Uma Discussao Sobre A Lit Juvenil

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Anais do VI Seminário dos Alunos dos Programas de

Pós-Graduação do Instituto de Letras da UFF


Estudos de Literatura

UMA DISCUSSÃO SOBRE A LITERATURA JUVENIL

Cássia Farias Oliveira dos Santos


Orientador: André Cabral de Almeida Cardoso
Mestranda

RESUMO
Ao contrário do que acontece na literatura para adultos, a literatura para crianças e
adolescentes tem uma função: ela não é apenas uma forma de lazer, mas serve a um
papel educativo, não só porque pode ser usada na escola como meio de trabalhar as
habilidades de leitura e conhecimento das normas literárias, mas também por contribuir
para a socialização, mostrando para o leitor o mundo e a sociedade ao seu redor. Por
esse motivo, o gênero chama a atenção de diversas áreas de conhecimento e da
sociedade em geral, sendo alvo constante de tentativas de censura. Além disso, a
literatura juvenil surgiu apenas no século XX, se consolidando nos anos 60, sendo um
campo de estudos extremamente novo, e que divide com a literatura infantil o fato de
ser heterogênea e ter fronteiras pouco definidas. O trabalho pretende discutir algumas
questões acerca dessa literatura, como a relação entre o leitor e o texto e as
características que a definem.
PALAVRAS-CHAVE: literatura juvenil; literatura infanto-juvenil; Romance.

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O presente trabalho pretende discorrer, de forma breve, sobre algumas


problemáticas da literatura infanto-juvenil. Os temas aqui abordados fazem parte da
pesquisa para a dissertação a ser desenvolvida para o mestrado em Literaturas de Língua
Inglesa, focando particularmente na produção contemporânea dos Estados Unidos, e
foram escolhidos por serem questões importantes para definir e delimitar o corpus
trabalhado.
A primeira coisa que é preciso discutir é a nomenclatura do gênero. O termo
infanto-juvenil é impreciso, pois abarca um grupo de leitores implícitos que vai desde a
primeira infância até indivíduos que estão chegando à vida adulta. Existe a
possibilidade, normalmente adotada, de dividir essa literatura em dois grandes grupos, a
literatura infantil e a juvenil. O que acontece na prática, porém, é que o termo infanto-
juvenil é usado indiscriminadamente como sinônimo tanto da literatura para crianças
como para adolescentes, e também para denominar o conjunto oriundo da junção das
duas. Não é meu objetivo propor uma solução, ou uma forma de tornar mais clara a
nomenclatura, mas essas são questões devem ser mencionadas, pois ajudam a situar o
leitor e melhor esclarecer o objeto a ser tratado. No caso específico deste trabalho, irei
tratar da literatura juvenil, utilizando o termo infanto-juvenil apenas quando estiver
falando de elementos ou características que sejam comuns à literatura para crianças e
àquela voltada para adolescentes.
Escolher focar na literatura juvenil levanta outro debate: quais são, exatamente,
as obras que a compõem? A questão é polêmica, já que existem três tipos de obras que
se encaixariam nesse gênero: obras escritas para o público adulto, mas que fazem
sucesso com o público juvenil; obras escritas para adolescentes; e obras escritas por
adolescentes. É possível, então, ver a literatura juvenil como um conjunto formado pela
junção desses tipos de obra ou apenas como a manifestação de uma ou outra delas.
Outro aspecto a ser levado em conta é que a classificação de uma obra como infantil ou
juvenil (em oposição à literatura adulta ou em oposição uma a outra) parece, muitas
vezes, seguir critérios subjetivos. É o caso de Are You There, God? It’s Me, Margaret
(1970), de Judy Blume, tratado por Seth Lerer como um livro infantil e por Cart como
um exemplo de literatura juvenil, visto que trata de uma menina de 12 anos que está
começando o sexto ano. Podem-se observar também casos como o de As vantagens de
ser invisível (1999), de Stephen Chbosky, originalmente lançado pela MTV Books. Cart
(2010, p.92) argumenta que a editora voltava suas publicações para a parcela mais velha

