Artigo Abordagem Policial e Abuso de Autoridade

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Abordagem policial e abuso de autoridade

Valdeonne Dias da SilvaValdeonne Dias da Silva

Publicado em 05/2014. Elaborado em 02/2013.Página 1 de 4»

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ASSUNTOS:BUSCA PESSOAL NO PROCESSO PENALTEORIA GERAL DA
PROVAPODER DE POLÍCIAPRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Além do aspecto da fundada suspeita, que é condição de legalidade estrita do
ato, a prática da busca pessoal necessita se ponderar no parâmetro da
necessidade, adequação e proporcionalidade, conforme as circunstâncias do
caso concreto.

Resumo: O presente trabalho tem como objetivo precípuo fazer uma ampla
análise jurídica sobre a prática da busca pessoal pelos agentes públicos e a
relação desta com o instituto do abuso de autoridade, aspecto limitador da
atuação abusiva do poder estatal. Do mesmo modo, procura esclarecer o que
vem a ser de fato o termo fundada suspeita e quais são os critérios utilizados
para a realização da busca pessoal. Evidencia-se, também, a importância da
abordagem policial como fator preponderante na minimização dos índices da
criminalidade, e consequente melhoria na sensação de segurança e
manutenção da ordem pública ora estabelecida. Identifica a existência de
parâmetros objetivos formadores da convicção de fundada suspeita, como
condição de legalidade do ato, conforme previsão normativa do Art. 244 do
CPP. Expõe as características legais e doutrinárias da lei nº. 4.898, de 09 de
Dezembro de 1965 que trata do tema abuso de autoridade. A formação policial
é evidenciada como condição determinante para a ocorrência do excesso e do
abuso do poder. Neste aspecto, tem-se que a hipótese que se almeja é que a
busca pessoal é legal, desde que alicerçada no seu caráter preventivo, na
previsão legal e em certos elementos que fornecem condição de fundada
suspeita, sendo que os excessos desta intervenção estatal devem ser tolhidos
e minimizados por meio da formação policial de qualidade e do caráter
protetivo contra o abuso de autoridade e de outros elementos jurídicos. Na
elaboração do trabalho foi utilizado o método de argumentação dedutivo, tendo
sido realizadas pesquisas bibliográficas como principal recurso metodológico. A
justificativa para o presente trabalho se deve ao fato de o tema não ser
debatido de forma ampla pela doutrina jurídica e pelos diversos tribunais, bem
como ser de extrema importância para um especialista em ciências criminais.
Ademais, evidencia-se a carência por uma definição mais específica do termo
fundada suspeita, porquanto tornaria impossível elencar todas as situações
concretas que apontem a real necessidade da busca pessoal. Essa discussão
jurídica não se limita somente ao critério da fundada suspeita, sendo
relacionada também a questões referentes aos excessos cometidos pelos
agentes públicos e de sua devida proporcional responsabilização. Por fim,
apesar da celeuma jurídica que envolve o tema, restou provada a hipótese,
podendo-se afirmar que mesmo se tratando de um termo genérico e que
conduz à subjetividade, os agentes policiais podem utilizar de alguns critérios
de índole objetiva para se formar a convicção de fundada suspeita, como
condição legitimadora da busca pessoal, sendo, porém, a intervenção policial
limitada e disciplinada pela amplitude do termo abuso de autoridade.

PALAVRAS-CHAVE: ABORDAGEM POLICIAL; ABUSO DE AUTORIDADE;


BUSCA PESSOAL; FUNDADA SUSPEITA; LIMITAÇÃO ESTATAL;
FORMAÇÃO POLICIAL.

Sumário: 1. INTRODUÇÃO. 2. A ABORDAGEM POLICIAL NO


ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO. 2.1. Abordagem policial e busca
pessoal..2.2. Da busca pessoal....2.2.1. Policiamento preventivo e ordem
pública.2.2.2. Da fundada suspeita..2.3. Da busca domiciliar...2.4. Princípios da
abordagem policial..2.5. Uso de algemas...3. ABUSO DE AUTORIDADE E
CRIMES CORRELATOS.3.1. A lei de abuso de autoridade – lei nº.
4898/65..3.2.. A relação do crime de abuso de autoridade com o direito
administrativo.3.3.. Abuso de autoridade e atuação policial..3.3.1. Crime de
desacato e sua relação com o abuso de autoridade..4. A FORMAÇÃO
PROFISSIONAL NA CARREIRA POLICIAL. 4.1. A cultura do abuso..4.2. Nova
formação profissional...5. CONCLUSÃO... 6. REFERÊNCIAS.

1 – INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem o objetivo de investigar os contornos jurídicos


concernentes à busca pessoal (Art. 244 do Código de Processo Penal), ação
desenvolvida pelo poder estatal através de seus agentes e que visa à
manutenção da ordem pública e da paz social e a sua íntima relação com ilícito
abuso de autoridade.
Será evidenciada como tema central a condição de legalidade da busca
pessoal no que se refere ao aspecto da fundada suspeita, a interferência da
formação policial na prática da abordagem policial e o caráter limitador
desenvolvido pelo instituto do abuso de autoridade.

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Tem-se como objeto de estudo a discussão referente à legalidade e amplitude


da busca pessoal, dado a margem de subjetividade que permeia em tal medida
de ordem processual, suas nuanças e quais os fatores que interferem e
legitimam a sua efetivação. Deste modo, o presente trabalho parte do
questionamento se a prática da busca pessoal é legítima e quais os critérios
utilizados para definir e limitar a sua utilização pelo agente público.

No que se refere à metodologia, foi utilizado o método de argumentação


dedutivo, tendo sido realizadas pesquisas bibliográficas como principal recurso
metodológico, assim como pesquisas bibliográficas doutrinárias, históricas,
jurisprudenciais e pesquisas na internet.

Inicialmente, observa-se que diante das questões sociais, da criminalidade e


das disparidades econômicas, encontra-se o Estado, o gerente social, aquele
que controla, de certa forma, as relações sociais, impondo limites e
estabelecendo sanções aos que agridem as leis e os interesses coletivos.

No intuito de atuar em prol da preservação da ordem pública, o Estado por


meio de seus agentes públicos, mais especificamente da polícia utiliza-se da
prática da abordagem policial, a fim de antecipar a ação delituosa, através da
prévia localização de armas e objetos de crime, e subsequente efetuação da
prisão de infratores que faticamente agrediram o “sistema jurídico” com suas
condutas típicas.
Para que os agentes públicos possam identificar os objetos do delito, se valem
da busca pessoal, quando houver aspecto da fundada suspeita, e assim,
inspecionam o corpo, as vestes e o que tiver sobre a custódia do suspeito,
tendo como parâmetro o seu caráter preventivo.

Nota-se que para grande parte da doutrina a busca pessoal somente terá
caráter legal no caso de prisão ou se houver a caracterização da fundada
suspeita, a qual se refere a uma provável condição de que alguém esteja
ocultando consigo algum objeto ilícito ou que esteja no desenvolver de uma
ação criminosa.

Essa medida intervencionista é caracterizada pela discricionariedade do


policial, que de fato não necessita estar imbuído do mandado judicial para
realizar a busca pessoal. No entanto, deve fundamentá-la na condição de
fundada suspeita, prevista no Art. 244 do CPP, na qual a pessoa a ser
abordada necessita encontrar-se em circunstâncias de suspeição de que esteja
na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de
delito.

Neste enfoque, encontra-se a grande discussão do tema, pois não há uma


definição técnica ou jurídica para qualificar de fato o que vem a ser a fundada
suspeita, fornecendo, assim, condições para que ocorram juízos de
subjetividade por parte dos policiais em sua atuação prática, provocando uma
fragilidade jurídica no próprio procedimento policial.

Essa falta de normatização sistemática da busca pessoal e do termo fundada


suspeita, adicionada à má formação profissional dos agentes policiais conduz
ao excesso e ao abuso de autoridade.

Os órgãos policiais devem superar a cultura do abuso que ainda está presente
na relação polícia e sociedade, haja vista que é incompatível a prática do
abuso por quem tem o dever constitucional de proteger e defender. Neste
aspecto se evidencia a importância da formação profissional moderna e de
qualidade como condição redutora dos casos de excessos por parte da polícia.

A formação policial no Brasil passa por uma transformação nos métodos e na


estrutura curricular de ensino, dado as interferências do Ministério da Justiça,
entretanto ainda tem muito a evoluir, necessitando ser direcionada para a uma
formação ética social e voltada para o ensino transmissor de um pensamento
humanista e que atenda as novas perspectivas sociais.

Visando limitar a ação estatal e evitar que possíveis danos sejam causados a
coletividade, a lei de abuso de autoridade (Lei nº. 4.898/65) é comumente
utilizada como escudo protetor das garantias fundamentais elencadas na
Constituição Federal.

No caso da busca pessoal por se tratar de uma hipótese de restrição das


garantias individuais, não se pode admitir a prática de abusos por parte das
autoridades públicas, as quais devem ser devidamente responsabilizadas pelos
excessos e desvios de conduta praticados no momento da busca.

A hipótese que se comprovará nesta pesquisa é que a prática da busca


pessoal é legal, desde que alicerçada em certos elementos que fornecem
condição de fundada suspeita, sendo que a sua prática não deve ser abusiva e
nem indiscriminatória, sobpena de incidência de uma das hipóteses previstas
na Lei nº. 4.898/65.

A justificativa para o presente trabalho se deve ao fato de o tema não ser


abordado de forma ampla pela doutrina jurídica ou sequer pelas jurisprudências
dos diversos tribunais. Assim, buscou-se dar uma maior relevância ao assunto,
com vistas a uma melhor percepção sobre a formação policial e a prática da
busca, considerando a sua amplitude e a sua importância no contexto social,
bem como a sua limitação e possíveis responsabilizações.

O trabalho está estruturado em três capítulos em que o primeiro aborda sobre a


abordagem policial no ordenamento jurídico brasileiro, questões relacionadas à
prática da busca pessoal, sua origem e o seu verdadeiro papel social. Busca-se
elucidar o instituto da busca pessoal e as diferenças existentes entre os tipos
de busca no processo penal pátrio, sendo analisado também a legalidade e
limites do uso de algemas.

No segundo capítulo, evidencia-se a responsabilização dos agentes públicos


por possíveis arbitrariedades na execução da busca pessoal, com base na lei
do abuso de autoridade (Lei nº. 4.898/65), sendo vislumbrado o aspecto do
emprego desnecessário e autoritário no ato de bordar que, de fato, viola
abertamente os princípios e direitos fundamentais da pessoa humana,
atingindo, assim, toda a ordem jurídica nacional. Já o terceiro capítulo refere-se
ao aperfeiçoamento da formação policial no Brasil e a cultura do abuso por
parte dos agentes policiais que ainda permeia na relação polícia e sociedade.

Observa-se, deste modo que o presente estudo visa proporcionar uma visão
mais lúcida a respeito da correlação entre a ação policial na defesa da ordem
pública e a amplitude do constrangimento causado pela prática da busca
pessoal no que se refere aos direitos individuais e à dignidade da pessoa
humana. Tema este de extrema importância para um especialista em ciências
criminais.

2 – A ABORDAGEM POLICIAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

A abordagem policial é costumeira e historicamente utilizada pelas instituições


estatais, mais precisamente pelas polícias, como meio intervencionista nas
relações sociais, visando o controle da criminalidade e manutenção da ordem
pública.

Diferentemente a busca pessoal trata-se de um meio de prova concebido no


Código de Processo Penal - CPP, empregado com a finalidade de localizar
possíveis instrumentos, armas proibidas ou objetos que estejam em
discordância com os aspectos legais admitidos nas normas vigentes.

Esse meio de prova empregado pelos órgãos de segurança não pode ser
confundido com o termo abordagem policial, pois este é amplo, abrange ações
diversas por parte da polícia como os inter-relacionamentos assistenciais,
preventivos e repressivos.

A busca pessoal tem por impulso a movimentação da polícia no campo da


prevenção, representa um dos principais instrumentos de trabalho da atividade
policial e pode resultar, não obstante, em encontro de objeto ou informação que
caracterizem a prática de ação delituosa.

A condição peculiar dessa modalidade de busca, haja vista a previsão no CPP


da busca domiciliar, é a vinculação ao aspecto da fundada suspeita, como
condição de legalidade para sua aplicação.

2.1 – ABORDAGEM POLICIAL E BUSCA PESSOAL


No senso comum, abordagem policial pode ser conceituada como o ato de
aproximar-se de uma pessoa que esteja em circunstância suspeita ou não, com
a intenção de averiguar, informar, investigar, orientar, advertir, interagir,
prender, assistir, etc.

Observa-se que a prática da abordagem possui uma conotação genérica,


podendo envolver situações de plena normalidade ou mesmo as que envolvem
alto risco.

