A Construção Da Autoridade Docente... Silva e Abud

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CAMINHOS EM LINGUÍSTICA APLICADA

Universidade de Taubaté – UNITAU

A CONSTRUÇÃO DA AUTORIDADE DOCENTE: O QUE PENSAM OS


FUTUROS PROFESSORES SOBRE ISSO?

Elisabeth Ramos da SILVA

Maria José Milharezi ABUD


Universidade de Taubaté

Resumo: Este texto expõe uma pesquisa cujo objetivo foi investigar as concepções de alunos
em processo de formação docente sobre a autoridade do professor em sala de aula. Sabe-se
que a disciplina na escola está estreitamente associada à autoridade docente, daí esse tema
tornar-se objeto de nossas investigações, porque a qualidade do ensino pressupõe que haja
respeito, e este, por sua vez, vincula-se à autoridade do professor. Para a realização da pesquisa,
foram selecionados 33 alunos que frequentavam o curso de Letras, em uma universidade do
interior paulista. Por se tratar de um curso de licenciatura, tais alunos provavelmente
pretendem exercer o magistério. Sendo assim, a forma como concebem o conceito de
autoridade docente certamente influenciará em sua atuação profissional. Assim, solicitamos
aos sujeitos de pesquisa que completassem por escrito a seguinte questão: “Em sua opinião, a
autoridade do professor consiste em...”. As respostas dos sujeitos de pesquisa foram
examinadas segundo os constructos da análise de conteúdo de Bardin (2010). Feitas as
análises, verificou-se que a maioria entende a autoridade docente como o poder adquirido
pelo professor quando este sabe estabelecer limites ou possui domínio dos conteúdos e
postura adequada. Poucos concebem a autoridade docente como uma construção feita em
parceria entre professor e aluno. Nesse sentido, segundo os especialistas no assunto, atribuir
unicamente ao professor a responsabilidade de angariar o respeito do aluno pode tornar-se
empecilho ao êxito da aprendizagem. Por isso, é importante entender no que consiste a
autoridade docente para poder incrementar ações que a viabilizam.
Palavras-chave: Formação de professores. Autoridade docente. (In)disciplina na escola.

THE CONSTRUCTION OF TEACHER'S AUTHORITY: WHAT DO FUTURE


TEACHERS THINK ABOUT IT?

Abstract: This article shows a research which the objective was to investigate the conceptions
of students in the teacher's training process about his authority in the class. We know that
discipline in the school is strictly associated to teacher's authority; therefore this subject turns
into the objective of our investigations, because the quality of education assumes that students
have respect, and this, for instance, is related to teacher's authority. For the research
procedure 33 students were attended Letters Course in a university of a small city from São
Paulo state. Such students probably intend to follow the teaching profession. However, the way
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Revista CAMINHOS EM LINGUÍSTICA APLICADA, Volume 17, Número 3, 2º sem 2017.
Elisabeth Ramos da SILVA e Maria José Milharezi ABUD. A CONSTRUÇÃO DA AUTORIDADE DOCENTE: O
QUE PENSAM OS FUTUROS PROFESSORES SOBRE ISSO?. p. 559-580.
Disponível em: http://periodicos.unitau.br/ojs-2.2/index.php/caminhoslinguistica - - ISSN 2176-8625
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that they understand the concept of teachers' authority certainly will influence their
professional performance. Therefore, we requested to the subjects of our research to complete
the following sentence: “In my opinion, the authority of a teacher consists in…”. The answers of
this question were analyzed under the constructs of content analysis based on Bardin (2010).
Afterwards, we verified that the majority understands teachers' authority as a conquered
power by teacher when he knows how to establish the limits or when he has the contents
knowledge and an adequate performance. Otherwise a few understands teachers' authority as
a construction made between teacher and student. In this way, according to experts on the
subject, to attribute only to teachers the responsibility for the respect of their students it could
be a barrier for the learning success. So it is important to understand in what authority consists
in order to improve actions which turn it viable.
Keywords: Teachers' training. Teachers’ authority. (In)discipline at school.

LA CONSTRUCCIÓN DE LA AUTORIDAD DOCENTE: QUÉ PIENSAN SOBRE


ELLO LOS FUTUROS PROFESORES?

Resumen: En este texto se presenta una investigación de las concepciones de estudiantes en


proceso de formación docente sobre la autoridad del profesor en la sala de clases. Se sabe que
la disciplina en la escuela está estrictamente relacionada a la autoridad docente, de ahí ese
tema ser tomado como objeto de nuestras investigaciones, ya que la cualidad de la enseñanza
supone que exista respeto, el cual por su vez está vinculado a la autoridad del profesor. Para la
investigación fueron seleccionados 33 estudiantes del curso de Letras de una universidad
ubicada en el interior del Estado de São Paulo, Brasil. Por tratarse de una carrera de licenciatura,
se supone que esos estudiantes pretenden actuar como profesores. Así, la forma como
conciben el concepto de autoridad docente seguramente influenciará su actuación profesional.
Se solicitó a los participantes que respondieran por escrito la siguiente pregunta: “En su
opinión, la autoridad del profesor consiste en…”. Las respuestas fueron analizadas según los
constructos de contenido de Bardin (2010). Se constató que la mayoría comprende la autoridad
docente como el poder adquirido por el profesor cuando este sabe establecer límites o domina
los contenidos y tiene una postura adecuada a su papel. Pocos estudiantes conciben la
autoridad docente como una construcción realizada en conjunto entre profesor y estudiante.
Sin embargo, según especialistas en el asunto, atribuir únicamente al profesor la
responsabilidad de lograr el respeto del estudiante puede ser un obstáculo para el éxito del
aprendizaje. Por ello es importante comprender en qué consiste la autoridad docente para el
incremento de acciones que la hacen viable.
Etiquetas: Formación de profesores. Autoridad docente. (In)disciplina en la escuela.

