Tipos de Professores e Alunos

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Universidade de Aveiro Departamento de Ciências da Educação

2008

António André Renca A Indisciplina na Sala de Aula: Percepções de


Alunos e Professores

Dissertação apresentada à Universidade de Aveiro para cumprimento dos


requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Análise Social e
Administração da Educação, realizada sob a orientação científica do Dr.
António Maria Martins, Professor Auxiliar do Departamento de Ciências da
Educação da Universidade de Aveiro

1
À minha esposa Helena e aos meus filhos Filipe Miguel, Ana Beatriz e Catarina
Alexandra, pelos muitos momentos que os privei da minha “presença”.

2
o júri

presidente Professor Doutor Jorge Adelino Costa


Professor Associado com Agregação da Universidade de Aveiro

Professor Doutor Armando Paulo Ferreira Loureiro


Professor Auxiliar da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

Professor Doutor António Neto Mendes


Professor Auxiliar da Universidade de Aveiro

Professor Doutor António Maria Martins


Professor Auxiliar da Universidade de Aveiro (Orientador)

3
agradecimentos Ao professor Doutor António Maria Martins pelas sábias orientações, pelo seu
precioso contributo científico, pela dedicação e apoio dispensado nos
momentos em que me sentia mais perdido e com vontade de desistir;

Aos outros professores do mestrado pelos conhecimentos que transmitiram e


pela disponibilidade que sempre demonstraram para nos ajudar;

À Presidente do Conselho Executivo da escola onde realizámos o nosso


estudo por nos facilitar a recolha dos dados utilizados na parte empírica da
nossa investigação, e pela colaboração pessoal no trabalho;

Aos professores e alunos que voluntariamente se ofereceram para participar


neste estudo, dando o seu precioso contributo na recolha dos dados empíricos
através das suas entrevistas;

Aos meus colegas de mestrado pelos bons momentos de convívio que


passámos. Um agradecimento particular ao Cachide, colega de longa data,
com quem iniciei esta aventura, pelo apoio e incentivo em todos os momentos;

À professora Margarida Rosa pelo apoio na revisão literária do trabalho escrito.

4
palavras-chave Disciplina e indisciplina na sala de aula; socialização; relação professor-aluno;
prática pedagógica; regras; desvios; sanções;

resumo A indisciplina na sala de aula, não sendo um fenómeno recente, é hoje,


conjuntamente com o insucesso escolar e a exclusão, um grave problema que
se coloca às escolas portuguesas. É um fenómeno que se encontra presente
em todo o processo educativo e se apresenta como a grande deficiência do
processo pedagógico, comprometendo as aprendizagens dos alunos e
contribuindo para a grande instabilidade emocional e profissional dos
docentes. Os docentes gastam uma parcela significativa do tempo de aula na
eliminação de focos de indisciplina, resultando daí um grande desgaste físico e
psicológico e uma permanente tensão na procura e construção de um clima
relacional que lhes permita trabalhar. Este trabalho, quantas vezes inglório,
provoca nos professores sentimentos de impotência, ansiedade, frustração,
abandono, mergulhando-os num profundo stress que muitas vezes os conduz
ao desejo de fuga às situações vivenciadas.
A própria escola, como instituição de ensino, vê-se confrontada com uma
situação paradoxal: a existência de uma cultura de rua e de uma cultura
veiculada pelos meios de comunicação social, com destaque para a televisão,
não tendo conseguido encontrar soluções que lhe permitissem ombrear com a
concorrência e apontar estratégias que consigam estimular e motivar os alunos
no sentido da adopção de comportamentos mais assertivos.
No presente trabalho estudou-se a indisciplina na sala de aula. Procurámos
identificar os comportamentos de indisciplina que aí ocorrem com mais
frequência e como actua o professor perante os mesmos.
Professores e alunos experimentam na escola e particularmente na sala de
aula, situações sociais significativas - o professor contribui para o processo de
formação e socialização do aluno e este também entra no processo de
formação do professor -, estabelecendo-se entre eles um clima relacional
marcante para os seus comportamentos. A este respeito, perguntámo-nos:
quais as regras que vigoram na sala de aula? Quem as define? Como se
posicionam os professores e os alunos em relação à disciplina / indisciplina?
Quem é o aluno indisciplinado? Como é visto o aluno indisciplinado pelo
professor? O que pensam os alunos dos seus comportamentos e dos seus
professores?
Verificou-se que na sala de aula ocorrem comportamentos muito diversos,
sendo os mais usuais a conversa e as brincadeiras. Perante os
comportamentos considerados indisciplinados os professores agem de
diferentes formas procurando eliminá-los sequencialmente por processos,
normalmente coercitivos, que vão desde a repreensão até à expulsão do aluno
da sala de aula.
Do ponto de vista metodológico optou-se por um estudo de caso de natureza
qualitativa em que nos socorremos das entrevistas e da pesquisa documental
como técnicas de recolha da informação para o nosso estudo empírico.

5
Keywords Discipline and indiscipline in the classroom; socialization; teacher-student
relation; pedagogic practice; rules; deviations; sanctions.

abstract Not being a recent phenomenon, indiscipline in the classroom is today, along
with school failure and exclusion, a serious problem for Portuguese schools. It
is a phenomenon that is present in all aspects of the educational process and
presents itself as the great deficiency of the pedagogic process, endangering
student learning and contributing towards the great emotional and professional
instability of teachers. Teachers spend a significant amount of class time
ridding it of indiscipline and thus resulting in great physical and psychological
wear as well as permanent tension in the search and construction of a
relational climate which allows teachers to do their job. This Job, many times
inglorious, causes teachers to feel powerless, anxious, frustrated, and
abandoned and leads to tremendous stress and thus many times the desire to
escape these situations which are experienced.
The school itself, as an educational institution, is faced with a paradoxical
situation: the existence of a street culture and a culture moved by the media,
with special reference to television, not having found solutions that would allow
it to shoulder the competition and appoint strategies that are able to stimulate
and motivate students into adopting more assertive behaviour.
In this work, indiscipline in the classroom was studied. We attempted to identify
the misbehaviour that happens most frequently and how teachers address it.
Teachers and students experiment significant social situations at school and in
particular in the classroom. The teacher contributes towards the educational
and socialization education of a student and the student also plays a role in the
educational process of the teacher - establishing between them a marking
relational climate for their behaviour. With respect to this, we ask: what rules
apply in a classroom? Who defines them? How do teachers and students
position themselves with regards to discipline/ indiscipline? Who is the
undisciplined student? How is the undisciplined student seen by the teacher?
What do the students think about their own behaviour and their teachers’?
Several types of behaviour were observed in a classroom, with the most usual
being conversation and games. With regards to the behaviour considered to be
undisciplined, teachers act in different ways looking to sequentially eliminate it
through processes which are normally coercive and that go from reprehension
to student expulsion from the classroom.
From the methodological point of view, a study of a qualitative nature was
chosen where interviews and documental research such as information
gathering techniques for our empirical study were used.

6
Índice

Lista de Quadros .................................................................................................................. 11

Siglas utilizadas ................................................................................................................... 13

1- Questões e objectivos de investigação ............................................................................ 19

2- Motivos justificativos desta investigação ........................................................................ 20

3- Estrutura da dissertação................................................................................................... 21

PARTE I – QUADRO TEÓRICO ....................................................................................... 24

CAPÍTULO I - A INDISCIPLINA ..................................................................................... 25

Introdução ............................................................................................................................ 25

1- Clarificação conceptual ................................................................................................... 26

2- Explicação causal ............................................................................................................ 31

2.1. A indisciplina da responsabilidade do professor ...................................................... 32

2.2. A indisciplina da responsabilidade do aluno ............................................................ 35

3. As perspectivas de abordagem da indisciplina ................................................................ 40

3.1. Perspectivas psicológicas ......................................................................................... 41

3.1.1- Abordagem comportamentalista ....................................................................... 42

3.1.2- Perspectiva cognitivista ..................................................................................... 46

3.2- Perspectivas sociológicas ......................................................................................... 47

3.2.1- A perspectiva de reprodução social ................................................................... 48

3.2.2- Perspectiva interaccionista ................................................................................ 53

4- Alguns estudos sobre a indisciplina ................................................................................ 56

4.1. Estudos nacionais ..................................................................................................... 56

4.2. Estudos internacionais .............................................................................................. 57

7
CAPÍTULO II – ENQUADRAMENTO ORGANIZACIONAL DA DISCIPLINA /

INDISCIPLINA ................................................................................................................... 59

Introdução ............................................................................................................................ 59

1- A escola, uma organização específica ............................................................................. 61

2- A escola e a socialização dos alunos ............................................................................... 62

2.1 – O conceito de socialização ..................................................................................... 64

2.2 - Socialização e comportamentos desviantes............................................................. 66

3 - A sala de aula, principal espaço do processo educativo ................................................. 67

3.1- As interacções na sala de aula .................................................................................. 68

3.2- As relações de poder na sala de aula ........................................................................ 70

3.2.1- O conceito de poder .......................................................................................... 70

3.2.2- O poder do professor ......................................................................................... 72

3.2.3- O poder dos alunos ............................................................................................ 74

3.3- As estratégias na sala de aula ................................................................................... 76

3.3.1- As estratégias dos professores ........................................................................... 77

3.3.2- As estratégias dos alunos................................................................................... 79

3.4. Regras, desvios e sanções ......................................................................................... 82

3.4.1 A escola e as regras organizacionais .................................................................. 83

3.4.2. Desvios comportamentais e sanções.................................................................. 88

3.4.3. A função do castigo ........................................................................................... 89

CAPÍTULO III – A INDISCIPLINA À LUZ DOS NORMATIVOS LEGAIS.................. 94

1- Parecer nº 3/2002 do CNE ............................................................................................ 95

2- Lei 30/ 2002 .................................................................................................................... 99

3- Lei 3/2008 ..................................................................................................................... 102

4- Regulamento Interno da escola secundária com 3º ciclo das Tílias .............................. 104

8
PARTE II – ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ....................................... 112

CAPÍTULO IV - METODOLOGIA ................................................................................. 113

1- Metodologia .................................................................................................................. 113

2- O método: Estudo de Caso .............................................................................................. 114

3- Técnicas de recolha da informação ...................................................................................... 119

3.1. Documentos analisados .......................................................................................... 119

3.2- Entrevista ................................................................................................................ 120

3.2.1- Critérios para a selecção dos entrevistados ....................................................... 122

4- Tratamento da informação: a Análise de Conteúdo ........................................................ 127

5. Caracterização da escola secundária com 3º ciclo das Tílias ........................................ 130

5.1- Um pouco de História ............................................................................................ 130

5.2. O meio envolvente .................................................................................................. 131

5.3. O ambiente interno ................................................................................................. 134

CAPÍTULO V – ANÁLISE DOS DADOS ....................................................................... 139

1- Um primeiro olhar sobre a indisciplina na escola das Tílias......................................... 139

1.1- Manifestações de indisciplina / sexo ...................................................................... 140

1. 2- Manifestações de indisciplina / ano de escolaridade ............................................. 143

1. 3- Manifestações de indisciplina / reincidência ......................................................... 145

1.4- Indisciplina versus culpa e arrependimento ........................................................... 148

2- O ambiente disciplinar na sala de aula .......................................................................... 150

2.1- Comportamentos indisciplinados ........................................................................... 151

2.2- Causas da indisciplina na sala de aula .................................................................... 156

2.2.1- As percepções dos alunos................................................................................ 156

2.2.2- As percepções dos Professores ........................................................................ 161

2.3- As regras na sala de aula ........................................................................................ 168

9
2.3.1- Os alunos e as regras na sala de aula ............................................................... 169

2.3.2- Os professores e as regras na sala de aula ....................................................... 172

2.4- As medidas disciplinares ........................................................................................ 177

2.4.1- Os alunos e as sanções disciplinares ............................................................... 178

2.4.2- Os professores e as medidas disciplinares ...................................................... 186

2.5- Os órgãos de gestão e a indisciplina na escola ....................................................... 192

2.5.1- Gestão Intermédia - o papel do Director de Turma ......................................... 192

2.5.2- Direcção Executiva – o papel do Presidente do Conselho Executivo ............. 194

CONCLUSÕES E REFLEXÃO FINAL ........................................................................... 198

BIBLIOGRAFIA GERAL................................................................................................. 209

ANEXOS ........................................................................................................................... 217

10
Lista de Quadros

Quadro I - Tipologias do poder do professor segundo Ribeiro & Bregunci……………………… 74

Quadro II - Tipologias do poder do professor segundo Formosinho………………………………... 74

Quadro III - As estratégias dos professores segundo Nizet e Hiernaux……………......................... 78

Quadro IV - As estratégias dos professores segundo Peter Woods…………………………………… 80

Quadro V - As estratégias dos alunos segundo Nizet e Hiernaux…………………............................. 81

Quadro VI - As estratégias dos alunos segundo vários autores………………………………………… 82

Quadro VII - Comportamentos de indisciplina segundo o sexo e ano / turma…………………….. 125

Quadro VIII - Caracterização dos alunos entrevistados……………………………………………………… 127

Quadro IX - Caracterização dos docentes entrevistados……………………………................................ 127

Quadro X - Categorias comportamentais……………………………………………………………………….. 130

Quadro XI - Sectores de Actividade 1991-2001……………………………………………………………….. 133

Quadro XII - População Residente, censos 1991 / 2001……………………………………………………. 134

Quadro XIII - Áreas e cursos de oferta da escola no Ensino Secundário……………………………….. 137

Quadro XIV - Pessoal docente da escola (Ano Lectivo de 2007/2008)……………………………… 138

Quadro XV - Pessoal não docente da escola (Ano Lectivo de 2007/2008)…………....................... 138

Quadro XVI - População escolar (Ano Lectivo de 2007/2008)…………………………………………… 139

Quadro XVII - Caracterização dos alunos do 3º ciclo do Ensino Básico……………….......................... 140

Quadro XVIII - Manifestações de indisciplina em função do sexo……………………............................... 143

Quadro XIX - Manifestações de indisciplina em função do ano de escolaridade…………………... 146

Quadro XX - Manifestações de indisciplina / reincidências (7º, 8º, 9º)……………………………… 147

Quadro XXI- Manifestações de indisciplina / culpa e arrependimento………………………………. 149

Quadro XXII - Comportamentos mais praticados na sala de aula, segundo os alunos……………. 153

Quadro XXIII - Comportamentos mais praticados na sala de aula, pelos respondentes………….. 154

Quadro XXIV - Comportamentos mais praticados na sala de aula, segundo os professores……. 155

11
Causas dos comportamentos indisciplinados na sala de aula, segundo os
Quadro XXV - alunos………………………………………………………………………………………………….... .….. 158
Causas dos comportamentos indisciplinados na sala de aula, segundo os
Quadro XXVI- professores…………………………………………………………………………………………………… 163

Quadro XXVII - Posicionamento dos alunos entrevistados acerca das regras na sala de aula……. 170

Quadro XXVIII- Regras mais definidas na sala de aula, segundo os alunos entrevistados………….. 173
Posicionamento dos professores entrevistados acerca das regras na sala de
Quadro XXIX- aula………………………………………………………………………………………….................... 174
Regras mais definidas na sala de aula, segundo os professores
Quadro XXX- entrevistados ………………………………………………………………………………………………. 175
Medidas disciplinares utilizadas pelos professores na sala de aula,
Quadro XXXI- segundo os alunos entrevistados…………………………………………………………………… 180

Quadro XXXII- Percepção dos alunos entrevistados sobre os castigos na sala de aula……………... 181

Quadro XXXIII- Influência dos castigos no relacionamento com os professores………………………. 183


Castigo e hábitos de bom comportamento, segundo os alunos
Quadro XXXIV- entrevistados………………………………………………………………………………………………… 185
Posicionamento dos professores entrevistados acerca das sanções
Quadro XXXV- aplicadas na sala de aula para resolver os problemas de indisciplina……………. 188
Quadro XXXVI Medidas disciplinares utilizadas pelos professores na sala de aula………………. 189
Efeitos das sanções sobre os hábitos de bom comportamento dos
Quadro XXXVII- alunos, segundo os professores entrevistados…………………………………………….. 191
Meios utilizados pelos professores para participarem os comportamentos de
Quadro XXXVIII- indisciplina na sala de aula aos directores de turma…………………………………….. 194

12
Siglas utilizadas

Al 1 – Aluno 1

Al 2 – Aluno 2 (…)

CEF – Cursos de Educação e Formação

CNE – Conselho Nacional de Eucação

DR – Diário da República

DT1 – Director de Turma 1

DT2 – Director de Turma 2 (…)

P1 – Professor 1

P2 – Professor 2 (…)

PCE – Presidente do Conselho Executivo

RI – Regulamento Interno

13
Introdução

“Os moços” são especialistas num ressentimento amordaçado que evita sempre o confronto aberto.
Dispostos na aula tão perto do grupo quanto lhes é possível, mantêm um contínuo arrastar de
cadeiras, um resmungar mal-humorado à mínima exigência e uma agitação constante, em que se
exploram todos os modos possíveis de se estar sentado ou deitado na cadeira. Durante as sessões
de estudo, alguns demonstram claramente o seu desdém adormecendo aparentemente com a
cabeça sobre a carteira, outros põem-se de costas voltadas a olhar pela janela ou de um modo vago
para a parede… Há um sussurro permanente de conversas, como uma onda inevitável sobre a areia
seca, e vê-se por toda a parte um revirar de olhos ou ouvem-se murmúrios exagerados de segredos
conspiratórios… Nos corredores, há um andar arrastado, um “olá” demasiado amigável ou um
silêncio súbito, quando passa o director de turma. Irrompem de gargalhadas irónicas ou insanas
que podem ser ou não sobre alguém que passa. É tão humilhante parar como continuar a andar…
A oposição à escola manifesta-se principalmente na luta para retirar espaço simbólico e físico à
instituição e às suas regras e para derrotar o seu principal objectivo conhecido: pô-los a
“trabalhar”.

(Paul Willis, citado por Giddens 1997, p.520)

A sociedade actual é uma sociedade organizada e composta por pequenas


organizações onde nos inserimos, contribuindo para dar vida a essas organizações. Teixeira
(1995: 4), reportando-se ao pensamento de Etzione diz-nos: “nascemos em organizações,
quase todos os momentos de cada um dos nossos dias são vividos em organizações, os
serviços que utilizamos e os bens que consumimos são-nos fornecidos por organizações e
no momento da nossa morte é, ainda, uma organização que há-de autorizar o nosso
enterro.”
O homem é um ser eminentemente social. A sua vida encarada, sob o ponto de vista
individual, seria incomportável pois não conseguiria satisfazer um grande número das suas
necessidades, mesmo as mais primárias. Daí a necessidade que ele sente de se relacionar
com outros homens, integrando-se em grupos ou organizações que, por sua vez, se incluem
numa organização mais vasta que é a sociedade.
Segundo Rousseau, citado por Alves & Borges (1994: 53), “todas as estruturas
organizacionais, entendidas como o relacionamento entre dois ou vários elementos, são

14
potencialmente conflituais; o conflito está, por isso, sempre presente na organização; é a
ausência do conflito que é o estado de excepção”.
A escola é uma organização social onde diversos actores se relacionam no seu dia-
a-dia. O funcionamento de qualquer organização traz, implícita, a questão do conflito e da
indisciplina, inerente às inúmeras interacções que se processam no seu seio, porque
qualquer relação, por mais pacífica que seja, pode, a qualquer momento, transformar-se
numa fonte de conflitos, uma vez que segundo Horton e Hunt (1981: 257), “O processo de
conflito... desenvolve-se sempre que uma pessoa ou grupo procura obter uma
recompensa”, ou, no dizer de Alves & Borges (1994: 9), “para existir conflito, existem
sempre dois grupos de exigências: objectivos ou motivos que são incompatíveis”.
O conflito pode assumir naturezas diversas. Referimos apenas dois tipos que estão
mais dentro do âmbito do nosso trabalho – o conflito intrapessoal e o conflito entre
indivíduos. O primeiro desenvolve-se dentro do mesmo indivíduo e, como afirma Alves &
Borges (1994: 6) “os conflitos dentro de nós são parte fundamental da vida humana”, “nós
temos que por vezes decidir entre desejos que podem divergir em direcções opostas” ou
“poderá haver um conflito entre desejos e obrigações”. E continua: “podemos estar ainda
em conflito entre dois grupos de valores: dividir-nos entre o ir defender a pátria, mas
acreditar também nas nossas responsabilidades perante a família”. O segundo acontece
quando dois indivíduos, ou dois ou mais grupos, pertencentes à mesma organização têm
objectivos diferentes ou diferentes personalidades. É normal encontrarmos este tipo de
conflito nas escolas, por exemplo, quando o professor pretende transmitir conteúdos e o
aluno não está receptivo aos mesmos e tenta boicotar o seu trabalho.
Podemos, assim, concluir acerca do conflito que ele resulta da incompatibilidade de
objectivos e interesses e envolve na sua dinâmica pessoas e grupos, podendo manifestar-se
de várias formas - pode ser conflito individual, envolvendo uma só pessoa, ou envolver
várias pessoas integradas ou não em organizações.
Em muitas das nossas escolas é frequente encontrarmos situações que se
enquadram no contexto do que anteriormente dissemos. Sempre que existam conflitos, os
comportamentos dos elementos que interagem na organização (no caso das escolas o
número de actores em interacção é muito elevado e muito diversificado) afastam-se da
normalidade, provocando desvios que levam, muitas vezes, a situações de indisciplina ou
até de violência.

15
É frequente, também, ouvirmos alguns professores dizerem que os alunos de hoje já
não são como os de há uns anos atrás. Queixam-se da dificuldade em manter uma ordem
na aula que permita a aprendizagem. Frequentemente, afirmam que grande parte dos
alunos tem uma crescente vontade de desrespeitar regras estabelecidas, o que os leva a
enveredarem por comportamentos desviantes ou indisciplinados.
A indisciplina na escola é um problema tão antigo como a própria escola e já em
tempos recuados constituía motivo de preocupação e levava os pedagogos a tentar manter a
disciplina. Clara Freire da Cruz (2003: 30) diz-nos que no século XVII Coménio, um dos
principais pedagogos da Reforma, na sua obra “Didáctica Magna – Tratado da Arte
Universal de Ensinar tudo a todos” privilegiou a disciplina escolar no processo de
socialização das crianças e jovens. Para este pedagogo,

“ Uma escola sem disciplina é um moinho sem água.


Efectivamente, assim como se tira a água a um moinho, ele pára necessariamente, assim também, se
na escola falta a disciplina tudo afrouxa. Do mesmo modo, se um campo não é sachado, logo nele
nascem cizânia e outras ervas daninhas; se as árvores não são podadas, tornam-se selvagens e
lançam rebentos inúteis. Daqui não se segue que a escola deva estar cheia de gritos, de pancadas e
de varas, mas cheia de vigilância e de atenção, da parte dos professores e da parte dos alunos. Com
efeito, que é a disciplina senão um processo adequado de tornar os discípulos verdadeiramente
discípulos?”

Conclui-se, assim, que indisciplina sempre houve ao longo dos tempos. Contudo,
actualmente, as suas manifestações são mais frequentes e parecem estar a subir em
escalada. Este fenómeno afecta as escolas básicas, secundárias e mesmo algumas escolas
do 1° ciclo ou até do pré-escolar, com particular destaque para as das grandes cidades,
sobretudo as que se localizam junto de bairros degradados ou com problemas sociais
graves.
Como explicar estas mudanças?
A democratização do ensino, promovida em Portugal com a Revolução de Abril de
1974 e o consequente alargamento da escolaridade obrigatória para nove anos, fez
aumentar o número de alunos, provocando a massificação1 das escolas e a inerente

1
A este propósito João Formosinho (1992: 36) escreve que “a complexificação da actual escola de massas
deriva, à primeira vista, do mero crescimento rápido dos efectivos discentes e docentes que deu origem a
unidades organizacionais gigantes. Mas tal complexidade deriva também, e principalmente, de aspectos mais
profundos, de aspectos qualitativos – da própria heterogeneidade humana da escola de massas”

16
heterogeneidade social (as escolas portuguesas passaram a incluir alunos que, até aí,
poucas possibilidades tinham de as frequentar e que trouxeram para a escola modelos
culturais diversificados), o que tem tornado mais complexa e imprevisível a actividade
docente, tem gerado situações de indisciplina e colocou sérios problemas à construção de
uma ordem democrática, cívica e participativa. Muitos destes alunos encaram a escola
como um dever, uma imposição, uma fonte de insatisfação e incertezas. Consequência
evidente deste processo foi a degradação progressiva do ambiente escolar e a deterioração
da autoridade dos professores. Este desequilíbrio originou a proliferação de práticas
perturbadoras da convivência e do bom ambiente escolar. Actos de indisciplina,
frequentemente expressos em agressividade e violência, acentuam em muitas escolas um
generalizado sentimento de insegurança e de impunidade.
Por outro lado, a evolução registada nas estruturas familiares, nos meios de
comunicação social - com especial relevo para o papel da televisão e da internet2 - e na
própria composição da sociedade portuguesa, com o crescente número e importância das
comunidades imigrantes, dos países de expressão portuguesa e dos países de leste,
portadoras de contributos decisivos de diferenciação social e cultural, permite avaliar a
extensão e complexidade dos desafios que se colocam à instituição escolar.
Manuel Matos enfatiza as alterações ocorridas no seio da escola por força dos
novos tempos. À crescente autonomização das relações entre o Estado e a sociedade civil
corresponde um aumento das lógicas conflituais que se fazem sentir dentro da escola:

“A escola reflecte directamente esta realidade e, mais do que isso, potencia-a e exacerba-a nos seus
aspectos mais contraditórios e explosivos, dado que nela convivem ou, pelo menos, coexistem todos
os estratos sociais e não apenas aquela fracção social e cultural mais próxima dos valores
tradicionais da Escola” (Matos, 1996: 81)

Sobre esta situação se pronuncia também Jesus (1999: 31) dizendo que:

“Sobretudo nos últimos anos, tem-se verificado um aumento da frequência e da gravidade das
situações de violência nas escolas e de indisciplina dos alunos na sala de aula, nomeadamente das
agressões verbais e físicas entre os alunos e destes aos professores e funcionários, fomentando um
clima de medo e insegurança entre os alunos, sobretudo os mais novos e disciplinados”.

2
Não nos esqueçamos que num passado recente a escola, para uma grande parte dos alunos, era a única via
de conhecimento de um mundo relativamente ao qual dispunham de muito pouca informação. Hoje, os meios
de comunicação de massa fornecem aos jovens um manancial de informações tão vasto, que fica
radicalmente prejudicada uma parte da novidade que antes havia na aprendizagem escolar.

17
A “nova” Escola suscitará respostas adequadas ao seu tempo histórico, que se
consubstanciarão nas diferentes formas de abordagem a nível micro (gestão do professor
na sala de aula) ou meso (gestão da escola aos diferentes níveis), pois estudos recentes têm
dado conta dos efeitos negativos que a indisciplina produz nas escolas, com particular
incidência nos alunos e professores, considerando-a como um dos problemas mais graves
de hoje nos países industrializados. Em Portugal, começa a atingir níveis preocupantes,
nomeadamente nos meios urbanos mais populosos. Professores e alunos sentem, cada vez
com mais frequência, os efeitos negativos da indisciplina. Esta tem-se tornado factor de
stress, de angústia, de preocupação e de mal-estar dos professores, dificultando as boas
aprendizagens.

“É importante a análise deste tema na actualidade, pois, de acordo com os resultados obtidos em
diversas investigações, a indisciplina dos alunos constitui o principal factor de stress para muitos
professores” (Jesus, 1999: 31).

O mesmo autor complementa afirmando que

“São cada vez mais graves e frequentes as situações de indisciplina na escola, inviabilizando toda
a planificação das aulas e a qualidade do processo de ensino-aprendizagem pretendida pelos
professores” (Afonso et al., 1999: 42).

Neste contexto, o controlo disciplinar na sala de aula torna-se uma das tarefas mais
difíceis com que o professor se depara (Domingues, 1992: 153), ao qual este tem que
responder prontamente, muitas vezes sem ter preparação para tal. E se, em tempos mais
recuados, a eficácia do professor no processo de ensino-aprendizagem assentava apenas no
plano cognoscitivo, hoje, o sucesso do docente centra-se também, e essencialmente,
diríamos nós, na relação pedagógica que ele consegue estabelecer com os alunos.
Maria Teresa Estrela (1986: 15), uma das principais investigadoras da temática da
indisciplina na escola e em contexto de sala de aula, diz-nos que “o conceito de
indisciplina define-se por oposição ao conceito da disciplina, sendo a sua essência lógica
definida como privação ou negação”.
A mesma autora (1986: 16) refere ainda que

“toda a educação visa a inserção do indivíduo numa sociedade que se quer ordenada e
harmoniosa, ou seja, disciplinada (o que pressupõe também a existência dos meios necessários

18
para a manutenção da ordem). A disciplina social torna-se, assim, uma das finalidades mediatas da
educação, sendo a disciplina educativa, o meio para atingi-la. Esta disciplina que se exerce de
modo imediato sobre o indivíduo, apresenta-se, assim, como um objectivo e como um meio da sua
educação, pois ela exige sob pena de punição, a aprendizagem gradual das regras de conduta e dos
comportamentos que elas prescrevem. Além da sua função social, em geral, estes comportamentos
regrados favorecem as condições das situações educativas satisfazendo os seus objectivos,
revelando, assim, também, uma função educativa”.

1- Questões e objectivos de investigação

Qualquer investigação deve partir de um problema ou questão que se queira


esclarecer ou investigar. Podemos escolher um assunto que ignoremos completamente ou,
simplesmente, desejar melhorar o nosso conhecimento acerca de temas do nosso interesse
pessoal e com os quais nos confrontemos no nosso dia-a-dia. Porém, “a melhor
investigação sociológica parte de problemas que também constituem enigmas” (Giddens,
1997: 795), entendendo o autor por enigma “não apenas uma falta de informação” mas
uma “lacuna no nosso entendimento”. Este tipo de investigação procura esclarecer as
razões que levam a que um determinado acontecimento ocorra desta forma e não de
outra, não aceitando aquilo que os acontecimentos possam parecer à primeira vista, o que
o senso comum nos transmite.
Após uma primeira abordagem bibliográfica sobre a problemática em estudo parece
claro que a indisciplina escolar é uma das grandes preocupações dos professores e outros
agentes com responsabilidades na educação. Conclui-se, assim, que os comportamentos
indisciplinados são um fenómeno cada vez mais vivenciado nas nossas escolas,
apresentando-se como fonte de stress nas relações interpessoais, particularmente quando
associados a situações de conflito em sala de aula e dificultadores das aprendizagens e
socialização dos alunos.
Serão os comportamentos indisciplinados na escola, e mais concretamente na sala
de aula, da exclusiva responsabilidade dos alunos? Ou a actuação dos professores na sala
de aula terá relação directa com a indisciplina dos alunos? As condições oferecidas pela
escola poderão propiciar a irrupção de comportamentos indisciplinados? Ou será a
indisciplina na sala de aula resultado de vários factores conjugados? Que estratégias são
utilizadas para manter a disciplina na sala de aula?

19
Estas são algumas interrogações que nos impelem para esta investigação e nos
ajudarão a compreender melhor o fenómeno em estudo, com vista a uma melhor actuação
relativamente ao micro cosmos que é a sala de aula. Para o efeito, definimos um conjunto
de objectivos, que a seguir se apresentam, orientadores do trabalho e para os quais se
procurou elucidação com a investigação empírica efectuada numa escola secundária, onde
se lecciona também o terceiro ciclo do ensino básico.
1. Registar os comportamentos que ocorrem com mais frequência na sala de aula;
2. Identificar as razões que levam os alunos a ter comportamentos de indisciplina na
sala de aula;
3. Ver nas interacções da sala de aula a possibilidade do surgimento de
comportamentos inadequados;
4. Questionar se a actuação dos professores na sala de aula tem relação directa com a
ocorrência de comportamentos de indisciplina por parte dos alunos;
5. Avaliar a importância do estabelecimento de normas e regras de conduta na
prevenção/superação dos comportamentos de indisciplina;
6. Elencar os procedimentos pedagógicos utilizados pelos professores na sala de aula
para resolver os problemas dos alunos com comportamentos de indisciplina;
7. Avaliar a importância das sanções como factor dissuasor de comportamentos de
indisciplina na sala de aula;
8. Avaliar a intervenção dos órgãos de gestão dos estabelecimentos de ensino na
prevenção/resolução dos problemas disciplinares.

2- Motivos justificativos desta investigação

A questão da (in)disciplina nas escolas é familiar para todos aqueles que estão
envolvidos no processo educacional. Professores e alunos de todas as épocas,
possivelmente, guardarão na lembrança episódios relacionados com prémios e castigos na
escola.
Ao iniciarmos uma carreira como docentes estávamos longe de imaginar que o
ensino nos reservaria, nos primeiros anos, algumas surpresas. Com uma preparação
essencialmente teórica numa área disciplinar específica, fomos gradualmente confrontados
com ambientes de sala de aula, onde acontecem interacções de natureza diversa, umas

20
bastante gratificantes e outras nem por isso. Algumas situações de cariz disciplinar
provocaram situações desagradáveis, pondo a nu a falta de preparação para lhes fazer
frente. Começámos, a partir daí, a ter noção de que a nossa preparação, como futuros
professores, apresentava algumas lacunas. Essa situação levou-nos a procurar algumas
leituras e frequentar algumas acções de formação que nos ajudassem a minorar essa falta.
Assim, a reflexão sobre a experiência profissional como professor e Director de
Turma e porque os contactos com os problemas disciplinares foram e continuam a ser
muito sentidos, aguçou o interesse pelas questões da disciplina/indisciplina, a vontade de
as aprofundar, tendo, no entanto, consciência de que muito há para descobrir e aprender no
que se refere à sala de aula - palco de um complexo jogo de interacções - e onde, não raras
vezes, têm lugar comportamentos ditos indisciplinados. Procurar-se-á, assim, responder a
algumas inquietações pessoais e, eventualmente, contribuir para esclarecer alguns aspectos
da indisciplina na sala de aula, caso particular que irá ser objecto deste estudo.

3- Estrutura da dissertação

Em termos estruturais, a dissertação será constituída por duas partes, antecedidas de


uma introdução geral.
A primeira parte, o enquadramento teórico-normativo, é constituída por três
capítulos.
No primeiro capítulo, faz-se uma abordagem teórica às questões da
disciplina/indisciplina, visto que os problemas de indisciplina têm sido estudados segundo
diversos enquadramentos teóricos.
Iniciaremos o capítulo, apresentando o conceito de indisciplina, contrapondo-o ao
de disciplina. Serão também apresentadas diferentes abordagens que procuram analisar o
problema, perspectivando uma diversidade de factores que concorrem para a indisciplina.
Numa segunda fase, apresentamos o quadro teórico sobre as diversas perspectivas
de análise da indisciplina, nomeadamente as perspectivas psicológicas, sociológicas e
pedagógicas.
Os comportamentos indisciplinados do aluno, enquanto indivíduo, têm sido objecto
de estudo de perspectivas psicológicas. Nesta perspectiva, o aluno é apresentado como o

21
principal responsável pelos comportamentos indisciplinados, que resultarão de
características que lhe são inatas ou de patologias.
A Sociologia, e em particular a Sociologia da Educação, revela-se, também,
importante para a análise dos problemas disciplinares, ao considerar aspectos exteriores ao
aluno e que se prendem com questões institucionais e decorrentes do funcionamento da
escola e da sociedade.
As perspectivas pedagógicas mostram concepções e quadros de acção estratégica
para a função organizativa do professor, à qual não são alheias a planificação das aulas, a
organização do espaço e o estabelecimento e a utilização adequada das regras.
Outras abordagens, como o interaccionismo, evidenciam as relações que se
estabelecem entre professores e alunos na sala de aula, salientando a importância
desempenhada pelo processo de comunicação.
No segundo capítulo, aborda-se, de forma sucinta, a escola como organização,
detendo-nos mais pormenorizadamente na sala de aula, espaço de interacções diversas.
Depois de procedermos à abordagem da indisciplina, na sua relação com a socialização,
faz-se uma breve análise da problemática das relações de poder que se estabelecem na sala
de aula entre professor e alunos, bem como das diferentes estratégias de que se socorrem
ambas as partes em interacção.
No terceiro capítulo, à laia de introdução, faz-se um balanço sucinto do parecer nº 3
de 2002 do Conselho Nacional da Educação. Na sequência deste documento, faz-se uma
análise das questões da indisciplina com base nos normativos legais, dando-se destaque à
Lei 30/2002 de 20 de Dezembro, Estatuto dos Alunos do Ensino não Superior, que
regulamenta os procedimentos disciplinares a adoptar pelas escolas; a Lei 3/2008, de 18 de
Janeiro, que introduziu alterações ao diploma anterior e o Regulamento Interno da Escola
Secundária com terceiro ciclo do Ensino Básico das Tílias.
Na segunda parte, constituída por dois capítulos, descreve-se a metodologia da
investigação e faz-se a apresentação dos resultados do trabalho empírico.
O primeiro capítulo, metodologia da investigação, explica o método utilizado no
estudo e as técnicas de recolha de dados. Privilegiou-se a utilização dos métodos
qualitativos em detrimento dos métodos quantitativos, não obstante o recurso a análises
estatísticas, quando as mesmas se justificaram. O método utilizado foi o estudo de caso. A
recolha dos dados foi feita através de entrevistas semi-estruturadas, aplicadas a alunos e

22
professores, e análise de documentos disponibilizados pelos órgãos de gestão da escola.
Para o tratamento da informação utilizámos a análise de conteúdo. Neste capítulo, faz-se
ainda uma caracterização interna e externa da escola onde se realizou o estudo empírico.
O segundo capítulo apresenta a análise empírica dos dados e as conclusões gerais
do estudo.

23
PARTE I – QUADRO TEÓRICO

24
CAPÍTULO I - A INDISCIPLINA

Introdução

" São várias as escolas onde se fala dos vidros partidos e paredes riscadas,
muitas queixam-se da "violência" dos alunos entre si e algumas relativamente aos
professores e pessoal auxiliar e a maioria refere os distúrbios na sala de aula que, ainda
que não em níveis preocupantes, impedem o professor de transmitir todos os seus
saberes. Na referência às situações em geral e aos alunos em particular são frequentes
expressões como "não têm respeito por ninguém", "falta-lhes boas maneiras", "não se
sabem comportar como deve ser" ou então "não sabem aguardar sossegados pelos
professores.”
(Vale e Costa 1994: 256)

A situação descrita é por demais conhecida de todos aqueles que se encontram


ligados ao sistema de ensino e que exercem efectivamente a docência nas nossas escolas e
constitui a preocupação central de professores, pais e educadores, sendo mesmo apontada
pelos professores como o problema que mais sentem e mais os afecta.
“Indisciplina”, “mau comportamento”, “irreverência”, “falta de respeito” são
palavras e expressões que habitualmente se ouvem na sala de professores, nos corredores,
enfim, na escola, pronunciadas por professores, auxiliares da acção educativa e outros
agentes do processo educativo. Elas constituem, sem dúvida, a grande preocupação de
todos os que se encontram ligados ao ensino, porque condicionam e afectam o normal
funcionamento da escola em geral e das aulas em particular. São, contudo, os principais
implicados no processo ensino/aprendizagem – os professores e os alunos3 que sentem
mais intensamente os efeitos dos comportamentos indisciplinados e, certamente, já sobre
eles reflectiram, mas nem sempre conseguiram explicações e respostas: problemas dos
alunos? Dos professores? Outros?
A indisciplina, que inequivocamente existe e provoca desequilíbrios importantes ao
normal funcionamento do grupo/turma e das escolas em geral, é normalmente atribuída aos

3
A nossa experiência como professor mostra-nos que muitos alunos, sobretudo os que têm objectivos bem
definidos em termos de estudos, sentem os efeitos dos comportamentos indisciplinados na sala de aula e os
reprovam, intervindo, por vezes, no sentido de chamarem à atenção os colegas que se desviam ou não
cumprem regras estabelecidas.

25
alunos que chegam à escola «marcados» por problemas familiares, económicos, sociais,
raciais, étnicos, de insucessos repetidos, etc. (Estrela, 1991: 33). Contudo, as causas da
indisciplina ultrapassam o universo dos alunos e centram-se, por vezes, na actuação dos
próprios professores, funcionários e outros agentes responsáveis pelas escolas. Este
problema leva a uma análise sobre a formação dos agentes educativos, sobretudo os que
contactam directamente com os alunos – professores dentro e fora da sala de aula e
auxiliares da acção educativa em toda a escola. Também as carências materiais dos
estabelecimentos de ensino, nomeadamente equipamentos didácticos, poderão contribuir
para gerar ou agravar situações de indisciplina.
Num grupo/turma indisciplinado todos os alunos, bem comportados ou não, têm a
perder: não conseguem apreender os conhecimentos que o professor pretende transmitir o
que se reflectirá, indubitavelmente, no sucesso ou insucesso da aprendizagem. Neste
contexto, alunos, que no seu percurso instrutivo não consigam adquirir uma sólida
formação escolar, técnica ou profissional, dificilmente conseguirão integrar-se, sem
problemas, no mundo do trabalho ou na sociedade em geral e a sua socialização pode ficar
irremediavelmente afectada. Casos haverá, certamente, em que alunos com graves
problemas de indisciplina, na escola, poderão enveredar pelo caminho da delinquência,
fora dela (Estrela, idem: 29).
A indisciplina na sala de aula afecta também o desempenho dos professores. Em
turmas indisciplinadas, os docentes vêem-se obrigados a adoptar atitudes pouco
consentâneas com a sua função de formadores/educadores, o que, por vezes, lhes provoca
situações de mal-estar, «stress» e os deixa psicologicamente afectados: são os conteúdos
programáticos que não são integralmente cumpridos, é a relação pedagógica que não
funciona, é a sua própria autoridade como professor e como adulto que é posta em causa
por «miúdos» irreverentes e desafiadores (ibidem: 30).

1- Clarificação conceptual

O conceito de indisciplina é, como já anteriormente se disse, usado habitualmente


nas escolas pelos diversos intervenientes no processo educativo. Contudo, não é um
conceito de fácil definição porque é susceptível de múltiplas interpretações. A maior
dificuldade na sua clarificação resulta, por um lado, do facto de não se lhe poder atribuir

26
uma significação sem o integrar num determinado contexto, isto porque actores diferentes
podem percepcioná-lo de forma também diferente, ainda que dentro do mesmo contexto
(Magalhães, 1992: 12) e, por outro, porque este conceito é, por vezes, confundido ou
sobreposto com outros. Termos como indisciplina, irreverência, incivilidade, agressividade
ou violência podem sobrepor-se ou confundir-se e gerar, consequentemente, reacções
múltiplas. Vale & Costa (1994: 256) referem que a este respeito nos situamos “num terreno
em que as fronteiras são ténues e extremamente lábeis, principalmente porque mediadas
por variáveis de um enorme idiossincrasismo.”
Determinados comportamentos parecem, pois, assumir conotações diferentes sendo,
deste modo, difícil especificar com precisão quais os que são considerados de indisciplina.
Por exemplo, enquanto para alguns professores determinado comportamento é considerado
indisciplinado, para outros, pode ser apenas um excesso de vitalidade, uma manifestação
própria da idade ou do meio de proveniência. Por outro lado, os professores parecem tomar
diferentes atitudes face aos comportamentos que consideram de indisciplina, o que pode
dificultar aos alunos a percepção de quais desses comportamentos são considerados
indisciplinados. Se numa turma um professor sanciona negativamente um determinado
comportamento e outro professor não sanciona da mesma forma esse mesmo
comportamento, esta atitude deixa os alunos confusos, dificultando-lhes a percepção sobre
o que deve ou não deve ser considerado como comportamento de indisciplina. Assim,
pensamos que se deve ter algum cuidado na rotulagem dos comportamentos indisciplinados
até porque se corre o risco de atribuir rótulos de indisciplinados aos alunos que pratiquem
esses comportamentos, contribuindo desta forma para a criação de estigmas sociais.
Pensamos, portanto, justificar-se, em primeiro lugar, a clarificação do conceito
disciplina e, por inerência, o de indisciplina, por se tratarem dos conceitos fundamentais do
nosso trabalho.
Estrela (1992: 15), por exemplo, salienta o “carácter polissémico” destes dois
vocábulos, referindo que “o conceito de indisciplina se relaciona intimamente com o de
disciplina e tende normalmente a ser definido pela sua negação ou privação ou pela
desordem proveniente da quebra das regras estabelecidas”. Neste contexto, a indisciplina
surge como negação da disciplina.
Daniel Sampaio (1998: 5) reflectindo em torno desta dicotomia, salienta que “para se
compreender o que é indisciplina, a escola tem de entender-se primeiro sobre a disciplina, isto

27
é, sobre o conjunto de comportamentos que considera aceitáveis, sob o ponto de vista
pedagógico e social, para aquelas pessoas, naquele contexto”.
Lourenço (2003: 1) refere que “na escola, como em qualquer estrutura social, os conceitos
de disciplina e indisciplina estão associados à necessidade dos seus elementos se nortearem
por regras e normas de conduta e de acção que proporcionem a integração de cada pessoa no
grupo-turma e na organização escolar em geral”.
Amado (2001: 167) diz que quando falamos de indisciplina, estamos perante “um
daqueles conceitos tão vagos e extensos que, se não for prévia e operatoriamente definido,
tanto pode referir-se a uma realidade merecedora de elogios, como expressar um daqueles piores
males da sociedade contemporânea, dignos de condenação e combate.” Acentua, ainda, que por
indisciplina deve entender-se “o incumprimento de regras de trabalho ou «exigências
instrumentais» que enquadram os comportamentos dentro do espaço da aula, impedindo ou
dificultando a obtenção dos objectivos de ensino-aprendizagem. A esse incumprimento
deve acrescentar-se, ainda, o desrespeito das exigências morais, isto é, das regras, normas e
princípios, explícitos ou não, que fazem parte do património supostamente comum a uma
determinada sociedade e que estabelecem os deveres e os direitos dos cidadãos no seu
relacionamento social”.
Para Jesus (1999: 31), “a indisciplina dos alunos integra todos os comportamentos e
atitudes que estes apresentam como perturbadores e inviabilizadores do trabalho que o professor
pretende realizar”.
Silva (2001: 9) recorre a uma definição mais directa e incisiva pois preconiza que “a
indisciplina nos remete para a violação de normas estabelecidas o que, em contexto escolar,
impede ou dificulta o decorrer do processo de ensino-aprendizagem”. Na mesma linha de
pensamento podemos citar Magalhães (1992: 12) para quem a indisciplina deverá ser
encarada como “negação de qualquer coisa, seja uma norma ou padrão socialmente aceite
ou uma regra arbitrariamente imposta.”
Hargreaves (1978) vê a indisciplina como um processo de categorização, de
atribuição a alguém ou a uma determinada situação da categoria de indisciplinado.
Podemos completar o pensamento deste autor com o de Fontana (1996), que considera que
falar a despropósito, evitar o trabalho, levantar-se do lugar sem pedir e obter prévio
consentimento, dizer uma asneira, conversar com o colega de lado, fazer barulho, não ser
pontual, quebrar regras estabelecidas, podem configurar situações de indisciplina se assim

28
forem consideradas pelos actores sociais em presença, ou seja, se a categoria “indisciplina”
for atribuída à situação (Carita, 1997: 17).
Veiga (1995: 45), utilizando a expressão “disrupção escolar” em vez de
indisciplina4, aceita como conceito de “comportamento escolar disruptivo” “aquele que
vai contra as regras escolares, prejudicando as condições de aprendizagem, o ambiente
de ensino ou o relacionamento das pessoas na escola”. O autor baseou-se na noção de
“comportamento disruptivo” extraída de Lawrence e outros, que o definiram como o
“comportamento que interfere seriamente com o processo de ensino e/ou altera
gravemente o funcionamento normal da escola. Além do habitual mau comportamento
na aula, no recreio, nos corredores…, inclui os ataques físicos e a destruição intencional
da propriedade” (idem: 44).
Outras definições poderiam ser apresentadas e delas extrairíamos, certamente, os
mesmos pontos comuns: a indisciplina remete-nos para a violação de normas (formais ou
informais) estabelecidas, o que, em contexto escolar, sobretudo em sala de aula, impede ou
dificulta o decorrer do processo de ensino-aprendizagem. Podemos concluir, também, que
o conceito de indisciplina é susceptível de múltiplas interpretações e que um aluno ou
professor indisciplinado é, em princípio, alguém que possui um comportamento desviante
em relação a uma norma explícita ou implícita sancionada em termos escolares e sociais.
Seguidamente, e para melhor compreender o conceito de indisciplina, abordaremos
a questão dos comportamentos indisciplinados, tentando compreender o que são e a que se
devem.
Segundo Perrenoud (1995: 18), a escola apresenta mais dificuldades que estímulos
ao desenvolvimento das aprendizagens dos alunos e chama a atenção para o facto através
das seguintes questões:

“Qual o aluno que poderá interessar-se profundamente pelo seu trabalho quando este é tão
fragmentado, desconexo, caótico, ao sabor das mudanças de actividades e de disciplinas, do ritmo
das campainhas e de outros toques, da contínua troca de professores e dos respectivos
temperamentos, das pressas e dos tempos mortos? Qual o aluno que poderá, por imposição, tornar-
se activo ou passivo e escutar ou concentrar-se, falar ou escrever, questionar ou responder só
porque recebeu a ordem do professor, no momento determinado que este julga oportuno? (…)

4
Segundo Olga Magalhães (1992: 18), comportamentos disruptivos, indisciplinados ou desviantes assumem
o mesmo significado e estão intimamente associados ao conceito de indisciplina.

29
Qual o aluno que poderá aprender por tentativas e erros, expor as suas questões e as suas dúvidas,
quando “tudo aquilo que possa dizer pode ser utilizado contra si”, dá lugar a apreciações, a
sarcasmos, a comentários anotados na caderneta?”.

Todo o ser humano ao adoptar determinado comportamento actua influenciado por


objectivos, claros ou não, que pretende alcançar. Assim, e tendo em conta as palavras de
Perrenoud, muitas vezes a sobrevivência e a satisfação dos alunos na escola dependem da
sua adaptação a um meio desconhecido e da sua capacidade de se integrarem numa turma
ou num grupo e serem aceites e reconhecidos por eles.
Neste contexto, os comportamentos dos alunos, sejam bons ou maus, não podem
ser vistos apenas como provenientes deles próprios. Torna-se necessário considerá-los
como parte de uma situação total, na qual actuam vários intervenientes que atribuem
significados àquilo que se faz. Contudo, nem sempre é fácil atingir os objectivos e
satisfazer as necessidades porque, frequentemente, os actores se deparam com obstáculos
que dificultam ou impedem a sua realização. Quando tal acontece e o aluno não consegue a
satisfação dos seus objectivos pode experimentar sentimentos de inferioridade e recorrer a
métodos alternativos competitivos que se manifestam em comportamentos indisciplinados,
que serão tanto mais frequentes quanto maiores forem as dificuldades encontradas.
Podemos ver nestes métodos uma espécie de compensação que encaminha os alunos para
objectivos mais específicos como:

“ – chamada de atenção, motivada pelo desejo de louvores ou críticas, como forma de obter
um determinado status;
- luta pelo poder a fim de satisfazer o desejo de autonomia em relação aos adultos, símbolos
de autoridade;
- vingança por se sentir desprezado e magoado pelos outros (por exemplo, para o aluno o
mundo está contra ele e a maneira que encontra de obter reconhecimento é vingar-se contra os
adultos);
- incapacidade assumida, motivada pela baixa auto-estima e que pode manifestar-se em
sentimentos de inferioridade, isolamento e uma acentuada desesperança de sucesso” (Silva, 1999:
10-11).

O aluno mostra, desta forma, revolta pela não-aceitação no grupo, por não ter
alcançado os seus objectivos, vê-se como um ser inferior e, por esse motivo, recorre a

30
comportamentos indisciplinados com os quais procura alcançar algumas compensações
relativamente ao grupo, aos professores ou à escola.

2- Explicação causal

Neste ponto, procura-se equacionar algumas das causas possíveis dos


comportamentos ditos indisciplinados ou disruptivos cientes, no entanto, que não é fácil
fazer o inventário das causas da indisciplina nas escolas e mais especificamente na sala de
aula.
Podemos dividir estas causas em dois grupos gerais: as causas externas à escola e as
causas internas. Entre as primeiras, encontram-se, por exemplo, a influência hoje exercida
pelos meios de comunicação, a violência social e o ambiente familiar. Entre as causas que
se encontram no interior da escola incluem-se o ambiente escolar e as condições de ensino-
aprendizagem, os modos de relacionamento humano, o professor e a gestão que este faz da
aula, o perfil dos alunos e a sua capacidade de se adaptar aos esquemas da escola. Conclui-
se, pois, que na própria relação entre professores e alunos se encontram motivos para a
indisciplina e que as formas de intervenção disciplinar que os professores praticam podem
reforçar ou mesmo gerar modos de indisciplina.
A nossa investigação centra-se, tanto quanto possível, na abordagem das causas da
indisciplina na escola e fundamentalmente na sala de aula.
Na explicação causal da indisciplina e outros comportamentos desviantes, cruzam-
se, como já anteriormente se referiu, perspectivas psicológicas com abordagens de carácter
sociológico e pedagógico. Saliente-se, no entanto, que as abordagens de carácter
sociológico e pedagógico têm posto em causa as perspectivas psicológicas de carácter
individualizante e correctivo. Nestas perspectivas, as variáveis do contexto social e
pedagógico tornam-se preponderantes e o aluno deixa de ser o centro das atenções dos
fenómenos de disciplina/indisciplina. O aluno é visto como “actor-vítima de uma série de
circunstancialismos adversos” (Estrela, 1992:78).
A desculpabilização do aluno e a culpabilização da sociedade e da escola é posta
em evidência por estudos microssociológicos realizados em sala de aula. Esses estudos
“vão pôr em relevo o papel do professor como promotor da indisciplina do aluno,
indisciplina agora concebida como desvio à regra estabelecida” (Estrela, 1992: 78).

31
Para Dawoud, citado por Estrela (1994: 76), existem diferenças de opinião entre
professores e alunos, sobretudo no que diz respeito à atribuição causal: enquanto os
professores tendem a atribuir as razões de indisciplina a características psicológicas do
aluno ou ao meio familiar, os alunos atribuem grande parte da responsabilidade ao
professor. A imputação da responsabilidade da indisciplina ao professor é também
defendida por Estrela (1994: 85), ao dizer que "os alunos imputam grande parte da
responsabilidade dos comportamentos de indisciplina aos seus professores e acham que a
solução passa por uma modificação da relação pedagógica e por um exercício correcto da
autoridade docente".
Nos pontos seguintes analisamos o papel dos professores e dos alunos como
promotores ou facilitadores de comportamentos indisciplinados na sala de aula.

2.1. A indisciplina da responsabilidade do professor

“As responsabilidades do professor inscrevem-se em duas lógicas


fundamentais da sua acção: a do modo como estrutura as tarefas académicas
e a do modo como gere as relações sociais na aula”

(Amado, 2001: 222)

As correntes pedagógicas são aquelas que mais põem em relevo o papel do


professor como agente de indisciplina. Para estas correntes, onde se salienta a do
classroom management, que Estrela (1992) traduziu “imprecisamente”5 por organização da
aula, os conceitos de disciplina e indisciplina são vistos sob o ponto de vista pedagógico,
reportando-se directamente ao bom ou mau funcionamento da aula e indirectamente às
regras estabelecidas.
Com base em observações de situações naturais de aula, Kounin estabeleceu as
correlações existentes entre a disciplina ou indisciplina dos alunos observados e as
técnicas de organização utilizadas pelo professor. Entre as técnicas que apresentam
correlação elevada com a disciplina destacou:

5
Palavra da autora

32
-“Testemunhação – Capacidade de comunicar à turma que o professor sabe o que se passa mesmo
quando está de costas voltadas;
- A atenção simultânea a duas situações diferentes;
- O ritmo da aula e a suavidade da transição entre tarefas (evitando: saltos na matéria, começar uma
actividade deixando-a no ar, fazer discursos e sermões, fazer demasiadas recomendações sobre a
tarefa ou sobre o material);
- A variedade de estímulos oferecidos ao aluno;
- A capacidade de manter o grupo ocupado numa tarefa comum através da responsabilização dos
alunos e da atribuição de tarefas individuais” (Estrela, 1992: 81).

Parece poder concluir-se destas correlações que a disciplina ou a ordem necessária


às aprendizagens escolares está dependente da capacidade organizativa da aula pelo
professor.
Também Emmer e Evertson, em trabalhos realizados em 1982, caracterizam os
comportamentos docentes que permitem classificar os professores como bons ou maus
organizadores da aula. Concluíram, de acordo com (Estrela, 1992: 81), que

“enquanto que os bons organizadores estabelecem bem as regras e dão directivas precisas,
apresentam claramente as suas expectativas quanto aos comportamentos dos alunos, respondem a
estes de forma consistente, intervêm mais prontamente para parar o desvio e utilizam mais
frequentemente as regras em caso de indisciplina, os professores maus organizadores utilizam regras
vagas e não reforçáveis, dão directivas pouco precisas, comunicam ambiguamente as suas
expectativas, são inconscientes nas suas respostas à maior parte dos comportamentos desviantes dos
alunos, ignoram mais vezes esses comportamentos, não evocam as suas consequências e reagem
com lentidão”.

Nestas situações, o professor como organizador da aula desempenha um papel


fundamental na prevenção da indisciplina. É na questão da prevenção que se distinguem os
professores bons organizadores da aula uma vez que os trabalhos de Good e outros (1975)
e Duke e Jones (1984), referenciados por (Estrela, 1992: 81), mostram que

“professores com bom controlo do clima disciplinar da aula, quando postos face a situações
inesperadas de indisciplina, não reagem de forma diferente dos colegas que se manifestam
incapazes dele”.

