Sociedade Disciplinar
Sociedade Disciplinar
Sociedade Disciplinar
Mudanas sociais ocorridas no sc. XVIII e XIX levaram a alteraes do jogo do poder, que foi sendo gradativamente substitudo pelo que Foucault denomina de sociedades disciplinares, as quais atingiram o seu apogeu no sc. XX. A passagem de uma forma de dominao a outra ocorreu quando a economia do poder percebeu ser mais eficaz e rentvel vigiar do que punir.
Coube s sociedades disciplinares organizar os grandes meios de confinamento, os quais tinham como objectivo concentrar e compor, no tempo e no espao, uma forma de produo cujo efeito deveria ser superior soma das partes. O indivduo no cessava de passar de um espao fechado ao outro: famlia, escola, fabrica, universidade e eventualmente priso ou hospital. A existncia de mecanismos disciplinares anterior ao perodo que Foucault denominou como sociedade disciplinar, mas antes existiam de forma isolada, fragmentada. O padro de visibilidade das sociedades disciplinares projectou-se no interior dos prdios das instituies, que passaram a ser construdos para permitir o controle interno. Foucault afirma que as instituies no tm essncia ou inferioridade, nem so fontes de poder. So mecanismos operatrios prticos que fixam relaes. Tm necessariamente dois plos: aparelhos e regras. O plo negativo compreende a tctica do poder em sujeitar e reprimir. O plo positivo consiste em produzir, mobilizar tipos de foras que constituem o poder, provocando um corpo - a - corpo. Quanto mais poder conseguir produzir, mais dever sujeitar e administrar. Nesse confronto retira-se um efeito til, uma notvel soluo, diria Foucault: o aparecimento da disciplina. A disciplina dissocia o poder desse corpo - a - corpo e reduz o perigo da inverso de um equvoco dessa polarizao. Ao estudar o nascimento da priso, Foucault observa que passou por trs fases: primeiramente, nas sociedades soberanas, no sc.XVII, existe paralelamente a outras
administraes de punio, como o manicmio e o asilo. Com a queda da soberania, a lei e o poder adquirem uma forma regular de administrao, isto , a sua transmisso e continuidade ganham nova forma, quando acontece a estatizao da justia penal. Como Foucault observa a priso no ento uma pena e direito, no fez parte do sistema penal dos sculos XVII e XVIII. Os legistas so perfeitamente claros a este respeito. Estes afirmam que, quando a lei pune algum, a punio ser a condenao morte, a ser queimado, a ser esquartejado, a ser marcado, a ser banido, a pagar uma multa, etc. a priso no uma punio. Quando o indivduo perde o processo e declarado culpado, deve uma reparao sua vtima, isto , exige-se do culpado a reparao da ofensa que cometeu contra o soberano, a lei e o poder monrquico. Assim que aparecem os mecanismos da multa, da condenao morte, do esquartejamento, do banimento etc. O segundo momento de consolidao da priso ocorre no final do sc. XVIII e inicio do sc.XIX. caracterizada pela reforma e reorganizao do sistema judicirio e penal nos diferentes pases da Europa e do mundo. Nesse momento, ao contrario do perodo anterior, a priso passa a difundir-se em todas as direces, por se efectuarem em alto grau as exigncias do diagrama da disciplina, vencida, obviamente a m reproduo que vinha do seu papel precedente. Foucault denomina esse perodo de sociedade disciplinar, pois traz como caractersticas essenciais a distribuio dos indivduos em espaos individualizados, classificatrios, combinatrios, isolados, hierarquizados, capazes de desempenhar funes diferentes segundo o objectivo especifico que deles exige. Estabelece uma sujeio do individuo ao tempo, com o objectivo de produzir com o mximo de rapidez e eficcia. A vigilncia tambm se expressa como um dos seus instrumentos de controle, de maneira contnua, perpetua e permanente.