INTRODUÇÃO

O tema da autoridade docente tem sido objeto de estudo em vários textos que
abordam questões referentes à indisciplina nas escolas brasileiras. Recentemente, o Ministério

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da Educação, aproveitando o espírito das competições olímpicas, fez campanhas midiáticas


para que os alunos respeitem os professores. Nessas mensagens difundidas através do rádio e
da televisão, com o intuito de cativar os jovens, foram os atletas olímpicos que abordaram a
questão da indisciplina e do necessário respeito ao professor, alegando que é este o
responsável por tornar o aluno um campeão na vida, assim como o técnico os prepara para
serem os vencedores nas Olimpíadas 1. É interessante observar que, por esse prisma, é o aluno
quem deve resolver o problema da indisciplina, e deve fazê-lo porque o professor o ajudará a
ser um campeão na vida. Ou seja: o pedido de respeito ao professor é justificado pelo fato de
este ser útil na futura competição do aluno em sociedade. Não se trata, portanto, de abordar
uma questão ética necessária à conduta humana, a qual certamente garantiria o vínculo
harmonioso entre professor e aluno, mas de assegurar apenas o futuro proveitoso para o
jovem que um dia competirá com os demais em sociedade.

Corroborando tal ideia, em palestra proferida no Café Filosófico, Karnal (2013) faz uma
observação jocosa a respeito de sua trajetória pela escola: primeiro como aluno, depois como
professor. Ele se considera desprovido de sorte porque, quando entrou na escola, na década de
60, somente os professores “tinham razão”. E agora, quando ele é professor, somente os alunos
“têm razão”. Assim, ele nunca pôde “ter razão”. É claro que Karnal oferece justificativas para
que entendamos por que isso está acontecendo. Hoje, pela primeira vez na história da
Educação, o jovem detém o domínio de uma técnica que os mais velhos em geral não têm: o
manuseio dos aparelhos de informática. Isso confere poder ao jovem, tornando -o senhor de
um conhecimento que não foi adquirido com a orientação dos tradicionais mestres. Ao
contrário, hoje é o jovem quem os ensina. Assim, os professores não são mais vistos como
aqueles que dominam o conhecimento necessário para ser um cidadão bem sucedido.

Além disso, muitos jovens acreditam que o conhecimento consiste apenas na mera
aquisição de informações; nesse sentido, entendem que basta consultar um mecanismo de
busca no celular (o Google, por exemplo) para obterem a informação de que precisam. Alguns
passam inclusive a verificar no celular o que o professor afirma em sala de aula, como se
estivessem avaliando em que medida o que está sendo dito é fidedigno. Assim, se

1
Disponível em: <http://www.secom.gov.br/atuacao/publicidade/somos-todos-brasil>.
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considerarmos que a autoridade docente provém da ideia de que é o professor quem detém o
conhecimento, veremos que tal concepção não se sustenta mais na atualidade.

Por outro lado, sabemos que a relação assimétrica entre o professor e aluno é sempre
necessária, já que cabe ao professor planejar e gerenciar o processo de aprendizagem. Afinal,
esse processo é o objetivo comum de ambos, mestre e aluno, e o professor é o profissional que
se preparou para cumprir tal tarefa. Daí a importância de exercer a autoridade docente em sala
de aula, já que, sem ela, multiplicam-se os problemas referentes à indisciplina, o que
compromete visceralmente a aprendizagem.

Essas questões sinalizam como é complexo discutir o tema da autoridade docente. Por
um lado, há o perigo de cultivar o saudosismo da época em que bastava a presença do
professor em sala de aula para garantir a disciplina, já que a autoridade era inerente à sua
profissão (o professor sempre “tinha razão”). Por outro lado, há o risco de entender o
desrespeito atual à autoridade docente como uma legítima luta de poder entre alunos e
professores, como se a autonomia do jovem estivesse ameaçada toda vez que o professor
desse uma ordem em sala de aula. Não faltam trabalhos que contemplam as diferenças entre
autoridade e autoritarismo, tais como Aquino (1999), Novais (2004), Roure (2006), entre outros.
Assim, em meio a essa profusão de ideias sobre o assunto, pareceu-nos relevante investigar
como o futuro professor entende o exercício da autoridade docente em sala de aula, uma vez
que a reflexão sobre esse tema certamente favorecerá o discernimento sobre um dos
complexos fatores que constituem o fenômeno da indisciplina.

Para tanto, este trabalho apresenta primeiramente as considerações sobre a


autoridade docente na visão de autores contemporâneos. A seguir, relatamos a pesquisa e
expomos nossas análises de acordo com os dados coletados. Esperamos que este trabalho
possa se perfilar com os de pesquisadores que lutam pela qualidade da educação brasileira.

1. OS CONTORNOS DA AUTORIDADE DOCENTE

Pode-se dizer que o cerne das práticas educacionais de uma escola está na relação
entre professor e aluno, a qual é estabelecida nesse ambiente de ensino formal, onde acontece
a maior parte do processo educativo. Por se tratar de uma relação institucionalizada, há, de
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modo geral, elementos que propiciam as condições para a efetivação a contento das relações
entre os sujeitos participantes, tais como, "uma sucessão de rotinas, regras e expectativas
próprias [a qual] delimita e, ao mesmo tempo, faculta suas existências concretas" (AQUINO,
1999, p. 134, grifo do autor). Nesses encontros, ainda, conforme o autor, "entra em cena a
noção de autoridade como reguladora das relações entre sujeitos enredados em deter minada
configuração institucional" (AQUINO, 1999, p. 134). Nesse sentido, a compreensão de tal
relação envolve, portanto, dentre outros componentes, a questão da autoridade docente.

Em outros termos, a relação de autoridade está atrelada à função social do professor


na realização do trabalho docente. E, se assim é, o descaso com essa relação de poder também
pode causar a indisciplina. Tal entendimento vai ao encontro das considerações de Davis e Luna
(1991, p. 69), quando evidenciam as situações nas quais a indisciplina parece ser mais
frequentemente gerada: "como último recurso contra a autoridade autoritária – ou o
autoritarismo – do professor ou como expressão de sua falta de autoridade". De fato, os
reflexos que decorrem do excesso ou da falta de autoridade do professor podem afetar as
relações interpessoais escolares e, por conseguinte, o processo de ensino-aprendizagem.

