Caso Glória

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FILMES PSICOLÓGICOS E EDUCACIONAIS

TRÊS ABORDAGENS EM PSICOTERAPIA

- Uma série de filmes produzidos por: “Filmes Psicológicos Santa Ana, Califórnia"

- Produzido e dirigido por: Everett L. Shostron PH.D.

- Filmado e editado por: Rod Yould

- Os psicoterapeutas:
Carl Rogers, PH.D. - Frederick Perls, M.D. PH.D. - Albert Ellis, PH.D.

- A paciente:
Glória

Psicoterapia é um processo tanto pessoal quanto particular, que é um mistério para a maioria das pessoas
que nunca passaram por ele. As seguintes seqüências são um esforço único que nos permite assistir ao que
geralmente é uma experiência terapêutica privada. Uma paciente de verdade foi corajosa o suficiente para
permitir-se ser filmada enquanto estava envolvida na terapia com três terapeutas diferentes. Com isto, nos foi
dado o privilégio de ver e sentir o que realmente ocorreu.

Uma seqüência de filmes como esta, na qual três terapeutas diferentes, com suas diferentes orientações,
dividem condutas terapêuticas, nunca foi feito antes. Portanto, desejamos demonstrar nossa gratidão a Glória,
a cliente, e aos três terapeutas, por permitirem que compartilhássemos de suas aventuras terapêuticas.

Esta série está dividida em três filmes separados.

N 1º filme, vemos o dr. Carl Rogers, fundador da Terapia Centrada no Cliente, no 2º filme, o Dr.
Frederick Perls, fundador da Gestalt- terapia e no 3º filme, o Dr. Albert Ellis, fundador da Terapia Racional
Emotiva.
Cada terapeuta descreve seu sistema de terapia de forma breve, antes de demonstrar seu trabalho com
Glória, e por fim, irá comentar o trabalho realizado.

Vamos agora ao Dr. Rogers:

A partir de anos de experiência terapêutica eu vim a perceber que se eu conseguir criar o clima, o
relacionamento e a condição apropriados, o processo do movimento terapêutico irá inevitavelmente ocorrer no
meu cliente.
Mas o que é esse clima? Quais são estas condições? Estarão presentes na entrevista que irei ter com
esta pessoa que estou prestes a conhecer? Deixe que eu descreva brevemente que condições são estas e
como eu as vejo.
Antes de mais nada, uma pergunta cuja importância foi crescendo para mim ao longo dos anos: será que
posso ser verdadeiro no relacionamento? Penso que genuinidade é uma outra forma de descrever esta
qualidade que eu gostaria de ter. Gosto do termo congruência, com o qual quero dizer que o que experiencio
internamente terá que estar presente em minha consciência e ser expresso pela minha comunicação.
Desde que eu tenha esta qualidade, estou íntegro no relacionamento. Outra palavra que descreve isto para mim
e que eu gostaria de ter é transparência. O meu desejo é que meu cliente possa ver dentro de mim, que não
exista nada escondido. Quando sou verdadeiro, nesses termos, eu sei que meus próprios sentimentos afloram
à minha consciência e são expressos de um modo que eles não irão se impor ao meu cliente.
A segunda pergunta que me faço é: será que me perceberei gostando dessa pessoa, importando-me
com ela? Certamente eu não gostaria de fingir um cuidado que não sinto. Caso eu não goste de meu cliente e
se este sentimento persistir, prefiro expressar isto para ele. Todavia eu sei que é mais fácil ocorrer o processo
psicoterapêutico, bem como uma troca construtiva, se eu sentir, espontaneamente, um verdadeiro apreço por
esta pessoa com quem estou me relacionando. Este apreço por uma outra pessoa pode ser chamado de
aceitação, ou de cuidado, ou de amor não possessivo. Sei que o relacionamento se tornará mais construtivo
se este apreço estiver presente.
E a terceira pergunta é: serei capaz de compreender o mundo interno dessa pessoa? Serei capaz de
ver através de seus olhos? Serei sensível o suficiente para mover-me dentro do mundo de seus
sentimentos e me sentir como ela se sente, para que eu possa compreender não só significados que estão
na superfície, mas também aqueles que estão subjacentes? Sei que se puder me soltar com sensibilidade e
precisão dentro da experiência do meu cliente, será mais fácil garantir o movimento terapêutico.
Suponhamos que eu seja bem sucedido e consiga, realmente, experienciar aquelas atitudes na relação
com este cliente, então muita coisa poderá acontecer.
A partir de minha experiência clínica e de minhas investigações, posso concluir que se estas atitudes
estiverem presentes, uma série de coisas irão acontecer. O cliente explorará alguns de seus
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sentimentos e atitudes mais profundamente. Ele será capaz de descobrir alguns aspectos ocultos de si
mesmo, dos quais ele não tinha tido ainda consciência. Sentindo-se prezada por mim, é bem possível
que a pessoa venha a se prezar mais. Sentindo que alguns de seus valores são compreendidos por
mim, é possível que ela possa mais prontamente reconhecer a si mesma, reconhecer o que acontece em
sua própria experiência, reconhecer seus próprios valores, que ela se recusava a admitir até então, e
talvez se ela puder reconhecer sinceridade em mim, ela será capaz de ser um pouco mais sincera
consigo mesma. Concluindo, acredito que ocorrerá também uma mudança no modo de expressar dessa
pessoa. Pelo menos esta tem sido minha experiência em outras situações.
Por ser capaz de representar a sua experiência, ela será capaz de perceber e expressar aquilo que está
acontecendo com ela naquele exato momento. Ao invés de se desaprovar é possível que ela consiga atingir um
grau mais elevado de aceitação de si mesma. De um relacionamento temeroso, ela poderá caminhar para um
nível de contato mais direto comigo. Ao invés de construir a vida em padrões preto e branco, ela poderá
alcançar um modo mais rico de conceber suas experiências e encontrar significado nelas. De um referencial de
valoração externo, é possível, que ela passe a reconhecer uma capacidade maior dentro de si mesma para
fazer seus próprios julgamentos e tirar suas próprias conclusões.
Estas são algumas das mudanças que tenho a intenção de buscar. Creio serem todas elas mudanças
características do processo de psicoterapia e do movimento psicoterapêutico.
Se eu tiver algum sucesso em criar algumas das condições que mencionei anteriormente, é possível que
possamos ver em alguns minutos mudanças neste cliente, apesar de saber precisamente que nosso contato
será muito breve.