A abordagem policial propriamente dita é caracterizada simplesmente pela


presença do policial na relação de abordagem, sendo que este se posiciona de
maneira ativa nessa relação, desenvolvendo-a e direcionando-a de acordo com
o contexto presente.

De forma mais técnica, nota-se que a abordagem policial (gênero) ocorre em


razão da própria condição preventiva da polícia, em especial a Polícia Militar,
órgão de natureza preventiva, que diuturnamente necessita utilizar-se desse
instrumento para alcançar uma maior aproximação com a sociedade, a fim de
averiguar determinadas situações como foco no seu papel preventivo e, em
dados momentos, até mesmo assistir a população.

Diferentemente, a busca pessoal possui uma conotação mais restritiva, sendo


concernente ao ato do policial “vistoriar”, “investigar” e “revistar” o cidadão
suspeito, visando localizar possíveis objetos ou armas que possuem relação
com uma dada atividade ilícita.

Definida como um tipo de prova, a busca pessoal trata-se de uma “ferramenta”


valiosa para que a polícia possa de fato antecipar a ação delituosa, por meio da
prévia localização de armas e objetos, e da subsequente prisão de infratores.

A busca pessoal traduz-se num meio de percepção policial empregado com a


finalidade precípua de comprovar a verdade processual e de obter a prevenção
de delitos, sendo que a doutrina é pacífica no sentido de interpretar
extensivamente esse meio de prova, para autorizar, além da inspeção no corpo
e nas vestes do cidadão abordado, tudo que estiver na esfera de custódia do
mesmo, referindo-se assim, à pessoa propriamente dita, suas vestimentas,
bolsas, demais objetos, e em algumas circunstâncias, até mesmo o veículo que
está sendo conduzido pelo abordado.
A busca pessoal é feita não somente nas vestes ou nos objetos que a pessoa
traga consigo, como também, diretamente no corpo, quer por meio de
investigações oculares ou manuais, quer por meios eletrônicos, radioscópicos,
sabido como é que os ladrões e, particularmente, as ladras preferem esconder
pequenos objetos, pedras preciosas e outros que tais em qualquer esconso
natural. (TOURINHO FILHO, 2008, p. 393)

Ressalta-se que esta percepção extensiva fornecida pela doutrina refere-se


também aos veículos que estiverem na posse do abordado no momento da
busca, quando estes não forem abrangidos pela conceituação doutrinária de
domicílio.

Será realizada quando “houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo
arma proibida” ou outros objetos. É realizada na pessoa (incluindo
bolsas,malas etc.) e em veículos que estejam em sua posse (automóveis,
motocicletas etc). (CAPEZ, 2009, p. 341)

Com tais definições gramaticais chega-se à noção de que a abordagem é a


prática ampla, genérica e que geralmente independe até da ocorrência da
fundada suspeita, podendo está presente até mesmo na mera relação de
convivência entre Polícia e comunidade.

Ao passo que a busca pessoal tem um caráter mais restrito, sendo considerada
uma etapa do gênero abordagem, consistente no ato do policial revistar o
cidadão, suas vestimentas e seu corpo, com o objetivo de encontrar objetos ou
instrumentos de delito, ou seja, possui relação especifica com a prática
processual penal.

Propõe-se, por esse motivo, o uso uniforme da expressão "abordagem policial",


em amplo sentido envolvendo as três ou quatro etapas descritas (ordem de
parada, busca pessoal, identificação e eventual condução) e somente em
estrito sentido como sinônimo de busca pessoal, que corresponde exatamente
ao núcleo do procedimento, a parte mais relevante da intervenção policial.
Essa postura interpretativa se harmoniza com a análise legal da ação, levando
em conta a previsão do instituto no ordenamento jurídico – nomeado busca
pessoal. (NASSARO A, online)
Fica nítida a diferenciação terminológica entre ambos “institutos policiais”, os
quais costumeiramente são utilizados, principalmente, pela polícia preventiva e
ostensiva, a Polícia Militar.

2.2– DA BUSCA PESSOAL

A busca pessoal, dependendo do momento na qual é realizada, bem como a


sua finalidade, possuirá caráter eminentemente preventivo ou, em
determinados casos, processual. Consoante pensamento de Nucci (2011, p.
511): “Busca significa o movimento desencadeado pelos agentes do Estado
para a investigação, descoberta e pesquisa de algo interessante para o
processo penal, realizando-se em pessoas ou lugares”.

Assim, se a mesma for realizada antes da efetiva constatação da prática


delituosa, é procedida por iniciativa do agente policial competente e constitui
ato legitimado pelo exercício do Poder de Polícia, com base em critérios de
fundada suspeita, independentemente de mandado judicial, conforme previsão
normativa do Art. 244, CPP:

Art. 244. A busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou


quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma
proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou quando a
medida for determinada no curso de busca domiciliar.

Se realizada logo após a prática delituosa, ainda que na sequência da busca


preventiva, intenta atender aos interesses processuais, visando à obtenção de
objetos necessários ou relevantes a prova da infração, ou a defesa do réu,
consonante ao Art. 240, §2°, CPP:

Art. 240. A busca será domiciliar ou pessoal.

...

b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;

...
f) apreender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu poder,
quando haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à
elucidação do fato;

...

h) colher qualquer elemento de convicção.

§ 2º Proceder-se-á à busca pessoal quando houver fundada suspeita de que


alguém oculte consigo arma proibida ou objetos mencionados nas letras b a f e
letra h do parágrafo anterior.

Observa-se que a questão da fundada suspeita está diretamente ligada a


busca de caráter preventivo, ao passo que a execução da busca num momento
logo posterior ao fato delitivo tem como escopo a finalística processual no
aspecto da obtenção de provas e objetos necessários à elucidação do crime.

Distinguem-se, assim, duas espécies de busca pessoal: a processual e a


preventiva, de acordo com o momento em que é realizada, bem como de
acordo com a sua finalidade. Antes da efetiva constatação da prática delituosa,
ela é procedida por iniciativa de autoridade policial e constitui ato legitimado
pelo exercício do poder de polícia, na esfera de atuação da Administração
Pública, com finalidade preventiva. Realizada após a prática, ou em seguida à
constatação da prática criminosa, ainda que em seqüência de busca
preventiva, tenciona atender ao interesse processual, para a obtenção de
objetos necessários ou relevantes à prova de infração, ou à defesa do réu.
(NASSARO B, online)

De qualquer modo, a efetivação da busca pessoal é um “processo” que


demanda do policial um domínio amplo das técnicas policias, tendo em vista o
seu caráter situacional, ou seja, cada abordagem policial tem seus próprios
detalhes e peculiaridades e que exigem uma postura eficiente e especifica do
policial em sua ocorrência.

Diante do aumento da violência, as autoridades estatais, em incessante vigília


e diligência para coibir o uso ilegal de armas, narcóticos e outros objetos de
delito, valem-se do instituto da busca pessoal para prevenir a prática do crime e
zelar pela manutenção da ordem pública.
É necessário ressaltar que a efetivação da busca pessoal está associada à
questão da convivência social propriamente dita e a necessidade de controle
social, deste modo, necessária a sua utilização no decorrer das diversas
sociedades existentes e não simplesmente faculdade das sociedades
modernas e contemporâneas.

O primeiro relato da realização de uma legítima busca pessoal durante uma


abordagem policial, encontra-se no Livro do Gênesis, parte III, "A História de
José", da Bíblia Sagrada. José, que ocupava um dos mais altos postos da
hierarquia do Egito e ainda não havia revelado sua identidade aos irmãos que
vieram buscar trigo, determinou ao oficial intendente que no deslocamento da
volta procedesse à busca em seus irmãos, particularmente nos seus sacos de
viagem. José sabia que seria encontrada no saco de viagem transportado por
Benjamim - o mais novo - uma taça de prata, pois a havia ali ocultado, a fim de
observar as reações dos irmãos depois que o valioso objeto fosse descoberto
durante a busca. Ao serem abordados, os irmãos negaram a prática de furto e
não ofereceram resistência à revista. O intendente, então, lhes proferiu
algumas palavras e procedeu à busca, conforme segue: ‘Seja como dissestes!
Aquele com quem for encontrada a taça será meu escravo. Vós outros sereis
livres’. E, imediatamente, pôs cada um o seu saco por terra e o abriu. O
intendente revistou-os começando pelo mais velho e acabando pelo mais novo;
e a taça foi encontrada no saco de Benjamim" (Livro do Gênesis, parte III,
Capítulo 44, versículos 10-12). (NASSARO A, online)

O Código de Processo Penal brasileiro - CPP, Decreto-lei nº 3.689, 03 de


outubro de 1941, estabelece duas modalidades de busca no seu art. 240: a
busca domiciliar e a pessoal.

Assim, por tratar-se de ação estatal que inevitavelmente impõe restrição de


direitos individuais em qualquer das duas espécies citadas, somente deve ser
concretizada em situação de razoável equilíbrio entre o interesse da ordem
pública e os direitos e garantias individuais, ambos de fundamento
constitucional.

Diversamente da busca pessoal, a domiciliar possui uma conotação mais


restrita, sendo direcionada por critérios tipicamente objetivos, definidos
criteriosamente pela Constituição Federal de 1988, no seu Capítulo I, que trata
dos direitos e deveres individuas e coletivos, Art. 5º, Inc. XI:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:

XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem


consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou
para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.

Conforme previsão normativa fica nítida a percepção sobre quais são os


critérios legais autorizadores para a realização da busca domiciliar, podendo
assim, ocorrer o seu cumprimento, somente na ocorrência de cinco hipóteses
legais, as quais estão taxativamente previstas na Constituição Federal de 1988.

No entanto, deve-se ressaltar que para a ocorrência de uma determinada


busca domiciliar não é necessário que exista as cinco hipóteses
conjuntamente, sendo que, a ocorrência de apenas uma desta, de acordo com
a doutrina, já autoriza a execução da busca domiciliar.

a) com o consentimento do morador (a qualquer hora do dia ou da noite); b) em


caso de flagrante delito (com ou sem o consentimento do morador e a qualquer
hora do dia ou da noite); c) em caso de desastre (com ou sem o consentimento
do morador e a qualquer hora do dia ou da noite); d) para prestar socorro (com
ou sem consentimento do morador e a qualquer hora do dia ou da noite); e)
durante o dia (fora das hipóteses acima), por determinação judicial. (RANGEL,
2010, p. 157)

Já para a fundamentação legal da busca pessoal, além de ter que ser realizada
com base no parâmetro de fundada suspeita, impõe-se por parte do policial, a
observação acerca das garantias individuais de prescrição genérica, as quais
estão estabelecidas na Constituição Federal, a saber, o respeito à intimidade, à
vida privada e à integridade física e moral do indivíduo, e principalmente o não
constrangimento ou ato atentório ao direito fundamental da dignidade da
pessoal humana.

Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos


fundamentais, o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma
densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-
constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo
reduzir-se o sentido da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais
tradicionais, esquecendo-a nos casos de direitos sociais, ou invocá-la para
construir teoria do núcleo da personalidade individual, ignorando-a quando se
trate de garantir as bases da existência humana. (SILVA A, 2006, p. 105)

O princípio da dignidade da pessoa humana trata-se de princípio supremo,


originário na própria condição de ser humano e, por isso, deve ser preservado
pelo ordenamento jurídico, bem como pelas instituições de segurança pública.

A dignidade da pessoa humana não pode ser limitada pelo uso da busca
pessoal, mas sim, necessita ser garantida e protegida por esta, através da
ação proporcional e razoável por parte da polícia.

O Código de Processo Penal, Art. 249, refere-se a uma modalidade de busca


pessoal mais específica, aquela realizada nas mulheres. Neste enfoque, o CPP
busca proteger a intimidade da mulher, buscando evitar o máximo que o policial
masculino efetue a busca em uma determinada mulher, sendo que tal
circunstância poderá ocorrer somente em situações extremas, onde não há
outra hipótese por parte da polícia: “A busca em mulher será feita por outra
mulher, se não importar retardamento ou prejuízo da diligência”.

Com base na previsão normativa supracitada, significa que um policial


masculino pode, em situação extrema, realizar a busca pessoal numa mulher,
havendo fundada suspeita, caso não haja outra alternativa legal, e quando a
não intervenção policial importar retardamento ou prejuízo a diligência policial,
nesta hipótese a mesma deve ser efetuada.

Apesar dessa possibilidade jurídica, a busca realizada por policial do sexo


masculino necessita ser evitado ao máximo, pois tal situação gera possíveis
interpretações negativas quanto à atuação do policial masculino que
faticamente entrará em contato com o corpo feminino no momento busca, pois
para a sua concretização há a necessidade iminente do contato corpóreo.