No mbito do direito penal, passa-se a enunciar os crimes e os castigos que preconizam o controle e a reforma psicolgica e moral das atitudes e do comportamento dos indivduos, diferente daquela prevista no sc. XVIII, que visava to somente a defesa da sociedade. Ressalta Foucault que a priso, nesse momento remete a palavras e conceitos completamente diferentes, como a delinquncia e o delinquente, que exprimem uma nova maneira de enunciar as infraces, as penas e os sujeitos. A terceira fase consiste na reforma penitenciria, pois destitui a priso da sua exemplaridade, fazendo-a voltar ao estado de agenciamento localizado, restrito e separado. As tcnicas disciplinares sero substitudas pelo modelo tcnico de cura e normalizao. Funcionar como teraputica da rectificao do individuo, e a sentena judicial ser inscrita entre os discursos do saber, implicando num baixo grau de exigncias do diagrama da disciplina. Nesse estudo topolgico de interrogar as formaes histricas, Foucault descobriu uma engenharia que atravessa quase meio sculo, praticamente despercebida, enquanto estratgias ou tctica de poder. Aparece contudo, como uma mecnica de observao individual, classificatria e modificadora do comportamento, uma arquitectura formulada para o espao da priso, ou para outras administraes, tais como: a fabrica, a escola, o manicmio. Essa maquinaria era o Panptico. O Panptico a utopia de uma sociedade e de um tipo de poder que , no fundo, a sociedade que actualmente conhecemos utopia que efectivamente se realizou. Este tipo de poder pode perfeitamente receber o nome de panoptismo. Vivemos numa sociedade onde reina o panoptismo.
Com o Panptico vai-se produzir algo totalmente diferente. No h mais inqurito, e sim vigilncia e exame. O Panptico teve uma trplice funo a vigilncia, o controle e a correco. Segundo Foucault (1990), o poder uma prtica social e, por isso mesmo, constitudo historicamente e articula-se com a estrutura econmica. O que Foucault chamou microfsica do poder significa tanto um deslocamento do espao de anlise quanto ao nvel que este se efectua. De acordo com a sua categorizao, as sociedades e os seus respectivos regimes de visibilidade podem ser divididos em: sociedades de soberania, onde o rei ou senhor exercia o poder, por meio de uma vigilncia externa e geral; sociedade disciplinar, na qual as instituies so um dos maiores dispositivos de visibilidade, principalmente com relao ao funcionamento dos operrios institucionais; e sociedade de controle, veio substituir a sociedade disciplinar, na qual ocorre a implementao progressiva e dispersa de um novo regime de dominao, ou seja, o exerccio do poder distancia. Actualmente, encontramo-nos numa crise generalizada de todos os meios de confinamento da sociedade disciplinar e assistimos instalao de uma sociedade que controla distncia. Desse modo, a crise das instituies modernas representa a implantao progressiva e dispersa de um novo regime de dominao. A lgica da sociedade disciplinar analgico, ou seja, descontinua e diferenciada em cada confinamento, enquanto a da sociedade de controle numrica e constante.
Sociedade de Controle
A passagem da modernidade para a contemporaneidade ocasionou a mudana de um modelo de sociedade. De uma sociedade vista por Foucault como Disciplinar, para um modelo de sociedade identificada por Gilles Deleuze (1992) como de controle. Hoje, ns encontramo-nos num momento de transio entre um modelo e
outro. Estamos a sair de uma forma de encarceramento completo para uma espcie de controle aberto e contnuo. A chamada sociedade de controle um passo frente da sociedade disciplinar. No que esta tenha deixado de existir, mas foi expandida para o campo social de produo. Segundo Foucault, a disciplina interiorizada. Esta exercida fundamentalmente por trs meios globais absolutos: o medo, o julgamento e a destruio. Logo, com o colapso das antigas instituies imperialistas, os dispositivos disciplinares tornaram-se menos limitados. As instituies sociais modernas produzem indivduos sociais muito mais moveis e flexveis que antes. Essa transio para a sociedade de controle envolve uma subjectividade que no est fixada na individualidade. O indivduo no pertence a nenhuma identidade e pertence a todas. Mesmo fora do seu local de trabalho, continua a ser intensamente governado pela lgica disciplinar. A forma cclica e o recomeo contnuo das sociedades disciplinares modernas do lugar modulao das sociedades de controle contemporneas nas quais nunca se termina nada mas exige-se do homem uma formao permanente. Enquanto a