Artigo - Patrick - Multiparentalidade

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UNIVERSIDADE IGUAÇU
FACULDADE DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS APLICADAS – FACJSA
CURSO DE DIREITO – CAMPUS I – NOVA IGUAÇU

Patrick Van Basten Machado Serra Góes

A MULTIPARENTALIDADE E SEUS EFEITOS NO DIREITO


SUCESSÓRIO

Nova Iguaçu

2018
1

PATRICK VAN BASTEN MACHADO SERRA GÓES

A MULTIPARENTALIDADE E SEUS EFEITOS NO DIREITO


SUCESSÓRIO

Artigo científico apresentado ao curso de


graduação em Direito da Universidade Iguaçu
como exigência final para obtenção do título
de bacharel em Direito.

Orientador: Prof Luiz Marcelo

Nova Iguaçu

2018
2

A MULTIPARENTALIDADE E SEUS EFEITOS NO DIREITO


SUCESSÓRIO

Patrick Van Basten Machado Serra Góes1

RESUMO

O presente estudo tem por intento analisar de maneira breve a evolução


histórica e legislativa da instituição familiar até a contemporaneidade, enfatizando ao
longo dessa trajetória a evolução dos direitos conquistados. Considerando que o
matrimônio fosse a única maneira de se constituir uma família, e dada à
impossibilidade da sua dissolução, que tornava as entidades familiares muito mais
severas e sem vínculo de afeto, identifica-se no trabalho os momentos de grande
relevância na evolução do direito de família. Possibilitando destacar as
transformações do modelo hierarquizado, conservador e patriarcal que outrora
majorava no direito de família, motivo pelo qual se deu uma proliferação de uniões
extramatrimoniais, o que acabava abalando e trazendo grandes transtornos a
estrutura familiar da época, agora em família contemporânea qual apresenta
peculiaridades diversificadas, o que se justifica por meio incessante busca pelo afeto
e felicidade. Aborda-se também quanto à amplitude do conceito de família que
acabou por permitir o reconhecimento de outras entidades familiares, como a uniões
homoafetivas, o reconhecimento da filiação socioafetiva, entre outros diversos
avanços. Assim, trata-se na pesquisa quanto às novas relações que levam os
operadores do direito a uma busca e, consequentemente, a possível inserção de
soluções práticas no âmbito do Direito das Famílias.

Palavras-chaves: Direito das Familias. Socioafetividade. Multiparentalidade.

1
Graduando do Curso de Direito. Universidade Iguaçu. Nova Iguaçu, 13 de novembro de 2018.
3

INTRODUÇÃO

A pesquisa em questão tem por finalidade apontar os efeitos do


reconhecimento da multiparentalidade causados em nosso Ordenamento Jurídico
pátrio, uma vez que a entidade familiar possui enorme relevância em todos os
aspectos de convívio social do indivíduo, além de ser considerado como o pilar de
qualquer cidadão.

Para tanto, observa-se no primeiro item, quanto à origem e o


desenvolvimento tanto legislativo como cultural percorrido até os dias atuais, de
maneira a destacar um breve contexto histórico. Buscando conceituar o que se
entende por multiparentalidade, e apresentando seu reconhecimento social e
jurídico, identificando os princípios constitucionais que norteiam esta seara do
direito.
Desse modo, o segundo item colocará em questão, especificamente,
sobre a inovação que vem acompanhada de relevantes efeitos em nosso
Ordenamento Jurídico, bem como traz resultados significantes para a sociedade,
quais serão enfatizados no presente trabalho.

Ainda quanto aos efeitos advindos do instituto da multiparentalidade,


disserta-se a fim de se obter uma clara e concisa compreensão do tema em tela,
quanto às áreas específicas em que esses efeitos têm maior influência, sendo estas
no âmbito do direito sucessório, dos alimentos, do direito previdenciário e do nome
da pessoa, através de apontamentos doutrinários e legais.

Por fim, resta assento trazer a baila quanto ao posicionamento dos


Tribunais no que se refere à novidade do reconhecimento inovador do instituto da
multiparentalidade, por meio de decisões proferidas pelos mesmos, estabelecendo
uma compreensão de grande repercussão a todos os possíveis conflitos que
possam rodear a temática.

1 MULTIPARENTALIDADE

Como é de conhecimento expansivo e comum, a família é estruturada e


constituída por diversas formas e padrões, de modo a fazer com que a noção de que
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a família tem por base apenas o liame genético, biológico e decorrente do


casamento civil, seja de um todo arcaica. Não obstante a proteger-se o patrimônio,
passou a imperar o direito dos indivíduos, dando inicio, portanto, ao reconhecimento
de fato nas relações interpessoais existentes na sociedade.
Elucida Karina Abreu em seu artigo que:

Com há o reconhecimento de que o afeto é um princípio do direito de


família e faz as vezes de direito fundamental, há uma quebra de
paradigmas, dando-se valor e lugar para o afeto, para o que permeia
cada uma das relações familiares. É por esta razão que se diz que as
relações de consanguinidade são menos importantes que as
oriundas de laços de afetividade e convivência familiar. A afetividade
é o elemento nuclear e definidor da união familiar. (ABREU, 2014)

A multiparentalidade consiste na possibilidade de se reconhecer um


vinculo de parentesco não se limitando a laços sanguíneos e biológicos, mas sim
abrangendo esse vinculo a simples afetividade. De maneira que a afetividade seja o
requisito principal que define uma união familiar.