Verifica-se que sempre que possível, a busca em mulheres deve ser realizada
por uma policial feminina. Entretanto, para não retardar ou prejudicar a
diligência, o policial masculino pode executar a mesma, com o devido respeito
e discrição, preferencialmente em lugar reservado, de maneira a não expor a
pessoa que está sendo abordada.
Em relação à busca veicular, aquela realizada no veículo do cidadão que está
sendo alvo de uma determinada abordagem policial, deve-se inicialmente
verificar o requisito da fundada suspeita, a qual se refere tanto a busca pessoal
quanto a veicular, haja vista que esta se trata de uma extensão da prática da
busca pessoal.

No entanto, necessário se faz a análise do conceito de casa e de domicílio,


pois se caso o conceito de domicílio se enquadre na condição do veículo que
está sendo abordado, estará presente a inviolabilidade do domicílio e, assim
não há que se falar em fundada suspeita e em busca pessoal, devendo, deste
modo, atender os requisitos da busca domiciliar.

Para a doutrina, o caráter abrangente do conceito jurídico do termo “casa”


estende-se tanto aos espaços habitados privativamente por qualquer pessoa,
como por exemplo, o caso do trailer ou da boléia do caminhão, quanto àqueles
em que o indivíduo exerce, com exclusão de terceiros, qualquer atividade de
índole profissional.

No que se refere à busca e apreensão, importante a distinção entre ambos os


conceitos, haja vista a sequência de ações que existe na aplicação desses
institutos, onde a apreensão trata-se do ato posterior a prática da busca.

A busca é o primeiro ato e a apreensão é o segundo. Primeiro se procura e


depois se apreende a coisa ou a pessoa. A busca e apreensão são meio de
prova destinadas a evitar o perecimento. Também é medida cautelar. Pode ser
realizada anteriormente a qualquer procedimento policial, durante a fase
inquisitiva, processual e até na fase de execução. (ISHIDA, 2010, p. 155)

O termo busca está relacionado à procura, a pesquisa de uma coisa ou de uma


pessoa, ao passo que a apreensão é o ato ou efeito de apreender para
posterior incremento processual.

Apesar de parte da doutrina posicionar a busca pessoal como meio de prova


no processo penal brasileiro, a mesma também pode ser vislumbrada como
uma espécie de medida cautelar, assim como a apreensão. Não obstante,
ressalta-se que pode ocorrer busca sem apreensão, se nada for encontrado,
podendo haver, também, apreensão anterior à ocorrência da busca, na
hipótese de não ter que serem procuradas, por serem de fácil percepção e logo
encontradas.
2.2.1.– POLICIAMENTO PREVENTIVO E ORDEM PÚBLICA

O policiamento preventivo está intimamente relacionado ao aspecto da


ostensividade e da fácil percepção que é alcançada por meio dos
patrulhamentos e das rondas policiais efetuadas. Por se responsável pela
prevenção de delitos e de outras perturbações sociais, a Polícia Militar realiza o
policiamento ostensivo e preventivo nas diversas cidades brasileiras,
realizando rondas nas ruas e em outros locais públicos, buscando garantir a
manutenção da paz e da tranquilidade social, conforme previsão constitucional.

A Polícia Militar está presente nas relações sociais, seja prevenindo a


ocorrência do crime através de sua ostensividade, bem como pela prática dos
variados tipos de abordagem policial.

Outra característica peculiar dessa instituição é a diversidade de maneiras em


que se apresenta no contexto social, dado a complexidade e amplitude do
termo prevenção e ostensividade, que em determinado momentos se refere a
prevenção de ilícitos e, em outros, que se confunde com as questões
assistênciais e comunitárias existentes no seio social.

No entanto, a ação mais peculiar e cotidiana da Polícia Militar é o


patrulhamento preventivo, o qual conduz a prática da abordagem policial de
cunho preventivo. Essa intervenção estatal acontece quando o policial se
aproxima de uma pessoa ou de um grupo de pessoas que se encontram em
circunstância de suspeição.

Em relação aos ditames constitucionais, a Polícia Militar, em consonância ao


Art. 144, § 5°, da CF de 1988, é responsável pela preservação da ordem
pública e pelo policiamento ostensivo, em todas as suas modalidades, sendo
considerada força auxiliar e reserva do Exército Brasileiro. Ressalta-se ainda
que a Polícia Militar subordina-se, da mesma forma que as polícias civis, aos
Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

Art.144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de


todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das
pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
...

V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.

...

§ 5º - às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem


pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em
lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.

§ 6º - As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e


reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos
Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.

As Polícias Militares brasileiras se originam nas Forças policiais criadas


durante o Império, no reinado de D. Pedro I. A Corporação mais antiga do
Brasil é a Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, com origens na Guarda
Real de Polícia criada em 1809 por Dom João VI, Rei de Portugal.

No entanto, a idéia de Polícia, que visa promover a justiça e organizar o serviço


da ordem pública, no Brasil, nasceu no ano de 1530, quando Dom João III
resolveu colonizar o território, até então não explorado, adotando o sistema de
Capitanias Hereditárias, sendo que, a visão de polícia preventiva somente
iniciou-se em 1837 com a criação da Guarda Municipal Permanente.

A idéia de Polícia no Brasil, nasceu em 1530 quando D. João III, ao adotar o


sistema de capitanias hereditárias, outorgou a Martins Afonso de Souza uma
carta régia para estabelecer a administração, promover a justiça e organizar o
serviço da ordem pública, como melhor entendesse, nas terras que
conquistasse. No período colonial, as atribuições da Polícia estiveram
confiadas aos Juízes que possuíam como auxiliares os meirinhos(oficiais de
justiça daquela época) e os homens jurados que, depois de escolhidos,
juravam perante o conselho dos deveres de Polícia. Em 1808, ocasião em que
D. João VI e sua Família Real já estavam instalados no Brasil, foi criada a
Intendência Geral de Polícia: em 1809, era instituída a Divisão Militar Da
Guarda Real de Polícia, primeiro dispositivo legal a dar vida à Polícia Militar.
Em 1837 é criada a Guarda Municipal Permanente. Homens que trabalhavam a
pé e a cavalo para patrulhar as vilas e auxiliar a Justiça. (JESUS, 2009, p. 96)
O papel precípuo e dever constitucional da Polícia Militar é a preservação da
ordem pública, tendo como ação principal o policiamento ostensivo em todas
as suas modalidades. Assim, percebe-se que a prática da abordagem policial
está associada à própria natureza preventiva da polícia e a exigência legal da
manutenção da ordem pública.

De outro modo, a abordagem policial no sentido de se aproximar de um dado


cidadão, a fim de verificar sua conduta, se insere no contexto social, como uma
ferramenta eficiente e legítima não só para a averiguação de suspeitos e
demais situações previstas em lei, mas, com igual eficiência para a inserção do
próprio policial militar na cidadania, colocando-o em contato direto com aqueles
aos quais protege e convive.

Necessário ressaltar que o momento da prática da busca pessoal, trata-se de


um instante de grande preocupação, haja vista possíveis riscos que podem
envolver a ação policial, tanto para o cidadão que está sendo abordado, quanto
para os próprios policiais que precisam conter prováveis atos atentórios as
normas vigentes, não podendo, em nenhuma hipótese, cometerem excessos
ou desvio de conduta a título de serem prontamente responsabilizados penal,
civil e administrativamente.

Fica evidente a importância do papel do policial que se encontra no seio


comunitário, a amplitude e a relevância de suas ações no contexto social, deste
modo, a ação da Polícia deve ser transparente, legal e, sempre, oportuna e
razoável.

A referência que se faz acerca da Polícia possui tantas conotações, pela sua
própria condição constitucional de estar diuturnamente agindo na manutenção
da ordem pública, de maneira ostensiva, fácil percepção, permanecendo,
assim, presente na realidade social.

Historicamente, a Polícia, com o sentido que lhe é devido atualmente, órgão


estatal que tem como encargo manter a ordem social e a tranquilidade pública,
originou-se na Roma Antiga, vindo a adquirir, então, significação especial de
ação de governo no sentido de manutenção da ordem pública, tranquilidade e
paz interna:
O vocábulo polícia, do grego politéia – de pólis (cidade) – significou, a princípio,
o ordenamento jurídico do Estado, governo da cidade e, até mesmo, a arte de
governar. Em Roma, o termo política adquiriu um sentido todo especial,
significando a ação do governo no sentido, de manter a ordem pública, a
tranquilidade e paz interna; posteriormente, passou a indicar, o próprio órgão
estatal incumbido de zelar sobre a segurança dos cidadãos”. (TOURINHO
FILHO, 2008, p. 195)

Na defesa da ordem pública, a Polícia funciona como um braço forte do


Estado, limitando condutas individuais em prol da proteção de direitos inerentes
à coletividade em geral, a fim de que a própria sociedade consiga se relacionar
de forma aprazível.

A ordem pública é o pré-requisito para o funcionamento do sistema de


convivências públicas, sendo imprescindível a existência de um polissistema
social, pois viver em sociedade importa, necessariamente, um conviver
publicamente. (JESUS, 2009, p. 66)

Concernente ao aspecto da natureza preventiva da polícia, importante destacar


a distinção entre polícia administrativa e judicial, onde não se pode realizar a
diferenciação de ambas somente pelo aspecto da prevenção e repressão,
porquanto a polícia administrativa mesmo sendo considerada pela doutrina e
jurisprudência como preventiva, pode atuar também de modo repressivo em
determinadas situações.

A polícia administrativa tanto pode agir preventivamente (como, por exemplo,


proibindo o porte de arma ou a direção de veículos automotores), como pode
agir repressivamente (a exemplo do que ocorre quando apreende a arma
usada indevidamente ou a licença do motorista infrator). No entanto, pode-se
dizer que, nas duas hipóteses, ela está tentando impedir que o comportamento
individual cause prejuízos maiores à coletividade; nesse sentido, é certo dizer
que a polícia administrativa é preventiva. (DI PIETRO, 2010, p. 118)

Neste aspecto, a polícia administrativa pode ser vislumbrada, como as ações


preventivas dos órgãos estatais visando evitar prejuízos futuros, os quais
poderiam ocorrer pelo comportamento irregular do particular.

O objetivo do poder de polícia administrativa, o qual é exercido pela Polícia


Militar no ato da abordagem policial é a manutenção da ordem pública em geral
e o bom andamento da atividade administrativa, impedindo preventivamente
possíveis infrações das leis.

Por essa característica peculiar, a atividade de polícia administrativa deve ser


desempenhada por órgãos administrativos de caráter fiscalizador, integrantes
dos mais diversos setores da administração pública.

Verifica-se que o poder de polícia administrativa refere-se às limitações


impostas a bens jurídicos individuais, podendo ser evidenciado, por esse
aspecto, como o exercício do poder de polícia amplo, porquanto restringi ou/e
limita administrativamente o direito do particular.

Por esse motivo não se trata da competência da polícia judiciária o ato de


multar por excesso de velocidade, ou algo do gênero, pois nesse caso a função
é nitidamente administrativa e contraria a função de polícia judiciária.

Nesta mesma concepção, encontra-se a busca pessoal preventiva realizada


por ocasião do ingresso de transeuntes em estádios de futebol, visando evitar à
entrada de objetos, que possam gerar um estado de risco eminente e provocar
ações prejudiciais à ordem pública, bem como ser utilizados pelas torcidas
organizadas.

Necessário mencionar que, neste caso, procede a busca pessoal em todas as


pessoas presentes, independentemente da configuração da fundada suspeita,
haja vista que a Polícia Militar estará agindo no exercício do poder de polícia
administrativa, como medida preventiva a possíveis atos que atentem contra a
ordem pública.

A função de polícia administrativa é de competência da administração pública


em geral, envolvendo, inclusive, algumas ações de segurança pública em seu
repertório. No entanto, ambas as terminologias são distintas, sendo que a
polícia eminentemente de segurança é aquela encarregada de medidas
preventivas, protegendo a ordem pública e evitando que os bens penalmente
protegidos sejam atingidos.

O exercício da atividade de polícia de segurança independe de ordem judicial


ou de prévia autorização da autoridade policial competente, haja vista sua
previsão constitucional (art. 144, § 5º, da CF). No Brasil, normalmente a função
de polícia administrativa de segurança é exercida pelas polícias militares dos
Estados e do Distrito Federal.

A polícia de segurança que, em sentido estrito, é a polícia ostensiva tem por


objetivo a preservação da ordem pública e, pois, “as medidas preventivas que
em sua prudência julgar necessárias para evitar o dano ou o perigo para as
pessoas. (SILVA B, 2008, p. 757)

Nota-se que a Polícia Militar pode ser considerada eclética ou mista, porque
atua tanto preventivamente, quanto repressivamente, com base na sua
condição de polícia de segurança e, em casos pontuais, pelo próprio poder de
polícia administrativa.

Não obstante, com essa concepção não se pode diferenciar a polícia


administrativa da judiciária, simplesmente, pelo órgão aplicador, porque a
Polícia Militar, por ser polícia de segurança, conforme o caso poderá atuar em
ambas vertentes.

Diferentemente, a Polícia Federal e a Polícia Civil que está presente nos


Estados e no Distrito Federal, atuam somente na condição de polícia judiciária,
como órgão auxiliar da Justiça, não exercendo, deste modo, o papel de polícia
administrativa.

