirmação de Anderson (2010) ao destacar que ele é um mestre literário reconhecido
e um dos escritores mais influentes de prosa dentre os outros americanos que se encontram
em sua geração.
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Percebe-se, em sua descrição, a forma exata utilizada ao citar algumas utilidades dos
combatentes, especialmente os cartuchos, munição comumente usufruídas pelas tropas, em
especial os alemães que, em Londres, mantinham escondido 50 mil fuzis e 7 milhões de
cartuchos para seus ataques às forças inimigas (MACMILLAN, 2014). Dessa forma, os
homens serviam como verdadeiras máquinas de guerra, submetidas a um regime totalitário
onde a violência era o principal mecanismo para a obtenção da vitória.
Seguidamente, é evidente a presença das ambulâncias no texto narrativo e a sua
utilidade no cenário de guerra. Associada aos dados biográficos de Hemingway –motorista
de ambulância – a narrativa revela como esses veìculos se configuravam: ―Eram
ambulâncias de frente achatada, pesadonas, pintadas de cinza e lembrando caminhões de
mudança. Os mecânicos estavam consertando uma fora da garagem. Três outras andavam
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pelas montanhas, a serviço dos postos de emergência [...].‖ (HEMINGWAY, 2013, p.17).
Americano, o escritor de Adeus às Armas é um exemplo de voluntário fornecido pelo
governo estadunidense durante a Primeira Guerra, sem falar nas ambulâncias concedidas,
como se confere no dado histórico abaixo:
Por estar inserido em um cenário político de combate entre países, subtende-se que
Hemingway era ciente das relações de poder que se instauravam em torno daquelas
circunstâncias que ele mesmo presenciou durante os combates. Em Henry, ele internaliza a
sua visão sobre a condição dos Estados Unidos perante a guerra, e isso se torna claro
quando o narrador aponta a sua perspectiva sobre a ―possìvel‖ ação futura do presidente
americano Woodrow Wilson (1856-1924) em proclamar guerra:
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base em todas as relações estabelecidas entre história e literatura nesta pesquisa,
observa-se que a perspectiva narrativa adotada por Hemingway expõe informações
diretamente alusivas ao contexto da Primeira Guerra trazido pelos historiadores que se
dedicaram a relatar este conflito mundial. É preciso destacar que este evento consistiu em
algo de grande repercussão para todos os envolvidos e que, assim, é justificável a
quantidade de textos históricos encontrados sobre a ―Grande Guerra‖. Isso também se
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REFERÊNCIAS
CANDIDO, Antonio. Literatura e Sociedade. Rio de Janeiro: Ouro Sobre Azul, 2006.
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REIS, Carlos; LOPES, Ana Cristina M. Dicionário de Teoria da Narrativa. São Paulo:
Editora Ática, 1988.
VERNON, Alex. War: World War I. In: MODDELMOG, Debra A; GIZZO, Suzanne del.
(Ed.). Ernest Hemingway in Context. New York: Cambridge, 2013. p. 388-394.
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RESUMO
Este trabalho tem como objetivo mostrar de que forma a literatura medieval cômica
produzida nos séculos XII e XIII foi utilizada como mecanismo de resistência pela camada
popular para burlar o poder vigente do período. Os fabliaux e os exempla fazem parte de
uma vasta produção literária que tem como objetivo provocar o riso através de textos
paródicos que versavam sobre o cotidiano da população. Em seu corpo textual facilmente
se encontram brigas domésticas, luxúria clerical, astúcia feminina e ironias ao regime
feudal. Este trabalho se fundamenta nas discussões de Bakhtin (2013), que afirma que o
riso sempre esteve como arma de libertação nas mãos do povo e de Minois (2003), para
quem que o riso popular teria o valor de subversão social, temporariamente tolerado,
abolindo ou revolvendo as hierarquias. É sobre estes dois aspectos que o trabalho
discorrerá, procurando mostrar como, através do riso, as camadas populares subvertem o
poder vigente.
Palavras-chave: Literatura; Medievo; Resistência; Riso; Comicidade.
A palavra riso no dicionário Aulete2 significa ―1. Ação, resultado ou modo de rir; 2.
Demonstração de contentamento, de alegria; 3. Escárnio, zombaria, deboche, desprezo.‖.
Rir nos traz sensação de bem estar, geralmente representa satisfação e felicidade e
contemporaneidade o riso é permitido em muitos lugares e aparece sob várias formas. Com
o avanço da tecnologia e o aparecimento das redes sociais o riso pode ser representado por
emojis3, por exemplo, ou pela sequência de três letras ―k‖ (kkk). A liberdade do ato de rir
na contemporaneidade possibilita a sociedade de expressar seus sentimentos de forma mais
ampla, seja por meio das redes sociais, da literatura, da música do teatro e do cinema, o
riso transcende qualquer sentimento opressor possibilitando uma espécie de sentimento de
liberdade. Mas se formos fazer uma análise histórica sobre o riso verificaremos que em
algumas sociedades passadas o ato de rir era tido como violação e desobediência à ordem
vigente, como é o caso da Idade Média.
Conforme Macedo (2000) os escritores do cristianismo primitivo, imbuídos das
ideias neoplatônicas e estoicas e da dicotomia da existência do sagrado e profano, pecado e
2
http://www.aulete.com.br/riso
3
Emoji são ideogramas e smileys usados em mensagens eletrônicas em páginas da web. Seu uso teve início
no Japão e se popularizou para além do país. Eles existem em diversos gêneros, incluindo: expressões faciais,
objetos, lugares, animais e tipos de clima. Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Emoji.
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Certificados de que o riso não seria um ato de infâmia a Deus, o clero via nele a
oportunidade de usá-lo como ferramenta instrutiva. A partir dessa observação, vão
surgindo alguns tipos de gêneros textuais cômicos reservados para os sermões, como é o
caso dos exempla. Seus escritores se apropriavam tanto de conteúdo sagrado quanto
profano de forma didática, com intuito de atingir o público de forma mais abrangente.
Depois da fome e das epidemias diminuírem, a mensagem com tom de miséria ficou
enfraquecida. Impõe-se, então, um esforço pedagógico para conquistar, de novo, os
espíritos: o recurso a historietas engraçadas que excitam os ouvidos e possibilitam guardar
a lição.
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pregadores, o que diz muito do interesse provocado por seus sermões. O riso do exempla
não deve servir apenas para manter as pessoas acordadas, deve também auxiliar a
memorizar mensagens morais. (MINOIR, 2003, p. 213). Não podemos deixar de lembrar
que, a maior fonte de inspiração para tais textos é a própria sociedade, os monges
medicantes misturados à população urbana, conhecedores dos problemas domésticos
através da confissão, criam um vasto repertório diversificado para ser usado na catequese.
A respeito das características do exempla e sua função na sociedade Macedo (2000)
destaca:
Ao lado dos exempla, surge também outro gênero literário, os fabliaux, Para
explicar o que é um fabliau a autora Nora Scott (1995) cita o Conde de Caylus que fez um
estudo sobre esse tipo de literatura nos anos de 1753 e Anatole de Montaiglon que também
estudou os fabliaux, em 1872. Assim, Caylus coloca que o fabliau é um poema que encerra
a narrativa elegante de uma ação inventada, mais ou menos carregada de intriga, porém, de
certa extensão agradável ou engraçada, cujo objetivo é instruir ou divertir. Já para Anatole
de Montaiglon (apud Scott, 1995), o fabliau é uma narrativa perfeitamente cômica, de uma
aventura real ou possível, mesmo com exageros, que se passa nas circunstâncias da vida
humana média, é a narrativa de uma aventura totalmente particular e comum.
Os fabliaux não se confundem com as fábulas porque são mais longos e seus
personagens principais são exclusivamente humanos. A própria Scott (ibid.) expõe a
dificuldade encontrada na classificação desses textos, mostrando que entre eles e outras
formas literárias da época, como as canções de gesta, romance, exempla e lais, há em
comum o fato de serem narrativos e em versos, em sua maioria. E no caso dos exempla e
dos fabliaux, de trazerem uma moral. Porém, a intenção didática e o tom moralizador não
desempenha o mesmo papel nos contos profanos, marcados pelo espírito sarcástico, pelo
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tom satírico, erótico e obsceno, oposto aos valores defendidos pela cultura clerical oficial
(MACEDO,2000, p. 165).
Afirma Lacy (1995) que, sendo ou não um gênero burguês os fabliaux
frequentemente mostram personagens que pertencem à classe média ou à sociedade
camponesa. Raramente figuram cavaleiros. Conforme Macedo (2000, p.178), os
personagens da alta nobreza que figuram nas narrativas geralmente obtêm sucessos nas
empreitadas sensuais. Os maridos conseguem desvendar as trapaças arquitetadas por
sedutores e revertem a situação em seu benefício. Se forem de classes mais baixas, como
os vilões, estudantes pobres, sacristãos ou religiosos, quase sempre são enganados ou
ridicularizados. Os reis, por fazerem parte do topo das hierarquias geralmente são
poupados das humilhações, diferentemente do clero, que dificilmente escapa da
ridicularização. O público para quem os textos eram dirigidos ou recitados era bastante
diversificado, a exemplo de nobres, burgueses e cavaleiros e habitantes de várias cidades.
Na diversidade de textos literários que circularam no período que abrangem os
séculos XII ao XIV, os fabliaux apresentam características bem peculiares: a linguagem
erótica, ainda que sob a forma de eufemismos e metáforas aparece em parte considerável
do que se tem compilado atualmente, a vida nas cidades, tensões entre homens e mulheres
que reside não na diferença sexual, mas um impulso de revirar as estruturas hierárquicas.
Estas duas características nos levam a perceber que os fabliaux dialogam com traços
populares advindos de festividades como a Festa do Asno, A festa dos loucos e A festa dos
Foliões, todas preservando em comum o traço da inversão da ordem hierárquica.
No campo teórico quem discute este aspecto nos textos cômicos da cultura popular,
no contexto de Rabelais, período do Renascimento, é Mikhail Bakhtin (2013), estudioso
russo do campo da literatura e da linguagem. A este processo de inversão Bakhtin chama
carnavalização. Embora tratando de momento histórico posterior, Bakhtin retorna à Idade
Média para mostrar que as manifestações artísticas da época, incluindo os fabliaux, foram
responsáveis – com destaque para as obras em que acontecem as inversões –, pela
preparação e consolidação do pensamento do homem moderno.
O autor nos apresenta um quadro de infinidades de manifestações do riso que se
opunha à cultura oficial, ao tom sério, religioso e feudal da época. Dentro dessa
diversidade de manifestações, das festas públicas carnavalescas, dos ritos e cultos cômicos
especiais, dos bufões, tolos, gigantes, anões, monstros, palhaços de diversos tipos e
categorias, encontra-se a literatura paródica, que é vasta e multiforme, que possui uma
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paródias de textos e ritos sagrados tinham como destino sua execução durante a festa dos
loucos e estavam diretamente ligados a ela. O autor ressalta também que, toda literatura
paródica do medievo é uma literatura recreativa, criada durante os lazeres que
proporcionam as festas, e destinada a ser lida nessas ocasiões na qual reinava uma
atmosfera de liberdade e de licença. Essa maneira alegre de parodiar o sagrado era
permitida em honra das festas, da mesma forma como era o risus paschalis, o consumo de
carne e a vida sexual. Ela estava impregnada pela mesma sensação de alternância das
estações e de renovação num plano material e corporal.
O riso popular que organiza todas as formas do que Bakhtin (ibid.) chama de
realismo grotesco foi sempre ligado ao baixo material e corporal. É essa a comparação
feita com a paródia medieval, a quem diz muito se assemelhar. No realismo grotesco, a
degradação do sublime não tem um caráter formal ou relativo ―o alto‖ é o céu; o ―baixo‖ é
a terra, possuem um sentido topográfico, o alto é representado pelo rosto (a cabeça), e o
baixo pelos órgãos genitais, o ventre e o traseiro (BAKHTIN, 2013, p. 19). Há, assim
como nos fabliaux, uma conexão do corpo com a construção do texto.
Para Minois (2003) o riso teria o valor de subversão social, temporariamente
tolerado, abolindo ou revolvendo as hierarquias. O riso carnavalesco é, primeiramente, um
bem coletivo do povo. Todo mundo ri, é o riso ‗geral‘, ele é ‗universal‘, ou seja, atinge
todas as coisas e todas as pessoas. O mundo inteiro parece cômico, é percebido e
conhecido sob seu aspecto risível, em sua jubilosa relatividade. O riso é ambivalente: é
alegre, transbordando de alegria e esfuziante, mas também zombeteiro e sarcástico. Nega e
afirma. Sepulta e ressuscita, ao mesmo tempo. Minois (2013, p. 191) ressalta que na Idade
Média
É por essas razões, diz Bakhtin (ibid., p.82), que o riso jamais poderia ser um
instrumento de opressão e embrutecimento do povo, uma vez que nunca conseguiu se
tornar inteiramente oficial. O riso sempre esteve como uma arma de liberação nas mãos do
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povo. O sério oprimia aterrorizava, acorrentava, mentia e distorcia. Nas praças públicas,
durante as festas, diante de uma mesa abundante, lançava-se abaixo o tom sério e ouvia-se
a verdade sob a forma cômica através das brincadeiras, obscenidade, grosserias, paródia
pastiches, etc.
No campo do sagrado, pode-se perceber que lá também estava o riso. No caso dos
sermões era um riso de combate, segundo Minois (2003), arma a serviço do bem, ou antes,
da moral cristã, contra o mal, os vícios. Se certos pregadores, sobretudo os franciscanos,
tinham tendência ao riso bufão, grande parte se recusava ao riso gratuito, ao rir por rir. O
riso da Idade Média, segundo Bakhtin (2013), é um riso de sensação social, universal. O
homem ressente a continuidade da vida na praça pública, misturando-se à multidão do
carnaval, ao contato com outros corpos, de pessoas de idades e condições das mais
variadas. Há uma sensação de pertencimento, por um momento se suspendem as opressões,
situa-se em estado perpétuo de crescimento e de renovação. Talvez por isso o riso da festa
popular englobe uma conexão com o sobrenatural, tocando as coisas sagradas e a morte,
mas também o temor. ―Inspirado por todas as formas de poder, pelos soberanos terrestres,
a aristocracia social terrestre, tudo o que oprime e limita‖. (BAKHTIN, 2013, p. 213).
Diante desses apontamentos sobre a literatura cômica medieval, o que podemos
destacar é que esta foi usada como mecanismo de subversão das normas constituídas
durante o período apresentado. Através do riso quebram-se as amarras dos tabus
estabelecidos, libertam-se os corpos e seu riso. Quem não podia falar acaba por falar
demasiadamente, quem não podia ouvir, escuta, acaba praticando estes atos. Vence o medo
do sagrado, do que é constituído como moral, para dar voz e vez ao que está reprimido por
muito tempo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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LACY, Norris J. Fabliaux. In: KIBLER, William W. (editor) et al. Medieval France: an
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ZUMTHOR, Paul. A letra e a voz: A "literatura" medieval. São Paulo: Schwarcz, 2005.
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RESUMO
Este trabalho tem o objetivo de analisar um dos poemas épicos inglês de maior
importância, Paraíso Perdido (1667), de John Milton. Esta obra se insere no conturbado
contexto histórico inglês do século XVII, dominado por disputas políticas e religiosas entre
grupos rivais protestantes e católicos, no qual o autor participou ativamente enquanto alto
funcionário público. Seu poema mais conhecido é uma releitura de trechos bíblicos, os
quais são utilizados para ilustrar os confrontos políticos e religiosos de sua época,
notadamente do grupo puritano, do qual Milton fazia parte. Diante do exposto, este
trabalho analisará conteúdo e forma de Paraíso Perdido, destacando inclusive, os aspectos
épicos de sua composição, uma vez que este gênero literário trata de documentar relevantes
fatos históricos de uma nação.
Palavras-chaves: Literatura, sociedade, poesia épica.
INTRODUÇÃO
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Parlamento. Silva (2005, p.138) afirma que: ―Infelizmente para James o poder efetivo da
sociedade Inglesa estava cada vez mais nas mãos dos comerciantes e donos de terras que
constituìam o Parlamento‖. E de fato viria a ser cada vez mais, percebe-se quando outra
crise se instaura no reinado de James I, quando um grupo de protestantes pertencente ao
Parlamento exigia leis mais duras aos católicos. O rei cedeu a pressão, mas não conseguiu
satisfazer ao grupo. No que resultou na fúria dos católicos, uma conspiração contra o rei e
ao Parlamento, no qual foi conhecido como a conspiração da pólvora.
De acordo com Silva (op.cit, p.139) os puritanos era um grupo religioso do
Parlamento que se opunha ao Rei James I, eles recebiam esse nome por suas investidas em
tentar purificar a Igreja Anglicana, dos embelichimentos e esculturas presentes na igreja. E
o rei James durante o seu reinado tentou converter os puritanos ao anglicanismo, numa
perseguição fervorosa.
Tensões econômicas e sociais contribuiu para rebeliões no século XVII, contra a
dinastia Stuart, os monarcas Jaimes I (1603-1625) e o seu sucessor Carlos I (1625-1649). A
oposição à política centralizadora, junto com a recusa do anglicanismo do estado, resultou
em conflitos políticos-religiosos ao absolutismo real. Os dois reis acreditavam no
absolutismo, desprezando cada vez mais o Parlamento, através da igreja Anglicana, a coroa
doutrinava o direito divino dos reis. De acordo com Silva (2005, p.140) quando James I
morreu, sucedendo a coroa para seu filho Carlos I, foi quando a relação entre o rei e
Parlamento resultou em maiores conflitos. Em 1640, o rei se viu na necessidade de obter
novos impostos para combater uma rebelião na Escócia, que recusava o Anglicanismo,
assim convocando o Parlamento. Após se reunirem, o Parlamento para aceitar os pedidos
do rei, impôs que fosse concedido a eles o direito a consultas sobre questões tributárias e
religiosas.
Segundo Campos e Miranda (2005, p. 230) O rei Carlos I não aceitou tais
exigências e o Parlamento se recusou a dar dinheiro pra coroa, ordenou o fechamento do
Parlamento e a prisão de cinco parlamentares, foi o estopim para a guerra civil, também
chamada de Revolução Puritana. De um lado tínhamos o rei, os nobres e a Igreja
Anglicana, do outro um novo exército financiado por comerciantes e comandado por
Oliver Cromwell, que veio a ser um republicano que defendia a tolerância religiosa. Esse
novo exército era composto por agricultores ricos e puritanos.
Na guerra Cromwell foi apontado como um gênio militar, segundo Silva (2005,
p.145), diz que: ―Ele uniformizou seus homens com as melhores armas e armaduras
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No século XVII, de fato a igreja católica não era mais o principal poder de
espiritualidade, a Bíblia teve sua versão oficial em 1611, no reinado de James I, como
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chefe da Igreja Anglicana, ele ordenou uma publicação em língua Inglesa. E por assim, em
influenciar obras da literatura Inglesa como Paraíso Perdido.
O poeta Inglês John Milton viveu em meados do século XVII, um dos escritores
representantes de sua geração, autor de Paraíso Perdido (1667), escreveu um dos mais
importantes poemas épicos da literatura. Sua obra é notável assim como outros épicos de
Homero, Virgílio, Camões e Beowulf. O seu poema possui uma linguagem altamente
rebuscada e de difícil compreensão no início, mas ao decorrer uma estória fascinante,
baseada em passagens do livro Gêneses da Bíblia, incorporando fatos relevantes da sua
época.
Milton participou da vida política do país ativamente como funcionário público, no
qual dedicou sua vida e obra as causas puritanas. Ele escreveu panfletos no qual defendia o
governo de Oliver Cromwell e suas ações, um dos mais conhecidos foi ―A Defense of the
English People‖, no qual ele justificava a morte do Rei Carlos I. Posteriormente foi ficando
cego, ao dedicar-se arduamente aos seus trabalhos, sobre a luz fraca de velas. Depois da
restauração e a volta da monarquia, muitos dos puritanos foram presos, inclusive o poeta
John Milton, ficando sem dinheiro e propriedades. Após intervenção de amigos, ele foi
libertado e dedicou o resto de sua vida a lecionar para sobreviver, e foi quando escreveu
um dos seus maiores poemas, que representa a literatura Inglesa. Já completamente cego
ditou o poema Paraíso Perdido para uma de suas filhas, no qual ele vai tratar sobre a queda
de Lúcifer e do homem e a origem do pecado. Sua obra refletiu sobre todas as inquietações
da sociedade Inglesa, como as questões religiosas, políticas, o puritanismo e até um pouco
de existencialismo de como ele se sentia nesse contexto conturbado. Quatro anos mais
tarde ele publicou Paraíso Reconquistado (1671) uma sequência do primeiro poema, aonde
Cristo vem a Terra para recuperar o que Adão teria perdido.
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Beowulf, que abre o poema com a genealogia da dinastia de Scylding, objetos ou coisas
importantes como os navios que iriam pra guerra, e lugares).
Algumas convenções épicas utilizadas no poema é o uso do prepositio, uma
afirmação sobre o tema ou a causa do épico. Pode ser um propósito (como John Milton
propôs de justificar os caminhos de Deus até o homem) ou uma questão (como na Ilíada,
que Homero inicia por pedindo uma musa para cantar a ira de Aquiles). O poema começa
em media res, ou seja, que a estória já inicia no meio das coisas, geralmente o poeta
começa com uma pressa invocando as musas ou um deus para providenciar inspiração
divina para começar a contar a estória de um grande herói, através de longos discursos. No
poema épico é comum o uso de figuras de linguagem e a estrutura pode ser dividida em
livros ou cantos, e os heróis da literatura épica, são vinculados por um código de honra.
Como o épico começa no meio das ações, os personagens usam digressões através
de rápidos flashbacks para contar sobre fatos do passado que não foram explicados. Outra
convenção frequente é o uso de epithets, que são a renomeação ou um segundo nome, seja
de personagens como de Agamenon e Menelaus, que se referiam a eles como ―águias
gêmeas‖, deuses, coisas ou frases. Por exemplo, Homero usa a frase ―aurora dos dedos
rosados‖, para dizer toda vez que o dia se iniciava. Também ocorre a presença do
sobrenatural, porque geralmente o protagonista herói vem acompanhado de uma força
sobre-humana, podendo vencer criaturas míticas, como em Beowulf que o rei decide
enfrentar sozinho um dragão. E ainda temos um contador de estórias que toca uma lira e
canta uma canção improvisada sobre os feitos do herói.
Continuando nos conceitos Aristotélicos, temos mais dois de suma importância
para o poema épico, que são a peripécia e o reconhecimento. Para Aristóteles (op.cit, p.30-
31) um exemplo perfeito para os dois é o Édipo Rei, sabendo que peripécia, é uma
reviravolta das ações do personagem, também podendo ser chamado de mudança de
fortuna, em que o personagem ia bem e depois de alguma coisa ele se dar mal, ou vice-
versa. E que o reconhecimento é a mudança de desconhecimento para o conhecimento,
algo que vem a tona. Temos Édipo quando ele tenta encontrar o assassino do Rei Laio, em
que ele descobre que é ele próprio o assassino e a partir daí toda a sua sorte muda. O
reconhecimento se dar entre pessoas, outro exemplo é quando um escravo reconhece
Odisseu através de uma cicatriz que tinha na perna, depois de 19 anos afastado do reino.
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Paradise Lost foi originalmente escrito em dez cantos e depois em doze cantos, o
autor quis assemelhar a sua obra a de outros épicos como Eneida de Virgílio e a Odisseia
de Homero, as quais tinha forte aspirações. O poema vai tratar da rebelião de anjos,
liderados por Lúcifer, a queda e expulsão do homem do paraíso, baseados em
acontecimentos do livro Gênesis da Bíblia. No primeiro livro, Milton abre o poema com
uma invocação ao espìrito santo, com o propósito de justificar ―os caminhos de Deus ao
Homem‖. O poema começa in medias res, com Satanás se acordando e confuso nas
profundezas do inferno.
O primeiro livro é contado na perspectiva de Satanás, ele descreve como o inferno é
horrível e dar nomes de figuras pagãs aos anjos caídos, em que ele passa a liderá-los. Neste
momento temos um catálogo longo da lista de anjos caídos que participaram da guerra.
Evidencia-se nesse catálogo, representa as pessoas e navios que foram pra guerra no
conturbado século XVII. Por conseguinte, no livro II os demônios se reagrupam sob a
liderança de Satanás, para planejar uma vingança contra Deus e construir um palácio
chamado de Pandemonium, um neologismo cunhado pelo próprio Milton.
Nos primeiros livros o personagem Satanás é construído com as qualidades de um
herói, como líder, inteligente, forte e que haveria o que eles tinham perdido que era o céu.
Então ele decide sozinho enfrentar o caos e os perigos para se chegar ao novo mundo, que
era o jardim do Éden. Mas também Satanás tinha outras qualidades indesejáveis, que eram
a inveja, a ambição, o desejo de vingança e o orgulho.
No livro III ocorre uma mudança narrativa, na qual o autor deixa de falar sobre o
inferno e passa a falar sobre o céu, havendo uma mudança de perspectiva de Satanás para
Deus. Desta forma, já sabendo dos planos de Satanás para acabar com a criação divina,
Deus decide entregar o seu filho para a salvação do homem. Milton descreve
detalhadamente todo o plano de satanás, mostrando como ele fará para conseguir entrar no
Paraíso. Por conseguinte no livro IV, é quando satanás chega ao jardim do éden e fica
maravilhado com aquele paraíso, comparando com o do reino dos céus, ele demonstra
vários sentimentos de nostalgia, arrependimento, mas quando vê o casal todo feliz naquele
jardim, até os admira, mas então a inveja se torna maior e todo o desejo de vingança, é
nesse momento que ele os ver discutindo sobre a ordem de Deus, de não comer do fruto
proibido e é quando Satanás planeja todo o seu plano de vingança contra Deus, para
provocar a queda do homem.
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No Livro V ainda no reino do céu, Deus ordena que um dos seus anjos Raphael
desça a terra, para alertar a Adão sobre as tentações de Satanás, quando ele chega a terra,
ele conversa com Adão e fala sobre os anjos que se rebelaram no reino do Céu. Ele faz
uma digressão através de flashbacks para contar o que houve no céu, fala da inveja de
Lúcifer, quando Deus introduziu seu filho para governar junto com ele, da rebelião de
anjos liderado por Satanás, da guerra que houve no céu entre os anjos fiéis a Deus e os
anjos que se rebelaram serve pra ilustrar a guerra civil que ocorreu na Inglaterra e a
expulsão dos anjos que correspondiam a um terço do céu para o inferno. Rafael estava
contando aquelas estórias porque queria que Adão aprendesse com elas.
E com isso Raphael retorna para a estória de Abdiel de valores cristãos, que
confrontou Satanás e os outros anjos que disse a eles que confrontar Deus, iria ser uma
derrota iminente. Quando Abdiel deixa os seguidores de Satanás, ele é bem-vindo de volta
às fileiras de Deus. Ele é perdoado por Deus e louvado pela lealdade, obediência e
resistência do mal. Esta estória de Abdiel é uma reminiscência de uma cena inicial no
épico. Os valores e as qualidades típicas que a maioria das pessoas associa a um
protagonista ou líder, de valores cristãos. Aquiles não é obediente, Odisseu não é humilde
e Abdiel honra a integridade e é obediente e humilde.
Depois que Adão é informado da guerra no céu por Raphael, ele pede mais
informações sobre a sua própria criação e sobre a Terra. No livro VII, aqui temos outra
invocação de Milton a musa Urania, uma musa grega da astronomia, particularmente
apropriada para este livro, que será em grande parte sobre a criação universal. E Milton faz
referencia a outros mitos gregos, como o personagem Bellerophon, que foi um grande
herói grego mítico aventureiro que derrotou uma quimera, voou montado no cavalo
Pegasus, até o Monte Olímpio, provocando a ira de Zeus, golpeando-o, deixando o resto de
sua vida sozinho e cego. A analogia que o Milton faz, serve para ilustrar o que estava
acontecendo com ele. Ambos viajam para o refúgio e ambos estão cegos. E quanto ao fato
de Milton também se sentir sozinho, o período em que esteve escrevendo esse poema.
Outra referência é a Bacchus o deus grego do vinho, ou o deus do êxtase e entusiasmo, foi
uma critica as pessoas da sociedade inglesa, para falar das pessoas que bebiam e
participavam de festividades. Outra alusão que é rapidamente mencionada é o de "Bardo
Thracian", referente a Orfeu, a saber, Orpheu foi morto por uma mulher, haja vista que o
homem foi condenado a morte por a mulher em Paraíso Perdido, na visão de Milton.
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No livro IX, é quando exatamente Satanás chega a Terra e possui uma serpente e
confronta Eva quando está sozinha e tenta convencê-la a comer do fruto proibido, também
chamado do fruto de conhecimento do bem e do mal. E é quando finalmente Eva come do
fruto e a compartilha com Adão, eles adormecem e o fruto começa a ter efeito. No livro X,
é onde ocorre à peripécia e o reconhecimento, o fruto traz a tona o desconhecido, os
personagens Adão e Eva passam a obter o conhecimento, e devido ao pecado por terem
cometido, a sorte deles começa a mudar, eles iam bem e as suas vidas começam a mudar
drasticamente. E começa toda uma questão existencial de Adão, se lamentando pelo que
tinha feito arrependido por aceitar o fruto de Eva, ignorando e insultando, e nesse livro vai
perceber uma visão machista nos discursos de Milton.
E por fim, a partir dos livros XI e XII, vemos as consequências de Adão e Eva por
terem pecado, o desfecho para Satanás e os seus seguidores por ter provocado a queda do
homem. Quando Deus envia o anjo Michael para expulsar o casal do jardim do Éden e
mostra a Adão visões do futuro que acontecerão devido ao pecado que cometeram.
Michael mostra vários horrores, como doenças, mortes e guerras, mas repete a mensagem
de Deus que o único caminho é a obediência e uma maneira de se juntar ao céu e uma
promessa de redenção para eles. Adão também viu pessoas com alegria dançando e
flertando, que aparentemente era uma coisa boa que Michael diz a ele, no entanto quem
vivia por prazer e obedecem a Deus, eles nunca entrariam no céu.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, ler um épico como Paraiso Perdido foi possível analisar fatos
históricos da sociedade Inglesa de um determinado período. Uma vez que um épico tem
grande importância de documentar fatos históricos de uma nação ou povo. E também nos
possibilitou analisar características da poesia épica.
Paraíso perdido é um poema de grande relevância para a literatura inglesa, pois
John Milton ilustrou na sua obra episódios políticos e religiosos que marcou o século XVII
da Inglaterra. Como sabemos o puritanismo foi um grande grupo de protestantes em
oposição à igreja católica e os seus seguidores, que resultou numa guerra civil. Este estudo
evidenciou-se que os maiores interessados nas rebeliões e conflitos foi a alta nobreza, os
detentores do poder politico e religioso e que apesar dos protestantes conseguirem
implementar uma república, não satisfez as necessidades do povo e sua religiosidade.
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Entretanto, apesar do início do reinado dos Stuart, ter sido uma tragédia, o século
XVII foi fortemente marcado, por acontecer algo inédito que não acontece mais até os dias
de hoje, que foi a implementação de um governo republicano.
E por fim, no poema épico a gêniosidade do escritor em entrelaçar fatos históricos,
bíblicos e a poesia, fica evidente. Mas se lido e analisado de outro ângulo, pode perceber
uma visão machista do escritor em algum de seus discursos no poema, podendo interligar
um dos conceitos puritanos que ele tinha sobre a mulher na época, associado ao pecado e
vista com uma maior inferioridade.
REFERÊNCIAS
ARISTÓTELES. Arte poética. São Paulo: Difusão Européia, 1959.
CAMPOS, Flavio de; MIRANDA, Renan Garcia. A Escrita da História. 1 ed. São Paulo:
Escala Educacional, volume único, 2005.
SILVA, Alexander Meireles da. Literatura Inglesa para Brasileiros: Curso Completo de
Cultura e Literatura para Estudantes Brasileiros. Rio de Janeiro: Moderna, 2.ed.2006.
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RESUMO
O presente artigo propõe uma reflexão sobre os movimentos migratórios no cenário
brasileiro, tendo como metáfora desse processo a região Nordeste e a obra Morte e Vida
Severina do poeta João Cabral de Melo Neto. Com esse objetivo busca-se compreender
aspectos do processo de migração do meio rural para o urbano e suas implicações na
ocupação do espaço, assim como refletir sobre a trajetória do migrante e o significado do
migrar para esse sujeito desenraizado do seu espaço social e identitário. Sendo a linguagem
literária fonte privilegiada de representação da realidade, o enfoque dessa metodologia
procura estabelecer um diálogo entre História e Literatura no pensar as representações
sobre a realidade histórica apreendidas no texto ficcional, como o faz João Cabral de Melo
Neto que em sua linguagem poética interpreta um espaço social marcado historicamente
pelo processo migratório e pela presença do ―homem Severino,‖ sua história, motivações e
descobertas nessa travessia.
Palavras-chaves: Espaço; História; Literatura; Migração.
INTRODUÇÃO
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5
O Romance Regionalista ou Romance de 1930 marcou na literatura brasileira um momento de mudança na
forma como seus autores buscaram representar a realidade. Os autores desse período buscaram através da
crítica social descrever de forma fiel as contradições e os conflitos existentes dentro da espacialidade
brasileira, ou seja, um país que se queria moderno, mas que conservava traços arcaicos em sua diversidade
regional, á exemplo do nordeste que sofria bastante com a falta de estrutura e por resquícios de uma
sociedade patriarcal em decadência. Nomes como Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Raquel de Queirós
entre outros se destacam nesse viés regionalista seguido por João Cabral de Melo Neto.
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Recife revelaria o contraste entre os centros urbanos e as áreas periféricas, refúgio dos
retirantes fugidos da seca e da miséria. O próprio poeta reflete sobre esses contrates
sociais no pensar a direção que toma enquanto escritor de uma poesia social:
É interessante perceber que mesmo sendo membro da elite agrária, João Cabral
assume uma postura crítica diante dos problemas sociais que afetavam seu meio, diferente
de outros intelectuais7 que frente às mudanças nas formas tradicionais da economia
brasileira evocaram um tempo e um espaço perdido. Acompanhando as transformações em
curso no país e seu impacto na produção literária, que se revestiu de um caráter de
denuncia social, assumiu na sua arte uma forma de expressar seu engajamento social.
Alfredo Bosi ao se referir ao poema Morte e Vida Severina assim o caracteriza:
O seu poema longo mais equilibrado entre rigor formal e temática participativa,
conta o roteiro de um Severino, um homem do Agreste que vai em demanda do
litoral e topa em cada parada com a morte, presença anônima e coletiva, até que
no último pouso lhe chega a nova do nascimento de um menino, signo de que
algo resiste á constante negação da existência ( 1994, p.471)
6
MELO NETO, João Cabral de. Resposta ao poeta Sebastião Uchoa Leite. Nº 3. Rio de Janeiro: 34 Letras,
Mar. 1989.
7
Alguns escritores regionalistas como José Lins do Rego e próprio sociólogo Gilberto Freyre, enquanto
descendentes de família patriarcal, trouxeram em seus escritos uma caráter saudosista e de defesa dos valores
tradicionais que vinham sendo questionados.
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Ao tomar esse poema como uma leitura do migrante esse excerto já demonstra a
metáfora que é proposta pelo autor. Uma vez que, diante da impossibilidade de se
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8
Para uma melhor compreensão das práticas xenofóbicas, de racismo e preconceito ao imigrante na
contemporaneidade ver ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. Xenofobia: medo e rejeição ao
estrangeiro. São Paulo: Cortez, 2016. Nessa obra publicada em 2016 Durval Muniz aprofunda o debate
sobre a xenofobia, como instrumento de motivação psicológica na luta pelo poder, entre pessoas, grupos e
nações, assumindo um sentido para além da aversão ao estrangeiro ou ao incomum.
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como a grande empregadora daquela região. A mulher logo se apresenta com ―rezadora
titular que vive a morte ajudar‖ (MELO NETO, 2000, p 57).
Outro aspecto relevante apresentado no texto, para além das condições climáticas é
o fenômeno da concentração fundiária que empurrou muitos indivíduos para as periferias
das grandes cidades. Ao longo de sua travessia o primeiro encontro do retirante é com dois
homens denominados os ―irmãos da alma‖ que carregam em uma rede um pequeno
proprietário, Severino lavrador, vítima de uma emboscada do grande latifundiário por
disputas de terras. Ao questionar sobre a punição do assassino a resposta é reveladora da
realidade que cerca aquele meio: ―mais campo tem para soltar/ irmãos da alma/ tem mais
onde fazer voar/ as filhas-bala‖ (MELO NETO, 2000, p 49), ou seja, não haveria punição
ao contrario o assassino se beneficiaria com mais terra. O que é interessante inferir do
diálogo é que os interlocutores parecem não se indignar com a injustiça, o que indica ser
uma situação contra a qual não se podia lutar. A travessia de Severino é motivada por uma
busca de melhores dias, mas por onde ele passa só se depara com os rastros da morte. Isso
faz com que ele apresse sua viajem, uma vez que em cada lugar que passa suas esperanças
vão sendo minadas:
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muitos migrantes anônimos, que até hoje chegam a cidades ou países e se deparam com
uma realidade totalmente inversa ao que buscavam, e diante da falta de oportunidades vão
compor os índices de desempregados e excluídos socialmente.
Nosso personagem central encontra um centro urbano despreparado para recebê-lo
deixando-o a mercê das mesmas privações da quais vinha fugindo. Essa situação de
exclusão é evidenciada por João Cabral de Melo Neto em uma conversa que Severino
escuta ao chegar ao Recife entre dois coveiros que fala das distintas alas do cemitério,
sintetizando na hierarquização do cemitério um reflexo da sociedade: avenida do centro
onde se enterram os ricos (banqueiros, usineiros e políticos), alas dos funcionários
(contratados, mensalistas, profissionais liberais) e as dos operários e indigentes
(ferroviários, rodoviários, indigentes e pobres vários) logo a ala dos retirantes que segundo
os coveiros migravam seguindo o próprio enterro:
A conclusão que João Cabral nos remete nesse poema é do sonho ilusório que em
muitos casos caracterizam os processos migratórios, no entanto, ao concluir seu enredo
com o nascimento de uma criança, filho do Seu José mestre Carpina, trás uma
representatividade da fé na vida, no veio de esperança que impulsionou e impulsiona o ir e
vir dos muitos sujeitos anônimos.
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A criança mesmo trazendo os traços físicos de mais uma vida Severina: magra,
pálida e franzina é a representação de que o que move o migrante é a vida, é o símbolo da
resistência que caracteriza os passos dos muitos indivíduos que cruzam diferentes
caminhos ao longo da nossa história.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A migração é um fenômeno que vem ganhando espaço nos debates atuais, uma vez
que é algo presente na realidade histórico-mundial10 e que muito tem impactado na
configuração dos espaços e nas relações humanas. João Cabral de Melo Neto ao abordar
em seu poema os dramas dos retirantes nordestinos, provavelmente não imaginava os
contornos que as migrações assumiram ao ponto de chegar a ser um assunto central nas
relações entre países. O autor escreve sobre um Nordeste em plena mutação e cria uma
concepção crítica sobre o que acontece com o seu povo por intermédio da poesia, porém
essa não é apenas história de um Severino, mas de todos que viveram aquela situação de
flagelo e que fizeram parte de uma realidade histórica ocorrida na região nordeste seja em
decorrência das secas ou de outros fatores de cunho social, político e econômico. Uma
realidade que não é parte de um passado apagado, mas algo bem atual nos descolamentos
de pessoas de um espaço a outro.
Na atualidade questões como fatores climáticos, concentração de riquezas,
desigualdades sociais, marginalização, fome e pobreza continuam a ser motivações para as
práticas migratórias fazendo da poesia Cabralina um importante meio de analise das
origens e desdobramentos do migrar em seu lado perverso de desenraizamento. Percorrer
escritos como Morte e Vida Severina é fazer emergir uma visão mais aberta que considere
as nuances desse fenômeno. Assim sendo as discussões que envolvem essa temática podem
10
Para uma visão mais ampla dos processos migratórios em um contexto global ver: BAUMAN, Zygmunt.
Estranhos à nossa porta. Rio de Janeiro. Zahar, 2017. Em seu último livro o sociólogo analisa as origens,
os contornos e os impactos de uma chamada ―crise migratória‖ evidenciando o pavor provocado pela as
migrações e a política de desumanização dos sujeitos envolvidos nesse processo, refletidas em atitudes de
ódio e diferentes reações polìticas por parte dos paìses ― invadidos‖. O autor destaca dentre muitas outras
questões, que mais do que uma crise migratória vivemos uma crise humanitária e propõe ao longo da obra
soluções como cooperação e solidariedade entre os povos, se configurando como um importante texto para se
refletir sobre os dilemas que caracterizam os processos migratórios na atualidade.
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Tese (Doutorado em Educação). UFPB, João Pessoa, 2013.
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RESUMO
Com a consolidação do campo de estudos da História Cultural, tornou-se possível explorar
a literatura de cordel como fonte histórica, principalmente, para o estudo da cultura
popular. Portanto, visamos compreender quais elementos representativos do cangaço,
contidos nos textos de dois cordelistas, José Bernardo da Silva e João Martins de Athayde,
relacionam-se ou contribuem para a construção de uma identidade nordestina. Os cordéis
destes autores retratam momentos específicos da história de Lampião, a saber, sua
passagem por Juazeiro do Norte, em 1926, sendo tais cordéis contemporâneos aos fatos
retratados. As análises iniciais têm sido férteis, por nos permitir investigar tanto alguns
elementos constitutivos da cultura nordestina, quanto os modos pelos quais Lampião foi
representado em seu tempo presente. Palavras-chave: Literatura de
cordel; Cangaço; Lampião.
INTRODUÇÃO
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Portanto, diante da fala da autora podemos perceber que o folheto tinha o papel de
informar e que o acesso a ele era feito graças aos ambulantes que viajavam em busca de
vender- lós. Vale ressaltar também o fato de o folheto ser declamado, lido e improvisado.
Vale esclarecer que até a década de 20 ainda se tratava de uma produção eminentemente
oral, ou seja, era feita as cantorias.
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Ela defende que os historiadores devem se valer deste tipo de fonte, por ela ser
rica em representar como eram as sociedades, seus modos de viver, suas crenças, costumes
e, apesar de ela apresentar histórias ficcionais, nelas são impressas marcas da época em que
foi escrita. Segundo ela:
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LAMPIÃO NO CORDEL
Tendo em vista a ideia de lugar social defendida por Certeau, o qual afirma que o
lugar do autor influencia diretamente na sua escrita, o paraibano João Martins de Athayde
que, no entanto, se consagra como cordelista longe de seu Estado, sendo este em Recife, e
o alagoano Jose Bernardo da Silva em Juazeiro do Norte, são acima de tudo nordestinos,
portanto possuem familiaridade com o tema estudado. Considerando também a
popularidade dos folhetos, a diversidade de temas abordados, e o seu papel diante da
sociedade do inicio do século XX, fazemos o seguinte questionamento: De que maneira
lampião é apresentado aos leitores e ouvintes em folhetos a sociedade das primeiras
décadas do século XX?
A frente da cabroeira
Vinha o celebre Lampião
De barbicacho passado
E parabelum na mão
Trazia quatro bornaia
Repleta de munição
Trazia calça culote
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O autor descreve alguns elementos que compõem a figura de lampião como, por
exemplo, suas vestimentas, o barbicacho se referindo à tira de couro que passa pelo queixo
e prende o chapéu a cabeça, certamente utilizado para evitar que o chapéu caia com o
vento, galhos etc. também a bornaia que era utilizada para guardar a munição feita de
couro ou tecido e a perneira que proporcionava a proteção das pernas. Esses elementos
caracterizam a imagem que mais tarde será reproduzida pelo folclore, mídia se inserindo na
representatividade da identidade nordestina e sua cultura.
Nos versos do folheto que descreve a chegada de Lampião em Juazeiro do Norte, o
autor José Martins de Athayde conta como Lampião entrou na cidade de juazeiro
acompanhado de cinquenta cangaceiros e como ofereceu seus serviços à legalidade contra
os revoltosos, citado pela autora Rosilene Alves de Melo (2010, p. 29). Athayde descreve o
cangaceiro com os adjetivos, ―leal e companheiro‖ e fala da admiração do povo de
Juazeiro para com lampião:
Causou admiração
Ao povo de juazeiro
Quando Lampião entrou
Mansinho como um cordeiro
Com toda sua regência
Que lhe rende obediência
Por ser leal e companheiro.
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Diante da fala do autor podemos refletir de que maneira a poesia contribuiu para
tecer a dualidade da imagem de herói e bandido dos cangaceiros, pois alem de contar seus
feitos de crueldade e banditismo, também retrata sua valentia, imponência, generosidade e
os supostos motivos que os levaram para a vida do crime.
CONCLUSÃO
Foi possível perceber que Lampião estar representado de diferentes formas, pois,
hora descrito como bandido assassino hora como valente e causador de admiração nas
pessoas, generoso, e celebre. Percebemos que os cordéis das primeiras décadas do século
XX já retratam a ambiguidade de sua figura, pois, o mesmo folheto pode apresentar o bem
e o mal do nosso personagem, como por exemplo, no cordel anteriormente mencionado
Lampião em Villa Bella, em que nosso personagem é apresentado com o termo bandido
desgraçado e ao mesmo tempo fala de seu bom coração. Neste artigo também houve a
possibilidade de analise com relação o cordel foi utilizado pelo próprio lampião para falar
de mesmo.
Portanto, diante da questão que se faz presente neste artigo que consiste em
procurar perceber a imagem de lampião no cordel e os elementos do cangaço que fazem
parte da cultura do Nordeste. Podemos concluir que o cordel foi um veiculo importante
pelo qual foi possível divulgar a imagem de lampião e seu bando, com riquezas de
detalhes, numa linguagem compreensível. E que a cultura nordestina sob o ponto de vista
de representar o nordestino se valeu de características atribuídas aos cangaceiros, ou seja,
seu valor moral de valentia e honra como também de seus elementos estéticos.
BIBLIOGRAFIA
ABREU, Márcia Azevedo de. Histórias de cordéis e folhetos. Campinas: Mercado das
Letras. 1999.
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INTRODUÇÃO
PÓSCOLONIALISMO E LITERATURA
Said (2003) observa que 84,5% do planeta terra foi colonizado por impérios
europeus. Diante disso, observa-se uma cadeia quase que interminável de relações
internacionais que moldaram a literatura ocidental. Os autores do período do império
romano, por exemplo, olhavam para a literatura grega como padrão a ser seguido, e como
boa parte do mundo foi, posteriormente, colonizada pelos romanos, foi neles que os
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Estes procedimentos ideológicos não foram aplicados apenas para que se ocultasse
tanto a presença de nativos quanto a consequente ilegalidade do domínio colonial. Eles
foram utilizados com nova roupagem, para se minimizar a presença do controle
imperialista sobre a colônia, bem como o processo de exploração das riquezas nativas e a
―dependência‖ europeia de terras coloniais, bem como a utilização do trabalho escravo - ou
semi-escravo, conforme ocorreu no período imediato à abolição da escravatura, questão
que pode ser inferida na peça em apreço.
Portanto, pode-se constatar que o que aparece e como aparece no texto literário
neste contexto das relações coloniais, revela o uso sistemático de padrões ideológicos que
tanto serviam para mascarar questões morais no que se refere aos horrores do processo
colonizador, como também para minimizar a importância de determinados elementos
―necessários‖, porém incômodos para os colonizadores, a exemplo dos escravos e seus
descentes. Diz ―necessários‖ porque o foram para a formação ou manutenção do status
social elevado de muitos, porém ―incômodos‖, em virtude das discussões levantadas por
setores das sociedades colonizadoras acerca das atrocidades impostas pelos colonizadores
a tais figuras.
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(erguendo-se). Não, irmã, não, irmã – você seja a dama desta vez e eu serei a negrinha‖
(WILLIAMS, 1949, p. 4; todas as traduções desta peça são de nossa autoria, visto que não
há traduções oficiais dela para a Língua Portuguesa).
Césaire (1978) revela que fazia parte da mentalidade colonialista fabricar, via
divisão de raças e classes, grupos específicos para a classe trabalhadora, como os negros e
determinados grupos étnicos, tais como chineses. Nesse sentido, é possível perceber no
texto de Williams esta questão. Merece destaque o fato de que o espaço em que o enredo
se desenrola é o Sul dos Estados Unidos, lugar que representa o hibridismo característico
daquele país, sobretudo pela mistura predominante de ingleses, franceses e afro-
descendentes, por exemplo, em virtude da presença elevada de escravos que para ali foram
levados, devido à natureza propícia para a agricultura daquela região, diferente dos frios
estados do norte.
A citação acima ilustra este hibridismo cultural que ainda predomina(va) naquela
nação, embora a figura da serviçal negra aludida seja trazida à lume via silenciamento,
sobretudo porque afro-descendentes nesta obra aparecem apenas como fantasmas de um
passado visto como glorioso para Amanda. Eles são fantasmas por serem tratados com
insensível invisibilidade e também por assombrarem o presente de total decadência
financeira da matriarca. A citação também ilustra o fato de que a figura da mulher negra é
trazida à memória pela lembrança da classe social a qual fazia parte, ou seja, a de serviçal,
subalternizada pelo poder branco hegemônico que a cercava e lhe determinava a esfera de
atuação, castrando-lhe outras possibilidades no sentido profissional, financeiro e social,
devido ao preconceito racial. Isto ilustra a quase impossibilidade, naquele ponto da
história, para alguém em tal condição social, ascender socialmente.
A citação a seguir mostra outra questão, o uso de um linguajar depreciativo para se
fazer referência aos afro-americanos:
AMANDA: Um domingo à tarde in Blue Mountain – sua mãe recebeu – dezessete!
– pretendentes! Bem, às vezes não havia cadeiras suficientes para acomodá-los.
Nós tínhamos que mandar um nego trazer cadeiras da capela (WILLIAMS, 1949,
p. 5; grifo nosso).
No original em inglês ela diz ―nigger‖, isto é, ―nego‖, palavra que expressa um
sentido pejorativo que a tradução para a língua portuguesa não permite expressar
plenamente.
É importante considerar que o enredo da peça se passa cerca de 10 anos antes da
ação dramática, ou seja, na década de 1930, período da Grande Depressão Americana,
todavia, Amanda, criada no contexto imediato à abolição da escravatura, não se
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desvencilhou de hábitos escravagistas que ainda ressoavam àquela altura de sua vida na
sua prática discursiva:
AMANDA: No Sul nós tínhamos tantos serviçais. Passou, passou, passou. Tudo
vestígios de uma vida graciosa. Passou completamente! Eu não estava preparada
para o que o futuro me trouxe. Todos os meus pretendentes eram filhos de
fazendeiros e então, claro, eu imaginava que me casaria com um e constituiria
minha família em um grande pedaço de terra cheio de serviçais (WILLIAMS,
1949, p. 26).
Observa-se aqui que o discurso saudosista de Amanda é marcado pela experiência
da falta, da perda de um passado irrecuperável, no qual a figura do afro-americano lhe era
fundamental pelo papel que desempenhava no universo das relações de raça e classe. Isto
mostra os desdobramentos do processo colonizador empreendido contra a figura do negro
– fica implícito que esses serviçais são afro-americanos quando se considera seu discurso
como um todo acerca de empregados domésticos - dentro da metrópole imperialista
americana, os quais para ali foram trazidos como animais de carga para realizar o trabalho
pesado, notadamente na área da agricultura.
Merece destaque o fato de que o texto de Williams foi escrito quase cem anos após
a ―libertação‖ dos escravos nos Estados Unidos, mas ainda revela o quanto aquele processo
de ―libertação‖ continuava sendo visto como um gesto que, pode-se dizer, continuava
sendo, de certo modo, ―simbólico‖, sobretudo porque aqueles indivìduos permaneceram
escravos de uma construção ideológica que os aprisionou na própria cor e em uma
condição social, em contraste com uma minoria branca que continuava a dominá-los pelo
poder do discurso racista e da manutenção deles na condição de subalternos, isto é, na
classe trabalhadora, sem perspectivas favoráveis de mudanças, naquele ponto da história,
em relação ao Sonho Americano que desde a colonização americana foi propagado como
sendo ―para todos‖ que ali chegassem.
Observa-se que essas figuras remanescentes da escravidão são apresentadas na obra
como serem invisíveis que rondavam de maneira serviçal e silenciosa as famílias brancas
que precisam deles para se verem como superiores. A nostalgia imperialista de Amanda
reforça a inexistência desses indivíduos enquanto personagens da obra, uma vez que são
retratados sem existência própria nem voz ativa, de modo que eles são apenas construídos
e significados pelo olhar e mentalidade do branco americano, acostumados a dominá-los e,
por eles, serem servidos.
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A língua francesa e as influências daquela cultura europeia são por demais vistas na
literatura americana, notadamente pelo fato histórico da presença de imigrantes franceses
no sul dos Estados Unidos, região onde nasceu e sobre a qual escreveu Tennessee
Williams. Uma das características da poética do autor é exatamente o uso daquele idioma.
Por esta razão, um personagem recorrente nas obras de Williams é a Southern Belle [A
Bela do Sul], aqui ilustrada por Amanda, um termo que designa um personagem histórico,
típico da região sul: uma moça americana, branca, bonita e rica, geralmente filha de
fazendeiros locais, com a qual jovens ricos desejavam casar-se. Ela é um símbolo do Sul,
de sua riqueza e prosperidade material. Seu nome é em francês exatamente porque aquele
idioma e cultura francesa se fixaram no imaginário local e nacional como sinônimo de
refinamento, beleza, erudição, ou seja, de tudo o que é visto como elevado acima da média
e merece ser imitado.
Entretanto, esta representação e compreensão acerca da Southern Belle mudou com
os desdobramentos da Guerra Civil Americana (1861-65), especialmente porque o Sul foi
devastado por aquele conflito bélico em seu território, vindo a ser durante muitas décadas
ainda, o oposto do que havia sido por séculos, isto é, um lugar de riqueza, beleza e
progresso. Sendo a Southern Belle um símbolo da região, tanto aquele ambiente como seu
símbolo passaram a ser vistos pelo consciente coletivo e representados na literatura
americana de forma oposta após a Guerra Civil, ambos passando a representar degradação,
pobreza, envelhecimento, a exemplo da protagonista que dá nome ao conto ―A rose for
Emily‖ (1930), de William Faulkner e Scarlet O‘Hara em E o vento levou (1939), de
Margareth Mitchel, obra citada em The glass managerie. Na verdade, o próprio título da
peça contém uma palavra em francês. Desta vez, o uso de tal idioma tem por finalidade
retratar a delicadeza e a fragilidade feminina, num sentido positivo, tanto dos objetos de
vidro colecionados pela irmã do protagonista, Laura, quanto ela mesma, débil física,
mental e emocionalmente.
Dessa forma, pode-se perceber que o amplo uso deste idioma que é visto na peça
em apreço resgata e mantém um passado valorizado pelos americanos que incorporaram
aquela cultura estrangeira à sua, vendo-a, de certo modo, como superior a sua, porém
tratando-a em pé de igualdade com sua própria cultura em formação, assimilando-a e
tornando-a parte da identidade local, um comportamento ambíguo que oscila entre uma
baixa auto-estima e um complexo de superioridade/inferioridade de uma ex-colônia em
busca de auto-afirmação. Apesar do hibridismo característico da região, esta estratégia de
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The glass menagerie destaca utopias de colonização que foram fabricadas para
moldar o que viria a ser os Estados Unidos e destaca a grandeza nacional através dos feitos
de alguns dos seus mais ilustres cidadãos, Benjamim Franklin e Thomas Edison, ambos
inventores que mudaram o mundo com suas descobertas cientìficas: ―AMANDA:
Eletricidade não é uma coisa misteriosa? Não foi Benjamim Franklin que amarrou uma
chave a uma pipa? [...] O Sr. Edison fez a lâmpada Mazda‖ (WILLIAMS, 1949, p. 27).
Esta citação ressalta o desejo de afirmação e poder, bem como a contribuição daquele país
para a ciência mundial, o que o insere no panteão desejado de conquistas científicas no
mesmo nível daquelas tão comumente realizadas no Velho Mundo.
Sendo liberdade, igualdade e oportunidade “para todos”, o lema do propagado
Sonho Americano por ocasião da formação daquela nação, tais características se fixaram
no imaginário universal e nacional, de modo que, como mostra a peça em tela, o homem
americano continua, desde a colonização, sendo visto como empreendedor, capaz de
trabalhar arduamente para atingir o sucesso financeiro, conforme está ressaltado na peça.
Ao se referir a um antigo conhecido do Sul, Amanda observa: ―Aquele garoto Fitzhugh foi
para o Norte e fez uma fortuna – veio a ser conhecido como o Lobo de Wall Street! Ele
tinha o toque de Midas, tudo que ele tocava virava ouro‖ (WILLIAMS, 1949, p. 5). Este é
um típico homem americano, exaltado em suas conquistas financeiras e capacidade de
progredir financeiramente. Um homem digno de imitação.
Sendo a personagem que encarna e mais propaga os ideais do Sonho Americano,
incutindo-o nos filhos, Amanda impõe a filha Laura estudar numa escola técnica em busca
de ascensão financeira, já que agora ela mal consegue sobreviver com a família, somando-
se ao estresse de ter Tom sempre ameaçando abandoná-las, como seu pai o fizera anos
antes da ação dramática. Ironicamente, aquele Sonho foi perdido por Amanda após o
casamento desastroso com um homem pobre que a abandonou com dois filhos. Entretanto,
a matriarca estimula ambos a irem adiante e não se tornarem pessoas dependentes como
ela, que, enquanto jovem rica, não se preparou para o futuro qualificando-se
profissionalmente, uma vez que depositou suas expectativas apenas em um ―bom‖
casamento. Assim, na busca por um pretendente para Laura, a obra destaca que Jim é o
típico descendente de imigrante (irlandês) em busca de progresso:
TOM: Ele estuda em uma escola noturna. AMANDA (brilhando). Esplêndido! O
que ele faz, quer dizer, estuda? TOM: Engenharia de Rádio e Oratória!
AMANDA: Então ele tem planos de progredir neste mundo. [...] Ambos os fatos
são iluminadores. Estas são o tipo de coisa que uma mãe deve saber em relação a
qualquer jovem pretendente de sua filha (WILLIAMS, 1949, p. 19).
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme pode ser observado, The glass menagerie revela aspectos de uma
sociedade que surge como periférica, derivando suas noções sobre as relações entre o ―eu‖
e o ―outro‖ em termos do que é valioso e viável, com referências que ainda permanecem
―externas‖, isto é, internacionais, no século XX, no caso, aquelas culturas consideras
dignas de imitação, na busca pela afirmação e manutenção da própria identidade que não
se aceita devidamente enquanto múltipla, isto é, como formada por raças diversas. Aqui, a
―diglossia‖ só é reconhecida e validada se for efetivada entre correspondentes europeus
como línguas de contato (o inglês e o francês). Isto ressalta rasuras de uma zona de contato
cultural caracterizada por uma visão de ―contato‖ divergente no que diz respeito aos
subalternos (no caso, os negros), significando, nesse sentido, ―eu mando e você obedece‖
de forma silenciosa, subserviente e invisível.
REFERÊNCIAS
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CÉSAIRE, Aimé. Discurso sobre o colonialismo. Trad. de Noêmia de Sousa. Lisboa: Sá da Costa,
1978.
DIAS, Daise Lilian Fonseca. A subversão das relações coloniais em O morro dos ventos
uivantes: questões de gênero. Campina Grande: EDUFCG, 2015.
FANON, Franz. Pele negra, máscaras brancas. Trad. de Maria Adriana da Silva Caldas. Rio de
Janeiro: Fator, 1983.
FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. Trad. de Laura Fraga de Almeida Sampaio. São
Paulo: Edições Loyola, 2009.
SAID, Edward W. Orientalism. 25th anniversary edition.New York: Vintage Books, 2003.
WILLIAMS, Tennessee. The glass managerie. New York: A Signet Book, 1949.
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RESUMO
É comum se ouvir falar em inclusão, sobretudo nas escolas. Isto se deve por causa de uma
série de políticas públicas que promoveram o acesso à escola e, em muitos casos até a
educação para pessoas com deficiência, adaptando-se ao seu mundo. Assim, não é estranho
se observar alunos com cegueira, surdez, paralisia, dentre outras pelos corredores das
escolas brasileiras. Entretanto, cabe-nos refletir, o que um professor, especialmente, o de
História, pode fazer para melhorar e desenvolver seu aluno? O presente estudo visa
dialogar sobre isso, com profissionais já atuantes na área e, sobretudo com os futuros
docentes a fim de construir um espaço mais inclusivo em nossas salas de aula. Para tanto
objetivamos, neste texto, traçar um caminho que converse sobre as práticas pedagógicas, o
ensino de história e a convivência com o aluno com deficiência.
Palavras-chave: Ensino de História; Inclusão; Práticas Educativas.
INTRODUÇÃO
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Disponível em: <https://www.significados.com.br/educar/>. Acesso em 28 set 2017.
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Com isso, é sabido dizer que a escola, quando inclusiva, abrange a todos os seus
setores, como garantia do direito de ir e vir de quaisquer cidadãos.
O fato é que historicamente a pessoa com deficiência vem sendo tratada como
alguma coisa na sociedade e a ela era imputada uma condição de ―coitadinha‖, de ―pena‖,
quando não visto como caso de tratamento médico.
A grande logística da educação inclusiva é promover uma sociedade inclusiva.
Partindo do pressuposto que tudo inicia na escola, esta é a primeira a receber a
incumbência de promover a socialização desses indivíduos e, para isto recebe subsídios
para adequar as suas estruturas, capacitar os profissionais envolvidos no processo, entre
outros.
Incluir, significa ―por dentro de‖, ―juntar(-se)‖, ―inserir(-se)‖. No campo da
educação, incluir é promover ações que garantam a igualdade de direitos, ao tempo que
estimular as habilidades de um aluno com quaisquer deficiências, a fim de garantir a sua
autonomia em atividades cotidianas.
Quando falamos em deficiência, nos referimos, geralmente a ausência de algo. Por
isso que, ao tratar de uma pessoa que ―não seja normal‖ 12, o correto é se chamar pessoa
com deficiência, pois para ela, a ausência de alguma habilidade – quer seja visual,
auditiva, intelectual, etc. – não a torna diferente de nós, anormal, uma ―aberração‖, como
se sustentou por anos, quando estudos com esses indivíduos não eram estimulados.
O processo de inclusão é marcado por ações que visem promover a autonomia,
como bem já dissemos, do indivíduo frente às ações cotidianas. Embora isto soe como uma
―limitação‖ do ensino à pessoa com deficiência, o ato de se afirmar que a escolarização
desses indivíduos objetivem a sua autonomia implica na vastidão desse universo, mas não
impede que um cego, um surdo, um deficiente físico, por exemplo, galguem voos maiores,
mas que, para que o processo de ensino e aprendizagem aconteça, se faz necessário adotar
ações que primem por esse objetivo.
É preciso conhecer a realidade de cada aluno para que as metodologias aplicadas
surtam o efeito desejado, visto que para cada deficiência existem tecnologias e
metodologias específicas que auxiliam o professor em um dado conteúdo.
12
O termo entre aspas refere-se a uma forma não usual de tratar as pessoas: como ―normais‖, para sem
deficiência e ―anormais‖ ou por meio de algum estereótipo para àquelas que possuem quaisquer deficiências.
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Por outro lado se faz necessário que o professor compreenda o seu papel enquanto
agente promotor de uma aprendizagem e busque soluções para os seus alunos, promovendo
a ação integrada de alunos, o diálogo com outros profissionais da turma e do Atendimento
Educacional Especializado (AEE).
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O ser cidadão, como já bem discutido nas linhas deste estudo, além de objetivo da
disciplina História segundo os documentos oficiais da educação brasileira, é bem enfocado
a partir das lutas sociais e construção da ideia de nação/povo brasileiro em face aos
processos que marcaram revoltas, transformações políticas e sociais de cada época vivida
em nosso país e no mundo.
Espera-se, portanto, que ao entrar em contato com esses processos, os alunos
possam se envolver, e até mesmo se identificar com alguns deles, levantando
questionamentos sobre algumas características da época, naquela tentativa de reafirmar que
o hoje é diferente, mas também pode ser semelhante.
Com isso, percebe-se que o aluno cria seu primeiro laço de identidade através da
história: a noção do certo e errado como extensão de um processo histórico. Exemplo disso
é discutir a questão das igualdades, racismo (como ato preconceituoso e criminoso), entre
outros temas. A própria presença do aluno com deficiência é um caso de direitos
adquiridos ao longo do tempo e que pode ser explorado pelo professor.
A escola, para Mantoan (2006), não é apenas um ambiente sob o qual todos tendem
a passar para aprender algo, mas devemos compreender o papel da escola na formação do
cidadão, tornando-o um membro efetivo da sociedade, seguindo a finalidade natural que é
―[...] educar para a liberdade, para a expressão máxima da capacidade de cada um e para a
cooperação e o entendimento entre as pessoas.‖ (MANTOAN, 2006, p.185).
Sob nossa ótica, somar ao convívio escolar crianças com características diferentes
permite aos alunos perceberem o mundo diversificado que eles vivem e entender essa
diversidade existente no globo, trabalhando de forma mais eficaz, conceitos como
cidadania, democracia, igualdade, de modo a derrubar barreiras construídas por séculos de
história excludente e compreendendo a variedade ético-racial, linguística distribuída por
toda a sociedade, ao mesmo tempo entendendo que, mesmo com diferenças, cada um é
capaz de ser independente.
Compreendemos também que a escola não pode, e nem deve ser constituída apenas
dos personagens que atuam diretamente no cenário escolar. Esta é a construção de vários
personagens e, para isto, necessita da atuação de todos para que a educação aconteça de
forma efetiva.
O processo de inclusão é marcado por ações que visem, como dissemos
anteriormente, promover a autonomia do indivíduo frente às ações cotidianas e no que se
refere ao papel do professor de História, este tem função primordial de conduzir tal aluno a
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De modo que ter um aluno com deficiência em sala de aula não é tarefa fácil, nem
por isso impossível, mas ainda causa estranheza por parte de muitos profissionais que, por
vezes, se julgam inaptos a trabalhar, mas que, por um razão ou outra, aceitam a turma, mas
não buscam interagir com outros professores da turma e do AEE.
Mas, como bem afirmamos anteriormente, nem a educação, nem a inclusão são
processos individualistas, ambos necessitam de uma atuação conjunta. E tal afirmação nos
indica a resposta para um questionamento: como trabalhar com um aluno que tenha
quaisquer tipos de deficiência?
Segundo Bedaque (2015):
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Dentro do ensino da História, dos seus vastos temas, o professor pode, utilizando a
sua criatividade, somando a um diálogo prévio com o docente do AEE e algumas outras
tecnologias, oportunizar um aprendizado ao aluno com um tipo específico de deficiência.
Ao ensinar, por exemplo, numa turma de 7º ano do ensino fundamental, Expansão
Marítima, um professor de História geralmente busca se apegar aos mapas para
exemplificar as rotas marítimas, a importância do desbravamento de outros caminhos para
o Oriente, ou seja, utiliza-se de um instrumento além do convencional quadro e pincel (ou
giz) para ilustrar, na aula, o interesse dos europeus à época das grandes navegações.
Imaginando, nesta mesma sala de aula um aluno com deficiência visual, como
poderia o professor se utilizar do mesmo método? Uma solução imediata para isto seria
ver, junto com o professor do AEE, um mapa em alto relevo, ou, confeccionar um,
utilizando um mapa impresso e suas divisas – e no caso, também as rotas – com cola ou
outro material que faça o alto relevo.
Outra solução é utilizar uma das várias tecnologias assistivas 13 que podem auxiliar
o trabalho do professor. Uma delas foi desenvolvida pelo Instituto de Geociências e
Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista (UNESP) para as aulas de geografia. O
aplicativo MAPAVOX, segundo o site da universidade:
13
Sobre uma definição de Tecnologia Assistiva, Gonçalves e Furtado (2015) entendem que: ―A Tecnologia
Assistiva é uma área do conhecimento de característica interdisciplinar que tem por objetivo proporcionar à
pessoa com deficiência mais independência, qualidade de vida e inclusão social [...].‖ (GONÇALVES E
FURTADO, 2015, p.47).
14
Disponível em <http://www.rc.unesp.br/igce/ceapla/cartografiatatil/cartografia.php>. Acesso em 02 out
2017
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Embora o aplicativo seja voltado para aulas de Geografia, uma adaptação a este
sistema para atender a uma necessidade da disciplina de História é uma solução provável.
Sabemos, logicamente, que para cada tipo de deficiência são exigidas metodologias
e práticas – e até mesmo uso de recursos tecnológicos – diferentes, mas não nos cabe aqui
analisar cada tipo de tecnologia assistiva para cada tipo de deficiência.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A escola tem que ser esse lugar em que as crianças tem a oportunidade
de ser elas mesmas e onde as diferenças não sejam escondidas, mas
destacadas.
Mantoan
Todo processo de inclusão inicia com a própria inclusão dos docentes no universo
das pessoas com deficiência. O lidar com as diferenças é um grande desafio para quaisquer
pessoas.
O fato é que, muitas vezes, o diferente nos causa estranheza, porém não nos pode
causar o sentimento de pena e piedade. A nova geração de alunos já aprenderam a lidar
com essa diferença, cabe-nos, agora aprender a trabalhar com o diferente, ao tempo que
trabalhá-lo no coletivo.
As ações na sala de aula, devem ser promovidas para a inclusão, caso contrário,
cometeremos o pecado de apenas inserirmos esses indivíduos, não lhes proporcionando a
experiência do trabalho em grupo, das ações coletivas e, sobretudo, do aprendizado.
Um exemplo bem simples disso é quando um docente – independente do
componente curricular – agenda um trabalho em equipe. Geralmente, ao aluno com
deficiência sempre é negligenciado esse tipo de atividade, pois, na vil mentalidade do
professor esse, pelo simples fato de ser ―especial‖, já está aprovado. E não é assim que tem
que acontecer. Onde está o processo de aprendizado desse aluno? Onde fica a troca de
experiências, o momento da descoberta, do aprender algo novo?
Um professor não pode negligenciar o potencial de um aluno com deficiência.
Simplesmente não deve deixar passar despercebido um aluno com quaisquer tipos de
deficiência. E nem tampouco deve esquecer de seu papel como professor.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
REFERÊNCIAS
JESUS, Denyse Meyrelles de; EFFGEN, Ariadna Pereira Siqueira. Formação Docente e
Práticas Pedagógicas: conexões, possibilidades e tensões. In: MIRANDA, Theresinha
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
KARNAL, Leandro. Conversas com um jovem professor. São Paulo: Contexto, 2016.
MANTOAN, Maria Teresa Égler (org.). O desafio das diferenças nas escolas. 4ªed.
Petrópolis: Vozes, 2011.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
RESUMO
Buscamos apresentar possibilidades do ensino de História a partir do patrimônio cultural
através de vivências e reflexões realizadas no ano de 2016 com alunos do 9º ano, em
Crato-CE, com os quais trabalhamos a ―história local‖ sendo o elemento gerador, o
Caldeirão da Santa Cruz do Deserto, que faz parte do patrimônio tangível. Dialogamos
com os conceitos de memória, silenciamento e patrimônio Cultural tendo Fonseca (2003)
como referencial, para quem o patrimônio ultrapassa a materialidade. As discussões que
embasaram as práticas de ensino foram fomentadas pelo PIBID e
PROFHISTÓRIA/URCA, programas dos quais fazemos parte. Como resultados temos a
indicar uma aprendizagem significativa e avaliação processual o que constitui a
socialização dessa experiência parte importante do processo de ensino-aprendizagem.
Palavras-chave: Memória; Silenciamento; Patrimônio Cultural; Caldeirão da Santa Cruz
do Deserto.
INTRODUÇÃO/REFLEXÃO
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
13 e 14 anos, advindos tanto da zona rural como da zona urbana. A escola se localiza em
um bairro próximo ao centro da cidade do Crato e atende a um público composto por
adolescentes filhos da classe trabalhadora. Situando melhor a turma, podemos dizer que se
trata de um público bem diversificado, sendo parte deles vindos de pequenas escolas
particulares, e a maioria vinda de escolas públicas. Há alunos com um maior nível de
maturidade intelectual e exercício de leitura, enquanto outros apresentam acentuados
problemas de disciplina intelectual e comportamental.
Entretanto, apesar dos problemas citados, a turma em nenhum momento apresentou
objeções à presença dos bolsistas graduandos da Universidade Regional do Cariri –
URCA, nem às propostas de atividades fora do espaço escolar, o que foi para nós um
aspecto positivo, pois há escolas, ou mesmo turmas, que entendem atividades que fujam do
livro didático, da resolução de atividades ou das ações convencionais desenvolvidas no
espaço da sala, como aula. Atividades extraescolares são consideradas como algo externo
ao currículo ou mesmo como passeio, por exemplo, mas não consideram estas como
práticas de aprendizagem.
Desde o primeiro contato, os estudantes aceitaram e foram colaboradores, porém a
maneira deles, pois não devemos compreender a aceitação como uma disposição a
assumirem uma postura extremamente séria, de silêncio total e não interpretar pequenas
distrações ou brincadeiras como sinônimo de ojeriza. São estudantes que apresentam uma
diversidade comportamental e que parte deles ainda não desenvolveu bem suas estratégias
de controle emocional e de autodisciplina, o que requer dos docentes maleabilidade e
estrutura emocional para compreender que nem sempre a distração é sinônimo de não
aceitação. Antes, é mais manifestação desordenada de seus impulsos e de questões muitas
vezes exteriores a escola, do que mesmo uma contestação da aula.
Tendo a equipe de bolsistas, incialmente observado a turma, a preocupação foi em
como unir patrimônio cultural com o ensino de História de uma forma que fizesse sentido,
que tornasse as questões abstratas em algo mais palpável, perceptível e mais próxima das
questões de onde vivem, porém sem reduzir o ensino a mera história do local desconectada
de contextos mais amplos, pois entendemos que esta não é meramente local, mas dialoga
com questões mais abrangentes.
Por termos como proposta, a temática patrimônio cultural, consideramos ser
necessária uma sondagem com os alunos a fim de saber que compreensões os discentes
tinham desse assunto e em seguida traçar estratégias que contemplassem as carências
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Para melhor situar o leitor no contexto, a comunidade Caldeirão foi formada no ano
de 1926 na zona rural de Crato, ao Sul do Ceará e liderada por um beato seguidor do Padre
Cícero Romão Batista, vindo da Paraìba ao Juazeiro do Norte após as notìcias do ―milagre‖
da hóstia15, acontecido em Juazeiro do Norte no ano de 1989, tendo como protagonistas o
Padre Cícero e a Beata Maria de Araújo. O lugar é chamado de Caldeirão devido aos
aspectos naturais.
O nome da propriedade é proveniente das formas geológicas, denominadas de
Caldeirão, que são escavações realizadas pela força das águas ocasionada nas
rochas, ocasionando a dissecação do relevo e formando espécies de reservatórios
naturais que acumulavam água inclusive nos tempo de estiagem favorecendo a
agricultura no local. (SILVA, 2010, p. 78).
15. No ano de 1989 em Juazeiro do Norte enquanto o Padre Cícero Romão Batista celebrava a missa, ao
entregar a comunhão à beata Maria de Araújo, segundo os relatos que foram propagados, a hóstia teria se
transformado em sangue. Sangue este que para uns seria o sangue de Cristo e para outros, seria obra diabólica
ou mesmo um embuste. A repercussão dessa história resultou na crença na santidade do Padre Cícero para
parte da população e em punição ao padre Cícero por parte do Vaticano, que suspendeu as ordens do padre
Cícero, não podendo portanto atuar como padre.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Ainda para o mesmo autor, esse lugar era chamado de Caldeirão dos Jesuítas, pois
se acredita que na época da expulsão dos jesuítas pelo Marquês de Pombal, dois membros
da ordem teriam se refugiado nas imediações desse ―caldeirão‖. Mais tarde, com a
experiência vivenciada pelos formadores de uma comunidade coletiva liderada pelo Beato
José Lourenço, beato penitente que tinham a cruz como símbolo de sua comunidade, a
expressão Caldeirão dos Jesuítas foi substituída por Caldeirão da Santa Cruz do Deserto.
A experiência coletivista do Caldeirão da Santa Cruz do Deserto teve dez anos de
duração, de 1926 a 1936. Sendo este sítio propriedade do Padre Cícero, este recomendou a
instalação do Beato José Lourenço e dos camponeses que viviam sob orientação do
mesmo, e juntos, construíram a comunidade edificando casas, construindo roças, engenhos,
oficinas de artesanato e açudes. A experiência coletiva do grupo anterior a 1926 tinha sido
parcialmente desmontada em decorrência da venda da terra em que viviam no Sítio Baixa
D‘Antas, também zona rural de Crato, que o Beato, anteriormente orientado pelo Padre
Cícero, já havia arrendado em meados de 1894.
Apesar de a comunidade ter como modelo o trabalho e posse coletiva dos bens,
guiados por princípios religiosos cristãos e conduta pacífica, os que lá viveram, cerca de
1000 pessoas ou mais, foram considerados perigosos no entender dos princípios que
guiavam a sociedade brasileira. Não condizia com o modelo de civilização que se
pretendia, chegando mesmo o modelo implantado no Caldeirão a ser visto como oposição à
civilização, sinônimo do atraso e da barbárie.
Por estas questões levantadas por setores das elites agrárias, da Igreja Católica,
destacando a Ordem dos Salesianos16 e as autoridades políticas, em 1936 se decidiu pôr
fim à comunidade, o que se deu por uma operação militar em setembro de 1936. Nesta foi
ordenada a desocupação do Caldeirão, se destruíram as casas, as plantações e se saquearam
os bens, sendo apenas uma parte desses entregue à justiça, que fez leilão. Parte do dinheiro
foi utilizada na compra de uma propriedade no Sítio União, em Exu Pernambuco, para
onde o Beato foi com apenas algumas poucas pessoas em 1940, após se convencer de que
as autoridades do Ceará não lhe permitiriam mais permanecer no Caldeirão.
Após o desmanche da comunidade, em 1937 houve um confronto na Serra do
Araripe, entre alguns ex-moradores do Caldeirão e integrantes da força militar, resultando
em oito mortes, sendo quatro de cada lado, o que fortaleceu o discurso da periculosidade
16. Com a morte do Padre Cícero no ano de 1934, as terras do Caldeirão passaram a pertencer à Ordem dos
Salesianos, conforme estava definido no testamento do Padre Cícero.
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Não pretendemos impor as reflexões sobre o patrimônio como única estratégia para
se ensinar e aprender História local, porém pensamos que numa época em que as
polêmicas em torno desse tema ocupam os espaços fora da escola e estão presentes em
vários lugares, pois praticamente toda cidade tem seus lugares vistos como patrimônio e no
caso específico do Estado do Ceará, o número de bens que foram inscritos nos livro de
tombo, livro dos registros do patrimônio intangível, cresceu a partir do período de 2003 a
2006, devido a um plano de cultura, criado na gestão do governador Lúcio Alcântara,
tendo como uma das metas tombar e registrar diversos bens representativos da cultura das
cidades que integram o Ceará, a temática patrimônio cultural aparece como fundamental já
que questões como a memória, e o silenciamento podem ser tratados com os alunos.
Entendemos que seja válido que essas discussões permeiem os conteúdos escolares,
uma vez que por meio delas é possível trabalhar conceitos e conteúdos relativos à História
de uma forma que se dê mais materialidade aos mesmos. Como exemplo, o aluno pode
entender o passado e as relações com o presente, a partir de elementos simbólicos
materializados na capela de Santo Inácio de Loyola 17, na formação geológica denominada
17. Caldeirão foi tombado por suas referências históricas, contendo nesse espaço os seguintes bens materiais:
a capela de Santo Inácio Loyola, cuja construção fora iniciada no início da década de 1930, as ruínas de um
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
caldeirão, nas ruínas das casas do Caldeirão e seu entorno ou por meio da prática das
romarias para esta localidade, facilitando até mesmo o entendimento de que a História não
é apenas o que aconteceu em lugares geograficamente distantes, pois ―a história local pode
estabelecer a aproximação entre segmentos populares e o ensino de história.‖ (BARBOSA,
2006, p. 65).
Cientes da impossibilidade de tratar todas as questões pertinentes, em duas aulas, o
plano norteador foi elaborado para ser desenvolvido ao longo de atividades extraclasse,
utilizando a metodologia de aulas de campo, nas quais eram retomadas as questões dos
conflitos presentes no patrimônio. Falar de patrimônio é desvendar de certa forma o véu
que cobre o passado. É adentrar um universo de tensões que muitas vezes não se revelam
ao primeiro olhar. É sair do lugar da contemplação para enxergar as nuances que se
escondem por trás de uma história romantizada que muitas vezes é vista sem conexão com
outras temporalidades.
Para melhor especificar as tensões existentes no próprio processo de
patrimonialização, podemos exemplificar com o caso do tombamento do primeiro terreiro
de Candomblé, em Salvador, no ano de 1984, tendo o antropólogo Gilberto Velho (2006)
como condutor do processo, fato que suscitou intensa mobilização favorável e contra o
tombamento, pois havia o choque entre uma visão mais restrita do que deveria ser tido
como patrimônio e uma visão mais abrangente que questionava o reducionismo dos
critérios estabelecidos pelas leis patrimoniais. Ou o exemplo do processo de tombamento
do Santuário de Bom Jesus da Lapa, do qual fala Fonseca (2003), na Bahia, arquivado em
1968, porque o relator, antropólogo Luís de Castro Farias, via um conflito entre a
conservação da edificação e seu uso, a prática de ―um culto de cunho popular‖ (2003, p.
61) que tinha uma dinâmica própria, envolvendo a ampliação, renovação e mesmo
inovação do espaço. Ou, para aproximar mais, o próprio tombamento do Caldeirão, pôde
ser tomado como elemento para explicar como se constrói um patrimônio cultural. E, como
o patrimônio é histórico, suas regras são modificadas conforme a consciência que se tem
em cada período da história. Caldeirão não seria tombado como patrimônio anterior à
elaboração da Constituição de 1988 e a criação de decretos regulamentadores do artigo 216
desta constituição, e mesmo as inovações das leis que regem a política patrimonial na
esfera estadual, haja vista que o Caldeirão foi tombado no ano de 2005 pela Secretaria
cemitério, o caldeirão formado por rochas, as ruínas da residência do beato e duas casas que ainda se
conservam erguidas.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Estadual de Cultura, após o Estado do Ceará ter adequado seu aparato legal às leis e
decretos federais, o que permitiu o seu enquadramento como patrimônio cultural.
Nessa perspectiva, as aulas foram ministradas de forma a fugir do patrimônio como
mero campo da contemplação e partindo para uma historicização dos bens patrimoniais
desde o entendimento da história da instituição do patrimônio cultural no Brasil,
perpassando a história do próprio bem tombado, os conflitos que o envolveram e seus
significados no presente.
Mas é preciso problematizar o que é patrimônio.
A expressão designa um bem destinado ao usufruto de uma comunidade que se
ampliou a dimensões planetárias, construído pela cumulação contínua de uma
diversidade de objetos que se congregam por seu passado comum: obras e obras-
primas das belas-artes e das artes aplicadas, trabalhos e produtos de todos os
saberes e savoir-faire dos seres humanos. (CHOAY, 2006, p. 11).
O patrimônio não é imutável. Não tem sentido próprio e isolado, e mesmo sendo
visto como pertencente a uma coletividade, ele nem sempre faz sentido para todas as
pessoas e parte delas sequer entende que determinado lugar, prática, saber, objeto ou
arquitetura integra o patrimônio e não conhece a história que perpassa esses bens. Fonseca
chama atenção dizendo que ―o poder simbólico dos patrimônios nacionais é relativo e tem
alcance limitado‖ (1997, p. 12), visto que não faz sentido para toda a sociedade, muitas
vezes até pelo desconhecimento. Como se identificar com algo que não se conhece?
O povo, geralmente se mantem ou é mantido afastado do patrimônio, sendo este
muitas vezes restrito aos intelectuais, a quem o Estado concede o poder de avaliar e definir
o que integra ou não o patrimônio. Mas é também verdade que os intelectuais podem ter
um papel de agente transformador da compreensão que se tem sobre patrimônio.
Fonseca, ao discutir sobre o patrimônio cultural e suas políticas, entende que
―trata-se de uma política conduzida por intelectuais que requer um grau de especialização
em determinadas áreas do saber (arte, história, arquitetura, arqueologia, etnologia,
antropologia‖ (1997, p. 12). A autora faz questionamentos pertinentes. Ela cita que cerca
de quase mil bens tombados ―funcionam mais como sìmbolos abstratos e distantes da
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
nação do que como marcos efetivos de uma identidade nacional com que a maioria da
população se identifica e que integram a imagem externa do Brasil‖ (FONSECA, 1997, p.
17). Ela mostra que o carnaval, futebol, samba, a fórmula 1 e as telenovelas no exterior e
no Brasil, muitas vezes tem mais força de identificação, de representação do país, do que
mesmo aqueles bens que integram os cânones patrimoniais.
Recorremos a esse aparato conceitual não para levar a teoria no sentido mais formal
para os alunos, pois eles não suportariam nem é papel do ensino fundamental levar textos
teóricos densos para a sala de aula. Entretanto a equipe de bolsistas, enquanto responsáveis
pela mediação do conhecimento, necessitou de tais compreensões para ter condição de
articular o pensamento e o discurso e possibilitar as devidas reflexões, de modo a sair da
tendência de se restringir apenas ao campo da sacralização do patrimônio, numa visão
superficial e naturalizadora.
Entendemos que os alunos não precisam ser capazes de ler um teórico sobre
patrimônio cultural, mas são muito bem capazes de entender que o patrimônio congrega
processos históricos e que ele pode se tornar referência da identidade de um povo. Que
algo se torna patrimônio porque uma coletividade assim o compreende e é oficializado ou
não, conforme uma relação de forças, de disputas políticas, disputas em torno de uma
memória. Podem compreender que o conceito de patrimônio, aquilo que preenchem o
significado dessa palavra, pode mudar e que essas mudanças surgem de questionamentos,
de interesses, de reivindicações. Podem entender que um bem tangível 18 ou intangível é
dotado de significados e simbolismos construído pelas pessoas e esses simbolismos são
criados a partir de acontecimentos, não são simples invenções desprovidas de sentidos.
Exemplo, o valor simbólico contido no espaço do Caldeirão e nos bens materiais lá
presentes, se dão não porque foram inventados ficcionalmente mas foi em decorrência de
um conjunto de práticas reais que existiram nesse espaço, das quais os agentes históricos
foram pessoas que estavam dentro e pessoas que estavam fora do Caldeirão. As relações
criadas e fatos acontecidos tornam esse lugar digno de ser rememorado. E mesmo assim só
são vistos como merecedores de uma rememoração em decorrência de um regime de
historicidade e de patrimonialização que tornou possível que o referido lugar com os
resquícios de vestígios materiais e sua História, fosse digno de se tornar pública.
18. Nos apropriamos do conceito de patrimônio cultural tangível e intangível, ao invés de material e
imaterial, defendido por Cecília Londres Fonseca (2003). Para ela, patrimônio imaterial é um equívoco, uma
vez que ele se materializa ainda que por tempo muito breve. Uma celebração ou uma dança, tido como
imaterial, se materializa enquanto os praticantes estão atuando na dança ou no ritual da celebração.
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programa e isso contribuiu para que tenhamos ficado inseguros em exigir uma produção
escrita ou outro tipo de avaliação mais complexa, com receio de que a turma por achar as
atividades difíceis, se recusasse em aceitar a equipe de bolsistas e não se dispusessem às
atividades.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Aprendemos com essas experiências, que o patrimônio cultural seja ele tangível ou
intangível, tem significativo potencial para ser adotado como caminho para se conhecer a
história seja da região em que se vive ou mesmo numa dimensão nacional ou mundial.
Aquilo que se define como patrimônio é resquício de um passado ainda atuante no presente
e dele podemos extrair histórias silenciadas, pois quando se opta por designar um bem
como patrimônio, ele nem sempre é referência para a história de todos os grupos sociais.
―A cada ato de preservação corresponde a pelo menos um de destruição‖ (FÉLIX, 2016, p.
35).
É possível pensar o que foi silenciado, por aquilo que está sendo lembrado. Tombar
ou registrar é um ato de selecionar e também um ato de poder. Quando se patrimonializa,
geralmente se impõe uma narrativa que sobrepõe várias outras possibilidades de se contar
o passado. E em meio a tantas lembranças e silenciamentos é atribuição da disciplina de
história problematizar o patrimônio tombado/registrado e trazer a tona outras narrativas e
por meio delas propiciar aos discentes o exercício do pensamento crítico.
Seguindo esse percurso metodológico com o estudo do patrimônio representado
pelo Caldeirão, os estudantes puderam não só conhecer um pouco da História de Crato
interligada a História do país, como conhecer minimamente o conceito de patrimônio,
registro, tombamento e suas demais particularidades. Facilitou a compreensão das
mudanças históricas, perceber as diferenças entre o passado e o presente, visto que
enquanto narrávamos o passado, os estudantes percebiam que o modo de viver dos anos
1920 e 1930 era diferente do século XXI.
Buscamos desenvolver nos alunos a ideia de que em todo patrimônio há intenções.
Há uma história ou várias possíveis. Procuramos incutir o olhar desnaturalizador com a
pretensão de que consigam captar aquilo que se esconde por traz de um saber, de uma
celebração, de um lugar, arquitetura ou obra de arte e enxergá-las também como campo de
conflitos visto que podem enaltecer uma memória em detrimento de outras, mas, sobretudo
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também romper com a visão do patrimônio como sendo apenas o que diz respeito aos
grandes personagens e aos grupos mais poderosos da sociedade, todavia não se trata de cair
na banalização de que tudo é patrimônio.
BIBLIOGRAFIA
FONSECA, Maria Cecília Londres. Para além da pedra e cal: Por uma concepção ampla
de patrimônio cultural. Rio de Janeiro, DP&A, 2003.
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RESUMO
O objetivo deste artigo é refletir sobre o ensino da história colonial brasileira, tendo como
perspectiva os preceitos dos Direitos Humanos. Por que ensinar, ou melhor, por que nossos
estudantes devem aprender sobre a história colonial? Como o estudo sobre este período
pode colaborar para as formações das identidades dos nossos estudantes? Como devem ser
tratados os povos indígenas e os povos africanos que foram escravizados na América
portuguesa? Acreditamos que a reflexão através do ensino e da aprendizagem de
determinadas barbáries da história humana, como a escravidão negra e indígena, é uma
forma de superá-las e evitar que se repitam, assim como um ensino de história colonial
baseado nas diretrizes dos Direitos Humanos nos permite pensarmos as permanências na
nossa sociedade quando se trata de preconceitos e racismos.
Palavras-chave: ensino de história; Direitos Humanos; escravismo colonial.