sociedade disciplinar se constitui de poderes transversais que se dissimulam atravs das instituies modernas e de estratgias de disciplina e confinamento, a sociedade de controle caracterizada pela invisibilidade e pelo nomandismo que se expande junto s redes de informao. Se nas sociedades disciplinares o modelo Panptico dominante, implica o observador estar de corpo presente e em tempo real a observar-nos e a vigiar-nos. Nas sociedades de controle esta vigilncia torna-se rarefeita e virtual. As sociedades disciplinares so essencialmente arquitecturais: a casa da famlia, o prdio da escola, o edifcio do quartel, o edifcio da fbrica. Por sua vez, as sociedades de controle apontam
uma espcie de anti-arquitectura. A ausncia da casa, do prdio, do edifcio fruto de um processo em que se caminha para um mundo virtual. importante perceber que na sociedade de controle, o aspecto disciplinar no desaparece, apenas muda a actuao das instituies. Os dispositivos de poder que ficam circunscritos aos espaos fechados dessas instituies passam a adquirir total fluidez, o que lhes permite actuar em todas as esferas sociais. Entre os princpios norteadores desta dinmica, destaca-se a abolio do confinamento enquanto tcnica principal. As tcnicas disciplinares originadas a partir do sc. XVIII destinavam-se a garantir que os indivduos por meio dos seus corpos fossem submetidos a um conjunto de dispositivos de poder e de saber, baseados na vigilncia permanente, na normalizao dos seus comportamentos e na exposio a exames. Como forma de se produzir verdades sobre eles mesmos, essas prticas tinham como objectivo a extraco mxima das potencialidades e, portanto, as instituies como escolas, fbricas, hospitais entre outros cumpriam um papel fundamental na implementao desses mecanismos, com o objectivo de tornar os indivduos dceis. neste sentido que a noo de confinamento, amplamente utilizada a partir do sc. XVIII, norteadora do funcionamento desses estabelecimentos, deixou de ser a estratgia principal do exerccio do poder. O controle ao contrrio, ultrapassa a fronteira entre o pblico e o privado. Aqui, reside um dos aspectos fundamentais na construo da passagem da sociedade disciplinar para a de controle: h um processo de instaurao da lgica do confinamento, em toda a sociedade, sem que seja necessria a existncia de muros que separem o lado de dentro das instituies do seu exterior. H uma vigilncia contnua, concretizada pela propagao das cmaras espalhadas por toda a parte: no comercio, bancos, escolas e at mesmo nas ruas. Isto traz a dimenso da sociedade auto-vigiada, idealizada porJeremy Bentham,
cujo Panptico expressa a sua concepo arquitectnica. Uma vigilncia intensificada pela disseminao de dispositivos tecnolgicos de vigilncia presentes at mesmo ao ar livre. Todos podem e querem espiar todos. Trata-se da reinveno do Panptico benthaniano que passa a actuar com o objectivo de transformar, de maneira extensiva e intensiva, os modos de viver, pensar e agir dos indivduos. Se a principal premissa da sociedade disciplinar era fazer com que o indivduo modelasse o seu comportamento. A partir da possibilidade de estar a ser vigiado por algum (inspector), essa perspectiva transmutou-se. O que presenciamos na sociedade de controle que houve uma espcie de incorporao da disciplina. A tal ponto, que os indivduos podem estar sob os efeitos dos dispositivos disciplinares, independente, da presena de algum tipo de autoridade investida de poderes capazes de impor os procedimentos de poder e de saber. A sociedade de controle redimensiona e amplifica os pilares constituintes da sociedade disciplinar. Como argumenta G. Deleuze, a passagem de uma sociedade disciplinar a uma sociedade de controle, tem como estratgia fundamental esvaziar a imagem da sua virtualidade, para a tornar pura informao, parte dos dispositivos de vigilncia e monitorizao. Ao atribuir imagem a potencialidade da informao, deslocamos a abordagem do campo de representao, passando a compreende-la enquanto a prpria expresso dos acontecimentos. No creio que os media tenham muitos recursos ou vocao para captar um acontecimento. Primeiro, eles mostram com frequncia o comeo e o fim, ao passo que um acontecimento, mesmo breve, mesmo instantneo prolonga-se (Deleuze, 1992; Pg:198). Seja na cobertura de uma guerra, seja acompanhando as rotinas exibicionistas dos reality shows, as imagens que nos chegam parecem no se interessar mais pelo acontecimento, mas apenas em reafirmar o seu olhar omnipresente, sob o qual tudo se passa e nada passa despercebido.