Daí a importância do exercício da autoridade docente para a manutenção da disciplina


em sala de aula (NOVAIS, 2004), uma vez que a indisciplina tem sido apontada como um
problema que dificulta a realização do trabalho docente.

Para Davis e Luna (1991, p. 69),

[...] o professor com autoridade é aquele que deixa transparecer as


razões pelas quais a exerce: não por prazer, não por capricho, ne m
mesmo por interesses pessoais, mas por compromisso genuíno com o
processo pedagógico, ou seja, com a construção de sujeitos que ,
conhecendo a realidade, disponham-se a modificá-la em consonância
com um projeto comum.

Novais (2004) expõe que a professora, sujeito de estudo da sua pesquisa, manteve a
assimetria, característica do relacionamento professor-aluno. Dessa forma, por não atuar como
"colega" de seus educandos e por exercer uma autoridade pautada no respeito mútuo e no
diálogo, preservou claramente seu papel social e, por conseguinte, sua posição hierárquica,
sem, no entanto, se tornar distante deles. Como dirigente do processo pedagógico, conseguiu
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que a indisciplina fosse minimizada em sua classe. Essa professora aparentava segurança,
mantendo-se cônscia de valor no exercício docente.

Em contrapartida, sabemos que muitos professores não se sentem valorizados pela


instituição em que atuam na sua relação diária com os alunos, o que lhes pode causar um
sentimento de desamparo. Segundo Laterman (2002, p. 10), os alunos citam "a falta de
autoridade na escola" como "a principal razão para a existência de um ambiente caótico, sem
diálogo", pois os problemas, como afirmam os alunos, são por vezes "resolvidos com agressões
verbais e físicas". Os alunos "sentem-se desrespeitados com o funcionamento instável do
estabelecimento, sentem-se desprotegidos frente às ameaças dos colegas, não há respeito e
admiração suficientes para fazer valer a imagem da autoridade" (LATERMAN, 2002, p. 13-14), o
que provavelmente também pode propiciar um comportamento inadequado nos alunos.

Também é preciso observar que, muitas vezes, os alunos apresentam certa atitude de
resistência quanto à autoridade do professor em sala de aula, podendo inclusive confundi-la
com autoritarismo (NOVAIS, 2004; GALLAND, 2010). Neste caso, trata-se da obediência e
submissão mediante o uso contínuo de punições e ameaças autoritárias nas relações com os
alunos. Novais (2004) considera ainda importante enfatizar que, a despeito de ser uma forma
de poder, a autoridade não deve ser confundida com autoritarismo. A esse respeito, Araújo
(1999, p. 34) também acredita que "boa parte dos problemas disciplinares que as escolas vêm
enfrentando ultimamente decorre do fato de que as relações ali estabelecidas [. ..] não é de
respeito e sim de obediência". Nessa mesma direção, Novais (2004, p. 17) observa que "ter
autoridade tem equivalido a ser autoritário com os aprendizes, não lhes dando direito de se
posicionarem em relação a diversas questões que ocorrem no contexto escolar" e com isso,
eles se calam pelo receio das punições e ameaças do professor.

Segundo Arendt (2014), a autoridade sempre exige obediência, por isso ela é muitas
vezes confundida com alguma forma de poder ou violência. Porém,"onde a força é usa da, a
autoridade em si mesma fracassou" (p. 129). Por outro lado, conforme a autora, a autoridade
também é incompatível com a persuasão, uma vez que esta última pressupõe uma relação de
igualdade e efetua-se por meio de um processo de argumentação. Nesse sentido, conclui que a
autoridade é concebida em contraposição tanto em relaçao à coerção pela força quanto à

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persuasão, tendo como ponto comum entre o que manda e o que obedece a própria hierarquia,
cuja legitimidade ambos reconhecem.

No entanto, manter de modo permanente essa hierarquia consensual entre os alunos,


a fim de que não se sintam oprimidos e reconheçam como legítima a autoridade do professor,
nem sempre é tarefa fácil. Por um lado, há o receio de ser entendido como um profissional
autoritário; por outro, há a obrigação de garantir as normas impostas. Diante dessas pressões,
o professor se sente como que "no fio da navalha", e nem sempre consegue manter esse
equilíbrio que lhe é exigido.

2. AFINAL, É PROIBIDO PROIBIR?

De fato, muitos professores têm receio de que possam parecer autoritários quando
impõem determinadas regras aos alunos, acreditando que uma atitude mais incisiva pode ser
entendida como autoritarismo. Nesse caso, eles estariam alheios ao que sugerem as
contemporâneas diretrizes educacionais. E realmente não se trata de uma questão simples de
ser resolvida. É nesse sentido que La Taille (1999) considera o tema da autoridade bastante
complexo e até perigoso. É complexo no que se refere às relações de poder provenientes das
esferas política, econômica e cultural. E é perigoso porque, por se tratar de relações de poder, a
autoridade pode se edificar sobre bases ilegítimas que conduzem ao autoritarismo e à injustiça.
Entretanto, ainda conforme o autor, "negar a autoridade em nome de igualdades forjadas leva
à hipocrisia nas relações humanas" (p. 9). Ambos podem ser encontrados no campo da
educação, pois:

[...] se a escola negar toda e qualquer capacidade de discernimento e


singularidade intelectuais aos alunos, ela se arvora o direito de ar bitrar
indiscriminadamente sobre cada uma de suas condutas – eis o
autoritarismo – e, em caso de fracasso por parte deles, longe de
questionar suas pretensões e seus métodos, ela incrimina aqueles que
"fogem da norma": são indisciplinados, preguiçosos, retardados – eis a
injustiça. Todavia, se a escola negar que a relação professor/aluno é, por
definição, assimétrica, uma vez que o primeiro sabe coisas que o
segundo deseja ou precisa conhecer, ela, em nome de um igualitarismo
de bom tom, paralisa-se e, por conseguinte, paralisa os jovens que a
frequentam. (LA TAILLE, 1999, p. 9-10, grifo do autor).

