Meszaros - Desemprego e Precarização Um Grande Desafio para A Esquerda

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Desemprego e precarização: um grande desafio para a esquerda1


István Mészáros2

Introdução
Escolhi este assunto para a nossa discussão por duas razões principais. Primeiro, porque a
questão afecta todas as cambiantes da esquerda. Pois no nosso tempo nenhuma secção da força de
trabalho pode considerar-se imune à desumanizante dureza do desemprego e da precarização. De facto
"eventualização" ("casualisation") é mais apropriadamente chamada em algumas línguas de
"precarização" ("precarisation") , embora em geral seja tendenciosamente mal representada como
"emprego flexível" desejável. Uns poucos meses atrás uns 25 mil empregados do Wesminster Bank
tiveram de enfrentar a perspectiva do desemprego (redundancy) ; hoje os trabalhadores da empresa
automobilística Rover - uma parte da bancarrota da orgulhosa corporação transnacional BMW - são
lançados aos lobos da insegurança total. A questão não é se o desemprego ou a "precarização flexível"
vai ameaçar as pessoas ainda empregadas mas sim quando elas irão partilhar as agruras da
precarização forçada. A segunda razão principal para nos preocuparmos com esta questão é porque ela
representa um inultrapassável problema estrutural para o capital. Assim, é impensável que a esquerda
possa desenvolver uma estratégia viável para o futuro sem dar um lugar central à questão vital do
desemprego e da precarização. Tenciono hoje considerar três aspectos principais daquilo que está em
jogo.

1- A "globalização" do desemprego e da precarização, afectando mesmo as partes do mundo


capitalisticamente mais desenvolvidas.
2- O mito da "flexibilidade" com o qual a pílula amarga é coberta de açúcar. Pois do que estamos a
falar é de facto a grave tendência socioeconômicada equalização descendente (downward equalisation)
da taxa de exploração diferencial.
3- A única solução factível para os problemas que enfrentamos é abandonar as trocas socioeconómicas
reguladas pela submissão à tirania do "tempo de trabalho necessário" (também chamado "trabalho
necessário") para a emancipação através do "tempo disponível" como a alternativa positiva ao modo
de reprodução social metabólica do capital.

Como ponto de partida, podemos considerar a questão da redução da semana de trabalho para
35 horas a qual, não por acaso, veio a apresentar-se nos últimos tempos.

1
Tradução de Jorge Figueiredo. Disponível em: http://www.socialismo.org.br/portal/filosofia/155-artigo/397-desemprego-e-precarizacao-
um-grande-desafio-para-a-esquerda. Acesso em março de 2012.
2
Professor Emérito de Filosofia e Teoria Política da Universidade de Sussex, Reino Unido, e autor de Beyond Capital; Marxist Theory of
Alienation; Works of Sartre; Search for Freedom; Philosophy, Ideology and Social Science; The Power of Ideology.
2

Parte I ─ A "globalização" do desemprego

Socialistas em vários países europeus - assim como na América do Norte e do Sul - estão a
combater pelo objectivo de reduzir o tempo de trabalho para 35 horas por semana sem perda de
pagamento. Esta importante reivindicação estratégica não está de forma alguma livre de dificuldades.
Pois ela destaca tanto os prementes problemas do desemprego por todo o mundo como as contradições
do sistema socioeconômico que, por sua própria perversa necessidade, impõe a incontáveis milhões as
dificuldades e os sofrimentos que decorrem do desemprego. Assim, o combate pelas "35 horas de
trabalho" não pode ser uma reivindicação sindicalista tradicional, confinada aos mecanismos há muito
estabelecidos das negociações salariais. Ao contrário, tem de estar plenamente consciente não só da
magnitude da tarefa e das implicações a longo prazo das questões em causa e também da inevitável
resistência tenaz da ordem socioeconômica, a qual deve seguir os seus próprios imperativos a fim de
anular qualquer concessão que possa ser feita na esfera legal/política sob condições temporariamente
favoráveis aos sindicatos e aos seus representantes políticos à esquerda. Compreensivelmente,
portanto, na Itália por exemplo, o partido da Rifondazione no seu modo de levantar o problema
simultaneamente sublinha a preocupação com o aumento do emprego e da melhoria das condições de
vida ("per l'occupazione & per migliorare la vita") e a necessidade de mudar a sociedade ("per
cambiare la società") a fim de assegurar o objectivo desejado de abreviar o tempo de trabalho numa
base viável. Pois o êxito final neste assunto só é factível através de uma troca sustentada - uma
reciprocidade dialéctica - entre o combate pelo objectivo imediato do tempo de trabalho reduzido
significativamente e a progressiva transformação da ordem social estabelecida, a qual não pode
contribuir para resistir e anular tais reivindicações. Aqueles que negam a legitimidade destas
reivindicações, exaltando em alternativa as virtudes do seu querido sistema, continuam a idealizar o
modelo americano para resolver o problema do desemprego bem como todos os males sociais
inseparáveis do mesmo. Ainda assim, um exame rápido do estado real dos negócios revela que as
confortáveis idealizações dos EUA pertencem ao reino da fantasia. Pois, como enfatizou um editorial
de The Nation:

"A taxa de pobreza no último ano, 13,7 por cento, era mais elevada do que
em 1989, apesar de sete anos de crescimento quase ininterrupto.
Aproximadamente 50 milhões de americanos - 19 por cento da população -
vive abaixo da linha nacional de pobreza. Aqueles na pobreza incluem uma
em cada quatro crianças abaixo dos 18 anos, um em cada cinco cidadãos
adultos e três em cada cinco famílias monoparentais. Em dólares constantes,
os rendimentos médios semanais dos trabalhadores caíram de US$ 315 em
1973 para US$ 210, enquanto os 5 por cento mais ricos ganhavam uma
média de US$ 6440 (não contando seus ganhos de capitais). ... O número de
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americanos sem seguro de saúde mantinha-se em 40,6 milhões em 1995, um


aumento de 41 por cento desde meados da década de setenta. Em 1995,
quase 80 por cento dos não assegurados estavam em famílias onde o chefe
da família tinha um emprego." [1]