Terapeuta: Bom dia!


Cliente: Bom dia!
T: Sou o Dr. Rogers, você deve ser Glória?!
C: Sim, sou eu.
T: Nós temos meia hora juntos, não sei o que poderemos fazer, mas espero que possamos fazer algo
neste tempo. Terei prazer em saber qualquer coisa que tenha importância para você.
C: Bem, estou um pouco nervosa... mas agora me sinto mais a vontade, pois com sua voz suave sinto que
você não será tão duro comigo. Mas...
T: Percebo um tremor em sua voz, portanto...
C: A coisa principal que quero falar é que estou divorciada há pouco tempo. Fiz terapia antes e me sentia
aliviada quando parei. Agora que saí do casamento, a grande mudança é me ajustar à minha vida de solteira.
Uma das coisas que mais me incomoda são os homens e o fato de ter homens em casa afetar as crianças. A
coisa que vem à minha cabeça agora é que ... tenho uma filha de nove anos que certa vez me pareceu ter
muitos problemas emocionais e... eu gostaria de parar de tremer e estou realmente consciente das coisas que
estão me afetando. Não quero que ela fique triste, que fique chocada. quero muito que ela me aceite. Algo com
que nos deparamos muito é sexo. Outro dia ela viu uma garota solteira, grávida, e ela me perguntou se uma
garota pode ficar grávida mesmo estando solteira. A conversa estava ótima até que ela me perguntou se eu
tinha feito amor com algum outro homem depois que me separei do pai dela. Menti. E desde então isso fica
voltando à minha mente e me sinto muito culpada por ter mentido para ela, sendo que eu nunca menti e queria
que ela confiasse em mim. Quero uma resposta sua, se isto afetaria a ela, o fato de eu ter falado a verdade ou
não?
T: Você está preocupada com ela e com o fato de estar sentindo que aquele relacionamento franco que
sempre existiu entre vocês duas tivesse desaparecido...
C: Sim, sinto que tenho que ter cuidado com isso, porque eu me lembro, que quando era criança, deixei de
gostar de minha mãe por uns tempos, quando vim a saber que ela e meu pai tinham relações sexuais, o que eu
considerava sujo e terrível. Não quero mentir para Pammy, e não sei...
T: Gostaria realmente de poder lhe dar a resposta que você poderia dar a ela.
C: Temia que o senhor fosse me dizer isso.
T: Pois o que você quer, na realidade, é uma resposta.
C: Quero saber especificamente se o que a traumatizaria seria o fato de eu ser completamente honesta e
franca com ela ou o fato de ter-lhe mentido. Sinto que nossa relação foi atingida porque menti para ela.
T: Você acha que ela poderia vir a suspeitar, ou a saber que alguma coisa não esteja bem?
C: Sim, eu acho que, com o tempo, ela desconfiará de mim. E pensei também, bem, quando ela crescer
um pouco mais e se encontrar em situações delicadas, que ela provavelmente não iria querer admitir isso
porque pensa que sou tão boa e tão pura. Por outro lado, tenho medo de que ela pense que sou um demônio.
Quero tanto que ela me aceite. Não sei até que ponto uma menina de nove anos pode suportar tudo isso.
T: Na realidade, ambas as alternativas a preocupam. Que ela possa pensar que você seja tão boa ou
melhor do que é na realidade...
C: Sim.
T: Ou que ela pense que você seja pior do que é...
C: Não pior do que eu sou. Não sei se ela me aceitaria como eu sou. Acho que me imagino como sendo
maternal e terna, mas estou um pouco envergonhada de meus aspectos não muito claros.
T: Compreendo. Você nunca terá a certeza de que, se ela a conhecesse como é na realidade, ela iria ou
poderia aceitá-la.
C: É isso o que eu não sei. Não quero que ela fuja de mim. Nem sei como me sinto a esse respeito,
porque, em certos momentos, sinto-me tão culpada, como quando estou com um homem em casa, que tento
mesmo fazer um plano especial para ficar a sós com ele, de forma que a menina não possa apanhar-me
fazendo essas coisas. Porque eu sou mesmo sabida nessa coisa. entretanto, sei também que tenho esses
desejos.
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T: Então está bastante claro que não é só o problema dela, ou o relacionamento de vocês, o problema
também está em você...
C: Em minha culpa. sinto-me culpada, com muita freqüência.
T: “Qual a melhor coisa que posso fazer?” e você compreende que com essa espécie de subterfúgios,
precavendo-se para não ser surpreendida por ela, você está agindo com base na sua culpa, não é?
C: Sim, e não me agrada o ... eu gostaria de me sentir à vontade com tudo o que faço. Se eu resolver não
dizer a verdade a Pammy, ainda assim, queria sentir-me à vontade. Queria que ela entendesse, mas eu não
consigo. Quero ser honesta, mas vejo que existem áreas que nem eu mesmo aceito.
T: Se você não pode aceitá-las em si mesma, como é que você iria conseguir contar a ela, sem se
perturbar?
C: Tem razão.
T: Portanto, como você disse, você tem esses desejos e esses sentimentos, mas você não se sente bem
com eles.
C: Certo. Sinto que o senhor vai ficar aí sentado e deixar-me cozinhar nesse caldo, e eu preciso mais do
que isso. Quero que o senhor me livre dos meus sentimentos de culpa. Se eu puder me livrar dos meus
sentimentos de culpa por mentir ou por ir para a cama com um homem, sem estar casada, ou por qualquer
outra coisa, vou sentir-me mais aliviada.
T: E eu penso que gostaria de dizer, não, não quero que você fique cozinhando em seus sentimentos, mas,
por outro lado, também sinto que isto é uma coisa pessoal que eu não poderia responder por você. Mas lhe
asseguro que farei tudo para ajudá-la a encontrar uma resposta. Não sei se faz sentido para você, mas é isso