1.1 BREVE HISTÓRICO

O Brasil sempre teve como requisito legal adotado para estabelecer a


filiação sempre foi o biológico, no qual já se via conecta, a presunção da relação
sexual se determinar a causa da gravidez. Não só no Brasil, mas em outros países
que também ao decorrer da história tiveram como fundamentação a filiação legal no
sistema codificado, automaticamente, tinha-se a ideia de que os filhos legítimos só
eram tidos por meio da origem biológica através do casamento juridicamente
estabelecido.
Com o advento da Constituição de 1988 as mudanças começaram a
surgir, através da inserção de alguns princípios balizadores da família como, por
exemplo, o da igualdade entre os cônjuges e de direitos entre os filhos. Dessa
maneira, quebra-se o paradigma de considerar o matrimônio como o único requisito
nuclear para representar à legítima da paternidade no Brasil. A igualdade redigida na
Constituição estabelece a extinção da discriminadora diferenciação entre filhos,
independentemente de qual fosse a origem biológica.
A Constituição possibilitou não somente um relevante avanço jurídico,
mas também avanços na esfera científica e tecnológica, que muito contribuiu para
5

as conquistas nesse âmbito. Dessa forma, o exame de DNA milagrosamente se


tornava um método eficaz para determinar com precisão a origem genético-
biológica.
Segundo o artigo de José Santos:

Essas questões reforçaram a capitação e aparecimento de novas


teses, enriquecendo o que podemos chamar de novos caminhos e
critérios para a fixação da filiação. Podendo a mesma ser definida e
decidida pela presunção legal, pelo vínculo genético e ainda pela
socioafetividade, construção jurídica que mostra a evolução.
(SANTOS, 2014)

Assim, também surgiram outras conquistas na medicina e na genética, a


exemplo, temos a reprodução assistida que tornou inexistente os debates outrora
desenvolvidos, principalmente quanto ao fato de que a prioridade sempre haveria de
ser da mãe biológica em razão da prevalência do vínculo genético.
Portanto, atualmente podemos considerar que a paternidade/maternidade
não é considerada puramente pela questão biológica, mas sim devem ser
determinadas por um dos três aspectos, quais são: a presumida, a biológica e a
afetiva. Pois podemos apreciar o surgimento de lides nessa área, todavia, com os
avanços alcançados pela doutrina e pelas interpretações jurisprudenciais, a temática
vai se pacificando e, consequentemente, as pessoas passam a buscar seus vínculos
na realidade parental, e “não apenas no critério da unicidade pessoal biológica para
a fixação metodologia da fixação da paternidade/maternidade”. (SANTOS, 2014)

1.2 O RECONHECIMENTO SOCIAL E JURÍDICO

Em razão das diversas formas de se constituir entidades familiares,


atualmente admitidas pelo Ordenamento Jurídico pátrio, muitas são as decisões
proferidas pelos juízes admitindo o registro de por multiparentalidade, não sendo
essas submetidas a recurso, o que denota uma conquista não só jurídica, mas
também social.
Nesse sentido, Maria Berenice esclarece:

Para o reconhecimento da filiação pluriparental, basta flagrar o


estabelecimento do vínculo de filiação com mais de duas pessoas.
Coexistindo vínculos parentais afetivos e biológicos, mais do que
apenas um direito, é uma obrigação constitucional reconhecê-los, na
medida em que preserva direitos fundamentais de todos os
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envolvidos, sobretudo a dignidade e a afetividade da pessoa


humana. (DIAS, 2016, p.409)

Cabe ressaltar, que o reconhecimento da multiparentalidade não exclui o


vínculo com os genitores, pois apenas acresce o direito de reconhecimento a quem
é conferida a posse do estado do filho. Assim, como nas ações de investigação de
paternidade quando o pai que registra não é o biológico, é declarada a dupla
paternidade.

1.3 PRINCIPIOLOGIA DA MULTIPARENTALIDADE

Temos como princípios balizadores do instituto da multiparentalidade


quase os mesmos princípios elencados como os do Direito de Família, sendo um
dos mais importantes, o da Dignidade da Pessoa Humana, que está intrinsecamente
conectado aos sentimentos do indivíduo.
Assim, também são elencados como os princípios embasadores da
aplicação ao instituto da multiparentalidade: o princípio do pluralismo das entidades
familiares, o princípio da proibição do retrocesso social, o princípio da afetividade, o
princípio do melhor interesse do menor e o princípio da realidade socioafetiva.
Os novos direitos advindos com o referido instituto se consolidaram pela
proteção Constitucional, em razão do constituinte originário objetivar a amplitude
quanto ao reconhecimento legal para todos os tipos de família existentes, e quanto
aos que eventualmente poderiam surgir. Contudo, essa proteção “trouxe à
sociedade atual um caráter pluralista, conforme se infere do artigo 226, §§ 3º, 4º e 8º
da Constituição/88. Fica a todos a possibilidade de criar e priorizar a proteção a
outros tipos de famílias, decorrência, que tem por base o legislador constituinte”.
(SANTOS, 2014)

