Sistema de Avaliação Da Educação Basica
Sistema de Avaliação Da Educação Basica
Sistema de Avaliação Da Educação Basica
https://doi.org/10.18222/eae.v32.7839
SISTEMA DE AVALIAÇÃO DA
EDUCAÇÃO BÁSICA: REVISÃO
SISTEMÁTICA DA LITERATURA
TALITA EMIDIO ANDRADE SOARES I
DENILSON JUNIO MARQUES SOARES II
WAGNER DOS SANTOS III
RESUMO
Neste artigo foi realizada uma revisão sistemática da literatura adequada às
recomendações Prisma, utilizando o descritor “Sistema de Avaliação da Educação
Básica” (Saeb). As buscas foram realizadas nas bases de dados Scopus, Web of Science
e SciELO, sem delimitação temporal. Foram selecionados 11 artigos, classificados em
três categorias que discutem a origem do Saeb mediante as reformas educacionais da
década de 1990, o Saeb enquanto política de responsabilização (accountability) e os
fatores associados aos resultados do Saeb. Evidenciou-se que seu papel e desempenho
como política de avaliação é amplamente criticado. Em contrapartida, nota-se a escassez
de estudos que discutem novas possibilidades para avaliar a qualidade da educação
básica, constituindo um campo aberto para discussões no ambiente acadêmico.
PALAVRAS-CHAVE
SISTEMA NACIONAL DE AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA •
AVALIAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA • POLÍTICAS PÚBLICAS EM EDUCAÇÃO • REVISÃO
DE LITERATURA.
INTRODUÇÃO
Os sistemas de avaliação da educação, organizados por agentes externos à escola
(ditas avaliações externas),1 ganharam maior visibilidade na América Latina a par-
tir da década de 1980, fruto da ascensão das políticas internacionais no continente
que defendiam o gerenciamento estatal da educação, por meio de sua regulação e
monitoramento (UCZAK, 2014; MENDONÇA, 2014).
Nesse período, propuseram-se no Brasil as primeiras iniciativas externas de ava-
liação aplicada em larga escala, com destaque para o Projeto Nordeste de Educação
Básica I (Edurural), o Projeto Nordeste de Educação Básica II (Projeto Nordeste) e a
Avaliação do Rendimento Escolar de Alunos de Escolas de 1° Grau da Rede Pública.
Esta última, realizada por iniciativa do Ministério da Educação (MEC) com a cola-
boração da Fundação Carlos Chagas (FCC), com o objetivo de verificar a viabilidade
de um projeto de avaliação em âmbito nacional, servindo de base para o desenho
inicial do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Público de 1° Grau (Saep).
A primeira aplicação do Saep ocorreu no final de 1988. Com ela, foi possível
verificar a pertinência dos instrumentos e procedimentos de medida até então uti-
lizados nas avaliações externas nacionais, com vistas para a ampliação da propos-
ta, que culminaria na criação do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb).
Dessa forma, alguns estudos referem-se ao Saep como um projeto piloto do Saeb
(BONAMINO; FRANCO, 1999; PESTANA, 2016).
As primeiras aplicações do Saeb ocorreram em 1990 e 1993 e assumiram os cur-
rículos de sistemas estaduais como subsídio para a elaboração das provas, que ava-
liaram a aprendizagem de uma amostra de estudantes, matriculados nas 1ª, 3ª, 5ª
e 7ª séries do ensino fundamental, em Língua Portuguesa, Matemática, Ciências
Naturais e Redação.
Entretanto, o Saeb só foi regulamentado quatro anos após o primeiro ciclo, por
meio da publicação da Portaria n. 1.795, de 27 de dezembro de 1994 (BRASIL, 1994).
Conforme o art. 1°, constituíam os objetivos gerais do referido sistema de avaliação:
1 Essas avaliações geralmente são aplicadas em larga escala, ou seja, a um grande número de estudantes.
Dessa forma, é comum referir-se a elas como avaliações externas em larga escala ou avaliações
estandardizadas (MARQUES; STIEG; SANTOS, 2020).