É assim que aparece o róseo modelo americano desde que se esteja disposto a abrir os olhos.
Podemos também acrescentar aqui um número mais significativo fornecido recentemente pelo
Gabinete do Orçamento do Congresso dos EUA, não objectável nem mesmo para os piores apologistas
do capital. Ele informa-nos que o rendimento dos um por cento mais ricos da população é equivalente
àquele dos 40 por cento da base. E ainda mais importante: também se verifica que este número
aterrador realmente duplicou nas últimas duas décadas, em consequência da crise estrutural do capital.
Assim, nenhuma camuflagem cínica da deterioração das condições de trabalho, não importa quão
ilusoriamente adulterada com a benção da "flexibilidade", pode esconder as sérias implicações desta
tendência para o futuro da expansão e acumulação do capital. As estatísticas do desemprego podem,
naturalmente, ser trapaceadas ou definidas e redefinidas de forma totalmente arbitrária não só nos
EUA como em todos os países do assim chamado "capitalismo avançado". Na Grã-Bretanha, por
exemplo, mesmo os apologistas profissionais do sistema do capital - os editores do London Economist
- tiveram de admitir que os números do desemprego foram "revistos" 33 vezes pelo governo a fim de
fazê-los parecer mais apresentáveis. Sem mencionar o facto de que qualquer um que trabalhe 16 horas
por semana na Grã-Bretanha é contado como se desfrutasse de um emprego a tempo inteiro. E, ainda
mais surpreendentemente, no Japão - um país que até recentemente era saudado como um caso
paradigmático de "capitalismo dinâmico avançado" - "qualquer um que efetue trabalho assalariado por
mais de uma hora na última semana do mês deixa de ser incluído nas estatísticas de desemprego". [2]
Mas quem pode ser enganado por tais artifícios de manipulação econômica e política? Pois não
importa quão arranjada e tortuosa seja a adulteração do estado de coisas existente, o desafio
potencialmente muito grave do desemprego não pode ser evitado em qualquer dos países
capitalisticamente mais avançados. Dessa forma, seja o que for que os números das estatísticas
apologéticas possam sugerir, já não é mais possível ocultar o alarme acerca dos registros de
desemprego em ascensão constante no Japão e o aprofundamento da recessão econômica que isto
implica. Na realidade, a dramática ascensão do desemprego nos países capitalistas avançados não é um
fenômeno recente. Ela surgiu no horizonte - depois de 25 anos de uma expansão do capital no pós-
guerra relativamente sem perturbações - com o princípio da crise estrutural do sistema do capital como
um todo. Surgiu como a característica necessária e sempre em agravação desta crise estrutural.
Consequentemente, argumentei em 1971 que sob as condições em desdobramentos do desemprego.
"O problema não é mais apenas a condição difícil dos trabalhadores não qualificados mas
também a de vastas quantidades de trabalhadores altamente qualificados que estão agora a perseguir,
em acréscimo ao primitivo mar de desempregados, os escassos empregos disponíveis. Além disso, a
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tendência da amputação "racionalizante" já não está mais confinada aos "ramos periféricos da
indústria envelhecida" mas abrange alguns dos mais desenvolvidos e mais modernizados sectores da
produção - desde estaleiros navais e aviação à electrónica, e do engineering à tecnologia do espaço.
Assim, já não estamos preocupados com os "normais", e bem aceites, subprodutos do "crescimento e
desenvolvimento" mas sim com sua tendência para uma travagem, nem na verdade com os problemas
periféricos dos "bolsões de subdesenvolvimento" e sim com uma contradição fundamental do modo de
produção capitalista como um todo que converte até as últimas conquistas do "desenvolvimento", da
"racionalização" e da "modernização" em fardos paralisantes de subdesenvolvimento crónico. E,
acima de tudo, a agência humana que se considera como a receptadora final já não são as pessoas
"desfavorecidas" socialmente e sem poder, multidão apática e fragmentada, mas todas as categorias de
trabalho qualificado e não qualificado: i.e., objetivamente a força de trabalho total da sociedade". [3]
Desde o tempo em que estas linhas foram escritas testemunhamos um decuplicar do desemprego
na Grã-Bretanha e alhures. Tal como estão as coisas hoje, mesmo de acordo com os números oficiais -
grosseiramente subestimados -, há mais de 40 milhões de desempregados nos países industrialmente
mais desenvolvidos. Deste número, a Europa conta com mais de 20 milhões, e a Alemanha - outrora
elogiada por produzir o "milagre alemão" - ultrapassou a marca dos 5 milhões. Um país como a Índia -
altamente louvado nos órgãos tradicionais de sabedoria econômica pelos seus feitos como um país em
saudável desenvolvimento - tem não menos de 336 milhões de pessoas nos seus registos de
desemprego, [4] e muitos milhões mais sem trabalho adequado que deveriam ser contados mas não são
registados. Além disso, a intervenção do FMI nos países "em desenvolvimento", verdadeira
organização dos EUA para ditar comandos, piora a condição difícil dos desempregados ao pretender
melhorar as condições econômicas dos países afetados. Tal como afirma outro editorial de The Nation:

"A economia do México pode parecer estar bem, mas o seu povo está em
estado lastimável. Desde a salvação (bailout) do FMI, as camadas médias
foram esmagadas; 25 mil pequenos negócios foram à falência; 2 milhões de
trabalhadores perderam os seus empregos no mesmo período. Em termos de
dólar, os salários afundaram 40 por cento. O FMI tinha de destruir a
economia interna a fim de salvá-la". [5]

Ao mesmo tempo, os antigos países pós-socialistas pertencentes ao sistema de tipo soviético,


desde a Rússia à Hungria - os quais no passado não sofriam de desemprego, apesar de terem de
administrar suas economias com altos níveis de subemprego, tiveram de acomodar-se, muitas vezes
sob a pressão direta do FMI, às condições desumanizantes do desemprego maciço. A Hungria, por
exemplo, foi felicitada pelo FMI [6] por "estabilizar" o desemprego em cerca de 500 mil. Na realidade
o número é consideravelmente superior, e ainda aumenta. Mas mesmo 500 mil, em termos da
relativamente pequena população húngara, é o equivalente a ter 6,5 milhões de desempregados na Grã-
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Bretanha ou na Itália, e algo em torno dos 8 milhões na Alemanha. Na Federação Russa a situação é
igualmente má, e em vias de tornar-se pior, incluindo ultrajes como não pagar os salários de mineiros
e outros trabalhadores por muitos meses. O Vietname apresenta um exemplo particularmente trágico.
Após a heroica vitória do seu povo sobre a longa e devastadora guerra intervencionista do
imperialismo americano, a paz está a ser perdida sob a pressão da restauração capitalista. [7] E mesmo
a China não é excepção à regra geral de desemprego em ascensão, apesar do modo muito especial
como a sua economia é controlada politicamente. Um relatório confidencial mas que veio à luz,
preparado pelo seu Ministério do Trabalho, adverte o governo chinês de que dentro de uns poucos
anos o desemprego no país está destinado a atingir o número estarrecedor de 268 milhões - apontando
também para o perigo de grandes explosões sociais a decorrerem disso - a menos que medidas
apropriadas (mas não especificadas) sejam adotadas para conter a presente tendência. [8]
É assim que alcançamos um ponto no desenvolvimento histórico no qual o desemprego é uma
característica dominante do sistema do capital como um todo. Na sua nova modalidade, constitui uma
rede fechada de inter-relações e inter-determinações pelas quais agora é impossível encontrar remédios
e soluções parciais para o problema do desemprego em áreas limitadas, em agudo contraste com as
décadas de desenvolvimento do pós-guerra nuns poucos países privilegiados em que políticos liberais
podiam falar acerca de "Pleno emprego numa sociedade livre" (Full Employment in a Free Society) .
[9]
Nos últimos anos tem havido muita conversa propagandeando as virtudes universalmente
benéficas da "globalização", deturpando a tendência da expansão global e integração do capital como
um fenômeno radicalmente novo destinado a resolver todos os nossos problemas. A grande ironia da
tendência real de desenvolvimento - inerente à lógica do capital desde os primórdios da constituição
do seu sistema há séculos atrás, que alcançou a sua maturidade no nosso tempo de uma forma
inextricavelmente ligada à crise estrutural do sistema - é que o avanço produtivo deste modo
antagônico de controlar o metabolismo social lança uma porção cada vez maior da humanidade na
categoria de mão de obra supérflua. Já em 1848, no Manifesto Comunista, Marx insistia em que

"A fim de oprimir uma classe devem ser-lhe asseguradas certas condições
sob as quais esta possa, pelo menos, continuar a sua existência servil. ...
[Mas] a burguesia é incapaz de continuar a ser por muito mais tempo a
classe dominante da sociedade e a impor à sociedade como lei reguladora as
condições de vida da sua classe. Ela é incapaz de dominar porque é incapaz
de assegurar ao seu escravo a própria existência no seio da escravidão,
porque é obrigada a deixá-lo mergulhar num tal estado em que tem de ser ela
a alimentá-lo ao invés de ser alimentada por ele". [10]
6