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Valendo-se de algumas ideias de Hannah Arendt, La Taille (1999, p. 10) busca


determinar "o que é uma relação de autoridade". Segundo o autor, alguém possui autoridade
quando "seus enunciados e suas ordens são considerados legítimos por parte de quem ouve e
obedece" (p. 10). Nas relações instauradas no uso da força, "há hierarquia, certamente
legitimada por parte de quem detém o poder, mas não legitimada por quem é obrigado a
obedecer: tais relações não são, portanto, relações de autoridade (cabe a palavra autoritarismo:
uso abusivo do poder)" (LA TAILLE, 1999, p. 11). Assim, o uso abusivo do poder por meio de
ameaças, manifestadas ou veladas, pode até aparentar que resulta em obediência, mas esta
não é legitimada por parte de quem é obrigado a obedecer.

Assim, vemos que o grande diferenciador entre autoridade e autoritarismo é o fato de


aquela estar legitimada por quem deve acatar as ordens, e de este último instituir-se por força
de ameaças e de sanções, gerando uma obediência mitigada por litígios constantes. Daí o
professor sentir-se inseguro, pois ele sabe que terá que discernir o limite, por vezes tênue,
entre exercer o poder autoritário ou alcançar a autoridade e o respeito de seus alunos. Afinal,
figuram como objetivos da educação o desenvolvimento do senso crítico e da autonomia, e
estes enfatizam que a escola não deve formar seres submissos, mas sujeitos que devem ser
agentes de seu destino. Ora, tal ideia aparentemente opõe-se à noção de obediência, cujos
sinônimos podem ser: submissão à vontade de alguém; docilidade, sujeição (FERREIRA, 2009).

Quanto à questão da autonomia, La Taille (1999, p. 11) considera que, em geral, "quem
se submete a uma autoridade não tem, ou pensa não ter, no momento e no campo da
submissão, autonomia", para poder manifestar-se com liberdade de ação. A relação de
autoridade é legitimada devido à falta de autonomia, daí entendermos como se torna por
vezes contraditório para o professor saber administrar os ideais da educação quanto à
formação do cidadão crítico diante de questões como a assimetria hierárquica entre professor
e aluno.

E, de fato, para La Taille (1999, p. 13), a assimetria está na base das instituições
educacionais, porquanto "elas são formadas por pessoas que sabem algumas coisas ─ os
professores ─ e por outras que estão lá justamente porque não sabem essas mesmas coisas ─
os alunos". No entanto, sendo tais instituições essencialmente lugares onde os conhecimentos

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constituídos são ensinados, trata-se de uma assimetria temporária, pois, "de posse dos saberes,
os alunos não precisam mais daqueles que, antes, eram os únicos a possuí-los" (p. 13). Nesse
sentido, o autor explicita que:

É por isso que se diz que o grande objetivo de cada professor deve ser o
de deixar de sê-lo em relação aos seus alunos. A relação professor/aluno
é, por definição, provisória porque, se bem-sucedida, a assimetria inicial
dá lugar à igualdade; e a dependência dá lugar à gratidão. Em termos de
autonomia, o que define a posição do aluno é essencialmente o fato de
ele não a possuir em relação a determinadas áreas do saber. As
instituições educacionais não são tanto o lugar do exercício da
autonomia, mas sim de sua conquista. (La Taille, 1999, p. 13, grifo do
autor).

Assim considerando, Carvalho (1999, p. 62) afirma que o fato de uma pessoa
demonstrar autonomia em determinado campo, mas não a demonstrar em outro é
absolutamente comum. Portanto, é altamente questionável a noção de que a autonomia é um
traço psicológico individual, que pode ser transferido a novos contextos bem mais complexos,
uma vez que a autonomia que temos em um determinado campo não se separa do
conhecimento que dele possuímos. Por isso, segundo La Taille (1999, p. 14), a relação
professor/aluno é uma relação hierárquica, uma relação de autoridade, na qual o primeiro
"precisa dar ordens referentes ao bom andamento da aprendizagem, e o segundo precisa
segui-las, contanto, é claro, que sejam justas e se mostrem, ao longo do tempo, eficazes".

As considerações desses autores permitem que entendamos a autonomia discente não


como uma conquista pontual, que deva ser alcançada prontamente nas relações cotidianas
entre mestre e aluno. Ao contrário, a conquista da autonomia deve ser entendida co mo
resultado de um longo percurso em que o respeito à autoridade docente tornou-se uma
condição fundamental para a formação do aluno. É a partir da relação hierárquica entre mestre
e aprendiz, com o objetivo comum de alcançar sucesso na aprendizagem, que a autonomia do
aluno irá florescendo em suas futuras condutas.

Essas questões implicam ainda repensar no que consiste a obediência ao professor,


uma vez que ela pode ocorrer por motivos distintos. Um deles é a coação, o que pressupõe que
tal obediência não será legitimada pelos alunos. Nesse ponto,"o exercício de pura autoridade é

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muito raro e tem quase sempre, na retaguarda, punições de vários tipos", as quais devem
ocorrer somente quando a autoridade falha, como um último recurso, em caráter de exceção
(LA TAILLE, 1999, p. 14).

No entanto, a obediência pode ser acolhida pelo aluno como uma atitude legítima,
quando este entende que se trata de reivindicações justas e necessárias ao processo de ensino
e aprendizagem. É nesse sentido que Carvalho (2015, p. 975), ao evidenciar que os discursos a
respeito do "lugar da autoridade na educação escolar" têm-se alternado entre os que advogam
em favor da abolição do lugar de autoridade na relação entre professor e alunos e os que
clamam pela busca de uma suposta autoridade perdida, adverte que, a despeito das
divergências teóricas entre essas duas posições em conflito, elas apresentam "um aspecto
comum: não distinguem a obediência produzida por uma relação de autoridade – sempre
fundada na confiança – daquela que emerge da violência, da coerção ou do mero apego à
legalidade".

Nessa acepção, segundo Aquino (1999, p. 136, grifo do autor), "a autoridade é um
fenômeno de cunho institucional, estreitamente vinculado à ideia de delegação e crédito ao
outro", o que significa, segundo o autor, que as prerrogativas detidas pelos agentes de
determinada prática precisam ser avalizadas e referendadas pelo seu outro complementar. Por
isso, para o autor, a autoridade deve ser entendida como uma espécie de "amálgama"
institucional, que se atualiza a cada momento, dependendo de como ocorre a relação entre os
parceiros. Trata-se, inclusive, conforme o autor, de um efeito mutante, posto que a ação
institucional está sujeita a inúmeras circunstâncias que podem favorecê-la ou, ao contrário,
colocá-la em xeque; e quanto mais desfavoráveis forem estas condições, mais a autoridade se
fará necessária (AQUINO, 1999).