A melhoria do clima da aula e a diminuição de manifestações de indisciplina está


também dependente da forma como o professor prepara as suas aulas e dos incentivos

33
atribuídos aos alunos. Graça Fernandes, em entrevista dada ao Jornal a Página da
Educação em Abril de 2001, aborda esta questão referindo que

“Além do estabelecimento das regras, da atenção e cuidado que põe na relação, o professor evitará
muitas ocorrências desagradáveis, se preparar as suas aulas, prevendo as actividades mais
adequadas aos alunos e que mais os impliquem na sua própria aprendizagem e lhes confiram
responsabilidades. Finalmente, se o professor estiver atento e disposto a encorajar e a reforçar os
comportamentos que demonstram interesse, e empenho, se recompensar os seus alunos com gestos
e palavras que traduzem a sua satisfação, se valorizar os bons procedimentos, criará na sua aula
um clima mais afectivo, fraterno e securizante.”

Amado (2001: 223), relacionando o surgimento da indisciplina na sala de aula e a


acção do professor, diz-nos que a utilização de estratégias inadequadas ou uma relação
pedagógica problemática podem estar na origem de comportamentos desviantes dos
alunos. Através de um estudo baseado na observação directa de aulas e de entrevistas feitas
aos alunos concluiu que “se há alunos que se portam bem numas disciplinas e noutras não,
a culpa não é só dos alunos, não é só da turma, mas é também dos professores”.
O método expositivo é apresentado como sendo o principal indicador de
“estratégias de ensino inadequadas”. Diz-nos o mesmo autor (idem: 224

“com efeito, diz-se que uma tal metodologia dá sono, provoca a distracção e o alheamento, de modo
que o aluno dá por si a pensar coisas completamente diferentes da matéria que ele está a dar, não
favorece a compreensão dos assuntos, provoca desmotivação e, enfim, gera a indisciplina nas suas
mais diversas expressões, sobretudo clandestinas”.

No método expositivo verifica-se um grande desequilíbrio entre o tempo gasto pelo


professor na comunicação e o tempo utilizado pelos alunos. Neste método o aluno tem
pouca possibilidade de manifestar as suas opiniões e de confrontar as suas ideias, o que
pode ser castrador da sua autonomia, e faz com que o aluno recorra a certos subterfúgios
para fazer com que a aula passe mais depressa.
Aulas desinteressantes são também apontadas como causas de comportamentos
desviantes. Amado (2001: 226), entende por aulas desinteressantes aquelas em que
segundo os alunos “não há nada para fazer, em que o professor nunca sai da matéria ou
está a ser desinteressante, chato”. Os métodos de ensino empregues são criticados por
serem cansativos, não existem actividades interessantes e num caso destes os alunos dizem
“a gente não tem nada que fazer, prontos, falamos para o parceiro do lado”.

34
2.2. A indisciplina da responsabilidade do aluno

“Os alunos reconhecem que os problemas da indisciplina têm origens múltiplas e que
as responsabilidades do seu aparecimento têm de ser divididas entre professores,
alunos, instituição e família, não sendo ignorados, também, os factores de ordem
sociopolítica”
(Amado, 2001: 221).

A escola, por intermédio dos seus professores, procura transmitir aos alunos um
conjunto de conhecimentos curriculares, atitudes e competências - formar os alunos com
vista à sua futura integração na sociedade. Este propósito nem sempre é conseguido de
forma satisfatória porque os alunos oferecem resistência e enveredam por comportamentos
indisciplinados.
Maria Teresa Estrela, uma das principais investigadoras dos problemas
disciplinares em contexto de aula, em estudos realizados em escolas portuguesas entre
1977 e 1983, debruçou-se sobre as questões da indisciplina na sala de aula e abordou,
numa perspectiva pedagógica, os fins e as funções dos comportamentos de indisciplina dos
alunos. A autora (1992: 92), “tendo como referentes as alterações provocadas no processo
pedagógico em curso na aula” detectou as seguintes funções pedagógicas dos
comportamentos de indisciplina:

“- a função de proposição - é desempenhada por aqueles comportamentos que têm como fim mudar,
suavizar, facilitar a tarefa ou resistir a ela. Visam transformar a situação num sentido favorável ao
aluno: essa transformação pode traduzir-se por uma mudança de tarefa ou pela suspensão temporária
das regras que a orientam (ou aceitação temporária do desvio). (…) Exemplo: 4.a classe. A
professora faz perguntas sobre o texto e diz que só responde o aluno que ela solicitar. Os alunos
começam a responder em coro e a professora aceita;
- a função de evitamento permite que o aluno se furte temporariamente ou durante toda a aula à
tarefa ordenada pelo professor. Exemplo: o aluno não faz nada ou lê um livro doutra disciplina ou
uma banda desenhada;
- a função de obstrução traz uma ruptura parcial ou total do funcionamento afectando toda a turma,
na medida em que põe em causa as possibilidades de realização da função principal de produção.
São exemplo as interrupções constantes e despropositadas que impedem o professor de dar a matéria
prevista;

35
- a função de contestação põe directamente em causa a autoridade do professor. Ao contrário das
outras funções que a põem em causa apenas de modo indirecto, a função de imposição exige do
professor uma atitude de força ou uma atitude de recuo que porá em causa a sua imagem. Exemplo:
o professor pede ao aluno o exercício e este deita-o ao chão;
- a função de imposição visa não somente a contestação da organização estabelecida mas também a
imposição de uma contra-organização. Exemplo: em turmas do 5.° e 6.° de escolaridade, cinco
minutos antes do termo, os alunos fecham os livros e cadernos, começam a falar e alguns cercam o
professor. Põem assim termo à aula antes do toque.”

A origem dos actos indisciplinados na sala de aula tem, portanto, origens diversas.
Podemos encontrar razões de ordem relacional e, neste caso, a indisciplina pode ser uma
resposta à autoridade do professor; o aluno contesta porque não está de acordo com as
exigências do professor, com os valores que ele pretende impor, com os seus critérios de
avaliação, a sua parcialidade; o aluno não aceita o professor ou a sua disciplina; o professor
não consegue motivar o aluno, despertá-lo ou cativá-lo. Amado (2001:108), refere que
Rosser e Harré, utilizando uma perspectiva psicossociológica, consideram que

“as funções principais da indisciplina serão, por um lado, uma forma de retribuir agravos (o aluno
paga, com um insulto, um insulto do professor); por outro, o restabelecimento do equilíbrio da sua
imagem perante os colegas, no caso de a sua dignidade ter sido afectada”.

No dizer de Lourenço é irrelevante a percentagem de alunos que manifestam


atitudes de oposição em relação ao professor e à escola, na forma de contrapoder. O
mesmo autor (2004: 24), baseando-se em Amado e Freire refere que para estes autores

“estas atitudes são uma demonstração de contrapoder dos alunos, sendo o seu objectivo coagir o
professor a proporcionar situações mais favoráveis, tais como: aulas onde se aprenda de uma forma
alegre e descontraída; serem tomados em consideração os ritmos biológicos e psicológicos dos
alunos durante a aprendizagem; onde se instituam e regulem normas claras que na realidade
orientem a actividade curricular e as relações interpessoais”.

Outras causas resultam de desajustamentos entre os alunos e a escola, a


desmotivação dos alunos e o desinteresse explícito por aquilo que se pretende ensinar ou
qualquer outro comportamento inadequado, por vezes não são mais do que chamadas de
atenção ao professor sobre os seus métodos de ensino ou sobre as estratégias de relação na
aula; injustiças cometidas e alteração das regras, sem negociação, podem também provocar

36
indisciplina. Continuando a seguir o pensamento de Amado (2001: 108), que se apoia no
pensamento de Woods, podemos confirmar este aspecto uma vez que para ele

“a indisciplina pode ser uma "resposta" aos constrangimentos gerais da situação de aula. Neste caso,
a função da indisciplina, pelo menos para alguns alunos, pode ser simplesmente a de procurar
subverter a situação geradora de algum aborrecimento, tornando-a mais suportável, como uma
estratégia de sobrevivência na aula”.

Perrenoud (1995: 150), vai também ao encontro desta ideia de sobrevivência na


aula ao afirmar que

"Para sobreviver, o aluno tem, fundamentalmente, de penetrar nos interstícios. Se os professores não
os concedem voluntariamente, os alunos encontrarão, de uma maneira ou de outra, o tempo para
dizerem entre si o que lhes interessa".

Também Magalhães (1992: 15), põe a tónica dos comportamentos indisciplinados


na questão da chamada de atenção do aluno sobre si ao dizer que

"por vezes os comportamentos inadequados mais não são do que tentativas, bem ou mal sucedidas,
de chamar a atenção. A criança ou o jovem, sentindo-se ignorado, pode tentar adoptar um
comportamento que atraia sobre si a atenção do professor, dos pais ou dos colegas".

Ainda segundo Magalhães (1992), as interacções na sala de aula poderão ser


também afectadas pelo funcionamento da turma enquanto grupo. Com efeito, sabemos que
as nossas turmas são grupos extremamente heterogéneos sob vários aspectos: sexo, idade,
proveniência, nível socio-económico, etc. Num grupo com estas características facilmente
encontramos elementos com fraca predisposição para os estudos, com dificuldades de
integração no espírito do grupo/turma e que podem tornar-se potenciais elementos
desestabilizadores dentro da sala de aula. Esta situação poderá agravar-se quando numa
mesma turma se juntam um ou vários elementos que foram obrigados pela família a
frequentar a escola e que se tornam autênticos líderes de contestação ao trabalho do
professor e dos outros colegas. Na medida em que a maioria das regras e normas são
exteriores ao grupo/turma e impostas do exterior, pode significar, por si só, uma recusa da
sua aceitação, pelo menos por parte dos alunos não integrados, levando-os a
comportamentos indisciplinados.

37
Nizet e Hiernaux (s/d), numa outra perspectiva, vêem na indisciplina dos alunos
formas de reacção à continuidade ou à ruptura cultural que os alunos encontram na escola e
que as estratégias "brandas ou duras" dos professores acentuam.
Podemos, finalmente, referir que o sucesso escolar obtido pelos alunos também
poderá ter influência directa no seu desempenho comportamental. Magalhães (1992: 15-
16), baseando-se no pensamento de autores, como Alves Pinto & Formosinho, Argyle,
Carvalho, Fontaine e Veiga, diz-nos que

"quanto menor for o sucesso obtido pelo jovem na sua prática escolar, menor será o seu investimento
nessas tarefas. O desinvestimento e a relação negativa com o saber e a escola podem desencadear
emoções negativas que se tornem visíveis em comportamentos inadequados. O insucesso repetido e
o consequente desinvestimento na escola são frequentemente geradores de quebras graves na auto-
estima6 do jovem que, para além de poderem provocar problemas comportamentais, podem
contribuir para que este tenha problemas de inserção e ajustamento, sentindo-se assim confuso e
angustiado".

Os motivos da indisciplina anteriormente apresentados envolvem professores e


alunos e relacionam-se directamente com a escola ou com a sala de aula. Contudo, há
outros motivos que são extrínsecos à aula, mas podem reflectir-se dentro dela, tais como
problemas familiares, dificuldades de inserção social ou escolar, excessiva protecção dos
pais, carências sociais, forte influência de ídolos violentos, etc.
As manifestações de indisciplina na sala de aula parecem variar com o ciclo de
estudos dos alunos e, consequentemente, com a idade. Esta ideia é-nos apresentada por
Maria Teresa Estrela (1992) que, ao estudar as relações entre as regras e a produção da
aula, detectou desequilíbrios frequentes entre os planos “formal-normativo” e “funcional-
produtivo” que variam com a idade dos alunos. Verificou que alunos da 1ª classe e no
início do ano são submetidos a um processo normativo-disciplinar cujo objectivo é a
“inculcação directa de regras”. Começa aqui a resistência dos alunos a essa acção
normativa do docente que se deve apenas à espontaneidade infantil a regras que lhe são
estranhas. Na 4ª classe verificou alterações que passam pela desvalorização do “aspecto
formal” da regra. Verifica-se da parte do professor alguma tolerância sobretudo no que diz
respeito a pequenos desvios que não põem em causa a realização das tarefas do aluno.

6
“a auto-estima poderia definir-se como o resultado das experiências de êxito ou de fracasso, comparadas
com as aspirações do indivíduo” (Veiga, 1995: 27)

38
Ainda segundo a mesma autora (1992: 84) nas turmas do ex-ciclo preparatório a
desvalorização do aspecto formal da regra acentua-se, valorizando-se a produção. As
regras são cada vez menos invocadas e “o elevado índice de tolerância ao desvio retira-lhe
o seu valor formal, tornando-a num referente de ordem funcional”. Verifica-se que o
professor reduz o formalismo normativo, submetendo-o a critérios de produção mínima.

“O professor começa por desvalorizar os pequenos desvios que limitam mas não impedem
totalmente a produção e só considera como indisciplina os actos que a comprometem abertamente ou
aqueles que visam directamente a sua autoridade ou a sua pessoa”. (1992: 84)

Magalhães (1992) corrobora esta opinião, dizendo que alguns comportamentos


indisciplinados poderão resultar apenas de desconhecimento das regras do jogo escolar e
não de estratégias desestabilizadoras. Isto poderá ocorrer sobretudo em crianças ou jovens
de pouca idade, que ainda não sabem escolher o comportamento mais adequado para
determinadas situações e ocorre normalmente nas escolas do 1º, 2º e 3º ciclos. Já no ensino
secundário a adopção de atitudes críticas e de indisciplina é frequentemente a resposta a
necessidades de afirmação pessoal perante os colegas e o professor. Nestes casos, os
alunos pretendem, muitas vezes, atingir o professor na sua autoridade e, finalmente, na sua
pessoa. Nesta situação, é a idade dos alunos que condiciona a existência de
comportamentos disruptivos ou desviantes.
Amado (2001: 112-113), em trabalho realizado em 1989, chegou a conclusões que
se aproximam destas posições. Diz-nos ele que

“A análise da natureza dos comportamentos desviantes destes alunos mais velhos mostrou que eles
traduziam problemas de relação com a autoridade, em especial com o professor. A meu ver, eles
exerciam, de facto, uma função de contestação do professor e do sistema escolar: contesta-se porque
não se está de acordo com as exigências do professor, com os valores que ele pretende impor, com
os seus critérios de avaliação, com os seus métodos de ensino e até com a sua parcialidade, enfim,
contesta-se tudo aquilo que, do ponto de vista do aluno, é, por certo, a razão de ser do seu
insucesso e que, por isso mesmo, se deseja ver alterado7.”

Um pouco adiante, o mesmo autor, referindo-se agora aos alunos mais novos
explica que

7
O itálico é do autor

39
“a natureza dos comportamentos dos alunos mais novos (12 e 13 anos) é, maioritariamente,
constituída por infracções à regras do "processo-aula", isto é, infracções que, no dizer do professor,
"impedem" ou "perturbam o bom funcionamento da aula", ou põem em causa a organização e gestão
da classe e o "rendimento da turma". Conclui que, até certo ponto, estes comportamentos dos alunos
mais novos tinham uma função de obstrução das situações habituais da aula, através de processos
menos violentos do que a contestação clara e directa. Enfim, o alvo da acção destes alunos mais
novos não é a autoridade do professor, mas os constrangimentos que impelem à passividade: exige-
se que o aluno "não execute tarefas estranhas à aula", "se mantenha com postura e gestos
adequados", "não se desloque sem autorização", "não brinque", "não converse nem faça ruídos ",
"entre ordeira e pontualmente", para só dar alguns exemplos.”

Assim, podemos concluir que parece haver uma evolução gradual por parte dos
alunos indisciplinados. Começam por perturbar as aulas não se empenhando nas tarefas,
recusam fazer o que lhes é pedido, põem em causa a autoridade do professor e, finalmente,
tentam atingir a sua pessoa. A idade dos alunos parece favorecer esta escalada, bem como
os desequilíbrios de ordem pedagógica e social, que eventualmente levam a manifestações
de carácter psicológico.
Lourenço (2004: 24) diz-nos, no entanto, “que a principal origem dos problemas de
comportamento em sala de aula, quando considerados por si só, residem na sua frequência
e não na sua gravidade”.

3. As perspectivas de abordagem da indisciplina

Os indivíduos, enquanto actores sociais, passam uma grande parte das suas vidas
nas organizações onde desenvolvem as suas actividades profissionais. É aí que os actores
interagem, se empenham na consecução dos objectivos da organização, dando o melhor de
si próprios, colocando-se ao serviço da organização e da sociedade. Para que melhor
possamos compreender as acções dos indivíduos nas organizações e as reacções daqueles
com quem interagem, sejam superiores, colegas ou subordinados, torna-se necessário
compreender, ainda que sumariamente, o funcionamento da personalidade humana. No
caso da escola, uma questão se coloca frequentemente: que razões levarão os alunos a
tomar determinado tipo de comportamentos disciplinados ou indisciplinados na escola e na
sala de aula? Conseguiremos compreender melhor esta problemática conhecendo algumas
características dos alunos adolescentes.

40
Segundo Piaget, o adolescente atinge o raciocínio formal por volta dos quinze anos
de idade. Fica, a partir daí, preparado para raciocinar como os adultos, desenvolve
raciocínios abstractos, tendo, no entanto, menos conhecimentos, menos experiência e
menor maturidade psicológica e cultural. Socialmente, continua dependente do adulto, o
que lhe confere um estatuto de inferioridade relativamente àquele. Estas características
podem ser potenciadoras de vários conflitos.
Este estádio de desenvolvimento dos jovens tem também reflexos na escola e nas
próprias aulas. Maya (2002: 35-36) refere que

“Nas aulas o adolescente exercita a sua capacidade intelectual questionando o professor quer sobre
o conteúdo da disciplina, quer sobre a organização do trabalho, deliciando-se com a sua própria
argumentação lógica, ainda que muitas vezes insuficientemente fundamentada. Conseguir deixar o
professor sem resposta é afirmar-se por mérito próprio ao mesmo nível do adulto, pelo que sai
valorizado da contenda verbal, reforçada pelo facto de conseguir uma vitória frente ao seu grupo de
colegas. Tomar uma posição pessoal é afirmar-se diferente dos outros. É simultaneamente procurar
definir-se, testando a solidez das suas perspectivas”.

Esta situação, vivida pela maioria dos nossos docentes na sala de aula, por vezes, é
potenciadora de atitudes positivas por parte dos alunos em relação aos professores, quando
integrada numa situação real de aprendizagem por alunos motivados e interessados nessa
aprendizagem. Contudo, outras vezes, pode ser geradora de conflitos e comportamentos
indisciplinados desde que o confronto entre aluno(s) e professor se traduza em desafio do
poder do docente ou em boicote permanente da aula e não para debate de ideias e
conteúdos da disciplina.
No caso concreto da escola como organização social e da temática em estudo,
vários são os psicólogos e sociólogos que tentam, recorrendo a teorias, explicar os
comportamentos individuais, a partir dos quais se poderão explicar os comportamentos
indisciplinados dos alunos.

3.1. Perspectivas psicológicas

A aprendizagem, no seu todo, encarada como acção educativa, tem como finalidade ajudar a
desenvolver no educando as capacidades que lhe permitam ser capaz de entrar numa relação
pessoal com o meio em que vive (físico e humano) servindo-se, para esse efeito, das suas
estruturas sensório-motoras, cognitivas, afectivas e linguísticas.
Tavares e Alarcão (1989: 89-90)

41
Alguns estudos colocam o indivíduo no centro da problemática da indisciplina - são
os que se integram na linha de investigação de perspectiva psicológica. O contributo da
psicologia para o estudo da indisciplina centra-se sobretudo ao nível das abordagens
comportamentalista e cognitivista. Nos estudos psicológicos a indisciplina surge associada
a questões de natureza neurótica da personalidade e a atitudes anti-sociais por parte de
crianças com necessidades educativas.

3.1.1- Abordagem comportamentalista

O termo comportamentalismo resulta da recente tradução inglesa da palavra


“behaviorismo”. A psicologia do comportamento toma como base a ideia de que

“o organismo actua sempre por algumas causas bem particulares e projecta as formas de
comportamento para o ambiente, as quais depois «recebem uma resposta» positiva ou negativa desse
mesmo ambiente, na medida em que conseguem ou não conseguem o seu fim. Uma resposta
positiva do ambiente a uma manifestação de comportamento é um reforço, e uma resposta negativa a
uma manifestação do comportamento é o não-reforço.” (Correll, 1973: 56)

As teorias “behavioristas” iniciaram-se com Pavlov que efectuou estudos


laboratoriais sobre os “reflexos condicionados”. Prosseguiram com Thorndike e Watson8
(que introduziu o termo “behaviorismo”), mas seria com Skinner que o behaviorismo
experimentaria novo impulso. Skinner trabalhou os mecanismos comportamentais em
laboratório com animais, concluindo que eles são transponíveis para a abordagem do
comportamento humano. Nos seus estudos abordou as condições em que

“as reacções podem ser reforçadas ou, pelo contrário, enfraquecidas até à sua extinção e reduziu-as a
quatro:
a) Reforço positivo ou recompensa: as reacções que são recompensadas têm tendência a
ser repetidas;
b) Reforço negativo: as reacções que libertam o organismo de uma situação penosa têm
tendência a ser repetidas;
c) Extinção: as reacções que não são recompensadas têm tendência a desaparecer;

8
Watson vê a aprendizagem como o resultado de um processo de condicionamento segundo o qual
determinadas respostas ou reacções são associadas a determinados estímulos e considera que todas as formas
de comportamento podem ser aprendidas (Tavares e Alarcão, 1989: 92).

42
d) Castigo: as reacções que conduzem a consequências indesejáveis ou penosas têm
tendência a ser suprimidas.” (Tavares e Alarcão, 1989: 96)

Do ponto de vista pedagógico as teorias comportamentalistas têm uma aplicação


prática bastante interessante nas nossas escolas. Correll, na sua obra Psicologia Pedagógica
(1973: 59), refere que

“Se se quer conseguir que um saber ou uma habilidade se fixe bem na memória, mesmo que não
seja reforçada mais depois de algum tempo, importa fortificá-la o mais frequentemente possível
enquanto se está a formar. Mas, pelo contrário, deve-se atender a que uma forma de comportamento
que é «indesejada» seja fortificada o menos possível, porque doutra forma resiste mais tempo à
extinção”.

Partindo desta ideia, o professor deve apenas reforçar as formas de comportamento


que realmente quer que sejam construídas ou formadas, aquelas que ele pretende que
venham a ter êxito.
O interesse de Skinner pela temática educativa levou-o mesmo a dedicar-lhe um
livro - A Revolução Científica do Ensino - onde desenvolve as suas ideias sobre as
implicações das teses comportamentalistas, destacando o conceito de “condicionamento
operante”. Carvalho (1992: 130), citando Skinner, diz

“A aplicação do condicionamento operante à educação - diz-nos Skinner, sem rodeios - é simples e


directo. Ensinar não é mais, com efeito, do que preparar as condições de reforço nas quais os alunos
aprenderão. Eles aprendem de facto sem que os instruamos, no seu meio natural, mas o ensino
organiza as condições de aprendizagem, de maneira a facilitá-la, a acelerar o aparecimento de
comportamentos que, sem isso, seriam lentamente adquiridos, ou não apareceriam nunca”.

Assim, para Skinner e seus seguidores, “os comportamentos humanos nada mais
são do que o produto das relações do indivíduo com o meio em que vive, relações essas
definidas pelo esquema do condicionamento operante” (Aubert, s/d: 240). Nesta
perspectiva, indivíduos colocados perante factos semelhantes deveriam ter
comportamentos também semelhantes, o que, na realidade, não acontece. Os
comportamentalistas explicam esta situação pelo facto de os

“indivíduos reagirem efectivamente a estímulos diferentes da situação e a um condicionamento


anterior que os levaria precisamente a seleccionar na situação este ou aquele tipo de estímulos e a
reagir em função da sua presença ou da sua aprendizagem prévias” (Aubert, s/d: 242-243).

43
Em suma, os comportamentalistas vêem a aprendizagem como consecutivas
mudanças de comportamentos individuais que acontecem de acordo com as situações que
se vão deparando ao indivíduo e que ele vai interiorizando. Deste ponto de vista, “os
comportamentos indisciplinados ocorrem porque o sujeito não aprendeu os
comportamentos adequados às situações” (Magalhães, 1992: 23).
Contudo, os comportamentalistas defendem que assim como os comportamentos
são aprendidos, eles também podem ser desaprendidos. Para a extinção de comportamentos
inadequados, utilizam-se os processos de reforço9, que pode ser positivo ou negativo. O
reforço positivo é definido por Skinner como sendo “tudo o que é introduzido na situação e
aumenta a força do comportamento que o precede imediatamente” (Aubert, s/d.: 240). O
mesmo autor continua dizendo que

“O reforço positivo incentiva o indivíduo a repetir o comportamento assim reforçado. O reforço


negativo define-se como sendo algo que, quando desaparece da situação, aumenta a força de resposta
que o precedia imediatamente. Consiste este reforço em fazer desaparecer um estímulo ou uma
situação desagradável como resposta a um comportamento adequado”.

Para os comportamentalistas, existe ainda a punição ou castigo como forma de


controlo de comportamento ou de aprendizagem. Podemos dizer que alguns alunos
aprendem, muitas vezes não por se interessarem pelo estudo em si nem por quererem
alcançar reforços positivos, mas sim por quererem afastar de si estímulos adversos como
são os castigos e as ameaças. Aubert (s/d: 240) diz-nos sobre a punição

“consiste a mesma em fazermos com que um comportamento inadequado tenha uma consequência
desagradável ou resulte na retirada de um reforço positivo, de forma a enfraquecermos ou
suprimirmos esse mesmo comportamento”.

Sprinthall (1997: 234) refere, no entanto, que

“Skinner é contra o uso da punição na sala de aula, não porque não controle o comportamento –
porque o controla – mas porque pode produzir uma série de reacções emocionais negativas. As

9
Werner Correll (1973: 43), entende por reforço “o processo que determina uma mais frequente forma de
comportamento (uma reacção), quando a sua apresentação é seguida de uma determinada resposta do
ambiente”
Sprinthall (1997: 226), sobre o reforço positivo e negativo diz que “Um reforço positivo é qualquer estímulo
que, quando acrescentado à situação, aumenta a probabilidade de ocorrência da resposta. Do mesmo modo,
um reforço negativo é qualquer estímulo que, quando retirado da situação, aumenta a probabilidade de
ocorrência da resposta.”

44
reacções emocionais negativas, condicionadas através do uso da punição, podem impedir
aprendizagens futuras e até a frequência escolar futura. A punição leva sempre a tentativas de fuga
da situação escolar e, quando as crianças a evitam a aprendizagem formal na sala de aula é
obviamente impossível”.

Pode concluir-se, assim, que quando um comportamento é seguido da apresentação


de um reforço positivo ou negativo, a resposta tem maior probabilidade de se repetir com a
mesma função. Do mesmo modo, quando o comportamento é seguido por um castigo,
positivo ou negativo, a resposta tem menor probabilidade de ocorrer posteriormente.
Esta perspectiva fornece aos docentes os meios suficientes para desenvolverem nos
alunos capacidades e saberes e, ao mesmo tempo, manter a disciplina, pelo que se tornou
um utensílio útil para os professores (Magalhães, 1992: 24).
Carita (1997: 106) chama, no entanto, a atenção para a administração destas
técnicas de modificação de comportamentos que devem ser geridas correctamente e, ao
aplicá-las,

“o professor deve saber que a natureza e efeitos do reforço são varáveis. Terá, então de
experimentá-los com cuidado, procurando adequá-los aos seus alunos tendo em conta a idade, sexo,
origem sócio-cultural, estatuto económico e características da personalidade”.

A perspectiva comportamentalista, não obstante tudo o que foi dito, não é isenta de
críticas. Para Magalhães (1992: 24),

“As suas maiores limitações consistem no facto de atribuírem demasiada importância às


determinantes externas do comportamento do indivíduo e reduzirem a importância da riqueza do
desenvolvimento humano nos seus aspectos cognitivos. Daí a sua inaplicabilidade a situações
complexas, a sua permeabilidade à ocorrência de problemas éticos, a possibilidade de emergência de
questões morais delicadas…”

Também Tavares e Alarcão (1989: 113), referem que,

“ Três grandes falhas se apontam aos adeptos do behaviorismo. Em primeiro lugar, concentram-se
nos comportamentos externos, nos resultados finais obtidos e descuram os processos internos. Em
segundo lugar, perdem a visão de conjunto da tarefa da aprendizagem. Em terceiro, relegam o
educando para um plano inferior, despersonalizando-o, considerando-o como um ser passivo,
moldável, dependente do educador que o leva a atingir um fim previamente estabelecido através de
uma influência muito directa que sobre ele exerce.”

45
3.1.2- Perspectiva cognitivista

“A psicologia cognitivista debruça-se sobre a capacidade que o ser humano tem para
obter conhecimentos e desenvolver a sua inteligência”

(Sprinthall, 1997: 237)

Tavares e Alarcão (1989: 98) dizem-nos que os cognitivistas reagiram contra a


visão mecanicista apresentada pelos psicólogos behavioristas. Estes autores, baseando-se
no pensamento de psicólogos como Max Wertheimer, Wolfang Kohler e Kurt Koffka,
dizem que os cognitivistas

“exploraram uma teoria segundo a qual o sujeito interpreta e organiza o que se passa à sua volta em
termos de conjuntos e não apenas de elementos isolados. A experiência do mundo é assim percebida
e organizada em estruturas, em formas completas, em esquemas de acção e em configurações totais
a que o sujeito atribui um determinado significado.”

Os mesmos autores (1989: 114) referem,ainda, que

“ As teorias cognitivas, ao atenderem aos processos mentais envolvidos na aprendizagem, são um


avanço em relação às behavioristas. Problemas como motivação da aprendizagem, transferência de
conhecimentos, aquisição de conceitos, têm sido amplamente explorados.”

A aprendizagem, para os cognitivistas, relaciona-se com a necessidade que o


indivíduo sente de dar sentido àquilo que o rodeia. Nesta perspectiva, a criança aprende a
partir daquilo que já conhece e incorporando novos conhecimentos que vai adquirindo
(Magalhães, 1992: 25).
Segundo Aubert (s/d : 241),

“Os cognitivistas consideram que adquirimos fundamentalmente a nossa personalidade da mesma


forma como aprendemos a dactilografar ou a fazermos com que um computador funcione, e isto por
meio de mecanismos como a “modelização psicológica” ou a aprendizagem por imitação, sobretudo
no que respeita à aprendizagem das regras e dos tabus sociais, da acção social e das maneiras
pessoais e sociais”.

Assim, os cognitivistas ou teóricos da aprendizagem social enfatizam os


mecanismos a partir dos quais a aprendizagem condiciona o desenvolvimento da

46
personalidade, e nas situações em que os sinais aprendidos determinam o comportamento.
São os processos cognitivos e as interpretações que as pessoas fazem dos acontecimentos,
juntamente com as contingências do meio e os dados fisiológicos, que determinam os
comportamentos e a sua modificação. A interacção indivíduo/meio é indispensável para
que haja aprendizagem. Neste intercâmbio, o homem sofre influências do meio, mas pode
também contribuir para o modificar com a sua acção.
Para os teóricos cognitivistas, o comportamento indisciplinado resultará do nível de
desenvolvimento cognitivo e moral do indivíduo, bem como da interpretação que este faz
das situações, a qual é influenciada por outros processos cognitivos. São exemplo desses
processos as representações, as expectativas, o autoconceito. A modificação
comportamental poderá conseguir-se utilizando estratégias de acção preferencialmente
cognitivas, como o desenvolvimento da auto-instrução e da auto-observação que permitam
o desenvolvimento do autoconceito e da auto-estima (Magalhães, 1992: 25).
Esta corrente também não fica isenta de críticas. Tavares e Alarcão (1989:115)
dizem-nos que,

“À força de insistirem muito nos aspectos cognitivos, os cognicistas tiveram também sobre o ensino
uma influência perniciosa que se traduz na descrença e até no horror à aprendizagem decorada ou
memorizada”

3.2- Perspectivas sociológicas

A problemática da disciplina/indisciplina nas organizações, e mais especificamente


na escola, suscita a atenção de numerosos investigadores. Daí, não surpreender a
pluralidade dos olhares sociológicos sobre a questão, que tem sido analisada no contexto
alargado das regras de funcionamento institucional e organizacional da escola e da sala de
aula, dos mecanismos de controlo social, das relações de poder e autoridade e das respostas
possíveis dos alunos.
Não obstante, no dizer de Afonso (1991: 119), que se baseou no pensamento de
Brian Torode e outros autores, “a disciplina escolar se ter tornado um domínio reservado
aos professores e um campo que os sociólogos procuram evitar”, muitos são os sociólogos
que fazem da escola o seu campo de estudo. Entre os aspectos por eles abordados,
encontram-se

47
“os modelos de funcionamento das escolas e as suas características internas, o tipo de relações que
se estabelecem na escola e na sala de aula, os mecanismos de controle sobre os professores e alunos,
o(s) processo(s) de socialização que têm lugar na escola, as divergências entre o que é oferecido pela
escola e o que é exigido pela sociedade” (Magalhães, 1992: 33).

As perspectivas psicológicas, analisadas anteriormente, centram-se, para a análise


dos problemas disciplinares, fundamentalmente nos indivíduos e nos processos individuais.
Contrariamente, as perspectivas sociológicas centram-se no funcionamento da escola como
instituição e local de aprendizagens diversas com vista à preparação dos alunos para a vida
activa, quer no mundo do trabalho, quer na sociedade em geral. Segundo Pardal (2005: 7),

“Seja qual for a perspectiva sociológica de análise, o sistema escolar é, invariavelmente, entendido
como um sistema social, o que implica estabilidade e preocupação com a manutenção de um estado
de equilíbrio, considerado adequado ao funcionamento e ao desempenho dos seus papéis no interior
de uma qualquer sociedade”.

3.2.1- A perspectiva de reprodução social

Entre as várias perspectivas sociológicas, encontramos a perspectiva de reprodução


social. Na antiga Grécia, Platão desenvolveu a concepção de que educar é fazer e educar-se
é fazer-se. Para este filósofo, educar é fazer entrar na sociedade, ou seja, socializar.
Durkheim foi, talvez, o primeiro sociólogo a debruçar-se sobre o problema da
disciplina na escola, acentuando o papel da mesma no controlo social e realçando a
necessidade da educação moral e da ordem social. Segundo este autor (1984:136), “a
disciplina produzirá pois efeitos muito dissemelhantes, segundo a ideia que fizermos da
sua natureza e do papel que desempenha na vida, em geral, e muito particularmente na
educação”.
O mesmo sociólogo (1976: 98) reflectiu sobre os problemas da educação,
estabelecendo uma ligação entre ela e os fenómenos sociais. Define a educação como:

“a acção exercida pelas gerações adultas sobre aquelas que ainda não estão maduras para a vida
social; tem como objectivo suscitar e desenvolver na criança um certo número de estados físicos,
intelectuais e morais que lhes são exigidos pela sociedade política no seu conjunto e pelo ambiente
particular ao qual está destinado de forma específica”.

48
Durkheim entende a relação pedagógica como uma relação de dominação e ao
colocar o acto educativo numa dimensão de educação social, “procura na sociedade a
explicação da ordem social - o que, consequentemente, pressupõe a necessidade de
mecanismos coercitivos exteriores ao indivíduo” (Afonso, 1991: 125, nota 2). Nesta
perspectiva durkheimiana de educação, encontramos a questão da disciplina social, a
necessidade de os jovens serem disciplinados e submetidos à ordem social porque, como
Durkheim (1984: 136) afirma,

“antes de mais, é facilmente demonstrável que a disciplina possui uma utilidade social, por si mesma
e independentemente dos actos que prescreve. Com efeito, a vida social não passa de uma das
formas da vida organizada, e qualquer organização viva pressupõe regras determinadas, das quais
ela não se pode desviar sem a ocorrência de perturbações mórbidas”.

Deduzimos, assim, que a educação consiste numa socialização metódica da geração


jovem, “o objectivo final da educação seria precisamente constituir o ser social em cada
um de nós” (Durkheim, 1976: 98).
Para este sociólogo, a educação é indispensável à sobrevivência da sociedade na
medida em que tem por funções “preservar a sociedade e socializar, humanizar o homem,
fornecendo-lhe referenciais normativos e cognitivos que lhe faltam” (Alves Pinto, 1995:
79). É através da educação que é transmitido a todas as crianças e jovens um conjunto de
conhecimentos, normas, valores, competências que se pretende seja adquirido por todos de
igual forma, isto é, com a finalidade de “homogeneizar” (1995: 79). Pardal (2005: 9-10),
reportando-se às ideias de Durkheim, diz que

“seja qual for a sociedade, o sistema de educação apresenta sempre um duplo aspecto:
simultaneamente múltiplo e uno, diferenciador e homogeneizador”. Continua, um pouco
adiante, dizendo que “a existência da sociedade é indissociável da existência de certa
homogeneidade entre os membros que a compõem. Compete à educação manter, reforçar e
perpetuar essa homogeneidade”.

Citando Durkheim, o mesmo autor (2005: 10): “Não há povo em que não exista um
certo número de ideias, de sentimentos e de práticas que a educação deve inculcar a todas
as crianças indistintamente, seja qual for a categoria social a que pertençam”. Baseando-se
nestes pressupostos, Pardal (2005: 10) afirma que

49
“a educação constitui um instrumento de perpetuação e de reforço da homogeneidade necessária à
existência da sociedade; diversificando-se ela mesma e tornando possíveis especializações, cria
condições de ocorrência de cooperação na sociedade e permite a manutenção da diversidade
necessária à sobrevivência da mesma”

O autor, anteriormente citado (2005: 10), conclui que

“ as grandes funções do sistema de educação integram o carácter profundamente unificador do


sistema de educação, e, nomeadamente, do sistema escolar, em relação à sociedade. Contribuindo
para a unidade e diferenciação no todo social, a educação configura-se como agente de manutenção
e de reforço de ordem e de disciplina na sociedade”.

Também Postic (1984: 14), referindo-se ao pensamento de Durkheim, reforça esta


ideia ao afirmar que “o sistema de educação não tem em vista, em primeiro lugar, o
desenvolvimento do indivíduo” e que “os fins da educação são determinados pela
sociedade que talha à sua imagem a nova geração”.
A escola, responsável pela socialização secundária, exerce, inicialmente, a primeira
forma de controlo social. Assim, “deve ser assegurada uma analogia entre a instituição
escolar e a instituição social. E isto passa, por exemplo, pelo controlo social, que deve ter
tradução no controlo que se exerce sobre os alunos na escola” (Alves Pinto, 1995: 79).
Mas, o que é e como se manifesta o controlo social?
Cohen, citado por Afonso (1991: 121), entende o controlo social como um conjunto
de “processos e estruturas que servem para impedir ou reduzir a transgressão”. Para
Afonso (1991: 121), e baseando-se ainda na perspectiva de Cohen, “a escola pode ser
entendida como uma estrutura latente de controlo social já que - ao nível das suas funções
implícitas e, por isso mesmo, menos visíveis - cumpre esse papel social”. Baseando-se em
vários autores, explícita a sua ideia afirmando que “é através das imagens, crenças e
atitudes conformistas impostas aos alunos (Walgrave), dos castigos a que recorre, e do
carácter vicário ou efeito de exemplo que estes comportam (Gotzens) que a escola se
manifesta como lugar de controlo social”.
Hargreaves (1991: 121), quando escreve que, “ao seleccionar uma resposta
particular, o professor pretende deter o desvio de regras, impedir a reincidência e a difusão
entre os demais alunos”, salienta esse mesmo aspecto.
Althusser, estudando o poder e a dominação nas modernas sociedades de classes,
salienta a importância da ideologia para se poderem compreender esses dois fenómenos.
Para este investigador, de acordo com Pardal (2005: 11),

50
“o estado, visando a reprodução económica e ideológica, utiliza práticas auto-reguladoras para a
difusão dos princípios legitimadores daquela. Tais práticas situam-se em Aparelhos Repressivos de
Estado, como o exército, a política e as prisões, e em Aparelhos Ideológicos de Estado, a exemplo
das agências de serviço social, da escola, etc.”

Para Althusser (1981: 46),

“o Aparelho Ideológico de Estado que foi colocado em posição dominante nas formações
capitalistas maduras, após uma violenta luta de classes política e ideológica contra o antigo
Aparelho Ideológico de Estado dominante, é o Aparelho Ideológico escolar”

Comparando o Estado a um concerto, o investigador francês (1981: 47-48) refere,


no entanto, que

“neste concerto, há um Aparelho Ideológico de Estado que desempenha incontestavelmente o papel


dominante, embora nem sempre se preste muita atenção à sua música: ela é de tal maneira
silenciosa! Trata-se da Escola.”

Continua, explicando a importância do aparelho ideológico escolar, referindo que a


escola representa para os Estados um aparelho privilegiado ao dispor de uma audiência
obrigatória durante 5 a 6 dias semanais, por um período que pode ir até às 8 horas diárias.
Diz:

“ Desde a pré-primária, a Escola toma a seu cargo todas as crianças de todas as classes sociais, e a
partir da pré-primária, inculca-lhe durante anos, os anos em que a criança está mais «vulnerável», entalada
entre o aparelho de Estado familiar e o aparelho de Estado Escola, «saberes práticos» (des «savoir faire»)
envolvidos na ideologia dominante (o francês, o cálculo, a história, as ciências, a literatura), ou
simplesmente, a ideologia dominante no estado puro (moral, instrução cívica, filosofia). Algures, por volta
dos dezasseis anos, uma enorme massa de crianças cai «cai na produção»: são os operários ou os pequenos
camponeses. A outra parte da juventude escolarizável continua: e seja como for faz um troço do caminho
para cair sem chegar e preencher os postos dos quadros médios e pequenos, empregados, pequenos e médios
funcionários, pequenos- burgueses de toda a espécie. Uma última parte consegue aceder aos cumes, quer para
cair no semi-desemprego intelectual, quer para fornecer, além dos «intelectuais do trabalhador colectivo», os
agentes da exploração (capitalistas, managers), os agentes da repressão (militares, polícias, políticos,
administradores) e os profissionais da ideologia (padres de toda a espécie, a maioria dos quais são «laicos»
convencidos”.

Pardal (2005: 11), citando Althusser a respeito dos Aparelhos Ideológicos de


Estado,

51
“ Todos (…) , sejam eles quais forem, concorrem para um mesmo resultado: a reprodução das
relações de produção (…)”.

Os sociólogos Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron apresentam-nos uma


perspectiva de reprodução social, estabelecendo uma ligação entre a relação pedagógica e a
cultura dominante. Postic (1984:18) resume os postulados enunciados por estes sociólogos
dizendo que “o sistema educativo está decalcado sobre a sociedade hierarquizada e, como é
elaborado por uma classe privilegiada, que detém a cultura, isto é, os utensílios
fundamentais (o saber, o saber-fazer e, sobretudo, o saber-dizer) tem em vista a
conservação do poder cultural desta mesma classe”. Neste contexto e ainda segundo o
mesmo autor “O sistema de ensino desempenha «a sua função social de legitimação da
cultura dominante», de «conservação» e de selecção; «contribui para a reprodução da
ordem estabelecida», dissimulando a sua função” (1984: 19).
Bourdieu criou o conceito de violência simbólica para descrever o processo através
do qual a classe que domina economicamente impõe a sua cultura aos dominados. “O
sistema educativo está ao serviço de um objectivo central, o de transmitir um «arbitrário
cultural», o currículo, definido pelas classes dominantes de uma sociedade, radicando aqui
o fundamento da sua denúncia de uma escola ao serviço da reprodução social e cultural”
(Neto Mendes, 2002: 29).
“Obrigar certos alunos à frequência da escola, impor a uma criança uma manhã
inteira de aulas para aprender a contornar as armadilhas da leitura e da escrita são
seguramente formas de «violência escolar» a que submetemos as nossas crianças e jovens.
Para uns, trata-se de uma forma de violência legítima, a que a sociedade atribui utilidade e
para a qual encontra razão de ser; para outros, como o sociólogo francês Pierre Bourdieu, é
um acto que representa aquilo a que chamou «violência simbólica» ” (Neto-Mendes, 2002:
29).
Bourdieu e Passeron partem, assim, do princípio de que a cultura, ou o sistema
simbólico, é arbitrária, uma vez que não assenta numa realidade dada como natural. O
sistema simbólico de uma determinada cultura é uma construção social e a sua manutenção
é fundamental para a perpetuação de uma determinada sociedade, através da interiorização
da cultura por todos os membros da mesma. A violência simbólica expressa-se na
imposição "legítima" e dissimulada, com a interiorização da cultura dominante,
reproduzindo as relações do mundo do trabalho. O dominado não se opõe ao seu opressor,

52
visto não ter consciência de ser vítima deste processo, considerando, o oprimido, a situação
natural e inevitável. A violência consiste na interiorização e legitimação da dominação.
A escola, apesar de proclamar a sua função de instrumento democrático de
mobilidade social, acaba por ter afinal a função, talvez inconsciente por parte dos seus
agentes educativos, de legitimar e, em certa medida, perpetuar as desigualdades de
oportunidades dos alunos. “Segundo esta linha de pensamento, a «violência simbólica»
exercida pela «acção educativa» será tanto maior quanto mais significativa for a distância
entre o «capital cultural» da família e o exigido pela escola” (Neto-Mendes, 2002:29.
Nesta perspectiva de reprodução social, “ignora-se a capacidade potencial de auto-
organização que toda a pessoa humana tem, uma vez que ela é vista essencialmente como
produto social e que, em certo sentido, é encarada como estando condenada a unicamente
reproduzir a estrutura social onde se desenvolve” (Alves Pinto, 1987: 3).
Pensamos que, pelo exposto, se poderá concluir que na escola existe controlo social
ou, se quisermos, controlo disciplinar, com a finalidade de impedir que os alunos
enveredem por comportamentos que dificultem, ou impeçam, a aquisição de normas,
crenças, atitudes e valores, que supostamente ela deveria transmitir, e que os alunos mais
tarde utilizarão enquanto membros activos da sociedade.
Terminamos este ponto com uma ideia de P.W. Jackson, citado por Afonso (1989:
3), que diz: “de um ponto de vista pedagógico, quando se perde o controlo tudo está
perdido”, o que leva inevitavelmente a que “a manutenção do controlo possa chegar a
transformar-se no centro das preocupações profissionais dos professores”.

3.2.2- Perspectiva interaccionista

“Todos os sistemas sociais em larga escala dependem dos padrões de


interacção social em que nos envolvemos no decurso das nossas vidas
diárias”.
A. Giddens (1997: 118)

O estudo das interacções sociais quotidianas é, para Giddens, de grande


importância para a sociologia. Segundo este autor (1997: 117),

53
“ As rotinas da vida quotidiana, que nos envolvem mais ou menos de uma forma constante em
interacções face a face com os outros, constituem o grosso das nossas actividades sociais. As nossas
vidas estão organizadas de acordo com a repetição de padrões semelhantes de comportamento dia
após dia, semana após semana, mês após mês e, mesmo, ano após ano.”

Entre os vários autores que realizaram estudos sobre as interacções sociais, salienta-
se Erving Gofmam que, muitas vezes, usa noções teatrais na sua análise. Segundo ele, o
conceito de papel social10, muito usado para este fim em sociologia, teve origem no teatro.
Goffman vê a vida social como se fosse representada num palco por actores, uma vez que
os nossos actos dependem dos papéis que desempenhamos em determinados momentos
específicos. Na sua obra a representação do eu na vida cotidiana (1989: 29), refere a este
respeito,

“ Venho usando o termo “representação” para me referir a toda atividade de um indivíduo que se
passa num período caracterizado por sua presença contínua diante de um grupo particular de
observadores e que tem sobre estes alguma influência”.

Continuando a pronunciar-se sobre o assunto (1989: 36-37) diz,

“Em presença de outros, o indivíduo geralmente inclui em sua actividade sinais que acentuam e
configuram de modo impressionante fatos confirmatórios que, sem isso, poderiam permanecer
despercebidos ou obscuros. Pois se a atividade do indivíduo tem de tornar-se significativa para os
outros, ele precisa mobilizá-la de modo tal que expresse, durante a interação, o que ele precisa
transmitir. De facto, pode-se exigir que o ator não somente expresse suas pretensas qualidades
durante a interação, mas também que o faça durante uma fração de segundo na interação”.

Segundo a perspectiva interaccionista, o homem é visto como um ser que interage


com outros num determinado ambiente social, sem que, contudo, tenha de se submeter à
sociedade onde se integra. A escola funcionará, neste contexto, não como simples
reprodutora social, mas como pólo dinamizador de acções e comunicações diversas,
valorizando as vivências e experiências dos seus membros, quer sejam professores, alunos
ou outros implicados no processo educativo.
Martins (1993: 34) refere que nestes casos se verifica

10
Giddens (1997: 132), diz “ Os papéis são expectativas definidas socialmente que uma pessoa com um
determinado status ou posição social segue. Ser professor, por exemplo, é deter uma posição específica; o
papel do professor consiste em actuar de modo específico em relação aos seus alunos”.

54
“ a não passividade do indivíduo e daí a sua capacidade para funcionar como agente de socialização
nas relações sociais que ocorrem a nível interpessoal. Este processo é caracterizado pelo efeito de
“feed-back” em que duas pessoas se modelam uma à outra nas relações face a face, num jogo
espectáculo, segundo a designação de Erving Goffman, ou num jogo de dominação-subordinação
marcada pelo conflito, ou ainda num jogo consensual em que a modelação respeita princípios
básicos de natureza “epigenética”.”

Correntes sociológicas interaccionistas estudam a forma como professores e alunos


valorizam os acontecimentos na aula, criam estratégias de resposta e negoceiam
subtilmente formas de comportamento. Para estas abordagens, “a indisciplina resulta de
estratégias de resposta dos alunos a situações cuja definição difere da dos professores”
(Estrela, 1992: 80). Para Marsh, citado por Estrela (1992: 80),

“existem regras da desordem” na sala de aula. Elas assentam em estratégias de retribuição de


presumíveis ofensas imputadas aos professores. O comportamento distante do professor, a
despersonalização da relação originada pelo professor que ignora o nome do aluno, a brandura
quando é esperada a força, são algumas das situações que suscitam a retaliação do aluno”

Alves Pinto (1987: 4), utilizando uma perspectiva interaccionista, afirma:

“a socialização corresponde à participação progressiva da criança, do adolescente, do jovem e mais


tarde do adulto nas transacções complexas, que fazem a sociedade existir, no contexto dos sistemas
de comunicação, de concepção do mundo e de valores que caracterizam o universo em que vive”.

Goffman, na parte conclusiva da sua obra (1989: 221-222), explica que

“Quando um indivíduo se apresenta diante de outros, consciente ou inconscientemente projecta uma


definição da situação, da qual uma parte importante é o conceito de si mesmo. Quando acontece algo
expressamente incompatível com esta impressão criada, consequências significativas são sentidas
(…). A interação social (…) pode chegar a uma parada embaraçosa e confusa. A situação pode
deixar de ser definida, as posições anteriores tornarem-se insustentáveis e os participantes
encontrarem-se sem uma linha de ação estabelecida. Tipicamente, os participantes sentem uma nota
falsa na situação e vêm a se sentir embaraçados, perturbados e, literalmente, desconcertados.”

Baseando-nos nas ideias exprimidas por Goffman, e aplicando-as ao contexto


escolar, podemos dizer que a perspectiva interaccionista entende os comportamentos
indisciplinados dos alunos como resultantes das interacções que têm lugar na sala de aula,
vista como um palco de representações, segundo a concepção goffmaniana, envolvendo

55
docentes e discentes. Neste sentido, o grupo-turma e o próprio professor podem ser
considerados instrumentos desencadeadores de comportamentos indisciplinados.

4- Alguns estudos sobre a indisciplina

Maya (2002: 48) refere que “a disciplina tem sido uma das questões mais estudadas
em pedagogia, quer a nível internacional quer nacional, uma vez que é um dos problemas
mais agudos na relação entre o professor e os alunos.” Salientando a opinião de alguns
investigadores sobre a escassez de trabalhos nesta matéria, faz, no entanto, referência a um
conjunto de trabalhos realizados a nível nacional e a nível internacional sobre as questões
da (in)disciplina na escola. Seguindo de perto o pensamento da autora, faremos referência a
esses trabalhos, citando as suas principais conclusões. Refira-se, no entanto, que os
trabalhos realizados por investigadores nacionais foram por nós confirmados.

4.1. Estudos nacionais

M. T. Estrela realizou estudos sobre a indisciplina, com alunos do ensino primário e


alunos do 1º e 2º ano do Ciclo Preparatório, actual 5º e 6º anos de escolaridade. Concluiu
que há um enfraquecimento da autoridade pedagógica dos professores do ciclo preparatório
e do secundário em relação ao professor do ensino primário, apontando como razão
provável desta situação “a partilha do poder que a pluralidade de regras e de actuações
disciplinares põem em evidência” (1983: 653). O mesmo estudo parece mostrar que os
alunos do 2º ano do Ciclo Preparatório e do 3º Ciclo com os seus comportamentos
indisciplinados procuram pôr em causa o professor, desrespeitando-o. Estes alunos desejam
que o professor cumpra bem o seu papel, exerça a sua autoridade equilibradamente e os
trate como pessoas.
Magalhães (1992) procurou, num estudo que envolveu 649 alunos do 3º ciclo do
ensino básico e os 55 professores que leccionavam essas turmas, conhecer as
representações de alunos e professores sobre a indisciplina. Concluiu que tanto alunos
como professores apontam o desinteresse pelas matérias como a principal causa da
indisciplina. Os jovens contestam a escola, perturbando o funcionamento das aulas, porque

56
se apercebem que existe um desajustamento entre a oferta da escola e as suas necessidades,
aspirações e condição. Este estudo conclui, ainda, que os alunos se mostram muito mais
prejudicados pelas situações de indisciplina na aula do que os professores pensam. Este
facto leva os alunos a preferirem punições disciplinares mais pesadas.
Um outro trabalho de Freire (1990) sobre a indisciplina realizado com 120 alunos
do 7º ano e 153 alunos do 9º ano e 58 professores apresentou os seguintes resultados: os
alunos apreciam como qualidades no professor o ser próximo, motivar, explicar bem e ter
sentido de humor. Os alunos do 7º ano valorizam a firmeza e o sentido de justiça do
professor e a sua capacidade de os motivar e ajudar; os alunos bem comportados do 9º ano
valorizam mais o facto de o professor ser um bom transmissor de saber, enquanto os mal
comportados dão mais valor às características relacionais do professor (Maya, 2002: 51).
Mais recentemente (2007), foram apresentadas na Universidade de Aveiro duas
dissertações de mestrado que versam sobre temáticas que envolvem comportamentos de
alunos. José Ilídio, num estudo de caso, abordou o fenómeno do “bullying” numa escola
secundária, concluindo que o fenómeno começa a ter alguma expressão em escolas
portuguesas. António Cachide, realizou também um estudo de caso numa escola do 2º e 3º
ciclo do ensino básico, cuja temática foi a “ violência na escola: a actuação dos Auxiliares
de Acção educativa”, concluindo que os fenómenos de indisciplina e violência começam a
ser cada vez mais frequentes nas escolas portuguesas, em todos os níveis de ensino.

4.2. Estudos internacionais

Wilson (1981) realizou um estudo de opinião sobre a disciplina na Grã-Bretanha,


inquirindo quatro grupos de pessoas, com cerca de 250 indivíduos cada, ligadas à
educação, alunos, pais, professores e técnicos de educação. Pretendia-se compreender a
forma como cada grupo se posicionava relativamente à disciplina a nível de crenças e
prescrições. O estudo mostra que os alunos e os pais desejam maior disciplina na escola e
consideram necessária a existência de regras e dos respectivos castigos em caso de
transgressão. Os professores valorizam menos, que os alunos e pais, a questão da disciplina
e, menos de metade dos inquiridos acordariam num reforço da disciplina nas escolas e
cerca de 35% acha que não é necessário existirem regras claras entre alunos e professores.

57
Outro estudo realizado por Caffyn em 1989 pôs em confronto as opiniões de alunos
e professores sobre as atitudes dos mesmos perante as recompensas e as punições.
Estiveram envolvidos 510 alunos entre os 13 e os 15 anos e 99 professores de quatro
escolas diferentes. Como resultados mais significativos devem salientar-se que os
professores consideram preferíveis as recompensas baseadas no professor como, por
exemplo, o elogio que este faz a um aluno diante da turma ou a repreensão efectuada em
privado. Os alunos atribuem maior sucesso às atitudes que envolvem os pais como, por
exemplo, o professor chamar os pais à escola, ou enviar um bom relatório para a família.
King (1990), num “estudo realizado com alunos australianos entre os 8 e os 16
anos, avaliou a atitude dos alunos face a quatro tipos de estratégias utilizadas pelo professor
na aula: a permissividade, o diálogo, a expulsão da sala e o castigo físico. O diálogo foi o
estilo preferido, enquanto a permissividade foi o mais rejeitado.” (Maya, 2002: 49-50)
Do exposto e em jeito de síntese, concluímos que a indisciplina existe e é, nas
escolas, o maior obstáculo ao seu normal funcionamento. O conceito não pode ser isolado
de contextos específicos, sendo apresentado por vários autores como o desvio ou violação
de regras ou normas formais ou informais institucionalizadas em organizações sociais,
como a escola.
As manifestações de comportamentos indisciplinados ocorrem dentro e fora da sala
de aula, manifestando-se, por exemplo, em desobediência a ordens de professores e
funcionários, danificação de material escolar, agressões verbais e físicas, furtos, etc. Estas
manifestações podem ter causas diversas imputáveis, sob o ponto de vista dos professores,
quase exclusivamente aos alunos, podendo, no entanto, ser atribuídas a factores externos
ao aluno como sejam a instituição e o próprio professor, a família e a sociedade no seu
todo.
Este é, contudo, um campo melindroso onde a psicologia e a sociologia já se
aventuraram em investigações várias, resultando daí abordagens explicativas que
contribuem, sem dúvida, para detectar possíveis causas dos comportamentos desviantes e
ajudam a encontrar soluções e medidas preventivas para muitos desvios ocorridos.

