Fichamento Fustel de Coulanges

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UFMS – CPTL

HISTÓRIA – LICENCIATURA

Docente: Prof. Dr. Leandro Hecko


Discente: Matheus Medeiros Piquera

FICHAMENTO COULANGES
CÉZAR, Temístocles. Fustel de Coulanges. In: MALERBA, Jurandir
(Org.). Lições de História: o caminho da ciência no longo século XIX. Rio
de Janeiro: FGV Editora; Porto Alegre: EdiPUCRS, 2010.
p. 307  “Apesar do reconhecimento de A cidade antiga, Fustel de
Coulanges não foi somente um historiador do mundo antigo. Ele
transitou da Grécia à França e da Antiguidade à Idade Média e à
moderna. Pesquisador erudito, além da investigação do passado nas
fontes antigas e nos arquivos, também se dedicou à reflexão acerca
do método do fazer histórico com tal empenho que, mais que uma
simples preocupação, para ele isso tornou-se, com o transcorrer do
tempo, uma verdadeira ruminação ou mesmo uma obsessão. Ou
seja, Fustel de Coulanges também refletiu sobre a história, suas
possibilidades, seus limites, sobre o que ela deveria ser — uma
ciência — e o que ela não poderia ser — arte.” (p.307-308)
p. 308  “Numa-Denis Fustel de Coulanges nasceu em Paris no dia 18 de
março de 1830. Em 1850, ingressa na prestigiosa Escola Normal
Superior para estudar história, influenciado pelas aulas do
historiador François Guizot. Três anos depois, parte para a Escola
Francesa de Atenas[...]. Retorna para a França e assume, em 1855, o
cargo de professor do liceu de Amiens e, em seguida, do liceu
Saint-Louis em Paris, onde fica de 1858 a 1860.”
 “Pouco tempo depois, em 1862, Fustel de Coulanges inicia sua
carreira de professor universitário na Faculdade de Estrasburgo. Sua
aula inaugural, sobretudo o fragmento relativo à teoria histórica,
encontra-se traduzida neste capítulo. Em 28 de fevereiro de 1870,
volta a Paris, nomeado mestre de conferências na Escola Normal
Superior em função, segundo ele explica, da “natureza de seu
trabalho e seu gosto pela ciência pura”. No entanto, não fica muito
tempo na instituição, pois em 1875 assume a cátedra de história
antiga na Sorbonne e, três anos depois, a de história medieval, na
mesma instituição. Finalmente, em 1880, Fustel de Coulanges
retorna à Escola Normal para assumir sua direção, uma tarefa,
segundo ele, árdua, que exerce até 1883, quando retorna à
Sorbonne. Doente, morre, aos 59 anos, no dia 12 de setembro de
1889.”
p. 309  “A historiografia francesa do século XIX, na qual se insere a obra
de Fustel de Coulanges, é herdeira crítica do movimento intelectual
que a antecede e que ficou conhecido como Iluminismo, ao qual o
próprio conceito de história não fica imune.”
p. 310  “Logo, para Mably não haverá história que seja ao mesmo tempo
instrutiva e aprazível, sem uma narrativa que incorpore discursos
produzidos pela imaginação do historiador. Um dos seus exemplos
é Tucídides: “tente suprimi-los de sua obra e não terá mais do que
uma história sem alma”. Tanto Rousseau quanto Mably chamam a
atenção para um problema teórico cuja resolução se tornará, ao
longo do século XIX, fundamental para Fustel de Coulanges e para
a consolidação da história como ciência: uma narrativa objetiva e
neutra. O filtro científico segregará os textos marcados pela
faculdade da imaginação, desviando-a cada vez mais para o campo
da literatura e das artes.”
p. 311  “O fardo que eles têm a suportar é muito mais pesado do que o era
para Tito Lívio, Tácito, Políbio — objeto de tese de Fustel de
Coulanges — ou Dionísio de Halicarnasso. Dos modernos são
exigidos “mais detalhes, fatos mais constatados, datas precisas,
autoridades, mais atenção aos costumes, às leis, aos usos, ao
comércio, às finanças, à agricultura, à população”. Diante dessas
dificuldades, o método mais conveniente para se escrever a história
seria aquele que levasse em consideração certas diferenças. Por
exemplo, a maneira conveniente para se escrever a “história do seu
país não é própria para descrever as descobertas do Novo Mundo”,
bem como “não se deve escrever sobre uma aldeia como se escreve
sobre um império, [...] não se pode escrever a história privada de
um príncipe como se fosse a da França e a da Inglaterra”. No
entanto, embora, segundo Voltaire, essas regras sejam bem
conhecidas, “a arte de bem escrever a história sempre será rara.
Sabe-se que é necessário um estilo grave, puro, variado, agradável.
Existem leis para escrever a história como há para todas as artes do
espírito; como nessas, há muitos preceitos e poucos grandes
artistas”.”
p. 312  “Assim, por um lado, não é difícil traçar um paralelo entre o que
disse Luciano, em 165 da nossa era, e o postulado definido por
Ranke, em 1824, aquele que instruía o historiador a “mostrar como
algo realmente aconteceu” (wie es eigentlich gewesen), ou mesmo
trabalhos como os de W. Humboldt, Fustel de Coulanges, G.
Monod, C. V. Langlois e C. Seignobos, cujas obras tornaram-se
referências para a definição de uma história científica (sobretudo o
levantamento exaustivo de fontes e um texto objetivo). Por outro
lado, é preciso considerar que as regras e princípios metodológicos
que vinham sendo estabelecidos por uma disciplina que tentava se
instaurar não eram seguidos incondicionalmente.”
P. 313  “Paralelamente aos trabalhos dos historiadores narrativistas seguem
a passos largos aqueles que, herdeiros, porém críticos, da filosofia
da história do século XVIII, preocupam-se em conferir à história
graus de cientificidade. No entanto, ao analisarmos mais
detidamente as obras de alguns autores envolvidos nesse debate,
notaremos que se trata antes de ensaios que procuram normatizar ou
estabelecer uma narrativa científica do que propriamente uma
afirmação do gênero.”
 “A primeira tarefa do historiador é “expor aquilo que aconteceu”.
Eco de Luciano e prenúncio de Ranke, essa fórmula traz consigo
proposições inovadoras: expor é narrar os acontecimentos que se
passaram. Assim, o que aconteceu é um dado da realidade, é o
caráter objetivo do discurso histórico, que é, entretanto,
reconstruído pela subjetividade do historiador.” (p. 313-314)
p. 314  “Nesse sentido, as atividades do historiador e do poeta são
“incontestavelmente aparentadas”: tal como este, aquele se serve da