que quero dizer.
C: Bem, gostei de ouvi-lo dizer isso. O senhor parece dizer o que está pensando, mas não sei aonde ir.
Nem consigo pensar para onde ir. Pensei que havia resolvido a maior parte dos meus sentimentos de culpa, e
agora que estão voltando, sinto-me desapontada comigo mesma. Estou mesmo. Gosto de sentir-me bem
comigo mesma, quando faço alguma coisa, mesmo que contrarie a minha moral, ou o modo como fui educada.
E agora não estou me sentindo bem. É como se existisse uma menina agindo dentro de mim e que, de uma
forma ou de outra, eu me protegesse como uma mãe e imagino que ela pensa que sou toda doçura, e com
certeza não quero mostrar-lhe meu lado mais irritadiço e mau. Quero ser meiga, mas me é tão difícil - tudo isso
parece tão novo outra vez, e é tão desapontador.
T: Sim, entendo seu desapontamento, pois você pensou que tinha resolvido todas essas coisas, e agora
lhe vem essa culpa e a sensação de que só uma parte sua é aceitável para os outros.
C: Sim.
T: Pois é isto. Creio que entendo o enigma realmente complicado que você julga ser mais ou menos
assim: "puxa vida! que é que eu faço?"
C: Sim, e sabe o que penso, doutor, é que tudo que começo a fazer, mesmo que seja impulsivo, me parece
natural que eu dissesse a Pamela - sair para um encontro ou qualquer outra coisa. Sinto-me à vontade até que
começo a pensar que fui traumatizada quando criança e, no momento em que esse pensamento me vem a
mente, fico toda confusa. É como se eu quisesse muito ser uma boa mãe, e eu sinto que sou uma boa mãe,
mas existem essas pequenas exceções, como minha culpa por trabalhar fora. Quero trabalhar e é bom ter um
dinheiro extra. Gosto de trabalhar à noite, mas quando penso que não estou sendo boa com as crianças, ou
não lhes dando atenção suficiente, começo a sentir-me culpada novamente. Então, é por isso que é (como eles
chamam a isso) uma dupla vinculação. É justamente o que parece ser. Quero fazer isso e isso me parece
certo, mas por outro lado, acho que não estou sendo uma boa mãe, e quero ambas as coisas. Cada vez mais
percebo como sou perfeccionista. É isso que me parece que quero ser - toda perfeita. Ou quero ser perfeita
segundo meus padrões, ou então, não quero mais tê-los.
T: Creio que vejo as coisas um pouco diferente - que você quer é parecer perfeita - mas isso significa muito
- é muito importante para você ser uma boa mãe, e você quer parecer ser uma boa mãe, mesmo que alguns de
seus sentimentos reais divirjam desse objetivo. É isso mesmo, não é?
C: Não, acho que não é isso o que quero dizer. Não, não é isso, absolutamente, o que sinto. Eu sempre
quero ser aprovada, mas meus atos não me deixam. Eu quero ser aprovada por mim mesma.
T: Compreendo... para você é como se seus atos fossem exteriores a você. Você quer aprovar-se a si
mesma, mas o que você faz, de uma forma ou de outra, não lhe permite aprovar-se a si mesma.
C: Certo. é como se eu não pudesse aprovar-me com relação, por exemplo, à minha vida sexual. Essa é a
grande questão. Se eu me apaixonasse realmente por um homem, o respeitasse e o adorasse, creio que não
me sentiria tão culpada por dormir com ele e creio que não me sentiria obrigada a inventar desculpas para as
crianças, porque elas poderiam ver a atenção natural que eu dedicaria a ele. Mas quando sou envolvida por
desejos físicos e digo, "ora, por que não?", e é o que quero, sinto-me culpada, depois. Odeio enfrentar as
crianças, odeio olhar para mim mesma, e raramente sinto prazer no sexo. É isso o que quero dizer. Se as
circunstâncias fossem diferentes, creio que não me sentiria tão culpada, pois sentiria que estaria fazendo o que
seria certo.
T: Creio que você quis dizer, "se o que eu estava fazendo, quando ia para a cama com um homem, fosse
realmente verdadeiro e cheio de amor e respeito, e assim por diante, eu não me sentiria culpada com relação a
Pammy. Eu me sentiria verdadeiramente. à vontade com a situação."
C: Sim, é isso o que sinto. E sei que é como se eu quisesse uma situação perfeita, mas é como me sinto.
E nesse ínterim, não posso parar de ter desejos. Tentei isso também. Tentei dizendo: "Está bem, eu me odeio
quando faço isso, portanto não quero mais fazer". Nesse instante fico com raiva das crianças. Penso, então,
por que razão elas me impediriam de fazer o que quero, afinal de contas não é tão ruim assim.
T: Mas creio que você disse também que não é só pelas crianças, você mesma não gosta disso, quando
não é realmente...
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C: É isso mesmo, estou certa de que - sei que é isso, provavelmente mais do que tenho consciência, mas
só noto com maior intensidade quando vejo refletido nas crianças. Nesse momento posso notá-lo também em
mim mesma.
T: E, de certa maneira, às vezes, é como se você se sentisse acusando-as pelo sentimento que você tem.
Quero dizer, por que iriam elas impedi-la de ter uma vida sexual normal?
C: Bem, uma vida sexual, eu diria, não normal, porque algo em mim diz que não é muito saudável -
entregar-se ao sexo só porque se sente atraída, ou qualquer coisa, ou uma necessidade física. Algo me diz que
isso, de alguma forma, não é correto.
T: Mas você sente, realmente, que às vezes está agindo de uma forma que não está de acordo com seus
próprios padrões íntimos.
C: Correto. Correto.
T: Mas você disse também, há alguns minutos, que você não pode fazer nada em contrário.
C: Eu gostaria de poder. É isso, e eu não posso - sinto agora que não posso controlar-me como podia