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dos telespectadores do canal, entre 18 e 34 anos, ou seja, não era uma editora de livros
juvenis, mas, de acordo com o autor, muitos de seus livros se encaixariam nessa
literatura, e ele destaca que Vantagens, em especial, deveria ter sido lançado como
YAlit. De fato, o livro parece ter sido abraçado pela crítica como tal1 e, em edições mais
recentes, conta, inclusive, com um guia de leitura a ser usado em sala de aula – no
Brasil, o livro foi lançado e classificado como juvenil. Além de ser mais uma evidência
de subjetividade na classificação genérica dos livros, isso mostra que os critérios
mudam de um país para o outro. As fronteiras pouco delimitadas e flexíveis das
literaturas infantil e juvenil podem ser consequência não só do já mencionado amplo
público alvo, mas também do fato de se tratar de duas literaturas surgidas recentemente.
Estudos críticos costumam apontar que “somente a partir do século XVIII pode
considerar-se que existem livros dirigidos a crianças e adolescentes como um fenômeno
cultural de certo valor” (COLOMER, 2003, p.13) e com características próprias. Suas
origens estão ligadas às mudanças e avanços acerca da concepção de educação, sendo
sua função primária justamente a de educar seus jovens leitores. Já a literatura juvenil,
em si, é um fenômeno ainda mais recente, visto que a própria noção de adolescência só
seria definida no início do século XX (TRITES, 2000, p.8; CART, 2010, p.4): os
membros dessa nova parcela da sociedade foram vistos basicamente como crianças até
os anos 1930, sendo essa a década em que começaram a ser comercializados livros com
esse público em mente, coincidindo com a emergência da cultura jovem (CART, 2010,
p.8-9). As obras de Cart e Trites apontam que a literatura juvenil só iria se estabelecer e
se definir com mais clareza no pós-Segunda Guerra Mundial e que “passou a ser vista
como um gênero literário distinto no final dos anos 60” (TRITES, 2000, p.9). É
importante perceber também que, mais do que à literatura infantil, seu desenvolvimento
se deve à literatura adulta: dois dos três livros que costumam ser citados como decisivos
para o estabelecimento da YAlit – Seventeenth Summer (1942), de Maureen Daly,
Apanhador no campo de centeio (1951), de J.D. Salinger e The Outsiders (1967), de
S.E. Hinton (TRITES, 2000, p.9) – foram escritos e publicados para o público adulto,
apesar de Daly ter escrito parte de seu livro na adolescência. Desses, apenas a obra de

1
Como pode ser visto nos artigos “‘It’s The Catcher in the Rye… He Said It Was the Kind of Book You
Made Your Own’: Finding Holden in Contemporary YA Literature”, de Bickmore e Youngblood, “The
Epistolary in Young Adult Literature”, de Wasserman, e “What Annie Wrought”, do próprio Cart, que
no livro de 2010 também se refere a obra como YAlit.

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Hinton foi lançada tendo os jovens como público alvo. Cada qual à sua maneira, esses
livros ajudaram a construir um tipo de literatura para adolescentes que se aproxima da
que é produzida nos dias de hoje.
Outro fato interessante sobre a literatura infanto-juvenil é trazido à tona por
Teresa Colomer em A formação do leitor literário, obra na qual a autora faz uma
revisão da história dos estudos sobre a literatura infanto-juvenil – com foco maior na
infantil – e aponta que, ao longo do tempo, essas literaturas passaram a configurar uma
área de estudos multidisciplinares que não se iniciou nos estudos literários, mas sim na
área de biblioteconomia (COLOMER, 2003, p.23-24). Peter Hunt também reporta esse
fenômeno, e afirma que
A literatura infantil [e podemos dizer também que a juvenil] (e seu
estudo) atravessa as fronteiras genéricas já estabelecidas, históricas,
acadêmicas e linguísticas; ela requer contribuição de outras
disciplinas; é relevante para uma ampla classe de usuários, apresenta
desafios singulares de interpretação e de produção. Implica
necessariamente em aquisição da língua, censura, gênero e
sexualidade, o que leva o debate mais para o domínio do afeto que
para o da teoria (HUNT, 2010, p.49)
A diferença é que, enquanto Colomer parece ver o fato de que a literatura
infanto-juvenil se presta a diversas abordagens como algo positivo e que enriquece os
estudos sobre ela, Hunt chama atenção para o fato de que "[o] resultado acadêmico (...)
é que seu estudo tende a ocorrer mais nas disciplinas práticas de biblioteconomia e
educação, e talvez na psicologia, que na disciplina mais teórica de 'literatura'" (HUNT,
2010, p.49). E, de fato, essa parece ser a realidade dos estudos sobre a literatura para
crianças e adolescentes, com grande profusão de trabalhos no ramo da educação, que
apresentam também grande diversidade, o que nem sempre pode ser dito dos estudos
literários, sendo inclusive as obras que falam do viés pedagógico dessa literatura as que
delineiam panoramas históricos e tentativas de delimitá-la e classificá-la.
O interesse de diferentes áreas de estudo pela a literatura infanto-juvenil pode
ser visto como um reflexo do interesse que a sociedade em geral tem pelo tema. Apesar
de ainda ser vista como um tipo de literatura de menor importância, existe uma grande
preocupação, em especial no cenário norte-americano, com o que é lido por crianças e
adolescentes. A prova disso é lista da American Library Association (ALA) dos 10
livros cuja adequação mais foi questionada em 2014, nos EUA: a lista é composta por
um livro ilustrado, dois livros de não ficção, três quadrinhos e quatro romances, dos
quais apenas dois não apresentariam conteúdo "inapropriado para o público alvo"