Outra diferença: a polícia judiciária é privativa de corporações especializadas


(polícia civil e militar), enquanto a polícia administrativa se reparte entre
diversos órgãos da Administração, incluindo além da própria polícia militar, os
vários órgãos de fiscalização aos quais a lei atribua esse mister, como os que
atuam nas áreas de saúde, educação, trabalho, previdência e assistência
social. (DI PIETRO, 2010, p. 118)

Entretanto, é oportuno ressaltar que embora seja uma polícia que atua de
modo preventivo, a Polícia Militar também age repressivamente quando se
depara com a ocorrência de ilícito penal que não conseguiu evitar, na chamada
“repressão imediata”, visando o restabelecimento da ordem pública violada e
evitar o surgimento de novos danos.

A ordem pública, contudo, sendo violada em razão de ilícito penal, deve ser
restabelecida de imediato e automaticamente pelo órgão de polícia
administrativa que tenha a competência constitucional de preservação da
ordem pública. Cuida-se da repressão imediata, que tem o seu fundamento no
art. 144, § 5º, da vigente Constituição da República, porque, se não se
conseguiu preservar a ordem pública, o órgão policial que detém a
exclusividade dessa competência constitucional deve restabelecê-la imediata e
automaticamente. (LAZZARINI, 2003, p. 97)

Ressalta-se que as ações de polícia administrativa, especificamente de


segurança pública, que tem a seu cargo todos os modos e formas de
prevenção e de repressão remanescente no próprio exercício do poder de
polícia, privativo da Administração Pública, se subordinam integralmente ao
ramo do direito administrativo, tendo como limite de sua área de atuação,
precisamente, onde se inicia a alçada do Direito Processual Penal.

2.2.2.– DA FUNDADA SUSPEITA

A busca pessoal que tem por impulso a movimentação da polícia no campo da


prevenção e da manutenção da ordem pública representa um dos principais
instrumentos de trabalho da atividade policial e pode resultar, não obstante, no
encontro de objeto ou informação que caracterizem a prática da ação delituosa.

No entanto, a busca pessoal, mesmo a de caráter preventivo, somente terá


caráter legal se houver fundada suspeita de que alguém esteja ocultando
consigo algum objeto ilícito (Art. 244 do CPP).

Pode ser realizada em pessoas em atitudes suspeitas e nos seus pertences,


não precisando de ordem escrita da autoridade policial competente ou do
magistrado. Porém, esta não pode ser utilizada como medida de prevenção de
delito, sob pena de ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana e ao
Estado de Democrático de Direito, porquanto estaria contrariando diretamente
um dos fundamentos constitucionais da República Federativa do Brasil (Art. 1°,
III da Constituição Federal de 1988).

Fica evidenciado que a “invasão”, sem critério e desregrada, realizada junto ao


corpo da pessoa, nas suas vestes e nos objetos que ela esteja portando, é
medida abusiva estatal e, por essa condição, ameaça os direitos fundamentais
ligados à personalidade do indivíduo como o direito à imagem, à privacidade, à
honra, à dignidade etc.
Assim, as tradicionais revistas aleatórias, que atende somente propósitos
preventivos, não podem ser realizadas se não houver elementos de fundada
suspeita.

As buscas, como acontece com as medidas cautelares penais em geral, têm


um caráter coercitivo e são exercitadas em freqüente atrito com as liberdades
públicas fundamentais. No caso das buscas domicilias e pessoal, estarão
sempre em jogo liberdades fundamentais, como a inviolabilidade do domicílio,
intimidade, honra, e imagem da pessoa, cujos direitos estão expressamente
assegurados na CF. Daí que se torna indispensável, na aplicação das buscas,
uma estrita observância da lei e das formalidades que visam a garantir os
direitos individuais dos sujeitos passivos de tais providências cautelares.
(MACHADO, 2009, p. 580)

A busca só deve ser realizada quando houver fundadas suspeitas, e


objetivando sempre não ferir a dignidade humana, ou seja, deve ser realizada
de modo que não seja vexatória para a pessoa que está sendo abordada e
nem para terceiros, tendo em vista que o policial que exceder nas suas ações
poderá responder por crime de abuso de autoridade, bem como ser
responsabilizado civil e administrativamente.

Assim, nota-se que a legalidade da busca pessoal está pautada,


essencialmente, no aspecto da fundada suspeita, que aparentemente, para
grande parte da sociedade, pode ter uma conotação subjetiva; já em relação
aos órgãos policiais, esta deve ser cercada de indícios e de elementos
concretos que sugiram a necessidade real da intervenção policial e não
simplesmente de parâmetros subjetivos.

Quando a lei se refere a fundadas razões exige que haja um fato concreto
autorizador da formação da suspeita. A busca somente será legítima se,
efetivamente, houver um dado objetivo, um dado concreto, um fato da vida que
autorize os agentes realizarem a busca e apreensão. O simples olhar do
policial, entendendo tratar-se de um carro suspeito ou de uma pessoa suspeita,
por exemplo, não pode autorizar a busca e apreensão, sem que haja um dado
objetivo impulsionando sua conduta. (RANGEL, 2010, p. 157)

A busca pessoal se realizará sempre que existirem fundadas suspeitas, e não


certeza absoluta, de que o abordado oculte coisas ou objetos provenientes de
crime ou instrumentos que poderão ser utilizados na prática delituosa, ou
quando houver outros elementos objetivos e concretos que também indiquem a
necessidade da busca, a fim de que o poder estatal possa, através da mesma,
evitar um iminente ato ilícito de ser praticado.

Esta busca é absolutamente legal, pois não há que se falar em arbitrariedade


policial, e sim em preenchimento de requisitos legais que forma a convicção de
fundada suspeita.

É requisito essencial e indispensável para a realização da busca pessoal,


consistente na revista do indivíduo. Suspeita é uma desconfiança ou
suposição, algo intuitivo e frágil, por natureza, razão pela qual a norma exige
fundada suspeita, que é mais concreto e seguro. Assim, quando um policial
desconfiar de alguém, não poderá valer-se, unicamente, de sua experiência ou
pressentimento, necessitando, ainda, de algo mais palpável, como a denúncia
feita por terceiro de que a pessoa porta o instrumento usado para o
cometimento do delito, bem como pode ele mesmo visualizar uma saliência sob
a blusa do sujeito, dando nítida impressão de se tratar de um revólver. Enfim,
torna-se impossível e impróprio enumerar todas as possibilidades
autorizadoras de uma busca, mas continua sendo curial destacar que a
autoridade encarregada da investigação ou seus agentes podem – e devem –
revistar pessoas em busca de armas, instrumentos do crime, objetos
necessários à prova do fato delituoso, elementos de convicção, entre outros,
agindo escrupulosa e fundamentadamente. (NUCCI, 2011, p. 521)

A jurisprudência já se posicionou algumas vezes acerca da busca pessoal e da


fundada suspeita, tendo exposto como condição de legalidade do ato a
ocorrência de critérios objetivos e concretos que exigem a necessidade da
busca. De acordo com a decisão do Supremo Tribunal Federal, 1ª Turma, no
HC nº. 1.305-4 / GO:

A fundada suspeita, prevista no art. 244 do CPP, não pode fundar-se em


parâmetros unicamente subjetivos, exigindo elementos concretos que indiquem
a necessidade da revista, em face do constrangimento que causa. Ausência,
no caso, de elementos dessa natureza, que não se pode ter por configurados
na alegação de que trajava, o paciente, um blusão suscetível de esconder uma
arma, sob o risco de referendo a condutas arbitrárias ofensivas a direitos e
garantias individuais e caracterizadoras de abuso de poder. (Rel. Min. Ilmar
Galvão, 2002)

Neste sentido, a decisão do Tribunal Regional da 1ª Região, no Recurso em


Sentido Estrito nº. 2007.38.00.023314-9 – MG:
(…) a busca pessoal relatada pelas provas presentes nos autos não padece de
qualquer ilegalidade, haja vista a plena observância das regras estabelecidas
nos artigos 240, § 2º, e 244 do Código de Processo Penal, isto é, procedeu-se
à busca pessoal no recorrido em vista de fundada suspeita (denúncia anônima)
de que ele estaria portando arma de fogo, oportunidade em que com ele foram
encontradas cédulas falsas. Não é demais anotar que a apreensão de coisa
diversa daquela noticiada na denúncia anônima em nada influi na legalidade da
busca pessoal, visto que esta destina-se a averiguar qualquer ilegalidade – ou
indícios desta – apontada por fundada suspeita inicial. (Rel. Desemb. Fed.
Cândido Ribeiro, 2007)

O Tribunal Regional da 1ª Região, 3º turma, no Recurso Criminal nº.


2007.33.00.011197-0 – MG expõe que:

PROCESSUAL PENAL. BUSCA PESSOAL. ARTS. 240, § 2º, E 244, CPP.


AUSÊNCIA DE FUNDADA SUSPEITA. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO
DE CRITÉRIO OBJETIVO JUSTIFICADOR DO ATO. PRISÃO EM
FLAGRANTE DECORRENTE DA BUSCA PESSOAL. ILEGALIDADE.
ARBITRARIEDADE. DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS
DESRESPEITADOS. 1. “Fundada suspeita” é requisito essencial e
indispensável para a realização da busca pessoal, consistente na revista do
indivíduo (Guilherme de Souza Nucci). 2. A busca pessoal sem mandado deve
assentar-se em critério objetivo que a justifique. Do contrário, dar-se-á azo à
arbitrariedade e ao desrespeito aos direitos e garantias individuais. 3. A
suspeita não pode basear-se em parâmetros unicamente subjetivos,
discricionários do policial, exigindo, ao revés, elementos concretos que
indiquem a necessidade da revista, mormente quando notório o
constrangimento dela decorrente (STF – HC 81.305-4/GO, Rel. Ministro Ilmar
Galvão). 4. Recurso em sentido estrito não provido. (Rel. Desemb. Fed.
Tourinho Neto, 2008)

Com base na doutrina e jurisprudência, nota-se que a busca pessoal, em face


do constrangimento que causa, para ser legal, no sentido jurídico do termo, tem
que ocorrer como meio de prova, quando houver suspeita fundamentada por
elementos objetivos e não apenas em uma suspeição intuitiva por parte do
policial.
Não existirá fundada suspeita, assim, quando o policial militar basear sua ação
em simples suspeita, que é uma desconfiança ou suposição, algo especulativo
e frágil.

Não pode ser considerada legal a solicitação do policial para que o condutor de
um veículo saia do mesmo para se submeter à busca pessoal, quando não
ficar vislumbrado aspectos de fundada suspeita, de que este mesmo condutor
esteja ocultando algo ilícito, ou até mesmo, tenha praticado alguma conduta
ilegal que exige a necessidade da busca.

Não obstante, não há que se evidenciarem critérios subjetivos por parte do


policial, a fim de fundamentar a referida busca. A intervenção policial, mesmo
que preventiva, necessita está imbuída de elementos concretos e que sejam de
fácil percepção, autorizando, deste modo, a prática da busca.

A análise dos critérios objetivos da fundada suspeita deve ser realizada de


forma situacional, ao passo que existe um infinito de possibilidades que
poderão vir a caracterizar uma fundada suspeita, mas para ser legal deve
sempre está voltada a questões palpáveis e de fácil percepção, baseada em
algo mais concreto e mais relevante do que a mera suspeita.

A vagueza dessas expressões, e a dispensa do prévio controle judicial na


realização de tais medidas cautelares, muitas vezes acabam por permitir uma
persecução penal violenta e atrabiliária. Daí a necessidade, num autêntico
Estado Democrático de Direito, de se estabelecer um rigoroso controle sobre a
atuação policial, mormente naquelas práticas em que essa atuação possa
ameaçar tão de perto direitos fundamentais do homem. (MACHADO, 2009, p.
580)

Assim, visando atender o fator preventivo da atividade policial militar e agir em


consonância com as regras do Código de Processo Penal, a fundada suspeita,
como já exposto, não pode fundar-se simplesmente em elementos subjetivos
por parte do agente policial.

Deve se sustentar num conjunto de fatores suscetíveis a suspeição, que


atrelados e compatíveis ao contexto do ato ilícito praticado, conduz o policial a
formar a convicção de fundada suspeita, seja, na relação entre os indivíduos
envolvidos no fato criminoso, em razão do lugar, da hora do crime, do
comportamento das pessoas que estão presentes no contexto fático e,
principalmente, nas condutas reativas e nas informações e denúncias de
terceiros ora realizadas.

Em determinados casos, alguns fatores comportamentais do indivíduo a ser


abordado, serve como parâmetro para formação de suspeita, como, por
exemplo, volumes na região da cintura que podem ser indicativo de um
provável porte de arma de fogo ou mesmo uma conduta evasiva no sentido de
se esquivar da intervenção policial.