antes. Por alguma razão, agora eu não posso. Simplesmente me deixo levar e há muitas coisas que faço
erradas e de que me sinto culpada, e certamente não gosto disso. Quero muito que o senhor me dê uma
resposta direta, e vou fazer uma pergunta, embora não espere uma resposta direta, quero saber. O senhor
acha que para mim a coisa mais importante é ser franca e honesta, e se não posso ser nem uma coisa nem
outra com meus filhos, o senhor acredita que isso os prejudicaria? Se, por exemplo, eu dissesse a Pammy,
"senti-me mal por ter-lhe mentido, Pammy, e agora quero dizer-lhe a verdade", e se lhe dissesse a verdade e a
chocasse e a deixasse nervosa, se isso a perturbasse ainda mais? Quero livrar-me de minhas culpas, e isso
me ajudará, mas não quero colocar essas culpas nela.
T: Está certo.
C: O senhor acha que isso poderia magoá-la?
T: Creio - estou certo de que o que vou lhe dizer lhe parecerá evasivo, mas parece-me que, talvez, a
pessoa com quem você não está sendo franca é você mesma. Surpreendeu-me bastante quando você disse,
"se me sinto bem por ter feito o que fiz, seja ir para a cama com um homem ou outra coisa qualquer, se sinto
que isso é certo, então não deveria me preocupar com o que dizer a Pammy ou com o meu relacionamento com
ela."
C: Certo. O senhor tem razão. Agora entendo o que quer dizer. É claro. E por isso, quero fazer o que
puder para aceitar-me a mim mesma. Quero me sentir bem com isso. Isso faz sentido. Isso passará a ser
natural e não precisarei preocupar-me com Pammy. Mas quando as coisas parecem tão erradas para mim,
sinto o impulso de fazê-las, como posso aceitar isso?
T: O que você gostaria de fazer é sentir-se mais receptiva com relação a você mesma, quando faz coisas
que acha que são erradas. Estou certo?
C: Sim.
T: Parece meio difícil conseguir isso.
C: Sinto como se o senhor fosse dizer: "Ora por que você pensa que são erradas?", e aí também meus
sentimentos são confusos. Pela terapia eu diria "pensando bem, eu sei que isso é natural. As mulheres sentem
isso - é verdade. Não falamos muito sobre isso, em sociedade, mas todas as mulheres sentem, e é muito
natural". Tenho tido relações sexuais nos últimos onze anos e, naturalmente, ainda vou desejar tê-las. Mas
ainda penso que é errado, a menos que você esteja verdadeiramente apaixonada por um homem, e meu corpo
parece não concordar. Assim, não sei como aceitar isso.
T: Isto parece como se fosse um triângulo, não? Você sente que eu, ou os terapeutas em geral, ou outras
pessoas, dizemos, "está tudo certo, tudo certo, isso é natural, vá em frente, e creio que seu corpo se inclina
para esse lado da questão. Porém algo em você diz, mas não gosto dessa maneira, só quando está realmente
certo."
C: Correto... tenho uma sensação de desesperança. Quero dizer, essas são coisas que eu sinto - está bem,
mas e daí?
T: Você sente que esse é o conflito e que ele é simplesmente insolúvel, portanto, não há esperança, e você
está aqui me olhando, e parece que eu não a ajudo em nada.
C: Certo. Na verdade, eu sei que o senhor não pode responder por mim, mas quero que o senhor me guie
ou me mostre por onde começar - de forma a não parecer tão sem esperança. Sei que posso continuar vivendo
com esse conflito, e sei que, no final, tudo ficará resolvido, mas o que eu queria era sentir-me mais à vontade
com a maneira como vivo - e não me sinto.
T: Pergunto-lhe uma coisa, o que você queria que eu dissesse?
C: Eu queria que o senhor dissesse para ser honesta e enfrentar o risco de que Pammy venha a me
aceitar. E também sinto que se pudesse mostrar isso a Pammy, mais do que a qualquer outra pessoa, eu seria
capaz de dizer, "veja como essa menina me aceita, portanto, não sou tão má assim". Se ela souber realmente
que demônio eu sou, e ainda assim puder amar-me e aceitar-me, creio que isso me auxiliaria a aceitar-me a
mim mesma - como se isso não fosse realmente tão ruim assim. Quero que o senhor me diga para ir em frente
e ser honesta, mas não quero ter a responsabilidade com o fato de que meus atos a deixem nervosa. É aí que
não quero assumir a responsabilidade.
T: Você sabe muito bem o que queria fazer nesse relacionamento. Você queria ser você mesma, e
gostaria que ela soubesse que você não é perfeita e que faz certas coisas que talvez nem ela aprovaria, que
você mesma desaprovaria, de certo modo, mas que ela assim mesmo a amasse e a aceitasse como uma
pessoa imperfeita.
C: Sim. Imagino que, se minha mãe tivesse sido mais franca comigo, eu talvez não tivesse essa atitude tão
restritiva com relação ao sexo. Se eu tivesse pensado que ela pudesse ser, entende, bem sensual e ordinária,
até mesmo execrável, eu não teria olhado para ela como se ela fosse uma mãe tão boazinha, eu pensaria que
ela também poderia ter sido o contrário. Mas ela não falava sobre esses assuntos comigo. Talvez tenha sido aí
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que eu formei a minha imagem. Não sei bem, mas quero que Pammy me veja como uma mulher completa,
mas também que me aceite.
T: Você não parece tão insegura.
C: Não? O que o senhor quer dizer?
T: O que quero dizer é que você tem estado sentada, aí, dizendo-me exatamente o que gostaria de fazer
nesse relacionamento com Pammy.
C: Eu gostaria, mas não quero arriscar fazer, a não ser que uma autoridade me diga.
T: De uma coisa tenho certeza: viver é uma coisa bastante arriscada. Você estaria colocando em jogo o
seu relacionamento com ela, e correndo um risco ao deixar que ela saiba quem você é realmente.