INTRODUÇÃO
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Maria de Lourdes Janotti coloca não é possível ignorarmos acontecimentos da história colonial em que se
encontram raízes da nossa sociedade tradicional tão resistente às mudanças, da noção arraigada de um Estado
patrimonialista, dos preconceitos raciais e da desvalorização do trabalho manual. JANOTTI, Maria de
Lourdes. História, política e ensino. In: BITTENCOURT, Circe (Orgs.). O saber histórico em sala de aula.
São Paulo: Contexto, 1997, p. 42-53.
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O que são Direitos Humanos e como podemos relacioná-los não apenas à História,
mas também ao ensino de história? Antes de mais, Direitos Humanos são todos aqueles
direitos inerentes a todo ser humano, como o direito à vida, à liberdade, à opinião e
expressão, ao trabalho, à educação, dentre outros. Se entendermos os Direitos Humanos
enquanto prática social, veremos que a escola é um lugar privilegiado para exercê-la
através do ensino (FRANZEN, 2015). Douglas Franzen propõe que a relação entre ensino
de história e Direitos Humanos seja pautada na afirmação de valores, atitudes e práticas
sociais que expressem valorização dos Direitos Humanos; além da formação de uma
consciência crítica cidadã que se faça presente na vida do estudante nos níveis cognitivo,
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ensino de história colonial: essa história não deve ser voltada para a cristalização de
hegemonias ou de perspectivas, mas, antes de tudo, deve ser para problematizar as
múltiplas realidades passadas (SILVA, 1992). As tradições indígenas e a cultura afro-
brasileira devem ser trabalhadas apoiadas nos Direitos Humanos justamente para superar
qualquer resquício da nossa condição colonial, na qual populações negras eram vítimas do
cativeiro e populações indígenas do extermínio e da preação, tendo que modificar seus
modos de vida e traçar estratégias constantemente de adaptação e resistência às normas
impositivas. Situações que, guardadas as devidas proporções, ainda tem reflexos
coetaneamente.
20
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. LEI Nº 10.639, DE 9
DE JANEIRO DE 2003. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e
bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática
"História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências.
21
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. LEI Nº 9.394, DE 20
DE DEZEMBRO DE 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
22
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. LEI Nº 11.645, DE 10
MARÇO DE 2008. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9
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de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial
da rede de ensino a obrigatoriedade da temática ―História e Cultura Afro-Brasileira e Indìgena‖.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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onde não seja preciso uma jovem negra empunhar, numa recente
manifestação de rua, cartaz que dizia: ―A casa-grande surta quando a
senzala aprende a ler‖ (REIS, 2017).
Reiteramos, portanto, que somente teremos uma sociedade mais justa e igualitária
quando formos capazes de superar os resquícios das barbáries que mancham nossa história.
Superação que virá pela problematização, pela divulgação, pela educação e informação
como propõe o historiador acima. A história do período colonial — assim como dos outros
momentos da nossa trajetória enquanto formação de uma nação e de um país — demonstra
que ainda precisamos discutir e problematizar essas questões em sala de aula. Nas aulas de
história, os Direitos Humanos são fontes das quais temos de beber.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. LEI
Nº 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de
1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo
oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-
Brasileira", e dá outras providências.
CAIMI, Flávia Eloisa. O que precisa saber um professor de História? História & Ensino,
Londrina, v. 21, n. 2, p. 105-124, 2015.
DIAS, Margarida & FREITAS, I. Ensino de História e Formação da consciência crítica. In:
MOLINA, Ana & FERREIRA, Carlos. Entre textos e contextos: caminhos do ensino de
história. Curitiba: CVR, 2016.
104
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FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25. ed.
São Paulo: Paz e Terra, 2002.
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RESUMO
O presente trabalho tem o objetivo discutir a formação cidadã a partir da construção do
Conhecimento Histórico que se faz possível através da inteligibilidade dos conceitos históricos
trazidos nos livros didáticos. Nesse contexto, discutiremos as contribuição e dificuldades de se
trabalhar com o livro didático na atualidade, tendo em vista que da forma que se apresentam,
de forma resumida e sem muitas explicações, dificulta o entendimento e provoca o desinteresse
por parte do aluno, comprometendo a construção do Conhecimento Histórico, muito embora
ainda seja um dos recursos didáticos mais utilizados no processo ensino-aprendizagem. Assim,
acreditamos que atuação crítico-cidadão só se fará possível a partir de uma educação de
qualidade, a qual perpassa por investimento em qualificação profissional e novas abordagens
didático-pedagógicas.
Palavras-chave: Ensino de História; Livro didático; Conceitos Históricos; Tecnologia;
Formação cidadã.
APRESENTAÇÃO
Este trabalho se propõe a discutir a formação cidadã que se processa por meio da
Construção do Conhecimento Histórico, desenvolvido a partir da inteligibilidade dos
conceitos históricos contidos nos livros didáticos e da busca por uma educação de
qualidade. Embora, o livro didático ainda seja um dos recursos pedagógicos mais
utilizados no processo educacional na maioria das escolas públicas brasileiras, este
material de maneira isolada, em algumas ocasiões, não tem sido suficiente para atender aos
objetivos do Ensino de História. Acreditamos que uma educação de qualidade que
contemple a formação cidadã, só se fará possível através do investimento em qualificação
profissional, políticas públicas e recursos didático-pedagógicos diferenciados, tendo como
destaque os tecnológicos, os quais oportunizam a maior participação em sociedade através
do universo digital.
23
Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Ensino de História (PROFHISTÓRIA) da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte.
106
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24
Fonte: Portal Brasil. Disponível em:< http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2009/11/acesso-a-educacao>.
Acesso em 28 set. 2017.
³As Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) são normas obrigatórias para a Educação Básica que orientam o
planejamento curricular das escolas e dos sistemas de ensino. Elas são concebidas, discutidas e fixadas pelo Conselho
Nacional de Educação (CNE). As diretrizes buscam promover a equidade de aprendizagem, garantindo que conteúdos
básicos sejam ensinados para todos os alunos, sem deixar de levar em consideração os diversos contextos nos quais eles
estão inseridos.
26
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira, LDB (Lei 9394/96) é a lei que regulamenta o sistema educacional
brasileiro, reafirmando o direito à educação, garantido pela Constituição Federal. Estabelece os princípios da educação e
os deveres do Estado em relação à Educação escolar pública, definindo suas responsabilidades, em regime de
colaboração, entre União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.
27
O Conselho Nacional de Educação (CNE) é um órgão independente associado ao Ministério da Educação e tem como
missão, aprimorara e consolidar a Educação nacional de qualidade assegurando a participação da sociedade. O Conselho
foi constituído na Lei 9.131 de 1995. O CNE auxilia o ministério da Educação, formulando e avaliando a política
nacional da área, zelando pela qualidade do ensino e pelo cumprimento da legislação educacional. O órgão emite ainda
pareceres e resoluções e decide privativamente e autonomamente sobre assuntos que lhe são pertinentes.
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28
A Base Nacional Curricular Comum (BNCC) é um documento que visa sistematizar o que é ensinado nas escolas do
Brasil inteiro, englobando todas as fases da educação básica, desde a Educação Infantil até o final do Ensino Médio.
Trata-se de uma espécie de lista com objetivos de aprendizagem de cada uma das etapas de sua formação nas áreas de
Linguagem, Matemática, Ciências da Natureza e Ciências Humanas. Longe de ser um currículo totalmente fixo. A Base
Nacional é uma ferramenta que orienta a elaboração do currículo específico de cada escola, sem desconsiderar as
particularidades metodológicas, sociais e regionais de cada uma.
29
O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) tem como principal objetivo subsidiar o trabalho pedagógico dos
professores por meio da distribuição de coleções de livros didáticos da educação básica. O programa é executado em
ciclos trienais alternados. Assim, a cada ano o MEC adquire e substitui livros para todos os alunos de um segmento, que
pode ser: anos iniciais do ensino fundamental, anos finais do ensino fundamental ou ensino médio. À exceção dos livros
consumíveis, os livros distribuídos devem ser conservados e devolvidos para a utilização por outros alunos por um
período de três anos.
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O livro didático é um material escolar que pode ser analisado como um instrumento
didático-pedagógico favorecedor da construção do conhecimento, pois apresenta recursos
de aprendizagem tais como exercícios, questionários, leituras complementares e sugestões
de trabalho em grupo e individuais. Muito embora este recurso didático, de maneira
isolada, muitas vezes não atingem os objetivos do Ensino de História 31. Vale salientar
ainda, que o livro didático é produzido por indivíduos ou grupos que perpetuam sua forma
de pensar e agir e, consequentemente, suas identidades culturais e tradições, sendo
evidentes as relações de representações em que se misturam os interesses públicos e
privados.
A proposta político-pedagógica das escolas, assim como as aulas ministradas pelos
professores, deve estar articulada à realidade do alunado, relacionando os conteúdos
escolares como a vida cotidiana. Trata-se de uma condição importante para que os alunos
possam se reconhecer como parte dessa cultura e construir identidades afirmativas o que,
também, pode levá-los a atuar sobre a sua realidade e transformá-la com base na maior
compreensão que adquirem sobre ela. Muito embora, alguns livros didáticos não trabalhem
a História local, não oportunizando tal relação de identidade entre o aluno e o conteúdo
abordado no livro didático.
Um dos objetivos do ensino de História é o pensar historicamente, (OLIVEIRA,
2010, p. 19). Assim, o Ensino de História deve ser entendido como condição para que o
aluno possa participar do processo de fazer histórico, contribuindo para a formação de
cidadãos conscientes da importância e participação social. É importante destacar que o
livro didático deveria apresenta-se como um instrumento para promover este pensar por
meio de conteúdos e abordagens apresentadas pelos autores e analisados pelo PNLD.
Porém, estes objetivos não serão alcançados se os alunos não conseguirem se reconhecer
como sujeitos históricos e nem entender, por dificuldade de interpretação de texto ou pela
falta de inteligibilidade, os conceitos históricos neste material.
30
O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) é responsável por captar e distribuir recursos financeiros
a vários programas do Ensino Fundamental. Ao financiar e executar esses programas, o FNDE reforça a educação de
milhões de crianças brasileiras diretamente beneficiadas por ele.
31
Segundo as DCN, um dos principais objetivos do Ensino de História é a formação cidadã.
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OS CONCEITOS
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Os conceitos históricos podem ser entendidos como termos ou expressões que não
pertencem a qualquer outro vocabulário. Eles são instrumentos com os quais o historiador
procura consolidar e organizar a realidade, levando o passado e exprimir sua especificidade
e suas significações. Um conceito histórico inclui por si só uma pluralidade de
significações e experiências.
32
Segundo PROST, os conceitos históricos, por serem abstratos e fazerem referência a uma teoria, formam uma rede
conceitual que corresponde a um conjunto de termos inter-relacionados sob uma forma instável, seja de oposição,
associação ou substituição.
111
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não é criar uma proposta inovadora ou uma formula mágica de ensino-aprendizagem, mas
mobilizar alunos e professores a efetuarem pequenas mudanças no fazer pedagógico.
Seminários, júri simulado, exposição de fotos (com o acervo pessoal dos próprios alunos e
seus familiares), vídeos feitos com celulares, entrevistas, música, teatro e outras atividades
lúdicas podem ser mobilizadas como instrumentos de pedagógicos para tornar os conceitos
históricos inteligíveis, facilitando a compreensão e incentivando a participação dos alunos
nas aulas, além de estabelecer uma conexão entre os conteúdos escolares e o cotidiano dos
educandos, tornando assim, o ensino de História significativo.
O uso de ferramentas didáticas midiáticas também pode ser um importante elo entre
o universo do aluno, o Ensino de História e a formação cidadã. Tendo em vista que a
sociedade atual está inserida no mundo digital, a inclusão do aluno no ambiente virtual
torna-se fundamental no processo de formação cidadã. Acreditando que a formação
cidadão se faz a partir da apropriação crítica e criativa de todos os recursos técnicos
dispostos em sociedade. Desta forma, trabalhando com os recursos tecnológico-midiáticos
o professor estará também contribuindo para a formação de cidadãos críticos, analíticos e
socialmente protagonistas.
O universo vivenciado pelo jovem do século XXI está inserido no mundo virtual
através das séries, vídeos, jogos, redes sócias, entre outros onde o intenso contato com os
meios de comunicação acabam produzindo impactos sociais que são refletidos em sala de
aula. Por outro lado, os recursos midiáticos não se limitam ao entretenimento. Nossa
sociedade está cada dia mais digital: no transporte público, nas agências bancárias, nas
informações, comunicações e tantos outros. Por tanto, a apropriação dos recursos técnicos
e virtuais são fundamentais para o amplo desenvolvimento da vida em sociedade.
A inclusão digital relacionada à cidadania pode ser observada também a partir de
ações do Governo como a ―Cidadania Digital‖ especificada no site do Ministério do
Planejamento, Desenvolvimento e Gestão,33 que condiciona o acesso aos serviços públicos
digitais à Plataforma de Cidadania Digital como sendo o ―canal único e integrado para a
disponibilização de informações, solicitação eletrônica e acompanhamento de serviços‖.
Não podemos esquecer que esta mobilização e transformação no contexto
educacional passam por incentivo à qualificação profissional do professor e pela busca por
uma melhoria do Ensino de História. Uma dessas políticas educacionais é o Mestrado
33
Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão. Disponível em:
<http://www.planejamento.gov.br/cidadaniadigital>. Acesso em 29 set. 2017.
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PALAVRAS FINAIS
Acreditamos que a formação cidadã será alcançada quando nossa sociedade puder
dispor de uma educação de qualidade. Esta precisa está pautada em três pilares de
fundamentação: qualificação profissional, políticas públicas e novas metodologias de
ensino-aprendizagem. Entendemos que a cidadania é um processo de construção que só
será possível no momento em que tivermos investimento em qualificação dos professores e
recursos didático-pedagógicos diferenciados oportunizados por políticas públicas que
possibilitem o pleno desenvolvimento da capacidade crítica e do protagonismo do alunado
e subsidiem o trabalho dos profissionais da educação. Através do ensino significativo e do
Ensino de História, neste caso favorecidos pelo estudo dos conceitos históricos trazidos
nos livros didáticos e trabalhados com o auxílio do professor em sala de aula o jovem
poderá associá-los as suas vidas e atuar de forma crítica e participativa em sociedade.
BIBLIOGRAFIA
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115
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ROCHA, H. A.; CAIMI, F. E. A(s) história(s) contada(s) no livro didático hoje: entre o
nacional e o mundial. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 34, n. 68, p. 125-147,
2014.
VENERA, R. A. S. O funcionamento de tipologias discursivas em livros didáticos de
história. Educação em Revista, Belo Horizonte, v. 29, n. 01, p. 121-150, março 2013.
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RESUMO
No Brasil, a partir da década de 1970, os historiadores despertaram para a história regional e local,
demonstrando interesse por questões do cotidiano e por sujeitos históricos até então silenciados
pela historiografia tradicional. Partindo do princípio que o local é o lugar de experiência e
observação privilegiado do sentir-se sujeito da história, o ensino de história local assume uma
importância singular por permitir a inserção do educando na comunidade da qual é partícipe,
possibilitando que, com base no conhecimento da sua realidade, ele seja capaz de protagonizar
ações e propor práticas para solucionar problemas e transformar seu espaço de vivência. Por este
motivo, observamos como as orientações curriculares prescrevem seu ensino, no âmbito nacional e
estadual, bem como apresentamos um levantamento dos materiais didáticos que contemplam o
estudo da história da Paraíba.
Palavras-chave: Ensino de História; História Local; Currículo; Materiais Didáticos.
34
Este texto é uma adaptação de um capítulo da dissertação intitulada ―Povos Indìgenas na Paraìba:
prescrições legais e representações nos materiais didáticos da história local para o Ensino Fundamental
(1996-2015)‖, defendida no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal da Paraíba.
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35
Esse cenário mudou bastante nos últimos anos devido ao interesse crescente dos historiadores por
temáticas locais, haja vista a grande produção acadêmica dos Programas de Pós-graduação, muitos dos quais,
inclusive, possuem Linhas de Pesquisa dedicadas à História Regional (UFPB) e à História Local (UNEB).
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trajetória de pessoas ou famílias locais proeminentes, dando visibilidade apenas aos grupos
mais abastados e as camadas dirigentes, recaindo no deslize da história personalista
(MELO, 2015).
São muitas as críticas dirigidas aos pesquisadores diletantes, porém, devido a sua
escrita está dissociada do rigor acadêmico, seus textos tendem a alcançar um maior número
de leitores, não raro são lidos e debatidos pelos próprios moradores da localidade, o que é
dificilmente alcançado pelas produções dos historiadores profissionais. Certamente, disso
resulta o interesse cada vez maior dos acadêmicos acerca dos memorialistas e da história
local.
Somente a partir da década de 1970 foi que os historiadores brasileiros –
acompanhando uma tendência internacional caracterizada pela adesão de novas
abordagens, temas e fontes – voltaram-se para a história regional e local, demonstrando
interesse por questões do cotidiano e por sujeitos históricos até então silenciados pela
historiografia tradicional. Segundo Melo (2015), nas décadas finais do século XX e o
início do XXI, ocorreu uma
[...] revisão nas concepções do que são as histórias regionais e histórias locais,
quando são consideradas novas dimensões, novos olhares, novos objetos e novas
preocupações, especialmente em tributo aos protagonistas históricos até então
silenciados, excluídos e alijados da historiografia oficial que, a partir de então,
alcançam uma maior visibilidade nos processos históricos. (MELO, 2015, p.31).
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[...] a história local é entendida aqui como uma modalidade de estudos históricos
que, ao operar em diferentes escalas de análises, contribui para a construção de
processos interpretativos sobre as diferentes formas de como os atores sociais se
constituem historicamente. Ou seja, interessa-se pelos modos de viver, coletivos
e individuais, dos sujeitos e grupos sociais situados em espaços que são
coletivamente construídos e representados, na contemporaneidade, pelo poder
político e econômico, sob a forma estrutural de ―bairros‖ e ―cidades‖.
(TOLEDO, 2010, p. 751).
36 Segundo Giovanni Levi (2011, p. 135), a micro-história ―é essencialmente uma prática historiográfica em
que suas referências teóricas são variadas e, em certo modo, ecléticas‖. Enquanto prática, se baseia na
redução da escala de observação, na análise microscópica e no estudo intensivo do material documental.
120
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37
Considerar a história local de modo isolado significa recair no erro do localismo. Melo (2015, p. 64-65)
destacou os perigos e equívocos que devem ser evitados quando se opta pelo trabalho com história local,
quais sejam: 1) não definir marcos relacionais entre a realidade local e os contextos mais amplos da história;
2) considerar o fazer pesquisa no campo da história local mais simples do que fazê-lo na esfera nacional; e 3)
desenvolver uma perspectiva reducionista e/ou localista, isto é, uma visão estreita do local desconsiderando
a importância e relação com outros espaços.
38 Nesse sentido, Neves (1997, p. 22) afirmou que ―o local fora do contexto geral é apenas um fragmento, e
o geral, sem o respaldo das realidades locais, é apenas uma abstração, e, neste caso, ambos estarão destituídos
de sentido‖.
121
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municípios envolvidos, a fim de orientá-los acerca das possibilidades de uso dos materiais
produzidos (MELO, 2015).
Outra produção do NDIHR voltada ao ensino de história regional/local foi a
publicação de livros sobre História da Paraíba destinada, especificamente, aos professores
de Ensino Fundamental e Médio, na tentativa de reduzir a lacuna bibliográfica nesta área.
A coleção denominada ―História Temática da Paraìba‖ foi organizada em quatro volumes 42
conforme os temas discutidos pelos pesquisadores nas diversas linhas de pesquisa do
Núcleo.
Estas e outras iniciativas evidenciaram a importância da articulação entre pesquisa
e ensino no tangente ao estudo da história regional/local. Neste sentido, Neves (1997, p.
19) afirmou que ―a ligação, imprescindìvel, entre o conhecimento e a ação, em história,
embasa todas as concepções que atribuem importância fundamental à história local, uma
vez que ela é o espaço de ação, por definição‖. Trata-se, portanto, da relação indissociável
entre a produção/construção e a socialização do conhecimento e, deste, com as ações dos
sujeitos históricos que ocorrem, por excelência, na escala do local.
Neste contexto, o ensino de história local assume uma importância singular por
possibilitar a inserção do educando na comunidade da qual é partícipe, favorecendo que,
com base no conhecimento da sua realidade local, seja capaz de protagonizar ações e
propor práticas para solucionar problemas e transformar seu espaço de vivências.
Entendemos que o ensino da história da comunidade, do bairro e da cidade dos educandos
contribui de modo significativo para que se percebam sujeitos da história. Por este motivo,
as orientações curriculares costumam prescrever o ensino de história local, principalmente
nos primeiros anos de escolarização, como poderemos verificar através da análise da Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), dos Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN) do Ensino Fundamental (anos iniciais) e dos Referenciais Curriculares
para o Ensino Fundamental da Paraíba (RCEF-PB).
A LDBEN definiu que é responsabilidade da União, em colaboração com os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios, estabelecer competências e diretrizes para
orientar os currículos e seus conteúdos mínimos, a fim de proporcionar uma formação
básica comum. Ainda sobre esta matéria, a LDBEN determinou que essa base nacional
42 Foram quatro volumes, cada um deles relacionado a um tema: Vol. 1 – O Trabalho da Paraíba; Vol. 2 –
Atividades Produtivas na Paraíba; Vol. 3 – Questão Urbana na Paraíba; e Vol. 4 – Estrutura de Poder na
Paraíba. Os autores, à época, eram todos docentes do Departamento de História da UFPB.
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43 A nova redação, alterada pela Lei nº 12.796/2013, incluiu na normativa a Educação Infantil, visto que a
divisão do currículo em uma parcela de base nacional comum e outra diversificada só estava prevista para o
Ensino Fundamental e Médio.
44 A elaboração dos PCN de História é anterior a Lei nº 11.274/2006, que alterou a Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional, ampliando para nove anos a duração do Ensino Fundamental. Nesse sentido,
enquanto as novas Bases Nacionais Comuns Curriculares não forem implementadas, esses documentos que
analisamos continuam sendo consideradas as prescrições oficiais.
124
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No primeiro ciclo, os PCN indicam que os alunos iniciem seus estudos pelo tempo
presente, comparando a vida em família com a de outra coletividade mais ampla a qual
passam a integrar – a escola. O estudo da localidade prevê um levantamento das
semelhanças e diferenças sociais, econômicas e culturais entre os alunos da classe e deles
com as demais pessoas que compõem a escola, além da identificação das mudanças e
permanências dos costumes das famílias e nas instituições escolares ao longo do tempo.
Neste sentido, os PCN apontaram que o ensino de história local proporciona aos alunos
informações favorecendo
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Unidade Conteúdo
I Nossos lugares de vivências e suas lembranças – ruas e bairros.
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Unidade Conteúdo
I A história que se narra – passos para a pesquisa e a história que se
faz. Histórias do meu lugar
II O cotidiano e a formação política – tempos da Paraíba (Abrir para
o Brasil)
4º
III No dia-a-dia, no trabalho e na luta – tempos da Paraíba (Abrir
para o Brasil)
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Há uma variedade de artefatos que podem ser usados no contexto escolar com a
função de contribuir no processo de ensino e aprendizagem, sendo, portanto, denominados
materiais didáticos. Deste universo, selecionamos os livros que se dedicam ao ensino da
história local que, segundo Freitas (2009, p. 9), ―registram a experiência de grupos que se
identificam por fronteiras espaciais e socioculturais – seja na dimensão de uma cidade, seja
nos limites de um Estado ou de uma região do Brasil‖.
128
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45
Esses materiais didáticos foram encontrados em vários acervos pessoais, em livrarias comerciais, em
bibliotecas de Instituições de Ensino Superior (IES) e de escolas públicas municipais e estaduais e ―sebos‖ na
cidade de João Pessoa-PB. Consultamos editoras, bibliotecas e ―sebos‖ on line.
46A temática local figurou/figura entre os conteúdos programáticos de certames de ingresso no serviço
público do estado, como por exemplo, no concurso para Oficiais (Polícia e Bombeiros) e para professores da
Educação Básica. Registramos também, que por conta dessas exigências a História da Paraíba é contemplada
em duas disciplinas no curso de Graduação em Licenciatura Plena em História da Universidade Federal da
Paraíba.
47
Os anos finais do Ensino Fundamental (do 6º ao 9º ano, antigas de 5ª a 8ª série) não tem indicação nos
PCN, nem nos RCEF-PB para o estudo da História da Paraíba, porém isso não significa que os professores
não possam lecionar esse conteúdo, inclusive se levarmos em conta a necessidade da adoção do jogo de
escalas entre o global – nacional – regional – local.
48
Os livros didáticos distribuídos pelo FNDE, através do PNLD, devem ser utilizados por três anos
consecutivos. Os livros de língua portuguesa, matemática, ciências, história, geografia e os livros regionais
129
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REFERÊNCIAS
BITTENCOUT, Circe Maria Fernandes. Ensino de história: fundamento e métodos. 4ª ed. São
Paulo: Cortez, 2011.
CORREA, Sílvio Marcus de Souza. História local e seu devir historiográfico. Métis: história &
cultura, Caxias do Sul,v. 2, n. 2, p. 11-32, jul./dez. 2002.
FAGUNDES, José Evangelista. A História Local e seu lugar na história: histórias contadas em
Ceará-Mirim. 2006. Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de
Ciências Sociais Aplicadas. Programa de Pós-Graduação em Educação,Natal, 2006.
FREITAS, Itamar (org). História regional para a escolarização básica no Brasil: o livro didático
em questão (2006/2009). São Cristóvão: Editora UFS, 2009.
são reutilizáveis, ou seja, devem ser devolvidos ao final do ano para serem utilizados por outros alunos. Os
editais, publicados com intervalo de três anos para cada nível de ensino, estabelecem as regras para a
inscrição do livro didático, determinando o prazo e os regulamentos para a habilitação das obras pelas
editoras. Eles são geralmente publicados 2 anos antes do início da vigência das obras, assim o PNLD 2016,
por exemplo, teve Edital publicado em 2014, avaliação e distribuição em 2015, com vigência entre 2016-
2018. Por este motivo, a estrutura de organização do PNLD é trienal.
130
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LEVI, Giovanni. Sobre a micro-história. In. BURKE, Peter (org.). A escrita da história: novas
perspectivas. Trad. Magda Lopes. São Paulo: Unesp, 2011. p. 131-163.
LIMA, Idelsuite de Sousa. A Abordagem do Ensino de História Local nos Livros Didáticos das
Séries Iniciais. 2012. Disponível
em:<http://www.ichs.ufop.br/perspectivas/anais/GT0801.htm.>. Acesso 01 nov. 2016
MELO, Vilma de Lurdes Barbosa. História Local: contribuições para pensar, fazer e ensinar. João
Pessoa: Editora da UFPB, 2015.
NEVES, Joana. História Local e Construção da Identidade Social. Saeculum – Revista de História.
João Pessoa: Departamento de História da Universidade Federal da Paraíba, n. 3, jan./dez. 1997.
TOLEDO, Maria Aparecida Leopoldino Tursi. História local, historiografia e ensino: sobre as
relações entre teoria e metodologia. Antíteses, vol. 3, n. 6, p. 743-758, jul./dez. 2010.
DOCUMENTOS LEGAIS
BRASIL. Presidência da República. Lei nº 12.796, de 4 de abril de 2013. Altera a Lei no 9.394,
de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para dispor
sobre a formação dos profissionais da educação e dar outras providências. (2013). Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Lei/L12796.htm#art1> Acesso 28
mai. 2015.
131
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RESUMO
49
Graduanda em História Licenciatura pela Universidade Estadual da Paraíba, campus de Campina Grande-
PB.
50
Professora efetiva vinculada ao Departamento de História da Universidade Estadual da Paraíba, campus I.
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INTRODUÇÃO
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principalmente na França, são numerosos o bastante para que seja possível fazer um
mapeamento básico do tema. (...) apesar de obedecer a ritmos e lógicas culturais próprios‖.
De tal modo, entende-se que o ser humano se mantem em estado de angústia diante
da morte e é ser histórico pela finitude física e ação no tempo. Assim, desde os
pensamentos remotos, o coletivo humano buscou anemizar as problemáticas do morrer
com alternativas que apresentassem a morte como uma condição natural, estando, pois, em
convivência real com a continuidade da vida representada pelas manifestações dicotômicas
e, ao mesmo tempo, assíduas, sendo experimentada pela sociedade que fabricou os seus
símbolos, os cultos e as ritualísticas, compreendidas, também, enquanto tentativas de
dominar a morte em vida e a vida pós a morte.
Em outras palavras, segundo Carneiro (2012, p.25), ―A morte é problemática para
os vivos, de modo que sua ritualização tem tido a função de lidar com o contexto da
finitude. O sentido deste jogo existencial (...) elabora-se e apresenta-se para os
sobreviventes‖. Ainda assim, a ideia de morte parece comover e a lembrança recorrente da
condição de desaparecer não é a única preocupação dos vivos.
Sobre estes pilares, a experimentação do morrer passa a ser algo acontecido de
forma solitária pelo moribundo, mas a vivência da morte torna-se uma ação sentida e
consentida por práticas coletivas desenvolvidas por valores próprios advindos de cada
grupo social. Segundo Chiavenato (1998, p.105), ―O homem não tem experiência pessoal
da morte- a morte que ele conhece e ―experimenta‖ é a morte do outro: a sua consciência é
a da morte alheia‖.
Na mesma proporção em que o ser humano vivencia a morte do outro, ele passou a
temer a própria morte. Por estas circunstâncias, os indivíduos costumam inventar uma série
de rituais para assegurar o cumprimento da relação entre vida e morte. Em sociedades que
estabelecem ligações com Deus(es), segundo Chiavenato (1998, p.15), nota-se que:
―Dentro dessa cultura a morte raramente é encarada como natural ou normal. Natural ou
normal é a vida‖.
Portanto, percebeu-se que os seres humanos tiveram, quase sempre, o cuidado com
a morte e, sendo assim, o medo de morrer se fez atrelado a este processo. Mesmo com
todos os preparos em vida, a morte se coloca como um evento inesperado, como uma ação
dolorosa com rupturas de afeto físico e que depois se apresenta enquanto mistério
indecifrável.
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A FOTOGRAFIA
No século XIX, o ato de capturar a imagem e fixa-la foi uma invenção que seduziu
muitos contemporâneos e provocou desconfianças por parte de outros. Mas, passadas
algumas décadas, o retrato vai-se tornando objeto de luxo e privilégio para quem pretendia
se fazer representar em vida e também para eternizar a memória de um parente morto, ao
exemplo dos retratos fúnebres, que se transformam numa espécie de ritual moderno.
A fotografia surge por volta do início do século XIX, enquanto uma técnica de
reproduzir imagens de forma mecânica mediante o uso de equipamentos e sob o processo
de substâncias químicas para a obtenção do material e das informações contidas nas
imagens produzidas. Assim, para compreender a finalidade imposta à fotografia ainda no
século XIX, Mauad (1996, p.2) diz que: ―O caráter de prova irrefutável do que realmente
aconteceu, atribuído à imagem fotográfica pelo pensamento da época, transformou-se num
duplo de realidade, num espelho, cuja magia estava em perenizar a imagem que refletia‖.
Desde a sua trajetória, a fotografia e o seu uso foi apreciado pela sua capacidade de
apreensão em recortes de um contexto e como provas, indícios, relacionados à existência
de um fato, que exibiu acontecimentos de interesse público, apresentando, assim,
fragmentos visuais sobre as ações, as vestimentas, as diversas atividades dos sujeitos, etc.
Conforme Kossoy (2009, p.19), ―(...) a fotografia ganhou elevado status de credibilidade.
Se, por um lado, ela tem valor incontestável por proporcionar continuamente a todos (...),
por outro, ela sempre se prestou e sempre se prestará aos mais diferentes e interesseiros
usos dirigidos‖.
Vale ressaltar que a concepção de fotografia, como reprodução da realidade e
verdade dos fatos simples e límpido, tornou-se um pensamento desmanchado pelos vários
críticos que apontaram a existência de intencionalidades, denunciando a evidência das
múltiplas interpretações sobre uma determinada fotografia, por exemplo. Pois, a imagem
capturada pela lente da máquina fotográfica é resultado da escolha de um ângulo, de um
olhar e, portanto, ela apenas representa o fragmento do real. Mauad (1996), por exemplo,
entende que entre o objeto e a representação da imagem existe uma série de fatores
ajustados construídos historicamente e culturalmente, de acordo com a inserção no espaço
e tempo.
Quando do uso da fotografia como fonte historiográfica, Kossoy (2009, p.22)
defende que ―Cabe aos historiadores e especialistas no estudo das imagens, a tarefa de
desmontagem de construções ideológicas materializadas em testemunhos fotográficos‖. Ou
135
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seja, as imagens fotográficas não são repositórios de verdade única, fixa e invariável. Pelo
contrário, ainda conforme Kossoy (2009), há uma incessante necessidade de decifrar
aquilo que está intrinsicamente representado nas fotografias, pois é importante
compreender as razões que levou o sujeito fotógrafo criar a imagem, já que a mesma está
em diálogo com os seus elementos constitutivos.
Para Mauad (2008, p.37), ―Nesse sentido, o fotógrafo atua como mediador cultural
ao traduzir em imagens técnicas sua experiência subjetiva frente ao mundo social‖. Em
outras palavras, o que se encontra na imagem fotografada como assunto é fruto de uma
sequência marcada pela seleção de escolhas atreladas ao processo de criação da fotografia,
estando, pois, conduzida, organizada e idealizada pelo sujeito fotógrafo que captura a
imagem, uma representação a partir do real e a transforma em materialidade documental ou
apenas em um registro de estilo de vida.
Conforme o exposto, a fotografia, neste caso específico, se reconhece como fonte
para a produção da escrita histórica e exige do historiador um lugar de interpretação, pois
há fotografias que um dia esteve presente no contexto de sua produção e foi guardada entre
as lembranças, como indícios de memória do passado, junto as pistas deixadas por quem a
produziu e usou de alguma maneira. Também não se pode negar a existência de fotografias
que desejam recuperar o seu lugar de presente, embora fazendo parte de outro/novo
contexto e a partir de outros/novos olhares. Deste modo, compartilho da ideia de Mauad
(1996), quando: as imagens não falam sozinhas, é preciso fazer-lhes as perguntas.
OS RETRATOS MORTUÁRIOS
Com o surgimento da fotografia no século XIX, juntamente com a sua utilização no
Brasil e em outras partes do mundo, não é de estranhar a infinidade de possibilidades
registradas pelas lentes da câmera fotográfica, uma vez que podemos vê em imagens a
reprodução possível do real, desde convivências e experiências do cotidiano até a própria
morte, embora seja uma morte do outro.
Ainda no início do século XIX, a circunstância de criar um registro fotográfico da
família ou de um membro ficou durante muito tempo restrito às condições de famílias
abastadas na sociedade, pois o custo financeiro de uma fotografia era relativamente alto
naquele contexto. Todavia, durante o século XX, o valor do registro fotográfico tornou-se
mais acessível, assim, as máquinas fotográficas e o ato de fotografar passaram a alcançar,
de certa forma, vários segmentos sociais.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
A fotografia mortuária surge logo após o ato fotográfico e se tornar arte, enquanto
técnica e capacidade de perenizar momentos tidos como parte de um presente que já se
transformou em passado. Conforme Koury (2006, p. 107), no Brasil, ―Sua popularização,
contudo, vai se dar entre os anos de 1920 e 1950, quando é utilizada por várias camadas da
população‖.
Ainda, assim, o retrato do morto faz parte das intimidades e da privacidade de
álbuns fotográficos, caixas de sapatos, gavetas ou envelopes de seus familiares como uma
tentativa de eternização da memória através da imagem do morto. Por isso que, nas
palavras de Koury (2006, p. 106), o registro fotográfico do morto e do seu momento de
morte ―(...) tem por função preservar o corpo morto de um ente querido para a posteridade,
na hora final de despedida, antes do sepultamento‖.
As imagens de morte, assim como outros rituais e objetos interligados às
manifestação de luto, assumem o papel social e de produção de memória coletiva ou
individual para representar o sujeito morto de forma visual, visto que uma das aparentes
pretensões é preencher simbolicamente um espaço lacunar deixo pela ausência física do
morto entre os familiares. Segundo Soares (2007, p.19), ―A representação imagética
assume o papel de instrumento de apoio para o bom trabalho de luto e, (...) como uma
forma de lutar contra a ameaça que cerca a todos os indivíduos, a assustadora ameaça do
esquecimento‖.
A necessidade de reproduzir as feições de morte, mediante a representação do
morto em telas pintadas, esculturas e, posteriormente, fotografias, tornou-se uma prática
recorrente, já que a finalidade de retratar o morrer impõe-se de maneira significativa e
simbólico entre determinados grupos sociais, pois aquele que é ou está sendo representado
não irá compor, a partir daquele momento consumado pela morte, a vitalidade apresente no
mundo dos vivos.
Desde modo, para se entender uma fotografia como fonte, e neste caso específico a
fotografia mortuária, é preciso reconhecê-la como um objeto inserido em uma dada
sociedade e produto da mesma, coexistindo junto a um sistema articulado de diversificados
códigos e símbolos fornecidos pelo próprio universo cultural da sociedade que a produziu
sobre circunstancias de cortes temporais e de espaço. Sobre os ―cortes‖ da fotografia nas
palavras de Dubois (2012, p.168): ―O ato fotográfico implica portanto não apenas um gesto
de corte na continuidade do real, mas também a ideia de uma passagem, de uma
transposição irredutìvel‖.
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bem de seus mortos, assim como da própria morte. (...) Os mortos ganharam mais
importância no catolicismo popular, ainda impregnado de fortes componentes mágicos e
pagãos‖.
O medo da morte, em contextos passados, não estava unicamente atrelado a
condenação da alma à passagem do purgatório ou ao inferno. Destarte, ―Efetivamente ,
existe uma ponte entre os dois mundos, que é o medo de ser enterrado vivo e a ameaça da
morte aparente‖. (ARIÈS, 2003, p.157). A morte aparente, inesperada ou repentina,
preocupou e perturbou durante décadas as sociedades cristãs por causa dos projetos
fracassados de bem morrer. De fato, o que sabemos é que mudam as maneiras de morrer e
as atitudes diante da morte, mas o medo da mesma continua presente na sociedade
ocidental, principalmente, até os dias atuais, como colocado por Chiavenato (1998).
O medo beirava muito mais a possibilidade de viver sem um plano para a morte,
que, na maioria das vezes, se apresentava em forma de testamento, pois este preparo do
bem morrer atenuavam as preocupações em relação ao destino no além e condicionava os
vivos a atender os pré-requisitos deixados pelo moribundo. Sendo assim, nas observações
de Ariès (2003, p.69), ―Do século XIII ao século XVIII, o testamento foi o meio para cada
indivíduo exprimir, frequentemente de modo muito pessoal, seus sentimentos, sua fé
religiosa, seu apego às coisas, aos seres que amava (...)‖.
Os últimos sacramentos empreendidos pela igreja católica, a exemplo da extrema-
unção, eram realizados como auxìlio de encaminhamentos da alma na hora do morto. ―O
sacramento perdoava os pecados pendentes do enfermo, culpas esquecidas durante a
confissão, mas podia também resultar em sua recuperação fìsica (...)‖. (REIS, 1991, p.103).
No entanto, é importante ressaltar que muitos morriam sem os sacramentos pelas
condições sociais ou em consequência da morte inesperada. De acordo com Reis (1991,
p.100), ―Uma boa morte era sempre acompanhada por especialistas em bem morrer e
solidários espectadores. Ela não poderia ser vivida na solidão‖.
Durante a exumação da morte do moribundo, porta e janelas da casa eram fechadas
para evitar a entrada de maus espíritos e, quando do velório, as mesmas eram abertas para a
saída da alma do morto da residência, como bem apresenta em Reis (1991) no livro a
Morte é uma Festa. Ao analisar uma iconografia do século XII, sobre a hora da morte,
Ariès (2003, p.50) observa concepções do imaginário da morte: ―(...) um espetáculo
reservado unicamente ao moribundo, que, aliás, o contempla com um pouco de inquietude
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A Pequena cidade de Nova Palmeira encontra-se localizada no Estado da Paraíba, a uma distância de
aproximadamente 240 km da capital João Pessoa, estando, também situada na microrregião do Seridó
Oriental Paraibano.
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Tal afirmação ainda nos faz recordar a ideia de que o ato fotográfico para algumas
dessas pessoas, representadas nesta imagem do velório, poderia ser uma condição distante
de suas realidades financeiras. Por isso, demonstram expressões faciais de tristeza pelo
momento vivenciado, mas se apresentam com atitudes controladas, sem choro ou gestos de
desespero, na tentativa de preparar uma imagem apropriada de si para os outros, como diria
Pierre Bourdieu (2006).
Outros aspectos interessantes presentes na imagem são os acessórios fúnebres,
enquanto definidores da integridade religiosa e moral do cadáver, como o caixão sem
tampa ou, pelo menos, podendo estar excluído da fotografia mortuária. Sobre este ponto,
subentende-se a ideia de representar a morta em um estado de sono profundo. De tal modo,
observa-se o corpo envolto de um lençol branco e não uma mortalha. Reis (1991) fala
dessa prática como uma tentativa de imitação à Cristo, cuja finalidade estaria relacionada a
certeza de sua ressurreição e condição de vida eterna.
Aparentemente, o velório aconteceu na sala da casa, pois observamos ligeiramente
pontos de iluminação na fotografia, em suas exterminadas esquerda e direita, apontando
um possível indício de porta e janelas abertas. Segundo a crença advinda das religiosidades
populares, durante o velório, porta e janelas da casa do defunto deveriam se manter abertas
para a saída de sua alma, como os pés também deveriam ficar na direção da porta para
encaminhar o espírito no bom caminho.
A ritualística fúnebre presente neste cortejo da morta Firmina Rosa se torna ainda
mais interessante e definidor de caráter social e econômico, quando da presença de um
padre em seus trajes sacerdotais. ―Na tradição registrada por Câmara Cascudo, a presença
de sacerdotes no funeral prevenia a metamorfose do morto em alma penada. (...) os padres
velavam o corpo para salva a alma (...)‖. (REIS, 1991, p.142). O retrato na parede do
Coração de Jesus, os três anjos meninas, a cruz por trás do padre e as duas velas nos
castiças (uma vela está acena) completam este cenário do velório com um espetáculo
fúnebre regido por elementos do catolicismo, pelas concepções que parte do imaginário
popular e pela certeza de vida eterna.
Vale ressaltar que o verso desta fotografia trás a seguinte mensagem de acessível
visualização: ―Osório Casimiro dos Santos e filhos, convidam sobrinhos e cunhados para
assistirem a missa que mandam celebrar por alma de sua inesquecível esposa. A missa no
dia 10 de setembro, as 7 horas. Para Maria Rita e família. Parelhas, 31 de agosto de
1951”. Portanto, vemos um caso de ―foto-convite‖ de missa com a imagem do velório. Sob
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Nova Palmeira foi elevada a condição de município mediante a lei municipal de nº 3102/14-12-1963.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sendo assim, na atividade de coletas das fotografias em Nova Palmeira, pude notar
a repetição com frequência desta imagem nos acervos pessoais de retratos fotográficos,
principalmente dos habitantes mais antigos. Há época, pareceu ser importante a presença
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deste retrato mortuário de Justo Lourenço entre os arquivos particulares, por um desejo de
revisitar os laços emocionais e as memórias construídas em torno do episódio, no final da
década de 1940, como uma tentativa de regresso do morto ou, melhor dizendo, negação da
sua morte trágica percebida no ato da fotografia.
De fato, nem todas as competências de interpretação sobre os retratos mortuários e
os preparos à morte são decifradas por historiadores, porém fica nitidamente entendido que
estas imagens do morto ajudaram a fortalecer o processo do luto, reunir familiares,
demonstrar as posses do defunto em seu velório e preparar a sua passagem ao além.
Assim como outras maneiras intencionais de fotografar, a fotografia mortuária, em
conjunto aos trajes e trajetos para o bem morrer, reafirmam a necessidade de lembrar e o
denuncia o medo do esquecimento.
REFERÊNCIAS
ARIÈS, Philippe. História da Morte no Ocidente. Tradução: Priscila Viana de Siqueira. Rio
de Janeiro: Ediouro, 2003.
ARIÈS, Philippe. O Homem Diante da Morte. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1982.
BOURDIEU, Pierre; BOURDIEU, Marie-Claire. O Camponês e a Fotografia. Revista de
Sociologia Política, nº 26, p. 31-39, jun 2006.
CARNEIRO, Maristela. Construções Tumulares e Representações de Alteridade:
Materialidade e simbolismo no Cemitério Municipal São José, Ponta Grossa/PR/BR, 1881 a
2011. (Dissertação) Mestre em Ciências Sociais. Universidade Estadual de Ponta Grossa, Ponta
Grossa, 2012.
CHIAVENTO, Júlio José. A Morte: uma abordagem sociocultural. São Paulo: moderna, 1998.
(coleção polêmica).
DUBOIS, Philippe. O Golpe do Corte: a questão do espaço e do tempo no ato fotográfico. In__
O Ato Fotográfico. Tradução de Marina Appenzeller. 14º ed. Campinas, SP: Papirus, 2012, p.
161-217.
KOSSOY, Boris. Realidades e Ficções na Trama Fotográfica. 4º ed. São Paulo: Ateliê
Editorial, 2009.
KOSSOY, Boris. Fotografia e História. São Paulo: Ática, 1989.
KOURY, Mauro Guilherme Pinheiro. O Imaginário Urbano sobre a Fotografia e Morte em
Belo Horizonte, MG, nos Anos Finais do Século XX. VARIA HISTORIA. Belo Horizonte,
vol. 22, nº 35, p.100-122, jan/jun 2006.
MAUAD, Ana Maria. Através da Imagem: fotografia e história interfaces. Tempo. Rio de
Janeiro, vol. 1, nº 2, 1996, p. 73-98.
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RESUMO
53
O surgimento do punk rock foi uma reação aos rumos tomados pelo desenvolvimento do rock nos anos
1970, siginificando uma volta a alguns parâmetros iniciais do gênero, relacionados à simplicidade na
composição e na execução musical [...] com um verniz mais agressivo e adaptado aos novos tempos.Dentre
alguns elementos trazidos pelo punk rock, destacam-se, em termos de performances envolvendo palco e
plateia, o mosh (salto dos artistas sobre a plateia) e o pogo ou a roda (espécie de encanação de brigas
envolvendo o público nos shows). (SILVA, 2013, p.58)
54
O rock ouvido na década de 1980 aqui no Brasil é tributário do movimento punk inglês que explodiu em
1977 com o lema do-it-yourself (faça-você-mesmo). Mesmo as bandas brasileiras que não possuíam qualquer
vinculação orgânica com a estética ou a sonoridade punk, herdaram essa tradição, essa possibilidade de
criação sem preocupações estéticas rigorosas. O fato é que esse lema, essa prática, deu condições a jovens
sem qualquer intimidade com instrumentos musicais, a condição de com uma guitarra, um baixo e bateria
expressar seus sentimentos, opiniões, dores, angústias e reivindicações. Possivelmente essa seja uma das
explicações para o surgimento de centenas de bandas em torno do rock nos anos de 1980 no Brasil. (SOUZA,
2005, p.18-9)
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Napolitano destaca que um gênero musical não se define apenas por seu ―ritmo‖,
sendo, portanto, ―uma convenção, de um conjunto de propriedades fluidas, constantemente
debatidas e redefinidas por uma certa comunidade musical de criadores, empresários,
crìticos e audiências anônimas‖ (2008, p.156)
Logo, podemos assimilar que o gênero rock é um estilo de vida, um cenário, que
possui um público e artistas não passivos e não somente reduzido à meros ‗jogos‘
comerciais. O gênero musical está para além dos interesses da indústria e permeia os
campos das sensibilidades, tanto do artista como do público. Os sujeitos que compõem este
cenário, através de suas identificações, selecionam a partir do que os influencia, o que
produzir, no caso dos artistas, e o que consumir enquanto público.
55
―(...) enquanto o punk era essencialmente rock de guitarras tocado nos mais altos decibéis, a new wave era
um bailão de misturas. Funk, ska, reggae, música eletrônica e rockabilly se misturavam ao som da Motown e
dos girl groups. A new wave era ao mesmo tempo futurista (abarcava sons eletrônicos) e retrô (no visual e no
rock básico). (ROMANHOLI, 1999, p.50 apud SILVA, 2013, p.67)
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56
Algumas se apresentam mais punk, outras flertam mais com o SKA, por exemplo. Bem como suas
temáticas podem ser mais voltadas ao caráter contestador político-social, como também a um viés mais
humanista, individualista.
151
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Como apresenta o artigo ―Delìrio Urbano e Mais Fanzines e Alternativos dos 80‖ -
presente na compilação ―Delìrio Urbano‖ lançada em 2014 pelo selo natalense Sebo
Vermelho Edições – a produção contracultural ganha maior ênfase e repercussão no:
[...] período de abertura política, quando artistas da MPB, marcados pela postura
antiditadura militar, e da poesia marginal, que tinha fortes traços da geração
hippie, deram lugar à juventude do rock, que explodia em todo o país com
bandas Legião Urbana, Barão Vermelho, e Titãs, as quais tinham em suas
formações os poetas Renato Russo, Cazuza e Arnaldo Antunes, respectivamente.
[...] Em Natal, não foi diferente. A partir de 1983, o gênero musical trouxe
consigo uma leva de novos artistas dispostos a mostrar suas produções.
(SANTIAGO, 2014)
Na década de 1980 cada vez mais, na cidade de Natal, encontramos espaços abertos
para a produção artística-contracultural. Em 1981 aconteceu 1° seminário de semiótica e
arte no qual a Fundação Brasileira de Semiótica foi fundada, após este seminário as
palavras: Performance, Semiótica, art-door, vídeo-art, multimídia, foram incorporadas ao
vocabulário da cultura local, ao cotidiano do núcleo de arte e cultura da UFRN‖
(ALBERTO, 1989).
O artigo de Jais Alberto ainda aponta que
Na música, ocorreram shows e espetáculos para todos os gostos do rock ao
grande sucesso da lambada. A partir da segunda metade da década, Natal entrou
no roteiro de grandes shows rock – e destes, destaque para os shows dos Titãs, a
maior banda de rock do Brasil, na década. Os Titãs estiveram pela primeira vez
em Natal em 1988, e depois no primeiro semestre de 1989. A cidade também
recebeu artistas internacionais, como o KISTCH Ray Connif, em 1987. [...] No
teatro, destaque para jovens atores que formaram a premiada Stabanada Cia de
Repertório, grupo que sacudiu o setor marasmo em que estava mergulhado ao
longo da década. Jesiel Figueiredo, incansável ator e diretor de teatro, conseguiu
montar um teatro de espetáculos populares no bairro do Alecrim [...] A literatura
local cresceu, mais em quantidade do que em qualidade. Dezenas de lançamentos
literários constaram da agenda cultural nos últimos anos, destacando-se porém
alguns autores com trabalhos de boa qualidade: Manoel Onofre Jr., [...]. Além do
surgimento do jornal literário ―O Galo‖, a literatura viveu outro momento de
festa com a presença do poeta paulista Haroldo de Campos em Natal, em outubro
de 1988 e a comemoração do centenário de nascimento do poeta Fernando
Pessoa. E este ano, os 150 anos de nascimento de Machado de Assis. Outro setor
que experimentou crescimento, ao longo da década, foi o de artes plásticas,
também com a realização de dezenas de exposições individuais e coletivas. [...]
(ALBERTO, 1989)
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57
Gênero de algumas bandas do final dos anos 1960 e início dos anos 1970, também chamado Art Rock. As
músicas são mais longas e de conteúdo profundo. Os intricados arranjos utilizavam tecnologia de ponta,
sintetizadores e um grande número de efeitos sonoros e visuais. (DOURADO, 2004, p. 284)
58
Delírio Urbano
59
Organizado pela COOART, cooperativa de artistas locais natalenses, o Festival de Artes Do Natal teve sua
primeira edição no ano de 1978 e se estendeu até o ano de 1988. Buscando realizar o enaltecimento da
produção artística local e regional, o festival divide-se nos mais variados formatos de arte, realizando uma
miscelânea, se dedicava em apresentar shows musicais, teatrais, de dança, artes visuais (vídeo, cinema,
multimeios), literatura.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Carito seguiu seu caminho e em 1986, formou seu novo trabalho musical, a Modus
Vivendi. A banda era composta por: Carito no vocal, Alexandre Miúda na guitarra, Nelson
Benevides nos teclados, Erick Firmino no baixo e Lênio Santos na bateria, e chegou a ter
um projeto de gravação de disco aprovado, porém o selo pela qual se lançaria, acabou
falindo antes da gravação. Passou ainda por variadas formações chegando a ter até 7
integrantes, terminando mais ‗enxuta‘ com: Carito no vocal, Edu Gomez na guitarra,
Fernando Suassuna na bateria e Dudu Taufic no baixo sintetizado e teclados.
O material das bandas gravado em áudio é praticamente inexistente, devido as
dificuldades de gravação, bem como à ação do tempo. Porém, em acervo pessoal de
Vlamir Cruz, ex-guitarrista da banda Cabeças Errantes, encontramos alguns programas de
shows nos quais podemos ter acesso a algumas das letras. Um ponto interessante é que,
uma forma de se fazer divulgar era por meio da panfletagem e os shows eram um espaço
60
Blog do Carito
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A Modus Vivendi teve seu fim oficial em 1999, após ganhar bastante visibilidade
na cidade de Natal, chegando a ganhar festivais e até a aparecer no Programa Palco MTV,
da antiga Music Television Brasil (MTV-BR); quando Carito envia um comunicado à
imprensa local anunciando o fim.
CABEÇAS ERRANTES
Outra banda que ganhou bastante destaque nesta época em Natal é a Cabeças
Errantes. Formada no ano de 1982, por rapazes moradores do Bairro Vermelho, na capital
potiguar a Cabeças Errantes teve seus trabalhos mais divulgados a partir do ano 1985
conforme destacou em entrevista o vocalista e guitarrista da banda à época, Vlamir Cruz. A
61
Blog do carito
62
CARITO. Modus Vivendi, 2010. Disponível em: < http://www.carito.art.br/?page_id=509 > Acesso em: 03
de mar 2014
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banda passou por variadas formações sendo a mais conhecida delas, composta por Vlamir
Cruz, no vocal, Ricardo Menezes na guitarra, Bob no baixo, Tampinha na bateria e Pedro
Pereira nas performances.
A banda teve maior popularidade em meados da década de 1980 e a sua sonoridade
era influenciada mais por um hard rock63, ou ainda, rock progressivo. Segundo Vlamir
Cruz, encontramos na Cabeças Errantes, um rock que bebeu na fonte da década de 1970 e
que traz uma perspectiva mais existencialista em suas letras numa sonoridade um pouco
mais agressiva, por assim dizer.
O grupo também não possui registros gravados disponíveis. No depoimento de
Vlamir Cruz, podemos perceber um exemplo de uma contracultura que recusa os atos de
padronização presentes nas tentativas de cooptação por parte da indústria cultural, como se
o rock constituísse cenários imutáveis64. Os integrantes da banda Cabeças Errantes e de
algumas outras bandas natalenses não se viam como sendo influenciados diretamente pelos
grupos musicais em auge, no eixo sul-sudeste, na década de 1980 e suas temáticas:
É claro que tínhamos uma certa cara feia do segmento cultural mais ranzinza de
dizer ―‗porra‘ a gente ‗tá‘ num pais que as coisas ‗tão‘ carregadas e vocês ‗tão‘ aì
fazendo música - vamos dizer - alegre, a gente tem que contestar‖ [...] Mas a
gente desce do palco e os caras conversam com a gente e vê que não somos
alienados, [...] nós não éramos alienados, mas também não era uma necessidade
de estar falando só daquilo nas nossas músicas, algumas músicas do Cabeças
Errantes falam disso, a gente tem uma música chamada ―Sete minutos depois do
fim‖ 65 que fala um pouco disso, uma chamada ―Tio Sam‖ 66 falando de uma
relação de capital, do americano que vem que domina tudo mas que tá lá
conversando com moscou e combinando a guerrinha lá na américa central e a
gente aqui, terceiro mundo só assistindo;
63
Termo que nos anos 1960 designava alguns gêneros de rock agressivo e menos comercial de bandas como
o Cream e MC5. As músicas incorporavam elementos do blues, do rock n roll e do pop. (DOURADO, 2004,
p. 156)
64
ver Goffman & Joy.
65
―Refaça seus planos pro futuro/ já fiz meus molotovs e armadilhas/ se era esse eu desejo/ está declarada a
nossa guerra‖
66
Tio Sam: Você tem olhos azuis/ sua casa é tão branca/ seu olhar não me seduz/ vai pra lá com sua banca/
Pelo telefone vermelho/ fala com o kremelim/ amanha duas da tarde/ guerra na américa central/ Meu terceiro
mundo/ já está duro sem grana/ você traz os dólares no bolso/ e as algemas na mão/ Vai pra casa Tio Sam/
vai cuidar de suas feridas/ olha mais seu Harlem/ a ku-klux-klan
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CANTOCALISMO
67
Meu sonho era ? um som instrumental/ e me realizar dentro do meu eu, pra levantar a grana mergulhei no
comercial/ mudando de cabeça abri mão do era meu/ fazia rock e letra ? cultural/ Falava do Brasil e do seu
baixo astral/ a minha posição ia mais de intelectual/ e em tão pouco tempo fui sucesso nacional/ não era isso
que eu queria e tudo foi p mim/ pensar num belo dia ser o Tom Jobim/ fui um cara produzido pra fazer de ti/
Apenas um ouvido e não mais sentir no teu corpo a minha música/ De repente eu senti que tudo era igual e
tudo o que eu fazia era tão artificial/ e mergulhei num drama de pensar no que deixei/ garoto propaganda só
assim eu tinha vez/ mas tudo vai passar em breve eu vou mudar/ fazer aquele som e me sintonizar já chega
dessa ? de poder me deixar levar/ só penso no ? e não sou produto musical.
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qualidade, ou seja, a banda era crìtica nisso, [...] e ―Poema pra lua‖ 68 vai mais
por uma questão romântica e ―Perceber‖ era mais politizada.
A banda acabou de uma forma gradativa, por fatores como novos caminhos
profissionais seguidos pelos integrantes; desentendimentos técnicos em termos de que
gênero musical adotar em suas músicas, pois, alguns integrantes queriam ceder à um
formato mais comercial, no caso o pop-rock, mais em alta na época, outros queriam seguir
numa linha mais condizente com suas ideologias. Deste modo, o grupo foi se desgastando
até que chegou ao fim. Pouco tempo depois, ainda foi lançado um segundo LP, contudo,
somente dois integrantes da banda permaneceram nesta gravação, o baixista Aluízio e o
baterista Ginho.
ALFÂNDEGA
68
Ainda assim podemos notar aqui as alusões implícitas já mencionadas, permeadas pelo momento histórico
vivido ―Sonhar pode ser atrevido quem sabe no mundo de agora/ ninar no grito é poder embalar um
pedação da aurora/ de repente um poema pra lua [...]‖ – grifo nosso
69
CANTOCALISMO. Cantocalismo. WR-Salvador-BA, 1988. Faixa 2
158
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
passam os fatos cotidianos e os sentimentos por eles gerados que são percebidos
e transformados em produtos musicais (MACEDO, 2013)70
Porém podem, sim, ser verificadas nas canções relações implícitas, afinal todo
sujeito age socialmente enquanto filho de seu tempo. Deste modo a letra de ―MPB (Medo
Popular Brasileiro)‖ há uma reflexão sobre o lugar social ocupado pelo individuo
contemporâneo, esse tipo de reflexão normalmente é provocada em conjunturas de crise e
pode-se identificar em menção implícita, em uma conjuntura pós-ditatorial, o pensamento
da sociedade representado:
Eu tenho medo de ser preso, de ser preto, de amar/ Eu tenho medo de ternura, de
aventura ,de voar/ Medo, eu tenho medo de mim / Eu quero ter um amor que me
liberte desta situação, falsificação inerte( eu quero já )/ Eu tenho medo do que você
faz do que sou capaz e do que não sou também / Eu tenho medo de arriscar, de me
entregar ao querer bem. 72
70
MACEDO, Marcus A. Alfandega (1988-2004). Natal, 11 out. 2013. Disponível em: <
http://sompotiguar.blogspot.com.br/2013/10/alfandega-1988-2004.html> Acesso em: 11 de mai de 2014
71
https://romulotavares9.wixsite.com/alfandega/bio
72
Alfândega. 1988-2004. Sonopress-Rimo, 2004. Faixa 3
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
A letra de Rock PoPTyguar ―Homens Maus‖ é uma das que mais remetem o
cenário, à cena BRock na produção da Alfândega, como o próprio baixista Rômulo
Tavares diz em entrevista: ―essa era uma música bem titãs mesmo‖. Em termos de letra, a
canção também traz muito dos temas presentes no cenário do BRock, como pode ser
percebido abaixo:
E aí professor... já bateu no aluno? Já gritou a lição?/ e ai jogador... já chutou o
juiz? Já arrumou o seu gol? E aí torcedor... já rasgou a bandeira? Já brigou na
geral? E aí homem mau? E aí senador... já ganhou seu cache? Já brincou de PC?
E aí leitor... já votou no pior? Num boçal da TV?
O grupo encontra-se ativo até hoje, porém a história da banda é permeada por
alguns hiatos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base nas letras, melodias, bem como na apresentação estéticas das bandas
expostas, compreende-se que o rock não era apenas um estilo musical, mas um cenário
característico, cujas propostas se voltavam para destacar a insatisfação com as questões
políticas e sociais da época. As músicas dos roqueiros traziam críticas de forma direta, sem
metamorfosear ou ocultar. Nota-se, aqui, a transição entre a repressão à produção
fonográfica – que precisava disfarçar suas letras no período ditatorial ou pagar o preço do
exílio, quando não da tortura e da prisão – e a liberdade de expressão trazida nas letras de
rock do período da redemocratização, permitindo que estas pudessem criticar e fazer
reivindicações aos governos de forma direta.
As bandas natalenses ao se localizarem em um espaço fora do eixo comercial de
produção, o espaço de Natal, apresentam em suas canções as particularidades deste e,
devendo-se a isto, acabam negando a existência de influências diretas com o BRock tal
qual definido por Artur Dapieve, como podemos perceber em entrevista concedida pelos
músicos. Contudo, ao analisarmos os elementos que compõem o cenário no qual se
encontra as bandas natalenses e seu público, podemos notar que havia, sim, uma produção
de rock, tal qual a característica do eixo central da década de 1980, na cidade de Natal.
Entendemos assim que a relação existente entre o cenário BRock e o Rock PopTyguar
consistiu em um: ―[...] hibridismo às avessas, ou seja, cria um suposto diferenciar-se, uma
constituição de ser ―diferente‖ e único, todavia (re)cria tribos e grupos que se vestem e se
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REFERÊNCIAS
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urbanas e a ressignificação da Rua Chile, Natal-RN. 2014. 210 f. Dissertação (Mestrado) -
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GONÇALVES, Paula Vanessa Pires de Azevedo Gonçalves. Ser Punk: a narrativa de uma
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musical. Itajaí: Univali; Niterói: UDUFF; 2011
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RESUMO
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São assim criadas redes de textos, que por vezes remetem explicitamente uns
para os outros, que trabalham sobre o mesmo motivos, reproduzidos, alterados
ou invertidos, e cujas relações não são de modo algum fundamentalmente
diferentes das que existem, no interior de um texto, entre os seus diversos
fragmentos. (p. 174).
Os textos estariam assim, interligados entre si, formando uma ―rede‖ de ligação
de ideias e mensagens. Essa ―rede de texto‖ se torna possìvel por meio das intervenções
dos editores, os quais, ―propõem ao seu público textos que originam séries‖, e estas por sua
vez, elaboram narrativas que estariam interligadas entre si. As imagens também elaboram
séries, assim como os textos, elaboram uma identidade, relações entre si, estabelecem um
diálogo.
Neste sentido, o autor vem apresentar que a produção editorial está permeada
por intenções que buscam ir de encontro ao leitor e ao seu cotidiano. Em outras palavras,
pensando o contexto da França do século XVII, era preciso reelaborar textos que
atendessem ao público que se destinava o escrito. Se torna importante compreender que os
agentes responsáveis pela produção dos livros, como os editores, estão inseridos em um
lugar de produção, lugar este que influencia diretamente as operações editoriais, assim
como nas estratégias utilizadas, nas escolhas efetuadas. Os ―livros de cordel‖ editados em
Troyes do século XVII possuíam, como aponta Chartier (1990), um duplo objetivo: ser
moralizante e elaborar uma ―nova legibilidade‖ aos textos. Em outras palavras, o autor
alerta para fato de que, compreender os cordéis é compreender o próprio impresso e sua
produção, a qual está inserida no que ele chama de ―formula editorial‖, a qual dá ao livro
características próprias. (CHARTIER, 1990, p. 178).
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Torna-se claro como as imagens são portadoras de uma ideologia que busca educar para o
respeito, a devoção. As imagens serviam como doutrinadoras ao tempo em que
aproximavam os seus leitores do espaço escrito.
Quais usos são dados às imagens neste período? Pode-se dizer que não apenas
religioso. Ao longo do século XVII, durante as guerras religiosas na França, as imagens
começam a adquirir novos usos e funções. Chartier (2004) chama atenção para o
crescimento de imagens profanas neste período e explica que tal crescimento está atrelado
a um objetivo polìtico, ligado a estas guerras, o que ocasiona segundo ele ―uma guerra de
imagens‖. As imagens adquirem assim novos significados, suas mensagens se invertem
quando reutilizadas.
Convém salientar que os sujeitos detentores do poder fazem uso das imagens
para atender aos seus interesses, os quais estão diretamente ligados a questões políticas e
ideológicas. Henrique IV foi um destes sujeitos que soube fazer uso das imagens quando
foi conveniente, mandando que fossem gravadas iconografias de propagandas dos feitos
reais e que difundissem sua imagem. Quando não foram convenientes, mandou serem
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queimadas. Os sujeitos fazem nas imagens operações, que busca atender a interesses
políticos, ideológicos atrelados ao campo do poder.
Nesse sentido, Chartier (2004) adquire razão ao afirmar que ―nos séculos XVI
e XVII, sob formas diversas, que quase sempre autorizam uma dupla leitura, a do texto e a
da imagem, a imprensa difundiu amplamente um material tipográfico abundante...‖ (p.
113). Ela torna-se responsável por transformar ―profundamente uma cultura‖ que em
grande parte era restrita a poucos grupos. Convém questionar: quando se constitui o
mercado popular dos impressos na França? Chartier (2004) responde:
Neste sentido é importante ser compreendido ainda que ―o livro não é uma
entidade fechada: é uma relação; é um centro de inúmeras relações‖ (CHARTIER, 2014, p.
42) que possibilitam uma diversificação cultural entre os mais diversos elementos que o
compõem. Inserida nestas relações se encontra as decisões de inclusão e exclusão do que
deve ou não ser inserido em sua produção. Neste trabalho, o conceito de ―livro‖ é
entendido como amplo, que abarca não apenas o relato escrito, mas também o visual. O
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historiador Robert Darnton oferece outras reflexões sobre este importante elemento
cultural.
Cabe se fazer claro que este conceito possibilita o entendimento dos diversos
interesses presentes na produção dos livros. As estratégias e táticas utilizadas representam
a posição de cada sujeito (autor, editor) na produção editorial, seus interesses,
intencionalidades e caminhos traçados durante a produção e distribuição destes artefatos
culturais. É bem verdade, ainda hoje, a afirmação de Robert Darnton (1990), que o papel
do editor ―[...] como figura especìfica diferenciada do mestre livreiro e do impressor, ainda
demanda um estudo sistemático‖ (p. 123). Este sujeito é o responsável pelas escolhas,
articulações e decisões do processo editorial. Contudo, ainda hoje, suas práticas culturais e
sociais são pouco estudadas. É preciso que esta figura seja observada de perto, entende-la
como sujeito primordial na elaboração dos livros e imagens é fundamental.
O que representa a história dos livros? Para Darnton (1998), ela se caracteriza
enquanto uma ―nova disciplina das ciências humanas‖, permitindo
[...] adquirir uma visão mais ampla da literatura e da história da cultura em geral.
Ao identificar os livros que passavam palas mãos de uma sociedade inteira, ao
descobrir (pelo menos até certo ponto) em que medida os leitores conseguiam
compreendê-los, podemos estudar a literatura como parte de um sistema cultural
geral (p. 14).
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Alguns pesquisadores, como Everardo Ramos, aponta para estes primórdios. Segundo ele,
as origens da impressa ilustrada no Brasil se deu no ano de 1876 com o surgimento da
intitulada A Revista Ilustrada, que tinha como objetivo combater a escravatura através das
caricaturas elaboradas e publicadas neste periódico. Contudo, é preciso atentar para o fato
de que, os primeiros impressos brasileiros começam a ser produzidos por volta do ano de
1808 quando a Corte Portuguesa fugida de Portugal implanta no Rio de Janeiro a primeira
gráfica, e é dela que surgem as primeiras impressões de jornais. Todavia, é no ano de 1844
com o lançamento de A Lanterna Mágica que começam as primeiras publicações das
revistas com caricaturas e desenhos que atingem seu sucesso durante a ―segunda metade do
século XIX‖ (RAMOS, s/d).
Como vem sendo apontado neste trabalho, à produção de textos e imagens não
está isenta de poderes e interesses, estes elementos se fazem presentes nas diversas etapas
da sua produção editorial. As imagens postas nos periódicos brasileiros, como as
xilogravuras eram utilizadas não de forma ingênua, mas sim intencional, e objetivavam,
acima de tudo, transmitir ideias, que tendiam a elencar criticas politicas e sociais. O que
pode ser observado assim é que, ―o discurso visual‖, como define RAMOS (s/d),
desempenhava um grande papel nos jornais que circulavam no Brasil no século XIX, em
especifico na cidade de Recife, pois, possuìam um grande ―poder de ênfase e sìntese‖,
fazendo com que as criticas realizadas sobre determinados espaços da sociedade, como o
campo político, se tornassem cada vez mais forte e claro.
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Figura 1: Folheto do poeta João Athayde com imagem de artistas de cinema. Ano 1974.
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Figura 2: Folheto do poeta José Costa Leite, com imagem de artistas de cinema. Sem data de
publicação
Figura 3 Republicação do poema As aventuras de Renato e Elvira. A xilogravura retrata o casal. Sem
data de publicação
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Já no segundo caso, o poeta Manoel Camilo Rezende (s/d) anuncia uma peleja sua
com outro poeta, e para isso, utiliza um retrato do seu rosto para demonstrar a sua ―discussão‖. Ao
editar outro folheto A ressurreição do Poeta que não morreu (s/d) a mesma imagem volta a ser
reutilizada, apesar do poema girar em torno do autor, a reutilização da imagem assume outra
mensagem aborda uma outra história, ao tempo em que grava na memória dos leitores a sua
imagem, tornando-a conhecida. No último exemplo, a xilogravura que retrata uma cena de
amor, afeto entre um casal, retrata no folheto A filha do Capitão e Rufino (1973), uma cena
de amor, um romance que inunda o desenho da capa. Quando reutilizada no folheto Quem se casa
faz um laço pra colocar no pescoço, sem uma data de publicação, a imagem se reelaborar com
outra mensagem, expressa não mais um romance, mas um alerta aqueles que pretendem um dia se
unir em matrimónio.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar das discussões aqui elencadas, é preciso atentar-se para o fato de que os
poetas e editores não se prendem necessariamente a modelos ou padrões verbais e visuais.
Os sujeitos envolvidos no campo editorial também elaboram seus próprios modelos, agem
de forma a construir seu repertorio visual, buscam o ―ineditismo‖ em suas obras (RAMOS,
2007). Não cabe a generalização. Dessa maneira, é preciso ser compreendido que no
campo da literatura de cordel os diversos sujeitos inseridos na editoração deste suporte não
se prendem unicamente a modelos, eles elaboram também os seus, o que lhe é conveniente.
LITERATURA DE CORDEL
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___________. Quem se casa faz um laço para colocar no pescoço. Condado-PE: A Voz
da Poesia Nordestina, s.d.
PAZ, Romano Elias da. A Canonização do Padre Cícero Romão Batista e seus
Milagres em Vida no Juazeiro. Belém-PB: s.ed, s.d.
SANTOS, Manoel Camilo. A Ressurreição do Poeta que não Morreu. Campina Grande:
Estrela da Poesia, s.d.
___________. Discussão de Manoel Camilo com um Protestante. Campina Grande:
Estrela da Poesia, s.d.
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__________. Leitura e leitores na Franca do Antigo Regime. São Paulo: Editora
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acesso: 24/02/2015.
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RESUMO
A figura do Rei no congado ganha destaque, sua desempenho ―teatral‖, seu traje branco,
coroa na cabeça e um guarda chuva para se proteger do sol, remonta as antigas embaixadas
africanas do século XVI. Todavia, em Pombal-PB o aspecto mais festivo e de louvor ao
catolicismo tem maior expressão nas ações desta figura com significado renovado. O
objetivo deste trabalho é analisar as representações relacionadas à figura do Rei de Congo
na cidade, os aspectos simbólicos e culturais. A justificativa parte do principio de
podermos compreender melhor esse destaque do Rei e seu significado para a cultura local.
Partimos então, de uma metodologia de analise bibliográfica e do canto de embaixada dos
congos. Teoricamente o texto terá como norte as discussões estabelecidas por Roger
Chartier (1990), Marina de Mello e Souza (2006) e Roberto Benjamin (1977) acerca do
tema.
Palavras-chave: Rei de Congo; representação; cultura.
INTRODUÇÃO
73
A palavra reis de Congo é uma acentuação de documentos da época colonial onde administradores assim
se referiam aos reis constituídos no Brasil dentro das irmandades negras que eram devotas de orangos
(santos católicos de sua preferencia).
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Ao iniciarmos este tópico cabe aqui falar um pouco do contexto em que essa
realeza se insere e da historiografia sobre os reis negros que remonta a África Centro
Ocidental (Reino do Congo e Angola), onde Marina de Mello e Souza relata que ―Os
indícios para o século XVIII mostram que havia celebrações em torno de reis de diversas
nações, preferencialmente centro-africanas, mas não só7, enquanto as fontes relativas ao
século XIX falam quase só em rei do Congo‖ (2005, p. 83). Isto inca que a realeza existia
por toda África central, porem haverá de se destacar os reis de Congo, que provavelmente
tiveram uma acentuada participação nas práticas do catolicismo romano implementadas
nesta parte do continente, bem como tiveram também uma reação muito forte com o trafico
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pelo fado de haver um destaque destes nos relatos do século XIX, um momento de
acentuado trafico de africanos para as Américas, principalmente.
Esse contexto, é fundamental para entendemos como se constrói essa acentuação e
um relato mais aprofundado sobre os reis de Congo. Não que deixasse de existir outros
reis, outras autoridades, porem estes acabou por algum motivo se destacando. Talvez o
motivo seja esta presença forte de uma estruturação hierárquica romana que fez com que
adaptações fossem mais fáceis para os reis de Congo do que para outros reis. Era comum
que reis de várias nações se reunissem para festejar ou mesmo para prestar homenagens.
Sobre isso, podemos perceber o seguinte:
O relato do autor acima demonstra uma diversidade de nações com seus ritos,
cores, performances e todo um ―variado espetaculoso‖ criando encenações, danças, forma
de apresentação no dia Reis para juntas as nações, festejar o espetáculo divino que hora se
manifestava em suas ações e crenças. Estas representações, encenações são maneiras de
―enxerguemos uma variabilidade de imagens e textos produzidos historicamente e que
permitem observar as práticas sociais e estratégias dos homens no seu cotidiano‖
(CHARTIER, 1990, p. 21-25), são variações das práticas destas nações reunidas em
práticas seus ritos de fé. A dança, a musica, os trajes são representações destes reis e o
destaque do reis de Congo é a síntese da compreensão de que o universo simbólico
africano por mais que existam pontos específicos é de uma variabilidade enorme de
práticas simbólicas.
Está variabilidade também se sustenta na especificidade e na historicidade de
acontecimentos que existe no contexto dessa África Central e que aqui discutidos nos faz
perceber como a importância destes reis. E novamente Marina de Mello e Souza nos
chama a atenção quando se trata de reis de Congo para dizer que:
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As informações acima sobre o reino do Congo e sobre a realeza nela, seu poder,
suas relações e a manutenção das relações com os reis de Portugal determinaram essa
acentuação de que os reis de Congo são a expressão mais conhecida entre todas as nações
africanas existentes. O fato de um rei convertido ao catolicismo ainda criança é uma
notória demonstração do peso simbólico que estes reis desempenharam durante o processo
de cristianização da África Central junto com todas as outras formas de relações
estabelecidas sejam elas de conflitos militares, econômicos, políticos ou mesmo de uma
diplomacia demonstrada nessa representação e adoção de nomes portugueses para reis
africanos.
Há que se compreender, portanto, que não há o estabelecimento de relações
superficiais, simbólicas, mas de uma profundidade que chama a mudança de nomenclatura
do chefe local para atender um conjunto de interesses de ambos os lados. A conversão
católica é, portanto, para esse reis uma experiência que será revivenciada nos trópicos
americanos no decurso dos séculos, principalmente o século XIX, momento em que as
organizações leigas - irmandades - se constituem para formatar sua resistência cotidiana.
O aporte fundamental para isso talvez esteja na logica de que o trafico escravo foi
mais que uma atividade comercial com relação as pessoas, mas também um momento onde
houve uma reelaboração cultural transposta por essa ruptura, por essa desterritorialização.
Sobre isso, John Kelly Thornton (2004) reflete da seguinte forma:
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Figura 2: Do lado direito da imagem destaque para Francisco Tertuliano de Sousa (Chico Barro), secretário
do congado de Pombal entre as décadas de 1970 e 1980 (Imagem adaptada: capa do Documentário Sonoro do
Folclore Brasileiro - nº 18).
74
Denominação literal para aqueles que dançam ou brincam o congado.
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Durante o cortejo do Rosário, procissão que sai da ―Casa do Rosário‖ e vai até a
igreja no centro da cidade. Nela o comportamento dos congos é de acompanhar o Rosário e
dar projeção ao Rei e Rainha do Rosário que em suas mãos carregam o objeto religioso
com o devido zelo, inspirados na fé católica que os guia. Os Congos rufam seus maracás,
como sinal de sua presença no cortejo e rememorando a ritualística de sua encenação
dramática acompanhada do som deste instrumento artesanal.
Ainda no percurso do cortejo do Rosário se mantem em duas alas compostas por
trajes vermelhos e azuis, indo no meio do povo lembrando as embaixadas africanas nos
cortejos das festas religiosas tanto na África como em Portugal que encenavam dentro do
espaço normatizado da religiosidade da igreja romana sua resistência e criação de uma
identidade conjunta.
A representação do ―Reis de Congo‖ no espaço da procissão do Rosário em Pombal
é a de um monarca simbólico que ocupa seu espaço junto com os brincantes para
rememorar seu papel simbólico. Ao lado da igreja e de certa forma, abaixo dela, o é o Rei
Congo por princípio uma figura da cultura local, popular, festiva e devocional. Suas ações
estão sendo legitimadas pela igreja enquanto este faz parte da festa em louvor ao Rosário.
Sendo assim, é podemos compreender as afirmações de Marina de Mello e Souza
quando afirma que,
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Santana dá louvor
Rosário de Maria,
Enche o céu de glória,
E a terra de alegria.
Dizei, dizei, hoje nesse dia (2x),
Vamos ver o Rosário
Vamos ver Maria76
75
Cântico de embaixada dos Congos de Pombal-PB (BEIJAMIM, 1977, p. 10).
76
Cântico introdutório dos Congos de Pombal-PB (BEIJAMIM, 1977, p. 10).
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Roberto Benjamim nos faz perceber como se dá esta estruturação, como o reinado
dos Congos se apresenta e realiza sua ritualística. O rei do Congo em Pombal revela neste
sentido a simbologia de rememorar as formas africanas de identidade, isso no sentido de
que a representação da realeza passa pelo comportamento de todos no grupo compondo o
congado, suas maneiras de ser e fazer o ritual do congado. Manifesta, portanto, na
musicalidade, no cortejo dramático e em dançar com suas saias brancas e seus maracás em
punho. Demonstram assim que,
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REFERÊNCIAS
FILHO, Mello Moraes. Festas e tradições populares do Brasil. -3ª Edição, Rio de
Janeiro: F. Briguiet & Cia. Editores, 1946.
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História, n. 152, 2005, p. 79-98.
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RESUMO
INTRODUÇÃO:
77
CASCUDO, Luís da Câmara. História da Alimentação no Brasil. v. 2. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo:
USP, 1983. 926 p.
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Diante disso, buscamos ressaltar a importância cada vez mais crescente que está
sendo dada aos nossos hábitos alimentares, no universo das Ciências Humanas e Sociais.
Tendo em vista que a temática da alimentação esteve durante algum tempo às margens da
escrita da história no Brasil, uma vez que, a alimentação, assim também como as suas
práticas culturais, se constituiu em espaços e objetos privilegiados quase que
exclusivamente de estudos antropológicos, principalmente no século XIX e nas primeiras
décadas do século passado.
Entretanto, devido à grande contribuição das novas abordagens no campo da
chamada Nova História Cultural Francesa (já mencionada anteriormente), a partir do
advento da chamada Terceira Geração da Escola dos Annales, da década de 1970 em
diante, em que ocorreu uma verdadeira revolução documental no campo historiográfico,
houve uma mudança muito significativa em relação ao estudo das práticas cotidianas,
ocasionando, nos últimos anos, uma retomada da temática da alimentação, através de um
diálogo interdisciplinar com outras áreas afins, na escrita da história de nossos hábitos e
costumes alimentares.
Como bem atestam Jacques Le Goff, em “Documento/ Monumento” (1974) e
Michel de Certeau, em “A Escrita da História” (1982), ambos discorrem sobre esse
momento em que os mais variados registros da presença do homem no passado – entre eles
estão, sem dúvidas, os nossos hábitos e costumes alimentares, desde os primórdios –
passaram a serem objetos de estudo do historiador, usados, por assim dizer, para escrever a
―história nossa de cada dia‖.
Nesse sentido, dentro do campo historiográfico brasileiro, ocorreu uma maior
abertura e dialogo interdisciplinar com as demais ciências humanas, a partir da década de
1980, assim como também com as ciências do corpo – a biologia, e a nutrição, a medicina.
Assim, a questão da alimentação deve se situar no centro das atenções dos
historiadores e de reflexões sobre o processo histórico da sociedade, pois, a nosso ver, a
História é a disciplina que oferece um suporte fundamental e projeta perspectivas, quanto à
construção de uma história de nossos hábitos alimentares, perpassando as nossas práticas
cotidianas, como parte da história do patrimônio cultural do Brasil.
Para além de uma simples temática, a História da Alimentação é algo que engloba
uma série de problemáticas e reflexões que são, antes de tudo, históricas. Portanto falar de
uma história da alimentação no Brasil é mexer com o cotidiano de nossa gente, a partir dos
hábitos alimentares que possuem suas raízes, por assim dizer, no passado colonial do país.
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encontraram, no caso do Brasil, um terreno fértil para se desenvolver, mesmo que a custa
das vegetações nativas, como foi o caso da cana-de-açúcar, nos primórdios da colonização
portuguesa.
Em linhas gerais, pode-se descrever a construção de uma ―cozinha à brasileira‖,
partindo dos grandes deslocamentos populacionais e das trocas daí decorrentes, pois, ao se
deslocarem as populações levam consigo toda uma bagagem de práticas culturais
alimentares. Não somente isso, mas também técnicas, ingredientes, valores, preferências,
prescrições, e porque não, proibições (MACIEL, 2004, p. 38).
Portanto, é de grande estima que ―invocamos‖, para endossar essa discussão em
torno da construção da brasilidade alimentar, o folclorista potiguar Luís da Câmara
Cascudo, que em seu livro “História da Alimentação no Brasil” (CASCUDO, 1983, p.
926), procura analisar o processo de miscigenação alimentar no interior da cultura
brasileira através de múltiplos aspectos, sejam eles sociológicos, culturais, históricos,
biológicos e rituais, partindo das matrizes nativa, europeia e africana, apontando como a
miscigenação cultural desses povos também teve reflexo na construção da identidade
alimentar brasileira.
E, antes de tudo, Cascudo afirma que “o número de livros sobre a cozinha
brasileira, com base na pesquisa e na informação histórica, é extremamente reduzido, de
difícil leitura e confundidos com as coleções de receitas, de todas as procedências”
(CASCUDO, 1983, p. 414). Cabe aqui destacarmos a grande importância que este autor
dedicou a temática da alimentação, ao ponto de vislumbrar ―a cozinha como sendo
realmente uma arte, mas uma Arte Menor; e o ambiente da cozinha como um apaixonante
motivo de Arte‖ (CASCUDO, 1983, p. 417).
Entretanto, apesar de sua admiração profunda por essa cozinha artística, requintada
de banquetes e festins, já pomposa no período colonial, Luís da Câmara Cascudo a critica
com veemência, visto que defende uma cozinha cotidiana correspondente ao passadio do
povo espalhado pelo Brasil, pois “o povo não come galinha assada com recheio, peixes
com espinha ao molho branco (...) Come carne, farinha feijão, arroz (CASCUDO, 1983,
p. 431).
Nessa perspectiva, podemos ressaltar que a cozinha dos povos colonizadores não
erradicou a cozinha dos povos colonizados. Pelo contrário, houve uma miscigenação
cultural, entre ambas e, no caso de nossos hábitos alimentares, além das contribuições
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nativas e europeias, tivemos também a forte influência dos alimentos de origem africana,
que engrossaram o caldo do caldeirão culinário brasileiro.
Assim, o passado colonial brasileiro foi marcado por miscigenação cultural (no
tocante ao intercâmbio entre hábitos culturais de diversos povos que formam uma
determinada cultura), uma vez que nossos hábitos alimentares fazem parte de um conjunto
de bens e práticas tradicionais que nos identificam como nação ou como povo, sendo
apreciado como um dom, algo que recebemos do passado com tal prestigio simbólico que
não cabe aqui discuti-lo.
No dizer de Cascudo, “A cozinha brasileira é um trabalho português de
aculturação (transculturação) compulsória, utilizando as reservas amerabas e os recursos
africanos aclimatados (...)” (CASCUDO, 1983, p. 410). E, embora a cozinha brasileira
tenha nascido ao mesmo tempo em que nasceu o brasileiro, no século XVI, ainda conforme
o autor, os elementos que constituem a cozinha nativa contribuíram para que ela se
mantivesse poderosa e natural, distanciada, em parte, da influência acentuadamente
lusitana.
Todavia, para o folclorista potiguar, a miscigenação entre mamelucos, mulatos e
brancos europeus, entre outras coisas, acabou unificando a alimentação pela convergência
oficial dos níveis humanos, isto é, assim como seus pais, mulatos e mamelucos também se
alimentavam da comida de branco e todos bebiam, sem distinção de hierarquia social, a
cachaça, aguardente de cana, que participava de todos os pigmentos (CASCUDO, 1983, p.
432).
Pela sua influência irresistível sobre as populações nativas e africanas no Brasil
colonial, a cozinha portuguesa, como ressalta Luís da Câmara Cascudo, corroborou para
que a multidão de escravos jamais possuísse uma autonomia alimentar, já que essas
populações escravas não trabalhavam isoladas da administração senhorial.
Com isso, a cozinha brasileira torna-se, no seu ponto de vista, um símbolo nacional
de rebeldia, visto que, nos momentos de comoção revolucionária esta era usada
exclusivamente como um índice de liberdade, independência e autonomia. Portanto, a
cozinha reflete para Câmara Cascudo como:
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voltada para a exportação do açúcar, cujo cultivo da cana-de-açúcar tinha que cada vez
mais ocupar vastas extensões de terras não deixando espaços para outras agriculturas de
subsistências.
A título de ilustração, vemos que no século XVIII, com a descoberta de metais
preciosos na região das chamadas Minas Gerais, as condições de alimentação dos
habitantes da colônia portuguesa na América não melhoraram. O deslocamento exagerado
de pessoas em direção às Minas Gerais fez com que houvesse um grande desabastecimento
que acarretou numa alimentação pobre e deficiente.
Essa escassez de alimentos perdurou durante todo o período colonial, e se agravou
de tal forma, que os governadores de províncias passaram a incentivar os lavradores a
plantar a mandioca, o feijão e o milho, como tentativa de sanear a fome de grande parte da
população pobre e faminta.
Diante de toda essa pobreza alimentar, os portugueses instalados na colônia tiveram
de fazer adaptações – táticas de resistência e subsistência - para garantir sua sobrevivência
num cotidiano tão diverso, como a colônia portuguesa na América. Assim, substituíram
determinados alimentos existentes aqui no Brasil pelos que eram muito utilizados em
Portugal.
Portanto, esse quadro alimentar, caracterizado pela pobreza de nutrientes, vai
exigir do português, improvisação e criatividade contribuindo, desta forma, para
construção da mesa típica regional brasileira. Visto que como afirma Câmara Cascudo que
“a identidade alimentar não apenas fixa a continuidade cultural, mas a contiguidade do
grupo na extensão do social”. (CASCUDO, 1983, p. 43). Posto que, o que se vivencia no
cotidiano, na verdade, é resultado de uma combinação de coisas, relações, concepções e
percepções.
Se por um lado, trabalhos clássicos nas áreas da Antropologia e da Sociologia, já
abordavam o tema da História da Alimentação no Brasil, como os escritos, outrora
expostos nesse artigo, de Câmara Cascudo e Gilberto Freyre, que analisam os aspectos
culturais do Brasil – folclore, música, dança, lendas, festas, culinária, entre outros – desde
as primeiras décadas do século XX, por outro lado, já existem hoje muitos trabalhos no
campo historiográfico direcionados a essa temática, visto que a alimentação, dentro do
universo da cultura material e imaterial, é um objeto de pesquisa que possui grandes
visibilidades.
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Um exemplo desse interesse cada vez mais crescente dos historiadores pela
temática da alimentação pode ser vislumbrado no artigo de Maria Eunice Maciel (2004),
intitulado de “Uma cozinha à brasileira”. Neste artigo, a historiadora afirma que uma
cozinha é construída através de todo um processo histórico, articulando um grande
conjunto de elementos que encontram referências na tradição, pois, com muita frequência,
a criação de uma cozinha é descrita como um somatório de elementos diversos (MACIEL,
2004, p. 30).
No Brasil, essa situação é particularmente observável, sendo recorrente a ideia de
que a ―cozinha brasileira‖ é fruto de ―influências‖ de diferentes grupos sociais (em geral
indicados como ―raças‖ e/ou ―etnias‖), os quais ―contribuìram‖ harmonicamente para a sua
formação. (MACIEL, 2004, p. 34).
Sem sombra de dúvidas, quando pensamos o Brasil e todas as práticas culturais
dos seus habitantes, a primeira imagem que vem à mente é a diversidade da pluralidade de
fazeres e saberes seculares da nossa gente. E em meio a toda essa diversidade de culturas,
encontramos as ―raìzes‖ dos nossos hábitos alimentícios, no decorrer de um processo que
é, antes de tudo, histórico.