Em outros termos, o fenômeno da autoridade precisa ser entendido como um efeito


institucional, sempre singularizado pelas condições concretas de sua obtenção; e, nessa visão,
"o reconhecimento da autoridade do agente não é uma reação automática, nem um dever
'natural' da clientela; ele precisa ser forjado na ação cotidiana, e sempre em ato" (AQUINO,
1999, p. 137, grifo do autor). Sendo assim, segundo o autor, não podemos mais tomar as
instituições sociais e as funções de seus atores como algo estável, sólido, compulsório

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(implicam ainda repensar). É necessário que o exercício da autoridade do agente seja


reconhecido e consentido pelos parceiros da relação. Dessa forma, é condição fundamental
que o lugar da autoridade seja legitimado por todos os envolvidos na ação.

Assim, não é “proibido proibir”, quando se trata de prescrições entendidas como


necessárias e legítimas. Aliás, a aceitação e a consequente obediência a uma ordem, por julgá-
la justa e adequada, constitui uma forte evidência de que o aluno está conquistando a
autonomia moral, um dos objetivos mais notáveis da educação.

3. SCIENTIA POTENTIA EST. (CONHECIMENTO É PODER)

Há uma sentença em latim que afirma que conhecimento é poder. De fato, um dos
indicadores necessários para que o professor obtenha o reconhecimento da autoridade é o
domínio teórico dos conteúdos em determinado campo de conhecimento.

Entendemos, como propõe Aquino (1999), que é nas condições sociais concretas da
ação cotidiana e sempre singularizada pelos seus participantes que o fenômeno da autoridade
produz efeitos institucionais. Para tanto, o reconhecimento da autoridade do professor implica
não só o domínio teórico dos conteúdos em determinado campo de conhecimento, mas
também o domínio metodológico (AQUINO, 1999). Isso guarda relação de sentido com o
posicionamento apresentado por Davis e Luna (1991, p. 69):

Um professor, para ser reconhecido como autoridade que merece


confiança, precisa, ainda, de mestria no exercício de sua função. Isto
significa que a autoridade do professor constitui-se a partir da aliança
entre conhecimento e experiência na condução da classe: para
encaminhar os alunos para a apropriação de um determinado fenômeno
do real, é preciso que o professor domine tanto o fenômeno a ser
conhecido como o processo de conhecer.

De fato, o professor deveria saber mais do que seus alunos sobre o que se propõe a
ensinar, uma vez que a confiança deles é diretamente proporcional à segurança que o
professor demonstra pelo domínio consistente dos conteúdos teóricos (AQUINO, 1999, p. 139).

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Daí a importância da formação docente, sobretudo se considerarmos que o domínio de


algum conteúdo teórico pressupõe a capacidade de relacionar as informações que lhes são
pertinentes, de saber articulá-las com discernimento e de forma criteriosa. Essa deveria ser
uma condição sine qua non para o exercício docente. A esse respeito, Carvalho (1999, p. 57)
pondera que não se pode considerar que a hierarquia no contexto escolar seja determinada
apenas pela diferença de idade cronológica entre professores e alunos.

A autoridade do professor tem como fonte legitimadora não a


sacralidade de sua palavra ou o fato de ele ser um adulto, mas deriva de
sua responsabilidade social e pública por esse mundo escolar, do qual
participa e no qual ele representa formas de conhecimento e critérios de
valor publicamente estabelecidos. (p. 57- 58, grifo do autor).

De posse do saber, "cabe ao professor escolher a forma mais propícia de comunicação


possível com a heterogeneidade do grupo. É aí que entra em cena o domínio metodológico"
(AQUINO, 1999, p. 139, grifo do autor). Afirma o autor que a autoridade docente não se
ampara unicamente na erudição de seu portador e nem é decorrência unívoca dela, "mas do
trabalho engenhoso, árduo e compromissado daquele que, de fato, se dispõe a ensinar algo a
outrem” (AQUINO, 1999, p. 140). É, portanto, mediante a confluência do domínio dos
conteúdos e do domínio metodológico que a autoridade do professor se legitima diante dos
alunos. É nesse movimento interativo, planejado pelo professor, que a construção da
autoridade docente se torna possível. Caso contrário, iniciam-se os desacertos que culminam
na falta de respeito ao mestre. De fato, a análise acerca da interação concreta entre professor-
aluno, subentendida como o cerne de uma instituição educativa, é, segundo Aquino (1999, p.
137), "o modo pelo qual se pode compreender boa parte das vicissitudes da autoridade
docente na atualidade". Então, podemos dizer que o conhecimento é o vetor que legaliza e
nutre a autoridade do professor na relação estabelecida com seus alunos, conferindo -lhe um
legítimo poder.

Mediante tais ideias, é possível inferir que tanto a autoridade docente como o
conhecimento relativo aos conteúdos e à forma de melhor ensiná-los são fatores que vão
sendo construídos na interação diuturna entre o professor e aluno. Isso significa que a
autoridade docente não é prontamente legitimada pelo aluno simplesmente pelo fato de um
adulto designar-se professor, tampouco dependerá unicamente de sua experiência e bagagem

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cultural acumulada. Esses são, por certo, fatores necessários para garantir a autoridade do
professor em sala de aula, mas não são suficientes. É preciso que se instaure sempre, nas
relações de ensino e aprendizagem, um planejamento atento às especificidades de cada
contexto, a fim de que, ao ser construída, a autoridade docente tenha em sua gênese a
legitimidade conferida pelo aluno.