C: Sim, mas, se não me arriscar, também não me sentirei bem, jamais, sendo amada e aceita por ela, sem
que ela saiba realmente quem sou.
T: Se o amor e a aceitação dela por você se baseiam numa falsa imagem de você, de que servem, afinal?
É isso o que você está querendo dizer?
C: Sim, é isso, mas também sinto que ser mãe é uma grande responsabilidade. Não quero sentir-me
causadora de grandes traumas nas crianças. Eu não gosto de toda essa responsabilidade. Penso que é isso.
Não gosto, e sentir isso talvez seja falha minha.
T: Creio que foi isso que eu quis dizer com "a vida é arriscada". Assumir a responsabilidade de ser a
pessoa que você queria ser com relação a ela é uma grande responsabilidade.
C: É mesmo.
T: Uma responsabilidade bastante assustadora.
C: O senhor sabe, vejo isso tudo sob dois aspectos. Gosto de saber que estou sendo honesta com as
crianças, de orgulhar-me realmente de mim mesma, de modo que, não importa o que eu disse a elas, não
importa que me julguem má, ainda assim terei sido honesta e nosso relacionamento será mais completo e
profundo. Por outro lado, o senhor sabe, fico com ciúme quando estão com o pai delas. Sinto que ele é mais
descontraído, não é tão verdadeiro, nem tão honesto, mas elas têm uma imagem muito boa de seu pai, não
obstante. O senhor sabe, ele é todo bondade e luz e tenho inveja disso também. Quero que elas me vejam tão
boa como o vêem, apesar de saber que ele não é muito autêntico com as crianças. Parece-me, portanto, que
tenho de escolher uma coisa ou outra e sei que isso é o que mais quero, mas sinto falta de um pouco dessa
Glória.
T: Você sente como se quisesse que elas tivessem uma imagem tão agradável de você como têm do pai,
e, se a dele não é muito autêntica, então a sua também não poderá sê-lo. Penso que você está exagerando um
pouco.
C: Mas é isso o que quero dizer. Sei, porém, que ela não poderia ter uma imagem tão perfeita de mim, se
eu fosse honesta. Além disso, sinto que sou um pouco mais ordinária do que o pai delas. Provavelmente faço
mais coisas que elas desaprovariam.
T: Então você realmente acha difícil que elas a amem, se elas chegarem a conhecê-la?
C: Sim, é isso. O senhor sabe que é exatamente assim. Antes da terapia, eu teria definitivamente
escolhido a outra área. Eu conseguirei o respeito delas, não importa o que tenha de fazer - mesmo se for
obrigada a mentir.
T: Compreendo.
C: Neste instante, porém, sei que isso não é verdade, e não tenho certeza de que elas me aceitarão. Algo
me diz que sim. Sei que sim, mas não tenho certeza. Quero que me dêem essa certeza. Continuo a querer
isso.
T: Agora você está numa espécie de terra-de-ninguém, mudando de um ponto de vista para outro, com
esses problemas, mas você queria muito que alguém lhe dissesse, "está certo, vá em frente e faça isso".
C: Sim. É por isso que me senti encorajada, quando li num livro escrito por alguém a quem respeito e
admiro, que fazer isso é correto, que não importa - no fim a honestidade vencerá. Bem, isso me dá confiança -
por Deus, eu estou certa, mas...
T: É, tão difícil escolher por você mesma, não é?
C: E isso me faz sentir muito imatura. Não gosto desse meu aspecto. Gostaria de ser bastante madura
para fazer minhas decisões e permanecer com elas, mas preciso de alguém que me ajude - alguém que me dê
forças.
T: De certa forma você se reprova por isso. Creio que você sente, "se eu fosse alguém, ou se fosse adulta,
eu teria a maturidade de decidir coisas por mim mesma"
C: Sim. E me arriscaria mais, gostaria de arriscar-me mais. Gostaria de poder seguir em frente e ser assim
e poder dizer, enquanto as crianças crescem, eu fiz o melhor que pude por elas. Eu não precisaria sentir
constantemente esse conflito. Eu gostaria de, mais tarde, dizer, "não importa o que vocês, crianças, tenham me
perguntado, eu lhes contei a verdade. Talvez vocês não gostassem, mas era a verdade". Isso, de certa forma,
eu admiro. Não tenho respeito por pessoas que mentem. Detesto isso, o senhor vê em que jogo duplo me
encontro. Eu me odeio se sou má, mas também me odeio por mentir, portanto, a questão é aceitação. Quero
me aceitar mais.
T: Creio, pelo seu tom de voz que você se odeia mais quando mente do que quando faz coisas que
desaprova.
C: É isso mesmo. Isso sempre me preocupou. Isso aconteceu com Pammy, no mês passado, isso
continua me preocupando. Não sei se devo chegar para ela e conversar ou se devo esperar. Ela talvez tenha
até esquecido o que me perguntou, mas...
T: Acontece que você não esqueceu.
C: Eu não esqueci. Não. Não esqueci e gostaria, ao menos, de ser capaz, de lhe dizer que me lembro de
ter-lhe mentido e que sinto muito por isso, e que tenho me preocupado muito. Agora me sinto como - agora
isso está resolvido - e nem mesmo resolvi nada, mas sinto-me aliviada. Na verdade, sinto como se o senhor
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estivesse dizendo - o senhor não está me aconselhando, mas sinto como se o senhor me dissesse, "você sabe
que caminho quer seguir, vá em frente e siga-o". Sinto uma espécie de apoio no senhor.
T: Creio que sei como é, você esteve dizendo o que você sabe que quer fazer e nesse sentido, sim,
acredito no apoio às pessoas para o que elas querem fazer. É um pouco diferente do que lhe parece.
C: O senhor está querendo me dizer...
T: Veja você, o que me preocupa é que não é nada bom fazer algo que você realmente não escolheu fazer.
É por isso que estou tentando ajudá-la a descobrir quais são suas escolhas.