Considerando que existe uma multiplicidade de textos escritos sobre a História da
Alimentação no Brasil, abrangendo aspectos dos mais variados, como a produção,
distribuição, o preparo e consumo dos alimentos, assim como também os seus mais
variados significados sociais, políticos, econômicos, sexuais, estéticos, religiosos, etc.;
Assim, também há uma riqueza de alimentos descritos nos relatos dos cronistas e viajantes
que percorreram o território colonial português na América, do século XVI ao século
XVIII, relatando a variedade de frutos, hortaliças, vários tipos de animais e peixes, aves,
crustáceos, entre outros.
Como bem relata Henrique Carneiro em seu livro “Comida e Sociedade: Uma
história da alimentação” (2003), que a cozinha revela um microcosmo da sociedade, com
todo o significado simbólico na construção de regras e sistemas alimentares, impregnada
de cultura. Nesse livro, o autor, dentre outros assuntos, sugere aos historiadores direções
no campo da História da Alimentação, segundo as perspectivas das Ciências Humanas, que
possam revelar aspectos da vida cotidiana a partir do universo da comida. Nessa medida,
“comer não é um ato solitário ou autônomo do ser humano, ao contrário, é a origem da
socialização” (CARNEIRO, 2003, p. 71). Logo:
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78
Segundo José D‘Assunção Barros, ao fazer uma leitura de Roger Chartier, são práticas culturais não apenas a leitura de
um livro, uma técnica artística ou uma modalidade de ensino, mas também os modos como, em uma dada sociedade, os
homens falam e se calam, comem e bebem, sentam-se e andam, conversam ou discute, solidarizam-se ou hostilizam-se,
morrem ou adoecem, tratam seus loucos ou recebem os estrangeiros. A História Cultural e a contribuição de Roger
Chartier. In: O Campo da História – Especialidades e Abordagens, Petrópolis: Vozes, 2004, p. 131.
199
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Tzvetan Todorov, em “A Conquista da América: a questão do Outro”, analisa essa relação representada pelo eu
branco, cristão, europeu, civilizado e colonizador, este se mostra como agente construtor das identidades tomando por
referência seus modelos e critérios religiosos, intelectuais e culturais que a partir da linguagem (escrita) vai se
estabelecendo no meio social e gerando o lugar do outro.
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os alimentos tão estranhos aos seus paladares, mas cuja necessidade de sobrevivência
assim exigia.
Para José Martins Catharino (1995), quando da chegada dos colonizadores
portugueses à América, os indígenas já haviam resolvido o problema com seu instinto
natural, em relação à pobreza proteica da mandioca, pois faziam um concentrado muito
rico, em proteínas; fermentavam e enriqueciam a massa com vitaminas e sais minerais,
usando alguns temperos, como pimenta, sal e outros.
Nesse sentido, há, por traz deste sistema, um modo de se fazer comida e de se
comer, que fala mais do que o alimento em si, sobre as maneiras originais de conservação
nos trópicos sobre os ajustes à subsistência e à sobrevivência, sobre a negociação entre
valores como hierarquia, desigualdade e fome. Assim, um cardápio composto de uma
construção de identidades étnicas, contendo farinha de mandioca ou de milho, de peixe, um
pedaço de carne-seca e a mistura toda molhada pelo caldo do feijão, das favas ou das
verduras, constituindo um tripé culinário no Brasil Colônia (SILVA, 2005, p. 149).
No cotidiano, tanto dos colonizadores quanto dos indígenas da América
Portuguesa, nos séculos XVI e XVII, as práticas e hábitos alimentares representavam algo
muito importante, visto que havia muito que se explorar na nova conquista, aquilo que de
bom ela dava a alimentação dos que ali chegavam. Dessa feita, na longa enumeração dos
produtos alimentares da terra, a ênfase era colocada tanto na abundância quanto no sabor.
Haja vista que “as práticas culinárias se situam no mais elementar da vida
cotidiana, no nível mais necessário e mais desprezado (...)” (GIARD, 1994, p. 218), pois é
no cotidiano das pessoas que os fatos históricos são construídos, em que as trocas culturais
se manifestam das mais variadas maneiras possíveis, como no caso da necessidade que os
colonizadores tiveram de readaptar os seus paladares, a partir de táticas de resistências,
acostumados com as iguarias europeias, a um novo e desconhecido sabor, isto é ―as
80
delìcias do Descobrimento,‖ já que não tinham outras formas de conseguir alimento
estando tão distantes de sua pátria.
Portanto, pensar o cotidiano é buscar com frequência as questões que são
consagradas como rotineiras do homem ordinário, do sujeito comum que elabora seu
saber/fazer no dia-a-dia. A partir de sua prática ele constrói seus significados, dando
sentido a sua vida, que é vivenciada por meio da convivência com o coletivo. É no
80
HUE, Sheila Moura. Delícias do Descobrimento: A Gastronomia Brasileira no século XVI. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar, 2009. 207 p.
201
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cotidiano, pensado por Michel de Certeau, que o ser humano constrói seus hábitos,
costumes, rituais e táticas de sobrevivência.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala: a formação da família brasileira sob o
regime da economia patriarcal. 21. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1981. 573 p.
GIARD, Luce. A Arte de nutrir. In: CERTEUA, Michel de. A Invenção do Cotidiano:
morar, cozinhar. v. 2. Petrópolis: Vozes, 1996. p. 285-86.
LE GOFF, Jacques; NORA, Pierre. História, novas abordagens. Rio de Janeiro: F. Alves,
1974.
LÈRY, Jean de. Viagem à terra do Brasil. Belo Horizonte, Itatiaia, 1980. Cap. IX.
MACIEL, Maria Eunice. Uma cozinha à brasileira. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, nº
33, janeiro-junho de 2004, p.25-39.
SILVA, Paula Pinto. Farinha, feijão e carne-seca: um tripé culinário no Brasil colonial.
São Paulo: SENAC, 2005. 149 p.
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RESUMO
Alguns agricultores da comunidade do sítio Salgadinho de Aurora CE participam de uma
irmandade de penitentes denominados ―Ordem da Santa Cruz‘, tal grupo de homens é
repleta de simbologias, representações e misticismo importante para a religiosidade
daquele lugar. O estudo destes penitentes requer um olhar mais etnográfico e antropológico
intrinsecamente ligado a História, por isso o uso teórico-metodológico da História Cultural.
O recorte temporal fundamenta-se a partir das transformações internas da ordem da Santa
Cruz na década de 1990 a 2017. As fontes utilizadas para a análise são: fotografias e
recursos áudios visuais. Portanto é importante compreender as simbologias religiosas e
fazer uma análise cultural destes penitentes, adentrando no mundo destes homens donos de
uma missão.
Palavras-chave: Penitentes; religiosidade; cultura e missão.
INTRODUÇÃO
Os penitentes são grupos de homens que se apropriam de um aparato de ideias
místicas e religiosas que justificam suas atuações. Estes homens são identificados como
donos de uma missão, um papel simbológico perene na sua cosmogonia. O compromisso
deles é salvaguardar a comunidade dos pecados ou dissipar esses males, seja pela oração,
cânticos, promessas, rituais ou autoflagelação.
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Essa religiosidade dos penitentes é rica em atributos a partir de uma própria leitura
do sagrado provocado por fatores sociais, históricos e culturais. Essa delimitação de uma
nova e/ou outra fé no catolicismo diferenciado fundamentado na proximidade entre
sagrado e profano.
Para a pesquisadora Dra Anna Christina Farias de Carvalho em seu artigo ―Fé e
tradição oral: práticas mágico-religiosas presentes nos rituais das irmandades de penitentes
do Cariri cearense (2007)‖ defende a proposta que essa religiosidade é um encontro de
influências sociais e culturais que moldaram uma reelaboração do catolicismo e por
consequência a dicotomia sagrado e profano. Carvalho frisa:
Nesse sentido, entendemos que magia e religião são sistemas de crenças que, ao
se fundirem na perspectiva da religiosidade popular, moldam por conivência
entre o sagrado e o profano, como práticas e crenças autoproduzidas e/ ou re-
significadas (CARVALHO, 2007, p. 61).
206
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A análise dos penitentes no decorrer das décadas 1990 a 2017 é relevante para
adentrar nas simbologias e representações que carrega esses agentes culturais. Nestes anos
os deslocamentos no campo religiosidade, sociais e culturais da ordem da Santa Cruz se
edificam por meio de readaptações diante das transformações da comunidade. Diante
dessas mudanças o discurso de ―donos de uma salvação‖ se torna um elo que unifica e
atribui sentidos entre aqueles agricultores.
Para Carvalho (2003) os penitentes abrangem lugares místicos e sacros que não
negam sua essência, por isso não significa colossais metamorfoses de práticas religiosas,
para a autora é visível a fé na salvação via igreja, bíblia, santos etc. No entanto apropriação
desses aparatos sacros mesclados as especificidades da religiosidade popular
proporcionaram re-siginificações, não negações das raízes.
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Fica evidente então, a força com que a ideia de castigo divino chega ao
imaginário desse grupo de pessoas. Apesar de muito forte no imaginário da
cristandade católica, o temor a ira divina desenvolve-se com mais eficácia nesse
grupo; acreditamos que muito desse reforço aos castigos de Deus deva-se tanto
aos discursos do Padre Cícero, santo de principal devoção para o grupo, tanto
como pela assimilação das teorias inclusas na ―Missão Abreviada‖, o livro que o
penitente tremia freneticamente como um escudo, citado anteriormente
(OLIVEIRA FILHO, 2013, p.6).
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de rituais até na sede do município de Aurora CE. O que diferencia de outras comunidades
da região e até na cidade, a comunidade do Sitio Espinheiro do mesmo município são mais
―fechados‖ e se dedicam apenas aos anseios da sua localidade.
A ideia do lugar social de Certeau (1982) é tão importante ser apresentada quando
se pretende analisar culturas, por meio social é palpável e visível as experiências e o
cotidiano dos indivíduos e coletivo. Separar ou menosprezar os laços socioculturais
deixaria essa pesquisa com enormes lacunas, em suas falas, vestimentas, rituais e costumes
estão relacionados a sua comunidade, não é a toa eles trabalharem com agricultura.
Os rituais dos penitentes da ordem da santa Cruz são entrelaçados aos cultos e datas
católicas, entre eles orações na semana santa, terços e alertais 82 em outras datas sacras ou
diante de solicitações de moradores do sítio. O ato de autoflagelação tão repleto de
simbologia acontece na sexta feira santa e tem intuito de demarcar a missão primordial dos
penitentes aurorenses (a ―salvação‖), fazendo a limpeza de pecados da carne, pois o
sofrimento de flagelar é uma ponte com o que Cristo fez com a humanidade.
82
Terços mesclados a benditos e suplicas.
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(Foto 1: alertai realizado pelos penitentes da ordem da Santa Cruz Aurora CE.
Fonte:http://blogdaaurorajc.blogspot.com.br/2012/01/penitentes-de-aurora-um-
exemplo-de.html. Acesso 01/08/2017).
(Foto 2: acervo pessoal, terço de penitentes da ordem da Santa Cruz em Aurora CE.
21/03 /2017).
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Nesse sentido, o elo estabelecido entre o som que ecoava da tradição oral dos
penitentes e seus sentidos práticos revelam chaves mnemônicas, elementos que,
ao serem percebidos, logo despertavam as atenções dos devotos. Portanto, a
imagem guardada, enquanto um conceito e reconstruída na memória social sobre
os penitentes, possui relevância simbólica, no tocante às práticas de
rememoração da triste morte da Rufina. São assim memórias do som. Conforme
alguns devotos, os versos entoados nos cortejos dos penitentes foram
rememorados, entre o esforço da voz e o choro da saudade (SANTOS, 2012, p.
32).
83
Personalidade da religiosidade aurorense marcada pela memória de um assassinato cruel, para a população
local é uma ―santa‖.
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CONCLUSÃO
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Os penitentes do sítio Salgadinho de Aurora CE são uma ordem sacra que tem um
laço forte com o sagrado. Essa ligação é fruto de uma mescla de discursos baseados numa
ortodoxia católica mesclada com elementos populares. A princípio os grupos de penitentes
na região do Cariri cearense eram muitos grupos, diante da pesquisas atuais são poucos que
se mantêm diante da atualidade. A década de 1990 até 2017 no município de Aurora CE de
inúmeras ordens de penitentes em zonas rurais restam duas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CALIXTO JR, João Tavares. A Venda Grande d‟Aurora. 1. Ed. Fortaleza. Expressão
gráfica Editora, 2012.
CARVALHO, Anna Christina Farias de. Fé e tradição oral: práticas mágicos- religiosas
presentes nos rituais dos penitentes do cariri cearense. Oralidades, 2, 2007, p. 61-82.
CARVALHO, Anna Christina Farias de. Sob o signo da e da mística: um estudo das
irmandades de penitentes no Cariri Cearense. 1. Ed – Fortaleza: Editora IMEPH,
2011.Disponível://www.acsrm.org/interactivo/fscommand/GT05_FariasAnnaChristina.pdf.
Acesso 28/03/2016.
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DOS SANTOS, Cícero Joaquim. A cruz que alumeia o mundo: narrativas memoráveis
sobre os penitentes e a devoção à Cruz da Rufina, no sul do Ceará. Revista Brasileira
de História & Ciências Sociais Vol. 4 Nº 7, Julho de 2012. Disponível
https://www.rbhcs.com/rbhcs/article/view/119. Acesso 26/02/2016.
NOBRE, Edianne Santos. Festas e praticas religiosas no Cariri Cearense nos relatos de
viagem (século XIX) - anais do III Encontro do GT História das religiões e religiosidades.
IN: Revista Brasileira de História das Religiões. Maringá (PR). V. III, n9, jan/2011.
Disponível em: http://www.dhi.uem.br/gtreligiao/pub.html. Acesso: 27/02/2016.
TAVARES, Amarílio Gonçalves. Aurora: História e Folclore. 2ª Ed. João pessoa PB,
Avantes. 1999.
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RESUMO
Na sociedade contemporânea, a profissão docente exige cada vez mais de seus
profissionais. Os professores, principalmente os da rede pública de ensino, precisam estar
lotados em várias instituições para que a sua dedicação diária seja minimamente
recompensada. A priori, pretende-se nesse artigo, explorar os elementos políticos e sociais
que influenciam na determinação da carga horária de trabalho dos professores, como
também nas formas de sua organização. Dessa forma, usaremos como aporte teórico Tardif
e Lessard (2008), buscando evidenciar os fatores que influenciam nesse processo. Assim,
reconhecer a potencialidade da mediação pedagógica, numa ação transformadora que
insere o sujeito no campo das possibilidades, evidencia a necessidade de criar políticas que
estabeleçam efetivamente a valorização do trabalho docente.
Palavras-chave: Formação docente; Ensino-aprendizagem; Desafios.
INTRODUÇÃO
84
Graduando do curso de Licenciatura em Pedagogia na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG-
CFP), bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID-CAPES), membro do
Grupo Interdisciplinar de Estudos e Pesquisas em Educação, Linguagem e Práticas Sociais (GIEPELPS-
CNPq).
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todos os dias em busca de melhorias que podem ou não acontecer. É trabalhar no campo
das incertezas e acreditar que a semente plantada dará frutos e reproduzirão o mesmo afeto.
Trabalhar numa concepção humanística, dialógica, otimista pode ter seu preço, mas para
construir uma sociedade humanizada qualquer valor é baixo.
Assim, evidenciamos a formação docente desde o início como uma profissão que
está estreitamente vinculada ao ser social, ao seu contexto, as suas limitações, é nesse
sentido que ser professor é uma tarefa árdua pois requer empatia, precisa-se gostar do que
faz e fazer com amor. Como nos mostra (TARDIF, 2002, p. 130) ―uma boa parte do
trabalho docente é de cunho afetivo, emocional. Baseia-se em emoções, em afetos, na
capacidade não somente de pensar nos alunos, mas igualmente de perceber e sentir suas
emoções, seus temores, suas alegrias, seus próprios bloqueios afetivos‖.
Nesse aspecto, o docente precisa não apenas dirigir seu olhar ao ensino, mas ao
processo que constitui a ação de ensinar, isto é, as relações que devem ser constituídas
durante uma mediação pedagógica, as representações que são construídas diante do aluno
no processo de aprender a aprender. Devemos compreender a singularidade de ensinar,
devemos evidenciar que ensinar não é transferir conhecimento, mas oportunizar a sua
construção (FREIRE, 2011), precisamos colocar-nos sempre na posição de aprendiz para
que a aprendizagem seja uma ação mútua, coletiva e dialógica, nunca centralizada e
autoritarista.
É nesse aspecto que reside no professor a competência para visualizar no sujeito a
predisposição para aprender e ensinar. Aprender a aprender deve ser sempre ressignificar o
conhecimento que se sabe ao desconhecido. Não deve ser descartada a bagagem social,
cultural e intelectual que o sujeito traz consigo de casa para a escola, mas sim, deve ser
visualizada como uma oportunidade para conhecer novas manifestações de conhecimento,
experiências que são constituídas no âmago das vivências particulares de cada sujeito.
Com isso, evidenciamos a necessidade de estar sempre suscetível a novas
possibilidades, a trabalhar de modo interativo, coletivo, construindo cada conhecimento de
modo constante, concreto. Os desafios para a atuação docente de modo institucionalizado
são inúmeros, então resta-nos trabalhar com a contextualização do conhecimento, investir
na relação professor-aluno, na assimilação do conhecimento, nas trocas de experiências.
Assim, devemos trabalhar com o grupo, com as especificidades de cada um e construir
conceitos a partir do que nos é colocado, como nos esclarece Tardif:
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O professor tem que trabalhar com grupos, mas também tem de se dedicar aos
indivíduos; deve dar sua matéria, mas de acordo com os alunos, que vão
assimilá-la de maneira muito diferente; deve agradar aos alunos mas sem que
isso se transforme em favoritismo; deve motivá-los, sem paparicá-los; deve
avaliá-los, sem excluí-los, etc. Ensinar é, portanto, fazer escolhas constantemente
em plena interação com os alunos. Ora, essas escolhas dependem da experiência
dos professores, de seus conhecimentos, convicções e crenças, de seu
compromisso com o que fazem, de suas representações a respeito dos alunos e,
evidentemente, dos próprios alunos. (2002, p. 132).
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A competência docente não é tanto uma técnica composta por uma série de
destrezas baseadas em conhecimentos concretos ou na experiência, nem uma
simples descoberta pessoal. O professor não é um técnico nem um improvisador,
mas sim um profissional que pode utilizar o seu conhecimento e a sua
experiência para se desenvolver em contextos pedagógicos práticos pré-
existentes. (1991, p. 74).
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CONSIDERAÇÕES PROVISÓRIAS
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prática dialógica e humanística. Dessa forma, o professor precisa em sua prática docente
permitir que o aluno esteja incluído nesse processo, não apenas sendo submetido a ele, mas
possibilitando a sua produção.
Com isso, compreendemos os desafios da profissão docente e os dilemas que
constituem sua formação como questões que buscam fragmentar uma prática que
potencialize os conhecimentos dos discentes. Nesse aspecto, a carga horaria de trabalho do
professor se caracteriza como instrumento que pode minimizar ou oportunizar uma
mediação docente comprometida com o crescimento intelectual do sujeito discente.
Portanto, compreender o processo de formação como atividade contínua e
evidenciar no aluno a predisposição para aprender e ensinar, deve ser um compromisso
social com o trabalho docente. O professor não pode centralizar-se como detentor do
conhecimento, mas como mediador do saber, como sujeito que possibilitará a construção e
a dialogicidade. Deve-se nesse sentido, primar pela valorização de uma abordagem
coletiva, que visualize nas experiências socioculturais uma oportunidade para construir
aprendizagens significativas.
REFERÊNCIAS
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 43. ed.
São Paulo: Paz e Terra, 2011.
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RESUMO
INTRODUÇÃO
Essa questão foi elaborada tendo em vista a contexto histórico no qual o movimento
hip hop teve início e tem se desenvolvido. Quanto à educação, sabemos que esse
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Sob uma visão sociológica o movimento hip hop foi interpretado como expressão
artístico-político. A crise econômica sofrida por vários países, a exemplo dos Estados
Unidos da América, ainda em consequência da segunda guerra mundial, ocasionou
diversos problemas: desemprego, corte dos serviços públicos, aumento da violência
urbana. Assim, em meados da década de 1970, os Estados Unidos da América, já se
configurando como uma das principais potencias mundiais, colocam em prática as políticas
neoliberais visando estabilizar a economia do país. Tais problemas, entre outros, causaram
efetivos efeitos na vida dos jovens pobres dos guetos e periferias daquele país e foram de
extrema relevância para a criação do Movimento Hip Hop, assumindo um caráter político,
artístico, cultural e social. Sobre a criação desse movimento, afirma Santos (2011, p.17):
Foi em meio a esse contexto de crise econômica, aumento dos problemas sociais
e desestruturação urbana que surgiu o hip-hop. Criado por jovens negros e
pobres dos Estados Unidos, inicialmente na cidade de Nova York, o hip-hop é a
união de rap (música), break (dança) e grafite [...]. Todavia, para além da
literalidade do conceito, essa manifestação foi utilizada como instrumento de
resistência, alternativa de lazer e transformou-se num movimento político-
cultural de uma parte considerável da juventude negra e pobre americana e, a
partir dos anos 1980, em muitos outros países.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
movimento hip hop enquanto agente educativo, buscando mostrar que esse movimento tem
importância cultural e educativa para as minorias sociais e políticas que não tiveram a
oportunidade de receber uma escolarização justa e igualitária. Assim objetivamos também
explicitar a necessidade de que o hip hop seja debatido e mostrado no âmbito escolar,
dando ênfase ao seu caráter de militância politizadora e de conscientização social,
retratando a cultura negra, mostrando-a do ponto de vista das pessoas que sofrem diversos
tipos de preconceitos como exclusão social, cultural, violência policial, discriminação
racial entre outros, valorizando também a cultura afrodescendente que está arraigada no
movimento hip hop.
85
As leis de Jim Crow foram leis locais e estaduais, promulgadas nos Estados do Sul dos Estados Unidos,
que institucionalizaram a segregação racial, afetando afro-americanos, asiáticos e outros grupos étnicos.
Vigoraram entre 1876 e 1965.
86
Malcolm X foi um dos maiores representantes na defesa dos direitos dos negros nos Estados Unidos.
Nascido no dia 19 de maio de 1925 na cidade de Omaha, Malcolm Little era filho de Earl Little e de Louise
Little. Ver mais em: <http://www.infoescola.com/biografias/malcolm-x/>
229
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Também foi fundado o partido dos Panteras Negras com o intuito de dar continuidade às
lutas as quais vinha sendo exercidas em prol da população negra, com ideologias de caráter
socialista e anticapitalista, que buscava dar voz a comunidade afro-americana.
Após o assassinato de Martin Luther King a maioria da população negra
―despertou‖, o partido criou mais forças com a mobilização em massa da população negra,
assim trazendo mais pessoas que contribuíam nas lutas contra as políticas segregacionistas.
Porém devido o partido ser considerado radicalista pelas autoridades da época, chegando
ao ponto de lutar pelos seus direitos através de forças armadas, houve perseguições e
investigações por parte do Departamento Federal de Investigação dos Estados Unidos
(FBI) e gradativamente o movimento foi também perdendo forças por conta de motivos
políticos governamentais, na tentativa de extinguir as lutas afro-americanas.
Eis que em meio a esse cenário, surgiu o movimento social que objetivava expor os
problemas que a população negra vinha enfrentando, o movimento hip hop. Este foi
influenciado pelas lutas que já haviam sido travadas contra o sistema governamental
opressor.
Embora o senso comum localize o surgimento do movimento hip hop nos Estados
Unidos, este tem origem em outro país, a Jamaica, onde teve início por volta da década de
1940. No final da década de 1960 e início da década de 1970 começou a haver a migração
de jovens jamaicanos para os Estados Unidos devido à crise que a ilha passava, grande
parte desses jovens se alojava nos subúrbios norte-americanos. Os jovens imigrantes
começaram a realizar eventos festivos semelhantes aos que realizavam na Jamaica e que
eram conhecidos como Black Parties, isto é, festas nas quais majoritariamente quem as
frequentava era a população negra e de situação econômica desfavorecida. O movimento
hip hop viria a surgir em meio a esse cenário no qual, de início, era uma forma simples
dessa população que sofria com as políticas segregacionistas e lutavam contra o sistema
capitalista, realizar atividades de lazer.
Porém como esse período foi marcado pelas políticas segregacionistas e de
opressão racial ou socioeconômica, entre outras, o movimento viria a ser usado como
forma de expressão em prol da luta contra essas diversas situações e também como forma
de educação não-formal, orientando a população que estava engajada no movimento. Foi
87
Martin Luther King Jr. foi um importante pastor evangélico e ativista político norte-americano. Nascido na
cidade de Atlanta em 15 de janeiro de 1929. Em 14 de outubro de 1964, recebeu o prémio Nobel da Paz em
função de seu trabalho, combatendo pacificamente o preconceito racial nos EUA. Ver mais
em:<http://www.suapesquisa.com/biografias/luther_king.htm>
230
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
então que o hip hop surge como resposta aos problemas enfrentados pela população dos
bairros pobres de Nova York como o Bronx, Harlem e Broonklyn, entre outros. Com a
marginalização vivenciada nesses bairros, o hip hop surge como movimento cultural-
político, ou seja, como reação a situação que sofriam. Nesta perspectiva, como assinala
Ivan Messias (2008), o termo hip hop significa movimentar-se político-esteticamente.
Os elementos que compõem o hip hop e que já existiam em manifestações culturais
da Jamaica como forma de diversão e lazer, são: O Rap (rythm and poetry) é um relato
musical por meio de ritmo e poesia com letras improvisadas; o DJ (disc jockey) fica
encarregado de mixar as músicas e fazer o ritmo envolvente do rap; o MC (máster of
cerimonies) é o responsável por relatar todos os problemas da comunidade e experiências
de vida, assim alertando e orientando os que escutam suas rimas; o B. boy (break boy) é o
elemento que representa o movimento por meio das expressões corporais, ou seja, por
meio da dança de rua, seja street dance, break, entre outros estilos; e por último o elemento
Grafite que é mostrado por meio da arte de pinturas em muros, trens e locais públicos de
fácil visibilidade.
Assim, com a junção desses elementos já utilizados antes na Jamaica para a
realização de festas e momentos de lazer dos jovens, foram compostos a cultura e o
movimento hip hop, que com a sua migração foi instaurada nos Estados Unidos. A partir
das lutas e movimentos sociais o hip hop proporcionou e deu chances para que a população
negra envolvida pudesse expor suas aflições, porém o hip hop tomou proporções
gigantescas, não se atendo somente ao público dos Estados Unidos. Sobre a expansão do
hip hop para além dos EUA, Ivan Messias afirma:
231
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Deste modo surgiram vários grupos no Brasil, da mesma forma como ocorreu nos
Estados Unidos, o movimento aqui no nosso país também teve a pretensão de servir à
conscientização das populações de zonas periféricas sobre a importância do seu
engajamento no cenário político, sempre buscando fomentar essa orientação por meio da
arte que a cultura hip hop proporciona. Apesar de ser aceito por parte da população
marginalizada, pelo motivo de não está diretamente ligado ao ambiente escolar e também
pelo fato de ter surgido no meio da população negra, o movimento hip hop não foi aceito
positivamente pela sociedade. Porém o rap foi sendo difundido por alguns grupos que
foram fazendo sucesso e conquistando a mídia nacional, tais como Thayde e Dj Hum, logo
em seguida Racionais Mcs, Detentos do Rap, Câmbio Negro, Sabotage, entre outros.
Todos sempre com a ideologia de contestação do estado político atual, mostrando a
realidade da vida das pessoas que moram nas periferias e o que sofrem, como a violência
policial, falta de oportunidade educacional e cultural, expondo a criminalidade e sempre
buscando a inclusão social da população que tem sofrido com essas questões.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Logo, devido a educação formal seguir esse padrão estrutural e burocrático, esta
não tem dado espaço para aspectos educacionais diferenciados, como é o caso do
movimento hip hop. Foi por esse motivo que o mesmo não tem tido lugar no âmbito formal
da educação escolar, mas também há a questão relacionada ao preconceito e
marginalização do movimento e as questões políticas que dificultam a sua entrada na
estrutura da educação formal. Existem, todavia, diversos casos e exemplos da junção entre
a educação formal e o movimento hip hop.
Um dos casos bem-sucedido de integração entre escola e movimento hip hop é o
exemplo do professor Pablo88, formado em química pela Universidade Presbiteriana
Mackenzie, de São Paulo, e morador do bairro Capão Redondo. Porém, antes de tudo,
devemos compreender que o seu exemplo não deve ser tido como verdade única e
absoluta, pois o fato do caso ter ocorrido com sucesso não significa que este se aplica e
muito menos representa toda instituição escolar e todo movimento hip hop. Mas com
certeza é uma prova de que a junção entre esse movimento e essa instituição pode ser
adotada.
O envolvimento do professor Pablo com o movimento hip hop veio exatamente por
ser um jovem negro de zona periférica. Na comunidade onde morava foi um dos poucos
que conseguiu concluir o ensino médio e entrar na universidade e após a sua formação
como professor de química, viu que como ele, aqueles jovens de zona periférica também
tinham capacidade de entrar no ensino superior, mesmo contando com todas as
dificuldades encontradas como o não acesso a uma educação de qualidade, baixas
88
Professor Pablo – Blequisploiteixion é o título do segundo álbum do Professor ―rapper‖ Pablo. O tìtulo tem
o título de um movimento que foi a revolução do homem negro dos Estados Unidos nas grandes telas, com
filmes onde eles eram os atores principais. O movimento chamado de ―Blaxploitation‖ começou no início dos
anos 70 e foi adaptado a nossa gramática por um professor de química que canta Rap. Assim como o
movimento cinematográfico, Pablo, desde o seu primeiro disco, procurou mostrar o negro no papel principal
e sem estereótipos. Entrevista em vídeo sobre a sua história, ver em:
<https://globoplay.globo.com/v/2104867/>
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
condições financeiras, falta de inclusão social e cultural, entre outros fatores negativos.
Assim esse professor decidiu realizar palestrar motivacionais e de conscientização social
com um grupo de amigos nas escolas, criando um pequeno projeto idealizado por eles, no
qual buscava mostrar aos jovens que apesar das dificuldades encontradas era possível
―vencer na vida‖ por meio dos estudos, sempre mostrando para aqueles jovens que o maior
ato de rebeldia contra o sistema para quem nasce pobre é estudar. Porém, não teve êxito de
início nessas palestras. Diz o Professor Pablo (2012):
Quando chegávamos nas escolas, eu mais três amigos, todos negrões, de jaqueta,
o pessoal jurava que era show de rap, então ficava uma galera atenta olhando, aí
quando a gente começava a conversa já tinha uma galera falando, não quero
ouvir isso e fugiam, então comecei a perceber que se a gente chegasse e cantasse
iriamos mobilizar muito mais gente.
Esta situação levou o professor Pablo a escrever as suas primeiras letras de rap e
viu que era possível haver essa ligação do ambiente escolar com o rap, na qual é possível
também aprender por meio da música, principalmente para os jovens de periferia, pois o
contexto descrito nas letras das canções é contexto social, econômico e cultural no qual a
grande maioria dos jovens pobres de periferia está inserido. Ele deu continuidade a sua
carreira de professor e agregou a de rapper, na qual seu nome artístico ainda continuava o
mesmo enquanto docente: ―Professor Pablo‖. Foi como ficou conhecido, realizando ações
sociais, palestras sobre cidadania, violência, assuntos da periferia em geral em escolas e
comunidades carentes.
A educação não formal se diferencia da educação formal, embora ambas tenham, a
princípio, o mesmo objetivo, que é o de educar o cidadão para viver em harmonia no meio
social, despertar o senso crítico e a consciência acerca dos seus direitos e deveres perante a
sociedade. Porém os métodos para a execução do ato educacional são de certa forma
diferenciados. Como vimos anteriormente, para que ocorra a educação formal é necessário
haver a sistematização e burocratização do processo, e uma das principais características
da educação não formal é especificamente essa, a questão de não necessitar seguir esse
sistema, no qual a educação se dá por meio das instituições tais como escolas e
universidades. Segundo Gohn (2006, p. 2), a educação não formal é aquela que:
234
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
É considerando a especificidade apontada por Ghon que o movimento hip hop tem
o seu lugar dentro da educação não formal, pois desde a sua origem o movimento buscou a
fomentar a orientação política dos direitos pertencentes aos cidadãos, realizando atividades
comunitárias voltadas para a solução dos problemas coletivos na sociedade. Sendo assim,
consideramos a educação não-formal como um dos núcleos básicos de uma Pedagogia
Social (GOHN, 2006). A educação não-formal é também uma atividade educacional
organizada e sistemática, mas levada a efeito fora do sistema formal. Daí também alguns a
chamarem impropriamente de ―educação informal‖ (GADOTTI, 2005). De acordo com o
que os autores afirmam é possível compreender que a educação formal e não formal estão
intrinsicamente ligadas, com alguns fatores que as diferenciam, mas o objetivo de ambas é
sempre o mesmo, a educação do cidadão para agir em prol da sociedade.
Na educação formal o principal mediador do conhecimento é o professor, mas na
educação não formal e mais especificamente no movimento hip hop quem seria esse
mediador do conhecimento? O rap (ritmo e poesia) que é uma das vertentes do hip hop e
pode ser considerada a ―voz‖ do movimento, alguém que se aproximaria da figura do
professor no cenário da educação não formal seria o rapper, com suas composições
poéticas em formato musical fazendo relatos ou orientações educacionais em prol das
comunidades.
No cenário atual da música brasileira ainda existem muitos artistas com o espírito
que o movimento hip hop proporcionou no início da década de 70, que foi o de passar o
conhecimento, conscientizar e dar o poder de militância política para aquelas minorias que
não tiveram a oportunidade de receber adequadamente a educação formal. Artistas como
Gabriel o Pensador, Fábio Brazza, Racionais Mc‘s, Eduardo e outros ainda tentam fazer o
papel do ―professor‖ dentro do movimento hip hop, entre esses será citado o exemplo do
Mc Marechal.
Rodrigo Vieira, mais conhecido como Mc Marechal, há mais de quinze anos como
rapper lutando dentro movimento hip hop no Brasil, nunca se submeteu à mídia na
tentativa de ocultar as verdades que são expostas em seus versos sobre o sistema opressor
que desfavorece em geral as populações de classes pobres e de baixo poder econômico.
Desde o início quando entrou no movimento seu foco foi buscar educar e politizar as
comunidades nas quais realizava seus shows. A partir dessa ideologia, foi então que em
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
2012 ele reverteu um dos seus cachês para a compra de livros com o intuito de distribuí-los
em seu próximo show, ele viu que a reação do público foi positiva e isso o levou à ideia de
criar o Projeto livrar89. Livrar vem da junção das palavras ―livro‖ e ―levar‖, e remete à
essência da perspectiva libertária, um dos cinco elementos da cultura hip hop.
No ano de 2016 o projeto completou quatro anos de sua criação, e com uma marca
expressiva de mais de 5.000 livros distribuídos gratuitamente, possibilitando assim a
difusão de conhecimento e proporcionando a leitura para muitos jovens de zonas
periféricas que nunca tiveram a oportunidade de receber um livro em mãos. São exemplos
como ações desse tipo realizadas pelo Mc Marechal que nos possibilita ver que a educação
por meio da música rap é possível, seguindo a linha educacional não formal, na qual ocorre
no âmbito extraescolar, que apesar de sofrer ainda com a marginalização do movimento é
possível fazer essa ligação entre escola-rap-educação.
Em uma de suas músicas o rapper Mc Marechal busca passar a mensagem referente
ao projeto por ele fundado. Também existem diversas outras mensagens como a que retrata
e resgata a cultura africana, a exemplo da música intitulada ―Griot‖ 90. Nesta o MC faz
denúncias e críticas ao nosso sistema educacional e aos métodos de ensino atrasados, no
qual somos ―escravos‖ da reprodução, não existindo o incentivo ao raciocìnio livre para
criar, criticar ou inovar.
89
Projeto Livrar é uma ação de distribuição de livros idealizado pela escritora e produtora cultural Lâmia
Brito e pelo músico e produtor musical Mc Marechal. As distribuições acontecem em shows do selo musical
#VVAR e os objetivos são o fomento a leitura, a descoberta de novos leitores e garantir a visibilidade aos
autores desses livros. Ver mais em:<www.projetolivrar.com.br>
Vídeo sobre o projeto:<https://www.youtube.com/watch?v=0N7tNleWS3I>
90
Os Griots, são indivíduos que tinham compromisso de prescrever e transmitir histórias, fatos históricos, os
conhecimentos e as canções de seu povo. Existem gritos músicos e gritos contadores de histórias. Eles
ensinavam a arte, o conhecimento de plantas, tradições, histórias e davam conselhos aos jovens príncipes,
eram responsáveis por transmitir a tradição e a cultura. Vivem hoje na África ocidental.
236
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Pelo fato da instituição escolar seguir um padrão curricular de ensino no qual não
abre espaços para as diversas formas educacionais, como por exemplo, o movimento hip
hop que pode ser usado no âmbito educacional, a difusão das práticas educacionais que o
movimento proporciona são dificultadas e barradas na escola. Porém para compreender
melhor como ocorre esse tipo de educação diferenciada, outro exemplo que podemos citar
é o projeto extraescolar ―Programa Escola Aberta‖, realizado nas zonas periféricas de
Recife, que fez essa relação entre a escola e o movimento hip hop, possibilitando a
participação das comunidades na escola por meio de oficinas, práticas educativas e
sociopolíticas.
Este projeto foi realizado com pessoas de baixa renda em comunidades nas quais a
escola está inserida e apresenta inúmeros tipos de problemas como carência em relação aos
serviços de saneamento básico, equipamentos de lazer e estrutura de urbanização como
transporte, segurança pública, água tratada, além de outros fatores que dificultam a entrada
e permanência dos alunos na escola. As práticas realizadas pelo projeto contribuem para
uma nova visão de mundo, despertando o senso crítico acerca da realidade vivenciada
pelos jovens e são formadas ações participativas e mobilizadoras, como forma de garantir
que os princípios e os valores que nutrem o movimento circulem e transformem a cultura
política desses jovens (MENEZES et al., 2010).
237
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Deste modo, podemos perceber que o movimento hip hop busca desenvolver e
seguir um padrão diferenciado do que a escola, de praxe, repassa para exercer o ato
educacional. O movimento busca interagir com os alunos por meios lúdicos, sempre
visando à interação direta entre aluno, professor e material didático, possibilitando a
entrada de conteúdos que serão debatidos nas escolas e que despertam o interesse dos
alunos no que se refere a sua realidade e contexto cultural de onde estão inseridos. Assim,
alguns temas, tais como sexualidade, drogas, ação policial e violência contra a mulher
238
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cativa de modo efetivo o interesse nos jovens (MENEZES et al., 2010). Esses são temas,
entre outros, que a escola, com a sua rigidez curricular, dificilmente coloca em livre
discussão junto aos alunos. Julgamos ser necessário que haja na escola a discussão das
questões mais prementes que afetam a vida dos jovens estudantes pobres, negros,
moradores de periferia, ou seja, temas que de fato retrate a realidade no qual o aluno se
encontra e que possa ser visto por ele como algo que será um aprendizado útil para a sua
vida e seu contexto social.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
MESSIAS, I S. Hip Hop, Educação e Poder: O Rap como instrumento de educação não-
formal. 2008. 157 f. Dissertação Mestrado (mestrado) – Universidade Federal da Bahia.
Faculdade de Comunicação, Salvador, 2008.
Professor Pablo. Programa Jô Soares. Entrevista. Vídeo (17mn). 2012. Disponível em:
https://globoplay.globo.com/v/2104867/. Acesso em: 28 de setembro de 2016.
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RESUMO
O objetivo do presente texto é discutir a inclusão escolar enquanto práxis, destacando sua
historicidade e problematizandosuas relações estabelecidas com a sociedade
contemporânea. Este artigo se ocupa em analisar os impactos da inclusão e o tratamento
que a sociedade emprega a essa questão, tomando como referência a escola CEEIGEF
(Centro de Educação Especial Integrada Geny Ferreira), que é uma instituição
discursivamente inclusiva, localizada na cidade de Sousa-PB. Para tecer tais reflexões,
tomara-se como referência as perspectivas de Foucault (2001) Lopes (2011), Díaz (2012),
entre outros pesquisadores, que possuem importantes reflexões na área.
Palavras-Chave: Inclusão Escolar. Sociedade. Educação. Desafio.
INTRODUÇÃO
Cada sociedade tem seu regime de verdade, sua "política geral" de verdade:
isto é, os tipos de discurso que ela acolhe e faz funcionar como verdadeiros;
os mecanismos e as instâncias que permitem distinguir uns e outros; as
técnicas e os procedimentos que são valorizados para a obtenção da verdade;
o estatuto que têm o encargo de dizer o que funciona como verdadeiro.
(FOUCAULT,1998, p.12)
241
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longe de se território, de sua lìngua, de sua sexualidade, de seu gênero‖ (SKLIAR, 2003,
p.45).
Desse modo, ―(...) o desafio é estender a inclusão a um número maior de escolas e
comunidades e (...) ter em mente que o principal propósito é facilitar e ajudar a
aprendizagem‖. (STAINBACK, 1999, p.12).
Não é desejo dos princípios inclusivos disfarçar as necessidades especiais e
específicas dos discentes, ao contrário é reconhecendo essas particularidades que a
inclusão promove a atividade de englobar todos em um só sistema. Considerando que,
―Não se compreende, hoje, uma Educação especial para uma fatia de crianças jovens, não
se compreende que seja necessário separar as pessoas para as educar, para as ensinar a
viver com os outros, para as juntar depois‖. (SANCHES, 2006, p.68). A inclusão não se
faz na delimitação de territórios, para cada aluno. Não há sistematização e nem separação
no decorrer do processo de ensino e aprendizagem, pelo fato de que a inclusão acontece
quando as necessidades e as normalidades ditas se mesclam e se juntam para a aquisição
do s saberes.
Nesse contexto complexo, o CEEIGEF (Centro de Educação Especial Integrada
Geny Ferreira) integra um panorama de instituições que acredita que o ensino precisa
abrir-se para o novo, para o improvável e descontínuo, pois é preciso sair dessa zona de
mesmice, que só leva à práticas antiquadas, para trilhar novos caminhos e novas formas de
aprender e ensinar, que garantam uma aprendizagem múltipla e dinâmica.
A instituição denominada Centro de Educação Especial Integrada Geny Ferreira,
criada em 04 de março de 1990, foi fundada e idealizada pelo casal Geny Ferreira de Sousa
e Aloysio Rodrigues de Sousa. Esta instituição foi uma reformulação estrutural e
ideológica da então Escola Saci Pererê; localizada na rua Raimundo Braga Rolim,22, no
bairro Dr. Zezé, Sousa-PB, CEP.58804-490.
A Escola Saci Pererê era privada e recebia as crianças de bairros vizinhos, no curso
de pré-escolar e alfabetização. No ano 1992, a Sra. Geny Ferreira de Sousa, encontrava-se
só a frente dos trabalhos, tendo em vista que Sr. Aloysio Rodrigues de Sousa, que até então
era tido como diretor da escola, havia se afastado da família e consequentemente da escola.
No ano, de 1993, foi implantado o trabalho de inclusão e a escola passou a atender pessoas
com várias deficiências. Uma vez que mudou o trabalho, modificou também o nome da
escola, passando a ser: Escola Especial de 1º Grau Saci Pererê, e em 1996, passou a
atender o ensino infantil/inclusivo, e ensino fundamental/inclusivo. No dia 09 de agosto de
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
1999, por via de consequência, foi necessário mudar a razão social da escola, a partir dessa
data passou a ser Centro de Educação Especial Integrada Geny Ferreira (CEEIGEF).
Esta escola enfrenta muitos desafios, entre eles o da formação de seus funcionários.
Apesar de que, os próprios documentos que regem a educação brasileira discutem tem
buscado dar subsídios para as escolas praticar a inclusão, o que ainda precisa ser efetivado
na prática.
Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB, de 1996, são
conjecturados ―professores com especialização adequada em nìvel médio ou superior, para
atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a
integração desses educando nas classes comuns‖. (Art. 58, III). Isto é, a tal lei permite
formação em nível médio, o que vai a contrapartida com a orientação geral para o
magistério, que, aliás, tem exigido e motivado a formação no ensino superior.
Sabe-se que ―A compreensão dos pressupostos que perpassam a práxis do professor
e a racionalidade pedagógica que fundamenta o trabalho docente implica perspectivas
teórico-metodológicas cujo olhar permite apreender a epistemologia da prática docente
(...)‖. (THERRIEN; CARVALHO, 2009.p.130). Nesse sentido, a racionalidade que deveria
orientar o trabalho pedagógico é uma junção dos princípios da teoria e da prática.
Diante disso, ao longo deste artigo discutiremos as práxis pedagógicas utilizadas
pelo corpo docente da escola CEEIGEF no desafio de empreender uma educação inclusiva.
Nesse sentido, não nos interessa apenas os aspectos teóricos, mas os operacionais usados
pelos docentes para enriquecer e tornar o ambiente de aprendizagem ainda mais profícuo.
É interessante problematizar os aspectos teóricos e metodológicos que orientam a
prática pedagógica dos professores da escola em questão. Para isso, será de fundamental
importância analisar documentos em que apareçam esses anseios, além de ouvir os relatos
do corpo docente da escola.
Assim, pretende-se aqui discutir o conceito de inclusão, com ênfase no Centro de
Educação Especial Integrada Geny Ferreira (CEEIGEF), problematizando a práxis desta
escola. Esta reflexão, ora proposta, integra uma pesquisa de Trabalho de Conclusão de
Curso. Desse modo, não pretendemos abarcar neste artigo, de forma extensa todas as
problematizações defendidas pelo TCC.
INCLUSÃO
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A inclusão parece ser questão própria da nossa sociedade atual, no entanto ―seus
usos estão registrados desde os séculos XVI e XVII. Pela etimologia, sabemos que
inclusão foi usada na Academia dos Singulares de Lisboa já em1665‖. (LOPES, 2011,
285). Nesse sentido, o termo e a discussão sobre inclusão não parecem ser tão novos.
No Brasil, o debate sobre a inclusão remonta o século XVI, ―com médicos e
pedagogos que, desafiando os conceitos vigentes na época, acreditaram nas possibilidades
de indivìduos até então considerados ineducáveis‖. (MENDES, 2006, p.387)
O que mudou com o passar dos anos foi a forma de se conceber a inclusão. ―Os
seus usos, então, eram diferentes daqueles que vimos circular bem mais tarde,
principalmente se colocarmos como marco a Conferência de Educação para Todos,
ocorrida em 1990, em Jontiem na Tailândia‖. (LOPES, 2011, 285). Essa Conferência é um
dos mais importantes símbolos da luta pela garantia de educação para todos, acolhendo as
diferenças. Essa conferência também foi produto da efervescência dos anos de 1990 em
termos de discutir a inclusão.
―A partir da década de 1970, houve uma mudança, e as escolas comuns passaram a
aceitar crianças ou adolescentes deficientes em classes comuns, ou, pelo menos, em classes
especiais‖. (MENDES, 2006, p.390). Na década de 1980, houve uma grande campanha,
mobilização social e das Nações Unidas para que houvesse o cumprimento das leis que
determinavam a inclusão na escola de crianças e jovens deficientes. Esta década foi
marcada pelo intenso movimento a favor da integração da pessoa com deficiência, de
modo que buscou inserir o aluno na classe regular e também no ensino especial.
A educação de pessoas com deficiência nesse período ocorria de forma muito
tímida, sendo que nem as famílias destas pessoas e nem a escola estavam preparados para
esta árdua tarefa. Isso ocorria não somente pelo preconceito que ainda existia na mente das
pessoas em relação a este tema, mas também por causa da grande falta de informação e
formação continuada para os professores a respeito dessa temática. Ou seja, o investimento
ainda era pouco na formação de profissionais para lidar com tais pessoas, de modo a
preparar a escola para de fato integrar.
Portanto, nessa época essas pessoas começavam a ser integradas na rede regular de
ensino, entretanto, norteadas pelo que dizia a medicina sobre crianças com deficiências, ou
seja, ainda havia certo rótulo médico, em relação a indivíduos portadores de deficiências. E
nem todas as pessoas com deficiência possuía o mesmo direito, sendo que havia um
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regulamento que decidia quais eram os alunos aptos para ingressarem na rede regular de
ensino. E os que não possuíam um determinado nível cognitivo, eram encaminhadas para
salas especiais, o que só disseminava o preconceito.
Neste período eram os discentes que tinham que se adaptarem à escola e não a
escola a eles, o que tornava a escola excludente, em vez de inclusiva. E o fato de serem os
alunos que tinham que se adaptarem fazia com que houvesse a evasão escolar por parte
dessas crianças, ou simplesmente a nunca ida delas à escola. Sendo, pois, assim, o que era
para ser integração, virou uma integração cheia de dificuldades e que não integrava.
―Atualmente, de uma maneira gradativa, vem sendo reconhecido que a inclusão, no
ambiente comum de ensino, daqueles que são comumente excluídos é essencial para a sua
dignidade e para o exercìcio dos seus direitos humanos‖ (MARTINS, p.18). O princìpio, a
filosofia da educação inclusiva consiste em incluir, juntar pessoas, sejam elas sem
deficiência ou portadoras de alguma deficiência, com o objetivo de todos juntos, formar
homens e mulheres capazes de atuar na sociedade em que se vive.
Desse modo, A educação inclusiva acredita que todos são capazes e pessoas com
deficiências também têm seus potenciais, o que os tornam importantes para suas famílias e
para toda a sociedade, de modo que devem sair de suas zonas de conforto, para irem para o
mundo estudar, trabalhar e atuar. A educação inclusiva aposta em uma escola para todos e
todas, sem discriminação e sem preconceito, sem estereótipos e mais humana.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
CANÁRIO, Rui. A Escola tem futuro? Das promessas às incertezas. Porto Alegre:
Artmed, 2006
249
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CÉSAR, M. A escola inclusiva enquanto espaço-tempo de diálogo de todos para todos. In:
RODRIGUES, David (org.), Perspectivas sobre a inclusão. Da educação à sociedade.
Porto: Porto Editora,2003
MARTINS, Lucia de Araújo Ramos; PIRES, Gláucia Nascimento da Luz; MELO FRLV.
Inclusão: compartilhando saberes. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.
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O presente artigo tem como objetivo analisar os aspectos disciplinares e cotidianos vividos
por ex-alunas no Colégio Nossa Senhora Auxiliadora, na cidade de Sousa-PB, no período
de 1958 a 1969. Perceberemos o Colégio enquanto espaço de disciplina, verdade e poder,
sob a perspectiva foucaultiana, identificando como são voltados os olhares dos gestores do
educandário para formação de sujeitos dóceis, passivos e submissos. Apresentaremos como
a influência da Igreja Católica e seus princípios morais tornaram esta realidade disciplinar
mais presente. Refletiremos as vivências cotidianas dentro do Colégio como uma dimensão
da resistência dessa alunas à disciplina e normas impostas, baseando nos conceitos de
estratégias e táticas propostos pelo historiador Michel de Certeau.
Palavras-chave: Igreja Católica; Disciplina; Cotidiano; Memória.
INTRODUÇÃO
Este artigo tem como objetivo analisar, refletir e problematizar a relação entre a
disciplina escolar e o cotidiano vivido por ex-alunas no Colégio Nossa Senhora
Auxiliadora. A pesquisa se insere em aspectos culturais, através da memória e a história
que permite uma visão ampla da temática. Direcionamos a análise para questões de
vivências cotidianas na plena juventude dessas ex-alunas, em que permitem um leque de
possibilidades e problemáticas para compreensão desse ambiente escolar.
Com leituras sobre o livro clássico A Escrita da História91, de Michel De Certeau
(2002), entendemos que o lugar é aquele praticado pelo sujeito na pesquisa, em que o lugar
problematizado é o Colégio Nossa Senhora Auxiliadora, em que justamente ocorreram as
vivências, o cotidiano, os aspectos disciplinares e as influências da Igreja Católica na vida
dessas jovens durante seus períodos escolares. Este Colégio é situado na cidade de Sousa-
PB, desenvolvendo uma educação com ideais e princípios católicos, através da
Congregação das Filhas de Santa Tereza de Jesus. Assim, a educação proposta nesse
educandário é motivada na perspectiva da Congregação, pelos princípios de bons
costumes, da fé, solidariedade e valores morais com ética.
91
CERTEAU, Michel de. A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002.
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momentos nesse determinado período, em que estas participaram do passado e estão nos
possibilitando com seus depoimentos compreender o presente.
Os discursos e suas verdades também permitem uma análise crítica do nosso objeto
de estudo, entendendo como isso está presente e se perpassou a ponto de nos tornar sujeitos
desses discursos, de ver como eles se naturalizaram, ficando hegemônicos, ―a partir de
práticas mínimas, de ínfimos enunciados, de cotidianas e institucionalizadas regras, normas
e exercìcios‖ (FISCHER, 2003, p. 386).
A relevância da pesquisa está em perceber, problematizar e desvendar o que se
passava de fato nesse espaço educacional religioso, através dos depoimentos dos próprios
atores, isto é, as ex-alunas. Estas ao descreverem suas lembranças, pela memória,
colocarão uma nova visão do Colégio. Não será mais o discurso das madres e superioras
que dirigem o Colégio, a serem ouvidos e analisados. A voz destas alunas é o que terá
ênfase e destaque e a partir disso, haverá um confronto de discursos e assim, entenderemos
o que ocorria neste espaço.
O recorte temporal tem como marco o ano de 1958, em que se implantou o Colégio
na cidade de Sousa até o ano de 1969, em que se percebe de destaque nesse recorte é o
período do contexto político do nosso país, em que a Ditadura Militar estava instaurada,
refletindo em um momento onde o conservadorismo era forte, se revelando também na
educação. A educação brasileira esteve ligada a esse processo histórico e assim, iremos
perceber até que ponto o Estado esteve relacionado com a disciplina e moralidade católica
neste educandário sousense.
Como recorte espacial é destacado a cidade de Sousa92 que é marcada por sua
referência em aspectos políticos, econômicos, culturais e em destaque religioso, dando uma
ênfase notória a importância do C.N.S.A93. Sousa teve seu desenvolvimento econômico
através da sua elite, que detinha da produção econômica e ansiou por uma educação que
fosse adequada a realidade deles. Então a sociedade sousense, juntamente com o padre
João Cartaxo Rolim conseguiram implantar na cidade um Colégio religioso que
propiciasse a formação educacional e religiosa da mocidade feminina.
92
A formação do núcleo urbano de Sousa iniciou com as grandes fazendas que surgiram as margens do Rio
do Peixe. A economia sousense seguia a produção agrícola algodoeira, sendo reflexo do Brasil que tinha o
algodão como principal produto de exportação, possibilitando assim o crescimento urbano. A urbanização
intensificou em Sousa a partir da década de 1910 com o aumento das atividades comerciais, venda e
comercialização dos produtos agropecuários produzidos.
93
Abreviação do nome: Colégio Nossa Senhora Auxiliadora.
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94
DÁRIO, Rafaela Pereira. Nos caminhos do progresso, nas veredas da modernização: representações da
cidade de Sousa-PB. Dissertação – Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal da
Paraíba, João Pessoa – PB, 2012.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
―Até a década de 1980 era muito comum se deparar com trabalhos sobre
as cidades onde a preocupação maior era elevar os grandes vultos, evocar
sobre a fundação da urbe, sem, contudo, realizarem análise crítica em
seus conteúdos, ou seja, tais trabalhos refletiam a postura da época, não
podendo ser considerados inferiores por conta disso, tendo em vista a
grande contribuição dos mesmos na e para a história das cidades‖
(DÁRIO, 2012, p. 45).
De maneira semelhante, o livro Além do Rio (2012) de Augusto Ferraz é uma obra
que apresenta um panorama fotográfico da cidade sousense, em que o autor buscou fazer
um álbum fotográfico da mesma, apresentando referências e notas sobre cada imagem.
Ferraz destaca que a finalidade de seu trabalho era registrar a evolução arquitetônica da
cidade no século XX, mostrando as manifestações dos costumes, as atividades sociais,
comerciais e de lazer durante este período, possibilitando aos pesquisadores em geral uma
fonte de pesquisa.
A vinda da Congregação das Filhas de Santa Teresa de Jesus para cidade ocorreu
após a chegada de Padre João Cartaxo Rolim que se encarregou de ir até a cidade do Crato,
sob a orientação do bispo Dom Zacarias Rolim de Moura. Chegando à cidade, Padre João
conseguiu trazer a Madre Teresa Machado à cidade sousense, que na época era Superiora
Maior da Ordem, e a mesma aceitou o pedido de implantar um colégio religioso.
Percebemos que nas produções havia uma visão de que devido à cidade ter uma
forte religiosidade, que foi marcada pelo suposto Milagre Eucarístico, a necessidade de um
colégio religioso em Sousa foi marcante. Isto é bastante presente na Revista Comemorativa
dos 50 anos do Colégio Nossa Senhora Auxiliadora. A mesma foi uma edição festiva do
Colégio, que visou relatar momentos, vivências, contexto e depoimentos sobre o mesmo,
para homenagear nessa data significativa. Assim como nos dois trabalhos acima, não havia
uma análise problemática do Colégio na revista, mas alguns depoimentos e textos escritos
nos auxiliaram para investigar sobre o C.N.S.A. A princípio a gestora Madre Aurélia, tem
em várias páginas seus textos sendo destacados, em que a mesma foi diretora desse espaço,
chegando à cidade em 21 de abril de 1965 e foi a quinta Superiora Geral da Congregação,
mostrando ter um conhecimento do Colégio e também do papel da Congregação.
Ela faz um panorama da implantação do Colégio, afirmando que a influência
católica presente no lugar, possibilitou crescer o desejo do ―povo‖ por um educandário
religioso. Com isto, uma questão surgiu: quem era este povo que desejava um educandário
religioso? Era a elite sousense, que até então na cidade não existia um colégio que fosse de
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
muita influência religiosa e que propiciasse um ensino melhor do que o público ou seria a
maioria da população, que nesse contexto da educação nacional, apenas uma minoria tinha
acesso a educação?
Entendemos assim que as congregações religiosas, a principio, têm um ideal de
servir a sociedade e, sobretudo, aqueles mais necessitados. A Congregação das Filhas de
Santa Teresa de Jesus através do bispo Dom Quintino tinha esse pensamento, mas que ao
longo do tempo, as instituições educacionais foram sendo destinada a elite, que tinha
recursos para colocar suas filhas nos educandários. O mesmo aconteceu em Sousa, pois o
Colégio passou a ser destinado às jovens moças da elite sousense, ganhando o educandário
um prestígio sem igual.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Nesse contexto, as jovens moças que tiveram suas vidas entrelaçadas aos costumes
e valores da época sentiram as consequências do extremo moralismo e de suas funções já
preestabelecidas pelas suas famílias. A elas caberiam as funções de uma boa esposa, rainha
do seu lar e uma boa mãe, auxiliando e aceitando a vida proporcionada pelo seu esposo,
seja ela qual for.
Na coleção História da Vida Privada no Brasil 3 (1998), o artigo das autoras
Marina Maluf e Maria Lúcia, discute esse papel que era determinada para as mulheres,
sendo isso a realidade delas, em que suas trajetórias já estavam decididas pelos seus pais,
cabendo a elas apenas aceitar tal situação.
Esse tripé foi expandido tanto pela religiosidade católica quanto pela mentalidade
da sociedade da época, em que se difundiu a ponto de se tornar algo normal e que ao fugir
dessa realidade e desenvolver os mecanismos de resistências, foi considerado um equívoco
que deveria ser combatido. Esse era o discurso dos conservadores, que se estendeu para
população, seja ela de qualquer esfera econômica e social. Segundo as autoras, ―a imagem
da mãe-esposa-dona de casa como a principal e mais importante função da mulher
correspondia àquilo que era pregado pela Igreja, ensinado por médicos e juristas,
legitimado pelo Estado e divulgado pela imprensa‖ (MALUF; MOTT, p. 374, 1998).
Nesse contexto, havia o incentivo ao casamento, que era enfatizado na educação,
sobretudo a religiosa, visando moldar os costumes, os pensamentos, o comportamento e
também o caráter. Havia então muitos conselhos, regras e fórmulas para que o matrimônio
fosse preservado, tanto as mulheres, como também os homens eram instruídos a praticar
isso.
Assim abordaremos essas questões ao realizar as entrevistas, em que perguntaremos
como essa realidade social estava presente em suas vidas; o que as marcaram em seus
percursos no Colégio Nossa Senhora Auxiliadora; os conflitos; o cotidiano; a influência
católica; a disciplina imposta e suas trajetórias de vida. Com as análises dos depoimentos,
que serão transformados em fontes historiográficas, perceberemos como essa realidade
predominava e quais os mecanismos de luta e resistências essas senhoras desenvolveram.
O papel profissional que a cabia a mulher, pertencente ou não da elite, era o
magistério, em que isso estava bastante perpassado em suas vidas, através da religiosidade
forte que marcava o cariri cearense, como também a cidade de Sousa. Pessoas como Dom
Adauto, Dom Quintino, Padre Ibiapina, Padre João Cartaxo Rolim, entre outros, tinham
uma forte influência na sociedade do Ceará e em Sousa e que a elite então destinava suas
257
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
filhas para vivenciar a religiosidade. Para esse período era algo bastante comum e que não
havia discussão ou receio em obter essa educação.
As mulheres se profissionalizavam ao oficio de serem professoras, sob os
princípios católicos, em que sua educação era instruída de valores, comportamentos e
costumes regulados pela Igreja Católica e legitimado pelo Estado. Porém, segundo Tatiana
Medeiros, a educação profissionalizantes das mulheres, no início, não foi bem aceito.
―Ressalte-se que no Brasil, mais especificamente na Parahyba do Norte,
ainda vivia-se sob a égide total das tradições patriarcalistas mais
arraigadas, desfavorável à presença da mulher na vida pública, que, por
conseguinte, recomendava a manutenção dos padrões consagrados ao
feminino na ordem familiar, ou seja, na dependência ao marido e as
atividades de ocupação doméstica‖ (SANTOS, p. 4, 2010).
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que iremos a partir da perspectiva foucaultiana, enxergar o nosso redor com clareza e
realidade, o que de fato essas instituições têm por trás de seus discursos de verdade,
sobretudo no Colégio Nossa Senhora Auxiliadora.
259
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95
DURAN, Marília Claret Geraes. Uma leitura do cotidiano escolar com Michel de Certeau. International
Studies on Law and Education, set-dez, 2012.
260
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p.121). Além disso, identificaremos como foram desenvolvidas essas táticas para resistir ao
poder disciplinar que estava sendo imposto.
É necessário compreender como esses dois conceitos centrais da pesquisa têm em
comum e o que divergem. Foucault e Certeau são autores que travaram os debates sobre os
aspectos disciplinares e seus mecanismos de resistências. O primeiro analisou as relações
de poder, incluindo as disciplinares e o segundo analisou o cotidiano entre as estratégias e
as táticas, percebendo que nas normas e imposições podem-se encontrar resistências e
assim desenvolver novas formas de organização na sociedade.
As autoras Larissa Meira e Emilayne Souto 96 interpretam os conceitos de
estratégias e táticas:
―[...] isso quer dizer que a estratégia é fundada sobre um ―lugar próprio‖
que autoriza uma variedade de formas de domínio de saberes,
conhecimentos e verdades, permitindo atribuir ao ―outro‖ uma situação
de dependência, estranheza, ausência de autonomia. A estratégia,
portanto, é organizada sobre (e por meio) as relações de poder. A tática,
por sua vez, é uma ação calculada determinada pela ausência de um
―lugar próprio‖ e é justamente a carência dessa condição que permite
transformar sua máxima debilidade em sua potencial condição de
fortaleza. São as táticas que infiltradas na heterogeneidade social,
esquivam-se, insinuam-se, contrapõem-se‖ (VASCONCELOS; SOUTO,
2014, p.3).
Portanto, o que aproxima esses dois autores são as resistências, em que Foucault
trata do poder disciplinar, suas formas, técnicas e discurso, enquanto Certeau também
discute esse aspecto do poder, mas focaliza as astúcias da tática, deixando claro que esses
96
VASCONCELOS, Larissa Meira de; SOUTO, Emilayne. Notas para um debate entre Michel Foucault e
Michel De Certeau. 1º Encontro Internacional de Estudos Foucaultianos: Governamentalidade e Segurança
João Pessoa-PB, 2014.
261
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autores investigaram as variadas formas de resistir às normas impostas. As táticas são por
vezes invisíveis, mas existem e são politizadas, atuando nas ações cotidianas.
97
SANTOS, Tatiana de Medeiros. Magistério em declínio: histórias e memórias de ex-alunas do Magistério
do Colégio Nossa Senhora das Neves (1970). Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal
da Paraíba, João Pessoa, 2009.
262
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
rememorar‖ (SANTOS, 2009, p.43). Assim, perceberemos que a escola é um espaço que
está propicio para memória social.
Durval Muniz problematiza a memória e sua relação com a história, apontando as
diferenças entre eles, pois a História interpreta o fato ocorrido posteriormente, trabalhando
com as experiências de vários grupos e a memória trabalha internamente, ficando presa a
uma visão de grupo. Ele explica o porquê a História é violação:
Segundo Muniz, a memória dos sujeitos tem uma afetividade que surge pela
emoção e que trazem também um nível imaginativo através das imagens e sensações
vividas socialmente.
―[...] as memórias possuem ainda um nível afetivo que está ligado à
forma de sensibilidade social que está preso o individuo. Ela surge das
emoções que depositamos em cada recordação, ela é como o gosto que
nos provêm da sensação evocada ou lembrada‖ (MUNIZ, 1994, pg.45).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A história das instituições educativas também está voltada para as políticas locais,
em suas relações com o poder econômico e também ao social. Percebemos isto ao fato da
elite sousense ter tido a participação nesse processo de implantação do educandário nesta
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
cidade. Com base nisso, entendemos que é por meio da História da Educação que
conseguimos reconstituir as transformações que ocorreram no campo educacional, de
ensino e de pesquisa, através das diversas instituições escolares e suas relações políticas
educativas, suas ideologias e o âmbito social.
A História da Educação permite a reflexão, investigação e problematização da
atuação das instituições escolares, fornecendo uma compreensão do processo evolutivo
educacional, da sociedade e da cultura. É por meio da investigação das instituições
escolares que percebemos o mesmo como lugar de práticas políticas, pedagógicas,
religiosas e culturais, permitindo entender como se configurou este espaço, o cotidiano, a
disciplina, as questões econômicas e sociais.
A partir do que foi discutido, concluímos que esse educandário desenvolveu, nesse
recorte temporal, a predominância da disciplina, em que perpassava devidos os fatores
políticos, econômicos, culturais e a mentalidade da época. Os discursos prevaleciam à
verdade que se queriam evidenciar, através do conservadorismo e na moralidade que foram
influenciados pela Igreja Católica.
A preparação educacional dessas jovens destacou que as escolhas foram
preestabelecidas e que cabia a elas aceitar ou elas enxergavam como normal, pois o
respeito e a obediência estavam atrelados a submissão e passividade. Diante disso, as ex-
alunas vão expor como desenvolveram seus mecanismos de resistências, segundo o
conceito de Certeau as suas táticas, que reflete a ausência de poder, mas também utiliza
maneiras de alterar as imposições sofridas.
Portanto, destacamos de maneira geral, os conceitos que estão dando suporte ao
entendimento da temática, as metodologias que serão necessárias para analisar as fontes e
as compreensões efetuadas, através do levantamento bibliográfico.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade: lembranças de velhos. TA, 1994.
CERTEAU, Michel de. A Invenção do Cotidiano: artes de fazer. Petropolis: 12. Ed.
Vozes, 1994.
264
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GADELHA, Julieta Pordeus. Antes que Ninguém me Conte. João Pessoa: A UNIÃO –
Superintendência de Imprensa e Editora, 1986.
GORE, Jennifer M. ―Foucault e educação: fascinantes desafios‖. In: Silva, Tomaz Tadeu.
O sujeito da educação. Petrópolis: Vozes, 1994, p. 9-20.
PESAVENTO, Sandra Jatahy. História & história cultural. 2ª Edição. Belo Horizonte:
Autêntica, p. 1-132, 2005.
265
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
98
MARIA PEREIRA DE SOUSA
[email protected]
RESUMO
Este trabalho propõe uma discussão sobre o processo educacional na década de 1930,
através da publicação de artigos da Revista do Ensino, um editorial trimensal de
responsabilidade da Diretoria do Ensino Primário do Estado da Paraíba, publicada através
das Officinas da Imprensa Official em João Pessoa. De forma sistematizada esse estudo
através de leituras e interpretação de alguns artigos dos exemplares do Anno I N.1 de abril
de 1932, Anno II N.2 julho de 1932, Anno III N.10 julho de 1934 e Anno V N. 14
Dezembro de 1937, busca compreender os principais métodos didáticos utilizados e a
postura do professor desse período, a fim de refletir como o processo de ensino-
aprendizagem estava pensado e ate que ponto a postura adotada pelo professor era
responsável por essa tarefa.
Palavras-chave: Revista do Ensino; ensino; papel do professor.
98
Graduada em Licenciatura plena em História pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG- CFP)
2015.
99
Revista do Ensino, Anno I N. 2 Julho de 1932. s/p.
266
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100
Revista do Ensino, Anno I N. 2 Julho de 1932. s/p.
101
Revista do Ensino, Anno I N. 2 Julho de 1932. s/p.
102
Revista do Ensino, Anno I N. 2 Julho de 1932. P.32
267
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[...] o dever principal do que ensina é meditar a matéria de suas ações, por
ordem, distinção, clareza nas ideias, usar palavras apropriadas, sempre ao
alcance do alunno, ilustrar, em todo o ensinamento com semelhanças,
exemplos, contrastes, etc. 105
O cenário apresentado neste período parece marcado por mudanças no que diz
respeito aos métodos didáticos pedagógicos, não é intuito desse trabalho nesse momento
afirmar de forma especifica os tipos de mudanças ou os impactos que elas trouxeram ao
103
Revista do Ensino, Anno I N. 2 Julho de 1932. p.33
104
Revista do Ensino, Anno I N. 2 Julho de 1932. p. 33
105
Revista do Ensino, Anno I N. 2 Julho de 1932. p.34
106
Revista do Ensino, Anno I N. 2 Julho de 1932. s/p.
268
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ensino, mas não é impreciso dizer que nesse momento a educação passa a beber na fonte
da escola nova e que os métodos didáticos de ensino, começam a aderir a alguns aspectos
extraídos dessa fonte.
Sobre esses indícios de adaptação á novos métodos em outro artigo publicado na
edição de abril de 1932, pelos autores, lemos a seguinte informação:
Diante dessa informação entende-se que o ensino, nesse período visava uma
mudança otimista onde os novos métodos didáticos pedagógicos deveriam ser pensados
para que o educando fosse levado em consideração, o terno escola moderna aparece nos
artigos lidos, associado a ideia que o ensino deveria enveredar por novos caminhos em
busca de uma melhor qualidade, ou como uma tentativa de melhor aproveitamento e
rendimentos do que era ensinado pelo professor.
Não é objetivo deste trabalho, considerar que a Revista de Ensino incentivava ou
apontava aspectos da escola moderna como uma metodologia que deveria ser adotada, ao
passo que recomendava excluir o ensino tradicional, apenas propõe-se uma reflexão que
segundo os seus artigos os autores buscavam discutir a relevância de se adotar propostas e
metodologias que dinamizassem o processo de ensino aprendizagem desse período, e que
atentassem para as mudanças que estavam vindo á tona nesse cenário educacional.
107
Revista do Ensino Anno I N. 1 Abril de 1932 p. 15
269
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Os livros são teus melhores amigos. Deles não te podes separar. Não
julgues que tens habilitação necessária para o integral cumprimento dos
teus deveres. Estuda, acompanha esse movimento renovador que se
processa por toda parte. O livro dos mestres, as revistas, as conferencias,
as aulas de um colega talvez te revelem a necessidade ingente que tens de
estudar.110
108
Revista do Ensino, Anno III N.10, Julho de 1934 p.3.
109
Revista do Ensino, Anno III N.10, Julho de 1934 p.8
110
Revista do Ensino, Anno III N.10, Julho de 1934 p.5
111
Revista do Ensino, Anno III N.10, Julho de 1934 p.6
270
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―[...] professor é o responsável por ensinar ao aluno como captar e valorizar a diversidade
das fontes e dos pontos de vistas históricos, levando-o a reconstruir, por adução, o percurso
da narrativa histórica.‖.
Neste sentido, o professor exerce o papel de mediador entre o aluno e o percurso
que este faz para a elaboração e construção do conhecimento histórico. O professor deve
entender-se não como detentor do saber, mais como facilitador e promotor do
conhecimento, deve perceber o aluno como um sujeito ativo no processo de ensino-
aprendizagem.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
272
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
REFERÊNCIAS
Revista do Ensino. Orgão da Directoria do Ensino Primario Anno III, julho de 1934 n.10.
Imp. Off. João pessoa 1934
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RESUMO
O presente trabalho propõe discutir os critérios de utilização e análise dos relatos de
história de vida por meio de uma narrativa biográfica. Para tanto, analisamos as
experiências profissionais de Maria do Disterro, professora de ensino religioso da cidade
de Cajazeiras, Paraíba, a partir de um relato que se afirma dentro de um percurso
sequencial, produzindo uma história de vida. Compreendendo a sua formação e os espaços
onde atuou, percebendo a sua existência individual dentro de uma superfície socialmente
constituída, levando em conta os desencontros e descontinuidades. Assim, o nosso olhar
perpassa pelo campo dos novos significados que essa escrita historiográfica adquiriu, como
assinala Benito Bisso Schmidt sobre as dúvidas quanto aos atuais desafios da área,
exigindo dos historiadores um distanciamento a linearidade cronológica e envolver-se com
diferentes temporalidades.
Palavras-chave: História Oral; narrativa biográfica; profissionalização docente.
INTRODUÇÃO
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momento presente da história, e suas contribuições para os avanços desse saber científico
são incontestáveis. Para tanto, os historiadores que se enveredaram atualmente pela
narrativa biográfica articularam essa escrita à história-problema, característica principal de
defesa dos Annales, o principal contestador da biografia histórica.
A NARRATIVA BIOGRÁFICA
Diante desse cenário os estudos de Benito Bisso Schmidt nos apresentam elementos
que constituem a produção biográfica recente. O enfoque nos personagens é primeiro
ponto, não se prendendo aos grandes homens da sociedade, como é observado em toda a
trajetória tradicional dessa escrita. A escolha perpassa pela perspectiva de
representatividade do ―homem-comum‖. O autor nos convida a perceber a possibilidade de
investigar ―os espaços de exercìcio da liberdade possìveis em uma determinada sociedade‖
(2000, p. 4), salientando que não busca realizar parâmetros entre classes, ou indivíduos e
suas importâncias. Esse último termo é o que menos se leva em consideração nessa
abordagem. A importância, como objetivo referente à relação do personagem com a
sociedade evoca o oportunismo das críticas à narrativa biográfica. Pois é perceptível nas
produções atuais o afastamento dessas emboscadas em vista da renovação da escrita. ―Isso
acontece, geralmente, quando seus autores levam em conta as críticas já feitas ao gênero,
procurando integrá-las às suas preocupações.‖ (2003, p. 65). Fugindo desse apologético
meio de destacar indivíduos e suas condutas positivas ou negativas, atendendo os
propósitos educacionais das sociedades normativas, o objetivo da narrativa biográfica está
pautado nas questões cotidianas do contexto em que os biografados estão inseridos, outro
ponto discutido pelo autor. Ao designar “A ilusão biográfica”, Bourdieu intitula uma
questão muito discutida sobre o gênero, outro ponto examinado por Schmidt, que se refere
à forma de construção da narrativa biográfica. Pois a mesma exige dos historiadores um
distanciamento a linearidade cronológica e envolver-se com diferentes temporalidades. É
um desafio! ―Assim, um dos principais desafios dos biógrafos na atualidade é captar os
personagens enfocados a partir de diferentes ângulos, constituindo-os não de uma maneira
coerente e estável, mas levando em conta suas hesitações, incertezas, incoerências,
transformações.‖ (2014, p. 197).
Entretanto, dentro do viés de múltiplos olhares sobre a História, o gênero biográfico
surge como um campo frutífero, que abre espaço para a interação entre a história e
literatura, ficção e realidade. Esse é o ultimo ponto examinado pelo autor dos atuais
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serem ilimitadas não significa que todas são verdadeiras no mesmo sentido, nem
que inexistem manipulações, inexatidões e erros. (PORTELLI, 1997, p. 15.)
Um documento não fala por si só, e as informações do seu conteúdo possui uma
produção textual composta de elementos, sujeitada por uma escolha. Dentro de uma
perspectiva que denomine uma objetividade na documentação escrita, é indispensável
perceber o mesmo teor de subjetividade que constitui as fortes orais criadas pelo processo
de entrevista.
Além disso, a fonte oral concilia as memórias do passado vivido, em que o sujeito
entrevistado relata lembranças de diversas situações vivenciadas de modo coerente,
buscando um sentido para sua existência no dado período em que está sendo questionado
pelo pesquisador. O mais interessante, é compreender que essa retrospectiva, é mediada
pela recuperação de vivências que ocorreram em diferentes momentos do passado, e esse
processo caracteriza a memória histórica.
As pessoas não têm em suas memórias uma visão fixa, estática, cristalizada dos
acontecimentos que ocorreram no passado. Pelo contrário, existem múltiplas
possibilidades de se construir uma ―versão‖ do passado e transmiti-la oralmente
de acordo com as necessidades do presente. É nesse momento da narrativa de
uma ―versão‖ do passado, que as lembranças deixam de ser memorias para se
tornarem histórias. (KENSKI, 2013, p. 58).
A ABORDAGEM HISTÓRICA
280
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de ampliação da jornada escolar das escolas públicas no intuito de construir uma educação
integral); Estágio Supervisionado; o Projeto de Extensão “Meu lugar na escola, meu lugar
no mundo”, e o relato dos sujeitos que compõem esse espaço foram desenhando um campo
possível para questionar as atribuições da docência e abrangência de espaços dessa
atuação.
Em meio a isso, no processo de levantamento das fontes documentais no arquivo da
Escola Municipal Maria Guimarães Coelho, o nome da professora Maria do Disterro se
destacou consecutivamente por dez anos na admissão do cargo de diretora desta
instituição. O passo seguinte foi localiza-la e entender sua relação com a escola.
Acompanhando a satisfação de ser convidada a participar da pesquisa essa disponibilizou
fotografias que fazem parte do seu acervo pessoal. Diante disso, o sentimento de chegar ao
ponto de partida de um trabalho foi alcançado.
Ao observarmos a escola, percebemos um espaço construído por vários sujeitos,
que tem na sua trajetória histórica uma variedade de atribuições que vai constituindo esse
modelo de instituição educacional da sociedade moderna, existente até os dias atuais como
algo necessário para diversos interesses. Hoje ela ocupa as diversas áreas geográficas de
agrupamentos humanos. Na área urbana onde ele vai surgir quase como um modelo
universal, podemos observar que a escola como espaço educacional faz parte de memórias
de uma determinada fase da vida de vários sujeitos, e isso não pode nos levar a crer em um
espaço somente de passagens, pois cada sujeito é constituinte daquele espaço, e as suas
ações individuais refletidas nas ações coletivas são elementos que constroem a história
dessa instituição.
Observa-se na descrição acima, o destaque do nosso olhar sobre dois elementos de
investigação, o professor e a escola. A instituição escolar é o espaço construído para a ação
do professor no processo de transmissão de conhecimentos que atendem aos interesses do
Estado. Essa relação surge na nossa pesquisa como ponto de partida, aproximando-se da
das referencias do campo de análise sobre a profissão de professor. Desse acordo com as
pretensões da pesquisa, preocupada com a análise, articulada a perspectiva da história-
problema, buscando problematizar o processo de profissionalização da nossa biografada.
Nesse sentido, percebemos que ―a história da profissão docente permitiria contar a história
da escolarização de um ponto de vista que é, ao mesmo tempo, plural e único‖
(VICENTINI, 2009, p. 20). A instituição escolar possui uma cultura própria que ―é
efetivamente uma cultura conforme, e seria necessário definir, a cada período, os limites
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um número significativo de docentes em salas de aula por todo o país. Um currículo que se
submeteu as particularidades regionais para se concretizar.
Em razão disso, a implementação do Curso de Magistério não foi imediata e
tampouco se processou nas mesmas condições em todas as regiões brasileiras, o
que se tornou necessário prever, na lei, as variações possíveis em termos da
preparação para que todos pudessem ajustar-se às normas legais. Desse modo,
estabeceram-se várias modalidades de estudo aceitável para o exercício docente
no primeiro grau, sendo a escolarização mínima requerida a Habilitação para o
Magistério (curso de 3 anos em nível de segundo grau), que permitia ensinar de
1ª a 2ª séries. (VICENTINI, 2009, p. 50).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro:
Editora FGV, 1996.
DE FREITAS, Sônia Maria. História oral: procedimentos e possibilidades. Editora
Humanitas, 2006.
KENSKI, Vani Moreira. Memória e ensino. Cadernos de pesquisa, 2013, 90: 45-51.
PRIORE, Mary Del. Biografia: quando o indivíduo encontra a história. Topoi (Rio de
Janeiro), 2009, 10.19: 7-16.
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RESUMO
Uma das ferramentas mais eficazes para expressar sentimentos ou narrar histórias é a
música, ela esteve presente em toda história da humanidade exercendo diversos papéis e
atualmente está presente no entretenimento mundial. A música está inserida em sessões
exclusivas no mundo das artes, mas também está presente no entretenimento vendido em
larga escala, influenciando fortemente o comportamento social, registrando marcas na
história. Se a música tem poder de narrar, expressar ou até mesmo influenciar, é necessário
analisar esta expressão cultural para o uso na educação. Podemos usufruir da popularidade
das canções para ensinar uma língua/cultura estrangeira, analisando os assuntos presentes
nas composições, trazendo para a sala de aula maior interação entre disciplinas utilizando
das produções de entretenimento como ferramenta didática.
Palavras-chave: Música; Cultura; Ensino.
INTRODUÇÃO
[...] a criança nasce com uma única [...] capacidade, a capacidade ilimitada de
aprender e, nesse processo, desenvolver sua inteligência - que se constitui
mediante a linguagem oral, a aten-ção, a memória, o pensamento, o controle da
própria conduta, a linguagem escrita, o desenho, o cálculo (KESTER, 2004, pg.
136).
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A escola é o local ideal para criar espaços de introdução às noções básicas sobre
sociedade, este espaço é necessário para que o aluno possa compreender as diversidades
culturais, a coletividade e tudo que gira em torno das relações entre pessoas. A educação
precisa servir às demandas do desenvolvimento sócio cultural e o ensino de línguas pode
ser um dos pilares mais importantes para a construção dos saberes. Seja o conhecimento
proveniente de uma cultura local ou estrangeira é importante que seja analisado, discutido
e se validado, disseminado e registrado para que o processo de troca de informações entre
culturas seja bem aproveitado. É importante criar espaços para o questionamento, para que
seja possível comparar, reparar e repensar as condições sociais.
Compreender outras culturas é entender a diversidade do estilo de vida humana e
todos os dilemas que circundam o homem contemporâneo, é de extrema valia considerar o
processo de globalização em que estamos inseridos, e toda a intervenção que uma cultura
pode exercer sobre a outra, este processo de influências entre culturas é histórico e está
presente por exemplo nos processos de colonização.
Conhecer o estrangeiro pode não ser bem recebido na sala de aula, os alunos
compreendem geralmente o assunto como desnecessário, sem valor ou surreal. Estas
imagens construídas negativamente não são exclusivas do ensino de língua, diversas outras
disciplinas sofrem neste processo de invalidez educacional. O estado crítico de política do
Brasil tem gradativamente sucateado o ensino público e cada vez mais transmitir o valor e
a importância da escola tem sido uma tarefa árdua para os profissionais da educação, e é
necessário se pensar em novas fórmulas para se transmitir o valor e a importância da
educação.
Além da língua materna, uma segunda língua pode ser extremamente eficaz na
construção dos saberes pois ao utilizar outro idioma podemos ir além das disponibilidades
linguísticas locais. Se o idioma utilizado para comunicação, estudo e pesquisa é o inglês, a
possibilidade de obter variados resultados é maior, segundo Lane em seu artigo no site
Babbel, o inglês é a terceira língua mais falada no mundo, possui 360 milhões de falantes
nativos e aproximadamente 500 milhões de pessoas que falam o idioma como segunda
língua, ou seja, quase 900 milhões de falantes o que significa que aproximadamente 14%
287
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do planeta fala inglês, enquanto o português é falado por aproximadamente 215 milhões de
nativos, representando apenas 3,5% de falantes no mundo. O número de falantes da língua
inglesa é expressivo pois é a língua das comunicações, negócios e do entretenimento,
sendo assim, questões que circundam à aplicação do inglês no currículo escolar, precisam
ser pensadas, para que o uso desta língua e cultura seja proveitoso no desenvolvimento
linguístico e cultural dos alunos.
USUFRUINDO DA TECNOLOGIA
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atividades e tudo que está para além da sala de aula, para que seja possível converter a
cultura dos alunos em educação, transformar a tecnologia em uma ferramenta apropriada
para sala de aula.
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Para falar sobre as diversas faces do pop é imprescindível citar dois grandes nomes
que mudaram as formas como a música popular passou a ser representada, foi a partir dos
anos 80 que Michael Jackson (cantor mundialmente conhecido como rei do pop)
influenciou toda a cultura das gerações seguintes com sua música e performance. Seu
trabalho foi influenciado por diversos tipos de atores e dançarinos do cinema dos anos 50,
entre eles podemos destacar os trabalhos de Fred Astaire e Genne Kelly. Utilizando a
Dança de rua como base, reinventou as clássicas performances de Elvis Presley e James
Brown; transformou aspectos banalizados da cultura afro em referência, trouxe para a
universo de espetáculos musicais coreografias que desafiavam a razão e a lógica, seu maior
trunfo foi representar a cultura popular, detalhe que até antes de sua chegada era pouco
valorizado e explorado nos espetáculos, Michael Jackson cresceu no entretenimento e
reinou absolutamente sozinho neste universo musical até a chegada de Madonna em 1984.
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A INDÚSTRIA DO ENTRETENIMENTO
A indústria fonográfica pop tem crescido consideravelmente nos últimos dez anos,
o uso da internet como plataforma de divulgação potencializou a manifestação desta
cultura, posterior à internet todo o entretenimento dependia de redes de televisão e rádio
que entre as décadas de 80 e 90 desempenharam papel fundamental para firmar a presença
do pop no mundo musical.
No início dos anos 50 o rádio tornou se o principal veículo de transmissão de
músicas, em seguida a televisão se tornará o principal meio para expressar essa cultura; a
popularização da televisão no fim dos anos 60 proporcionou espaço para as famosas
performances, foi por meio de programas da televisão americana como Saturday Night
Live que o mundo passou a ouvir e ver a música pop através da dança. As premiações
musicais, shows via satélite, programas de auditório, diluíram a cultura pop americana por
todos os continentes. Apoiados na experiente indústria Hollywoodiana a televisão
americana tornou se uma das mais influentes no cenário musical.
Em 1981 o canal Music Television mais conhecido popularmente como MTV
(Canal subsidiário da Viacom Media Network) é fundado, tomando para si toda a atenção
da produção cultural americana, pois seu conceito era reproduzir videoclipes durante toda a
programação utilizando DJs (Disco Jóquei) como apresentadores. Este projeto foi um
sucesso instantâneo pois se distinguia dos inúmeros canais que não possuíam foco na
reprodução de músicas.
Em um regime rígido e ininterrupto de lançamentos, o canal tornou se o centro das
atenções tratando de assuntos relacionados ao mundo pop, desde programas de bastidores a
shows reproduzidos ao vivo para todo o mundo, a MTV viabilizou a propaganda e a
promoção de artistas tornando os ainda mais populares e influentes. Ano a ano a estética
dos videoclipes, espetáculos e premiações musicais se tornavam mais opulentas e
―glamourizados‖, a música pop seguia as proporções televisivas da época, relacionando o
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FERRAMENTA DE APRENDIZAGEM
Para desenvolver atividades para ensinar com a música pop é necessário pesquisa e
acima de tudo sincronia com as tendências universais da música e atualização sempre que
possível sobre as modas musicais e tudo que se discute no mundo da música, conhecer o
material utilizado proporcionará maior segurança para o professor e credibilidade para os
alunos, é dever do professor estudar os antecedentes e referências da música, o tipo de
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linguagem utilizada também deve ser uma prioridade para o professor, a música está
inserida em algum contexto social, e geralmente é uma narrativa, ou seja, conhecer e
buscar entender as diversas nuances da sociedade podem ajudar o professor a compreender
as mensagens nas músicas.
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elas, podemos destacar o tìtulo do álbum, inspirado no ditado popular ―Se a vida lhe
oferecer um limão, faça uma limonada‖. A artista incentiva seu público a tentar
transformar adversidades em vantagens, tentando superar as dificuldades da melhor forma
possível.
A crìtica especializada considera o álbum LEMONADE um ―Divisor de águas‖ na
carreira da cantora Beyoncé. De acordo com as resenhas críticas no site Metacritics o
álbum possui excelente média, 92 de 100 pontos que o site costuma intitular de Metalscore
uma análise universal, baseada em 33 críticos especializados. Este número é extremamente
satisfatório se comparado com a média de notas do álbum anterior da artista, o álbum
BEYONCÉ (2013) recebeu média final de 85 Metalscore.
O site compila e media as críticas especializadas sobre diversos trabalhos do mundo
do entretenimento. A nota máxima (100) para o álbum LEMONADE foi atribuída por um
jornalista do Telegraph, um importante e antigo jornal do Reino Unido, para Bernstein
(2016) ―LEMONADE é de longe o álbum mais forte de Beyoncé [...] Com LEMONADE,
Beyoncé prova que existe uma linha fina entre amor e ódio‖ (tradução nossa).
Notamos que os ―mais importantes‖ crìticos dos maiores jornais são em sua maioria
homens brancos de países desenvolvidos, europeus ou norte-americanos. Avaliar o álbum
apenas sob esta perspectiva é problemático, sendo ele um trabalho voltado para um público
diferente, público em sua maioria, feminino, negro e pobre. Sendo assim, é necessário
avaliar o trabalho também sob perspectiva do público em geral e considerar a crítica tecida
por ele. A atenção exclusiva à crítica especializada em música é um erro e pode deixar
lacunas na avaliação que somente o público alvo (mulheres negras e pobres) que tem uma
experiência de vida diferente e um olhar sobre o mundo e uma narrativa exclusiva pode
preencher.
Em diversos aspectos o público comum pode avaliar o trabalho com mais
propriedades, à experiência das mulheres ouvintes em relação ao discurso da artista tornam
o público alvo um potencial crítico. Toda esta preocupação na perspectiva de avaliação se
dá pelo histórico que o homem branco-europeu-cristão tem sobre a arte em geral, na qual
as obras só são validadas sob a perspectiva europeia-caucasiana-cristã-heteronormativa,
geralmente a arte com influências e referências africanas é tida como algo extraordinário,
excêntrico e seus valores são atribuídos como exóticos.