METODOLOGIA
Neste artigo, de natureza qualitativa do tipo exploratória, realizou-se uma revisão
sistemática da literatura sobre o Saeb. Para isso, foram utilizadas as diretrizes de
elegibilidade e análise do modelo Prisma (Preferred Reporting Items for Systematic
Reviews and Meta-Analyses) e a Análise Temática proposta por Braun e Clarke (2006).
O modelo Prisma, elaborado como ponto de partida para o desenvolvimento de
uma revisão de literatura, auxilia, por meio de seus métodos sistemáticos, a identifi-
cação, seleção e avaliação crítica a respeito das pesquisas mais relevantes relaciona-
das ao tema em estudo (MOHER et al., 2009). Trata-se de um checklist que direciona o
processo disposto em quatro fases: identificação, triagem, elegibilidade e inclusão.
A análise temática, por sua vez, segundo Souza (2019), contribui para estreitar
o campo de visão analítico do pesquisador. É um instrumento estruturado em seis
fases para que certas decisões, tradicionalmente implícitas, se tornem evidentes na
realização da análise, tornando-se eficaz para interpretar e relatar padrões (temas)
com base nos dados qualitativos.
Para compor esta revisão, optou-se por uma consulta expandida ao Portal de
Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes),
considerando SciELO (Scientific Electronic Library Online), Scopus e Web of Science
(WoS) como bases de dados eletrônicas. Essas bases foram escolhidas por serem as
principais indexadoras para a obtenção de melhores classificações nas avaliações do
RESULTADOS
Mediante as estratégias de pesquisa, foram identificados, inicialmente, 124 artigos,
dos quais 74 pertenciam a periódicos revisados por pares. Destes, 28 estavam in-
dexados nas bases de dados definidas (SciELO, Scopus e WoS). Com a leitura dos
resumos, optou-se pela exclusão daqueles cuja temática principal não era o objeto
desta pesquisa ou que foram publicados em periódicos cujo foco não era a educação.
Entre os artigos excluídos, destacam-se a presença de discussões sociais, curricu-
lares, estruturais e de estudos que consideram instituições de ensino específicas,
restando 11 artigos para as análises propostas neste estudo.
A Figura 1 apresenta um fluxograma da seleção dos artigos analisados, que foi
realizada de acordo com as diretrizes do método Prisma.
Fonte:
Fonte:Elaboração
Elaboraçãodos
dos autores.
autores.
Fonte:Elaboração
Fonte: Elaboraçãodos
dosautores.
autores.
alguns dos artigos analisados (COELHO, 2008; ALVES, 2008; SOUSA; OLIVEIRA,
2010; KAUKO et al., 2016; DICKEL, 2016). Dessarte, Bonamino e Franco se mostram
referências nas discussões acerca do Saeb.
Em relação aos professores da Universidade de São Paulo (USP) (SOUSA;
OLIVEIRA, 2010) destaca-se que a professora colaboradora Sandra Zákia Sousa tra-
balhou no MEC, no período de 1982 a 1991, atuando também na gerência do Projeto
de Capacitação de Recursos Humanos do Programa Edurural. O professor titular
aposentado Romualdo Luiz P. Oliveira, por sua vez, atuou como colaborador da
Unesco. Apesar de não ser o caso do presente trabalho, ambos são citados por ou-
tros dois artigos (KAUKO et al., 2016; DICKEL, 2016). Verificou-se que, além dos auto-
res apresentarem um considerável volume de publicações em conjunto, há também
a participação de Adriana Bauer, referência em avaliação educacional e integrante
de um dos projetos de pesquisa dos quais os autores fizeram parte.