C: Mas então há aí um conflito, porque não estou realmente segura do que quero fazer. A parte da
mentira, sim, mas não sei o que quero fazer, quando se trata de ir contra mim mesma. Como quando levo um
homem para casa. Não estou certa de querer fazer isso. Se me sinto culpada depois, é porque, na verdade, eu
não o queria.
T: Estou interessado no que você disse - não estou certo de quais as palavras que usou - mas você não
gosta de você ou não se aprova quando faz algo contra você mesma.
C: Sim, o senhor sabe que isso é tão diferente. Essas coisas de que estamos falando agora, não é
somente saber se queremos ou não fazer alguma coisa. Se quero ou não quero ir trabalhar de manhã, isso é
fácil saber. Mas quando me vejo fazendo algo com que não me sinto à vontade, digo automaticamente: "Se
você está pouco à vontade, é porque não é certo. Algo está errado". Pois é isto. A pergunta que quero lhe
fazer é: como posso saber o que é mais forte? Porque o faço, isso quer dizer que é mais forte? No entanto, se
desaprovo, como é que se pode conciliar as coisas? O senhor sabe, parece que caí numa contradição. Não
estou conseguindo sair dela.
T: Parece que você está sentindo uma contradição em você mesma, também, embora o que eu ouvi você
dizer, em parte, é que você gosta quando se sente realmente à vontade com o que você está fazendo.
C: Sim, e às vezes me sinto assim, quando tomo uma decisão. Isso me parece certo. Isso parece
perfeitamente certo - sem conflitos - mas em outras ocasiões, faço coisas com as quais não me sinto à vontade.
Aí há um conflito. O que estou querendo dizer é, como posso realmente saber quando estou seguindo meus
verdadeiros sentimentos, se depois me sinto culpada ou em conflito?
T: Compreendo. Porque no momento, parecem ser seus verdadeiros sentimentos.
C: Sim. Quando estou começando a fazê-lo. Certo...
T: Mas o que há é que... se você se sente à vontade naquele momento e depois absolutamente não se
sente à vontade, que rumo você deveria ter seguido.
C: O senhor sabe, o que é mais surpreendente - não sei se está acompanhando, o que estou dizendo
sobre esse conflito - o que sei é que queria, por exemplo, deixar meu marido há alguns anos. Nunca o fiz.
Continuei a pensar , como seria bom se o fizesse, ou como seria assustador, mas nunca o fiz. E, de repente,
quando o deixei, senti que estava certa. Não me senti má com relação a ele. Eu simplesmente soube que era
assim que tinha de agir. É assim que sei que estou seguindo a mim mesma. Estou seguindo completamente
meus sentimentos. Aí não tenho conflitos. Já me aconteceram umas coisas tristes com isso, mas não tive
conflitos; acontece quando estou seguindo o curso de meus sentimentos. E, na vida cotidiana, as pequenas
decisões, as pequenas coisas que devem ser feitas, não são resolvidas com essa clareza, de maneira
nenhuma. Acompanham-nas tantos conflitos! Isso é natural?
T: Embora você esteja dizendo - eu espero que seja - mas você está dizendo também que conhece
perfeitamente o sentimento que está dentro de você e que ocorre quando está fazendo algo que para você é
certo.
C: Conheço mesmo. Conheço e sinto falta desses sentimentos em outras ocasiões. São uma pista para
mim.
T: Você pode realmente ouvir a si mesma, às vezes, e perceber: "Oh! não é assim que deveria sentir-me,
se estivesse fazendo o que realmente queria fazer".
C: E, no entanto, muitas vezes, eu vou em frente e faço o que não deveria, e digo: "Oh! Bem, estou outra
vez nessa situação, da próxima vez vou me lembrar." Mencionei essa palavra muitas vezes na terapia e muitos
terapeutas riram de mim, sorriram complacentemente ou tiveram qualquer outra reação. Quando eu dizia
"utopia", mas quando realmente sigo um sentimento e sinto essa sensação boa dentro de mim, isso é uma
espécie de utopia. É isso que quero dizer. É assim que gosto de sentir-me, quer seja uma coisa ruim ou boa.
Mas sinto que estou certa.
T: Sinto que, nesses momentos utópicos, você se sente uma pessoa realmente completa. Você se sente
inteira.
C: Sim, fico emocionada quando o senhor diz isso, porque não me sinto dessa maneira com tanta
freqüência como gostaria. Gosto desse sentimento de plenitude. É um momento precioso para mim.
T: Acho que ninguém tem esses momentos tão freqüentemente quanto gostaria, mas realmente
compreendo isso. (Pausa. Lágrimas surgem nos olhos da cliente). Isso realmente a emociona, não é verdade?
C: Sim, e o senhor quer saber o que estava pensando agora? Eu - uma pessoa insignificante - agora de
repente, estava conversando com o senhor, pensei, puxa, como posso conversar tão bem com o senhor,
gostaria que o senhor me aprovasse e eu o respeito, mas é que sinto falta, meu pai nunca me falou como o
senhor está me falando". Quero dizer, eu gostaria de dizer: "Puxa, gostaria de ter o senhor como pai". Nem sei
por que cheguei a pensar nisso.
T: Você até me parece filha minha, muito amável. Mas você lamenta realmente é não ter conseguido ser
franca com seu próprio pai.
C: Sim. Eu não podia ser franca, mas a culpa foi só dele. Penso que sou mais sincera do que ele me
permitiu ser. Ele nunca iria se dispor a me ouvir, como o senhor o fez, sem me desaprovar ou me diminuir.
Pensava nisso, outro dia. Por que sempre tenho de ser tão perfeita? Eu sei porque. Ele sempre quis que eu
fosse perfeita. Eu tinha sempre de ser a melhor... sim, eu sinto falta disso.
T: Você deu tudo de si para ser a menina que ele queria que você fosse.
C: Embora, ao mesmo tempo, eu me rebelasse.
7