4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Neste trabalho, o objetivo foi investigar as concepções sobre a autoridade docente na


relação professor-aluno em estudantes que estão vivenciando o seu processo de formação
como futuro professor. Para tanto, escolhemos como sujeitos de pesquisa 33 alunos (27
mulheres e 6 homens, sendo 1 deles com 44 anos de idade e os demais, 32, entre 17 e 27 anos
de idade), que frequentavam o curso de Licenciatura em Letras em uma cidade do interior
paulista. Esses sujeitos foram escolhidos porque, por estarem em um curso de licenciatura,
provavelmente pretendem exercer o magistério. Sendo assim, cremos que a concepção sobre o
conceito de autoridade do professor certamente influenciará em sua futura atuação
profissional.

Para colhermos tais informações, pedimos a nossos sujeitos de pesquisa que


completassem por escrito a seguinte questão: “Em sua opinião, a autoridade do professor
consiste em...”. Acreditamos que, ao explicitarem componentes constitutivos da autoridade
docente na relação professor-aluno, esses sujeitos evidenciariam suas concepções sobre o
assunto.

Para analisarmos as respostas de nossos sujeitos de pesquisa, utilizamos a análise de


conteúdo na perspectiva de Bardin (2010). Trata-se de um instrumento metodológico
operacionalizado segundo técnicas específicas de análise que, ao proporcionar uma descrição
analítica das mensagens trabalhadas como objeto de estudo, auxilia a reinterpretação dos
conteúdos dos enunciados, propiciando uma compreensão aprofundada de seus significados e
sentidos, que ultrapassa os limites de uma leitura comum (MORAES, 1999). Em outros termos,
a manipulação dispensada ao material do corpus ajuda o pesquisador a identificar, interpretar
e compreender as unidades de significação concernentes ao conteúdo dos enunciados, o que

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permite efetivar inferências específicas ou interpretações causais por meio da depreensão de


temas recorrentes ou pressupostos implícitos ou explícitos contidos nas respostas dos sujeitos
da pesquisa. Desse modo, a inferência é o procedimento “que vem permitir a passagem,
explícita e controlada”, da descrição analítica do conteúdo das mensagens à interpretação
(BARDIN, 2010, p. 41).

De modo específico, Bardin (2010, p. 44) sintetiza o terreno, o funcionamento e o


objetivo da análise de conteúdo ao expor que esta pode ser designada, de modo geral, como
“um conjunto de técnicas de análise das comunicações”, sendo que, em tais técnicas, visa-se a
encontrar, por meio de procedimentos sistemáticos de descrição do conteúdo dos
enunciados,“indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos
relativos às condições de produção [...] destas mensagens”. Nesse sentido, consideramos
oportuno destacar, ainda, que, segundo a autora, o componente comum dessas técnicas, desde
o tratamento do texto até a consecução de uma asserção implícita no sentido manifesto, é uma
interpretação controlada, apoiada na dedução, na inferência (BARDIN, 2010, p. 11).

Por isso, o objetivo desse procedimento metodológico é a efetivação da análise do


sentido latente, do não dito, que está por trás do sentido manifesto expresso de qualquer
mensagem, e este deve ser deduzido valendo-se, também, das condições do contexto e da
realidade subjacente. Dessa forma, é necessário, também e, sobretudo, "desviar o olhar para
uma outra significação, uma outra mensagem entrevista através ou ao lado da mensagem
primeira", porquanto a leitura feita pelo analista é "antes o realçar de um sentido que se
encontra em segundo plano” (BARDIN, 2010, p. 43). Em outros termos, para que isso venha a
ocorrer, é preciso compreender o que está sendo investigado para alcançar os sentidos
implícitos, ou, ainda, segundo a autora, "atingir através de significantes, ou de significados
(manipulados), outros significados de natureza psicológica, sociológica, política, histórica, etc.”
(BARDIN, 2010, p. 43). Portanto, a análise de conteúdo ao priorizar a comunicação correlaciona
as estruturas semânticas ou linguísticas com as estruturas psicológicas dos enunciados e
procura obter, por meio de processos inferenciais, as variáveis envolvidas no contexto em que
um enunciado é produzido.

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A leitura atenta e minuciosa do material de pesquisa, segundo as técnicas de análise de


conteúdo de Bardin (2010), permitiu que chegássemos à interpretação mais profunda dos
dados, bem como possibilitou a realização de inferências pelo cruzamento das respostas,
levando-se em conta o contexto da realidade concreta em que elas foram produzidas. Para
tanto, procuramos obter nas respostas tanto os sentidos explícitos quanto os implícitos, o que
nos proporcionou condições para examinar as diferenças de significação entre os conteúdos
dos enunciados, bem como as nuanças de semelhança que eles apresentavam.

Com tal procedimento, foi possível estabelecer categorias de análise referentes a


componentes mencionados nos enunciados dos sujeitos a respeito da autoridade docente na
relação professor-aluno. A frequência (F) e o percentual (P) dizem respeito ao número de vezes
que a categoria é mencionada nas respostas dadas por eles, e não ao número de participantes
da pesquisa. Assim, um mesmo sujeito pode estar incluído em várias categorias.

Abaixo, transcrevemos o quadro resultante das análises iniciais.

Quadro 1 – Concepções dos alunos sobre a autoridade do professor


“Em sua opinião, a autoridade do professor consiste em ...”.
Categorias de análise F P Exemplos
Postura adequada do 09 27% “Ter uma postura de professor...”
professor “[...] O professor deve saber posicionar-se...”
“[...] Tem que se manter firme nas suas decisões em
sala de aula sem desrespeitar de nenhuma forma o
seu aluno, tem que saber os problemas através do
diálogo.”
“[...] o profissional deverá saber se impor de forma
adequada em sala de aula, para que seja produtivo
para ambas as partes.”
“[...] ensinar seus alunos da melhor forma possível,
porém sem ser grosseiro com os alunos ou causar
antipatia neles, procurando sempre conquistar o aluno
com sua postura.”

Valorização do 07 21% “Acho que o professor é uma das principais


professor autoridades da sociedade. É ele que forma a base da
civilização.”
“[...] mostrar aos alunos a necessidade de um
professor em sala de aula.”
“[...] procurar fazer o aluno entender que seremos um

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aliado e não inimigo.”