imaginação. Ou seja, o recurso que auxilia o historiador a articular
os elementos de sua narrativa com o objetivo de atingir a verdade
histórica do que se passou é a imaginação.” (Humboldt)
p. 315  “Entre esses, Fustel de Coulanges se destaca por reivindicar de
modo categórico a condição de ciência para a história. Na sua aula
inaugural na Faculdade de Estrasburgo, em 1862, cujo texto
compõe esta antologia, Fustel de Coulanges declara: “gostaria que
fosse bem entendido que a história não é um passatempo, que ela
não é feita somente para ocupar nossa curiosidade e para preencher
as casas de nossa memória. Ela é e deve ser uma ciência”.”
 “O fundamento metodológico dessa concepção encontra-se na
noção de documento histórico: “a única habilidade” [do
historiador], escreve Fustel, “consiste em retirar dos documentos
tudo aquilo que eles contêm e de nada acrescentar-lhes”.”
p. 316  “Por outro lado, a condição “presentista” do historiador deve, na
metodologia fusteliana, ser não apenas recusada, mas esquecida:
quanto mais o presente é negado, mais o historiador aperfeiçoa seu
método; com efeito, para ver os fatos é preciso começar pelo
fechamento dos olhos sobre o presente. Dessa forma, a história
poderia se tornar uma “ciência pura”.”
 “François Hartog explica que, apesar de tudo, o historiador
fusteliano é um leitor, mas um leitor que se acredita neutro, que “lê
seus textos e vê seus fatos, pois ler é ver: o melhor historiador
sendo aquele que vê mais profundamente, mais exatamente”. Por
conseguinte, entre o observador e aquilo que se observa, a relação
se desdobra “no espaço asséptico da leitura fiel”.42 No entanto, a
transição dessa leitura historiadora para o texto deve manter e
ratificar o afastamento entre o historiador e seu objeto. Com efeito,
se o historiador escreve, de modo nenhum ele pode ou deve ser um
escritor. Contudo, paradoxalmente, Fustel foi reconhecido também
pelo seu talento como autor, como literato, condição que ele
procurava relativizar com insistência[...].”
p. 317  “Fustel de Coulanges foi um dos grandes historiadores do século
XIX. Ele viveu a história como a sua vida — como muitos outros
historiadores profissionais de então — e com intensidade procurou
consolidá-la como disciplina científica. Nesse sentido, buscou
incessantemente construir para si a imagem de homem de ciência, o
que não o impediu de ter posições políticas e que sua obra tenha
sido usada para fins políticos.”
Aula inaugural do curso de história da Faculdade de Estrasburgo (1862)
p. 318  “Ela é e deve ser uma ciência. Seu objeto é seguramente um dos
mais belos que podem ser propostos ao trabalho do próprio homem,
que, para ser conhecido por inteiro, exige-lhe diversas ciências: o
fisiologista estuda seu corpo; o psicólogo e o historiador dividem-se
no estudo de sua alma, o primeiro constata o que nela há de
imutável, sua natureza, suas faculdades, sua força intelectual, sua
consciência, o segundo observa aquilo que muda e aquilo que é
móvel nessa alma, as crenças, o movimento e a sucessão das ideias,
e tudo aquilo que se transforma com as ideias, quer dizer, as leis, as
instituições, a arte, a ciência.” (Sobre a História como ciência –
Coulanges)
 “[...]é necessário tê-la observado em todos os períodos de sua
existência; podem-se estudar os outros seres pela simples
observação; o homem somente pode ser conhecido pela história.”
(sobre a natureza humana)
 “Onde os monumentos escritos lhe faltam, é preciso que ela solicite
às línguas mortas seus segredos, e que em suas formas e em suas
próprias palavras adivinhe os pensamentos dos homens que as
pronunciaram. É fundamental escrutar as fábulas, os mitos, os
sonhos da imaginação, todas estas velhas falsidades sob as quais ela
deve descobrir alguma coisa de muito real: as crenças humanas.
Onde o homem passou, onde deixou algum frágil vestígio de sua
vida e de sua inteligência, aqui está a história. Ela deve abraçar
todos os séculos, posto que é o livro tradicional onde a alma
humana inscreve suas variações e seus progressos.”
REGRAS DE UMA HISTÓRIA IMPARCIAL
P. 319  “Mas a história deve terminar por conhecer as instituições, as
crenças, os costumes, a vida inteira de uma sociedade, sua maneira
de pensar, os interesses que a agitam, as ideias que as dirigem. É
acerca de todos esses pontos que nossa vista encontra-se perturbada
pela preocupação do presente. Nós seremos sempre impotentes para
compreender os antigos, se continuarmos a estudá-los pensando em
nós mesmos. Devemos observá-los, em si mesmos, sem nenhuma
comparação conosco.”
 “A primeira regra que devemos nos impor é, portanto, afastar toda
ideia preconcebida, toda maneira de pensar subjetiva[...]O melhor
historiador da Antiguidade será aquele que melhor conseguir
abstrair-se de si mesmo, de suas ideias pessoais e das ideias de seu
tempo, para estudar a Antiguidade.”
p. 320  “Para chegar lá, a condição é manter nosso espírito e nossos olhos
igualmente presos aos textos antigos.”
 “É necessário ler os documentos antigos, lê-los todos, e se não
ousamos dizer ler somente eles, ao menos apenas a eles atribuir uma
confiança plena. Não lê-los rapidamente, mas com uma atenção
escrupulosa, procurando em cada palavra o sentido que a língua do
tempo atribuía a cada palavra, em cada frase do pensamento do
autor.”
 “É preciso dizer como Descartes: o método histórico assemelha-se
ao menos em um ponto ao método filosófico: nós devemos acreditar
apenas naquilo que é demonstrado.”
 “Ora, quando se trata dos antigos, não há conjuntura nem sistema
moderno que possa nos demonstrar uma verdade. As únicas provas
vêm dos próprios antigos. Os modernos podem, às vezes, nos servir
de apoio[...]”
p. 321  “Aplicado à história, espírito crítico consiste, ao contrário, em
deixar de lado a lógica absoluta e as concepções intelectuais do
presente; consiste em tomar os textos tais como foram escritos, no
sentido próprio e literal, em interpretá-los de modo mais simples
possível, em admiti-los ingenuamente, sem nos metermos muito. O
fundo do espírito crítico, quando se trata da história do passado, é
acreditar nos antigos.”
p. 322 A Compreensão Retrospectiva