Um fenmeno recente que tem chamado a ateno de diversos estudiosos os referidos reality shows. Tais programas expem os seus participantes a situaes limites e do margem a uma srie de anlises. Um bom exemplo disso o Big Brother que surgiu em 1999, na Holanda e foi criado pela produtora Endemol, uma das maiores empresas de entretenimento da Europa. O nome Big Brother foi inspirado no livro 1984 do escritor ingls George Orwell. Neste livro, todos os habitantes de um pas fictcio so vigiados diariamente, por cmaras que funcionam como olhos do governo. O autor alerta para o perigo de estarmos a caminhar para uma sociedade controlada por cmaras. Passados pouco mais de cinquenta anos da publicao do romance de Orwell, o receio do totalismo cedeu lugar seduo, atravs da invaso de cmaras em programas televisivos. Em 2000, o programa Big Brother comeou a ser exportado para outros pases, como Alemanha, Espanha, Estados Unidos da Amrica, Inglaterra, Portugal, Suia, Sucia e Blgica. Desde o incio das sociedades modernas, os meios de comunicao contriburam decisivamente para a construo da subjectividade dos seres humanos. Sempre em sintonia com o surgimento e consolidao das sociedades capitalistas modernas, os meios de comunicao desenvolveram-se de forma espantosa. impossvel pensar o mundo contemporneo, sem levar em conta o papel dos mass media. Um dos traos fundamentais deste mundo contemporneo exactamente o inesgotvel fluxo de imagens e de contedos simblicos, disponibilizados pelos meios de comunicao a um nmero cada vez maior de pessoas, e que de certa maneira, conformam a realidade, as relaes sociais e a subjectividade individual. Uns dos aspectos a serem considerados no Big Brother so os valores implcitos no programa. Pode-se perceber estes valores atravs da sua estrutura e funcionamento,
tais como: confinamento, vigilncia, excluso, fama, dinheiro, esforo, sorte, culto do
heri, salve-se quem puder, negao do sofrimento psico-social, cada um por si e Deus por todos. A vigilncia, a fama e o confinamento so as caractersticas que conferem o carcter indito do programa e ficam em maior evidncia para o telespectador.
Vigilncia A pergunta que se faz , o que ocorreu, para que sassemos do horror da vigilncia, para imergirmos na apoteose voyerista, de contemplar supostamente em tempo integral, um grupo de indivduos exibicionistas confinadas num espao marcado por cmaras e microfones? O controle, na sociedade contempornea, exercido de modo glamourizado pela indstria cultural. Assim substituiu-se a guilhotina e a violncia fsica por tcnicas de controle social formadas dentro das cincias humanas e sociais, pela psicologia, psiquiatria e mais recentemente pelos meios de comunicao de massas. Em vez de usar a fora fsica para fazer os corpos indceis padecerem em razo de no se ajustarem, o que ocorre tornar interna a ideolgica exercida pelos meios de comunicao de massa, que produzem uma certa forma de ser, de viver, de pensar e de sentir. A estratgia actual construir subjectividades, de forma a que estas se enquadrem no modo de vida oferecido pela sociedade, pois de acordo com Foucault, o poder moderno exerce-se na produo e na represso. Hoje, os vigias do Grande Irmo, so todos os indivduos, que auxiliados pela edio dos media ficam extasiados, fascinados diante da televiso, vigiando e controlando atravs dos votos (pois um programa interactivo), os passos dos doze participantes annimos. O que, antes era temido o controle e o vigiar e tambm o que era protegido a privacidade e a intimidade tornam-se objectos de fascnio. Isto
evidencia-se no primeiro imperativo para participar do show de realidade Big Brother - que a imposio da restrio do privado. Oferece-se aos participantes uma casa bem equipada em que se encontram 24 sobre 24 horas sob vigia, para que se tornem famosos, todavia, caso sejam excludos e no ganhem o prmio mximo de cem mil euros, j tiveram a oportunidade de conquistar a fama. Troca-se desta maneira, a privacidade pela fama. A sociedade contempornea descrita por Debord (1994), como a sociedade do espectculo, que substitui o lema Penso logo existo, por um outro ditado: sou visto, logo existo (Quinet, 2002). Ainda segundo este autor, a sociedade dominada pelo olhar, que omnividente sob diversas formas, que vo desde a proliferao dos programas televisivos de voyerismo e exibicionismo explcitos, at difuso epidmica da vigilncia, que multiplicam as cmaras encontradas a cada passo do indivduo. Vivese hoje, numa sociedade escpica que tem como espectculo, a disciplina e controle. O olho que vigia e pune, o mesmo que possibilita a fama. A fama parece ainda ser inseparvel de um outro vnculo: a dor de se ter de separar do privado, da vida rotineira, para se lanar rumo a ser objecto do olhar do outro, desgarrado e desenraizado da sua forma de ser. Esta sociedade escpica impe uma existncia vinculada visibilidade, e consequentemente celebridade, mas por outro lado, amplia cada vez mais a vigilncia e o controle sobre cada indivduo. Quase j no possvel sair de casa sem nos depararmos com os dizeres sorria, voc est a ser filmado. Verdade ou mentira, no importa, pois a frase faz existir um olhar invisvel pousado no indivduo. A instncia desse olhar atribudo ao outro, chamado por Freud de superego, que tem como um dos seus atributos vigiar e punir o indivduo. A sociedade escpica, ao utilizar esta estrutura subjectiva, multiplica os seus dispositivos de vigilncia electrnica e transforma-nos todos em objectos vistos e controlveis. A transparncia, passa assim, a ser um ideal.