Dessa forma, ironicamente, o desenvolvimento daquele que é de longe o mais dinâmico sistema
produtivo da história culmina por proporcionar (rendering) um número cada vez maior de seres
humanos supérfluos para a sua maquinaria de produção , embora - de acordo com o carácter
incorrigivelmente contraditório do sistema - longe de supérfluos como consumidores . A novidade
histórica do tipo de desemprego no sistema globalmente realizado é que as contradições de qualquer
parte específica complicam e agravam o problema em outras partes e, consequentemente, no todo.
Pois a necessidade de produzir desemprego, "downsizing", etc, necessariamente levanta-se dos
imperativos antagônicos do capital de perseguir o lucro e acumulação ao qual não pode
concebivelmente renunciar, nem tão pouco conter-se de acordo com princípios de satisfação racional e
humana. O capital ou mantém o seu inexorável impulso em direção aos objetivos de autoexpansão,
não importa quão devastadoras sejam as consequências, ou deixa de ser capaz de controlar o
metabolismo social da reprodução. Aqui não pode haver qualquer meio-termo ou mesmo a mais
ligeira atenção a considerações humanas. Eis porque pela primeira vez desde sempre na história
ascende um sistema dinâmico - e em suas implicações finais dinamicamente destrutivo - de controle
social metabólico auto-expansivo, o qual expele brutalmente, se necessário, a esmagadora maioria da
espécie humana do processo de trabalho. Este é o significado profundamente perturbante de
"globalização". Quando o capital alcança este estágio de desenvolvimento não há maneira de corrigir
as causas da sua crise estrutural; ele pode apenas trapacear com efeitos e manifestações de superfície.
Consequentemente, desde que o capital "já não pode alimentar o seu escravo", as "personificações" do
seu sistema (para utilizar a expressão de Marx) tentar resolver o problema pela reversão mesmo do
limitados benefícios concedidos ao trabalho na forma do "Estado providência" ("Welfare State") -
durante o período do pós-guerra de despreocupada expansão do capital - através do ataque e abolição
do dito "Estado providência". Assim, nos EUA, os desempregados são obrigados a submeterem-se aos
ditames dos "programas de trabalho do governo" (work-fare") se quiserem receber quaisquer
benefícios sociais. E, exatamente do mesmo modo, na Grã-Bretanha está a ser tentada a mesma
transferência do "Welfare" para o "work-fare" pelo governo de um partido que outrora considerou-se
socialista. Em consequência, quando uma manchete a oito colunas de um jornal liberal britânico (que
acontece ser muito amigo do governo do "New Labour") anuncia: "Dizem aos desempregados:
alistem-se no Exército ou percam os benefícios" [11] , tal manchete dá uma antevisão das medidas que
aguardam a juventude desempregada. Isto, mais uma vez, sublinha o facto, tal como os outros aspectos
do nosso problema mencionados até aqui, que a agora plenamente cumprida globalização do
desemprego e da precarização não pode ser reparada sem a substituição radical do próprio sistema do
capital. Não muitos anos atrás era confiantemente previsto que todos os males sociais conhecidos,
mesmo nas mais "subdesenvolvidas" partes do mundo, seriam ultrapassados pela "modernização"
universal, em conformidade com o modelo americano. Caracteristicamente, contudo, somos agora
confrontados por algo diametralmente oposto àquele quadro róseo. Pois as condições outrora
confinadas, nos contos da "teoria do desenvolvimento" e da sabedoria governamental, às supostamente
7

temporárias dificuldades do "subdesenvolvimento" estão agora a tornar-se claramente visíveis mesmo


nos mais desenvolvidos países capitalistas.

Parte II ─ O mito da "flexibilidade": equalização declinante da taxa de exploração diferencial

Em 19 de Maio de 1998 o Parlamento francês aprovou uma lei que reduz a semana de trabalho para 35
horas. Legislação semelhante também é aguardada na Itália em futuro não demasiado distante. Seria
ingênuo, entretanto, pensar que isto é o fim da história. Pois em Paris o movimento foi imediatamente
"descrito por muitos economistas e líderes de negócios como suicídio econômico" [12] , e na Itália
antes até de qualquer iniciativa legislativa o líder da Confederação da Indústria Italiana
(Confindustria), Giorgio Fossa, tornou absolutamente clara a intenção da sua organização de anular
qualquer legislação desse gênero. [13] Além disso, o presidente Fossa da Confindustria (cujo nome em
italiano significa, mais apropriadamente, "túmulo") também declarou sem vergonha (como se isto não
fosse óbvio para todos os que conhecem a sua organização) que pretende enterrar a lei, se aprovada no
Parlamento, com a ajuda de uma "grande coligação" que incluiria os apoiantes mesmo dos partidos da
extrema direita. [14] E conforme o seu cinismo habitual, o London Economist assim pontificou acerca
da proposta de lei:

“Assim, quem realmente quer a semana laboral de 35 horas de Lionel


Jospin? Certamente não o patronato da França, o qual reclama que isto
aumentará os custos do trabalho e reduzirá a sua competitividade. Nem tão
pouco o contribuinte, o qual suspeita que terá de pagar impostos mais
elevados para financiar o esquema. Nem, cada vez mais, os sindicatos, os
quais temem que isto leve a salários mais baixos e menos direitos para os
trabalhadores. Nem mesmo os trabalhadores, a maior parte dos quais espera
continuar a trabalhar tanto quanto antes, mas com mais mudanças
comprometedoras e horas não sociais. Mesmo os desempregados, os
supostos beneficiários do esquema, estão a perguntar-se a si próprios
quantos empregos, se algum, isto realmente criará. ... O sr. Jospin encontra-
se encravado num esquema que nem mesmo ele - murmura-se - acredita".
[15]

Assim, aparentemente a lei em questão representou um mistério total. Disto fomos assegurados por
The Economist com base na autoridade dos misteriosos murmuradores bem informados.
Naturalmente, há sérias dificuldades que devem ser enfrentadas pelo movimento trabalhista na sua luta
pela redução real da semana de trabalho sem perda de pagamento. Mas elas são de uma ordem muito
diferente em comparação com os contos aterrorizantes inventados por The Economist e pelos outros
8

porta-vozes da ordem vigente. Os obstáculos reais que confrontam o trabalho no presente e no futuro
próximo podem ser resumidos em duas palavras: "flexibilidade" e "desregulamentação" : dois dos
mais queridos slogans das personificações do capital nos negócios de hoje e também na política. Eles
pretendem soar muito atraentes e progressistas. Na verdade, contudo, eles condensam as mais
agressivas aspirações anti-trabalho e políticas neoliberais, apregoadas como recomendáveis para todo
o ser racional tal como a maternidade e a torta de maçã. Pois a "flexibilidade" em relação às práticas
de trabalho - a ser facilitada e forçada através de várias espécies de "desregulamentação" - aumenta na
realidade a brutalidade da eventualização (casualisation) da força de trabalho. Ela é frequentemente
emparelhada com legislação anti-trabalho autoritária - desde a supressão de Reagan dos controladores
aéreos dos EUA até as longas séries de viciosas leis anti-trabalho de Margaret Thatcher:
caracteristicamente mantidas pelo governo "New Labour" de Tony Blair. E as mesmas pessoas que
clamam ser a difusão das condições de trabalho mais precárias "flexibilidade" universalmente benéfica
também se atrevem a chamar a prática da legislação autoritária anti-trabalho de "democracia".
Espera-se que a "flexibilidade" tome conta da concessão das 35 horas, se por razões de
contingência política se tornar inevitável, como parece ser o caso em França e na Itália. Assim, em
França "alguns ministros falam em tornar o mercado de trabalho mais flexível , notavelmente pela
permissão aos empregadores de variarem a semana de trabalho de acordo com a procura sazonal, de
modo que o número de horas trabalhadas semanalmente seria calculado como uma média ao longo do
ano". [16] Espera-se que a mesma trama faça chegar ao mesmo resultado na Itália. No momento da
sua introdução o primeiro-ministro da Itália, Prodi - posteriormente premiado com a Presidência da
Comissão Europeia - reassegurou aos seus críticos que a "flexibilidade" apropriada deveria ser capaz
de conter os efeitos negativos da lei. A preocupação real das personificações do capital é promover a
"flexibilidade laboral" e combater de todas as formas possíveis "mercados de trabalho rígidos". Assim,
um artigo importante no Financial Times insiste em que "tanto no Japão como na Europa as
companhias estão intensificando a eliminação de empregos mais rapidamente do que rígidos mercados
de trabalho podem criá-los", indicando aprovadoramente que a " desregulamentação pode forçar o
ritmo" e acrescentando para efeitos de consolo propagandístico que "Optimistas acreditam que a
desregulamentação finalmente conduzirá à criação de suficientes empregos em novos mercados para
absorver muito do excesso de trabalho. Mas para isto acontecer o Japão precisará da espécie de
mobilidade do trabalho que se verifica nos EUA". [17] (A história do takeover da Nissan pela Renault,
provocando com isto o despedimento de 30 mil trabalhadores da Nissan, deve agradar os advogados
de tais remédios, pois isto mostra que o Japão está a mover-se na "direcção certa"). De modo análogo,
um documento do staff do FMI - entusiasticamente revisto por The Economist - assevera que "estudos
sugerem que na Europa salários reais são flexíveis apenas pela metade em relação àqueles nos EUA,
que os trabalhadores da Europa são muito menos propensos a moverem-se à procura de trabalho do
que aqueles dos EUA". Eles dizem isto enquanto beatificamente esquecem a queixa de John Kenneth
Galbraith há muitos anos atrás de que os trabalhadores nos EUA podem culpar-se apenas a si próprios
9

pelo seu desemprego porque se recusam a "mover-se" devido ao seu "instinto para ficar em casa", o
qual liga-os ao lugar da sua formação. Nada parece mudar ao longo de décadas tanto no diagnóstico
como na visão terapêutica. E para completar o inapreciável raciocínio pronto a comer, os autores do
documento do staff do FMI apresentam o seu longe de reflexivo mas, ao contrário, a solução reflex
automática e pavloviana na forma de projeções do que "deveriam ser" as soluções desejáveis para o
capital neoliberal:

"Suponha, por exemplo, que um governo corte benefícios de desemprego.