58
CAPÍTULO II – ENQUADRAMENTO ORGANIZACIONAL DA DISCIPLINA /

INDISCIPLINA

«A escola enquanto organização especializada, separada da Igreja e


controlada pelo Estado, é o resultado de um longo processo de construção
que, em Portugal, teve o seu início com o Marquês de Pombal e,
especialmente no caso do ensino secundário, com a criação do liceu por
Passos Manuel»
Lima, 1992: 33

Introdução

Responsável pela formação dos jovens que integrarão a sociedade, a escola, como
instituição, sofreu, a partir da 2ª Guerra Mundial, mas sobretudo a partir das três últimas
décadas, profundas modificações, quer no relacionamento com as outras instituições
sociais, quer no seu próprio funcionamento interno. Reestruturaram-se os currículos,
alargou-se a escolaridade obrigatória, instituíram-se novos modelos de avaliação dos
alunos.
A escola como organização11 passou a ser encarada como tal, a partir de meados da
década de 80, vendo-se, a partir daí, os estabelecimentos de ensino como "lugares dotados
de margens de autonomia, como espaços de formação e autoformação participada, como
centros de investigação, como núcleos de interacção social e de intervenção comunitária"
(Nóvoa, 1992: 19).
Com o 25 de Abril de 1974, iniciou-se o processo generalizado de democratização
da sociedade portuguesa. Este processo implicou que a Escola, como instituição social, se
democratizasse também. Deixou de ser uma instituição fechada e abriu-se à comunidade
envolvente, passando a ser uma verdadeira "comunidade educativa" (Formosinho, 1988).
Verificou-se um acentuado crescimento da população escolar em número e diversidade.
11
Costa (1996: 10-11) relativamente à definição do conceito de organização diz “pode apresentar-se como
uma tarefa simultaneamente simples e complexa” porque são várias as definições existentes e não há
consenso entre os vários autores”.
Etzioni (1984: 3) define as organizações como “ unidades sociais (ou agrupamentos humanos
intencionalmente construídos e reconstruídos, a fim de atingir objectivos específicos”.

59
São jovens que nasceram em democracia e aprenderam, desde novos, a emitir opiniões, a
saber melhor fazer ouvir a sua voz, possuindo saberes, desejos e necessidades
diversificados.
Esta heterogeneidade da população estudantil confronta a escola com a necessidade
de se adaptar e integrar as inovações tecnológicas e os novos saberes que têm vindo a ser
produzidos, visto caber-lhe a função de garantir a transição e integração dos jovens na
sociedade e na vida profissional. Uma das lacunas apontadas por alguns autores
relativamente ao papel da escola é a constatação de que «a escola tendencialmente
socializa e prepara os alunos mais para a sociedade do passado do que para o futuro.»
(Martins, 1998: 5)
Sabe-se também que os jovens de hoje parecem viver uma situação paradoxal: por
um lado, tentam autonomizar-se a partir de um conjunto de vivências quotidianas, que
assentam numa cultura de lazer, por outro lado, vivem mais tempo no domicílio dos pais,
assumindo tardiamente compromissos. Neste contexto, Escola e Família hesitam sobre o
papel que a cada uma cabe na educação dos jovens e quais os aspectos que mais devem
privilegiar. É assim que, ao questionarmos os alunos, sobretudo os do 12º ano, verificamos
o seu desejo de sucesso social e profissional, mas também a inquietação sobre as
dificuldades que, sabem, irão defrontar, o que os leva, frequentemente, a pôr em causa os
saberes adquiridos ao longo do seu percurso escolar.
Magalhães (1992: 9-10), diz-nos que:

"Desenha-se assim um cenário onde abundam as contradições e que se torna potencialmente gerador
de conflitos: por um lado, o progressivo prolongamento da escolaridade obrigatória faz com que as
nossas crianças e jovens permaneçam na escola por períodos cada vez maiores, tornando assim mais
tardio o ingresso no mercado de trabalho; por outro lado, embora esse mercado de trabalho seja cada
vez mais exigente ao nível da obrigatoriedade da posse de diplomas escolares para o ingresso na vida
activa, ele próprio desvaloriza na prática os saberes escolares, cuja utilidade na vida profissional é
frequentemente posta em causa".

60
1- A escola12, uma organização específica

Martins (1993: 29) diz que

“Todas as sociedades, para sobreviverem, precisam de um grau de integração mínima de todos os


indivíduos no sistema de valores dominante ou nos socialmente aceites. Dado que o processo não é
automático nem natural, serão necessárias instituições para esse desempenho”.

Uma dessas instituições é a escola.


Alves Pinto (1995: 147), baseando-se em King, afirma:

"a escola existe porque existem pessoas que, detendo determinados estatutos num sistema de
interacção com determinada delimitação, desempenham papéis específicos, através dos quais a
instituição e os seus membros prosseguem os correspondentes objectivos".

A escola, encarada nesta perspectiva, é mais do que o conjunto de edifícios e


espaços exteriores delimitados por uma fronteira física visível.

"A escola é um determinado conjunto de acções levadas a cabo por pessoas situadas num sistema de
interacção caracterizado por determinados estatutos, papéis e regras de funcionamento (formal e
informal) " (1995: 146).

Para Quintana-Cabanas (1989: 456),

“a escola responde à necessidade social de transmitir a cultura às jovens gerações e de socializá-las,


integrando-as na colectividade (comunidade) e preparando-as para desempenhar um papel activo
nela. Responde também à necessidade de cada indivíduo de receber esses benefícios.”

Para Rui Canário, citado por Almeida (2007: 63), a escola,

“a partir de um conjunto de valores estáveis e intrínsecos, funciona como uma fábrica de cidadãos,
desempenhando um papel central na integração social”, ao mesmo tempo que desempenha “um
papel fundamental de unidade cultural, linguística e política, afirmando-se como um instrumento
fundamental da construção dos modernos estados-nação”.

12
Não é propósito deste trabalho fazer o historial da escola como organização social. Limitar-nos-emos a
tecer algumas considerações sobre o assunto e apresentar algumas definições.

61
A escola, assim definida, será a escola alargada à comunidade, como um sistema
aberto, onde um cada vez maior número de pessoas tem poder de actuação e intervenção,
"um sistema complexo de comportamentos humanos organizados de maneira a realizar
certas funções no seio da estrutura social" (Alves Pinto, 1992: 20).
É nesta escola, organização social em mudança, que ocorrem situações de
indisciplina e outros comportamentos desviantes que muito afectam o seu funcionamento e
que obstam a que ela atinja plenamente os objectivos que se propõe. Essa indisciplina
manifesta-se dentro e fora da sala de aula, onde um número razoável de alunos, com
tendência a aumentar, estamos em crer, apresenta comportamentos em nada concordantes
com uma situação normal de ensino/aprendizagem. Os efeitos destes comportamentos
manifestam-se a vários níveis, afectando os vários agentes envolvidos no processo
educativo - alunos, professores, funcionários, encarregados de educação - e a sociedade em
geral.

2- A escola e a socialização dos alunos

“A sociedade tem valores e saberes que impõe aos indivíduos,


particularmente às novas gerações, através do subsistema educativo e, por
consequência, do poder que confere ao professor de os transmitir no âmbito
desse sistema. É nessa relação de poder, concretizada nas práticas curriculares
e de controlo na sala de aula, que se estabelece uma espécie de ponte entre o
domínio macro-social e o domínio micro-social.”

(Amado, 2001: 64-65)

O homem não está preparado para viver solitariamente. A vida só poderá ser
compreendida na interacção do homem com os seus pares, em comunidade, onde poderá
cumprir as suas obrigações cívicas e políticas.
O homem, ao nascer, não é portador das suas capacidades sociais, elas não são
inatas, o homem nasce sociável mas não socializado. Transformá-lo de ser sociável em
socializado é trabalho da educação, mais concretamente a sua dimensão social.

62
Educar para a vida é, contudo, educar para uma sociedade dura, difícil, onde existe
grande competitividade. O ser humano é preparado para viver nesta sociedade através de
uma educação social, ou seja, uma ajuda conveniente ou necessária que lhe desenvolve
plenamente as suas capacidades sociais. Essa educação acontece em ambientes
diversificados como a família, a escola e organizações várias. A socialização ocupa, assim,
uma grande parte da vida dos sujeitos, sem nunca se completar.
Musgrave (1984: 20-39) analisa o processo de socialização em duas perspectivas: a
perspectiva estrutural, vista como o processo de socialização ao longo do tempo, plasmado
nos “papéis aprendidos pelos indivíduos enquanto passam ao longo das suas vidas pelas
várias posições de que podem dispor”, e a perspectiva interpessoal, vista como “o processo
pelo qual os indivíduos a qualquer momento aprendem pela interacção com outros qual o
comportamento que deles se espera”.
A sociedade espera dos seus membros determinados comportamentos, que
desempenhem determinados papéis13 que podem ser de três níveis:
a) os papéis primários, e que dizem respeito aos papéis que desempenhamos
sempre, como por exemplo os relacionados com o sexo;
b) os papéis secundários que desempenhamos em algumas circunstâncias, mas não
em todas, e que se relacionam por exemplo com o desempenho de papéis no âmbito de
instituições económicas e/ou políticas;
c) os papéis terciários, configurando os papéis que se desempenham numa única
circunstância.
Este processo de socialização desenvolve-se em ambientes diversificados. Segundo
Musgrave (1984), há quatro agentes de socialização que adquirem particular relevância:
1- A família, que proporciona a aprendizagem de todo o tipo de papéis, onde o
sujeito aprende os papéis primários e secundários, constituindo-se também, como o
ambiente que “fornece” à criança um modelo a imitar, mesmo que inconscientemente;
2- A escola, que pretende responder às exigências educacionais de muitas
profissões, para as quais os pais não estão cientificamente preparados. Assim, a escola
proporciona às crianças competências adequadas às exigências do mercado de trabalho;

13
Os sociólogos distinguem dois tipos de papéis - os papéis atribuídos e os papéis adquiridos,
exemplificando Musgrave com o papel sexual desempenhado pelo homem. A sociedade espera o papel
atribuído de macho, podendo, também, desempenhar o papel adquirido de marido.

63
3- O grupo de colegas, visto numa perspectiva de grupos restritos de crianças ou
adolescentes com idades similares e que proporciona experiências diferentes das que
ocorrem na família. Por outro lado, estes grupos mobilizam o “engenho” da criança que, de
per si, desencadeia mecanismos que assegurem algum “status” entre pares;
4- Os Meios de Comunicação de massa que proporcionam informação, modelos de
papéis e divertimento. A imagem exerce uma forte atracção na criança ou no adolescente,
pelo que o cinema, mas particularmente a televisão, constitui-se como um importante
agente de socialização.
O processo de socialização não é um processo estático, nem linear. Pelo contrário,
ao longo da vida o Homem tem necessidade de aprender novos papéis ou reaprender
outros. A perda de importância de algumas instituições que tem ocorrido nas sociedades
contemporâneas leva a escola a assumir um papel cada vez mais importante, conforme
refere Cherkaoui (1986: 37): “a escola assume e tende a assumir cada vez maior
importância na transmissão da cultura e da diferenciação social (…) devido ao declínio de
instituições tradicionais como a religião e a família”
A socialização ocupa, assim, uma grande parte da vida dos sujeitos, sem nunca se
completar, conforme refere Musgrave (1984: 25) “a socialização deve ser um processo que
dura toda a vida”.

2.1 – O conceito de socialização

Como anteriormente se referiu, o homem, para se integrar na sociedade, sofre um


processo de aprendizagem que começa na família, passa pela escola e continua fora dela.
Este processo é designado de socialização. É um processo complexo que pode resultar da
conjugação de diversos factores e de vários intervenientes e que pode ser encarada sob
perspectivas diferentes. Guy Vincent, citado por Van Haecht (1992: 137), diz que “a
socialização é sem cessar um estar-se fazendo, desfazendo e refazendo-se: é sempre
possível, portanto, que ela ocorra de outra maneira”.
A respeito da socialização Martins (1993: 32) diz-nos que,

“Durkheim considerava ser a ordem imposta por grupos facto indispensável para se obter o consenso
sem o qual o bem estar individual e colectivo seria pouco provável. Referia ainda que o controle

64
seria perene se emanasse dum poder “moral” interiorizado e aceite por todos e não imposto por
métodos violentos.”

Continuando a seguir o pensamento durkheimiano o mesmo autor refere que


Durkheim considerava o indivíduo “egoísta” e “desestabilizador” da “ordem Moral” e por
isso era necessário “modelá-lo” para que a “solidariedade do grupo e o consenso social
fossem mantidos”.

Partindo destas mesmas premissas, Cherkaoui (1986: 37) diz-nos que:

“Socializar é converter. Idealmente significa transformar um indivíduo de ser associal num ser
social, inculcando-lhe categorias de pensamento e um sistema de ideias, crenças, tradições, valores
morais, profissionais ou de classe, dos quais alguns são irreversíveis, e outros, pelo contrário,
mudam em função de novas aprendizagens e de situações vividas”.

Nesta perspectiva, afirma Martins (1993: 33),

“ a socialização faz diminuir a individualização e conduz o agente do processo a uma posição de


subordinação-aceitação a regras e princípios a si exteriores e que emanam duma ordem social e
moral, a quem os indivíduos reconhecem “autoridade”, ficando-lhe sujeitos por uma aceitação e
reconhecimento inquestionáveis”

Também tomando como ponto de partida a definição de educação apresentada por


Durkheim, Boudon e Bourricaud (1982: 485) encaram a socialização como

“uma espécie de treino pelo qual o indivíduo jovem é levado a interiorizar as normas, valores,
atitudes, papéis, saberes e habilidades que comporão uma espécie de programa destinado a ser
executado, mais ou menos mecanicamente, no futuro”.

Da mesma forma, Fermoso (1987: 643-644) entende a socialização “como um


processo mediante o qual o indivíduo aceita conscientemente ou inconscientemente as
pautas de conduta, os costumes, os valores e formas de pensar mais habituais na
comunidade em que vive, e pelo qual aprende a conviver com os demais”.
Alves Pinto (1987: 2) diz que “a socialização é compreendida fundamentalmente
como submissão do jovem indivíduo a um quadro que lhe é exterior, estranho”.
Das definições apresentadas sobressai um aspecto comum: a socialização resulta de
um processo de aprendizagens várias a que os sujeitos estão submetidos, voluntária ou

65
involuntariamente, e que os preparam para integrar a sociedade. Parece poder concluir-se,
também, da existência de um certo ascendente da sociedade sobre o indivíduo,
apresentando este um certo carácter de passividade.

2.2 - Socialização e comportamentos desviantes

Pelo anteriormente exposto, podemos concluir que a escola desempenha um papel


fundamental no processo de socialização dos nossos jovens. Para Van Haecht (1992: 140),
“a escolarização consistiu o modo de socialização por excelência da nossa sociedade
Ocidental”. Também para Alves Pinto (1987: 1) “a escola é nas sociedades ocidentais um
lugar de socialização que tem vindo a alargar o seu campo de influência ao longo do último
século”.
É à escola, como instituição, que compete a tarefa de transmitir, por intermédio dos
seus professores e outros agentes educativos, os conteúdos curriculares, competências e
aptidões. Contudo, e porque ela é palco privilegiado de interacções diversas, os alunos
contactam aí com valores, crenças, normas e culturas heterogéneas, porque heterogénea é
também a população escolar. Esta heterogeneidade pode tornar-se um factor de
desestabilização da escola e pode pôr em causa o próprio processo de socialização se a
escola tentar confrontar-se com a diversidade cultural que hoje em dia nela existe porque,
como nos diz Afonso (1988: 42), “uma das características mais importantes da actual
escola de massas é o facto de nela se encontrarem, lado a lado, crianças e jovens
pertencentes a várias classes sociais”, a várias etnias, raças e credos, acrescentaríamos nós.
Neste sentido, poder-se-á admitir a hipótese da escola falhar como instituição
socializadora, porque, muitas vezes, não aproveita nem respeita a

“diversidade de experiências vivenciais (sociais e familiares) dos seus alunos” nem tem em conta
que “elas mesmas são geradoras de expectativas e possibilidades desiguais”, antes pelo contrário,
impõe “certas normas, valores e crenças, tenta afirmar-se como o lugar por excelência do discurso
competente - instância privilegiada do consenso em termos de valores e de cultura.
Consequentemente, tende a desvalorizar todos os conhecimentos, valores e comportamentos que se
afastem de um certo padrão cultural único e tido como melhor para todos os elementos da
sociedade” (Afonso, 1988: 42-43).

66
Para Melo (1993: 39),

“a escola desenvolve uma acção, que, por processos por vezes subtis, leva à estigmatização de
determinados alunos, que, por tal facto, são rejeitados ou depreciados socialmente, em maior ou
menor grau conforme o contexto cultural a que pertencem” e, continua dizendo que “a escola produz
ou aumenta, frequentemente, desigualdades entre os alunos, desigualdades essas que são valorizadas
pela sociedade e pelos próprios alunos”.

Esta situação poderá provocar reacções diversas nos alunos que, frequentemente,
manifestam recusa na aceitação dessas normas, valores, crenças e até saberes. Muitos
alunos vêem a escola como um local que as suas famílias ou o poder instituído os obriga a
frequentar, um local que já não corresponde aos seus anseios e aspirações14.
Confrontam-se, também, com o problema de acabarem um ciclo de estudos, que
lhes é certificado com um diploma, mas não conseguem ingresso no mundo do trabalho.
Esta situação leva-os a questionarem a validade dos saberes escolares e a importância da
escola enquanto instituição académica. Todos estes factores conjugados contribuem para o
descrédito do papel da escola na sociedade e levam, frequentemente, a manifestações que
se traduzem em comportamentos desviantes de indisciplina e, não raras vezes, de
violência, dentro e fora das escolas.

3 - A sala de aula, principal espaço do processo educativo

Dentro da escola, existem espaços com funções específicas. A sala de aula é, sem
dúvida, o mais importante de todos eles. É neste espaço que ocorrem as principais
interacções do processo de ensino / aprendizagem. Para Magalhães (1992: 38) “A sala de
aula pode ser encarada como um cenário, onde quotidianamente acontecem representações,
então poder-se-á eventualmente trazer a este palco os actores (sociais) que aí
desempenham os papéis que lhes foram atribuídos: os professores e os alunos”.
No âmbito da nossa investigação sobre a indisciplina na sala de aula dedicaremos
especial atenção aos aspectos que consideramos serem mais importantes para a

14
Não podemos esquecer que actualmente a escola sofre a concorrência de outros meios de informação mais
aliciantes e cativantes para os jovens

67
compreensão do assunto abordado e que ocorrem nesse espaço: multiplicidade de
interacções, relações de poder, estratégias adoptadas pelos intervenientes.

3.1- As interacções na sala de aula

O professor procura transmitir aos seus alunos um conjunto de conhecimentos


curriculares, atitudes e competências - forma os alunos com vista à sua futura integração na
sociedade. Segundo Alves-Pinto, (1995: 85) “É ao professor que a sociedade confia a
tarefa de socializar os novos membros”. Citando Durkheim, a mesma autora escreve:

“é pois a ela (sociedade) que cabe relembrar incessantemente ao professor quais as ideias, os
sentimentos que é necessário incutir na criança para a homogeneizar com o meio em que a mesma
deverá viver (…). Necessário se torna que pais e mestres sejam para ela (criança) o dever encarnado
e personificado (…) o tom imperativo (…) o respeito que inspira nas vontades e que os obriga a
inclinar-se”.

Professores e alunos encontram-se, pois, em constante interacção15 no espaço que


lhes é reservado por excelência - a sala de aula. Neste espaço, que fisicamente é quase
isolado do resto da escola, reveste especial importância a questão da comunicação. É
através dela que o professor procura transmitir os seus conhecimentos e os alunos, com o
respectivo feedback, mostram se os adquiriram ou não. Contudo, a comunicação na sala de
aula nem sempre é fácil, muitos são os obstáculos que podem dificultar o processo
comunicacional, impedir o professor de realizar eficazmente o seu trabalho e, por
conseguinte, impedir os alunos de alcançar os seus objectivos. Entre essas dificuldades
podemos referir as seguintes: a forma como a mensagem é transmitida e interpretada pelas
duas partes em comunicação; a distância entre o emissor e o receptor; a adequação da
mensagem às características do(s) receptor(es).
Relativamente ao primeiro aspecto, diz-nos Magalhães (1992: 44) que

“ do ponto de vista dos comportamentos indisciplinados, a forma como o professor transmite a sua
mensagem e a forma como ela é percebida pelo(s) aluno(s) assumirá eventualmente maior
importância do que o seu próprio conteúdo. Assim, uma mensagem interpretada pelo(s) alunos como

15
Blumer, citado por Melo (1993: 42) entende a interacção como “um dar e receber diário entre professor e
alunos”

68
desajustada à situação poderá desencadear nele(s) comportamentos indisciplinados que o professor
não previra, nem pensara desencadear com a sua mensagem. Mas, ainda deste ponto de vista, poder-
se-á pensar que o inverso também é (poderá ser) verdadeiro, quando o professor interpreta
diferentemente as mensagens que recebe dos alunos”.

A aproximação ou afastamento do(s) aluno(s) relativamente ao professor pode


facilitar ou prejudicar a relação que entre ambos se estabelece. A nossa experiência como
professores mostra-nos que os alunos que se encontram mais afastados do professor têm
mais tendência a distrair-se das suas actividades, mais dificuldades de concentração e estão,
por isso mesmo, mais propensos a não ouvirem as explicações do professor ou a deturpá-
las. A autora anteriormente citada (Magalhães 1992: 45) afirma a este propósito:

“ estudos têm provado que a proximidade do aluno relativamente ao professor influencia quer o
processo de aprendizagem, quer o comportamento do aluno e que existem relações estreitas entre o
posicionamento do aluno na sala de aula e o seu sucesso ou insucesso escolar, nomeadamente porque
o número de interacções que se estabelecem entre o aluno e o professor aumenta consideravelmente
com a proximidade entre ambos.

Relativamente à adequação da mensagem às características do(s) receptor(es),


poderão também existir problemas que dificultem a comunicação e contribuem para a
existência de comportamentos disruptivos. Nas nossas escolas, cada vez mais encontramos
alunos de diferentes raças, diferentes credos, diferentes categorias socioeconómicas que
sentem maiores ou menores dificuldades em compreender e descodificar as mensagens que
lhes são transmitidas. Essas dificuldades podem levar os alunos a desinteressarem-se do
processo de ensino e a enveredarem por comportamentos desviantes. Afonso (1989: )
confirma o que acabámos de dizer ao afirmar que

“relações interpessoais privilegiadas com determinados tipos de alunos - geralmente com aqueles
que os professores consideram “alunos ideais”, podem provocar nos outros (os que, por oposição,
seriam “alunos não ideais”) estigmas ou outras formas de rejeição que, por sua vez, tenderão a
favorecer a ocorrência de comportamentos de resistência e indisciplina na sala de aula”.

As interacções na sala de aula poderão ser também afectadas pelo funcionamento


da turma enquanto grupo. Com efeito, sabemos que as nossas turmas são grupos
extremamente heterogéneos sob vários aspectos: sexo, idade, proveniência, nível
socioeconómico, etc. Num grupo com estas características facilmente encontramos

69
elementos com fraca predisposição para os estudos, com dificuldades de integração no
espírito do grupo/turma e que podem tornar-se potenciais elementos desestabilizadores
dentro da sala de aula. Esta situação poderá agravar-se quando numa mesma turma se
juntam um ou vários elementos que foram obrigados pela família a frequentar a escola e
que se tornam autênticos líderes de contestação ao trabalho do professor e dos outros
colegas. Na medida em que a maioria das regras e normas são exteriores ao grupo/turma e
impostas do exterior, pode significar, por si só, uma recusa da sua aceitação, pelo menos
por parte dos alunos não integrados, levando-os a comportamentos indisciplinados
(Magalhães, 1992: 46-47).
A problemática das interacções na sala de aula não se esgota, evidentemente, nestes
dois aspectos abordados. Outros poderiam ser referidos, embora, pensamos nós, sem a
importância e influência nos comportamentos indisciplinados como os tratados. Porém,
estes aspectos, porque se interligam com a existência de normas e regras, conduzem-nos a
uma outra problemática de grande relevo e interesse na sala de aula - as relações de poder
que aí se estabelecem.

3.2- As relações de poder na sala de aula

O professor é a pedra principal sobre a qual assenta todo o peso fundamental da


actividade da escola. Como figura basilar da educação, o professor é comummente
conotado com o poder e a autoridade. O poder e a autoridade, exercidos de forma correcta
ou incorrecta, condicionam, de forma decisiva, as interacções professor aluno e são, muitas
vezes, responsáveis pelo clima de estabilidade ou instabilidade criada na sala de aula.
Relativamente ao exercício do poder podemos levantar algumas interrogações que
melhor nos ajudarão a compreender o seu funcionamento na sala de aula. Que tipo de
poderes encontramos na sala de aula? Quem os exerce?

3.2.1- O conceito de poder

Max Weber foi um dos autores que primeiramente analisou a questão do poder.
Citado por Afonso (1989: 10), concebe-o como “a probabilidade de um actor impor a sua

70
própria vontade, dentro de uma relação social, ainda que contra toda a resistência e
qualquer que seja o fundamento dessa probabilidade”.
Weber (1979) constrói um modelo de organização burocrática em que contrapõe o
conceito de burocracia racional ao conceito marxista de luta de classes.
Uma das características deste modelo prende-se com a necessidade das
organizações possuírem áreas de jurisdição organizadas de acordo com regulamentos (leis
ou normas administrativas). Explica Weber, que numa estrutura burocrática, as actividades
são distribuídas e constituem-se como deveres oficiais inalteráveis. A responsabilidade de
ordenar está, segundo o autor, regulamentada e é proporcional aos meios de coerção
colocados à disposição de funcionários ou autoridades. Por isso são tomadas medidas que
visem o cumprimento dos deveres e execução dos correspondentes direitos. As normas são
racionais porque se adequam aos fins da organização. Também são legais porque conferem
às pessoas investidas de autoridade o poder de coacção sobre os subordinados.
Assim, domínio e autoridade implicam, para Weber, a oportunidade de que uma
determinada ordem encontre obediência na pessoa ou no grupo que a recebe. O sujeito
obediente segue o conteúdo da ordem como máxima que orienta a sua acção.
Para Weber, é a autoridade que proporciona poder, donde se deduz que ter
autoridade é ter poder. O contrário não é verdadeiro na medida em que ter poder não
significa necessariamente ter autoridade. Tanto a autoridade como o poder que dela emana
dependem da sua legitimidade, ou seja, da capacidade de justificar o seu exercício.
Ainda segundo Weber, os tipos de autoridade são a autoridade tradicional, a
autoridade carismática e a autoridade racional, legal ou burocrática.
A esta definição generalizante podemos acrescentar outras mais específicas e
algumas adaptadas à realidade escola. Boudon e Bourricaud, citados por Melo (1993: 43),
definem poder como

“uma relação assimétrica entre dois ou mais actores (…) em que A tem a capacidade de conseguir
que B faça o que B não teria feito por ele mesmo e que está de acordo com as intimações ou
sugestões de A”.

Etzioni, citado por Afonso (1989: 11), define o poder como “a capacidade de um
indivíduo para induzir ou influenciar outro a seguir suas directrizes”. Em contexto escolar,

71
podemos adoptar a definição simples que nos é dada por Afonso (1989: 10) ao afirmar que
o poder é o “potencial que tem A de levar B a fazer aquilo que A quer”.
Analisado que está, embora de forma simplista, o conceito de poder, vejamos como
ele se manifesta na sala de aula, quando utilizado pelos actores em palco: professores e
alunos.

3.2.2- O poder do professor

A sala de aula confere ao professor intimidade e autonomia. A sala de aula é o seu


espaço e ele organiza-o como bem entender, aí desenvolvendo a sua autoridade e o seu
poder. A autoridade advém-lhe do facto de se encontrar acima dos alunos na hierarquia da
organização (Melo, 1993: 43). Magalhães (1992: 51), baseando-se em Gotzens, diz-nos
que

“o poder do professor resulta da existência (conjugada ou não) de uma certa capacidade de exercer
influência sobre os seus alunos, nomeadamente pela sua própria personalidade (carisma); da
capacidade de dominar e controlar as diferentes situações com que é confrontado (domínio); da
capacidade de dominar conhecimentos numa área específica do saber (poder intelectual); e da
capacidade de planear, organizar e avaliar as diferentes actividades dos alunos (recursos implícitos)”.

Afonso (1989: 16) apresenta-nos diferentes tipologias de poder que o professor tem
e aplica na escola e sobretudo na sala de aula. Destacam-se, da obra deste autor, as de
Shipman, Ribeiro & M. Bregunci e Formosinho. Shipman releva o poder normativo e
coercitivo, aplicados simultaneamente pela escola. Quando se pretende que “os alunos
interiorizem determinadas normas” com vista a uma “socialização perfeita”, estaríamos
perante um poder normativo. Contrariamente, se se verificar, por parte dos alunos, uma
recusa na aceitação das normas, impostas pela escola, então esta lançará mão de um poder
de tipo coercitivo.
Ribeiro e Bregunci centram as suas atenções no poder institucional do professor.
Assim, com base na transposição e adaptação das autoras podemos elaborar o quadro II.

72
QUADRO I - Tipologias do poder do professor segundo Ribeiro & Bregunci

TIPOS DE PODER CARACTERÍSTICAS


Permite que o professor determine, por exemplo, os métodos de estudo, as regras de trabalho e de
LEGÍTIMO (CARGO)
comportamento dos alunos na sala de aula e também fora dela.
COERÇÃO É o que possibilita que o professor utilize punições ou restrinja a liberdade dos alunos.

RECOMPENSA Baseia-se na utilização de estímulos positivos.

REFERENTE Decorre da eventual identificação do aluno com o professor.


Baseia-se no reconhecimento e valorização, por parte do aluno, do facto de o professor saber mais e
ESPECIALISTA
ter um conhecimento aprofundado num determinado domínio.

Fonte: Afonso, A. J., 1989: 16

Formosinho, encarando o poder sob um ponto de vista mais lato, propõe uma
classificação em seis tipologias, apresentadas no quadro II:

QUADRO II - Tipologias do poder do professor segundo Formosinho

TIPOS / BASES DE PODER CARACTERÍSTICAS


É aquele que está subjacente à possibilidade que os professores têm de utilizar o castigo
FÍSICO-AUTORITÁRIO
corporal como acção disciplinar.
“Não é um poder exercido pelo professor, mas sobre o professor” na medida em que é este
MATERIAL OU REMUNERATIVO
que está vinculado à escola por um contrato cuja base é sobretudo monetária.
Pressupõe que o professor seja capaz de exercer influência sobre os alunos fazendo apelo a
NORMATIVO normas e valores consensuais. Pode ser dividido em poder normativo moral se resulta do
apelo a normas sociais e outras e poder ideológico se resulta do apelo a valores e ideologias.
Capacidade de influência que o professor exerce sobre os alunos pelo facto de dominar
COGNOSCITIVO
conhecimentos e possuir experiências que eles não têm.
Fundamenta-se nas “características afectivas, temperamentais e de personalidade” do
PODER PESSOAL
professor. Esta fonte de poder é extremamente importante sob o ponto de vista pedagógico.
Decorre do facto do professor estar oficial e legalmente respaldado para exercer a sua
actividade numa organização formal que é a escola. Este poder, embora confira ao professor
AUTORITATIVO / AUTORIDADE
uma “superioridade formal”, nem sempre é suficiente para manter uma relação educativa
eficaz.

Fonte: Afonso, A. J., 1989: 17-1

Pelo exposto, concluímos que a escola investe o professor de variados poderes,


legitima a sua acção em termos disciplinadores. Da mesma forma, outros poderes do
professor são de natureza pessoal com especial destaque para o poder avaliativo do qual se
serve muitas vezes para efeitos dissuasores de comportamentos indisciplinados.
No entanto, se o professor possui uma fatia apreciável do poder na escola, e mais
particularmente na sala de aula, ele não possui todo o poder. O carácter relacional implica
que outros actores neste contexto detenham algum poder porque, como diz Crozier, citado
por Afonso (1989: 21) “cada membro de uma organização, mesmo o mais humilde, dispõe
de uma certa forma e até um certo ponto (…) de um mínimo de poder (…)”. Na
organização escola esses membros são os alunos.

73
3.2.3- O poder dos alunos

Acabámos o ponto anterior referindo que os alunos possuem na escola e sobretudo


na sala de aula algum poder, pelo menos informal. Todos nós, professores, já fomos
confrontados com esse poder. Quem nunca cedeu aos intentos de uma turma na marcação
de um teste de acordo com as suas preferências? Quem nunca alterou estratégias na
leccionação de determinados conteúdos programáticos? Quem nunca se deixou seduzir
pela organização de determinadas actividades extracurriculares, como visitas de estudo,
por exemplo? São apenas alguns exemplos do poder informal dos alunos.
Mas que tipo de poder exercem os alunos? Sara Delamont (1987: 89) responde a
esta questão:

“enquanto que o papel do professor é um papel de dominância socialmente aceite - legítimo -, o


papel do aluno é um papel de subserviência. Qualquer poder que os alunos exerçam não será um
poder socialmente aprovado, mas sim ilegítimo. Espera-se que os alunos aprendam e se comportem
de maneira a facilitar a aprendizagem, seja deixando-se ficar sentados a absorver calmamente as
lições dos professores, seja atarefando-se com folhas de exercícios, aparelhos ou “recursos”
diversos”.

Podemos, então, concluir que o poder dos alunos é um poder ilegítimo, porque não
é socialmente aceite e não lhe é conferido nem legitimado pela instituição. Neste caso,
esperar-se-ia dos alunos uma atitude de completa passividade dentro da sala de aula,
esperando ser “cheio” com os conhecimentos transmitidos pelo professor. Contudo, e
seguindo o pensamento da autora anteriormente referida (1987: 89), “nem todos os alunos,
porém, aceitam as obrigações do papel, e seria perigoso supor que a dominação está
assegurada à partida, como muitos investigadores já supuseram”.
Afonso, em pesquisa efectuada, concluiu que os alunos possuem pouco poder
formal na sala de aula. Contudo, o seu poder informal é grande e, em determinadas
situações, têm capacidade de manipular os professores, interferir nos modelos e métodos
de ensino e, por vezes, impor a sua própria vontade. Se o aluno na sala de aula conseguir
mobilizar conjuntos de interacções pode fazer desenvolver outros tipos de poder nos seus
colegas, nomeadamente, o poder de grupo, o poder físico e o poder pessoal. O mesmo
autor refere que o aluno detém, ainda, outro tipo de poder, o poder de perito, que pode
utilizar sob a forma de comportamentos de resistência para pôr em causa a imagem

74
profissional dos professores. Quando tal acontece, quando se confrontam os poderes de
professores e alunos e se chega à fronteira entre o permitido e o proibido, surge a
necessidade do controlo disciplinar.
Na sala de aula, os alunos influenciam a actuação do professor com base em dois
tipos de poder: o poder individual e o poder do grupo, sendo este último a principal origem
do poder dos alunos. Para Sara Delamont (1987: 89) “a força de um aluno está em relação
directa com o número de colegas da turma que podem ser mobilizados para o apoiar – que
com ele partilham a mesma definição da situação”. Afonso (1989: 24) completa esta ideia
ao afirmar que

“esta capacidade pode estar associada a outros factores, entre os quais o facto desse mesmo aluno
pertencer, eventualmente, a sub-culturas específicas, como aquelas que foram caracterizadas em
certos estudos como sub-culturas anti-escolares, e que, sendo temidas pelos outros alunos e até pelos
professores, podem impor algumas condições na definição da situação ao nível da sala de aula. Neste
caso estaríamos, indirectamente, em presença do poder de grupo”.

Já no entender de Postic (1984: 177), “os alunos, pelo seu poder no campo
afectivo, introduzem um processo de regulação do poder que o docente tem no plano
funcional”.
Como já anteriormente se referiu, outras podem ser as formas de poder adoptadas
pelos alunos em interacção. O poder físico ou força física é uma delas. Embora não seja
ainda muito comum nas nossas escolas, pontualmente aparecem menções a agressões
perpetradas sobre alunos, ameaças de agressão e algumas agressões consumadas, sobre
alguns professores e funcionários16. Disso mesmo nos dá conta Melo (1993: 46) que,
baseando-se em Baillauqués, afirma:

“existem alunos difíceis que resistem abertamente, que provocam e perturbam a turma a que
pertencem como quem pretende distanciar-se dela. A ameaça aos colegas de lhes bater - esperando-
os à porta, quando os encontrar a sós, no recreio ou noutro local - aliada à força física que aparentam
ter pode criar receio entre os colegas”.

Em relação aos professores, o mesmo autor (1993: 46) refere:

16
Os meios de comunicação social têm nestes últimos anos noticiado casos de agressões nas escolas com
mais frequência. O Presidente da República e o ministério Público têm mostrado apreensão e preocupação
com o aumento da frequência destes casos, recomendando ao governo a tomada de medidas.

75
“ todo o professor reconhecerá que a força física que certos alunos exibem - e que pode ser associada
à agressão ou possibilidade de agressão - tem uma influência real no comportamento do grupo-turma
durante as aulas. Este poder, aliado a determinadas características ou qualidades excepcionais,
podem fazer de um aluno um líder natural, nomeadamente, se ele detiver uma situação sociométrica
elevada por relação aos colegas”.

No caso da liderança, ela pode trazer grandes problemas ao funcionamento da sala


de aula, pois um aluno que tenha noção dessa capacidade pode ganhar prestígio entre os
colegas e entre os professores. Se for um aluno com boas capacidades, pode levar a turma a
responder às expectativas do professor. Contrariamente, se for um aluno com atitudes
negativas face à escola, pode influenciar negativamente os seus colegas e desviá-los dos
objectivos educativos definidos à partida. Esta situação torna-se tanto mais real quanto a
maioria da turma pender para uma situação ou outra.
Concluindo, a sala de aula é palco de inúmeras interacções, marcadas por relações
de poder - o poder do professor e o poder dos alunos. Destes dois tipos de poder apenas o
poder do professor é um poder legítimo e reconhecido pela instituição e pela sociedade. O
poder dos alunos é um poder informal, não legitimado pela instituição nem reconhecido
socialmente. Contudo, ele existe e é necessário contar com ele pelo facto de poder
interferir negativamente no normal funcionamento do grupo-turma e impedir que
objectivos definidos sejam atingidos. Por este facto, os actores em interacção - professor e
alunos -, tentando salvaguardar os seus interesses pessoais, socorrem-se de um conjunto de
estratégias que procuram implementar na sala de aula.

3.3- As estratégias na sala de aula

Referiu-se, anteriormente, que na relação pedagógica existem determinados


objectivos que é preciso atingir. Nizet e Hiernaux (s/d: 63) dizem que

“os objectivos perseguidos pelos professores são relativamente constantes, pelo menos duma forma
geral: para os professores, trata-se sempre de fazer com que os alunos se empenhem na formação
escolar”.

Mas, se no caso dos professores os objectivos são precisos e claros, acontecerá o


mesmo com os alunos? Os mesmos autores (s/d: 63) referem que

76
“o problema dos objectivos que perseguem, nomeadamente através dos comportamentos de
oposição e de retraimento (…) parecem complicar-se, o que não acontecia no caso dos professores.
Não somente não se distingue claramente quais os objectivos que perseguem adoptando tais
comportamentos, como inclusivamente se pode perguntar se eles perseguem na realidade algum
objectivo”.

Parece, pois, estar-se perante posições opostas entre os principais envolvidos no


processo educativo, o que faz prever dificuldades na interacção entre as partes. Daí a
necessidade de se adoptarem estratégias que visem ultrapassá-las.
Gento, citado por Castilho (1992: 564), refere que

“qualquer estratégia, entendida como apresentação conjunta das directrizes a seguir em cada uma
das fases do processo, determina actuações concretas em estreita relação e permanente referência
com os objectivos que se pretendem conseguir”.

Para Plaisance, citado por Magalhães (1992: 61),

“a estratégia concebida como uma articulação subjectiva de meios com os fins visados, envolve
actores individuais que compõem reciprocamente as suas perspectivas, que “negoceiam” as
situações, que constroem, na sua interacção, uma realidade social comum”.

3.3.1- As estratégias dos professores

Nizet e Hiernaux, (s/d: 31-33), abordam a questão das estratégias dos professores
na sala de aula. Segundo estes autores, os professores na sala de aula utilizam estratégias
severas e estratégias suaves. As primeiras assentam em relações distantes e assimétricas e
no uso da coação. As segundas baseiam-se nas relações próximas e simétricas e utilizam
meios não coercivos. Os autores sintetizam as suas ideias no quadro III:

QUADRO III - As estratégias dos professores segundo Nizet e Hiernaux

TIPOS DE ESTRATÉGIA ESTRATÉGIA SEVERA ESTRATÉGIA SUAVE


MEIOS UTILIZADOS Meios de coação Meios não coercivos
CARACTERÍSTICAS DA RELAÇÃO Distância e assimetria Proximidade e simetria

Fonte: Nizet, J. & Hiernaux, J. P. (s/d: 33)

77
Relativamente às estratégias severas dizem-nos os autores (s/d: 33) que os
professores que as utilizam exercem a autoridade sobre os alunos, isto é, afirmam-se
superiores a eles, recorrendo à “coacção directa e personalizada”, ao “regulamento”, à
“coacção regulamentar”.
Recorrendo a este tipo de estratégias, os professores utilizam diversos tipos de
coacção: “a coacção directa pode utilizar diversos meios, desde o castigo à punição, à
“descompostura” à “tareia” (Nizet e Hiernaux, s/d: 34). A utilização da punição indica-nos
que há situações que não são toleradas aos alunos e outras que o serão, reforçando o
carácter de desequilíbrio de poder na relação educativa. Como forma de coacção, os
autores salientam ainda o papel da “negociação” entre professor e alunos na sala de aula,
sobretudo nas notas e atribuição de diplomas. A importância da negociação é reforçada por
Melo (1993: 48-49) ao dizer que

“os professores sabem, ou pressentem, que a forma adequada ao estabelecimento de um clima que
lhes permita, de facto, dar o programa é através do estabelecimento de uma negociação que pode ser
subentendida ou explicitada”.

Outros professores preferem, no seu dia-a-dia, utilizar as estratégias suaves “que


tentam estabelecer com os seus alunos relações igualitárias e de proximidade, que evitam o
recurso à coacção” (Nizet e Hiernaux, s/d: 43). Prosseguem dizendo que conseguem os
seus objectivos

“através duma ordenação e utilização apropriadas do espaço. (…) Não utilizar o estrado significa
claramente a instauração duma situação de igualdade na relação. Outras formas de ordenação ou
utilização podem consistir na colocação das carteiras ou secretárias, na decoração, etc.” (idem: 44).

Levar os alunos a interessarem-se por actividades extracurriculares, como visitas


de estudo, projectos de investigação, clubes, jogos, etc., e a debaterem questões de
natureza extra-escolar, ligadas a temas do quotidiano e do interesse dos alunos, pode levar
a um melhor conhecimento recíproco e a uma maior aproximação.
Por fim, os autores da obra Aborrecimento dos Jovens na Escola salientam a
possibilidade de os professores poderem utilizar alternadamente os dois tipos de
estratégias, de acordo com as situações que se lhes deparam. Dizem-nos eles (s/d: 61- 62):

78
“podem-se considerar diversas combinações destas 2 estratégias, ou ainda diversas passagens de
uma à outra”, concluindo, no entanto, que “diversas apreciações provenientes de professores e
alunos mostram que, se nenhuma das 2 estratégias examinadas é plenamente eficaz, sem dúvida, a
combinação de uma outra não o é mais”.

Finalizamos a questão das estratégias dos professores na sala de aula com a


perspectiva de Peter Woods, citado por Magalhães (1992: 66-67) que, tendo analisado os
constrangimentos que sobre os professores pendem, concluiu que os mesmos têm
necessidade de desenvolver e utilizar um conjunto de estratégias que denominou de
estratégias de sobrevivência, que sintetizamos no quadro IV:

QUADRO IV - As estratégias dos professores segundo Peter Woods

ESTRATÉGIA CARACTERÍSTICA / FUNÇÃO


Consiste numa espécie de manobra de antecipação através da qual os alunos são “treinados” num
SOCIALIZAÇÃO
conjunto de competências que vão da forma de vestir à postura na escola e na sala de aula.
Considerando que, genericamente, os professores são maiores, mais fortes e mais experientes do
DOMINAÇÃO que os alunos, estas capacidades podem ser usadas para garantir uma forma coerciva de controlo
sobre os alunos, incluindo o castigo corporal e a agressão verbal.
Assenta na troca e no compromisso e utiliza, para se afirmar, os apelos e as apologias, a lisonja e o
NEGOCIAÇÃO
elogio, as promessas e o suborno, a permuta e as ameaças.
Consiste em o professor se empenhar em obter boas relações com os seus alunos, procurando dessa
FRATERNIZAÇÃO forma minimizar potenciais conflitos e desenvolver nos alunos o sentido da obrigação. Pode
assumir diferentes formas.
AUSÊNCIA OU Consiste na ausência (ou retirada) da cena de potenciais conflitos e pode ir do extremo absoluto da
RETIRADA ausência física à renúncia do cumprimento do dever, contemplando um amplo leque de técnicas.
A chamada, os testes, os horários, e a estrutura das lições são algumas das rotinas que são
RITUAL E ROTINA
facilmente aceites por todos na escola e que podem servir para estabelecer a base do controle.
TERAPIA Conjunto de movimentos corporais frequentemente acompanhados pelo entorpecimento dos
OCUPACIONAL sentidos e pode ser usada por professores e alunos.
É uma estratégia retrospectiva e permite aos professores neutralizarem mentalmente o problema da
SUPORTE MORAL
sobrevivência através da retórica e do riso.

Fonte: Magalhães, O. (1992: 66-67).

3.3.2- As estratégias dos alunos

O ponto anterior deixou claro que existe uma desigualdade de poder entre professor
e alunos na sala de aula. A possibilidade do professor utilizar a punição mostra claramente
esse desequilíbrio de poder. Como reagirão os alunos perante tal situação? Adoptarão eles
próprios estratégias de defesa? Atendendo a que “o aluno é constrangido à interacção e, ao
contrário do que acontece noutras situações, não pode geralmente iniciá-la ou interrompê-
la sem que incorra em algum tipo de sanção” (Afonso, 1989: 30), é provável que os alunos

79
adoptem como estratégia comportamentos de rebeldia e de recusa para atingirem os seus
objectivos.
Os comportamentos indisciplinados, como estratégia, podem manifestar-se, por
exemplo, quando os alunos são solicitados pelo professor a dar determinadas respostas. Se
eles conseguem dar a resposta correcta, vão sentir-se envolvidos no processo de ensino
aprendizagem e vêem a sua participação como lícita e pedida pelo próprio professor.
Contrariamente, quando não conseguem descobrir o que o professor deseja, não
conseguem dar a resposta correcta ou o professor não aceita os seus pontos de vista,
podem, facilmente desinteressar-se da aprendizagem, desmotivar-se, distrair-se, enveredar
por situações de brincadeira, de indisciplina, que poderão ser passíveis de admoestação por
parte do professor (Magalhães, 1992: 71).
Nizet e Hiernaux (s/d: 10) estudaram, também, as estratégias dos alunos na sala de
aula. Para estes autores, existe um certo desfasamento entre a oferta da escola e o modelo
cultural dos alunos, o que pode condicionar a sua actuação na sala de aula.

“Os alunos, também eles, que sofrem de aborrecimento, manifestam agressividade e violência.
Pretendeu-se mostrar que foi devido às mesmas razões: eles não encontram na escola o que lá
procuram encontrar (…), o seu modelo cultural” e continuam: “ora, o que a escola oferece - como
conteúdo, como tipo de relações, como modo de organização…- está muitas vezes deslocado em
relação a esse modelo cultural”.

Os mesmos autores (s/d: 71) reforçam a ideia dizendo que “o desequilíbrio entre a
oferta escolar e o modelo cultural dos alunos constitui o terreno propício ao
desenvolvimento de estratégias de oposição e retraimento”. Quando se verifica uma
situação como a descrita, os alunos adoptam, para sua defesa, as chamadas estratégias
dependentes de acordo com as estratégias utilizadas pelo professor, que poderemos
sintetizar no quadro V:

QUADRO V - As estratégias dos alunos segundo Nizet e Hiernaux

TIPO DE CORRESPONDÊNCIA COM AS


SUB-CATEGORIA CARACTERÍSTICAS
ESTRATÉGIAS ESTRATÉGIAS DO PROFESSOR
Dependência “positiva” Aceitação da oferta escolar
DEPENDENTES Comportamentos de oposição e Estratégia severa - oposição
Dependência “negativa”
retraimento Estratégia suave - retraimento

Fonte: Nizet e Hiernaux, (s/d: 126-132)

80
Finalizamos a questão das estratégias dos alunos na sala de aula com o quadroVI,
que resume as estratégias mais ligadas aos comportamentos indisciplinados. Este quadro
foi elaborado com base em Olga Magalhães (1992: 72) que, por sua vez, se baseou em
autores como Descombe, Perrenoud, Fontana, Rosser & Harré, Smith, etc.:

QUADRO VI - As estratégias dos alunos segundo vários autores


ESTRATÉGIAS CARACTERÍSTICAS
Atendendo ao papel socializador da escola e à autoridade formal e institucional que detém, é
CONTESTAÇÃO DA possível pensar que os alunos adoptem comportamentos indisciplinados como estratégia de
AUTORIDADE
contestação da autoridade, quer seja individual do professor ou institucional da escola.
Aceitando-se a necessidade de afirmação dos jovens perante os seus companheiros, poder-
PROMOÇÃO INTER PARES se-á encarar a indisciplina como uma estratégia de afirmação do jovem no contexto do
grupo-turma.
Uma vez que a maior parte do tempo que os alunos passam na escola o passam na sala de
CRIAÇÃO DE ESPAÇOS DE aula, os comportamentos de indisciplina podem pretender obter a expulsão da sala de aula,
CONVÍVIO
de forma a prolongar o tempo de convívio com os colegas, nomeadamente de outras turmas.
A contestação de que a oferta escolar não corresponde quer às expectativas, quer às
CONTESTAÇÃO DA OFERTA necessidades impostas pelo mercado de trabalho, pode desencadear nos alunos
ESCOLAR
comportamentos de indisciplina que visem precisamente contestar essa oferta escolar.

Fonte: Magalhães, O., 1992: 72

Relativamente às estratégias na sala de aula, podemos concluir que elas são


utilizadas por professores e alunos. Uns e outros servem-se de estratégias diversificadas
para tentarem alcançar os seus objectivos específicos.
Contudo, e porque os actores nem sempre estão de acordo, havendo alunos que com
a sua actuação mais não pretendem do que contestar o sistema escolar, pôr em causa a
função e actuação dos professores ou promoverem-se pessoalmente entre os seus pares,
enveredam por comportamentos indisciplinados que constituem, para eles, autênticas
estratégias de actuação.
Perante a diversidade de situações, os professores adoptam estratégias que podem
dividir-se em estratégias severas, suaves ou de sobrevivência, que lhes permitam adaptar-
se e acomodar-se à escola, a fim de aí garantirem a sua permanência com um mínimo de
desgaste e stress.

81
3.4. Regras, desvios e sanções

“Todas as sociedades (...) estabelecem regras cuja transgressão provoca


desaprovação, cólera ou indignação. E onde existem regras, existem
transgressões”.

A. Cohen, cit. por Domingues (1995: 13)

A vida em sociedade seria impossível sem a existência de normas que


regulamentem os comportamentos dos membros das classes. Da mesma forma, as
organizações sociais só conseguem atingir os seus objectivos se criarem mecanismos que
regulamentem as relações e interacções dos seus membros. Cada indivíduo, na sociedade
ou em instituições específicas, necessita de orientações, saber o que deve fazer, o que os
outros esperam dele e o que ele deve esperar dos outros. As regras definidas por Giddens,
citado por Amado (2002: 96), como “procedimentos generalizáveis aplicados no pôr em
marcha e na reprodução da vida social”, fornecem aos indivíduos esses conhecimentos e
orientações gerais.
Amado (2001: 96), baseando-se em Doyle, refere que

“toda a organização social, das grandes instituições aos pequenos grupos, para alcançar os seus
objectivos, tem de regulamentar as relações e as condutas dos seus membros. Com efeito, os
membros de uma organização necessitam de alguns pontos de acordo que orientem em comum as
acções de cada um deles - as regras constituem essa espécie de conhecimento, comum e geral, sobre
que tipo de comportamento é aceitável e em que contextos”.

O mesmo autor (2001: 96), seguindo o pensamento de Parsons, diz que ”Numa
perspectiva funcionalista, a regra tem um papel de instrumento de socialização; procura-se
que os membros de uma determinada cultura pautem os seus actos por um sistema
normativo mais ou menos comum, estável e preexistente”. Continuando a referir-se a este
assunto (2001: 97), apoiando-se, neste caso, em Goffman e Dubet, salienta que “numa
visão interaccionista, a vida dos grupos, tal como a de cada um dos seus membros, é
determinada, mais do que por estruturas normativas preexistentes, por incessantes
redefinições e interpretações da situação, ficando bem vincada a diferença entre sistema e
indivíduo”. Ainda Amado (2001:97), parafraseando Blumer, esclarece que “para além de

82
um certo carácter instável, contínuo e indeterminável de definições pessoais da situação,
existem também "acções conjuntas", planeadas colectivamente e "em que cada um dos
participantes há-de ordenar os seus próprios actos em conformidade com os actos alheios".
Maria Teresa Estrela (1992: 49) salienta também a importância das regras e normas
de conduta para a sobrevivência dos grupos, referindo que “a emergência de normas de
conduta é um aspecto importante da vida dos grupos, pois, ao criarem as condições de
funcionamento harmonioso do grupo, submetem a vontade particular à vontade geral e
criam sentimentos de solidariedade e de pertença”.
A organização da sociedade escolar é, muitas vezes, um decalque da sociedade
nacional. Como esta, é regida por leis e normas que asseguram o seu harmonioso
funcionamento. Também à semelhança da sociedade nacional, essas leis e normas muitas
vezes são desrespeitadas, sendo os transgressores punidos e castigados. Assim, as regras
são indispensáveis ao funcionamento da sociedade em geral e das organizações em
particular.
Partimos, então, da ideia que a escola, enquanto organização formal, racionalmente
organizada, com funções hierarquizadas, implica regras organizacionais claramente
definidas, para que os actores sociais se orientem dentro de um emaranhado de regras pré-
existentes na organização.

3.4.1 A escola e as regras organizacionais

Neste ponto, abordaremos a importância das regras na escola e a sua relação com a
disciplina/indisciplina. Para Sara Delamont (1987: 52),

“todas as escolas possuem um conjunto de regras respeitantes ao comportamento dos alunos - é a


esfera da disciplina, ou domínio institucional. No entanto, a extensão e a natureza do sistema de
domínio institucional variam de escola para escola, do mesmo modo que o regime geral da escola
penetra na sala de aula”.

Ivo Domingues (1995: 15), seguindo o pensamento de Licínio Lima, diz-nos

“Distinguimos na escola a existência de três tipos de categorias normativas: as regras formais, as


regras não formais e as regras informais. As regras formais têm origem no nível estratégico do
sistema (Ministério da Educação), são estruturadas, são de conhecimento obrigatório, circulam em

83
suportes oficiais (decretos, leis, portarias, despachos e ofícios) e definem o organigrama. Porque
visam a uniformização do sistema através de uma racionalidade formal-legal, são regras sempre em
vigor e devem ser do conhecimento público”.

O mesmo autor (1995: 15-16) continua fazendo a distinção entre as regras não
formais e as regras informais. Relativamente às regras não formais refere que

“ são elaboradas no nível intermédio do sistema (a escola), são estruturadas ou semiestruturadas,


têm uma divulgação restrita e circulam tanto em suportes escritos como orais. Podem ser regras
interpretativas das regras formais ou regras alternativas que procuram regular áreas de actuação não
inteiramente cobertas por aquelas”.

As regras informais

“são regras que têm origem no nível operativo (na situação social), são não estruturadas, têm uma
divulgação desconhecida. São comunicadas verbalmente ou têm uma existência implícita,
dificilmente vislumbrável nos documentos escritos, sendo só perceptíveis nos comportamentos
administrativos e sociais”.

Baseando-nos em Domingues (1995: 16), diremos que as regras informais, que


frequentemente se confundem com as regras sociais, são as mais utilizadas pelos
professores na escola e na sala de aula, são definidas pelos professores e alunos, servindo
para regular as relações que entre eles se estabelecem. Os professores e os alunos
negoceiam permanentemente, visando criar e recriar regras sociais para manter uma frágil
ordem social na sala de aula. Na escola produzem-se, assim, regras não formais e informais
que, muitas vezes, servem para omitir e substituir as regras formais.
Licínio Lima (1998, p. 64) apresenta alguns exemplos destas regras muito
utilizadas pelos educadores de infância e pelos professores do 1º ciclo e “negociadas” com
os alunos no início do ano:

“(…) deve-se trabalhar em silêncio, para falar, deve-se levantar o dedo; fala um de cada vez; deve-se
ficar sentado no seu lugar, no fim do dia de aulas, deve-se deixar a sala arrumada, etc. - , as regras
de distribuição de tarefas na sala de aula – apagar o quadro, distribuir os materiais escolares,
distribuir o leite, etc.”.