“[...] ser o agente responsável por transmitir a cultura
da nossa sociedade dentro da tradição acadêmica e
mediada pelo rigor científico.”
Construção feita em 05 15% “[...] respeito, ética e parceria... A autoridade deve ser
parceria conquistada na base da parceria...”
“[...] autoridade não significa apenas controlar uma
sala de aula, mas fazer com que o aluno queira estar
em sua aula e te respeitar de boa vontade.”
“[...] trabalhar e elaborar conteúdos para a sua aula,
ter domínio da sala e da matéria, influenciar os alunos
a fazerem uma autorreflexão crítica e por último
compreender as dificuldades de seus alunos.”
Respeito aos alunos 05 15% “[...] respeitar acima de tudo os seus alunos, as
e/ou ao professor diferenças entre eles, para que assim possa cobrar o
mesmo deles.”
“[...] respeitar a integridade de seu aluno e tê-lo como
um semelhante na sala de aula, incentivando-o para
descobrir novos caminhos.”
“[...] fazer com que o aluno dê o respeito necessário
para que o professor possa dar aula.”
“[...] respeito tanto do professor em relação aos
alunos, quanto vice-versa.”
Limites definidos 05 15% “[...] limites com os alunos. A sala de aula é sua
fortaleza e nela manda o professor. O professor
merece todo o respeito de todos os alunos.”
“[...] manter certa ordem na sala de aula, a respeito do
comportamento geral dos alunos, de modo que, não
se tornando demasiadamente autoritário, proporcione
e possibilite um lugar interessante de diálogo
saudável, construtivo e de troca de conhecimentos.”
“[...] criar normas para a sala, respeitando as leis,
como por exemplo, impedir o uso de celular, não
permitir conversas alheias.”
“Consiste também em elaborar regras de acordo com a
demanda de conteúdo, aluno e disciplina. Fazer com
que ela seja cumprida e ainda lembrar que a melhor
autoridade é a que visa a necessidade de todos.”
Domínio dos conteúdos 05 15% “[...] apresentar-se de maneira confiante dominando o
e didática conteúdo e passando uma energia boa. Está
relacionada ao que o professor tem para passar seja
aspectos didáticos ou de ciência.”
“[...] transmitir o conhecimento e as ideias que ele
juntou durante a vida toda.”
“[...] entendimento sobre a matéria e coisas além dela
que possam complementar e tornar a aula mais
interessante tanto para o professor quanto para os

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alunos...”
“[...] aplicar vários níveis de ensinamento para todos
os tipos, adaptando para cada necessidade...”
“[...] mostrar-se tendo o conteúdo que leciona
dominado, ou seja, mostrar que entende muito bem
seu objeto de estudo, pois dessa forma ele é visto
como uma figura bastante necessária, convertendo-se
em autoridade no assunto. Não se trata de dureza na
postura, ele deve se mostrar como entendedor e não
intimidador.”
Garantia da formação 02 6% “[...] Comprometer-se não apenas no ensino do aluno,
do aluno mas também com a formação do mesmo como
cidadão consciente.”
“[...] educar e formar seres humanos para uma
sociedade, podendo fazer a diferença na vida de um
aluno.”
Amor pela profissão 02 6% “Estar preparado e gostar de ensinar é primórdio, pois
se não houve amor para ensinar, a autoridade dele
nunca será reconhecida.”
“[...] amor por ensinar.”
Conhecimento geral 01 3% “[...] conhecer o mundo e ser capaz de instruir os
outros acerca deste.”

Liderança 01 3% “[...] Professor não deve ser visto como autoridade


através do medo, e sim através da liderança...”
Fonte: Elaboração própria

5. ANÁLISES

Vimos que, de acordo com as considerações dos autores anteriormente mencionados,


a autoridade docente não pode ser entendida como uma conquista unilateral, engendrada pelo
professor sem a parceria de seus alunos. Quando tal ideia prevalece, recai sobre os ombros
docentes toda a responsabilidade de um eventual fracasso. Além disso, resta-lhe ainda o ônus
de não parecer autoritário e de não impedir que a autonomia de seus alunos floresça.

No entanto, vemos que apenas alguns acreditam que a autoridade docente é “uma
construção feita em parceria” (05), ou que deve haver “Respeito aos alunos e/ou ao professor”
(05). Os demais alegam, como atributos constitutivos da autoridade docente, algumas
características concernentes apenas à atuação do professor.

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De fato, por esse último prisma, segundo o exemplo de um dos sujeitos de pesquisa,
cabe ao professor “[...] manter-se firme nas suas decisões em sala de aula sem desrespeitar de
nenhuma forma o seu aluno, [o professor] tem que saber os problemas através do diálogo.”

Nota-se que o sujeito menciona o respeito ao aluno, bem como o conhecimento dos
problemas através do diálogo, mas cabe exclusivamente ao professor tomar tais providências. E
isso é percebido inclusive pela construção formal do enunciado, pois o termo “professor” é o
sujeito dos verbos: “manter-se”; desrespeitar; saber. Ele é o agente, uma vez que serão suas
atitudes que se transmutarão na “postura de professor”, a qual é capaz de angariar o respeito
de seus alunos.

Uma outra característica mencionada diz respeito ao “Domínio dos conhecimentos”.


Vimos que Aquino (1999) e Carvalho (1999), entre outros, enfatizam o conhecimento como um
fator fundamental para o êxito da tarefa docente. E, de fato, sentir-se seguro quanto ao
conteúdo que será ensinado confere poder ao professor, facilitando a relação entre mestre e
aluno. No entanto, vimos que a forma como os conteúdos são transmitidos, ou ainda, o
tratamento didático conferido aos conteúdos não é algo que acontece prontamente, mediante
fórmulas a priori estabelecidas. Antes, é preciso que o professor construa sua forma de atuar
mediante a percepção do contexto, e isso será adquirido paulatinamente junto aos alunos.
Como foi dito, a autoridade docente não é algo que possa ser prontamente acatado pelo aluno
apenas pelo fato de haver um adulto em sala de aula que domina os conteúdos. Como se trata
de relações entre pessoas, é preciso que haja um objetivo comum, o qual demanda sempre um
planejamento consensual, a fim de que a autoridade docente naturalmente decorra do
empenho do professor em cumprir a meta educacional. Assim, o domínio dos conteúdos é
fundamental, mas não é a única condição para que a autoridade docente seja respeitada.