Os trabalhadores então têm um incentivo mais forte para procurar trabalho e
assim o desemprego cairia. Um aumento no número de pessoas à procura de
emprego também provocaria pressão descendente nos salários. Custos
salariais mais baixos deveriam, por seu turno, promover o emprego". [18]

Naturalmente, em resultado desta maravilhosa contração do custo salarial, viveremos felizes


para sempre. E por outro lado, se - apesar dos sacrifícios muito reais dos trabalhadores (descritos na
nossa citação) - as expectativas fictícias do "deveriam" não se materializassem, isso não poderia de
modo algum invalidar a teoria partilhada pelo FMI e por The Economist . Isto revelaria apenas que os
porcos proverbiais do bem conhecido provérbio inglês recusam-se teimosamente a que lhes cresçam
asas, para parecerem abelhas gigantes, a fim de fugir rumo ao ilusoriamente projetado futuro
"optimista" do capital. Nesse ínterim, a selvajaria real do sistema continua ininterruptamente não só a
expulsar cada vez mais pessoas do processo de trabalho como, numa contradição característica,
também a estender o tempo de trabalho, sempre que o capital possa conseguir isso. Para mencionar um
exemplo muito importante, no Japão o governo introduziu recentemente um projeto de lei "para elevar
os limites superiores do dia de trabalho de 9 para 10 horas, e a semana de trabalho de 48 para 52 horas.
Tal disposição legal permitirá a uma empresa forçar os empregados a trabalharem mais horas quando
estiver ocupada enquanto o total de horas trabalhadas em um ano não exceder o limite fixado", [19] tal
como os "mercadores da flexibilidade" propõem em França, na Itália e por toda a parte. Além disso, o
mesmo projeto de lei pretende também estender os chamados "cronogramas de trabalho arbitrários"
("discretionary work schedules") a fim de "permitir a uma empresa que pague aos seus trabalhadores
de colarinho branco apenas 8 horas de trabalho mesmo que eles possam ter trabalhado mais". [20]
Alguns assustadores exemplos dos efeitos destrutivos desumanos do tal "trabalho arbitrário" são
relatados nos campos onde já estão em prática, agora a serem estendidos. Exemplo: um jovem
programador de computador morreu devido ao enorme excesso de trabalho, segundo julgamento do
Tribunal Distrital de Tóquio. Lemos que "o seu tempo médio anual de trabalho era superior a 3000
horas. Nos três meses anteriores à sua morte ele trabalhou 300 horas por mês. Naquele momento ele
estava empenhado em desenvolver um sistema de software para bancos". [21] Outro jovem que
morreu de ataque de coração devido a um excesso de trabalho brutal, "nas duas semanas anteriores à
10

sua morte trabalhou em média 16 horas e 10 minutos por dia". [22] Segundo outro jornal japonês
mesmo hoje
"os empregadores impõem quotas estritas aos trabalhadores, o que significa
longas horas de trabalho e trabalho não pago colocado nas costas dos
trabalhadores. ... Um condutor de comboio, por exemplo, a trabalhar para a
East Japan Railways Co., o maior caminho de ferro do Japão, realmente
cumpriu os seus deveres durante 14 horas e 5 minutos e manteve-se no lugar
de trabalho durante 24 horas e 13 minutos, e a companhia não lhe pagou
pelas restantes 10 horas e 8 minutos, dizendo que estas horas "não são nem
horas de trabalho nem períodos de descanso". [23]

Significativamente, na era da crise estrutural do capital mesmo este nível de exploração não é
suficiente. Ele deve ser estendido tanto quanto o movimento dos trabalhadores possa suportar. No
Japão, o atual projeto de lei apresentado ao parlamento "é o maior ataque no período do pós-guerra aos
direitos dos trabalhadores" . [24] Não é de admirar, portanto, que alguns sindicatos estejam a encarar a
adoção de um papel político muito mais direto no futuro, em relação à sua linha tradicional do
passado. Para citar Kanemichi Kumagai, secretário-geral da Confederação Nacional Japonesa de
Sindicatos: "A luta da Primavera deste ano não seguirá o que foi feito no passado mas terá como
objectivo mudar as tendências da política e do movimento dos trabalhadores, incluindo como as
políticas e a economia do Japão deveriam ser. Por isso concedemos a maior importância ao objectivo
de conseguir que os trabalhadores e os sindicatos adotem ações que tenham influência sobre a
sociedade". [25]
O Japão é um exemplo particularmente importante pois não estamos a falar de um país do
chamado "Terceiro mundo" em relação aos quais mesmo as mais coriáceas e brutais práticas de
exploração do trabalho sempre foram consideradas como uma prática normal. Ao contrário, o Japão
representa a segunda mais poderosa economia do mundo: um paradigma dos avanços capitalistas. E
agora mesmo num tal país o desemprego está a crescer perigosamente as condições de trabalho devem
ser tornadas piores do que nunca no longo período do desenvolvimento do pós-guerra e de expansão
do capital, incluindo não só a grande intensificação de cronogramas de trabalho exploradores em nome
da "flexibilidade" como também o - para muitas pessoas bastante incompreensível - imperativo de
uma semana laboral mais longa.
Nas raízes desta embaraçosa e de certa forma auto-contraditória advocacia da "flexibilidade",
emparelhada com rígida e autoritária legislação trabalhista, encontramos a vitalmente importante lei
tendencial da equalização descendente da taxa de exploração diferencial , a qual torna-se agudamente
evidente através da cada vez mas destrutiva globalização do capital neste período da crise estrutural do
sistema. Foi por isto que escrevi em 1971:
11

"as classes trabalhadoras de algumas das mais desenvolvidas sociedades


"pós-industriais" estão a adquirir uma antevisão da crueldade real do capital
"liberal". ... Assim, a natureza real das relações de produção capitalistas: a
impiedosa dominação do trabalho pelo capital está a tornar-se cada vez mais
evidente como um fenômeno global. ... A compreensão do desenvolvimento
e da auto-reprodução do modo de produção do capital é absolutamente
impossível sem o conceito de capital social total ... Analogamente, é
absolutamente impossível entender os múltiplos e espinhosos problemas das
variações nacionais e do trabalho socialmente estratificado se não se
mantiver sempre em mente a estrutura necessária para uma avaliação
adequada, nomeadamente o antagonismo irreconciliável entre capital social
total e a totalidade do trabalho".

Este antagonismo fundamental é inevitavelmente modificado conforme (1) as circunstâncias


socioeconômicas locais; (2) as respectivas posições de países particulares na estrutura global de
produção de capital; e (3) a maturidade relativa do desenvolvimento sócio-histórico global.
Consequentemente, em diferentes períodos de tempo o sistema como um todo revela a actuação de um
complexo conjunto de diferenças de interesses objectivos de ambos os lados do antagonismo social. A
realidade objectiva das diferentes taxas de exploração - tanto dentro de um dado país como no sistema
mundial do capital - é tão inquestionável quanto as diferenças objectivas nas taxas de lucro em
qualquer momento particular ... Da mesma maneira, a realidade das diferentes taxas de exploração e
lucro não altera a própria lei fundamental, i.e., a crescente equalização das taxas de exploração
diferenciais como a tendência global de desenvolvimento do capital mundial.
Sem dúvida esta lei da equalização é uma tendência a longo prazo na medida em que o sistema
global do capital é afetado. ... Deixe agora enfatizar que o "capital social total" não deveria ser
confundido com o "capital nacional total". Quando este último está a ser afectado por um
enfraquecimento relativo da sua posição dentro do sistema global, este inevitavelmente tentará
compensar-se das suas perdas através do aumento da sua taxa específica de exploração em relação à
força de trabalho sob o seu controle directo - ou de algum outro modo se a sua posição competitiva for
novamente enfraquecida dentro da estrutura global do "capital social total". ... Aqui não pode haver
nenhum outro caminho de saída, além da intensificação das taxas específicas de exploração, as quais
somente podem conduzir, tanto localmente como em termos globais, a uma intensificação explosiva
do antagonismo social fundamental a longo prazo. Aqueles que têm estado a falar acerca da
"integração" da classe trabalhadora - descrevendo o "capitalismo organizado" como um sistema que
teve êxito em dominar radicalmente suas contradições sociais - erraram irremediavelmente na
identificação do êxito manipulativo das taxas de exploração diferenciais (as quais prevaleceram
12