Devemos estar atentos ao fato que tecer elogios à beleza do negro, a sua dança,
música e culinária não constituem um avanço no combate ao preconceito étnico-
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O projeto LEMONADE foi bem recebido pela crítica popular e a aprovação não se
deteve apenas nos grandes jornais, as declarações, resenhas de ativistas negras no site
Youtube foram bastante expressivos em todo o mundo, em diversas resenhas de sites
mulheres de diversos locais do mundo em diversas línguas resumem o álbum como um
excelente representante na cultura negra feminina e um importante trabalho de
emponderamento na contemporaneidade.
O trabalho foi promovido sem descansos no primeiro semestre do ano de 2016 e
rendeu excelentes marcas de reprodução em torno do mundo. Beyoncé durante meses
atraiu toda a atenção para seu trabalho, no universo da cultura pop o projeto artístico
obteve êxito e até o momento é amplamente reproduzido, comentado e discutido pelos
jovens de todo o mundo tornando se um material excelente para ser utilizado dentro da sala
de aula, já que o mesmo é repetidamente discutido fora dela, principalmente nas redes
sociais.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
embaladas por ritmos dançantes tornam o processo de absorção mais rápido e prazeroso; o
contexto em que as palavras são colocadas, metáforas que são identificadas e interpretadas,
e os diálogos que podem estar presentes nas composições são alguns dos aspectos
presentes na música que podem melhorar o processo de aprendizado.
O vocabulário das composições musicais geralmente refletem a condição
linguística de um grupo ou em alguns casos pode representar uma variação linguística, seja
esta variação uma expressão formal ou informal, aspectos como estes tornam o processo de
identificação do idioma mais natural e gradativamente a tendência é de melhorias no
processo de aquisição da língua.
As denúncias encontradas neste trabalho artístico são assuntos extremamente
recorrentes em todo o mundo, tornando o álbum um material mais ―refrescante‖ para
iniciar discussões já que o trabalho engloba geografia, história, arte, sociologia, filosofia,
antropologia e outros de forma suave, um excelente ponto de partida para introdução de
outros materiais de cunho acadêmico que demandem mais dedicação e leitura.
Muitos alunos possuem dificuldade para imergir em diversos assuntos propostos
pela academia principalmente assuntos que se relacionem com a cultura afro muitas vezes
isto acontece pelo não-reconhecimento da cultura, reconhecer este traço na cultura
brasileira é importante para o desenvolvimento social e iniciar os debates com a
flexibilidade da arte na música é um excelente estimulante e pode facilitar um processo de
conhecimento que até então seguindo as recomendações tradicionais da academia pode
parecer enigmático.
Mais facilmente um aluno do ensino público estará aberto a uma produção do
entretenimento como um álbum, do que um livro, o professor como mediador do
conhecimento deve juntamente com seus teóricos discutir as produções e incentivar os
alunos no processo de aquisição de conhecimento, buscar aprofundar a pesquisa utilizando
estes materiais como porta de entrada. Como o próprio título do álbum propõe o professor
pode com estes ―limões‖, que seriam relativos aos produtos que a mídia e o entretenimento
oferecem em larga escala para os jovens alunos e fazer uma ―limonada‖ ou seja,
transformar as desvantagens em vantagens no ensino de cultura e língua estrangeira.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
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RESUMO
Este artigo tem como objetivo analisar a condição feminina no conto ―The Yellow
Wallpaper‖ (1892), da escritora Charlotte Perkins Gilman, a partir do contexto patriarcal
do século XIX. Também será discutida a presença de elementos góticos e a influência da
escrita de Poe (1809-1849), particularmente suas referências do grotesco e do arabesco
contidas na obra de Gilman para ressaltar a opressão da mulher, e uma análise comparativa
com a obra Jane Eyre (1847) de Brontë. Este texto utiliza-se dos aportes teóricos tais como
Gibbs (1994), inspecionando a crítica da autora em relação à condição de repressão da
mulher, e Stein (1983) para observar os aspectos góticos utilizados. Por fim buscou-se
contribuir para uma reflexão sobre a situação opressiva que a mulher foi condicionada no
contexto do conto.
Palavras-chaves: patriarcal; gótico; repressão; grotesco.
112
Graduanda em Letras-Língua Inglesa pela Universidade Federal de Campina Grande-Cajazeiras.
113
Graduanda em Letras-Língua Inglesa pela Universidade Federal de Campina Grande-Cajazeiras.
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INTRODUÇÃO
A escritora americana Charlotte Perkins Gilman era conhecida como uma jornalista
feminista que defendia os direitos das mulheres, ela nasceu em 1860, em Hartford,
Connecticut, e escrevia sobre temas como justiça e desigualdade social, porém tinha como
foco principal de escrita a luta das mulheres contra o aprisionamento dentro da sociedade e
dentro do casamento. Em muitos de seus trabalhos como por exemplo relativas às
crianças (1900), The Home (1904), e o Trabalho Humano (1904), Mulheres e Economia
(1898), Gilman apresenta seu ponto de vista em relação a criação dos filhos e a condição
da mulher, que está diretamente ligada as tarefas domésticas.
Na literatura, ela escreveu contos e histórias, porém sua obra de maior destaque foi
o conto ―The Yellow Wallpaper‖ escrito em 1892, que narra a vida de uma mulher
aprisionada nos seus próprios pensamentos, que não é compreendida nem pelo marido e
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nem pela sociedade. Este conto foi uma revolução para sua época, pois tratava em forma
de sátira o tratamento do repouso, recomendado as mulheres com problemas psicológicos,
além de traços da vida da autora, como por exemplo, o casamento mal sucedido, a
depressão pós-parto, entre outras características comuns à vida das mulheres à época.
Gilman casou-se pela primeira vez em 1884 com Charles Walter Stetson, e tiveram
uma filha, Katherine. Depois da maternidade Charlotte apresentou graves crises de
depressão, sendo consultada por um médico chamado Dr. Weir Mitchell. Ela foi orientada
a repousar por algum tempo até que se apresentassem melhoras, mas ela decide romper
com o tratamento, e se mudar para a Califórnia, onde se separa do primeiro marido, e se
casa com George Houghton Gilman. Em 1935, esses aspectos sobre da vida da autora
foram descritos em sua autobiografia The Living of Charlotte Perkins Gilman.
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114
"O gótico feminino pode, assim, ser visto como uma versão do Gotico criado por autoras mulheres para
explorar anteriormente o horrìvel,―mosntruoso‖, "aspectos da vida das mulheres". (Stein, 1983, p. 126,
tradução nossa)
115
Algumas escritoras femininas veem a loucura como perspicaz, como uma heróica jornada interior , uma
maneira de integrar a si (STEIN, 1983, p. 130, tradução nossa)
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the Grothesque and Arabesque (1840)116 tratando do padrão do papel de parede, no qual
Poe relaciona a algo ―estranhamente misto e fantástico‖, assim de acordo com Davison
(2004, p.64) ―The arabesque designs are active symbols of Poe‘s efforts to melt away the
rigid pattern that is imposed by man‘s reason‖ .117
Logo, são esses elementos que Gilman alcança no seu conto, questionando a
sociedade patriarcal de forma simbólica, através dos arranjos ornamentais do papel de
parede arabesco, que é algo grotesco na literatura, remetendo a idéia de uma câmera
fotográfica, onde uma visão distante se mostra uma imagem bonita, mas de perto é algo
conflituoso, perturbador, pinturas incongruentes, feias, bizarras com formas estranhas,
obedecendo a um padrão geométrico, que significamente é feito por homens. E logo a
cultura árabe é bastante representativa nesse conto, pois é totalmente repressora no modo
como as mulheres são tratadas nessa sociedade, tornando-se uma referência pra Gilman
para refletirem e criticarem a condição da mulher em mundo dominado por mentes
masculinas.
116
Conto do Grotesco e Arabesco de Poe (tradução nossa)
117
Os desenhos de arabesco são símbolos ativos de esforços de Poe pra fundir o padrão rígido que é imposto
pela razão do homem.‖ (DAVISON, 2004, p. 64, tradução nossa).
306
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autora usa uma linguagem de diário, em razão de ser algo utilizado apenas por mulheres,
sem credibilidade na literatura. Com tal característica, critica sutilmente a limitação da
mulher em produzir textos literários.
De acordo com Gibbs (1994 apud CONZ, 2010, p. 10) observa-se o estudo de
três tipos de ironias, conhecidas como ironia verbal, situacional e dramática:
(a) Ironia verbal é uma figura de linguagem na qual o falante intenciona ser
entendido como falando alguma coisa que contrasta com o uso literal do que foi
dito.
(b) Ironia situacional resulta do reconhecimento de estranheza de uma dada
situação, havendo discrepância entre o resulta do esperado e o resultado real.
(c) Ironia dramática é quando há uma diferença de consciência entre a
personagem de uma obra literária e seu leitor; quando as palavras e ações
possuem significância que o leitor entende, mas não a personagem.
118
―[...]eu diria mesmo uma casa assombrada, e atinjo o auge da felicidade romântica — mas isso seria exigir
demasiado do destino! ‖ (GILMAN, 1892, p. 4, tradução de José Manuel Lopes)
119
―O John é médico e talvez (não o diria a ninguém, é claro, mas isto é papel morto e um grande alívio para
o meu estado de espírito) — talvez seja essa uma razão para que eu não melhore mais rapidamente.‖
(GILMAN, 1892, p. 4, tradução de José Manuel Lopes)
307
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Também observamos que ela escreve para distrair a mente, já que a mesma sofre
com problemas mentais, isso é uma forma de expressar seus pensamentos, já que o marido
ignora o que ela sente e também pode ser por isso que seu estado mental não melhore: ele a
trata como uma criança e por ser médico, pensa ter o controle total da saúde de sua esposa.
Nota-se que a narradora é diagnosticada, pelo marido, com uma ―leve histeria‖, e
historicamente a histeria e a depressão eram doenças comuns das mulheres no século XIX.
Assim, ela é proibida de efetuar qualquer atividade que conduzisse a um cansaço da mente.
Em vista disso, ela era proibida de escrever e questiona a insignificância que seu marido
dar a doença, e também a autora indaga de forma mais ampla e profunda, o que se pode
fazer em discordância a submissão da mulher. Gilman também está criticando a repressão
na literatura feminina, pois as mulheres eram condicionadas a escreverem apenas em
diários, pois suas escritas não eram valorizadas.
Portanto, obervar-se que ela encontra voz no diário secreto, uma representação da
mulher escritora e a repressão que a mesma sofria, relacionando com o contexto da mulher
da época, que era oprimida pela sociedade patriarcal, condicionada a uma figura frágil,
limitada e aos afazeres domésticos do casamento. Sua voz está sendo negada, mas isso tem
um caráter subversivo, pois ela tem voz através da escrita, em contraposição ao marido que
representa o vilão gótico, o qual policia e a oprime, controlando a vida de sua esposa.
Gilman inspirada na escrita de Poe, foca no aspecto sombrio, tratando a questão da
opressão feminina como sujeito inferior em uma sociedade patriarcal. Ademais, a autora
usa da verossimilhança para criticar o tipo de tratamento para a depressão existente nesse
período, da cura pelo descanso.
120
“O John disse que, se eu não melhorar, me enviará para o Dr. Weir Mitchell no Outono. Mas eu não
quero, de modo nenhum, ir para lá. Tive uma amiga que esteve, em tempos, nas suas mãos, e ela diz-me que
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Também destaca-se um fator simbólico: a personagem principal não tem nome, ela escreve
um diário, mas não se identifica, representando todas as mulheres anônimas que sofrem
com a opressão do sistema patriarcado.
No caso da figura de John, ele representa o sistema patriarcal, assim como Jennie é
o exemplo da mulher que aceita a condição de submissão, eles conspiram, sem maldade,
pode-se dizer que contra a liberdade da narradora que percebe o que há nas entrelinhas das
falas de ambos. Nota-se outra ironia verbal acerca de Jennie: ―She is a perfect and
121
enthusiastic housekeeper, and hopes for no better profession.‖ (GILMAN, 1892, p.
1136). Constata-se a crítica que autora faz a posição de Jennie, como antagonista, visto
que, sem perceber age como uma inimiga que a policia, pois ela é uma mulher conformada,
em contraste com a narradora que deseja liberdade.
ele é tal e qual como o John e como o meu irmão, só que ainda pior do que eles!‖. (GILMAN, 1892, p. 16
tradução de José Manuel Lopes)
121
―Ela é uma dona de casa perfeita e entusiasmada, e não deseja outra profissão melhor.‖ (GILMAN, 1892,
p. 15, tradução de José Manuel Lopes)
309
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122
―Bem, o Quatro de Julho acabou! As pessoas já se foram embora e eu estou exausta.‖ (GILMAN, 1892, p.
15, tradução de José Manuel Lopes)
310
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– the heroines learn to identify with their hidden selves and to reaffirm the values
which had previously been denied. 123.
Observa-se que Bertha é o outro, que vem de uma colônia, sendo explorada e
aprisionada por seu marido, já a protagonista de The Yellow Wallpaper, está no início da
sua loucura, e ela quem está contando sua estória, onde sua cunhada Jennie, funciona como
Grace Poole - que cuidava de Bertha- são mulheres que policiam as outras. Percebe-se
similarmente, que os dois maridos são tratados como bons, em suas consciências pensam
que o modo como tratavam suas esposas, era o melhor, vemos que Bertha não tem voz,
Jane Eyre quem a descreve, porém, a loucura da personagem de Gilman tem voz através da
escrita. Por sua vez, vê-se que no caso de Bertha, a mulher da colônia é a mais oprimida,
pelo patriarcado e pelo imaginário colonial.
Aliás, a autora inglesa Charlotte Brontë, também explora com riqueza a condição
da mulher do século XIX, quando através da personagem Jane Eyre, critica a sociedade
que oprime e reprime a figura feminina:
Supõe-se que as mulheres são muito calmas em geral, mas elas sentem da mesma
forma que os homens; precisam tanto do exercício para suas faculdades, e de um
campo para seus esforços, quanto seus irmãos; sofrem com uma contenção
123
Essas heroínas experimentam a loucura como uma etapa no caminho para a auto-conhecimento. Nestas
jornadas internas - o equivalente feminino da aventura masculina - as heroínas aprendem a identificar-se com
os seus próprios ocultos e para reafirmar os valores que anteriormente tinham sido negados. (tradução nossa)
311
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Este conto de Gilman explora com profundidade por meio de uma heroína gótica, a
vitimização, o confinamento, o cerceamento da mulher como escritora, inclusive ela tem
uma visão da maternidade e os afazeres domésticos como um impedimento para a escrita
feminina, reforçado pelo sistema dominador que é do patriarcalismo. A autora enriquece a
obra quando utiliza a estética do grotesco e do arabesco presentes na escrita de Poe (1840)
através do padrão do papel de parede, o que provoca perturbação na protagonista, já que o
grotesco traz a ideia de estranho, bizarro, incongruente. Ainda em relação a Poe, conhecido
como o pai do simbolismo e da ficção, percebe-se a voz maníaca e enlouquecida da autora
nos personagens de Poe.
124
“(...) quase posso imaginar um padrão de irradiação, apesar de tudo — esses grotescos desenhos
intermináveis parecem formar-se em torno de um centro comum para depois se precipitarem em grandes
mergulhos de cabeça, de igual distração.” (GILMAN, 1892 p. 18, tradução de José Manuel Lopes)
312
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consegue tocar no ponto crucial do seu conto, pois esse padrão reflete uma cultura
estrangeira que subjuga e oprime a classe feminina, a cultura árabe. Por essa arte ser
produzida por homens, têm-se um sentido da posição da mulher, Gilman usa uma
linguagem verbal e imagética, para mostrar que são os homens que repetem o padrão da
vida das mulheres.
Constata-se que o arabesco é uma forma de arte árabe, o qual também reflete a
visão teológica do mundo árabe, de não fazer imagem, principalmente formas humanas,
agindo de acordo com seus princípios religiosos. Assim têm-se, a significância religiosa do
papel de parede, representando o padrão religioso das leis islâmicas, o qual a autora afunila
mais ainda sua crítica, pois quem determina o padrão de educação das mulheres islâmicas
são os homens, influenciados pelos princípios do Alcorão. Assim vê-se a beleza crítica da
obra, pois ela está questionando o padrão religioso e também o papel de gênero. O
arabesco é totalmente racional, o qual obedece ao padrão geométrico e matemático, é nesse
sentindo que a escritora questiona o padrão de tratamento das mulheres, da razão.
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But he did, and right across my path by the wall, so that I had to creep over him every
time!‖125(GILMAN, 1892, p. 1149).
Por fim, ela se liberta da prisão da mente, olha com superioridade para aqueles que
lhe aprisionaram em si mesma, descobre sua subjetividade, visto que antes não entendia
sua condição, ela não concordava, mas não tinha consciência de sua situação de
prisioneira. No desenvolvimento da sua loucura, ela vai tomando consciência e tornando-se
sã, em oposição da ―antagonista‖, Jennie, que ao termino da narrativa continua aprisionada
e não descobre sua subjetividade.
CONCLUSÃO
Em suma foi discutido nesse estudo, o tom irônico da autora, onde podemos
destacar dois tipos de ironia: a ironia dramática e a ironia verbal. Somando-se a isso de
forma mais abrangente, foram analisados os aspectos do gótico feminino, o qual destaca-se
que a loucura é um motivo literário do gótico, e é através desse elemento que a
protagonista reflete sobre sua condição, tentando buscar a verdade, a partir do papel de
parede amarelo. Observa-se que o papel de parede funciona como uma espécie de projetor
da vida da personagem, no qual ela enxerga uma mulher presa no papel até chegar ao
ponto de identificar-se com aquela situação, pois representava sua condição dentro do
casamento e, também de modo amplo, dentro da sociedade patriarcalista.
Assim, a autora utiliza dessa obra para expor e denunciar a condição de submissão
da mulher, de modo que Gilman situa sua vida particular com a vida da protagonista,
revelando a repressão que a mulher do século XIX ainda sofria, devido a uma sociedade
patriarcalista. Também foram destacados a influência da escrita de Poe nessa obra, com
seus estudos do grotesco e do arabesco, vê-se a forma profunda com que Gilman aborda
sua crítica feminista, ao usar o padrão árabe do papel de parede, significando o padrão da
sociedade patriarcal, observamos então que de forma harmoniosa, ela excede o simples
para atingir o profundo.
125
“Agora digam-me, por que razão teria aquele homem desmaiado? Mas é que desmaiou mesmo, e logo no
meu caminho, junto à parede, de modo que tinha sempre que rastejar por cima dele.‖ (GILMAN, 1892 p. 19
tradução de José Manuel Lopes)
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REFERÊNCIAS
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Acesso em: 04 maio. 2017.
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ZABEL, Morton Dauwen. A arte da ficção nos Estados Unidos. In: Contos norte-
americanos: os clássicos. Rio de Janeiro: Ediouro. P. 8-20.
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RESUMO
INTRODUÇÃO
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Diante disso, é importante considerar que, o século XIX não foi um período fácil
para as mulheres. Nele, elas eram submetidas às condições sociais impostas pela sociedade
- de modo muito mais difícil do que nos dias atuais -, bem como pelo pensamento machista
que era fortalecido e apoiado por princípios religiosos, os quais a compreendiam como
mero ―instrumento‖ de procriação. Além disso, a figura feminina não usufruìa de direitos
igualitários quando comparado aos homens da mesma época, por exemplo: não tinha
direito ao voto; se fosse casada e, por algum motivo se divorciasse, não teria o direito de
ficar com a guarda dos filhos; não poderia ter bens materiais em seu nome, muito menos
administrá-los em caso de perda dos parentes masculinos, conforme atestam Gilbert e
Gubar (1996). Já o acesso à educação era totalmente limitado a um aprendizado básico,
direcionado à maneira de como se comportar na sociedade, especialmente como dona de
casa de forma que agradasse os homens, em especial, ao marido, o que a relegava a uma
situação de total submissão, como mostra Araújo (apud PRIORE, 1997, p.50):
317
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Esta situação não era diferente no espaço literário, sobretudo até o século XIX,
visto que as mulheres viviam numa espécie de confinamento, ―trancadas‖ na casa do pai ou
do marido. Muitas delas realizavam seus escritos de maneira privada e íntima, no silêncio
da noite, em seus quartos, local onde respondiam às cartas recebidas, mantinham seus
diários atualizados, talvez como forma de terapia, especialmente ao relatar suas vidas em
forma de escrita (PERROT, 2007). Além disso, no caso de possíveis publicações, elas
deveriam sair ―pelas portas dos fundos‖, muitas vezes em forma de pseudônimos
masculinos com o intuito de apagar a imagem feminina devido aos preconceitos
relacionados, inclusive, aos temas abordados nos seus escritos pela crença de
―improdutividade‖ atribuìda às suas produções que muitas vezes tratavam exclusivamente
das próprias experiências de vida. Assim, através da escrita, elas expressavam de forma
implícita suas mais profundas angustias e insatisfações com aquelas rotinas submissas ao
seu provedor (pai ou marido) e aproveitava esta única ―arma‖ – a escrita - para criticar a
condição ao qual estavam destinadas: domesticidade, procriação e a serem anjos do lar. De
acordo com Moreira (2005, p. 235):
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universo literário, compreende-se o período que vai desde a fase de aceitação das obras
pelas editoras para a publicação até a recepção destas, principalmente por parte dos leitores
masculinos, considerados na época os críticos literários.
Entretanto, estes processos não eram simples nem fáceis, pois havia na maioria das
vezes imposições sociais que barravam e limitavam estes escritos, principalmente os
produzidos pelas mulheres. As irmãs Brontë – Emily Brontë (1818-1848), Charlotte (1816-
1855) e Anne (1820-1848), por exemplo, ficaram excluídas por muito tempo do espaço
literário já que elas usaram pseudônimos masculinos ou apenas as iniciais do nome em
algumas de suas obras como tantas outras escritoras. Com isso, elas objetivaram ocultar a
―imagem feminina‖ devido ao forte preconceito e suposta ―incapacidade‖ atribuìda as suas
atividades de escritas. A este respeito, Lobo (1998, p. 5) destaca:
Ser o outro, o excluso, o estranho é próprio da mulher que quer penetrar no sério
mundo acadêmico ou literário. Não se pode ignorar que, por motivos
mitológicos, antropológicos, sociológicos e históricos, a mulher foi excluída do
mundo da escrita – só podendo introduzir seu nome na história europeia por
assim dizer através de arestas e frestas que conseguiu abrir através de seu
aprendizado de ler e escrever em conventos.
Além disso, outro fator que barrava as produções literárias femininas era à
desvalorização dos temas abordados nas obras, visto que eles prestigiavam, na sua maioria,
apenas o espaço doméstico/familiar. Entretanto, por meio destas escritas, as mulheres
puderam usá-las a seu favor como um grito de protesto (ainda que de maneira implícita) ao
fazerem referência à insatisfação delas com a vida limitada que as prendiam neste universo
patriarcal, sempre dependente da figura masculina. Ainda sobre isso, Dias (2015, p. 18)
ressalta:
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ainda são apresentadas como morais, frágeis, dóceis, emotivas, amantes da paz, da
estabilidade e da comodidade do lar, incapazes de tomar decisões, desprovidas da
capacidade de abstração, intuitivas, crédulas, sensíveis, ternas e pudicas.
Logo, cabe ressaltar que a liberdade da mulher nesse período era limitada apenas ao
espaço privado ligado ao âmbito doméstico/maternal e restrito ao espaço social, enquanto
os homens mantinham-se donos do poder nos espaços públicos e privados. Além disso,
suas vestimentas também deveriam estar de acordo com os padrões morais aceitáveis pela
sociedade, pois elas também faziam parte dos ―negócios‖ de seus maridos nas reuniões ou
jantares oferecidos com interesses lucrativos. Nestas ocasiões elas deveriam manter uma
postura adequada mesmo contra a própria vontade. Além do mais, Dantas (2016, p. 27)
ainda destaca outras limitações atribuídas ao modo de vida delas mesmo no âmbito
doméstico:
321
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
maneira significativa para publicações futuras. Ora, Kate Chopin, uma escritora sulista dos
Estados Unidos continha em seu próprio diário escritos inicias que deram início nas
produções de suas obras aos trinta e dois anos quando foi instruída pelo seu médico a
escrever com fins terapêuticos após a perda de sua mãe. Sendo assim, as obras escritas
pelas mulheres daquela época de submissão/passividade proporcionam aos leitores atuais
terem acesso aos costumes e ao modo como elas viveram, uma vez que nesses diários,
essas escritoras e tantas outras que adotaram esta prática refletiram sobre o próprio papel
na sociedade e na maneira como representaram a realidade da qual faziam parte através da
literatura. Já as mulheres que preferiram se livrar de seus escritos restam sobre elas
somente referências esparsas em textos de pessoas que as conheciam ou de pesquisas
realizadas de acordo com os relatos da época.
Portanto, desde que as mulheres passaram a retratar suas rotinas de esposa/dona de
casa através do meio literário, discussões sobre a quebra dos padrões de suas escritas em
relação aos modelos canônicos de autoria masculina foram elencados em meio a uma
tradição que as inferiorizavam. Embora, já no final do século XVIII, foi permitido que as
mulheres escrevessem, mas tais textos, de modo geral, consistiam em receitas, diários,
manuais domésticos de como manter a casa em ordem, entre outros gêneros, desde que não
violassem os bons costumes e a moral da cultura patriarcal (TEDESCHI, 2008).
Algumas delas iam além, e aproveitavam suas histórias para criticar a sociedade
opressora. Foi isso que Kate Chopin fez em seu romance intitulado “The Awakening”
(1899), traduzido em português para “O despertar” (1889). Assim, a autora inseriu através
da personagem Edna Pontellier, pensamentos e ações considerados a frente do seu tempo,
que confrontavam todos os princípios morais de uma sociedade patriarcal, tudo isso em
razão da busca pela identidade de sua protagonista que, embora já fosse casada a mais de 8
anos, descobriu o amor, a sexualidade, a independência através de outro homem mais
novo. Acerca da recepção do romance de Chopin e o conteúdo, Sroczynski (2004, p.
10:11) afirma:
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Por isso, todos os livros foram retirados das bibliotecas e queimados em praça
pública por ter sido considerado uma ameaça aos princípios patriarcais tendo em vista que
o publico leitor na sua maioria fossem as mulheres. Isso fez com que a escritora Kate
Chopin fosse esquecida por muito tempo da literatura, e somente nos anos sessenta, com a
ascensão da critica literária feminina foi que ela ganhou novos espaços, principalmente nas
pesquisas acadêmicas sobre feminismo.
Entretanto, outras escritoras também sofreram para hoje serem reconhecidas no
mundo editorial literário. Virginia Woolf, em Um teto todo seu (1929), iniciou seu texto
fazendo uma ironia ao sistema patriarcal por retirar da mulher a liberdade de escrita e a
independência, ao dizer que ―a mulher precisa ter dinheiro e um teto todo dela se pretende
mesmo escrever ficção‖ (WOOLF, 2004, p. 8). Neste discurso, a escritora enfatizou a
limitação e econômica de total dependência do seu provedor - no caso pai ou esposo – uma
das barreiras que dificultavam seus sonhos de se tornarem reconhecidas como escritoras,
principalmente quando a publicação tinha que ser custeadas por elas mesmas e a restrição
espacial delimitada apenas ao espaço doméstico, a própria casa, confinadas em seus
quartos.
Mesmo diante de tantos percalços, os escritos femininos foram aos poucos
ganhando destaque e se tornaram essenciais para motivar e dar voz às mulheres no espaço
literário. Sobre isso, Perrot (2005, p.13) destaca a importância dos escritos iniciais
femininos:
Assim, o século XIX foi um período de destaque nos escritos de autoria feminina,
situação que logo espalhou-se pela Europa e Estados Unidos bem como no Brasil. Dentre
os escritos literários de autoria feminina, podem-se destacar contos, poesias e romances
como os gêneros de maior produção. Segundo Vasconcelos (2002, p. 107) ―[...] o romance
foi o instrumento escolhido por muitas delas [mulheres do século XIX] exatamente como
meio de expressão, de denúncia, de revolta e de recusa de sua situação‖. Além do mais,
poesias ou contos eram mais fáceis de serem publicados e a circulação destes era mais
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viável e acessível a todas as mulheres principalmente, tendo em vista que estes eram
inseridos em jornais e revistas.
Além do mais, o romance foi o gênero literário que prevaleceu na Inglaterra durante
o século XIX, ao qual foi fortalecido, inicialmente, pelos escritos de Jane Austen,
considerada a principal representante do romance inglês por tratar nos seus escritos o que
realmente interessava a ela - a conduta das pessoas que estavam misturadas a uma
sociedade tomada pela ambição, onde os valores eram mais importantes do que o próprio
―Eu‖ (FREIRE, 2011). As obras de Austen ajudaram a moldar a nação inglesa, uma vez
que retratavam aquela sociedade patriarcal e imperialista (DIAS, 2015).
Ainda sobre o romance, Perrot (2007, p. 99-100) afirma que foi este gênero ―[...]
em particular, que se tornou o território das grandes romancistas inglesas (Jane Austen, as
irmãs Brontë, George Eliot, Virginia Woolf e as demais) [...]‖. Além disso, para Lukács
(1964) este gênero literário tornou-se o mais simbólico e representativo da sociedade
burguesa por mostrar as contradições e conflitos dos personagens entre os desejos pessoais
e sociais, onde o herói inicia uma luta a fim de modificar alguns princípios impostos pela
sociedade, por exemplo, o acesso à educação era limitado de acordo com a classe social de
cada indivíduo. O autor defende que o romance é um gênero burguês porque trata dos
anseios da burguesia em ascensão e sua necessidade de promover mudanças sociais nas
rígidas regras sociais estabelecidas para cada classe social. Neste sentido, o herói do
romance é problemático porque luta contra as amarras sociais que impediam seu pleno
desenvolvimento como indivíduo. Esta questão se adequa perfeitamente aos romances de
autoria feminina, visto que eles apresentam heroínas problemáticas que lutam contra as
forças opressoras da sociedade, a exemplo de Edna Pontellier em O despertar.
Assim, as lutas travadas contra as opressões machistas amparadas pelo sistema
patriarcal aos poucos foram sendo desmistificadas através das vozes femininas que
eclodiram no espaço literário, e que durante séculos reivindicaram/reivindicam um espaço
digno e igualitário em todas as esferas sociais, das quais eram/são excluídas. Os relatos e
experiências destas escritoras/protagonistas na literatura de modo geral, ao longo da
história, tornaram-se relevantes para que houvesse um reconhecimento cultural e
acadêmico em seus diversos gêneros, de modo que estes possam servir de modelos para o
papel da figura feminina inserida na obra seja repensada e assim destacada como ―sujeito‖
e não como ―objeto‖ nos escritos futuros, já que, segundo Patrocìnio (2010, p. 29) a
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―Literatura busca a formação de um espaço próprio [...] em que a mulher seja o sujeito do
discurso [...]‖ afim de que esta possa ―construir sua própria representação‖.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Portanto, é notório o quanto a mulher batalhou para alcançar seus objetivos, e ser
reconhecida como sujeito ativo dentro da sociedade, em especial no mundo editorial.
Pois seu percurso foi árduo e repleto de lutas para hoje ter, dentro do possível liberdade e a
igualdade conquistada: trajam-se da maneira que as satisfazem, escolhem seu esposo,
podem ter sua profissão/independência, estudam o que lhes agrada, andam sozinhas, etc.
No entanto, mesmo estando no século XXI, ainda é possível encontrar em alguns países
mulheres em situação de estrema submissão. Em relação à escrita de autoria feminina
houve uma evolução significativa, pois elas conseguiram reconhecimento nesse mundo
editorial: não precisam mais usar pseudônimos masculinos, a escrita não é mais realizada
numa espécie de confinamento, os temas são livres de acordo com o que realmente lhes
agrada ou agrada o público leitor e tem melhores condições econômicas para custearem
suas publicações.
Conforme pode ser observado, foi muito difícil para as mulheres se aventurarem no
universo editorial, mas mesmo assim, após um longo caminho de lutas elas conseguiram
empreender mudanças e oferecer uma nova roupagem em teorias que foram formuladas
pelos homens, trazendo-as atualmente para o centro das pesquisas acadêmicas literárias.
REFERÊNCIAS
325
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
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WOOLF, Virgínia. Um teto todo seu. Tradução de Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 2004.
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RESUMO
O cordel, uma das importantes manifestações da cultura popular nordestina, teve no
cangaço um dos seus grandes temas. Além de comentar as violências de Lampião e seu
bando, com a entrada das mulheres no cangaço, fato ocorrido em 1930, os cordelistas
agregaram romance e o erotismo como importantes elementos dos seus versos. As
mulheres são representadas no cordel sob diversos aspectos. Mas como as mulheres que
participaram do cangaço entre os anos de 1930 até 1940 são representadas na literatura de
cordel? Para refletirmos sobre isto trabalharemos com cordéis que versam sobre as
trajetórias de duas das mais famosas cangaceiras: Maria Gomes de Oliveira (Maria Bonita)
e Sérgia Ribeiro da Silva (Dadá). A partir disto pensaremos quais lugares foram/são
instituídos para as mulheres no verso popular.
Palavras-chave: Mulheres; Cangaço; Cordel; Cangaceiras.
Maria Gomes de Oliveira, ―Maria de dona Déa‖, ―Maria Déa‖, ―Santinha‖, ―Maria
do Capitão‖, foi mulher de muitos epìtetos e de muitas histórias. Seu nome aparece sempre
atrelado ao de alguém. Primeiro era Maria, mas Maria de Dona Déa, pertencendo à sua
mãe, algo comum no sertão nordestino e que facilitava a identificação das pessoas, os
nomes dos filhos estavam muito ligados aos de suas mães. Alguns testemunhos afirmam
que ao entrar no cangaço, Lampião renomeou sua companheira e a partir daí passou a ser
chamada de Santinha. Lins (1997) fala desta nomeação e vê nela não apenas uma questão
estratégica para dificultar a identificação da mulher que estava com ele, mas sim uma
327
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
tentativa de construir para sua mulher uma nova identidade, onde sua vida anterior fosse
esquecida. Podemos pensar também num esforço por parte de Lampião de cobrir com esse
nome os atos cometidos por Maria Bonita para viver com ele, atos considerados levianos e
indignos de uma mulher honesta. Pois não podemos deixar de pensar que indo viver com
um cangaceiro, Maria Déa quebrou o laço sagrado do matrimônio, portanto, era
considerada pela sociedade como uma adúltera.
Os testemunhos dão conta que Maria Déa vivia um casamento infeliz, marcado por
brigas, com seu primo legítimo, o sapateiro Zé de Neném, por isso, enquanto esteve casada
era conhecida como Maria Neném. Segundo muitas elaborações, Zé de Neném era
considerado pela esposa como covarde e fraco e que o fato de não ter dado filhos à sua
mulher era mais uma demonstração dessa fraqueza moral e física. Até uma suposta
homossexualidade é colocada no meio das suposições:
O problema é que, além de ser pessoalmente sem graça – até desdentado ele era
–, Zé de Neném não desempenhava bem o seu digamos assim, papel de marido.
Quase nunca procurava a jovem esposa e ainda parecia muito mais fazê-lo para
cumprir a obrigação do que propriamente por apreciar a companhia da mulher.
Maria Deia chegou a pensar que, na verdade, ele gostava mesmo era de homem e
só tinha se casado para disfarçar a preferência. Ela fantasiou muitas vezes se
entregar a outros ao longo daqueles sete anos de casamento, mas nunca teve
coragem. Pois agora Zé de Nénem teria uma boa lição: ninguém menos que
Lampião, o cabra mais corajoso, famoso e cobiçado de todo o sertão, estava
interessado nela. Quem era Zé de Neném perto de Lampião? Ninguém
(OLIVEIRA, 2012, p. 143).
caminhos de Corisco e Dadá pelo sertão. Assim o mar e o sertão são utilizados como
metáforas, o sertão é como o mar, misterioso, perigoso, imenso, capaz de causar fascínio e
curiosidade. A natureza do litoral e do sertão são também personagens relevantes. A
aspereza da ação dos homens se confunde com a aspereza do sertão, suas paisagens
cinzentas, o sol forte ressecando os animais, as almas de homens e mulheres. Os bichos
rastejando no solo pedregoso estão presentes na encenação do estupro de Dadá, violentada
de forma brutal por Corisco, brutalidade que a colocou doente. A violência, porém, é
minimizada na narração e até romantizada, sendo o amor colocado como a outra face do
ódio da menina. Na versão cinematográfica Dadá odiou Corisco, mas também o amou ao
ponto de tentar defendê-lo da morte. Que Dadá foi representada no filme? Ao meu ver,
uma Dadá diversa da construída pela própria. A Dadá do cinema é mostrada como a
mulher que sofre por estar no cangaço, ao ver seus filhos morrendo pede a Corisco para
abandonarem o cangaço. Em uma das cenas Dadá faz ajustes em um vestido de Maria
Bonita, o vestido cobria o corpo de Maria que ouvia as reclamações de Dadá com ar de
impaciência, mais preocupada com sua pele próxima dos alfinetes manuseados por Dadá.
Maria Bonita é representada como mulher vaidosa e voluntariosa, acostumada com a vida
de riquezas do cangaço fala com orgulho da recepção que ela e Lampião tiveram em uma
cidade do interior, com prefeito, delegado e padre prestando homenagem aos dois. A
tristonha Dadá parece inconformada e até mesmo espantada com a forma como Maria
encarava o cangaço com alegria, como se fosse uma grande festa. Para ela restava apenas a
solidão, o medo e a morte constante dos filhos transformados em anjos de uma corte
comandada por São Jorge.126
No livro Gente de Lampião: Dadá e Corisco (2003 [1982]), do pesquisador do
cangaço Antônio Amaury Correa de Araújo, escrito após entrevistas com a cangaceira
Dadá, que passou alguns meses morando na casa do autor, e também com entrevistas
realizadas com outros cangaceiros. O Autor assim relata a entrada de Dadá no bando.
126
Ver: CORISCO e Dadá. Direção: Rosemberg Cariry. Fortaleza: Cariri Filmes, 1996. Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=XmT6_8ouAIY. Acesso em: 15. Out. 2015.
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para que lhe cuidem da saúde. Deixa algum dinheiro e parte, prometendo voltar
breve.
Sérgia fica ali quase três anos. Corisco foi visita-la várias vezes. Trazia cortes de
pano, perfumes, jóias e dinheiro. Procurava agradar a pequena. Sussuarana,
como a chamava o cangaceiro, odiava Corisco. Quando ele chegava de surpresa
o comportamento da menina se alterava: tornava-se retraída, desconfiada.
Mostrava claramente desagrado pela presença de seu raptor. (ARAÚJO, 2003
[1982], p. 46)
No mesmo livro uma frase foi escolhida para fazer parte da contracapa, onde está
escrito ―Dadá valia mais que muito cangaceiro‖. Segundo o autor do livro, foi dita pelo
cangaceiro Labareda, um dos subchefes de grupo. Percebo na frase que o valor da mulher
não está intrínseco no fato mesmo de ser mulher, mas sim de ser uma mulher com atitudes
ditas masculinas. Valia mais que um cangaceiro, parece um elogio. No contexto em que foi
dito é elogiosa, reflete a elevação da figura de Dadá, mas é uma valorização subordinada à
masculinidade. A própria Dadá assumiu o discurso de sua diferença frente às outras
mulheres, quando faz isso se distancia do feminino e o coloca num lugar de inferioridade,
de fraqueza. ―Com exceção de Dadá, nenhuma das mulheres no cangaço tomava parte nos
combates, mas elas se afirmavam como companheiras de um cangaceiro‖. (GRUSPAN-
JASMIM, 2006, p. 36). A positividade atribuída a Dadá, sempre direcionada para o
masculino, reflete o papel da mulher na sociedade sertaneja, pois como apontei no começo
do capítulo, na sociedade sertaneja a masculinidade era ainda mais imperiosamente
desejada e necessária. Mas como estas duas mulheres foram imortalizadas na literatura de
cordel? Não pretendo com este trabalho trazer à tona todos os discursos sobre Dadá e
Maria Bonita, pois são muitos e diversificados, mas espero refletir sobre como os
cordelistas acentuaram nos seus versos a sexualidade, beleza, dando ao cangaço uma
conotação romântica que minimiza a violência.
A literatura de cordel foi durante muito tempo percebida como uma literatura feita,
e também utilizada, pelas classes subalternas que não tiveram acesso à literatura
considerada erudita. Galvão nos diz que ―os depoimentos parecem indicar, assim, que a
alfabetização das pessoas por intermédio do cordel se dava de maneira autodidata por meio
da memorização dos poemas‖ (GALVÃO, 2002, p. 125). Por ser produzida e largamente
utilizada por pessoas que viviam no interior do Nordeste, ela não foi pensada como fonte
histórica importante, os discursos produzidos por ela caíam apenas no anedótico. Mas
pensando a partir dos pressupostos da História Cultural, a literatura de cordel passou a ser
utilizada em maior escala, principalmente em trabalhos relacionados com a história do
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
No cordel Vida, Vingança e Morte de Corisco a violência sofrida por Dadá ao ser
raptada por Corisco é apagada e surge pelas mãos do poeta popular uma história de amor e
encantamento entre os dois:
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Se Dadá foi mostrada como uma mulher amorosa e apaixonada, não podemos
esquecer as imagens de valentia e bravura também atribuídas a estas mulheres, e que
mesmo nestes discursos de exaltação, há uma tentativa de subordinação do feminino. Ao
refletir sobre as imagens da mulher-macho, a historiadora Alômia Abrantes da Silva,
pensou também o cangaço como mais um lugar em que este discurso encontrou eco. A
respeito disto Silva (2008, p. 114) diz:
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Essas estrofes anteriores são a introdução que o autor precisou criar para lançar o
leitor na história de vida de Maria Déa, menina que ele constrói como sendo muito pobre,
com nenhuma escolaridade e sem profissionalização ou perspectiva de um futuro
profissional. Na sua elaboração, apenas estas dificuldades explicariam a opção de Maria
Déa em casar com um ―Lambe-Sola‖. Aqui novamente se percebe a tentativa da
desqualificação da masculinidade de Zé de Neném, da qual falei anteriormente. Esta
desvirilização do marido de Maria Déa alcançou os escritos de memorialistas, de
historiadores e também dos cordelistas. Nesta elaboração, ela aceitou o casamento como
um fardo, uma obrigação:
Para não morrer de fome
Maria se sujeitou
Casar-se com o jovem Déa
Porque o pai a obrigou
Mulher nova, cheia de vida
Pra não ser ―mulher perdida‖
O casamento aceitou.
(CAVALCANTE, 1983, p. 2)
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
A partir deste quadro o cordelista narra os anos de casamento de Maria Déa como
anos de infelicidade conjugal, e tendo como causa desta infelicidade o gênio de Maria.
Nesta narrativa poética, é neste momento que vai sendo gestada na sertaneja uma
admiração por Lampião, não apenas no aspecto romântico, mas uma admiração que
preenche sua vontade de engajamento na luta cangaceira. Aparece assim uma Maria Bonita
preocupada com as questões sociais:
Sentia Maria Déa
A injustiça do Sertão.
O terror dos Coronéis
Que não tinham coração,
Por isso mesmo falava
Que um dia se encontrava
Com o Capitão Lampião.
(CAVALCANTE, 1983, p. 3)
O autor explica que ao realiza o desejo de se juntar a Lampião, Maria Bonita teve
logo participação nas escaramuças do grupo, sendo de grande valia na hora do combate.
Cinco soldados ficaram
Sem vida naquele dia.
Um morto por Labareda
E os outros dois por Maria,
Lampião dois alvejou
Porém nenhum não matou
Do jeito que ele queria
(CAVALCANTE, 1983, p. 6)
Nesta elaboração houve a troca de lugares, ela deixa as panelas e passa a dar
ordem nas mulheres que não desempenhavam um papel guerreiro no grupo, cuidava dos
feridos de guerra, tarefa importante reservada aos homens. Portanto tinha dado provas de
ser uma mulher- macho, comparada a animais perigosos e traiçoeiros.
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Para pensar como foi criada imagem de Maria Bonita como guerreira pela
literatura de cordel é importante citar o cordel de Antônio Teodoro dos Santos, um dos
mais importantes e mais conhecidos cordéis sobre Maria Bonita. Araújo (2012 [1985],
p.189) diz que ―Dentre todas as cangaceiras foi Maria Bonita a única a merecer dos vates
caboclos a honra de ter sua vida descrita em versos, em um cordel feito especificamente
com esta finalidade‖.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
REFERÊNCIAS:
ARAÚJO, Antônio Amaury Correia de. Gente de Lampião: Dadá e Corisco. São Paulo:
Traço Editora, 2003.
BURKE, Peter. O que é história cultural? Tradução de Sérgio Góes de Paula. 2. ed. rev. e
ampl. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.
LINS, Daniel. Lampião o homem que amava as mulheres. São Paulo: Annablume, 1997.
MELO, Rosilene Alves de. Arcanos do verso: trajetórias da literatura de cordel. Rio de
Janeiro: 7 letras, 2010.
127
Setilhas são estrofes de sete versos de sete sílabas.
128
Décimas são estrofes de dez versos de sete sílabas.
336
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CORDÉIS
D‘ ALMEIDA FILHO, Manoel. Vida, Vingança e Morte de Corisco. São Paulo: Luzeiro
Editora. s/d.
CAVALCANTE, Rodolfo Coelho. ABC de Maria Bonita, Lampião e seus cangaceiros. Rio de
Janeiro, 1976.
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RESUMO
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Compreendo a violência contra as mulheres como qualquer ato que resulta ou possa
resultar em dano, sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, incluindo ameaças de tais
atos, coerção ou privação arbitrária de liberdade em público ou na vida privada. São muitos os
tipos de violências que envolvem as mulheres, e em muitas dessas situações o amor revestido de
ciúme tem servido de justificativa para legitimar atos violentos. Sandra Raquew dos Santos
Azevêdo (2011) comenta que as histórias de mulheres que passaram por violências são variadas,
mesmo assim é pouco comum um olhar interpretativo de tais problemas, visto que tais atos
possuem várias configurações como a violência física, a psicológica, sexual, moral e patrimonial
manifestando-se de forma heterogênea de acordo com a cultura, o lugar e o tempo, mas
interligadas por uma cultura patriarcal comum, onde o homem é o sujeito de maior valor, que
estabelece o domínio e o poder sobre as mulheres.
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assassinato de mulheres em São Paulo, destaca o esvaziamento do valor da vida feminina, onde
razões superficiais levam a um assassinato. E, como motivo de muitas mortes de mulheres estão
palavras mal interpretadas, uma recusa de sair, a atitude de negar-se... todos os atos que confrontam
o sexo masculino tornam-se o ―suficiente‖ para que uma vida feminina seja eliminada. Em sìntese,
a mulher foi construída culturalmente como uma pessoa interdependente, desprovida de direitos e
repleta de deveres. Na sociedade do controle do corpo feminino, a mulher não foi constituída como
indivíduo, pois o indivíduo e a individualidade são características masculinas. Estas são algumas
características da construção social da mulher desde a época moderna, com resquícios na sociedade
atual, ―esta é a gênese da desigualdade‖, (Frota, 2011, p. 34) é a base das formas de violência
contra o corpo feminino. Onde são cometidos pequenos assassinato cotidianos contra o corpo
feminino.
Analba Brasão Teixeira (2009) comenta que entre as inúmeras situações de violência
presentes na sociedade contemporânea, as que são frequentemente veiculadas na mídia, são as que
enfatizam o amor como motivação nos casos de feminicìdios ìntimos. Nesses casos, ―é comum,
encontrar destaques em manchetes de jornais com títulos descartando a culpa do parceiro da íntimo
da vìtima: ―Dois amores levam em tragédia‖ (2009: 17) ou mesmo a manchete encontrada no
Jornal O NORTE ―Abandonado, advogado espanca e mata mulher com tiro no peito‖. (Jornal
O NORTE, 22 DE AGOSTO DE 1982)
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129 Consta no processo crime que Antonio Olimpio Rosado Maia, era um renomado advogado e
professor da Universidade Autônoma, residente do Bairro Miramar em João Pessoa. Verificar: Fórum
Criminal. Comarca de João Pessoa. Tribunal do Júri. Processo n° 84211423. Data de 23 de maio de 1984.
De família rica, seu sobrenome conferia a ele, privilégios sociais garantindo-lhe distinção e poder entre
seus pares.
130 Jornal O NORTE, 24 DE AGOSTO DE 1982.
131 Jornal O NORTE, 22 de agosto de 1982.
132 Jornal O NORTE, 24 DE AGOSTO DE 1982.
133 (Fórum Civil. Comarca de João Pessoa. Vara da família. Separação Judicial. Processo de n°
20019815503251. Data de 08 de agosto de 1981.)
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para ela o casamento estava sendo desfeito, devido há outros relacionamentos amorosos que
Rosado Maia possuía, fato nunca lembrado nas matérias de jornais, por mim verificadas.
Também ameaçava matá-la (ou a seu irmão) se ela não voltasse a viver com
ele. Ameaçou também matar uma sobrinha de Violeta Formiga, de apenas 3
anos de idade, caso não saísse com ele para reiniciar o interrompido
relacionamento amoroso e sexual. (Jornal A UNIÃO, 24 de novembro de
1994)
Na noite do crime contam que Rosado Maia para forçar Violeta a acompanhá-
lo ao apartamento de Tambaú, ameaçou matar uma sobrinha dela, de apenas
três anos. (Jornal CORREIO DA PARAÍBA, 24 de novembro de 1994)
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Tal artigo destaca que o Feminicídio é o assassinato de uma mulher pela condição de
ser mulher. As motivações mais usuais são o ódio, o desprezo ou o sentimento de perda
do controle e da propriedade sobre o corpo das mulheres, comuns em sociedades marcadas pela
associação de papéis discriminatórios ao feminino, como é o caso brasileiro:
Coaduno com Rita Laura Segatto (2006) que explica o feminicídio (2006) como um
crime do patriarcado e como tal são crimes de imposição de poder, com uso de força física.
Devemos ainda considerar, outra dimensão, a noção do feminicídio como um crime de ódio: Ódio
a autonomia e libertação feminina. Para a compreensão do poder investido nas mulheres, textos
como os de Tania Swain (2000) e Margarete Rago (1998), proporcionam o entendimento, que as
mulheres foram constituídas como alvo privilegiado da agressão masculina, devido ao corpo que
impõe lugar no mundo. O corpo feminino é reflexo das marcas de poder e dos mecanismos de
controle que delimitam os corpos em respectivos lugares sociais e morais.
Para Tania Swain, a violência de gênero, pode ser pensada como resultado do
dispositivo de sexualidade, teorizado por Michel Foucault. Resultado da representação social dos
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seres humanos, que investe em corpos e os define por um sexo biológico, dando-lhes funções e
um lugar social. Por isso compreendemos que a divisão binária e hierárquica dos indivíduos
gerou uma desigualdade e assimetria que permite e institui o uso da violência, tendo como
referência, o corpo biológico. Os homens empregaram e empregam o uso da força física nas
mulheres de forma naturalizada, como parte de uma dominação banal dos corpos femininos. De
acordo com Swain:
135 SWAIN. Tania Navarro. A construção do corpo feminino ou a ―hora da vez do nomadismo
identitário?‖ Textos de História, v.8. n° 1-2, 2000, p 24.
136 Processo Criminal n° 95.002 467-8.
137 Jornal O NORTE, 22 de agosto de 1982; Jornal A UNIÃO, 22 de agosto de 1982, Jornal da Paraíba,
22 de agosto de 1982.
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Rosado Maia, esteve na casa situada na rua Pau-brasil, no conjunto dos Bancários, casa
onde moravam os pais de Violeta Formiga e convidou-a para sair. Foram para um
restaurante chinês, chamado ―Kanton‖139. E de lá para o Edifício Solar dos Navegantes,
em Tambaú.
Violeta Formiga foi levada ao prédio que residia Antonio Olímpio Rosado
Maia, Edifício Solar dos Navegantes. Quando chegaram ao prédio, Violeta Formiga
estava chorando com um lenço vermelho em sua boca140. E subiram para o apartamento
502. Violeta Formiga foi espancada, como atesta o laudo pericial.
Eram 2 horas da madrugada, quando ouviu-se o primeiro disparo e Violeta
Formiga não sendo atingida, correu para livrar-se pela escadaria do prédio. Todavia, foi
atingida pelo segundo disparo. Fugindo, Violeta chegou a sair do prédio, sendo então
socorrida com vida, para um hospital. Mas, não resistiu. Consta nos jornais analisados, que
segundo Djian Formiga, irmã da vítima, o relacionamento do casal aconteceu de maneira
forçada, sendo Violeta Formiga obrigada a casar-se com seu assassino:
Segundo a irmã da vítima, em 1981, sob pressão do assassino, Violeta se casou
com ele. Logo, nos primeiros meses de vida conjugal , ainda segundo
afirmação de Djian Formiga, Violeta descobriu que seu marido é epilético.
Diante deste fato negado pelo esposo, e não suportando viver ao seu lado, por
se tratar de um homem extremamente violento, propôs a separação. (Jornal A
UNIÃO, 22 de agosto de 1982)
Nesta entrevista, Djian declarou que Antonio Maia e membros de sua família,
pressionavam Violeta Formiga para que não revelassem o segredo da doença de Rosado Maia. E
assim, ela o fez. Mas, mesmo assim, este não foi motivo suficiente para que seu ex marido
deixasse-a viver.
Violeta de Lourdes Formiga Maia, de 31 anos, foi morta com uma balaa
calibre 7,65, depois de violentamente surrada. A polícia prendeu o advogado
Antonio Omímpio Rosado Maia, seu marido, depois que os irmãos Reinaldo e
Reginaldo Bezerra, porteiros do edifìcio Solar dos Navegantes (…) viram
quando o homem chegou com a mulher amordaçada, as 2 horas da madrugada
de ontem. (Jornal O NORTE, 22 de agosto de 1982)
138 Entrevista dada por Djian Formiga ao Jornal O NORTE, 22 de agosto de 1982.
139 Jornal O Norte, 24 de agosto de 1982.
140 Processo Criminal n° 95.002 467-8.
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Segundo consta no jornal os empregados do prédio falaram a polícia que após atirar
em Violeta Formiga, ―ele subiu ao seu apartamento, para ouvir música clássica‖, evidenciando
frieza em seu ato. (Jornal O NORTE, 22 de agosto de 1982) Após o assassinato, a polícia chegou
para prestar esclarecimentos, 6 horas após o crime. Neste momento o assassino já havia se
livrado do carro e das possíveis provas que o incriminariam. Nenhuma prova exata foi encontrada
incriminando Antonio Olímpio Rosado Maia. A empregada da casa de Rosado Maia, Maria
Poncilda, fugiu após dar declarações a imprensa incriminando seu patrão:
Se por muito tempo todas essas cenas foram vistas na sociedade como naturais, hoje,
apesar dessas práticas não terem desaparecido, a naturalização da violência contra a mulher esta
acabando; devido aos discursos que contestam o assujeitamento feminino. Portanto nesta
dissertação, dediquei-me em compreender, quais os motivos fizeram a década de 1980 ser
lembrada como o período com maior número de assassinatos de mulheres praticados por
parceiros íntimos?
141 Verificar: Segato, Rita Laura. Femigenocidio y feminicidio: una propuesta de tipificación. IN:
Estudios de Género y Feminismos. 2011
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de Ciudad Juarez, fronteira norte do México. Estes assassinatos de mulheres, foram chamados de
"femicìdio" adaptando a expressão Inglês ―femicide‖. O conceito de femicìdio foi utilizado pela
primeira vez por Diana Russel em 1976142, perante o Tribunal Internacional Sobre Crimes
Contra as Mulheres, realizado em Bruxelas, para caracterizar o assassinato de mulheres pelo fato
de serem mulheres. Para a autora femicídio é:
No texto de Rita Laura Segato (2006) ela comenta que o texto de Cuputi e Russel
(1992)- ―Femicide”, tinha a função de desmascarar o patriarcado – instituição que se baseia no
142 Verificar em: Femicide: the politics of woman killing. Diana R. H. Russel. In:
http://www.dianarussell.com/f/femicde(small).pdf
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Marcela Lagarde y de los Ríos (2004) comenta que foi no século XX que várias
mulheres começaram a ganhar espaços, criando oportunidades e participar nas mais diversas
áreas da sociedade, cultura e política. Neste período, mulheres de diferentes países dão vida à
cultura feminista para denunciar a opressão de gênero e criar uma consciência crítica sobre a
condição das mulheres. Eram 263 mortos e 4.500 mulheres desaparecidas na Ciudad Juarez e
Chihuahua. Para a autora, vivenciamos tal grau de violência de gênero contra as mulheres, e
assistimos a impunidade dos criminosos e a negligência da justiça, devido a omissão e
cumplicidade das autoridades. Foram décadas marcadas por violência de gênero contra a mulher.
E assim, a sociedade passou a exigir justiça para os crimes e desaparecimentos de meninas e
mulheres.
Tania Navarro Swain (2000) comenta que as leis regulatórias dos indivíduos criaram
nos homens o poder de repressão e violência sobre as mulheres. Neste sentido, o corpo foi
marcado por poderes e reproduzidos através do uso da força física. Deste modo, essas cenas de
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violência contra as mulheres foram passadas como ―naturais‖. Assim, as inscrições das diferenças
sexuais, da cultura patriarcal introduz no imaginário social, a naturalização da violência.
REFERÊNCIAS
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midiática. JP: Editora Universitária UFPB, 2011.
BLAY, Eva Alterman. Violência contra a mulher e políticas públicas. Estudos Avançados. v.17.,
n.49. USP: São Paulo, 2003.
__________. Assassinatos de mulheres e direitos humanos. São Paulo: USP, Curso de Pós –
Graduação em Sociologia: Ed, 34, 2008.
CORRÊA, Mariza. Morte em família: representações jurídicas de papéis sexuais .Graal, 1998.
__________. Os crimes da Paixão. Editora: Brasiliense. São Paulo, 1983.
ELUF. Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres: de Pontes Visgueiro
a Pimenta Neves.3° ed. São Paulo: saraiva, 2007.
FAUSTO, Boris. O crime do restaurante Chinês- Carnaval, Futebol e Justiça em São Paulo dos
anos 30. SP: Companhia das letras, 2009.
__________.. Crime e Cotidiano: a criminalidade e o cotidiano. SP: Brasiliense, 1984.
349
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
FOUCAULT. Michel. História da Sexualidade II- O uso dos prazeres. RJ, Graal, 2014.
__________. História da Sexualidade I: A vontade de saber. São Paulo: Edições Graal, 2014.
GREGORI, Maria Filomena. Cenas e queixas: um estudo sobre as mulheres, relações violentas e a
prática feminista. RJ: Paz e Terra, 1992.
GROSSI, Miriam Pilar. Rimando amor e dor: Reflexões sobre a violência no vínculo afetivo
conjugal. In: PEDRO, Joana e GROSSI, Miriam Pillar (orgs.). Masculino, Feminino, Plural: Ed.
Mulheres, 1998.
LUCENA, Jandira. Uma homenagem a Violeta Formiga e outros escritos. João Pessoa: Editora
da UFPB, 2013.
RAGO. Luzia Margareth. Do cabaré ao lar: a utopia da cidade disciplinar: Brasil : 1890-1930. RJ:
Paz e Terra, 1985.
__________. Paisagens e tramas: o gênero entre a história e a arte. SP: Intermeios, 2013.
RUSSEL, Diana. RADFORD, Jill. Feminicídio. La política del asesinato de las mujeres. CEIICH,
UNAM, 2006. Livro publicado nos EUA em 1992.
SCOTT, Joan. “Gênero: uma categoria útil de análise histórica‖. Educação e Realidade, Porto
Alegre, jul./dez. 1990.
350
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RESUMO
O Jornal das Moças foi uma revista feminina do século XX e que circulou no Brasil até
1961 propagando conteúdos para o mundo feminino e ressaltava um modelo ideal de
mulher. Este artigo tem por objetivo analisar a figura do feminino a partir da revista Jornal
das Moças, que circulou na cidade do Rio de Janeiro entre os anos de 1914 a 1961 e nas
principais capitais do país. Para este trabalho iremos analisar o Jornal das Moças na
primeira metade dos anos 1950 período este marcado por mudanças nas práticas e
costumes dos brasileiros, tendo como aporte teórico o estudo das representações, com base
nos estudos de Roger Chartier que trabalha as representações a partir do lugar social de
cada sujeito. Partindo disso busco problematizar como esse periódico irá contribuir para a
manutenção de um modelo ideal de mulher ―perfeita‖, uma vez que direto ou indiretamente
foi um dos responsáveis por propagar esse ideal de mulher.
Palavras chaves: representações, feminino, anos 50.
INTRODUÇÃO
No início do século XX as revistas femininas tinham grande importância para a
educação da mulher, através das mesmas era vinculado um modelo de comportamento que
as mulheres deveriam seguir, esse tipo de periódico foi muito propagado no Brasil e em
outros países como França e Estados Unidos, nas revistas eram vinculados matérias
relacionadas ao dia a dia da mulher; temas como culinária, moda, maquiagem, higiene
pessoal, etc.
Tudo o que deveriam ler e consequentemente como falar em seu meio, ou seja, os
modos de ser e viver dentro do mundo feminino, acabava se tornando uma construção
midiática e que era seguido por muitas mulheres, esses periódicos tiveram propagação em
todo o país, desde das capitais até os sertões.
A presente pesquisa analisa as representações femininas a partir da ―moda e
modos" apresentados na Revista Jornal das Moças nos anos de 1950 a 1955 na cidade do
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Rio de Janeiro, o contexto social dessa época é de grande importância para a historiografia
brasileira, pois é nesse período que o país passa por muitas mudanças, dentre elas as
transformações comportamentais e estruturais, as mudanças comportamentais são às novas
influências vindas de outros países como a França que ditou por muito tempo a moda no
Brasil, assim como a educação do corpo por meio da mídia, enquanto que as
transformações estruturais é a forma como nosso país, passará a se organizar diante da
nova estrutura estabelecida.
A moda sendo um espaço amplo, e que merece destaque por contribuir para a
construção do ―modo de vestir, como demonstração de poder e status, transformou a roupa
num sìmbolo de comunicação, contendo palavras e signos próprios‖. (ANDRZEJEWSKI,
2012), corroborando com Andrzejewski percebemos que a roupa carrega consigo esse
simbolismo, assim como o peso da historicidade de uma determinada época e dos lugares
sociais que são formados nela.
Buscamos analisar como a Revista Jornal das Moças tratava essas mudanças em
seus exemplares, já que embora fosse uma revista ilustrativa, não deixa de ter uma
intenção, pois o documento mostra sempre uma mensagem pra seu leitor direto ou
indiretamente. Nesse sentido, nosso principal espaço de pesquisa será a revista, assim,
buscarei dialogar com alguns estudiosos como Roger Chartier (1990), Nukácia Meyre
Araújo de Almeida (2008), Liana Pereira Borba dos Santos (2011), dentre outros, que
trabalham com a temática da pesquisa em questão.
O ―Jornal das Moças‖ circulou no Brasil de maio de 1914 a dezembro de 1961, a
mesma era um periódico semanal e circulava nas quartas-feiras, era produzido na cidade do
Rio de Janeiro/ RJ, pela Editora Menezes, filho & C. Ltda do Rio de Janeiro de
propriedade de Álvaro Menezes diretor e redator e Agostinho Menezes diretor responsável,
e tinha como slogan ―Jornal das moças - A revista de maior penetração no lar‖ fazia jus ao
slogan, pois ―Suas tiragens eram publicadas com distribuição por todo território nacional
cobrindo assim as capitais e o interior‖. (SILVA/ SANTOS, 2013, p. 01).
São aproximadamente 2.422 exemplares da revista disponíveis na Hemeroteca da
Biblioteca Nacional, no site: http://bndigital.bn.br/acervo-digital/jornal-mocas/111031,
produzindo uma extensa quantidade de exemplares quando ativa no mercado editorial. A
metodologia aplicada nesse artigo será analise da revista dando foco na coluna ―Troças &
Traços‖ entre os anos de 1950 a 1955, discussões de textos e análises bibliográficas,
353
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
fizemos esse recorte pois é nesse período que o Brasil vive um período de muitas
transformações, usaremos alguns exemplares desses anos citados.
As mudanças estão tanto nos hábitos quanto nos costumes, dar-se também início a
um período de modernização e avanços tecnológicos assim como culturais e
comportamentais que não deixam de intervir no mundo feminino. E nesse contexto busco
problematizar como será apresentada a representação feminina nesse periódico, e a partir
dessas mudanças e com as influências vindas de fora do Brasil, pensar também como a
revista lidará com essa modernidade. A Revista Jornal das Moças buscava levar a sua
leitora de tudo um pouco: Modos, Culinária, Moda, Poesia, Horóscopo, Novela dentre
outros assuntos, ou seja, uma revista feminina do início do século XX.
Tais revistas procuravam deixar suas leitoras informadas sobre todas as mudanças
no mundo feminino, assuntos que seriam interessantes elas saberem, não o que poderia está
realmente acontecendo no país, pois a revista tinha um público alvo. A mesma
desempenhava um papel de ―ditador de comportamento social, familiar e religioso
reforçando o papel idealizado ou esperado da sociedade com relação ao papel da mulher
que mudava conforme a passagem das décadas‖ (SILVA/ SANTOS, 2013, p. 01).
Nesse período meados dos anos 1950 aparecerá uma figura de grande destaque no
143
Brasil - Juscelino Kubitschek com seu plano de metas para a modernização do país, a
partir das transformações ocorridas haverá uma formação de representações feminina do
que seria a mulher moderna em meio a tantas inovações vindas de fora, isso não só na
moda, mas também para o lar já que surgirão as novas tecnologias que contribuirá para
uma mudança de comportamentos.
Estudar as representações feminina na primeira metade década de 1950, possibilita
uma nova forma de ver o feminino ocorrida a partir das transformações tanto na mente
como nos comportamentos, os modos seguidos por elas a partir dessas mudanças nos
ajudam a entender como era o cotidiano e onde estavam aquelas leitoras do Jornal das
Moças, buscando entender as formas de educação da mulher e como se forma o estereótipo
da ―mulher perfeita‖ imagem que era formulada pela mìdia época.
143
Juscelino Kubitschek de Oliveira foi um médico, oficial da Polícia Militar mineira e político brasileiro que
ocupou a Presidência da República entre 1956 e 1961.
354
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O Jornal das Moças foi uma revista fundada no Rio de Janeiro e que entrou em
circulação no ano de 1914 circulando até o ano de 1965, era uma revista semanal e
circulou principalmente nas capitais do país e em algumas cidades do interior. A
distribuição da revista era realizada em todo o Brasil, incluindo estados como Acre,
Amazonas, Alagoas, Ceará, Pernambuco, Paraíba, Santa Catarina, Rio grande do Sul,
Minas Gerais, São Paulo, entre outros. (ALMEIDA, 2008, p. 05).
Sua fabricação era realizada pela Empresa Jornal das Moças – Menezes, Filho &
C. Ltda e dirigida por Álvaro Menezes (diretor e redator) e Agostinho Menezes (diretor e
responsável), a revista chegava nos correios das cidades para seus assinantes. No artigo ―O
Jornal das Moças: uma narrativa ilustrada das mulheres de 30 a 50 & sua passagem por
Pelotas nas décadas‖ é apresentado o conteúdo contido na revista.
Nesse sentido e a partir do que Santos e Silva nos traz podemos perceber que o
Jornal das Moças tinha dois públicos alvos as ―as jovens moças e as donas de casa‖ elas
estão inseridas em um mesmo mundo porém em contextos totalmente distintos. Podemos
tecer dois aspectos nesse âmbito quem eram as moças e as donas de casa do início do
século XX?
A moça no século XX era a futura dona de casa, aquela que estava sob a proteção
dos pais, sendo educada para o casamento e para ser aquela mulher perfeita que todo
homem desejava. Na própria educação das meninas demonstram que havia uma
modelagem para no futuro aquela menina ser a futura esposa, seria aquela que iria cuidar
da casa, dos filhos e do marido, aquela que estaria sempre pronta para atender os pedidos
dos mesmos, esse modelo era transparecido nos manuais de comportamento e nas revistas
femininas.
355
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Por outro lado aquela no entanto que saísse dos padrões estabelecidos pela
sociedade era vista como a ―diferente‖, seria assim excluìda daquele ciclo, pois não haveria
lugar pra ela, o ―novo‖ era revestido por uma resistência social. Nesse aspecto acabavam
sendo refém dos papeis sociais que são criados pela comunidade, através de discursos que
objetivam uma disciplinarização dos sujeitos, você é condicionado a seguir um
determinado padrão e quando não o segue é simplesmente excluído, como nos mostra
Chartier, 1990:
Os papeis sociais vão sendo construídos de acordo com o lugar social e esses
lugares demostram quem fala. Assim sendo a revista carrega uma intencionalidade, nela
encontravam-se colunas com assuntos sobre decoração do lar, culinária, noções de higiene,
dicas de conquista afetiva, felicidade conjugal, manutenção do casamento, moda, além de
fotos da alta sociedade fluminense e hollywoodiana. Percebemos assim, que essas revistas
desenvolveram um papel importante na vida dessa mulher moderna, com isso podemos
identificar alguns aspectos dessas leitoras, buscando a partir de seus lugares sociais traçar
possibilidades para entender as representações que são mostradas delas por meio da
revista.
A revista Jornal das Moças tem uma vasto conteúdo a ser problematizado, em uma
de suas coluna a Troças & Traços nela é publicado conteúdos de forma livre, tanto no que
se refere a identificação quanto aos conteúdos, na mesma podemos identificar conteúdos
de caráter muitas vezes machista com um tom cômico em sua escrita, apresenta ainda
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
A maioria dos contos possui um tema e são de acordo com o que será tratado na
história, possui também imagens que estão relacionados ao enredo. Na análise da coluna
percebi a presença de um discurso que inferioriza a mulher, através das pequenas histórias
que a revista traz. Na sequência analisamos algumas das histórias que são apresentadas na
revista, e para isso utilizo cinco edições da revista sendo 4 edições do ano de 1950 e uma
edição do ano de 1952, as análises seguem a seguir.
Na mesma coluna destacamos também outro fragmento que diz: Ele- “Antonieta,
este céu azul, este sol, não te faz lembrar alguma coisa? Ela – Sim. Um magnifico dia para
estender roupa no varal”. Aqui busca-se mostrar como o lugar da mulher é definido e
limitado, papel esse que se resume as tarefas domésticas e que em seu universo não existe
lugar para o lazer, esse ideal de mulher é bem propagado na mídia da época. Esse discurso
de tanto ser reproduzido acaba internalizando muitas vezes na mulher, está se deixa levar
por essa ideologia que mulher perfeita é aquela que está sempre pronta para seu esposo e
que não tem o direito de questiona-lo.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
rosas que todos pesavam, seria mais complicado apresentar esse assunto principalmente
nesse meio de comunicação que circularia em muitos lares.
Percebemos no trecho acima citado, a Le Sege foi vista com olhares preconceituoso
pelo fato de ser a primeira mulher a andar de balão e ficar um pouco mais de uma hora na
companhia de um homem, pela própria escrita do texto que não possui identificação. Há
um tom de ironia e desconfiança no próprio título “Teria ido mesmo as nuvens”, deixando
plantada uma dúvida da real intenção da mulher e do seu companheiro de voo, quando fala
da reputação ao realizar o esporte, denotando que as aparências conta muito nessa
sociedade, aquilo que é projetado ganha muito mais valor sobre aquilo que realmente é, no
discorrer do texto percebemos isso, a reputação dela foi colocada em conta no momento
em que ela decide subir no balão na companhia masculina.
Vivemos até hoje nessa sociedade do aparentemente correto, sem olhar a fundo o
outro para tecer conclusões, chegando a julgar algo que nem se conhece. A mídia tem esse
poder de comunicação que acaba fazendo essas criações de lugares sociais tanto para o
homem quanto para a mulher, e em nome da moral e dos bons costumes são propagados
esses dois projetos distintos e que não podem ser compartilhados pois teria uma inversão
de papeis que a sociedade não admite.
diálogo como algo ruim na vida de um homem. Há uma certa resistência do marido em não
querer que a sogra possa morar com eles, é uma questão de privacidade do casal que passa
a ser ameaçada pela presença da sogra.
A coluna Troças & Traços está bem presente na revista Jornal das Moças,
destaquei para esse momento algumas edições do ano de 1950, porém a coluna se faz
presente durante toda a década que se segue, seguindo sempre a mesma forma de escrita e
sempre ocultando seus autores, introduzindo conteúdos afirmando a posição do homem
perante a mulher. Na edição de nº 1916 de 06 de Março de 1992, a coluna apresenta o
seguinte relato: “Ela- Não me venha mais fazer queixa de seus amigos! Afinal, você é
homem ou não é?” percebemos que a escrita mudou um pouco de foco, em sua grande
maioria o tema principal que tinha destaque era a figura feminina, nessa edição apresenta a
mulher, ela está mais elevada e o tom de voz também está mudado como nos mostra a
seguinte representação retirada da revista Jornal das Moças.
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revista apresenta, são sempre representadas com traços mais delicados, distintos da
imagem acima.
CONCLUSÃO
No item anterior foi abordada essa coluna, era um espaço livre, e nesse sentido
percebemos uma escrita mais direta, ou seja, o ponto de vista de quem escreve é mais
claro, deve-se também ao fato de não ter identificação, mantendo assim em sigilo o autor,
não sendo assinado os artigos dessa coluna. Percebemos a ausência da receptividade na
comunidade diante de alguns colocações, principalmente com relação a mulher.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
aquele que está sempre com a verdade, é o chefe de seu lar. Essa fala é bastante marcante,
pois nesse contexto a mulher se torna uma simples sombra de seu esposo, onde a mesma
está sempre submissa aos seus caprichos e vontades, aos poucos essa situação irá mudar e a
mulher ganhará espaço antes monopolizado pelos homens.
Logo acima trago a discussão da coluna ―Troças & Traços‖ que nos mostra o
discurso de forma sátira que é colocado para a mulher, o anonimato da coluna nos faz
refletir que a possibilidade da escrita serem de homens, já que tiveram mais acesso a esses
meios, não proponho aqui fazer juízo de valor mas a imagem do homem é sempre colocada
como superior a mulher, reafirmando os papeis sociais que são postos por essa sociedade,
onde o homem é o provedor e mais inteligente e a mulher mais fraca e pacifica.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Esse é um ponto identificado nas revistas femininas, elas nos apresenta os modos e
modas vividos pelos sujeitos de determinado contexto, essa fonte nos abre um leque de
possibilidades para se trabalhar desde do vestuário, comida, leituras até questões mais
complexas como a discussão de gênero. Em Louro, 1997 podemos entender como essas
relações sociais são construídas e assim perceber que elas se constitui a partir de um
conjunto de práticas, assim ela traz:
Portanto o Jornal das Moças foi um importante veículo na propagação desse ideário
feminino, aquele de uma mulher perfeita, modelo este que é compartilhado não só pelo
Jornal das Moças, como também por várias revistas femininas desse período. Mostravam
em suas páginas o que era o politicamente correto para a mulher do momento. Utilizado
como manual de instruções tanto as jovens solteiras quanto para as senhoras casadas; para
as solteiras os conselhos e dicas de como seria um bom casamento e para as casadas como
manter o mesmo.
Para esse momento busquei mostrar um pouco da revista, quanto a seus conteúdos e
sua estrutura. E como alguns assuntos estão presentes na revista, apresentando a sua
variedade de conteúdos dirigidos ao público feminino. Os periódicos no geral são de
grande importância para entender o contexto em que essas leitoras estão inseridas e os
lugares sociais que vivem.
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JORNAL DAS MOÇAS, 19 de Janeiro de 1950, nº 1805. Rio de Janeiro: Editora Jornal
das Moças.
JORNAL DAS MOÇAS, 09 de Fevereiro de 1950, nº 1808. Rio de Janeiro: Editora Jornal
das Moças.
JORNAL DAS MOÇAS, 08 de Junho de 1950, nº 1825. Rio de Janeiro: Editora Jornal das
Moças.
JORNAL DAS MOÇAS, 10 de Agosto de 1950, nº 1834. Rio de Janeiro: Editora Jornal
das Moças.
JORNAL DAS MOÇAS, 06 de Março de 1992, nº 1916. Rio de Janeiro: Editora Jornal das
Moças.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
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femininas (1932-1945). 2008. Tese de Doutorado. http://teses. ufc. br.
ANDRZEJEWSKI, Luciana. A moda como história. Revista Eletrônica do arquivo
público do estado de São Paulo, n. 53, 2012.
CERTEAU, Michel de. A Invenção do Cotidiano: artes de fazer. Petropolis: 12. Ed.
Vozes, 1994.
CHARTIER, Roger et al. A história cultural. Entre práticas e representações. Lisboa:
Difel, 1990.
DOS SANTOS SOARES, Diego; DA SILVA, Ursula Rosa. O JORNAL DAS MOÇAS:
UMA NARRATIVA ILUSTRADA DAS MULHERES DE 30 A 50 & SUA PASSAGEM
POR PELOTAS NAS DÉCADAS. Seminário de História da Arte-Centro de Artes-
UFPel, n. 3, n.1 2013.
DOS SANTOS, Liana Pereira Borba. Mulheres e revistas: A dimensão educativa dos
periódicos femininos Jornal das Moças, Querida e Vida Doméstica nos anos.
DOS SANTOS, Liana Pereira Borba. SER MÃE, SER MODERNA, SER MULHER: A
PROPAGANDA E A DIVULGAÇÃO DE REPRESENTAÇÕES DE MULHER NAS
REVISTAS FEMININAS DOS ANOS 1950.
MALUF, Marina; MOTT, Maria Lúcia; NOVAIS, Fernando A. Recônditos do mundo
feminino. In: República: Da Belle Époque à era do rádio. Companhia das Letras, 1998. p.
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LOURO, Guacira Lopes. Gênero, sexualidade e educação. Petrópolis: vozes, p. 14-56,
1997.
VITORIANO. Renata Kelly Cavalcante. (Re) vistas a revista: representação feminina no
corpo a corpo (1995 -2005) / Renata Kelly Cavalcante Vitoriano. _ Guarabira: UEPB,
2012.
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SITE CONSULTADO:
Hemeroteca Digital Brasileira. Anos 1950 a 1961. Disponível em:
<http://bndigital.bn.br/acervo-digital/jornal-mocas/111031>. Acesso em 22 de Abril de
2017.
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RESUMO
O vocábulo Negro traz consigo uma carga histórica estigmatizada pela Escravidão, desde
os primórdios de nossa historiografia, quando o alemão Carl Friederich Phillip Von
Matius, ganhou o concurso monográfico do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro –
IHGB, ―Como se deve escrever a História do Brasil‖, com o escrito a História Geral do
Brasil, no qual divide a sociedade em três grupos: o Branco, o Índio, o Negro. Passado
quase um século da replicação da Ideologia Eugênica Europeia, prefalada anteriormente e
pormenorizada no decorrer do estudo, surge Gilberto Freyre com o livro ―Casa-grande e
Senzala‖ e apresenta uma ―Democracia Racial‖ falaciosa, mas que, contribuiu para
entendermos melhor a miscigenação racial brasileira.
Palavras-chave: Negro; estigmatizada; miscigenação racial; ascensão.
APRESENTAÇÃO
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145 New York Times, by Jeremy Ashkenas, Haeyoun Park and Adam Pearce.Aug,24,2017.
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Esta afirmativa nos induz a inferir que a ideologia da Democracia Racial era falha,
pois, a amálgama genética e cultural não sobrepujou a Eugenia apregoada no Brasil nos
primórdios do Império, a qual espargiu no esmaecer da República os obstáculos materiais e
imateriais para a aceitação e ascensão do elemento Negro, na sociedade Brasileira. O fim
da escravidão e o surgimento da República não foram garantias de Cidadania, o Direito
Civil, Político e Social (foram inaplicáveis ao novo elemento social), não facilitaram a
inserção dos Negros libertos que, adensaram as favelas, a criminalidade, a violência e o
analfabetismo, heranças do velho sistema.
Qual a origem dessa ideia aviltante do Negro? Qual o motivo de nossa
historiografia respaldar e/ou promulgá-la? Seria verdade a inexistência de intelectuais
Negros no Brasil? No afã de responder estas e outras perguntas apresentamos em dezembro
de 2008 nossa monografia, ‗ O sequestro de Intelecto Negro no Brasil Oitocentista‘.
Entretanto, elencar intelectuais Negros do período, questionar a interferência da
Eugenia em nossa historiografia e apresentar querelas imateriais inter e intrapessoais não
saciaram o desejo por respostas. Notamos a necessidade de ampliar os estudos e mesclar as
referências bibliográficas, pois para melhor responder estes e outros questionamentos, faz-
se indispensável à observação da interferência da Escravidão nas macro e micro relações
sociais do cotidiano.
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que lhe forneça um elo, um sentimento de pertencimento que o auxiliará em suas relações
com outros elementos sociais. No momento que esse atrelamento por motivos outros não
favorece ao convívio ou o obstaculiza, o Ser em construção busca de forma
consciente/inconsciente desvencilhar-se, assumindo nova identidade ou simplesmente
negando a própria.
A interferência psicológica da Escravidão na construção e aceitação da identidade
brasileira é perceptível na forma e na dimensão em todo o território, independentemente da
estratificação socioeconômica em estudo, o afã de distanciar-se deste passado maculador é
imprescindível para que esse elemento social tenha segurança em relacionar-se com os
demais, sem que as barreiras de um conceito pré-existente obstaculizem esse processo
social natural.
Contudo, o número de Negros que buscam ocultar sua genealogia em detrimento de
uma aceitação social é algo rotineiro, desde os Movimentos Abolicionistas até a
hodiernidade, ademais, com a ascensão social magicamente tornam-se ―transétnicos146‖,
pois quando ―atingem as mais elevadas posições no serviço público adquirem o “tom” ou
“cor” de uma classe deferente daquela à qual pertencem pelo nascimento‖
(GOFFMAN,2008, p.30).
―Quando Koster esteve em Pernambuco nos começos do século
XIX notou que eram mulatos, na sua maior parte, os melhores
mecânicos: mas notou também que já havia homens de cor entre os
―ricos plantadores‖ – senhores das casas-grandes do interior – e os
ricos moradores – moradores de sobrados – do Recife‖ (p.497-
498)[...]―Mas esses poucos mulatos que chegaram a exercer, nos
tempos coloniais, postos de senhores, quando aristocratizados em
capitães-mores, tornavam-se oficialmente brancos‖ (FREYRE, p.
727).
146 Transétnicos: cunhamos esse termo para referendar os Negros que buscam de forma consciente ou
inconsciente distanciar-se das origens, como também buscar assumir status de outro grupo étnico.
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147 Sermão pelo Bom Sucesso das Armas de Portugal, I, apud Sermões, tomo I, org. Alcir Pecora, ed.
Hedra, 2000, p.445
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Portanto, o nosso intento não será criar uma verdade, mas, questionar as verdades
acerca do Negro no Brasil, para entendermos como a estigmatização deste elemento social,
interferiu e interfere não apenas em suas relações sociais, mas, em sua autoconstrução, na
existência de uma identidade deturpada, de relacionamentos psicossociais fragilizados, por
conceitos preexistentes, omissões pessoais e governamentais.
Almejamos, pois, instaurar reflexões acerca da autoidentificação/aceitação e/ou
reidentificação, em detrimento da continuidade de ações estigmatizadas, como também, do
paternalismo governamental. Para que enfrentamentos da ordem apresentada por Hughes
abaixo transcrito, do prefalado trabalho, perdurem em nossos contatos diários,
obstaculando a harmonização social no Brasil.
―We younger Negro artists who create now intend to express our
individual dark-skinned selves without fear or shame. If white
people are pleased we are glad. If they are not, it doesn‘t matter.
We know we are beautiful. And ugly too. The tom-tom cries and
the tom-tom laughs. If colored people are pleased we are glad. If
they are not, their displeasure doesn‘t matter either. We build our
temples for tomorrow, strong as we know how, and we stand on
top of the mountain, free within ourselves‖. (HUGHES, 1926)
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―I learned that courage was not the absence of fear, but the triumph
over it (...). The brave man is not who does not feel afraid, but he
who conquers that fear. I never lost hope that this great
transformation would occur (…), I always knew that deep down in
every human heart, there is mercy and generosity. No one is born
hating another person because of the color of his skin, and if they
can learn to hate, they can be taught to love, for love comes more
naturally to the human heart than its opposite (…). Man‘s
goodness is a flame that can be hidden but never extinguished‖.
(MANDELA, 2008)
150 Psicosfera: termo refente a atmosfera psíquica, ou seja, é um campo de emanações eletromagnéticas
que envolvem o Ser Humano.
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BIBIOGRAFIA
AZEVEDO, Celia Maria de. Onda Negra, Medo Branco: o Negro no Imaginário das
Elites Século XIX. 3. ed. São Paulo: Annablume.2004.
CAMPEDELLI, Samira, LAJOLO, Marisa. (Org.). Castro Alves: Seleção de textos, notas,
estudo biográfico, histórico e crítico. 2. ed. São Paulo: Nova Cultural.1988.
CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 7. ed. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2005.
151 A obra em epígrafe encontra-se na seleção de textos, notas, estudo biográfico, histórico e crítico por
Mariza Lajolo e Samira Campedelli.
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HUGHES, Langston. The Negro Artist and the Black Mountain. Disponível em:<
https://www.poetryfoundation.org/articles/69395/the-negro-artist-and-the-racial-
mountain>. Acesso em 06 out.2017.
PECORA, Alcir. (Org.). Sermão pelo Bom Sucesso das Armas de Portugal, I. apud
Sermões, tomo I. Pecora, ed. Hedra, 2000.
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RESUMO
A produção bibliográfica sobre o cangaço teve início com maior profusão na década de
1920. Direcionamos a nossa abordagem para a produção sobre o cangaço da década de
1920 a 1980, pois pretendemos compreender como esse movimento foi sendo
apresentado/representado ao longo das décadas. Nessa perspectiva também é
fundamental uma reflexão sobre a concepção de ―verdade‖, pois os autores que
produziram essas obras mantiveram a postura de que elas continham a ―verdade
histórica‖ sobre o movimento do cangaço e os cangaceiros. Especificamente esse
recorte contemplará a figura do cangaceiro Lampião. Para o alcance do objetivo
lapidado usamos os métodos analítico e bibliográfico.
Palavras-chave: Cangaço; Lampião; Historiografia; Verdade histórica.
INTRODUÇÃO
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que fora morto na Grota do Angico, em Sergipe. Como a produção escriturária sobre
esse personagem apresenta-se mais volumosa, isso possibilita ao pesquisador fazer uma
síntese dos vários lugares sociais que gestaram uma escrita sobre Lampião e os
cangaceiros e como esses escritos, a partir de interesses dispares, produziram um tipo de
cangaceiro e representações.
Como questão que norteará a discussão, indagamos como a produção
bibliográfica apresentou o movimento do cangaço ao longo dos anos de 1920 a 1980?
Nessa perspectiva também é fundamental um questionamento e reflexão sobre a
concepção de ―verdade‖, pois os autores que produziram essas obras sempre
mantiveram uma postura cética de que elas continham a ―verdade histórica‖ sobre o
movimento do cangaço e os cangaceiros.
Salientamos ainda que ao falarmos em obras historiográficas não estamos nos
reduzindo ao entendimento corrente que só quem produz historiografia são os
historiadores de ofício, ou aqueles que estão vinculados a uma Instituição financiadora
oficial ou a uma Universidade. A história, antes de ser um produto/objeto da academia,
é filha do seu tempo, sendo que muitos escritos sobre o cangaço foram elaborados em
um momento no qual nem mesmo a Universidade tinha se enraizado em solo brasileiro,
o que nos leva a não entendermos a produção dos memorialistas, folcloristas e
escritores/historiadores diletantes, como obras de qualidade inferior ou produções a-
historiográficas.
Já em 1942, Lucien Febvre (2009), como dito há pouco, deixava claro que ―a
História é filha de seu tempo‖, sendo que cada época tem a sua Grécia, sua Idade
Média, seu Renascimento e o seu cangaço. ―[...] a historiografia é um produto cultural
que, como qualquer outro, resulta de um complexo conjunto de condições materiais e
psicológicas do ambiente individual e coletivo que a vê nascer‖ (FRANCO JÚNIOR,
2001, p. 14), Cada produção historiográfica é fruto de um contexto histórico e lugares
sociais específicos.
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memória que deve ser preservada e que tomará forma por meio da nossa narrativa e
escrita. Como isso deve-se levar em conta que os documentos são produzidos e que o
pesquisador e historiador ao escolher determinado documento ele acaba por delimitar a
sua importância para o seu fazer historiográfico, não estando tal escolha sendo
imparcial.
O documento, como produto do passado e objeto de trabalho do pesquisador e
historiador, deixa margem para múltiplas interpretações e releituras dependendo da
problemática de pesquisa, sendo que todo documento abriga a possibilidade de infinitas
releituras. ―[...] o documento não é um documento em si, mas o diálogo entre o presente
e o documento‖ (KARNAL; TASCH, 2009, p. 12), tal diálogo estando perpassado pelos
nossos desejos e indagações sobre um objeto de estudo, pois ―toda pesquisa
historiográfica se articula com um lugar de produção socioeconômico, político e
cultural‖ (CERTEAU, 2008, p. 66).
Salientamos dois pontos com essa discussão: em um primeiro momento é
relevante atentarmos que cada período de produção historiográfica apresentará um tipo
específico de cangaço e de Lampião, baseando-se em documentações históricas as mais
variadas. ―Fato e documento histórico demonstram nossa visão atual do passado, num
diálogo entre a visão contemporânea e as fontes pretéritas‖ (KARNAL; TASCH, 2009,
p. 13, grifo dos autores).
O segundo ponto que devemos salientar, e que justifica a discussão que fizemos
até agora sobre o fazer historiográfico, o lugar social e a produção/seleção dos
documentos históricos, é o que diz respeito ao imperativo categórico presente na
maioria das produções bibliográficas sobre o cangaço que apresentam suas narrativas e
fontes como verdades absolutas. Os escritores se apoderam do discurso de que os seus
escritos e consequentemente as suas fontes de pesquisa são inquestionáveis e
condensam toda a verdade sobre o fenômeno do cangaço. No entanto, tal concepção e
visão de pesquisa com endeusamento e petrificação/santificação das fontes, fazem com
que esses pesquisadores não cruzem dados e informações e questionem a validade das
suas informações.
O primeiro momento da escrita sobre o cangaço, que estará dividida por fases,
acaba reproduzindo toda a visão de história do século XIX e a tradição positivista com o
seu caráter de ―cientificismo‖ da História e a ideia de uma ―história objetiva‖ que não
levava em consideração a relação com um lugar social produtor tanto de documentação
como do próprio historiador e pesquisador.
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Lampião. No entanto, teremos uma profusão de cordéis nesse período, que narravam os
feitos dos cangaceiros e suas facetas nas invasões.