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(AMERICAN LIBRARY ASSOCIATION, [2015?])2 como motivo para


questionamento. É interessante notar que apenas metade das obras listadas foi, de fato,
feita para crianças e adolescentes, mas as que foram feitas para o público adulto, em sua
maioria, trazem personagens jovens como o ponto central da narrativa, o que pode
despertar o interesse de jovens leitores para esses livros.
As constantes tentativas de censurar a literatura juvenil podem se relacionar com
a afirmação de Colomer (2003, p.14) de que “[n]os livros infantis, mais do que na
maioria dos textos sociais, se reflete a maneira como uma sociedade deseja ser vista”.
As obras cuja adequação é questionada são justamente os livros que fogem dessa
representação idealizada, tratando de temas polêmicos como abuso sexual, desigualdade
social, conflitos armados e outros tópicos considerados tabus ou muito “pesados” para o
público jovem. Isso é importante, também, porque, como Colomer (2003, p.161)
comenta, “a literatura infantil e juvenil foi se consolidando como um instrumento
socializador de nossa cultura”, servindo para transmitir os valores – positivos – da
sociedade atual. Ou seja, apesar dos protestos de que os livros infanto-juvenis muitas
vezes são inapropriados, o que ocorre na prática é que
Livros para adolescentes são subversivos – mas às vezes apenas de
forma superficial. Na verdade, eles costumam ser bastante didáticos; a
conclusão do enredo de muitos romances juvenis contém uma
mensagem explícita sobre o que o narrador aprendeu. (...). Livros para
adolescentes têm muitas ideologias. E eles passam muito tempo
manipulando o leitor adolescente. (TRITES, 2000, p.ix-x, tradução
livre)
É possível perceber que, de fato, os livros juvenis tendem para uma
reconciliação entre indivíduo e sociedade, mesmo nos casos em que essa mesma
sociedade é hostil ao indivíduo, ou assim se mostra inicialmente. Há, então, um certo
conservadorismo na literatura infanto-juvenil que, muitas vezes, escapa à percepção dos
censores.
Mas o que podemos dizer sobre as características dessa literatura? Uma
definição precisa não seria possível, mas é possível estabelecer alguns pontos em
comum entre as obras que costumam ser classificadas nesse gênero.

2
Os livros são: 1) O diário absolutamente verdadeiro de um índio de meio expediente, Sherman Alexie;
2) Persépolis, Marjane Satrapi; 3) And Tango Makes Three, Justin Richardson e Peter Parnell; 4) O
olho mais azul, Toni Morrison; 5) Vamos falar sobre sexo, Robie Harris; 6) Saga, Brian Vaughan e
Fiona Staples; 7) O caçador de pipas, Khaled Hosseini; 8) As vantagens de ser invisível, Stephen
Chbosky; 9) Vida roubada - Memórias, Jaycee Dugard e10) Drama, Raina Telgemeier.