durante a fase histórica relativamente "livre de perturbações" da reconstrução do pós-guerra e da


expansão) como um remédio estrutural básico. [26]
Como acompanhamento necessário da globalização das relações produtivas e distributivas, a
equalização descendente (downward equalisation) das taxas de exploração diferenciais afeta cada um
dos países capitalistas avançados, mesmo os mais ricos. Aqui já não há mais espaço para relações de
trabalho manipuladas paternalistamente, por mais "tradicionais" e "profundamente enraizadas" se
suponha que possam estar, nem na verdade para evitar permanentemente o severo impacto negativo da
omnipresente crise estrutural através de vantagens comerciais e tecnológicas relativas. Na realidade,
tal como enfatizou um Apelo assinado por alguns distintos intelectuais num jornal italiano, o que torna
a situação grave é que a precarização e a insegurança ("la precarietà e l'insicurezza") avançam por toda
a parte no mundo do trabalho: "o trabalho desprotegido e sub-pago está a alastrar-se como mancha de
óleo, ao passo que mesmo o trabalho mais estável experimenta uma pressão em direcção à
intensificação sem precedentes, e em direção à plena disponibilidade para a submissão aos mais
diversificados horários de trabalho". [27]
Dizendo isto de um outro modo, temos aqui de enfrentar uma tendência extremamente
significativa e de longo alcance: o retorno da mais-valia absoluta , numa extensão crescente, nas
sociedades do "capitalismo avançado" nas últimas poucas décadas. O Professor Augusto Graziani
falou eloquentemente em Fevereiro de 1998, na Convenção da Rifondazione em Milão dedicada à
questão das 35 horas semanais, acerca das condições de trabalho do "Mezzogiorno" em geral e acerca
da terrível exploração do trabalho feminino na Calábria em particular. Sua intervenção é mais
relevante para a questão da "mais-valia absoluta" num país capitalista avançado, como a Itália, em que
algumas das práticas de trabalho altamente exploradoras podem ser identificadas também no Norte do
país mais industrialmente desenvolvido. Na Inglaterra, ao mesmo tempo, um documentário recente da
TV ilustrou a difusão generalizada do trabalho infantil, embora seja claramente contra a lei.
Naturalmente, a lei não é de modo algum aplicada. Ao contrário, são promovidas todas as espécies de
argumentos falsificados para justificar indiretamente tais práticas ilegais. Assim, os interesses
empresariais conduzem uma vociferante campanha contra o salário mínimo em geral, com a desculpa
de que a sua introdução tornaria o emprego dos jovens muito pior. Outro modo de manipular a mesma
questão, adotado pela Confederation of British Industry, pelo Institute of Directores e por várias
organizações "Think Tank" de negócios, é pressionar pela "isenção dos jovens" da legislação do
salário mínimo, ou a concessão de salário mínimo muito mais baixo. Além disso, a pioria das
condições de trabalho de pessoas de todas as idades em incontáveis lugares de trabalhos escravizantes
("sweatshops") - imigrantes legais ou ilegais bem como uma porção longe de negligenciável da força
de trabalho inglesa, escocesa, galesa e irlandesa - falam bastante alto acerca do reaparecimento do
impulso para a mais-valia absoluta, como uma das mais retrógradas tendências do desenvolvimento do
capital no século XX, num dos mais privilegiados países do "capitalismo avançado". É desnecessário
dizer, que tanto a procura implacável da mais-valia absoluta em geral como a sua manifestação
13

particularmente obnóxia na forma de trabalho infantil foram sempre proeminentes nos países do
'Terceiro mundo' (e, naturalmente, assim continuam ainda hoje).
Paradoxalmente, a crise global da acumulação de capital na era da globalização avançada cria
algumas grandes dificuldades novas, ao invés de resolver aquelas há muito contestadas iniquidades do
sistema, como os "optimistas" porta-vozes da "globalização" não problemática querem fazer-nos
acreditar. Pois as margens viabilidade produtiva do capital estão a diminuir (daí o impulso para a
mais-valia absoluta), apesar de todos os esforços dos Estados capitalistas - individualmente ou em
conjunto, como nos encontros do G7/G8 - para expandir, ou pelo menos manter firmes, as margens
produtivas do sistema. Na realidade só pode haver um caminho para tentar alargar as margens
contraídas da acumulação de capital: a expensas do trabalho. Isto é uma estratégia promovida
ativamente pelo Estado - na verdade, devido a esta necessidade, o papel intervencionista do Estado
nunca foi tão grande [28] como neste nosso tempo, apesar de toda a mitologia neoliberal em contrário
- e a estratégia é objetivamente apoiada no nosso tempo pela tendência para a equalização declinante
da taxa de exploração diferencial. No fim, contudo, a estratégia agora perseguida está votada ao
fracasso, desde que o movimento dos trabalhadores tenha êxito em rearticular radicalmente suas
próprias estratégias e formas de organização, orientando-as rumo à criação de um movimento de
massas genuíno, a fim de fazer face ao desafio histórico. Pois nem mesmo os teóricos mais
"optimistas" do FMI e dos outros generosamente financiados órgãos de apologia do capital
conseguiram até agora inventar, nem é provável que o consigam no futuro, um dispositivo pelo qual
seria possível espremer para fora o exigido poder de compra sempre crescente e a correspondente
acumulação de capital das cada vez piores condições econômicas e dos "pacotes de salários
precarizados" da força de trabalho.

Parte III ─ Da tirania do "tempo de trabalho necessário" à emancipação através do "tempo


disponível"

Como pode o trabalho - o antagonista estrutural do capital - reagir à tendência de deterioração


inseparável do estreitamento da margem de viabilidade do capital produtivo?
Esta pergunta conduz-nos de volta ao terceiro elemento do pedido da Rifondazione para
assegurar a semana de trabalho de 35 horas citada no princípio desta palestra: "mudar a sociedade"
("per cambiare la società") . Pois hoje - em resultado da necessidade do capital de arrancar sem
cerimonias [29] mesmo as suas concessões passadas, ao invés de aceder a novas - é totalmente
impossível realizar mesmo os objetivos mais imediatos e limitados do sindicalismo tradicional sem
tomar a rota que conduz a uma transformação social fundamental. A reconstituição radical do
movimento socialista é uma parte vitalmente importante deste processo. [30]
Alguns dos mais inteligentes representantes do capital, como Dean Witter - o economista chefe
e director de economia global do Morgan Stanley - estão prontos a confessar que a tendências em
14

andamento são mais problemáticas do que habitualmente pintadas nos órgãos de propaganda do
neoliberalismo. Num artigo publicado no Sunday New York Times , intitulado "The Worker
Backlash", ele rejeita a explicação de que os êxitos recentes resultaram da "desregulamentação e do
aumento de produtividade". A sua própria explicação, de longe mais consciente do conflito e menos
reconfortante, é que foi
“um realinhamento dramático do bolo económico do país, com uma fatia
muito maior indo para o capital e uma mais pequena indo para o trabalho.
Chamo a isto uma recuperação do trabalho triturado, que floresceu só porque
a América empresarial aplicou uma pressão implacável sobre a sua força de
trabalho". [31]