A década de 1930 manterá o mesmo estilo de escrita da anterior, mas
encontramos um maior número de obras sobre a temática, pois o cangaço já ganhara
nova conotação nacionalmente, haja vista que a Revolução de 1930 mexerá
substancialmente com as oligarquias locais dos Estados e apresentou uma nova
formatação de Estado para o Brasil.
Obras como ―Almas de Lama e de Aço‖, escrita em 1930 por Gustavo Barroso,
trás uma perspectiva de humanização do cangaço, ou seja, a tentativa de entender os
bandidos, especificamente Lampião, não como sujeitos de personalidade degenerada,
mas fruto de um meio social que impelia esses sujeitos a seguirem a vida do banditismo.
Nesse sentido também estará o livro ―O outro Nordeste‖ de Djacir Menezes, escrito em
1937.
Com exceção da obra de Barroso e Menezes, todos os autores desse período
representarão os cangaceiros como doenças a serem exterminadas, bestas descomunais,
grandes flageladores do sertão nordestino. Por outro lado, algumas narrativas se
propõem a fazer a denúncia da corrupção na política e na polícia que acabava por
favorecer o florescimento e a manutenção do cangaço. Isso fica visìvel nas obras: ―Os
dramas dolorosos do Nordeste‖ (1930) e ―Flagelo de Lampião: relação documentada de
suas hediondas façanhas no Nordeste durante os primeiros 4 meses de 1931‖ (1931), de
Pedro Vergne de Abreu; ―Fatores do Cangaço‖ (1934), de Manuel Cândido; e
―Lampeão‖ (1933), de Ranulpho Prata.
Esse último livro publicado em 1933, apresenta-se como a segunda biografia do
―Rei do Cangaço‖, sendo que o autor deixou claro nas suas primeiras páginas que o
objetivo do seu escrito era denunciar as barbáries cometidas por Lampião nos sertões. É
um filho da elite agrária local, radicado do sul do país, falando sobre as ações dos
cangaceiros contra a população dos sertões. Nas palavras dele: ―A mão que tracejou este
livro é a de um filho dos sertões [...] somos assim, mero porta-voz da angústia de
milhares de seres humildes, dos mais desgraçados do país, pés-rapados, párias,
intocáveis, açoitados por mil flagelos‖ (PRATA, 1933, p. 21). É o clamor para que a
―gente litorânea‖, ―civilizada‖, olhe para os sertões, para aquele pedaço do Brasil no
qual as benesses da civilização ainda não fincou raízes. Segundo ele o progresso
precisava adentrar nos sertões e para isso o extermínio de Lampião e seu bando era algo
necessário e urgente.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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colocada em pauta no país por meio de movimentos ligados a terra, como, por exemplo,
as Ligas Camponesas.
Trabalhos como os de Rui Facó e de Maria Isaura Pereira de Queiroz são
importantes por romperem a perspectiva biográfica ou memorialística do cangaço,
inserindo a temática dentro de uma perspectiva sociológica, buscando entender os
enraizamentos desse movimento dentro da realidade social sertaneja. No entanto,
contraditoriamente, esse período construiu um modelo analítico dentro da academia
sobre o cangaço que acaba influenciando e sendo retroalimentado até os dias atuais.
Modelo este que apresenta esse movimento como o produto de uma sociedade na qual o
Estado oficial ausentava-se ou que travava uma íntima relação com os potentados
locais, tornando o sertão uma área dominada pelo coronelismo, onde o sertanejo era
vitimado pela seca, fome, falta de perspectiva de ascensão social, trabalho servil ou
semi-servil, e a falta de uma justiça ou burocracia jurídica estatal que desse garantias
aos menos abastados. Como dito, na perspectiva de Facó o cangaceirismo apresentava-
se como um meio de resistência a uma realidade de desigualdade, estando tal
abordagem perpassada pela perspectiva marxista da época.
Assim, de um lado encontraremos na produção bibliográfica dos escritores e
pesquisadores diletantes uma abordagem mais factual sobre as ações dos cangaceiros,
do outro, a partir da década de 1960, encontramos na academia a formatação desse
modelo analítico sobre o cangaço que apresentava o cangaceiro como a vítima do
sistema político, econômico e social do Brasil da primeira metade do século XX, sendo
que esse modelo acaba retroalimentando e sendo reafirmado como único válido para o
entendimento do movimento do cangaço dentro da academia. É como se toda a
discussão se esgotasse nessa única corrente analítica.
Não entramos no mérito se é válida ou não essa perspectiva, pois acreditamos
que ela é um caminho possível para a compreensão do cangaço, como também ela é
fruto de uma década na qual essa perspectiva apresentava-se como o modelo
hegemônico dentro das universidades.
Hoje o desafio está na mudança de fase, ou seja, passar da fase narrativista
factual e ir para a fase analítica, de recortes, de especificidades, analisando conjecturas,
confrontando dados e documentos, fatiando o cangaço, indo para além da perspectiva
biográfica, fazendo um questionamento minucioso da documentação até o presente
coletada, uma catalogação das obras já escritas, para se possibilitar uma reviravolta nos
estudos do cangaço, indo do magro ao micro. Uma história do cotidiano, do imaginário,
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dos amores, dos odores, da estética, dos medos. Não com a busca de instituir uma
verdade absoluta sobre esse movimento, mas tentando entendê-lo a partir das suas
minúcias, dos ―não ditos‖, das subjetividades.
REFERÊNCIAS
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de Janeiro: Typografia do Jornal do Commercio, 1930.
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do Autor, 1940.
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FIGUEIRÊDO, Major Moysés de. Lampeão no Ceará: a verdade em torno dos factos.
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RESUMO
INTRODUÇÃO
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esses documentos que são hoje constantemente utilizados pelo historiador no seu ofício,
temos a canção. Napolitano (2008, p. 235-236), fala sobre o crescente espaço dado a
outros tipos de fontes e principalmente as fontes audiovisuais e musicais. Essas fontes
entre no rol de fontes primárias e de uma forma desafiadora para o historiador.
Napolitano, em seu texto, verifica que muitas vezes as fontes audiovisuais como o
cinema (documentários), televisão e registros sonoros, são testemunhos diretos e
objetivos da história, já quando se trata de cinema ficcional, novelas e canções, tem uma
carga de subjetividade. Mas ―A questão no entanto, é perceber as fontes audiovisuais e
musicais em suas estruturas internas de linguagem e seus mecanismos de representação
da realidade, a partir de seus códigos internos‖ (NAPOLITANO, 2008, p. 236).
Verificando a questão da canção, e tendo uma visão ―subjetivista‖, devido a
sua natureza estética e polissêmica podemos dizer:
As perguntas que devem ser lançadas à fonte histórica devem informar sobre
esses elementos e as relações entre eles: os sujeitos e seu contexto, seu lugar
social, as distintas relações por eles vivenciadas, o ambiente em que estavam
inseridos, suas identidades, etc.
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Em outras palavras, sem deixar de ser por uma instituição qualquer, a fonte é
uma evidência de um processo ou de um evento ocorrido, cujo
estabelecimento do dado bruto é apenas o começo de um processo de
interpretação com muitas variáveis. Ao contrário da tradição metódica e
positivista, que acreditava na neutralidade e na autoria e datação, a Nova
História e seus herdeiros apontam para o caráter representacional das fontes,
mesmo as tradicionais fontes escritas, que são documentos e monumentos
carregados de intencionalidade e parcialidade.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
forma completa (letra, música e ritmo). Talvez pela dificuldade de não haver uma
organização sistemática do que foi produzido, tendo o historiador se valer de coleções
particulares de colecionadores. Os primeiros estudos historiográficos, por volta da
década de 1970, pegaram embalo nas áreas de Estudos Literários e das Ciências Sociais,
que privilegiavam a ―letra‖ em suas análises. Para o historiador, a letra da canção
serviria como um texto, simulador da realidade social ou uma crônica do cotidiano.
A canção, como é colocado por Napolitano (2003, p. 77), como um
termômetro, um caleidoscópio ou um espelho das mudanças sociais. Como então essa
canção pode tornar-se objeto e fonte na formulação do conhecimento histórico?
Hermeto contribui para a discussão de como o conhecimento histórico é produzido:
Por isso, cada historiador dará sua resposta singular, sua opinião sobre o que
pode vir a ser um tema em determinada expressão musical. Desde que haja
fontes suficientes para respaldar seu discurso, o historiador poderá inventariar
certos sentidos e escrever outros para uma canção, um grupo ou um artista
em sua investida historiográfica, sem perder de vista os já inventados e
consolidados; ele busca não o que ―está evidente‖, mas o que ele procura
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
evidenciar, o que ele quer dar visibilidade, não significando que, com isso, se
possa dizer tudo acerca de uma canção ou de seu compositor/intérprete ou
menos ainda de um tema ou contexto histórico como a fama, por exemplo.
(FARIAS, 2011, p. 24)
(…) esses vìcios podem ser resumidos na operação analìtica, ainda presente
em alguns trabalhos, que fragmenta este objeto sociológica e culturalmente
complexo, analisando ‗letra‘ separada de ‗música‘, ‗contexto‘ separado da
‗obra‘, ‗autor‘ separado da ‗sociedade‘, ‗estética‘ separada de ‗ideologia‘.
(NAPOLITANO, 2002, p. 08).
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canção. Uma música ideal para a realização desse trabalho seria ―Faroeste Caboclo‖ 152.
A canção tem mais de nove minutos e 157 versos mostra a vida e morte de
João do Santo Cristo na cidade de Brasília. Encontraremos todas as dimensões
propostas nessa canção. Foi escrita no ano de 1979 por Renato Russo e gravada em
1987 no álbum Que País É Este 1978/1987 da Legião Urbana.
O título da canção faz referência ao algo rural, que tem ligação com o cerrado,
o sertão (caboclo) e ao bang-bang americano dos estados do norte (faroeste). A
realidade exposta pela canção é um pouco diferente do que seu título retrata. O cenário
colocado na música também foge – apesar de ser no cerrado brasileiro – as
características do seu título. Faroeste Caboclo fala de Brasília, na época recém-
construída (1960) para ser a capital do Brasil. Brasília que era uma cidade que
apresentava uma característica diferente dos grandes centros urbanos do Brasil, era um a
cidade que não tinha muito o que fazer. Brasília é tema de diversas música do Aborto
Elétrico, da Legião Urbana, do Capital Inicial e da Plebe Rude.
A canção, devido ao seu tamanho, tem diversas variações em seu ritmo e
melodia. Em momentos de mais ―tensão‖ o ritmo se acelera e as guitarras são mais
pesadas. A melodia cantada por Renato Russo também sofre variação em diversos
momentos. Podemos encontrar as cinco dimensões nessa canção, verificando os pontos
colocados por Hermeto (2012, p. 142-148).
A dimensão material, que cita duas questões importantes para serem
analisadas, o suporte e a linguagem torna-se importante para repassar o documento. A
canção pode ser trabalhada em diversos suportes: letra impressa ou projetada, videoclipe
oficial com legendas, vídeos feitos por fãs, apresentações ao vivo somente o áudio ou
em vídeo, etc. Cada tipo de suporte poderá agregar informações ao historiador. Quando
tratamos da linguagem, a relação entre melodia/letra/ritmo é de fundamental
importância. A linguagem pode também ter suas variações a partir do suporte utilizado.
A forma gravada em estúdio das canções ou as apresentações ao vivo, por exemplo,
podem trazer diversas informações diferenciadas e modificar a linguagem utilizada.
Como coloca Hermeto (2012, p. 144): ―(…) canções que circulam em videoclipes
trazem, junto da relação básica melodia/letra/ritmo, a imagem em movimento. Imagens
que recriam e reinterpretam as representações da canção, e que passam a compor a
mensagem para o leitor‖.
152
LEGIÃO URBANA, 1987, f. 9 Disponível em: https://www.letras.mus.br/legiao-urbana/22492/
399
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153
A canção não está com sua letra apresentada no artigo devido o limite de páginas, mas poderá ser
acessada em: https://www.letras.mus.br/legiao-urbana/22492/
400
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401
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se encontra.
A dimensão explicativa: irá analisar o contexto que a canção está inserida e
onde ela foi produzida e percebida na sociedade. Temos que observar também a canção
em dois contextos: o contexto em que foi escrita e o contexto em que foi interpretada. O
contexto que foi escrita demonstra o local e o que levou o compositor a se debruçar
sobre o tema. A canção ―Faroeste Caboclo‖ irá demonstrar a história de um nordestino
negro que sai da Bahia e tenta a vida em Brasília. Renato Russo, compositor da canção,
viveu sua adolescência em Brasília e provavelmente teve contato com inúmeros
migrantes na cidade. Era nesse contexto que vivia o autor da canção. Era também o
início do processo de abertura política da Ditadura Militar no Brasil, que também está
relatado na canção. Existe também alguns acontecimentos relatados na canção, vividos
por Renato Russo, com as bombas em bancas de jornais e a ―Rockonha 154‖. Outros
acontecimentos, fictícios, mas que condiz com os problemas e conflitos sociais que
existiam (e existem) no Brasil como delinquência juvenil, sistema penitenciário
fragilizado, desemprego, tráfico de drogas, contrabando, promessas de políticos e
criminalidade.
Alguns desses acontecimentos relatados, são da época, mas o leitor de hoje, da
canção, pode verificar ainda em nossa sociedade todos os problemas relatados, exceto
os relatados sobre a Ditadura Militar. É preciso verificar o contexto da canção e sua
historicidade, como os relatos de sua letra podem trazer (ou não) questões históricas.
Mesmo as abordagens fictícias, encaixa-se perfeitamente no contexto de interpretação
atual. Ainda vemos crianças e adolescentes indo para o ―reformatório‖, ainda vemos os
crimes cometidos pelo conflito entre traficantes, ainda vemos palavras dos ministros
dizendo que irão ajudar. Todas essas informações são colhidas pelo autor da canção
através de referências que ele vê ou em acontecimentos presenciais ou idealizados
devido suas leituras sobre o seu contexto.
A dimensão dialógica do documento, irá trabalhar justamente os links que
poderem ocorrer na canção. A discussão sobre o sistema prisional pode partir da análise
desta canção. A ligação com outros textos e outras fontes pode ser realizada. É preciso
perceber quais são esses diálogos e a evocação deles, traz a mensagem final da canção.
154
As ―rockonha‖ aconteceram no mesmo lugar, num sitio em sobradinho (cidade-satélite de Brasília). A
primeira foi um sucesso e, apesar de pouca divulgação, deu tudo certo. Devido a esse sucesso os
organizadores resolveram fazer outra. A segunda, que ficou famosa na música, foi bem diferente da
primeira, a começar pela divulgação, que foi feita pela cidade inteira e até a polícia ficou sabendo.
(\MARCHETI, 2001, p. 48)
402
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Temos nos últimos versos e a melodia final toda uma carga contestatória. A missão
procurada por Santo Cristo, mesmo passando por todos os intemperes relatados na
canção, ―Ele queria era falar com o presidente / Pra ajudar toda essa gente que só faz /
Sofrer!!‖.
A dimensão sensível apresenta para nós, a identificação dos sentimentos
apresentados pela canção. Não se pode deixar de fora o que o autor da canção está
sentindo. Como foi debatido nas outras dimensões também, a variação tanto na melodia
como na música é fundamental para a demonstração dos sentimentos colocados pelo
autor. A composição sempre tem uma carga emocional e também gera uma carga
emocional em quem ouve. Esses elementos devem ser identificados, favorecendo a
percepção de que esse documento foi realizado por sujeitos reais, envolvidos em
relações sociais complexas.
Para acrescentar na análise do documento nessas dimensões, Napolitano (2012,
p. 281-282) ao final do seu artigo sobre ―A História depois do papel‖, dá dicas para se
trabalhar com os documentos audiovisuais. Ela coloca a música com qualquer outro tipo
de documento histórico que evidencia e representa algo. Verificar a música com sua
estrutura interna de linguagem e de representação da realidade ou como testemunho da
experiência histórica e social. Articular a linguagem e as representações da realidade
histórica ou social nela contida. Essas observações feitas por Napolitano, estão
diretamente ligadas as dimensões colocadas anteriormente.
Quando se trata da música como fonte, é necessário, segundo Napolitano,
verificar algumas questões: 1. Escolher o suporte, fonograma ou outro como videoclipe;
2. Informações históricos do fonograma; 3. Realizar audições repetidas; Analisar letra,
estrutura musical, sonoridades vocais e instrumentais; 4. Verificar o contexto
extramusical (dados da biografia dos compositores, cantores e músicos, filha técnica do
fonograma, textos explicativos dos próprios artistas envolvidos); e 5. Contextualizar as
manifestações escritas da escuta da música (crítica, artigos de opinião) com as obras em
sua materialidade (fonogramas).
Temos que o observar como a canção pode se tornar também material didático
e que seja utilizado pelo professor em suas aulas. O próprio professor poderá utilizar
esse documento independentemente dos manuais utilizados sugerirem isso. A criação de
sequências didáticas ou de projetos pedagógicos interdisciplinares poderão fazer essa
ponte entre o Ensino de História e a canção da música urbana. Cabe ao docente procurar
a elaboração destes e agregar as demais disciplinas das ciências humanas nessa
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empreitada.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e métodos.
4ª ed. São Paulo: Cortez, 2011
CALVANI, Carlos Eduardo Brandão. Teologia e MPB. São Paulo: Edições Loyola,
1998.
DAPIEVE, Artur. BRock (o rock brasileiro dos anos 80). 3ª ed. Rio de Janeiro: Editora
34, 2000.
FARIAS, Elton John da Silva. Captain Fantastic And The Brown Dirt Cowboy: Um
Capítulo de História da Fama (1975). Dissertação (mestrado em História). Universidade
Federal de Campina Grande. Campina Grande, 2011.
GÜNTHER, Wesley Rosa. Que Cidade É Esta? A Urbs brasiliense nas letras do álbum
Que País é Este 1978/1987 da banda Legião Urbana. Dissertação (mestrado em
Literatura e Práticas sociais). Universidade de Brasília. Brasília, 2013.
PINSKY, Carla Bassanezi (Org.) Fontes Históricas. 2ª Ed. São Paulo: Contexto, 2008
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RESUMO
INTRODUÇÃO
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Dito isto, compreendo que o campo político possui suas fronteiras delimitadas
por barreiras simbólicas que separa os profissionais dos profanos. Dentro deste
microcosmo, um capital, também simbólico, hierarquiza posições, reverencias e
simbologias. Assim, ―falar de campo polìtico é dizer que o campo polìtico (e por uma
vez citarei Raymond Barre) é um microcosmo, isto é, um pequeno mundo social
relativamente autônomo no interior do grande mundo social‖ (BORDIEU, p. 194/194).
Desta forma o funcionamento de um campo só faz sentido para aqueles que se movem
dentro dele buscando seus troféus e dispostos a agirem conforme suas regras e
paradigmas. No entanto, as regras e paradigmas de um campo não são estáticas sendo
passiveis de serem transformadas a partir de um relação de disputa e poder, onde novas
regras e paradigmas podem se tornar hegemônicos incluindo novos atores e excluir os
antigos participantes.
Diante do exposto, esta proposta visa analisar como ―João de Zeca‖, adentrou as
fronteiras do campo político em 1970 e caminhou por este espaço até a década de 1982.
João de Zeca, como ficou conhecido era filho de José Antônio de Macêdo, daí o
apelido que ganhou ainda na juventude, pois naquele espaço e contexto histórico era
costumeiro se referir aos mais jovens a partir de uma referência, no caso do vereador a
referência era o seu pai, um agricultor conhecido pela alcunha de Zeca de Vigário. Não
nos cabe neste trabalho hierarquizar tais referências, pois o que nos interessa nesse
momento é identificar os fatores que proporcionaram a ascensão de nosso personagem à
cena pública.
155
. Ato Institucional nº 11, de 14 de Agosto de 1969. http://www2.camara.leg.br/legin/fed/atoins/1960-
1969/atoinstitucional-11-14-agosto-1969-363939-publicacaooriginal-1-pe.html
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A família Macêdo possuía certo prestígio na cidade, pois figurava como uma das
primeiras famílias a habitarem aquelas terras. Sua participação na política local se
iniciou em 1919 quando Antonio Landim de Macedo se tornou prefeito da cidade, em
uma época de constantes conflitos, inclusive armados, disputando o poder com outra
família importante; os Leite. Os notórios habitantes da cidade tinham em suas
assinaturas quatro importantes sobrenomes: Leite, Quezado, Gonçalves e Macêdo. Era
famosa, na época, 1970, conforme Joaryvar Macedo156, uma quadra que enfatizava a
popularidade dessas famílias.
156
. Revista do Instituto Histórico do Ceará. Fortaleza, 97: 93-111, 1983
157
. MACÊDO, Vicente Landim. João de Zeca: o vitorioso. Brasília, 2016.
409
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2008. p. 34). Foi após a crise do comércio de algodão que João de Zeca se aventurou
pela política.
Com o aval do seu chefe local, João de Zeca se candidatou naquelas eleições
contrariando a própria família,
Fui proibido de pedir voto em três sítios. Na Várzea de Pedra, que era região
de Macedinha, aqui nas Varzantes e no São Miguel. Eu não podia pedir votos
nesses cantos. Porque disseram que eu ia derrotar Macedinha. Eu tava tirando
os votos dele. Aí tio Tonho um dia me chamou e disse: ―meu filho eu quero
que nesse três cantos você não pode pedir voto‖. Eu disse: ―tio Tonho, eu não
to tirando voto de Macedinha não, eu converso com a pessoa: ‗com que você
vai votar?‘ Ai ele diz: ‗eu vou votar com fulano e tal, se for do grupo, do
partido eu nem paro, quando é do outro lado é que eu vou atrás‘. (MACÊDO,
J.A, 2017)
158
. MACEDO, J.A. Entrevista concedida a Francisco de Assis Severo Lima. Aurora-CE, 10 de jan. 2017.
[A entrevista encontra-se transcrita nos anexos desta dissertação]
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usufruir do dinheiro para garantir sua vitória, ―eu botei até um café para atender o povo
e quem tomou conta desse café foi Chico ―Fele‖, botei até o nome café canta galo, lá
você tomava café, merendava era tudo de graça, ninguém pagava‖ 159.
Durante sua atuação como prefeito da cidade Aurora João de Zeca desenvolveu
algumas práticas modernizantes no município. Ao longo de sua gestão o município
vivenciou um processo de desenvolvimento e modernização urbano-social a partir da
eletrificação de grande parte das zonas urbanas e parte das zonas rurais, abastecimento
de água encanada nos bairros, construção de 74 unidades escolares, oito barragens que
visavam perenizar o Rio Salgado em sua passagem pelos limites do município,
calçamentos urbanos e abertura de 476 km de estradas para passagem de automóveis
interligando a zona rural, facilitando o escoamento da produção agrícola. Num período
em que o princípio da impessoalidade não vigorava tais obras públicas foram ligadas
diretamente ao nome do gestor fazendo de João de Zeca um político prestigiado e
admirado pelos munícipes. Tais estratégias se consubstanciaram em mecanismos da
conquista do capital político e, fizeram de João de Zeca um personagem atuante deste
campo político, sabendo se portar na relação com os indivíduos que chancelaram sua
entrada.
159
. Idem.
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- Cumpade, agora você entrou num ramo bom. Pense num ramo bom!
Prefeitura é mil vezes melhor do que o comércio. Vou explicar: todo
dia 10, 20 e 30 cai dinheiro - num é, doutor contador? O contador
assentia e explicava que era o recurso do FPM.
João prosseguia:
- é o ICMS.
E João arrematava:
160
. https://issuu.com/gazetaco/docs/gazeta313/3
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
mais arraigados, fazendo com que os indivíduos recebessem favores em troca de apoio
político. Por conseguinte, neste sistema de troca e apoio político, os bens públicos
continuaram a servir aos interesses familiares.
REFERÊNCIAS
BOURDIEU, P. 1996. Marginália. Algumas notas adicionais sobre o dom. Mana, Rio
de Janeiro, v. 2, n. 2, p. 7-20.
BURKE, Peter. O que é História Cultural? Tradução de Sergio Góes de Paula. 2. ed.
revista e ampliada. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008 [2004].
BURKE, Peter. ―História como alegoria‖. Estudos Avançados, São Paulo, USP, vol. 9,
n. 25, 1995, p. 197-212.
415
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RÉMOND, René. ―Uma história presente‖. In RÉMOND, René. (Org.). Por uma
História Política. Rio de Janeiro: UFRJ/FGV, 1996, pp. 13-36.
RÉMOND, René. ―Uma história presente‖. In RÉMOND, René. (Org.). Por uma
História Política. Rio de Janeiro: UFRJ/FGV, 1996, pp. 13-36.
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RESUMO
Esse famoso encontro ecumênico foi realizado por iniciativa do Papa João XXIII,
e, com a sua morte em 1963, coube ao seu sucessor, o Papa Paulo VI, concluir esse
concílio em 1965, o qual representou um marco na história da Igreja Católica no século
XX, haja vista as mudanças significativas que resultaram desse encontro, no tocante ao
modo de ser e fazer Igreja. De acordo com Pereira (2012, p. 48):
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
O Concílio Vaticano II, na visão do Papa João XXIII, tinha por finalidade a Igreja
fazer uma autoavaliação e atualizar-se a temas inerentes da contemporaneidade, sua
proposta era a de um aggiornamento. Este evento teve uma forte influência na prática
pastoral exercida por Dom José Maria Pires no Estado paraibano. Ele buscou colocar em
prática as resoluções do Concílio, apresentando em seu ministério o modelo de uma Igreja
atenta às questões sociais e mais aberta ao povo.
Embora apoiando o Golpe Militar de 1964, quando ainda era bispo daquela
diocese mineira [Araçuaí], Dom José mudou sua postura acerca do regime
militar já nesse mesmo ano, enfrentando o autoritarismo dos militares e
defendendo as vítimas do regime ditatorial. Chegando a Paraíba, em 1966,
permaneceu firme na luta contra as arbitrariedades dos militares e buscou
alternativas para resolução de problemas como a fome e a seca, criando duas
iniciativas relevantes: a Operação Gota D‟água e o Projeto Igreja Viva. Ambos
com preocupações maiores que o mero assistencialismo tão presente na
instituição eclesial.
Dom José manteve uma posição de radicalidade na defesa dos direitos humanos,
manifestando denúncias e sentimentos de repúdio a violação de tais direitos por meio de
sermões, cartas pastorais, declarações nos jornais, além de comparecer nas comunidades
injustiçadas. Por esse engajamento pastoral e crítico das arbitrariedades cometidas pela
classe dominante e o governo dos militares, Dom José chegou a ser intitulado por esses
setores como sendo comunista e subversivo.162
161
Dom José Maria Pires também era conhecido por Dom Pelé, apelido dado por seus amigos na época em
que era bispo da Diocese de Araçuaí (MG), em virtude da semelhança que tinha com o jogador de futebol
Edson Arantes do Nascimento, vulgo Pelé, o qual era seu conterrâneo.
162
Cf. PEREIRA, Vanderlan Paulo de Oliveira. Em nome de Deus, dos pobres e da libertação: Ação
pastoral e política em Dom José Maria Pires, de 1966 a 1980. Dissertação de Mestrado apresentada ao
PPGH/UFPB, em 2012.
418
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Vale salientar que a Igreja Católica, sendo uma grande instituição universal,
abarca em torno de si grupos heretogêneos de clérigos, que possuem divergências
metodológicas e visões distintas sobre a prática religiosa. Aqui no Brasil, por exemplo,
partindo dessa premissa, podemos delinear duas vertentes da Igreja: uma conservadora,
adepta da concepção da Neocristandade, por outro lado, temos os progressistas, do qual
Dom José fazia parte e que se caracterizava por ser um grupo que almejava se aproximar
dos pobres, sendo signatários da teologia da libertação. Para Pereira (2012, p. 67):
Sobre essa cisão ideológica dentro da Igreja, é importante lembrar que os agentes
da repressão contaram com o apoio de setores expressivos da sociedade civil, inclusive de
parte da Igreja Católica, que através da Sociedade Brasileira em Defesa da Tradição, da
Família e da Propriedade (TFP), não economizou esforços para combater à oposição. De
acordo com Júnior (2008, p. 53):
No tocante ao golpe de 1964, Dom José Maria Pires foi um grande entusiasta a
princípio, assim como grande parte dos membros da Igreja Católica do período. Entretanto,
tempo depois, decepcionou-se com o regime dos militares por não terem posto em prática
o programa de governo que fora anunciado. Além de agirem com austeridade aos
opositores políticos. Em entrevista a Vanderlan Pereira, Dom José disse o seguinte:
419
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Com relação as vítimas do Regime Militar, Dom José buscava conceder proteção
dentro de suas possibilidades, em suas palavras:
A gente fazia o que era possível. Se era preciso esconder a pessoa, a gente já
sabia que devia mandar pra tal lugar, mandava muitas vezes p‘ro interior, pra
casa de um padre. É necessário? Como é que vai pra lá? Entra no meu carro aqui,
fica lá atrás, deita lá. Meu carro passava. Não tinha a Manzuá, mas tinha a
polícia na estrada... Era o arcebispo, pronto, logo conseguia. Então a gente pode
levar pessoas assim. (PIRES Apud PEREIRA, 2012, p. 95)
Portanto, Dom José Maria Pires foi um líder religioso que não se limitou a ficar
restrito ao ambiente do Palácio do Bispo, sede oficial do Arcebispo da Paraíba, como o
fizeram seus antecessores, pelo contrário, ele se envolveu nos conflitos sociais que
existiram na época da Ditadura, sempre estando ao lado dos menos favorecidos, dos
trabalhadores rurais, dos estudantes perseguidos. Em suma, manteve uma posição de
defesa dos direitos humanos, de ajuda aos mais necessitados e de crítica as arbitrariedades
cometidas pelo sistema. Não se calando diante das graves injustiças cometidas contra os
trabalhadores.
420
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Essas diretrizes dizem respeito a postura de uma Igreja mais preocupada com a
situação dos menos favorecidos, a opção pelos pobres e oprimidos. Uma Igreja que
buscava ajudar na transformação da condição dessa camada da população, não se limitando
às práticas assistencialistas. Sendo, portanto, uma Igreja viva e atuante.
Com relação às forças armadas, a Igreja deve inculcar-lhes a ideia de que, além
de suas funções normais específicas, têm a missão de garantir as liberdades
políticas dos cidadãos, em vez de lhes obter obstáculos. Além disso, as forças
armadas têm a possibilidade de educar dentro de seus próprios quadros, os
jovens recrutas para a futura participação, livre e responsável, na vida política do
país. ((PAULO VI In: CELAM, 1998, p.37 Apud PEREIRA, p. 99).
421
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Sua trajetória pastoral é marcada por atritos que estabeleceu entre, por um lado,
com os agentes do governo, e por outro, com setores da classe dominante local. A título de
exemplo, temos os conflitos rurais que aconteceram nas Fazendas de Mucatu e Alagamar.
Não obstante, mesmo diante de situações politicamente delicadas, podemos perceber que o
Arcebispo da Paraíba sempre buscou o caminho do diálogo e da resolução dos conflitos
por via pacífica.
A ação pastoral de Dom José, fora materializada a partir dos projetos Igreja Viva,
CEB‟s, Operação Gota d‟água e Equipe de Promoção Humana, este último,
posteriormente deu lugar ao Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Arquidiocese da
Paraíba, em 1976. Todos esses órgãos tinham por escopo se envolver nos problemas
vividos pelo povo paraibano. Refletiam a prática das resoluções conciliares.
Diante dessa atuação eficaz nos meios populares, de engajamento político em áreas
rurais em defesa dos camponeses, denunciando a concentração de terras, o latifúndio, a
opressão dos pobres, algumas lideranças políticas do Estado e membros da classe
latifundiária se desagradaram com esse modelo da Igreja Viva, no que implicou na
422
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perseguição de alguns agentes pastorais. 163 Por isso Dom José é considerado um desafeto
dos militares.
Nosso irmão Frei Hermano José foi também chamado de novo ao I Grupamento
de Engenharia por autoridades da Segurança Nacional. Acusaram-no “de estar
pregando a violência, levando o povo a fazer greve, de ser ele comunista e
subversivo como o Arcebispo da Paraíba‖. Advertiram-no de não continuar
seu trabalho junto aos camponeses. E o ameaçaram de fazer um processo contra
ele e expulsá-lo do País. (PIRES, 1975)
Nesta carta, Dom José também manifesta apoio ao Frei franciscano, tanto por
parte da Arquidiocese quanto da Ordem a qual pertence. Além de tecer críticas as
autoridades políticas e considerar injustas as acusações formuladas contra o Frei Hermano
José. O Arcebispo ressalta que é legítima a ação pastoral do Frei Hermano, no qual
aconselha os agricultores para se unirem, recorrerem ao Sindicato e a Federação, na
procura de defenderem seus direitos dentro da lei. Dom José reflete que nas circunstâncias
da época, os missionários que se comprometem a ajudar os humildes, são tachados de
comunistas, subversivos e ameaçados de expulsão. E acrescenta:
Seria tão bom que os nossos irmãos, responsáveis pela Segurança Nacional
fossem viver algum tempo no meio do povo, participando de seus sofrimentos,
trabalhando com ele e comendo do mesmo feijão com farinha. Então eles
também iriam apoiar as reclamações do povo e iriam sentir que a verdadeira
segurança não se conquista silenciando os clamores de justiça, mas
transformando metralhadoras em arados e tanques de guerra em tratores
agrícolas. (PIRES, 1975)
163
Idem, 2012.
423
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João Batista Filho era padre da Paróquia de São Cristóvão, em Campina Grande.
Ao tempo em que exercia o sacerdócio e a cátedra, também atuava como
assessor espiritual dos movimentos da Juventude Estudantil Católica (JEC) e da
Juventude Universitária Católica (JUC). Em 1966, ingressou como estudante no
curso de Ciências Econômicas da Faculdade de Ciências Econômicas de
Campina Grande, o que possibilitou que fizesse movimento estudantil e fosse
eleito presidente do Centro Acadêmico daquela Faculdade. Quando do Decreto
477, de 26 de fevereiro de 1969, teve sua matrícula suspensa por dois anos, pela
Reitoria da Universidade Federal da Paraíba. Por ter sido afastado da cátedra e
dos seus estudos, e por temer pela sua vida, abandonou Campina Grande e a
batina para tentar a sobrevivência em São Paulo. Atualmente, é casado com
Raimunda de Brito Batista, e mora em Londrina, Estado do Paraná (Arquivo do
Gabinete do Deputado Zenóbio Toscano Apud SILVA, 2010, p. 30).
Outro caso de atrito entre membros da Igreja no Estado com os militares ocorreu
em 1972, quando o Bispo diocesano de Campina Grande (CG), Dom Manuel Pereira da
Costa, foi proibido de entrar no teatro municipal por ordem do Comandante da 5 a Cia. de
Infantaria de CG. Sobre esse episódio, o vereador Rildo Fernandes, da Câmara municipal
da cidade, saiu em defesa do religioso164. Dom Manuel Pereira, por sua vez, comunicou ao
General do 7° Regimento Militar de Pernambuco o acontecido:
164
Cf. Dossiê do regime militar, no Arquivo Eclesiástico da Paraíba. Fundo: Chancelaria, série:
documentação dos bispos, sub-série: discursos, 1972. (doc. Sem título).
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A prática pastoral de Dom Manuel Pereira é semelhante à de Dom José Maria Pires.
Ambos são denominados como bispos progressistas. Por isso eram considerados desafetos
dos militares, pois suas atuações não se limitavam as questões religiosas, tendo também
preocupação com a realidade social do povo paraibano. Em contrapartida, os bispos das
dioceses sufragâneas do interior do Estado, Dom Expedito e Dom Zacarias,
respectivamente de Patos e Cajazeiras, tinham uma postura mais conservadora. Contudo,
apesar das concepções metodológicas serem distintas, segundo Dom José 166, o
relacionamento entre os quatro era de harmonia e cumplicidade.
No que concerne a Dom José Maria Pires, este recebeu várias cartas anônimas
contendo ameaças, devido ao seu trabalho pastoral. Algumas dessas cartas encontram-se
no dossiê do Regime Militar da Arquidiocese do Estado, e fazem menções as atividades
contrárias de Dom José a Revolução de 64, acusando-o de ser terrorista, pedindo o seu
afastamento do cargo de Arcebispo, chegando até a conter ameaças de morte. Como
podemos verificar neste trecho:
Das coisas que você está fazendo D. José Maria Pires, querendo levar o país a
mesma situação de 1964. Não pense que o povo está com você, o povo está com
a revolução, deixe de ser besta velho caduco, filho da puta. Você com esse
terrorista Wanderlei Caixe vai arranjar o chapeu de viagem, pode esperar. Os
proprietários também não vão ficar de braços cruzados, aguarde que verá, porque
quem procura acha. Você agora só quer é agitar o povo, mas o povo está
compreendendo tudo porque ninguém é besta e já sabe o que passou em 64. Olhe
para a Itália, França e o mundo todo, e veja o terrorismo como está, e você
também querendo fazer terrorismo velho filho da puta. Prepara-se para morrer,
porque se continuar assim o seu dia chegará, e o de Wanderlei também, bando de
165
Cf. Dossiê do regime militar, no Arquivo Eclesiástico da Paraíba. Fundo: Chancelaria, série:
documentação dos bispos, sub-série: Cartas pastorais, 29/03/1972.
166
PEREIRA, 2012.
167
Vilma Batista foi da direção da JUC (Juventude Universitária Católica). Atuou no movimento estudantil, e
por isso acabou sendo fichada pela DOPS, acusada de desenvolver atividades incompatíveis com a vida
universitária e desordem pública. Atualmente é professora emérita do Estado da Paraíba.
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filho da puta terroristas. (Carta anônima, sem data. Dossiê do regime militar.
Fundo: Chancelaria, série: doc. dos bispos, sub-série: Comunicação, AEPB).
REFERÊNCIAS
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Arquivo Histórico do Estado da Paraíba
Fundação José Américo de Almeida
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VELÔSO, Ricardo Grisi. As cartas pastorais de Dom José Maria Pires durante a
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RESUMO
INTRODUÇÃO
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presente nos discursos políticos como justificava para aquisição de uma ferrovia, como
também versaram sobre interesses próprios.
Com suas fazendas, engenhos e produção agrícola, os políticos empenhavam-se em
alcançar seus objetivos. Observamos também, o desejo dessa junta parlamentar em tornar-
se moderno. A seca era uma das vias para consolidação dos seus desejos. Neste âmbito,
Rezende (1997, p. 89) nos demonstra que os desejos decorrentes dessa modernidade não
está alheio aos homens, estes traçam seus percursos e caminham, entre verdade e
invenções.
Desse caminhar, ressaltamos o espetáculo que foi a chegada do progresso por meio
do trem, na Paraíba. Em 15 de dezembro de 1871 a princesa Isabel assinou o decreto n°
4.838, disponibilizando aos conselheiros Diogo Velho, deputado Anísio Salatiel e André
Rebolças a permissão da construção da via férrea na Paraíba. Dessa autorização nasceu a
estrada de ferro do período imperial: conde D´Eu Rei que ligava a sede da província a vila
de Alagoa Grande, com ramais para Ingá e Independência, antigo nome da cidade de
Guarabira.
O mapa abaixo elaborado no século XX representa um panorama da extensão
ferroviária no Brasil em 1890 abarcando a cidade da Paraíba e as outras localidades
citadas. Ao observá-lo minuciosamente percebemos que desde essa época o trem de Natal-
RN, linha denominada The Imperial Brazilian Natal Nova Cruz passando por Sousa-PB,
era um traçado almejado vindo a ocorrer apenas na metade do século XX.
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Para aquisição de uma ferrovia, tendo em vista o beneficio de elites nortistas, eram
articuladas falas no senado. O intuito era conseguir cada representante do seu estado ou
província, apoio dos deputados. Cita Camargo (2015) que em alguns casos os diretores das
companhias ferroviárias eram na verdade; fazendeiros, coronéis, senadores e deputados.
Este fator facilitou muitos empreendimentos nesse setor, sem planejamento adequado,
malha mais cara que o normal, ao mesmo tempo viáveis. Aranha (2001) descreve em suas
pesquisas que os gastos com a implantação de ferrovias eram exorbitantes, fruto das causas
acima.
Ainda na perspectiva de Aranha (2001), havia também engenheiros que não
maquiavam os números, a realidade dos fatos, mas sim, ressaltavam, sem exageros, que a
economia paraibana teria rendimentos promissores. Baseavam-se no potencial de cada
região como as vilas do sertão.
Não seria, assim, apenas um ―favor‖ vindo do então presidente Epitácio Pessoa
(1919-1922), mas de fato uma vantajosa empreitada. Existia de fato característica propícia
para o prolongamento das estradas de ferro de: Soledade, Santa Luzia, Patos, Pombal,
Sousa e Cajazeiras, vilas que se apresentavam como incluídas no crescimento econômico
por meio do algodão e da agricultura.
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Como acréscimo de argumentos, elegeu-se a seca como uma grande figura a ser
combatida. Sertanejos, flagelados pela ação dela precisavam de salvação, o trem nesse
caso, era a imagem da salvação ao apontar no sertão.
(...) Fome e epidemia formavam uma dobradinha perfeita enquanto mote para
justificar a necessidade do transporte ferroviário na região. De modo que tinham
pouca importância, aqui, razões de ordem econômica, voltadas para o incremento
da atividade agrícola e/ou comercial. O que importava era a capacidade de
engatilhar um discurso que sensibilizasse que implicasse, na liberação de
recursos. (ARANHA apud SILVA, 2011, p. 46).
Observamos na citação que o discurso era o mais importante ator desse cenário,
como ele, na voz dos seus oradores, os parlamentares, ajudou-os em suas conquistas. E
mais uma vez, não importava-se a quem ou a que se referia o assunto em pauta. Com isso
tornou-se visível a construção de ferrovias, mas como observamos, o que deveria ter sido
ressaltado eram concepções econômicas, em virtude da atividade agrícola existente.
Entretanto, o que foi engatilhado, no ano de 1918 pelo presidente da República, o
paraibano Epitácio Pessoa as estradas de ferro no seu projeto de obras contras secas. De
todo modo, com esse impulso na edificação das ferrovias, a Paraíba destacou-se como a
maior produtora de algodão, exportando fardos ao mercado internacional.
Dentro desse processo de modernização, na Paraíba, as únicas cidades que
encaixavam-se nesse contexto eram: Areia e Mamanguape. Possuíam um sistema de
pavimentação, escolas, igrejas, imprensa e boticas. Em contra partida, a capital sentiu uma
queda negativa no número populacional nos períodos de 1872 e 1890.
Campina Grande nesse momento não passava de um ―desarrumado de casario‖.
Mas os papéis se inverteram com a aliança trem-telégrafo. Sem a presença deste meio de
comunicação e locomoção, Areia e Mamanguape decresceram e tornaram-se cidades
desfalecidas. (MELO, 2002).
Em grande medida a elite não mediu esforços para adquirir um transporte
ferroviário, movido pelo ideal de lucratividade. As localidades que participaram são
envolvidas em um processo de busca de mudanças em seu território. Critica Berman
(2007) que essas mudanças em outro momento darão espaço a outras, substituído-as ou
cessado-as de vez, tendo como fio condutor a busca sempre dessa lucratividade.
Acrescenta Berman (2007, p. 123):
[...] Tudo que é sólido das roupas sobre nossos corpos [...] as casas, os bairros
onde vivem os trabalhadores, as firmas e corporações que os exploram, às vilas e
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cidades, regiões inteiras...tudo isso é feito para ser desfeito amanhã, despedaçado
ou esfarrapado, pulverizado...a fim que possa ser reciclado ou substituído na
semana seguinte, sempre adiante, talvez para sempre, sobe formas cada vez mais
lucrativas [...].
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Almeida (1981) ao discorrer sobre isso, afirma que o D.N.O.C.S não detinha recursos para
concretização das obras: faltava material. Outro argumento era a dificuldade em transporte:
―em muitas obras são usados caminhões de aluguel‖, desta forma necessitava a construção
e melhoramento das ferrovias, visto que, em uma construção de açude era requerido um
transporte que aguentasse o peso das cargas.
Como medida governamental foi criado o IOCS em 1909, no decreto de número
7.619, e passando a ser intitulado IFOCS no decreto de n° 13.687, de 1919 (FERREIRA,
1989). Nesse momento a RVC passa a ser subordinada administrativamente a esse órgão
para a construção de enormes barragens, designadas ao abrigo de água para irrigação.
Fundamentava-se que, fazia-se ―necessário dar-se maior liberdade de ação a inspetoria,
quanto a providências relativas ao tráfego necessário as suas atividades na região‖
(FERREIRA,1989, p.65). Manteve-se até 1923 em virtude da finalização da ―caixa
especial das obras de irrigação de terras cultiváveis no nordeste brasileiro‖
(FERREIRA,1989, p.65).
Para o investimento nesse cenário, ingleses seduzidos pelo decreto de 1852, lei de
N° 641 contribuíram notando condições propícias na construção da segunda Estrada de
Ferro no Brasil implantada em 1858, em Pernambuco. Sendo assim, a The Great Western
of Brazil Railway Company (GWBR) realizou essa construção e, na metade do século XX
respondeu por 1,6 mil km o que correspondeu a 30% da malha Nordeste, (CAMARGO,
2015). Acerca da relação ferrovia, seca e mão-de-obra, o historiador Josemir Camilo
(2008) acrescenta:
Essa força de trabalho, descrita pelo autor, funcionava também como controle
social, visto que, acreditava-se que ao estarem trabalhando, as vítimas da seca não
representavam risco à sociedade, e ociosos envolver-se-iam com a bebida e roubo.
Chalhoub (2008, p. 70) apresenta-nos que ―o trabalho é o elemento ordenador da
sociedade, a sua lei suprema, o cidadão recebe tudo do estado, pois garante segurança, a
liberdade, o trabalho é uma forma de retribuir‖.
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trajeto muito se perdia pelo caminho, além do custo ser caríssimo. De Campina Grande,
onde acabavam os trilhos até o sertão os valores cresciam gradativamente; saindo de Sousa
o valor do transporte era de 22$000 contos de réis, Cajazeiras, 26$000 e, variava conforme
a distância da proximidade dos trilhos. (SOUSA, 2005).
Nos postos da alfândega o recolhimento de impostos era prejudicado, e dessa forma
a província perdia em receita. No sertão comercializava-se com o posto mais próximo;
Sousa, por exemplo, negociava com Mossoró, no Rio Grande do Norte, e o Ceará. Os
lucros que arrecadavam com os produtos eram baixos, enquanto que os atravessadores,
comerciantes e exportadores possuíam mais vantagens. O trem estreitou a distância entre
as localidades, transportou mais cargas a um custo menor e em menos tempo,
consequentemente aumentou a produção tendo em vista a economia feita com o traslado.
Pautado em Melo (2002), as dormentes168 penetram pelo oeste paraibano justificado
pelas obras contra as secas, pela intervenção da Rede Viação Cearense. Iniciado na cidade
de Paiano, município, hoje, de Lavras da Mangabeira, do traçado da linha de Baturité. Os
caminhos de ferro chegaram do Ceará passando pela cidade de Baixio até adentrar, em
1923, a Antenor Navarro, denominada atualmente de São João do Rio do Peixe, sob uma
acirrada disputa política.
A linha estendia-se até Sousa em 1926, e no mesmo ano adentra também a vizinha
cidade de Cajazeiras. Esta era a localidade onde as elites locais, coronéis, não articulavam-
se para ter-se a Maria fumaça, sendo necessário, a intervenção do presidente (na época
Epitácio Pessoa) para que se abrisse um ramal. A respectiva ligação com o restante da
Paraíba até a capital ocorreu paulatinamente. Em 1932 foi para Pombal e em 1944 para a
cidade de Patos e chegou a Campina Grande em 1958. O mapa que segue abaixo, referente
ao ano de 1937 marca em linha vermelha o trecho de Pombal a Patos ainda em construção.
168
Peças de madeira ou ferro colocadas transversalmente à via férrea onde são fixados os trilhos.
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Mapa 2– Relatório da RVC, 1937, com destaque para o percurso de Pombal a Patos em
construção
O trecho mencionado por último teve término pela Rede Ferroviária do Nordeste
169
(RFN) , que a incorporou completando-o. É sabido que, a princípio as linhas férreas no
nosso país tiveram grande incentivo de capital inglês, todavia, as concessões foram
vencendo. Explica-se desse modo que trechos não só no Nordeste foram prolongados por
companhias diferentes, fruto de um processo de encampação até o momento que retorna a
União.
A RFN foi criada com o fim da GWBR, originada em Londres em 1872 para
sedimentar estradas de ferro no Brasil. A Nordeste, como comumente era denominada,
passou a responder pelos ramais da Paraíba, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Alagoas.
Foi durante a jurisdição da RFN, em 1951-1958 que aconteceu o prolongamento do
sertão a Campina Grande-PB, momento também em que a companhia em 1957 foi
incorporada a Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima (RFSSA) (CAMARGO,
2015). Preliminarmente a RFN aproximou a cidade do recife ao São Francisco com parada
169
Disponível em: <http://vfco.brazilia.jor.br/mapas-ferroviarios/1954-RFN-Rede-Ferroviaria-Nordeste-2-
trechos-centrais.shtml>. Acesso em: 05 abril 2015.
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em Sousa, transportando diariamente pessoas e cargas. 170 Criada em 1957 através da lei
3.115, sancionada pelo presidente Juscelino Kubitstcheck, a RFSSA unificou a malha
Nordeste tendo uma extensão de 2.635 quilômetros.
CONCLUSÃO
Percebemos nas linhas traçadas que a aquisição da ferrovia na Paraiba, não foi por
si só, algo simples. Destacamos nisso, que os parlamentares responsáveis para esse feito,
fizeram e desfizeram de seus poderes, ou seja, uns até legitimaram o crescimento
econômico do sertão por meio do algodão, outros, simplesmente maquiaram e inventaram
traçados ―mirabolantes‖.
Para essas invenções tornarem-se reais, o que na verdade versaram, também, sobre
interesses próprios. Imaginemos, o trilho passando na porta de uma produção agrícola? O
quão vantajoso para um coronel.
A seca não representou de todo modo o problema maior como colocado, na
verdade, o latifúndio mal utilizado representou a ―chave‖ de toda a questão. Faltaram
políticas publicas a respeito, um modo de empregar mão-de-obra, bem como,
aproveitamento da terra, mesmo com suas problemáticas.
Aqui buscamos nos enveredar, não propriamente dito pelos caminhos de ferro, mas
julgamos importante compreender como se deu as articulações nesse meio político, para
obtenção de uma ferrovia.
O que observamos na verdade, foi, sobretudo, um jogo de interesses e
aproveitamento das ações momentâneas. E muitas vezes, as pessoas ficaram como
telespectadoras e massa de manobra de interesses, subvertidas ao pouco, que desse, para
sua sobrevivência. As almas, sujeitos a quem nos referimos, não foram salvos, foram
usados. Tentou-se na verdade, solucionar toda a problemática da seca, mas ao mesmo
tempo, usou desta, visto que, essas almas foram flagelados agredidos por longos períodos
de seca.
170
Disponível em: <http://estacoesferroviariaspb.blogspot.com.br/2010_08_01_archive.html>. Acesso em:
05 abril 2015.
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REFERÊNICAS
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MELO, José Octávio de Arruda. História da Paraíba. 19 ed. João Pessoa: A União, 2002.
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QUEIROZ. Rachel de. O Quinze. 44. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1990.
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Acesso em: 11 jun. 2017.
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RESUMO
O presente artigo tem como objeto de estudo a influência de Frei Damião de Bozanno na
candidatura de Fernando Collor de Melo a presidente da república no período de 1989,
levando consigo a ideia de união entre a religião e a política, a exemplo da missa em ação
de graça a vitória de Collor no primeiro turno das eleições de 1989, idealizada por Collor
em Maceió – AL e celebrada pelo frade, o que gerou uma série de discórdias entre o
provincial dos capuchinhos e o Collor, além do discurso em relação a colaboração de Frei
Fernando nos assuntos que envolviam Frei Damião e Collor. Utilizando de páginas dos
jornais do Brasil e Folha de São Paulo, observamos como os mesmos trataram os
acontecimentos desse período, relacionando os dois ícones relatados nesse artigo,
abordando e utilizando das ideias de LIMA (2005) e OLIVEIRA (1997) sobre a política e
religião idealizando a figura de Frei Damião e a política brasileira.
Palavras chaves: devoção, política, influencia e religiosidade.
INTRODUÇÃO
O trabalho que se desenvolve a seguir traz como tìtulo ―Entre o fogo da polìtica e o
altar da religião‖, o fato de se misturar a polìtica com a religião vem do fascìnio de muito
em sempre tentar juntar ambas já que não podem se distinguir a política que em suma e a
ciência ou arte, como alguns chama, de governar um estado ou uma nação tendo por parte
à negociação e a compatibilidade de interesses, nesse sentido a pessoa de Fernando Collor
de Mello se encaixa de forma total, a relação do altar que e a parte central da igreja
católica, ou seja, o pilar e o sentido que sustenta tudo, nessa parte se encaixa a figura do
messias do nordeste, o Frei Damião de Bozzano procurando sempre obter os sentidos que
sempre unem esses dois assuntos em especial a política de Collor e a relação com Frei
Damião de Bozzano no ano de 1989, observando toda a trajetória que Collor passou
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durante toda a sua eleição a presidente da república junto com o seu maior oponente, o
Lula, e como Frei Damião junto com Frei Fernando ajudaram de forma direta e indireta a
essa eleição.
Por muitos séculos a política e a religião precisavam ser dialogadas de forma bem
distintas pelo fato de se tratarem de temas tão polêmicos mais ao mesmo tempo tão
interessantes, porém e possível se dizer que a política e a religião nunca andaram de forma
separada já que na maioria das vezes uma complementa a outra, a exemplo dos antigos
astecas que foi a primeira civilização a povoar a América Central e que tinha o seu poder
politico e religioso centralizado nas mãos de uma única pessoa, fato esse que não se
restringe somente a esse povo mais também a toda idade média que por sua vez tinha o
poder da igreja cada vez mais elevado seguindo sempre junto ao rei que tinha suas ideias
sempre apoiadas pela igreja e vice-versa, partindo para o lado mais atual do século XXI, a
igreja apresenta em sua estrutura que se equipara muito e se apropria da política seja ela
em meio a politicas públicas que favorecem a igreja ou ate mesmo a própria estrutura da
sede da igreja fixada no Vaticano na Itália, possuindo assim suas leis e seu governo próprio
unindo o político e o religioso.
O presente tema do artigo aborda um período bem mais difícil para essa associação,
nesse período mais específico na década de 80, existia uma devoção muito grande em
relação aos andarilhos e supostos messias que rodeavam durante muito tempo as terras do
Brasil, sabendo da grande influência e da capacidade de convencimento da população em
relação a esses religiosos, os políticos em alguns casos se utilizavam desse meio para
garantir o seu apoio político, porém não se pode dizer que todos os devotos do meio
político utilizavam dessas armas, nem que os religiosos concordavam com essas atitudes,
muito menos que a população em seu total apoiavam os que obtinham essas medidas. Em
específico retrataremos nesse artigo a devoção de um católico apostólico romano que ate
mesmo antes de se tronar político, já trazia de suas raízes passada por seus pais uma
devoção a esse ―santo‖ em vida, falaremos de Fernando Collor de Melo e sua devoção e
amizade com o Capuchinho Frei Damião de Bozzano e todo o seu desenrolar em relação a
sua chapa a presidente da república federativa do Brasil no ano de 1989. Más será que
Fernando Collor de Melo utilizou de sua devoção e amizade com o frade para conseguir
gerar através da mídia um sentimento de carinho para com os devotos do frade levando
assim a um favoritismo em relação aos demais candidatos? Ou o político se encontrava
com o mesmo as claras apenas por tamanha devoção herdada de seus pais sem ter em si
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POLÍTICA DE COLLOR
Foi por meio dessas confissões e de todo o seu desenrolar pelo nordeste com suas
missões que Frei Damião de Bozzano começou a chamar atenção dos políticos das várias
regiões, esses mesmos sempre querendo se aproveitar da fama e da atenção que o frei
capuchinho tinha para se promover e promover a sua campanha, porém o frade abominava
qualquer tipo de atitude referente a essas finalidades.
Contudo a vontade do frei não foi seguida pelos políticos, um grande exemplo se
encontra na eleição de 1978 quando o candidato a senador Nilo Coelho, que em 1971
enquanto exercia seu mandato de governador concedeu a Frei Damião de Bozzano a
Medalha Pernambucana do Mérito, utilizou de um truque onde distribuiu milhares de
panfletos a população onde continha uma mensagem de apoio, supostamente escrita pelo
frei, e uma foto dos dois juntos, no panfleto tinha a seguinte frase: ―Com as graças de Deus
e a minha benção: eu recomendo o meu amigo Nilo Coelho para o Senado. Frei Damião.‖
porém o candidato cometeu um erro em colocar a assinatura do frei do mesmo jeito e com
a mesma grafia em que o texto tinha sido escrito apresentando assim a fraude, esse porém
foi um dos poucos exemplos em que os políticos se aproveitavam do frei. Outra figura que
ficou bastante marcada e popular por se utilizar de Frei Damião foi o candidato a
presidente da república no ano de 1989, Fernando Collor de Melo, que não entrou em
contato com a ordem dos frades capuchinhos e mandou celebrar uma missa em ação de
graças na cidade de Maceió e pediu que o Frei Damião fosse o presidente da celebração,
porém conforme o Jornal do Brasil, ate um dia antes da celebração o frade não tinha
confirmado a sua presença na celebração, pelo fato de que o provincial dos capuchinhos no
nordeste, Frei Francisco Barreto, teria desaconselhado o frei a participar da celebração pelo
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fato de temer uma exploração política do ato canônico religioso, porém a congregação de
frades não poderia proibir a sua participação em tal evento por isso foi enviada uma carta
da ordem dos capuchinhos para o frei uma noite antes do dia marcado para a celebração
aconselhando que não fosse, a carta foi entregue pelo seu emissário Frei Valder Oliveira,
que foi ate a cidade de Monteirópolis onde acontecia uma missão de Frei Damião, contudo
só quem poderia dizer de certeza se o frade iria ou não para a celebração era o seu
secretário pessoal Frei Fernando Rossi responsável pelos comunicados e organização das
missões e encontros pessoais do frade, foi colocada todo o peso do envolvimento entre o
frei e o candidato ao seu secretário que teria articulado todo o encontro e a participação na
missa, em relatos do secretário ele afirma que o frade sequer sabia da existência dessa
missa no dia em que a carta havia chegado e que toda e qualquer questão burocrática era de
responsabilidade de seu secretário já que o frei era uma pessoa muito simples e já
carregava em si o peso dos seus 91 anos, que forma inocente foi colocado na televisão em
uma propaganda eleitoral transmitida a todo o Brasil onde Frei Damião aparecia abraçando
o candidato a presidente Fernando Collor de Mello no encontro casual que aconteceu entre
os dois em Juazeiro do Norte – CE, segundo relatos do emissário Frei Valder muitos
quiseram alegar que o capuchinho apoiava a candidatura de Collor de Mello contudo ele
diz que era notório que o abraço entre os dois era meio forçado, não se sabe ao certo se
essa declaração do emissário foi para acabar com só boatos de apoio eleitoral ou se
realmente o frade abraçou o candidato de forma forçada, a não participação de do frei na
missa de ação de graças não era apenas um desejo da ordem dos capuchinhos, mais sim de
toda o clero da arquidiocese de Maceió na pessoal do arcebispo Dom Edvaldo Amaral, a
missa se realizaria as 10 horas do dia 26 de Novembro de 1989 no Conjunto Virgem dos
Pobres que se localizava em uma favela as margens da Lagoa Mundaé, a intenção principal
da missa de ação de graças era agradecer a Deus pela vitória no primeiro turno das eleições
que se realizou no dia 15 de Novembro de 1989, que levou ao candidato a presidente a
seguir para o segundo turno concorrendo com Luiz Inácio Lula da Silva, no segundo turno
das eleições que ocorreu no dia 17 de Dezembro de 1989, Collor vence de Lula
conquistando em todo o Brasil 35.089.998 que corresponde a 53,03% dos votos, contra
31.076.364 que equivale a 46,97% dos votos dando assim a vitória a Collor que foi
vitorioso em 23 estados do Brasil.
Fernando Collor de Mello foi eleito pelo voto popular depois de 25 anos de
Ditadura Militar, sua posse foi realizada no dia 15 de Março de 1990 em uma sessão
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conjunta do Congresso Nacional, onde foi presidida pelo Senador Nelson Carneiro, sendo
assim oficializado o novo Presidente da República Federativa do Brasil, onde governaria
ate o dia 29 de Dezembro de 1992, momentos antes de ser condenado pelo Senado
respondendo ao crime de responsabilidade, perdendo os seus direitos políticos por oito
anos.
No ano da posse de Collor, no mês de Outubro, o atual presidente convidou a Frei
Damião para abençoar o seu gabinete em Brasília – DF, após a benção no gabinete, Collor
colocou em sua mesa uma imagem do frade para sempre recordar da sua força e da sua
ajuda nas eleições do ano passado.
No final do ano de 1990, de forma mais específica no dia 30 de Novembro de
1990, Collor fez um pronunciamento a publico, dizendo que presentearia a Frei Damião
com uma caminhoneta da marca Deserter XK que para a época era um dos veículos
estrelas na modalidade fora de série e que tinha um valor muito elevado, cerca de Cr$ 7,5
Milhões sendo encomendada na revendedora FORD localizada em Recife – PE, a notícia
foi oficializada pelo secretário do frei, Frei Fernando Rossi, que em um sermão celebrado
no Morro da Conceição – Recife – PE, apresentou a novidade a população, a caminhoneta
foi produzida em cor verde e possui todos os tipos de regalias que qualquer motorista
sonhava em ter, desde vidros elétricos, equipamento de som, direção hidráulica ate a sua
mala que tinha capacidade de ate 500 quilos.
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Fernando Collor de Mello recebendo Frei Damião de Bozzano, Frei Fernando e sua
secretaria particular.
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Frei da repercutir uma notícia que levava interesse ao publico também relatou a ajuda que
o presidente da república ofereceu ao frade como uma forma de pagamento pela ajuda que
o frade realizou com ele no período da sua eleição, no decorrer da matéria e apresentado
todas as informações do frade em relação a sua doença e também diz que o mesmo não terá
custo algum em seu tratamento no hospital de São Paulo, e no final da meteria apenas no
último paragrafo vem relatando que Collor carretaria com todas as despesas hospitalares do
frade, porém essa informação não foi passada a publico pelo próprio presidente, mais sim
pelo secretário pessoal de Frei Damião, o Frei Fernando Rossi que a algum tempo antes
teria sido acusado de ser o intermediador entre o frade e o político caindo sobre si a culpa
de Frei Damião ser tão influente e presente na vida política de Collor. Em pesquisa feita
pelo jornal a empresa Líder Táxi Aéreos, que foi o responsável por todo o transporte do
frade, estimou que o contrato feito com a empresa que incluiria o transporte aéreo do
Recife – PE para São Paulo – SP, acompanhamento de médicos, transporte de ambulância e
equipamento de UTI Móvel, teria custado em total cerca de Cr$ 3.272.500,00 que segundo
a matéria teria sido paga pelo presidente da república Fernando Collor de Melo.
Conforme o tempo foi se passando as doenças que acometiam o frade foi se
desenvolvendo e piorando, o que levaria em 31 de Maio de 1997 a morte do frade, no
Hospital Português na cidade de Recife – PE, o corpo do frade parte então para ser
embalsamado e seguiria para o velório, naquela mesma noite, as 21:30 horas uma
celebração particular, apenas para os membros do clero, foi celebrada na Basílica da Penha,
em sufrágio da alma do missionário.
O Jornal Folha de São Paulo emitiu uma notícia no dia 5 de Junho de 1997, alguns
dias após o enterro do frade, relatando um problema que aconteceu no dia 1 de junho de
1997 dia do seu enterro, o fato foi que o ex presidente da república e amigo de Frei
Damião, Fernando Collor de Melo teria sido proibido de participar da cerimonia fúnebre
do frade, noticia essa que teria sido publicada e interpretada pelo jornal como negativa para
a pessoa de Collor, o que não foi, ou pelo menos acredita-se que não, a intenção dos frades
capuchinhos em proibir a presença de Collor de forma específica na cerimonia do frade. O
fato foi de o superior Provincial da Ordem dos Capuchinhos no Nordeste havia emitido
uma nota oficial delegando que só poderiam participar de forma oficial e mais precisa da
celebração do frade, já que a cerimonia foi aberta ao publico, os religiosos e autoridades
constituídas em dignidade e saber que se restringiria ao representante do presidente da
república o vice-presidente Marcos Maciel, o governador do estado do Pernambuco Miguel
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Arrares e o prefeito de Recife Roberto Magalhães, com isso, Collor sendo ex presidente da
república e estando assim desligados de suas atividades políticas federais não entraria
nesses critérios apresentados pelo superior, Collor foi informado dessa decisão enquanto se
encontrava no aeroporto de Guararapes onde foi informado pelo ex senador Ney
Maranhão. O decreto oficial foi revogado pelo Frei Fernando Rossi, que mais uma vez
conseguia ultrapassar uma ordem de cima para favorecer a Collor, conseguiu fazer com
que Collor fosse ao enterro onde por próprios relatos do ex presidente, lembrou de vários
momentos que viveu com o frade, ao chegar no local onde o corpo estava sendo velado,
Collor foi aclamado pelo povo que gritava incessantemente o seu nome de forma livre,
assim relata o jornal, Collor entendeu a aclamação como uma forma de incentivo e força
para continuar o seu trabalho conforme ele mesmo disse: ―Isso dai-me forças para
enfrentar os obstáculos que tenho enfrentado.‖ e disse que tudo o que ocorreu desda sua
proibição em participar do funeral e a sua autorização foi obra de Frei Damião pois o jornal
também faz outra citação que Collor fez ao chegar no aeroporto de Recife as oito da manhã
junto com a sua esposa Rosane ―O que me trouxe aqui foi Frei Damião. Não vou falar de
polìtica.‖ Marco Maciel, Airres e Magalhães não compareceram ao enterro por medo de
serem acusados de misturar política com a religião sendo assim quem ocupou a cadeira da
tribuna foi Fernando Collor de Mello que foi saldado pelos presentes em cerca de 18 vezes.
CONCLUSÃO
Fernando Collor de Mello se utilizou das duas facetas da política para conseguir
unir-se com a religião, utilizou tudo o que viveu e aprendeu durante a sua vida, aproveitou
a influência católica herdada da sua família para desde cedo conseguir se fixar com bases
políticas, desde cedo Collor queria seguir os passos do seu pai que sempre foi político, com
isso sempre foi conhecido e obteve o carisma do povo desde cedo, porém ele precisava se
garantir, precisava de um ato que trouxesse os votos do povo de uma forma para ele ser
visto e amado, com isso se utilizou da figura de Frei Damião para garantir seus votos no
território nordestino, tinha um grande aliado que ajudou a sempre convencer o frade e a
colocar a sua vontade de acordo com a vontade do Frei, o secretário pessoal do Frei, o Frei
Fernando Rossi que sempre foi próximo de Collor fazendo assim as vontades do mesmo, o
que deixa a entender que Collor se utilizou da influência do Frei junto com a sua cultura
religiosa para garantir a sua vitória em urnas nordestinas e de todo o Brasil já que o Frei
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REFÊRENCIAS
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2005.
454
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo apresentar reflexões sobre a utilização do conceito
de cultura política, em especial a chamada cultura política brasileira, para a pesquisa sobre
a Aliança Renovadora Nacional (ARENA) na Paraíba. A ARENA foi o partido que
integrou o bipartidarismo formulado pela ditadura militar, desempenhando a função de
apoiadora do regime no parlamento. A cultura política brasileira, por sua vez, pode ser
entendida como um conjunto de valores, representações e condutas políticas,
majoritariamente conservadoras e elitistas, que caracterizaram o Estado nacional ao longo
da história. Dessa forma, este conceito serve para entender o regime militar e seus
elementos paradoxais, ajudando a elaborar questões complexas, proporcionado ao
historiador se esquivar de visões simplistas sobre o período.
Palavras-chave: ARENA; Paraíba; Cultura política brasileira.
INTRODUÇÃO
As linhas que seguem são uma tentativa de reflexão que busco desenvolver ao
longo de pesquisa acadêmica, no intuito de aperfeiçoar a utilização do conceito de cultura
política na análise do objeto de estudo selecionado, a Aliança Renovadora Nacional
(ARENA). Este foi um partido político criado pela ditadura militar instaurada após o golpe
de Estado dado no Brasil no ano de 1964. O marco inicial de sua existência foi o Ato
Institucional nº 2 (AI-2) de 1966, um decreto que extinguiu as antigas legendas partidárias
existentes no país desde 1945 e instaurou um sistema bipartidário composto pela ARENA,
encarregada de dar sustentação política ao regime autoritário e pelo Movimento
Democrático Brasileiro (MDB), que desempenharia a função de oposição consentida e
controlada pela ditadura.
Esta é uma pesquisa que vem sendo realizada desde a graduação, em projeto de
iniciação científica, o qual buscou-se analisar a atuação dos parlamentares e partidos
políticos na implementação da ditadura militar no estado da Paraíba. Sucessivamente, em
dissertação de mestrado, verticalizou-se a temática da pesquisa, dando foco à ARENA e
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tendo como recortes espacial e temporal a Paraíba e os anos de 1966 a 1969. No atual
estágio da pesquisa, o doutoramento, continuamos com o mesmo objeto e recorte espacial,
porém foi selecionado como recorte temporal os anos de 1970 a 1979, ano em que há a
extinção da ARENA junto ao sistema bipartidário brasileiro.
Ao longo dessa trajetória acadêmica, algumas leituras fizeram perceber que a
análise de uma organização partidária não pode se limitar à determinados aspectos ou ficar
presa ao campo disciplinar da História. Ao me inserir no campo da história política,
compartilho da constatação de Ângela de Castro Gomes (1996), de que o historiador deve
realizar uma ―dupla formação‖, ou seja, acompanhar a renovação de métodos e conceitos
de pesquisa desenvolvidos por outras disciplinas, especialmente a Ciência Política. Sobre
as organizações partidárias, o cientista político Ângelo Panebianco (2005) desenvolveu
renovadora metodologia sobre a temática. Em sua abordagem, os partidos políticos,
enquanto organizações complexas, não podem ser vistos desconectados da realidade na
qual estão inseridos. Para ele, o pesquisador deve pensa-los a partir de sua história, como
organizações em movimento, influenciados por possíveis mudanças em seu ambiente
externo, evoluindo ou modificando-se para manter sua estabilidade. Olhando nessa
direção, um conceito que pode ajudar nesta pesquisa é o de cultura política, o qual tem sido
sistematicamente discutido por disciplinas como a Antropologia, a Ciência Política e mais
recentemente pela História.
Dessa forma, esse texto se propõe a discutir o conceito de cultura política,
elencando a categoria de cultura política brasileira como diretriz para pensar a pesquisa da
ARENA na Paraíba. Num primeiro momento será trabalhado a forma como o conceito foi
apropriado pela historiografia e quais são as interpretações elaboradas para a cultura
política brasileira. Posteriormente, será abordado como e quais as interpretações dessa
categoria podem ser utilizadas na pesquisa em desenvolvimento.
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acadêmicas, sendo criadas linhas de pesquisa para sua abordagem. No entanto, sua
utilização é mais longeva e precisa ser apresentada. Pode nos ajudar para a realização de tal
tarefa o historiador Rodrigo Patto Sá Motta (2009), que tem desenvolvido pesquisas sobre
o tema e buscou interpretar o conceito para o campo da História. Segundo ele, o conceito
de cultura política foi primeiramente utilizado no início do século XX, pelo intelectual da
política Alexis de Tocqueville. Novas contribuições significativas só tornaram a acontecer
na década de 1960, com os cientistas políticos Grabriel Almond e Sidney Verba. De acordo
com Motta, a discussão da cultura política feita por eles era um reflexo da conjuntura
histórica em que se inseriam, utilizando o conceito para entender o surgimento de regimes
autoritários, como o soviético, e fortalecer a ideia da democracia vivida nos Estados
Unidos. Almond e Verba criaram um entendimento da cultura política de maneira simplista
e hierarquizante171. No entanto, ao longo dos anos, novas interpretações do conceito
surgiram e outras disciplinas passaram a utiliza-lo para trabalhar seus objetos de pesquisa.
Especificamente na pesquisa histórica, Motta aponta que o primeiro trabalho a
utilizar o conceito foi o do norte-americano Bernad Baylin na década de 1960, em
trabalhos que sofreram forte influência da interpretação de Almond e Verba. No entanto,
foi com o movimento de retorno da história política encabeçado pela historiografia
francesa, que o conceito ganhou novos ares dentro da disciplina 172. Liderados por René
Rémond (2003), que teve como marco o livro Por uma história política, um grupo de
historiadores da política buscaram mapear novos temas e repensar abordagens teóricas e
metodológicas para velhos objetos de estudo do político. Apesar de não ter um capítulo
específico para a cultura política nesse livro, o conceito perpassa como chave interpretativa
em toda a obra.
Posteriormente, um historiador ligado a esse grupo, Serge Berstein (1998), buscou
sistematizar o conceito para o uso por historiadores. No seu entendimento, a cultura
política deve ser vista de forma plural, afastando qualquer tentativa de hierarquização,
mesmo se alguma cultura política assumir predominância sobre as demais, e deve ser
171
Na tipologia elaborada por Almond e Verba existe três tipos de cultura política: paroquial, de sujeição e a
participativa. A última correspondia ao estágio mais avançado do conceito, meta a ser alcançada pelas
demais, representada pela democracia dos Estados Unidos.
172
A negação da política dentro da História e seu afastamento das pesquisas históricas ocorreu a partir do
movimento de historiadores franceses, os Annales. No entanto, esse ostracismo da história política é um
fenômeno da historiografia francesa e, visto que nosso país sofre significativa influencia intelectual da
França, no Brasil a política também passou um tempo afastada das pesquisas históricas. Logo, vale ressalvar
que em outros espaços, a política continuou a ter campo, bem como há reflexões sobre esse hiato dentro da
própria historiografia francesa. Nesse sentido vale a indicação dos textos de José d‘Assunção Barros (2012) e
Jacques Le Goff (1983).
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173
Alguns pontos apontados pelo autor que distinguem o regime militar brasileiro dos demais: 1) projeto
econômico nacional-desenvolvimentista; 2) manutenção do funcionamento (embora de modo precário) das
instituições liberais; 3) menor número de mortes e desaparecimentos provocados pela repressão política; 4)
elevada taxa de absolvições nos julgamentos de crimes políticos; 4) maior tolerância com os valores culturais
da esquerda (que continuavam a circular durante a ditadura).
174
Ao descrever a cultura política comunista no Brasil, Motta (2013b) relata que esta compartilhou
caracterìsticas da ―cultura polìtica brasileira‖, como a tendência à negociação de conflitos, expressa nos
acordos feitos com partidos de ideologias distintas, e o personalismo, ilustrado nas figuras de líderes
carismáticos.
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Visto que essa é a primeira reflexão elaborada sobre essa utilização do conceito de
cultura política brasileira e a pesquisa sobre a ARENA na Paraíba, além do fato de a
pesquisa nas fontes primárias ainda está em sua fase inicial, os apontamentos realizados
abaixo são baseados no projeto de doutorado produzido para a disciplina de Seminário de
Dissertação do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Minas
Gerais (PPGHIS-UFMG) do qual sou vinculado.
O objetivo principal da tese descrito no projeto é entender como as oligarquias
locais agiram politicamente na ditadura através da atuação da ARENA-PB na década de
1970, e a partir disso, compreender a associação entre poder local e regime autoritário,
pensando a relação entre os planos regional e o nacional. Vale ressaltar que no período
abordado, o país e, mais especificamente, a Paraíba passavam por um período de
modernização176 implementado pelo regime autoritário. É notório a percepção desse
projeto modernizador no estado, especialmente em obras de infraestrutura. No entanto,
esse ímpeto modernizador aparentemente limitava-se às obras de concreto armado, pois
uando olhamos para as práticas políticas nesse período, percebe-se a continuidade de uma
série de práticas e representações políticas remetentes de antes da formação do Estado
brasileiro, sobrevivente aos eventos marcantes e possíveis rupturas na história do país.
Além disso, o próprio modelo de regime autoritário, apesar de implementar uma série de
mudanças no sistema político177, deu condições para a permanência e até mesmo
176
Para Bresser-Pereira (2015), este foi um pacto desenvolvimentista semelhante ao elaborado por Getúlio
Vargas, diferenciando-se pela exclusão da classe trabalhadora do projeto político. Nele engajaram-se os
golpistas reunidos em 1964, tendo como principal força o chamado ―tripé modernizante‖: burguesia, tecno-
burocracia e interesses estrangeiros, harmonizando tendências liberais, nacionalistas e anticomunistas. Para
Motta (2014), as experiências de modernização autoritária/conservadora fazem parte da ―cultura polìtica
brasileira‖, um ato de promover o novo negociando com o velho.
177
As mudanças no sistema político implementadas pela ditadura militar tinham como objetivo aumentar o
poder do governo federal e, ao mesmo tempo, dava margem para a participação dos setores civis que
participaram da empreitada golpista junto aos militares em 1964. Dessa forma, o regime: implementou
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eleições indiretas para os principais cargos da República (presidente, governador e prefeito das capitais e
cidades consideradas Zonas de Segurança Nacional), porém manteve eleições diretas para os demais cargos;
extinguiu as antigas legendas partidárias, mas criou um sistema bipartidário que comportava, inclusive, um
partido de oposição; manteve o Congresso Nacional e o poder Judiciário funcionando, mas com suas
prerrogativas reduzidas; bem como acabou com a Constituição em vigor e instaurou nova carta contendo
todas as mudanças implementadas desde o golpe de 1964.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nesse espaço, relembro que essa é uma empreitada ainda em fase inicial, com isso
esse texto tem mais características informativas e descritivas e menos reflexivas e
problematizadoras. O exercício de levar para eventos acadêmicos essas ideias da pesquisa
serve para levar aos pares nossas pesquisas no intuito de absorver todas os possíveis
apontamentos e indicações, bem como indicar aos demais pesquisadores caminhos que
podem ser seguidos a partir de nosso trabalho acadêmico.
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178
Ver ALBUQUERQUE JR., Durval Muniz. Palavras que calcinam, palavras que dominam: A invenção da
seca no Nordeste. Revista Brasileira de História. São Paulo: Marco Zero, vol. 14, nº28, 1994.
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na pecuária, o que permitia uma certa mobilidade da produção durante as secas‖ (NEVES,
2004).
Nos primórdios da colonização, apesar das dificuldades, a irregularidade de chuvas
não era usada para justificar as mazelas dessa região. Os colonizadores, mesmo assim,
buscaram se adaptar a esse território.
Com a exploração da terra, desmatada para obter maior produção, sobretudo da
cana-de-açúcar, começavam as acusações destinadas ao clima semiárido devido as perdas
da produção. Ainda sem muito impacto, essas reclamações não eram levadas ao governo
provinciano, muito menos ao império, eram reclamações de âmbito local, não havendo
ainda tanto alarde. Era comum nesse período a migração temporária dos pequenos
agricultores para terras mais férteis de seus patrões, mantendo relações paternalistas com
os mesmos. Estas relações acabavam por sustentar cada vez mais aspectos de subserviência
dos trabalhadores em relação aos proprietários das terras. De acordo com Frederico de
Castro Neves
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Em meados do século XIX, não tendo mais a possibilidade de migração para terras
mais férteis, outrora morada temporária dos trabalhadores rurais que mantinham relações
de apadrinhamento com os proprietários das terras, em períodos de estiagem, devido a
produção em alta escala do algodão, impossibilitando a cultura de subsistência e
manutenção dessas famílias em tais propriedades, os camponeses, agora retirantes,
buscavam alternativas nas cidades.
Essa efervescência do desenvolvimento urbano nas cidades brasileiras, aqui
especificamente, na capital do Estado do Ceará, Fortaleza, se deu principalmente na virada
do século XIX para o XX. O desenvolvimento moderno em Fortaleza tem íntima ligação
com o período de regulares chuvas entre os anos de 1845 e 1877, até então, a seca de
1877/1879, vem sendo colocada como marco na construção desse imaginário da seca como
problema e principal fator de atraso e subdesenvolvimento desta região. No entender do
historiador Durval Muniz de Albuquerque Júnior, a vasta literatura que trata sobre a
temática da seca, percebe esta como um fenômeno natural, ainda que possua repercussões
sociais, políticas e econômicas. O autor atenta para o fato de que a seca é um produto
histórico de práticas e discursos, ―um objeto ‗imagético-discursivo‘, cujas imagens e
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significações variam ao longo do tempo e conforme o embate de forças que a toma como
objeto de saber‖ (ALBUQUERQUE Júnior, 1994).
Tendo essa percepção da seca como problema de repercussão nacional a partir de
1877, faz-se necessário desnaturalizar este fenômeno, colocando-o como estratégia política
na tentativa de sensibilizar o Estado e a nação em relação aos males causados pela
estiagem. Esse objeto de discurso viabiliza e legitima um determinado saber que leva a
aceitação atravessando todo corpo social. Produz verdade. De acordo com Michel Foucault
A verdade é deste mundo; ela é produzida nele graças a múltiplas coerções e nele
produz efeitos regulamentados de poder. Cada sociedade tem seu regime de
verdade, sua ―polìtica geral‖ de verdade: isto é os tipos de discurso que ela
acolhe e faz funcionar como verdadeiros; os mecanismos e as instâncias que
permitem distinguir os enunciados verdadeiros dos falsos, a maneira como
sanciona uns e outros; as técnicas e os procedimentos que são valorizados para a
obtenção da verdade; o estatuto daqueles que tem o encargo de dizer o que
funciona como verdadeiro (FOUCAULT, 2007. p. 12).
A ―grande‖ seca de 1877, como ficou conhecida, é posta como marco na história do
Ceará. A migração de inúmeros camponeses para a capital do Estado, caminhando longas
léguas, com a esperança de encontrar a caridade que antes era ―função‖ das relações
paternalistas, mas que agora, nem mesmo os antigos ou ainda proprietários de terras
possuem recursos suficientes para manter aquele tipo de relação, ao contrário, alguns
fazendeiros estavam endividados, devendo aos comerciantes, principalmente da capital.
Neves afirma que
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Todos os dias, como coloca Neves, eram noticiados nos jornais locais a chegada de
milhares de retirantes à capital do Estado cearense. O jornal O Cearense, na edição de 29
de abril de 1877 noticia
Não há dia no qual as portas das Igrejas e edifícios públicos não estejam
etopetados por mendigos de todas as idades. Esse espetáculo é deponente contra
os nossos costumes, além de ser, a maior parte das vezes, imoral e repugnante.
(O Cearense apud OLIVENOR, 66. p. 2002).
Além das páginas de jornais, a seca de 1877 também foi temática de romances
como por exemplo A Fome de Rodolfo Teófilo, no qual o autor inicia sua obra dizendo
O mês de dezembro é sempre quente nas províncias do Brasil mais próximas do
equador. Mesmo no litoral, que é bafejado pelas brisas do mar, os dias são
calmosos, a temperatura, à sombra, chega às vezes, a 33º centígrados. Foi na
tarde de um desses dias, no ano de 1877, o ano da fome, que na Jacarencanga,
um dos arrabaldes de Fortaleza, arranchava-se à sombra de um cajueiro uma
família de retirantes, que, depois, das torturas de uma viagem de cem léguas,
vinham aumentar a onda de famintos (TEÓFILO, 1979. p. 4).
Não! Você não me impediu de ser feliz! Nunca, jamais bateu a porta em meu nariz!
Ninguém é gente!
Nordeste é uma ficção!
Nordeste nunca houve!
Não! Eu não sou do lugar dos esquecidos!
Não sou da nação dos condenados!
Não sou do sertão dos ofendidos!
Você sabe bem: conheço o meu lugar!
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
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Percebe-se, com a citação acima, que durante a segunda metade do século XIX, as
novas ideias advindas da Europa, tem um amplo apoio de intelectuais, escritores, políticos,
enfim, que fazem disseminar todo esse discurso da modernidade em meios diversos para
obter aceitação coletiva da sociedade. Todo esse discurso em torno do novo e do moderno,
traz consigo um aparato de saber científico que cria verdades e exerce poder sobre os
demais, ―uma espécie de pressão e poder de coerção sobre outros discursos‖
(FOUCAULT, 2012. p. 17). Essa produção imagética que buscou fabricar uma nova
sociedade e uma nova mentalidade, encontrou no final do século XIX o período mais
propício para as transformações que se queria efetivar.
Desse modo, as mudanças acontecem. O novo substitui o velho. As ruas tornam- se
mais largas, há passeios públicos, edifícios, praças arborizadas, enfim, equipamentos
modernos moldam uma nova cidade e pensamentos modernos criam uma nova civilização.
O discurso modelador, disciplinar, fabricador de boas condutas e de uma civilização
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Sim, havia fome, doenças e muitas mortes, porém, esse saber era utilizado como
estratégia por parte dos representantes governamentais, da elite burguesa e intelectuais,
para adquirir verba e assistência, justificada a partir das agruras ocasionadas pela seca. No
entanto, esses recursos eram empregados no aformoseamento da capital cearense e
474
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
As cobranças feitas pela elite local, governantes e alguns intelectuais, tinham como
propósito manter a estrutura econômica e política. Os usos sobre os recursos que eram
destinados para resolver, ou mesmo diminuir, o sofrimento daqueles que de fato foram
prejudicados com danos e perdas de suas terras e foram obrigados a migrar, tiveram outra
função.
O Estado tinha a responsabilidade de socorrer a população emergente. O Império
destinava recursos para as províncias e estas, por sua vez, repassavam para os municípios.
No entanto, os fins para que foram estabelecidos tais recursos foram outros. A elite local,
justificando que era um erro dar esmolas, pois esta prática levava a ociosidade e
improdutividade daqueles, defendiam outras práticas e destino diferente aos recursos
imperiais, algo que desse retorno à sociedade.
Ora, a elite local não queria perder as relações de dependência arraigadas ainda na
estrutura clientelista, por outro lado, se queria disciplinar e controlar estes que
atormentavam a ordem pública, além do que, não poderia perder a oportunidade de
desenvolver a cidade, já que em períodos normais seria difícil arrecadar verbas para o
progresso desta região. O jornal O Retirante de 28 de outubro de 1877, citado em José
Olivenor, nos traz referências a como os periódicos da época apoiavam estas práticas de
benevolência dos estadistas, que utilizavam os recursos destinados aos ―flagelados da
seca‖, de forma produtiva para a sociedade, dando empregos sistemáticos e temporários
aos retirantes que se encontravam em frentes de trabalho
Com efeito, S. Excelência deixa a presidência depois de ter esbanjado mais de
setecentos contos de réis da verba de socorros públicos, sem ter conseguido
socorrer senão as comissões, os comissionados, as subcomissionadas e
protegidas. Em toda a Província não existe um só celeiro onde a indigência
mitigue a fome um dia se quer. Em compensação fica muita casa-farta, muita
grimpa erguida, com os despojos da miséria! (...) As obras públicas iniciadas
para dar trabalho a indigência foi, sem dúvida, uma ideia de S. Excelência capaz
de resultados fecundos: mas S. Excelência viu de braços cruzados, os
especuladores retalharem essa ideia generosa em seu proveito, se assim
podemos nos exprimir, sem ter a energia de embargar-lhes os passos. (O
RETIRANTE apud OLIVENOR, 2002. p. 62).
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Diante do exposto, podemos dizer também que a seca ajudou, a partir do discurso
que imprimiram sobre ela e das práticas que puseram a cabo com a verba destinada para
diminuir seu impacto, o desenvolvimento da cidade de Fortaleza, tornando-a uma cidade
modernizada.
Outro aspecto que aqui deve ser explorado, é o lado pedagógico das frentes de
trabalho. Controle social, disciplina, romper com a ociosidade e vícios da população
emergente e desenvolver o progresso, enfim, o ―trabalho dignifica o homem‖, dá-lhe
utilidade. Assim, ao invés de esmolar, a elite local manipula os recursos repassados pelo
Império, dando-lhes outro destino, ao mesmo tempo que mantém as antigas relações
patronais. Desse modo, Olivenor afirma
Portanto, fosse como medida de mero combate à seca, como necessidade de
disciplina social, ou mesmo como ideal de progresso material para a província,
pode-se dizer que a política assistencialista do Estado imperial, que assegurava a
todo brasileiro o direito de receber socorro em caso de calamidade pública, foi
rapidamente transformada pelas elites locais num instrumento de coerção ao
trabalho (Ibid. p. 64).
Tendo o apoio de boa parte dos citadinos e dos meios de comunicação da época –
todos temendo a mendicidade e com o pensamento no progresso –, esse propósito de retirar
das ruas de Fortaleza, corpos inúteis e improdutivos para o trabalho em prol do
desenvolvimento da cidade, deu um caráter de utilidade aos recursos adquiridos pelo
governo imperial, que ao invés de simplesmente esmolar os retirantes, incentivando a
ociosidade, preguiça e vadiagem, unia o útil ao agradável, trabalho e progresso, o que
poderia ser, também, ordem e progresso.
Os trabalhos eram diversos, desde que colaborassem em dois sentidos: 1) diminuir
o fluxo de pessoas ociosas em Fortaleza; 2) modernizar e civilizar a capital. Nesse sentido,
alguns dos trabalhos, como por exemplo, o aumento da estrada de ferro de Baturité,
englobava esses dois aspectos mais gerais. Ao mesmo tempo que levava à estrada de ferro
para novos caminhos, facilitando o transporte de pessoas e mercadorias, desse modo,
dando maior dinamicidade ao comércio, ao mesmo tempo que poderia levar o progresso
para outras cidades do interior do Estado, além, de fazer com que alguns desses
trabalhadores ficassem fora da capital, uma vez que esse tipo de trabalho lhes enviava para
outras localidades.
Outros trabalhos objetivavam manter a população nos seus próprios municípios,
fazendo com que o governo provincial criasse comissões de socorros, assim, boa parte da
população que migraria, trabalhavam em obras públicas de embelezamento, reformas,
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
estradas, açudes, enfim, evitando que mais retirantes chegassem à Fortaleza. De acordo
com Foucault
O momento histórico das disciplinas é o momento em que nasce uma arte do
corpo humano, que visa não unicamente o aumento de suas habilidades, nem
tampouco aprofundar sua sujeição, mas a formação de uma relação que no
mesmo mecanismo o torna tanto mais obediente quanto é mais útil, e
inversamente. Forma-se então uma política das coerções que são um trabalho
sobre o corpo, uma manipulação calculada de seus elementos, de seus gestos, de
seus comportamentos. O corpo humano entra numa maquinaria de poder que o
esquadrinha, o desarticula e o recompõe. Uma ―anatomia polìtica‖, que é
também igualmente uma ―mecânica do poder‖, está nascendo; ela define como
se pode ter domínio sobre o corpo dos outros, não simplesmente para que façam
o que se quer, mas para que operem como se quer, com as técnicas, segundo a
rapidez e a eficácia que se determina. A disciplina fabrica assim corpos
submissos e exercitados, corpos ―dóceis‖ (FOUCAULT, 2013. p. 133).