Verifica-se que a fundada suspeita relaciona-se diretamente com a conduta


humana, a qual geralmente é exposta por denúncia de terceiros, ou através da
própria percepção do policial.

No entanto, mesmo se tratando de elementos que caracterizam a suspeição, é


irrefutável a necessidade de sua materialidade e a correlação com o ato
criminoso ora praticado.

É notório que por insuficiência de conceituação legislativa e indefinição


doutrinária acerca da expressão fundada suspeita, ocorre à intervenção de
experiências adquiridas no decorrer da vida do policial militar no momento da
prática da busca pessoal, podendo, assim, provocar uma fragilidade jurídica no
próprio procedimento policial.

Assim, a autoridade policial (militar ou civil, federal ou estadual) poderá revistar


o agente quando houver “fundada suspeita”. Mas, o que é “fundada suspeita”?
Uma cláusula genérica, de conteúdo vago, impreciso e indeterminado, que
remete a ampla e plena subjetividade e arbitrariedade do policial. (LOPES
JÚNIOR, 2008, p. 658)

Necessário se faz ressaltar que o ordenamento jurídico brasileiro, através da


Constituição Federal de 1998, constitui-se em uma República Federativa
voltada a um Estado tipicamente de Direito.

Por esse motivo, a persecução penal e toda e qualquer ação estatal estão
rigorosamente disciplinadas por regras jurídicas previamente definidas e
estabelecidas, não podendo seus agentes agir simplesmente com aquilo que
considerem certo, cabível e de interesse da sociedade, sob pena de serem
responsabilizados.
2.3– DA BUSCA DOMICILIAR

No Processo Penal brasileiro existem dois tipos de busca previstos, a domiciliar


e a pessoal. A busca domiciliar encontra um maior rigor formal diante do direito
à inviolabilidade do domicílio.

A busca domiciliar é um instrumento jurídico que pode ser executado no


domicílio de qualquer pessoa, seja ele o próprio acusado no processo ou
mesmo terceiro não envolvido em delito.

A condição de legitimidade da busca domiciliar está relacionada ao aspecto


das fundadas razões, sendo estas, critério autorizador da realização dos atos
previstos no art. 240 Código de Processo Penal.

Art. 240. A busca será domiciliar ou pessoal.

§ 1º Proceder-se-á à busca domiciliar, quando fundadas razões a autorizarem,


para:

a) prender criminosos;

b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;

c) apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos


falsificados ou contrafeitos;

d) apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou


destinados a fim delituoso;

e) descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu;

f) apreender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu poder,


quando haja suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à
elucidação do fato;
g) apreender pessoas vítimas de crimes;

h) colher qualquer elemento de convicção.

Conforme exposto, essa modalidade de busca é procedida quando autorizada


por fundadas razões, nos termos do parágrafo 1º do Art. 240 do CPP, para
possibilitar algumas ações relevantes ao processo, visando instruí-lo com
novas provas.

A busca domiciliar se diferencia da busca pessoal, porquanto é limitada por


critérios totalmente objetivos e de fácil percepção, definidos em um único e
diploma legal, Art. 5º, Inc. XI da Constituição Federal: “A casa é o asilo
inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do
morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar
socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.

Essa modalidade de busca deve ser realizada por meio do respectivo mandado
judicial, conforme previsão legal, exceto se o morador consentir que o agente a
realize sem maiores formalidades.

Os agentes executores da busca domiciliar devem realizá-la durante o dia,


devendo ainda motivar a ação, exibindo e procedendo a leitura do mandado de
busca ao morador proprietário ou responsável pelo imóvel para que este abra a
porta da casa, permitindo o ingresso no seu interior.

Não obstante, para que haja uma maior transparência na ação estatal é
necessário que após a realização da busca no domicílio, os executores
confeccionem o respectivo Auto Circunstanciado e o assinem juntamente com
outras duas testemunhas, conforme previsão normativa do Art. 245 do Código
de Processo Penal:

Art. 245. As buscas domiciliares serão executadas de dia, salvo se o morador


consentir que se realizem à noite, e, antes de penetrarem na casa, os
executores mostrarão e lerão o mandado ao morador, ou a quem o represente,
intimando-o, em seguida, a abrir a porta.
§ 1º Se a própria autoridade der a busca, declarará previamente sua qualidade
e o objeto da diligência.

§ 2º Em caso de desobediência, será arrombada a porta e forçada a entrada.

§ 3º Recalcitrando o morador, será permitido o emprego de força contra coisas


existentes no interior da casa, para o descobrimento do que se procura.

§ 4º Observar-se-á o disposto nos §§ 2º e 3º, quando ausentes os moradores,


devendo, neste caso, ser intimado a assistir à diligência qualquer vizinho, se
houver e estiver presente.

§ 5º Se é determinada a pessoa ou coisa que se vai procurar, o morador será


intimado a mostrá-la.

§ 6º Descoberta a pessoa ou coisa que se procura, será imediatamente


apreendida e posta sob custódia da autoridade ou de seus agentes.

§ 7º Finda a diligência, os executores lavrarão auto circunstanciado,


assinando-o com duas testemunhas presenciais, sem prejuízo do disposto no §
4º.

Expõe-se que no caso do morador se recusar a liberar ou mesmo retardar a


entrada dos agentes executores da busca domiciliar que estão com o
respectivo mandado judicial em mãos, estes poderão utilizar a força necessária
e proporcional para conseguirem adentrar ao respectivo domicílio, para que
possam realizar a busca.

A lei admite até a possibilidade de arrombamento da porta e emprego de força


em caso de desobediência do morador ou moradores. Quando ausentes estes
últimos, deve-se intimar um vizinho, se houver e estiver presente, para assistir
à diligência. (MACHADO, 2009, p. 580)

Outro aspecto que merece destaque refere-se à execução da busca pessoal


dentro do domicilio, ou seja, logo após ou de modo paralelo à realização das
buscas no interior do imóvel.
Neste caso, não há discordância na doutrina ou nos tribunais, porquanto não
há que se falar em fundada suspeita, pois o ato já está fundamentado
previamente no respectivo mandado judicial, sendo que, nesta hipótese, a
busca pessoal é mera extensão e instrumento da busca domiciliar.

A busca pessoal também está automaticamente autorizada quando realizada


no bojo de uma busca domiciliar. Essa disposição do art. 244 é lógica e
necessária para eficácia da própria busca domiciliar. Aqui a situação é
diferente, pois foi judicialmente autorizada a busca domiciliar, de modo que a
revista dos presentes é englobada e imprescindível para a obtenção da prova
buscada. Ainda que não houvesse essa disposição, o art. 240, § 2º, “h”,
autorizaria a busca pessoal de quem na casa estivesse. (LOPES JÚNIOR,
2008, p. 659)

A busca domiciliar não está relacionado ao campo da prevenção, mas sim ao


próprio exercício de Polícia Judiciária e à Instrução Criminal, partindo da
premissa, em regra, da prévia ocorrência de um ilícito penal.

Essa modalidade de busca refere-se à procura e “investigação” realizada em


casa alheia, visando prender criminosos ou localizar elementos e objetos que
possam constituir prova material e, consequentemente, possam instruir melhor
o processo penal.

2.4– PRINCÍPIOS DA ABORDAGEM POLICIAL

A abordagem policial é um “processo” que demanda do policial um domínio


amplo das técnicas policias, tendo em vista o seu caráter situacional, ou seja,
cada abordagem policial tem seus próprios detalhes e peculiaridades e que
exigem uma postura eficiente e específica do policial no momento da sua
prática. A legalidade da atuação policial não deve ser colocada em segundo
plano, pois, via de regra, esta condição deve ser comum e exigível em toda e
qualquer intervenção estatal.

Abordagens a suspeitos são circunstâncias de alto risco. Assim, ao ser


realizada, o policial deve sempre, por mais simples que a situação possa
parecer, estar alerta e atento com a segurança das pessoas envolvidas, tanto a
sua quanto a do cidadão abordado, bem como a de terceiros, uma vez que a
preservação da ordem pública e da vida é a missão precípua da Polícia.
Neste sentido, o policial necessita está sempre atento, procurando identificar os
riscos potenciais, a fim de obter o domínio geral da situação, para que possa
controlar qualquer ameaça que apareça.

Uma questão que merece destaque refere-se à forma como o policial


estabelece a comunicação no momento da abordagem. Muitas ocorrências
policiais são resolvidas, simplesmente, através da verbalização e orientação
por parte do policial.

O policial deve sempre procurar ter o domínio preciso da habilidade de se


comunicar claramente e sem agressividade. O modo como se dá a relação
entre a polícia e o suspeito no início e durante toda abordagem, será fator
preponderante para que o policial possa obter uma solução aceitável no
transcorrer da busca pessoal.

Na atividade operacional da Polícia é necessário, por parte do policial, ter


conhecimento técnico da atividade policial e conhecimento jurídico concernente
à prática da busca pessoal.

A proporcionalidade na atuação policial deve ser encarada como fundamento


basilar, ou seja, princípio a ser seguido em toda intervenção policial. Muitas
mortes de policiais estão ligadas diretamente a abordagens executadas ou
planejadas de maneira equivocada. Nos noticiários nacionais e internacionais
falam-se constantemente em ações policiais mal sucedidas, haja vista que o
instituto da abordagem policial não deve ser considerado ato de intimidação e
controle social.

O aspecto da segurança não pode ser posto em segundo plano no ato de


abordar, porquanto a atividade policial é de alto risco e, envolve interesses
diversos que vão desde a manutenção da ordem pública, até a própria
segurança individual da pessoa que está sendo alvo de uma intervenção
policial.

De acordo com a doutrina policial, durante a realização de uma busca pessoal


devem ser observados, por parte dos agentes aplicadores da lei, alguns
princípios fundamentais que facilitarão as ações, bem como proporcionarão a
segurança necessária para o local onde está sendo executada a ação policial e
as pessoas ali envolvidas.
Ao ser realizada uma abordagem há necessidade que haja um policial
responsável pela coordenação e controle da equipe de policiais que estão
executando a abordagem, lembrando que seu papel é definir as funções e
estabelecer a verbalização com os cidadãos abordados. A segurança deve ser
a preocupação basilar da equipe policial, devendo, sempre que possível,
procurar surpreender o cidadão a ser abordado e buscar agir rapidamente, pois
uma ação rápida contribui para dissuadir uma possível resistência.

Outro fator importantíssimo refere-se à postura do policial no momento da


abordagem, haja vista que a mesma pode inibir uma ameaça presumível por
parte do infrator e de modo contrário evitar até uma possível ação arbitrária e
abusiva do agente público.

A supremacia de força policial precisa ser aplicada, a polícia não deve estar em
desvantagem numérica no momento da busca, pois formalmente é ela que tem
o poder/dever de manter a ordem pública e de confrontar possíveis ameaças.
No entanto, o objetivo dessa supremacia não é coagir e nem constranger as
pessoas a serem abordadas, mas fornecer uma condição segura e adequada
para a prática da busca.

Segundo o artigo, “O Caso Nilson Pedro: Um estudo de caso”, defendida pelo


Capitão da Polícia Militar do Mato Grosso, Marcos Roberto Sovinski, os
princípios de uma boa abordagem policial são:

Segurança - É a certeza, a confiança, a garantia, a condição de estar seguro.


Basicamente é estar cercado de todas as cautelas necessárias para a
eliminação dos riscos de perigo. Evidente que uma abordagem em local ermo,
sem iluminação, requer maiores cuidados com a segurança.

Surpresa - Ato ou efeito de surpreender, aparecer inopinadamente. O fator


surpresa, além de contribuir decisivamente para a segurança da equipe, é
dissuador psicológico da resistência do abordado. Agora, se o fator surpresa,
foi perdido, os cuidados com uma reação devem ser redobrados.

Rapidez - Qualidade de ser rápido, instantâneo, ligeiro, veloz. O princípio da


rapidez, dentro da progressão policial, visa impossibilitar uma reação por parte
do abordado. Rapidez não significa afobação.
Ação vigorosa - Maneira como se exerce uma força física. Não se pode
confundir vigor com arbítrio. O policial deve fazer com que o infrator da lei sinta
que há necessidade de sua parte render-se, neutralizando o menor esboço de
reação. O importante é o impacto psicológico, a postura e a conduta, fatores
inibidores de uma possível reação.

Unidade de comando - Ao se realizar uma abordagem, certos comandos


verbais devem ser emitidos visando o entendimento por parte do abordado das
ações que deva realizar. Somente um dos policiais da equipe deve ser
incumbido de comandar a abordagem e de dar as ordens, pois se vários
policiais emitirem ordens ao mesmo tempo à confusão dominará a ação
policial, prejudicando seriamente seu êxito. (SOVINSKI, online)

Além dos princípios supracitados, o policial deve agir com educação e


urbanidade, pois a atitude e a postura dos agentes estatais no transcorrer de
uma determinada abordagem poderão contribuir efetivamente na prevenção de
delitos, bem como na melhoria da relação polícia e sociedade.