Refere ainda, que ao longo do ano lectivo, o professor recorre a este tipo de regras para
“sancionar” os comportamentos que infringem essas normas.

84
Descendo ao nível micro da sala de aula, para que as actividades escolares possam
funcionar é necessário estabelecer regras que regulem os comportamentos, em geral, e a
forma como os alunos devem desempenhar as tarefas que têm de cumprir. Regras
claramente definidas facilitam o processo de ensino-aprendizagem.
Amado (2001: 99), referindo-se especificamente às regras na sala de aula e
baseando-se em autores como Boostrom, Jackon, Boostrom e Hansen, diz-nos que elas têm
dois grandes objectivos:

“ (…) por um lado, como instrumentos de socialização, visam criar "estruturas de pensamento" que
permitam dar sentido às relações sociais. Por outro lado, elas surgem como recursos práticos da
"gestão da aula" de modo a que, através delas, se possam regular as interacções e se consigam
alcançar os objectivos de ensino-aprendizagem que é pressuposto presidirem às actividades.”

Maria Teresa Estrela (1995: 65), pronunciando-se sobre a importância das regras na
sala de aula, afirma que

“(…) as regras em vigor na sala de aula, se estão ao serviço de um processo de socialização de


ordem geral, servem especificamente um processo pedagógico de carácter singular, contextualmente
localizado no seu aqui e agora e influenciado pelas dinâmicas relacionais que se geram entre os seus
protagonistas.”

Amado (2001: 99), baseando-se no pensamento da autora anteriormente


referenciada e referindo-se ao contexto particular das normas na sala de aula, refere que
elas,
“(…) servem cinco funções principais: organizativas (estabelecem as condições da actividade),
reorganizativas (reformulam a situação criada em função de uma regra anterior), preventivas (regras
enunciadas prevendo e prevenindo situações indesejáveis), reforçadoras (uma espécie de slogans
repetidos) e correctivas (visam pôr fim a um comportamento desviante) ”.

Conclui-se, então, que as regras na sala de aula são essenciais e desempenham


funções fundamentais quer no plano social, quer no plano pedagógico. Elas regulam o
“jogo interactivo” entre a “concórdia” e a “discórdia” (entre a “disciplina” e a
“indisciplina”), exercendo uma função de “controlo social” (Amado, 2001: 100).
Geralmente, cabe ao professor produzir e definir as normas que lhe permitam
exercer a sua actividade pedagógica na sala de aula, ao mesmo tempo que transmite
normas sociais de carácter geral.

85
Para Marcel Postic (1990: 147), o docente

“no primeiro dia em que contacta com o grupo de alunos, estabelece de uma forma explícita as regras de
ordem, de trabalho, determinando a actuação que todo o aluno deve ter em tal situação, ou então de uma
forma implícita ao longo da vida escolar, mostrando, pelo seu comportamento, o que é permitido ou
tolerado em tal circunstância. As normas elaboram-se também pelo processo de interacção porque os
hábitos impõem-se, e o sistema de normas introduzido pelo docente é susceptível de ser posto em
questão pela dinâmica do grupo dos alunos”.

No entanto, o professor pode pedir a colaboração dos alunos na definição dessas


regras, o que será desejável, pois assim os estudantes não vêem as regras na sala de aula
como impostas e injustas e aceitam-nas melhor. Silva (1994: 72), seguindo o pensamento
de Jessup e Kiley, refere que

“os estudantes gostam de conhecer as regras e os regulamentos e é injusto esperar que eles as
conheçam sem se ter falado nelas. O professor pode estabelecê-las sozinho ou podem ser os
estudantes a estabelecê-las. Estas regras que os estudantes estabelecem, eles mesmos, são mais
fáceis de forçar do que as que são impostas pelo professor e que os estudantes sentem como
opressoras ou injustas. (…) se os professores tomarem o tempo para explicar aos alunos porque é
que as coisas devem ser feitas de determinada maneira, as regras podem aparecer mais razoáveis aos
olhos dos alunos. Dizem ainda que os professores são diferentes uns dos outros e o que é certo para
um pode não ser para outro”.

A mesma autora (1994: 73), baseando-se em Furlong, diz que

“o professor tem mais poder no processo da negociação das regras, mas que os alunos devem
participar e conformar-se. Refere ainda que se torna interessante quando os alunos, individualmente
ou em grupo, definem a situação de um modo diferente dos professores, quando, por alguma razão,
interpretam a aula aborrecida ou irrelevante ou como fonte de riso. Nestas ocasiões, os alunos
estabelecem uma diferente definição da situação e a ordem é transgredida.”

Maria Teresa Estrela (1992: 52) partilha a mesma opinião acerca da participação
dos alunos na definição das regras. Para esta investigadora,

“(…) da compreensão da legitimidade da regra decorre a probabilidade de ela ser aceite e respeitada.
Se a regra não é considerada como legítima, ela surge aos olhos do aluno como uma arbitrariedade
do professor que só será respeitada coercivamente. E o professor não se pode esquecer que a
legitimidade das regras se liga à avaliação que os alunos fazem do exercício da autoridade do
professor”.

86
Graça Fernandes, numa entrevista dada ao jornal Página da Educação, em Abril de
2001, pronunciando-se sobre este assunto,

“ O respeito não se demonstra com palavras e declarações de princípio, mas através de actos e
atitudes. (…) Um exemplo: a construção das regras que deverão reger o trabalho e o convívio na
sala de aula. A estipulação de regras no início do ano lectivo, dizem todos os autores, é
indispensável ao normal funcionamento da classe. Decerto, mas não devem resultar de uma
imposição unilateral. O seu efeito será tanto melhor quanto mais aprofundada for a participação dos
alunos no seu estabelecimento, individualmente, e em assembleia de turma, juntamente com o
professor e após o debate dos problemas. Se, para cada regra que consideraram importante,
estabeleceram as consequências do seu incumprimento, se as regras se aplicarem ao professor do
mesmo modo que aos alunos, haverá um funcionamento democrático da turma, em que cada um
pode expressar livremente a sua opinião e a decisão colectiva será por todos respeitada.”

Porém, esta situação nem sempre se verifica. Há muitos professores que não
explicitam convenientemente as regras e não pedem a colaboração dos alunos na sua
definição, o que leva muitas vezes a situações de desentendimento que facilitam a irrupção
de comportamentos inadequados na sala de aula. Rutherford, citado por Silva (1994: 68),
confirma esta situação:

“Na verdade, muitas das regras da sala de aula não são nunca comunicadas aos alunos, embora se
espere que eles sejam capazes de as cumprir. Se é verdade que a maior parte deles até é capaz de o
fazer graças ao precioso auxílio do grupo de pares (os colegas), o qual se revela num poderoso
instrumento de socialização e aprendizagem, outros há, porém, que vivem em permanente situação
de conflito com o professor, com os colegas, com a escola e até mesmo consigo próprios”.

Amado (2001: 97), baseando-se em Vasquez & Martinez, parece compartilhar este
ponto de vista uma vez que para ele “no processo de escolarização (…) as regras vão sendo
interiorizadas por inculcação e por imitação, sem que a criança dê por isso, adquirindo um
carácter de "óbvias" e de indiscutivelmente necessárias aos olhos da instituição, dos
professores e dos próprios alunos”.

87
3.4.2. Desvios comportamentais e sanções

Neste ponto, abordamos a questão da indisciplina e a necessidade de aplicação de


sanções que corrijam os desvios praticados pelos alunos.
Um comportamento indisciplinado é qualquer acto ou omissão que contraria
princípios do regulamento interno ou regras básicas estabelecidas pela escola ou pelo
professor. Na sala de aula, entre o professor e o aluno existe, na maior parte das vezes, uma
relação desequilibrada. Deste desequilíbrio resultam situações de transgressão, muitas
vezes de difícil resolução, que levam, inclusivamente, à aplicação de sanções. A este
respeito Cohen, citado por Amado (2001:102) diz que “cada regra cria um desvio
potencial”
Para Domingues (1995: 67-68),

“Um professor, no desempenho das suas funções de controlo, recorre a qualquer uma das
normas presentes na organização – formais, não formais e informais. Mascar pastilhas elásticas na
sala pode, à luz das regras informais, ser considerado um acto indisciplinado. Do mesmo modo pode
proceder o aluno, para quem o mesmo acto se pode constituir, à luz das regras informais dos alunos,
como absolutamente normal. Ou seja, a classificação de um acto como desviante, 17 depende não só
da sua categorização em relação às regras que prescrevem e interditam, mas também das normas
sociais e mundividências que guiam as práticas dos professores e alunos”.

O mesmo autor (1995: 68) acrescenta que

“É frequente os professores classificarem determinados actos como desviantes em dadas


circunstâncias e não noutras, em certos alunos e não noutros. O processo de rotulação de
comportamentos divergentes é muito determinado por factores situacionais, como o estado de humor
do professor, a plateia que assiste à perpetração do desvio e a afectação que este provoca na
identidade virtual daquele, o contexto, como o comportamento recente do aluno ou da turma e os
rótulos a estes já atribuídos através do processo social de rotulagem”.

Furlong, citado por Amado (2001: 97), diz que

"as regras fazem parte de um conhecimento comum acerca da sala de aula desenvolvido por
professores e alunos e é este conhecimento que lhes permite entender as imputações de desvio
mesmo quando não se fazem referências às regras em jogo".

17
Porque constitui uma infracção a uma regra socialmente reconhecida.

88
Para Hargreaves, citado por Amado (2001:102), invocando a teoria interaccionista,

"o desvio é visto ao mesmo tempo como produto e processo da interacção social, fruto de um
conjunto complexo de transacções entre uma pessoa que se comporta de determinado modo e outra
pessoa ou grupo que responde de modo peculiar".

McLaren, citado por Amado (2001: 109), diz que

“os estudantes apresentam resistências enquanto no 'estado de estudante', através de ritos de


transgressão, pois, neste estado, eles são conduzidos à apatia, ausência de paixão e vazio emocional
e espiritual”.

Amado (2001: 109), dando continuidade a esta ideia dos “rituais de resistência”, diz que
eles,

“incluem toda uma variedade de tipos de conversa (zombaria, obscenidade, verborreia antiprofessor,
comentários), gestos (atirar-se para trás na cadeira, pontapear, debruçar-se, recostar-se
indolentemente, olhar perdido), flatulência, violência física, roubo e "risada de resistência."

3.4.3. A função do castigo

O castigo é uma medida utilizada pelos professores com alguma frequência. As


sanções encontram-se previstas na lei, quer sejam leis emanadas do Ministério da
Educação, quer sejam regulamentos das instituições de ensino como é o caso do
Regulamento Interno. Revestem formas variadas que podem ir da realização de tarefas
extra-aula, proibição de participação em determinados eventos como visitas de estudo,
proibição de utilizar determinados equipamentos, como computadores e determinados
espaços, como a sala de convívio, expulsão da aula até à pena de suspensão (de um a dez
dias). Muitas vezes o castigo é exigido pelos próprios alunos, em nome da ordem e do
respeito na aula.
Ferre, citado por Silva (1994: 68), diz que

“a educação é um aprendizado social; ora toda a vida social implica regras a respeitar, e desde que, não
se cumpram, sofrem-se as consequências repressivas da acção social. De resto, é preciso que as crianças
aprendam, por experiência, que os seus actos comportam prolongamentos que afectam os próprios, que
adquiram o sentido da responsabilidade, que não é mais do que a propriedade que um acto tem de recair

89
sobre quem o pratica: não há melhor meio para isso que fazê-lo recair, sendo repreensível, sob a forma de
punição”.

Silva (1994: 79), baseando-se na obra de Voeltzel, refere que os motivos que levam
os professores a castigar os alunos são:

“- De ordem pessoal: o sistema disciplinar, facilitando a acção do mestre, diminui a fadiga, a tensão
nervosa, contribui para a manutenção do estado de saúde. Concebido por cada um, responde às
exigências do carácter, contribui para a autoridade, para o prestígio do educador.
- De ordem pedagógica: os professores não concebem o trabalho sem a calma, sem a ordem
indispensável, sem a existência duma atmosfera propícia à actividade do grupo; o sistema disciplinar
deve permitir as condições mais favoráveis para solicitar, manter e reforçar o poder de atenção dos
alunos, atenção tão fugidia, tão difícil de obter nos meios urbanos, e sem a qual a criança não pode
participar na sua própria educação.
- De ordem moral: o emprego das sanções contribui para a aquisição de hábitos, factores de
educação moral: «o receio do polícia é o começo da prudência», afirmam alguns professores. Incita,
também, o aluno a constranger-se, a resistir aos seus caprichos, progressivamente, à autonomia
moral.
- De ordem social: a vida em grupo habitua a criança a não incomodar os outros, condu-la a uma
limitação dos seus actos, faz-lhe compreender a necessidade dos constrangimentos; é preciso que
faça a experiência do necessário e do impossível, da sua impotência para bastar-se a si própria,
principalmente para manter a sua moralidade. Os sucessivos chamamentos que as sanções
constituem amparam-na na aprendizagem da futura vida social em que se integrará.”

Ainda Voeltzel, citado pela mesma autora (1994: 79), diz

“No entanto há professores, em número ínfimo, na realidade, que consideram o sistema disciplinar
como uma tábua de salvação, sem a qual não poderiam satisfazer a sua tarefa; não dispensam a
necessidade duma vida escolar, estritamente regulamentada, com uma aplicação regular, contínua,
rígida até, dum sistema de sanções; evidentemente que demonstram falta de confiança suficiente
neles próprios”.

Que efeitos produzirá o castigo sobre os alunos? Serão os castigos eficazes para
dissuadir os comportamentos de indisciplina?
O uso da punição como controlo do comportamento tem sido um tema controverso
entre os teóricos da aprendizagem e os educadores. Sprinthall (1997: 260) diz que

90
“ O controlo através de meios aversivos poderá provocar um contra-ataque; sonhar acordado;
desistir da escola, cometer actos de vandalismo e recusar aprender tarefas constituem indicações
comuns de tentativas de evitar o controlo aversivo”

O mesmo autor (1997: 262), referindo-se especificamente à sala de aula, refere que

“ A punição na sala de aula surge geralmente sob a forma de reprovação do que o aluno fez ou de
retirada do reforço positivo. Uma reprovação severa por parte do professor poderá constituir uma
forma eficaz de controlar comportamento, mas não promove amor à aprendizagem.”

Curwin, citado por Amado (2001: 175-176), pronunciando-se sobre o castigo, diz
que o mesmo

"produz o efeito de travar a indisciplina por um tempo curto, mas não produz uma mudança de
comportamento duradoura. Só detém temporariamente a acção que se castiga".

E, acrescentamos nós, este efeito só acontecerá se a acção ocorrer no período imediato


após a ocorrência do comportamento desviante, como defendem as teorias behavioristas.
Amado (2001) refere que, contrariamente ao que se possa pensar, os procedimentos
disciplinares punitivos não caíram em desuso nem foram relegados para o “museu da
Pedagogia”, continuam a ser utilizados, embora de forma diferente do passado, e muitas
vezes os próprios alunos consideram a “punição como justa e necessária”.
O mesmo autor (2001: 177); continuando a sua exposição sobre o assunto, refere
que

“o principal requisito dos procedimentos disciplinares punitivos é o da sua razoabilidade; isto é,


torna-se necessário que o aluno perceba que a exigência que é feita e o castigo que se impõe têm
uma razão de ser, e que não está diante de uma simples exibição de poder e arbitrariedade.”

Continua, dizendo que

“Entre outros requisitos, contam-se, ainda, o da adequação, que torna estes procedimentos
proporcionais à gravidade do problema, e o da consistência, exigindo a sua aplicação a todos e em
circunstâncias semelhantes”.

Se os requisitos apontados não forem cumpridos, o aluno mergulhará em


sentimentos de incerteza e confusão o que poderá levar a maiores conflitos de poder entre

91
alunos e professores, pois os primeiros podem ver a acção dos segundos como “injusta”,
“arbitrária” e “prepotente”.
Concluímos este aspecto, citando Amado (2001: 177-178). Para este autor,

“relacionada com a problemática da indisciplina, a "necessidade" da punição fundamenta-se,


supostamente, na ideia de que esse tipo de comportamentos tem como factores fundamentais a má
vontade, o desinteresse e a "má educação" do aluno. É certo que, em Educação, "punir" tem como
objectivo fundamental induzir a "mudança de comportamento" (…) mas não há dúvida de que, na
realidade, se mantêm ainda as facetas tradicionais de expiação, de dissuasão e de exemplaridade,
mais difíceis de justificar enquanto processos educativos.”

A eficácia dos castigos é muito relativa. Amado, numa entrevista dada em 26 de


Maio de 2006 ao jornal a página, confrontado com a questão: Expulsar um aluno que dá
problemas da sala de aula ou suspendê-lo durante alguns dias é uma das formas possíveis
de resolver a questão? (da indisciplina). A resposta dada pelo investigador foi que

“Estas medidas, só em casos muito excepcionais, dão um resultado positivo e persistente. Na


maioria dos casos têm um efeito pontual, circunstancial; geralmente agravam mais os problemas do
que os resolvem. Certos alunos vêem a sujeição a essas medidas como motivo de orgulho e de
satisfação.”

Perante esta resposta, conclui-se, pois, que algumas medidas punitivas não
apresentam os resultados esperados por quem as aplica. Esses resultados são transitórios e
muitas vezes contrários ao objectivo inicial. Os alunos prevaricadores são vistos pelos seus
pares como “heróis” e quando tal acontece a tendência é para a repetição dos
comportamentos indisciplinados.
Alguns autores apontam o surgimento de perturbações emocionais a longo prazo,
resultantes da aplicação de punições. Sprinthall (1997: 263) diz-nos, no entanto, que ainda
não existe uma resposta conclusiva sobre este assunto. Segundo ele,

“A visão tradicional, quase lendária, é que a punição está muito envolvida na origem das
perturbações comportamentais. Um teórico18 sugeriu uma longa lista de problemas provocados pela
punição, que incluía a rigidez, desvio social, ajustamento pobre e regressão. No entanto, outros

18
Trata-se de Maurer, A. (1974)

92
psicólogos não têm tanta certeza. Um especialista 19 no campo da punição argumenta que muitos dos
procedimentos da punição não produzem consequências emocionais a longo prazo.”

Continua a expor as suas ideias, referindo que,

“ Muitos dos especialistas20 em modificação do comportamento inclinam-se para a possibilidade de


diminuição ou minimização dos alegados efeitos secundários da punição, se esta for administrada
correctamente e se os comportamentos alternativos estiverem disponíveis e forem encorajados”

Conclui este assunto, chamando a atenção para o cuidado que se deve ter na
aplicação de estímulos aversivos na sala de aula. Diz a esse respeito:

“O uso de estímulos aversivos na sala de aula, quer sob a forma de reforço negativo, quer sob a
forma de punição deverá ser visto com uma precaução extrema. Embora seja certamente um meio
eficaz de controlar o comportamento, raramente dá ao aluno uma atitude positiva face à
aprendizagem. (…) Punir um aluno por um determinado comportamento não significa
necessariamente que o aluno pare de apresentar esse comportamento. (…) Se se utilizar a punição,
esta deverá ser feita com moderação e juntamente com o reforço positivo da resposta alternativa.
Isto é, enquanto a punição suprimirá o comportamento indesejável, o reforço positivo deverá ser
utilizado para fortalecer um comportamento socialmente aceite.”

Com base no sábio ditado popular de que “não se caçam moscas com vinagre!”
concluiremos facilmente, que não é também com repreensões, expulsões ou outras medidas
punitivas, que se combatem problemas de comportamento, embora alguns se possam
minimizar. Uma das formas mais relevantes de o fazer é, sem dúvida, a adopção de outro
tipo de atitudes e de pedagogias mais activas, com base em estratégias atraentes, que
acabarão por motivar e ocupar mais os alunos e apostando definitivamente na prevenção
do fenómeno da indisciplina na sala de aula e na escola. Como diz Daniel Sampaio (1996:
14),

“ Para que a indisciplina não brote quase por geração espontânea, é útil que o professor tenha bem
presente a importância dos aspectos relacionais com os seus alunos. Se o professor continuar a
valorizar apenas a sua função de instrução (transmitir conhecimentos), é mais provável que os
conflitos disciplinares apareçam. Para evitar tal situação, a tónica da acção da escola deverá centrar-
se na prevenção da indisciplina e não na forma de a controlar”

19
Trata-se de Walters, G. e Grusec, J. (1977)
20
Refere entre outros, Newsom, C., Favell, J. E. e Rincover, A. (1983)

93
CAPÍTULO III – A INDISCIPLINA À LUZ DOS NORMATIVOS LEGAIS

A violação pelo aluno de algum dos deveres previstos no artigo 15.º ou no regulamento
interno da escola, em termos que se revelem perturbadores do funcionamento normal
das actividades da escola ou das relações no âmbito da comunidade educativa, constitui
infracção disciplinar, a qual pode levar, mediante processo disciplinar, à aplicação de
medida disciplinar.

Artigo 23.º - Lei 30/ 2002 (de 20 de Dezembro)

A escola, no dia-a-dia, é local de conflitualidade, reflectindo, muitas vezes, uma


realidade social degradada. Existe um número cada vez maior de alunos, que por não
estarem devidamente integrados na turma, na família e na comunidade, exibem na escola
comportamentos inadequados e mesmo associais, perturbadores do ambiente propício à
aprendizagem. Os professores, frequentemente, recorrem a ameaças e a constantes
repreensões, que na maior parte das vezes acabam por não dar resultado, para tentarem
resolver as difíceis situações com que se deparam. A escola confronta-se, assim, com um
problema de bastante gravidade, que tem vindo a aumentar nos últimos anos e tem de
procurar soluções capazes de promover a integração de todos os alunos, sem excepção.
Assim, a resolução dos problemas disciplinares tem sido uma das principais
preocupações quer do Ministério da Educação, quer das escolas, individualmente. Os
Regulamentos Internos, documentos aglutinadores de todas as normas internas que regem
os estabelecimentos de ensino, têm sido alvo de constantes reformulações nestes últimos
anos, porque também os organismos que tutelam a educação têm produzido abundante
legislação sobre as questões disciplinares, o que mostra a preocupação geral sobre esta
temática21.
Neste capítulo, analisamos alguns documentos respeitantes às questões
disciplinares nas escolas, a fim de melhor percebermos esta problemática. Começaremos
com o parecer nº 3/2002 do Conselho Nacional de Educação, que embora não sendo um

21
O Conselho Nacional de Educação emitiu alguns pareceres sobre o assunto. Faremos referência no texto ao
parecer nº3/2002

94
documento normativo, faz uma abordagem bastante clara dos problemas da indisciplina
nas escolas e serviu de texto de apoio à elaboração da Lei 30/2002 de 20 de Dezembro que
define o Estatuto dos Alunos do Ensino não Superior. Analisaremos depois a Lei 30/2002,
a Lei 3/2008 e o Regulamento Interno da escola onde efectuámos o estudo.

1- Parecer nº 3/2002 do CNE

No ano de 2002 o Conselho Nacional de Educação emitiu o seu parecer nº 3,


subordinado ao tema “Para Combater a Indisciplina nas Escolas”. Desse documento
podemos salientar alguns aspectos que nos ajudam a compreender o assunto em análise e
que mostram a grande preocupação dos organismos ligados à educação relativamente ao
crescimento do fenómeno da indisciplina nas nossas escolas. No preâmbulo desse parecer,
publicado no Diário da República (DR), podemos encontrar uma definição para o
problema em análise:

“Serão assim abrangidos pela noção de indisciplina todos os comportamentos que reflictam o
propósito de perturbar os processos de aprendizagem que decorrem na escola, dificultando o
exercício da função docente, inibindo uma efectiva cooperação discente, perturbando a convivência
da comunidade educativa no seu todo”. (DR-II SÈRIE:5480)

Consideram os seus autores que o problema da indisciplina se encontra bastante


difundido e que por isso mesmo constitui um factor de perturbação das nossas escolas e
que, se não for atempadamente travado, poderá aumentar a insegurança e a violência nas
mesmas. Apontam como factores geradores deste fenómeno a rápida democratização da
escola, a massificação do ensino e a perda de expectativas dos alunos que a frequentam,
bem como dos pais, relativamente à inserção no mundo profissional e social. Tal situação
pode levar à desmotivação e a uma rejeição da escola pelos alunos que a vêem como uma
organização injusta que reflecte as injustiças da própria sociedade.
O Conselho Nacional de Educação faz, no seu documento, uma análise dos factores
que podem ser causadores de indisciplina nas escolas e apontam medidas que podem
resolver, ou pelo menos minorar, os seus efeitos.
Abordando o papel dos professores, dizem

95
“Se há hoje uma tempestade na escola, os professores estão no centro dela. Isso não significa que
sejam eles os únicos protagonistas do processo educativo, mas lembra que não é possível levar por
diante qualquer mudança relevante do sistema educativo, sem o seu envolvimento profundo”. (DR-
II SÈRIE:5481)

Referem que a democratização da escola trouxe um esbatimento da “supremacia


hierárquica” dos professores perante os alunos, visto passarem a reconhecer-se aos alunos
direitos que anteriormente não possuíam. Este aspecto é apontado como facilitador de
problemas disciplinares nas escolas porque

“passou o tempo de uma disciplina, principalmente imposta, sendo necessário descobrir-se como se
constrói o tempo de uma disciplina, principalmente assumida, decorrente de uma ética democrática
de autoridade”. (DR-II SÈRIE:5481)

Esta situação levou a uma relativização do poder dos professores que ficaram,
assim, fragilizados e desprotegidos na sua profissão. Ora, tendo em conta

“que o modo como os alunos vêem os professores é um elemento decisivo para que sejam induzidos
a assumir nas aulas uma atitude de cooperação no processo de aprendizagem. A imagem do
professor tem, por isso, de ser protegida, nomeadamente, pela dignificação e valorização da função
docente que é essencialmente uma função educativa e não meramente de ensino”. (DR-II
SÈRIE:5481)

Os professores têm, assim, um grande desafio pela frente e têm de apresentar-se e


impor-se aos seus alunos não pelo autoritarismo mas pela “evidência do seu saber”, pela
“capacidade de persuasão e de sedução” e pelo “apuro ostensivo dos seus recursos
pedagógicos”.
A posição que os professores possam conquistar dependerá também muito da sua
capacidade e da competência para a conseguir. O seu papel será facilitado se actuarem no
sentido de formarem os seus alunos para a cidadania, incutindo-lhes o sentido do trabalho,
da responsabilidade e do respeito pelos outros.

“Se os professores forem preparados para serem mestres de cidadania, mais naturalmente poderão
fazer com que os alunos se comportem na escola como cidadãos. Se os professores forem
motivados, de modo a gostarem de exercer a função docente, mais facilmente transmitirão aos
alunos o entusiasmo pela aprendizagem.” (DR-II SÈRIE:5482)

96
Se os professores conseguirem motivar os alunos a ver nas aprendizagens e no
saber um factor dignificante de “enriquecimento irreversível da sua personalidade” e não
um mero instrumento para conseguir uma ocupação profissional, isto poderá contribuir
para que eles adoptem comportamentos mais cooperantes na escola e mais concretamente
na sala de aula.
Também a escola, como instituição organizacional e física poderá influenciar
decisivamente o comportamento dos alunos. Neste parecer o Conselho Nacional de
Educação tece algumas considerações a este respeito.
Enquanto espaço físico, a escola

“deve ser, no seu todo, um espaço acolhedor, esteticamente agradável, funcionalmente


adequado, o mesmo se devendo poder dizer de cada sala de aula, isoladamente considerada. Será
bom que os locais de recreio sejam amplos e arborizados, espaços de convívio e de lazer, onde todos
possam relacionar-se sem constrangimentos”. (DR-II SÈRIE:5482)

Na sua construção,

“devem ser cuidadosamente evitados todos os factores arquitectónicos que possam potenciar a
insegurança, nomeadamente, fazendo com que a manutenção dos locais e dos equipamentos seja
assegurada permanentemente, dentro dos padrões de segurança legalmente consagrados”. (DR-II
SÈRIE:5482)

Na mesma lógica de limitação dos riscos, a sobrelotação das Escolas deve ser
evitada, a todo o custo, dado ser um claro factor de encorajamento da indisciplina e até
mesmo uma causa autónoma do acréscimo da insegurança.
Enquanto organização, a escola deve estimular uma “pedagogia criativa” que
desperte o interesse e entusiasme os alunos para os conteúdos leccionados. Deve incutir
nos alunos o sentido da responsabilidade, deve promover a realização de actividades
“circum-escolares”.
Este tipo de pedagogia exige, também, que os professores tenham uma sólida
preparação e que se mantenham permanentemente actualizados, quer do ponto de vista
pedagógico, quer do ponto de vista científico. Para que tal aconteça a escola deve
disponibilizar os meios necessários a este fim.
Para finalizar estas considerações sobre o papel da escola enquanto organização na
prevenção de comportamentos de indisciplina refere-se que

97
“Uma pedagogia estimulante pode ter que ser diversificada para corresponder à heterogeneidade dos
alunos e tem de ser enriquecida através de uma adequada formação interdisciplinar, que permita
identificar e enfrentar a complexidade dos problemas que se colocam a um professor.”

Finalmente, o Conselho Nacional da Educação, defende que deve haver uma


valorização da comunidade educativa.

“A valorização da comunidade educativa é um elemento estruturante de qualquer política de


combate à indisciplina na escola. Para isso, esta deve transformar-se num espaço de cidadania, no
âmbito do qual os professores se sintam dignificados pelo revigoramento da sua autoridade, os pais
encorajados a assumirem uma responsabilidade mais consistente pelos apoios recebidos e os alunos
estimulados a uma participação criativa na vida da escola pela garantia de que os seus direitos são
reconhecidos e respeitados”. (DR-II SÈRIE:5483)

Referem o papel das famílias, cuja participação na vida das escolas tem vindo a
aumentar, demonstrando a importância crescente que os pais atribuem à escolaridade dos
filhos, situação que tem contribuído para dissuadir alguns problemas de indisciplina nas
escolas. Neste contexto, saliente-se o caso da toxicodependência e a marginalidade a ela
associada, dramas que afectam as famílias e as escolas e que muito dificilmente serão
enfrentados com êxito, se não forem combatidos conjugadamente nesses dois contextos.
Refira-se, também, os casos de “diversidade étnica” onde a complexidade das relações
entre a escola e a família não deve ser subvalorizada. Dizem os autores deste parecer que

“Merece aqui uma especial atenção o multiculturalismo, sendo certo que dificilmente se conseguirá
um clima escolar saudável, se as famílias dos alunos não estabelecerem entre si laços de
reconhecimento mútuo e não partilharem uma vontade de resolverem em conjunto problemas que,
por serem da escola, são, necessariamente, comuns aos diversos grupos étnicos nela existentes”.
(DR-II SÈRIE:5483 )

Este parecer termina com um conjunto de recomendações, apresentadas na


sequência do anteriormente exposto e que, no entender dos autores, poderão contribuir para
resolver ou minimizar os aspectos de indisciplina que ocorrem nas nossas escolas.

98
2- Lei 30/ 2002

A lei 30/2002 de 20 de Dezembro, Estatuto do Aluno do Ensino não Superior,


regulamenta o funcionamento disciplinar das escolas portuguesas. Lê-se na exposição e
motivos dessa lei que

“As políticas educativas terão que recentrar o seu esforço de enquadramento, de forma a promover
um melhor ambiente escolar e a fomentar o exercício de valores como o respeito, a tolerância e a
liberdade, no quadro dos princípios democráticos consagrados na Constituição da República
Portuguesa”.

Depreende-se daqui, que o ambiente das escolas se degradou ao longo dos tempos e
que, por isso, se tornou necessário tomar medidas que impedissem que este processo
continuasse em escalada. Continuando a leitura do preâmbulo, ficamos a conhecer os
motivos que levaram à sua publicação. Entre eles, apontam-se as alterações verificadas nas
estruturas familiares, a evolução dos meios de comunicação social, com destaque para a
televisão, o aumento da imigração que introduziu na sociedade portuguesa e,
consequentemente nas escolas, elementos de diferenciação social e cultural e a
massificação do ensino, resultante do aumento da escolaridade obrigatória para nove anos.

“A evolução registada nas estruturas familiares, nos meios de comunicação social - com especial
relevo para o papel da televisão - e na própria composição da sociedade portuguesa, com o
crescente número e importância das comunidades imigrantes portadoras de contributos decisivos de
diferenciação social e cultural, permite avaliar a extensão e complexidade dos desafios que se
colocam à instituição escolar. Esta, paralelamente, é confrontada com o processo de massificação,
decorrente do maior acesso e mobilidade no sistema educativo, do aumento da escolaridade
obrigatória para nove anos e do alargamento a grupos sociais cada vez mais diferenciados.”

As consequências resultantes deste processo foram evidentes e traduziram-se numa


degradação do ambiente das escolas, onde passaram a verificar-se, cada vez com mais
frequência, actos de indisciplina que, em alguns casos, dão origem a atitudes violentas.

“Uma das consequências mais evidentes deste processo foi a degradação progressiva do ambiente
escolar e a deterioração da autoridade dos professores. A sobrevalorização e salvaguarda dos
direitos, facto em si positivo, conduziu, contudo, à falaciosa subalternização dos deveres. Este
desequilíbrio originou a proliferação de práticas perturbadoras da convivência e do bom ambiente

99
escolar. Actos de indisciplina, frequentemente expressos em agressividade e violência, acentuaram
em muitas escolas um generalizado sentimento de insegurança e de impunidade.”

O diploma, no seu capítulo V, referente à disciplina, regulamenta os procedimentos


disciplinares a adoptar pelas escolas.

Na Secção I, Infracção disciplinar, qualifica-se o conceito de infracção disciplinar.

“A violação pelo aluno de algum dos deveres previstos no artigo 15.º ou no regulamento
interno da escola, em termos que se revelem perturbadores do funcionamento normal das actividades
da escola ou das relações no âmbito da comunidade educativa, constitui infracção disciplinar, a qual
pode levar, mediante processo disciplinar, à aplicação de medida disciplinar.” (Capítulo V, Secção I,
Artigo 23.º)

A Secção II, Medidas disciplinares, aborda as finalidades das medidas disciplinares,


diferenciando claramente as medidas preventivas e integradoras com vocação
sancionatória e as medidas acautelatórias, preventivas e de integração.

“Quanto à matéria da disciplina, houve o cuidado de qualificar, expressa e rigorosamente, o


conteúdo da infracção disciplinar. Por outro lado, em termos de medidas disciplinares, para além da
sua reorganização global, passou a distinguir-se claramente entre as medidas disciplinares que, para
além da sua eficácia preventiva e integradora, têm vocação sancionatória e as medidas disciplinares
pensadas unicamente para prosseguirem um sentido cautelar, preventivo e de integração. Deste
modo se concilia, agora sem confusões perversas, dois desideratos, cada um deles irrenunciável: a
efectiva responsabilização do aluno prevaricador responsabilizável, por um lado, com a efectiva
dimensão reabilitadora e integradora da escola, por outro”. ( Decreto Lei n.º 30/2002, Exposição de
Motivos)

A Secção III, Competência para aplicação das medidas disciplinares, salienta o


papel do professor em todo o processo, reconhecendo a necessidade de reabilitação da sua
autoridade.

“Este modelo, teve, obviamente, as devidas repercussões técnico-jurídicas a nível da cumulação de


medidas disciplinares e da competência disciplinar, entre outros aspectos, sendo que se entende a
autoridade dos professores como um pilar estruturante da vivência escolar e das boas aprendizagens
e, como tal, objecto de um processo necessário de reabilitação.” (Decreto Lei n.º 30/2002,
Exposição de Motivos)

100
O artigo 38º refere a este respeito:

“O professor, no desenvolvimento do plano de trabalho da turma e no âmbito da sua


autonomia pedagógica, é responsável pela regulação dos comportamentos na sala de aula,
competindo-lhe a aplicação das medidas de prevenção e remediação que propiciem a realização do
processo de ensino e aprendizagem num bom ambiente educativo, bem como a formação cívica dos
alunos, com vista ao desenvolvimento equilibrado das suas personalidades, das suas capacidades de
se relacionarem com outros, das suas plenas integrações na comunidade educativa e dos seus
sentidos de responsabilidade.” (Secção III, Artigo 38.º)

Na Secção IV, Procedimento disciplinar, procurou-se agilizar o processo, tornando-


o mais célere, tendo sempre em vista a reabilitação do aluno. Garante-se a transparência do
processo com o acompanhamento do aluno pelo encarregado de educação em todo o
processo de averiguações e audições.

“O procedimento disciplinar foi redesenhado. Preservando todas as garantias destinadas ao cabal


apuramento da verdade e a permitir a audição integral do aluno arguido e do seu encarregado de
educação, o processo tornou-se mais dinâmico e eficaz, pois, nos ambientes das escolas, tal é
verdadeiramente decisivo para fomentar os valores inerentes à disciplina. Na execução das medidas
disciplinares sublinhou-se o correcto acompanhamento do aluno, numa lógica de acentuar o sentido
reabilitador.” (Decreto Lei n.º 30/2002, Exposição de Motivos)

A intervenção dos pais e encarregados de educação nos processos disciplinares é


garantida pelo artigo 51º da presente lei.

“Os pais e encarregados de educação devem, no decurso de processo disciplinar que incida sobre o
seu educando, contribuir para o correcto apuramento dos factos e, sendo aplicada medida disciplinar,
diligenciar para que a mesma prossiga os objectivos de reforço da formação cívica do educando,
com vista ao desenvolvimento equilibrado da sua personalidade, da sua capacidade de se relacionar
com os outros, da sua plena integração na comunidade educativa, do seu sentido de responsabilidade
e das suas aprendizagens.” (Secção IV, Artigo 51.º)

101
3- Lei 3/200822

O Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República a Proposta


de Lei n.º 140/X, onde se propõem alterações à Lei n.º 30/2002, de 20 de Dezembro.
A presente Proposta de Lei deu entrada na Mesa da Assembleia da República no dia
21 de Maio de 2007 e, por despacho do Sua Excelência o Presidente da Assembleia da
República de 23 de Maio de 2007, baixou à Comissão Parlamentar de Educação, Ciência
e Cultura para a emissão do respectivo relatório e parecer.
Na exposição de motivos que levaram a esta decisão pode ler-se:

“O Estatuto do Aluno do Ensino não Superior, actualmente em vigor, foi aprovado pela Lei n.º
30/2002 de 20 de Dezembro. A experiência da sua aplicação, ao longo dos últimos quatro anos,
permitiu verificar que, em muitos aspectos, não valoriza o papel dos professores, não tem em conta a
necessidade de uma actuação célere em situações de alteração do clima de trabalho das escolas, nem
contribui eficazmente para o desenvolvimento de uma cultura de responsabilidade de alunos e pais”.
(proposta de lei n.º 140/X, 2007: 1)

Assim, com esta proposta de lei, pretende-se colmatar algumas insuficiências


verificadas com a aplicação do Estatuto do Aluno do Ensino não Superior, previsto na Lei
n.º 30/2002, de 20 de Dezembro. Em resposta a esta realidade, entendeu o Governo,
mediante a presente iniciativa legislativa, propor as seguintes alterações:
- Distinguir, de um modo claro, as medidas correctivas das medidas disciplinares
sancionatórias, devendo as medidas correctivas “ser entendidas como parte integrante do
processo de ensino, prosseguindo finalidades pedagógicas, dissuasoras e de integração,
não tendo, portanto, um carácter punitivo” e as medidas disciplinares sancionatórias “têm
em vista, para além dos aspectos educativos e pedagógicos, a punição e o cerceamento de
eventuais comportamentos de maior gravidade, ou reincidentes, inaceitáveis no espaço
escolar.” (proposta de lei n.º 140/X, 2007: 2) As primeiras “poderão configurar a
obrigatoriedade de cumprimento de tarefas ou actividades de integração, a ordem de saída
da sala de aula, a inibição de participação em actividades extracurriculares ou o
condicionamento de acesso a espaços e equipamentos, ou, ainda, a mudança de turma”,

22
Primeira alteração à Lei n.º 30/2002, de 20 de Dezembro, que aprova o Estatuto do Aluno dos ensinos
Básico e Secundário

102
enquanto as segundas, “poderão configurar a repreensão registada, a suspensão
temporária da frequência, a transferência de escola e a expulsão.” (proposta de lei n.º
140/X, 2007: 2)
- Reforçar a autoridade dos professores e das escolas, transferindo maior poder de
decisão para os professores e para os órgãos de gestão dos estabelecimentos de ensino,
ampliando-se o “leque de medidas passíveis de ser aplicadas com autonomia de avaliação
e decisão por parte dos professores e órgãos de gestão da escola, nos termos que as
próprias escolas definam no seu regulamento interno.” (proposta de lei n.º 140/X, 2007:2)
- Responsabilizar os Conselhos Executivos ou Directores das escolas pela decisão
final sobre todas as medidas disciplinares, exceptuando as medidas de transferência ou
expulsão de escola, cuja aplicação dependerá também das Direcções Regionais de
Educação;
- Simplificar os

“procedimentos formais, de natureza processual, referentes à aplicação de medidas disciplinares


sancionatórias, sem prejuízo das garantias do direito de defesa dos alunos e de informação aos
encarregados de educação” e a “aplicação de medidas correctivas também deixará de obedecer a
procedimentos formais, como a redução a escrito e a abertura de autos. As reuniões de conselhos de
turma ou conselhos pedagógicos extraordinários, nestes casos, não se consideram necessárias, tendo
em conta a morosidade na análise do processo que tal implicaria. A única formalidade exigida será a
de comunicação aos encarregados de educação.” (proposta de lei n.º 140/X, 2007: 2)

- Reforçar a

“responsabilidade dos pais e encarregados de educação no acompanhamento do percurso escolar dos


respectivos educandos, nomeadamente, em situações de reiterado incumprimento do dever de
assiduidade, por parte do aluno, durante a escolaridade obrigatória” (proposta de lei n.º 140/X,
2007: 2)

- Melhorar e ampliar a “informação a prestar pelas escolas aos encarregados de


educação, no que concerne a falta de assiduidade ou medidas correctivas ou disciplinares
aplicadas.” (proposta de lei n.º 140/X, 2007: 3)

103
4- Regulamento Interno da escola secundária com 3º ciclo das Tílias23

“ Regulamento Interno é o documento que define o regime de


funcionamento da Escola, de cada um dos seus órgãos de administração e
gestão, das estruturas de orientação e dos serviços de apoio educativo,
bem como os direitos e os deveres dos membros da comunidade escolar.”

(Artigo 6º, RI, 2008: 5)

Todas as organizações necessitam de regras, manifestas ou implícitas, inatas ou


adquiridas, aceites ou impostas, que não deverão, nem restringir a sua liberdade de acção,
nem empobrecê-la, mas torná-la mais dinâmica e actuante, delimitando obrigações e
direitos, para que todos os que dela fazem parte possam ser defendidos e respeitados.
A esta necessidade não foge a Escola, como comunidade onde se inserem os alunos
que a frequentam, os professores que nela ensinam e os funcionários que organizam
administrativamente ou que velam pela sua conservação e limpeza.
Numa comunidade educativa com estas características criam-se relações
complexas, que necessitam ser reguladas de forma a criar condições para uma participação
democrática dentro de um quadro de normas que conduzam a uma sã convivência.
Desta forma, o Regulamento Interno, criado por força do art. 6º, do Decreto-Lei n.º
115-A/98, de 04 de Maio, deve ser considerado como a norma básica para o bom
funcionamento das escolas, de cada um dos seus órgãos de administração e gestão, das
estruturas de orientação educativa, dos diversos serviços e estruturas educativas, bem como
os direitos e os deveres dos membros da comunidade escolar, estabelecendo o quadro de
normas e regras a que todos os membros devem obedecer. Destina-se especificamente a
prever e disciplinar todas as situações que, no decorrer da actividade da instituição, possam
vir a verificar-se com as pessoas, instalações ou equipamentos que directamente se
relacionam com ela.
Concluindo, o Regulamento Interno tem por objectivo proporcionar um eficaz,
regular e harmonioso funcionamento da escola, constituindo-se como um espaço de
referência onde toda a comunidade se deve rever e encontrar o caminho, de forma a

23
Trata-se da 8ª revisão de 16 de Julho de 2008, que já contempla as alterações introduzidas no estatuto do
aluno do ensino não superior pela lei 3/2008 de 11 de Janeiro.

104
garantir-se igualdade de oportunidades no acesso e sucesso escolares. A sua aplicação é da
responsabilidade de toda a comunidade escolar e abrange todos os seus membros no
exercício das suas funções.
No âmbito do nosso trabalho e relativamente à escola objecto do nosso estudo
analisaremos apenas a parte correspondente às questões disciplinares. Convém, no entanto,
salientar que um regulamento interno não pode contrariar as disposições legais em vigor,
que lhe são hierarquicamente superiores, cumprindo-lhe apenas adaptar as leis em vigor às
situações previstas e disciplinar. Nesta escola, elaborou-se o Regulamento Interno (adiante
identificado pela sigla RI) de acordo com este princípio.
Para análise deste documento, utilizaremos a mesma metodologia dos anteriores,
focando a nossa lente apenas nas questões que garantam a disciplina ou que possam levar à
sua ruptura.
Começamos por abordar os direitos e deveres dos principais actores em interacção
na sala de aula - os professores e os alunos - uma vez que é da violação desses direitos ou
do incumprimento dos deveres que na maior parte das vezes resultam os comportamentos
inadequados e indisciplinados.
No capítulo XV, secção I – Direitos dos alunos, lê-se no artigo 214º que “O direito
à educação e a uma justa e efectiva igualdade de oportunidades no acesso e sucesso
escolares compreende (…) direitos gerais do aluno”. Referiremos aqueles que podem ter
influência directa na temática da disciplina/indisciplina:

“1- Usufruir do ensino e de uma educação de qualidade de acordo com o previsto na lei, em
condições de efectiva igualdade de oportunidades no acesso, de forma a propiciar a realização de
aprendizagens bem sucedidas;
8- Ser tratado com respeito e correcção por qualquer membro da comunidade educativa;
9- Ver salvaguardada a sua segurança na escola e respeitada a sua integridade física e moral;
14- Apresentar críticas e sugestões relativas ao funcionamento da escola e ser ouvido pelos
professores, Directores de Turma e Órgãos de Administração e Gestão da escola, em todos os
assuntos que justificadamente forem do seu interesse;
16- Participar na elaboração do regulamento interno da escola, conhecê-lo e ser informado, em
termos adequados à sua idade e ao ano frequentado, sobre todos os assuntos que justificadamente
sejam do seu interesse;
19- Ter uma Escola limpa e acolhedora;
20- Ter direito ao intervalo;
34- Expressar livremente e com correcção a sua opinião.” (RI, 2008: 97-99)

105
No mesmo capítulo, secção II – Deveres dos alunos, podemos ler no preâmbulo do
artigo 215º que “a realização de uma escolaridade bem sucedida numa perspectiva de
formação integral do cidadão, implica a responsabilização do aluno, enquanto elemento
nuclear da comunidade educativa” (RI, 2008: 100). Manifesta-se, assim, a necessidade de
responsabilizar os alunos pelos seus actos dentro da escola. O mesmo artigo enumera um
conjunto de deveres, dos quais se destacam, pela sua importância no plano disciplinar,
quando não observados, os seguintes:

“3- Seguir as orientações dos professores relativas ao seu processo de ensino e aprendizagem;
5- Tratar com respeito e correcção qualquer membro da comunidade educativa;
7- Respeitar as instruções dos professores e do pessoal não docente;
10- Respeitar a integridade física e moral de todos os membros da comunidade educativa;
12- Zelar pela preservação, conservação e asseio das instalações, material didáctico, mobiliário e
espaços verdes da escola, fazendo uso correcto dos mesmos;
15- Respeitar a propriedade e/ou a qualidade dos bens de todos os membros da comunidade
educativa;
20- Não utilizar quaisquer materiais, equipamentos tecnológicos, instrumentos ou engenhos,
nomeadamente telemóveis, PDAs, Mp3 e Mp4, IPODs entre outros, passíveis de, objectivamente,
perturbarem o normal funcionamento das actividades lectivas, ou poderem causar danos físicos ou
morais aos alunos ou a terceiros;
27- Conceder aos outros o direito de se expressarem e de serem ouvidos;
32- Trazer o material escolar necessário às suas actividades;
36- Respeitar a imagem dos membros da comunidade, não os filmando sem o seu consentimento.”
(RI, 2008: 100-102)

Da mesma forma e porque, como foi referido em capítulos anteriores, também os


professores têm um papel fundamental na prevenção ou instigação da
disciplina/indisciplina, faremos referência a alguns direitos do pessoal docente que, quando
desrespeitados pelos alunos, poderão levar a procedimentos disciplinares e a alguns
deveres que, quando não observados pelos docentes, poderão ser fonte de comportamentos
indisciplinados por parte dos alunos.
Os direitos do pessoal docente compõem a secção I do capítulo XVI. Entre os
fundamentais podemos referir:

“4- Ter direito à segurança na actividade profissional;


6- Exprimir-se livremente, qualquer que seja a sua origem e situação;

106
7- Ser ouvido e respeitado por todos os membros da comunidade escolar;
8- Obter da Escola as melhores condições possíveis de ambiente e de trabalho;
15- Exigir o respeito e participação activa dos alunos no processo de aprendizagem;
16- Dispor de salas em completo estado de arrumação e limpeza;
19- Não ser interrompido nas aulas, excepto em situações excepcionais.” (RI, 2008: 106-107)

Na secção II, do referido capítulo, o artigo 227º especifica os deveres gerais dos
professores, dos quais se salientam:

“1- Contribuir para a formação e realização integral do aluno;


2- Reconhecer e respeitar as diferenças culturais e pessoais dos alunos e demais membros da
comunidade educativa, valorizando os diferentes saberes e culturas e combatendo processos de
exclusão e discriminação;
7- Gerir o processo de ensino-aprendizagem, no âmbito dos programas definidos, procurando
adoptar mecanismos de diferenciação pedagógica susceptíveis de responder às necessidades
individuais dos alunos;
8- Respeitar a natureza confidencial da informação relativa aos alunos e respectivas famílias;
14- Pautar sempre a sua acção pelos parâmetros do respeito, atenção, compreensão e
responsabilidade;
15- Manter a disciplina, ambiente de trabalho e relacionamento com os alunos na sala de aula;
17- Promover medidas de carácter pedagógico que estimulem o harmonioso desenvolvimento da
educação dos jovens, quer nas actividades na sala de aula, quer nas demais actividades da Escola;
18- Sensibilizar os alunos para princípios e valores, tais como, liberdade, solidariedade, tolerância,
autonomia, intervenção, civismo, espírito crítico, etc;
19- Intervir sempre que necessário, não se demitindo da sua função de educador;
26- Manter o espaço de trabalho limpo e seguro.” (RI, 2008: 108-109)

O capítulo XX regulamenta as medidas disciplinares. Na secção I –


Enquadramento, começa por dar, no artigo 239º, a noção das medidas disciplinares,
baseando-se textualmente nos normativos emanados da tutela e anteriormente analisados.
Assim, pode ler-se:

“1- A violação pelo aluno de algum dos deveres previstos no artigo 214º, deste regulamento, em
termos que se revelem perturbadores do funcionamento normal das actividades da escola ou das
relações no âmbito da comunidade educativa, constitui infracção passível da aplicação de medida
correctiva ou medida disciplinar sancionatória.
2- Todas as medidas correctivas e medidas disciplinares sancionatórias prosseguem finalidades
pedagógicas, preventivas, dissuasoras e de integração, visando, de forma sustentada, o cumprimento

107
dos deveres do aluno, a preservação do reconhecimento da autoridade e segurança dos professores
no exercício da sua actividade profissional e, de acordo com as suas funções, dos demais
funcionários, visando ainda o normal prosseguimento das actividades da escola, a correcção do
comportamento perturbador e o reforço da formação cívica do aluno, com vista ao desenvolvimento
equilibrado da sua personalidade, da sua capacidade de se relacionar com os outros, da sua plena
integração na comunidade educativa, do seu sentido de responsabilidade e das suas aprendizagens.
3- As medidas disciplinares sancionatórias, tendo em conta a especial relevância do dever violado e
gravidade da infracção praticada, prosseguem igualmente, para além das identificadas no número
anterior, finalidades punitivas.
4- As medidas correctivas e medidas disciplinares sancionatórias devem ser aplicadas em coerência
com as necessidades educativas do aluno e com os objectivos da sua educação e formação, no
âmbito, tanto quanto possível, do desenvolvimento do plano de trabalho da turma e do projecto
educativo da escola, e nos termos do presente regulamento.” (RI, 2008: 118)

O artigo 241º, no ponto 2, tipifica, com base no nº 1 do artigo 24º da lei 3/2008, de
18 de Janeiro, as medidas correctivas, estipulando que são medidas correctivas:

“a) A ordem de saída da sala de aula, e demais locais onde se desenvolva o trabalho escolar;
b) A realização de tarefas e actividades de integração escolar, podendo, para esse efeito, ser
aumentado o período de permanência obrigatória, diária ou semanal do aluno na escola;
c) O condicionamento no acesso a certos espaços escolares, ou na utilização de certos materiais e
equipamentos, sem prejuízo dos que se encontrem afectos a actividades lectivas;
d) O condicionamento na participação em visitas de estudo;
e) A mudança de turma.” (RI, 2008: 119)

Os artigos seguintes clarificam cada uma dessas medidas, adaptando-as à situação


específica da escola. Assim, o artigo 242º estabelece que:

“1- A aplicação da medida correctiva da ordem de saída da sala de aula e demais locais onde se
desenvolva o trabalho escolar, é da exclusiva competência do professor respectivo e implica a
permanência do aluno na escola, competindo àquele, determinar, o período de tempo durante o
qual o aluno deve permanecer fora da sala de aula, se a aplicação de tal medida correctiva acarreta
ou não a marcação de falta ao aluno e quais as actividades, se for caso disso, que o aluno deve
desenvolver no decurso desse período de tempo.
2- A ordem de saída da sala de aula implica a marcação de falta injustificável ao aluno, devendo
ser comunicada por escrito ao Director de Turma.
3- Na sequência do ponto anterior o aluno deverá ser encaminhado, pela funcionária do bloco,
para o Gabinete de Gestão de Conflitos onde executará as tarefas designadas.” (RI, 2008: 119)

108
O artigo 243º estabelece as actividades de integração na escola referindo que

“1- As actividades de integração na escola consistem no desenvolvimento de tarefas de carácter


pedagógico que contribuam para o reforço da formação cívica do aluno e promovam um bom
ambiente educativo;
2- A determinação das tarefas de integração a realizar pelo aluno é estabelecida pelo Presidente do
Conselho Executivo ou Director, devendo as mesmas ser executadas em horário não coincidente
com as actividades lectivas do aluno e por prazo a definir, consoante a gravidade do comportamento,
nunca superior a quatro semanas.
3- As actividades de integração são as a seguir mencionadas:
a) Realizar um trabalho escrito de reflexão sobre comportamentos perturbadores e propor a
remediação dos mesmos;
b) Cumprir um programa de integração social com a coordenação dos SPO.
c) Reparar os danos provocados;
d) Organizar os seus cadernos diários;
e) Ajudar na organização do Polivalente;
f) Ajudar as funcionárias dos blocos na limpeza das salas ou do Polivalente;
g) Ajudar nas actividades de jardinagem.
h) Realizar trabalhos relacionados com as suas áreas curriculares.” (RI, 2008: 120)

O artigo 244º condiciona a participação dos alunos em visitas de estudo, o artigo


245º limita o acesso dos alunos a certos espaços da escola, referindo que:

“ (…) O aluno poderá ficar impedido de aceder à Biblioteca, campos de jogos, mesas de ténis de
mesa, matraquilhos ou outro que se revele adequado.
O espaço, materiais ou equipamentos com acesso condicionado dependerão da infracção cometida.
O período de condicionamento de acesso dependerá da infracção cometida, não podendo ultrapassar
o período de tempo correspondente a um ano lectivo.” (RI, 2008: 120)

Finalmente, e no respeitante às medidas correctivas, o artigo 246º estabelece a


medida correctiva de mudança de turma, que apenas deverá ser aplicada se nenhuma das
medidas anteriormente referidas se revelar adequada. A aplicação desta medida é da
competência do Presidente do Conselho Executivo ou Director, depois de ouvido o
conselho de Turma.
O artigo 247º e seguintes tipificam as medidas disciplinares sancionatórias.

“As medidas disciplinares sancionatórias traduzem uma censura disciplinar do comportamento


assumido pelo aluno, devendo a ocorrência dos factos em que tal comportamento se traduz, ser

109
participada, pelo professor ou funcionário que a presenciou ou dela teve conhecimento, de imediato,
ao respectivo Director de Turma, para efeitos da posterior comunicação ao presidente do Conselho
Executivo ou Director.
São medidas disciplinares sancionatórias:
a) A repreensão registada;
b) A suspensão da escola até 10 dias úteis;
c) A transferência de escola.” (RI, 2008: 121)

O artigo 248º especifica a medida disciplinar sancionatória de repreensão registada.

“A aplicação da medida disciplinar sancionatória de repreensão registada é da competência


do professor respectivo, quando a infracção for praticada na sala de aula, ou do presidente do
Conselho Executivo, nas restantes situações, averbando -se no respectivo processo individual do
aluno, a identificação do autor do acto decisório, data em que o mesmo foi proferido e a
fundamentação de facto e de direito que norteou tal decisão.” (RI, 2008: 121)

No artigo 249º regulamenta-se a medida disciplinar de suspensão da escola por um


período não superior a 10 dias.