Com respeito ao artigo dos professores de instituições distintas (FRANCO;
MENEZES-FILHO, 2012), podemos ressaltar que Naércio Aquino Menezes-Filho, do
Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), orientou a professora adjunta Ana Maria de
Paiva Franco, da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), durante seu doutorado
em Educação, sendo com ela suas únicas produções relacionadas ao Saeb. Menezes-
-Filho é citado em duas produções analisadas (ALVES, 2008; CASTRO; TAVARES
JÚNIOR, 2016). Ana Maria de Paiva Franco, por sua vez, atuou como analista e con-
sultora de instituições como Itaú (Unibanco), Banco Mundial e Comissão Econômica
para América Latina e Caribe (Cepal). Além disso, a autora tem publicações com o
economista Renato Baumann, seu orientador de mestrado e diretor do Escritório
Cepal no Brasil (1995-2010), período no qual a autora prestou serviços técnicos.
Por último, encontram-se os artigos publicados por grupos no âmbito nacional e
internacional. Ressalta-se que enquanto a produção nacional se restringe a um tema
específico, que diz respeito à avaliação no ensino de Ciências Naturais (DANTAS;
MASSONI; SANTOS, 2017), a produção internacional (CARNOY et al., 2015; KAUKO et
al., 2016; FERRÃO et al., 2018) abrange temas mais amplos como economia (CARNOY
et al., 2015), formulação de políticas públicas (KAUKO et al., 2016) e resultados de
pesquisas realizadas pelo Inep (FERRÃO et al., 2018).
Entre os autores das produções realizadas em grupo, é importante acentuar a
relevância de Martin Carnoy, autor com mais citações entre os artigos analisados
(BONAMINO; FRANCO, 1999; ALVES, 2008; CARNOY et al., 2015; KAUKO et al., 2016;
FERRÃO et al., 2018). Economista e professor da Universidade de Stanford, Carnoy
também trabalhou como consultor do Banco Mundial e da Unesco. Além disso, o
autor é conhecido por seus debates acerca da escola charter, por suas pesquisas em
relação ao impacto das políticas de responsabilização na aprendizagem, eficácia e efi-
ciência nas escolas e também pelos efeitos da globalização nos sistemas educacionais.
A seguir, apresenta-se uma exposição para cada categoria, identificada com base
na análise temática deste estudo.
3 Os estados participantes do Edurural eram Ceará, Pernambuco e Piauí (BONAMINO; FRANCO, 1999).
Dessa forma, por meio desse cenário favorável e com a crescente utilização
dos exames estandardizados, a partir de 1990, o Saeb passou a substituir o Saep,
tendo sido criado com o objetivo de contribuir para o monitoramento da educação
básica brasileira e para oferecer subsídios aos formuladores de políticas públicas
(BONAMINO; FRANCO, 1999; SOUSA; OLIVEIRA, 2010).
De acordo com Sousa e Oliveira (2010), destaca-se a influência do Saeb nos siste-
mas estaduais5 de avaliação, tornando-se uma referência para os gestores estaduais.
Nota-se sua influência tanto como modelo de desenho a ser seguido quanto como
parâmetro para a proposição de alternativas (SOUSA; OLIVEIRA, 2010). A citar, por
exemplo, a Matriz de Referência do Saeb,6 instituída em 1997, que também serviu
como subsídio para a formulação dos currículos estaduais (BONAMINO; FRANCO,
1999; SOUSA; OLIVEIRA, 2010).
Durante seus primeiros 20 anos, por meio de um estudo realizado por Coelho
(2008), apresentam-se as principais modificações sofridas pelo Saeb nesse perío-
do. Dentre elas, destaca-se o levantamento de dados sobre o nível socioeconômico
(NSE). Bonamino e Franco (1999), por sua vez, apontam os resultados do Relatório
Coleman (1986) como essenciais para essa composição do Saeb. Esse relatório apon-
tou o NSE dos alunos como o fator primordial para o desempenho escolar, o que
4 Os estados participantes do Projeto Nordeste eram: Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba,
Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe (PEREIRA, 2007).
5 No artigo de Sousa e Oliveira (2010) analisam-se os seguintes estados: Bahia, Ceará, Minas Gerais,
Paraná e São Paulo.