2.5– USO DE ALGEMAS

No que se refere ao uso de algema por parte dos órgãos de segurança,


importante ressaltar que o Código de Processo Penal não disciplinou o uso de
algemas, sendo que a Lei de execução penal, Art. 199, remeteu o
disciplinamento da matéria a Decreto Federal, o qual nunca fora editado,
demonstrando, assim, mais uma vez a omissão legislativa.

Mesmo com a falta de previsão legislativa concernente o uso de algemas na


atividade policial, ressalta-se que a lei processual fez menção acerca da
possibilidade de uso de força por parte do agente ou da autoridade
competente, em caráter excepcional.

O uso de algemas estava equiparado ao uso da força pela polícia. Assim,


nesse caso, a indispensabilidade da medida, a necessidade do meio e a
justificação teleológica, deveriam se basear no princípio da proporcionalidade.
Todas as vezes que o uso da algema exorbitasse desse limite constituiria
abuso, nos termos dos art. 3º, i (atentado contra a incolumidade do indivíduo),
e 4º, b (submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a
constrangimento não autorizado em lei) da lei nº. 4.898/65 (lei de abuso de
autoridade). (ISHIDA, 2010, p. 176)
Em apenas duas hipóteses a lei processual penal vislumbra o uso da força e
dos seus respectivos instrumentos. Inicialmente como exceção a regra,
segundo o Art. 284 do CPP: “Não será permitido o emprego de força, salvo a
indispensável no caso de resistência ou de tentativa de fuga do preso”.

Conseguinte, também ocorre a autorização do uso da força pela autoridade


pública, conforme previsão do Art. 292 do CPP, onde o emprego da força
deverá ser empregado simplesmente para conter a resistência à prisão em
flagrante, ou para a defesa do executor dessa prisão, sendo que a intervenção
deverá ser posta em um auto que será subscrito pela autoridade competente e
também por duas testemunhas.

Art. 292. Se houver, ainda que por parte de terceiros, resistência à prisão em
flagrante ou à determinada por autoridade competente, o executor e as
pessoas que o auxiliarem poderão usar dos meios necessários para defender-
se ou para vencer a resistência, do que tudo se lavrará auto subscrito também
por duas testemunhas.

Atualmente, o uso de algemas é concebido pelas regras da Súmula Vinculante


nº. 11 do STF, a qual trata este instrumento policial não como regra, mas sim
como exceção jurídica, só se admitindo o seu uso em casos de resistência, de
fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física do preso ou alheia,
sobe pena de responsabilização disciplinar, civil e penal do agente ou da
autoridade responsável pelo o uso.

Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de


fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou
de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de
responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de
nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da
responsabilidade civil do Estado. (Súmula vinculante nº. 11 do STF)

Ressalta-se a necessidade de motivação por parte do policial que utilizar o


recurso da Algema, haja vista que o mesmo terá que fundamentar tal medida
por escrito, mencionando os motivos que culminaram para a sua utilização.

A obrigatoriedade da motivação do uso de algemas, de certa forma, também


provoca a fundamentação jurídica da intervenção policial, impedindo, assim,
possíveis responsabilizações do policial condutor por abuso de autoridade
simplesmente por ter feito o uso de algemas, bem como evita que haja a
nulidade da prisão ou do ato processual que fora realizado por ter sido
realizado o uso das algemas.

Concernente ao uso de algemas é importante mencionar que a doutrina


considera ato atentório aos direitos individuais o seu emprego de modo
desnecessário e excessivo, podendo o policial que exceder nesse uso, ser
responsabilizado pelo crime de abuso de autoridade.

O emprego desnecessário de algemas viola abertamente princípios e direitos


como a dignidade da pessoa (art. 1º, II e III, da CF), a honra e a imagem (art.
5º, X), integridade moral dos presos (art. 5º, XLIX), a presunção de inocência
(art. 5º, LVII) etc. e não se harmoniza com um processo de garantias,
comprometido não apenas com a repressão, mas sobretudo, com as
salvaguardas dos direitos fundamentais do indivíduo. (MACHADO, 2009, p.
554)

Outro assunto interessante é a previsão normativa presente no Estatuto da


Criança e do Adolescente, em seu Art. 178, que expõe acerca da não
condução do adolescente em compartimento fechado de veículo policial:

Art. 178. O adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional não poderá
ser conduzido ou transportado em compartimento fechado de veículo policial,
em condições atentatórias à sua dignidade, ou que impliquem risco à sua
integridade física ou mental, sob pena de responsabilidade.

O policial condutor deverá levar em consideração todo o contexto da


ocorrência, a periculosidade do adolescente infrator, seu porte físico e a
referida previsão normativa, sendo que, em nenhuma hipótese, deverá
submeter o adolescente a condições vexatórias à sua dignidade e a risco a sua
integridade física ou mental.

Assim, o policial deve focar sua ação na tríade da necessidade,


proporcionalidade e razoabilidade, visando sempre atender aos interesses
sociais e as normas vigentes.

3.. ABUSO DE AUTORIDADE E CRIMES CORRELATOS


Os agentes policiais no exercício de suas funções encontram-se sujeitos aos
limites e exigências da lei. A atividade policial, por sua natureza social e
situacional, possui aspectos discricionários que são essenciais para o
cumprimento das funções de segurança pública.

Pela existência dessa discricionariedade a ação policial fica mais aberta,


dificultando assim, diferenciar um ato policial discricionário de um ato arbitrário
e contrário ao Estado Democrático de Direito.

No entanto, a liberdade de escolha por parte da Administração Pública,


necessita estar sempre relacionada à procura dos melhores meios para
satisfazer o interesse público, ou seja, devem consecutivamente visar os
interesses sociais, objetivando satisfazer sua finalidade legal com foco na
razoabilidade.

Visando limitar a ação estatal e evitar que possíveis danos sejam causados a
coletividade, a lei de abuso de autoridade é comumente utilizada como escudo
protetor das garantias fundamentais elencadas na Constituição Federal, haja
vista que pela sua força normativa, minimiza a prática de abusos por parte das
autoridades públicas.

3.1.– A lei de abuso de autoridade – lei nº. 4898/65

A lei de Abuso de Autoridade (Lei nº. 4.898/65) tem com escopo proteger os
cidadãos dos abusos praticados pelas autoridades públicas ou por seus
agentes, que possam comprometer direitos e garantias constitucionais como:
liberdade de locomoção, sigilo de correspondência, inviolabilidade domiciliar,
incolumidade física etc.

Nota-se que a lei em referência busca proteger as garantias individuais


elencadas na Constituição Federal de 1988, bem como promover o normal
funcionamento da Administração Pública e do exercício da função pública sem
que haja abusos e desvios por parte das autoridades públicas.

Para praticar esse direito o particular interessado procederá mediante petição


que será dirigida à autoridade superior que tiver atribuição legal para apurar e
aplicar sanção à autoridade civil ou militar acusada da prática do abuso.
Conforme exposto no Art. 5 da Lei 4.898/65 “Considera-se autoridade, para os
efeitos desta lei, quem exerce cargo, emprego ou função pública, de natureza
civil, ou militar, ainda que transitoriamente e sem remuneração”.

Assim, percebe-se que o policial por exercer notadamente cargo público, está
tipicamente englobado na Lei de Abuso de Autoridade e, deste modo, caso
exceda no emprego de sua atividade pública estará sujeito a possíveis sanções
administrativas, civis e penais.

Quando o abuso de autoridade for praticado por policial, seja civil ou militar,
poderá ser cominada a pena autônoma ou acessória, de não poder o acusado
exercer funções de natureza policial ou militar no município da culpa, por prazo
de um a cinco anos, conforme Art. 6º, § 5º, lei nº Lei 4.898/65.

No que se refere à competência para apuração do crime de Abuso de


Autoridade, tem-se a regra que, se abuso for praticado por autoridade estadual,
o juízo competente será a Justiça Estadual, sendo que, se tratando de policial
militar, conforme Súmula 172, do STJ, compete a Justiça Comum processar e
julgar o militar por crime de abuso de autoridade, ainda que praticado no
decorrer do serviço policial militar.

Seja como for, tem prevalecido mesmo o entendimento de que crime militar é
apenas aquele previsto no CPM. Daí por que os crimes previstos em leis
especiais, como, por exemplo, o abuso de autoridade, os delitos de tortura, de
sonegação fiscal, de tóxicos, cometidos contra o consumidor e etc., não são
considerados crimes militares e escapam à competência da justiça castrense.
(MACHADO, 2009, p. 314)

Não há discordância na doutrina acerca da competência para julgar o crime de


abuso de autoridade praticado por policial militar, porquanto, trata-se de crime
especial que não há previsão no Código de Processo Penal Militar, e assim,
foge da competência da Justiça Militar.

3.2.– A relação do crime de abuso de autoridade com o direito administrativo

De acordo com a doutrina vigente, o Abuso de Poder citado no Direito


Administrativo é cometido pelo agente público de duas maneiras: o excesso e o
desvio.
No caso do excesso, verifica-se que o agente público atua fora dos limites de
sua competência, de modo excessivo, ao passo que na hipótese do desvio,
atua dentro do limite de sua competência, no entanto, afasta-se do interesse
público que fundamenta sua ação.

Assim, quando o agente público age de modo excessivo está utilizando o poder
da administração pública de forma abusiva e por consequência, de maneira
ilegal, minimizando o interesse do Estado que é o bem estar social e a
intervenção razoável, para agir em interesse próprio.

Tratando-se do desvio de finalidade, este se processa quando um agente


público busca finalidade diferente para a ação estatal realizada, utilizando-se
da execução de um ato manifestamente legal, mas de modo ilegal e com a
obtenção de um resultado diverso do que o pretendido pela Administração
Pública.

Nesta hipótese, o agente público também extrapola os limites da lei, valendo-se


de sua obrigação funcional de agir, buscando atender ao interesse público,
mas que no instante da execução fornece um fim contrário do que
originalmente deveria ser pretendido.

Fazendo um paralelo entre as espécies do gênero Abuso, o do Poder do Direito


Administrativo e o de Autoridade que se refere à Lei nº 4.898/65 verifica-se que
ambos possuem duas formas bem definidas de se apresentarem que é o
desvio de finalidade e o excesso de poder, sendo que, para a ocorrência do
ilícito típico de Abuso de Autoridade há a necessidade de incidir nas previsões
penais descritas na lei supracitada.

Esse abuso de autoridade é gênero, do qual são espécies o desvio de


finalidade e o excesso. Conforme o autor, O excesso de poder acontece
quando a autoridade ultrapassa a linha da legalidade, excedendo-se em sua
competência, pois, ninguém pode agir em nome da Administração fora do que
a lei lhe permite. O excesso de poder torna o ato arbitrário, ilícito e nulo. É uma
forma de abuso de poder que retira a legitimidade da conduta do administrador
público, colocando-o na ilegalidade e até mesmo no crime de abuso de
autoridade quando incide nas previsões penais da Lei 4.898, de 9.12.65, que
visa a melhor preservar as liberdades individuais já asseguradas na
Constituição. (MEIRELLES, 2007, p. 85)
Observa-se que o Abuso de Autoridade não se trata, exclusivamente, de uma
autêntica punição penal, extrapolando a mera competência processualística
penal, porquanto há previsão de responsabilização do agente que excedeu na
execução da esfera de seu poder, nas três esferas, administrativa, civil e penal,
conforme Art. 6º da Lei. 4.898/65 “O abuso de autoridade sujeitará o seu autor
à sanção administrativa, civil e penal”.

A responsabilidade administrativa do agente será apurada por meio de


procedimento administrativo próprio, sindicância ou processo, de acordo com o
Estatuto ou Lei orgânica a que estiver sujeito o funcionário que praticou o
abuso. Na esfera civil, a responsabilidade do funcionário será apurada pro ação
civil indenizatória, nos termos do Código de Processo Civil brasileiro. Tratando-
se da responsabilidade penal, esta será apurada com supedâneo nos artigos 3º
e 4º da lei de abuso de autoridade. (SILVA A, 2006, p. 361)

Pode-se dizer que o abuso de poder não tem a sua existência limitada somente
ao campo administrativo, sendo também utilizado no âmbito penal para
caracterizar algumas condutas de abuso de autoridade, as quais são muito
mais amplas do que o simples excesso ou desvio de poder, pois abarcam
outras condutas ilegais do agente público tipificadas na lei de abuso de
autoridade.

3.3.– Abuso de autoridade e atuação policial

As garantias fundamentais não impedem ou dificultam o exercício da atuação


policial frente à manutenção da ordem pública, não podendo, os agentes
públicos serem omissos no exercício de suas funções sociais sob pena de
responsabilidade.

A sociedade sofre com a violência praticada por determinadas pessoas que


não respeitam as regras pré-estabelecidas. A segurança pública é de extrema
necessidade para o desenvolvimento do Estado, e deve ser mantida e
assegurada por agentes que estejam preparados para empregarem a força
física ou letal, quando necessário e oportuno.