Do mesmo modo, os demais fatores alegados pelos sujeitos de pesquisa, tais como:
“Garantia da formação do aluno”, “Amor pela profissão”, “Conhecimento geral” e “Liderança”,
são quesitos que compõem a atuação do professor, sua personalidade e seus ideais, sem incluir
a participação do aluno no trajeto da construção da autoridade docente. É o professor quem
deve amar, formar, entender, liderar, enfim, é ele quem deve “fazer a diferença” na vida dos

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alunos. Daí talvez a angústia exaustiva de que muitos professores se queixam ao terem que
lidar com a indisciplina na escola.

Há, porém, aqueles que acreditam na parceria entre professor e aluno. Para eles, “A
autoridade deve ser conquistada na base da parceria...”; uma vez que esta “[...] não significa
apenas controlar uma sala de aula, mas fazer com que o aluno queira estar em sua aula...”. Para
isso, acreditam que é preciso “[...] influenciar os alunos a fazerem uma autorreflexão crítica.”

Como podemos perceber, nesses casos, o professor inclui os alunos, tornando-os


partícipes da conquista da autoridade docente, mediante laços estabelecidos pela afetividade e
volição (uma vez que o aluno deve “querer” estar na sua aula) e pelo desejo de contribuir com
a harmonia em sala de aula (uma vez que deve fazer uma “autorreflexão crítica”).

Essa concepção de parceria entre professor e aluno para a edificação da autoridade


docente coaduna-se com as ideias de Aquino (1999) que, como vimos, considera a autoridade
do professor como algo que deve ser “forjado” na ação cotidiana, de forma contínua. Para
tanto, a autoridade docente deve ser mutuamente consentida, porque se mostra legítima e
necessária à consecução do ideal de aprendizagem que uniu mestre e alunos. Assim, o
professor não é mais o único agente das ações que farão florescer sua autoridade, mas aquele
que promoverá encontros e esclarecimentos para a realização do ideal que todos ali almejam.
Por esse prisma, sua autoridade será resultante de todo um processo, sem se impor a priori,
mediante ameaças coercitivas.

A compreensão de que a autoridade docente será resultante de um caminhar conjunto,


tendo como meta a aprendizagem, é que poderá libertar o professor de cobranças que ele
mesmo se impõe quando supõe ser o único responsável pelo fracasso de angariar o respeito de
seus alunos. Não se trata de elaborar prontamente uma performance que o revista de
autoridade, mas de manter uma postura solidária e amável, para dar início à consecução do
motivo que dará ensejo à convivência diuturna entre ele e seus alunos. Trata-se, portanto, de
valorizar o ideal da aprendizagem, tornando-o legítimo e necessário a ambos: mestre e aluno.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A falta de autoridade do professor em sala de aula tem sido apontada por autores, tais
como Aquino (1999), Carvalho (1999), Davis e Luna (1991), Galland (2010), entre outros, como
um dos maiores obstáculos à qualidade do ensino, justamente porque favorece a indisciplina
na sala de aula. Poderíamos ainda acrescentar que a indisciplina igualmente denuncia a falta
de respeito entre os participantes do processo de ensino, impedindo o desenvolvimento de
valores importantes para a convivência em grupo.

Tal assunto, por mostrar-se relevante para a educação brasileira, tem sido inclusive
evidenciado pela mídia, com o objetivo de orientar os jovens a respeitar o professor,
devolvendo a este a reverência que ele tinha outrora. Daí nosso interesse em estudar como a
autoridade docente é entendida por especialistas e, em contrapartida, como ela é vista por
aqueles que pretendem exercer o magistério.

Sabemos que, para sanar as dificuldades que o professor enfrenta em sua trajetória
diária, é preciso que ele adquira o conhecimento necessário sobre os fatores que o impedem
de obter sucesso em seu trabalho. A questão da autoridade docente é certamente um tema
que se insere nesse rol de fatores impeditivos, daí acreditarmos ser importante que os cursos
de licenciatura abordem esse tema, a fim de que o futuro docente possa preparar-se para
construir, junto com seus alunos, sua legítima autoridade em sala de aula.

Vimos que os resultados de nossa pesquisa sugerem que há ignorância, por parte dos
futuros professores, sobre a natureza da autoridade docente. A maioria considera que o
professor é o único responsável e, portanto, torna-se culpado quando não consegue angariar
prontamente o respeito de seus alunos. Não raro, tais questões afligem o docente que, mais do
que ensinar os conteúdos com didática e maestria, precisa ainda garantir a harmonia em sala
de aula e o respeito às regras estabelecidas pela escola.

Tais questões não podem ser desprezadas nos cursos de formação docente. Cremos
que é preciso que haja leituras, conversas e reflexões sobre a natureza da autoridade docente,
a fim de que o futuro professor saiba como ela se edifica e se constrói com a participação de
alunos e mestres. Em síntese, cremos que os cursos que se consagram a formar futuros
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professores devem incluir em seu currículo tais reflexões que, longe de serem relativas a
problemas esparsos, constituem um dos principais entraves ao êxito da aprendizagem.

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necessária. In: AQUINO, Julio Groppa (Org.). Autoridade e autonomia na escola: alternativas
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FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio eletrônico versão 6.0. 4. ed.
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Acesso em: 17 fev. 2016.

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Elisabeth Ramos da SILVA

Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo

Maria José Milharezi ABUD

Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

Recebido em outubro/2016 - Aceite em janeiro/2017.

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Revista CAMINHOS EM LINGUÍSTICA APLICADA, Volume 17, Número 3, 2º sem 2017.
Elisabeth Ramos da SILVA e Maria José Milharezi ABUD. A CONSTRUÇÃO DA AUTORIDADE DOCENTE: O
QUE PENSAM OS FUTUROS PROFESSORES SOBRE ISSO?. p. 559-580.
Disponível em: http://periodicos.unitau.br/ojs-2.2/index.php/caminhoslinguistica - - ISSN 2176-8625

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