6 Essa pode ter sido a primeira experiência de implantação de um currículo comum no contexto nacional.
7 De acordo com Brasil (2020), o Novo Saeb pretende avaliar todos os anos escolares a partir do 2° ano do
ensino fundamental das escolas públicas e privadas, permitindo-se acompanhar o progresso do aluno
no decorrer dos anos da vida escolar.
verificou-se que um dos desafios de tal situação é que grande parte dos países em
desenvolvimento ainda não tem um sistema de avaliação da qualidade da educação
que consiga tal êxito.
Em conclusão, constata-se que, entre os artigos desta categoria, existe forte-
mente a crítica quanto ao uso que se tem feito dos resultados das avaliações do
Saeb, sobretudo no que diz respeito às suas ações como política de responsabi-
lização (accountability) (FRANCO; MENEZES-FILHO, 2012; DANTAS; MASSONI;
SANTOS, 2017). No entanto, Franco e Menezes-Filho (2012) não apresentam as pri-
meiras iniciativas dessa responsabilização na educação brasileira, tampouco seus
respectivos contextos.
Evidencia-se, portanto, a necessidade de pesquisas que considerem as resolu-
ções do Saeb e/ou da legislação brasileira que ocasionaram em tal responsabiliza-
ção, por exemplo, o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), o Plano Nacional
de Educação (PNE) e a própria ANA, já mencionada.
Além disso, os artigos de Dickel (2016) e Dantas, Massoni e Santos (2017) criti-
cam algumas das ações do Saeb, como o ranqueamento grosseiro das escolas, mas
não apresentam possíveis alternativas de mudanças nem para aperfeiçoamento do
sistema.
Entre as poucas soluções apresentadas pelos artigos, justifica-se o uso de aná-
lises qualitativas acerca dos fatores da escola em conjunto com a quantitativa,
porém não se apresenta o modo como seriam feitas e nem quais seriam os respon-
sáveis por sua realização (FRANCO; MENEZES-FILHO, 2012; DANTAS; MASSONI;
SANTOS, 2017).
Outra discussão apresentada pelos artigos refere-se à imposição de um currícu-
lo por meio da avaliação (DICKEL, 2016; DANTAS; MASSONI; SANTOS, 2017). Apesar
da relevância desse fato, os artigos não consideram o movimento da adoção das ma-
trizes de referência do Saeb nem a influência da Base Nacional Comum Curricular
(BNCC) que, de acordo com Brasil (2020), será utilizada pelo Saeb para avaliar todos
os anos escolares a partir do 2° ano do ensino fundamental.
Em síntese, exterioriza-se a necessidade de pesquisas que busquem abarcar algu-
mas das questões expostas anteriormente, de maneira a considerar tanto o contexto
das mudanças como o de seus agentes influenciadores. Desse modo, é necessário
realizar uma investigação profunda de como o Saeb se torna um instrumento de
monitoramento da qualidade da educação básica.
Isso significa que, apesar da influência do background8 familiar, ele não é exclusivo
para determinar a realização escolar do aluno (CASTRO; TAVARES JÚNIOR, 2016).
Por isso, os problemas nos sistemas de ensino deveriam ser resolvidos desde a
pré-escola (CASTRO; TAVARES JÚNIOR, 2016; FERRÃO et al., 2018), de modo a au-
xiliar os alunos ao longo de sua trajetória escolar, evitando o comprometimento de
sua escolarização futura (FERRÃO et al., 2018).
Conclui-se que, como a educação é uma possibilidade de ascensão social, em de-
corrência do valor atribuído à educação escolarizada, o entendimento do b ackground
familiar é crucial para a implementação de projetos e promoção de políticas e/ou
ações educacionais destinadas à melhoria da qualidade da educação e à equidade no
sistema de ensino (FERRÃO et al., 2018).