Na verdade, não só a América empresarial aplica pressão implacável sobre a sua força de
trabalho como também as personificações do capital fazem-no por toda a parte. Pois as conquistas
reformistas do passado foram precedidas pelo crescimento contínuo do bolo - as quais surgiram sob
condições económicas favoráveis como concessões do capital, ainda que nunca pudessem ser uma
questão de "realinhamento do bolo em favor do trabalho" uma vez que o capital deve sempre
apropriar-se da fatia do leão. Agora, devido à crise estrutural do capital e do estreitamento da margem
de viabilidade do sistema produtivo, torna-se absolutamente necessário "realinhar o bolo econômico
do país", mais do que nunca, em favor do capital, de modo a assegurar uma "recuperação do trabalho
triturado", graças à passividade e resignação da força de trabalho. Mas o que acontece quando o
trabalho recusa-se a acompanhar tal brutal realinhamento do bolo econômico, porque não pode mais
permitir-se isso devido à crescente dureza imposta pelas tradicionais e recém-inventadas formas de
"economia do trabalho triturado"? As possibilidades de "realinhar" um bolo estacionário, para não
falar num em processo de encolhimento, tem os seus limites bem definíveis. Não esquecer o facto de
que a inatividade contemplativa ("resignatory") do movimento dos trabalhadores não pode ser tomada
simplesmente como garantida para sempre em qualquer país, como uma matéria de necessidade
natural. Nem mesmo nos países capitalistas mais avançados. Não é de admirar, portanto, que hoje
mesmo o economista chefe do Morgan Stanley tenha de falar acerca da "Revanche dos trabalhadores"
("The Worker Backlash") nos EUA, dando voz às suas preocupações acerca de uma possível "luta pelo
poder primário entre o capital e o trabalho" e acrescentando que "longe estão os dias de uma força de
trabalho dócil que outrora concordou com as reestruturações empresariais de retalhamento e queima
(slash-and-burn) ". [32]
Naturalmente, do ponto de vista do capital não pode haver respostas para a pergunta: que
espécie de alternativa à "economia do trabalho triturado" deveria ser perseguida a fim de evitar "a luta
pelo poder primário entre o capital e o trabalho". Quaisquer que sejam os seus temores e
preocupações, o economista chefe do Morgan Stanley deve continuar a aconselhar a sua firma acerca
dos melhores meios de explorar as oportunidades da especulação financeira "globalizada", ou ele será
15

rapidamente despachado para pastagens mais tranquilas com um poderoso aperto de mão dourado. Do
ponto de vista do capital realmente "não há alternativa" ao "trabalho triturado" tanto quanto possível -
e mais ainda em situações de emergência -, mesmo que alguém perceba os perigos implícitos de
perseverar nesse caminho socioeconômico. Pois no fim há sempre a sedução de soluções autoritárias,
não só no país do General Suharto, cliente dos EUA, como também nas "democracia capitalistas
avançadas" do Ocidente que ajudaram a colocar Suharto no poder, apoiando-o de todas as formas
possíveis durante 32 anos, incluindo sua selvagem repressão militar do povo, e tentando salvar o seu
miserável regime com fundos maciços do FMI até no último minuto antes da sua morte.
A promessa geral de resolver as gritantes iniquidades e contradições do sistema foi durante
muito tempo - e ainda hoje continua - que através dos benefícios do sempre crescente e globalmente
integrado "livre comércio" as condições dos trabalhadores melhorariam muito em todo o mundo,
graças ao retorno da economia a uma situação de expansão não perturbada do capital, livre dos
defeitos das décadas do pós-guerra que acabaram em inflação e estagnação. Os sinais reais e os
indicadores econômicos, contudo, apontam na direção oposta, um facto por vezes reconhecido mesmo
por economistas da "corrente predominante" (mainstream) que mantêm a sua crença nas virtudes
insuperáveis do sistema do capital. Assim, para citar um artigo que resenha um livro recente de um tal
economista:
"Rodrick argumenta que o comércio em geral, não apenas as importações de
baixos salários, piora a distribuição do rendimento. A competição
internacional acrescida, escreve ele, traduz-se numa maior "elasticidade" da
procura interna por trabalho. Em termos simples, isto significa que um
trabalhador está agora a competir com uma oferta de trabalho muito mais
vasta. Em resultado disso, uma pequena mudança nos salários de
trabalhadores estrangeiros ou na procura global por um produto ou serviço
pode causar grandes mudanças na procura interna de trabalhadores. A maior
vulnerabilidade do trabalho a flutuações do mercado enfraquece a sua
posição negocial em relação ao capital. Portanto, conclui Rodrick, "O efeito
de primeira ordem do comércio parece ter sido uma redistribuição do
excedente da empresa em benefício do patronato e não a ampliação do
excedente". A evidência, portanto, diz-nos que os críticos do livre comércio
estavam certos; o comércio não está a ampliar a riqueza e sim a redistribuí-la
para um nível mais alto". [33]

Mas, ainda assim, quando chega à questão das alternativas, obtemos de Rodrick apenas piedosas
pregações. Assim, para continuar nossa citação:
16

"As políticas de Rodrick são na melhor das hipóteses ingênuas. Ele aconselha
o trabalho e o governo a serem mais responsáveis, mas nada tem a dizer às
corporações de negócios multinacionais. ... "O trabalho deveria advogar uma
economia global que tivesse uma face mais humana", escreve Rodrick, mas
silencia acerca dos ferozes esforços organizados pelos negócios
multinacionais e pelas finanças para impedir que políticas humanas sejam
sequer consideradas pelo Fundo Monetário Internacional, pelo Banco
Mundial, pela Organização Mundial de Comércio, e por outros que
estabelecem as regras para o mercado global. Isto sugere um ponto de vista
que está, para dizer a coisa suavemente, desligado das realidades da
economia política global". [34]

Na verdade, adotar o ponto de vista do capital - não só na sua forma neoliberal cegamente acrítica e
mais agressiva, mas também nas suas ilusórias variedades liberal-reformistas - significa desde há
muito "desligar-se das realidades da economia política global".
A novidade radical do nosso tempo é que o sistema do capital já não está em posição de
conceder ao trabalho seja o que for, em contraste com as aquisições reformistas do passado. A
acomodação deprimente, e mesmo a capitulação total, de alguns dos antigos partidos da classe
trabalhadora às exigências dos interesses dos grandes negócios - como na Grã-Bretanha e em vários
países europeus, mas de modo nenhum apenas na Europa -, uma capitulação que chega não só a
manter a autoritária legislação anti-trabalhista das últimas poucas décadas como também a dar postos
ministeriais chave nos governos do "New Labour", da "Esquerda Democrática" italiana e alhures a
proeminentes representantes do capital corporativo, fala inequivocamente acerca desta postura. (Lord
Simon, Lord Sainsbury, Geoffrey Robinson, etc na Grã-Bretanha e figuras semelhantes na Alemanha,
França e Itália). Eis porque no actual período histórico mesmo os objetivos limitados e modestos do
trabalho - como a semana de 35 horas - só podem ser realizados através da "mudança de sociedade",
uma vez que objetivamente contestam a ordem socioeconômica e política estabelecidas (por outras
palavras: todo o sistema de tomada de decisão) sob a qual "o bolo econômico do país" é produzido e
distribuído. Nas condições da crise estrutural do capital esta é a natureza objetivamente inevitável da
contestação socioeconômica, mesmo que no momento muitos representantes do trabalho não
conceptualizem ou articulem isto nestes termos. E esta é também a razão porque o reformismo liberal
e social-democrata, o qual em outros tempos tinha um poderoso aliado no dinamismo expansionista do
capital, está agora condenado à futilidade das pregações piedosas - desde os sermões do professor John
Kenneth Galbraith acerca da "Cultura do contentamento" (rapidamente reflectidos, sem os mais
ligeiros efeitos curativos, por Bispos e Arcebispos na Igreja da Inglaterra) à noção do "trabalho e
governo inspirados pela economia global com uma face humana" citada atrás. Uma pregação que as
personificações do capital provavelmente não podem ouvir.
17