“1- A decisão de aplicar a medida disciplinar sancionatória de suspensão da escola até 10 dias
úteis compete ao presidente do Conselho Executivo, que pode, previamente, ouvir o Conselho de
Turma.
(…)
3- As faltas dadas pelo aluno no decurso da aplicação da medida disciplinar sancionatória de
suspensão da escola até 10 dias úteis são consideradas injustificadas.” (RI, 2008: 121)

O artigo 251º regulamenta a transferência de escola. Trata-se da medida disciplinar


sancionatória que se aplica aos casos de maior gravidade e, por isso mesmo, a sua
aplicação é da competência do Director Regional da Educação.

“1- A aplicação da medida disciplinar sancionatória de transferência de escola reporta-se à prática de


factos notoriamente impeditivos do prosseguimento do processo de ensino - aprendizagem dos
restantes alunos da escola, ou do normal relacionamento com algum ou alguns dos membros da
comunidade educativa.
2- A decisão de aplicar a medida disciplinar sancionatória de transferência de escola, é da
competência do Director Regional da Educação.” (RI, 2008: 122)

110
Terminamos a análise deste Regulamento Interno, fazendo referência ao artigo 254º
da secção II – Procedimento Disciplinar, que refere expressamente que é da competência
do Presidente do Conselho Executivo ou Director a instauração de procedimentos
disciplinares, sempre que tal se justifique.

“A instauração de procedimento disciplinar por comportamentos susceptíveis de configurarem a


aplicação de alguma das medidas disciplinares sancionatórias previstas nas alíneas c) e d) do nº2 do
artigo 27º da Lei 3/2008, de 18 de Janeiro, é da competência do presidente do Conselho Executivo
ou Director de acordo com a legislação em vigor.” (RI, 2008: 123)

Pela análise dos documentos apresentados, podemos concluir que as questões da


disciplina/indisciplina são tema de preocupação dos órgãos que tutelam a educação e das
escolas enquanto organizações individuais. Compreendem-se, assim, as alterações
propostas à Lei 30/2002 introduzidas pela Lei 3/2008, que reforçam o papel dos órgãos de
gestão dos estabelecimentos de ensino e dos próprios professores, salvaguardam os direitos
individuais de todos os envolvidos no processo educativo, agilizam os procedimentos
disciplinares, permitindo que algumas das medidas disciplinares aplicadas na sequência de
comportamentos indisciplinados considerados mais graves sejam aplicados pelo Presidente
do Conselho Executivo, sem que para o efeito seja necessário reunir o Conselho de Turma.

111
PARTE II – ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

112
CAPÍTULO IV - METODOLOGIA

1- Metodologia

Metodologia Científica nada mais é do que a disciplina que “estuda os


caminhos do saber”, se entendermos que “método” quer dizer caminho,
“logia” quer dizer estudo e “ciência” quer dizer saber.
Dicionário Língua Portuguesa

Qualquer trabalho de investigação social deve ser encarado com seriedade, precisão
e rigor científico. Para que tal aconteça, é necessário que todo o investigador utilize uma
metodologia correcta, que o ajude a levar a bom termo a investigação a que se propõe. A
metodologia procura explicar de forma minuciosa, detalhada, rigorosa e exacta a acção
desenvolvida no método do trabalho de pesquisa. Explica-se o tipo de pesquisa, os
instrumentos utilizados, os intervenientes na investigação, a forma de tratamento dos
dados, enfim, tudo aquilo que se utilizou no trabalho de investigação.
Muito se tem escrito sobre metodologia, métodos e técnicas de investigação em
Ciências Sociais. Mas, afinal, o que é metodologia, métodos e técnicas em investigação?
Muitas vezes, surge alguma confusão do uso destes conceitos, não havendo um uso único
para cada um. Tentamos, seguidamente, elucidar cada um deles.
Lima (1995: 12-13) diz-nos que:

“ A metodologia consistirá na análise sistemática e crítica dos pressupostos, princípios e


procedimentos lógicos que moldam a investigação de determinados problemas sociológicos. Situam-
se aqui as questões relacionadas com a estratégia de pesquisa a adoptar em referência e adequação a
certos objectos de análise e em ordem à relacionação e integração dos resultados obtidos através do
uso de técnicas”

No dizer de Pardal (1995: 10), metodologia

“ é um vocábulo utilizado com diversos sentidos, sendo, por esse facto, portador de não pequena
ambiguidade. No uso corrente, aparece não apenas associado à ciência que estuda os métodos

113
científicos, como a técnicas de investigação e, até mesmo, a uma certa aproximação de
epistemologia”.

Loureiro (2006: 233), citando Costa, diz que “um método é uma estratégia
integrada de pesquisa que organiza criticamente as práticas de investigação, incidindo
nomeadamente sobre a selecção e articulação das técnicas de recolha e análise da
informação”. O mesmo autor (2006: 233), parafraseando Caria e reportando-se ao conceito
de metodologia por ele utilizado diz que “ uma metodologia é uma construção estratégica,
que articula teoria e experiência para abordar um objecto”. Conclui, assim, que “a
metodologia é uma estratégia que diz respeito à maneira como investigar”.
Ainda segundo Loureiro (2006: 233) e baseando-se em Silva (2001), Ghiglione e
Matalon (1993), diz que “são instrumentos de recolha e também de tratamento da
informação considerada útil para o estudo em causa”.
No nosso trabalho, constituído por um enquadramento teórico e por uma
investigação prática, procurámos ter em conta algumas regras metodológicas básicas para
que o mesmo tenha consistência científica, embora tenhamos consciência de que muito
teremos que aprender neste campo.

2- O método: Estudo de Caso

Segundo Pardal, o método de estudo consiste essencialmente

“num conjunto de operações, situadas a diferentes níveis, que tem em vista a consecução de
objectivos determinados. Corresponde a um corpo orientador da pesquisa que, obedecendo a um
sistema de normas, torna possível a selecção e a articulação de técnicas, no intuito de se poder
desenvolver o processo de verificação empírica” (1995: 10).

A nossa investigação baseou-se numa abordagem de orientação qualitativa, sendo


complementada com alguns contributos quantitativos pontuais. É um estudo de orientação
qualitativa porque se enquadra, em pelos menos quatro, das cinco características definidas
por Bogdan e Biklen (1994: 47-51) para as investigações qualitativas. Entre elas:

114
- “Na investigação qualitativa a fonte de dados é o ambiente natural, constituindo o investigador
o instrumento principal. Os investigadores introduzem-se e despendem grandes quantidades de
tempo em escolas, famílias, bairros e outros locais tentando elucidar questões educativas”.
- “A investigação qualitativa é descritiva. Os dados recolhidos são em forma de palavras ou
imagens e não de números. Os resultados escritos da investigação contêm citações feitas com base
nos dados para ilustrar e substanciar a apresentação. Os dados incluem transcrições de entrevistas,
notas de campo, fotografias, vídeos, documentos pessoais, memorandos e outros registos oficiais”.
- Os investigadores qualitativos tendem a analisar os seus dados de forma indutiva. Não recolhem
dados ou provas com o objectivo de confirmar ou infirmar hipóteses construídas previamente; ao
invés disso, as abstracções são construídas à medida que os dados particulares que foram
recolhidos se vão agrupando”.
- O significado é de importância vital na abordagem qualitativa. Os investigadores que fazem uso
deste tipo de abordagem estão interessados no modo como diferentes pessoas dão sentido às suas
vidas. (…) Ao apreender as perspectivas dos participantes, a investigação qualitativa faz luz sobre
a dinâmica interna das situações, dinâmica esta que é frequentemente invisível para o observador
exterior”.

Esclarecendo a investigação qualitativa e o método de estudo de caso, Ludke e


André (1986: 13) afirmam que a pesquisa qualitativa pode assumir várias formas,
destacando-se a pesquisa de tipo etnográfico e o estudo de caso. Qualquer um destes tipos
tem grande aceitação na área da educação devido “ao seu potencial para estudar as
questões relacionadas à escola”.
Daí a nossa escolha, para orientar a pesquisa, ter recaído no método de estudo de
caso. A nossa pouca experiência, e o facto de Bogdan e Biklen defenderem que este
método tanto pode ser utilizado por investigadores experientes como por principiantes,
“não é por acaso que a maioria dos investigadores escolhe, para o seu primeiro projecto,
um estudo de caso” (1994: 89), também pesou nessa escolha.
Judith Bell (1997: 22) é da mesma opinião, ao referir que este método “é
especialmente indicado para investigadores isolados, dado que proporciona uma
oportunidade para estudar, de uma forma mais ou menos aprofundada, um determinado
aspecto de um problema em pouco tempo”. Para esta autora, o estudo de caso tem sido
descrito como um termo guarda-chuva para uma família de métodos de pesquisa cuja
principal preocupação é a interacção entre factores e eventos.
Bogdan e Biklen (1994: 89), baseando-se em Merriam, referem que “O estudo de
caso consiste na observação detalhada de um contexto, ou indivíduo, de uma única fonte de

115
documentos ou de um acontecimento específico”. Esta primeira abordagem ao método de
estudo de caso corresponde às características do nosso trabalho que se desenrolou em
contextos específicos e tratou acontecimentos também específicos. Desta forma
corresponde àquilo que estes investigadores designam de estudo de caso de análise
situacional. Ainda de acordo com Bogdan e Biklen (1994: 89)

“o estudo de caso consiste na observação detalhada de um contexto, ou indivíduo, de uma única


fonte de documentos ou de um acontecimento específico”. Complementam esta ideia ao
acrescentarem que “Neste tipo de estudo é investigado um determinado acontecimento (por
exemplo, a expulsão de um aluno da escola) do ponto de vista de todos os participantes (o aluno, os
seus amigos, os pais, o director e o professor que desencadeou a acção)”. (1994: 93)

O estudo de caso permite compreender em profundidade a realidade em estudo,


integrando-a em contextos mais globais. O enfoque que utiliza é colocado não apenas num
elemento, mas sim numa maior multiplicidade deles. Procura-se vislumbrar as relações que
se estabelecem no seio do objecto de estudo. No nosso caso concreto, indisciplina na sala
de aula, não interessa apenas aquilo que isoladamente o professor ou o aluno fazem, mas
sim o que ambos fazem, os contextos em que actuam, as representações que têm de si
próprio e do outro.
Bogdan & Biklen (1994: 16) esclareceram que a expressão etnográfica é utilizada
muitas vezes no mesmo sentido que investigação qualitativa, e esta última é usada

“como um termo genérico que agrupa diversas estratégias de investigação que partilham
determinadas características. Os dados recolhidos são designados por qualitativos, o que significa
ricos em pormenores descritivos relativamente a pessoas, locais e conversas, e de complexo
tratamento estatístico. As questões a investigar não se estabelecem mediante a operacionalização
de variáveis, sendo, outrossim, formuladas com o objectivo de investigar os fenómenos em toda a
sua complexidade e em contexto natural”.

Os mesmos autores (1994: 48), citando Geertz, dizem:

“Se a interpretação antropológica consiste na construção de uma leitura dos acontecimentos,


então, divorciá-la do que se passa – daquilo que em determinado momento espácio-temporal
pessoas particulares afirmam, fazem, ou sofrem, de entre a vastidão de acontecimentos do mundo
– é o mesmo que divorciá-la das suas aplicações, tornando-a oca. Uma boa interpretação do que
quer que seja – um poema, uma pessoa, uma história, um ritual, uma instituição, uma sociedade –
conduz-nos ao coração daquilo que pretende interpretar”.

116
Mendes (1987: 175) diz-nos que o “método de caso” também pode ser designado
de “método monográfico”. O mesmo autor, citando Pierre Léon, diz que este método

“ baseia-se não em teorias admiráveis, mas na própria realidade”. Continua afirmando que “isto
não significa, contudo, que se deva prescindir da(s) teoria(s), ao elaborarem-se monografias24 ou
ao estudarem-se casos. Significa, sim, que em qualquer monografia a componente realidade – que,
em cada caso, se torna objecto de análise – é muito forte e deve impregnar todo o estudo, de forma
nítida e bem patente”.

Para além de Bogdan & Biklen que indicam o “estudo de caso” como uma de entre
muitas expressões associadas à investigação qualitativa, Costa é outro autor que também
referiu esta diversidade de expressões para designar este tipo de pesquisa. Este autor (1994:
129) adoptou a expressão de “pesquisa de terreno” mas indicou o uso de outros termos
como

“«trabalho de campo», «estudo de caso», «estudo de comunidade», «análise intensiva», «método


qualitativo», «etnografia», «observação participante»”, sem deixar de advertir que não significam
exactamente a mesma coisa, mas que “Pertencem a sistemas alternativos de classificação dos
métodos de pesquisa, estruturados segundo eixos diversos. Por isso as ênfases são diferentes e os
recobrimentos apenas parciais”.

Costa (1994: 129-130) salientou, igualmente, que todas estas expressões que
designam um método de pesquisa de terreno, método que

“supõe, genericamente, presença prolongada do investigador nos contextos sociais (...)”


contrapõem-se a outros métodos de pesquisa sociológica “tais como: a) os que assentam
predominantemente na análise de dados estatísticos institucionalmente produzidos ou na de outros
documentos; b) os que têm como principais procedimentos a realização de inquéritos por
questionário ou de entrevistas, através de contactos pessoais de carácter pontual; c) os que
consistem em experimentações de tipo laboratorial”.

A nossa investigação baseia-se na realidade da escola em estudo, daí o recurso ao


método anteriormente descrito. Não pretendemos fazer generalizações mas sim

24
Mendes, baseando-se em dicionários, define monografia como “descrição, tratado ou estudo de um ponto
particular de uma ciência ou arte, de uma só personagem” (…). “numa monografia foca-se sempre um ponto
particular de um assunto, mas este pode ser da mais variada natureza” (1987: 175)

117
compreender melhor essa realidade que tanto preocupa todos os intervenientes no processo
ensino/aprendizagem que é a indisciplina.
Algumas críticas têm sido apontadas a este método sendo a principal que os
resultados não são generalizáveis. Contudo Bell (1997), apoiando-se na opinião de
Bassey, refuta esta crítica, sublinhando que a fiabilidade de um estudo de caso é mais
importante que a possibilidade de o generalizar. Aponta-se-lhe ainda como aspectos
negativos o facto de requerer um longo período de tempo para terminar a investigação, o
que pode levar a que envolva custos, por vezes bastante elevados. Dado poder ser
efectuado por investigadores isolados, a validade interna pode ser limitada devido à
subjectividade do observador.
Não obstante estas críticas, este método apresenta também algumas vantagens. Os
resultados por ele alcançados são facilmente entendidos por todos e, porque se revelam
bastante realistas, fornecem informações importantes para outras situações similares.
Outro aspecto positivo é o de permitir ao pesquisador concentrar-se num aspecto ou
situação específica e identificar, ou tentar identificar, os diversos processos que interagem
no contexto estudado. Refere-se também, como vantagem da utilização deste método, o
facto de que enquanto os questionários e outros métodos estruturados conseguem
respostas apenas aos aspectos especificamente questionados, os estudos de caso são mais
receptivos a informações não previstas pelo pesquisador. Yin (2007: 9), afirma esta
posição ao sublinhar que um bom estudo de caso beneficia do facto de poder recorrer a
uma multiplicidade de fontes na recolha de informação. Também Pardal & Correia (1995:
23) referem que

“o pesquisador pode recorrer a uma grande diversidade de técnicas, facto que tanto pode ser
determinado pelo quadro teórico de que se possa ter socorrido e das hipóteses que tenha elaborado,
como da especificidade da situação, ou de ambas as condições: inquérito por questionário,
entrevista, análise documental, observação participante…”

Finalmente, e este parece ser um dos pontos mais fortes do estudo de caso, é a sua
capacidade de explorar processos sociais à medida que esses ocorrem nas organizações,
permitindo uma análise processual, contextual e longitudinal das várias acções e
significados que ocorrem e são construídos nas organizações.

118
3- Técnicas de recolha da informação

“Cada método de colecta de dados é só uma aproximação ao


conhecimento. Cada um fornece um vislumbre diferente e normalmente
válido da realidade e todos eles são limitados quando usados
isoladamente”

(Amado in Estrela e Ferreira, 1997: 77 e 78).

3.1. Documentos analisados

Para Pardal & Correia (1995: 74), a análise documental é uma “técnica de recolha
de informação necessária em qualquer investigação, o recurso a documentos é uma tarefa
difícil e complexa que exige do investigador paciência e disciplina”.
A investigação empírica foi, em parte, elaborada a partir da análise de um conjunto
de documentos que os órgãos de gestão da escola nos facultaram para consulta. O Projecto
Educativo da Escola para o triénio 2006-2009, o Regulamento Interno, e os documentos
constituintes dos procedimentos disciplinares: como participações de ocorrência de
carácter disciplinar, autos de instrução de averiguação, relatórios de instrução de
procedimento disciplinar e declarações de notificação aos Encarregados de Educação.
O Projecto Educativo da Escola reveste-se de primordial importância pois é a partir
dele que podemos compreender o funcionamento da escola e quais as principais linhas
orientadoras em termos educativos. Caracteriza-a tanto a nível de ambiente interno como
do meio envolvente.
O Regulamento Interno define o funcionamento da instituição e de todos os órgãos
que a constituem. Para o nosso trabalho, releva especial importância o capítulo respeitante
às questões disciplinares, uma vez que nele se encontram sintetizados os regulamentos
emanados da tutela mas também um conjunto de normas e formas de actuação disciplinar
definidas pelos órgãos de gestão da escola.
A Carta Educativa do Concelho onde a escola se localiza foi outro importante
documento que nos permitiu recolher informação relevante para a caracterização do meio
envolvente da escola em estudo.

119
3.2- Entrevista

As entrevistas foram realizadas a alunos25, professores e Presidente do Conselho


Executivo. Optou-se por entrevistas semi-estruturadas por se tratar de uma técnica de
recolha de dados que proporciona um contacto directo e um clima mais favorável entre os
intervenientes, requisito indispensável para a recolha de elementos das vivências dos
entrevistados (alunos) e de opiniões, o que permite obter dados com mais profundidade,
em comparação ao inquérito por questionário. Quivy & Champenhoudt (2005: 192),
dizem-nos que

“ao contrário do inquérito por questionário, os métodos de entrevista caracterizam-se por um


contacto directo entre o investigador e os seus interlocutores e por uma fraca directividade por parte
daquele. Instaura-se, assim, em princípio, uma verdadeira troca, durante a qual o interlocutor do
investigador exprime as suas percepções de um acontecimento ou de uma situação, as suas
interpretações ou as suas experiências, ao passo que, através das suas perguntas abertas e das suas
reacções, o investigador facilita essa expressão, evita que ela se afaste dos objectivos da investigação
e permite que o interlocutor aceda a um grau máximo de autenticidade e de profundidade”.

Esta técnica de recolha de dados permite, assim, que o entrevistador e o


entrevistado, sem fugirem à linha condutora da entrevista tenham margem de manobra,
sendo as questões colocadas consoante o sentido de oportunidade. Como nos diz Pardal
(1995: 65), “A entrevista semi-estruturada nem é inteiramente livre e aberta (…) nem
orientada por um leque inflexível de perguntas estabelecidas a priori ”. Refira-se, no
entanto, que o êxito de uma entrevista depende de muitos factores, sendo de referir a sua
preparação, a qualidade do entrevistador e o carácter do entrevistado.
Sobre a técnica da entrevista Bogdan e Biklen (1994: 134) referem que “Em
investigação qualitativa, as entrevistas podem ser utilizadas de duas formas. Podem
constituir a estratégia dominante para a recolha de dados ou podem ser utilizadas em
conjunto com a observação participante, análise de documentos e outras técnicas”.
Continuam, referindo que “a entrevista é utilizada para recolher dados descritivos na
linguagem do próprio sujeito, permitindo ao investigador desenvolver intuitivamente uma
ideia sobre a maneira como os sujeitos interpretam aspectos do mundo”.
25
As entrevistas apenas foram realizadas após obtenção, por escrito, de autorização do pai ou encarregado
de educação dos alunos envolvidos.

120
De Ketele & Roegiers (1993: 22) definem a entrevista como:

“um método de recolha de informações que consiste em conversas orais, individuais ou de grupos,
com várias pessoas seleccionadas cuidadosamente, a fim de obter informações sobre factos ou
representações, cujo grau de pertinência, validade ou fiabilidade é analisado na perspectiva dos
objectivos da recolha da informação”.

A entrevista, entendida como “procedimento de recolha de informação que utilizam


a forma de comunicação verbal” (Almeida & Pinto 1976: 100), foi uma das técnicas
principais de recolha dos dados empíricos. Ela permitiu-nos obter informações acerca de
aspectos não observáveis, permitindo ainda um conhecimento mais profundo das situações
em estudo, nomeadamente das perspectivas dos alunos e professores a respeito do
fenómeno da indisciplina na sala de aula.
As entrevistas foram recolhidas em gravação magnética e posteriormente transcritas
para formato papel a fim de poderem ser trabalhadas porque, segundo Bogdan e Biklen
(1994: 49) "A palavra escrita assume particular importância na abordagem qualitativa,
tanto para o registo dos dados como para a disseminação dos resultados".
O registo magnético das entrevistas26 foi uma opção que teve em conta dois aspectos:
a possibilidade de criar um ambiente de proximidade e empatia entre
entrevistador/entrevistado e também porque segundo os mesmos autores (1994: 172)
“Quando um estudo envolve entrevistas extensas ou quando a entrevista é a técnica
principal do estudo, recomendamos que use um gravador”.
As entrevistas foram todas realizadas pelo investigador que contactou pessoalmente
cada um dos entrevistados. O órgão de gestão da escola, onde a recolha dos dados foi
efectuada, disponibilizou um pequeno gabinete onde as entrevistas foram realizadas, num
ambiente calmo e sossegado.

26
O registo áudio de todas as entrevistas foi previamente autorizado por cada um dos intervenientes.

121
3.2.1- Critérios para a selecção dos entrevistados

Pretendendo, com o nosso trabalho, uma melhor compreensão das questões ligadas
à indisciplina na sala de aula e as percepções que alunos e professores têm do fenómeno,
desenvolvemos a nossa investigação na instituição anteriormente referida, onde ocorreram
situações de comportamentos indisciplinados na sala de aula, às quais se aplicaram sanções
disciplinares.
Na Escola Secundária com 3º ciclo do ensino básico das Tílias iniciou-se, no ano
lectivo de 2007/2008, um método inovador no respeitante ao tratamento das ocorrências
disciplinares em contexto de sala de aula. Resultou de um projecto apresentado por uma
professora da escola, que frequentou um curso de mediação de conflitos, com vista à
resolução de problemas disciplinares na escola e, sobretudo na sala de aula. Esse projecto
foi aprovado pelo Conselho Pedagógico e pelos órgãos directivos da escola. Formou-se um
“Gabinete Disciplinar”27, constituído por professores que se ofereceram voluntariamente
para esta experiência inovadora. Os elementos do gabinete frequentaram uma acção de
formação com a duração de oito horas, orientada por uma professora da Universidade
Lusófona do Porto especializada em mediação de conflitos. Estes professores tiveram
também sessões de esclarecimento com a colega que apresentou o projecto, e que tinha
frequentado um curso de formação sobre a temática dos conflitos e da indisciplina na sala
de aula.
Nesta escola, uma falta disciplinar não corresponde apenas à expulsão do aluno da
sala de aula e respectivo registo no livro de ponto. A sanção é sempre o início de um
processo de análise do comportamento e acompanhamento do aluno. Quando um professor
dá ordem de saída da sala de aula, o aluno já sabe onde, obrigatoriamente, tem de se
dirigir, ao Gabinete Disciplinar. Neste gabinete há professores prontos a ouvi-lo e a fazê-lo
preencher um „registo de incidente disciplinar‟. Conversam com ele, tentam saber o que se
passou na sala de aula, nomeadamente os motivos que levaram à ordem de saída e
convidam-no a reflectir sobre os seus comportamentos, aconselhando-o para que os
mesmos actos não se repitam. „Como classificas o teu comportamento?‟, „o que poderias

27
Este gabinete também é conhecido por Gabinete de Gestão de Conflitos. Ao longo do trabalho utilizam-se
as duas designações.

122
ter feito para evitar esta situação?‟ e „o que te comprometes a fazer para remediar e
ultrapassar esta situação?‟, são algumas das questões colocadas aos jovens.
O relato do aluno e a participação que o professor, obrigatoriamente, tem que
redigir são, depois, analisados para a tomada de eventuais decisões disciplinares mais
graves. Desta forma, fica-se com uma perspectiva sobre o funcionamento da escola e das
relações que se estabelecem entre professores e alunos.
Com base nos referidos registos, a partir dos quais se elaborou o quadro VII, que
adiante se apresenta, identificámos quais os comportamentos que mais acontecem na sala
de aula. Foi com base nesta informação que seleccionámos os alunos que foram
entrevistados28 a fim de recolhermos os dados que nos permitiram completar a nossa
investigação. O quadro com a caracterização dos alunos seleccionados para as entrevistas
apresenta-se na página 127.

28
A respeito das entrevistas realizadas aos alunos deve referir-se que existiram alguns
constrangimentos. Alguns entrevistados mostraram-se extremamente nervosos, o que fez com que algumas
respostas fossem muito curtas. Confrontado com esta situação o entrevistador teve que intervir bastantes
vezes, colocando questões complementares, no sentido de tentar recolher o máximo de informação possível.
Esta situação causou ao próprio entrevistador algum embaraço devido a alguma falta de experiência na
realização de entrevistas com alunos.
Refira-se também que os alunos do 7º ano de escolaridade que abordámos, no sentido de serem
entrevistados, se mostraram muito desconfiados e pouco colaborantes. Dois chegaram a marcar entrevista, à
qual não compareceram. Por tal motivo, não foi entrevistado qualquer aluno do 7º ano de escolaridade.

123
QUADRO VII- Comportamentos de indisciplina, segundo o sexo e ano / turma
SEXO ANO
CATEGORIAS SUBCATEGORIAS / COMPORTAMENTOS TOTAL
M F 7º 8º 9º 10º 11º 12º
- Interromper o professor com questões
2 1 3 3
fora do assunto da aula.
Relação - Falar ou responder ao professor de forma
21 1 9 6 5 2 22
professor-aluno incorrecta
- Desafiar a autoridade do professor 12 4 2 4 2 12
- Desobedecer a ordens do professor 32 2 18 11 3 1 1 34
- Insultar ou gozar o professor 7 2 1 4 7
Total parcial categoria 78
Percentagem % 23,1
- Provocar os colegas. 6 3 2 1 6
Relação aluno-
- Insultar os colegas. 8 4 2 1 1 8
aluno
- Agredir ou tentar agredir um colega 13 2 8 7 15
Total parcial categoria 29
Percentagem % 8,6
- Conversar com os colegas. 56 6 26 21 10 2 3 62
- Rir e fazer rir os colegas de forma
Comunicação 34 2 15 10 10 1 36
exagerada.
oral clandestina
- Brincar, atirando papéis (ou outros
e distracções 26 18 6 2 26
objectos) pelo ar ou chão.
- Falar alto e desordenadamente ou fazer
23 3 11 12 2 1 26
barulho
Total parcial categoria 150
Percentagem % 44,4
- Balançar-se na cadeira. 1 1 1
Movimentação - Circular pela sala de aula. 6 3 3 6
- Levantar-se do lugar sem autorização. 8 3 2 3 8
Total parcial categoria 15
Percentagem % 4,4
- Danificar o material da escola (mesas,
Material escolar 3 2 1 3
cadeiras, portas, etc.)
Total parcial categoria 3
Percentagem % 0,9
- Recusar realizar as actividades ou não
12 6 5 1 12
participar nas aulas.
- Estudar ou realizar os trabalhos para
Trabalho 2 2 2
outras disciplinas.
- Chegar atrasada(o) às aulas. 3 1 1 1 3
- Não trazer o material escolar necessário. 2 2 2
Total parcial categoria 19
Percentagem % 5,6
- Entrar na sala de aula sem pedir
1 1 1
autorização.
- Permanecer na aula com o boné na
1 1 1
cabeça.
Convenções - Utilizar telemóvel, MP3, ou outro
3 1 3 1 4
sociais material electrónico.
- Manter uma postura inadequada na sala
de aula (pés em cima das cadeiras, mal 21 13 7 1 21
sentado, comer etc.).
- Proferir palavrões / utilizar linguagem
17 5 8 2 2 17
imprópria
Total parcial categoria 44
Percentagem % 13,0
TOTAL = 320 18 159 108 47 18 3 3 338

Não faremos aqui, uma análise exaustiva do quadro apresentado (essa análise será
feita noutro capítulo), salientamos, no entanto, que os comportamentos de indisciplina são
praticados com uma frequência muito mais elevada por elementos do sexo masculino do

124
que por elementos do sexo feminino. Tal facto levou a que apenas entrevistássemos um
elemento do sexo feminino. Podemos também verificar que a frequência de casos de
indisciplina na sala de aula é mais elevada no 7º ano de escolaridade (159 casos),
diminuindo gradualmente nos outros anos de escolaridade, sendo pouco significativa no
ensino secundário29. Com base nesta informação, escolhemos essencialmente alunos do 8º
e 9º ano de escolaridade e porque, como já anteriormente referimos, os alunos do 7º ano
não se mostraram colaborantes (ver nota de rodapé 19), para recolhermos os dados da
nossa investigação.
A recolha dos dados, que suportaram a investigação empírica, dividiu-se em duas
partes distintas, quanto à selecção dos dados e dos informadores privilegiados.
A primeira fez-se a partir de dados constantes de fichas de registo de incidências
disciplinares (Cf. anexo 1), ocorridas durante o ano lectivo de 2007/2008, a partir das quais
se elaboraram quadros de dados que apresentaremos oportunamente. Com base nesses
registos, seleccionámos três alunos que foram entrevistados (Cf. anexo 2). Estes alunos
evidenciaram, na sala de aula, comportamentos indisciplinados não demasiado “graves”
que foram sancionados com exclusão da sala de aula, com a respectiva falta disciplinar, e
participação de ocorrência ao Director de Turma e Encarregado de Educação.
A segunda baseou-se nos dados das entrevistas de quatro alunos (Cf. anexo 3) que,
na sala de aula, tiveram comportamentos indisciplinados de “maior gravidade” que
originaram instauração de processo disciplinar e sanções aplicadas pelo Presidente do
Conselho Executivo, como prevê a Lei 30/2002, de 20 de Dezembro, que aprova o Estatuto
do Aluno dos Ensinos Básico e Secundário, com as alterações introduzidas pela Lei 3/2008
de 18 de Janeiro30. O quadro VIII mostra-nos a caracterização desses alunos.

29
Por não ser significativo o número de incidências disciplinares registadas no “Gabinete Disciplinar” a nível
do ensino secundário, o tratamento dos dados recolhidos nesse gabinete contemplará exclusivamente as
turmas do ensino básico.
30
Estes dois diplomas foram analisados no capítulo III

125
QUADRO VIII - Caracterização dos alunos entrevistados31

nº Hábitos Particip. Agregado


Aluno Cod. Ano Idade Acção disciplinar
repet. estudo ocorrência familiar
Faltas disciplinares e trabalho Não gosta 2 pessoas (mãe e
Ana Al 1 8º 13 0 3
individual no gabinete de conflitos de estudar aluna)
Faltas disciplinares e trabalho Não gosta 5 pessoas (pai,
Rui Al 2 8º 15 2 8
individual no gabinete de conflitos de estudar mãe e 2 irmãos)
Faltas disciplinares e trabalho Não gosta 3 pessoas (mãe e
Pedro Al 3 8º 15 2 13
individual no gabinete de conflitos de estudar um irmão)
5 pessoas (pai,
Faltas disciplinares e repreensão Estuda às
Diogo Al 4 9º 16 2 2 mãe, irmão e
registada vezes
prima)
Faltas disciplinares e duas Não tem pai nem
Não gosta
Rúben Al 5 8º 16 3 suspensões das actividades 15 mãe ( vive com
de estudar
lectivas uma tia)
Faltas disciplinares e suspensão Não gosta 4 pessoas (pai,
Filipe Al 6 8º 14 1 4
das actividades lectivas de estudar mãe e um irmão)
Faltas disciplinares e suspensão Não gosta 4 pessoas (pai,
Carlos Al 7 9º 15 2 6
das actividades lectivas de estudar mãe e um irmão)

Entrevistámos, também, as professoras autoras das participações de ocorrência dos


quatro alunos que foram alvo de procedimento disciplinar (Cf. anexo 4), os Directores de
Turma de onde eram provenientes os sete alunos entrevistados (Cf. anexo 5) e a Presidente
do Conselho Executivo (Cf. anexo 6) e analisaram-se os depoimentos dos envolvidos no
procedimento disciplinar e de algumas testemunhas das ocorrências e os textos da decisão
final do procedimento disciplinar. O quadro IX caracteriza o pessoal docente que
constituiu os nossos informadores privilegiados.

QUADRO IX - Caracterização dos docentes entrevistados

DISCIPLINA QUE FUNÇÂO/CARGO


PROFESSOR SEXO IDADE OBSERVAÇÕES
LECCIONA DESEMPENHADO
Apresentou participação de ocorrência de um
DT 1 Fem. 50 L. Portuguesa D. Turma
aluno da sua D. Turma- processo disciplinar
Docente Apresentou participação de ocorrência –
P2 Fem. 55 L. Portuguesa
processo disciplinar
Um aluno da sua turma com processo
DT3 Fem. 40 Inglês D. Turma
disciplinar
Três dos alunos entrevistados pertencem à sua
DT4 Fem. 47 Inglês D. Turma Direcção de Turma – um aluno com processo
disciplinar
Apresentou participação de ocorrência –
P5 Fem. 52 História Docente
processo disciplinar
Docente Apresentou participação de ocorrência –
P6 Fem. 46 Geografia
processo disciplinar
Um aluno da sua turma com processo
DT7 Fem. 52 C. Naturais D. Turma
disciplinar
Vários alunos da sua turma com participações
DT8 Fem. 47 L. Portuguesa D. Turma
de ocorrência
Apresentou participações de ocorrência de
P9 Fem. 50 Geografia Docente
vários alunos
Aplicou as medidas disciplinares aos quatro
P10 Fem. 47 -------- P. Cons. Executivo
alunos sujeitos a processo

31
Os nomes dos alunos utilizados no estudo são fictícios.

126
4- Tratamento da informação: a Análise de Conteúdo

O tratamento da informação recolhida foi feito recorrendo à técnica de análise de


conteúdo.
Enquanto técnica de análise de dados, a análise de conteúdo foi a que nos pareceu
mais apropriada para análise das entrevistas e de outros documentos, nomeadamente
depoimentos de alunos e professores, uma vez que das leituras efectuadas ressalta a ideia
de que, por trás do discurso aparente, simbólico, podem esconder-se sentidos que devem
desvendar-se. Quivy & Champenhoudt (2005: 195) parecem confirmar esta ideia ao
afirmar que “em investigação social, o método das entrevistas está sempre associado a um
método de análise de conteúdo”. Os mesmos autores (2005: 227) referem ainda que

“ O lugar ocupado pela análise de conteúdo na investigação social é cada vez maior, nomeadamente
porque oferece a possibilidade de tratar de forma metódica informações e testemunhos que
apresentam um certo grau de profundidade e de complexidade, como, por exemplo, os relatórios de
entrevistas pouco directivas”.

Também Pardal (1995: 72-73), pronunciando-se sobre esta técnica, embora também
haja quem a designe de método, diz que “viabiliza, de modo sistemático e quantitativo, a
descrição do conteúdo da comunicação”, complementando que a sua utilização “permite
detectar o conteúdo ideológico de uma mensagem televisiva, de um manual didáctico, de
um filme, etc.”.
Para Almeida & Pinto (1976: 96) a análise de conteúdo “procura agrupar
significações, e não vocábulos, e é, em princípio, aplicável a todos os materiais
significantes, a todas as «comunicações», não se cantonando aos textos escritos”.
Contudo, foi Laurence Bardin que dedicou toda uma obra à análise de conteúdo,
salientando a sua importância enquanto “conjunto de instrumentos metodológicos cada vez
mais subtis em constante aperfeiçoamento, que se aplicam a «discursos» extremamente
diversificados”. Bardin (1977: 38) define análise de conteúdo como

“um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos,
sistemáticos e objectivos de descrição do conteúdos das mensagens, indicadores (quantitativos ou

127
não) que permitam a inferência32 de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção
(variáveis inferidas) destas mensagens”.

A mesma autora (1977: 45) refere-se também à análise documental, dizendo que

“alguns procedimentos de tratamento da informação documental apresentam tais analogias com


uma parte das técnicas da análise de conteúdo, que parece conveniente aproximá-los para melhor
os diferenciar”. Acrescenta que se à análise de conteúdo “suprimirmos a sua função de inferência e
se limitarmos as suas possibilidades técnicas apenas à análise categorial ou temática, podemos,
efectivamente, identificá-la à análise documental”.

Depois de tecer estas considerações e citando Chaumier, define análise documental


como “uma operação ou um conjunto de operações visando representar o conteúdo de um
documento sob uma forma diferente da original, a fim de facilitar num estado ulterior, a
sua consulta e referenciação” (1977: 45).
Bardin (1977: 46) conclui, no entanto, que apesar da semelhança de certos
procedimentos, existem diferenças fundamentais entre a análise de conteúdo e a análise
documental, a saber:

 “A documentação trabalha com documentos; a análise de conteúdo com mensagens


(comunicação).
 A análise documental faz-se, principalmente por classificação-indexação; a análise categorial
temática é, entre outras, uma das técnicas da análise de conteúdo.
 O objectivo da análise documental é a representação condensada da informação, para consulta
e armazenagem; o da análise de conteúdo, é a manipulação de mensagens (conteúdo e expressão
desse conteúdo), para evidenciar os indicadores que permitam inferir sobre uma outra realidade
que não a da mensagem”.

Do pensamento de Bardin, anteriormente exposto, salienta-se que um dos aspectos


mais importantes da análise de conteúdo é a utilização de categorias embora, segundo a
mesma autora, não seja uma etapa obrigatória. A categorização tem como objectivo inicial
simplificar os dados brutos que são recolhidos na investigação, organizando-os. Esta autora
(1977: 117-118) define categorização como “uma operação de classificação de elementos
constitutivos de um conjunto, por diferenciação e, seguidamente, por reagrupamento
segundo o género (analogia), com os critérios previamente definidos”. Dando seguimento à

32
“Inferência: operação, pela qual se admite uma proposição em virtude da sua ligação com outras
proposições já aceites como verdadeiras” (1976: 39, nota 25).

128
ideia, entende por categorias “rubricas ou classes, as quais reúnem um grupo de elementos
(unidades de registo, no caso da análise de conteúdo) sob um título genérico, agrupamento
esse efectuado em razão dos caracteres comuns destes elementos”. Complementando,
Bardin diz que “Classificar elementos em categorias, impõe a investigação do que cada um
deles tem em comum com outros. O que vai permitir o seu agrupamento, é a parte comum
existente entre eles”.
Bogdan e Biklen enfatizam também a importância da categorização como forma de
organização dos dados recolhidos, mostrando a importância e a necessidade de definir um
sistema de codificação desses dados com base em palavras ou frases que eles designam de
“categorias de codificação”. Para estes autores (1994: 221) “As categorias constituem um
meio de classificar os dados descritivos que recolheu, de forma a que o material contido
num determinado tópico possa ser fisicamente apartado dos outros dados”.
A fim de definirmos as categorias que serviram de base ao estudo empírico,
partimos da categorização definida por Estrela e analisámos os registos de incidente
disciplinar do Gabinete Disciplinar (anteriormente referido), respeitantes ao ano lectivo de
2007/2008, com base nos quais definimos as categorias que se apresentam no quadro X:

QUADRO X – Categorias comportamentais

CATEGORIAS COMPORTAMENTOS
- "Sussurrar" tudo o que o professor diz.
Relação professor-aluno - Interromper o professor com questões fora do assunto da aula.
- Insultar o professor.
- Não estar atento e pedir ao professor, continuamente, para repetir.
- Provocar os colegas.
Relação aluno-aluno
- Insultar os colegas.
- Conversar com o colega do lado.
- Rir exageradamente.
Comunicação oral
- Lançar papéis (ou outros objectos) pelo ar.
clandestina e distracções
- Fazer rir os colegas.
- Ler banda desenhada ou outras revistas.
- Falar desordenadamente.
- Balançar-se continuamente na cadeira.
Movimentação
- Circular pela sala de aula.
Material escolar - Riscar nas carteiras.
- Faltar às aulas sem razão.
Trabalho - Não participar nas aulas; Estudar para outra disciplina.
- Chegar atrasado às aulas.
- Não trazer o material escolar necessário.
- Demonstrar satisfação ao ser expulso da sala de aula.
- Atirar "lixo" (papéis...) para o chão.
Convenções sociais - Entrar na sala de aula sem pedir autorização.
- Levantar-se do lugar sem autorização.
- Permanecer na aula com o boné na cabeça.
- Manter uma postura inadequada na sala de aula (pés em cima das cadeiras, sentar de lado, etc).

129
5. Caracterização da escola secundária com 3º ciclo das Tílias

As razões da escolha desta escola para desenvolvermos o nosso trabalho prendem-


se com o facto de conhecermos bastante bem as realidades vivenciadas nestes
estabelecimentos de ensino, visto a nossa actividade profissional como docente se
desenvolver também numa escola secundária com 3º ciclo do ensino básico. Os
conhecimentos que temos de muitos professores que aí leccionam e dos próprios elementos
do Conselho Executivo facilitaram os nossos contactos e o relacionamento com a
comunidade educativa.
Quanto à tipologia, a escola é uma S42, dimensionada para 42 turmas e cerca de
1250 alunos, sendo, no entanto, este número ultrapassado em alguns anos lectivos.
As salas de aula normais, com uma área média entre os 35 e os 45 metros
quadrados, são bem arejadas e iluminadas e estão equipadas com mobiliário que oferece
razoáveis condições de utilização. Existem salas específicas como laboratórios de física,
química, biologia, ciências, electrónica, oficina de electrotecnia, salas de educação
tecnológica, salas de desenho e educação visual, salas de informática, anfiteatro de
audiovisuais. Para além dos espaços lectivos, possui salas de convívio de professores, de
funcionários, biblioteca, sala de estudo, refeitório, bufetes, clubes e associação de
estudantes. Possui um polivalente, que serve para convívio dos alunos, reuniões,
exposições, espectáculos, etc. Em 1995, foi construído um pavilhão gimnodesportivo.
Nas salas de aulas existe material didáctico, em quantidade razoável, à disposição
dos professores (gravadores áudio, retroprojectores, projector de diapositivos, câmaras de
vídeo, televisores, computadores portáteis, etc.). Existem também alguns computadores à
disposição de professores e alunos, em salas específicas.
Os órgãos de direcção e gestão da Escola são a Assembleia de Escola, o Conselho
Executivo, o Conselho Pedagógico e o Conselho Administrativo, integrando elementos
representantes dos docentes, discentes, encarregados de educação e outros representantes
da comunidade educativa.

5.1- Um pouco de História

130
Identificámos ao longo do trabalho esta escola como Escola Secundária com 3º
ciclo das Tílias33. É uma Escola Secundária onde se lecciona também o 3° ciclo. Foi criada
pela Portaria nº 406/80 de 15 de Julho para entrar em funcionamento em 1 de Outubro de
1982. Todavia, apenas começou a funcionar no ano lectivo de 1984/85, com 14 turmas (12
do 7º ano e 2 do 8º ano), num total de 352 alunos. No 1º ano de funcionamento, a Escola
contava com 30 docentes e três funcionários. Nos anos seguintes, a Escola acompanhou a
massificação do então curso unificado, chegando a ter mais de 2.000 alunos, já na década
de 90. Devido ao alargamento do parque escolar do concelho, o número de alunos
diminuiu, totalizando 1500 alunos, em 1998/99.
A construção da escola decorreu em duas fases: na primeira, foram construídos os
primeiros blocos, destinando-se um aos Serviços de Administração Escolar, salas da
Comissão Instaladora, Sala de Professores e Biblioteca. Os restantes blocos destinavam-se
a salas de aula, laboratórios e oficinas. O Pavilhão Gimnodesportivo veio a ser construído
apenas em 1995. Em 1997/98, foi construído o Polivalente, espaço destinado às mais
diversas actividades lúdicas, recreativas e culturais.
Nos anos lectivos de 1997/98 e 1998/99, a Escola enriqueceu o seu património
arquitectónico ao ver aprovados os seus projectos de humanização e valorização estética
dos espaços escolares, que permitiram colocar nas fachadas dos blocos painéis de
azulejaria, todos eles com um simbolismo adequado ao bloco que os exibe. Também desde
1996/97 que os espaços verdes envolventes foram arranjados, graças à colaboração da
Câmara Municipal da área de implantação da escola.

5.2. O meio envolvente

A escola situa-se na zona centro do país, na área de jurisdição da Direcção Regional


de Educação do Centro (DREC) que, segundo a Carta Educativa Municipal (pag. 10),
33
No sentido de preservar a confidencialidade e o anonimato da instituição em causa e das pessoas
envolvidas na pesquisa, foram escolhidos nomes fictícios. Este aspecto é uma das dimensões ou princípios
éticos que alguns autores salientam que se deve ter em conta nas investigações das Ciências Sociais em geral.
Como exemplo desses autores temos Bogdan & Biklen (1994: 77), que defendem a este respeito o seguinte:
“As identidades dos sujeitos devem ser protegidas, para que a informação que o investigador recolhe não
possa causar-lhes qualquer tipo de transtorno ou prejuízo. O anonimato deve contemplar não só o material
escrito, mas também os relatos verbais da informação recolhida durante as observações. O investigador não
deve revelar a terceiros informações sobre os seus sujeitos e deve ter particular cuidado para que a
informação que partilha no local da investigação não venha a ser utilizada de forma política ou pessoal”.

131
“beneficia de uma posição geo-estratégica impar e de grande centralidade em relação ao
país”.
O desenvolvimento de grandes eixos de comunicação ferroviários e rodoviários
norte-sul e este-oeste, contribuiu para beneficiar esta região de excelentes e diversificadas
formas de acessibilidade, o que constituiu um importante contributo na transformação dos
modos e qualidade de vida, reflectido na relação e acesso a serviços e equipamentos
colectivos.
Os sectores económicos foram marcados por algumas mudanças, sendo de realçar a
decadência de sectores tradicionais, que alternaram com o desenvolvimento de novas
frentes de produção. Diz-nos a Carta Educativa (pag. 13): “neste contexto, pela eficácia
empreendedora do tecido empresarial local tem-se verificado (…) uma terciarização
crescente, que acompanha o elevado grau de exigências de uma sociedade e economia
contemporâneas, assumindo um papel fundamental de suporte logístico e de estruturação
dos sistemas económicos na sua vasta área de influência”. O quadro XI mostra-nos essa
realidade. No Concelho onde se situa a escola, no ano de 2001, o sector terciário sobrepõe-
se ao secundário e primário, salientando-se o reduzido peso deste - 2%.

QUADRO XI - Sectores de Actividade 1991-2001

Anos Primário Secundário Terciário


1991 5% 37% 58%
2001 2% 35% 63%

Fonte: INE, censos 2001

O dinamismo económico “reflecte-se na taxa de actividade registada no concelho,


de acordo com os censos de 2001, verificando-se que, do total da população residente (…)
cerca de 52% é economicamente activa. Ainda, pela mesma fonte, os dados referem que,
da população economicamente activa, cerca de 95% está empregada, o que corresponde a
uma taxa de desemprego de cerca de 5%, enquanto em Portugal se verificou cerca de 7%.”
(Carta Educativa Municipal, pag. 14).
Em termos populacionais, possivelmente devido a alguns dos factores
anteriormente referenciados, o concelho que alberga a escola por nós estudada, apresenta
um crescimento populacional assinalável, muito superior ao da média nacional, como
podemos comprovar no quadro XIII.

132
Este crescimento populacional tem influência directa no número de alunos que
frequentam as escolas do concelho, algumas das quais se debatem com problemas
logísticos devido à falta de salas de aula. O elevado número de alunos por turma resulta
deste fenómeno, com todas as consequências que daí podem advir no respeitante a
relacionamentos e comportamentos da população escolar.

QUADRO XII - População Residente, censos 1991 / 2001

1991 2001 Var %


Concelho 66 444 73 335 10
Portugal 9 867 147 10 356117 5

Fonte: INE, censos 2001

Em termos culturais a Carta Educativa diz que “a presença no concelho de quatro


estabelecimentos de ensino superior de iniciativa pública e privada poderá contribuir e
justificar o nível de formação elevada da população no concelho, na qual o ensino superior
representa 16%”. Se atendermos que, no mesmo período, a média em Portugal se situava
nos 10 %, o concelho onde esta escola se situa encontra-se culturalmente numa situação
privilegiada.
Focando a nossa lente de análise a um nível micro, a freguesia, podemos dizer que
a Escola Secundária com 3º ciclo das Tílias é uma escola pública, situada numa freguesia
do perímetro urbano da cidade sede de distrito, com uma população híbrida onde se
misturam o urbano (centro da freguesia) e o rural (em quatro lugares periféricos).
Sendo uma freguesia populosa, conta com um parque escolar significativo
constituído pela Escola Secundária com 3º Ciclo, um agrupamento vertical que integra uma
Escola EB 2/3, Escolas do 1º Ciclo e Jardins de Infância. Existem ainda estabelecimentos
de ensino particulares.
A freguesia conta com várias associações de natureza cultural, recreativa, social e
desportiva, um pólo da Biblioteca Municipal e uma unidade de saúde.
É ainda nesta freguesia que se situa parte da zona industrial do Concelho.
Apesar de ser uma escola periférica, relativamente ao centro da cidade, tem fácil
acessibilidade pois é servida por uma boa rede de transportes rodoviários, havendo mesmo
alunos que utilizam o comboio nas suas deslocações, pelo que não existem problemas de
transporte. Há, no entanto, um grande número de alunos que se desloca a pé, visto viver
muito perto da escola, de bicicleta e motorizada ou ainda em automóveis particulares.

133
5.3. O ambiente interno

A dinamização entusiasta de projectos potenciadores de experiências de


Cidadania foi a resposta da escola às exigências de uma sociedade fragmentada,
que tende a empurrar muitos dos nossos adolescentes para uma triste solidão
interior, tantas vezes escondida sob a capa de ruidosa irreverência.

Projecto Educativo de Escola (2006-2009)

O Projecto Educativo de Escola constituiu-se como documento orientador dos


rumos significativos dos estabelecimentos de ensino. Nele se encontram delineadas as
linhas estratégicas que orientaram a escola tanto a nível de actividades internas como no
seu relacionamento com a comunidade educativa.
Foi reflectindo estas nuances que, durante estes seis últimos anos, a estratégia da
Escola se norteou por quatro objectivos definidos como prioritários, os quais se foram
constituindo em outros tantos pilares da sua prática. Hoje, são reconhecidos como traços
identificadores da sua especificidade e acredita-se que sejam importantes contributos para
a formação integral dos seus alunos. São eles:
1. Flexibilização crescente na oferta formativa.
2. Reforço constante na qualidade das aprendizagens.
3. Aperfeiçoamento anual nos critérios, métodos e técnicas de avaliação, com vista à total
transparência.
4. Dinamização entusiasta de projectos potenciadores de experiências de Cidadania Activa.

No respeito pela Constituição da República Portuguesa e pela Lei de Bases do


sistema Educativo, no Projecto Educativo são afirmados os seguintes princípios: a
democraticidade, a cidadania, o humanismo, a liberdade, a autonomia, a responsabilidade e
a inovação.
As principais finalidades a que a escola se propõe são:
 Promover uma cultura de qualidade e de rigor que assegure a todos os alunos as
condições adequadas à obtenção do sucesso educativo;

134
 Formar cidadãos capazes de julgar com espírito crítico e criativo, livres,
responsáveis, autónomos e solidários;
 Interligar o saber e o saber fazer, a teoria e a prática, a cultura escolar e a cultura do
quotidiano;
 Promover a educação para a cidadania nas suas diversas dimensões;
 Promover a multiculturalidade;
 Desenvolver o conhecimento e o apreço pelos valores característicos da Identidade,
Língua, História e Cultura portuguesas;
 Promover uma escola inclusiva;
 Contrariar a exclusão social gerada pelos insucessos repetidos;
 Diversificar a oferta formativa e educativa da escola;
 Promover cursos de educação e formação que contribuam para a inserção na vida
activa, por um lado, e para a certificação da escolaridade básica, por outro;
 Promover a melhoria da imagem da escola;
 Promover uma cultura de trabalho e persistência para a consecução doa objectivos
propostos;
 Promover a educação para a saúde;
 Envolver os Encarregados de Educação, a Associação de Pais e a comunidade
envolvente;
 Promover a formação contínua do pessoal docente e não docente;
 Envolver a Associação de Estudantes no quotidiano da escola;
 Cultivar o espírito de cooperação na partilha de experiências, realizações e
projectos;
 Valorizar a afectividade, o respeito e a dignidade a fim de promover as relações
interpessoais e a auto-imagem;
 Criar condições pedagógicas e de avaliação que permitam aos alunos a consecução
dos seus objectivos educacionais.
No respeitante à formação académica, a escola oferece, no ensino básico, as áreas e
disciplinas que compõem o currículo nacional, oferecendo como áreas de formação
opcional o Teatro, Artes e Educação Tecnológica. Nas línguas estrangeiras os alunos
podem optar entre o Inglês, Francês e Espanhol.

135
No ensino secundário diurno, uma panóplia variada de cursos abre um amplo
leque de opções profissionais aos alunos, tanto para a vida activa, como para o
prosseguimento de estudos. O quadro XIII mostra-nos essa realidade.

QUADRO XIII- Áreas e cursos de oferta da escola no ensino secundário

ÁREAS CURSOS
Ciências e Tecnologias
Científico-Humanísticos Ciências Sociais e Humanas
Ciências Socioeconómicas
Curso Tecnológico de Desporto
Cursos Tecnológicos
Curso Tecnológico de Informática
Curso Profissional de Técnico de Informática de Gestão
Cursos Profissionais
Curso Profissional Técnico de Instalações Eléctricas
Curso Profissional Técnico de Instalações
CEF – Tipo IV - Curso Práticas Administrativas –Assistente Administrativo
Eléctricas

Os alunos têm ao seu dispor uma enorme variedade de actividades desenvolvidas


em projectos e clubes, que podem frequentar nos tempos não lectivos ou nos tempos livres
em que permanecem na escola. Refiram-se: Desporto Escolar; Casa Ecológica; Coralima;
Clube de Teatro; Clube de Holografia; Clube de Artes; Clube Europeu; Clube de Cinema;
Clube de Espanhol; Clube de Línguas Germânicas; Clube de Xadrez; Clubeuropeu-
Cidadania; Clube Corte, Costura e Confecção; Clube de Electrotecnia, Electrónica e
Robótica; Clube de Educação Ambiental; Projecto CRIE; Projecto da Biblioteca Escolar;
RIA.EDU; Prof 2000; Sócrates / Comenius; Projecto de Educação Sexual.
Para melhor alcançar os objectivos a que se propõe, a escola realizou uma série de
protocolos e parcerias. Entre os seus parceiros contam-se: Universidade de Aveiro;
Universidade de Coimbra; Universidade do Porto; Unidade industrial da Vulcano;
C:A:C:I:A:; Centro de Recursos da CERCIAV; PRODEP; Centro de Formação José
Pereira Tavares
No respeitante aos recursos humanos, a maioria do corpo docente pertence ao quadro
da escola. Como podemos ver no quadro XIV.

QUADRO XIV - Pessoal docente da escola (Ano Lectivo de 2007/2008)

Pessoal Docente
PQND PQZP Contratados Destacados Destacados Fora da escola
106 10 18 13 2
TOTAL = 149

136
Estes docentes distribuem-se pelos seguintes departamentos: Departamento de
Ciências Humanas e Sociais; Departamento de Ciências Matemáticas; Departamento de
Tecnologias; Departamento de Expressões; Departamento de Línguas Românicas;
Departamento de Línguas Germânicas; Departamento de Ciências Físicas e Naturais;
Departamento de Ciências Sócio-Económicas.
O pessoal administrativo é em número suficiente, o mesmo não acontecendo com o
pessoal auxiliar da acção educativa, que, atendendo às características físicas da escola que
tem muitos espaços dispersos, internos e externos, para supervisionar, é insuficiente.
Possui uma psicóloga e uma responsável pelo ensino especial. Tem um técnico de
manutenção e um jardineiro, como observamos no quadro XV.

QUADRO XV - Pessoal não docente da escola (Ano Lectivo de 2007/2008)

Pessoal não Docente


Técnicos Especializados Serviços Pessoal indiferenciado
Psicóloga Ensino especial Tecn. Laboratório administrativos AAE Cozinha Tecn. Manut. Jardineiro
1 1 1 12 27 4 1 1
TOTAL = 48

No ano lectivo de 2007/2008 a escola, no ensino diurno, sobre o qual incidiu o


nosso estudo, era constituída por 47 turmas, e frequentada por 1009 alunos, distribuídos
como nos mostra o quadro XVI.