Constata-se, portanto, mais uma vez, a necessidade de um sistema de avaliação
que monitore os alunos ao longo dos anos, em especial aqueles com menos recur-
sos (FERRÃO et al., 2018). Dessa forma, o sistema forneceria subsídios às decisões
políticas para um planejamento com medidas de caráter focalizado, pois conhecer
melhor o perfil desses estudantes também ajudaria as escolas a adaptarem melhor
esses alunos (CASTRO; TAVARES JÚNIOR, 2016; FERRÃO et al., 2018).
Ademais, o sistema de avaliação permitiria “[...] a avaliação do impacto de polí-
ticas, programas e medidas na atenuação das desigualdades sociais e educacionais”
(FERRÃO et al., 2018, p. 290). Contudo, é preciso analisar os dados com cautela e
atentar-se à generalização exacerbada dos resultados, pois o próprio Pisa apresen-
tou uma superestimativa dos ganhos (CARNOY et al., 2015).
Percebe-se, também, que os artigos dessa categoria se preocupam em validar,
mediante pesquisas empíricas, concepções relevantes para o desempenho escolar
dos estudantes, como a influência do NSE e do background familiar (CARNOY et
al., 2015; CASTRO; TAVARES JÚNIOR, 2016; FERRÃO et al., 2018). Em contraparti-
da, não se atentam para a descoberta de novos fatores que possam interferir no
rendimento dos estudantes no Saeb, como a formação e a valorização docente,
a complexidade da gestão e a infraestrutura das unidades escolares. Acredita-se
que ponderar esses fatores contextuais é essencial para compreender as múltiplas
faces do sistema educacional brasileiro e suas implicações para o processo de en-
sino e aprendizagem escolar.
Além disso, os artigos dessa categoria utilizam dados de edições específicas,
sem considerar as modificações sofridas pelo Saeb, inclusive de uma edição para
8 O background familiar, de acordo com Castro e Tavares Júnior (2016), é o conjunto de características
socioeconômicas mensuráveis (o nível de instrução materno, o nível de instrução dos progenitores,
artefatos ou livros no domicílio, entre outros) que proporcionam melhor aproveitamento dos recursos
disponíveis.
outra (ALVES, 2008; CARNOY et al., 2015; CASTRO; TAVARES JÚNIOR, 2016; FERRÃO
et al., 2018). Vale ressaltar que a adoção pela análise de um período específico, sem
associá-la à implantação de políticas públicas educacionais, pode se tornar vaga.
Como exemplo, pode-se citar o artigo de Alves (2008), que considera os dados do
Saeb das edições de 1999, 2001 e 2003, mas não trata da adoção do programa de pro-
gressão continuada, apontada como um dos fatores que corroboraram não só para a
ampliação de matrículas, mas que também produziu um efeito significativo nas taxas
de abandono e de aprovação escolar (BRASIL, 1999; MENEZES-FILHO et al., 2009).
Em suma, os artigos desta categoria indicam que apesar de o Saeb ser um sis-
tema de avaliação importante, pouco se produz em relação aos efeitos diretos que
ele oferece à sua população (ALVES, 2008; CARNOY et al., 2015; CASTRO; TAVARES
JÚNIOR, 2016; FERRÃO et al., 2018). Evidencia-se, portanto, a necessidade de maio-
res investimentos em pesquisas que também abarquem o processo de tomada de
decisões dos governos com base nos resultados do Saeb, e não somente o juízo de
valores, como tem se estabelecido.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste artigo, apresentou-se uma revisão sistemática da literatura sobre o Saeb.
Observou-se que apesar de sua criação datar do ano de 1990, a publicação de artigos
com temáticas diretamente relacionadas ao sistema, no âmbito da educação, acon-
tece quase uma década depois (BONAMINO; FRANCO, 1999), ganhando notoriedade
com a criação da Prova Brasil, que inaugurou o caráter censitário nas avaliações
estandardizadas no cenário nacional.
Foram selecionados 11 artigos, classificados em três categorias de acordo com a
análise temática e que abordam: a origem do Saeb mediante as reformas educacio-
nais da década de 1990; o Saeb enquanto política de responsabilização (accountability);
e os fatores associados aos resultados do Saeb.