A exigência de uma redução significativa da semana de trabalho tem uma importância


estratégica fundamental. Não só porque a questão subjacente afeta profundamente e portanto preocupa
diretamente cada trabalhador, manual e intelectual afim, qualquer que seja a cor dos seus colarinhos.
Igualmente porque a questão do enfrentamento deste desafio não está a desvanecer-se. Ao contrário,
cresce em importância a cada dia que passa, e o imperativo de fazer algo significativo em relação a
isto não pode ser decretado como inexistente pelas personificações parlamentares do capital nos países
capitalistas avançados, nem na verdade reprimidos pelas forças nuas na "periferia" da ordem global do
capital. Por outras palavras, trata-se de uma exigência estratégica vital para o trabalho porque ela é
"não negociável": isto é, não pode ser integrada nas pseudo-concessões manipuladas da ordem
existente. Pois refere-se diretamente à questão do controle - um sistema alternativo de controle social
metabólico - ao qual o capital opõe-se frontalmente.
Naturalmente, as 35 horas de trabalho semanal - mesmo que pudessem ser genuinamente
concedidas e não anuladas tortuosamente de muitas maneiras, como é cinicamente planeado ou já
praticado - não poderiam resolver o monumental e sempre crescente, bem como socioeconomicamente
grave, problema do desemprego. Assim, a questão que legitimamente se levanta é: porque 35 e não 25
ou 20 horas por semana, que faria uma maior diferença em relação a isso? Esta é a questão que nos
transporta ao coração do assunto.
As incompatibilidades radicais entre a ordem social existente e uma na qual seres humanos
estejam no controle da sua atividade vital, incluindo o seu "tempo livre", a ser posto livre por uma
redução significativa da semana de trabalho, foi gráfica e penosamente ilustrado na Grã-Bretanha
através da destruição da indústria mineira. Em 1984 os mineiros de carvão travaram uma luta heróica,
não por dinheiro mas em defesa do seus empregos: uma longa greve de um ano que foi derrotada
através dos esforços combinados do governo da sra. Thatcher - a qual chamou os mineiros de "o
inimigo interno" - e o Partido Trabalhista de Neal Kinnock o qual apunhalou-os pelas costas. Como
resultado, a força de trabalho dos mineiros, que na época era de mais de 150 mil, foi dizimada, caindo
para o número atual de menos de 10 mil, e as cidades e aldeias de muitas comunidades mineiras foram
transformadas num deserto de desemprego desumanisado. No tempo da greve dos mineiros as minas
de carvão estavam ainda "nacionalizadas", o que significa que eram administradas com os mais brutais
critérios capitalistas de "eficiência" de controle autoritário pelo National Coal Board, tornando-se em
seguida "privatizadas" numa fracção da sua dimensão original. O que foi altamente característico do
modo como o Coal Board tratava do problema da "maior eficiência", enquanto falava acerca da
absoluta necessidade de "racionalizar" as exigências do trabalho na indústria do carvão, foi o facto de
que Board dirigido pelo Estado impôs aos mineiros uma quase insano cronograma de sete dias de
trabalho ao mesmo tempo em que cortava de forma selvagem a força de trabalho sob o seu controle.
Pois o capital é absolutamente incapaz de considerações humanas. Ele conhece só uma maneira de
administrar o tempo de trabalho: pela maximização da exploração do "tempo de trabalho necessário"
18

da força de trabalho empregada, ignorando totalmente o "tempo descartável" disponível na sociedade


de forma geral, pois não pode extrair lucro do mesmo.
Isto é o que impõe limites inultrapassáveis ao capital no seu modo de tratar o problema do
desemprego. Há algo paradoxal, na verdade profundamente contraditório em relação a isto. Pois o
sistema produtivo do capital de facto cria "tempo supérfluo" na sociedade como um todo, numa escala
cada vez maior. Ainda assim ele não pode concebivelmente reconhecer a existência de juro (i.e., a
legitimidade) deste tempo excedente socialmente produzido como o potencialmente mais criativo
tempo descartável que todos nós temos, o qual poderia ser utilizado na nossa sociedade para a
satisfação de muitas das necessidades humanas que agora são cruelmente negadas, desde exigências de
educação e serviços de saúde até à eliminação da fome e desnutrição em todo o mundo. Ao contrário,
o capital deve assumir uma atitude negativa/destrutiva/desumanisante em relação a isto. Na verdade, o
capital deve ser rigidamente indiferente ao facto de que o conceito de "trabalho supérfluo", com o seu
"tempo supérfluo", refere-se na realidade a seres humanos vivos e possuidores de capacidades
produtivas socialmente utilizáveis - ainda que capitalisticamente redundantes ou inaplicáveis.
O conceito de tempo disponível, tomado no seu sentido positivo e libertador, como uma
aspiração de socialistas, surgiu bem antes de Marx, num panfleto anônimo intitulado "A fonte e o
remédio das dificuldades nacionais" ("The Source and Remedy of the National Difficulties") ,
publicado em Londres quase 50 anos antes de O Capital de Marx, em 1821. Em algumas passagens
citadas por Marx este panfleto oferecia uma notável compressão dialéctica tanto da natureza
capitalística do processo produtivo e - ao focar a sua atenção sobre as categorias vitalmente importante
do "tempo disponível", "trabalho excedente", "dia de trabalho abreviado" - como das possibilidades de
escapar às suas contradições. Cito:

"Riqueza é tempo disponível e nada mais. ... Se todo o trabalho de um país


fosse suficiente somente para obter o sustento de toda a população, não
haveria trabalho excedente, consequentemente nada que pudesse ser
permitido acumular como capital. ... Uma nação será verdadeiramente rica se
não houver qualquer interesse ou se o dia de trabalho for de 6 horas ao invés
de 12". [35]
Estamos vagarosamente a alcançar a exigência, tal como nossos ancestrais o fizeram em 1821,
das 6 horas de trabalho diárias, mas ainda estamos muito longe de organizar a sociedade com base no
imensamente maior potencial de produção de produção de riqueza do tempo disponível. Sem este
último, não pode colocar-se a questão da emancipar os indivíduos trabalhadores da tirania de
determinações fetichísticas e de iniquidades gritantes. A realização de mesmo alguns dos nossos
limitados objectivos exigirá mobilização em massa [36] das pessoas empregadas e desempregadas,
guiadas pela solidariedade para com os problemas que todos nós somos obrigados a partilhar, hoje ou
amanhã. A perspectiva estratégica num prazo mais longo, que torna factível também a realização das
19

exigências imediatas, é inseparável da nossa consciência da viabilidade e na verdade da necessidade


fundamental de adotar o modo de controlar a nossa reprodução social metabólica com base no tempo
descartável. Este é o objectivo a que precisamos dedicar recursos se nos importamos com o problema
do desemprego. Só um movimento de massa socialista radical pode adotar a alternativa estratégica de
regular a reprodução social metabólica - um dever absoluto no futuro - com base no tempo
descartável. Pois devido aos constrangimentos inultrapassáveis e às contradições do sistema do capital,
qualquer tentativa de introduzir o tempo descartável como o regulador dos intercâmbios sociais e
econômicos - o que teria de significar colocar à disposição das pessoas individuais grandes
quantidades de tempo livre , libertados através da redução do tempo de trabalho bem além dos limites
de mesmo umas 20 horas de trabalho por semana - atuaria como dinamite social , explodindo o alto
firmamento da ordem reprodutiva estabelecida. Pois o capital é totalmente incompatível com o tempo
livre utilizado autonomamente e de forma significativa por indivíduos sociais livremente associados.

Notas

1 "Underground Economy", The Nation , January 12/19, 1998, p. 3.


2 Japan Press Weekly , 16 May 1998.
3 István Mészáros, The Necessity of Social Control, Isaac Deutscher Memorial Lecture, delivered at the London School of Economics and
Political Science on 26 January 1971. Merlin Press, London, 1971, pp. 54-55; reprinted in Mészáros, Beyond Capital, Merlin Press, London
1995 and Monthly Review Press, New York 1996. Quotation is from pp.889-890.
4 "Enquanto o número total de pessoas desempregadas registadas em agências de empregos manteve-se em 336 milhões em 1993, o número
de pessoas empregadas no mesmo ano segundo a Planning Commission era apenas de 307,6 milhões, o que significa que o número de
pessoas desempregadas registadas é mais elevado do que o número de pessoas empregadas. E a taxa da porcentagem de aumento de emprego
é quase desprezível". Sukomal Sen, Working Class of India: History of the Emergence and Movement 1830-1990. With an Overview up to
1995, K.P. Bagchi & Co., Calcutta 1997, p. 554.

5 "Waterloo in Asia?", The Nation, January 12/19, 1998, p. 4. Os interesses americanos são cinicamente perseguidos e impostos sempre que
a oportunidade dá ocasião. Assim, "responsáveis americanos, que efectivamente vetaram a criação de um Fundo Regional Asiático
independente do FMI, e portanto de Washington, também fizeram saber - mais recentemente no caso da Coreia - que nenhuma ajuda
americana directa virá até que os países aflitos concordem com as exigências do FMI. Dessa forma, as autoridades tailandesas concordaram
em remover todos os limites sobre a propriedade estrangeira de empresas financeiras e estão a promover legislação que permita aos
estrangeiros possuírem terra, o que era um tabu. Mesmo antes do pedido de ajuda ao FMI, Djacarta aboliu suas restrições à propriedade
estrangeira de acções comercializadas publicamente, um movimento replicado por Seul quando concedeu aos investidores estrangeiros
acesso aos US$64 mil milhões a longo prazo, garantidos por títulos de empresas no mercado, cujo acesso eles procuraram durante anos".
Walden Bello, "The End of the Asian Miracle", The Nation , January 12/19, 1998, p. 19.