QUADRO XVI - População escolar (Ano Lectivo de 2007/2008)

Nº Alunos Repetentes
Ano de Nº Média de
% % Totais
Escolaridade Turmas M F Idades F M
ciclo ano
7º 6 75 71 12,3 7 15 15,1 146
8º 6 58 63 13,25 1 7 11,9 6,6 121
9º 4 57 37 14,5 3 10 13,8 94
10º 8 121 83 15,3 3 13 7,8 204
11º 7 94 92 16,6 6 8 9,01 7,5 186
12º 7 80 61 17,6 7 11 12,8 141
34
8º CEF 1 10 6 15,1 2 4 10,3 37,5 16

34
Curso de Educação e Formação

137
9º CEF 3 20 12 16,5 0 0 0 32
10º CEF 2 39 3 17,2 0 0 0 42
11º CEF 3 18 9 19,1 5 1 22,2 27

TOTAIS: 47 572 437 34 69 10,2 1009

Uma análise rápida aos dados do quadro, mostra-nos que o número de repetências é
bastante elevado, sobretudo no sexo masculino, sobressaindo ainda a percentagem
referente ao 3º ciclo e aos cursos CEF (Cursos de Educação e Formação). Neste caso, a
percentagem é bastante elevada porque os alunos que frequentam estes cursos geralmente
já repetiram várias vezes no ensino “normal”, sendo depois encaminhados para cursos mais
profissionalizantes que lhe dão correspondência ao 9º ano de escolaridade, tratando-se de
cursos nível II ou ao 12º ano de escolaridade, quando se trate de cursos nível V.
Os alunos que integram o 3º ciclo do ensino básico, de onde extraímos os dados da
nossa investigação, distribuem-se pelas turmas que se apresentam no quadro XVII.
Procurámos saber junto do órgão de gestão quais os mecanismos de formação das turmas.
Ficámos a saber que relativamente às turmas do 7º ano de escolaridade, cujos alunos
provêm de outras escolas, tentam manter-se juntos os alunos que já frequentavam a mesma
turma da escola de origem, apenas se separando os que vão frequentar áreas opcionais ou
línguas estrangeiras diferentes. Nos anos seguintes, dentro do mesmo ciclo de estudos,
mantêm-se as turmas, que apenas sofrem alterações resultantes da introdução de alunos
repetentes e de alunos que eventualmente venham transferidos de outras escolas. No
tocante aos alunos repetentes é política da escola, na medida do possível, distribuí-los para
não concentrar muitos alunos repetentes na mesma turma.
QUADRO XVII – Caracterização dos alunos do 3º ciclo do ensino básico

ANO / TURMA Nº DE ALUNOS MÉDIA DE IDADES Nº DE REPETENTES %


A 22 11,9 1
B 21 12,3 5
C 28 12,4 5 25
7º 146
D 29 12,1 4
E 27 12,4 4
F 19 12,7 6
PARCIAL 146 12,3 25 = 17,1
A 15 13,5 2
B 23 12,9 0
8
C 24 13,1 1 120

D 23 13,3 1
E 20 12,8 0
F 15 13,9 4
PARCIAL 120 13,25 8 = 6,7

138
A 22 14,5 2
B 25 14,7 7
9º 12
C 26 14,2 3 92
D 19 14,7 0
PARCIAL 92 14,53 12 = 13,04
TOTAL GERAL = 358 45 12,6
Média de reprovações do 3º Ciclo = 15

No quadro, observamos que a média de reprovações no 3º ciclo é de 15 alunos.


Podemos verificar, ainda, que num total de 45 alunos retidos, correspondente a uma
percentagem de reprovações no 3º ciclo de 12,6%, a maior percentagem de retenções
incidiu sobre os alunos do 7º ano de escolaridade, 25 alunos, o que dá uma percentagem de
17,1% e a menor sobre os alunos do 8º ano de escolaridade, 8 alunos, o que corresponde a
uma percentagem de 6,7%. No 9º ano, em 92 alunos reprovaram 12, o que corresponde a
uma percentagem de 13,4%. Salienta-se o facto de haver duas turmas no 8º ano e uma no
9º sem alunos repetentes.
No respeitante ao número de alunos por turma, à excepção das turmas A e F do 8º
ano (15 alunos) e das turmas F do 7º ano e D do 9º ano (19 alunos cada) as restantes turmas
têm 20 ou mais alunos, salientando-se as turmas C, D e E do 7º ano com um número de
alunos mais elevado.
Na média de idades dos alunos, por ano, salientam-se as turmas F do 7º e 8º ano por
apresentarem um desvio mais significativo relativamente às médias gerais dos respectivos
anos.

CAPÍTULO V – ANÁLISE DOS DADOS

1- Um primeiro olhar sobre a indisciplina na escola das Tílias

Neste ponto, iniciamos a análise dos dados recolhidos ao longo do ano lectivo de
2007/2008, resultantes dos registos efectuados pelos professores no “Gabinete Disciplinar”
como se explicou anteriormente (cf. ponto 3.2.1 do capítulo metodologia). Esta análise
permite-nos, também, concluir a caracterização da escola por nós estudada, uma vez que
ficamos a conhecer melhor o ambiente disciplinar que se viveu ao longo do ano lectivo, no
espaço da sala de aula. A fim de facilitar o tratamento e a análise dos dados, nos quadros

139
estatísticos apresentam-se as categorias e os comportamentos que nessas categorias se
enquadram, seguindo o exemplo descrito no quadro X (cf. ponto 4 do capítulo
metodologia).

1.1- Manifestações de indisciplina / sexo

Neste ponto, abordamos a questão das manifestações de indisciplina na escola


secundária com 3º ciclo das Tílias em função do sexo dos alunos, uma vez que alguns
estudos têm demonstrado haver diferenças significativas entre os comportamentos
disruptivos segundo o sexo. Freire, citada por Lourenço (2004: 83), num estudo que
envolveu 64 alunos evidencia esta conclusão. Diz-nos a investigadora “ o comportamento
de indisciplina persistente e sistemático é um fenómeno restrito a um número reduzido de
alunos, progressivo e lento, mais lento ainda no grupo das alunas do que no grupo dos
alunos”. Lourenço (2004: 83), parafraseando Loranger, justifica esta conclusão ao afirmar
que

“ a generalidade das pesquisas actuais tende a acentuar que a cultura tradicional preponderante tem
beneficiado a competitividade e a auto-afirmação nos indivíduos do sexo masculino, sendo de supor
níveis superiores de disrupção neste grupo. Os indivíduos do sexo masculino, são entendidos como
possuindo níveis inferiores de adaptação disciplinar”.

Analisando o quadro XVIII, verificamos que dos 338 registos de ocorrência que
deram entrada no “Gabinete Disciplinar” durante o ano lectivo de 2007/2008, apenas 5,3%
são atribuídos a alunas, contra os 94,7% que correspondem a registos de comportamentos
indisciplinados praticados por alunos.
Uma análise mais pormenorizada das várias categorias, por sexo, mostra-nos que os
comportamentos que integram a categoria “comunicação oral clandestina e distracções”
são os que mais ocorrem na sala de aula e aqueles que mais levam os professores a
sancionarem os alunos. Verifica-se ainda que esta categoria em termos de sexo é a que
apresenta maior incidência na prática de comportamentos desajustados na sala de aula com
139 alunos (43,4%) do sexo masculino e 11 (61,1%) do sexo feminino. Nesta categoria,
conversar com os colegas é o comportamento mais praticado tanto por rapazes como por
raparigas, com 56 e 6 casos respectivamente. Segue-se, por parte dos rapazes o “rir e fazer
rir os colegas de forma exagerada” e por parte das raparigas o “falar alto e

140
desordenadamente ou fazer barulho”. Os outros comportamentos que integram esta
categoria também apresentam manifestações significativas, sobretudo por parte dos
rapazes.
Destaca-se, em segundo lugar pelo número de casos, a categoria “relação professor-
aluno”. Nesta categoria verifica-se que são também elementos dos dois sexos que praticam
os comportamentos que a compõem. É de realçar que o número de raparigas que
manifestam comportamentos de oposição ao professor, como desobediência, responder mal
e interromper a despropósito, ainda é significativo, se atendermos à população feminina
que constitui o nosso estudo, que é de 18 elementos. Na relação “professor-aluno”,
assumem especial relevância “desobedecer a ordens do professor”, “falar ou responder ao
professor de forma incorrecta” e “desafiar a autoridade do professor”, por serem os
comportamentos que mais ocorreram na sala de aula.
Os comportamentos que fazem parte da categoria “convenções sociais” ocupam a
terceira posição percentual em termos de frequência para os alunos do sexo masculino e
em quarto lugar para os elementos do sexo feminino. Dentro desta categoria, entre os
alunos, salientam-se dois tipos de comportamentos “manter uma postura inadequada na
sala de aula (pés em cima das cadeiras, mal sentado, comer…)” e “proferir palavrões /
utilizar linguagem imprópria”, com um número de manifestações considerável.
Para terminarmos a análise deste quadro deve salientar-se na categoria “relação
aluno-aluno” o comportamento “agredir ou tentar agredir um colega” que apresenta uma
frequência considerável, mesmo entre os elementos do sexo feminino, o que indicia que na
sala de aula começam a verificar-se situações que não se enquadram nos comportamentos
típicos de indisciplina, mas que se aproximam mais da violência e do “bullying”.

QUADRO XVIII: Manifestações de indisciplina em função do sexo35

TOTAL ALUNOS
CATEGORIAS COMPORTAMENTOS PARCIAL e % M F
- Interromper o professor com questões fora do assunto da aula. 2 1
- Falar ou responder ao professor de forma incorrecta 21 1
Relação professor- - Desafiar a autoridade do professor 12
aluno - Desobedecer a ordens do professor 32 2
- Insultar ou gozar o professor 7
PARCIAL N= 74 N= 4
% 23,1 22,2
- Provocar os colegas. 6
Relação aluno-aluno - Insultar os colegas. PARCIAL 8
- Agredir ou tentar agredir um colega % 13 2

35
O número de alunos neste quadro contém também os alunos do ensino secundário que passaram pelo
“Gabinete Disciplinar”

141
N= 27 N= 2
8,4 11,1
- Conversar com os colegas. 56 6
Comunicação oral - Rir e fazer rir os colegas de forma exagerada. 34 2
clandestina e - Brincar, atirando papéis (ou outros objectos) pelo ar ou chão. 26
distracções - Falar alto e desordenadamente ou fazer barulho 23 3
PARCIAL N= 139 N= 11
% 43,4 61,1
- Balançar-se na cadeira. 1
- Circular pela sala de aula. 6
Movimentação - Levantar-se do lugar sem autorização. 8
PARCIAL N= 15 0
% 4,7 0
- Danificar o material da escola (mesas, cadeiras, portas, etc.) 3
Material escolar PARCIAL 3 0
% N= 1 0
- Recusar realizar as actividades ou não participar nas aulas. 12
- Estudar ou realizar os trabalhos para outras disciplinas. 2
- Chegar atrasada(o) às aulas. 3
Trabalho
- Não trazer o material escolar necessário. 2
PARCIAL N= 19 0
% 5,9 0
- Entrar na sala de aula sem pedir autorização. 1
- Permanecer na aula com o boné na cabeça. 1
- Utilizar telemóvel, MP3, ou outro material electrónico. 3 1
Convenções sociais - Manter uma postura inadequada na sala de aula (pés em cima
21
das cadeiras, mal sentado, comer etc.).
- Proferir palavrões / utilizar linguagem imprópria 17
PARCIAL N= 43 N= 1
% 13,5 5,6
TOTAL GERAL = N= 320 N= 18
% 94,7 5,3

Em jeito de síntese, podemos dizer que os comportamentos na sala de aula,


classificados como “indisciplinados”, são mais praticados por elementos dos sexo
masculino do que por elementos dos sexo feminino; as aulas são, com alguma frequência,
boicotadas através das conversas paralelas, do riso, da brincadeira e do barulho; há
comportamentos que visam atingir o professor e que degradam a relação entre este e os
alunos através da desobediência, da comunicação incorrecta, do desafio à sua autoridade e
do insulto; que um número razoável de alunos boicota as aulas com posturas, em termos
físicos e de utilização do material e recorrendo ao palavrão e ainda que se verificam
confrontos físicos que algumas vezes resultam em agressões consumadas dentro da sala de
aula.

142
1. 2- Manifestações de indisciplina / ano de escolaridade

Neste ponto, pretendemos averiguar se existe relação entre o ano de escolaridade


dos alunos e os comportamentos indisciplinados na sala de aula, em que ano de
escolaridade se verifica maior número de desvios às normas estabelecidas.
Estudos efectuados por alguns autores referem que, normalmente, os alunos mais
novos têm tendência a ter comportamentos mais indisciplinados que os alunos mais velhos.
Lourenço (2004: 86) diz-nos a este respeito que “ os alunos mais novos, devido, muitas
vezes, à falta de objectivos e de consciência das consequências de um comportamento
inadequado na sala de aula e fora dela, são os que levantam maiores problemas
disciplinares”. Este mesmo autor (2004: 87) faz referência a trabalhos de Estrela (1986) e
Loranger (1987) que apontam para estas conclusões.
Outros estudos dão-nos conta, ainda, que os comportamentos praticados por alunos
mais jovens são de natureza diferente dos comportamentos praticados por alunos mais
velhos. Amado, num estudo realizado em 1989 a partir da análise de incidentes registados
em “participações” disciplinares confirma esta posição. Diz este autor (2001: 112-113)

“ Pareceu-me significativo que a grande maioria dos alunos implicados nas “participações”, com
idades compreendidas entre os 14 e os 19 anos, fosse repetente de um ou mais anos. A análise da
natureza dos comportamentos desviantes destes alunos mais velhos mostrou que eles traduziam
problemas de relação com a autoridade, em especial com o professor”. Continua dizendo que
relativamente aos alunos mais novos “a análise mostrou que a natureza dos comportamentos dos
alunos mais novos (12 e 13 anos) é maioritariamente, constituída por infracções às regras do
“processo-aula”, isto é, infracções que, no dizer do professor, “impedem” ou “perturbam o bom
funcionamento da aula”, ou põem em causa a organização e gestão da classe e o “rendimento da
Turma”.

Fazendo uma análise do quadro XIX, podemos constatar, em primeiro lugar, que
são os alunos do 7º ano de escolaridade os que evidenciam mais comportamentos
indisciplinados, 50,5% dos 315 registos estudados. Esses comportamentos diminuem à
medida que os alunos avançam na sua escolaridade, 34,6% no 8º ano e 14,9% no 9º ano.
A maior percentagem de comportamentos indisciplinados, nos três anos do ciclo, é
apresentada na categoria “comunicação oral clandestina e distracções”, com 45,4%. Não
existe grande disparidade entre as percentagens apresentadas, embora haja um pequeno
ascendente dos alunos do 9º ano. Nesta categoria verifica-se que os comportamentos que

143
visam prejudicar o bom funcionamento da aula como conversar, rir e brincar são os que
mais se evidenciam, no conjunto dos comportamentos desviantes verificados em sala de
aula, em todos os anos do ensino básico.
Verifica-se também que relativamente à categoria “relação professor aluno” a
percentagem de comportamentos que contribui para a degradação dessa relação é mais
elevada nos alunos que frequentam o 9º ano de escolaridade (27,7%), contra os 22,6% e os
18,3% dos 7º e 8º ano, respectivamente.
Na categoria “relação aluno aluno” de notar que não houve qualquer registo
referente a alunos do 9º ano de escolaridade. No 7º e 8º ano verificaram-se incidentes que
afectaram e perturbaram a relação entre alunos na aula. De notar que, quer num ano, quer
no outro, as agressões ou tentativas de agressão foram os comportamentos que tiveram um
número maior de manifestações.
Finalmente, refira-se a categoria “convenções sociais” onde devem destacar-se
como aspectos mais significativos o facto de que, nos três anos, os alunos manifestam
comportamentos inadequados na sala de aula e utilizam linguagem imprópria, recorrendo,
inclusivamente, ao palavrão.

144
QUADRO XIX: Manifestações de indisciplina em função do ano de escolaridade

TOTAL Anos de Totais e


CATEGORIAS COMPORTAMENTOS PARCIAL escolaridade percent.
e% 7º 8º 9º N= %
- Interromper o professor com questões fora do assunto
3
da aula.
Relação - Falar ou responder ao professor de forma incorrecta 9 6 5
professor- - Desafiar a autoridade do professor 4 2 4
aluno - Desobedecer a ordens do professor 18 12 3
- Insultar ou gozar o professor 2 1
PARCIAL 36 20 13 69 21,9
% 52,2 30 18,8
- Provocar os colegas. 3 2
- Insultar os colegas. 4 2
Relação aluno-
- Agredir ou tentar agredir um colega 8 7
aluno
PARCIAL 15 11 0 26 8,3
% 57,7 42,3 0
- Conversar com os colegas. 26 21 10
Comunicação - Rir e fazer rir os colegas de forma exagerada. 15 10 10
oral - Brincar, atirando papéis (ou outros objectos) pelo ar ou
18 6 2
clandestina e chão.
distracções - Falar alto e desordenadamente ou fazer barulho 11 12 2
PARCIAL 70 49 24 143 45,4
% 49 34,3 16,8
- Balançar-se na cadeira. 1
- Circular pela sala de aula. 3 3
Movimentação - Levantar-se do lugar sem autorização. 3 2 3
PARCIAL 7 5 3 15 4,8
% 46,7 33,3 20
- Danificar o material da escola (mesas, cadeiras, portas,) 2 1
Material
PARCIAL 2 1 0 3 0,95
escolar
% 66,7 33,3 0
- Recusar realizar as actividades ou não participar nas
6 5 1
aulas.
- Estudar ou realizar os trabalhos para outras disciplinas. 2
- Chegar atrasada(o) às aulas. 1 1
Trabalho
- Não trazer o material escolar necessário. 2
PARCIAL 11 5 2 18 5,7
% 61,1 27,8 11,1
- Entrar na sala de aula sem pedir autorização.
- Permanecer na aula com o boné na cabeça. 1
- Utilizar telemóvel, MP3, ou outro material electrónico. 3 1
Convenções
- Manter uma postura inadequada na sala de aula (pés em
sociais 13 7 1
cima das cadeiras, mal sentado, comer etc.).
- Proferir palavrões / utilizar linguagem imprópria 5 8 2
PARCIAL 18 18 4 40 12,7
% 45 45 10
TOTAL GERAL = 159 109 47 315
% 50,5 34,6 14,9

1. 3- Manifestações de indisciplina / reincidência36

O estudo dos incidentes de indisciplina registados no “Gabinete Disciplinar” da


escola em estudo mostrou-nos uma realidade que, certamente, ocorre em muitas outras
escolas, que há alunos reincidentes nos seus comportamentos. A este respeito Lourenço

36
Na questão das reincidências contabilizámos apenas os casos que se verificaram 2 ou mais vezes uma vez
que os alunos com um registo não nos parecem significativos, por se tratar de casos pontuais.

145
(2004: 24) diz que “a principal origem dos problemas de comportamento em sala de
aula, quando considerados por si só, residem na sua frequência e não na sua gravidade”.
No quadro XX apresentamos um resumo das reincidências por ano de escolaridade.
Agrupámos os dados em classes para facilitar a sua análise. No quadro, verificamos que no
7º ano de escolaridade ocorrem mais reincidências, diminuindo as mesmas no 8º e no 9º
ano. Verifica-se ainda que no 7º ano 14 alunos passaram entre 3 e 4 vezes pelo Gabinete de
Conflitos e do 8º ano foram 8 os alunos que foram reincidentes entre 3 e 4 vezes. De
assinalar que um aluno do 9º ano passou pelo Gabinete de Conflitos entre 13 e 14 vezes e
um aluno do 8º ano passou pelo mesmo gabinete entre 17 e 18 vezes.

QUADRO XX: Manifestações de indisciplina / reincidências (7º, 8º, 9º)

ANOS DE ESCOLARIDADE37
Nº REINCIDÊNCIAS
7º 8º 9º
0-2 4 2 6
3-4 14 8
5-6 4 3 2
7-8 2 1
9 - 10 3 3
11 - 12 1
13- 14 1
15 - 16
17 - 18 1
TOTAL = 28 18 9
% 50,9 32,7 16,4

Uma análise mais detalhada pode ser feita nos quadros que se apresentam nos
anexos VIII e IX. Essa análise mostra que existem turmas onde os casos de indisciplina são
muito mais frequentes. Salientam-se as turmas B, E e F do 7º ano, a turma F do 8º ano, a
turma B do 9º ano e a turma A do 8º ano CEF. Nestas turmas, o número de reincidências
varia entre as 2 e as 17. Neste quadro disciplinar sobressaem as turmas F do 7º e 8º ano não
só pelo número de alunos reincidentes, mas também pelo número de registos de presenças
no “Gabinete Disciplinar”.
Nos quadros apresentados nos anexos verifica-se ainda que o mesmo aluno pratica
comportamentos desviantes que se dispersam pelas várias categorias definidas, visando
com esses comportamentos infringir as regras de funcionamento da aula, prejudicar a
relação com os professores e com os próprios pares.
37
No 8º e 9º ano encontram-se incluídos os alunos dos cursos CEF

146
Verifica-se que entre as vinte turmas que constituem o 3º ciclo do ensino básico
existem algumas que não apresentam qualquer registo em termos de ocorrências
disciplinares no Gabinete de Gestão de Conflitos e outras que apresentam um número de
casos muito reduzido, procurámos encontrar explicações para esta situação. Baseando-nos,
novamente em Amado, podemos ver na organização das turmas uma causa, embora não
única, para alguns destes comportamentos inadequados na sala de aula. Diz o autor (2001:
314) que

“A composição das turmas é igualmente, um tema muito valorizado pelos professores, sobretudo
devido à falta de “homogeneidade” (grandes diferenças de “bases”, grandes diferenças no
empenhamento e no comportamento) e ao efeito nocivo da manutenção de alguns alunos na mesma
turma em anos sucessivos”.

Elucida este ponto de vista com a afirmação de uma professora de uma turma do 8º ano
(turma E) que dizia: “ se no 7º E já havia alunos que perturbavam, a turma devia ter sido
toda desfeita para que não se encontrassem novamente todos juntos”.
No caso concreto da escola, objecto do nosso estudo, apurámos que é prática
comum tentar manter os alunos sempre na mesma turma ao longo dos três anos do ciclo,
como já se referiu no ponto 5.3, em que se caracterizou o ambiente interno. Podemos
também concluir, analisando o quadro XVII (pag. 140), que há algum desequilíbrio na
formação das turmas. A turma F do 7º ano que apresenta mais registos de comportamentos
indisciplinados é uma turma com reduzido número de alunos (19), mas comparando com
as outras turmas apresenta o maior número de alunos repetentes (6). A média de idades dos
alunos desta turma é ligeiramente superior à das outras turmas do mesmo ano. No 8º ano a
turma F é a que apresenta um panorama mais desfavorável em termos disciplinares.
Verifica-se que é, como no caso anterior, uma turma pequena (15) alunos mas tem também
o maior número de alunos repetentes de todas as turmas do 8º ano. A média de idades
destes alunos é significativamente superior à dos alunos das outras turmas do 8º ano. De
notar que neste ano de escolaridade existem duas turmas onde não há alunos repetentes. No
9º ano salienta-se a turma B. É uma turma com um número de alunos bastante elevado
(25), 7 dos quais são repetentes. Também neste ano de escolaridade existe uma turma sem
alunos repetentes, que é, inclusivamente, a turma que tem menor número de alunos.

147
1.4- Indisciplina versus culpa e arrependimento

Neste último ponto, respeitante ao estudo do levantamento dos registos de


ocorrência que passaram pelo “Gabinete Disciplinar”, abordamos a posição dos alunos face
aos seus próprios comportamentos indisciplinados. Qual a opinião por eles adoptada face a
esses comportamentos? Consideram-se culpados, mostram-se arrependidos? Deve referir-
se, em primeiro lugar, que em muitas fichas de registo de ocorrência analisadas não foi
possível recolher elementos que nos permitissem elucidar as questões formuladas.
Contudo, foram muitos os alunos que expressaram opinião sobre o assunto.
Os resultados que apresentamos no quadro XXI mostram-nos que nas fichas de
registo do “Gabinete Disciplinar” foi possível recolher dados de 238 alunos sobre a
percepção que os mesmos tinham relativamente aos seus comportamentos. 74,5%
admitiram serem culpados da sua actuação incorrecta, enquanto 25,6% consideram não ter
qualquer culpa na situação ocorrida na sala de aula. Da mesma forma, pudemos constatar
que 215 alunos deram indicações respeitantes ao arrependimento quanto aos actos
praticados. Neste caso, 62,8% dizem-se arrependidos quanto aos comportamentos
praticados e 37,2% não mostraram qualquer arrependimento.

Quadro XXI- Manifestações de indisciplina / culpa e arrependimento


CONSIDERA-SE MOSTRA-SE
CATEGORIAS COMPORTAMENTOS CULPADO ARREPENDIDO
SIM NÃO SIM NÃO
- Interromper o professor com questões fora do assunto da aula. 3 2 1
Relação professor- - Falar ou responder ao professor de forma incorrecta 13 5 12 4
aluno - Desafiar a autoridade do professor 5 4 2
- Desobedecer a ordens do professor 14 11 12 10
- Insultar ou gozar o professor 1 4 3
- Provocar os colegas. 6 4 2
Relação aluno-
- Insultar os colegas. 4 2 5 2
aluno
- Agredir ou tentar agredir um colega 9 8 2
Comunicação oral - Conversar com os colegas. 34 8 25 17
clandestina e - Rir e fazer rir os colegas de forma exagerada. 18 9 12 11
distracções - Brincar, atirarando papéis (ou outros objectos) pelo ar ou chão. 12 1 7 4
- Falar alto e desordenadamente ou fazer barulho 15 4 11 3
- Circular pela sala de aula. 1 2 1 2
Movimentação
- Levantar-se do lugar sem autorização. 5 2 4 1
Material escolar - Danificar o material da escola (mesas, cadeiras, portas, etc.) 1 1
- Recusar realizar as actividades ou não participar nas aulas. 5 3 3 4
Trabalho - Estudar ou realizar os trabalhos para outras disciplinas. 1
- Chegar atrasada(o) às aulas. 2 1 2 1
- Não trazer o material escolar necessário. 2 1 1 1
- Permanecer na aula com o boné na cabeça. 1 1
Convenções sociais - Utilizar telemóvel, MP3, ou outro material electrónico. 2 1 1 1
- Manter uma postura inadequada na sala de aula (pés em cima
12 3 8 5
das cadeiras, mal sentado, comer etc.).
- Proferir palavrões / utilizar linguagem imprópria 12 3 12 3
TOTAL = 177 61 135 80
PERCENTAGENS (%) 74,4 25,6 62,8 37,2

148
Deste primeiro olhar sobre o ambiente disciplinar da Escola Secundária com 3º
Ciclo do Ensino Básico das Tílias podemos extrair algumas conclusões:
 A indisciplina manifesta-se com alguma frequência nesta escola, a avaliar pelas 338
fichas de registos de ocorrências que foram preenchidas e analisadas no Gabinete
Disciplinar38;
 Os indivíduos dos sexo masculino são mais propensos à prática de comportamentos
indisciplinados do que os do sexo feminino;
 Os comportamentos indisciplinados dividem-se por várias categorias, havendo, no
entanto três que se destacam: a categoria comunicação oral clandestina e
distracções, a categoria relação professor-aluno e a categoria convenções sociais.
Para mais facilmente compreendermos os dados apresentados e baseando-nos em
Amado (2001: 104) podemos agrupar as sete categorias por nós utilizadas em três
mais gerais:

“-a categoria da relação professor-aluno-. constituída por comportamentos que visam directamente
o professor enquanto agente da autoridade e enquanto responsável pelo processo de ensino;
-a categoria da relação aluno-aluno. constituída por comportamentos que põem em causa um
relacionamento equilibrado entre os alunos da mesma turma ou visam o incitamento à desordem e à
indisciplina;
-a categoria do processo-aula-. composta por comportamentos que, no dizer do professor, impedem
o "bom funcionamento da aula", "perturbam", põem em causa a organização e gestão da classe e o
"rendimento" da turma.”

Se tivermos em conta que cinco das categorias por nós definidas (comunicação oral
clandestina e distracções, movimentação, material escolar, trabalho e convenções
sociais), dizem respeito ao “processo-aula” definido por Amado, 68,3% dos alunos
que compõem a nossa amostra visam, com os seus comportamentos, impedir o
“bom funcionamento da aula”, “perturbar”, pondo em causa a organização e gestão
da classe e o “rendimento” da turma.

38
Deve referir-se que na sala de aula houve um número de incidentes superior a estes registos porque houve
alunos que receberam ordem de saída da sala de aula e que não chegaram a ir para o Gabinete Disciplinar, ou
porque eram encaminhados pelo professor para outros espaços como a biblioteca, por exemplo, ou porque,
como referiu um dos alunos entrevistados “Quando o aluno é posto fora da sala para ir para a gestão de
conflitos os alunos fogem. São poucos aqueles que chegam a ir para a gestão de conflitos, porque chegam à
gestão de conflitos e têm sempre um professor que vai fazer-lhe perguntas do que é que se passou sobre a
aula para ter ido para ali.” (entr. Al. 6)

149
Mantendo o mesmo processo de análise na categoria da relação “professor-aluno”,
integram-se 23,1%, sendo estes os que com o seu comportamento visam atingir a
autoridade do professor “enquanto responsável pelo processo de ensino”. Como
anteriormente se referiu, neste grupo integram-se os alunos mais velhos, muitos dos
quais frequentam o 9º ano.
Finalmente, na categoria da “relação aluno-aluno”, temos 8,6% dos registos de
comportamentos indisciplinados na sala de aula, sobressaindo nessa categoria as
agressões ou tentativas de agressão e os insultos entre alunos que “põem em causa
um relacionamento equilibrado entre os alunos”;
 74,5% dos alunos que praticaram comportamentos desviantes reconheceram a sua
culpa perante os actos praticados e 62,8% mostraram-se arrependidos das suas
acções.
Sem termos qualquer pretensão de generalização e tendo sempre em conta as
“limitações deste tipo de categorias, (…) porque raramente os comportamentos, no seu
contexto, oferecem apenas uma leitura única” (Amado, 2001: 104) devemos, no entanto,
referir que estes resultados vão de encontro aos obtidos pelo citado autor num estudo
efectuado numa Escola Secundária dos arredores de Lisboa e sobre os quais ele diz:
“Encontrei, do ponto de vista estatístico, diferenças bastante acentuadas no número de
incidentes por categorias, cabendo à do processo-aula 64,3% do total, seguindo-se a da
relação professor-aluno-, com 26%, e a da relação aluno-aluno, com 9,7%” (2001: 104).

2- O ambiente disciplinar na sala de aula

“O estudo dos “factores da indisciplina” do ponto de vista dos actores, professores


e alunos, é de enorme importância, não só porque ele traduz o sentido que cada um
dá ao comportamento dos outros e exprime uma parte da sua representação da
realidade, mas também porque essa mesma “representação” se constitui como
elemento importante do contexto. Os comportamentos surgem como reacção a
realidades objectivas, mas também às representações que os actores constroem em
interacção.”
(Amado, 2001: 221)

150
Neste ponto pretende-se analisar o ambiente disciplinar na sala de aula, recorrendo
aos testemunhos directos dos actores em interacção. Baseamos o nosso estudo na análise
das entrevistas realizadas a alunos e professores, tendo-se utilizado vários guiões para a
formulação de perguntas (cf. anexos). Utilizámos ainda documentos produzidos nos
procedimentos disciplinares, nomeadamente as participações de ocorrência apresentadas
pelos professores, os depoimentos colhidos pelos instrutores dos processos junto dos
alunos sancionados e de algumas testemunhas e os despachos do Presidente do Conselho
Executivo.
Os guiões das entrevistas foram orientados no sentido de recolhermos informação
pertinente para responder às nossas questões de partida e elucidar os objectivos que
estabelecemos para o trabalho.
O ambiente disciplinar na sala de aula constitui o tema central da nossa análise.
Para facilitar a interpretação dos dados, dividimos este tema em quatro domínios:
comportamentos indisciplinados; causas da indisciplina na sala de aula; regras da sala de
aula; e medidas disciplinares. Para cada um destes domínios foram definidas categorias
que por sua vez se subdividiram em várias subcategorias.

2.1- Comportamentos indisciplinados

Diariamente, nas nossas escolas, acontecem comportamentos de indisciplina, sendo


a sala de aula um espaço onde esses comportamentos ocorrem com alguma frequência.
Podemos integrar esses comportamentos em várias categorias: pouco graves, de gravidade
média e muito graves.
Para avaliarmos a natureza desses comportamentos e quais os que ocorrem com
mais frequência na sala de aula, colocámos aos nossos entrevistados as questões que se
seguem:
Aos alunos:
- Quais os comportamentos de indisciplina que ocorrem com mais frequência na tua
sala de aula? Desses comportamentos quais são os que tu mais praticas? Como classificas
esses comportamentos?
Aos professores:

151
- Enuncie os comportamentos de indisciplina que mais frequentemente ocorrem na
sua sala de aula; Desses comportamentos quais os que considera mais graves?
Aos Directores de Turma:
- Quais os comportamentos de indisciplina que mais frequentemente ocorreram na
sua turma? Como classifica esses comportamentos?
Para análise dos resultados obtidos agrupámos os comportamentos apresentados
pelos respondentes em três categorias39: a categoria da relação professor aluno, a categoria
da relação aluno-aluno e a categoria do processo aula.
No quadro XXII apresentam-se os resultados extraídos da análise das entrevistas
realizadas aos alunos sobre os comportamentos indisciplinados mais praticados em sala de
aula. Observamos que os alunos entrevistados referem como comportamentos desviantes
mais praticados os que compõem a categoria processo-aula, ou seja os comportamentos
que têm por objectivo impedir que a aula decorra com normalidade. Apenas dois alunos
apontam comportamentos que afectam a relação professor-aluno. Facto curioso é que
nenhum aluno entrevistado refere comportamentos que se integrem na categoria da relação
aluno-aluno.
Poder-se-á concluir da análise deste quadro, que os comportamentos indisciplinados
na sala de aula têm como objectivo fundamental prejudicar a aula em si e apenas em
algumas situações pontuais terão uma função de contestação do professor e da sua
autoridade.

Quadro XXII: Comportamentos mais praticados na sala de aula, segundo os alunos

Alunos
Categorias Comportamentos
Al 1 A l2 A l3 Al 4 Al 5 Al 6 Al 7
Relação Gozar com os professores X
Professor-aluno Responder mal aos professores X X
Relação
Aluno-aluno
Levantar-se do lugar, sair da sala sem autorização X X X
Falar alto, conversar muito, fazer barulho X X X X X X X
Processo aula Brincar, rir e distrair-se X X X
Usar boné, mascar pastilha, utilizar telemóvel X X X X
Chegar atrasado X

39
Apesar de haver vários tipos de categorizações: Hargreaves e colaboradores (1975) definiram cinco temas
fundamentais relativos aos comportamentos desviantes na sala de aula: da conversa, do movimento, do
tempo, da relação professor-aluno e da relação aluno-aluno; Maria Teresa Estrela (1986), elabora quatro
categorias: comportamentos que perturbam a comunicação na aula, comportamentos que perturbam o
rendimento do curso, comportamentos que perturbam as relações humanas e comportamentos que violam os
hábitos sociais estabelecidos, no nosso trabalho adoptámos a categorização definida por Amado (2001), por
entendermos que é a que melhor se adapta aos nossos objectivos, centrados na sala de aula.

152
O quadro XXIII refere-se aos comportamentos praticados pelos próprios alunos
entrevistados na sala de aula. Uma breve análise do quadro mostra-nos que os alunos que
nós entrevistámos seguem a mesma tendência dos colegas das turmas em que se integram.
Caso a salientar é o do aluno Al 5 que parece praticar na sala de aula todos os
comportamentos indisciplinados, o que está de acordo com o que referiu na sua entrevista
onde a esse respeito disse: “Pratico todos e mais alguns. Todos os que referi e mais
alguns.” (Entrev. Al 5). Outra aluna, sobre a prática deste tipo de comportamentos, afirmou
“Quase todos, senão não vinha para a rua, não é? Usar o telemóvel, conversar, rir…”
(entrev. Al 1).

Quadro XXIII- Comportamentos mais praticados na sala de aula, pelos respondentes

Alunos
Categorias Comportamentos
Al 1 Al 2 Al 3 Al 4 Al 5 Al 6 Al 7
Relação Gozar com os professores x
Professor-aluno Responder mal aos professores x
Relação
Aluno-aluno
Levantar-se do lugar, sair da sala sem
x x
autorização
Falar alto, conversar muito, fazer barulho x x x x x x
Processo aula
Brincar, rir e distrair-se x x x
Usar boné, mascar pastilha, utilizar telemóvel x x x x x
Chegar atrasado x

Relativamente aos professores, adoptámos a mesma metodologia utilizada para a


análise das entrevistas dos alunos. Os resultados são apresentados no quadro XXIV.
Relativamente à categoria da relação professor-aluno, todos os professores são unânimes
em reconhecer que o comportamento mais praticado pelos alunos na sala de aula é a
desobediência às ordens ou indicações dos professores. Ameaças e desafio à autoridade do
professor parecem não ser prática muito comum nas salas de aula destes professores. Na
categoria da relação aluno-aluno, contrariamente ao que aconteceu com as respostas dos
alunos, vários professores referem a existência de comportamentos que afectam a relação
entre pares, nomeadamente agressões e insultos. Na categoria processo-aula, integram-se
os comportamentos que têm uma maior incidência. Nesta categoria, professores e alunos
parecem estar de acordo, considerando que os comportamentos indisciplinados prejudicam
o bom funcionamento das aulas e são os que acontecem com mais frequência.

153
Quadro XXIV: Comportamentos mais praticados na sala de aula, segundo os professores

Professores
Categorias Comportamentos DT.P DT.P DT.P
P2 P5 P6 DT.P7 DT.P8 P9
1 3 4
Gozar com os professores
Relação Responder mal aos professores
Professor- Desobedecer a ordens do professor x x x x x x x x x
aluno Ameaça a professores x
Desafio da autoridade do professor x
Relação Agressão a colegas x x x x
Aluno- Insultos aos colegas x x x x
aluno Desrespeito pelos colegas x x
Levantar-se do lugar, sair da sala sem
autorização
Falar alto, conversar muito, fazer
x x x x x x
barulho
Brincar, rir e distrair-se x
Usar boné, mascar pastilha, utilizar
Processo x x x x
telemóvel
aula
Chegar atrasado
Respostas grosseiras, palavrões,
x x x x x
comentários despropositados
Comer na aula x
Recusar cumprir as actividades
x x
propostas

Sintetizando, verificamos que no respeitante aos comportamentos indisciplinados


na sala de aula, alunos e professores são unânimes em considerar que os mais praticados
têm uma função de obstrução às actividades escolares. Não existe concordância entre
alunos e professores no respeitante à interferência dos comportamentos inadequados no
afectar da relação professor-aluno pois os alunos só esporadicamente referem a existência
de comportamentos que se integrem nessa categoria, enquanto todos os professores
referem a desobediência e a não acatação de ordens como um dos principais problemas em
sala de aula. Finalmente, também existem divergências de opinião quanto à interferência
dos comportamentos desviantes na sala de aula na degradação do relacionamento entre
alunos do grupo-turma. Os alunos não referem qualquer comportamento que se integre
nessa categoria, enquanto os professores mencionam a existência de agressões e insultos
entre pares dentro da sala de aula. Esta situação é pouco usual e poderá configurar a
existência de uma cultura de protecção entre pares, levando alguns alunos a não
denunciarem a prática de más condutas por parte dos colegas.
Quanto à gravidade dos comportamentos praticados, os alunos tendem a
desvalorizar esse aspecto. Recolhemos das entrevistas efectuadas algumas passagens que
elucidam essa questão.

154
O aluno Ruben, questionado sobre a gravidade dos seus comportamentos,
respondeu que não eram graves, “Não. São todos normais.”(entrev. Al 5); o Rui, sobre o
mesmo assunto, referiu “Nenhum é muito grave” (entrev. Al 2); o aluno Carlos é da
mesma opinião dos colegas, para ele, “Eu acho que não. Acho que o barulho é normal,
uma pessoa não aguenta estar tantas horas sem falar” (entrev. Al 7); o Pedro considera
que há alguns graves mas que outros não têm grande gravidade,

“Mexer no telemóvel acho que sim, agora falar acho que não é muito grave, nós precisamos de
falar uns com os outros senão não somos amigos nem colegas, cada um para seu lado” (entrev. Al
3).

O aluno Filipe respondeu que a utilização do telemóvel era grave: “Acho. O do telemóvel é
um caso” (entrev. Al 6).
Pronunciando-se sobre a questão da gravidade dos comportamentos indisciplinados
na sala de aula, os professores têm ideias substancialmente diferentes das dos alunos. A
Directora da turma A do 8º ano referiu que “Houve um caso de uma ameaça a uma
professora e um caso de agressão a um colega” (entrev. DT. P3), casos graves que deram
origem a procedimentos disciplinares e a suspensão da frequência das aulas do aluno
Filipe. A Directora da turma D do 8º ano respondeu que

“Classifico esses comportamentos com alguma gravidade, pois são alunos que não sabem estar
numa sala de aula, apesar de conhecerem as regras não as cumprem” (entrev. DT. P8).

A Directora de turma do 9º D, pronunciando-se sobre o mesmo assunto, é de opinião que

“estes comportamentos podem ser classificados uns de mais gravosos e outros de


menos gravosos”. Acrescenta que “As simples conversas paralelas à explicação do
professor foram ao longo do ano motivo de um mau ambiente de trabalho, com
prejuízo não só para os alunos mais conversadores, como para toda a turma”
(entrev. DT. P7).

Também os professores, que apresentaram participações de ocorrência


dos alunos por nós entrevistados, consideram que a maior parte dos
comportamentos desajustados são graves. As intervenções que se apresentam
confirmam o que acabamos de dizer:

155
“A situação que me parece muito grave é a do aluno que não cumpre uma ordem de
saída da sala de aula, desrespeitando a docente como figura de autoridade”
(entrev.P5); “Desses comportamentos considero graves o falar na aula, comer na aula, usar o
telemóvel, chegar atrasados, dizer palavrões…”(entrev. Pr 9).

2.2- Causas da indisciplina na sala de aula

O primeiro domínio da indisciplina na sala de aula, abordado no ponto anterior, foi


o da tipificação dos comportamentos que ocorrem com mais frequência nesse espaço.
Neste ponto, abordamos o segundo domínio por nós estabelecido que é o das causas da
indisciplina na sala de aula. Parece-nos ser um ponto de abordagem mais complexa, porque
complexas são também as causas dos comportamentos indisciplinados, e que, por isso
mesmo, subdividiremos em duas partes – factores intrínsecos à sala de aula e factores
extrínsecos à sala de aula. No primeiro, incluímos as interacções na sala de aula e, no
segundo, factores que, sendo externos, podem condicionar os comportamentos naquele
espaço.
As interacções na sala de aula, nomeadamente a comunicação, e a organização das
actividades e do espaço são fundamentais para a criação de um ambiente que possibilite as
aprendizagens dos alunos. Este clima nem sempre se consegue criar, havendo factores que
interferem negativamente, uns atribuíveis aos alunos, outros atribuíveis aos professores e
outros, ainda à organização.

2.2.1- As percepções dos alunos

Tentámos saber junto dos actores em presença no espaço da sala de aula quais são
as principais causas dos comportamentos indisciplinados que obstaculizam o normal
desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem. Para recolhermos informação que nos
permitisse saber qual a percepção dos alunos sobre as causas da indisciplina na sala de
aula, formulámos as seguintes questões, que incluímos nas entrevistas: Quais os motivos
que levam os alunos a perturbarem as aulas? E no teu caso pessoal? Fala-me do
relacionamento entre professores e alunos na tua sala de aula. No teu caso pessoal, como

156
te relacionas com os teus professores? E com os teus colegas? A forma como os
professores dão as aulas influencia o vosso comportamento na sala? De que forma?
Os dados apresentados no quadro XXV mostram-nos que todos os alunos
entrevistados responsabilizam os professores como causadores de indisciplina na sala de
aula, derivando esta de uma actuação deficiente dos docentes. Quatro alunos referem
problemas de ordem organizacional da escola, atribuídos essencialmente aos horários
escolares. Três alunos mencionam problemas pessoais como causadores dos
comportamentos indisciplinados. Dois referem o desinteresse pelas disciplinas e apenas um
refere problemas familiares.

Quadro XXV- Causas dos comportamentos indisciplinados na sala de aula, segundo os


alunos

Alunos
Categorias Subcategorias
Al 1 Al 2 Al 3 Al 4 Al 5 Al 6 Al 7
- Doença do foro psicológico (hiperactividade)
Factores - Distúrbio emocional
Psicológicos e
Pessoais - Problemas pessoais x x x
- Desinteresse pelas disciplinas ou pela escola x x
- Proveniência de meios desfavorecidos
Factores Sociais - Violência e agressividade social
- Desrespeito e ausência de regras sociais
- Permissividade da escola
Factores - Dificuldades materiais da escola
Institucionais - Cultura organizacional da escola (turmas, x x x x
horários…)
- Deficiente actuação dos professores x x x x x x x
- Falta de apoios do Ministério da Educação
- Proveniência de famílias disfuncionais
- Abandono familiar
Factores
- Ausência de um sistema de valores
Familiares
- Carências económicas e culturais (linguagem)
- Outros problemas familiares x

Questionados sobre a sua própria actuação, as respostas não variam relativamente


ao que apontaram para o geral dos alunos da turma. Apenas o aluno Ruben referiu
peremptoriamente “Não gostava dos professores” (entrev. Al 5). Esta coincidência
explica-se, certamente, pelo facto de termos seleccionado para serem entrevistados alunos
que evidenciaram ao longo do ano lectivo comportamentos disruptivos que os levaram,
mais do que uma vez, a passarem pela “Sala de Gestão de Conflitos”.

157
A actuação dos professores, sobretudo a forma como dão as aulas, parece estar na
origem de comportamentos indisciplinados como podemos depreender da análise das
entrevistas efectuadas. Os excertos que apresentamos elucidam claramente esta situação.

“há lá professores que espetam um acetato, põem-se a ler o acetato, tiram o acetato e já acabou a
matéria. Se temos dúvidas, olha que se lixe. Há outros que chegam lá, dão a matéria calmamente,
há outros que ainda dão a matéria com vídeo, que é uma coisa diferente, depois se tivermos
dúvidas, é pá, não tiram muitas dúvidas mas ainda tiram algumas, fazemos fichas sobre essas
matérias e então aí sim. Agora chegar lá, por um acetato, tumba! blá! blá! blá! e acabou, próxima
matéria”. (entrev. Al 2)

O extracto apresentado mostra-nos claramente que os alunos apreciam determinado


tipo de aulas e não apreciam outras. As aulas em que o professor faz muito uso da
exposição, mesmo utilizando tecnologias (retroprojector e acetatos) não parece ser do
agrado dos alunos, pelo menos quando se abusa desta estratégia.
Sobre o mesmo assunto o aluno Ruben:

“Quando os professores avariam assim e depois começam a escrever só fazem testamentos e não
dão tempo para a gente passar, começamos a gozar com eles. Há professores que são aborrecidos,
já vêm amuados de outra aula qualquer e descarregam em nós. Não motivam lá muito a dar a
aula”. (entrev. Al 5)

Ainda sobre o funcionamento das aulas, o Pedro refere que as aulas monótonas são
propícias a manifestações de desinteresse e enfado por parte dos alunos, o que os leva à
prática de desvios na aula. Diz-nos ele:

“É as aulas serem sempre a mesma coisa, sempre aulas da mesma maneira, os alunos começam-se
a fartar de ouvir sempre as mesmas coisas, estar sempre sentadinhos a olhar para o quadro,
começam-se a fartar disso” (entrev. Al 3).

Os depoimentos anteriormente apresentados foram recolhidos de entrevistas de


alunos do 8º ano de escolaridade. Contudo, também os alunos mais velhos, do 9º ano,
parecem partilhar estas opiniões. O aluno Diogo refere que:

“as aulas em que nós temos que ler ler e escrever escrever, ler e ler, isso não dá com nada. Nós
estamos ali a ler porque estamos a ser obrigados, estamos a escrever porque estamos a ser
obrigados, nada entra” (entrev. Al 4).

158
Terminamos com uma passagem da entrevista de outro aluno do 9º ano, o Carlos,
que sobre as aulas refere: “Quando as aulas são muito seca. (…) São cansativas quando é
só escrever, uma pessoa cansa-se e começa-se a distrair com coisas pequeninas”.(entrev.
Al 7)
O aspecto relacional com os professores colheu, por parte dos alunos entrevistados,
respostas díspares. Alguns alunos dizem que o relacionamento é bom, enquanto para outros
não é assim tão bom. Com alguns parece ser mesmo muito mau. Para outros, o
relacionamento é bom com alguns professores e menos bom com outros.
A aluna Ana diz a este respeito: “Depende dos professores. Então, há professores
de que nós não gostamos, então damo-nos mal, os que nós gostamos e pronto damo-nos
bem”(entrev. Al 1). A mesma opinião nos transmite o aluno Pedro para quem, “É mais ou
menos, com alguns sores é bom, com outros é mau, outros é péssimo” (entrev. Al 3). O
testemunho do Diogo confirma a mesma situação. Para este aluno,

“Depende dos alunos e depende dos professores, porque se o professor não gostar do aluno e o
aluno não gostar do professor o relacionamento é um bocado complicado. Mas se os alunos forem
bem abertos e simpáticos e os professores forem a mesma coisa para os alunos não há problema
nenhum” (entrev. Al 4).

Outros alunos dão-nos testemunhos mais contundentes sobre o aspecto relacional


na sala de aula, deixando antever que existem algumas situações em que o conflito atinge
proporções preocupantes. Diz-nos o Rui, do 8º ano:

“Aqueles que são simpáticos para mim, também sou simpático para eles ”. E continua referindo
que, “Há aqueles professores que chegam lá e falam muito mal para nós e nós… pronto já estou a
ver que isto é assim e assado e já começamos logo assim o ano a ver os professores todos maus e
nós e olha nós também somos maus. Se virmos que eles são fixes, isso nós gostamos”. (entrev. Al 2)

O mesmo aluno, numa outra passagem da sua entrevista e pronunciando-se sobre a


actuação dos professores, diz:

“Nós com a professora de Ciências somos formidáveis. É calma e nós portamo-nos muito bem. É
uma coisa calmíssima. Agora com as professoras de História e Geografia é uma coisa doida. A
professora de História é qualquer coisa, recado logo! Chega à aula antes de tocar, está a tocar se
não estão lá todos já está a pôr faltas e aí nós, com carago! Mandamos uns berros. A professora de
Geografia fez mal porque ela não nos controlava ao início do ano e agora já não nos controla.

159
Começou a deixá-los fazer aquilo e o outro e depois ria-se. Agora olha, já não nos consegue
controlar”. (entrev. Al 2)

Os alunos referiram, em segundo lugar, questões organizacionais como


responsáveis pela indisciplina na sala de aula. O aspecto mais referido tem a ver com os
horários escolares, nomeadamente com o tempo de permanência na sala de aula que os
alunos acham exagerado. A este respeito colhemos as seguintes opiniões.

“Seca! Porque aquilo é seca! Estamos ali parados 90 minutos para nós não dá. O tempo de
duração da aula é exagerado. É difícil estar lá sem falar”. (entrev. Al 1).

“Noventa minutos uma aula é muito secante. Em algumas nem tanto, mas há outras em que é
muito”. (entrev. Al 3).

“às vezes uma pessoa satura muito no tempo de aula”. (entrev. Al 6).

“É o tempo. Acho que as aulas são muito grandes. Não dá para aguentar uma hora e meia”.
(entrev. Al 6).

Os excertos transcritos chamam a atenção para a questão da duração das aulas.


Noventa minutos sem interrupção levam a que muitos alunos não consigam concentrar-se
por um período tão longo, fiquem cansados e se distraiam com pequenas coisas, conversem
ou pratiquem outros comportamentos inadequados.
A terceira subcategoria, problemas pessoais, foi apontada por três alunos como
causa de indisciplina na sala de aula. O aluno Carlos disse a este respeito,

“No meu caso pessoal acho que é a disposição. Há dias em que se está bem-disposto e há outros
em que se está mal disposto”(entrev. Al 7).

O Diogo refere,

“depende se às vezes… são por revolta, não sei pode ser uma revolta vinda de casa, em que a
pessoa esteja mais nervosa e tenha, sei lá, de tomar certas atitudes para, não sei, desanuviar, para
libertar energias” (entrev. Al 4).

A respeito do relacionamento entre pares, os alunos entrevistados apresentam


respostas diversificadas. Alguns dizem dar-se bem com todos os colegas “Relaciono-me

160
bem, com todos” (entrev. Al 7), “Era óptimo, porque a gente fazia asneiras todos em
grupo, trabalhávamos em grupo, éramos uma turma unida” (entrev. Al 5)40.
Outros dizem que a relação com os colegas depende de algumas circunstâncias,
como por exemplo a amizade,

“Se for um amigo verdadeiro ajudo-o sempre no que puder. (entrev. Al 6);

“Com os meus colegas também depende, há colegas de que eu não gosto e há colegas de que eu
gosto. Quando eu não gosto não faço esforço para me dar bem com eles” (entrev. Al 1);

“Ah! É bom. Quando não nos chateamos é bom. De vez em quando há coisas mas isso são coisas
normais entre colegas. Passados cinco minutos já está tudo bem outra vez” (entrev. Al 3);

“temos que ver que há certas pessoas que são um bocado insuportáveis e eu, se calhar, também sou
insuportável para essas pessoas, portanto, depende disso” (entrev. Al 4).

2.2.2- As percepções dos Professores

Os professores tendem, segundo a literatura por nós consultada, a atribuir aos


alunos as causas dos comportamentos indisciplinados na sala de aula. Para sabermos qual a
percepção dos docentes sobre esta temática, recorremos a entrevistas que nos forneceram
os dados utilizados na nossa análise. Os professores entrevistados foram divididos em dois
grupos. O primeiro grupo é constituído pelos professores (P) que apresentaram
participações de ocorrência sobre os comportamentos praticados pelos alunos na sala de
aula. O segundo grupo integra os professores que desempenham as funções de Directores
de Turma (DT) das turmas onde se integram os alunos por nós entrevistados, alguns dos
quais foram alvo de procedimento disciplinar.
Abordámos, em primeiro lugar, os motivos que levam os alunos a perturbarem as
aulas. A informação sobre este aspecto foi recolhida através da questão: No seu entender
quais serão os motivos que levam os alunos a perturbarem as aulas?

40
Este caso é curioso uma vez que este aluno refere a existência de um grupo alargado que estava unido na
prática de distúrbios na sala de aula. Confirma-se a sua afirmação uma vez que ele pertencia à turma do 8º
ano que mais registo de comportamentos indisciplinados deixou no Gabinete Disciplinar, sendo ele o líder
desses registos.

161
Os dados apresentados no quadro XXVI mostram-nos que os docentes
entrevistados atribuem a origem dos comportamentos indisciplinados na sala de aula a
vários factores. Contudo, destacam-se as causas que se integram nas categorias “factores
institucionais” e “factores familiares”. Os “factores sociais” e os “factores psicológicos”
têm, segundo os nossos respondentes, menos influência na disrupção escolar, apesar de
haver quatro entrevistados que referem os factores de ordem social.

Quadro XXVI: Causas dos comportamentos indisciplinados na sala de aula, segundo os


professores

Professores
Categorias Subcategorias
DT1 P2 DT3 DT4 P5 P6 DT7 DT8 P9
- Doença do foro psicológico (hiperactividade)
Factores
- Distúrbio emocional
Psicológicos
- Baixa auto-estima x x
e Pessoais
- Desinteresse pelas disciplinas ou pela escola x x x x x x x
- Proveniência de meios desfavorecidos
Factores
- Violência e agressividade social x x
Sociais
- Desrespeito e ausência de regras sociais x x x
- Permissividade da escola x x
- Dificuldades materiais da escola
Factores
- Cultura organizacional da escola (turmas,
Institucionais x x
horários…)
- Deficiente actuação dos professores x
- Falta de apoios do Ministério da Educação
- Proveniência de famílias disfuncionais
- Abandono familiar x x x x
Factores - Ausência de um sistema de valores; Falta de
x x x x x x x
Familiares educação
- Carências económicas e culturais (linguagem) x
- Outros problemas familiares x

Entre os factores institucionais, a subcategoria mais apontada como originadora da


indisciplina na sala de aula foi o desinteresse pelos conteúdos das disciplinas leccionadas
ou o desinteresse pela própria escola, referida por sete dos professores entrevistados. Os
testemunhos que se apresentam elucidam este aspecto.

“Desinteresse pela escola, falta de competências relativas aos conteúdos que são leccionados”
(entrev. P9);
“O desinteresse pela escola e pelo estudo” (entrev. DT3);

“Nenhuma matéria os interessa, estudar não significa nada, os pais não estudaram e têm emprego
onde ganham dinheiro que chegue”. (entrev. DT4);

162
“Não é fácil identificar a causa que está na origem dos comportamentos
indisciplinados, de qualquer modo penso que tem que ver com, o desinteresse dos alunos
pelos conteúdos tratados em contexto de aula” (entrev. DT7);

“O desinteresse pela escola, o desinteresse pelos conteúdos leccionados e a não interiorização por
parte dos alunos da importância da escola na formação e futuro de cada indivíduo” (entrev. P5) .

Sete dos nove professores entrevistados atribuíram a indisciplina na aula a causas


de carácter familiar, destacando a ausência de um conjunto de valores ou a falta de
educação dos alunos. Neste ponto, todos os directores referiram os aspectos familiares
como causas de indisciplina. Não deixa de ser um facto importante uma vez que os
Directores de Turma comunicam directamente com os Encarregados de Educação e têm na
sua posse informações importantes sobre a vivência familiar dos alunos. Os testemunhos
extraídos das entrevistas efectuadas lançam alguma luz sobre o assunto.