 “A história não resolve as questões: ela nos ensina a examiná-las.


Ela nos instrui ao menos que é preciso empregar um meio para
observar os fatos humanos. O olhar que lançamos sobre as coisas
presentes é sempre turvado por algum interesse pessoal, algum
preconceito ou alguma paixão. Ver exatamente é quase impossível.
Se, ao contrário, trata-se do passado, nosso olhar é mais calmo e
mais seguro. Nós compreendemos melhor acontecimentos e
revoluções em relação às quais nada temos a temer ou esperar. Os
fatos terminados apresentam-se a nós com mais clareza que aqueles
em via de se concluir. Neles vemos o começo e o fim, a causa e os
efeitos, todos os detalhes. Nós distinguimos neles o essencial do
acessório. Apreendemos o caminho, a direção e o verdadeiro
sentido. Enquanto eles se realizavam, os homens não os
compreendiam; eles estavam confusos, misturados a elementos
estranhos, obscurecidos por acidentes efêmeros. Há sempre nos
eventos humanos uma parte que é apenas exterior e aparente; é
comum que essa parte impressione mais os olhos dos
contemporâneos. É raro também que um grande fato tenha sido
realizado por aqueles mesmos que trabalharam para produzi-los.
Quase sempre cada geração engana-se sobre seus feitos. Ela agiu
sem saber claramente aquilo que fazia. Acreditava visar um objetivo
e atingiu outro. Parece que está acima das forças do espírito humano
ter a intuição clara do presente. O estudo da história deve ter ao
menos esta vantagem de nos acostumar a distinguir nos fatos e na
marcha das sociedades aquilo que é aparente daquilo que é real,
aquilo que é ilusão dos contemporâneos daquilo que é verdadeiro.”
(RESUMO DA CONCEPÇÃO DE HISTÓRIA PARA FUSTEL
DE COULANGES)

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