Confinamento: Um dos meios utilizados pelos mass media para apresentar o programa Big Brother como um show de realidade, afirmar que o confinamento deve traduzir sentimentos verdadeiros, pois no d para protelar nem para recalcar emoes ou indisposies com os companheiros de cela. Na verdade, o confinamento sob esta perspectiva mantm uma tenso. De um determinado ponto de vista, poderia ser considerado um grande engano, pois como consta nas regras do programa os participantes so vigiados 24 horas por dia. Mas, as pessoas uma vez observadas pela cmara comeam a fazer poses, construindo uma real e prpria encenao (Sodr, 1994, pg.36). A partir desta fase, a real e prpria encenao pode ser entendida como idealizada. Portanto, de outro ponto de vista, o desejo pela fama entendido como a construo da auto imagem pela projeco de uma imagem para os outros (Coelho, 1999), j produz uma amputao da subjectividade trazendo como um dos resultados, o impedimento de accionar instncias psquicas superiores. Assim, o que se mostra, no fingimento ou teatro, pois a subjectividade sem a restrio da lei basta para se conformar as regras impostas pelo programa, e representar a sua identidade ideal, j capturada e vida pela fama. Portanto, a vigilncia j um confinamento que determina uma forma de ser, uma vez que, sob vigilncia, no palco, com os holofotes que potencializam a fama, h a transmutao de um ser pensante para um ser de origem. bom lembrar, que a situao dos participantes dos reality shows, expostos a uma cmara 24 horas por dia, e cientes de que a sua performance vai desembocar na sua excluso ou permanncia, tanto pelos seus parceiros como pelos telespectadores, so os elementos que confirmam a priso do ser.
Uma das propostas do Big Brother a de transformar a privacidade em espectculo. Importa salientar, que o que apresentado na tela, no a privacidade nua e crua de ningum, pois a direco do programa selecciona alguns fragmentos de seu interesse. A partir disto, a intimidade construda com msica de fundo que sublinham ou criam climas, maquinados com lentes inusitadas que transformam o banal em inusitado. A intimidade exposta, limitada no s pelas mudanas de comportamento j produzidas, via mudanas de valores da sociedade espectacular, regida pelos princpios do mercado, pelas regras do programa, como tambm elos recursos dos mass media. O vencedor o que padroniza um modelo de ser na cultura actual. aquele que perde a intimidade e a identidade, aquele que se afasta dos seus e se submete a uma experincia de priso show, julgado e sentenciado a cada comportamento e apresenta maior tolerncia privao. Enfim, aquele que muito perde, e no final referenciado como vitorioso. A visibilidade total a que se submete um cidado hoje em dia pode ser uma armadilha. A nossa sociedade vem criando cada vez mais uma condio de transparncia dos seus participantes e, muitas vezes, estamos reivindicando para sermos modernos, a visibilidade ampliada, como um direito, de alguns que permanecem na obscuridade e margem da histria recente ou num passado considerado longnquo. No entanto, convm lembrar que somos ns os produtores e produtos desta sociedade que crimos. No somos simples marionetas deste jogo de foras, mas coautores no nosso silncio, na naturalidade com que encaramos este estado das coisas.