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Desse modo, vemos que diversas estratégias foram criadas para garantir a
modernização da cidade, assegurar o projeto civilizador sobre a população, controlando,
disciplinando e remodelando a mesma. Era necessário manter a cidade limpa, diminuir o
fluxo de pessoas indesejáveis, tentando remodelá-las, reprimindo aspectos transgressores,
utilizando sempre o saber científico, evolucionista, dando credibilidade ao discurso
eugenista e criando vários meios de disseminação desse discurso.
REFERÊNCIAS
179
Ver ALBUQUERQUE FILHO, Ronald de Figueiredo e. Cidade, seca e campo de concentração: o início
da modernização em Crato, Ceará (1900 - 1933). 2015. 132 f. Dissertação (mestrado em história) –
Universidade Federal de Campina Grande. Campina Grande, Abril, 2015.
478
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ALBUQUERQUE JR., Durval Muniz de. A invenção do Nordeste e outras artes. 5ª ed.,
São Paulo: Cortez, 2011.
Palavras que calcinam, palavras que dominam: A invenção da seca no
Nordeste. Revista Brasileira de História. São Paulo: Marco Zero, vol. 14, nº28, 1994.
MENEZES, Edith Oliveira de; MORAIS, José Micaelson Lacerda. Seca no nordeste:
desafios e soluções. São Paulo: Atual, 2002.
NEVES, Frederico de Castro. Getúlio e a seca: políticas emergenciais na era Vargas. In.:
Revista brasileira de história, vol. 21, nº 40. São Paulo, 2001.
. A seca na história do Ceará. SOUZA, Simone de (Orgs.). Uma nova
história do Ceará. 3ª. ed., Fortaleza: Demócritos Rocha, 2004.
. A seca e a cidade: a formação da pobreza urbana em Fortaleza (1880-
1900). SOUZA, Simone de e NEVES, Frederico de Castro (Orgs.). Seca. Fortaleza:
Demócrito Rocha, 2002.
Curral do Bárbaros: os campos de concentração no Ceará (1915 e 1932).
In.: Revista brasileira de história, vol. 15, nº 29. São Paulo, 1995.
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RESUMO
O objetivo deste trabalho está pautado na busca para compreender em que medida os
elementos étnico-raciais, sobretudo no tocante à identidade e as africanidades, marcam
as práticas que constituem as singularidades da cultura romeira no Cariri cearense. A
metodologia de levantamento de dados tomou como base a aplicação de questionários
semiestruturados e entrevistas resultantes da pesquisa homônima, em andamento desde
maio de 2016. Trata-se de uma pesquisa ancorada teoricamente em referências dos
estudos pós-coloniais, cuja metodologia transita entre a pesquisa social e histórica, com
enfoques e acento no aspecto cultural e étnico.
Palavras-chave: Religiosidade; Identidade étnico-racial; Africanidade.
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INTRODUÇÃO
180
Sobre o processo de colonização do Cariri ver: ARAÚJO, (Pe.) Antônio Gomes de. O povoamento do
Cariri. Crato (CE), Faculdade de Filosofia do Crato, 1973. (Estudos e Pesquisas, VI). MACEDO,
Joaryvar. Povoamento e povoadores do Cariri Cearense. Fortaleza, SECULT, 1985. PINHEIRO, Irineu.
Efemérides do Cariri. Fortaleza, 1963. O Cariri: seu descobrimento, povoamento, costumes. Fortaleza,
1950. O Cariri: seu descobrimento, povoamento, costumes. Fortaleza, 1950.
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184
Aprovada no Edital FUNCAP N° 09/2015-BPI.
185
Os colaboradores dessa pesquisa, são os professores doutores: Cícera Nunes/DE Urca, Darlan Reis
Junior/DH Urca e Nirlene Nepomuceno/CECAFRO/Puc SP.
186
Dados extraídos dos registros oficiais da Basílica Santuário Nossa Senhora das Dores, que podem ser
encontrados, também, através do link: http://maedasdoresjuazeiro.com/basilica/romarias
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187
Em relação ao cálculo da amostra estamos utilizando os dados do contingente das pessoas que
frequentam as romarias, coletados pela Sala de informação do romeiro, juazeiro do Norte. E como
referência, os dados mais recentes que são os de 2015. Segundo os referidos dados, na romaria de
setembro de 2015, solicitaram registro 39.487 (trinta e nove mil, quatrocentos e oitenta e sete)
romeiros. Os dados contam com margem de 90% de confiança.
485
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Neste sentido, podemos dizer que a maioria dos interlocutores estão inseridos num
mesmo grande grupo étnico.
Em julho da ano de 2017, durante a Romaria de Morte/‖Passagem‖ do Padre
Cícero, 221 romeiros foram entrevistados. Dentre estes, 185 afirmam perceber a
presença de pessoas negras na sociedade ao seu entorno; 147 responderam ―sim‖
quando indagados sobre a presença de pessoas negras na família; 30 pessoas se
autodeclaram negras e 114 pardas. Nos chama a atenção o fato de que 11 pessoas
relataram que já se sentiram incomodados pela sua cor (autodeclarados pretos e pardos).
Do total de entrevistados nesta romaria, 38 pessoas perceberam ou vivenciaram
situações discriminatórias em relação à cor da pele (negra) em Juazeiro do Norte,
durante as romarias. Um dos interlocutores nos conta: ―Um dia fui comprar um relógio
para minha esposa no centro de Juazeiro. Olhei na vitrine, namorei com ele, mas não
me atenderam. Eu reclamei com gerente, disse com minha língua grande: Essa loja não
atende negro!”188. Entre os 221 interlocutores, 17 afirmaram já terem vivenciado
188
Trecho da entrevista cedido por interlocutor durante a aplicação de questionários realizada na Romaria
de Morte do Pe. Cícero de 2017, em Juazeiro do Norte. A entrevista integra o banco de dados da pesquisa
―A COR DA DEVOÇÃO: Africanidade e Religiosidade na cultura romeira no Cariri contemporâneo‖. O
nome do interlocutor foi preservado, como acordado durante o momento da entrevista.
486
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Em Setembro de 2017, durante a romaria de Nossa Senhora das Dores, nosso foco
metodológico diferenciou-se da proposta de aplicação de questionários do ano anterior:
nos interessou, no momento, a busca de registrar relatos audiovisuais dos devotos a
partir de questões voltadas para as percepções e experiências do racismo e o trânsito e
configurações da religiosidade partindo das romarias para a experiência pessoal dos
189
Trecho da entrevista cedido por interlocutora durante a aplicação de questionários realizada na
Romaria de Morte do Pe. Cícero de 2017, em Juazeiro do Norte. A entrevista integra o banco de dados da
pesquisa ―A COR DA DEVOÇÃO: Africanidade e Religiosidade na cultura romeira no Cariri
contemporâneo‖. O nome da interlocutora foi preservado, como acordado durante o momento da
entrevista.
487
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interlocutores. Para tanto, elaboramos um roteiro de entrevista que parte das seguintes
indagações:
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Dialogar sobre tais questões não foi uma tarefa fácil, da primeira à última
entrevista, pois é preciso pensar na delicadeza que envolve abordar questões que
permeiam o pertencimento étnico-racial e a religiosidade de matriz africana cientes de
todos os estigmas e processos de despistes que esta carrega em sua formação histórica
na sociedade brasileira; como nos indica Sodré,
a formação da sociedade brasileira, iniciada no século XVI, foi um
processo de agrupamento, num vasto território a se conquistar, de
elementos americanos (indígenas), europeus (os colonizadores
portugueses) e africanos (escravos negros, trazidos principalmente da
Costa Ocidental da África. No mesmo campo ideológico cristão do
colonizador, fixaram-se as organizações hierárquicas, formas
religiosas, concepções estéticas, relações míticas, música, costumes,
ritos, característicos dos diversos grupos negros. (Sodré, 2005, p. 90)
Depois de cinco dias de intenso fluxo e ritmo de romaria e de pouco mais de vinte
entrevistas, já quase vencidas pelo cansaço, entrevistamos uma interlocutora em
atividade, que para nós, sintetiza em seus relatos o objetivo central da pesquisa em
relação à busca de perceber as africanidades que presentes na romaria. Dona Ana, ou
Noca como prefere, é uma mulher de 89 anos que se autodeclara negra, nordestina,
integrante de uma roda de capoeira, devota do Padre Cícero e, depois de um alguns
minutos de entrevista, nos relatou abertamente: é mãe de santo e pratica o candomblé
desde a adolescência190.
Só soubemos que Ana é mãe de santo durante a realização da entrevista, pois
durante a abordagem para a gravação usamos o mesmo critério para a seleção de
possíveis interlocutores: pessoas em atividade de romaria que estivessem disponíveis
para dar o seu relato pessoa e autorizassem o uso do material coletado durante a
entrevista (vídeo, áudio e fotografia) para os fins acadêmicos da pesquisa. No momento
de abordagem, a interlocutora estava presente na reunião das três, idealizada pela Irmã
Anete, um momento que durante os dias de romaria, às 15 hs da tarde. A reunião das
Três é um momento da programação das romarias no qual os romeiros pedem orações,
cantam benditos e fazem o registro de suas romarias no microfone aberto ao público.
Durante a entrevista, quando indagada sobre como era possível conciliar as
obrigações do candomblé à fé no Padre Cícero e às atividades de romaria, Ana nos
respondeu: ―Não me atrapalhou, nem me atrapalha. Ao contrário, na minha fé no meu
Padim, Padim Ciço eu me sinto com força e realizada em todas as minhas dificuldades.
190
A entrevista realizada com Ana, com sua autorização para divulgação e menção ao seu nome, através
da assinatura do termo de autorização do uso de imagem, compõe o acervo audiovisual da pesquisa ―A
COR DA DEVOÇÃO: Africanidade e religiosidade na cultura romeira no Cariri contemporâneo‖,
aprovada no Edital FUNCAP N° 09/2015-BPI.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
CARVALHO, Anna Christina Farias de. Sob o signo da fé e da mística: um estudo das
irmandades de penitentes no Cariri cearense. Fortaleza: IMEPH, 2011.
CORTEZ, Ana Sara Parente. Cabras, caboclos, negros e mulatos. A família escrava
no Cariri cearense (1850-1884). Dissertação. (Mestrado em História Social) –
Universidade Federal do Ceará, 2008.
M.; AMADO, J. (Org.). Usos e abusos da história oral. Rio de Janeiro: Fundação
Getúlio Vargas, 1998.
493
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RESUMO
INTRODUÇÃO
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negra que atuaram e atuam desde as esferas políticas e sociais até mesmo as culturais e
simbólicas, a exemplos contemporâneos dessa resistência temos a organização de
comunidades quilombolas remanescentes e a valorização e afirmação da identidade
negra.
Em parte, como resultado dessa luta podemos considerar a tramitação e a
aprovação da lei 10.639/03 que como já mencionado, obriga o ensino das temáticas
referentes à História e Cultura Africanas e Afro-brasileiras em escolas públicas e
privadas. De acordo com Gisele Karin de Moraes (2009), o chamado Movimento Negro
Unificado, que se firmou na década de 1970, desde essa época realizando importantes
ações quanto à luta contra o racismo e a favor de direitos iguais para os negros, interviu
significativamente para reunir, debater e levar propostas ao Senado Federal por meio de
seus representantes para conseguir incluir de alguma forma esses temas nas escolas,
considerando essa ação como um primeiro e imprescindível passo para uma educação
resistente ao racismo.
Não há como negar o sentido e a importância da sanção da referida lei, tendo em
vista que significa não é só a efetivação de objetivos de luta de movimentos sociais
negros, mas também interferências estatais na educação em favor de no mínimo na
oficialidade se pretender uma educação contra os preconceitos e o racismo. Porém,
sabemos que apenas a obrigatoriedade desse ensino não o faz se realizar
verdadeiramente na prática, as realidades escolares são especificas e além do currículo
oficial há um currículo oculto que se traduz no que ocorre cotidianamente na escola, na
sala de aula. Dessa forma, é necessário que observemos e reflitamos sobre a real
possibilidade dessas temáticas serem colocadas em prática no ensino e se os
professores, talvez nesse momento sendo os atores principais, são formados, se
interessam e tem subsídio para fazer acontecer essa prática.
Diante das questões apresentadas, partindo dessas discussões das relações entre
identidade negra e o espaço escolar no contexto contemporâneo, a seguir iremos
analisar uma produção audiovisual (―O lado de cima da cabeça‖) que trata da temática
da identidade negra e logo depois discutiremos a partir do documentário as
possibilidades e estratégias que o cinema pode proporcionar para o tratamento desse
tipo de debate na sala de aula.
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FIGURA I: Entrevistada X. Fonte: ÉVINE, Naiara. O LADO DE CIMA DA CABEÇA (Direção: Naira
Évine Soares, 2014). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=1RFvuA0cu60>. Acessado
em: 24/03/2017.
191
Essas informações podem ser conferidas na página da rede social (Facebook) da própria Naira Soares
Disponível em: < https://www.facebook.com/naira.evine >. Acessado em: 24/03/2017.
192
Ver site: < http://www.rua.ufscar.br/o-lado-de-cima-da-cabeca-naira-soares-2014/ >
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expressão cabelo ―ruim‖, expressão essa que foi naturalizada e associada socialmente
aos cabelos crespos em contraposição aos cabelos lisos que seriam os cabelo ―bons‖, os
cabelos dos brancos.
Muitas das mulheres negras entrevistadas tocam na questão do querer a todo
custo seus cabelos alisados, pois seriam dessa forma aceitas e entrariam no padrão
social do cabelo ―bonito‖, pelo fato de não se sentirem bem com os seus cabelos
naturais considerando-os naquele momento como ―feios‖ ou não adequados. Porém, o
mais contundente é que essas pessoas no momento em que falam já adquiriram a
consciência das questões sociais dos padrões impostos e enxergam seus cabelos de
forma diferente, como luta de resistência aos preconceitos e como símbolo da
identidade negra.
Assim, podemos considerar como tema central do documentário o
empoderamento de um grupo de pessoas, principalmente negras, que construíam uma
imagem anterior de inferioridade de seus atributos, mas que superaram essa
complicação e agora promovem um poder, uma afirmação de sua personalidade, de suas
características, de sua identidade.
Em geral, as falas dos entrevistados (as) giram em torno de exteriorizar os
preconceitos sofridos e os estereótipos que são reproduzidos na sociedade relacionados
ao cabelo crespo e ao negro como um todo, e a partir dessas questões mostrarem suas
fases de transição até chegarem à aceitação de suas características e terem outra
concepção sobre elas, vendo-as como constituição de identidade e de resistência.
Portanto, ―O lado de cima da cabeça‖ pode ser interpretado como um vídeo
educativo e reflexivo, que por meio das falas e de uma contextualização que parte de um
lugar específico, o lugar do negro nessa conjuntura, nos faz enxergar por um viés crítico
a maneira como o negro e suas características são idealizadas socialmente.
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principal ressalva é que a discussão acerca do vídeo do professor com os alunos se paute
em uma abordagem crítica dos preconceitos que são expostos com por exemplo, o
cabelo crespo, atentando para o cuidado de não acabar reforçando estereótipos, mas sim
de tentar percebe-los de outra maneira através de um olhar reflexivo.
O documentário traz de forma descontraída e simples os preconceitos no
formato de palavras pejorativas, porém é de suma importância que o professor
problematize essas palavras e tente envolver os seus alunos na complexidade destas,
enfocando que apesar dos entrevistados mostrarem o empoderamento e de certa forma a
recuperação daquelas pessoas quanto àqueles preconceitos, deve-se estar atento para
não passar uma mensagem de que estes não existem mais ou de que nada mais
interferem na vida do (a) negro (a), muito ao contrário, o ideal é que se mostre o quanto
é pertinente o racismo e os preconceitos dessa natureza e em vários formatos e que
devemos sempre tomar uma posição de combate contra estes.
Outra questão não menos importante gira em torno do conhecimento que o
professor tem que estabelecer quanto às suas turmas e aos seus alunos, sendo atento
para as características de tais e a conjuntura em que propõe certas discussões. No caso
da temática dos preconceitos contra os símbolos voltados para a identidade negra, é
importante que se tenha a consciência se há ou não alunos (as) com essas características,
e se existirem, pensar quais as consequências e os impactos que esse assunto pode trazer
para estes.
De forma mais especìfica, o uso de ―O lado de cima da cabeça‖ no Ensino
Fundamental II se torna mais interessante a partir do 7º ano no sentido de que
geralmente nessa fase do ensino na disciplina de História é estudado o conteúdo de
História do Brasil Colonial e, como sabemos, os livros didáticos e a forma como é
ministrado esse conteúdo como também outros afins acabam passando a mensagem do
negro no contexto da história brasileira apenas como escravo, desconsiderando sua
própria história, cultura e questões sociais como africano e também como afro-
brasileiro.
Nesse contexto, o documentário traria toda uma discussão sobre as questões que
estão enraizadas desde esse período da nossa história e suas consequências, também
fazendo ponte para discutir sobre as formas de resistências negras do passado e da
contemporaneidade, trata-se de uma oportunidade de diálogo entre passado e presente
muito contundente e que talvez chame bastante a atenção dos discentes, principalmente
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na presença de alunos (as) negros (as) ao verem sua história colocada de maneira
diferente e não negativa.
No Ensino Médio também temos uma fase específica que geralmente a História
Colonial brasileira é tratada, que é o 2º ano médio, porém, se trata de uma sugestão o
aproveitamento desses temas para fazer essas relações, pois as discussões sobre os
temas suscitados se fazem importantes em todas essas fases escolares, ou melhor, em
todos os espaços educativos. Mas voltando ao Ensino Médio, tendo em vista a faixa
etária dos discentes que estão nessa fase, é imprescindível que o senso crítico seja mais
do que nunca aguçado, e para isso é contundente que o professor proporcione aos alunos
(as) não só o documentário, mas também o contato com textos e outras fontes que
possam analisar e complementar a discussão. Muitas vezes, devido à ausência desse tipo
de debate no Ensino Fundamental ou em outros meios educativos, os jovens chegam ao
Ensino Médio compartilhando muitos dos estereótipos e preconceitos absorvidos da
sociedade, assim sendo mais necessário ainda tornar presente esses temas no ensino.
Destarte, ―O lado de cima da cabeça‖ não está restrito à estas fases, não só
apenas a disciplina História em geral, mas considerando a possibilidade e a importância
da interdisciplinaridade, outras disciplinas podem adaptar ou mesmo expandir suas
discussões com os temas e com a utilização do documentário. É relevante ressaltar que,
como já mencionamos nesse texto, com a lei 10.639/03 se torna obrigatório a inserção
no ensino da temática História e Cultura afro-brasileiras e enfoca essa inserção nas
disciplinas de História, Educação Artística e Literatura. Sabendo da relevância dessa lei
e claro, da prática da mesma, o cinema se mostra uma como uma ferramenta que muito
pode ajudar a inserir realmente na escola, na sala de aula, essas temáticas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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que questione e ultrapasse os estereótipos construídos socialmente e que com isso, seja
um espaço de discussão da História e da Cultura negra e do rompimento com o racismo
e com todas as formas de discriminação racial.
Além dessas propostas de discussões teóricas, também pretendeu-se contribuir
de certa forma para a prática desse ensino sugerindo e compreendendo a produção
audiovisual como recurso didático para o tratamento desses temas, levando em conta o
documentário ―O lado de cima da cabeça‖ e as questões levantadas aqui sobre o mesmo
como adaptações para a sala de aula, e com a produção de uma ficha técnica acerca do
material para ajudar no planejamento das aulas dos docentes que tencionar utilizá-lo.
Assim concluímos que, antes de tudo, necessita-se de um investimento na
formação dos professores quanto a temática da identidade negra e conceitos
interligados, no espaço escolar com a tomada de consciência sobre a importância dessa
discussão e no cuidado com os materiais utilizados nesse espaço para evitar a
propagação de preconceitos e estereótipos, bem como o cinema como uma das
estratégias para a inserção dessas questões em sala de aula.
REFERÊNCIAS
GOMES, Nilma Lino. Educação e identidade negra. In: Aletria: alteridades em questão,
Belo Horizonte, 2012, s/p.
504
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NAPOLITANO, Marcos. Como usar o cinema na sala de aula. São Paulo: Contexto,
2013.
ANEXO I:
Cuidados: nenhum.
193
O referido modelo de ficha de análise foi inspirado nas fichas elaboradas acerca de diversos filmes
pelo autor Marcos Napolitano em seu livro ―Como usar o cinema em sala de aula‖ (2013).
505
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506
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194
MARY HELLEN LIMA DAS NEVES
UFAL
[email protected]
RESUMO
Este artigo tem como proposta descrever vários momentos da história dos indígenas
Xukuru-Kariri que habitam a Aldeia Indígena Mata da Cafurna em Palmeira dos Índios
e a partir de então compreender os conflitos durante os processos de posse e retomada
de suas terras tradicionais. Como metodologia foram utilizados materiais bibliográficos
de pesquisadores locais a intelectuais reconhecidos nacionalmente, tais como: Luiz B.
Torres, Aldemir Barros, Júlio Cezar Melatti entre outros. Foi feito, também um estudo
etnográfico com o intuito de retratar aspectos da estrutura física da aldeia que culminem
com uma discussão sobre o processo de demarcação territorial no município de
Palmeira dos Índios que perdura até os dias atuais.
Palavras-Chave: Cotidiano. Etnografia. Indígenas. Propriedade.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
194
Licenciada em História pela Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL), Especialista em Ensino de
História Novas Abordagens pela Faculdade São Luís de França (FSLF). Mestranda em História Social
pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Bolsista CAPES.
507
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197
Organização esta, que por volta do ano de 1967 foi substituída pela Fundação Nacional do Índio –
FUNAI.
509
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Fonte: Acervo Museu do Estado de Pernambuco – MEPE: Os Xukuru-Kariri no Posto Indígena Irineu dos
Santos, Palmeira dos Índios, Alagoas. Provável autoria de Carlos Estevão de Oliveira quando empreendeu
visitas para estudos de grupos indígenas no Nordeste (Bahia, Ceará, Paraíba, Pernambuco e Alagoas).
A imagem acima nos permite imaginar como se tomava corpo à ideia de viver
novamente aldeado, só que desta vez esta iniciativa vinha acompanhada do aparato
público através do SPI, que pretendia controlar o cotidiano dos indígenas, e claro que
interferir diariamente em seu modo de vida. Aldeá-los significava assegurar o controle
sobre o povo, suas atividades e suas organizações e tornava-se mais fácil colocá-los
sobre o controle do Estado.
Os índios adquiriram a primeira propriedade para usufruto perpétuo, a Fazenda
Canto, antes pertencente ao então prefeito do município de Palmeira dos Índios Manoel
Sampaio Luz, mais conhecido como Sr. Juca Sampaio, por Cr$ 500.000,00 (quinhentos
mil cruzeiros), e lá construíram o Posto de Saúde Irineu dos Santos, no entanto a terra
não estava em boas condições e não valia o valor pelo qual foi comprado, como cita o
antropólogo em seu relatório produzido para compor o processo de demarcação das
terras afirma que:
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Há, também, outro fator que não favoreceu ao povo indígena que pretendia lá
viver, pois os Cr$ 500.000,00 pagos pela fazenda correspondiam a 372 ha, mas quando
lhes foi entregue a terra, registrada, a área reduziu para 272 ha. Este equívoco ou ato de
má fé não foi revertido até os dias atuais. Com isso, o sonho da aldeia se concretizou,
mas teve suas proporções reduzidas e se formou com um problema agravado, a
insuficiência territorial para o atendimento das necessidades básicas do grupo. Ora, se já
era insuficiente abrigá-los com a quantidade de terras anteriormente acordada,
imaginemos com 100 ha a menos?
Viver na Aldeia Fazenda Canto não serviu para solucionar, nem tão pouco para
saldar a dívida histórica com os índios, mas lhes possibilitou o direito de voltar a viver
juntos, a possibilidade de resgatar sua cultura e a liberdade de assumirem-se como
índios.
A vida no aldeamento ficou sendo marcado por um novo desafio, o da
reafirmação étnica, que faz a Aldeia Fazenda Canto e seus moradores destacarem-se
como pioneiros na luta pela retomada de suas áreas e também por ser considerada o
berço da cultura indígena neste processo de retomada no município. Esse processo de
visibilidade da aldeia fortaleceu também o papel do líder, destacando a figura do Sr:
Alfredo Celestino, pertencente a uma das mais tradicionais famílias Xukuru-Kariri.
A vida na aldeia recriou um sentimento de liberdade e de pertença cultural e
isto, de certa forma, contrariava o desejo do SPI que tinha como política primordial
controlar e limitar os possíveis avanços dos movimentos indígenas na região. A partir
de então, a história local vai registrar, mesmo que timidamente, uma ascensão étnica
que muda o panorama do município.
A compra da Fazenda Canto não resolveu os problemas dos Xukuru-Kariri,
pois a área da propriedade não atendia às necessidades da comunidade. A limitada
extensão territorial, o crescimento populacional e o surgimento de conflitos internos
fizeram com que surgisse e se solidificasse a urgência em conseguir mais terras. Dessa
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Previdência Social e a ajuda do órgão federal que lhe dá assistência, como a FUNAI,
que pouco influencia nesta renda.
Há também índios que são funcionários públicos e outros que desempenham
variadas funções, como mão de obra no comércio, agricultura, pecuária e prestação de
serviços na cidade. O território é composto por uma Escola Estadual Indígena, um Posto
de Saúde/farmácia, uma Biblioteca, uma Lagoa, uma Barragem, várias casas e as roças.
Palmeira dos Índios é a terceira maior cidade do estado, está situada a cerca de
134 km da capital, Maceió. Localiza-se no agreste alagoano, uma região inserida em um
brejo de altitude no Semiárido alagoano, com um clima tropical semiárido e
mesmo subtropical.
Devido à elevada altitude cria condições necessárias para uma flora que reúne
tanto características da Mata Atlântica, quanto da Caatinga, contrastando
assim com as áreas circundantes que possuem condições climáticas mais
secas e estações do ano não muito bem definidas.(PORTO; CABRAL;
TABARELLI, 2004, p. 16).
Faz divisa com o estado de Pernambuco. Conta com aproximadamente 70.434
habitantes (IBGE/2010) entre os quais, convém destacar uma parcela considerável de
índios Xukuru-Kariri aldeados em oito aldeias na Fazenda Canto, Mata da Cafurna,
Serra do Amaro, Boqueirão, Coité, Cafurna de Baixo, Serra do Capela e Riacho Fundo,
além da não reconhecida Xukuru-Palmeira na Fazenda Vista Alegre e Fazenda Jarra.
Segundo o IBGE /2010 em Alagoas 16.291 pessoas se declararam indígenas,
mas apenas 6.268 habitam terras demarcadas, e os 10.023 vivem fora das aldeias,
resultando em um percentual de que apenas 38,5% estão em terras indígenas. O que se
configura como um grande contingente de pessoas que atribui a identidade indígena em
Alagoas, e consequentemente no município de Palmeira dos Índios-AL, considerada a
quarta cidade que mais concentra população indígena em Alagoas, além dos índios que
vivem nas periferias da cidade, pois as aldeias não comportam esse contigente.
Atualmente os indígenas Xukuru-Kariri ocupam uma área de 1.720.04 ha, onde
a princípio, por meio da doação de Dona Maria Pereira Gonçalves, herdeira da Sesmaria
de Burgos, tinham direito a uma área de meia légua em quadra, que corresponderia a
3.000 braças ou 12.320,00 hectáres, mas eles abriram mão dessa quantidade na intenção
de não comprometer o crescimento e/ou desenvolvimento do município e com isso a
extensão territorial foi se tornando cada vez menor, e mesmo assim o que já foi
determinado pela Justiça federal não teve andamento.
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No ano de 1990 a antropóloga Sívia Aguiar C. Martins e sua equipe fez o grupo
de trabalho (GT), nesse primeiro laudo antropológico foi identificado um área de 36 mil
ha, envolvendo desde as áreas já retomadas e área urbana, como justificativa a
antropóloga disse ter tomado como base um documento de doação198 de terras no ano
de 1773 que doava meia légua em quadro de terras a partir do pião da Igreja Matriz para
os índios Xukuru-Kariri.
No entanto a demarcação foi vista como inviável por envolver desapropriações
de parte da população do município. Relatos davam conta que nessa mesma época a
antropológa recebeu ameaças por ter concluído seu trabalho e a mesma ter entregado
um laudo que fosse a favor dos índios em questão, situação esta não confirmada, nem
negada por ela, uma vez que a mesma não mais retornou ao município após conclluir
seu trabalho.
Nove anos mais tarde, outro GT foi criado para mais uma vez fazer o estudo de
identificação e delimitação das terras indigenas, desta vez liderado pela antropológa
Sheila dos Santos Brasileiro, sendo interrompido pouco tempo depois de iniciado, sem
formular nehuma proposta.
Em 2003 mais um GT foi constituído, através de muita mobilização por parte
dos índios que pediram a intervenção da OAB/AL para pressionar a FUNAI a avançar
no processo de demarcação das terras, desta vez o antropológo foi Douglas Carrara 199,
que concluiu o trabalho e entregou um laudo que identificou 15 mil ha pertencentes ao
198
Frei Domingos solicitou aos herdeiros do Cel. Manoel e deles recebeu meia légua de terras em quadra
para a construção de uma Capela em homenagem a Bom Jesus da Boa Morte. A doação foi registrada em
cartório na cidade de Garanhuns – PE em 27 de Julho de 1773.
199
Laudo este, tido até hoje como um dos mais completos por pesquisadores da área.
514
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515
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Apesar dos relatórios e de alguns parcos avanços judiciais nem a FUNAI, nem
a União avançou com as demarcações e respondem judicialmente por isso, como
200
determinou o Juiz Antônio José de Carvalho Araújo, que concedeu liminar a pedido
do Ministério Público Federal, em Ação Civil Pública, determinando à União Federal e
à FUNAI a conclusão imediata da demarcação física da Terra Indígena Xukuru-Kariri,
nos termos da Portaria do Ministro da Justiça nº 4.033, de 15/12/2010 e em caso de
200
Matéria disponível no site: www.tjal.al.gov.br no dia 18/10/2013 tratando da liminar determinada pelo
Juiz Federal da 8º Vara Federal de Arapiraca a FUNAI e a União.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
MELATTI, Julio Cezar. Índios do Brasil. São Paulo, Editora EDUSP, 2007.
MOREIRA, Ana Cristina de Lima: PEIXOTO, José Adelson Lopes; SILVA, Tiago
Barbosa da.Mata da Cafurna. Tradição e cultura do povo Xucuru-Kariri. Maceió:
Catavento, 2008.4
518
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TORRES, Luiz Barros. Os Índios Xucuru e Kariri em Palmeira dos Índios. 4ª ed.
Maceió, Igasa, 1984.
SILVA, Edson Hely. História Xukuru, história indígena no Nordeste: novas abordagens.
In: Mnemosine Revista, 2010, p. 64-83.
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RESUMO
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masas son los principales artìfices de la historia‖ como define George Novack (1975, p.
11), teórico marxista da Harvard University. Esta concepção de ciência que adotamos
não apenas supera, como é a antítese das noções gêmeas do idealismo e do elitismo que
aponta grandes homens, deuses e pensadores como os feitores da história.
No Brasil, os negros foram utilizados à exaustão como força de trabalho escravo.
Foram os responsáveis pela constituição de imensas fortunas no triângulo comercial que
envolvia a África de onde os escravos eram arrancados. Assim, era o Brasil a colônia
produtora de gêneros agrários e Portugal e a Europa, o centro exportador e consumidor
de manufaturas. Entretanto, além da força de trabalho, a contribuição do povo negro
para a formação do Brasil teve marcas importantes nas dimensões da cultura e da
sociabilidade, embora ofuscadas pelos aparatos culturais hegemônicos.
As tradições negras como a religiosidade, a música e a dança sobreviveram à
escravidão, que teve início na primeira metade do século XVI, com a produção do
açúcar no Brasil. Ao longo dos séculos, essas tradições intercambiaram-se com as
matizes culturais indígenas e europeias, constituindo o arcabouço sociocultural
brasileiro. Contudo, os elementos étnicos indígena e africano foram expurgados pelo
projeto social do colonizador europeu. O processo colonizador dirigido pelo europeu,
branco e católico negou ao índio a sua identidade e civilização, enquanto que ao negro
foi negada a existência da própria alma. A violência desumana legitimada pelo Estado
português foi usada sem limites racionais como o principal instrumento ―pacificador‖
no sentido de debelar qualquer tipo de desobediência aos usurpadores da terra recém-
conquistada, qualquer rebeldia contra os colonizadores poderia ser paga com a vida.
As violações aos povos oprimidos como os negros não se restringiram nem se
restringem aos castigos físicos e morais marcados pela escravidão do passado e pelo
genocídio patrocinado pelo Estado policial na atualidade. O terrorismo psicológico e
simbólico contra a população negra atravessaram os séculos e continuam presentes
como sequelas do processo histórico da escravidão que no Brasil só teve seu fim formal
em 1888. As violações em curso contra o povo negro são muitas, embora muitas sejam
difíceis de caracterizar. O certo é que além da escravidão e do genocídio do povo negro,
a história de resistência e luta negra tem sido apagada.
A história enquanto narrativa, como define o historiador inglês Keith Jenkins
(2004), constrói um discurso científico que, embora não crie o mundo, lhe atribui
significados e sucessivamente consequências. Há pouco tempo, a narrativa histórica
passou a pautar o percurso do povo negro, embora ainda existam enorme ignorância e
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201 Francisco Ary Fernandes de Medeiros é doutor em Filosofia pela Universidade Gama Filho e
professor da UFRJ. Dentre os vários empreendimentos acadêmicos, Ary Medeiros coordenou uma série
de atividades e projetos de pesquisa e extensão em comunidades pobres com ênfase na questão da
cidadania.
202 Cacilda da Silva Machado é doutora História Social pela UFRJ, onde também atua como
professora. Entre 2008 à 2010 foi a Coordenadora do Grupo de Trabalho História e População da
Associação Brasileira de Estudos Populacionais (ABEP). É uma das estudiosas brasileiras sobre a questão
da escravidão, o tìtulo de sua tese é ―A Trama das Vontades: Negros, pardos e brancos na produção da
hierarquia social‖.
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que é praticada pelos principais autores da cidade. Note que o próprio Florestan
Fernandes recorreu a coligir entrevistas de líderes do movimentos negro e trabalhadores,
proporcionando que essas vozes atravessassem o silêncio de uma historiografia branca e
hegemônica.
Alguns trabalhos acadêmicos relevantes e recentes, que versam sobre a cidade,
merecem ser citados. Em sua grande maioria, essas pesquisas tratam da experiência
pedagógica liderada pelo educador Paulo Freire através do projeto de alfabetização de
adultos que ficou conhecido como ―As 40 horas de Angicos‖, que teve inìcio em 1963.
Vale destacar que em 1963, Angicos tinha pouco mais de 9 mil habitantes, dos quais
75% eram analfabetos203. É natural e justo que um experimento apontado como
revolucionário e coordenado por uma das principais figuras da educação e da
intelectualidade brasileira resulte em numerosos estudos. Seria inviável citar todos esses
estudos, mas é absolutamente certo afirmar que Paulo Freire e a história produzida sobre
seu método ocupam uma página inapagável na história do desenvolvimento da
educação, especialmente em Angicos.
Aqui, citamos rapidamente a historiografia produzida sobre a experiência do
método Paulo Freire, com a clareza que é impossível falar da história local de Angicos
sem mencioná-lo. O diretor do Instituto Paulo Freire, o educador Moacir Gadotti
(2013), em artigo intitulado ―Alfabetizar e politizar: Angicos, 50 anos depois‖,
apresenta o experimento inovador em Angicos e seus frutos, mas ressalta a necessidade
de eliminar o analfabetismo neste começo de século XXI no Brasil. Apesar dos vários
trabalhos que versam sobre a questão da educação em Angicos, estes não tiveram uma
preocupação especial com o drama da questão étnica.
Temos a certeza que a concepção de educação libertadora, cunhada por Paulo
Freire, deve ser examinada sistematicamente como uma ferramenta transformadora da
sociedade, inclusive, para superar os dilemas do analfabetismo em Angicos na
atualidade. O debate sobre o analfabetismo deve estar associado a questão étnica,
especialmente em Angicos, onde os dados mais atuais apontam que 76,8% da população
negra é analfabeta e apenas 0,64% concluíram o ensino superior204. Enfrentar o
analfabetismo é parte da pauta do dia, especialmente para construir um projeto político e
203 Angicos virou exemplo mundial. Publicado no Jornal Tribuna do Norte, em 31 de março de
2013. Disponível em: < http://migre.me/t53FA>. Acessado em 20 de janeiro de 2016.
204 Os dados são do Censo do IBGE de 2010, que apresenta que 76,8% da população negra em
Angicos (1.183 pessoas) classificam-se como ―sem instrução e com o fundamental incompleto‖, enquanto
que apenas 0,64% da população negra local (10 pessoas) concluíram o ensino superior. Dados disponíveis
em: http://www.ibge.gov.br.
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social que propicie ao próprio povo negro retificar o papel a eles atribuídos na história
local.
Afora as pesquisas sobre o método Paulo Freire, que resultaram e resultam em
uma extensa bibliografia e o projeto ―Angicos: suas famílias, seus mitos, sua história‖,
apenas dois livros versam, de forma geral, sobre a história da cidade: ―Angicos‖, uma
reedição recente de autoria de Aluìzio Alves (1997) e ―Angicos ontem e hoje‖, de Maria
Zélia Moreira Alves da Cunha (1992). Questões como a geografia, a economia, a
pecuária, o desenvolvimento social e a vida e formação religiosa essencialmente
católica da cidade são temáticas tratadas nos dois livros, que tem como característica
maior de semelhança à abordagem histórico-memorialista igualmente positivista e
linear205.
Aluízio Alves, que era jornalista e Zélia Alves, que era professora de história,
foram contemporâneos, ambos nasceram em Angicos e faleceram na primeira década do
século, na capital potiguar, Natal. O gosto pela atividade política é umas das
semelhanças que podem ser apontadas: Zélia foi eleita prefeita da cidade e Aluízio
ocupou vários cargos públicos e eletivos como Governador e Ministro de Estado na
gestão dos ex-presidentes José Sarney e Itamar Franco. Ambos escreveram sobre
Angicos.
O livro Angicos206, de Aluízio Alves (1997), inspirou e lançou as bases para
que Zélia Alves (1992) escrevesse Angicos, ontem e hoje. Aluízio foi membro da
Tribuna da Imprensa no Rio de Janeiro e, em 1950, fundou a Tribuna do Norte, em
Natal; no livro Angicos, utilizou como fontes documentos oficiais. O livro não possui
explicações adensadas e profundas sobre o desenvolvimento histórico da cidade, não
levanta problematizações sobre a formação social e se resume a apresentar ao leitor uma
visão panorâmica. O seu mérito é o ineditismo. Nenhuma obra anterior tratou da história
da cidade. O livro de Zélia (1992) apresenta imagens e algumas atualizações em relação
ao livro de Alves (1997), mas é justamente o autor que trata, mesmo que
superficialmente, da questão da escravidão e da legislação escravista relativas à cidade.
205 Linear no sentido que essas narrativas historiográficas não apresentam as contradições do
processo de desenvolvimento histórico, não demonstra a complexidade intrínseca das transformações
sociais locais, não problematiza as disputas ideológicas, e apresentam o mundo local naturalizado e
estático.
206 A primeira edição foi publicada em 1940 pelos Irmãos Pongetti Editores no Rio de Janeiro, a
segunda edição saiu em 1997 pela Fundação José Augusto como parte da Coleção Biblioteca Potiguar.
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207 O termo denota a crença que o Brasil escapou do racismo e da discriminação racial. A ideia é
que os brasileiros não enxergam uns aos outros através da lente da raça e não abrigam o preconceito racial
em relação um ao outro. Por isso, enquanto a mobilidade social dos brasileiros pode ser limitada por
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Freyre. Nestes termos, ressaltamos ideologia no sentido definido por Marx (2009, p.
10), como o ―modo de pensar que falseia embora não de modo não intencional o
conhecimento da realidade social, contribuindo, assim, para reproduzi-la segundo os
interesses das classes dominantes‖. Não é exagero: cientificamente, Alves falsifica a
história.
Aluìzio Alves (1997, p. 139) esclarece que ―Angicos nunca acolheu grande
massa de escravos‖, o que revela-nos que segundo os dados coligidos pelo autor havia
―pequeno número de escravos na cidade‖. Esse apontamento da proporcionalidade é um
elemento importante para mensurar com maior precisão a estrutura escravista local e
deve ser estudado mais minuciosamente, contudo, faltam fontes confiáveis para emitir
um veredicto. O apontamento de Aluízio sobre a proporção de escravos parece razoável,
numa população onde os negros representavam apenas 5,89% na Província do Rio
Grande do Norte, na segunda metade do século XIX. O censo demográfico de 1872
estimava uma população de 13.020 escravos frente pouco mais de 220 mil homens
livres. Relatam os números oficiais:
Através deste censo, duas conclusões sobre a escravidão em Angicos são nítidas.
O número de cativos era de pouco mais de quinhentos, entre homens e mulheres. O
número parece pequeno, mas não deve ser desprezado, é uma estatística significativa,
vários fatores, gênero e classe incluído, a discriminação racial é considerada irrelevante dentro dos limites
do conceito da democracia racial. Ver mais em: http://www.infoescola.com/sociologia/democracia-racial.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
tendo em vista que falamos do final do século XIX. Também segundo o censo, todos os
escravos eram analfabetos: não sabiam ler nem escrever.
O antropólogo e historiador Richard Price208 (2014) precisa com exatidão que
―o Brasil recebeu cerca de 45% de todos os africanos trazidos como escravos para as
Américas – mais do que qualquer outra nação‖.
O povo negro foi completamente desumanizado no Brasil e reduzido à condição
de mercadoria; humanos foram comercializados nos mais diferentes lugares em uma
terra estranha e hostil. Um destes lugares onde os escravos foram vendidos e comprados
foi na freguesia de São José dos Angicos, constituindo a pequena população de cativos
da cidade com pouco mais de quinhentas pessoas, nos idos de 1870.
A historiografia sobre Angicos fracassou em mensurar minimamente com o
mínimo de rigor o que significou a vida dos escravos na cidade. O espaço reservado
para os negros na história local é ínfimo. O espaço nas esferas de poder da sociedade
contemporânea é igualmente insignificante, o que implica dizer que a integração do
negro na sociedade de classes, mesmo com a abolição da escravatura, avanços sociais e
as cotas étnicas nas universidades, continua incompleta.
A escravidão não é uma invenção africana, embora a exploração da mão de obra
escrava tenha ocorrido em grandes proporções. A venda de escravos é um antigo
comércio que remonta a sociedade babilônica, de forma que, nos anos 1750 a. C., as
civilizações gregas e romanas, como retrata Cristiane Nascimento209 (2014, p.19), ao
frisar que ―a escravidão representava a mais radical degradação do homem, convertido
em meio de produção e privado de seus direitos sociais‖.
A escravidão tem uma história social que não foi retratada na historiografia
sobre Angicos e, além do lugar subalterno que é reservado ao negro na obra de Aluízio
Alves (1997), prevalece uma narrativa, que de forma subliminar atesta uma ―escravidão
mansa‖ e tributa aos humanistas católicos toda bondade e piedade humana possível. Os
escravos que chegaram a Angicos foram caçados na África e arrancados de suas
famílias; estes tinham histórias que se perderam no tempo e que não serão contadas
pelos livros de história.
208 É professor emérito de Estudos Americanos, Antropologia e História do College Of William &
Mary nos EUA.
209 Cristiane Nascimento é pesquisadora da Revista de História da Biblioteca Nacional (RHBN) e
autora da dissertação intitulada ―A relação entre os portugueses e muçulmanos (1930-1974)‖.
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Uma história de vida repleta de reais aventuras, como a de Osifekunde, que foi
nobre na África, escravo no Brasil e informante na Europa foi retratada por Aderivaldo
Santana210 (2015), mas quantas histórias de vida dos escravos em Angicos ganharam
páginas de livros ou ocuparam artigos em jornais? O silêncio histórico permite que
novas estratégias de desumanização e domínio tomem corpo e esconde um passado de
violações que não pode ser silenciado. É neste sentido que concordamos com o filósofo
Walter Benjamin211 (1987, p. 3) quando diz que ―somente a humanidade redimida
poderá apropriar-se totalmente do seu passado‖.
A cidade que Aluízio apresenta em seu livro tem um percurso histórico simples,
linear e sem contradições. Oculta-se a complexidade e as contradições do processo de
desenvolvimento histórico, silencia-se sobre o domínio e o julgo dos proprietários de
escravos sob suas mercadorias humanas. Aluízio induz o leitor desavisado a acreditar
que todos os proprietários de escravos eram abolicionistas, sendo tal romantismo é
pobre e falso.
Ao discutir o reflexo da promulgação da Lei dos Sexagenários212 em Angicos,
o autor se refere a personagens locais que lutaram contra a escravidão, mas não
aparecem os negros. Segundo ele:
O africano era mais empregado nos trabalhos agrícolas, que, entre nós,
despertaram muito tarde. Mesmo assim, praticipamos da campanha
abolicionista, mercê do pequeno número de cativos. (...) Podemos considerar
percursos do movimento, aqui, o célebre missionário padre dr. José Maria
Pereira Ibiapina, em cujas missões, realizadas desde 1862, pregava
insistentemente piedade para os infelizes negros vindos d‘alem mar nas
torturas da escravidão. (...) E há uma nota lisonjeira para nós: quando foi
decretada a Lei de 28 de setembro de 1855, muitos negros, por ela
beneficiados, preferiram continuar prestando seus serviços, como se escravos
ainda fossem (ALVES, 1997. p.139-140).
529
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À medida que não consegue dar conta da carga imposta pelos feitores e passa
a ser considerado um peso morto no orçamento do proprietário, o negro
escravo pode vir a ser alforriado, ganhando com essa suposta liberdade a
igualmente dura tarefa de mendigar os meios de subsistência. Essa situação
mais corriqueira é acompanhada de duas variantes: de um lado, encontramos
senhores que confiam tarefas (como a criação de aves) aos cativos tornados
inválidos para o trabalho e, de outro, não são poucos os que resolvem essa
questão assassinando pura e simplesmente aqueles que já não rendem o
esperado (GENNARI, 2008, p.17-18).
213 Joice Santos é pesquisadora da Revista de História da Biblioteca Nacional (RHBN) e autora da
dissertação intitulada "As Embaixadas dos Reinos da Costa Africana como mediadores culturais: missões
diplomáticas em Salvador, Rio de Janeiro e Lisboa (1750-1823)".
214 Embora, possa utilizar-se dos valores morais e éticos de uma época como ideologia e fulcro
justificativo.
530
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REFERÊNCIAS
BENJAMIN. Walter. Teses sobre o conceito da história. São Paulo: Brasiliense, 1987.
CUNHA, Maria Zélia Moreira Alves. Angicos ontem e hoje. Rio de Janeiro: Grafitto
Gráfica e Editora LTDA, 1992.
MARX, Karl. A ideologia alemã. Tradução de Álvaro Pina. 1ª Ed. São Paulo:
Expressão Popular, 2009.
531
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
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RESUMO
Esse trabalho tem a intenção de refletir sobre as consequências sofridas pelo Clube de
Regatas Vasco da Gama por lutar contra o racismo no futebol brasileiro. Em 1923 ano
que o Vasco foi campeão carioca, 34 anos após a abolição da escravidão, o preconceito
com os negros e as camadas mais populares da sociedade ainda era muito forte. A
equipe cruzmaltina, por agregar atletas negros, logo recebeu da imprensa da época, o
apelido de camisas negras. E isso em um esporte racista e classista com certeza teria um
preço a ser pago. Com a saídas dos times da Zona Sul da Liga Metropolitana e a criação
da AMEA foram criadas cláusulas absurdas, no tocante à participação dos clubes, tendo
como alvo a equipe do Vasco, que reunia negros e pobres. A partir desse momento, em
que o clube se ver prejudicado e mergulhado em meio a tanto preconceito, passa a
militar pela participação dos negros e das camadas populares no futebol brasileiro.
Palavras-chaves: Vasco da Gama; Racismo; Resistencia.
INTRODUÇÃO
―Glorias, Lutas, Vitorias Essa é Minha História‖¹ esse trecho presento no tìtulo faz
referência a uma música criada pela torcida do Vasco, chamada de Camisas Negras. ―Camisas
Negras‖ foi o apelido que a equipe recebeu da imprensa carioca em 1923, quando venceu seu
primeiro campeonato, sendo composta por negros, operários e brancos pobres. A música faz
referências às lutas travadas pelo Vasco em favor dos menos favorecidos e, principalmente,
contra o racismo; como podemos perceber em outro trecho: ―(...) Jamais terás a cruz, esse é meu
batismo, eu tive que lutar contra o teu racismo (...) ‖, e feito referência a construção do estádio
que tem todo um contexto de luta por trás ―(...). Eu vou torcer, aqui eu ergui meu templo para
vencer (...)‖.
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condição de capital federal era a principal cidade do país naquele momento e tinha
quase que a obrigação de incorporar as práticas do chamado ―mundo civilizado‖.
Grupos urbanos procuravam aproximar-se o máximo possível dos exemplos europeus
de organização econômica e de sua estrutura social, atitudes e modo de viver
(GRAHAM, Richard, 1973). Nesse contexto, ―o futebol tornara-se um novo item da
modernidade europeia que não podia faltar aos anseios e atualização da elite brasileira‖
(FRANCO JUNIOR, Hilário, 2007, p. 63).
Com isso, esse trabalho tem o intuito de mostrar como foram dados os pontapés
iniciais para a democratização desse esporte, que deixou de ser apenas de uma elite para
se tornar o mais popular do país, chegando ao ponto de se confundir o país com o
esporte. Esse processo de democratização se dá a partir do Clube de Regatas Vasco da
Gama, clube formado por portugueses da Zona Norte. O Vasco não foi o primeiro clube
a inserir negros, operários e analfabetos no futebol, mas foi o primeiro a lutar por eles, e
isso, acarretou consequências e são essas consequências que serão discutidas ao longo
do texto.
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É sabido que o primeiro time a ter um negro jogando foi o Bangu, mas por medo
de represálias, logo voltou atrás na sua atitude. O primeiro caso que teve repercussão
envolvendo um negro jogando futebol foi o do jogador Carlos Alberto, em 1914, a
repercussão não foi por um motivo positivo.
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Como Mario Filho diz no livro O negro no Futebol Brasileiro, os times da elite
carioca não se importavam com os negros jogando futebol, desde que eles estivessem
jogando em times pequenos e em divisões inferiores, que seriam de fato, o lugar deles.
O time ficou conhecido como Camisas Negras, com uma campanha arrasadora
no campeonato de 1923, sagrou-se campeão com onze vitorias, dois empates e apenas
uma derrota. Quebrando a hegemonia do Flamengo, Fluminense, Botafogo e América,
times que eram exclusivamente compostos por brancos. Muito se diz que esse sucesso
avassalador do Vasco de sair de divisões inferiores para conquistar a elite do futebol
carioca estava nos negros, mulatos e brancos, pobres e bons de bola, que o Vasco havia
recrutado nos campos de subúrbio.
Com isso, entendemos que o Vasco da Gama não tinha pretensões explícitas de
inclusão social e não era todo negro ou todo pobre que iria jogar no Vasco, tinha que ser
bom de bola. A diferença do Vasco para os outros times que tinham negros e pobres no
plantel é que, quando foi preciso, o Vasco lutou por eles e não se acovardou e por isso
teve sofrer as consequências.
O medo dos times da elite carioca era que, em 1924, se repetisse a cena e um
time de negros, pobres e analfabetos fosse novamente campeão do Rio. Com isso, no
ano seguinte à conquista vascaína, um movimento liderado por Fluminense, Botafogo e
Flamengo, com apoio do Bangu e do São Cristóvão começou a tecer críticas à Liga
Metropolitana. A alegação era de que a Liga Metropolitana não estava supervisionando
corretamente o campeonato para mantê-lo em condições de amadorismo.
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Foi assim que o Vasco lidou com a situação, se opondo a pressão da elite carioca. A
partir do momento em que o Vasco foi campeão, começou a surgir esses movimentos entre os
grandes clubes para frear esse processo vascaíno. América, Botafogo, Flamengo e Fluminense
não suportaram a vitória de um clube de portugueses e de um time de gente negra e humilde. E
isso começou a ser percebido pela imprensa, o incômodo dos dirigentes dos clubes grandes com
o título do Vasco. Isso pode ser visto na última rodada do campeonato, quando o Vasco já tinha
se consagrado campeão e pediu para o Bangu, que não tinha mais nenhuma pretensão naquele
campeonato, para que o jogo fosse adiantado em virtude do campeonato de regatas. Nessa
época, se o Vasco conseguisse o campeonato de remo se igualaria ao Flamengo, que em 1920
sagrou-se Campeão de terra e mar. O Bangu não apresentou problema algum em adiantar o
jogo e aceitou o pedido do Vasco, mas a diretoria da LMDT não aceitou. E entre os principais
periódicos da cidade, o Correio da Manhã destacava:
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Com isso, a AMEA teve que rever a situação e aceitar o Vasco. O time, que já
havia sido campeão da Liga Metropolitana em 1924, mas era grande demais para jogar
só com os pequenos, mesmo ferindo o sentimento da aristocracia carioca, entrava na
liga.
Umas das dificuldades que o Vasco enfrentou na época o fato de não ter um
estádio próprio. Quando ele chega na primeira divisão, foi obrigado a jogar em estádios
maiores e mais seguros do que ele estava acostumado, com isso pagava alugueis
caríssimos. Umas das cláusulas que tinha no regulamento da AMEA e que também
dificultou a entrada do Vasco na associação foi o fato do time não ter um estádio
próprio e seguro. João Manuel Casquinha Malaia Santas trata disso em sua defesa de
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Como já foi dito, de tantos pontos para o Vasco não entrar na AMEA, um deles
era não ter estádio. Esse ponto foi resolvido pelo time cruzmaltino no ano de 1926,
quando os portugueses decidiram se unir e construir o seu próprio estádio, não um
estádio qualquer, mas o maior e o mais bonito estádio da América do Sul, e isso tudo
apenas com o dinheiro dos sócios. De fato, o estádio do Vasco foi construído com o
dinheiro dos torcedores, as obras começaram dia 6 de junho de 1926 e a obra foi
entregue em 21 de abril de 1927. Com certeza, era mais que um estádio.
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O estádio virou símbolo dos direitos trabalhistas, foi o espaço que Getúlio
Vargas usou para realizar uma enorme cerimônia para anunciar, em 1940, para todo o
país, a criação do salário mínimo, e em 1943 a promulgação da Consolidação das Leis
do Trabalho, a famosa CLT. Todos esses movimentos sociais e políticos que
aconteceram em São Januário, só mostram como o estádio virou referência nesse
quesito, alterando toda a lógica geográfica, econômica e social do Bairro São Cristóvão.
Com o tempo, São Januário adotou todos esses símbolos de lutas, contra o
racismo, a discriminação social, a favor dos trabalhadores e dos menos afortunados. E
das consequências que o Vasco teve que arcar em fazer a manutenção dos Camisas
Negras, a obrigação de construir um estádio foi uma das melhores coisas que aconteceu
com o time.
Como foi visto, a vitória do Vasco na segunda divisão não chamou muita
atenção, mas quando o time venceu a elite dos times cariocas, aí sim despertou a ira dos
rivais, Mario filho fala que para os times da elite do Rio enquanto os negros estivessem
em times menores, onde seria seu lugar, estava tudo bem.
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A primeira vitória de um time formado por negros com certeza teria abalado a
estrutura hierárquica de uma sociedade onde havia discriminação racial e social. Mas,
Soares discorda da forma que Mario filho conta os fatos; para ele a vitória do Vasco não
teria toda essa carga dramática, e, além disso, estaria recheada de incoerências, como as
que ele cita a seguir:
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Soares pauta sua pesquisa em jornais do ano de 1924 para apontar erros e
incoerências na obra de Mario Filho. Para ele a questão central de toda a discussão não
era o racismo da elite carioca e sim a questão do amadorismo, ele diz que os clubes
cariocas até aceitariam negros jogando futebol, mas queria a garantia que fosse em
condição de amadorismo. Os negros não tinham um nome familiar ou uma profissão de
prestigio, e por isso quando se apresentava para jogar em um time de primeira divisão
sua condição de amador era logo colocada sob suspeita.
Soares lembra que a maioria dos negros e mestiços do Rio não tinha bons
empregos nem uma boa condição social, a lógica era ―quanto melhor condição social e
econômica, maior a probabilidade do jogador ser amador‖ (SOARES, 2001b, p. 117).
Para Soares essa ideia pairava sobre as cabeças dos dirigentes dos times, assim é
provável que a desconfiança fosse maior em relação aos negros sem sobrenome de
prestígio.
Soares faz uma conclusão a respeito do assunto, e ele diz que apontar as
incoerências nessa história não é bem visto, por que seria politicamente incorreto tentar
desmitificá-la.
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Outra crìtica que os autores fazem ao trabalho de Soares é que ―(...) onde se lia
‗racismo‘, propõe que se leia ‗amadorismo x profissionalismo‘. E essa redução não nos
parece nem profícua do ponto de vista metodológico, nem justa do ponto de vista
histórico‖. (HELAL e GORDON JÚNIOR, 2001, p. 57). Os apontamentos feitos as
críticas de Soares podem ser resumidas da seguinte maneira:
Nessa disputa esse trabalho vai pender mais para o lado dos ―novos narradores‖,
como foi dito o trabalho de Soares é louvável, a iniciativa que ele teve também em
cobrar um maior rigor de pesquisa nos trabalhos, mas o problema é que aparentemente
ele não dá muita atenção ao contexto histórico que esses personagens estão inseridos. O
futebol foi implantado no Brasil pouco tempo depois do fim da escravidão então o
sentimento de superioridade de raça ainda estava muito arraigado naquela sociedade.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar de não ser o primeiro time a ter negros integrando o plantel, foi o que
ficou com a imagem mais fixada nesse tema, quando se fala em inserção racial no
futebol se lembra quase que involuntariamente do Vasco da Gama. E isso se dá muito
pelo que vimos nesse trabalho, a resistência do Vasco em ceder às pressões da elite
carioca e da AMEA, em fazer uma carta aberta se negando excluir doze jogadores
negros e pobres para fazer parte da nova associação dos times da Zona Sul, e nessa
mesma carta demonstrou a importância desses mesmo jogadores para o time.
Podemos observar também que mesmo com as tentativas de boicote que o Vasco
foi sofrendo, simples pedidos sendo negados como o caso do adiantamento do jogo
contra o Bangu com o campeonato praticamente acabado e com acordo já feito entre o
Bangu e o Vasco a Liga Metropolitana negou pedido, simplesmente por ser o Vasco.
Temos que entender que essa relação que é feito entre o Vasco é causas sócias,
se dá em partes por uma negação que os times grandes do Rio em querer incorporar
pessoas de classes tidas como inferiores. Por que permitir que negros joguem futebol,
mas só que em classes inferiores é sim racismo, e diferente de Soares que pauta toda
discussão negando o racismo e substituindo por amadorismo versus profissionalismo, se
ele desse mais atenção ao contexto social da época iria ver que uma coisa não anula a
outra, discutir se o futebol deve ser amador ou profissional em nenhum momento nega o
racismo existente.
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São histórias como essas que vão fixando em nossa memória essa relação do
Vasco da Gama com causas sócias. E depois da construção de São Januário só fez
reforçar essa imagem, por que além da imagem da luta contra o racismo e a inserção de
camadas baixas no futebol estar ligada diretamente ao Vasco, depois de São Januário as
lutas trabalhistas começaram a ser relacionadas ao estádio, pelo fato de Getúlio Vargas
fazer cerimônias para apresentações dos direitos no estádio, e se estar relacionado ao
estádio inevitavelmente vai ser relacionado ao clube também. As memórias vão se
fixando a partir de pequenos momentos que juntos criam uma forte memória coletiva.
REFERENCIAS.
HELAL, Ronaldo e GORDON JÚNIOR, César. ―Sociologia, história e romance na
construção da identidade nacional através do futebol‖. In: HELAL, Ronaldo. A
invenção do país do futebol: mídia, raça e idolatria, Rio de Janeiro: Mauad, 2001: p.
51-76.
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EDSON SILVA
UFCG
[email protected]
RESUMO
Esse texto busca refletir sobre as formas de resistências que vem sendo adotadas pelos
indígenas Xukuru-Kariri, habitantes no Município de Palmeira dos Índios no estado de
Alagoas, mas especificamente focalizar as práticas cotidianas de reelaborações,
apropriações e adaptações que foram empregadas ao longo da História. Tomando como
fundamentação teórica as abordagens sobre o conceito de resistência expresso por
Certeau (1998) e James Scott (2002) que afirmaram a resistência como algo construído
cotidianamente diferindo de uma resistência armada e direta ou confronto aberto. As
reflexões também foram alicerçadas nas contribuições de alguns pesquisadores
vinculados a chamada história indígena como John Monteiro (1999), Maria Regina
Celestino de Almeida (2010), Silva Junior (2013), dentre outros.
Palavras-chaves: História Cultural; Indígenas; Invisibilidade; Resistência.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A história dos povos indígenas foi marcada por um grande impacto cultural no
processo de colonização. O contato com o europeu desestabilizou o sistema cultural
indígena, com a introdução de novos costumes, língua e o propósito de integração
forçada tornou-se necessário resistir para manter a cultura indígena.
Durante muitos séculos esses grupos indígenas foram vítimas de inúmeros atos
de violência, desde as físicas às psicologias, no entanto não podemos reduzi-los apenas
a seres vitimados. Os índios a partir de sua própria percepção de mundo estiveram
mobilizados e resistiram por meio de práticas cotidianas de invisibilidade, reelaborações
e adaptações às investidas dos não índios em torná-los assimilados.
Desse modo, fez-se necessário uma revisão bibliográfica sobre como esses
grupos eram referenciados nos escritos de historiadores e romancistas, bem como a
introdução dos indígenas como sujeitos na história. Durante séculos os índios estiveram
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à margem da História Oficial por serem considerados povos sem história, uma vez que
viviam ainda na ―selvageria‖ e não havia indìcios de grandes feitos que os levassem ao
patamar da civilização e assim negaram a sua participação na escrita da História.
A outra justificativa para a exclusão do índio da História era a falta de fontes
escritas que permitissem retomar com veridicidade o passado. O constante diálogo com
a antropologia permitiu que a História se abrisse e compartilhasse a oralidade e a
memória como fonte para a investigação histórica.
A História Cultural vem contribuir para que novos paradigmas e abordagens
sejam repensados e imbricados na pesquisa. O diálogo com outras disciplinas como a
psicologia, a linguística e principalmente com a antropologia a partir da década de 1970
possibilitou uma amplitude nos temas, nas fontes e nas metodologias aplicadas,
representando ―a constituição de novos territórios do historiador através da anexação do
território de outros‖ (CHARTIER, 1990, p. 14).
A escola dos Annales francesa através de Marc Bloch e Lucien Febvre
proporcionou essa interdisciplinaridade e abriu espaços para novas conjecturas
contribuindo para a renovação da historiografia e criando a denominada ―Nova
História‖ que vai se debruçar em todas as atividades humanas e sujeitos sociais, indo
além da política e da narrativa dos fatos heroicos e da elite.
Os historiadores abandonaram os tradicionais relatos históricos de líderes e
instituições políticas direcionando a atenção para as investigações de toda composição
social e da vida cotidiana de operários, criados, mulheres e grupos étnicos (HUNT,
1992). Segue-se a proposta de uma História Total voltada para todos os campos
historiográficos, distanciando-se da ideia de totalidade defendida pelos positivistas.
Roger Chartier fazendo parte da quarta geração dos Annales defende que ―a
história cultural, tal como a entendemos, tem por principal objecto identificar o modo
como em diferentes lugares e momentos uma determinada realidade social é construída,
pensada, dada a ler‖ (1990, p. 17).
A partir das conjunturas da História Cultural poderemos compreender como as
comunidades indígenas se organizam e se percebem como grupos coletivos que além de
culturais, são sociais e políticos, bem como refletir quão esses indivíduos são notados e
representados pela sociedade que os cerca.
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Não basta mais caracterizar o índio histórico simplesmente como vítima que
assistiu passivamente à sua destruição ou, numa vertente mais militante,
como valente guerreiro que reagiu brava, porém irracionalmente à invasão
europeia. Importa recuperar o sujeito histórico que agia de acordo com a sua
leitura do mundo ao seu redor, leitura esta informada tanto pelos códigos
culturais da sua sociedade como pela percepção e interpretação dos eventos
que se desenrolavam (MONTEIRO, 1999, p. 248).
Percebe-se que através de práticas diárias os indígenas por meio de sua própria
interpretação de mundo conseguiram resistir e driblar as investidas dos colonizadores
em relação aos costumes, religião e trabalho forçado que lhes eram impostos ao longo
dos séculos.
Certeau (1998) representou bem essas concepções quando trabalhou em sua
obra A Invenção do Cotidiano as formas como as pessoas que estiveram anônimas na
História construíram, através da arte do fazer, mecanismo de ressignificação e
acomodação de objetos que constituíam novos interesses. Pensando como o ler,
cozinhar, fazer compras, assistir davam suporte para entender a sociedade a sua volta
proporcionando formas de resistir à imposição de uma cultura ambivalente.
Seguindo a análise de Certeau, o conceito de bricolagem ―supõe que à maneira
dos povos indígenas, os usuários ‗façam uma bricolagem‘ com e na economia cultural
dominante, usando inúmeras e infinitesimais metamorfoses da lei, segundo seus
interesses próprios e suas próprias regras‖ (1998, p. 40).
O autor difere e analisa o conceito de estratégias e táticas ―a estratégia é o
cálculo das relações de forças que se torna possível a partir do momento em que um
sujeito de querer e poder é isolável de um ambiente‖ (CERTEAU, 1998, p. 46).
A tática era uma das principais formas de resistência aplicada pelos indígenas
que aguardavam o momento mais propício para as ações, nesse caso alguns indígenas
que fugiam dos colonos ―adotavam táticas de emboscada para atacar as tropas
governamentais e bandeiras de preamento‖ (OLIVEIRA; FREIRE, 2006, p. 84).
Construíam um cotidiano a partir do que absorvia do europeu, reelaborando e adaptando
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a sua cultura, muitos fingiam ter se tornados cristãos, mas ao mesmo tempo praticavam
seus rituais.
Em outros momentos negavam-se trabalhar para assim desestabilizar os
colonos que não conheciam o território. Maria Regina Celestino de Almeida (2017) com
base em John Monteiro afirma que somente as Capitanias de Pernambuco e São Vicente
tiveram êxito, porque os portugueses tiveram os índios como aliados, deve-se lembrar
que essas alianças eram feitas com objetivo próprio, poderia ser um emprego, proteção,
melhorias na condição de sua vida e de seus familiares entre outros privilégios,
entretanto nem sempre esses acordos eram consolidados.
É uma resistência que se refere a uma adaptação e a uma reelaboração
diferindo de uma resistência armada como citou, apropriando-se da concepção de Steve
Stern, Maria Regina Celestino de Almeida.
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A maioria das formas que essa luta toma cessa ao ser coletivamente
desafiada. Aqui tenho em mente as armas comuns dos grupos relativamente
sem poder: fazer ‗corpo mole‘, a dissimulação, a submissão falsa, os saques,
os incêndios premeditados, a ignorância fingida, a fofoca, a sabotagem e
outras armas dessa natureza (2002, p. 11-12).
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passaram a ser representados pela elite oligárquica por meio de uma imagem deturpada
e excludente.
Segundo Roger Chartier em seu livro A história Cultural: entre práticas e
representações, ―as representações do mundo social assim construìdas, embora aspirem
a universalidade de um diagnóstico fundado na razão, são sempre determinadas pelos
interesses de grupos que as forjam‖ (1990, p. 17) e ele continua,
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Kariri que eram marginalizados e ―empurrados‖ cada vez mais para a região serrana da
cidade.
Com a promulgação da Lei de terras em 1850 definindo que a terra só poderia
ser adquirida por meio da compra e venda, com a extinção oficial dos aldeamentos
indígenas em Alagoas no ano de 1872 tornando as terras devolutas e a entrega desses
territórios aos municípios com a Lei de 1887, os índios se dispersaram buscando novas
formas de resistências que lhes assegurassem a sobrevivência em meio à sociedade
envolvente. O processo de extinção dos aldeamentos, iniciado com a Lei de Terras de
1850, teve como resultado mais imediato a proletarização dos índios, pois, uma vez
desprovido da propriedade da terra, foram forçados a migrar para as cidades a fim de
vender sua força de trabalho, engrossando o contingente de mão de obra urbana
disponìvel, tal processo foi analisado por Silva Júnior (2013) como a ―proletarização
étnica‖.
Nesse período, o índio passou a silenciar a sua história e a negar sua identidade
étnica, pois quem se afirmasse como indígena estava fadado a enfrentar represálias,
desse modo, os indígenas passam a se camuflar ao se dispersar na sociedade, adaptando-
se ao meio urbano em que estavam inseridos, atribuindo-lhe seus próprios significados.
E precisaram emudecer; calaram-se para evitar que suas expressões
socioculturais fossem denunciadas, perseguidas por meio das imposições e com o
processo de integração forçada. Assim, os indígenas tiveram que ressignificar suas
expressões socioculturais, a exemplo da ‗Dança do Toré‘ que foi reelaborada para ser
realizada no novo ambiente em que os indígenas habitavam.
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Artigo 231 da Constituição Federal de 1988 afirma que devem ser ―reconhecidos aos ìndios sua
organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que
tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus
bens‖.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CERTEAU, Michel de. A invenção do Cotidiano: artes de fazer. 3ª ed. Petrópolis, Rio
de Janeiro: Editora Vozes, 1998.
HUNT, Lynn. Apresentação História, Cultura e Texto. In: HUNT, Lynn. A nova
história cultural. São Paulo: Martins Fontes, 1992, p. 01-29.
MARTIUNS, Karl Friedrich Von; RODRIGUES, José Honório. Como se deve escrever
a História do Brasil. Revista de História de América, Nº 42 (Dec., 1956), p. 433-458.
MONIOT, Henri. A história dos povos sem história. In: LE GOFF, Jacques; NORA,
Pierre. (Orgs.). História: novos problemas. Tradução Theo Santiago. 4ª ed. Rio de
Janeiro: Francisco Alves, 1995, p. 99-112.
MONTEIRO, John Manuel. Unidade, diversidade e a invenção dos índios: entre Gabriel
Soares de Sousa e Francisco Adolfo de Varnhagen. Revista de História, número 149,
2º semestre, 2003, p. 109-137.
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RESUMO
No século XV, após ter sofrido várias derrotas militares, a estratégia portuguesa
na África Central foi usar o máximo de exploração econômica com o mínimo de
ocupação territorial, com feitorias e fortalezas localizadas em pontos importantes na
costa africana. No século XVI, Portugal manteve seu comércio negreiro negociando
com os reinos e chefes locais africanos, através dos lançados 218, e realizando várias
alianças políticas e comerciais com diversos grupos, tentando criar uma rede de
subordinação, pois onde não houve negociações havia a imposição militar por parte dos
portugueses e seus aliados. Essa situação se modificou com as invasões holandesas no
Norte do Brasil em 1630, controlando a produção açucareira, e posteriormente a invasão
na costa africana, em que conquistaram Angola em 1641, controlando o fornecimento
de escravos da África atlântica para o Novo Mundo.
218
Agentes na sua maioria formados por mestiços. Os lançados ou pumbeiros trabalhavam negociando
com os grandes chefes tribais ou reis africanos. Durante um tempo, internavam-se no interior da África-
central, trocavam os escravos por tecidos, vinho e objetos de quinquilharias, voltando com uma centena
de escravos para serem negociados com os agentes no litoral africano.
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D. Sebastião cria em 1571 a capitania de Angola, além de não ter nenhum custo
para portugal, pois os moldes da capitania era de acordo com o modelo dos
exclusivismo privado das primeiras capitanias no Brasil, D. Sebastião deu consessão
de terras que não pertenciam a Coroa portuguesa, e sim aos reis africanos. A capitania
foi estabelecida do Rio Dande ao Rio Cuanza, e se estendia trinta e cinco leguas da
costa (COSTA E SILVA, 2011, p. 662). Chegando em Luanda em 1575 com um grande
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numero de soldados, marinheiros, artíficis, além de alguns jesuitas, Dias Novaes tentou
estabelecer a colonização portuguesa na África. De início ele teve dois problemas, o
primeiro é que já havia comunidades portuguesas em Luanda, advindas de São Tomé,
grupos de comerciantes que não gostaram da idéia do donatário ser o senhor econômico
de terras que já eram influenciadas por eles. Esses grupos se espalharam pela África
Central, muitos deles indo para a corte de Ndongo, onde venderam informações valiosas
sobre os portugueses recém chegados. O segundo foi justamente o reino de Ndongo e
seus vassalos que não permitiram essa tomada territorial facilmente. Em 1579, Dias
Novaes e o rei de Ndongo entram em conflito, alguns dos vassalos do Ngola se aliaram
aos Portugueses como Muxima, Cambanbe, Quincunguela e Massangano (COSTA E
SILVA, 2011, p. 663). Dias Novaes assim que saiu da Ilha de Luanda e foi para o
continente, investiu na construção de igrejas, casas, e fortificações, evidenciando que
tinha vindo para ficar e não apenas adquirir escravos, como acontecia na região desde
1526. Na política expansionista, Dias Novaes usou de grande violência, espalhando
pânico entre as populações, decapitou os chefes tribais que capturou, saquiou as vilas e
às queimou. O Rei do Ndongo possuia um grande execito, e mesmo com o caos
estabelecido por Novaes, o conflito teve perdas e ganhos para os dois lados. Com a
União Iberica em 1580, Felipe I de Portugal, retira o privilégio de Dias Novaes,
extinguindo a capitania hereditária, a qual Dias Novaes deixa de ser um donatario e
passa a ser um funcionario real, ou seja, o governador, isso fez com que as ações de
Novais sejam submetidas a autorização de Felipe I (SERRÃO, 1996, p. 144-145),
mesmo assim Novaes não desistiu da expansão até a sua morte em 1589, Sendo
substituído por Luis Serrão. No período filipino, a colonia de Angola obteve um modelo
administrativo semelhante ao da América, era administrado por um governador
substituído a cada três anos, centrado na cidade de São Paulo de Luanda 219, havia o
conselho municipal, a câmara, e capitães militares que administravam as fortalezas e
suas redondesas, houve uma relação de vassalagem entre os sobas 220 e os governadores,
e o tributo dessa relação era pago com escravos. O interesse filipino em manter a
colonia vinha de noticias sobre grandes minas de ouro na Áfriaca Central, depois de
muitas investidas a Coroa Ibérica certificou-se da falsidade das informações,
diminuindo a expansão e se preocupando em investir no tráfico de escravos (SERRÃO,
1996, p. 146). No início do século XVII, a capitania de Angola passou por uma série de
219
Fundada em 25 de janeiro de 1576.
220
Chefes tribais na África central.
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221
Asiento foram licenças ou concessões vendidas pela Espanha a negociantes de escravos na África
Central, na sua maioria de famílias portuguesas.
222
Chega ao poder eliminando os outros pretendentes a Coroa, sobretudo um filho de sua irmã Nzinga.
223
Ginga, Njinga ou Jinga, foi convertida ao catolicismo, sendo batizada e ganhando o nome cristão de
Ana de Souza.
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Neste mesmo ano o governador Fernão de Souza declara guerra contra Nzinga que
durou todo o seu mandato. A guerra se estabeleceu entre perdas e ganhos, alianças e
rompimentos, até 1629, onde as tropas lusas encurralaram Nzinga, onde ela foi vencida
mas não capiturada. Nesse momento assumiu em Ndongo o Ngola Ari, batizado de
Felipe, declarado rei do Ndongo, onde governou de acordo com os interesses lusos. No
início de 1630 Nzinga se aproveitou de uma crise dinástica no reino de Matamba e com
seu exército invadiu o reino e se proclama soberana, tornando o reino de Matamba um
reino poderoso e antilusitano. Esse reino se tornou um grande incomodo para a
capitania de Angola, sendo um concorrente no tráfico de escravos, e influenciando os
outros reinos contra Portugal. Com a restauração portuguesa em 1640, a ordem de
Portugal foi de negociar, por tanto D. João VI em 1641, ordenou a devolução do reino
Ndogo a Nzinga. Mas Já tinha sido tarde, pois os holandeses invadiram Angola no
mesmo ano (VANSINA, 2010, p. 663-664).
Os conflitos entre a capitania de Angola com o reino do Ndongo e seus vizinhos,
como também com Nzinga, permitiram que o reino do Congo se reestruturasse, se
tornando um concorrente dos portugueses no tráfico de escravos, negociando no porto
de Pinda com franceses, ingleses e sobretudo holandeses. Essa concorrência e a
influência dos outros Estados europeus, fez com que a política do Congo fosse de
monopolizar o tráfico de escravos na África Central, fazendo com que a capitania de
Angola fosse um inimigo a ser eliminado. Em 1641 assumiu no Congo o rei Garcia II,
que investiu no enfraquecimento da influencia de Portugal na região. Com a chegada
dos holandeses na África central todos os problemas dos portugueses serão
potencializados (VANSINA, 2010, p. 664).
564
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224
Em uma das lutas de resistência Souto Maior fez prisioneira a irmã da rainha Nzinga, D. Barbara, que
já tinha sido prisioneira anteriormente.
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Janeiro, a primeira pela produção açucareira e a segunda pelo comercio de escravos para
as minas de Prata na América espanhola, através do porto de Buenos Aires. Para
contrariar essas adversidades e com o objetivo de reconquistar Angola e expulsar os
holandeses, foi preparada uma expedição para reconquistar Angola. Para comandá-la foi
nomeado Salvador Correia de Sá e Benevides 225, que se tornou governador de Angola,
de 1648 a 1651.
A reconquista era dificultada não apenas pela peculiar situação diplomática em
que se achava Portugal ante os Países Baixos, em guerra no Nordeste do Brasil, como
pelas dificuldades econômicas em que o Reino se encontrava, na iminência da Guerra
da Restauração, e pela logística envolvida. Nesse contexto, um dos principais
interessados, foi Salvador Correia de Sá, que tive vários agentes comerciais envolvidos
com o tráfico de escravos entre a África, o Rio de Janeiro e Buenos Aires. Estava
disposto a romper com o comercio bipolar holandês entre Luanda e Recife.
A reconquista de Angola resultou na rearticulação do abastecimento de escravos
para a Bahia, e principalmente o Rio de Janeiro, servindo como conexão para Buenos
Aires e as minas de prata em Potosí. Salvador de Sá deu impulso a diversas medidas
administrativas, favorecendo o desenvolvimento de Luanda. A expulsão dos holandeses
na África Central inaugura uma nova fase na administração de Angola, marcada pela
governança de homens extremamente vinculados aos seus interesses particulares
enraizados principalmente na América portuguesa.
Conquistada a vitoria perante os holandeses, o desafio foi retomar o tráfico de
escravos, para tal, Portugal teria que recuperar o seu prestígio e as alianças com os
reinos da África central, principalmente o reino de Matamba da Rainha Nzinga, e o
reino do Congo com o rei Garcia II, e os sobas de várias tribos que foram submetidos
pela força ou por alianças políticas com relação de vassalagem. O período de quase oito
anos de ocupação holandesa em Angola favoreceu a política antilusitana, a qual os
reinos dessas regiões se aliaram aos holandeses, e tinham como intenção expulsar os
portugueses da África Central com intuito principal de serem os senhores no
fornecimento de escravos diretamente com o Novo Mundo. Esse foi o desafio
enfrentado pelos lusos nessa nova fase de ocupação em Angola, implantar uma
superioridade política para eliminar os concorrentes no negócio negreiro.
225
Antes de restauração de Angola, Salvador de Sá foi Governador da Capitania do Rio de Janeiro de
1637 a 1642.
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226
O capuchinho italiano João António Cavazzi de Montecúccolo esteve em Angola, no Ndongo e em
Matamba de 1654 a 1667, com a morte de Gaeta, foi confidente da rainha Nzinga, sua obra “Descrição
história dos três reinos do Congo, Matamba e Angola”, apesar do profundo etnocentrismo do autor,
para Cavazzi o reinado de Nzinga antes da nova conversão era um “verdadeiro” inferno, com
transexualismo, haréns de rapazes, infanticídio, antropofagia, feitiçaria e luxuria.
227
Mestre-de-campo é equivalente a coronel de infantaria, tem a jurisdição civil e criminal do seu terço
com apelação ao general (BLUTEAU, 2000, p. 457).
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Foi muito conveniente que enquanto João Fernandes Vieira governasse Angola,
André Vidal de Negreiros governasse Pernambuco228, as duas costas atlânticas com o
mesmo objetivo, aumentar a produção açucareira através de uma bem sucedida forma
de governar Angola baseado no trato negreiro.
Querendo controlar o mercado de escravos, João Fernandes Vieira realizou
várias medidas para fortalecer militarmente a sua administração, logo de inicio ele
colocou gente sua para os cargos administrativos e militares, ocasionando assim uma
demanda de colonos pernambucanos para gerir seu governo, principalmente os militares
que lutaram na expulsão holandesa (MELLO, 2000, p. 330-331), pois o interesse de
Vieira foi de expandir o território português no interior da África central, recuperar as
alianças e submeter à maior ameaça que foi o Reino do Congo, além de tentar eliminar
os intermediários no trato negreiro, pois na sua perspectiva não se negociava com
nativos e sim os conquistava. Para tanto, os militares pernambucanos foram muito úteis,
pois já tinham experiência em batalhas no ultramar. Vieira pede autorização a Coroa
para transferir grande parte da artilharia tomada dos holandeses para Angola.
Entre suas medidas, estavam o fortalecimento da região já controlada, como
obras nos portos, ampliando seus cais, restauração e construção de fortalezas e
ampliação do poderio militar. Após esse controle teve inicio a expansão territorial,
várias regiões foram reconquistadas e outras submetidas pela primeira vez. Conquistou
a região de Ambarca, conseguiu a vassalagem das terras de Libolo e Quissama,
recuperou o porto de Benguela, criou rotas terrestres seguras, recuperou o rio Cuanza e
o trato salineiro, além de iniciar negociações para aliança política com os guerreiros
Jagas do reino de Matamba que foram governados pela rainha Nzinga. Essas conquistas
arrecadaram um grande número de escravos para o Brasil, principalmente Pernambuco.
Suas medidas restauraram parte do prestigio português que havia sido perdida no
período holandês e pela influência do Reino do Congo (SOUZA, 2013, p. 76-78).
Com o Reino do Congo Vieira foi mais cauteloso, usou de muita negociação,
pois este Reino era reconhecido pela Santa Igreja Católica, tinha seu bispado próprio e
muita influência com Roma e Madri. Nas negociações Vieira exigiu o cumprimento dos
tratados anteriores, e enquanto a resposta não vinha, atacou os vassalos fieis ao Congo.
Depois de muitas ameaças de invasão ao território congolês, em 1659, Vieira conseguiu
228
Inicialmente seu mandato seria de 1657 a 1660, mas em 1660, Negreiros requer a Coroa que lhe
mantenha no cargo até o fim do mandado do governador de Angola, João Fernandes Vieira, em 1661.
(AHU-ACL-CU-015, Cx. 7, D. 620).
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Com o fim do seu governo e sem seu principal objetivo conquistado, submeter o
reino do Congo aos portugueses, Vieira teve a oportunidade de ter continuidade na sua
política expansionista através do seu sucessor, André Vidal de Negreiros. Na sua
chegada, em 1661, Negreiros passou alguns meses com a companhia de Vieira, onde o
mesmo fez questão de lhe passar todo o planejamento expansionista.
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Para Negreiros também foi interessante a expansão para o interior africano, pois
tinha feito vários acordos com Vieira, que tinha vários agentes envolvidos no tráfico.
Além de que, tambem era um senhor de terras na América portuguesa, onde o sistema
escravista foi muito forte. Com isso a política implantada por Vieira teve continuidade,
só que desta vez o intuito maior foi a invasão ao Reino do Congo, submetendo-o a
Portugal, aumentando ainda mais o controle sobre a região e o tráfico de escravos. Mas
essa medida não foi fácil, pois a invasão tinha que ser justificada, principalmente em
Roma. Para a igreja católica, o Congo era uma porta aberta para uma melhor entrada do
cristianismo nessa região africana, uma vez que os próprios africanos a pregavam. Outro
problema enfrentado por Negreiros foi a determinação de Portugal, de 1664, que
cancelava as investidas militares no interior africano, dando prioridade a proteção da
costa atlântica, sobretudo Luanda, pois havia muita ameaça de invasões por parte de
outros países interessados no comercio escravista.
O governo de Negreiros teve vários momentos de desentendimento com a Coroa
portuguesa, principalmente pela sua insistência na invasão ao Congo. Utilizando o seu
prestigio ele seguiu em frente e usou de várias estratégias para criar justificativas de
avanço militar no território congolês. Denunciou o Rei do Congo, Mulanza, de subtrair
terras e metais preciosos de Portugal, e declarou refutação ao caráter cristão do Congo,
relatando que o cristianismo era apenas uma fachada para agradar Roma, e os cultos
pagãos sempre estavam presentes nos rituais cristãos. Essas denúncias foram chamadas
de cisma dos cônegos congoleses o que causou um grande descontentamento ao Rei
Mulanza, a qual declara guerra a Angola portuguesa (ALENCASTRO, 2000, p. 291-
292).
Com a guerra declarada por Mulanza, foi mais fácil para Negreiros ter o apoio
que precisava, logo tratou de montar a estratégia para vencer a guerra contra o Congo.
Uma grande vantagem para Negreiros foi a aliança com o Reino de Matamba,
governado pela rainha Nzinga e os guerreiros Jagas. Vários conflitos se estenderam no
interior africano, mas a guerra só teve seu desfecho com a batalha de Ambuíla em 1665.
O exercito de Negreiro foi composto por tropas luso-afro-brasílicas. Adquiridas nos
conflitos contra os holandeses em Pernambuco, na luta contra quilombos e até mesmo
nos conflitos com indígenas, as tática de guerrilhas brasílicas foram de fundamental
importância para a vitória nesse conflito (CADORNEGA, 1940, p. 219-222).
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CADORNEGA, Antonio de Oliveira de. História geral das guerras angolanas, Tomo
II. Lisboa: Agência geral das colônias, 1940.
MONTECÚCCOLO, Pe. João António Cavazzi de. Descrição histórica dos três reinos
do Congo, Matamba e Angola. Volume 2. Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar,
1965.
LANGFUR, Hal. The forbidden Lands. Stanford: Stanford University Press, 2006.
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VANSINA, J. O reino do Congo e seus vizinhos. In: OGOT, Bethwell Allan (org.).
História Geral da África Volume V. Brasília: UNESCO. 2010.
EDSON SILVA
UFCG
[email protected]
RESUMO
Este texto tem como objetivo problematizar a forma como os índios Xukuru-Kariri são
representados no município de Palmeira dos Índios-AL, considerando a romantização e
mitificação nos escritos, imagens e símbolos oficiais, vistos como formas de manipulação por
parte das oligarquias locais, que exaltam e defendem utilizações de imagens do índio, frente aos
conflitos fundiários que ocorrem na região. Realizamos a pesquisa a partir da análise dos
escritos de Luiz Barros Torres e Ivan Barros, principais memorialistas de Palmeira dos Índios;
cujas produções compõem a ―história oficial‖ e influenciaram na criação de aspectos
importantes, a exemplo da bandeira e do hino municipal. Nossas reflexões baseiam-se em
estudos de autores como João Pacheco de Oliveira (1994), Adelson Lopes Peixoto (2013), Eric
Hobsbawn (1997), Roger Chartier (1990), Stuart Hall (2015), dentre outros.
Palavras-chave: Imagens; Índios; Representação.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
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(2006), demonstra como a memória de um dado povo, em uma dada época, está sujeita
à eventuais disputas; visto que a produção das narrativas históricas ou versões oficiais
envolvem essa dinâmica seletiva, onde o esquecimento é realizado por grupos
dominantes que manipulam tal produção.
Em vista disso, e considerando que o historiador possui como sua função dar
voz ao não-dito (CERTEAU, 1982), este trabalho se propõe a descrever como essa
imagem é construída e utilizada. Para tanto, será necessário analisar a construção da
―identidade palmeirense‖, entendida como resultado de tradições inventadas
(HOSBSBAW e RANGER, 1997) que moldam a identidade regional (HALL, 2015) e
possibilitam a imaginação dessa comunidade (ANDERSON, 2008).
O LÓCUS DA PESQUISA
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histórico. Para esses escritores, sendo Luiz B. Torre e Ivan Barros os mais importantes,
a participação dos Xukuru-Kariri na formação do município se restringe unicamente ao
momento de fundação, quando se ergueu um povoamento em suas terras; os índios são
descritos a partir de uma visão mítica, que os representa como seres idílicos, como
personagens deveras importantes, porém que ficaram no passado.
A elaboração do passado palmeirense é feita a partir da concepção dos grupos
dominantes; predomina a sua narrativa, criando uma identidade coletiva que tende a
privilegiar acontecimentos ligados à elite, ao passo que silencia a resistência indígena e,
portanto, tende a fixar no imaginário local a imagem de um índio mitológico e
romantizado, em detrimento dos índios históricos, que passaram por um agressivo
processo de expulsão e negação cultural e social.
Em face da disseminação de estereótipos e imagens deturpadas dos Xukuru-
Kariri, os índios da atualidade, a partir de comparações com os descritos pela história
oficial do município, passam a serem vistos, por grande parte da população, como
empecilhos ao crescimento local e como causadores dos conflitos fundiários existentes
no município.
Os índios descritos por Ivan Barros são seres ingênuos e passivos que aderiram
prontamente ao plano catequético de Frei Domingos de São José229, fazendo da ―santa
obra‖ uma empreitada ―empolgante‖, a partir da qual foram ―conquistados‖ e
―pacificados‖. É notável a presença da influência do mito do ―bom selvagem‖ no seu
relato, o qual descreve ìndios ―felizes‖ que aprendem a praticar a agricultura;
Está presente também, em seus escritos, a ideia de inferioridade cultural dos
índios diante da civilidade do não indígena. Não esqueçamos de destacar o exotismo e o
estranhamento presentes nos escritos do autor, que insiste em evidenciar os estranhos
costumes indìgenas, como o toré, que é realizado em ―trajes bizarros‖ e num ―estranho
culto‖. Segundo o autor, ―a indiada não resistiu à evolução voraz da civilização branca‖;
229
Ambos os autores consideram como marco da formação de Palmeira dos Índios o ano de 1770, data na
qual Frei Domingos de São José chega ao território dos Xukuru-Kariri, com o objetivo catequizá-los,
funda o aldeamento e uma igreja, na planície da região, propiciando o início do processo de migração
para a área.
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foram esquecidos depois da extinção de sua aldeia, onde antes ―viviam afastados, numa
promiscuidade desumana, num canto de terras, e assistiam o próprio ocaso da raça‖
(BARROS, 1969, p. 25).