T: É isso mesmo.
C: Quase escrevi-lhe uma carta, outro dia, contando-lhe que sou garçonete; acho que ele desaprova isso.
Saio à noite, e fiquei com vontade de feri-lo, dizendo: "E agora, você gosta de mim?" E, contudo, eu realmente
quero que ele me aceite e me ame. Quero dizer, eu sei que ele me ama.
T: Portanto, você o agride, dizendo: "É assim que eu sou, veja."
C: Sim. "Você me criou, que é que acha?" Mas, quer saber o que eu queria que ele dissesse? "Eu sempre
soube que você era assim, querida, e realmente a amo."
T: Você realmente sente que há muito pouca chance dele dizer isso a você.
C: Não, ele não dirá. Ele nem ouve. (Com voz triste e resignada.) Voltei à casa dele há dois anos,
realmente desejando fazê-lo compreender que o amava, embora tivesse medo dele. Ele não me ouviu. Ele
somente continua a dizer coisas como: "Querida, você sabe que eu a amo. Você sabe que sempre a amei". Ele
não ouve. (Seus olhos se umedecem).
T: Ele jamais a conheceu realmente ou a amou, e isso, de alguma forma, está causando essas lágrimas em
seus olhos.
C: Eu não sei o que é. O senhor sabe, quando falo sobre esse assunto, ele parece irreverente. Se eu fico
sentada pensando nisso por um minuto, sinto como se tivesse uma grande ferida dentro de mim.
T: É muito mais fácil ser um pouco irreverente, assim você não sente essa dor por dentro.
C: É claro, é uma situação sem esperança. Tentei superá-la e sinto que é algo que tenho de aceitar. Meu
pai não é o tipo de homem que eu gostaria de amar. Eu gostaria de alguém mais compreensivo e atencioso.
Ele é atencioso, mas não de um jeito que possamos cooperar - nos comunicar.
T: Você sente isso: "Eu sou permanentemente lograda."
C: É por isso que gosto de substitutos. Como gosto de conversar com o senhor e como gosto de homens
que posso respeitar... médicos... e não posso deixar de sentir que somos realmente íntimos, o senhor
compreende, uma espécie de pai substituto.
T: Eu não acho que seja fingimento.
C: Bem, o senhor, na realidade, não é meu pai.
T: Não, eu queria me referir ao fato de sentirmo-nos íntimos.
C: Bem, penso que é um fingimento porque não posso esperar que o senhor se sinta íntimo meu. O senhor
não me conhece tão bem assim.
T: Tudo o que sei é o que estou sentindo, e sinto-me muito próximo de você, neste momento.