A administração pública encontra-se sujeita aos princípios de legalidade,


impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (art. 37, caput, da C.F).
Do mesmo modo, os organismos policiais, no exercício de suas funções,
também se encontram sujeitos aos princípios que regem a administração
pública, e que estão vislumbrados na Carta Magna.

No que se refere à prática da busca pessoal, fica evidenciado que além de


fundar-se no aspecto da fundada suspeita, a intervenção policial necessita se
ponderar no parâmetro da necessidade, adequação e proporcionalidade. Neste
sentido, a busca pessoal deve ser medida excepcional e exigida conforme as
circunstâncias do caso concreto.

Todavia, ressalta-se que os direitos individuais elencados na Constituição


Federal não são absolutos e, em determinados casos, podem ser até mesmo
restringidos.

Por isso medidas intervencionistas com a busca e apreensão trabalham


especificamente nesta exceção da proteção constitucional, sendo, por isso,
consideradas medidas excepcionais.

Em contrapartida, nas hipóteses de excesso ou ilegalidade na execução da


busca pessoal por parte dos agentes públicos ou quando não há a real
necessidade para a aplicação de tal medida, faz com que a intervenção estatal
confronte diretamente direitos individuais e garantias fundamentais consagrado
na Constituição Federal brasileira.

No caso da busca pessoal, o abuso será caracterizado pelo excesso e,


consequentemente, pelo constrangimento causado, na hipótese em que
mesmo se tratando de um ato legítimo e revestido com o parâmetro da fundada
suspeita, o policial militar a executa de modo excessivo e abusivo, agredindo
fisicamente e moralmente o cidadão abordado, ou mesmo quando adota
procedimentos desnecessários e desproporcionais à conduta do cidadão que
está sendo alvo da abordagem.

Neste sentido, evidencia-se o posicionamento do Egrégio Tribunal de Justiça


do Rio Grande do Sul que ratifica o entendimento de que o excesso por parte
do policial militar no momento da busca pessoal caracteriza crime de abuso de
autoridade, sendo assim, passivo de responsabilização, conforme preceitua a
Lei nº. 4.898/65.
RECURSO CRIME. ABUSO DE AUTORIDADE. ART. 3º, ALÍNEA I DA LEI
4.898/65. TIPICIDADE DA CONDUTA E SUFICIÊNCIA DO CONJUNTO
PROBATÓRIO. SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA. PRESCRIÇÃO.

1- Demonstrado de forma suficiente pela prova colhida que o policial militar, em


abordagem, desferiu um tapa no rosto da vítima sem motivo aparente, está
caracterizado o abuso de poder.2 - Não transcorrido lapso temporal superior a
2 (dois) anos entre a data do fato e o recebimento da denúncia, ou entre este e
a publicação da sentença penal condenatória, não há falar em prescrição.
APELAÇÃO IMPROVIDA. (n.º 71002250496/RS, Rel. Volcir Antônio Casal,
14.09.2009)
Já o desvio, pode ser vislumbrado quando o policial age, simplesmente, por
vontade e interesses próprios, sem atender a finalidade pública, extrapolando
critérios jurídicos, como, por exemplo, realizar uma busca pessoal
desnecessária sem atendimento ao critério da fundada suspeita, baseando-a
somente na sua subjetividade.

Entretanto, pela vagueza do termo fundada suspeita, genericamente, fica difícil


vislumbrar a ocorrência do abuso, sendo que, por isso, necessário se faz
analisar casos concretos.

A autoridade policial poderá proceder à revista pessoal ( e nos automóveis,


caminhões, ônibus, etc.), a qualquer hora do dia ou da noite, sem a
necessidade de mandado judicial, bastando, para tanto, que alegue a “fundada
suspeita” de que alguém possa estar ocultando (quase que) qualquer coisa.
Claro, em tese, há a possibilidade de o policial ser responsabilizado pelo crime
de abuso de autoridade, previsto na Lei nº. 4.898, quando não houver fundada
suspeita. O problema é que, ao dar-se uma tal abertura para o uso da
autoridade, fica extremamente difícil a demonstração de que houve abuso. O
que separa o uso do abuso quando há uma indefinição da lei? (LOPES
JÚNIOR, 2008, p. 659)

Verifica-se que o abuso de autoridade poder estar presente na prática da busca


pessoal, quando não há a observância dos preceitos jurídicos que envolvem tal
medida, bem como no instante em que o policial a utiliza para satisfazer
somente interesses privados ou que seja realizado de maneira excessiva,
ferindo, assim, direitos fundamentais contemplados na CF/88.

Necessário ressaltar que pela característica do serviço policial e pela própria


dinâmica da busca pessoal, os possíveis excessos praticados irão configurar o
crime de Abuso de Autoridade, nas hipóteses, do Art. 3º, letra “a)” e “i)”,
respectivamente, quando a intervenção policial atentar contra “à liberdade de
locomoção” e “à incolumidade física do indivíduo”; ou/e no caso Art. 4º, letra
“b)” “submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a
constrangimento não autorizado em lei”

O abuso de autoridade no exercício funcional do policial pode ser evidenciado


de vários modos, desde a mera agressão verbal no ato da abordagem policial,
bem como ações que culmine lesões e até mesmo tortura.

3.3.1.-– Crime de desacato e sua relação com o abuso de autoridade

O crime de desacato previsto no Código Penal em seu “Art. 331. Desacatar


funcionário público no exercício da função ou em razão dela”, tem a sua
ocorrência no instante em que o cidadão, visando de ofender, denegrir e
desrespeitar o agente estatal usa de modos ou/e palavras incompatíveis para
afrontar o servidor público no exercício do seu trabalho ou em razão dele.

No crime em análise faticamente o “desejo” do autor se traduz na intenção


fática de humilhar e diminuir a pessoa do servidor público que está exercendo
sua função, a princípio de maneira adequada. Nas palavras do antigo mestre,
Magalhães Noronha o que se procura restabelecer com o crime de desacato é
a dignidade e o prestígio da função pública:

O bem jurídico protegido é a dignidade, o prestígio e o respeito devido à função


pública. É o Estado diretamente interessado em que aquele seja protegido e
tutelado, por ser indispensável à atividade e à dinâmica da administração
pública. (NORONHA, 2001, p. 303)

No entanto, a proteção jurídica que é dada a administração pública, por meio


do Crime de Desacato, algumas vezes também é utilizada para “maquiar” a
prática do suposto delito de abuso de autoridade, por parte do servidor público.
Nesses casos o servidor se utiliza da proteção, via desacato, para pôr
particular no polo ativo, como autor e evitar que este o denuncie por abuso de
autoridade.

O relator do então Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo - Tacrim-SP,


Roberto Mortari, foi bastante preciso quando expôs a necessidade do policial
agir de acordo com dos ditames da lei, mesmo que esteja sendo desacatado
pelo particular, e que caso venha a perder o controle da situação sua atitude
ensejaria o delito de abuso de autoridade".

A autoridade policial deve agir estritamente dentro dos limites legais, mesmo
que a vítima a desrespeite, devendo, neste caso, efetuar sua prisão, autuando-
a pelo crime de desacato, e não investir contra a sua integridade corporal, em
atitude que corporifica o delito de abuso de autoridade (art. 3º, “i”, da Lei
4.898/95)” (TACRIM– SP – 13ª Câm. - AC 918.777/7- Rel. Roberto Mortari – j.
21.02.1995).

Deste modo, o que se busca evitar é que o desrespeito de uma das partes
possa influir a mesma atitude pela outra parte, virando um círculo vicioso que
atinge, notadamente, os direitos fundamentais da pessoa humana e o bom
nome e a imagem da administração pública, principalmente no que diz respeito
à conduta por parte do agente público.

O uso proporcional e razoável da força policial e a adequação de sua


intervenção junto à sociedade são formas legítimas de proteger a cidadania e
de restabelecer a confiança e o respeito aos órgãos policiais.

Caso o policial haja em desacordo com os ditames legais, utilizando-se da


força desproporcional, contrária à prevista em lei, atentando contra a liberdade
de locomoção do sujeito, inviolabilidade do domicílio e incolumidade física do
indivíduo trata-se claramente do delito de abuso de autoridade, o qual deve ser
amplamente apurado pela autoridade competente, a fim de que não ocorra o
descrédito da função pública.

É notória a supervalorização que existe atualmente acerca do crime de


desacato, que faticamente é mais aplicado do que o abuso de autoridade
contra o cidadão, sendo utilizado como meio protetor da não incidência deste.
Entretanto, no Anteprojeto do novo Código Penal tal problemática fora
observada pela comissão de juristas que debatem a reforma do código, sendo
que os mesmos aprovaram a descriminalização do crime de desacato o qual
passará a ser somente um agravante do crime de injúria:

Brasília – A comissão de juristas que debatem no Senado a reforma do Código


Penal aprovou, nessa segunda-feira, a descriminalização do desacato a
autoridade, que passará a ser um agravante para o crime de injúria. O código
em vigor, criado em 1940, fixa pena de seis meses a um ano de prisão para
quem insulta ou ofende outra pessoa. O novo texto irá prever de um a dois
anos de detenção quando a injúria for cometida contra servidor
público.“Revogamos o crime de desacato. Prevaleceu o entendimento de que o
desacato não é outra coisa a não ser uma ofensa à honra do funcionário
público praticada em razão da função que ele exerce. Portanto, foi realocado
para a condição de crime contra a honra. É um crime de injúria com a pena
aumentada”, destacou o procurador Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, relator
da comissão.Ele acrescentou que a pena pode ser ainda maior se houver
agressão contra o servidor. “Se for uma injúria real, o que a gente chama de
partir para as vias de fato, que é dar um tapa, por exemplo, a pena será de um
a três anos”, disse Gonçalves. (DIEGO ABREU, online).
De acordo com a suposta mudança, o crime de desacato seria transformado
em uma espécie de injúria qualificada, afastando a crítica de que existiria um
viés autoritário na proteção ao servidor público, sem deixar, no entanto, de
manter como crime a ofensa a eles realizada em razão da função.

4– A FORMAÇÃO PROFISSIONAL NA CARREIRA POLICIAL


A formação profissional se traduz numa série de atividades desenvolvidas na
fase pré-profissional, acadêmica funcional, que favorecem a evolução plena da
personalidade e capacidade cognitiva do indivíduo.

A partir dos conhecimentos adquiridos nesta formação, permite que o indivíduo


obtenha parâmetros técnico-filosófico a respeito da atividade funcional a ser
executada, de si próprio e uma melhor adaptação ao meio laboral, sobretudo
no plano sócio profissional.

Desta feita, a formação profissional pode ser considerada como um processo


educacional que conduz ao aperfeiçoamento da técnica laboral, ampliando os
diversos conhecimentos e desenvolvendo as capacidades e comportamentos
profissionais.

4.1.– A cultura do abuso

A questão da violência policial está atrelada intimamente a cultura institucional


que se estabeleceu gradualmente desde a própria formação do Estado
Brasileiro. No entanto, geralmente quando se fala em violência policial, logo se
estabelece um liame entre esta e o período ditatorial.
Na época da ditadura o controle dos órgãos policiais estaduais era efetuado
pelo próprio Exercito, que tinha a autoridade da segurança pública em todos os
níveis políticos, inclusive no que se refere aos Estados membros e municípios.
Essa relação próxima entre Exercito, “polícia” de fronteiras e os órgãos policiais
de segurança pública influenciou de sobremodo a formação cultural das
policiais brasileiras.

Na ótica da cúpula do golpe de 64 o controle das Polícias Militares era uma


necessidade, sendo introduzido um novo modelo de segurança pública pelo
Exército, acabando-se com o pluralismo policial no país ficando a PM com o
policiamento ostensivo fardado e a Polícia Civil com as investigações cartoriais
e burocráticas. (COTTA, 2006, p.42)

No que se refere ao processo de ruptura nos métodos de intervenção policial


existente na ditadura, tem-se que no início dos anos 90, as corporações
policiais brasileiras iniciaram uma fase de rompimento do modelo então
estabelecido, em decorrência das transformações em andamento na sociedade
brasileira, em especial o surgimento de um Estado democrático de direito e a
perspectiva do fortalecimento da cidadania.

Entretanto, esse processo de modificação no jeito de ser dos órgãos policiais


se encontra em constante mudança, tendo ainda resquícios e interferências do
modelo tradicional de atuação, onde a força tem sido o primeiro e quase único
instrumento de intervenção junto a sociedade, deixando em segundo plano a
formação pautada na ética profissional, moral, proporcionalidade e não poucas
vezes à margem da legalidade.