“Falta de educação e de civismo que lhes não foi dado pelos pais ou educadores” (entrev. DT1);

“a falta de formação e de educação” (entrev. DT3);

“Desconhecem modos de estar adequados, não têm acompanhamento eficiente em casa” (entrev.
DT4);

“As vivências familiares, quer de mau ambiente quer por demasiado facilitismo,
penso que ainda que nem sempre, mas muitas das vezes também influenciam a
postura dos alunos na sala de aula.” (entrev. DT7);

“falta de hábitos de cumprimento de regras em casa e na sociedade” (entrev. DT 8);

“A ausência das famílias na transmissão de valores e a falta de acompanhamento.” (entrev. P2);

“falta de uma cultura do esforço porque aprender implica trabalho e falta de disciplina em
ambiente de trabalho.” (entrev. P6).

Factores de ordem social foram referidos por três dos nossos informadores
privilegiados. Referiram aspectos ligados essencialmente ao desrespeito e ausência de
regras e à violência e agressividade que grassam na sociedade e que diariamente são
veiculados pelos órgãos de comunicação social, com destaque para a televisão.

163
“Muitos alunos têm televisão no quarto e passam horas a ver televisão, não dormem o suficiente,
perdem a capacidade de se concentrarem, vêem programas não adequados, os ladrões, assassinos e
outros que tais são heróis em programas televisivos” (entrev. DT4);

“hoje os alunos estando sujeitos a tantos estímulos da sociedade transmitidos pelo computador,
jogos, televisão, etc., muitas das vezes apresentam dificuldades de concentração, o que também
julgo ser um factor de indisciplina.” (entrev. DT7);

“falta de hábitos de cumprimento de regras em casa e na sociedade e falta de rigidez no


cumprimento de regras desde o infantário.” (entrev. DT8).

Foram referidos outros aspectos com influência nos comportamentos dos alunos na
sala de aula. Salientamos os que se incluem nas subcategorias “permissividade da escola” e
“cultura organizacional da escola”. A este respeito, os nossos entrevistados disseram o
seguinte:

“falta de uma atitude concertada por parte de todos, aquando da implementação das regras”
(entrev. DT8);

“Conhecem a grande permissividade do sistema, que os desresponsabiliza das asneiras que fazem.”
(entrev. P2);

“Demasiada carga do horário lectivo que lhes não permite separar trabalho de brincadeira.”
(entrev. DT1);

“Em alguns casos a duração das aulas de 90 minutos julgo também ser um factor
propício à indisciplina” (entrev. DT7).

Outro aspecto que tem influência no clima disciplinar que se cria na sala de aula é a
relação que se estabelece entre docentes e discentes. Quisemos saber o que pensam os
professores a este respeito, colocando-lhe a seguinte questão: Acha que a forma como os
professores se relacionam com os alunos na sala de aula tem influência no tipo de
comportamento que estes têm? Porquê?
As respostas dadas permitem-nos concluir que todos os docentes se pronunciaram
afirmativamente. Apresentamos alguns testemunhos que clarificam a percepção dos
docentes.
A Directora da turma D do 9º ano diz que,

164
“Tem. Se o professor conseguir criar laços de cumplicidade, amizade e respeito, há mais
probabilidades de haver bom comportamento dentro da sala de aula. Mas o professor só vai
conseguir isso se o aluno o permitir”(entrev. DT1).

A mesma opinião colhemos da entrevista da Directora de Turma do 8º D para quem:

“Claro. O professor tem que estabelecer as regras e cumpri-las. Tem de exigir dos alunos e mostrar
que prepara as aulas convenientemente. Não pode ter um tipo de atitude diferente em cada aula que
dá. Os alunos precisam de ter um ambiente estável e saber com o que podem contar” (entrev. DT4).

A Directora da turma D do 8º ano dá-nos mais um testemunho da importância do


relacionamento na sala de aula. Diz:

“Evidentemente que sim. Julgo que a relação professor/aluno é extremamente importante e passa
pela necessidade de se criarem relações de empatia, fundamentais para o bom ambiente em sala de
aula. Mas, por vezes, essa empatia só se mantém se essa relação estiver alicerçada em regras de
educação e respeito de parte a parte, o que nem sempre acontece” (entrev. DT8).

Embora não respondendo com tanta convicção, a Directora de turma do 9º B, não deixa de
concordar com as colegas, dizendo que:

“Penso que não é linear. Mas de qualquer forma julgo haver alguma influência.
Acredito que muitas das vezes os alunos agem ou reagem de acordo com as
expectativas que julgam que os professores têm sobre eles, e acredito que quando
um professor consegue num clima de respeito e firmeza criar empatia com os
alunos isso é determinante para o comportamento deles com esse professor” (entrev.
DT7).

Colocámos a mesma questão aos docentes que não eram Directores de turma e as
respostas obtidas não diferem das anteriores. A docente de Geografia P6 respondeu:

“Sim. Quanto mais empatia e respeito os alunos tiverem com o professor mais assertivos tendem a
ser”.

A professora de História P5 também respondeu afirmativamente:

“Sim, embora os alunos devam compreender que os professores são diferentes entre si, com
diferentes formas de actuação, deverão entender essas diferenças, respeitando a figura do professor
dentro dessas mesmas diferenças.

165
Finalmente, a literatura consultada aponta para a actuação dos professores, em
termos de leccionação, como possibilitadora ou facilitadora de comportamentos
indisciplinados, nomeadamente a forma como conduzem a aula e as estratégias utilizadas
para a transmissão dos conteúdos. Os alunos apontaram as aulas expositivas como
cansativas e monótonas, que provocam desinteresse e levam a brincadeiras e
comportamentos desviantes.
Para sabermos o que os docentes pensam sobre a sua própria actuação colocámos-
lhe a seguinte questão: Pensa que a forma como os professores dão as aulas influenciará
o comportamento dos alunos nas mesmas? Porquê?
As respostas obtidas permitem-nos concluir que nem todos os docentes são da
mesma opinião. Para alguns, a forma como dão as aulas influencia directamente o
comportamento dos alunos:

“Obviamente. Nas disciplinas em que o professor não imprime ritmo às suas aulas, há lugar para o
disparate. No 8º F o truque era mesmo trabalhar do 1º ao último minuto – assim não havia espaço
para a asneira; também ajuda se as actividades forem variadas.” (entrev. DT4)

“Sim eu penso que se as aulas forem mais monótonas, mais expositivas e de certo
modo alheadas dos interesses dos alunos, podem ser mais propícias a haver
comportamentos indisciplinados” (entrev. DT7)

“Há, uma vez que se a aula não cativar os alunos, se as estratégias e métodos utilizados não
despertarem o interesse, os alunos “desligam o botão” e procuram distrair-se de outra forma. O
difícil está em cativar todos os alunos, quando há interesses e gostos tão díspares.” (entrev. DT8)

“Sim. O professor que consegue envolver os alunos nas actividades conseguirá um ambiente de
trabalho mais participativo e ordenado”. (entrev. P6)

Para outros tem alguma influência mas não muita:

“A forma como os professores dão as aulas tem alguma influência, mas não muita. Sou professora
de duas disciplinas distintas e quando lecciono as duas na mesma turma, genericamente, os alunos
gostam da professora de Português e comportam-se melhor, e contestam a professora de Francês.
Há uns anos atrás leccionava na mesma turma Português e Francês. Um dos “garotos”, na altura
no 8º ano, dizia-me que a professora de Português era muito fixe, mas a de Francês, às vezes, era
mazinha. Era um bom aluno a Português, mas a Francês era pouco mais que medíocre.” (entrev.
DT1)

166
“Sim. Em situações de maior exposição teórica e retórica por parte do professor o aluno tende a
desconcentrar-se e desmotivar-se. Mas há turmas onde por vezes o grau de desinteresse é tão
grande que nem uma tarefa mais prática os consegue interessar. Há claras divergências de
disciplina para disciplina.” (entrev. P5)

Para outros ainda não tem qualquer influência:

“Depende dos alunos. Alguns alunos conseguem motivar-se com determinados tipos de aulas, o que
diminui a frequência dos comportamentos indisciplinados. Para outros alunos isso não faz qualquer
diferença”. (entrev. DT3)

“Os alunos ainda não interiorizaram que há aulas em que tem de haver exposição de conteúdos,
não podendo as mesmas ser maioritariamente de execução de outras actividades ou de pesquisa na
net, situação muito apreciada por eles.” (entrev. P2)

Sintetizando, podemos concluir que as causas da indisciplina na sala de aula são


motivadas por diversos factores e parece não haver concordância entre alunos e professores
quanto à origem da indisciplina em contexto de aula.
No nosso estudo, os alunos atribuem a indisciplina na sala de aula
fundamentalmente à actuação dos professores, salientando a forma como os mesmos
orientam e conduzem as aulas; não apreciam aulas expositivas, monótonas e sem ritmo.
Nas suas palavras: “aulas de seca”. Alguns alunos destacam também a relação professor-
aluno como importante no processo disciplinar da sala de aula, gostando de professores
simpáticos, que os compreendam, os ajudem e os tratem com justiça. Os alunos referem
ainda factores de ordem organizacional e institucional para o surgimento de
comportamentos desajustados na sala de aula, nomeadamente o excessivo tempo de
duração das aulas, que leva ao cansaço, desinteresse e consequente irrompimento de
situações de indisciplina.
Os professores parecem ter percepções diferentes. Contrariando alguns estudos que
referem que por norma os professores tendem a atribuir a indisciplina na sala de aula às
características psicológicas dos seus alunos, os professores que participaram no nosso
estudo salientam como principais factores causadores de indisciplina na sala de aula o
desinteresse dos alunos pelos conteúdos de algumas disciplinas leccionadas ou o

167
desinteresse pela própria escola,41 questões pessoais, portanto, e motivos de ordem familiar
onde destacam a ausência de um conjunto de valores educacionais e um certo abandono
parental relativamente aos filhos. Outros professores ainda, referem a incapacidade da
família transmitir e fazer cumprir um conjunto de regras de boa educação, situação que a
própria sociedade, onde existe um grande desrespeito ou ausência de regras e
comportamentos agressivos e violentos, vem agravar.
Os professores por nós entrevistados atribuem ao aspecto relacional importância
significativa na criação de um bom clima de aula, considerando que a assertividade dos
alunos depende directamente de uma boa relação na sala de aula. A forma como as aulas
são organizadas e conduzidas é, para quase todos os professores entrevistados,
influenciadora dos comportamentos dos alunos, sobretudo aulas muito expositivas,
monótonas, com pouco ritmo e com estratégias pouco variadas, o que provoca a distracção,
o desinteresse e a disrupção. Refira-se que, neste aspecto, existe convergência entre
professores e alunos.

2.3- As regras na sala de aula

As regras na sala de aula são essenciais para que se consiga criar um ambiente
organizado que permita e facilite as interacções, a comunicação e, por conseguinte, as
aprendizagens. Definir regras e fazê-las cumprir nem sempre é fácil e a acção pedagógica
depende essencialmente da forma como professor e alunos se posicionam relativamente às
regras de conduta. Torna-se necessário que as regras sejam bem esclarecidas por parte do
professor e que este se certifique que os alunos as compreendem. As regras devem ser
suficientemente claras e não conter ambiguidades e numa turma devem ser implementadas
da mesma forma por todos os professores para não se cometerem arbitrariedades. Amado
(2001: 101) diz a este respeito:

41
Nas nossas escolas muitos alunos queixam-se do desfasamento existente entre os conteúdos leccionados e
as aspirações que eles têm. Como professor de História, sou confrontado frequentemente com esta realidade
por parte dos alunos ao referirem muitas vezes “para que hei-de estudar coisas que já aconteceram há
centenas de anos e que não têm qualquer interesse para mim?”
Noutros casos é a própria escola que não diz nada aos alunos. Vários estudos referem que hoje a escola já não
assegura empregabilidade futura a quem a frequenta. Talvez por esse motivo muitas vezes ouvimos por parte
dos nossos alunos desabafos como “ando na escola porque os meus pais me obrigam” ou “os meus pais não
estudaram e têm empregos onde ganham bem”.

168
“São essencialmente as normas e regras funcionais, reguladoras da relação social e das actividades
académicas no interior da aula, que podem variar de professor para professor, o que acentua o seu
carácter convencional e arbitrário”

Neste domínio da nossa investigação, pretendemos saber como os alunos e os


professores de posicionam relativamente às regras escolares, que tipo de regras são
definidas, quem as define, qual a importância que lhes atribuem.

2.3.1- Os alunos e as regras na sala de aula

Para tentarmos perceber o que os alunos pensam sobre as regras na sala de aula,
colocámos aos nossos entrevistados as seguintes questões:
- Diz-me o que pensas sobre as regras de comportamento na sala de aula.
- No início do ano, os teus professores definem as regras de comportamento que devem ser
respeitadas na sala de aula?
- Pensas que os alunos devem participar na definição das regras de comportamento?
Porquê?
No quadro XXVII apresentamos os resultados de uma primeira abordagem desta
questão. Nesse quadro, podemos verificar que todos os alunos entrevistados responderam
que as regras são necessárias, embora apenas três tenham dito claramente que
concordavam com elas. Todos os alunos informaram que as regras eram definidas no início
do ano pelos seus professores (apenas o aluno Al 3 disse que nem todos os professores
definiam as regras) e, exceptuando o aluno Al 5, todos defendem que os alunos devem
participar na elaboração das regras a implementar na sala de aula.

Quadro XXVII: Posicionamento dos alunos entrevistados acerca das regras na sala de aula

Alunos
Regras
Al 1 Al 2 Al 3 Al 4 Al 5 Al 6 Al 7
São muito importantes
Não são importantes
São necessárias X X X X X X X
Concordo com elas X X X
Os professores no início do ano definem as regras da sala de aula Sim Sim Alguns Sim Sim Sim Sim
Os alunos devem participar na elaboração das regras Sim Sim Sim Sim Não Sim Sim

169
Para compreendermos melhor os resultados apresentados no quadro XXVII, e
tentando esclarecer as questões acima apresentadas, socorremo-nos, mais uma vez, das
entrevistas dos alunos. Relativamente à primeira questão, os respondentes dizem que as
regras:

“Exageradas. São necessárias mas são exageradas. Não se pode conversar. É exagerado”.
(entrev. Al 1);

“Por um lado concordo com elas, concordo porque são precisas, se não houver regras é a mesma
coisa que estarmos lá fora uns com os outros. Mas acho que algumas são muito fortes para os
alunos, são muito rigorosas”. (entrev. Al 3);

“As regras têm que ser necessárias em qualquer lado, então na sala de aula é essencial”. (entrev.
Al 4);

“São, são necessárias, se não houvesse regras nós não nos portávamos mal, as regras existem para
serem quebradas”. (entrev. Al 5);

“São necessárias. Devem ser cumpridas”. (entrev. Al 7).

Pelos extractos das entrevistas apresentados, percebe-se que, apesar de muitas vezes
os alunos não respeitarem e não cumprirem as regras, que eles próprios ajudam a definir e
construir, têm consciência que as mesmas são necessárias e devem ser cumpridas. Curioso
verificar que o aluno Ruben (Al 5) diz que se não houvesse regras os alunos não se
portavam mal e que as regras existem para serem quebradas. Este aluno foi o mais
indisciplinado entre os que foram entrevistados. Dois alunos ainda referem que as regras
são muito rigorosas e exageradas.
No tocante à segunda questão, os dados do quadro mostram que os professores
definem as regras de actuação na sala de aula no início do ano lectivo.
Para esclarecer melhor a terceira questão, retirámos das entrevistas dos alunos
alguns trechos sobre o que os alunos pensam sobre a sua participação na definição das
regras. Dizem eles que:

“Sim. Para haver uma boa conduta de aula”. (entrev. Al 2);

“Sim. Porque assim os alunos a darem também essas ideias eles próprios vão ficar a saber que são
eles que estão a dar as próprias ideias para o comportamento. Se eles se portarem mal vai-lhes
pesar”. (entrev. Al 3);

170
“É essencial. Porque se eles cumprirem as suas regras não vão ter problemas para o lado deles”.
(entrev. Al 4);

“Acho que sim porque nós também entramos nisso, tanto os professores como os alunos”. (entrev.
Al 7).

Neste aspecto, mais uma vez o aluno Ruben tem opinião diferente da dos seus
colegas entrevistados. Para ele os alunos não devem participar na definição das regras da
sala de aula,

“Porque senão não nos portávamos mal porque tínhamos que cumprir as nossas próprias regras”.
(entrev. Al 5)

Ainda sobre as regras na sala de aula elaborámos o quadro XXVIII, que nos indica
qual a natureza das regras definidas. A análise do quadro permite-nos concluir que as
regras mais utilizadas na sala de aula se distribuem essencialmente por duas categorias a da
convivência social e relacional e a de carácter organizacional. Na primeira, sobressaem as
regras de boa conduta na sala de aula, nomeadamente as regras que impõem o silêncio e a
concentração, sem as quais o professor não consegue transmitir adequadamente os
conteúdos programáticos ou outros ensinamentos e as regras do respeito pelos envolvidos
no processo educativo, quer seja o professor ou os outros alunos. Na segunda categoria,
salientam-se regras que visam organizar convenientemente o funcionamento da aula com
destaque para a não utilização de objectos ou acessórios que não sejam necessários à
prossecução dos trabalhos (telemóvel, boné, etc.), regras que visam controlar as
comunicações e as movimentações na aula e ainda regras respeitantes à pontualidade,
assiduidade e ao material a utilizar na aula.

171
Quadro XXVIII: Regras mais definidas na sala de aula, segundo os alunos
entrevistados
Alunos
Categorias Subcategorias
Al 1 Al 2 Al 3 Al 4 Al 5 Al 6 Al 7
- Respeitar todos os intervenientes no processo
X X X X
educativo
Convivência - Não conversar, não fazer barulho, não brincar X X X X X X X
social e -Utilizar linguagem adequada
relacional
- Respeitar os espaços (não deixar lixo na sala) X
- Não chegar atrasado às aulas e ser assíduo X X
- Não sair do lugar sem autorização X X X
Carácter - Respeitar a ordem de intervenção e pedir
X X X
organizativo autorização para intervir
- Fazer-se acompanhar do material necessário X X
- Não utilizar na aula material ou acessórios
X X X X X X
proibidos ( MP3, telemóveis, bonés, chicletes…)
Carácter - Solicitar a intervenção dos alunos distraídos ou
preventivo conversadores
- Executar actividades diferenciadas
- Ordem de saída da sala de aula (para um local
Carácter específico e com uma tarefa)
correctivo
Realizar trabalhos das áreas curriculares

Os alunos não referiram a definição de qualquer regra respeitante às outras duas


categorias. Tal facto revela que, sem dúvida, as principais preocupações dos professores se
situam a nível do controlo das situações mais rotineiras dos alunos, aquelas que ocorrem
com mais frequência e que, embora consideradas de menor gravidade, não deixam de ter
grande influência no ambiente que se cria na sala de aula, causando grande cansaço devido
à sua repetência. As regras contidas nas duas últimas categorias são, normalmente, o
último recurso utilizado pelos professores para estabelecer o controlo disciplinar na sala de
aula.

2.3.2- Os professores e as regras na sala de aula

Os professores são os principais responsáveis pela definição de regras de


comportamento na sala de aula. Muitas vezes, são mesmo os únicos responsáveis pela sua
definição, impondo-as unilateralmente aos alunos. Para sabermos o que os professores que
participaram no nosso estudo pensam a este respeito colocámos-lhe algumas questões que
nos permitiram recolher a informação que a seguir analisaremos.

172
Neste ponto, em termos metodológicos, utilizámos questões idênticas para os nove
professores entrevistados e depois dividimos os entrevistados em dois grupos o grupo dos
professores com direcção de turma e o grupo dos professores sem direcção de turma.
As respostas à questão comum (Diga o que pensa sobre as regras de
comportamento na sala de aula) colocada a todos os professores entrevistados
encontram-se sintetizadas no quadro XXIX. Podemos constatar que todos os respondentes
consideram as regras como muito importantes, fundamentais ou necessárias. No início do
ano, todos os professores, de uma forma ou de outra, trabalham a questão das regras com
os seus alunos.

Quadro XXIX- Posicionamento dos professores entrevistados acerca das regras na sala de
aula

Professores
Regras
DT1 P2 DT3 DT4 P5 P6 DT7 DT8 P9
Não são importantes
São muito importantes / fundamentais / necessárias X X X X X X X X X
No início do ano define as regras da sala de aula Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim
Os alunos devem participar na elaboração das regras Não Sim Sim Sim Não Sim Sim Sim Sim

A participação dos alunos na definição das regras que devem ser respeitadas na sala
de aula é defendida por quase todos os professores entrevistados. Os mesmos,
pronunciando-se sobre o assunto dizem:

“Penso que os alunos conhecem as regras que devem seguir, embora não as cumpram. A sua
participação na definição das mesmas cria um compromisso por parte dos alunos, mas estes nem
sempre o respeitam”. (entrev. P2);

“Os alunos devem sugerir as regras a definir para que estas possam ser mais facilmente
interiorizadas e compreendida a sua intencionalidade. As infracções devem ser previstas e deve
haver firmeza na aplicação das regras” (entrev. P2);

“Foram estabelecidas as regras, logo no início do ano, na aula de formação cívica. Os alunos
colaboraram no estabelecimento dessas regras, concordaram com elas e comprometeram-se a
cumpri-las” (entrev. DT 3).

Os professores que têm outra opinião acerca do assunto referem que:

“Acho que os alunos não devem participar na definição das regras. Devem conhecê-las e cumpri-
las” (entrev. DT 1).

173
“Os alunos valorizam pouco a definição de regras. Alunos que já tive em anos anteriores mostram
caras entediadas quando se fala deste assunto e ignoram facilmente em sala de aula as regras
estipuladas desrespeitando-as com bastante frequência” (entrev. P5).

Relativamente às regras definidas, que apresentamos no quadro XXX, podemos


verificar que os Directores de Turma tratam esta questão de forma diferente da dos
professores que não são directores de turma. Os Directores de Turma trabalham com os
alunos todas as regras contidas no Regulamento Interno da Escola, enquanto os outros
professores procuram inculcar nos alunos as regras que mais facilmente lhes permitam
desenvolver o seu trabalho na sala de aula, quer sejam regras que se integram na categoria
da convivência social e relacional, quer sejam regras de carácter organizativo. Contudo, e
de acordo com informação recolhida das entrevistas dos Directores de Turma, as regras a
respeitar na sala de aula foram definidas em Conselho de Turma e foi também solicitado
aos professores para terem uma actuação concertada de modo a não haver actuações
díspares na aplicação das mesmas.

Quadro XXX: Regras mais definidas na sala de aula, segundo os professores


entrevistados

Professores
Categorias Subcategorias
DT1 P2 DT3 DT4 P5 P6 DT7 DT8 P9
- Respeitar todos os intervenientes no processo
X X X X X X X X
educativo
Convivência - Não conversar, não fazer barulho, não brincar X X X X X X X
social e -Utilizar linguagem adequada X X X X X X
relacional
- Respeitar os espaços (não deixar lixo na sala) X X X X X X
- Não chegar atrasado às aulas e ser assíduo X X X X X
- Definir uma planta da sala de aula X X
- Entrar ordeiramente na sala de aula X
Carácter - Não sair do lugar sem autorização X X X X X X X
organizativo - Respeitar a ordem de intervenção e pedir
autorização para intervir X X X X X X X X
- Fazer-se acompanhar do material necessário X X X X X X
- Não utilizar na aula material ou acessórios
proibidos ( MP3, telemóveis, bonés, X X X X X X X X

Carácter -chicletes…)
Solicitar a intervenção dos alunos distraídos X X
preventivo ou conversadores
- Executar actividades diferenciadas X X
- Ordem de saída da sala de aula (para um local
Carácter X X X X
específico e com uma tarefa)
correctivo
Realizar trabalhos das áreas curriculares

Verifica-se no quadro XXX que as regras definidas se distribuem por quase todas
as subcategorias que constituem as quatro categorias principais. Este indicador leva-nos a

174
concluir que, de facto, existe uma grande preocupação por parte de todos os professores no
que diz respeito aos problemas da disciplina/indisciplina na sala de aula.
Aos Directores de Turma colocámos duas questões: No início do ano como tratou
a questão das regras de comportamento com os seus alunos? Fez com eles algum
trabalho específico?
Algumas respostas obtidas ajudam-nos a perceber melhor como actuam os
Directores de Turma no plano disciplinar:

“As regras foram definidas em conselho de turma, de acordo com o regulamento interno, foram
aferidos critérios uniformes relativamente às regras a cumprir e estas foram comunicadas aos
alunos na aula de Formação Cívica. Para além disso, eu própria fiz um panfleto com as principais
regras, que entreguei aos alunos” (entrev. DT 8).

“Logo no dia da recepção aos alunos foram explicitadas as regras que teriam de respeitar na sala
de aula e na escola. Posteriormente nas aulas de Formação Cívica também foram feitos alguns
trabalhos de reflexão e algumas fichas de trabalho sobre as mesmas” (entrev. DT 7).

“Na aula de Formação Cívica foi lido o Regulamento Interno – Direitos e Deveres dos Alunos”
(entrev. DT 4).

Os extractos das entrevistas apresentados não deixam dúvidas relativamente à


actuação dos Directores de Turma no plano disciplinar da sala de aula. Porém, quisemos ir
mais longe e questionámos os Directores de Turma no sentido de auscultarmos a actuação
do Conselho de Turma sobre as regras da aula. Colocámos-lhes, para o efeito as seguintes
questões:
- Quais as orientações de actuação que o primeiro Conselho de Turma definiu
relativamente à sala de aula? Todos os elementos do Conselho de Turma colaboraram?
- O que pensa do trabalho de equipa para a prevenção dos comportamentos
indisciplinados?
Também, neste caso, as respostas parecem ser conclusivas. No respeitante às
primeiras questões, os Directores de Turma entrevistados disseram:

“Genericamente, o cumprimento do que está definido no regulamento Interno da escola, sobretudo


no que diz respeito aos deveres do aluno. Todos os elementos do Conselho de Turma colaboraram”
(entrev. DT 3).

175
“No primeiro Conselho de Turma foram acertados alguns procedimentos relativamente ao uso de
bonés, pastilhas elásticas, telemóveis, no sentido de não permitir o seu uso. Foi também defendida a
necessidade de os alunos assumirem uma postura correcta na sala de aula. Como nesta primeira
reunião ainda não se conheciam os alunos da turma, alguns ajustes de actuação foram sendo feitos
ao longo do ano” (entrev. DT 7).

“O conselho de turma definiu orientações uniformes relativamente a regras como: entrada na sala
de aula, proibição do uso do telemóvel e outros bips, bonés, pastilhas elásticas, participação
ordeira, entre outras. Acordou critérios de actuação firmes e rigorosos. Todos os elementos
colaboraram na sua elaboração” (entrev. DT 8).

O trabalho de equipa é, segundo os nossos respondentes, essencial e fundamental na


prevenção de comportamentos inadequados na sala de aula. Os Directores de Turma, órgão
de gestão intermédia por quem passam as questões disciplinares na sala de aula, dão-nos
testemunho da importância da actuação colectiva.

“É fundamental. A uniformização de procedimentos é crucial no combate à indisciplina, não só no


Conselho de Turma mas também em toda a escola” (entrev. DT 3).

“É fundamental. Os casos em que os professores cumprem as directrizes e exercem a autoridade na


sala de aula, há menos problemas. O ambiente de trabalho continua a não ser o melhor, mas as
matérias são dadas e quem quer aprende mesmo e tem oportunidade para isso” (entrev. DT 4).

“Eu penso que é muito importante que no conselho de turma haja um trabalho concertado de todos
os professores, no sentido de que todos ajam uniformemente perante as mesmas situações. Penso
que isto é muito educativo para os alunos” (entrev. DT 7).

“Julgo que é no trabalho de equipa que reside grande parte do segredo para combater a
indisciplina. Se não houver atitudes concertadas por parte de todos os intervenientes do conselho de
turma, cada um remará para seu lado” (entrev. DT 8).

Sintetizando, parece claro que alunos e professores estão de acordo que as regras na
sala de aula são importantes, necessárias e fundamentais para a criação de um ambiente
calmo que permita ao professor leccionar os conteúdos programáticos e aos alunos
interiorizarem as aprendizagens. Os principais interessados no processo de ensino-
aprendizagem concordam também que as regras devem ser definidas em conjunto para que
possam mais facilmente ser entendidas e interiorizadas por todos.

176
As regras mais explicitadas no início do ano são, segundo a percepção dos alunos,
regras de carácter organizacional e as de convivência social e relacional. As primeiras
pretendem controlar a actuação dos mesmos na sala de aula, no respeitante à não utilização
de objectos desnecessários à realização dos trabalhos escolares e que podem prejudicar as
actividades como por exemplo os telemóveis e Mp3, controlo das movimentações na aula,
salientando-se o não sair do lugar sem pedir autorização e o controlo das intervenções,
fazendo com que os alunos intervenham de forma ordeira e organizada respeitando os
colegas e o professor. As segundas pretendem estimular o respeito entre todos os actores
em presença na sala de aula e evitar atitudes incorrectas que prejudiquem os trabalhos da
aula como a conversa, o barulho e a brincadeira.
Os professores valorizam igualmente as regras de carácter organizacional e
relacional na sala de aula, embora os Directores de Turma dediquem alguma atenção a
regras de carácter preventivo e correctivo que trabalham com os alunos no início do ano
lectivo.
Parece poder concluir-se também que há alguma preocupação em envolver
colectivamente os professores de cada Conselho de Turma na definição das regras que
orientam e organizam os trabalhos da aula de forma a evitar actuações diversas perante
ocorrências disciplinares idênticas. Procura-se, assim, uniformizar critérios de actuação
que evitem mal-entendidos que podem originar situações de comportamentos
indisciplinados por parte dos alunos.

2.4- As medidas disciplinares

A ocorrência de comportamentos indisciplinados na escola leva os intervenientes


no processo educativo a adoptarem medidas disciplinares tendentes à correcção ou à
punição desses comportamentos. Os professores, na sala de aula, adoptam medidas
disciplinares para criarem um ambiente ou uma situação que lhes permita trabalhar. As
medidas disciplinares, neste caso, têm uma função iminentemente pedagógica pois visam
salvaguardar os interesses dos próprios alunos ao pretender controlar os alunos desviantes
e impedir que eles inibam os restantes elementos da turma de adquirirem as aprendizagens
que é suposto o professor promover. Para alcançar estes objectivos o professor utiliza

177
medidas correctivas que vão desde o cumprimento de actividades de integração, inibição
de participação em actividades extracurriculares, até à mudança de turma.
Noutras situações mais graves, em que os professores sentem necessidade de
afirmarem a sua autoridade pessoal na sala de aula ou de se protegerem e salvaguardarem a
sua integridade física e moral, face a pressões ou ameaças impostas pelos alunos os
professores, ou os órgãos competentes da escola, aplicam medidas disciplinares
sancionatórias que vão desde a repreensão registada, suspensão temporária da frequência
das aulas até dez dias, transferência de escola, ou expulsão definitiva do aluno do
estabelecimento de ensino.
Nesta rubrica do nosso trabalho, pretendemos saber como se posicionam os alunos
e os professores face às medidas disciplinares: quais as sanções mais aplicadas, o que
pensam da aplicação de sanções, qual ou quais os efeitos resultantes da aplicação de
sanções.

2.4.1- Os alunos e as sanções disciplinares

Sobre as sanções disciplinares na sala de aula, começámos por questionar os alunos


que entrevistámos sobre as medidas que os professores utilizam na sala de aula para
resolver os problemas de comportamentos incorrectos.
Os dados do quadro XXXI mostram que a medida disciplinar mais utilizada para
controlar os comportamentos desajustados na aula é a ordem de saída da sala, mencionada
por todos os alunos entrevistados. As admoestações verbais, vulgo ralhetes, os recados na
caderneta para os encarregados de educação e as participações aos Directores de Turma
são as outras medidas mais apontadas pelos alunos.
Estas medidas são, normalmente, utilizadas sequencialmente, sendo utilizada em
primeiro lugar a admoestação verbal, seguida de outras medidas como a mudança de lugar
ou a realização de actividades de integração e apenas em último recurso se recorre à ordem
de saída da sala de aula.

178
Quadro XXXI: Medidas disciplinares utilizadas pelos professores na sala de aula,
segundo os alunos entrevistados

Alunos
Categorias Subcategorias
Al 1 Al 2 Al 3 Al 4 Al 5 Al 6 Al 7
- Admoestação verbal (ralhete) X X X X X
- Mudança de lugar X
Medidas
- Recado na caderneta para o Encarregado de Educação X X X X
correctivas
- Participação de ocorrência ao Director de Turma X X X
- Realização de actividades de integração (fichas, pesquisas X X
- Ordem de saída da sala de aula X X X X X X X
- Repreensão registada
Medidas - Suspensão temporária da frequência das aulas (até 10
sancionatórias dias)
-- Transferência
Transferência de
de escola
escola
-- Expulsão
Expulsão definitiva
definitiva da
da escola
escola

Alguns alunos entrevistados dão-nos testemunho desta actuação ao referirem que os


professores:

“Há outros que é: tumba, voltas a abrir a boca e levas um recado. Então leva um recado. E se
voltares a abrir a boca, rua. E vai mesmo para a rua” (entrev. Al 2).

“Advertem os alunos várias vezes, optam por mandar recados na caderneta e quando os alunos
continuam mandam-nos para a rua, para o Gabinete dos Conflitos” (entrev. Al 3).
“Sim, mandam-nos calar, parar quietos, mas quando nós abusamos, claro que vamos para a rua”
(entrev. Al 4).

“Mandam calar primeiro, é uma advertência e depois mandam para a rua. Às vezes utilizam a
caderneta, mas não é muito utilizada” (entrev. Al 7).

Deve referir-se a respeito das medidas disciplinares que as medidas sancionatórias,


à excepção da repreensão registada que pode ser aplicada directamente pelos professores
na sala de aula ou fora dela, são aplicadas pelo órgão de gestão, ou mesmo pelo Director
Regional da Educação, se se tratar da mudança de escola ou da expulsão.
Outro aspecto em análise no nosso estudo é a percepção dos alunos sobre a
aplicação dos castigos na resolução dos problemas comportamentais em sala de aula.
Inquiridos sobre este aspecto os alunos pronunciaram-se e, a partir das suas respostas,
construímos o quadro XXXII.
Os respondentes das nossas entrevistas, de uma forma geral, concordam com a
aplicação de sanções aos alunos que têm comportamentos indisciplinados na sala de aula.
Apenas dois responderam que concordavam com algumas, o que pressupõe a sua não

179
concordância com outras. Note-se, no entanto, que não há um único aluno dos que foram
entrevistados que discorde da aplicação de sanções para impor a disciplina na sala de aula.

Quadro XXXII: Percepção dos alunos entrevistados sobre os castigos na sala de aula

Alunos
Grau de concordância
Al 1 Al 2 Al 3 Al 4 Al 5 Al 6 Al 7
Não concordo
Concordo com alguns X X
Concordo X X X X X

As entrevistas dos alunos explicam as suas opiniões sobre a aplicação de castigos


para controlar os comportamentos.

“Concordo com alguns. Depende deles.Com as faltas disciplinares não, nem com as participações.
Ir para a rua está bem, mas sem falta” (entrev. Al 1).

“Claro que concordo, não é? Se nos portamos mal temos que ter um castigo que é para nos fazer
ver, mas muitas vezes nunca vemos nada ainda ficamos revoltados e só pensamos em vingar-nos.
Mas os castigos são bons” (entrev. Al 2).
“Concordo com eles, porque senão um aluno vai continuar sempre um ano inteiro a fazer as
mesmas coisas, piorar até, e se não fizerem nada nunca aprende. A tendência será sempre a fazer
pior” (entrev. Al 3).

“Eu concordo com os castigos porque é uma maneira da pessoa pensar naquilo que fez e se calhar
não voltar a fazer o mesmo” (entrev. Al 4).

“Concordo. Concordo porque o erro é nosso e temos que pagar pelos nossos erros” (entrev. Al 5).

“Acho bem porque é uma maneira dos alunos aprenderem, mas têm que ser feitos… têm que ser
bem aplicados. Às vezes concordo. Depende do castigo. Se o castigo for bem aplicado, concordo. Se
for aplicado na altura certa e da maneira certa, se for justo” (entrev. Al 5).

As conclusões que podemos tirar dos excertos apresentados são inequívocas. Os


alunos percepcionam os castigos ou sanções como necessários e úteis. Têm perfeita noção
dos seus erros e vêem nas sanções a forma de tentar corrigi-los. Estas conclusões têm ainda
mais validade se atendermos ao facto de que todos os alunos entrevistados foram
confrontados com várias situações de comportamentos incorrectos na sala de aula e, em
resultado desses comportamentos, sofreram sanções.

180
O aluno Carlos (Al 5), na sua entrevista, levanta uma questão que nos parece de
grande importância. Diz que: “Se o castigo for bem aplicado, concordo. Se for aplicado na
altura certa e da maneira certa, se for justo”. Coloca a questão do “timing” da aplicação
do castigo, que deve ser aplicado logo após a ocorrência da infracção, como defendem
alguns autores42. Refere ainda a questão da justiça, pois os alunos têm uma percepção
bastante correcta de quando os castigos são justos ou injustos. Se o aluno considera um
castigo aplicado como injusto, esse castigo irá agravar uma situação que o professor
percepcionou como indisciplinada. Este aspecto conduz-nos a outro patamar da nossa
análise: quais os efeitos da aplicação de sanções por parte dos professores sobre os seus
alunos?
Começámos por tentar saber o que sentem os alunos quando são castigados. A
aluna Ana respondeu que “podem ficar revoltados” (entrev. Al 1). O aluno Rui referiu que
os alunos “Revoltam-se, não pensam no que fizeram, vingam-se” (entrev. Al 2). Para o
Pedro, os alunos

“Ficam chateados, como é obvio, ficam sempre chateados, mas se eles… são os próprios alunos que
fazem as asneiras devem aceitar, devem assumir as coisas e respeitar o que o professor…” (entrev.
Al 3).

O Diogo tem uma opinião um pouco diferente. Para ele,

“Depende. Há uns que se sentem orgulhosos por serem castigados porque fizeram asneiras. Há
outros que enfiam o barretezinho e o rabinho entre as pernas e não voltam a fazer o mesmo.
Depende muito das pessoas. Eu sinto-me envergonhado” (entrev. Al 4).

O aluno Ruben apresenta-nos uma ideia bastante diferente. Quando era castigado diz que
se sentia bem.

“Conforme. Eu sentia-me bem. Alguns sentem-se mal, mas eu sentia-me bem, porque não curtia
estar na sala e por isso é que fazia asneiras” (entrev. Al 5).

O aluno José apresenta uma razão muito semelhante à do seu colega Ruben. Para ele, os
alunos ficam

42
Para Docking (1987) para que o castigo produza efeito “é necessário que ele ocorra imediatamente após o
comportamento “desviante” em causa, como preconizam as técnicas behavioristas de “mudança de
comportamento” (Amado, 2001: 176).

181
“Um pouco chateados e com uma revolta, um pouco de revolta. Eu muitas das vezes vou para a rua
porque quero e faço de propósito, quando ando assim um pouco mal comigo próprio” (entrev. Al
6).

Finalmente, o nosso último entrevistado diz que

“Sentem… acho que ninguém gosta de ser contrariado. Revoltados não digo, às vezes eu até levo
um castigo na boa. Acho que depende da pessoa que está à frente. Se for uma pessoa que eu gosto
eu levo o castigo, cumpro e nem reclamo. Se for uma pessoa que eu não gosto ou acho que esse
castigo está mal feito, reclamo” (entrev. Al 7).

Os sentimentos que os castigos despertam nos alunos são variados: revolta,


vingança, vergonha, orgulho, satisfação e bem-estar. Há alunos que provocam situações
para serem expulsos da sala de aula e que, normalmente, são sujeitos no decorrer do ano
lectivo a um ou mais processos disciplinares, como foi o caso dos nossos entrevistados Al
5 e Al 7.
Sobre os efeitos das sanções, perguntámos aos alunos entrevistados se o
relacionamento entre alunos e professores seria prejudicado pela aplicação dos castigos.
Como podemos verificar no quadro XXXIII, apenas dois alunos acham que o
relacionamento entre docentes e discentes sai prejudicado com a aplicação de sanções. Um
diz que os castigos não têm influência na relação professor-aluno e quatro são de opinião
que às vezes o relacionamento pode degradar-se devidos aos castigos que o professor
aplica.

Quadro XXXIII: Influência dos castigos no relacionamento com os professores.

Percepção Alunos entrevistados


Al 1 Al 2 Al 3 Al 4 Al 5 Al 6 Al 7
Prejudica o relacionamento X X
Não prejudica o relacionamento X
Às vezes prejudica o relacionamento X X X X

Os alunos Pedro e Ruben foram os que responderam que o relacionamento é


prejudicado devido ao castigo. Nas suas entrevistas dizem, respectivamente,

“Por um lado sim, acho que sim porque o aluno começa a ficar chateado com o professor por ser
advertido muitas vezes, por ir para a rua muitas vezes, mas por outro acho que deve aceitar as
ordens que o professor lhe dá” (entrev. Al 3).

182
“Prejudica. Porque a gente não gosta, por mais asneiras que a gente faça não gostamos de ser
castigados. Às vezes mesmo que a gente a gente não se porte mal os professores só para sermos os
mesmos a actuar, viram-se logo para nós, mesmo que seja outro colega a fazer, viram-se logo para
nós. É a mania da perseguição” (entrev. Al 5).

Das entrevistas dos alunos que responderam que o relacionamento entre alunos e
professores às vezes sai prejudicado, extraímos as seguintes opiniões:

“Às vezes. Às vezes os alunos quando recebem o castigo ficam revoltados e depois amuam,
normalmente, com o professor. Depois a situação acaba por ser esquecida” (entrev Al 1).

“Depende. Depende do castigo. Nós quando recebemos um recado pronto, o resto da aula nós
ficamos calados, é pá, com uma vontade de pegar na mochila e ir embora.(…) E os professores de
vez em quando fazem de conta que vão marcar falta e nós aí chau, dizemos Adeus e saímos da sala
assim à bruta. Aí o relacionamento acaba por ser péssimo. (…) O relacionamento pode é ir
piorando à medida que o professor vá marcando muitos recados ou muitas faltas. Então, aí é que é,
aí chegamos lá e para a próxima já não vimos à aula. Há colegas meus que entram e saiem logo,
então aí estão lixados.” (entrev Al 2).

“Depende. Se há casos que o professor manda para a rua um aluno quando foi provocado por
outro, por exemplo quando um aluno começa a fazer brincadeira e o outro risse e esse que se riu
vai para a rua eu acho que é uma injustiça, mas há aqueles casos em que se o aluno fizer asneiras e
for para a rua justamente eu acho que não devia ter revolta porque eu acho que só devia sentir um
pouco de revolta quando é injustiçado, porque de resto…” (entrev Al 6).

“Às vezes, às vezes prejudica. Quando são muitos castigos, uma pessoa começa a ficar farta,
começa a não ligar a esse professor e às vezes até a tratá-lo mal. Se o castigo for esporadicamente
não afecta a relação” (entrev Al 7).

O aluno Diogo foi o único que referiu que os castigos não influenciam o
relacionamento entre professores e alunos na sala de aula. Para este aluno, poderá existir
um conflito se o castigo for mal aplicado e o aluno se sentir injustiçado. Diz que

“Não. Eu acho que não. Também depende do aluno. Se o professor tiver razão e o aluno perceber
que tem razão acho que não há problemas. Agora se o aluno tiver razão e o professor achar que
não, é que há ali um conflito, se calhar vai dar um bocado para o torto” (entrev Al 4).

183
Para finalizarmos a temática das sanções e as percepções que os alunos têm das
mesmas, quisemos saber o que os alunos entrevistados pensam sobre a influência que os
castigos podem ter sobre a mudança de comportamentos, colocando-lhe a seguinte questão:
- O castigo pode ajudar a adquirir hábitos de bom comportamento? Porquê?
Para complementar a nossa informação, colocámos, aos quatro alunos (Al 4, Al 5;
Al 6 e Al 7) que foram alvo de procedimento disciplinar, outra questão que ajudou a
esclarecer e complementar a anterior:
- Achas que o castigo que cumpriste vai evitar que no futuro tenhas comportamentos
indisciplinados? Porquê?
Podemos verificar no quadro XXXIV que quatro alunos são de opinião que os
castigos ajudam a adquirir hábitos de bom comportamento, um diz que não e dois
respondem que às vezes os castigos ajudam a que os alunos modifiquem os seus
comportamentos. Note-se, contudo, que parece haver aqui uma contradição pois, das
respostas dadas pelos mesmos alunos podemos, inferir que, exceptuando um, todos os
outros dizem que repetem situações que foram sancionadas.

Quadro XXXIV: Castigo e hábitos de bom comportamento, segundo os alunos


entrevistados

Alunos entrevistados
Percepção
Al 1 Al 2 Al 3 Al 4 Al 5 Al 6 Al 7
Ajuda a adquirir hábitos de bom comportamento X X X X
Não ajuda a adquirir hábitos de bom comportamento X
Às vezes ajuda a adquirir hábitos de bom comportamento X X
Repete situações que foram sancionadas Às vezes Sim Sim Não Sim Sim Sim

Sobre a relação entre castigo e hábitos de bom comportamento, os alunos


entrevistados que se pronunciaram afirmativamente disseram:

“Sim. Porque assim as pessoas aprendem que fizeram mal” (entrev.Al 1).

“ Sim. Então porque os alunos vão-se portando mal, vão-se portando mal e depois são castigados.
E eles quantos mais castigos houverem melhor, quantos mais tiverem cada vez aprendem mais, vão
aprendendo, aprendendo até que um dia começam a fazer muito pouco. Quantos mais castigos
forem, a tendência é para os comportamentos melhorarem” (entrev.Al 3).

“Pode. Porque se for bem aplicado o aluno pensa no que fez e ao pensar naquilo que fez vai tentar
mudar, leva-o a reflectir no seu comportamento e a tentar mudar” (entrev.Al 7).

184
Para os alunos Rui e José a situação não é tão clara e o castigo apenas ajuda a
adquirir hábitos de bom comportamento às vezes. Estes alunos referem respectivamente
que,

“Alguns, que nós chamamos os totós, que vão para a rua e pronto, a partir daí ficam calados,
quietos, aí o castigo resolveu tudo, já nunca mais falam. Os outros, prontos é mais uma falta. Vêm
aquilo, é mais uma falta. Mais uma, menos uma…Na aula a seguir já estão a fazer a mesma coisa.
Há uns que vão para a rua logo ao primeiro tempo, vêm no segundo tempo e fazem a mesma
porcaria. Depois vão suspensos e quando chegam tornam a fazer a mesma porcaria. (…) Mas
alguns é impossível, logo, só mesmo a expulsão e mesmo assim… ei, expulsão, fixe… não vou ter
aulas o resto do ano, prontos. Está a ser legal. É uma festa para eles” (entrev.Al 2).

“Depende. Depende do relacionamento com o professor. Se era muito bom e foi castigado, pode
melhorar, pode ser para tentar remediar o erro. Se o relacionamento for mau, pode piorar cada vez
mais” (entrev.Al 6).

O aluno Ruben foi o único a admitir que os castigos não contribuem para a
melhoria dos comportamentos dos alunos. Afirma peremptoriamente na sua entrevista que
“Não. Só piora. Porque a gente depois vai revoltados para a aula com esse professor e
ainda faz pior” (entrev. Al 5).
Aos alunos a quem foi instaurado processo disciplinar perguntámos se o castigo
cumprido iria evitar que no futuro repetissem o comportamento ou comportamentos que
tinham sido sancionados e, à excepção do Diogo, que afirmou que sim, os outros três
responderam que não. O Diogo disse que,

“acho que sim que vai evitar, vai evitar porque a mentalidade é outra, as pessoas crescem e se
calhar não voltam a fazer o mesmo. No meu caso pelo menos é assim. Este comportamento teve a
ver com o professor e com a idade, com as companhias com que andava, essas coisas influenciam
tudo” (entrev. Al 4).

Os restantes alunos justificaram as suas respostas dizendo:

“Não, porque vou sempre ter tendência a fazer pior” (entrev. Al 5).

“Não, porque daqui a poucos dias já vou ter outro castigo” (entrev. Al 6).

“Acho que não. Não, foi um dia, um dia acho que não, não muda as ideias” (entrev. Al 7).

185
O Carlos, último aluno entrevistado, refere, no entanto, que a duração e a dureza do
castigo pode ter influência na mudança de comportamentos. Para ele,

“Se em vez de um dia forem mais, o aluno vai pensar mais seriamente, porque vê… em risco, por
causa das faltas, por causa de depois não acompanhar a matéria. Aí é que o castigo começa a ser
mais sentido, e aí o aluno já pensa e o castigo pode ter resultados” (entrev. Al 7).

Sintetizando, podemos dizer que os professores na sala de aula tentam manter a


disciplina recorrendo à aplicação de sanções. As mais utilizadas são as admoestações
verbais, as mensagens via caderneta para os encarregados de educação, as participações de
ocorrência aos Directores de Turma e as ordens de saída da sala de aula.
De uma forma geral, os alunos concordam com a aplicação de sanções, acham-nas
úteis desde que sejam aplicadas no momento certo e com justiça. A aplicação de sanções
provoca nos alunos sentimentos diversos que passam pela revolta, vingança, vergonha,
orgulho, prazer… A maioria não vê na aplicação de castigos motivo para a degradação das
relações professor-aluno desde que, como anteriormente se disse, esses castigos sejam
percepcionados como justos e merecidos.
Mais de metade dos alunos entrevistados acha que a aplicação de sanções pode
ajudar a adquirir hábitos de bom comportamento embora quase todos admitam que repetem
comportamentos que foram anteriormente sancionados pelos seus professores ou por
outros órgãos competentes da escola.

2.4.2- Os professores e as medidas disciplinares

Os professores constituem o segundo grupo de actores do microcosmos que é a sala


de aula e são eles que aplicam as medidas disciplinares correctivas e algumas
sancionatórias. Com as nossas entrevistas, quisemos recolher informação que nos
permitisse saber como percepcionam os professores as questões disciplinares na sala de
aula, relativamente às sanções e seus efeitos sobre os alunos.
O primeiro aspecto abordado diz respeito à percepção que os professores têm sobre
a aplicação de sanções para resolver os problemas de indisciplina na sala de aula. Com
base nas respostas dos nossos entrevistados, construímos o quadro XXXV, onde podemos
verificar que quase todos os professores declararam concordar com as sanções e à

186
excepção de uma professora que na sua entrevista disse que “A sanção deve existir, mas a
minha experiência também me tem demonstrado que não serve de nada” (entrev. DT1), os
restantes classificaram as sanções como importantes, necessárias, indispensáveis e até
pedagógicas.

Quadro XXXV: Posicionamento dos professores entrevistados acerca das sanções


aplicadas na sala de aula para resolver os problemas de indisciplina

Professores
Percepções
DT1 P2 DT3 DT4 P5 P6 DT7 DT8 P9
Concordo X X X X X X X
Concordo com algumas
Não servem de nada X
São importantes, necessárias, indispensáveis X X X X X X

Das entrevistas, recolhemos alguns excertos que explicam melhor os dados do


quadro XXXVII:

“Eu penso que é pedagógico, quer para os alunos indisciplinados, quer para os colegas perceberem
que os maus comportamentos não ficam impunes. Embora sendo necessárias, no entanto não me
parece que seja esta a forma de resolver os problemas de indisciplina, pois não é com a sanção que
se vai à "raiz" do problema da indisciplina” (entrev. DT7).

“Talvez seja uma via necessária, quando outras estratégias falham” (entrev. P2).

“As sanções são muitas vezes um instrumento de que o professor se socorre para fazer impor a
disciplina. As sanções são gradativas e por vezes resultam” (entrev. P5).

“São indispensáveis. As sanções ajudam os alunos a tomar consciência da gravidade dos seus
comportamentos e ajudam a prevenir futuros problemas” (entrev. P6).

Parece evidente a importância atribuída pelos professores às sanções que aplicam


aos alunos na sala de aula. No ponto seguinte tentaremos apurar quais as sanções mais
utilizadas pelos professores na aula. Metodologicamente, utilizámos as mesmas categorias
aplicadas à análise das entrevistas dos alunos. No quadro XXXVI reunimos os dados
colhidos das entrevistas efectuadas aos professores. Verificamos no quadro que a sanção
mais utilizada pelos professores para manter o controlo na sala de aula e para conseguir o
ambiente que lhe permita ensinar os alunos é a ordem de saída da aula. Quatro professores

187
referem que utilizam as advertências orais, três as participações de ocorrência aos
Directores de Turma e dois os recados na caderneta. Também podemos verificar que
alguns professores referem mais do que uma sanção. Os procedimentos adoptados
envolvem, normalmente, vários momentos, começam com advertências ou chamadas de
atenção orais, muitas vezes repetidas mais do que uma vez. Quando os alunos teimam em
não respeitar as orientações, acabam por receber ordem de saída da sala de aula.

Quadro XXXVI: Medidas disciplinares utilizadas pelos professores na sala de aula

Professores
Categorias Subcategorias
DT1 P2 DT3 DT4 P5 P6 DT7 DT8 P9
- Admoestação verbal (ralhete) X X X X
- Mudança de lugar
- Recado na caderneta para o Encarregado de
Medidas X X
Educação
correctivas
- Participação de ocorrência ao Director de
Turma X X X
- Realização de actividades de integração X
(fichas,
- Ordempesquisas
de saída da sala de aula X X X X X X X X
- Repreensão registada
Medidas -- Suspensão
Suspensão temporária
temporária da
da frequência
frequência das
das aulas
aulas
sancionatórias (até 10
(até 10 dias)
dias)
-- Transferência
Transferência de
de escola
escola
- Expulsão definitiva da escola
- Expulsão definitiva da escola

Os professores, nas suas entrevistas, confirmam os dados apresentados no quadro.


A única professora que não recorre à ordem de saída da sala de aula referiu que

“Normalmente fico-me pelo “sermão”… diálogo com o aluno para lhe tentar demonstrar o certo e
o errado” (entrev. DT1).

Os restantes professores utilizam, entre outras medidas, a ordem de saída da sala de


aula. Dizem eles:

“Os professores começam por mandar recados na caderneta. Quando não conseguem resolver os
problemas por este meio utilizam a ordem de saída da sala de aula com a consequente participação
de ocorrência ao Director de Turma” (entrev. DT3).

“Advertência oral e ordem de saída da sala de aula” (entrev. DT4).

“A medida preventiva e de integração mais aplicada ao longo do ano foi a ordem de saída da sala de
aula” (entrev. DT7).

188
“Ordem de saída da sala de aula com falta disciplinar, participações de ocorrência e recados na
caderneta” (entrev. DT8).

“Saída para a sala de conflitos, com tarefas para executarem” (entrev. P2).

“Começo por fazer advertências e, se isso não for suficiente mando sair da sala de aula com
marcação de falta e encaminhamento para o “Gabinete de Conflitos” com orientação para resolução
de uma ficha de actividades, previamente preparada” (entrev. P5).
“Quando um aluno se porta mal, a primeira coisa que faço é mudá-lo de lugar. Outras sanções que
aplico é a atribuição de tarefas complementares da aula, a expulsão da sala de aula, embora esta
raramente seja utilizada, a comunicação da ocorrência ao Director de Turma e algumas vezes
recados ao Encarregado de Educação pela da caderneta do aluno” (entrev. P6).

“Peço aos alunos para saírem, mas fico sempre incomodada com a situação porque acho que o lugar
do aluno é na sala de aula” (entrev. P9).

Sobre as sanções aplicadas na sala de aula, podemos concluir que as opiniões dos
professores vão ao encontro das dos alunos, pois tanto uns como os outros referem que o
principal castigo utilizado quando os alunos praticam comportamentos desviantes é a
ordem de saída da aula, encaminhando-os para o Gabinete de Conflitos.
Pretendemos seguidamente saber o que pensam os professores sobre os efeitos que
a aplicação de sanções produz nos alunos, se elas ajudam a adquirir hábitos de bom
comportamento, ou seja, a corrigir os comportamentos indisciplinados e se os alunos a
quem são aplicados os castigos repetem os comportamentos que originaram esses castigos.
Pela análise do quadro XXXVII, podemos verificar que, à excepção do professor
DT1, para quem os castigos não ajudam a adquirir hábitos de bom comportamento, para os
restantes professores as sanções produzem efeitos sobre os comportamentos, mas para
cinco dos nove entrevistados apenas ajuda a adquirir hábitos de bom comportamento às
vezes e em determinadas circunstâncias, como veremos nos excertos das entrevistas que
apresentamos seguidamente. O quadro mostra-nos também que, segundo todos os
professores que entrevistámos, os alunos têm tendência a repetir os comportamentos
indisciplinados que deram origem à aplicação de sanções. Esta situação confirma, assim,
que os castigos, em determinadas situações, surtem algum efeito sobre os desvios
disciplinares que ocorrem na aula, extinguindo-os ou melhorando-os.

189
Quadro XXXVII: Efeitos das sanções sobre os hábitos de bom comportamento dos
alunos, segundo os professores entrevistados

Professores
Percepções
DT1 P2 DT3 DT4 P5 P6 DT7 DT8 P9
Ajuda a adquirir hábitos de bom
X X X X
comportamento
Não ajuda a adquirir hábitos de bom
X
comportamento
Às vezes ajuda a adquirir hábitos de bom
X X X X
comportamento
Repete comportamentos que foram Por Por Por Por Por Por Por
Sim Sim
sancionados vezes vezes vezes vezes vezes vezes vezes

Nas entrevistas, os professores confrontados com a questão da influência das


sanções sobre a aquisição de hábitos de bom comportamento afirmaram as suas posições
referindo que:

“Não. Os alunos perderam o respeito e o medo, ou nunca adquiriram nenhum deles”. (entrev.
DT1).

“Pode repetir, sobretudo se o castigo não for entendido como tal. O que é difícil hoje em dia é
castigar um aluno, pois é difícil entender o que é que o aluno entende como uma punição por um
acto errado que fez” (entrev. DT3).