(O filme terminou neste momento, e a entrevista, pouco tempo depois).

Resumo de Carl Rogers

Apesar de sentir inicialmente a artificialidade da situação, e particularmente as luzes quentes, rapidamente


fui me desligando da situação externa... e acredito que Glória também.
De certa forma fiquei contente por ela persistir em me pedir uma resposta às suas perguntas tão pessoais:
sobre sua vida sexual e seu relacionamento com a filha. Digo que estou contente com isso porque à medida
que o relacionamento se desenvolvia, começou a se tornar claro tanto para ela quanto para mim, que ela estava
procurando algo mais profundo do que aquilo. Gostaria de expressar o meu reconhecimento pela sua profunda
honestidade e vontade de falar sobre si mesma tão abertamente.
Apesar de cada indivíduo ser completamente único e neste sentido eu estava despreparado e às vezes
surpreso pelo material que ela apresentava, por outro lado isto é bem típico em minhas experiências em terapia.
Quando realmente sou capaz de penetrar em um relacionamento, e creio que foi isso que realmente
aconteceu neste caso, então não só acho que me movo cada vez mais e fico mais em contato com o
mundo interno do meu cliente, como me vejo, trazendo de dentro de minhas próprias experiências,
afirmações que parecem não ter nenhuma conexão com o que está acontecendo, mas que geralmente
provam ser ou ter uma relação significativa com o que o cliente está vivenciando. Percebi que isto
ocorreu uma ou duas vezes nesta breve entrevista.
Eu estava genuinamente envolvido e provavelmente demonstrei isto, visto que ao final do contato ela disse
que via em mim o pai que ela gostaria de ter. Minha resposta também foi bastante espontânea, visto que ela me
pareceu ser uma filha bastante boa. Acredito que estaríamos apenas brincando com o mundo real dos
relacionamentos se falássemos de uma experiência destas em termos de transferência e contra-
transferência. Sinto-me um tanto quanto incomodado em relação a isto, quero dizer, podemos até colocar esta
experiência em uma moldura intelectual, mas quando fazemos isso, ela perde completamente o ponto da
qualidade imediata de liberação que existe naquele exato momento. Senti que Glória e eu realmente
encontramos um ao outro, de uma forma breve, mas creio eu, duradoura, nos enriquecemos com a
experiência.
Estou dizendo estas coisas quase que imediatamente após a conclusão da entrevista e como é
característico em mim não existe mais de uma ou duas afirmações ou episódios que eu relembre da entrevista.
Eu simplesmente sei que estava bastante presente no relacionamento e que eu vivi a experiência no momento
em que ela estava acontecendo. Descubro depois de algum tempo que volto a me lembrar da experiência, mas,
no momento, tenho recordações, não específicas, da entrevista como um todo.
Tentarei agora olhar para a entrevista de um modo mais intelectual, em vez de partir de um ponto de
vista muito particular.
Glória mostrou o que venho percebendo como elementos característicos de um movimento terapêutico. Na
primeira parte da entrevista ela estava falando sobre seus sentimentos, e eles eram sentimentos no passado.
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Ela estava falando de aspectos de seu comportamento e de si própria como se ela não os possuísse. Ela
estava se olhando de fora de si mesma, por um certo modo de avaliação, com um certo tom de
autoridade. Ela via algumas das coisas que falava em padrões preto e branco. Já no final da entrevista, ela
estava experienciando seus sentimentos no momento imediato. Isto foi evidenciado não só por suas
lágrimas, mas também por sua habilidade ao expressar, diretamente a mim, e com evidência, os seus
sentimentos. Ela também estava muito mais consciente de sua capacidade de fazer seus próprios
julgamentos e escolhas.
Acredito que, usando um lugar comum, podemos dizer que ela passou de um "ali, outrora" de sua vida,
para um "aqui, agora" dos elementos que ela estava descobrindo em si mesma e nos sentimentos que ela
estava experienciando no momento do relacionamento comigo.
No geral, eu me sinto bem em relação à entrevista, creio que me sinto bem quanto ao meu trabalho na
entrevista.
E como Glória, sinto pesar pelo fato do relacionamento não poder continuar.

Terapia Centrada no Cliente - Carl R. Rogers


parte 01
Dr. Carl Rogers fundador da Terapia Centrada no Cliente

Fim da parte 01.

Tradução:
Psicóloga Gislaine Fátima Maia Coppe
Revisão Técnica:
Psicólogos Antonio Angelo Favaro Coppe
e Escípio da Cunha Lobo

Nota: Esta entrevista foi filmada em 1964, quando Glória tinha 30 anos.

Um dado curioso que indica que a entrevista foi mais do que simples palavras, é que Glória manteve alguns
contatos com Rogers (por correspondência) por 08 anos.

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