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Hunt (2010, p.27) afirma que a literatura infantil, e podemos dizer que a juvenil
também, “se define exclusivamente em termos de um público que não pode ser
definido". O que podemos tirar disso, na verdade, é que a literatura infanto-juvenil é,
por natureza, heterogênea – como pode ser visto na caracterização feita por Colomer
(2003, p.175) do destinatário dessas literaturas:
Um leitor cuja idade aumenta, que amplia progressivamente suas
possibilidades de compreensão do mundo e do texto escrito, e a quem,
portanto, dirigem-se textos que deveriam diferenciar-se segundo as
características psicológicas da idade e segundo a complexidade das
exigências de leitura. (grifos do original)
Além disso, a leitura das obras parece indicar uma correlação entre a idade do
protagonista, ou núcleo jovem principal, e a idade do leitor implícito ou alvo, devendo
elas ser próximas, sendo pouco comum também, em especial nos dias de hoje, a
presença de protagonistas adultos. Os leitores também determinam a linguagem que será
utilizada, em termos de estilo, elaboração e vocabulário.3 Como leitores de diferentes
idades têm diferentes “necessidades”, fica estabelecido, também, que a literatura
infanto-juvenil é, por natureza, heterogênea – o que realmente dificulta os esforços para
classificá-la.
Por ser heterogênea, e por interagir com outras formas e mídias, como os
quadrinhos, é difícil falar sobre os aspectos formais da literatura para adolescentes. A
princípio, esses livros tendiam a ser de curta extensão, mas isso não pode mais ser usado
como critério de diferenciação nos dias de hoje: como bem chama a atenção Cart (2010,
p.98), os livros da saga Crepúsculo e os livros finais de Harry Potter ultrapassam as
200-300 páginas que se consideravam habituais, e esses livros foram fenômenos de
venda, não sendo, também, os únicos livros longos escritos para esse público. No
entanto, se o fato de ser breve não caracteriza esses livros em sua extensão, ainda serve
para descrever os seus enredos. De uma forma geral, na YAlit a ação ocorre em um
curto espaço de tempo – de um ano, como em cada volume da série Harry Potter, a uma
única noite, como em Nick e Norah: uma noite de amor e música (2006), de David
Levithan e Rachel Cohn – sendo menos comuns histórias que se desenrolam ao longo de
anos, com a exceção de séries que se estendem por vários volumes.

3
Um exemplo disso pode ser visto em “What is Young Adult Fiction?”, texto em que David Belbin trata,
dentre outros assuntos, de sua experiência escrevendo romances para “leitores relutantes”, cuja
“linguagem precisa ser direta e a história linear” para acomodar leitores jovens e que têm dificuldades
em acompanhar a leitura (BELBIN, 2011, p.138, tradução livre).

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Talvez como reflexo disso, temos que a literatura infanto-juvenil apresenta uma
natureza episódica, não querendo isso dizer que dentro de uma mesma história as
peripécias narradas tenham pouca relação entre si, mas sim que os romances tendem a
focar em acontecimentos e conflitos específicos, e muitas vezes pontuais, em um recorte
da vida das personagens, tratando do que lhes aflige naquele momento. Essa natureza
episódica fica mais clara quando observamos as séries e sagas, nas quais há um todo
extenso, e que às vezes acompanha todo o crescimento das personagens, mas em que
cada livro tem um foco reduzido, o que se reflete inclusive nos títulos: Percy Jackson e
o ladrão de raios, Harry Poter e as relíquias da morte, A escolha (série Seleção).
Como afirma Peter Hunt (2010, p.27), “a literatura infantil também é um campo
que abarca quase todos os gêneros literários”, e o mesmo vale para a literatura juvenil,
que compartilha com as obras para crianças o fato de possuir “gêneros específicos: a
narrativa para escola, textos dirigidos a cada um dos sexos (...)” (HUNT, 2010, p.44),
entre outros. Porém, apesar de se caracterizar pela interação com outros gêneros – o que
permite uma variedade de temas e formatos –, costuma-se dividir a produção para
crianças e adolescentes em dois grandes grupos, ou subgêneros: a fantasia e a ficção
realista, que têm suas temáticas e formas específicas.
Uma das especificidades da literatura infanto-juvenil é que, ao contrário da
literatura adulta, ela tem uma função: ela não é apenas uma forma de lazer, mas serve a
um papel educativo, não só porque pode ser usada na escola como meio de trabalhar as
habilidades de leitura e conhecimento das normas literárias, mas justamente por
contribuir para a socialização, mostrando para o leitor o mundo e a sociedade ao seu
redor, e a forma como estes funcionam. Nos estudos sobre a literatura juvenil, se aceita
que a “literatura tem a capacidade de dar [aos adolescentes] um lugar no mundo, algo
tangível em que eles podem se apegar enquanto passam pelas suas próprias versões dos
processos de transição presentes em cada [livro].” (BICKMORE; YOUNGBLOOD,
2014, p.262, tradução livre). O sujeito adolescente é, por excelência, um sujeito em
transição, e seu percurso, idealmente, deve culminar na passagem satisfatória da
infância para a vida adulta. A literatura oferece uma forma de enfrentar os conflitos
típicos dessa fase, ao mostrar para o adolescente que é possível superar suas
dificuldades e que ele não é o único a enfrentá-las. Isso aponta para a necessidade de
diversidade nas temáticas abordadas por esse gênero, já que a empatia parece ser crucial
nas relações de leitura de crianças e adolescentes, seja em seu aspecto educativo ou