Em se tratando de comparações e da definição dos índios como seres
decadentes, cabe citar o próprio Luiz B. Torres, que partilhava de tal ideia e inclusive a
expos em alguns artigos publicados em jornais, como o texto intitulado ―Índios Xucuru
Kariri, uma raça em extinção‖ publicado em 31 de março de 1977 no Jornal de Alagoas,
no qual apresentou os Xukuru-Kariri como um povo que não mais falava sua língua
original, não dispunha da posse de terras suficiente para sua sobrevivência e que possuía
―pouca tradição‖. Descreve-os como decadentes, que ―conservam‖ um pouco do ritual
religioso tradicional, mas que estavam numa situação denominada como ―crepúsculo de
uma raça‖.
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apaixonada por seu primo Tilixi; a proximidade entre os dois primos fazia com que o
cacique, com ciúmes, os vigiasse constantemente. Certo dia, durante uma festa tribal,
Tilixi, ao receber de sua prima um pouco de bebida fermentada, beijou Txiliá; ao ver tal
cena, o cacique, enfurecido, condenou Tilixi a morrer por inanição, preso ao solo, longe
do acampamento, e exposto ao sol.
Ao ouvir os gritos de socorro, proferidos por seu amado, Txiliá pede a Frei
Domingos de São José que lhe de a cruz que ele carregava no pescoço, para que pudesse
―plantá-la ao lado do moribundo, para que dela nascesse uma palmeira, debaixo da qual
ele pudesse sofre menos‖ (TORRES, 1973, p. 54). Não conseguindo convencer a jovem
índia a desistir, o padre entregou-lhe a pequena cruz. Contrariando a proibição do
cacique, Txiliá vai ao encontro de seu amado, vai ao encontro de Tilixi, nesse momento,
é atingida por uma flecha, atirada pelo ciumento cacique.
Ainda segundo a lenda, no local em que o casal morreu nasceu uma ―frondosa
palmeira‖, tomada por Frei Domingos como um milagre, o sìmbolo do mais puro gesto
de fé. A ―confiança no onipotente poder de Deus‖, demonstrada por Txiliá, fez com que
o padre reunisse as forças necessárias para a edificação do município. Segundo Torres;
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A influência da lenda fundacional criada por Torres, vai além da leitura nas
escolas do município na semana do dia do índio. Essa estória inspirou a produção da
bandeira do município230, tendo o casal protagonista da lenda desenhado em seu brasão,
sendo a lenda ratificada nesse ícone oficial e no próprio hino231 do município, que foi
composto sob influência da lenda; os símbolos máximos da identidade de Palmeira dos
índios são inspirados numa ficção. Como afirma Hobsbawm (1997), as tradições são
impostas através da repetição e da perpetuação de determinado discurso por parte da
camada socialmente superior, em uma sociedade organizada e hierárquica.
A visão sobre os índios Xukuru-Kariri, lendários e idílicos, concebida por Luiz
B. Torres não se restringiu a seus escritos. A repercussão de sua lenda fez com que fosse
projetada uma imagem do índio como ser idealizado, lendário e puro; possuidor de
certas características físicas e culturais que não mais são encontradas nos que
atualmente vivem na região, tendo em vista o processo histórico de opressão pelo qual
passaram. Dessa forma, essa representação deturpada é muitas vezes tomada como
verdade, criando assim um modelo de índio deslocado da realidade sócio-histórica,
substituindo a realidade pela imaginação, o que corresponde a tomar ―os signos visìveis
como provas de uma realidade que não o é.‖ (CHARTIER, 1990, p.22).
Nessa relação de símbolos oficiais tomados como referência, o que prevalece
sobre o povo Xukuru-Kariri em Palmeira dos Índios não é a opinião ou a memória
construída historicamente a partir do contato social entre a população indígena e não
indígena, mas sim a imagem construída por um grupo isolado, representado um
intelectual que a moldou segundo sua visão e interesse próprio.
230
No dia 10 de dezembro de 1968 entrou em vigor a Lei Municipal Nº 691 que instituiu o hino oficial e
os símbolos do município de Palmeira dos Índios. Fonte: Acervo pessoal de Luiz B. Torres – Núcleo de
Estudos Políticos, Estratégicos e Filosóficos (NEPEF) – Universidade Estadual de Alagoas, Campus III –
Palmeira dos Índios/AL.
231
O hino de Palmeira dos Índios, escrito por Luiz B. Torres e José Gonçalves, canta acidade como
―nascida de uma cruz‖ e como possuidora de uma ―origem secular nos heroicos Xucurús de bravura e fé
sem par‖; referências à lenda criada por Torres. Fonte do hino: http://apalca.com.br/hino-de-palmeira-
dos-indios/
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
232
Segundo Maria Regina Celestino de Almeida (2010), são três as imagens dos índios no século XIX: a
de ìndios ―idealizados do passado‖, a dos ìndios como ―Bárbaros do sertão‖ e a dos ìndios como
―degradados‖ das antigas aldeias.
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conflitos fundiários fazem parte de sua história (desde sua fundação), influenciando na
forma como eles são vistos e representados. Tal imagem fortifica o discurso dos
posseiros, que aproveitam a comparação entre os índios atuais e os idealizados para
evocar estereótipos e preconceitos que sirvam para negar-lhes a identidade e assim o
direito à posse das poucas terras que ocupam. A presença indígena só é reconhecida
quando tal fato é conveniente à composição de uma imagem particular do município.
A história possui um alto valor, o passado é uma construção em disputa, cujo
monopólio permite que determinado grupo se mantenha na posição de domínio,
justificando suas ações a partir da negação e do silenciamento de sujeitos, de
acontecimentos ou mesmo de grupos. As narrativas históricas dominantes ou as versões
oficiais tendem a ser tecidas em meio a disputas de memórias e de discursos, por isso, o
passado deve ser constantemente retomado e analisado, visto que é fruto de seleções de
acontecimentos e versões moldadas a partir de interesses de determinado grupo em
detrimento do esquecimento de outro.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. 2. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1998.
GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar, escrever, esquecer. São Paulo: Editora 34,
2006.
HOBSBAWN, Eric; RANGER, Terence. A Invenção das tradições. 2. ed. São Paulo:
Paz e Terra, 1997.
585
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OLIVEIRA FILHO, João Pacheco de. Uma etnologia dos "índios misturados"? Situação
colonial, territorialização e fluxos culturais. In: Mana, vol.4, n°.1, p.47-77, Abr. 1998.
TORRES, Luiz B. Índios Xucuru Kariri, uma raça em extinção. Jornal de Alagoas.
Alagoas, p.11, 31 de Mar. De 1977.
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COORDENADORES:
MARIA DO SOCORRO RANGEL & RODRIGO CEBALLOS
INTRODUÇÃO
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indústria. Isso acontece porque o produto final, agora, durante sua produção passa,
através de etapas, pelas mãos de todos os trabalhadores da fábrica.
Para que as atividades na indústria fossem realizadas a vigor e de acordo com o
desejo do patronato foram criados os regulamentos, as regras da empresa a serem
seguidas pelos operários. As exigências contidas neles era uma forma de controle e
repressão, onde aos próprios operários não era permitido opinar sobre tais regras. ―O
regulamento, portanto, é a expressão da vontade patronal, e os operários não têm
nenhuma participação nele‖ (PERROT, 2008). Neles havia multas por falta, por causar
danos nas máquinas, por brigas e falatórios.
A carga horária de trabalho era extensa e exaustiva, segundo René Remond (1974)
―As condições de trabalho são as mais duras possíveis, não existe qualquer limitação de
tempo‖. Chegava-se a trabalhar dezesseis horas diárias, sem tempo para descanso, até
mesmo no sábado e no domingo. As condições de higiene e segurança também eram
precárias, não havia nada, nem lei e nem equipamentos que assegurassem direitos e
prevenissem acidentes. As empresas não assumiam responsabilidade diante de seus
funcionários. Além disso, os salários eram baixos e não fixos, o proletariado recebia a
remuneração que o dono da fábrica acreditava ser necessário. Assim, com a inclusão das
máquinas que substituem as tarefas manuais e em tempos de crise econômica, a situação
piora ainda mais para a classe trabalhadora. Isso porque as máquinas fazem a maior
parte do trabalho, substituindo a mão de obra humana, as crises econômicas causadas
pela busca exagerada de capital através do mercado consumidor, que em determinados
períodos gera superprodução, fazem o valor das mercadorias caírem devido a pouca
procura destas e provocam a demissão dos trabalhadores em grande escala, formando
uma massa desempregada que, assim, com a grande oferta de mão de obra tem o salário
diminuído.
A Historiografia estuda a escrita da história em diferentes visões, todo trabalho que
aborda um fato dentro da história, ao ser analisado, sempre será percebido nele a
prevalência de uma visão historiográfica. O Materialismo Histórico, fundado por Karl
Marx, surge no século XIX, muda a forma como se percebe a história, agora ela passa a
ser vista a partir de influências sociais, políticas e econômicas. Karl Marx (1818, Trier,
Prússia) viveu neste período e dedicou seus estudos a compreender a História Social a
partir dessas estruturas. E assim, sempre observando as sociedades, suas políticas e
modelos socioeconômicos, pode deixar vários escritos sobre as sociedades e suas
estruturas. Partes dos estudos marxistas foram desenvolvidas em sua parceria com
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Frederich Engels, seu compatriota, o Manifesto Comunista (1848) foi uma das obras
dessa parceria. É a partir dessas análises e da observação das revoluções que aconteciam
na Europa que Marx desenvolve ideias em que a classe operária, recém-formada a partir
do aparecimento do capitalismo industrial, se apoia.
Marx juntamente com Engels produziu textos de convocação da classe trabalhadora
à luta. O Manifesto Comunista sendo um deles expõe as características burguesas de
opressão que leva a subordinação do trabalhador que é tratado como mercadoria e
depende do bom desenvolvimento do capital burguês para se manter trabalhando. O
trecho abaixo desta obra aborda essa questão de subordinação da força de trabalho aos
que detém os meios de produção.
Na mesma proporção em que a burguesia, ou seja, o capital, se desenvolve,
desenvolve-se também o proletariado, a classe dos trabalhadores modernos,
que só podem viver se encontrarem trabalho, e só encontram trabalho na
medida em que este aumenta o capital. Esses trabalhadores que são obrigados
a vender-se diariamente são uma mercadoria, um artigo de comércio,
sujeitos, portanto, às vicissitudes da concorrência, às flutuações do mercado.
(MARX e ENGELS, 2003, P.32)
Essa observação a respeito do proletário relacionado ao capital burguês faz-se
entender que para quem possui os meios de produção, esse trabalhador é apenas uma
mercadoria do qual sua força de trabalho precisa se adequar ao sistema capitalista para
se manter no mercado, assim, sendo sujeito a vender esta força por salários mínimos
que permitem apenas ao trabalhador ter sua sobrevivência garantida, mas sem uma boa
qualidade de vida. Diante da economia burguesa o proletário perde seu lado humano
para tornar-se máquina de produção.
As resistências operárias às imposições burguesas são necessárias para que eles não
percam direitos e continuem lutando por condições justas de trabalho que os tornem
menos subordinados ao patrão, conquistando assim maior autonomia no modo de
produção, nos processos sociais e econômicos. Marx tornou possível a visão da história
por um outro ângulo, que permite que o proletariado note que é explorado, mas que
possui força para mudar isso, e mostrar que a história é feita pelas ações de todos os
homens.
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Compreendendo a obra.
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Todas as transcrições das entrevistas estão ipsis litteris, respeitando a identidade e os falares locais do
povo.
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dessa forma, trabalhar no sábado era opcional para os operários. Segundo Laércio
Ivanildo Barros dos Santos, 23 anos: "É 9 horas porque a gente tem 1 hora de almoço
porque a gente, essa 1 (hora) que a gente trabalha é já pro sábado, é a gente trabalha
sempre 1 (hora) pro sábado." (11/09/20016). Assim, como na lei garante 8 horas de
trabalho por dia, essa hora a mais se coloca como hora extra, por lei durante o dia só
podem ser adicionadas 2 horas a mais. Mesmo assim, outros operários afirmaram que
por muitas vezes trabalharam além das horas permitidas na lei, como pode ser visto nos
trechos a seguir.
O normal é pra ser 8 horas, mas nessa área da civil sempre trabalha mais.
Mas ai qualquer hora que passa e sempre passa, ai é hora extra. A gente não
gosta tanto porque tem que a gente ir pra 6 hora né (até as 6 da noite),
cansa, mas no mesmo instante a gente acha bom porque a gente ganha mais.
Mas não é de dizer que é muito bom não que a gente quer, é cansativo, né.
(Francisco de Oliveira da Silva, 24/09/2016)
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agradecido", essa gratidão dele não se refere unicamente a empresa, mas também a um
ser divino, o qual lhe concedeu a graça de trabalhar. O sentimento de subordinação
operária se apresenta em outras falas também, nas quais o trabalhador demonstra sentir-
se oprimido e sem direito a voz.
Na verdade a pessoa se sente bem pequeno porque você não tem voz. O
regulamento não deixa, você tá pra trabalhar e acatar ordem e pronto.
Mesmo tando errado, não importa. Então você se sente o seguinte: to aqui
porque preciso, vou ganhar o meu, defender a minha feira, da minha família,
mas sabeno que você ali, dentro da empresa, você é nada. Mas trabalhador
você pode fazer o que? Ficar calado porque você precisa ganhar, e se você
abrir a boca você vai mandado embora. (Francisco Lucier Ferreira Leite,
25/09/2016)
Eu ganhava em torno de, na base 1.600,00, quase 200,00 reais descontado
do INSS. O tanto de coisa que é tirado do suor do peão, é muita coisa
descontado. Nós trabalha não é só pra gente não, um trabalhador é, é muito
patrão que ele tem, é muita gente pra comer do suor... Um tiquim dali e um
tiquim dali.(Gilberto Unias Pereira, 23/09/2016)
Para a empresa o que importa é a força de trabalho comprada ao operário, a ele
cabe cumprir com sua tarefa de produção, sem poder opinar acerca das decisões
relativas ao seu trabalho, assim, sendo obrigado a acatar as ordens, pois caso o
contrário, ele perde o emprego que é a única fonte de renda. O salário que o trabalhador
recebe vai para gastos com utensílios fundamentais à sobrevivência. Além disso, do
salário que é considerado baixo, ainda há grandes porcentagens de descontos relativos a
seguros sociais, como o INSS, FGTS entre outros, que minimizam ainda mais a
remuneração. Outra reclamação da classe trabalhadora diz respeito ao não depósito do
dinheiro relativo a esses benefícios em suas contas.
Fizemos duas greves, paramos as BRs, sem sucesso, pra pressionar. A gente
fechou a BR 116 duas vezes por conta de que a... Foi mandado embora mil
homens, a firma não quer pagar a esses homens a rescisão de contrato,
pagando apenas o FGTS e liberando os papel pra entrada de seguro
desemprego. FGTS de pessoas que tem 4 anos(De trabalho) que a empresa
depositou mil e poucos reais. (Francisco Lucier Ferreira Leite, 25/09/2016))
Os atrasos de salários e o não pagamento de quantias garantidas aos trabalhadores
por direito, foram os principais motivos de organizações de greves, houve greve
também relacionada a falta de equipamentos de segurança no trabalho, mesmo com a
existência dos técnicos responsáveis pela área. As greves sempre eram acionadas devido
a falta de comunicação da empresa com os funcionários, dessa forma, exigiam
explicações sobre os problemas e o cumprimento do exercício do que é dever da
empresa para com seus funcionários.
A empresa só coloca um engenheiro de segurança e os técnicos de
segurança porque é obrigatório, uma obra não funciona se não tiver a
segurança porque o MI não aceita, né, os órgãos governamentais não
aceitam. Mas é assim, a segurança dentro da empresa, se ela funcionasse era
ótimo, mas o que acontece? A segurança é mandada pelo engenheiro, os
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CONCLUSÃO
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como foi observado, a empresa tendo apoio de outros órgãos como o sindicato,
consegue encontrar formas de burlar os direitos que defendem os trabalhadores. Assim,
podemos notar que a luta por direitos para a classe operária é constante e necessária
para a eficácia dos que já estão garantidos na lei e dos que ainda precisam ser
conquistados.
FONTES DE PESQUISA
Entrevistas:
Laércio Ivanildo Barros dos Santos (Ajudante - Aux. de segurança no trabalho),
entrevistado em 11/09/2016.
José Thiago de Andrade (Carpinteiro), entrevistado em 23/09/2016.
Gilberto Unias Pereira (Pedreiro), entrevistado em 23/09/2016.
Francisco de Oliveira Silva (Carpinteiro), entrevistado em 24/09/2016.
Francisco Lucier Ferreira Leite (Operador de perfuratriz), entrevistado em 25/09/2016.
Sites:
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canteiro-de-obras-da-transposicao-do-sao-francisco-469956.php Acesso em 16/11/2016
https://moodle.ufsc.br/pluginfile.php/934138/mod_resource/content/1/elementos%20b%
C3%A1sicos1.pdf Acesso em 16/11/2016
http://www.adital.com.br/site/noticia2.asp?lang=PT&cod=31077 Acesso em 06/11/2016
http://www.culturabrasil.org/revolucaoindustrial.htm Acesso em 16/11/2016
http://www.direitobrasil.adv.br/arquivospdf/revista/revistav51/ensaios/be1.pdf Acesso
em 16/11/2016
https://www.marxists.org/portugues/manfred/historia/v02/08.htm#c810 Acesso em
16/11/2016
http://www.mi.gov.br/documents/10157/3932290/Mapa+de+Localização+das+Metas_.j
pg/3d54bd57-66bd-41cc-89bf-1b869ce26166?t=1456774020755 Acesso em 05/11/2016
http://www.mi.gov.br/web/projeto-sao-francisco/o-rio-e-seus-numeros Acesso em
05/11/2016
http://www.mi.gov.br/c/document_library/get_file?uuid=261be082-5ac5-43b7-8e8b-
59bb61b1b108&groupId=2054191 Acesso em 16/11/2016
http://www.professores.uff.br/seleneherculano/images/MARX_E_A_CRITICA_AO_C
APITALISMO.pdf
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THOMPSON, E. P. Costumes em Comum. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
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RESUMO
Este trabalho é fruto da participação no projeto de pesquisa ―Inventariando memórias,
partilhando experiências: cultura material e redes familiares na recém-emancipada
cidade de Cajazeiras, PB (1976-1930)‖ e baseia-se na análise de inventários post-
mortem desta cidade com o objetivo de conhecer a sua cultura material, os hábitos de
consumo e as relações sociais e familiares presentes nessa documentação. Entendendo
que uma cidade não se constitui apenas por seu traçado urbanístico, mas sobretudo,
pelas relações que se estabelecem nela, Cajazeiras ganha outros contornos nessa
documentação. Todo elemento, seja este cultural, material, tradicional, etc., pode conter
indícios que em conjunto revelam o aparato por trás da sua constituição e que
possivelmente permanecem até os dias de hoje.
Palavras-chaves: Fonte Documental; Inventários post-mortem; Cultura Material.
233
O presente trabalho está sendo desenvolvido sob a orientação da professora Dr.(a) Viviane
Gomes de Ceballos e minha participação no projeto após a aprovação do mesmo pelo PIBIC
(Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica).
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despesas do inventário, a parte que cabe à viúva e aos herdeiros234. Vale ressaltar que,
eram documentos produzidos apenas por uma parcela da sociedade e que poderiam ser
produzidos de forma privada, o que diminui a quantidade desse tipo de fonte disponível
em acervos públicos235.
É preciso que o historiador esteja atento a mudanças a longo e médio prazo no
formato dessa fonte, ou até mesmo mudanças na mentalidade social podem ser
incluídas, pois, como já discutido acima, esses fatores (interesses e privilégios pessoais)
interferem diretamente na redução e consequentemente na análise das informações. Por
isso o cuidado no trabalho com a mesma, sobretudo com a ideia de generalização. Cada
inventário é único, também há a possibilidade de inventários fidedignos em sua
produção e informações e que podem apresentar apenas os elementos que para aquele
momento eram consideráveis economicamente. Com isso é possível entender as
mudanças na mentalidade social, pois é no quadro social que essas mudanças e
interesses são construídos.
Magalhães (1989) também explicita que essa é uma documentação que exige
cuidado em seu trato, sobretudo quando ela coloca em suspense os elementos contábeis
de inventários por ela analisados, principalmente com relação ao baixo preço de alguns
bens observados, fato também observado por Teixeira (2012). A possibilidade de
alteração de informações, que gerem (des)valorização, ou que privilegie alguns em
detrimento de outros, são pontos chaves retratados por aqueles que já trabalharam e que
talvez ainda trabalhem com essa documentação.
Uma das dificuldades em se trabalhar com essas fontes, e talvez a maior, é o seu
estado de conservação; a fragmentação do acervo e a ausência dos mesmos. É um
material que, como toda fonte, merece cuidados ao serem manuseados, cuidados de
conservação e meios de pesquisas como a sua digitalização em um banco de dados
virtual. É partindo dessa dificuldade, que a pesquisa tem como parte inicial, a
digitalização do acervo dos inventários post-mortem datados entre os anos de 1876 e
1930, pertencentes ao arquivo do Fórum Dr. Ferreira Júnior em Cajazeiras, PB. Vale
destacar que fora encontrado um volume considerável de documentos a mais que o
234
O período mencionado nessa pesquisa corresponde ao final do século XIX, portanto processos cíveis
como é o caso dos inventários a serem analisados encontram-se dentro dos padrões de elaboração
correspondentes as Ordenações Filipinas.
235
Além da realização de Inventários post-mortem no meio judicial, existiam aqueles que por acordo
familiar eram realizados de maneira privada, então, feitos o levantamento dos bens e conseguinte a
partilha sem nenhuma ligação com o meio judicial, é impossível o acesso a essa documentação, uma vez
que, caso tenha sido realizado por escrito, certamente permaneceu na família.
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As palavras ―acção e nullidade‖ e o nome ―Jusepha‖ foram escritos nesse trabalho da mesma forma na
qual se encontravam escritas na documentação.
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lugar o explorado que ela coloca em primeiro plano‖ (PESEZ, 1990, p. 211), permitindo
entender e discutir as questões e desigualdades sociais e as representações do campo
econômico e social.
O movimento Iluminista desencadeou uma série de transformações e revoluções
que promoveram o surgimento da História Moderna. Esse movimento requeria ao
mesmo tempo uma revolução epistemológica para que repensasse seus conceitos e é
nesse ponto que a Filologia (estudos científicos de línguas), que o estudo objetivo das
línguas tornou-se indispensável, já que,
―... a História se faz com documentos e que os devemos conhecer muito bem.
Precisamos diferenciar documentos falsos de verdadeiros e isso só é possível
com um conhecimento aprofundado da lìngua utilizada‖ (FUNARI, 2008, p.
83)
Por meio da Filologia é então possível identificar a veracidade dos documentos
através do estudo e conhecimento sobre a língua utilizada, é uma maneira de
conhecermos bem a documentação. Mas, além disso, é necessário que toda análise ou
reflexão sobre determinado momento histórico deva ser levado em consideração de
acordo com o seu lugar, tempo, espaço e contexto em que ocorrera.
O conceito de ―documentos‖ estendeu-se para além dos propriamente escritos e
apenas oficializados pelo Estado. A cultura material passou a ter relevância como fontes
historiográficas, permitindo, ―... disponibilizar fontes escritas sobre o passado e de
complementar as informações existentes com evidências materiais sem escrita.‖
(FUNARI, 2008 p. 84). O material é também um documento, uma fonte que carrega em
si, indícios sobre algo que possivelmente o escrito mesmo oficializado não dispõe, ou
até mesmo omita. A partir de análises feitas sobre a cultura material, Funari (2008)
menciona que através de vestígios materiais, foram encontrados indícios de conflitos e
resistência a exemplos de índios e escravos, fato este, que muitos pesquisadores por
muito tempo negaram ou simplesmente os escritos omitiam esse tipo de informação,
pois,
―Não que os documentos não se refiram à resistência, mas o fazem a partir de
um ponto de vista do grupo dominante, o que muitas vezes pode induzir o
historiador a considerar o comportamento dos subalternos como desviantes,
desrespeitosos das normas sociais que deveriam ser aceitas e
compartilhadas.‖ (FUNARI, 2008 p.103)
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mais informações que a evidência escrita, mas que a mesma também deve ser
considerada. Não é questão de hierarquização das fontes, mas de complementação das
mesmas.
A cultura material impulsionou o surgimento de novas correntes historiográficas,
como a exemplo o Materialismo Histórico, que se desenvolveu devido às
multiplicidades e condições materiais do cotidiano. Então a História passou de relato à
interpretação das fontes. Funari define cultura material como, ―... tudo que é feito ou
utilizado pelo homem.‖ (2008, p.85). Apesar de serem fontes históricas, é preciso usar
ferramentas interpretativas que orientem sua análise, afinal é uma história que deve ser
construída baseada na veracidade dos fatos e dos meios utilizados nas interpretações
sobre as fontes materiais. É necessário conhecer obras que trabalham a respeito desse
tipo de documentação, pois quanto mais informações possíveis, melhor será o resultado
do trabalho com essa mesma fonte.
Deve-se estar atento e tomar cuidado com a metodologia utilizada. Para Funari
(2008), uma analogia etnográfica permite através de seu estudo descritivo conhecer
aspectos sociais e culturais.
Objetos da Antiguidade foram as primeiras fontes arqueológicas, ao contrário do
que muitos pensam, as fontes arqueológicas são importantes não apenas para
historiadores da Antiguidade como também para a História Moderna, ―A especificidade
de cada contexto histórico pode ser revelada pelo historiador que se vale de fontes
arqueológicas‖ (FUNARI, 2008, p.99), pois literalmente é uma parte daquele momento,
é uma informação privilegiada, pois não é algo descrito com palavras, mas que
simplesmente fez parte daquele momento e que o vemos não pela imaginação, e sim, tal
como era.
A cultura material também apresenta preocupações que são indispensáveis a essa
discussão. Rede (1998) aponta duas preocupações: a primeira é a própria constituição
social e sua relação com a construção da cultura material; a segunda é como aplicar uma
metodologia que permita a cultura material fazer parte do processo historiográfico
explorando suas potencialidades.
Falar sobre cultura material não significa que durante os trabalhos
historiográficos, esses elementos serão estudados isoladamente, mas que, serão
contextualizados com outras fontes, ajudando no desenvolvimento, veracidade e
justificativa de pesquisas, dando margem inclusive a dinâmica social. É justamente
partindo da contextualização, que a cultura movida por interações individuais e
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coletivas com o meio, fazem com que o material, fruto da cultura, seja passível de
historicidade.
Em seu artigo, ―História a partir das coisas: tendências recentes nos estudos de
cultura material, Rede analisa a maneira como alguns estudiosos se posicionam com
relação a ligação existente entre o material e a cultura, pois para a maioria , são fatos
isolados e que portanto devem ser analisados da mesma forma, para ele, isso gera ―... o
esvaziamento da historicidade da noção de cultura.‖(1998, p. 268), pois ambas são
construídos e remodelados pelo meio social. Portanto o isolamento destas durante as
análises é uma ação imprópria. Ele vai além desse pensamento e defende a idéia de que,
―... a cultura material, a um só tempo, parte do fenômeno histórico e fonte documental
para sua compreensão‖ (1998, p. 266). O material e a cultura estão intrinsecamente
ligados e dependentes são como uma espécie de máquina que ao mesmo tempo produz e
consome seu próprio produto, sendo assim, não há motivos para uma análise do material
isolado do aspecto cultural que o envolve. Mesmo assim, a persistência em analisar o
material isolado da cultura, gera limitações.
―... as posições sobre as relações entre o universo material e a cultura
definirão, de algum modo, os limites das propostas de estudo e as formas de
mobilização dos elementos físicos na compreensão dos fenômenos
históricos.‖ (REDE, 1998, p. 267).
Apesar de alguns estudiosos reconhecerem a cultura material como fonte
documental, ainda existe grande insistência em se deter apenas a fontes escritas, por esta
ser a tradicional e a mais aceita, os quais se permitem estudar fontes não escritas apenas
na ausência ou minoria dos escritos.
O que os Inventários post-mortem têm a ver com Cultura Material se esses são
documentos escritos? Apesar de serem documentos escritos, eles estão ligados sim, pois
eles descrevem os bens materiais, registram cores, formatos, material (de fabricação),
estado de conservação, valores econômicos, localização, residência, etc.
―Os inventários descrevem o patrimônio de um indivìduo e, por isso, são de
natureza predominantemente econômica, sendo ricos testemunhos da cultura
material de uma sociedade.‖ (FURTADO, 2009, p.105)
O processo de construção de cidades é movido e mesclado pelos aspectos
políticos, sociais e religiosos, que unidos promovem grandes transformações,
confirmando o fato de que as cidades não são um produto finalizado, e sim, um
ambiente em constante transformação, impulsionado pelos anseios e desejos dos
cidadãos que nela habita.
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FONTES:
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Sér. v.41996. pp. 265-282.
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RESUMO
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ESTADO DA ARTE
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Percebendo o inventário Post Mortem como uma fonte ímpar e por isso pronta
para ser analisada em sua singularidade, a partir de agora nos ateremos à análise de um
inventário para que possamos compreender a cultura material de uma família
cajazeirense a partir de seus bens. Além do inventário, em anexo a esse documento há
também o Auto de Partilha dos bens, assim como a menção das dívidas ativas, no qual
traçaremos um panorama simplificado de como se deu essa partilha. Logo, vale salientar
que o inventariado não deixou testamento, diante disso, o processo de divisão dos bens
será dado de forma igualitária aos possíveis herdeiros.
Antes de iniciarmos a análise documental, é válido recordar uma saudosa fala de
BLOCH (2002, p.75) quando o mesmo faz uma reflexão acerca do passado e nos diz
que ―o passado é, por definição, um dado que nada mais modificará. Mas o
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Ainda acerca dos deixados pelos inventariados havia a existência de uma dívida
passiva no valor de 20:000 mil réis ao coronel Vital de Sousa Rolim.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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THIERRY, Augustin. Rapport sur lês travaux de la collection des monuments inédits de
l‘Histoire du tiers état, adresse à M. Guizot, ministre de l‘instruction publique, lê 10
mars 1837. Tessier, Paris, s.d.
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RESUMO
O presente artigo, tem como intenção fazer um passeio durante alguns séculos,
da época medieval na Europa, até o século XIX no Brasil, chegando em um arremate
que nos faça pensar como a loucura se perpetuou durante esses regimes de tempo, e
ainda impera em nossa contemporaneidade com todos os avanços da ciência. Inserida
nessa linha cronológica constante, tendo como base epistemológica as fontes escritas ―A
história da Loucura de Michel Foucault e O alienista de Machado de Assis”.
O homem Europeu desde a Idade Medieval em toda sua evolução humanitária,
tem se relacionado com algo no intrínseco de si, de uma forma que chegasse a cunhar
toda a sua existência, tendo como nome a loucura, alienação, desrazão, ―demência‖.
Talvez em virtude disso, essa presença obscurecida tida como razão ocidental, deva algo
de sua total profundidade.
237
Graduando do curso de Licenciatura plena em História da Faculdade Internacional do Delta-FID.
238
Mestre em História do Brasil pela UFPI, Doutorando em História pela UFU. Professor da SEDUC-PI.
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239
Jeroen Bosch 1450 — 9 de agosto de 1516), foi um pintor e gravador holandês dos séculos XV e XVI
Muitos dos seus trabalhos retratam cenas de pecado e tentação, recorrendo à utilização de figuras
simbólicas complexas, originais, imaginativas e caricaturais, muitas das quais eram obscuras mesmo no
seu tempo.
240
Friedrich Wilhelm Nietzsche (Röcken, Reino da Prússia, 15 de outubro de 1844 — Weimar, Império
Alemão, 25 de agosto de 1900) foi um filósofo, filólogo, crítico cultural, poeta e compositor prussiano
do século XIX, nascido na atual Alemanha.[1] Ele escreveu vários textos críticos sobre a religião, a
moral, a cultura contemporânea, filosofia e ciência, exibindo uma predileção por metáfora, ironia e
aforismo.
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A experiência clássica da loucura que nasce grande e nociva ameaça, que veio a
surgir no século XV, se atenuando os poderes inquietantes da alma que habitavam toda
a estrutura da pintura de Jeroen Bosch, mas acabou perdendo sua violência. Algumas
formas acabaram subsistindo, agora transparentes e dóceis acabaram formando todo um
cortejo, o inevitável cortejo da razão. O total esquecimento acabou caindo sobre o
mundo, sulcado pela livre escravidão de sua ―Nau‖, ou seja, seu navio dos insanos, essa
nau, não irá mais de um a quem para um além, em seu estranho momento de
culminação, nunca mais esse momento de passagem será fugido e absoluto.
Ei-la amarrada com compaixão no meio das coisas e das personas, isolada e
totalmente segura. Desde então, passou-se a não existir mais a barca dos insanos, mas
outro lugar de possível acolhimento e detenção: o Hospital. Durante toda a era
medieval, os loucos fazem parte de uma paisagem tida como social, e uma paisagem
tida como social e pitoresca que servia de relançamento de uma estrutura muito cética.
A loucura é inconsciente, e porque se todos são loucos, não haveria mais ponto de
referência para se saber se era louco ou não.
O interessante e inteiramente potente da era clássica é o fator histórico contido
nela por muito tempo silenciado, no qual consistia que um certo dia contido na linha da
cronologia, em abril de 1657, foram segregados e detidos em Paris cerca de seis mil
pessoas. Tais pessoas foram levadas à deriva da opressão ao Hospital geral, porque
eram desempregados, ou mendigos miseráveis e inúteis aos olhos das pessoas que lhes
colocavam nessa casa de separação social, independentemente de sua condição de
nascimento, ou se apresentava condição de trabalhar para se sustentar ou não, se fosse
considerado ocioso, era tido literalmente como louco, e tinha que ser escorraçado.
Eram também considerados loucos ou alienados, homossexuais desprovidos de
sensatez. Eram enviados aos Hospitais gerais, sem que se chegasse a se tomar contra
eles em nenhum momento uma medida jurídica precisa, era uma medida da polícia,
regida por ordens Reais, que simplesmente deveriam ser obedecidas sem
questionamentos, e o que seria mais absurdo: era necessária somente uma suplica dos
familiares do insano, para que ele passasse o resto de seus dias detido dentro de um
Hospital geral, em condições sub-humanas. Essa prática durou quase um século e meio,
foi um grande ritual de exclusão regido por crueldade e falta de humanidade.
É notório que a Europa, tinha seus regimes de partes territoriais invadidos por
fome, guerra e muito para além da peste negra, a letra e as doenças venéreas, que com o
passar da cronologia e suas potentes mudanças, depois sairiam de cena, e dariam lugar
625
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
241
René Descartes ( La Hayne em Touraine, 31 de março de 1596 – Estocolmo, 11 de fevereiro de 1650)
foi um filósofo, físico e matemático Francês. Durante a idade Moderna também era conhecido por seu
nome latino Renatus Cartesius.
626
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
627
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
ser baixados em toda a conjuntura do século XVII. Tendo como prosseguidor de suas
instâncias, esses espaços destinados aos insanos, eram mantidos pelas finanças públicas,
e todos os outros valores que passavam pela mão do Rei.
Nessas instituições com muitos conflitos envolvidos no processo de
prosseguimento, os velhos privilégios da Igreja, que dava assistência aos pobres com
todo seu seguimento de hospitalidade, e toda a preocupação da classe burguesa de fazer
uma limpeza no mundo dos miseráveis, com o desejo de ajudar e a necessidade de
repressão, ao seguimento da propagação da caridade e a vontade de instaurar punição.
628
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Uma palavra que durante a idade medieval era demonizada, e tinha que se
dissipar por seu significado, seu peso e sua potência que era considerada potencialidade
negativa, seria o ―louco‖, mas essa palavra não teria que ser tão pérfida e temida, e sim
a menção que com o decorrer da cronologia, teria mais uma potencialidade negativa,
por vir à tona, que seria: ―doença mental‖. Tendo seguimento, o louco tem uma
passagem para o estado de doente, que aparentemente seria uma nova qualificação para
esse quadro, que em verdade seria uma tomada de poder.
Em seu funcionamento com todos os seus propósitos, o hospital geral, não viria
a se parecer com nenhuma ideia médica. Sempre teve no fundo de sua existência,
valores regidos por uma instancia de ordem de uma monarquia e burguesia que se
organizou na França nesse mesmo espaço de tempo. O que veio a inventar o
internamento, foi o caciquismo, um pouco como a idade média a segregação dos
leprosos, mas com o vazio que os leprosos deixaram, outras pessoas vieram a tomar
como ocupação no cenário do mundo Europeu: que seriam os internos.
Esse mecanismo que sanciona o poder de detenção, pelo método da vigilância
com resultado manifestado através do total aprisionamento, e a conformidade com essa
espécie de prisão, seja literalmente nas casas de detenção ou nos campos de quem
trabalha, acaba que finalmente formulando esse dispositivo de poder retomado em todos
os contextos políticos e sociais. Tal instituição servia de encerramento punitivo que
levava para a Europa na segunda metade do século XVIII, o que se tornou uma forma
de enquadramento geral, instaurada na grande massa da sociedade moderna, seja ela
socialista ou capitalista.
Mudando de região geográfica e temporalidade, com a intenção de nos levar a
uma viagem no tempo em meio ao século XIX no Brasil, quando tal país ainda era
dependente de Portugal, e só veio a instituir sua independência no ano de 1822,
Machado de Assis242 e toda a potencialidade de sua literatura, problematiza através de
242
Joaquim Maria Machado de Assis (Rio de Janeiro, 21 de junho de 1839 — Rio de Janeiro, 29 de
setembro de 1908) foi um escritor brasileiro, considerado por muitos críticos, estudiosos, escritores e
leitores um dos maiores senão o maior nome da literatura do Brasil. Escreveu em praticamente todos
629
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
uma narrativa regida por uma ficção que nos faça se aproximar ao máximo de uma real
noção, de como deu-se em nosso país o tratamento e menção aos alienados, que
recebiam tratamentos por alienistas243.
Em Itaguaí, cidade realmente existente no estado do Rio de Janeiro, na
temporalidade que Simão de Bacamarte, médico alienista que estava retornando da
Europa para a cidade de Itaguaí, e decidiu estudar a loucura, ele era um cidadão
dedicado a ciência, com temperamento totalmente sereno, sempre procurou agir dentro
da imensidão maior do quadro de racionalidade, já que sua principal intencionalidade
era estudar as pessoas que fugiam desse padrão de normalidade, e eram considerados
alienados.
O médico alienista era casado com Dona Evarista, uma viúva de 25 anos de
idade, que era uma mulher que não emanava beleza nem simpatia, mas Simão
acreditava ter capacidade de ter vários filhos saudáveis e com muita força. Como ela era
desprovida de beleza, o médico não precisaria perder tempo em reparar a esposa, daí
teria tempo para fazer o que mais gostava de manifestar: sua total dedicação para os
seus estudos voltado para campo das doenças mentais. Simão Bacamarte um certo dia
conversando com seu amigo Crispim Soares, fez o seguinte comentário: que um medico
de verdade, deveria cuidar fielmente da cabeça dos loucos, já que em Itaguai os loucos
ou alienados viviam trancafiados dentro de suas casas. Em virtude disso, o estudioso
médico pensou em construir uma casa para eles e levou essa ideia aos vereadores da
cidade, sendo assim sua ideia aceita. Com o surgimento da Casa verde, o médico passou
a trancafiar dentro desse espaço, pessoas que tinham o comportamento diferente do seu,
já que ele se considerava o único apto e normal a diagnosticar essa enfermidade nas
pessoas com o avanço de suas pesquisas cientifica, e a potencialidade e analise de seu
próprio discurso que muitas das vezes acabava facultando as pessoas.
os gêneros literários, sendo poeta, romancista, cronista, dramaturgo, contista, folhetinista, jornalista e
crítico literário. Afro-descendente, testemunhou a Abolição da Escravatura e a mudança política no
país quando a República substituiu o Império, e foi grande comentador e relator dos eventos político-
sociais de sua época.
243
Aquele que trata de alienados, ou seja: que trata de pessoas que não têm ou que perderam sua
identidade, ou que vivem num estado em que se tornaram alheios a si mesmos, a si próprios, em um
estado em que não são responsáveis plenamente por seus atos.
630
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REFERÊNCIAS
ASSIS, Machado de. Obra Completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar 1994. v. II.
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RESUMO
Usando como fonte processos da Justiça do Trabalho da Junta de Conciliação e
Julgamento (JCJ) da cidade de Guarabira, que estão disponíveis no Núcleo de
Documentação Histórica no Centro de Humanidades da Universidade Estadual da
Paraíba (UEPB) em Guarabira, pretendo discutir contextos históricos que levaram
menores trabalhadores a entrarem na Justiça do Trabalho em busca de seus direitos
trabalhistas no momento de democratização da sociedade civil, junto com a ampliação
de estruturas institucionais do Estado, como a Justiça do Trabalho nas regiões
interioranas do Brasil. Assim, esse artigo pretende apontar questões iniciais sobre as
ações movidas pelos menores trabalhadores, as causas e os resultados dos processos
acionados no ano de 1987.
Palavras-chave: Trabalho infantil; Justiça do Trabalho; Agreste Paraibano.
INTRODUÇÃO
Como em todo trabalho, questões marcam o início de problemática, mas essas
não são questões que ―surgem do nada‖. Todo acontecimento faz parte de um processo;
no caso, do processo histórico pertencente ao contexto discutido nesse artigo. Assim a
conjuntura discutida estará delimitada na década de 1980 na região do agreste
paraibano, que em outra dimensão de escala faz parte do contexto histórico social do
Brasil no momento de retomada da democracia.
244
A jurisdição da Junta de Conciliação e Julgamento aberta na cidade de Guarabira 1987 cobre as
cidades de: Alagoa Grande, Alagoinha, Araçagí, Araruna, Bananeiras, Belém, Borborema, Cacimba de
Dentro, Caiçara, Casserengue, Cuitegi, Dona Inês, Duas Estradas, Guarabira, Lagoa de Dentro,
Logradouro, Mari, Mulungu, Pilões, Pilõezinhos, Pirpirituba, Riachão, Serra da Raiz, Sertãozinho,
Solânea e Tacima.
633
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245
TOSI, Giuseppe. Terra e salário para quem trabalha: um estudo sobre os conflitos sociais no
Brejo paraibano. 1988. 266 f. Dissertação (Mestrado em Sociologia Rural) - Universidade Federal da
Paraíba. Campina Grande, 1988.
246
COSTA, Lidineide Vieira da. “Algodão entre cristais no conflito capital-trabalho”: trabalhadores
e patronato frente à Junta de Conciliação e Julgamento de Guarabira – PB no ano de 1987. 2015.
75 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em História) – Universidade Estadual da Paraíba,
Guarabira, 2015.
247
TOSI, Giuseppe. op. cit. p. 24.
634
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248
Ibidem, p. 25.
249
GOLDENSTEIN, 1994 apud MACIEL, David. Democratização e Manutenção da Ordem na
Transição da Ditadura Militar à Nova República (1974-1985). 1999. 408f. Dissertação (Mestrado em
História) – Universidade Federal de Goiás. Goiânia, 1999. p. 342.
250
MACIEL, David. Democratização e Manutenção da Ordem na Transição da Ditadura Militar à
Nova República (1974-1985). 1999. 408f. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal de
Goiás. Goiânia, 1999.
251
Ibidem, p. 343.
252
Ibidem.
253
Ibidem, p. 259.
254
Ibidem, p. 160.
635
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255
TOSI, Giuseppe. op. cit., p. 44.
256
Ibidem, p. 175.
257
A maior parte destas iniciativas provinha do grupo de lideranças da Igreja, militantes da Pastoral Rural
e das CEBs, em colaboração com os ―serviços‖ e com outros centros de assessoria. Ibidem, p. 176.
636
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O montante total de ações referentes a esse ano de 1987 é de 311 259. Entre eles,
não foi encontrado nenhuma reclamação trabalhista aberta por algum menor residente
na cidade de Guarabira. Por outro lado, foram localizados 18 processos envolvendo
258
DOURADO, Ana; DABAT, Christine; ARAÚJO, Teresa Corrêa de. Crianças e adolescentes nos
canaviais de Pernambuco. In: PRIORE, Mary Del (Org.). História das crianças no Brasil. 7. ed. São
Paulo: Contexto, 2010. p. 407-436.
259
COSTA, Lidineide Vieira da. op. cit., p.55.
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menores, todos eles moradores das cidades da região pertencente agora à jurisdição da
JCJ na cidade260.
260
Sobre as cidades na qual pertenciam a jurisdição da JCJ de Guarabira, ver nota ¹.
261
COSTA, Lidineide Vieira da. op. cit., p. 57.
638
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Essa situação vai ter reflexos tanto na zona rural quanto na zona urbana. Na
zona rural, ela agrava as condições de vida da população pois o engajamento
no cultivo da cana, particularmente, representa a principal fonte de renda para
a maioria dos trabalhadores. O quadro repete-se nas áreas urbanas, pois
quando eclode a crise do Pró-álcool, parte significativa da população expulsa
da área rural residia nos núcleos urbanos da Zona Canavieira do Estado.262
A faixa etária desses menores registrados nos autos fica entre 12263 e 18 anos.
Nos processos coletivos fica mais presente o relato de menores que começaram a
trabalhar desde muito cedo, sem limitar especificamente a idade mínima. As cidades nas
quais se originam as ações movidas pelos menores podem ser listadas no seguinte
gráfico:
262
MOREIRA, Emilia et.al. A visão dos atores sociais sobre a crise do emprego rural a zona canavieira
da Paraíba. Revista da ABET, V.I, Nº 1/2, 2001. p. 45. Disponível em:
<http://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/abet/article/view/15425>. Acesso em: 8 Abr. 2014.
263
NDH-CH/UEPB. Processo da JCJ- Guarabira Nº 173/87.
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264
NDH-CH/UEPB. Processos da JCJ-Guarabira de número: 098/87, 117/87, 127/87, 201/87, 303/87,
318/87, 320/87, 362/87, 401/87.
640
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portanto, são de caráter individual265. Nessas ações individuais algumas são reclamações
contra grandes proprietários de terra. Inclusive contra alguns empregadores das ações
coletivas, mas por algum motivo o(a) trabalhador(a) menor decide entrar na Justiça do
Trabalho, rompendo sua relação de obediência para com seu empregador.
265
NDH-CH/UEPB. Processos da JCJ-Guarabira de número: 016/87, 163/87, 171/87, 173/87, 202/87,
291/87, 327/87, 337/87, 374/87.
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Por outro lado, mais da metade das ações, como visto no gráfico 5, terminaram
com sentença de procedência da reclamação. Embora os trâmites mais longos – se
estendendo por anos –, com volume maior de folhas, junção de provas e depoimentos,
havendo insatisfação com o resultado da sentença, o reclamado ainda poderia recorrer à
instância superior do resultado da ação, e só depois de tudo isso, caso confirmada a
primeira sentença, é que o trabalhador menor de fato teria ganhado suas causas, cabendo
ao empregador pagar os devidos valores cobrados. Esse longo processo, embora
desestimulante para quem deseja ter seus direitos ressarcidos, revela que, embora toda a
aparente normalidade de trabalho alegada pelos empregadores, afirmando que foi o
trabalhador que abandonou o serviço e outros motivos a mais, no fim são apuradas pela
Justiça do Trabalho como improcedentes as razões da reclamada, aceitando a denúncia
feita pelo trabalhador menor. E isso fica evidente quando analisamos o tempo dos
266
NDH-CH/UEPB. Processo da JCJ- Guarabira de número: 098/87, 163/87, 291/87, 318/87 e 401/87.
267
NDH-CH/UEPB. Processo da JCJ- Guarabira de número: 401/87. Finais do Termo de Conciliação.
Nas iniciais os trabalhadores cobravam um total de Cz$ 79.380,00, mas só foi pago pelo reclamado a
quantia de Cz$ 35.000,00.
642
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tramites processuais que o trabalhador tem que esperar para que no final de todas as
etapas corridas, o trabalhador ter o resultado de sua ação.
CONCLUSÃO
No curto espaço possível, tentei apresentar as problemáticas das mudanças nas
relações de produção, da expropriação dos trabalhadores rurais, da crise econômica e o
fim do Proálcool e demais questões que estiveram presentes no cotidiano de pais e
mães, meninos e meninas, crianças e jovens, trabalhadores que em 1987 –
principalmente os trabalhadores rurais – sofreram mudanças significativas.
Não sabendo os devidos parâmetros para essa resposta, mas com a salvaguarda
dos processos da JCJ de Guarabira, e o uso desses processos como fonte histórica, vem
a ampliar a possibilidade de entrarem em pauta histórias de trabalhadores(as) que antes
estavam apenas guardados em uma sala da justiça prestes a serem incinerados sem
nenhuma utilidade para a pesquisa.
REFERÊNCIAS
CARVALHO, José Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 18ª ed. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2014.
643
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PRIORE, Mary Del (Org.). História das crianças no Brasil. 7. ed. São Paulo:
Contexto, 2010.
TOSI, Giuseppe. Terra e salário para quem trabalha: um estudo sobre os conflitos
sociais no Brejo paraibano. 1988. 266 f. Dissertação (Mestrado em Sociologia Rural) -
Universidade Federal da Paraíba. Campina Grande, 1988.
644
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RESUMO
268
Aluno vinculado ao Programa de Pós-Graduação em História, na UFRN/NATAL, que tem como área
de concentração: História e Espaços.
269
Desenvolvemos atualmente a pesquisa intitulada: VIRGULINO CARTOGRAFADO: RELAÇÕES DE
PODER E TERRITORIALIZAÇÃO DO CANGAÇO ENQUANTO ESPAÇOS DE ATUAÇÃO DO
BANDO DE LAMPIÃO (1918-1928), sob orientação do Prof. Dr. Durval Muniz de Albuquerque Júnior.
270
CERTEAU, Michel de. A escrita da história. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2015. p. 56-108.
645
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271
De acordo com o geógrafo Marcelo Lopes de Sousa (2009), o substrato espacial material são as
formas espaciais, os objetos geográficos tangìveis (edificações, campo de cultivo, feições ―naturais‖ etc).
Ou seja, a matéria que serve de suporte e referência para as práticas sociais. O autor lança mão desse
termo como um esforço de separação do que ele chama de espaço concreto (matéria, objeto), do espaço
social (constituindo pelas relações humanas). Pensamos ser interessante usar esse termo, pois entendemos
que o espaço é sempre social, surge na relação e interação da prática social com os substratos materiais.
272
Um ensaio introdutório do entrelaçamento da história com a geografia pode ser encontrado em:
BARROS, José D‘Assunção. História, Espaço, Geografia: diálogos interdisciplinares. Rio de Janeiro:
Vozes, 2017.
646
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
273
Barros (2007) trabalhou a diferença entre coiteiros e protetores. Para ela, os primeiros eram os
fazendeiros de pequeno e médio porte, que agenciavam os cangaceiros seja porque eram chantageados,
seja porque eram beneficiados pelas relações comerciais mantidas com esse tipo de banditismo. Já os
protetores eram os grandes fazendeiros membros da elite nordestina, ligados às esferas dos poderes
políticos que agenciavam os cangaceiros a partir do litoral, das capitais dos estados do Nordeste. Ver em:
BARROS, Luitgarde Oliveira Cavalcanti. A derradeira gesta: Lampião e Nazarenos guerreando no
sertão. 2. ed. Rio de Janeiro: Mauad, 2007.
274
É importante destacar que, em 1930, Barroso também escreveu outro livro sobre o cangaceirismo,
intitulado: Almas de lama e de aço: Lampião e outros cangaceiros. Nesse livro, Barroso criticou a
desmoralização e os aspectos sociais e polìticos da chamada ―República Velha‖ que, para ele, eram os
principais produtores do atraso e do cangaceirismo no sertão nordestino.
275
Ver em: FOUCAULT, Michel. O que é um autor? In:____. Ditos e escritos: estética – literatura e
pintura, música e cinema (v.3). Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2011. p. 264-298.
647
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definida pelo meio ambiente que, por sua vez, condiciona os comportamentos humanos.
O cangaceirismo se constituiria como fruto do seu meio natural, como afirma Barroso:
276
Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, atuou entre os anos de 1918-1938. É a figura mais conhecida
do cangaço, sendo constituído pelos múltiplos projetos de memória, como imagem representativa do ser
nordestino e fonte rentável atrativa dos projetos políticos em torno do turismo.
277
A essa prática discursiva de Lampião, Frederico Pernambucano de Mello definiu como ―escudo ético‖.
Em outras palavras, é o uso do chamado ―código de honra sertanejo‖ que obrigava a vingança da morte
dos seus pais para justificar a vida cangaceira. Ver em: MELLO, Frederico Pernambucano de.
Guerreiros do sol: violência e banditismo no Nordeste do Brasil. 5. ed. São Paulo: A Girafa, 2011.
648
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278
Maria Chistina Mata Machado (1969); Maria Isaura Pereira de Queiroz (1977) e Frederico
Pernambucano de Mello (1985) elencaram as seguintes causas sociais para o surgimento do cangaço:
secas, isolamento sertanejo, domínio do latifúndio e brigas familiares.
279
A dissertação foi defendida com o título: A organização espacial do cangaço sob a chefia de Virgulino
Ferreira da Silva, Lampião (1922-1938) ou como produzir território em movimento.
649
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não somente como uma área geográfica pertencente a uma nação, com uma unidade
política e administrativa, mas como um conceito de espaço vivenciado/praticado pelos
agentes sociais que, através de estratégias e táticas, contribuem para a produção dos
espaços. Acreditamos que a produção do espaço é permeada pelas relações de poder e
de sentido, sendo assim, o processo de espacialização é territorializante. Isso mostra
também o caráter móvel do território,282 podendo operar tanto na continuidade quanto
na descontinuidade espacial.
Influenciado pelas leituras da dupla Deleuze e Guattari, Haesbaert (2016)
direciona seu olhar para uma abordagem processual do território. Na qual o território é
visto como um devir, um permanente movimento de tornar-se e desfazer-se, ou seja, não
existe território sem seus vetores de saída e, por sua vez, não existe saída do território
(desterritorialização),283 sem, ao mesmo tempo, um esforço para se reterritorializar em
outras bases (HAESBAERT, 2016, p. 99-101). Sendo assim, pensar a territorialização
do bando de Lampião é perceber o movimento duplo de des-reterritorialização. São
esses os movimentos que nos interessam. No primeiro momento um movimento de
territorialização, pelo qual Lampião vai mobilizar agenciamentos e constituir redes de
proteção e, no segundo momento, o processo de perda desses agenciamentos
(desterritorialização), o que vai culminar na necessidade de novas conexões para se
reterritorializar em outras bases. Segundo Haesbaert (2016), os agenciamentos são
moldados nos movimentos de territorialização e desterritorialização, uma vez que todo
agenciamento é territorial e duplamente articulado. Podendo marcar não só as entradas
no território, mas também suas saídas (linhas de fuga – nos termos de Deleuze e
Guattari).
Lampião opera esses agenciamentos através da máquina de guerra nômade 284
constituída por seu bando de cangaceiros, que tem como características por um lado, o
282
Geógrafos como Raffestin (1993); Marcelo Lopes de Sousa (2014); Haesbaert (2016) colocam em
cheque o mito da exclusividade territorial, uma vez que para eles o território circula e pode ser percebido
até nas relações microscópicas.
283
Haesbaert vai mostra em seu livro o mito da desterritorialização: do “fim dos territórios” à
multiterritorialidade, que os sujeitos que acreditam que o homem pode viver sem territórios, que a
sociedade pode existir sem territorialidade, são aqueles que cultuam o mito da desterritorialização. Ver
em: COSTA, Rogério Haesbaert da. O mito da desterritorialização: do ―fim dos territórios‖ à
multiterritorialidade. 9. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2016. p. 337-373.
284
A ideia de máquina de guerra nômade perpassa por toda a obra da dupla Deleuze e Guattari, mas foi
mais bem desenvolvida no quinto volume de Mil platôs. A noção de máquina significa operação em fluxo
e corte de agenciamentos. Enquanto que a guerra nômade abrange as potências de destruição e criação ao
mesmo tempo. É por essa razão que as forças do Estado tentam capturar para devir máquinas de guerra,
pois essas máquinas de guerra nômade estando em liberdade podem colocar em cheque o território do
651
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
seu poder destrutivo e desterritorializante e, por outro, sua capacidade de operar como
uma máquina, produzindo agenciamentos e criando territórios. É bom lembrar que esses
agenciamentos são entendidos em uma relação mútua e recíproca, os dois percorrem um
ao outro, intervém um no outro, sendo entendido sempre na horizontalidade das
relações e não na hierarquização das mesmas.
Durante sua intensa vida como cangaceiro, Lampião chegou a arrecadar riquezas
invejáveis. Os saques, os pedidos de regaste e os inúmeros bilhetes extorquindo
dinheiro dos moradores das vilas e cidades do interior de sete estados do Nordeste
(Pernambuco, Paraíba, Ceará, Alagoas, Rio Grande do Norte, Bahia e Sergipe) foram os
principais meios de arrecadação para alimentar os seus agenciamentos e abastecer o seu
bando. Segundo Mello (2011), essas práticas eram suficientes, inclusive para as
atividades de agiotagem junto aos coronéis. A diferença estava no fato de que enquanto
os coronéis alimentavam suas riquezas extorquindo o erário público por meio das
engrenagens do Estado, Lampião se beneficiava via atos ditos como fora da lei. Por
muito tempo a historiografia buscou separar o cangaceiro do coronel, mas até que ponto
os dois não se encontram? Não seriam duas formas diferentes de práticas de
expropriação que se alimentam do suor da sociedade sertaneja? A ponto de um
emprestar serviços ao outro e vice-versa?
O que estamos querendo enfatizar é que os agenciamentos aconteciam no
movimento recíproco, todos os envolvidos se beneficiavam de alguma forma. É o que
mostram Villela e Marques (1999):
Estado baseado no monopólio da força. Ler em: DELEUZE, G. e GUATTARI, F. Mil platôs: capitalismo
e esquizofrenia, vol. 5. ed. 34. São Paulo: Editora 34, 1997.
652
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
O que nos chamou atenção no texto citado foi o fato de que o poder destrutivo
da máquina de guerra nômade de Lampião lhe possibilitou transformar o medo em
agenciamentos e, assim, criar territórios. Contudo, esses agenciamentos eram
alimentados por Lampião através da sua habilidade de recompensar os valores, como
em um constante exercício de dar e receber. Os proprietários de terra se agenciavam285
com Lampião não só pelo medo de ter suas propriedades violentadas, mas pelo fato de
poder lucrar no comércio ilegal de armas e suprimentos, como também usufruir da
proteção dos cangaceiros para intimidar seus rivais locais. Por sua vez, os cangaceiros
se beneficiavam do apoio logístico desses proprietários em múltiplos sentidos, desde as
aquisições de armas e suprimentos até os tratamentos médicos, como nos primeiros idos
de 1924, quando Lampião passou meses tratando de um grave ferimento no pé nas
propriedades da destacada família Pereira Diniz de Princesa Isabel na Paraíba.
Agora já temos condições de entrar na análise do processo de
territorialização/desterritorialização do bando de Lampião na Paraíba. Iniciaremos em
1923, pois através das leituras dos jornais da época podemos notar que é a partir desse
ano que o bando de Lampião vai concentrar suas ações na fronteira dos Estados da
Paraíba e Pernambuco. Sobretudo entre os anos de 1923-1924, eram comuns notícias
dos cangaceiros do bando de Lampião entre as atuais cidades pernambucanas de Serra
Talhada, Triunfo, e São José de Belmonte, e a cidade paraibana de Princesa Isabel.
Nos anos anteriores, Lampião tinha concentrado suas ações nos Estados de
Pernambuco e Alagoas. Sendo o primeiro a sua terra natal, nascendo e vivendo sua
adolescência no sítio Passagem das Pedras, no atual município de Serra Talhada. Após
se envolver em uma briga com seu vizinho José Alves de Barros, o José Saturnino,
Lampião e seus familiares tiveram que se mudar para a localidade chamada Poço do
Negro, a cerca de 2 km do centro de Nazaré do Pico, atual distrito do município de
Floresta em Pernambuco. Aí se envolveria em novos conflitos, desta vez, com os
moradores de Nazaré que não aceitavam o fato de Lampião e seus dois irmãos, Antônio
e Livino Ferreira, andarem armados na então vila. Novamente a família Ferreira se
desterritorializa, para se reterritorializar no Estado de Alagoas, onde Lampião e seus
dois irmãos entraram no bando de saqueadores chefiado pelo seu tio Antônio Matilde.
285
Por essa não ser a pretensão deste artigo é importante destacar que Lampião se agenciava com sujeitos
de várias camadas sociais, como vaqueiros, pequenos proprietários, padres, familiares, chefes políticos e
membros das forças policiais.
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Depois que Matilde deixou o bando, Lampião e seus irmãos entraram para o grupo de
cangaceiros dos irmãos Porcinos, para em seguida, mais especificamente no ano de
1920, entrar para o bando de Sebastião Pereira e Silva, o famoso Sinhô Pereira.
Envolvido na luta secular entre Pereiras e Carvalhos,286 Sinhô Pereira foi um
grande mestre na arte do cangaceirismo para Lampião. Para Chandler (1981):
Em 1922 Sinhô Pereira deixa o cangaço e vai para o Estado de Goiás em busca
de reconstruir sua vida longe dos conflitos familiares na microrregião do Pajeú
pernambucano. Com isso, Lampião assume a chefia do bando e vai se tornar o
cangaceiro mais afamado do Nordeste. Mesmo Sinhô Pereira estando longe, os seus
ensinamentos serão seguidos e aperfeiçoados por Lampião. Esse último não era de
família tradicional como o seu ex-comandante, mas se destacaria como nenhum outro
cangaceiro no trato com as famílias do mais alto escalão da sociedade sertaneja, se
agenciando com personagens de notória influência seja na política, na economia ou na
religião. Para Chandler (1981), os acordos entre Lampião e a sociedade sertaneja
chegaram ao auge durante o período de 1923 a 1926. Justamente no momento que
Lampião agrupou suas atividades na fronteira entre Paraíba e Pernambuco como
mencionado anteriormente.
Foi no segundo semestre de 1923 que Lampião se instalou, para uma estadia de
diversos meses, na comarca de Princesa Isabel, cidade paraibana que está situada em
uma zona montanhosa, com vegetação espessa e com chuvas regulares. Sua base
principal era a pequena vila de Patos do Irerê, quase na divisa com Pernambuco.
286
Para mais informações entre a briga familiar entre Pereiras e Carvalhos, ver: SOARES, Cristiano
Emerson de Carvalho. Pereiras e Carvalhos: Uma história da espacialização das relações (Serra
Talhada-PE). 2015. Dissertação (mestrado) - Programa de Pós-graduação em História da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte. 2015. 149p.
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287
MACÊDO, Nertan. Sinhô Pereira, o comandante de Lampião. Rio de Janeiro: Ed. Artenova, 1975. p.
21.
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Pereiras de Princesa Isabel na trama desse ataque, fornecendo homens e armas para
facilitar o êxito dos cangaceiros em Sousa. Em troca, receberia parte do arrecadado no
saque. Em síntese, Lampião não autorizaria a movimentação do seu bando para um
ataque dessa proporção sem o consentimento dos seus aliados.
O sucesso desse ataque acabou sendo prejudicial para Lampião e seus homens,
pois em Sousa, diferentemente das humildes vilas que seu bando costumava saquear,
residiam famílias de prestígio. Por isso que acreditamos que poderia ter sido muito mais
vantajoso para os interesses de Lampião em terras paraibanas se os cangaceiros não
tivessem tido êxito em Sousa. Roubar e violentar sertanejos sem posse não representava
as mesmas consequências se essas ações recaíssem sobre famílias de prestígio
econômico e político.
Os feitos dos cangaceiros em Sousa tiveram como foco principal a tradicional
família Mariz, como também os Gadelhas e Gonçalves, seus rivais na disputa política
municipal. Essa escolha se justifica pelos interesses do cangaceiro Chico Pereira no
ataque. Esse último teve o pai assassinado no ano de 1922 pelos desdobramentos dos
conflitos da política sousense, sendo assim, com esse saque Chico Pereira vislumbrava a
oportunidade de vingar a morte do pai atacando os principais membros da família
Mariz.
Após o ataque a Sousa, o bando de Lampião vai começar ser fortemente
perseguido pelas forças do Governo paraibano. Diante da situação, os Pereiras de
Princesa Isabel aconselharam Lampião a deixar a região, visto que sua segurança não
poderia mais ser garantida. Nesse momento, Zé Pereira assume outra posição neste
jogo. De protetor passou a arregimentar homens (com o patrocínio do Estado da
Paraíba) para combater o bando de Lampião. Uma boa estratégia para continuar
lucrando com a chamada indústria do cangaço e, ao mesmo tempo, provar para os seus
aliados políticos o seu comprometimento com a luta contra o cangaceirismo. Por outro
lado, Lampião vai resistir com sua máquina de guerra nômade queimando e destruindo
algumas propriedades que pertenciam ao coronel Zé Pereira. O cangaceiro e seu bando
entram em uma linha de fuga, num processo de desterritorialização na Paraíba,
buscando novos agenciamentos, indo se reterritorializar no Cariri Cearense em 1926.
Nesse processo desterritorializante Lampião perdeu o primeiro irmão a lhe
acompanhar na sua trajetória no cangaço, Livino Ferreira, no ano de 1925, na localidade
chamada Baixa do Tenório, no município de Flores (PE), em combate com as forças da
Paraíba e de Pernambuco. Nesse momento as ações contra o bando de Lampião em
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terras paraibanas já estavam sob a chefia de Zé Pereira, que a partir de outubro de 1924
passou a ser financiado pelo seu aliado João Suassuna, Presidente do Estado da Paraíba
entre os anos de 1924-1928. Neste mandato, Zé Pereira usufruiu dos investimentos da
indústria do cangaço, financiando homens para proteger suas propriedades e
aumentando seu arsenal bélico. Podemos dizer com isso, que Zé Pereira e seus jagunços
que antes compunham máquina de guerra devem Estado, tornam-se representantes da
ordem, ao ter em suas fileiras forças para enfrentar as ameaças da maquina de guerra
nômade de Lampião.
Vale lembrar que a primeira biografia de Lampião, escrita pelo jornalista Érico
de Almeida, foi produzida nesse contexto. No ano de 1926, a Imprensa Oficial do
Estado da Paraíba publicou a primeira biografia de Lampião. Segundo Cardoso (1996),
o texto foi encomendado pelo então Presidente João Suassuna e auspiciada pelo
Deputado José Pereira Lima (Zé Pereira, de Princesa Isabel). Essa escrita tinha como
objetivo denegrir a imagem de Lampião e exaltar o combate ao cangaceirismo pelo
Estado, comandado por seus representantes: João Suassuna, no litoral; e Zé Pereira, no
sertão.
O livro de Érico de Almeida apresentou um claro projeto de memória: construir
uma identidade de combate ao cangaceirismo, ressaltando os esforços de João Suassuna,
a quem o autor tratou de ―o anjo do bem‖. Para esse fim, reservou o primeiro capìtulo
do livro, chamado: O bandidismo e a ação do presidente João Suassuna. Como toda
memória é seletiva, permeada pela dialética da lembrança e do esquecimento, o escritor
buscou lembrar que o Governo paraibano não media esforços para combater o
cangaceirismo. Ao mesmo tempo, iniciou uma luta para que as acusações feitas a João
Suassuna e José Pereira Lima, de serem protetores de cangaceiros, caíssem no
esquecimento.
A importância aqui da primeira biografia de Lampião é perceber como sua
escrita está atravessada por alguns interesses que nos apontam para os campos de forças
que constituíram o processo de territorialização/desterritorialização do bando de
Lampião na Paraíba. Não temos pretensões neste artigo de fazer uma análise mais
aprofundada dessa biografia, uma vez que o nosso objetivo ao citá-la foi outro.
Não foi exclusividade do governo paraibano a mudança de postura frente às
atuações do bando de Lampião. Em 1926, Estácio Coimbra assume a presidência de
Pernambuco e nomeia Eurico de Souza Leão para o cargo de chefe de polícia do Estado.
Esse último estipulou como meta primeira, desarticular as redes de proteção que
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CHANDLER, B. J. Lampião, o rei dos cangaceiros. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.
DELEUZE, G. e GUATTARI, F. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia, vol. 5. ed. 34.
São Paulo: Editora 34, 1997.
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QUEIROZ, Maria Isaura Pereira de. Os cangaceiros. São Paulo: Duas Cidades, 1977.
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RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo analisar as questões agrárias e as disputas por
terras, que são motivações para as práticas de crimes em Barro - CE. Os crimes que
resultam em homicídios no decorrer dos anos vêm aumentando fazendo vítimas e
destruindo famílias, os processos crimes são riquíssimos em informações, a partir de
analise em processos procurarei compreender as motivações que há por trás destes
crimes que resultam em homicídios. Os homicídios no Brasil ao decorrer dos anos o
veem tendo um crescimento assustador no seu índice, o município de Barro – CE
também veem sofrendo com o aumento deste índice, os crimes a ser analisados no
presente trabalho ocorreram do ano de 1942 ao ano de 1957 o intuito deste trabalho é dá
ênfase às motivações que levaram os acusados a pratica-los.
Palavras-chave: Violência, Questões agrarias e Disputas por terras.
INTRODUÇÃO
A pesquisa visa compreender o porquê de se pratica esses crimes e se havia
ligações destes com disputa por terras já que praticamente todos os homicídios desse
período foram cometidos na zona rural e tanto as vítimas como os acusados eram
agricultores e os crimes foram praticados com os objetos de trabalho, os objetivos
específicos é a compreensão e a problematização das práticas de crimes em Barro- CE,
buscar compreender as relações entre crimes e pobreza, e presentar as relações entre os
crimes e as disputas de terras, as fontes utilizadas são os processos crimes do fórum
Normando Alves Feitosa da cidade de Barro – CE.
A partir de pesquisa realizadas em arquivos do poder judiciário tendo como
fontes os processos crimes do fórum Normando Alves Feitosa da cidade de Barro – CE,
foi desenvolvido o presente artigo a intenção deste é analisar os homicídios que
ocorreram na cidade entre o ano de 1942 ao de 1957, até o presente momento não se
tem nenhum estudo relacionado ao tema na cidade, as fontes mais antigas encontradas
no fórum foram processos crime do de 1942, os processos crimes deste período que
foram analisados em sua maioria estão presentes conflitos agrários. Está pesquisa
possui relevância social não apenas para a determina cidade como para outras cidades já
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intuito de se defender atirou com uma espingarda contra o acusado, mas errou o alvo. O
acusado atacou a vítima com golpes de farra e a filha com o intuito de defender o pai
também foi atingida pelo acusado e ambos morreram no local, o acusado fugiu e não foi
encontrado para pagar pelos homicídios que cometeu.
Em 1957 o acusado Jose Constantino de Almeida assassinou o então presidente
do partido do PSD local, ex-vereador e filho do atual prefeito da cidade daquele
momento. Há anos a vítima e o acusado já trocavam ofensas e o acusado acusava a
vítima de lhe agredido e o ameaçado de morte. No dia do homicídio a vítima foi até o
comércio do acusado e ambos trocaram acusações por motivos políticos, a vítima era
filiada ao partido PSD local e o acusado não era filiado a nenhum partido, logo após a
vítima se retirou e se digeriu para o comercio vizinho aonde foi surpreendido pelo
acusado com golpes de uma faca peixeira e depois do crime o acusado fugiu mais
depois foi encontrado e preço.
As descrições dos crimes deixam transparecer, por um lado, a existência de
forte violência, principalmente em áreas rurais, dando destaque à ―justiça pelas próprias
mãos‖ e ao ―mundo do arbìtrio‖, as práticas criminosas cresceram gerando todo tipo de
violência em todas as cidades. A realidade brasileira apresenta uma ampla
conflitualidade e um aumento da violência nos espaços sociais agrários, entre as classes
e os grupos sociais, por meio da análise nos processos fica nítido que esses conflitos não
são entre classes e grupos, mais sim são fatos insolados que na maior parte dos casos
entre pessoas conhecidas e vizinhas de propriedades, um dos maiores problemas dos
crimes que tem por motivação questões agraria, é a forma como se procuram mascara os
crimes, nos processos crimes que foram analisados os crimes corridos não foram
tratados como questões por terras , e sim como discursões por motivos desconhecidos
que finalizou com assassinato, em alguns dos casos é possível se ver a desigualdade
social que há entre os envolvidos.
No ano de 1956 onde o acusado foi Cicero Gregório o mesmo foi acusado de
pratica dois homicídios, ele era agricultor, residia na zona rural do sitio Baixio, o
mesmo veio a assassinar José Sotero dos Santos juntamente com a sua filha Raimunda
Edite da Costa ambos residiam nos mesmo sitio em que o acusado e possuíam a mesma
profissão que o acusado. Todo o desenrolar da cena se deu na propriedade do acusado, e
o mesmo já havia a divertido a vítima que não mais transitasse pela sua propriedade, as
discursões entre ambos eram constantes. Após um dia de trabalho as vítimas ao se
encaminhar para casa adentraram a propriedade de Cicero que ficou enfurecido com a
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presença dos mesmos em sua propriedade, após uma breve discursão Cicero com uma
faca em punho de dirigiu a José com o intuito de ataca-lo, José por sua vez para se
defender pegou a sua espingarda e atirou contra o acusado, mas errou o alvo. Cicero
com a faca que tinha em mãos começou a golpear José, Raimunda ao ver seu pai sendo
golpeado foi ao seu socorro e assim como o mesmo foi golpeada, ambos morreram no
local devido a gravidade dos golpes recebidos, Cicero evadiu do local e nunca foi preso
para responder pelos crimes cometidos.
Em 1951 Daniel Vitorino de Sousa assassinou Nezario Leite da Cruz, ambos
residiam no sítio Riacho dos Cavalos, eram agricultores, Nezario vinha colocando as
suas vacas na propriedade de Vitorino sem a sua permissão, Vitorino já o tinha divertido
que não gostava da sua atitude e pediu para que a vítima não fizesse mais isso, Nezario
continuou a afrontar o acusado, quando Nezario mais uma vez saia da propriedade do
acusado com as suas vacas foi surpreendido por Vitorino que irritado começou a atacar
as vacas com um cacete, e voltou-se para Nezario e o perguntou se o mesmo tinha
achado ruim e estes por sua fez enfurecido se dirigiu contra o acusado, Vitorino que
vinha da roça pegou a sua enxada e começou a golpeá-lo, a vítima veio a óbito no local,
o acusado fugiu e não mais foi encontrado .
Em ambos os processos os crimes foram cometidos na zona rural, tanto a vítima
quanto o acusado agricultores pessoas simples de pouca riqueza e o desenrolar de toa a
trama ocorreu na localidade dos mesmos, o período em que os crimes ocorreram foi em
um momento em que se havia os conflitos por terras, era comum crimes em função da
disputa pela terra. A questão agrária ocupa neste trabalho, a reflexão sobre as formas de
violência presentes no meio rural, a violência e a criminalidade no meio rural essas por
sua vez teve um crescimento de forma acelerada e isso fez com que se impossibilitasse
uma organização e passou a fazer parte da imprensa policial como por exemplo no
jornal da capital e estavam classificados e identificados por ocupações de terra, disputas
por terra e por fim mortes e lesões.
Nesses processos ao qual foram mencionados a cima e em outros também há a
ausência de testemunhas oculares do fato ocorrido, o processo se dá pelos relatos de
testemunhas que fazem parte do ciclo de amizades da vítima e do acusado pessoas que
não estava presente na cena e não sabe o verdadeiro motivo de se cometer o crime e que
começa a levantar empostasses as possíveis motivações dos crimes. No município no
período em que ocorreram esses assassinatos a grande maioria deles eram cometidos
pelos instrumentos de trabalho que era enxada, roçadeira, espingarda, faca e entre
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outros, vários dos crimes cometidos, os acusados não ficaram presos para responder
pelo mesmo em sua maioria fugiram.
Por meio de pesquisas e leituras foi possível constatar que os pesquisadores que
estudam este tema classifica as violências sofridas pelas vítimas no espaço agrário são
classificadas em: A primeira dimensão da violência, derivada do tipo de relação do
homem com a natureza que é a violência que depreda a fauna e o meio ambiente como
um todo, a segunda dimensão da violência agrária, consiste na violência costumeira
dentro desta está inserida a violência entre classes e grupos sociais , a terceira forma de
violência é a violência política está é responsável por expressa uma forma de dominação
entre as classes sociais no campo, exercida principalmente por orientação de mandantes
particulares, a principal característica é o assassinato dos seus opositores o qual se tem
uma impunidade dos mandantes e executores, a quarta forma é a violência simbólica
essa é possível se expressa por diferentes discursos que seria pelo discurso de
colonização e um outro pelo discurso das ameaças de mortes.
Cada delito cometido possuem os resultados processuais diferenciados, devido
isso é necessário se ter cuidado para não generalizar e estipular um padrão social a partir
de relator controversos, devido cada processo em se possuir a sua própria
particularidade, motivação e especificação, não se pode homogeneização a sociedade. A
maioria dos crimes ocorrem devidos problemas de ordem socioeconômica, por mais que
não seja geral, mais é uma realidade que está inserida dentro da criminalidade e mesmo
os crimes analisados sendo de épocas anteriores da atual, estes problemas de ordem
socioeconômica se fazem presente neles, para se realizar os estudos deste faz se
necessário estuda qual a era as questões socioeconômicas da época.
Nos processos analisados está claro a desigualdade social entre vítima e acusado,
por mais que ambos pertençam ao ambiente e pratique os mesmos trabalhos eles se
diferencia nas questões economias onde um é mais abastado financeiramente que o
outro e este que é abastado em sua maioria são os responsáveis pela pratica de
violências e crimes, na análise dos processos é nítido que por mais que os crimes
ocorram no meio rural, com objetos agrícolas onde nos processos estão presentes relatos
onde devido dividas de moradores, discursões causadas por terras, nos processos não
explicita que a motivação dos crimes foram por disputas por terras, sendo assim o
julgamento não é levado para o campo das questões agrárias e sim para outros que em
nada se assemelham ao o anteriormente citado.
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OS CONFLITOS AGRÁRIOS
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partir da luta pela terra que se gera conflitos e que em sua grande maioria marcados por
crimes e assassinatos, as questões socioeconômicas são fáceis de se perceber dentro das
questões agrárias principalmente devido a seletividade do Estado nos conflitos agrários.
No espaço social agrário se tem grupos dominantes, que são aqueles mais abastados
financeiramente que possuem uma posição de domínio em relação demais grupos são
inferiores a eles, essa posição de domínio sobre outros grupos poder em ponto político,
econômico e social.
O intuito é de colocar em evidência a violência rural, assim permitindo tirar do
esquecimento e do anonimato as barbárie, violências e crimes sofridos pelos grupos
pobres que pertencem ao meio rural e assim a partir daí alimentar as forças sociais
sejam elas sindicato dos trabalhadores, INCRA e entre outros que lutam pela conquista
e efetividade dos diferentes direitos que normatizam a vida social contemporânea.
Dentro destes direitos podemos também inserir os direitos civis e políticos, os direitos
sociais e esses direitos já citados se juntando com o direito ambiental, poderiam ser
capazes de vir a garantir o respeito aos direitos humanos na sociedade brasileira.
A luta pela terra, a violência dos proprietários da terra contra a classe pobre,
juntamente com a parcialidade do Estado no conflito agrário que a trata como a
criminalização da questão agrária, isso tudo leva a indicações que há a continuidade do
processo de dilaceramento da cidadania no campo, mas revelam também o vigor das
lutas agrárias, essas lutas desde do princípio sofrem repressão nos dias atuais mesmo de
forma niveladas as lutas agrárias sofrem repressão de infinitos modos e meios, foi a
partir de 1985 que segundo Prof. Dr. José Vicente Tavares dos Santos que a Reforma
Agrária tem sido uma das respostas políticas do Estado Brasileiro, aos conflitos
agrários.
Dentro deste campo de questões agrárias não se pode esquecer que cada ciência
possui a sua própria definição do conceito de questões agrárias e em cada uma delas ela
pode ser trabalhada de maneira diferente:
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todos os que pertenci a os grupos ou movimentos sócias voltados para a questão agrária
no Brasil sofri repreensão, a imprensa não mostra todos os lados da questão agrária e
nem as chacinas sofridas pelos agricultores, por mais que esse seja um assunto que
desde sempre existiu, nestas últimas décadas vem ocorrendo de forma mais violenta e
causando mais vítimas.
O presente trabalho trabalha é com a questão agrária que cominou com morte,
onde esses homicídios tiveram apenas uma vítima, e esse é o principal motivo que nas
pequenas cidades esse tema não se tem uma grande denotação, e é tratado como algo
sem grande importância e não se tem uma estatística relacionada a crimes que
ocorreram devido a questão agrária nas pequenas cidades, mas como se sabe nas
grandes capitais onde se tem crimes relacionados a questão agrária sempre há mais de
uma vítima e se tem uma estatística apenas para crimes relacionados a esse assunto.
No campo a violência sempre esteve presente, os agricultores pequenos
proprietários ou arrendatários são os que mais sofre com essa violência, os crimes que
foram analisados de algum modo se assemelhar sejam pelos grupos sociais a que
pertencem os envolvidos, os objetos utilizados ou até mesmo nas motivações que
mesmo não sendo bem definidas em uma maioria são semelhantes aos demais, é obvio
que não se pode generalizar esses crimes ou dá a eles a mesma motivação, pois como
bem sabemos são pessoas diferentes, em momentos diferentes, que podem ter objetivos
diferentes e em cada um tem seu próprio julgamento que deferi dos demais.
CONCLUSÕES
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transpareçam elementos da vida cotidiana, das relações familiares, e assim por diante) a
pesquisa seguirá este ponto.
O homicídio tem a primazia entre os crimes mais graves, através de pesquisa é
possível se constata que o homicídio não é apenas o ato de tirara a vida do outro e sim
que por trás do ocorrido se tem uma história, se tem motivações e o principal a qual
meio social cada uma das partes pertenci, através dos estudos dos homicídios é possível
conhecer os valores e a cultura de determinada comunidade, é importante entendemos o
homicídio como um problema social e histórico da sociedade e procurar ver este tipo de
crime como práticas culturais de uma sociedade a parti da sua relação com os valores.
A realidade brasileira apresenta uma ampla conflitualidade e um aumento da
violência nos espaços sociais agrários, a partir do que foi apresentado, concluímos que
na cidade do Barro – Ce é vítima dessa violência, os conflitos são entre classes e
grupos, é certo que não se pode classificar. A sociedade como um todo está sempre
sofrendo mudanças, mas existi fato que mesmo que com o decorrer dos anos não deixa
de existir, homicídio é um ocorrido que sempre existiu desde o início da formação da
sociedade, só que por um certo tempo não foi objeto de estudo da história.
A tenção foi deixar claro a desigualdade social que há entre vítima e acusado,
forma geral a desigualdade social sempre esteve presente em toda a sociedade e esta foi
a causadora de inúmeros conflitos, conflitos estes que resultou em vários homicídios, a
realidade brasileira apresenta uma ampla conflitualidade e um aumento da violência nos
espaços sociais agrários, os conflitos não são entre classes e grupos, de as motivações
são questões agraria.
No final de tudo o que se objetiva não é ―abraças o mundo‖ com a pesquisa, mas
dar um pontapé inicial para o tema que é realidade do mundo em que vivemos que a
sociedade como um todo é afetada, é ver o homicídio além do fim da vida de alguém e
sim analisar o que se há interno deste e como esse meio em que vivemos influência a
prática deste crime.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
COLUSSI, Eliane Lucia. Fontes judiciais e suas possibilidades nos estudos de poder
local: os crimes de São Borja. IN: Anais IX Encontro Estadual de História–ANPUH-
RS, p. 185-206, 2008.
671
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MAGALHÃES, José Luiz Quadros de. Reforma agrária no Brasil. id/496832, 1988.
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RESUMO
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288
Informação consultada no site institucional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE:
https://ww2.ibge.gov.br/home/geociencias/areaterritorial/area.php?nome=Nazar%E9+da+Mata&codigo=
&submit.x=0&submit.y=0, Acesso em: 15 de setembro de 2017.
289
Sobre o Sistema de Plantação, ou, no original inglês ―Plantation”, ver: WOLF, Eric R.; MINZT,
Sidney W. Fazendas e Plantações na Meso-América e nas Antilhas. IN: MINTZ. Sidney W. O poder
Amargo do Açúcar: Produtores Escravizados, Consumidores Proletarizados. Organização e tradução
Christine Rufino Dabat. 2. ed. Recife: Editora Universitária da UFPE, 2010.
290
PERNAMBUCO. Secretaria de Planejamento. Fundação de Informações para o desenvolvimento de
Pernambuco-FIDEPE. Série Monografias Municipais: Nazaré da Mata. Recife, 1982.
291
THOMPSON, E. P. A Formação da Classe Operária Inglesa I: A Árvore da Liberdade. Tradução de
Denise Bottmann, 6. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2011.
292
THOMPSON, E. P. Costumes em Comum. Tradução de Rosaura Eichemberg. 8ª reimp. São Paulo:
Companhia das Letras, 2015.
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período pré-industrial com a nova realidade do sistema fabril, mas tal constituição deve
ser compreendida como um fazer-se, em que os próprios indivíduos são agentes que não
mantém apenas uma relação reativa com sua realidade história, mas que sua ação é
formada de modo complexo tanto pelas alternativas possíveis em cada momento, como
pela bagagem cultural que tal indivíduo ou conjunto de indivíduos traz consigo. Daí a
importância central do conceito de Experiência na obra de Thompson, conceito que, ao
nosso ver, se refere a toda a bagagem mobilizável por grupos e indivíduos na avaliação
das opções postas pela realidade histórica e, por conseguinte, na decisão acerca de qual
rumo seguir em cada momento. Desse modo, os diversos movimentos realizados pelos
trabalhadores na Inglaterra nos anos mais duros da Revolução Industrial não podem ser
compreendidos como simples atos de rebeldia de homens e mulheres incapazes de
valorizar o progresso ou reconhecer sua ―verdadeira‖ consciência, sendo mais
satisfatoriamente compreendidos se reconhecermos ―o sentimento de perda de toda
coesão comunitária‖ que esses homens e mulheres compartilhavam, elemento presente
nas palavras de ordens dos trabalhadores, e que irá se expressar nas suas formas de
organização e em seu programa político. (2012, p.437)
Quanto ao conceito de Cotidiano, serão utilizadas as contribuições de Lukács e
Agnes Heller. O Filósofo húngaro, naquilo que considerava ser uma reconstituição
fundamental do pensamento de Marx e, por essa via, do marxismo, põe a questão do Ser
Social no centro de suas reflexões, naquela que será sua última obra e, para alguns, seu
maior legado filosófico. É assim que na Ontologia do Ser Social293 o cotidiano terá um
lugar de destaque, pois, para o autor, é na vida cotidiana que os elementos mais
importantes da reprodução do ser humano, sejam do homem individual ou do conjunto
da sociedade, emergem e sempre voltam a desembocar. Para Lukács, ―vida cotidiana,
ciência e religião (teologia incluída) de uma época formam um complexo
interdependente, sem dúvida frequentemente contraditório, cuja unidade muitas vezes
permanece inconsciente‖. Nesta ligação de caráter relacional entre esses três elementos
da vida social, cabe ao ―prosaico e terreno senso do cotidiano, alimentado pela práxis
diária, (...) de quando em quando constituir um saudável contrapeso aos modos de ver
estranhados da realidade das esferas ―superiores‖.‖ Desse modo, filosofia, ciência,
religião etc., ―não podem ignorar essas exigências da vida cotidiana.‖ (2012, p.30-1).
293
LUKÁCS, György. Para uma Ontologia do Ser Social I. Tradução de Carlos Nelson Coutinho,
Mário Duayer e Nélio Schneider. 1. ed. São Paulo: Boitempo, 2012.
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Por sua vez, Agnes Heller, bastante influenciada pela obra de Lukács, concebe a
vida cotidiana como a vida de todo homem, na sua completude, a vida do homem
inteiro. Marcada pela heterogeneidade – pois as diversas atividades que nela realizamos
não são iguais –, e pela hierarquia, embora tal hierarquia não seja imutável, mas
histórica, de maneira que aquilo que em determinado momento assume uma posição
central pode tornar-se secundário em outro contexto. Dessa maneira, ―o homem da
cotidianidade é atuante e fruidor, ativo e receptivo‖ muito embora ―não tenha nem
tempo nem possibilidade de se absorver inteiramente em nenhum desses aspectos; por
isso, não pode aguça-los em toda sua intensidade.‖. (2008, p.31) Ambos os autores no
ajudam a perceber a vida cotidiana não apenas como algo trivial ou desimportante, mas
salientam sua riqueza e complexidade, possibilitando a ampliação de nossa abordagem.
Veremos como as vivencias da vida cotidiana dos trabalhadores moldaram suas lutas e
marcaram tanto a forma de suas organizações quanto seu programa político.
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Em sua obra, Dabat vai questionar como a ―onipresença da violência patronal‖ aparece
nos depoimentos de trabalhadores, ―seja ela efetiva ou potencial‖. A autora nos mostra,
dentre outros casos, a comum atitude dos proprietários de invadir a casa de seus
trabalhadores, a qualquer hora, pessoalmente ou enviando seus prepostos, com a
finalidade de aterrorizá-los para manter a ―ordem‖. Um dos aspectos mais brutais de tal
violência, o assassinato de trabalhadores, eram muitas vezes motivados por ―conflito de
interesse‖, quando os proprietários se negavam a pagar os vencimentos a que os
trabalhadores tinham direito, e estes não relutavam em reivindicá-los. A indicação é
clara, na zona canavieira de Pernambuco ―a violência patronal‖ deve ser compreendida
como um ―fator econômico‖. Veremos como o caso do trabalhador rural Manoel Biró
da Silva, ocorrido em Nazaré da Mata no ano de 1969, auge do regime de exceção,
explicita os traços mais brutais dessas relações de trabalhos, ainda mais agudizados nos
anos de chumbo. (2012, pp. 732-734)
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Sem pretensão de construir uma imagem idílica, Amaro nos revela como as discussões
nas assembleias demonstram não apenas uma consciência clara dos trabalhadores acerca
das violências que sofriam, uma noção daquilo que era ou não aceitável de acordo com
suas percepções de certo e errado, condenando tanto a violência patronal como os
comerciantes que abusavam no preço das mercadorias. O sindicato aparece, desse
modo, não apenas como uma organização cujo fim é reivindicar melhores condições de
trabalho, mas um espaço onde esses homens e mulheres podem discutir elementos mais
variados das suas vivencias cotidianas, dispensando inclusive o recurso aos aparelhos
estatais para resolução de querelas, de maneira que a violência, tanto sentida por eles em
sua relação com os patrões, podia ser um instrumento agora mobilizável em seu favor,
contra aqueles que praticassem atitudes que consideravam incorretas, pois ela era parte
679
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
de suas vivências diárias, cotidianas, as quais comparecem sempre que têm de enfrentar
as questões apresentadas em cada momento.