“Se a família colaborar, sim. A sanção é reforçada em casa e o aluno sabe que quem manda são os
pais e os professores. Caso contrário, não, porque nenhuma autoridade é reconhecida, nem dos
pais nem dos professores” (entrev. DT4).
“Pode ajudar, mas por si só não basta. Ainda que normalmente os alunos indisciplinados são
aqueles com quem se tem menos prazer de trabalhar, muitas das vezes são os que mais precisam da
nossa ajuda” (entrev. DT7).

“Não é regra geral, mas alguns sentem-se feridos no seu orgulho e não repetem. Penso que a
relação com a família e a actuação posterior desta pode ser determinante para evitar situações de
mau comportamento” (entrev. P2).
“Pode ajudar a impor a disciplina até porque o aluno percebe que há regras e que o desrespeito
destas tem sanções e penalizações. Se o aluno tem um comportamento indisciplinado e nada lhe
acontece, facilmente se repetem as situações pois o aluno nada teme” (entrev. P5).

“Acho que é capaz de repetir, só não repete tantas vezes. Se a punição for bem aplicada servirá de
ensinamento ao aluno” (entrev. P6).

190
Relativamente à repetição dos comportamentos anteriormente sancionados, os
docentes entrevistados deixaram os seus testemunhos:

“Regra geral, sim. Aprenderam a desrespeitar a instituição escola e sabem que em casa vão ter as
“costas quentes” pelos pais ou educadores” (entrev. DT1).

“Pode repetir, sobretudo se o castigo não for entendido como tal. O que é difícil hoje em dia é
castigar um aluno, pois é difícil entender o que é que o aluno entende como uma punição por um
acto errado que fez” (entrev. DT3).

“Umas vezes, sim, outras vezes, não. Se houver colaboração dos pais é mais difícil que isso
aconteça” (entrev. DT4).

“Pode repetir, porque com a aplicação da sanção não se vai à raiz do problema da indisciplina”
(entrev. DT7).

“Pode repetir, mas se não for sancionado repeti-lo-á consecutivamente e levará outros a fazê-lo”
(entrev. DT8).

“Por vezes, apesar de sancionado o aluno poderá incorrer na repetição de situações de indisciplina
mas isso será uma situação de excepção. Normalmente a sanção tem algum peso” (entrev. P5).

“Acho que é capaz de repetir, só não repete tantas vezes. Se a punição for bem aplicada servirá de
ensinamento ao aluno” (entrev. P6).

“Muitas vezes sim. Não está habituado a que lhe ponham limites e lhe digam não, infelizmente”
(entrev. P9).

Sintetizando, conclui-se que os professores aplicam sanções na sala de aula


conscientes que elas produzem algum efeito na modificação dos comportamentos
indisciplinados dos alunos. As sanções são, assim, necessárias e indispensáveis no
processo educativo. Têm consciência, também, que essas mudanças não são permanentes
uma vez que os alunos têm tendência a repetir comportamentos que foram sancionados.
Contudo, se não existissem sanções, não se conseguiria trabalhar nas escolas, pois alguns
alunos perderam o respeito pelos professores e pela instituição.
Alguns professores, sobretudo Directores de Turma, chamam a atenção para alguns
aspectos interessantes que ajudariam a resolver alguns comportamentos menos correctos
por parte dos alunos, como é o caso de uma maior intervenção das famílias nas questões

191
disciplinares, para que os alunos sintam que existe consenso entre as posições assumidas
pelos professores e pela escola com as posições assumidas pelas famílias. Chamam
também a atenção para a questão da aplicação dos castigos que deve ser feita de forma
correcta e justa, uma vez que as injustiças podem agravar ainda mais as situações criadas.

2.5- Os órgãos de gestão e a indisciplina na escola

Os problemas disciplinares nas escolas, em termos processuais, passam por dois


órgãos de gestão com incumbência directa na sua organização e resolução: um órgão de
gestão intermédia que é o Director de Turma e o órgão de gestão principal da escola, o
Conselho Executivo.

2.5.1- Gestão Intermédia - o papel do Director de Turma

O Director de Turma desempenha um papel crucial no sistema de ensino em


Portugal. Compete-lhe estabelecer a ligação entre a escola e a família, recebendo os
Encarregados de Educação dos alunos da turma aos quais transmite informações
relacionadas com o percurso escolar dos educandos, no plano das aprendizagens e no plano
comportamental. Compete-lhe estabelecer a ligação entre todos os professores que
compõem o Conselho de Turma, presidindo a reuniões, propondo medidas a adoptar para
melhorar o rendimento e comportamento da turma e ouvir propostas dos outros professores
no mesmo sentido.
No plano disciplinar, o ponto 10º da Portaria nº 921/92, que define as competências
do Director de Turma, estabelece na alínea f) que compete ao Director de Turma:

“Apreciar ocorrências de insucesso disciplinar, decidir da aplicação de medidas imediatas no quadro


das orientações do conselho pedagógico em matéria disciplinar e solicitar ao director executivo a
convocação extraordinária do conselho de turma”;

Sendo esta uma das competências do Director de Turma, quisemos saber dos
nossos entrevistados que desempenham esta função quais os meios que levam ao seu
conhecimento as ocorrências de indisciplina dos alunos na sala de aula, que apresentamos
no quadro XXXVIII.

192
Quadro XXXVIII: Meios utilizados pelos professores para participarem os
comportamentos de indisciplina na sala de aula

Directores de Turma
Meios utilizados DT1 DT3 DT4 DT7 DT8
Participações de ocorrência escritas X X X X X
Relatos orais X X X X X
e-mail X

Questionámos também os Directores de Turma sobre os meios que a escola tem ao


seu alcance para resolver os problemas de indisciplina. As respostas são bastante
esclarecedoras. Para os Directores de turma a escola não possui os meios necessários para
resolver as questões de indisciplina. Apontam mesmo aspectos que deveriam existir na
escola para solucionar estas questões. Apresentamos algumas respostas recolhidas:

“Não tem. Seria necessário que as turmas fossem mais pequenas, que a escola tivesse mais
funcionários para vigiar e acompanhar os alunos, por exemplo quando recebem ordem de saída
da sala de aula, penas mais pesadas, fossem elas quais fossem, deveria existir um grupo de
pessoas que tratassem dos procedimentos disciplinares, de forma a agilizar os processos”.
(entrev. DT 3)

“A escola tem as leis e não os meios. O tempo que isso consome, as burocracias, as averiguações
sumárias, as testemunhas… a transposição do sistema judicial para a escola resulta que muitos
professores não participam as ocorrências. Cometer uma infracção no final do ano é igual a
impunidade.
O Gabinete de Gestão de Conflitos da nossa escola é uma óptima ideia e devia funcionar a todas
as horas” (entrev. DT 4)

“Eu acho que a escola não tem os meios necessários para resolver os problemas de indisciplina e
acho ainda que a resolução dos problemas de indisciplina não é só tarefa da escola. A indisciplina
é também uma questão familiar, social.
Ao nível da escola penso que era importante continuar a haver uma maior uniformidade na
actuação por parte de todos os professores e investir mais na prevenção” (entrev. DT 8)

“Não. Seria necessário regras mais rígidas e sanções mais severas, como existem noutros países
europeus em que a indisciplina quase não existe; turmas mais pequenas, maior envolvimento dos
pais na educação dos filhos…” (entrev. DT 8)

193
Finalmente, quisemos saber a opinião dos Directores de Turma sobre a legislação
relativa à indisciplina na escola e se as medidas existentes são suficientes e eficazes. As
respostas dadas pelos entrevistados não deixam dúvidas, os professores, mais directamente
envolvidos com as questões da indisciplina, acham que

“Não são eficazes por serem muito morosas. Falta uma forma de tornar todo este processo menos
burocrático e mais rápido. Falta talvez implicar mais o aluno na sua própria recuperação” (entrev.
DT 3).

“As medidas são suficiente mas não eficazes. Falta actuar na hora e não passada uma semana. Os
castigos tardam em chegar, quando chegam já não produzem efeito, os pais ameaçam os filhos mas
não cumprem. Exemplo: “Eu disse-lhe que se ele se portasse mal, o mudava de escola” – um mês
depois “tenho medo que ele fique ainda mais revoltado”. Resultado, a criancinha continua na
escola e, por uma questão de opções, na mesma turma do grande amigo e companheiro de
disparates” (entrev. DT 4).

“No meu entender mais do que serem suficientes ou não, muitas das vezes penso que falta coerência
entre o que está legislado e o que se faz efectivamente. Em termos de medidas legislativas penso que
era importante haver mais firmeza e uniformidade na aplicação das mesmas” (entrev. DT 7).

“Não. Falta dar mais poder aos professores e à escola, para aplicar medidas mais severas” (entrev.
DT 8).

2.5.2- Direcção Executiva – o papel do Presidente do Conselho Executivo

O Decreto-Lei nº 115-A/98 de 4 de Maio estabelece no Artigo 18º, secção II, as


competências do Presidente do Conselho Executivo. Em matéria disciplinar, pode ler-se na
alínea c) Exercer o poder hierárquico, designadamente em matéria disciplinar, em relação
ao pessoal docente e não docente, e na alínea d) Exercer o poder disciplinar em relação
aos alunos. Estas duas alíneas foram textualmente reproduzidas no Regulamento Interno
da escola, na secção II, artigo 21º, alíneas d) e e).
As competências do Presidente do Conselho Executivo são também fixadas na
secção IV, capítulo V, da Lei 3/2008. Esta lei, no seu Artigo 43º, estipula, no ponto 1:

“Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 27.º, em que a competência é do professor titular da
turma, a competência para a instauração de procedimento disciplinar por comportamentos

194
susceptíveis de configurarem a aplicação de alguma das medidas disciplinares sancionatórias
previstas nas alíneas c) e d) do n.º 2 do artigo 27.º, é do presidente do conselho executivo ou
director, devendo o despacho instaurador ser proferido no prazo de um dia útil, a contar do
conhecimento concreto e preciso da situação.”

O artigo 45º, referente à instauração do procedimento disciplinar, estabelece que,

“Presenciados que sejam ou participados os factos passíveis de constituírem infracção disciplinar, o


presidente do conselho executivo, ou o director, tem competência para instaurar o procedimento
disciplinar, devendo fazê-lo no prazo de um dia útil, nomeando logo o instrutor, que deve ser um
professor da escola, salvo qualquer impedimento.”

O Artigo 46.º, que se refere à tramitação do procedimento disciplinar, decreta, no ponto 4


que,

“O relatório do instrutor é remetido ao presidente do conselho executivo ou ao director, que, de


acordo com a medida disciplinar a aplicar e as competências para tal, exerce por si o poder
disciplinar ou convoca, para esse efeito, o conselho de turma disciplinar, que deve reunir no prazo
máximo de dois dias úteis.”

O presidente do Conselho Executivo é, segundo a legislação apresentada, o


responsável máximo pela aplicação das sanções disciplinares nas escolas. A respeito das
questões disciplinares na escola, objecto do nosso estudo, entrevistámos o(a) presidente do
Conselho Executivo a fim de recolhermos a sua opinião sobre a indisciplina nesta escola.
Começámos por lhe perguntar se é política da escola definir claramente regras de
actuação para todos os intervenientes no processo de ensino-aprendizagem. Respondeu,

“Sim. No início do ano lectivo, em Conselho de Turma, definem-se regras comuns de actuação, por
exemplo: o aluno não deverá permanecer na aula com boné na cabeça, ou não poderá mastigar
pastilha elástica. Na prática, verifica-se que a actuação não é uniforme e varia de professor para
professor, de turma para turma. Também o Regulamento Interno refere um conjunto de deveres do
aluno, que implicam regras de comportamento na Escola.”

Complementou que a definição das regras competia, no caso das regras básicas ao
Conselho de Turma, sendo o Regulamento Interno da responsabilidade do conselho
Executivo, Conselho Pedagógico e Assembleia de Escola.
Questionado(a) sobre a indisciplina na escola e na sala de aula referiu que,

195
“No caso desta Escola, as situações de indisciplina são recorrentes. Normalmente são os mesmos
alunos que protagonizam essas situações. Creio que as situações de indisciplina decorrem da
demissão das famílias, na maior parte, mas, pontualmente, também da falta de autoridade do
professor.”

Os comportamentos de indisciplina que mais ocorrem neste estabelecimento de


ensino, segundo o(a) seu presidente, são:

“Nesta escola, fora da sala de aula, as situações de indisciplina prendem-se, na sua maioria, com
questões de roubo de telemóveis, bullying e, pontualmente, com má educação para com as
funcionárias. Dentro da sala, são as situações de desobediência ao professor, incorrecção no modo
como se dirige ao mesmo e ainda as situações de conversa e brincadeira com os colegas.”

Quanto à gravidade dos comportamentos, o(a) nosso(a) entrevistado(a) informou


que,

“Considero muito graves as situações de agressão, roubo, bullying e má educação para com os
professores. Considero graves as situações de mau comportamento dentro da sala, brincadeiras e
conversas, por exemplo, desde que não incluam incorrecção para com o professor.”

Quisemos saber a opinião do(a) Presidente sobre os motivos que levarão os alunos
a ter comportamentos indisciplinados na sala de aula. Pronunciou-se, dizendo que,

“A principal razão prende-se com a falta de regras que deveriam ter sido transmitidas pelas
famílias, concretamente regras de saber estar numa escola e de obedecer aos professores. Por vezes
é a própria família que desautoriza a Escola. O funcionamento da sociedade actual também pode
influenciar os nossos jovens negativamente. Vivemos numa sociedade que cultiva e transmite o
facilitismo. Os meios de comunicação social, sobretudo a televisão, ao apostar na transmissão de
programas onde a violência impera e onde se verifica um grande desapego a uma cultura de
valores, também contribuem para estas situações.”

Os comportamentos indisciplinados chegam ao conhecimento do conselho


Executivo através de repreensões registadas feitas pelos professores e através de
participações de ocorrência consideradas graves ou muito graves pelo director de Turma.
Relativamente às sanções, o(a) presidente concorda plenamente com a sua
aplicação, sendo as sanções mais aplicadas “as actividades de integração, por exemplo o
desempenho de tarefas de limpeza na escola e a suspensão.”

196
Quisemos saber as reacções manifestadas pelos alunos e pelos Encarregados de
Educação perante as sanções aplicadas. A este respeito o(a) presidente do conselho
Executivo respondeu que,

“Normalmente a primeira reacção é a de encontrar justificação e desculpa para o mau


comportamento do filho. Normalmente essa desculpa refere-se a injustiça e culpa por parte do
professor. No entanto, a maioria acaba por aceitar a medida proposta.”

Quanto ao efeito das sanções e se aplicação das mesmas ajuda a adquirir hábitos de
bom comportamento o(a) nosso(a) entrevistado(a) diz:

“Creio que sim, embora, como já disse anteriormente, a maioria das situações é recorrente, o que
significa que o mesmo aluno que prevarica e é castigado acaba por repetir essas situações. No
entanto são muitas as situações de alunos que o fazem apenas uma vez, o que faz acreditar que a
medida tenha surtido efeito.”

Finalmente, quisemos saber se as medidas legislativas relativas à indisciplina na


escola são suficientes e eficazes. A resposta a esta questão foi de que,

“As medidas legislativas existentes são suficientes mas não eficazes. Quero dizer com isto
que não serão necessárias mais medidas, o estatuto do aluno é suficiente e mais medidas talvez
espartilhassem mais a autonomia das escolas. Para mim essas medidas não são eficazes por
exemplo em termos de prazos a cumprir, estratégias a adoptar, o número de reuniões necessárias é
exagerado, assim como o número de pessoas envolvidas.” Complementa a questão referindo que
“os processos disciplinares seriam mais fiáveis se os prazos fossem mais alargados.”

197
CONCLUSÕES E REFLEXÃO FINAL

A indisciplina continua a ser um dos maiores flagelos das escolas portuguesas,


afecta professores, alunos, auxiliares da acção educativa e outros envolvidos no processo
educativo. A resolução dos problemas disciplinares consome tempo, exige esforços e,
muitas vezes, provoca stress, desânimo e cansaço. Reveste-se, assim, de primordial
importância tentar compreender este fenómeno para tentar conviver com ele no dia-a-dia e,
se possível, encontrar formas de o resolver ou, pelo menos, minimizar os seus efeitos sobre
os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem.
Pretendemos, com este trabalho, desenvolver um estudo de caso numa escola
secundária, onde se lecciona também o 3º ciclo do ensino básico, sobre as percepções de
alunos e professores a respeito da indisciplina na sala de aula. Conscientes que existem
bastantes trabalhos realizados por conceituados investigadores nesta área, temos, contudo,
noção que por mais investigações que se façam neste campo nunca chegaremos a
compreender a real dimensão deste problema multifacetado que a cada dia nos apresenta
novas nuances. As sociedades modificam-se – desenvolvem-se novos sistemas de
comunicações e novas tecnologias que facilmente colocam todo o tipo de informação
acessível a vastos e variados públicos, assiste-se a fenómenos migratórios que transformam
o nosso mundo numa aldeia global, disseminando-se e misturando-se padrões culturais,
linguísticos, religiosos…; as famílias desestruturam-se – instituições como o casamento
são muitas vezes postas em causa, fazendo aumentar o número de divórcios e de famílias
monoparentais, põem-se em causa sistemas de valores...; na instituição escola, assiste-se a
reformas em catadupa, escudadas em profusa legislação, nem sempre fácil de entender e
aplicar, quer aos professores, quer aos alunos, e que muitas vezes levanta celeumas,
provoca descontentamento e indignação. Neste ambiente de mudanças, os principais
intervenientes no processo de ensino-aprendizagem, alunos e professores são confrontados
com profundas alterações que nem sempre criam as condições ideais para que os
objectivos a que uns e outros se propõem sejam alcançados.
Partindo destes pressupostos, escolhemos a Escola Secundária com 3º Ciclo do
Ensino Básico das Tílias, situada na zona centro do país, para realizarmos a nossa
investigação sobre a problemática da indisciplina na sala de aula.

198
A primeira parte do nosso trabalho é constituída por uma abordagem teórica da
problemática da indisciplina na escola e mais concretamente na sala de aula. Tentámos
definir alguns conceitos ligados à questão em estudo e compreender as implicações do
fenómeno da indisciplina sobre aspectos fundamentais do funcionamento da escola,
nomeadamente a socialização dos alunos, as interacções na sala de aula e a própria
aprendizagem. Analisámos, também, a questão das regras e das sanções tentando
relacionar estes dois aspectos com a disciplina/indisciplina na sala de aula, nomeadamente
o valor das sanções na prevenção dos comportamentos desviantes. Foi nesta abordagem
teórica que ancorámos o nosso estudo empírico, a partir do qual tentámos esclarecer as
questões e objectivos orientadores do trabalho, apresentados na introdução.

A primeira conclusão a destacar é que os alunos do sexo masculino praticam


comportamentos indisciplinados com mais frequência do que os alunos do sexo feminino.
Entre os alunos mais prevaricadores salientam-se os mais novos, que na sala de aula
praticam preferencialmente brincadeiras, conversam muito, fazem barulho, prejudicando,
assim, o funcionamento dos trabalhos. Nos alunos mais velhos, esses comportamentos
diminuem de incidência e de natureza. Estes alunos, muitas vezes, pretendem com os seus
comportamentos incorrectos atingir os professores na sua dignidade pessoal e profissional,
tornando-se desafiadores e utilizando linguagem insultuosa. Esta posição é consentânea
com estudos nacionais e internacionais. Entre nós, estudos realizados por Amado,
Lourenço, Freire, entre outros, apontam neste mesmo sentido.

Relativamente aos comportamentos indisciplinados mais praticados pelos alunos


nas salas de aula da escola por nós estudada, verificamos, através do estudo dos registos
efectuados no Gabinete de Conflitos, que esses comportamentos se distribuem
essencialmente pelas categorias comunicação oral clandestina e distracções, relação
professor-aluno e convenções sociais. Na primeira categoria, integram-se, como
comportamentos mais praticados, conversas entre alunos, brincadeiras e barulho. Na
segunda categoria, sobressaem a desobediência a ordens dos professores e o responder aos
professores de forma incorrecta. Na terceira categoria de comportamentos, o manter uma
postura inadequada na sala de aula e utilizar linguagem imprópria foram os mais
praticados.

199
Complementámos esta informação a partir das entrevistas realizadas a alunos e
professores que, neste caso, apresentam, em alguns aspectos, percepções concordantes. Os
alunos entrevistados referiram como comportamentos indisciplinados mais praticados os
que se integram na categoria processo aula, destacando-se o falar alto, conversar muito e
fazer barulho, o usar boné, mascar pastilha e utilizar o telemóvel e, com menor incidência
o brincar, rir e distrair-se. Os professores referem, em primeiro lugar, a categoria da
relação professor-aluno, onde todos apontam como comportamento mais praticado a
desobediência a ordens do professor. Seguem-se os comportamentos que se integram na
categoria processo-aula onde se salientam o falar alto, conversar muito e fazer barulho,
utilizar linguagem grosseira, palavrões e comentários despropositados e o usar boné,
mascar pastilha e utilizar telemóvel. Estes comportamentos são considerados pelo órgão de
gestão e por alguns professores entrevistados como graves, sobretudo devido à sua
reincidência, confirmando as conclusões apresentadas em estudos efectuados por Estrela,
Amado e Lourenço, que afirmam a reincidência como um dos aspectos mais gravosos da
indisciplina nas escolas portuguesas. Contudo, os alunos percepcionam-nos de forma
diferente uma vez que quase todos os alunos entrevistados afirmam que esses
comportamentos não são graves.

Pretendemos saber também quais as razões que levam os alunos a ter


comportamentos indisciplinados na sala de aula. As percepções de alunos e professores
neste domínio não são concordantes.
Os alunos atribuem as causas dos comportamentos indisciplinados a factores de
ordem institucional, salientando a deficiente actuação dos seus professores, no respeitante
à leccionação das matérias e à organização e gestão da aula. Referem ainda questões
relacionadas com a formação das turmas e os horários escolares, nomeadamente a
instituição de aulas com a duração de noventa minutos. Embora com menor incidência, são
mencionados problemas pessoais e desinteresse pela escola e por algumas disciplinas.
Os professores atribuem os comportamentos indisciplinados na sala de aula
essencialmente a factores de ordem pessoal ou psicológica dos alunos e de ordem familiar.
Referem o desinteresse dos alunos pelas disciplinas ou pela escola, a ausência de um
sistema de valores, a falta de educação e o abandono familiar como causas principais pela

200
ocorrência de comportamentos desajustados na sala de aula. Factores sociais, embora
apontados por alguns professores entrevistados, perfilam-se em segundo plano.
Estas conclusões parecem ir ao encontro de estudos feitos por Kounin, Emmer e
Evertson, Duke e Jones, Good, referenciados por Estrela (1984), Amado (2001), ao
atribuírem à actuação dos professores na sala de aula parte da origem dos comportamentos
indisciplinados dos alunos. Outros estudos atribuem a responsabilidade da indisciplina na
sala de aula aos alunos. Incluem-se neste caso os de Nizet e Hiernaux, Estrela, realizados
em escolas portuguesas entre 1977 e 1983, Amado (1989), Magalhães (1992), Perrenoud
(1995), Rosser e Harré, referenciados por Amado (2001), Lourenço (2004), entre outros.

As interacções, na sala de aula, constituem um dos aspectos fundamentais do


processo ensino-aprendizagem. As relações professor-aluno e aluno-aluno são
fundamentais e explicam os comportamentos que ocorrem na sala de aula. Quisemos, por
isso, saber como são percepcionadas essas relações pelas duas partes em interacção.
Alguns alunos entrevistados referiram que as relações com alguns professores eram
boas, com outros eram razoáveis e com alguns eram péssimas. Este aspecto tem influência
directa no clima que se cria na sala de aula, levando os professores a aplicar medidas
sancionatórias, como a ordem de saída para o Gabinete de Conflitos, aos alunos que
prejudicavam o normal funcionamento dos trabalhos.
Os professores também valorizam bastante o aspecto relacional. Quase todos os
entrevistados responderam que a assertividade dos alunos depende da boa relação que se
consegue criar com os alunos na sala de aula.
Outro aspecto que condiciona as interacções na sala de aula é a organização dos
trabalhos, sobretudo a leccionação dos conteúdos programáticos. Para os alunos, aulas
muito expositivas, monótonas e repetitivas provocam enfado e desinteresse levando-os a
praticar actos que boicotam e prejudicam as aulas, os colegas e os próprios professores.
Neste ponto, quase todos os professores concordam com os alunos, afirmando que aulas
com pouco ritmo e com estratégias pouco variadas levam à distracção, desinteresse e
disrupção.
Estrela (1992), Magalhães (1992), Graça Fernandes (2001) e Amado (2001)
abordam, nos seus estudos, a questão das interacções na sala de aula e a organização da

201
mesma, salientando que estes aspectos podem levar os alunos a ter comportamentos menos
correctos.
As relações entre pares (aluno-aluno) não parecem ter grande influência nos
comportamentos na sala de aula. Não obstante haver algumas situações de discussão e
tentativas de agressão registadas no Gabinete de Conflitos, elas não são em grande número.
Os alunos entrevistados também não referem grandes problemas de relacionamento com os
colegas, bem pelo contrário, quase todos dizem que ele é bom.

Ao abordarmos as questões disciplinares na sala de aula não podemos esquecer as


regras que sempre lhe andam associadas e sem as quais se tornaria impossível a
sobrevivência num espaço propício à irrupção de conflitos. Também neste domínio,
quisemos saber como se posicionam os alunos e os professores relativamente às regras na
sala de aula.

Questionámos os nossos interlocutores sobre a importância das regras na sala de


aula e sobre quem as deveria definir. Os resultados obtidos mostram claramente haver
percepções idênticas sobre esta questão. Alunos e professores salientaram a importância e
a necessidade da definição de regras na sala de aula. Praticamente todos afirmam que as
regras devem ser definidas em conjunto, para que haja um maior envolvimento e
compreensão das mesmas.
Os alunos referem que, no início do ano, praticamente todos os professores
despendem algum tempo com a questão das regras. Da mesma forma, todos os professores
afirmam que, no início do ano, definiram as regras de conduta a serem respeitadas na sala
de aula, esclarecendo os alunos sobre a necessidade do seu cumprimento e os efeitos do
seu incumprimento. Alguns Directores de Turma disseram que fizeram trabalho específico
com os alunos, na aula de Formação Cívica, sobre as regras a ter em conta na sala de aula.
As conclusões do nosso trabalho sobre a definição das regras estão de acordo com o
defendido por autores como Estrela (1992), Silva (1994), que se baseou, por sua vez, no
pensamento de autores Jessup e Kiley, e Furlong e Graça Fernandes (2001).

As regras mais definidas na sala de aula, segundo os alunos, dizem respeito ao


estabelecimento de boas relações de convivência entre todos os elementos que interagem

202
na aula e à organização das actividades nesse espaço. Referem que a preocupação dos
professores ao definirem regras se prende, em primeiro lugar, com o controlo da conversa
entre alunos, com o barulho e a brincadeira; em segundo lugar, as preocupações voltam-se
para a proibição da utilização de acessórios desnecessários aos trabalhos da aula como
bonés, chicletes, telemóveis, MP3, etc. Existe ainda alguma preocupação em tentar
controlar as intervenções dos alunos, sobretudo em situações de questões lançadas à turma,
para promover o respeito por todos os intervenientes no processo educativo e com o
controle das movimentações dentro da sala de aula impedindo os alunos de se levantarem
do lugar sem a devida autorização dos professores.
Ao questionarmos os professores sobre as regras mais definidas na sala de aula
verificamos que elas se integram nas categorias da convivência social e relacional, da
organização do espaço sala de aula, carácter preventivo e carácter correctivo. As duas
últimas são definidas essencialmente pelos Directores de Turma, principais responsáveis
pela resolução das questões disciplinares nas suas turmas. As opiniões dos docentes vão de
encontro ao que os alunos referiram mas verifica-se também que eles definem regras para
outros domínios não abordados pelos alunos, nomeadamente regras de carácter preventivo
e de carácter correctivo. Esta dispersão por todas as categorias e subcategorias é um
indicador da grande preocupação que os professores têm com os problemas da
disciplina/indisciplina na sala de aula.
Reveste-se de grande importância o facto de haver uma preocupação colectiva no
tratamento das regras na sala de aula. Os professores por nós entrevistados, sobretudo os
Directores de Turma, referiram o facto de estas questões serem tratadas em Conselho de
Turma para se uniformizarem critérios de actuação, a fim de evitar disparidade na
aplicação de sanções sempre que as regras sejam violadas, não se cometendo desta forma
injustiças.
A posição assumida pelos alunos e pelos professores no respeitante às regras mais
definidas na sala de aula é concordante com os exemplos apresentados por Lícínio Lima
(1998: 64), e com posições assumidas por Estrela (1995) e Amado (2001).

Um dos aspectos em estudo no nosso trabalho consiste em saber quais as medidas


pedagógicas mais utilizadas pelos professores para resolver os problemas de indisciplina
na sala de aula.

203
Todos os alunos entrevistados, pronunciando-se sobre esta questão, referiram que
as medidas mais utilizadas pelos professores eram medidas de carácter correctivo. A ordem
de saída da sala de aula é a mais utilizada, sendo mencionada por todos os alunos
entrevistados. Outras medidas adoptadas foram a admoestação verbal (tradicional ralhete),
o recado na caderneta para o Encarregado de Educação e a participação de ocorrência ao
Director de Turma. Estas medidas são, normalmente, aplicadas sequencialmente vindo em
primeiro lugar a advertência e em último lugar a ordem de saída da sala de aula.
Os professores entrevistados, pronunciando-se sobre as medidas disciplinares
utilizadas na sala de aula, têm opinião concordante com os alunos. A medida mais utilizada
é a ordem de saída da sala de aula. Também aqui esta medida é, normalmente antecedida
de admoestação verbal e recados na caderneta. Destas situações, é feita participação de
ocorrência para os Directores de Turma.

As sanções ou punições terão efeitos práticos na mudança de comportamentos dos


alunos? Foi outra questão que nos propusemos explicar com o nosso trabalho.
A percepção que os alunos têm das punições aplicadas pelos professores na sala de
aula é no sentido da concordância com as mesmas. Nenhum aluno respondeu que não
concordava com a sua aplicação. Acham as punições necessárias e úteis pois têm perfeita
noção dos erros cometidos e vêem na aplicação de sanções uma forma de tentar corrigi-los
e de evitar a sua repetição no futuro. Referem, no entanto, que essas punições devem ser
aplicadas no momento certo e devem ser justas.
A percepção dos professores é concordante com a dos alunos. Também eles
concordam com a aplicação de sanções e dizem que as mesmas são importantes,
necessárias e indispensáveis.
Ao serem punidos os alunos demonstram sentimentos variados que vão da revolta,
vingança, vergonha, orgulho, satisfação e bem-estar. Os alunos que sentem orgulho,
satisfação e bem-estar, normalmente provocam situações que levam os professores a dar-
lhes ordem de saída da sala de aula. Estes alunos adoptam esta posição muitas vezes por
motivos exibicionistas perante os colegas da turma ou porque querem confrontar a
autoridade do professor.
Para estes alunos, as sanções, por vezes, podem prejudicar o relacionamento
professor aluno. Referem, explicitamente, as situações em que o mesmo professor aplica

204
sistematicamente castigos, quando é castigado um aluno por determinado comportamento e
outro em situação idêntica o não é, quando o aluno percepciona o castigo como injusto.
A influência da punição na aquisição de hábitos de bom comportamento é
percepcionada pelos alunos de forma positiva. Quatro dos nossos entrevistados
responderam afirmativamente a esta questão, dois referiram que às vezes ajuda a adquirir
hábitos de bom comportamento e apenas um respondeu que não.
Os professores não são categóricos a afirmar que as punições ajudam a criar hábitos
de bom comportamento. Quatro disseram, peremptoriamente, que sim, mas outros quatro
responderam que apenas, às vezes, a sanção modifica os comportamentos dos alunos para
melhor. Um professor foi taxativo ao responder que não.
No respeitante à repetição de comportamentos sancionados quase todos os alunos,
os que foram alvo de procedimento disciplinar e os que não foram, admitem que repetem
comportamentos que foram anteriormente punidos pelos seus professores ou pelo órgão de
gestão da escola. Houve mesmo um aluno que referiu ter sido punido no início do ano e
que iria ser novamente punido logo a seguir à realização da entrevista, no final do ano.
Da mesma forma, os professores corroboram a posição dos alunos. Apesar de
sujeitos a punições, os discentes repetem comportamentos desviantes praticados na sala de
aula. Dois respondem de forma categórica e os restantes sete referem que, algumas vezes,
esses comportamentos se voltam a verificar. Pode comprovar-se esta situação a partir dos
dados recolhidos nas fichas do Gabinete de Conflitos onde se verifica que vários alunos
são reincidentes, praticando o mesmo tipo de comportamento.
Estas conclusões aproximam-se dos resultados apresentados por Voeltzel, citado
por Silva (1994), Sprinthall (1997), Curwin, citado por Amado (2001) e Amado (2001 e
2006).

Do nosso estudo sobressai um aspecto que deve salientar-se. Os alunos têm perfeita
consciência dos seus actos e sabem avaliá-los correctamente. Podemos comprovar o que
acabamos de referir socorrendo-nos, mais uma vez, dos dados registados no Gabinete de
Conflitos da escola. Das fichas por nós analisadas foi possível recolher dados
relativamente à culpabilidade, ou não, de 238 alunos. Desse total, 74,4% consideraram-se
culpados da sua conduta na sala de aula e apenas 25,6% se consideraram inocentes,

205
imputando a responsabilidade dos comportamentos incorrectos a terceiros, professores ou
colegas.
Actuámos de forma semelhante relativamente ao arrependimento quanto aos actos
praticados. Pudemos verificar que nas fichas analisadas 215 alunos se pronunciaram sobre
o assunto. Destes, 62,8% mostraram-se arrependidos dos comportamentos praticados e
37,2% não se mostraram arrependidos.

Os órgãos de gestão das escolas desempenham um papel fundamental na prevenção


e resolução de problemas disciplinares nas escolas. O nosso estudo abordou, embora de
forma sucinta, o papel do Director de Turma e do Presidente do Conselho Executivo neste
processo. Quisemos saber sobretudo se as escolas possuem meios eficazes para resolver as
questões disciplinares e se a legislação em vigor é eficaz e responde cabalmente às
necessidades das escolas e dos envolvidos no processo de ensino.
Para os Directores de Turma a escola não possui os meios necessários para resolver
as questões disciplinares. Apontam algumas falhas, como o elevado número de alunos por
turma, falta de funcionários para acompanharem os alunos, sobretudo quando recebem
ordem de saída da sala de aula, deveria existir um grupo de pessoas para tratarem dos
procedimentos disciplinares para que os processos fossem mais rápidos e menos
burocráticos. Apresentaram mesmo algumas sugestões como um maior investimento na
prevenção, maior uniformidade na actuação dos professores, regras mais rígidas e sanções
mais severas, maior envolvimento familiar na educação dos alunos.
No respeitante à legislação em vigor os Directores de Turma acham que as leis não
são eficazes porque o processo é muito moroso e burocrático, os castigos, quando são
aplicados, já não surtem efeito. Referem ainda que a legislação ao retirar poder aos
professores lhes retirou eficácia em termos de actuação disciplinar.

O(a) Presidente do Conselho Executivo começou por referir que nesta escola os
casos de indisciplina são sobretudo recorrentes, normalmente são os mesmos alunos que
protagonizam a maior parte das situações. Os comportamentos mais praticados na sala de
aula têm a ver com situações de desobediência ao professor, incorrecção no modo como os
alunos se dirigem ao mesmo e ainda situações de conversa e brincadeira. Esta opinião é
consentânea com os dados apresentados pelos outros intervenientes no nosso estudo.

206
Considera muito graves os comportamentos de agressão e de má educação para com os
professores e graves todas as situações de mau comportamento dentro da sala de aula.
Como causas principais dos comportamentos indisciplinados na sala de aula, aponta
a falta de regras que deveriam ter sido transmitidas pela família, sobretudo o saber estar
numa escola e obedecer aos professores. No seu entender, o funcionamento da sociedade
também influencia negativamente os jovens, sobretudo por intermédio dos meios de
comunicação social.
A aplicação de sanções merece a concordância do(a) Presidente do Conselho
Executivo que refere como sanções mais aplicadas aos alunos, de acordo com a lei, as
actividades de integração como o desempenho de tarefas de limpeza na escola, como está
previsto no Regulamento Interno, e a suspensão das actividades lectivas até dez dias.
Referiu que a primeira reacção dos Encarregados de Educação e dos alunos perante as
sanções aplicadas é de tentar justificar a actuação dos discentes e atribuir a culpa da
situação ao professor, alegando tratar-se de injustiça. Contudo, a maioria acaba por aceitar
as medidas propostas.
O efeito das sanções sobre a modificação de comportamentos indesejados é,
segundo o(a) nosso(a) entrevistado(a), algumas vezes eficaz, mas noutras não. Completa a
sua ideia, dizendo que o facto de haver recorrência de comportamentos indisciplinados no
mesmo aluno mostra que as sanções não são totalmente eficazes.
Pronunciando-se sobre as medidas legislativas, diz que elas são suficientes mas não
eficazes. Aponta para essa ineficácia; os prazos a cumprir, as estratégias a adoptar, o
número de reuniões que é exagerado, bem como o número de pessoas envolvidas no
processo.

Reflectindo sobre as conclusões gerais do nosso trabalho e tendo em conta as


questões orientadoras do mesmo, parece poder concluir-se que a ocorrência de
comportamentos indisciplinados na sala de aula não é da exclusiva responsabilidade dos
alunos. Esses comportamentos resultarão da conjugação de vários factores de ordem social,
familiar e institucional, tendo os professores, em muitos casos, responsabilidade na
degradação das relações que se estabelecem na sala de aula e, por conseguinte, na irrupção
de comportamentos desviantes ou disruptivos.

207
As estratégias utilizadas para manter a disciplina na sala de aula são variadas,
recorrendo-se, quando necessário, à aplicação de medidas correctivas e sancionatórias que,
nalguns casos resolvem as questões de indisciplina mas que, em muitos outros, não evitam
que os alunos repitam os comportamentos por que foram sancionados. Esta questão deve
levar os professores a reflectir sobre a validade de determinados castigos e a pensar em
alternativas mais eficazes no controlo dos comportamentos indisciplinados, em contexto de
sala de aula.

Todos os envolvidos no processo educativo, sobretudo os professores, têm


consciência que a indisciplina é um fenómeno complexo sobre o qual se têm realizado
diversos estudos a nível nacional e internacional. Contudo, sendo um fenómeno
multifacetado, passível de várias abordagens, torna-se difícil a sua compreensão. Os
estudos de caso podem revelar-se preciosos auxiliares para todos aqueles que vivenciam de
perto esta problemática, para todos aqueles que nas escolas são confrontados diariamente
com comportamentos considerados indisciplinados, abusivos ou mesmo agressivos e de
violência. Quanto melhor se conhecerem os contornos do problema, melhor se conseguirão
definir as estratégias para lidar com ele.
As conclusões do nosso estudo, sem pretensões de generalização, como já
anteriormente se referiu, têm validade inseridas neste estudo de caso que, pensamos,
constitui mais um contributo para a compreensão do fenómeno da disciplina/indisciplina
na sala de aula.

208
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Legislação

Lei 30/2002, de 20 de Dezembro – Estatuto do aluno do ensino não superior

Lei 3/2008 de 18 de Janeiro – 1ª alteração à Lei 30/2002

Portaria n.º 921/92 - Competências do director de turma


Portari921/92 - Competências do director de turma

Outros diplomas

Parecer nº 3/2002 do CNE (Conselho Nacional de Educação)

Projecto Educativo da Escola Secundária com 3º ciclo do Ensino Básico das Tílias

Regulamento Interno da Escola Secundária com 3º ciclo do Ensino Básico das Tílias

Carta Educativa do Município de implantação da Escola em estudo

216
ANEXOS

Anexo I – Impresso preenchido pelos professores no Gabinete Disciplinar

GABINETE DE GESTÃO DE CONFLITOS REGISTO Nº


2007 / 2008

Aluno: ________________________________________________ Ano: ____ Turma: ____ Nº: ____


Disciplina: ____________________________________________ Data: ___ / ____ / ______ Hora: ____

O aluno acima identificado manifestou na sala de aula os seguintes comportamentos desajustados, que
afectaram o normal funcionamento da mesma:
CATEGORIAS COMPORTAMENTOS
Interrompeu o professor com questões fora do assunto da aula
Falou ou respondeu ao professor de forma incorrecta
Relação professor - aluno Desafiou a autoridade do professor
Desobedeceu a ordens do professor
Insultou ou gozou o professor

Provocou os colegas
Insultou os colegas
Relação aluno-aluno
Agrediu ou tentou agredir os colegas
Furtou ou danificou o material dos colegas

Conversou com os colegas, falando alto e desordenadamente e fazendo barulho


Rir e fazer rir os colegas de forma exagerada
Brincar, atirando papéis (ou outros objectos) pelo ar ou pelo chão
Levantou-se do lugar sem autorização e circulou pela sala
Entrou ou saiu da sala sem pedir autorização
Processo aula Balançou-se na cadeira
Recusou realizar as actividades e não participou na aula
Estudou ou realizou os trabalhos para outras disciplinas
Não se fez acompanhar do material necessário à aula
Manteve uma postura incorrecta na aula: boné na cabeça, utilizou telemóvel, comeu...
Utilizou linguagem imprópria ou proferiu palavrões
Outra...

O aluno a respeito da sua saída da sala de aula referiu:


_______________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________

Com base na versão do aluno o professor teve a seguinte intervenção:


_______________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________

No final o aluno mostrou-se: Arrependido  Não arrependido 


Relativamente ao seu comportamento considera-se: Culpado  Não culpado 

Para evitar situações futuras comprometeu-se a:


_______________________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________________________

O Professor: ________________________________________________

217
Anexo II - Guião de entrevista a alunos (sem processo disciplinar)

1- Fala-me da tua escola.

2- Diz-me o que pensas dos teus professores.

3- Diz-me o que pensas sobre as regras de comportamento na sala de aula.

4- No início do ano, os teus professores definem as regras de comportamento que devem


ser respeitadas na sala de aula?

5- Pensas que os alunos devem participar na definição das regras de comportamento?


Porquê?

6- Quais os comportamentos de indisciplina que ocorrem com mais frequência na tua sala
de aula?

7- Desses comportamentos quais são os que tu mais praticas?

8- Quais os motivos que levam os alunos a perturbarem as aulas? E no teu caso pessoal?

9- Fala-me do relacionamento entre professores e alunos na tua sala de aula. No teu caso
pessoal, como te relacionas com os teus professores e colegas?

10- A forma como os professores dão as aulas influencia o vosso comportamento na sala?
De que forma? E no teu caso pessoal?

11- Os alunos comportam-se melhor com os professores mais velhos ou com os mais
novos? Porque achas que isso acontece? E no teu caso pessoal?

12- Quando os alunos se portam mal na sala de aula quais as medidas que os professores
utilizam para resolver os problemas?

13- Diz-me o que pensas sobre a aplicação de sanções para resolver os problemas de
indisciplina na sala de aula. Tu pessoalmente concordas?

14- Quais as sanções mais utilizados pelos professores na sala de aula?

15- O que achas que os alunos sentem quando são castigados? E tu pessoalmente o que
sentes?

16- Achas que o castigo prejudica a relação do aluno com o professor? Porquê? (objectivo
8)

17- O castigo pode ajudar a adquirir hábitos de bom comportamento? Porquê?

218
Anexo III - guião de entrevista a alunos (com processo disciplinar)

1- Fala-me da tua escola.

2- Diz-me o que pensas dos teus professores.

3- Diz-me o que pensas sobre as regras de comportamento na sala de aula.

4- No início do ano, os teus professores definem as regras de comportamento que devem


ser respeitadas na sala de aula?

5- Pensas que os alunos devem participar na definição das regras de comportamento?


Porquê?

6- Quais os comportamentos de indisciplina que ocorrem com mais frequência na tua sala
de aula?

7- Desses comportamentos quais são os que tu mais praticas?

8- Quais os motivos que levam os alunos a perturbarem as aulas? E no teu caso pessoal?

9- Fala-me do relacionamento entre professores e alunos na tua sala de aula. No teu caso
pessoal, como te relacionas com os teus professores e colegas?

10- A forma como os professores dão as aulas influencia o vosso comportamento na sala?
De que forma? E no teu caso pessoal?

11- Os alunos comportam-se melhor com os professores mais velhos ou com os mais
novos? Porque achas que isso acontece? E no teu caso pessoal?

12- Quando os alunos se portam mal na sala de aula quais as medidas que os professores
utilizam para resolver os problemas?

13- Diz-me o que pensas sobre a aplicação de sanções para resolver os problemas de
indisciplina na sala de aula. Tu pessoalmente concordas?

14- Quais as sanções mais utilizados pelos professores na sala de aula?

15- O que achas que os alunos sentem quando são castigados? E tu pessoalmente o que
sentes?

16- Achas que o castigo prejudica a relação do aluno com o professor? Porquê? (objectivo
8)

17- O castigo pode ajudar a adquirir hábitos de bom comportamento? Porquê?

18- No teu caso pessoal foste alvo de procedimento disciplinar. Qual ou quais os
comportamentos indisciplinados que praticaste?

219
19- Como classificas esses comportamentos?

20- Qual a pena que te foi aplicada? Concordas com ela? Porquê?

21- Achas que o castigo que cumpriste vai evitar que no futuro tenhas comportamentos
indisciplinados? Porquê?

220
Anexo IV – Guião de entrevista a professores

1- Diga-me o que pensa sobre as regras de comportamento na sala de aula.

2- No início do ano, costuma definir as regras de comportamento que devem ser


respeitadas na sala de aula?

3- O que acha da participação dos alunos na definição das regras de comportamento?

4- Enuncie os comportamentos de indisciplina que mais frequentemente ocorrem na sua


sala de aula.

5- Desses comportamentos quais os que considera mais graves?

6- No seu entender quais serão os motivos que levam os alunos a perturbarem as aulas?

7- Acha que a forma como os professores se relacionam com os alunos na sala de aula tem
influência no tipo de comportamento que estes têm? Porquê?

8- Pensa que a forma como os professores dão as aulas influenciará o comportamento dos
alunos nas mesmas? Porquê?

9- Acha que os alunos se comportam melhor com os professores mais velhos ou com os
mais novos? Porque acha que isso acontece?

10- Quando os alunos se portam mal na sala de aula quais as medidas que costuma utilizar
para resolver os problemas?

11- Diga o que pensa sobre a aplicação de sanções para resolver os problemas de
indisciplina na sala de aula.

12- Se recorre à aplicação de sanções, quais as que utiliza com mais frequência?

13- Parece-lhe que a aplicação de sanções pode ajudar a adquirir hábitos de bom
comportamento? Porquê?

14- Acha que o aluno que é sancionado repete o comportamento que o levou a ser
castigado? Porquê?

15- Acha que a sanção prejudica a relação do aluno com o professor? Porquê?

221
Anexo V – Guião de entrevista a directores de turma

1- O que pensa sobre as regras de comportamento na sala de aula?

2- No início do ano como tratou a questão das regras de comportamento com os seus
alunos? Fez com eles algum trabalho específico?

3- Quais as orientações de actuação que o primeiro Conselho de Turma definiu


relativamente à sala de aula? Todos os elementos do Conselho de Turma colaboraram?

4- O que pensa do trabalho de equipa para a prevenção dos comportamentos


indisciplinados?

4- Quais os meios que levaram ao seu conhecimento os comportamentos indisciplinados


ocorridos na sua Direcção de Turma?

5- Quais os comportamentos de indisciplina que mais frequentemente ocorreram na sua


turma? Como classifica esses comportamentos? Porquê?

6- No seu entender quais serão os motivos que levam os alunos a perturbarem as aulas?

7- Acha que a forma como os professores se relacionam com os alunos na sala de aula tem
influência no tipo de comportamento que estes têm? Porquê?

8- Pensa que haverá relação entre a forma como as aulas são leccionadas e os
comportamentos indisciplinados? Porquê?

9- Acha que os alunos se comportam melhor com os professores mais velhos ou com os
mais novos? Porque acha que isso acontece?

10- Quando recebe participações de mau comportamento na sala de aula que medidas
costuma utilizar para tentar resolver os problemas?

11- Diga o que pensa sobre a aplicação de sanções para resolver os problemas de
indisciplina na sala de aula.

12- Se esta situação se verifica na sua direcção de turma, quais as sanções que os
professores mais utilizam?

13- Parece-lhe que a aplicação de sanções pode ajudar a adquirir hábitos de bom
comportamento? Porquê?

14- Acha que o aluno que é sancionado repete o comportamento que o levou a ser
castigado? Porquê?

15- Acha que a escola tem os meios necessários para resolver os problemas de indisciplina
que surgem nas salas de aula? Se não, no seu entender o que seria necessário fazer?

222
Anexo VI – Guião de entrevista presidente Conselho Executivo

1- É política da escola definir claramente regras de actuação para todos os intervenientes


no processo de ensino-aprendizagem?

2- A quem compete a definição dessas regras?

3- O que pensa sobre a indisciplina na escola? E na sala de aula?

4- Quais os comportamentos de indisciplina que mais ocorrem na escola? E na sala de


aula?

5- Como classifica esses comportamentos, quanto à sua gravidade?

6- No seu entender quais serão os motivos que levam os alunos a ter esses
comportamentos?

7- Quais os meios que levam ao seu conhecimentos os comportamentos de indisciplina na


escola e na sala de aula?

8- O que pensa sobre a aplicação de sanções para resolver os problemas de indisciplina?

9- Quais as sanções que mais aplica para resolver os problemas de indisciplina na escola?

10- Normalmente, como reagem os alunos e os Encarregados de Educação perante as


sanções aplicadas?

11- A aplicação de sanções ajuda a adquirir hábitos de bom comportamento? Porquê?

12- O aluno que é sancionado repete o comportamento que o levou a ser castigado?
Porquê?

13- As medidas legislativas relativas à indisciplina na escola são suficientes e eficazes?

14- Se acha que os regulamentos existentes são insuficientes e se estivesse ao seu alcance
legislar, que medidas tomaria para resolver os problemas da indisciplina na sua escola?

223
Anexo VII – Exemplar da grelha de análise das entrevistas

Frases
Domínios Categorias Subcategorias / Comportamentos Inferências
ilustrativas
- Falar ou responder ao professor de forma incorrecta
Relação - Desafiar a autoridade do professor
professor-aluno - Desobedecer a ordens do professor
- Insultar ou gozar o professor
- Provocar os colegas (vandalizar o material)
Comportamentos indisciplinados

Relação
- Insultar os colegas.
aluno-aluno
- Agredir ou tentar agredir um colega
- Conversar com os colegas, falar alto e fazer barulho
- Rir e fazer rir os colegas de forma exagerada.
- Brincar, atirando papéis (ou outros objectos) pelo ar ou
chão.
- Levantar-se do lugar sem autorização e circular pela sala
- Recusar realizar as actividades ou não participar nas aulas,
Processo-aula
não trazer o material escolar necessário.
- Permanecer na aula com o boné na cabeça., utilizar
telemóvel, MP3, ou outro material electrónico.
- Manter uma postura inadequada na sala de aula (pés em
cima das cadeiras, mal sentado, comer etc.).
- Proferir palavrões / utilizar linguagem imprópria
Ambiente disciplinar da sala de aula

Causas da indisciplina na sala de aula

Factores - Doença do foro psicológico (hiperactividade)


Psicológicos - Distúrbio emocional
- Proveniência de meios desfavorecidos
Factores Sociais - Violência e agressividade social
- Desrespeito e ausência de regras sociais
- Permissividade da escola
- Dificuldades materiais da escola
Factores
- Cultura organizacional da escola (turmas, horários…)
Institucionais
- Deficiente actuação dos professores
- Falta de apoios do Ministério da Educação
- Proveniência de famílias disfuncionais
Factores - Abandono familiar
Familiares - Ausência de um sistema de valores
- Carências económicas e culturais (linguagem)
- Respeitar todos os intervenientes no processo educativo
Carácter social -Utilizar linguagem adequada
As regras na sala de aula

- Manter uma postura adequada


- Não chegar atrasado às aulas
Carácter - Não sair do lugar sem autorização
organizativo - Respeitar a ordem de intervenção
- Fazer-se acompanhar do material necessário
- Solicitar a intervenção dos alunos distraídos ou
Carácter
conversadores
preventivo
- Executar actividades diferenciadas
- Ordem de saída da sala de aula (para um local específico e
Carácter
com uma tarefa)
correctivo
- Realizar trabalhos das áreas curriculares
- Cumprimento de actividades de integração
As medidas disciplinares

- ordem de saída da sala de aula


Medidas
- Inibição de participação em actividades extracurriculares
correctivas
- Condicionamento de acesso a certos espaços
- Mudança de turma

- Repreensão registada
Medidas - Suspensão temporária da frequência das aulas (até 10 dias)
sancionatórias - Transferência de escola
- Expulsão definitiva da escola

224
Anexo VIII – Comportamentos reincidentes dos alunos por ano / turma

7º ANO

TOTAL
TURMAS E Nº DE ORDEM DOS ALUNOS NA TURMA
CATEGORIAS COMPORTAMENTOS
A B C D E F
11 17 3 5 9 12 15 16 17 4 17 9 22 5 17 20 21 23 25 3 4 6 11 15 16 17 19 20
- Interromper o professor com
1 1
questões fora do assunto da aula.
- Falar ou responder ao professor
Relação 1 1 1 1 1 1 2 1 9
de forma incorrecta
professor- - Desafiar a autoridade do
aluno 1 1 1 1 1 5
professor
- Desobedecer a ordens do
1 2 2 1 1 1 1 1 1 1 3 1 2 1 1 1 21
professor
- Insultar ou gozar o professor 1 1
- Provocar os colegas. 1 1
Relação aluno- - Insultar os colegas. 2 1 1 4
aluno - Agredir ou tentar agredir um
1 1 1 1 1 1 6
colega
- Conversar com os colegas. 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 2 1 3 1 18
Comunicação - Rir e fazer rir os colegas de
oral 1 1 1 1 1 1 6
forma exagerada.
clandestina e - Brincar, atirarando papéis (ou
distracções 2 2 1 1 1 3 1 1 1 2 1 2 2 3 1 1 25
outros objectos) pelo ar ou chão.
- Falar alto e desordenadamente ou
1 1 1 1 1 1 1 7
fazer barulho
- Circular pela sala de aula. 1 1 2
Movimentação - Levantar-se do lugar sem
1 1 1 3
autorização.
Material - Danificar o material da escola
1 1 2
escolar (mesas, cadeiras, portas, etc.)
- Recusar realizar as actividades ou
1 1 1 1 1 1 6
não participar nas aulas.
Trabalho - Estudar ou realizar os trabalhos
1 1 1 3
para outras disciplinas.
- Não trazer o material escolar
1 1
necessário.
- Manter uma postura inadequada
Convenções na sala de aula (pés em cima das 1 1 1 1 1 2 1 1 9
sociais cadeiras, mal sentado, comer etc.).
- Proferir palavrões / utilizar
1 1 2
linguagem imprópria
TOTAL = 3 9 3 2 4 4 5 7 4 2 2 2 3 4 5 4 5 4 3 5 10 10 4 11 7 3 3 4 132

225
Anexo IX– Comportamentos reincidentes dos alunos por ano / turma

8º ANO 9ºANO CEF

TOTAL
CATEGORIAS TURMAS E Nº DE ORDEM DOS ALUNOS NA TURMA
COMPORTAMENTOS
A B C D F A B D 8º A 9º A
8 4 10 18 3 4 9 10 12 13 14 15 4 2 4 6 14 19 26 2 2 6 7 12 15 16 9
- Falar ou responder ao professor de
1 1 1 1 2 1 7
forma incorrecta
Relação - Desafiar a autoridade do professor 1 1 1 3
professor-aluno - Desobedecer a ordens do professor 1 1 1 2 2 1 1 1 10
- Insultar ou gozar o professor 1 1 2
- Provocar os colegas. 1 1 2
Relação aluno-
- Insultar os colegas. 1 1 2
aluno
- Agredir ou tentar agredir um colega 1 1 1 1 1 1 1 7
- Conversar com os colegas. 2 2 1 2 1 3 1 1 2 1 1 2 2 1 1 2 1 1 27
- Rir e fazer rir os colegas de forma
Comunicação 1 1 1 4 2 1 1 1 12
exagerada.
oral clandestina - Brincar, atirando papéis (ou outros
e distracções 2 2 1 1 1 1 1 9
objectos) pelo ar ou chão.
- Falar alto e desordenadamente ou
2 2 2 3 1 2 1 1 14
fazer barulho
- Circular pela sala de aula. 1 1 2
Movimentação
- Levantar-se do lugar sem autorização. 1 1 1 1 1 5
Material - Danificar o material da escola (mesas,
1 1
escolar cadeiras, portas, etc.)
- Recusar realizar as actividades ou não
1 1 1 1 1 1 1 7
participar nas aulas.
Trabalho
- Não trazer o material escolar
1 1 2
necessário.
- Utilizar telemóvel, MP3, ou outro
1 1 1 1 1 5
material electrónico.
- Manter uma postura inadequada na
Convenções
sala de aula (pés em cima das cadeiras, 1 4 1 1 1 1 1 1 11
sociais
mal sentado, comer etc.).
- Proferir palavrões / utilizar linguagem
1 1 1 1 1 1 1 2 1 10
imprópria
TOTAL = 3 4 4 3 3 4 10 17 4 5 10 9 2 2 14 6 5 2 2 2 5 5 7 2 4 2 2 138

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