"É necessário compreender as formações subjetivas sobre o valor e o respeito


de um homem, isto é, a concepção de masculinidade em suas relações com a
exibição de força e a posse de armas de fogo. É necessário também assinalar
os processos institucionais de longa duração nesta reflexão. Assim se formam
as práticas de violência policial contra os pobres em geral e as práticas sociais
de violência dos jovens pobres entre si numa sociedade fragilmente governada
pela lei e em um Estado que nunca teve o monopólio legítimo da violência.
Sempre houve, no Brasil, um hiato entre os direitos formais, escritos na lei, e os
realmente praticados. Desse modo, devem-se focalizar não apenas a letra da
lei, mas principalmente os processos sociais, tais como as regras ou as
práticas implícitas das ações dos atores. (ZALUAR, online)
Embora a transição para ao Estado democrático de direito tenha contribuído
para a minimização da violência policial no Brasil, as deficiências da
democracia brasileira, a desigualdade social e econômica, a persistência de
uma cultura da violência e a percepção midiática que é constantemente
repassada à sociedade brasileira, contribuem para o insucesso de qualquer
estratégia de controle da violência policial e combate a criminalidade.

A segurança pública no Brasil não é tratada como prioridade pelos governos


estaduais e pela união, os órgãos policiais faticamente agem de maneira
repressiva no combate a criminalidade, não é comum a prática de ações
proativas envolvendo a segurança no País.

A sociedade civil entende pouco o fenômeno, a mídia promove um debate sem


critério, há descrédito nas ações de combate ao crime, não há políticas de
Estado para a segurança pública e apesar dos investimentos a violência
cresce. (MEIRELES, 2007, p. 53)

Ainda segundo Meireles (2007, p.84): “No Brasil prevalece o entendimento


limitado de que polícia corre atrás de ladrão e prende ladrão”. Por isso,
necessário também que a própria sociedade se desprenda da concepção que
possui acerca da polícia que geralmente está voltada ao período ditatorial e
perceba-a pela sua nova roupagem.

Todavia, com o fiel cumprimento aos princípios constitucionais e a mudança de


paradigma é plenamente possível ter uma nova polícia, que atenda bem sua
população, de modo proporcional, imparcial e focalize o exercício da sua
função na garantia e efetivação dos direitos humanos.

4.2.– Nova formação profissional

A formação policial no Brasil é alvo de variadas críticas, haja vista seu caráter
tipicamente tradicional, onde predomina a atonia e o atraso técnico-científico.
Algumas academias de polícia se estruturam nos moldes da formação
hierarquizada do Exército, baseando o ensino em técnicas tipicamente
militares. Para Kant de Lima (2007, p. 73): “É comum, quando se questiona o
desempenho das polícias, relacionar o mau desempenho com despreparo, e
atribuir o despreparo à má formação”.

Entretanto, as exigências e a complexidade dos fenômenos sociais em que o


policial se depara se transforma paulatinamente, necessitando assim, por parte
dos órgãos policiais uma melhor formação, baseada não somente no
conhecimento jurídico, mas em valores que condicionam uma prática efetiva da
proteção aos direitos humanos.

Grande parte das academias de polícia fundamenta sua grade curricular


baseada somente na estrutura do curso de Direito, principalmente a polícia civil
por ser tecnicamente a polícia judiciária.

“Do ponto de vista pedagógico, há um arcaísmo gigante. Ou temos academias


que dão uma enorme ênfase à formação profissional técnica e nenhuma
disciplina de ciências humanas ou temos as chamadas academias tradicionais.
Nas escolas militares, há uma reminiscência do militarismo de opereta. Os
policias têm que acordar às 6h da manhã, têm 15 minutos para se arrumar,
vivem permanentemente numa espécie de ação incessante que não existe;
atividades que tem muito pouco a ver com o que a sociedade espera que este
policial faça. Já nas academias civis, o que há é uma repetição de metade do
curso de direito, que esses profissionais já cursaram. Sendo que os cursos de
criminologia em 40 faculdades de direito do Brasil são baseados na
criminologia do início do século”, descreve Tavares. (BIA BARBOSA, online).
A formação policial necessita ir além da teoria jurídica, a fim de que o policial
possa se vislumbrar no seio social como protagonista na construção de uma
cultura de paz e defesa dos direitos humanos, sendo que essa concepção
somente é adquirida por meio da formação acadêmica difusa, de qualidade e
voltada para esse designo.

Essa modalidade de formação, pautada na educação em direitos humanos é


um instrumento fundamental para a modificação das polícias, ela é capaz de
desenvolver no ser humano as condições exigidas para a mudança de
paradigma que respondam às necessidades das sociedades democráticas.

A educação em direitos humanos é um mecanismo fundamental para se fazer


incorporar inteligência nos sistemas de segurança. Para se criar capacidade de
reflexão, de crítica e de proposição para melhora”, disse Herbert Borges Paes
de Barros, da Subsecretaria de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos da
SEDH. (BIA BARBOSA, online).

Notadamente, observa-se que nos últimos anos têm ocorrido mudanças de


ordem metodológica na educação policial no Brasil. É nesse movimento que a
academia de polícia/universidade assume uma posição de destaque, como
agente de formação, reinvestida de um lugar eminentemente crítico, voltada
para o estudo sociojurídico transmissor por excelência de um pensamento
humanista e que atenda as novas perspectivas sociais.

O que não se admite nos dias de hoje é um modelo formal de socialização,


pois vivemos num rico e movimento mundo de diversidade e pluralidade de
formas de pensar, agir e de existir. Diante disso, a formação não pode ser
cristalizada apenas nas técnicas, ou seja, no modelo tradicional. É preciso que
haja uma abertura para integrar e agregar os múltiplos conhecimentos e ao
mesmo tempo promover reflexão sobre a concepção dialética. (Granjeiro, 2006,
p. 106)

Nesta nova realidade que está se desenhando na formação policial, o governo


federal tem papel de destaque, haja vista que o mesmo vem realizando ações
contínuas para fortalecer o sistema educacional dos profissionais de segurança
pública, não apenas na educação regular, cursos das academias, mas também
na educação permanente ou continuada, com treinamentos, seminários e
cursos de aperfeiçoamento profissional.

O governo federal para fortalecer a área da formação policial criou no ano de


2005 a Rede Nacional de Altos Estudos em Segurança Pública- RENAESP,
que faz parte de uma nova política educacional da Secretaria Nacional de
Segurança Pública – SENASP, promovida a partir da parceria com instituições
de ensino superior espalhadas pelo país, as quais recebem investimentos do
Governo para a realização de cursos de aperfeiçoamento e especialização
profissional nos diversos entes da federação.

Essa mudança de posicionamento do Governo Federal iniciou-se a partir do


ano de 2000, com a criação do Plano Nacional de Segurança Pública - PNSP,
o qual possibilitou ao Governo brasileiro iniciar ações voltadas para a
formação, qualificação e valorização profissional dos agentes de segurança
pública, propondo ações que pudessem garantir uma reforma substancial nas
polícias estaduais, pois compreendia a qualificação e a valorização profissional
como pilares para qualquer programa de redução da criminalidade.

No mesmo ano de elaboração do PNSP, o Governo também formulou um


documento para orientar a formação desses agentes, denominado Bases
Curricular para a Formação dos Profissionais de Segurança do Cidadão.
Em 2003, foi elaborado o “Projeto Segurança Pública para o Brasil”, sendo
recebido com respeito por todos, haja vista o fracasso da política de segurança
anterior, responsável pela deterioração das instituições policiais e sua
descredibilidade junto à sociedade.

O Projeto Segurança Pública para o Brasil ora mencionado sugeria a educação


das polícias como uma das formas de superação do modelo tradicional
implantado no País, o qual se encontrava enraizado na cultura policial brasileira
e era alvo de pesadas criticas.

Entretanto, observa-se claramente que a temática da formação policial ainda é


pouco discutida no meio acadêmico, isso não significa dizer que se trata de um
assunto com pouca relevância.

Por meio da qualificação dos profissionais de segurança pública é que as


instituições polícias terão capacidade de atuar com mais profissionalização e
respaldo para enfrentar as demandas cotidianas que chegam aos órgãos
policiais, com ênfase na proteção, defesa e garantia dos direitos humanos e da
cidadania. E é exatamente essa centralidade dada à educação que a Matriz
Curricular Nacional para a Formação em Segurança Pública evidencia:

A formação dos profissionais da Segurança Pública é fundamental para a


qualificação das polícias brasileiras, conforme definido nas diretrizes
estabelecidas pelo Plano Nacional de Segurança Pública. A Coordenação de
ensino da SENASP propõe um conjunto de orientações para o
desenvolvimento de ações formativas visando situar as atividades educativas
no contexto profissional e social em razão cada vez mais exigente demanda de
conhecimento, saberes e habilidades que exige continuamente novas
aprendizagens e que requer uma integração de conhecimentos que vai além do
desenvolvimento de currículos de forma fragmentada. Estas ações serão
operacionalizadas por meio das Instituições de Ensino de Segurança Pública
das Unidades Federativas (Ministério da Justiça, Online)

No entanto, ressalta-se que dentro do próprio novo sistema de formação


policial há resistências e críticas, as quais se fundamentam na permanência de
uma cultura institucional enfraquecida, mas ainda corporativa e de tolerância a
“certas práticas” que reforçam o arbítrio, o abuso e a ilegalidade.

5– CONCLUSÃO
O presente trabalho teve como finalidade demonstrar a legalidade da prática da
busca pessoal, conforme previsão normativa do Art. 244 do CPP e o aspecto
limitador gerado pela lei de abuso de autoridade.

A hipótese previamente sustentada e que se comprovou foi que a prática da


busca pessoal possui condição de legalidade, desde que pautada no seu
caráter preventivo e em certos elementos que fornecem condição de fundada
suspeita, os quais de forma associada norteiam a ação policial, sendo que sua
prática não deve ser abusiva e nem indiscriminatória, haja vista a possibilidade
de incidência de uma das hipóteses previstas na Lei nº. 4.898/65.

No transcorrer do trabalho em referência foi observada a importância da


formação profissional de qualidade dos agentes policiais para que estes
possam atuar de modo compatível com os interesses sociais e em respeito ao
Estado Democrático de Direito.

A formação desses profissionais necessita ter como referência a educação em


direitos humanos que é um instrumento fundamental para a modificação das
polícias, por ser capaz de desenvolver no profissional as condições exigidas
para a mudança de paradigma que respondam às necessidades das
sociedades democráticas.

A intervenção policial deve ser realizada com base na proteção aos interesses
coletivos. Evidencia-se a necessidade da realização da busca pessoal pelo seu
aspecto preventivo na defesa da ordem social, e que a existência de eventuais
critérios objetivos para a caracterização da fundada suspeita, aliado a sua
previsão normativa é que fornece de fato a condição de legalidade desse
instrumento de ordem processual.

Nota-se que a fundada suspeita corresponde a um elemento essencial utilizado


como parâmetro de legalidade para aplicação da busca pessoal. Todavia, fica
nítida a carência por uma definição mais específica do termo fundada suspeita,
sendo que, analisando o contexto geral das possibilidades de ocorrência da
busca pessoal, tornar-se-ia impossível definir e elencar todas as situações
concretas que apontem a real necessidade de aplicação desta medida estatal.

Mesmo se tratando de um termo genérico e que conduz a subjetividade, o


policial pode utilizar de alguns critérios de índole objetiva para se obter a
“fundamentação jurídica” da busca, com referência a fundada suspeita,
utilizando como condição legitimadora, por exemplo, as denúncias realizadas
por terceiros, ou da própria verificação por parte do policial de um volume
acentuado na região da cintura de um indivíduo, da correlação entre as
características físicas do autor de crime com as características do propenso
suspeito, bem como a própria conduta evasiva de um dado suspeito quando se
depara com a presença policial.

No entanto, o policial não se pode valer de discriminação ou conceitos pré-


estabelecidos para fundar a aplicação de tal medida, sob pena de contrariar as
regras impostas pelo ordenamento jurídico brasileiro.

Ocorrendo excessos na execução da busca pessoal por parte dos agentes


públicos estará se confrontando diretamente direitos individuais e garantias
fundamentais consagrados na Constituição Federal brasileira.

Na hipótese de excesso por parte dos agentes públicos no ato de abordar,


insurge a possibilidade de aplicação da lei de Abuso de Autoridade (Lei nº.
4.898/65), a qual poderá gerar responsabilização ao agente que excedeu na
prática de seu poder, nas três esferas, administrativa, civil e penal.

Além de fundar-se no aspecto da fundada suspeita, que é condição de


legalidade estrita do ato, a prática da busca pessoal necessita se ponderar no
parâmetro da necessidade, adequação e proporcionalidade, conforme as
circunstâncias do caso concreto.

Entretanto, apesar das exposições realizadas sobre o tema objeto deste


trabalho, nota-se que o mesmo necessita ter uma maior atenção por parte da
doutrina e especialistas, a fim de que se possa ter uma melhor compreensão e
definição jurídica no que se refere ao termo fundada suspeita e sobre a
amplitude e limites legais da busca pessoa

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