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
ajudando a fornecer um quadro das relações de trabalho em Nazaré da Mata nos anos do
Regime Civil-Militar. Trata-se de uma querela trabalhista, em que o patrão de Manoel
Biró, proprietário do engenho Diamante, onde o mesmo trabalhava e residia, aciona a
Justiça do Trabalho a fim de conseguir a rescisão do contrato de trabalho por justa
causa, alegando que o trabalhador havia cometido falta grave ao ausentar-se do trabalho
por tempo superior ao permitido em lei, sem apresentar justificativa.
681
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
abordagem dessa legislação está diretamente ligado à relação de morada, outro elemento
importante para a compreensão do caso de Manoel Biró e das relações de trabalho na
zona canavieira pernambucana. Também ligada ao passado escravista, a relação de
morada caracteriza-se pela cessão aos trabalhadores de um determinado lote de terra
onde seria permitido aos mesmos fixar residência e eventualmente plantar culturas de
subsistência, enquanto durasse sua relação de trabalho com o senhor de engenho. Tal
estratégia era adotada pelos proprietários com o objetivo de fixar a mão de obra nos
engenhos, a fim de garantir seu fornecimento em quantidade suficiente e a baixo preço.
Os trabalhadores, por seu turno, na ausência de alternativas, assumiam a relação de
morada e submetiam-se às condições impostas pelo senhor. (DABAT, 2012, pp. 91-2)
Desse modo, para os trabalhadores que viviam na condição de ‗morador‘, a demissão
era ainda mais penosa, pois significaria a perda da própria residência. Nesses termos, a
importância de uma legislação que assegurasse a estabilidade dos trabalhadores rurais
fica ainda mais clara, seja pelas garantias que oferecia aos trabalhadores, seja pelo golpe
que infligia no modelo tradicional de dominação dos proprietários.
296
Processo Trabalhista da Junta de Conciliação e Julgamento de Nazaré da Mata. Processo: 02/96, p. 09.
682
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
ordens que se recebem podem ser cumpridas‖, ordenando ainda que Manoel os
acompanhasse até o carro da guarnição, salientando que se o trabalhador tentasse correr
ele atiraria. Conta ainda Manoel que foi levado pelos policiais, que conduziram o
veículo para dentro dos canaviais, enquanto lhes faziam perguntas. Em primeiro lugar,
queriam saber se outros trabalhadores possuíam armas na propriedade, afirmando que se
ele não respondesse ―seria pior para a sua pessoa‖. Manoel conta que os policiais ainda
lhe questionaram se ―os outros (trabalhadores) eram agitadores como ele?‖, ao que o
trabalhador respondeu que ―assim sendo todos nós seriam agitadores, porque cobra o
salário do dia.‖ Manoel relata então que indicou um trabalhador aos policiais, o qual
possuía uma arma. A viatura teria então tomado o rumo da residência desse trabalhador,
chamado por Manoel de ―O velho‖. Lá os policias questionaram o ―Velho‖ a fim de
saber se o mesmo possuía alguma arma. Manoel não esclarece em seu relato qual a
resposta dada aos policiais pelo trabalhador, diz apenas que em seguida os dois foram
postos dentro do carro, e que na estrada um dos policiais teria revelado a Manoel que
havia recebido a missão de mata-lo na Secretaria do 4º Exercito. Após essa afirmação, o
carro teria sido conduzido para o canavial, sendo Manoel espancado pelos policiais que,
antes de abandonarem o trabalhador ferido, ―lhe recomendaram para nada dizer a
ninguém nem mesmo no sindicato‖, e que se assim não fosse ―ele voltaria por uma
madrugada, o enforcaria e o colocaria em um saco e que o enterraria na beira do rio, no
massapê‖. Manoel ainda afirma que ―acha que o espancamento partiu de seu patrão‖ e
que ―outros trabalhadores (do engenho) receberam a promessa de levar o que ele
levou‖.297
Esse relato brutal revela um caso que não pode ser considerado uma exceção no
contexto por nós analisado. Basta apenas refletirmos como ele revela elementos
importantes no que diz respeito a utilização do aparelho repressivo dos anos de chumbo
na intimidação dos trabalhadores, de suas formas de luta e instituições. Em tal contexto,
o próprio ato de ir à Justiça do Trabalho reclamar algum direito é motivo para todo tipo
de enquadramento dos trabalhadores enquanto ―agitadores‖, justificando atos de
violência como vimos acima. Ao longo dos depoimentos, ficamos sabendo que Manoel
havia entrado em conflito com o administrador do engenho Diamante no dia anterior ao
seu espancamento. Manoel levou o caso ao Sindicato que em seguida defendeu os
interesses do trabalhador perante a Justiça. Tal informação é comprovada no
297
Ibidem, p. 08-09
683
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298
Ibidem, p. 32.
299
Ibidem, p. 37.
300
Ibidem, p. 33.
301
Ibidem, p. 34.
684
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O trabalhador também afirma ter tido uma ―desinteligência‖ com o motorista do Senhor
de Engenho, que ao vê-lo reivindicar o pagamento relativo ao trabalho executado em
um feriado ―soltou uma graça, lhe chamando de comunista porque havia pleiteado ditos
pagamentos ao que respondeu que não era comunista‖.303 Como podemos ver, o
discurso da subversão era agora mobilizado na repressão aos trabalhadores, inibindo,
entre outras coisas, seu recurso ao Judiciário Trabalhista. Manoel Biró deveria ser visto
como um exemplo para os outros trabalhadores, que ao incorrerem nos mesmos ―erros‖
do colega, poderiam ―levar o que ele levou‖.
Essas são apenas algumas passagens desse rico documento. Nelas vemos que a
complexidade das vivencias cotidianas, tal como pensou Lukács, não nos permitem
inferir um único caminho de resposta. Se nesses contextos os trabalhadores
denunciavam patrões em público nas assembleias sindicais, também ocorria, de acordo
com a particularidade de cada caso, de temerem tais organizações por medo de
represálias. Assim, por exemplo, a atitude legalista assumida pela Federação dos
Trabalhadores na Agricultura de Pernambuco – PETAPE no período pós-golpe,
caracterizada pela recusa da influência de militantes comunistas no movimento e
restrição da pauta reivindicatória a conquista de direitos, não deve ser vista como um
ato de covardia ou concessão, mas responde as próprias vivencias desses trabalhadores,
fazem sentido para eles, e exemplos como esses apresentados nos depoimentos de
trabalhadores podem ajudar a esclarecer suas escolhas. (ABREU E LIMA, 2012, pp.
125-26)
CONCLUSÃO
302
Ibidem, pp. 38-39.
303
Ibidem, p. 40.
685
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Nesse caso específico, o ganho de causa para Manoel Biró da Silva significa
retornar ao trabalho, nas condições anteriores ao espancamento, reconhecida sua
304
Ibidem, p. 57-8.
686
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
HELLER, Agnes. O Cotidiano e a História. 8. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2008.
LUKÁCS, György. Para uma Ontologia do Ser Social I. Tradução de Carlos Nelson
Coutinho, Mário Duayer e Nélio Schneider. 1. ed. São Paulo: Boitempo, 2012.
305
Ibidem, p. 90.
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ARQUIVOS PESQUISADOS
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RESUMO
INTRODUÇÃO
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imigração avaliada na Europa desde 2011, início das agitações da Primavera Árabe, até
os dias de hoje com o movimento de milhões de pessoas advindas das regiões do
Oriente Médio, África e Ásia do Sul.
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Imagem 1 Caminhão onde os imigrantes foram encontrados Foto: BBCBrasil.com apud Terra (2017)
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Como vimos anteriormente, não conceder asilo e colocar pessoas sob risco
constitui graves violações aos direitos humanos, no entanto, ainda assim não é possível
verificar intervenções efetivas de países não europeus nas questões referentes à crise de
imigração na Europa. É evidente que muitos países, dentre os quais os Estados Unidos,
têm enviado ajuda humanitária de diversas formas. O que não se verifica é uma
intervenção, seja direta ou indireta, jurídica ou não quanto aos casos verificados de
negligência por parte de governos europeus aos direitos humanos dos refugiados e
requerentes de asilo.
Jeanne Park (2015, s/p) em seu artigo ―Europe‘s migration crisis‖ analisa
que:
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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PARK, Jeanne. Europe‘s migration crisis. New York: Council of Foreign Relations.
p. 311-325, 2015. Disponível em: https://www.cfr.org/backgrounder/europes-migration-
crisis. Acesso em: 23 de Janeiro de 2017
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... VOCÊS DIRÃO: TODOS VIVEM!!! MAS EU DECIDI QUE POSSO PARAR
COM ISSO." O SUICÍDIO NA CIDADE DE BERNARDINO BATISTA/ PB
(2000 - 2015)
RESUMO
Analisar historicamente a prática do suicídio na cidade de Bernardino Batista, município
localizado no sertão paraibano, é o objetivo. Observa-se que dentro do quadro de mortes
do referido município, há uma considerável parte desses óbitos que se dão por meio de
suicídio. Atestados de óbitos se constituíram a princípio como fonte para a análise
histórica que buscará compreender o fenômeno do suicídio e os discursos que
instituídos desde o século XIX pelo discurso médico, o religioso e o moral ainda ecoam
na Bernardino Batista, com um enfoque nos anos 2000 a 2015, recorte temporal
escolhido por fatores decisivos aos quais viabilizaram a efetivação da pesquisa, entre
eles o conjunto de fontes disponíveis. Busca-se compreender o suicídio como um
fenômeno histórico, dotado de historicidade. Em uma perspectiva cultural partimos de
conceitos como biopolítica em Michel Foucault e as esferas de biopoder que perpassam
os discursos sobre o suicídio.
Palavras-chave: Suicídio; Bernardino Batista; Historiografia; Michel Foucault.
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307
Dados da Organização das Nações Unidas sobre o suicídio e seus números pelo mundo disponível em:
www.who.int
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AS FONTES E O JUDICIÁRIO
Faz parte da natureza que os seres vivos morram, assim como nascem. A morte
é um fator biológico, contudo as concepções da morte e do morrer podem se diferenciar
de acordo com o espaço e o tempo na qual se insere. As pessoas passam a pensar a
morte de forma diferente, o sentido muda de sociedade para sociedade, assim como
podem se tornar diferentes de acordo com cada temporalidade. Inevitavelmente a morte
chega, enquanto ela chega às pessoas vivem. Mas todos vivem? Quem espera pela
chegada da morte? Quem aguarda? Foi pensando essas questões que veio o interesse em
estudar o suicídio, pensando em porque as pessoas não esperam, o que as movem a
cometer suicídio. Quais são os fatores para uma determinada sociedade apresentar entre
seus populares uma maior disposição para matar a si mesmo?
O interesse em estudar o suicídio na cidade de Bernardino Batista se deu pelo
fato da cidade apresentar segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatísticas) uma população de 3.153 habitantes e levando em consideração esse dado,
as tentativas e efetivações de mortes por suicídio são visivelmente recursivas. Dando
enfoque nos anos 2000 a 2015 podemos contar com um conjunto documental que nos
traz um apanhado qualitativo de levanta questões importantes sobre as condições em
que esses documentos são registrados. Tendo acesso ao livro de tombo da comarca da
cidade de São João do Rio do Peixe, a qual Bernardino Batista pertence judicialmente,
podemos notar também a carência de dados com relação aos casos ocorridos no
município, estando registrado apenas um caso, o da Jovem Jéssica Alves Martins 308,
este estando com poucos detalhes, rasurados no campo de especificação da causa mortis
com corretivo e por cima um escrito o detalhando como ―Fato atìpico‖ e esse tipo de
descrição de causa de óbito chama bastante atenção quando percebermos que até mesmo
dentro da esfera da justiça o suicídio é tratado como um fato atípico, que não é
recorrente? Que não é normal? Natural? Assim também encontramos pouquíssimos
atestados de óbitos, tanto no cartório da cidade, bem como nos arquivos da unidade
básica de saúde e esta UBS vale ressaltar é de onde saí os dados relativos a saúde dos
munícipes batistenses que vão para o ministério da saúde e que em tese voltam como
propostas de soluções para possíveis problemas de saúde pública. Mas como voltam se
a Atenção Básica não tem um levantamento preciso e seguro das mortes por suicídio? O
308
Jéssica Alves Martins, 15 anos de idade, batistense e residente na cidade cometeu suicídio em
07/09/2007 por meio de enforcamento em sua residência.
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A IGREJA;
E é isso que a igreja traz. Essa indiferença com o corpo do suicida sofre
ao longo do tempo algumas mudanças, novas perspectivas, mas o discurso é pautado na
309
Os cemitérios públicos como alvo das disputas entre Igreja e Estado. Diálogos, DHI/PPH/UEM, v. 13,
n. 1 p. 119-142, 2009.
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premissa de que a vida é dom de Deus e que a ele pertence. Ao individuo é negado o
direito de vida e morte, mesmo que esta esteja em poder de cada um, como nos aponta
alguns pontos do Catecismo da Igreja católica.310 Não raro as pessoas comentam ―É
falta de Deus.‖, ―Estava longe de Deus.‖, ―Isso é coisa de quem não acredita em Deus.‖.
O caso de Lia esbarra nesse discurso de que o suicida ―não tem Deus‖. Não há aparente
fragilidade nesse laço humano com o divino e com uma instituição. Chama atenção
ainda para o fato da igreja ainda não ter abandonado esse discurso de pecado
imperdoável e mesmo assim, não só Lia em questão, mas um grande número de cristãos
católicos rompe com o ciclo da vida voluntariamente.
A MEDICINA;
310
O Catecismo da Igreja Católica (C.I.C) é claro ao afirmar que ― o suicídio é gravemente contrário à
justiça, à esperança e à caridade. É proibido pelo quinto mandamento‖. C.I.C. nº 2325. ―O suicìdio
contradiz a inclinação natural do ser humano a conservar a própria vida‖. C.I.C. 2281.
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Osanam faz uso apenas de cartas escritas por suicidas. São cartas,
bilhetes e anotações que para o autor são fontes, documentos, que deixados pelos
indivíduos os quais recorreram ao suicídio, revelam quais eram as suas visões de
mundo. O autor chama atenção para o fato de ao emergir o período pós-moderno e todos
os discursos que o acompanham, inclusive sobre a condição humana e sobre a morte,
gerou-se assim uma transformação no modo com o qual o indivíduo particulariza suas
experiências e reflete ainda em como ele representa o ato de tirar a sua própria vida.
704
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De acordo com o autor, a carta nos remete a ideia de que a atriz tinha a
sensação de não pertencimento ao lugar que estava, e que quando não há esse
311
DIVULGADA a carta deixada por Leila Lopes, O Globo, Rio de Janeiro, 08 dez. 2009. Disponível
em: http://oglobo.globo.com/cultura/revista-da-tv/divulgada-carta-deixada-por-leila-lopes-3185750
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312
312
Fotografia do livro de tombo que se encontra na cidade de São João do Rio do Peixe, delegacia esta
responsável pelo destacamento policial de Bernardino Batista. Na ficha constam informações a respeito
do óbito da jovem Jéssica Alves Martins.
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313
313
Atestado de óbito da Senhora Maria Romana que se encontra do cartório de registro civil do município
de Bernardino Batista.
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REFERÊNCIAS
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RESUMO
Este artigo busca abrir o diálogo acerca do estado da questão da ―loucura‖ na primeira
década do século XXI na cidade de Cajazeiras-PB. É fruto de um estudo que está sendo
desenvolvido como trabalho de conclusão de curso. Aqui, delinearemos os
sustentáculos de nossa pesquisa a partir de uma perspectiva foucaultiana de análise de
discurso. A ideia é traçar uma arqueologia em torno da criação dos CAPS em 2001 e no,
consequente, processo de desestímulo do modelo hospitalocêntrico como resultado das
lutas que foram e estão sendo travadas desde 1980 no Brasil. A pesquisa terá como base
documental a análise dos prontuários do Centro de Associação Psicossocial (CAPS II).
Desejamos, com isso, ampliar as possibilidades de re (elaboração) das ações
socioculturais voltadas à saúde mental.
Palavras-chave: Loucura; Cajazeiras; Contemporaneidade.
Introdução
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espiralada dos aspectos sociais e culturais que nos proporcionam problematizar essa
questão em seus diversos aspectos.
CONTEXTUALIZANDO
A loucura já foi vista de diversas maneiras ao longo do tempo. Ora, com adornos
mágico-transcendentais, em que o sujeito consegue caminhar por diversos espaços de
sociabilidade, ora como algo que passa a ser símbolo de inimputabilidade, como um
veiculador de uma mensagem ilegítima, delirante, e encaminha-se como patologia
requerendo o auxílio médico. Noções de beleza, de comportamento corporal, de
moradia, de classe, de religiosidade, de cor, foram sendo ―encaixadas‖ e pré-
determinadas aos sujeitos sociais interferindo nas construções da loucura como doença e
sendo articulados aos tratamentos psiquiátricos vigentes. As representações da
sociedade vão sendo perpassadas e o imaginário de si acaba sendo mesclado com esses
conceitos.
A cientificidade do saber no século XIX traz, sobretudo, uma configuração
linguística nova em que o poder de quem fala conduz a relação com o objeto de que se
fala. Essa postura remodelada é algo que se apodera da relação médico-paciente. Para
Michel Foucault (2008) há mais uma concretude ―conceitual‖ do que qualquer ideia de
―desenvolvimento‖, de fato, estabelecido entre a Medicina Clássica e a Cientìfica.
É primordial, sobretudo, pensarmos em um século XIX como um período de
reflexões epistemológicas e teóricas acerca da elaboração dos conhecimentos gerais. A
própria historiografia passa por esse processo. Enfim, há toda uma metamorfose dos
saberes que tem início no fim do Medievo e início do Renascimento e que se consolida
no século XIX. A partir disso, no século XX o relativismo é introduzido em cena com a
teoria do físico Albert Einstein marcando assim um contexto de novas configurações
nos diversos campos de saber. É iniciada uma ―marcha‖ em que é necessário quebrar
―estruturas‖ ligadas às verdades absolutas e pensar nos meios de ―racionalidades‖
diversas.
A mobilização dos saberes é uma marca destes dois últimos séculos. A realidade
histórica, portanto, é vista como uma construção. Sendo assim, a essência do
relativismo é compreender que não existe um campo de saber imutável. Para Michel
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DISCUTINDO CONCEITOS
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Uma circularidade cultural, dentro de uma ―estrutura‖ que é vista muitas vezes
como algo, estritamente, rígida, é trabalhada por Yonissa. Ela pensa nesses novos
cenários que vão sendo elaborados e ressignificados a partir de uma linha que envolve
Cultura, Relações de Gênero e Memória. Yonissa busca problematizar a
institucionalização dos Hospitais e da Psiquiatria no âmbito nacional percebendo as
veredas que foram sendo fabricadas no Estado do Paraná.
Com o intuito de perceber em como a ideia de ―loucura‖ tramita na sociedade
cajazeirense no tempo presente e, também, pensando em como as identidades dos
pacientes que utilizam esse serviço público são construídas, pretendemos historicizar
esse processo interno e externo de análise de si dentro de um contexto de virada de
século. Dialogaremos com prontuários médicos que nos darão meios de solidificar esse
estudo. A partir de, por exemplo, nome completo, idade, profissão, estado civil, quadro
clínico, entre outros, podemos indicar graus de parentescos entre os pacientes, faixa
etária que utiliza esse serviço na cidade, diálogo desses pacientes com a sociedade por
meio do trabalho, alcance de atendimento do CAPS às regiões circunvizinhas, suas
relações pessoais, duração do tratamento, o que levou esses indivíduos a procurar
auxílio, como está sendo o processo de tratamento, enfim, um leque de particularidades.
A institucionalização da saúde, no geral, se dá na transição do século XVIII para
o XIX. Aqui no Brasil se dá entre o final do século XIX e começo do século XX. A
vinda da famìlia real e a ―loucura‖ de D. Maria (mãe de D. João VI) foi o ponto de
partida para se pensar na psiquiatria no país. O primeiro hospício se inaugura no Rio de
Janeiro em 1852 e recebe o nome de Pedro II, segundo Nádia Maria Weber Santos
(2013). O número de hospícios vai aumentando no Brasil com o delineamento do
campo de saber psiquiátrico e a partir do ―movimento higienista‖.
No Brasil Império, momento em que o país tenta construir fortemente uma
identidade nacional através da literatura, com a chegada da família real ao Brasil, essa
―necessidade‖ de ser ―singular‖ passa a ser um discurso proferido na época e esteve
relacionado com a origem das instituições hospitalares ditas próprias para os loucos e ao
desenvolvimento da psiquiatria no paìs. Uma verdadeira vontade de ―limpar‖ os
sofrimentos alheios colocando em cena a constante felicidade intelectual e, claramente,
normativa com ares de boemia presentes e prioritárias na vida urbana brasileira. Sendo
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assim, o diferente logo precisa ser ―catado‖, assim como os feijões que são retirados
quando não servem para cozinhar e o depositamos em seus lugares designados.
Os loucos precisavam de um lugar específico para que não trouxessem
problemas para a sociedade. Elisa Verona (2008) faz uma relação entre o Romance
(gênero literário de grande alcance de leitores na época, principalmente mulheres) e o
histerismo que é ligado, incisivamente, à mulher por conta do útero que provocaria
reações que seriam transmitidas ao cérebro. Enfatizamos que a mulher para ser contida
sexualmente, quando considerada histérica, era tratada com ―injeção de água gelada no
ânus, a introdução de gelo na vagina, a extirpação do clitóris ou dos órgãos sexuais
internos‖. (CUNHA, Maria Clementina Pereira. O espelho do mundo: Juquery a história
de um asilo. In: VERONA. O Romance, A mulher e o Histerismo No Século XIX
Brasileiro. 2008. p. 6). No período republicano essa preocupação aumenta e a
especialização entra em cena com os psiquiatras comandando o ―discurso‖ do saber-
poder médico acerca das pertinências da loucura.
É necessário, em vários momentos, como Michel Foucault fez com a
historiografia, pularmos dentro dos nossos próprios precipícios e desconstruirmos
verdades, supostamente, sedimentadas. É pensar ―A razão‖ não como mestra de tudo,
mas como uma árvore frutífera de racionalidades. A forma de representação da loucura
parte, também, do próprio ―louco‖. Acreditamos que é necessário colocar em prática o
diálogo com a literatura e os escritos de si. A partir disso, nós podemos entrecruzar
essas; ―narrativas que respondem às perguntas, expectativas, desejos e temores sobre a
realidade, a História e a Literatura oferecem o mundo como texto‖. (PESAVENTO,
2003, p.33). Essa união nos possibilita pensar nas subjetividades e no sensível da escrita
de si e das representações.
O que difere os dois discursos é que a História está intrinsecamente preocupada
em alcançar o real, diferente da Literatura que procura ousar em seus enunciados, com
os lirismos, brincando com as palavras. Mas, toda obra literária é fruto de uma época, de
um lugar social, ou seja, de um contexto. Segundo Pesavento (2003):
[...] geste entendimento da História como uma narrativa sobre o passado liga-
se ao conceito da representação, que encarna a idéia de uma substituição, ou
ainda da presentificação de uma ausência. Assim, no sistema de
representações sociais construídas pelos homens para atribuir significado ao
mundo, ao que se dá o nome de imaginário, a Literatura e a História teriam o
seu lugar, como formas ou modalidades discursivas que tem sempre como
referência o real, mesmo que seja para negá-lo, ultrapassá-Io ou transfigurá-
Io. (p.33)
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A partir de Foucault iremos pensar o próprio termo ―loucura‖ que nem sempre é
atrelado às doenças mentais até porque foi criado anteriormente à sua
institucionalização. Ela é ligada, em suma, aos modos desviantes das normatividades
sociais. Foucault aponta que o dito ―louco‖ é dotado de historicidade. Um exemplo
disso está claramente no fenômeno da higienização na cidade do Rio de Janeiro do
inìcio do século XX que foi ―encaixado‖ em um padrão de normalidade do social e não
apenas em aspectos arquitetônicos. Essa relação entre o que é doença e saúde mental é
uma linha tênue que será analisada ao longo da pesquisa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
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INTRODUÇÃO
314
Formada no curso de História pela Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), o presente
trabalho é parte da pesquisa do trabalho de conclusão de curso.
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Podemos ver tamanha ligação entre essas instituições como se fossem uma,
a religião era uma forma do Estado penetrar na mente e na cultura da colônia,
inculcando nas pessoas os ideais pregados pelo governo, bem como os rituais religiosos,
onde acontece uma apropriação religiosa para legitimar o seu poder, e ela se apropria da
cultura dos indígenas tornando-a errada e demoníaca, sendo necessária a imposição de
uma instituição que conduzisse esse povo à ―salvação‖; tornando a Igreja Católica uma
empresa religiosa com objetivo de inculcar e disseminar suas práticas na população.
Ainda segundo CARREIRO (2007), o Estado fazia dessa crença seu instrumento de
poder, e a partir daí passou a orbitar em torno da Coroa, constituindo um ornamento do
trono. Gamaliel afirma que ―A situação de dominação do Estado em assuntos da Igreja
ao longo dos séculos XVI, XVII, XVIII e XIX foi se agravando de uma forma tal, que a
presença e a força do Papa e da Cúria Romana eram quase nulas‖ (CARREIRO, 2007,
p. 64).
Sendo o padroado uma forma do Estado predominar nos assuntos religiosos,
pois dava ao Imperador o direito de indicar todos os cargos eclesiásticos no Brasil,
sendo realizado pagamentos de salários para o clero, tornando-os como funcionários.
Além disso, todas as bulas e documentos papais que vinham para o país eram obrigadas
a ter autorização do Imperador, demonstrando o controle do aparelho estatal sobre a
Igreja e uma subordinação que ela tinha em relação a ele:
Quando a Igreja desejava aumentar sua presença institucional nas colônias,
não podia, pois dependia da boa vontade do Estado e de seus recursos para tal
incursão. Quando a questão tinha interesse do Estado tal empreendimento
acontecia; quando não, simplesmente o projeto era vetado ou arquivado.
(CARREIRO, 2007, p. 68).
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Por conseguinte, podemos perceber que por muito tempo a Igreja Católica
brasileira ficou subordinada ao Estado, como uma espécie de desmembramento do
governo, tomando como exemplo a constituição de 1824 que demonstra a supremacia
do aparelho estatal em detrimento da igreja, e a grande eficiência em controlar a
religião, pois é atribuído ao Imperador nomear bispos e prover benefícios eclesiásticos.
Apesar desse controle, é interessante ressaltar a importância que o catolicismo vai
exercer durante o período imperial, pois se constitui como uma das bases da cultura e
das estruturas política, social, econômica e jurídica da sociedade brasileira, além disso
essa instituição religiosa vai gozar de benefícios e privilégios por ser a religião oficial
do país, tendo também o prestígio e influência que vai adquirir junto à sociedade,
influência essa que se repercute até os dias atuais.
Mesmo com os ganhos que a Igreja Católica conquistou, ela obteve diversas
perdas: como o enfraquecimento e desgaste das instituições e agentes católicos, além
dos descontentamentos com o Estado que controlava a instância religiosa deixando-a
submissa e dependente do governo, tomando como exemplo de conflito entre Igreja e
Estado é a questão religiosa, onde o papa Pio IX envia uma bula excomungando todos
os católicos que estivessem envolvidos com a maçonaria, atingindo diretamente d.
Pedro II que integrava os quadros da instituição censurada, dessa forma o Imperador
formula um decreto não reconhecendo a ordem dada, entretanto os bispos de Olinda e
Belém resolvem acatar as ordens do papa expulsando párocos ligados à maçonaria, por
conseguinte esse acontecimento vai desgastar bastante a relação entre coroa e igreja, e a
partir daí possibilitará uma nova fase do catolicismo, resultando em uma maior
independência dessa instituição perante o governo.
Além do desgaste entre o Estado e a Igreja, podemos ver nesse período a
inserção do protestantismo no país de forma institucional e definitiva a partir do século
XIX, inicialmente nos anos 20, com a presença imigrante incrementado através do
Tratado Comercial com a Inglaterra em 1808, que previa a liberdade de culto, e,
posteriormente como resultado do empreendimento missionário estadunidense, o
―protestantismo de missão‖, descrito na literatura especializada; fase essa do
estabelecimento do movimento protestante no Brasil com a chegada de diversas missões
religiosas, principalmente as norte-americanas, e o começo da atividade dirigida a fazer
prosélitos entre os brasileiros.
Outro ponto que vai ser de fundamental importância para a implantação
dessa nova religião no país vai ser a chegada da mão-de-obra imigrante, visto que o
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ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
Brasil tinha crescente necessidade desse tipo de trabalho, que tinha maior
predominância em países de tradição protestante, ao contrário dos países com tradição
católica. Sendo necessário o estabelecimento de algumas garantias, particularmente no
que se refere às liberdades e aos direitos destas populações; essa liberdade religiosa vai
ser essencial para a propaganda do Brasil no exterior com o intuito de atrair esses
trabalhadores. É interessante destacarmos que o modelo de formação e prática
sacerdotal herdado da tradição tridentina que Roma formava seu clero, não foi aceito de
forma espontânea pela ―Igreja popular‖ no paìs, manifestando um certo anticlericalismo,
sendo assim, isso vai consistir em um elemento que vai impulsionar grandemente as
camadas populares abraçarem o protestantismo.
Com a chegada do protestantismo no Brasil, as reações iniciais foram de
curiosidade, interesse e indiferença. As reações dos setores do clero foram variadas,
alguns mais reticentes, outros hostis e menos os de influência jansenista 315. Além disso
o anticlericalismo entre as elites, citado anteriormente, e uma aproximação com o
pensamento liberal, constituíam-se como fatores simpáticos ao protestantismo. Dentro
desse cenário, as perseguições foram episódicas e particulares, o que podemos
depreender que mesmo o catolicismo sendo a religião oficial, há uma certa abertura a
uma nova instância religiosa, cabendo uma análise e ponte com a atualidade, onde
mesmo o cristianismo, no sentido geral, abarca a maior parte da população brasileira, há
espaço para diversas religiões e pensamentos acerca de uma Alteridade no Brasil.
Entretanto, a reação romana contra a presença protestante se deu pelo esforço de
supressão da propaganda católica, pela difusão de literatura religiosa, pelo incremento
das ―santas Missões‖ e o confisco de sua literatura, como a queima de bìblias
protestantes em Olinda no ano de 1865.
Dessa forma, com a chegada das missões protestantes no Brasil e com a
disseminação da sua mensagem, vemos a partir do início do século XIX e mais
precisamente na sua segunda metade em diante um declínio do catolicismo, onde
despertará um curiosidade e simpatia com a mensagem protestante, gerando uma perda
de fiéis para as igrejas tradicionais. Apesar disso, as igrejas tradicionais, que foram as
primeiras a chegarem aqui, não chegaram a representar uma ameaça a hegemonia
católica, pois essas igrejas mesmo com a aceitação por parte da sociedade, não tiveram
315
O jansenismo foi um movimento reformista dentro da Igreja Católica. Fundou suas bases teológicas no
agostianismo, em detrimento do tomismo, e acentuou tendências anti-jesuítas e de distanciamento da
contrarreforma.
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tanta força no país como as igrejas pentecostais que teve o início das missões no país no
início do século XX com a Igreja Assembleia de Deus e a Congregação Cristã no Brasil.
Por conseguinte, podemos perceber como as igrejas de tradição pentecostal vão ter uma
maior influência na sociedade brasileira em detrimento das igrejas tradicionais.
316
O dom de falar em línguas estranhas ocorreu no dia de pentecostes relatado no segundo capítulo do
livro de Atos, no qual acredita-se que os cristãos tenham se reunido para fazer orações até que em certo
momento o Espírito Santo atuou distribuindo a habilidade de louvar a Deus em línguas que não
conheciam, que, no entanto os estrangeiros presentes puderam entender.
317
Expulsão de espíritos malignos que afligem a vida do indivíduo.
318
O pietismo é caracterizado principalmente por afirmar a possibilidade de uma experiência pessoal com
Deus.
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O pensamento que vai marcar o tipo de protestantismo que veio para o Brasil foi
o evangelical, esse pensamento tem como característica a ênfase espiritualista e
moralista que é o centro do conceito de disciplina eclesiástica e de natureza
comportamental. Foi através do doutor Robert Kalley que teve início uma missão
protestante definitiva, e que a partir disso seria a origem das igrejas congregacionais no
Brasil. Contudo, como já foi dito anteriormente, as igrejas tradicionais que deram início
ao movimento protestante no país não demonstraram ter condições suficientes para
rivalizar com o catolicismo, chegando a sua estagnação, ao contrário do movimento
pentecostal que crescia de forma muito rápida, uma diferença no crescimento mostra um
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novo perfil de religiosos no país que se diferencia dos católicos e das igrejas
tradicionais. Campos e Dolghie justificam essa maior aceitação ao pentecostalismo
devido: ―O pentecostalismo se aproxima muito do catolicismo popular, mais por
aspectos culturais do que teológicos, uma vez que sua teologia teve sua matriz no
protestantismo tradicional‖. (CAMPOS; DOLGHIE, 2012, P.38).
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PRESENÇA PENTECOSTAL
Além dos outros grupos anteriormente já citados, existe outro que vai conquistar
uma grande aceitação da população brasileira, os ―pentecostais‖. É no inìcio do século
XX que o pentecostalismo moderno é institucionalizado, e geralmente é com a leitura
do texto bìblico de Atos 2.4 que retrata a ―descida do Espìrito Santo‖ e o falar em
línguas no dia de Pentecostes, retratados em uma pregação do pastor William J.
Seymour em uma igreja de Nazarenos.319 Acreditava-se que além da conversão e
santificação haveria uma terceira benção, o ―batismo com o Espìrito Santo‖, que é
demonstrado pelo falar em outras línguas e que até hoje é a marca do pentecostalismo.
Com essa interpretação fez com que Seymour fosse expulso da igreja dos nazarenos, e a
partir disso juntamente com outros defensores do ―falar em lìnguas‖ alugaram um
antigo templo na rua Azusa e iniciaram o movimento com o nome de ―Fé Apostólica‖,
ou também conhecido por movimento da rua Azusa que atraía vários grupos
evangélicos curiosos por esse fenômeno religioso, e que serviu também como um centro
de formação missionária para outros países.
Charles Fox Parham,320ligado ao movimento de santidade do meio-oeste
estadunidense, teve a primeira experiência do ―falar em lìnguas‖, e a partir disso
convenceu-se que a glossolalia, ato de falar em outras línguas, representava a evidência
decisiva do batismo no Espírito Santo e que era a chave para o avanço missionário para
a evangelização mundial, criando o ―Movimento de Fé Apostólica‖. Seymour após
contato com Parham popularizou o movimento em Los Angeles na rua Azusa como já
foi mencionado. Segundo Eduardo Paegle:
Los Angeles, por ser uma cidade que recebia inúmeros imigrantes,
certamente, se tornou um lugar propício para a propagação do dom de
319
A Igreja do Nazareno (em inglês:Church of the Nazarene) é uma denominação
cristã protestante surgida nos Estados Unidos na década de 1900 e derivada do Movimento de
Santidade do século XIX, sendo a maior denominação a ter como base os princípios do Wesleyanismo e
do Metodismo.[2] Possui cerca de 2 milhões de membros, conhecidos como "Nazarenos", em 29.365
templos espalhados pelo mundo.
320
Charles Fox Parham (4 de junho de 1873 — 29 de janeiro de 1929) foi um pregador estadunidense,
sendo considerado um instrumento fundamental na formação do pentecostalismo.[1] Parham também criou
um movimento chamado de Apostolic Faith (Fé Apostólica), constituído por igrejas independentes
(inicialmente chamadas "missões") que cresceram no sul e no oeste dos Estados Unidos, onde ele
realizava as suas reuniões. Embora a imprensa fora inicialmente favorável em algumas das áreas onde
Parham ministrava, algumas das maiores igrejas de linha principal, e a hierarquia eclesiástica da cidade de
Sião, não foram favoráveis ao seu ministério e fizeram de tudo para que os seus ensinamentos não
prosseguissem. Como resultado, alguns relatórios da imprensa tornaram-se mais negativos a medida que o
seu ministério se aproximava do seu ápice entre 1906 e 1907.
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321
O Movimento de Santidade (em inglês: Holiness Movement) no cristianismo é um movimento que
ensina que a natureza carnal da humanidade pode ser purificada através da fé e pelo poder do Espírito
Santo possibilita que seus pecados sejam perdoados através da fé em Jesus Cristo. Os benefícios incluem
poder espiritual e uma capacidade para manter a pureza de coração (que foram, pensamentos e motivos
corrompidos pelo pecado). A doutrina é tipicamente atribuída nas igrejas de Santidade como
total santificação ou perfeição cristã.
322
O batismo no Espírito Santo para os pentecostais é uma obra distinta e à parte da regeneração, esse ato
acontece de forma simbólica diferente do batismo nas águas, e a evidência que ocorreu esse batismo é o
ato de falar em outras línguas.
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desse sonho remete a passagem de Atos 2:17, ―vossos anciãos terão sonhos‖, e,
portanto, esse acontecimento ficou como um relato legitimador da obra dos
missionários no Brasil, ou seja, tornou-se o mito fundador das Assembleias de Deus.
Ele ainda destaca algumas observações:
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por Vingren e Berg, já que a batista não concordava com esse tipo de mensagem; a
partir de então, foi-se aumentando o número de pessoas nesses cultos até fundarem uma
igreja Missão de Fé Apostólica que posteriormente foi mudada para Assembleia de
Deus; e com isso vê-se um crescimento acelerado dessa igreja no Brasil, não só dessa
igreja mas do movimento pentecostal como um todo.
A partir de então podemos ver o quanto a Assembleia de Deus foi conquistando
uma simpatia por parte da sociedade brasileira, seja pela sua mensagem que atraía
principalmente a população de classe mais baixa, seja pelo investimento na criação de
igrejas, gerando uma ascensão do movimento pentecostal no Brasil que possibilitará o
surgimento de outras igrejas com essa mesma mensagem. Sendo assim, o crescimento
protestantismo no país se deve em grande parte, a expansão do pentecostalismo, pois
como já vimos as igrejas tradicionais não vão apresentar um crescimento suficiente a
ponto de rivalizar com o catolicismo. O crescimento pentecostal foi tamanho que Isael
de Araújo afirma que:
Uma estimativa feita em 1971 apontava que oito entre dez crentes
evangélicos brasileiros eram pentecostais. Foi o censo demográfico do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 1980 que primeiro
separou os pentecostais dos demais protestantes. (ARAÚJO, 2007, p. 585.).
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declaro que vou ter um carro novo‖, os neopentecostais acreditam que como Deus criou
o mundo por meio das palavras, os cristãos também receberam esse ―poder‖ para
conseguir as coisas por meio da palavra.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
sendo demonstrado pelo crescimento acelerado que esse movimento vai ter, enquanto
que as igrejas tradicionais vão estagnar no seu crescimento.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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RESUMO
INTRODUÇÃO
De acordo com Geertz, citado por Burke (2008, p. 52), os símbolos, assim como
as práticas de um povo, são as ―chaves‖ para compreender-se a cultura de determinada
sociedade. Assim, em Ibiara, temos o almanaque como objeto de estudo para
analisarmos a estrutura tanto religiosa quanto social dos ibiarenses nas décadas já
precedidas.
É a partir da década de 1960 quando a História Cultural é redescoberta e passa a
ser estudada pelos historiadores, sem deter-se somente a questões políticas, econômicas,
mas passando a analisar práticas, costumes, símbolos de um povo, ou seja, a cultura
desse povo. E ainda assim, com bases nesses elementos, passa-se a compreender
também outros fatos ligados a sociedade (BURKE, Peter, 2008).
323
Graduanda em Licenciatura plena em História pela Universidade Federal de Campina Grande no
Centro de Formação de Professores (UFCG – CFP). Email: [email protected].
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324
Um conceito ainda utilizado por essas pessoas para qualificarem-se como homens honestos,
trabalhadores, que seguem as regras da sociedade tradicional.
325
CHARTIER, Roger; O livro dos livros: os Almanaques no Brasil; 1999.
326
Casa Nova (1996, p. 28) ressalta que: ―cada povo media o tempo e controlava-o conforme seu
cotidiano, sua crença. Cada povo, um calendário, uma história‖.
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O “PROFETA DO SERTÃO”
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vendia os Talismãs, amuletos da sorte para o homem deixar de ser cachaceiro ou para
você deixar aquele amor aos seus pés ou ainda adiar os dias de vida e ainda sobre
muitos outros desejos que você realizaria adquirindo o talismã, a pedra mágica. Assim
também como as pessoas se deslocavam para sua residência com o objetivo dele
―profetizar o futuro‖, como, por exemplo, foi relatado por sua irmã328 que as pessoas
antes de realizarem uma viagem iam diretamente a Manoel Luiz para saberem se daria
certo viajar em certo dia e horário.
Após colocar suas ideias no papel, Manoel Luiz dirigia-se, possivelmente, a
cidade de Caruaru - PE para datilografar em uma gráfica os seus almanaques e assim
enviar o seu conhecimento ao agricultor sertanejo. Ainda desconhecemos qual o trajeto
dos almanaques depois de serem datilografados e como chegavam à feira livre da cidade
de Ibiara. Isso ocorreu durante 42 anos de publicações.
Manoel Luiz, o profeta, é conhecido e ainda admirado por alguns agricultores
ibiarenses, contudo, devido à idade já avançada e o contexto social vivenciado
atualmente tornou-se irrelevante o trabalho destes profetas, pois os saberes modernos e
―cientìficos‖ ocuparam o lugar dessas práticas mìsticas que influenciaram durante
décadas a vida dos ibiarenses.
Durante essas décadas a serem analisadas, também percorreu pela feira de Ibiara
o almanaque de Manoel Caboclo, este residente em Juazeiro do Norte –CE e que
Manoel Luiz teve como seu ―sócio‖. Sempre aos finais e inìcio de ano, os agricultores
eram ansiosos pela chegada dos almanaques que, de certa forma, guiaria as produções
agrícolas. Aos domingos estes homens se deslocavam de suas residências rurais para a
rua, onde deixavam os filhos mais velhos em casa cuidando das obrigações e levava
somente o mais novo. Aqueles que já possuíam carro enchiam a carroceria de coco,
banana, macaxeira e iam em busca de adquirir o dinheiro da feira e pagar aos
trabalhadores semanais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Embora seja um caminho de pesquisa que ainda há muitas lacunas para serem
preenchidas, as análises desses almanaques populares que circularam no Nordeste
328
Entrevista realizada com Maria Barros da Conceição no dia 14/08/2017 em São José do Egito – PE.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BURKE, Peter. O que é história cultural?. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
HOORNAERT, Eduardo. Formação do catolicismo brasileiro —1550-. 1800: ensaio
de interpretação a partir dos oprimidos. Petrópolis. Vo- zes. 1974.
LE GOFF, Jacques. História e Memória. 4. ed. Campinas, SP: Editora da UNICAMP,
1996.
NOVA, Vera Casa. Lições de almanaque: um estudo semiótico. Belo Horizonte,
Editora UFMG, 1996.
POMIAN, Krzysztof. Coleção. In: Enciclopédia Einaudi. : Imprensa Nacional Casa da
Moeda, 1984. V.1
SANTOS, Manoel Luiz. Almanaque “O Nordeste brasileiro”. 1974.
TRIZOTTI, Patrícia Trindade. Identidade Paulista: Construção e Representação nas
Páginas do Almanaque D` O Estado de S. Paulo. Anais eletrônicos da XXIV Semana de
História: "Pensando o Brasil no Centenário de Caio Prado Júnior‖. Assis – SP. 2007.
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RESUMO
INTRODUÇÃO
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Esta é uma fala do prefeito Vergniaud Wanderley, após ser eleito em 1935 na
cidade de Campina Grande ao jornal da União, no qual explica ao articulista do diário
seus planos e anseios no que diz respeito ao seu programa de administração para a
cidade.
Tais perspectivas de administração urbana estavam concentradas em um
contexto da metade do séc. XIX e início do séc. XX, no qual as cidades metrópoles
brasileiras passaram por um processo de modernização e higienização que marcaram a
história país, e principalmente dos habitantes que viveram e presenciaram tal
espetáculo. Era o adentramento do Modernismo.
Influenciados e inspirados pelas reformas urbanas e sanitárias europeias, e pelas
exigências do capitalismo em expansão; prefeitos, gestores e governantes brasileiros
mobilizaram suas atenções e pautas em projetos urbanos modernos que se
enquadrassem neste novo modelo exigido.
Isso fez com que as cidades sofressem modificações profundas afetadas pela
necessidade de modernização. Mais do que perder seus bens culturais, a modernidade
significava também a perca do seu lugar, do seu espaço e de seus costumes isto é, tudo
aquilo que simbolizava o antigo, o retrogrado, estava sendo dizimado das cidades a fim
de esquecer o passado de atraso das mesmas. Praças, paço municipais, monumentos e
com eles costumes, referenciais de memória, espaços culturais sociais foram destruídos
em favor do progresso.
Em Campina Grande não foi diferente. Nos anos 1930, o prefeito Vergniaud
Wanderley, citado no começo do texto, inicia na cidade de Campina o grande projeto de
urbanização. Os motivos alegados para tais modificações giravam em torno dos
discursos e das novas questões levantadas na sociedade por higienistas e sanitaristas.
A fim de promover uma melhor estética e plasticidade das ruas, prédios e
logradouros, o prefeito afirmava ser umas das suas cogitações estimular a construção de
prédios modernos que substituiriam os casebres sem a estética desejável e idealizada
para uma cidade em processo de mudança.
Tais mudanças além de mudarem a fisionomia de Campina Grande, sem sombra
de dúvidas afetou de maneira considerável o patrimônio histórico e cultural da mesma.
Nesse sentido, se percebe que durante o processo de modernização da cidade não
houve o interesse de preservação do patrimônio local tanto no seu caráter material
quanto no imaterial, pois à medida que se dispunham a modernizar-se, os moradores da
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localidade abriam mão de um passado, de costumes que eram seus, mas que deveriam
ser relegados ao esquecimento em prol do progresso da cidade.
Com isso, o trabalho objetiva contribuir para a valorização e construção da
história via memória de Campina Grande, destacando a destruição do patrimônio
cultural de Campina Grande no processo de modernização do governo de Vergniaud
Wanderley (1935 – 1938; 1940 - 1945). Identificando aquilo que foi extinguido no
processo de modernização, pautado no discurso urbanístico e higienista. Percorrendo
um caminho no qual o destaque não se focaliza nas grandes construções ou reformas
realizadas, mas na destruição causada em prol da concretização de um projeto, de uma
visão, ou seja, da modernização.
329
SILVA, Maria Raquel. Civilizando os filhos da “Rainha”, Campina Grande: modernização,
urbanização e grupos escolares (1935 a 1945) / - João Pessoa, 2011. (Mestrado em História)
Universidade Federal da Paraíba
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AMPLIANDO A DISCURSÃO
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monere que significa: advertir, lembrar), que significa trazer à lembrança alguma coisa;
tocar, pela emoção, uma memória viva; ―monumento é tudo o que for edificado por uma
comunidade de indivíduos para rememorar ou fazer que outras gerações de pessoas
rememorem acontecimentos, sacrifìcios, ritos ou crenças‖ (CHOAY, 2001, p.18).
A especificidade do monumento deve-se ao seu modo de atuação sobre a
memória, mas não todo tipo de memória; uma memória que contribua para manter e
preservar a identidade de uma comunidade étnica ou religiosa, nacional, tribal, ou
familiar.
Com Choay discutimos também a questão de patrimônio, ela diz que patrimônio
é,
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forma. Não era apenas uma mudança no espaço físico de Campina Grande, se
constituía também, como uma mudança de cultura, no qual as práticas e vivencias
concebidas como ―coloniais e retrógadas‖, tinham que ser esquecidas e
substituídas. Ou seja, contra aquilo que estava fora dos padrões impostos como
modernos, se constituía como descartável, não havia neces sidade de lembrar ou
recordar.
E para o conceito memória destacamos a reflexão do sociólogo francês Halbwachs,
no qual elaborou o conceito de ―memória coletiva‖. Conceito este que se torna essencial
na temática.
Para Halbwachs a ideia fundante consiste plenamente na afirmação de que a
memória individual, as lembranças do sujeito, estão pautadas na memória coletiva do
grupo, ou seja, nos outros. Todas as lembranças são constituídas no interior de um
grupo. A constituição da memória de um indivíduo é uma combinação das memórias
dos diferentes grupos dos quais ele participa e participou e gera influência. Seja na
família, na escola, em um grupo de amigos ou no ambiente de trabalho
A origem de reflexões, paixões, conceitos e sentimentos que concebemos a nós, são
na verdade inspiradas pelo grupo, pelo coletivo. Halbwachs relaciona a memória
individual a participação de um grupo social, no qual, quando temos o ato de lembrar
nos deportamos de um grupo ao outro em pensamento.
Halbwachs afirma que as lembranças são restituìdas a partir de ―pontos de contato‖,
em outras palavras, ele concebe a memória individual como insuficiente para fomentar a
lembrança e considera que deva haver noções comuns, ou melhor, uma ―semente de
rememoração‖ através de pessoas participantes do mesmo convívio social no passado.
―A reconstrução das lembranças [...] opera a partir de noções comuns e passam de um
para o outro. Mas esse movimento só e possível se as pessoas fizeram ou ainda fazem
parte de um mesmo grupo social‖ (BRAGA, 2000, p. 51).
Ou seja, Halbwachs considera que a memória é um construto a partir do outro, no
qual o sujeito ao lembrar do passado tentado focalizar a uma recordação que lhe traga
sentido, o faz através de determinadas testemunhas que fizeram parte do seu meio social
no tempo passado. Podemos dizer que
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CONCLUSÃO
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REFERÊNCIAS
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RESUMO
O artigo está ligado à temática ―Cultura e Cidades‖, relacionando-a com ao campo da história
cultural. Assim que na nossa pesquisa pretendemos descortinar os atores sociais que formularam
uma sociedade e seu cotidiano na urbe na década de 60 do século passado, na cidade do Crato -
CE. Tendo como principal objeto de estudo os espaços que serviram como palco para que a
juventude cratense. Vamos trabalhar com fontes escritas, mais especificamente com o jornal
católico A Ação e um livro de memórias ―Anos Dourados: Praça Siqueira Campos‖. Importa
considerar que compreendemos o jornal e o livro como Gomes afirma um ―lugar de memória‖
portanto, atribuindo assim visões de mundo e paixões de quem o escreve; e história oral de vida
com algumas jovens que escreveram o livro em forma de blocos de perguntas amplos para que o
colaborador possa mergulhar em suas lembranças e recordações do passado. Dessa forma foram
desenvolvidas análises sobre a memória destes jovens sobre suas práticas e os espaços citadino.
Palavras-chave: Cidade; espaços; juventude.
INTRODUÇÃO
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Os vários textos que compõe o livro contam: dos volteios pela praça, das
roupas escolhidas ansiosamente já na segunda- feira, dos flertes, de como aquele era um
tempo bom. Essas memórias fazem parte não apenas da memória individual, mas
também da memória coletiva. Essa memória ―se desenvolve a partir dos laços de
convivência [...]. ela entretém a memória de seus membros, que acrescenta, unifica,
diferencia, corrige e passa a limpo‖ (BOSI, 1994, p. 410-411). Por isso ao falar ou
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Nas entrevistas foi utilizada a história oral de vida, que tem como objetivos
e procedimentos desenvolvidos em blocos de perguntas amplos para que o colaborador
possa mergulhar em suas lembranças e recordações do passado.
Era muito bom aqui, tranquilo. Não tinha esses problemas das drogas.
Você passa uma noite aqui era os veín todo passeando. Quando eu era
novo andava aqui, não era perigoso como é hoje. O espaço aqui tinha
umas rolinhas, mas o espaço tá pequeno o pessoal passa
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constantemente, não tem mais espaço para ela comer e deixaram até
de vim à praça. Eu mesmo comprava comida e dava pra elas e alguém
ainda me doava comida e alguém ainda chegou a me dá comida pra eu
dá pra elas. Era as rolinha nova caia aqui do ninho a gente pegava,
ajeitava, botava lá. Teve um rapaz aqui que chegou até levar pra casa
pra terminar de criar e depois soltar. (TAL, entrevista concedida em
05 de junho de 2012)
Assim ao trabalhar no local de sua juventude o senhor Getulio evoca em sua
fala memórias do passado e anseios do presente como o sentimento da insegurança
pública e o faz sentir falta de um passado que em sua lembrança se faz sem grandes
conflitos, sem violência onde a ingenuidade e apreço a natureza que o circundava
naquele espaço.
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As roupas eram mais feitas, pegava aquela revista e mandava fazer por
costureiras, inclusive eu tenho uma amiga Dilma que a mãe dela
pegava revistas mandava fazer, ela era quem lançava a moda
praticamente aqui no Crato (TAL, entrevista concedida 26 de agosto
de 2014).
Na época eram poucas pessoas que tinham um aparelho de TV em casa, mas
os jornais, filmes e revistas tinham maior circulação entre estes jovens, fazendo assim
com que eles tivessem acesso. E então podemos considerar que estes jovens apenas
reproduziam estes comportamentos que viam através da mídia da época ou eles o
fabricavam de acordo com o seu local de origem, gostos, renda familiar, ferramentas
disponíveis?
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na praça, para que não atrapalhassem os passos que eram dados quase que no mesmo
ritmo pelos grupos de amigas que volteavam todas de braços entrelaçados, que uma vez
ou outra lançavam seus olhos sobre os rapazes que ficavam no entorno da praça e que
quando por um segundo os olhares se cruzavam sentiam as maçãs do rosto entregarem
suas emoções.
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dos anos suas relações e os padrões de convivência vão sendo modificados e/ou
reproduzidos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRADE, Iarê Lucas. “Ao sopé da serra entre o canaviais”: a cidade do Crato
nos 40 a 60. Da linha do trem pra lá: O discurso sobre a prostituição na cidade de
Crato (1940/1960). Dissertação de Mestrado em História Social. Rio de Janeiro:
Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio de Janeiro,
2000. p. 17-23.
BOSI, Ecléia. Memória e interação. In: memória e sociedade: lembranças dos velhos.
São Paulo. Companhia das Letras, 1992. p. 405- 422.
CERTEAU, Michel de. Introdução Geral. In: Invenção do cotidiano: artes de fazer.
Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. p. 37- 53.
CORTEZ, Antônia Otonite de Oliveira. A construção da “cidade da cultura”: Crato
(1889-1960), Universidade Federal do Rio de Janeiro, Dissertação de Mestrado, 2000.
FOUCAULT, Michel. O corpo do condenado. In: Vigiar e punir: nascimento da
prisão. Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014. p. 9-34.
GOMES, Nilo Sérgio. Em busca da noticia: memórias do Jornal Do Brasil de 1901 in:
RIBEIRO, Ana Paula Goulart e FERREIRA, Lúcia Maria Alves. Mídia e memória: a
produção de sentidos nos meios de comunicação, Rio de Janeiro: Mauad X, 2000. p.
179.
LE GOFF, Jacques. Documento/Monumento. In: História e Memória. Campinas, SP
Editora da UNICAMP, 1990. p. 535-549.
MEIHY, José Carlos Sebe Bom. História. Manual de história oral. Edições Loyola: São
Paulo, 2000.
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In: Revista Brasileira de História, vol. 27, nº 53, 2007. p .11- 23.
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XXVI Simpósio Nacional de História, ANPUH- São Paulo, julho 2011. P. 1- 14
SCHAVARZMAM, Sheila. Ir ao cinema em São Paulo nos anos 20. In: Revista Brasileira de
História. vol.25, n.49., 2005, p.154.
769
ANAIS DA IX SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA CFP/UFCG
SILVA, Márcio Inácio da. Nas telas da cidade: salas de cinema e vida urbana na Fortaleza dos
anos de 1920. Fortaleza: UFC, Dissertação de Mestrado, 2007.
FONTES
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Siqueira Campos. Fortaleza: A província, 2009. p. 15-19.
TAL, Fulana de. Entrevista I. [agosto de 2014] Entrevistador: Maria Daíse Felipe de
Oliveira. Crato, 2014.
Feitosa, Zânia Maria Alencar Cunha. Praça Siqueira Campos no Crato. In: Anos
Dourados: Praça Siqueira Campos. Fortaleza: A província, 2009. p. 109- 117.
TAL, Fulano de. Entrevista I. [junho de 2012] Entrevistador: Maria Daíse Felipe de
Oliveira. Crato, 2012.
Jornal A Ação, ano de 1967. Disponível no Centro de Documentação do Cariri -
CEDOCC, Universidade Regional da Cariri.
VILLAR, Clymene. Voltando ao passado: Anos Dourados. In: Anos Dourados: Praça
Siqueira Campos. Fortaleza: A província, 2009. p. 9-11.
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RESUMO
INTRODUÇÃO
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RECAPITULANDO A CAMINHADA
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séc. XVI, com a construção de uma das principais avenidas da cidade, a Epitácio Pessoa, que
objetivava criar a ligação entre o centro da cidade e a orla marítima, além de abrir espaço
para a construção de casas residenciais para as classes mais abastadas. Apenas com as obras
da BR-101 (em direção a Recife) e da BR-230 (em direção a Cabedelo) e com a implantação
do Campus Universitário, representaram o início da expansão da cidade em direção ao
sul/sudeste.
O contexto de crises generalizadas (econômica, política, social, etc.) vividas pelo
Brasil na década de 1980, como muitos classificam de ―década perdida‖, também foi um
período muito profícuo politicamente. As aberturas políticas desencadeada pelo desgaste do
regime civil-militar ainda vigente acarretaram na re-organização e mobilização das camadas
populares, fortalecendo os sindicatos existentes, como os Metalúrgicos do ABC, liderados
por Luís Inácio da Silva, o Lula, e posteriormente as criações do Partido dos Trabalhadores e
do PMDB, por exemplo. Havia um grande clima de politização e por lutas por direitos entre
as classes menos abastadas da população brasileira de uma forma geral, e em João Pessoa
não era diferente.
Contando com cercade 76 mil habitantes o Conjunto Habitacional Tarcísio de
Miranda Burity, conhecido popularmente como bairro de Mangabeira, é o mais populoso de
João Pessoa. Caso fosse um município do estado da Paraíba, o bairro de Mangabeira seria o
6º em número de habitantes e perderia apenas para João Pessoa (723.515 habitantes),
Campina Grande (385.213), Santa Rita (120.310), Patos (100.674) e Bayeux (99.716). De
acordo com o Censo 2010 do IBGE, 94,40% da população do bairro é alfabetizada
colocando Mangabeira em 26ª posição no ranking de escolaridade da Paraíba. A renda per
capita do bairro é de R$ 846,84, a 36ª maior renda de João Pessoa. Uma parte da população,
10,31%, é composta por pessoas com idades que variam entre 25 e 29 anos, o que
corresponde a 7.835 habitantes. A menor parte, 0,01%, é composta por 6 pessoas que estão
com 100 anos ou mais. As mulheres são maioria no bairro e somam 40.144 moradores, já os
homens somam 35.844 habitantes (IBGE, 2011).
Mangabeira primeiramente foi projetada para ser inaugurada após a conclusão
da estrutura mínima que um bairro precisa. Saneamento básico, ruas pavimentadas, água
encanada, iluminação pública, entre outros itens. O problema da moradia explodia em
todo Brasil, sendo este um dos motivos para a criação do Sistema Financeiro de
Habitação (SFH) e do Banco Nacional de Habitação (BNH), logo após o golpe em
1964. A capital da Paraíba convivia diariamente com dezenas de milhares de pessoas
sem casa própria, muitos vivendo amontoados em barracos nas favelas, como foi
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330
Para mais informações sobre os projetos financiados pelo BNH em João Pessoa: LEAL, Anny Karinny
Lima. Permanências e inovações: o projeto do Conjunto Mangabeira. Dissertação (Mestrado em
Arquitetura e Urbanismo) – Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo, UFPB, João
Pessoa, 2012.
331
Hugo José de Freitas Peregrino formou-se em arquitetura e urbanismo, pela Faculdade de Arquitetura
e Urbanismo da UFRJ, em 1973, e em 1977, foi admitido na CEHAP.
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Fonte: Jornal Correio da Paraíba, edição do dia 06/04/1983, acervo da Fundação Casa de
José Américo.
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não-linearidade das narrativas dos mais de vinte autores que contribuíram com seus
relatos e memórias.
Passado este primeiro momento de calmaria, de convites para visitas regadas a
muito café, cigarros, bolo de milho, tapiocas e todo tipo de comida diariamente
consumida pelo trabalhador paraibano, acontece o fato que culmina no primeiro
pesadelo e o estopim para a união destes moradores que tinham recentemente sido
apresentados uns aos outros pelo destino de serem sorteados com uma casa de
mangabeira: as altas prestações das casas.
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repetidamente os autores dos artigos gostam de enfatizar. Esta definição do outro como
um mero ―pelego‖ (termo pejorativo utilizado pelos sindicalistas para indicar um
sindicalizado que luta a favor do patrão) ou de ―comunista‖ nos indicam as maneiras
pelas quais os moradores tentaram fazer-se ouvir, e em um primeiro momento
conseguiram uma conquista histórica, em uma mobilização que até os dias atuais gera
orgulho de ser contada pelos moradores que participaram dela – em todas as
oportunidades que tive de conversar com os moradores, isso era claramente destacado
pelos mesmos.
Como afirma Melo (2015) quando consideramos a ação e a experiência dos
agentes históricos no labirinto das relações sociais, as possibilidades de pesquisa em
história são ampliadas, proporcionam um alargamento e ao mesmo tempo um
rompimento nos limites do conhecimento histórico que estão postos a nossa disposição.
A história local, bem como a história de bairros como Mangabeira, podem nos
proporcionar a possibilidade de resgatar atores sociais silenciados e omitidos da história
geral tida como oficial, apresentando uma alternativa de construção do conhecimento
histórico, contribuindo para o suporte da identidade social, gerando assim consciência
de classe, ação e transformação, assim como fizeram os primeiros moradores de
Mangabeira.
A DERROTA E A SABOTAGEM
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bairros da Paraíba, e já se demonstra uma fonte riquíssima para pesquisas que podem
ser desenvolvidas nas escolas do próprio bairro, bem como nas universidades. Se faz
necessário falar de gente. Urge conhecer nossa gente. A história do Brasil está nos becos
e vielas das favelas e invasões de Mangabeira, como em qualquer outro bairro periférico
deste estado. O livro que é fruto de uma união coletiva memorialística fez sua parte da
maneira que puderam, como o sábio professor que ensina a partir do exemplo de suas
atitudes, alertando para nós historiadores a mina de ouro que se encontra bem ao lado de
nossas casas, próximo de nossas universidades e escolas, nosso povo, nossa gente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
MELO, Vilma de Lurdes Barbosa. História local: contribuições para pensar, fazer e
ensinar. João Pessoa: Editora da UFPB, 2015.
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RESUMO
A significação que é atribuída a objetos do passado, nos permite compreender com mais
clareza fragmentos importantes da nossa história. Parte dessa significação pode ser
atribuída ao patrimônio histórico nacional, seja ele material ou imaterial, legitimado
como segmento importante de uma determinada cultura. Sendo assim, dialogaremos
com os autores do ―manifesto em defesa do patrimônio histórico‖ de Pombal-PB,
(ARAÚJO NETO & SOUSA, 2004.) para buscarmos compreender a importância de se
estabelecer uma relação com o patrimônio histórico à qual atribuímos valores e
significados. Além desses e de outros autores, faremos uso do meu trabalho de
conclusão de curso intitulado ―A cadeia velha de Pombal: discursos e diálogos na
preservação do patrimônio histórico pombalense no século XXI.‖.
Palavras- chaves: Patrimônio; Preservação; Memória; Significados.
INTRODUÇÃO
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É importante fazer transparecer que essa memória coletiva, surgi das escolhas de
cada indivíduo e é através da inter-relação desses indivíduos com os objetos do passado
eleitos como partes importantes das suas vivências, (pois estes estão repletos de
significados) que lhes faz remontar um período cronológico, que a memória vai se
perpetuando, se cristalizando, transformando-se consequentemente em uma memória
coletiva. Pois, ―cada indivìduo é parte de um todo – da sociedade e do ambiente onde
vive – e constrói, com os demais, a história dessa sociedade [...]‖ (GHIRARDELLO,
2008, p. 15).
Os significados que são atribuídos a esses bens, valorizando-os e dando
notoriedade dentro da sociedade, e que são fragmentos dessa memória, podem está
inserido em diferentes categorias: seja no âmbito religioso, cultural, etnológico,
artístico, nas edificações de uma cidade, nos costumes de um determinado povo, entre
outros, mas que faz surgir determinadas práticas e concepções que se propagam através
do tempo.
Essa memória coletiva que em tempos passado era constituída e transmitida de
diferentes formas, através da oralidade ou da escrita, entre grupos de pessoas ou de
diferentes tribos e regiões, encontra agora um maior aparato diante das novas
possibilidades proporcionadas pela mídia e pela inovação tecnológica, capazes de
registrar e armazenar uma infinidade de informações e de transmiti-las em alta definição
e com maior precisão através do mundo.
Sendo assim, essas novas tecnologias tornam-se importantes aliados na
preservação dos objetos do passado, pois abrange um grande número de pessoas que se
manifestam a favor ou contra a manutenção desses bens, gerando importantes
discussões, como as que ocorreram em Pombal-PB, durante a tentativa de derrubada da
chaminé da fábrica Brasil Oiticica, no ano de 2012, onde várias pessoas se
manifestaram através das redes sociais para expressar as suas opiniões acerca daquela
polêmica.
Porém, não é a primeira vez que discussões inerentes ao patrimônio histórico da
cidade são levantadas. Durante a demarcação e processo de tombamento do centro
histórico da cidade, originada após denuncia ao ministério público, em decorrência do
desrespeito e mal uso de objetos históricos da cidade, várias pessoas se manifestaram
dando apoio à luta iniciada por um cidadão comum e que resultou no tombamento do
centro histórico e dos seus principais objetos.
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Geralmente temos essa concepção porque acreditamos que esses elementos por
se encontrarem protegidos por Lei, receberão dos órgãos responsáveis atenção
diferenciada, passando a ser restaurados todas as vezes que houver necessidade da
realização de reformas ou quando precisarem da ajuda dos órgãos preservacionistas para
resolver qualquer problema que ameace a sua existência.
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Esse posicionamento que de fato veio a ocorrer deixa claro o interesse das parcelas
envolvidas e promove o distanciamento de parte da população com o poder público
municipal, através das divergências políticas e da postura contrária adotada por alguns
governantes, que por consequência, termina penalizando toda a população que fica
privada de tais benefícios.
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Sendo assim, o sentimento que aflora dentro dessa parcela da população vai aos
poucos ganhando força, e em pouco tempo se transforma em protesto em defesa dos
objetos históricos da cidade.
Os motivos que levaram a revolta das pessoas envolvidas nesta ação podem ser
observados através de fotografias daquela época, quando a antiga cadeia encontrava-se
totalmente encoberta por trailers comerciais e ao mesmo tempo oculto dos olhos da
população.
Contudo, mesmo escondida dos olhos da maior parte da população que parecem
estar alheios a esse tipo de situação, talvez por não entender o valor histórico que cada
objeto representa dentro da própria cidade, apesar disso, é da própria população que
surge a iniciativa para se buscar soluções que possam manter preservadas as heranças
deixadas através do tempo.
Foto 01- Casa da Cultura em 2002 (IPHAEP, 0030, 2002, fl. 19).
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No pensamento deste indivíduo, a história não exerce nenhuma influência. Por isso, ele
não se incomoda em se desfazer daquilo que é precioso para as futuras gerações, se em
contrapartida, aparecer um negócio que lhe proporcione algum lucro.
E nesse impulso ele começa a combater tudo que parece velharia. Não
adianta dizer que tem valor histórico. Para o Modernizador Angustiado, o
mundo já tem história demais, passado demais. Ele é um fanático pelo futuro,
e para impor o que ele acha ser o futuro é capaz de implodir a Catedral de
Notre Dame ou de aterrar os canais de Veneza. (TAVARES, apud, ARAUJO
NETO, 2004, p. 10).
Sendo assim, de nada adianta sua consciência ou o seu conhecimento sobre a história
das gerações anteriores. Ele busca se libertar, e para isso o que interessa mesmo é que
tudo seja renovado.
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É o sujeito que assume uma repartição e manda jogar no lixo aquelas caixas e
caixas de papéis velhos ―que só servem para ocupar espaço‖. É a turma que
vai fazer acampamento no parque florestal, acende um fogo para fazer café, e
destrói não sei quantos mil hectares de Mata Atlântica, num incêndio que
precisa de mil bombeiros para ser contido. É o síndico que não gosta de um
mural e manda arrancar todos os ladrilhos, sem perguntar quem fez aquilo ou
quando. (TAVARES, apud, ARAUJO NETO, 2004, p. 10- 11).
Esse indivíduo muitas vezes só quer fazer o que para ele parece ser correto. Porém, a
falta de conhecimento não o deixa enxergar que tudo aquilo o que ele está fazendo, na
verdade prejudica uma grande parte da sociedade ―os delitos que pratica não são
dolosos (com intenção de prejudicar), mas são culposos, porque prejudicam‖.
(TAVARES, apud, ARAUJO NETO, 2004, p. 11).
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Por outro lado, o apoio que chega de vários lugares, é visto como ferramenta de
grande importância, na tentativa de pressionar os governantes locais e fazer com que
esses gestores tomem as devidas providências, diante da grave situação em que se
encontra o patrimônio histórico municipal. ―José Tavares, a história se faz com luta e
perseverança. O seu trabalho é digno de um filho consciente e de sentimentos aos
valores culturais da nossa terra. Parabéns.‖ (Verneck Abrantes de Sousa- Campina
Grande- PB).
Pessoas como o amigo Jose Tavares merecem nosso aplauso pela bravura de
está engajado nessa luta, que é de todos nós, mas deveria ser, principalmente,
da administração municipal de Pombal, que, deixe bem claro, nada,
absolutamente nada tem feito pela cultura de nossa Pombal. (Naldo Silva-
Pombal- PB)
Porém, além do apoio como podemos observar, também é possível destacar alguns
pontos essenciais que marcaram esse discurso. A importância da participação popular
no discurso que pede a preservação dos objetos que constituem a memória da cidade é
algo que tem que ser destacada como parte fundamental desse processo de conquista.
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A ―luz no fim do túnel‖ representa para essas pessoas, a certeza de que ao retornarem
um dia ao seu local de origem, poder se deparar novamente com os mesmos objetos que
deixaram durante a sua partida. Ou ainda, a garantia de poder ter como exemplo, objetos
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SEGUNDO MANIFESTO
A história se repete. Da mesma maneira que ocorreu no ano de 2002, quando a cadeia
velha esteve no centro das discussões que proporcionou o aceleramento do tombamento
do centro histórico da cidade e consequentemente dos seus bens patrimoniais, anos
depois surgi um novo levante, dessa vez, em defesa de um bem privado, mas que
também exerceu grande significado na vida das pessoas da cidade e da região.
Entretanto, uma parte da fábrica não tinha sido atingida. A chaminé onde
funcionava a caldeira teria sofrido vária tentativa de demolição, porém nenhuma delas
obteve êxito, devido a sua estrutura, apesar de alta, ter se fortalecido provavelmente
com o calor da sua caldeira.
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Foto 2- Chaminé da Brasil Oiticica durante tentativa de derrubada (Foto de Lucio Flávio Formiga )
A foto acima mostra a chaminé amarrada com cabos de aço enquanto na sua base foram
feitas escavações para facilitar a derrubada. No entanto, esse seria o foco da segunda
discussão envolvendo o patrimônio histórico da cidade e a população local, onde a
população se posicionou de maneiras opostas, contrários ou a favor da derrubada da
chaminé da Brasil Oiticica.
Ai vai minha opinião sobre esse caso da chaminé que está gerando a maior
polemica aqui em Pombal... Jose Tavares De Araujo Neto, Rapaz eu acho
que essa chaminé não tem mais condições de ficar ai não até por que, não sei
se você viu mais ela esta quebrando lá em cima e ela já sofreu muito dano, e
outra, eu tive a oportunidade de entrar dentro dela e ver ela por dentro e a
coisa está mais feio ainda, devido a umidade ela está muito acabada por
dentro.... Se for para reformar ela vai gastar muito mesmo! Dinheiro que
poderia ajudar muita gente ai que precisa aqui em Pombal, na minha opinião
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esse caso da chaminé seria um desperdício de dinheiro !!!! Mais vamos que
no que vai da neeh.....( EDSON KAIQUE, 2012.)
Mas apesar do resultado da enquete ter sido algo negativo, as pessoas que pediam pela
preservação continuaram suas manifestações através das redes sociais. ―A sua luta
incansável junto a todos os que compartilham com esse ideal terá resposta favorável.
Acredito que o Poder Público vai começar a entender a importância de um patrimônio
histórico. Parabéns!‖ (ALMEIDA, 2012). E esse apoio continuou crescendo.
Eu sou quem agradeço a todos que abraçaram esta causa, desde aqueles,
pombalenses ou não, que vem fazendo importante trabalho de bastidores
junto aos órgãos competentes, como também aqueles que depuseram a favor
da preservação, compartilharam nossos fotos ou curtiram os comentários
favoráveis. o MP, a UFCG, O IPHAEP, são órgãos que estão tendo papel
fundamental.( ARAÚJO NETO, 2012. )
O que de fato veio a ocorrer, pois no local onde hoje se encontra a torre foi
construída uma praça, provando que mesmo os objetos do passado são capazes de serem
integrados à modernidade e conviver passivamente com o presente e ainda ser útil a
população.
CONCLUSÃO
Nos dois casos o apoio da população foi de suma importância para a preservação
dos bens citados. Provocando o Ministério Público fez com que o mesmo se
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manifestasse assumindo uma postura diante daquela polêmica que envolvia a sociedade
pombalense. Da mesma forma ocorreu com o órgão preservacionista, o apoio da
população fez o IPHAEP perceber a importância histórica inserida em cada um desses
objetos, além disso, também fez transparecer o quanto a população se reconhece e se
identifica com cada um desses elementos espalhados pela cidade.
REFERÊNCIAS
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de Pombal: Manifesto em Defesa do Patrimônio Histórico. Pombal, 1 Ed. Gráfica
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tombados. São Paulo, 2008; Dissertação (Mestrado – Área de Concentração: História e
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CHOAY, François. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Editora UNESP, 3 Ed. 2008.
DE SOUSA, Verneck Abrantes. In; Nossa história, nossa gente; Igreja de Nossa
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SITES
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iphaep-em-laudo.html Acesso em: 04 de outubro de 17
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RESUMO
INTRODUÇÃO
Comemorar é antes de tudo trazer à memória conjuntamente, é celebrar
coletivamente um passado. Nas festividades cívicas o potencial comemorativo ganha
amplitude quando o passado a ser relembrado alimenta a própria identidade
sociocultural e política daquele grupo que rememora. As comemorações do bicentenário
da Revolução de 1817 carregam tal potencial. Neste estudo buscam-se identificar os
sentidos presentes nas narrativas memorialistas em torno do bicentenário em
Pernambuco e sua relação com o Poder Público.
Memória é conceito polissêmico e seu uso torna necessário um breve
esclarecimento. A memória abordada aqui está inserida no âmbito grupal e refere-se as
representações sobre o passado. Nesse sentido a memória social destaca-se pelo caráter
intencional com que se reconstrói o passado, enquanto que a memória coletiva remete a
tudo aquilo que fica do passado no vivido dos grupos. Tal entendimento foi apresentado
por Pierre Nora (1993) para indicar o surgimento dos lugares de memória, expressões da
memória social processados pela memória coletiva. Neste sentido é que edifícios,
símbolos nacionais, comemorações e uma gama de construções artificiais adquirem a
qualificação de lugar de memória no momento que são assimilados pela memória
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A obra, com 3x2 metros de dimensão, foi concluída em 1918 e compõe hoje o acervo da Pinacoteca do
Estado do Rio Grande do Norte.
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distinto, o rito de recordação pela História ou pela memória re-presentifica mortos (Cf.
RICOEUR, 2007; CATROGA, 2011; CERTEAU, 1982).
333
A Comissão foi formada por representantes da Secretaria da Casa Civil (coordenação), Secretaria de
Educação, Secretaria de Cultura, Procuradoria Geral do Estado, Assembleia Legislativa, Prefeitura do
Recife, Prefeitura de Olinda, Ministério da Cultura, Academia Pernambucana de Letras (APL), Instituto
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, IAHGP e Comitê Pernambuco 2017.
334
Salvo o período de abril de 2014 ao final daquele ano, quando o então governador eleito Eduardo
Campos renunciou para concorrer à Presidência, assumindo o vice- governador João Lyra (Partido
Democrático Trabalhista).
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335
Em Pernambuco, um entendimento de patriotismo constitucional foi proposto por Denis Bernardes, em
análise ao período 1820-1822. Diante da Revolta do Porto (1820) e da instalação das Cortes de Lisboa,
D.João VI viu-se forçado a deixar o Brasil, condição que tornou regente o príncipe D.Pedro. Em Portugal,
o rei passou a governar sob as limitações constitucionais e nesse sentido é que também as provinciais
brasileiras deveriam se submeter ao constitucionalismo. O patriotismo constitucional se insere nesse
contexto, em que a expressão patriótica se faz nos contornos constitucionais, legitimando a autoridade do
monarca, mas buscando garantias contra o despotismo. Pensar um patriotismo constitucional em 1817,
antes mesmo das Bases da Constituição da Monarquia Portuguesa, exige dados concretos de pesquisas
que até então não existem (Cf, BERNARDES, 2006).
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São eles: Jeims Duarte, Helder Santos, Daaniel Araújo, Bruno Vilela, Beto Viana, Plínio Palhano,
Jéssica Martins, Gio Simões, Roberto Ploeg, George Barbosa, Renato Valle e Rinaldo Silva.
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As entidades agraciadas foram: Assembleia Legislativa, a Câmara do Recife, a APL e o IAHGP. As
personalidades agraciadas foram: o Grão Mestre da grande loja de Pernambuco, o Grão estre do Grande
Oriente Independente de Pernambuco, o coordenador da Comissão da Memória e Verdade Dom Helder
Câmara e o presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Até aqui se buscou mostrar a historicidade da memória em torno da Revolução de
1817. Enquanto no período monárquico as representações sobre o evento o fizeram
diminuto no conjunto da história brasileira, a partir da Proclamação da República um
novo conjunto de narrativas valorativas passam a reconstruir a memória revolucionária.
O olhar mais detido sobre as comemorações do Bicentenário em Pernambuco permitiu
identificar nas narrativas memorialísticas referências gerais à ideia de republicanismo,
liberdade, democracia e patriotismo, noções que se projetam para construção da
autoimagem coletiva e delineiam o sentido da chamada pernambucanidade, ligando
passado e presente. Quanto à identificação dos agentes difusores dessa memória
(majoritariamente atrelados ao Poder Público), sugeriu-se possível deslizamento de
sentidos em que os valores ressaltados na memória de 1817 são tomados como próprios
daquele que evoca tal memória, lançando luz sobre a dimensão política das
comemorações.
Por fim, a forma pela qual é dada a aproximação do presente com o passado
revolucionário mostrou a forte tensão entre História e memória, representada em parte
pelo conteúdo patrimonial. A memória, ainda que envolta em paixões ou interesses
inconfessos, é uma forma de conhecer o passado e significar a sociedade. Por sua
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flexibilidade, a memória pode vir a preencher o vazio onde a História mostrou rigidez
no alinhamento aos interesses presente. É saudável que não caiba ao historiador o
monopólio das representações sobre o passado (tentativas de controle são pensáveis
apenas dentro de regimes totalitários). No entanto, a perspectiva da História é
fundamental para que a sociedade (pernambucana, em específico) se perceba
criticamente, permitindo reconstruir-se dia-a-dia pela superação de seus vícios em
recusa a afagos ufanistas.
REFERÊNCIAS
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LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto. São Paulo: Companhia as Letras,
2012.
NORA, Pierre. Entre memória e história: a problemática dos lugares. Projeto História,
São Paulo, n.10, dez. 1993.
PAIVA, Diego Souza de. (Por)Entre Pedra e Tela: a construção de uma memória
republicana (Natal 1906-1919). PPGH (Dissertação de Mestrado em História), UFRN,
2011.
VIEIRA, José Ribas. Qual o controle? Para qual Justiça? In: Anais do IV Forum de
Direito Constitucional, UFMG, 1993.
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RESUMO
Neste trabalho, buscamos discutir alguns aspectos acerca da formação intelectual de
José Lins do Rego. Abordaremos elementos biográficos e a sua atuação como
intelectual nordestino, em Maceió, pois, o seu lugar social está relacionado à produção
de uma ―escrita de si‖, considerada pelos seus estudiosos como uma escrita que faz
referências às suas memórias do tempo em que era um ―menino de engenho‖. Um fato
que chama atenção é o envolvimento de JLR nas ―rodas literárias‖, aspecto que é fadado
ao esquecimento por uma gama de estudiosos. Para tanto, por base os estudos de
Fernandes Freire (2014), Souza Barros (1972), e Micelli (1977). Como aporte teórico,
dialogaremos com Gomes (2002), Bordieu (2006) e Certeau (2000).
Palavras-chave: ―Escrita de si‖; roda literárias; intelectual nordestino.
INTRODUÇÃO
338
Pensamos o lugar social a partir das reflexões de Michel de Certeau (2000), quando aponta que o
lugar social é construído historicamente e funciona ao mesmo tempo como uma possibilidade e como
uma limitação, posto que é através dele que uma narrativa é pensada, construída e torna-se conhecida.
Desta maneira, “toda pesquisa historiográfica se articula com um lugar social de produção
socioeconômico, político e cultural” (CERTEAU, 2000, p. 66). Assim, o lugar social de José Lins do Rego é
o de neto de senhor de engenho, herdeiro da sociedade patriarcal, que corrobora em seus escritos para
a ideia de decadência.
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desenvolve e morre, de maneira que tudo aquilo que aconteceu durante o período de sua
existência fluísse numa rede de eventos organizados em volta do próprio fim da história.
Esta forma teleológica de compreender a biografia associada a uma estrutura de
relato e a um romance, no qual as ações estão colocadas de forma cronológica, em que o
enredo se dirige para um fim, um desfecho, é definido por Bordieu como ―ilusão
biográfica‖. Seria uma tentativa de se entender e narrar a vida de uma pessoa em um
dado período, levando em conta a linearidade temporal da vida entre o nascer e o morrer
– como se a vida fosse um desdobramento cronológico contínuo, explicado por uma
existência cujo sentido estaria no nome próprio adquirido.
Segundo Miceli (2001), as memórias constituem um gênero de investimentos
praticados por diversas categorias de escritores. Dentre os escritores consagrados, em
sua maioria, romancistas ou poetas, ―a elaboração de memórias constitui a oportunidade
de reafirmar o domìnio completo do ofìcio de escritor‖ (MICELI, 2001, p. 85). Nos
casos de Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Augusto Meyer, Gilberto Freyre etc, a
infância ou os primeiros anos da mocidade são os períodos que se dispõem a
rememorar.
Consideramos que foi a partir desse lugar de memória que ele se construiu
enquanto um intelectual nordestino. Entendemos o intelectual a partir das proposições
de Albuquerque Júnior (2005), quando nos informa que a palavra intelectual surgiu no
final do século XIX em substituição ao termo erudito. Segundo ele:
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O local exato onde José Lins do Rego nasceu é ainda objeto de discussão. Uns apontam o engenho
Corredor e outros apontam o engenho Itapúa. O fato é que ambos se localizavam na várzea paraibana.
Ver: FIGUEIREDO JÚNIOR, Nestor Pinto. Onde nasceu José Lins do Rego, afinal? João Pessoa: Ideia,
2000.
340
Moema Selma D´Andrea aponta que a vida cultural do Recife possuía regras familiarmente localista
cujo status era conferido por meio da obrigatória passagem pela Faculdade de Direito,
“tradicionalmente conhecida como centro difusor dos vários estudos humanísticos, franqueava a rota
batida e segura dos filhos d´algo do Nordeste açucareiro. A tradição que começava na ‘aristocracia de
berço’ continuava na ‘aristocracia togada’”. D´ANDREA, Moema. A Tradição Re(des)coberta. Campinas
– SP: Ed. da Unicamp, 1992. p.24.
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interior lhe estimularam o desejo de retornar para o Nordeste, seja para Pernambuco,
seja para a Paraíba.
Em uma carta endereçada ao amigo Gilberto Freyre, José Lins do Rego anunciou
sua ida para Maceió. Lá, passou a ocupar o cargo de fiscal de banco, que lhe foi
conseguido através da atuação do pai de sua esposa, um homem que já tinha ajudado
José Lins várias vezes, o que nos leva a considerar que Antônio Massa era um homem
de bastante influência.
―Em 14 de dezembro de 1926, a bordo do vapor Pará, chegava a Maceió um
homem de terno branco, bem vestido, com óculos bengala e costeletas que logo
chamaram atenção de muitos‖ (SANTANA, 1980, p. 39). O homem em questão era
José Lins do Rego, que chegava à capital de Alagoas como um desconhecido, mas que
iria se tornar um escritor reconhecido nacionalmente a partir de escritos em terras
maceioenses.
O historiador Fernandes Freire (2014) chama a atenção para o fato de o período
em que José Lins do Rego passou em Maceió passar despercebido pelos estudiosos de
sua produção literária:
Na verdade, o que podemos observar é um certo silenciamento
discursivo em torno daquela temporada. Gilberto Freyre, nos seus
textos sobre José Lins, quase não aborda a época em que seu amigo
esteve em Maceió. Para o ensaísta pernambucano, Maceió não teria
sido muito importante, não passaria de um mero capítulo na vida do
paraibano, pois teria sido o Recife, grande metrópole regional, que
teria contribuído para a obra literária de José Lins (FERNANDES
FREIRE, 2014, p. 118).
O tempo que passou em Recife e a sua importância para a formação de José Lins
do Rego pode ter contribuído para que seus estudiosos menosprezassem a sua estadia
por outras cidades, principalmente, Maceió. Para demonstrar essa postura, temos os
estudos de José Aderaldo Castello (1961), Pávula Maria Sales do Nascimento (2009) e
Mariana Chaguri (2009), os quais destinaram apenas leves parágrafos aos anos
maceioenses de José Lins. Esse fato indica o silêncio de que esse período padeceu, com
Gilberto Freyre reforçando a cidade do Recife como a principal na vida e na obra de
José Lins. Entretanto, para nós, os anos em que José Lins viveu na capital alagoana
foram importantes para a sua produção literária.
Em 1926, José Lins se mudou para Maceió e passou a exercer a função de fiscal
de banco. Não se tratava de um simples adepto do tradicionalismo freyreano que
chegava. Nos anos de 1924-1926, tinha fundido seu tradicionalismo com o
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Podemos dizer que no contexto de publicação das referidas obras existiam dois
grandes grupos de amigos: os que compunham a ―roda de São Paulo‖ (Mário de
Andrade, Tarsila do Amaral, Anita Malfatti, Menotti del Picchia e Oswald de Andrade)
e os que compunham a ―roda de Maceió‖ (José Lins do Rêgo, Rachel de Queiroz,
Graciliano Ramos, Jorge de Lima, Aloísio Branco, Valdemar Cavalcanti, Aurélio
Buarque de Holanda).
341
Ganhou o Prémio da Fundação Graça Aranha.
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Durante a sua permanência em Maceió, José Lins retornou para a fase da escrita
das crônicas e dos pequenos ensaios críticos, proeminentes na sua carreira342,
contemplando durante esses anos as suas definições literárias em prol do movimento
regionalista do Recife e em crítica para o movimento modernista de São Paulo.
No prefácio de ―Gordos e Magros‖ (1942), José Lins comenta sua passagem por
Maceió: ―relembro a fase alagoana de minha vida como tempos fecundos, época de
floração de minha carreira. Saía do aprendizado para fazer qualquer coisa com as
minhas próprias mãos‖ (REGO, 1942, p.47).
Foi na fase de Maceió que ele se dedicou a escrever um estudo biográfico e
crítico sobre Gilberto Freyre, mas o sociólogo pernambucano teria intervindo para que
não fosse publicado. Ao mesmo tempo, foi em Maceió que se deu a elaboração de seus
primeiros romances, como aponta Castello: ―sua atividade de romancista começou em
1932, com o plano de uma novela em que, no primeiro capítulo, ele se voltaria para a
infância, no ambiente dos canaviais‖ (1961, p. 91). Pela cronologia das obras, fica
nítido que estaria se referindo a Menino de Engenho, pois menciona o desejo de
enaltecer a figura de seu avô:
342
As crônicas escritas nesse momento de sua vida são os volumes de Gordos e Magros (1942) e Poesia
e Vida (1945), quando José Lins residia no Rio de Janeiro.
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A obra em questão é tida pela crítica literária e pelo próprio José Lins como a
primeira obra do conhecido ―Ciclo da cana-de-açúcar‖. Porém, Bueno (2006) adianta
que são muitos os romances que se apresentam na década de 1930. As primeiras edições
de Menino de engenho e Doidinho não fazem qualquer referência a pertencerem a um
ciclo literário em andamento. Foi preciso que a crítica identificasse uma continuidade
entre os dois livros para assim os definir.
Bueno (2006) nos adianta que, naquele momento, era costume da Editora José
Olympio publicar as obras na forma de ciclos. E isso não era partilhado por todo o
romance brasileiro de 1930, tendo em vista que grande parte dos casos tem relação com
a denominação e publicação comum pela José Olympio Editora. O autor de ―Uma
história do romance de 30‖ deixa um alerta para pensarmos se realmente estamos diante
de romances cíclicos, e o quanto esse tipo de projeto literário é determinado por um
realce na literatura social. Vejamos o que nos adianta acerca de José Lins do Rego:
Assim, nos escritos de José Lins do Rego, temos vários pontos a serem
trabalhados, desde pensarmos seu viés enquanto cronista, até seus romances cíclicos. A
relevância de José Lins para a tradição literária verifica-se na maneira como ele
conseguiu articular sua produção. Inicialmente, ligada à sua experiência pessoal, depois,
balanceando o estilo coloquial e o literário, acrescentando aspectos referentes à
linguagem dos personagens um tom de oralidade.
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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BUENO, Luís. Uma história do Romance de 30. São Paulo: Editora da USP;
Campinas: Editora da UNICAMP, 2006.
CHAGURI, Mariana Miggiolaro. Do Recife nos anos 20 ao Rio de Janeiro nos anos
30: José Lins do Rego, regionalismo e tradicionalismo. 2007. 211f. Dissertação
(Mestrado) - Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas, Campinas, 1990.
FIGUEIREDO JÚNIOR, Nestor Pinto. Onde nasceu José Lins do Rego, afinal? João
Pessoa: Ideia, 2000.
MICELI, Sérgio. Poder, sexo e letras na República Velha. São Paulo: Perspectiva,
1977.
REGO, José Lins. Menino de engenho. Rio de Janeiro: José Olympio, 2010.
_________. Gordos e Magros. Rio de Janeiro: Casa do Estudante do Brasil, 1942.
_________. Notas sobre Gilberto Freyre. In: FREYRE, Gilberto. Região e Tradição.
Rio de Janeiro: José Olympio, 1941.
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