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prazeroso. Dessa forma, nenhum assunto deveria ser muito sério ou muito polêmico
para ela, nem muito “bobo” ou sem importância, ainda mais se estiver diretamente
ligado à experiência adolescente.
Mas, tendo em mente que elas normalmente têm o objetivo de promover o
aprendizado, como se dá a resolução de conflitos nessas narrativas? O tipo de conclusão
em que vemos apenas a tomada de decisão e o impulso inicial de mudança, mas sem de
fato saber se os conflitos foram todos solucionados, tem se tornado comum na literatura
juvenil e convive com os finais mais tradicionais, que encerram os conflitos de forma
definitiva. Os dois tipos de final, porém, demonstram a grande presença do otimismo na
literatura infanto-juvenil. Não que finais tristes sejam inexistentes, mas o próprio
conceito de final feliz é subjetivo. The Chocolate War (1974), de Robert Cormier, é
constantemente visto como um exemplo de livro com um final “triste”, que mostra que
na vida nem tudo pode ter uma resolução positiva. Trites, porém, vê uma redenção no
final do romance, porque “pelo menos um dos personagens do romance teve a
oportunidade de crescer” (TRITES, 2000, p.15, tradução livre), oportunidade que
também é estendida ao leitor. Se a definição de final feliz for o “felizes para sempre”,
com resolução total dos problemas, então muitos livros não se encaixam nesse padrão.
O que parece ser comum aos diferentes finais da literatura infanto-juvenil é uma
tendência para a esperança, mesmo quando a conclusão parece triste. Talvez isso se dê
porque a esperança esteja no próprio ato de ler, na busca, por parte do leitor, pela
identificação e pela descoberta do seu lugar no mundo. Para Chambers, a leitura muitas
vezes traz uma epifania, que segundo ele é “[p]assar a saber de forma consciente algo
que você não sabia que já sabia. A sabedoria de que ‘eu sou e estou no mundo’, e que eu
não estou sozinho” (2010, p.272, tradução livre). Outra explicação para essa tendência é
o já mencionado conservadorismo presente nessa literatura, e da ideologia que ela
carrega. Como aponta Roberta Trites (2010, p.19, tradução livre), “[o] romance juvenil
se constitui como um gênero exatamente porque, enquanto um gênero, busca
demonstrar a habilidade dos personagens de amadurecerem e passar a aceitar o
ambiente em que vivem”, tendendo também para a reconciliação. Ainda segundo ela,
“de fato, adolescentes não chegam ao amadurecimento em um romance juvenil até que
eles atinjam a reconciliação com os poderes das instituições sociais com as quais
precisam interagir para sobreviver” (TRITES, 2000, p.20, tradução livre), o que envolve

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os valores socialmente desejáveis e a imagem de nossa sociedade que se deseja projetar


na literatura infanto-juvenil.
Há ainda muito que poderia ser dito, mas as questões aqui abordadas são
elementos que podem ser observados na literatura juvenil dos últimos anos. Foram
descritos aqui os aspectos mais gerais sobre essa produção, evitando uma classificação e
definição mais “rígidas”, já que a literatura infanto-juvenil está sempre se
transformando, se reinventando, uma vez que “uma característica central da literatura da
juventude seria ter como finalidade descrever e identificar o que é juventude”
(CHAMBERS, 2010, p.273, tradução livre). A adolescência e o ser adolescente são
conceitos que mudam com o tempo, e a literatura precisa acompanhar isso. Tendo isso
mente, espero ter conseguido ajudar a construir um panorama básico para aqueles que
buscam saber mais sobre esse gênero, apresentando de forma concisa algumas das
discussões levantadas em minha pesquisa.

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REFERÊNCIAS

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BICKMORE, S.; YOUNGBLOOD, K. “It’s The Catcher in the Rye… He Said It Was
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