Percebeu-se que o seu surgimento é abordado de forma generalizada pelos arti-
gos e que vários porquês não são explicados ao longo dos textos, por exemplo, quais
são os sujeitos que contribuíram para a elaboração/desenho desse sistema de ava-
liação? Como se deram as primeiras experiências de avaliação no âmbito nacional
e quais foram suas justificativas? O que elas têm em comum com o Saeb? Qual o ce-
nário de sua efetivação? E quais metodologias foram/são utilizadas para a avaliação
e o levantamento de dados?
Apesar de destacarem as primeiras experiências de avaliação que culminaram no
surgimento do Saeb, como o Edurural e o Projeto Nordeste, os artigos não abordam
o que de fato se retirou de proveito dessas avaliações. Assim, aponta-se para a neces-
sidade de estudos que possam abarcar a similaridade do Saeb com esses projetos de
avaliação, de maneira a compreender suas prioridades, como a escolha dos anos e das
disciplinas avaliadas, a preferência pelas metodologias utilizadas, a seleção das com-
petências e habilidades e as instituições responsáveis por sua aplicação.
Observou-se também que essas discussões poderiam abarcar os interesses e as
inclinações políticas do Brasil, durante a implantação do sistema, de maneira mais
centralizada. As ações da FCC, pioneira na gestão das avaliações no contexto nacio-
nal, por exemplo, são pouco exploradas nos estudos que se referem ao surgimento
do Saeb, embora haja um amplo acervo de documentos e relatórios do período, pro-
duzidos por pesquisadores da instituição.
Verifica-se, ainda, a presença de perguntas em aberto relacionadas à atuação
internacional no contexto de criação do sistema de avaliação brasileiro: quem finan-
ciou sua implantação? Quais os possíveis interesses por trás disso? Quais foram as
condicionantes e os desdobramentos dessa ação? Embora alguns artigos debatam a
influência do Banco Mundial na consolidação do Saeb, não foi encontrado um estu-
do capaz de responder a todos esses questionamentos, que, por sua vez, constituem
um importante subsídio para a compreensão da origem do sistema.
Ademais, ressalta-se a necessidade de estudos que considerem o processo sócio-
-histórico e epistemológico que culminou, para além da criação, na consolidação do
Saeb, abarcando as principais modificações sofridas durante os seus primeiros 30
anos de existência.
Nessa vertente, deve-se considerar as diversas mudanças na estruturação do sis-
tema, como a criação das matrizes de referência, que proporcionou uma discussão
inicial acerca da implementação de um currículo comum no âmbito nacional e a
adoção da Teoria de Resposta ao Item (TRI) para a construção dos testes, que viabili-
zou análises longitudinais por meio da comparabilidade dos resultados no decorrer
dos anos. Essas análises, que consideram o desenvolvimento da educação ao longo
dos anos, também precisam ser mais bem exploradas nos estudos, por oferecerem
subsídios para o acompanhamento da efetividade das políticas públicas educacio-
nais adotadas.
Quanto aos fatores externos que oferecem impacto no desempenho escolar dos
estudantes, algumas das produções analisadas destacaram o NSE e o background
familiar (CARNOY et al., 2015; FERRÃO et al., 2018) e a formação docente (ALVES,
2008). No entanto, percebe-se a ausência de estudos que tratem de outros fatores
contextuais de ampla discussão na literatura especializada, como a infraestru-
tura das escolas (SOARES NETO et al., 2013; MATOS; RODRIGUES, 2016; SOARES;
SOARES; SANTOS, 2020) e a complexidade da gestão, no que se refere ao porte da
escola, ao número de estudantes nela matriculados e a quantidade de etapas oferta-
das (OLIVEIRA; CARVALHO, 2018; GOBBI et al., 2020). Acredita-se que esses fatores
também possam influenciar a aprendizagem dos estudantes.
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