6 Cumprimentos do FMI, certamente, significam muito pouco, se é que alguma coisa, mesmo nos seus próprios termos de referência.
Caracteristicamente, "quando a economia tailandesa estava direccionada para perturbações, o FMI ainda estava louvando o 'registo
consistente de saudáveis políticas de administração macro-económica' do governo". Walden Bello, "The End of the Asian Miracle", loc. cit.,
p. 16. Analogamente, nos poucos meses decorridos desde que o FMI "salvou" a economia sul coreana, o desemprego realmente duplicou no
país. Ver também um artigo criterioso de János Jemnitz, "A review of Hungarian politics 1994-1997", Contemporary Politics, Vol. 3, No. 4,
1997, pp. 401-406.

7 Ver o primoroso livro de Gabriel Kolko, Vietnam: Anatomy of a Peace, Routledge, London and New York, 1997. Ver também Nhu T. Le's
passionate rejoinder in his review of Kolko's book in The Nation , "Screaming Souls", 3 November 1997.
8 Anthony Kuhn, "268 million Chinese will be out of jobs in a decade", The Sunday Times , 21 August 1994.

9 Ver o livro de Lord Beveridge com o mesmo título e o seu importante papel no estabelecimento do "Welfare State" britânico.

10 Marx and Engels, Manifesto of the Communist Party, Progress Publishers, Moscow 1971, p. 44. Ver o artigo profundamente
compreensivo de Marshall Berman sobre o 150º aniversário do Manifesto, "Unchained Melody", The Nation , 11 May 1998, pp. 11-16.

11 "Jobless told: join Army or lose benefit" de Stephen Castle (Political Editor), Independent on Sunday , 10 May 1998. Outra manchete na
mesma página relata reacções ao nível miserável com que o salário mínimo foi introduzido pelo governo britânico do "New Labour" com o
título: "Union fury as Labour sets minimum wage at £3.60."

12 Susan Bell, "Paris pass law on 35-hour week", The Times , 20 May 1998.
20

13 "Nem resignado nem amaciado sobre a questão das 35 horas, o Presidente dos industriais está mais determinado do que nunca a repelir o
referendo". ("Né rassegnato, né ammorbidito sul tema delle 35 ore, il presidente degli industriali è più deciso che mai a promuovere un
referendum abrogativo.") Vittorio Sivo, "Referendum sulle 35 ore", La Repubblica , 22 April 1998.

14 Ibid.

15 "The working week: Fewer hours, more jobs?", The Economist , 4 April 1998, p. 50.

16 Ibid., p.51.

17 Michiyo Nakamoto, "Revolution coming, ready or not", Financial Times, 24 October 1997. Ver no mesmo número do Financial Times
um artigo de John Plender, "When capital collides with labour", escrito no mesmo espírito.

18 "Policy Complementation: The Case for Fundamental Labour Market Reform", por David Coe e Dennis Snower. IMF Staff Paper
Volume 44, No. 1, 1997. Revisto em The Economist , 15 November 1997, p. 118. Contundentemente, o título do artigo de revisão é "All or
nothing: Piecemeal labour-market reforms will not cure Europe's unemployment problem. Governments need to go the whole way."

19 Japan Press Weekly , 14 February 1998, p. 25. Em outro número do Japan Press Weekly lemos: "Os principais objectivos do projecto de
lei são aumentar a aplicação de cronogramas de trabalho arbitrário para facilitar as restrições ao sistema existente de variação de horas de
trabalho (sistema flexível) e tornar legais contratos de emprego a curto prazo". 18 April 1998.

20 Japan Press Weekly , 14 February 1998.

21 Japan Press Weekly , 28 March 1998.


22 Japan Press Weekly , 4 April 1998.
23 Akira Inukai, "Attack against workers' rights", Dateline Tokyo , No. 58, April 1998, p.3.
24 Ibid.
25 Ibid., p. 4.
26 The Necessity of Social Control, pp. 56-59, and Beyond Capital, 890-892.

27 "il lavoro sottotutelato e sottopagato si allarga a macchia d'olio, mentre anche il lavoro più stabile subisce la pressione verso una
intensificazione senza precedenti della sua prestazione lavorativa e verso una piena disponibilità alla sottomissione ai più diversificati tempi
di lavoro." In: "Trentacinque ore della nostra vita", um Apelo de intelectuais assinado por Mario Agostinelli, Pierpaolo Baretta, Heinz
Birnbaum, Carla Casalini, Marcello Cini, Giorgio Cremaschi, Pietro Ingrao, Oskar Negt, Paolo Nerozzi, Valentino Parlato, Marco Revelli,
Rossana Rossanda, Claudio Sabattini and Arno Teutsch; Il Manifesto, 13 February 1998, p. 5.

28 O papel intervencionista do Estado fica em evidência tanto no plano económico como no político. No domínio económico os fundos
generosamente esbanjados com grandes empresas capitalistas são medidos em centenas de milhões de libras. A British Aerospace, por
exemplo, vai receber aproximadamente £600 milhões para um dos seus empreendimentos, além dos incontáveis milhões obtidos semi-
fraudulentamente do Estado num passado não tão distante, inclusive numa ocasião em que a companhia pretendia por numa base
econômicasaudável a empresa Rover, agora novamente em bancarrota. E posteriormente os fundos maciços necessários hoje para salvar a
Rover são esperados mais uma vez que sejam fornecidos pelo Estado - e ninguém parece saudar agora as miraculosas virtudes da empresa
privada - enquanto deixam os lucros, naturalmente, para a parte capitalista do chamado "Partenariato Privado-Público" ("Private Public
Partnerships") tão favorecido pelo New Labour. Igualmente importante, se não mesmo mais, é o papel da intervenção do Estado como
procurador (on behalf) do capital no plano político. Pois o sistema do capital necessita extremamente da legislação autoritária anti-trabalhista
- gentilmente introduzida pelos Conservadores e governos social democratas afins (na verdade, a maioria deles efectivamente reconhece a
gravidade a gravidade da crise estrutural do sistema, mesmo alguns governos presididos por antigos partidos comunistas, como na Itália) - a
fim de manter o seu domínio .

29 Tal como Marshall Berman afirmou no seu artigo citado na nota 10, "a crueldade estúpida autodenomina-se liberalismo (estamos a
massacrá-lo e aos seus filhos ao eliminar o bem estar social para o seu próprio bem)" e vocês são "afastados ou despedidos - ou
desqualificados, terciarizados (outsourced) , reduzidos (downsized) . (É fascinante verificar como muitas destas palavras trituradoras são
absolutamente novas)." The Nation , 11 May 1998, p. 16.

30 Ver um poderoso capítulo acerca dos desafios enfrentados pelo movimento dos trabalhadores; "Beyond Labour and Leisure", in Daniel
Singer's book, Whose Millennium?, publicado pela Monthly Review Press, New York, Spring 1999.

31 Dean Witter, "The Worker Backlash", Sunday New York Times, citado numa carta enviada aos leitores e apoiantes da Monthly Review
pelos seus Editores em Outubro de 1997.

32 Ibid.

33 Jeff Faux, "Hedging the neoliberal bet", (a review of Dani Rodrick's book, Has Globalization Gone Too Far?, Institute for International
Economics, Washington D.C., 1997), in Dissent , Fall 1997, p. 120.

34 Ibid.

35 Citado no Grundrisse de Marx, Penguin Books, Harmondsworth, 1973, p. 397.

36 O Apelo citado na Nota 27 refere-se certamente à necessidade de "promover uma mobilização de massa em favor das 35 horas semanais,
para afectar tanto o mundo do trabalho como da política e da cultura assim como o mundo das associações". ("promuovere una mobilitazione
di massa a favore delle 35 ore che tocchi il mondo del lavoro cosi come quello della politica, quello della cultura come quello delle
associazioni.")

[Tradução de Jorge Figueiredo]

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