2 EFEITOS JURIDICOS DA MULTIPARENTALIDADE

Em razão de a multiparentalidade admitir a hipótese de uma pessoa ter


seus pais duplicados em seu registro civil, ou seja, possuindo dois pais ou duas
mães, origina-se o motivo de grande inquietação no meio jurídico, pois com o
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advento da multiparentalidade, também surgem os direitos e obrigações das partes


envolvidas.
Em virtude da valorização da filiação socioafetiva, a multiparentalidade
coaduna o reconhecimento de direito do genitor biológico somado ao
reconhecimento pelo direito socioafetivo.
Neste sentido, Karina Abreu esclarece:

A multiparentalidade é uma forma de reconhecer no campo jurídico o


que ocorre no mundo dos fatos. Afirma a existência do direito a
convivência familiar que a criança e o adolescente exercem por meio
da paternidade biológica em conjunto com a paternidade
socioafetiva. (ABREU, 2014)

Porém, quanto às inquietações que esse direito causa, está a


preocupação de uma multiparentalidade generalizada, vez que a sociedade venha
sofrendo grandes e constantes mudanças na esfera conceitual de família.
A relação de parentesco/filiação é compreendida como o primeiro efeito
do reconhecimento do fenômeno da multiparentalidade. Identifica-se que, embora
exista constante preocupação sobre a relevância em se admitir a “paternidade” ou
“maternidade”, sócio-afetiva, isto implica também quanto à criação do vínculo que se
estende aos demais graus e linhas de parentesco, de modo que os efeitos
patrimoniais e jurídicos estejam de um todo englobando a cadeia familiar, decorrente
dos direitos produzidos pelo referido instituto.
Por tal motivo, é que os doutrinadores civilistas afirmam a necessidade de
se estudar cada caso concreto de forma minuciosa, principalmente quanto aos
efeitos por este instituto constituídos.
Diante desse raciocínio, Carlos Gonçalves levanta alguns
questionamentos que automaticamente surgem com a chegada do fenômeno da
multiparentalidade:

[...] Vários são os problemas que podem ocorrer com a


multiparentalidade, tais como: quem irá autorizar a emancipação e o
casamento de filhos menores; quem aprovará o pacto antenupcial do
menos; quem representará os absolutamente incapazes e quem
assistirá os relativamente; quem irá exercer o usufruto dos pais com
relação aos bens dos filhos enquanto menores; quando os filhos
menores serão postos em tutela; como será dividida a pensão
alimentícia entre os pais e se o filho é obrigado a pagar a todos eles;
como será feita a suspensão do poder familiar; quem dos vários pais
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será, também, responsável pela reparação civil prevista no art. 932


do Código Civil; como será contada a prescrição entre pais e filhos e
seus ascendentes; e a quem será atribuída a curadoria do ausente.
(GONÇALVES, 2016, p. 316)

Em que pese todos esses questionamentos, aparenta o referido instituto


não ser tão benéfico assim, nem para o filho, nem para a sociedade, além disso,
conclui-se que a necessidade de cada caso ser analisado de forma minuciosa é real,
devendo ser reservado o deferimento da multiparentalidade a casos excepcionais,
onde exista imprescindibilidade de uma harmonização dos pais biológicos e
socioafetivos.
Aduz ainda Gonçalves:

Efetivamente, o deferimento da multiparentalidade de ser reservado


para situações especiais, de absoluta necessidade de harmonização
da paternidade ou maternidade socioafetivas e biológicas, pelo
menos até que a jurisprudência tenha encontrado, com o passar dos
anos, solução para as consequências que fatalmente irão advir
dessa nova realidade, especialmente a repercussão que a nova
situação irá trazer, por exemplo, nas questões relacionadas com o
direito a alimentos e sucessórios entre os novos parentes, cujo
quadro fica bastante ampliado, bem como os direitos de convivência,
de visita, de guarda e de exercício do poder familiar, entre outros.
(GONÇALVES, 2016, p. 316)

Importa ressaltar, que o nosso Ordenamento Jurídico positivado não


reconhece o chamado “parentesco espiritual” (spiritualis cognatio), que consiste no
relacionamento entre padrinhos ou madrinhas e afilhados, qual para o direito
canônico tanto foi reconhecido, como se fez de critério de inadmissibilidade para a
consumação matrimonial.

2.1 DOS ALIMENTOS

Inicialmente, importa mencionar que ao tratarmos do direito de alimentos quanto


ao instituto da multiparentalidade, faz-se imprescindível identificar como dispositivo de
embasamento, o artigo 229 da Constituição Federal de 1988, qual determina que: “Os pais
têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de
ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”. (BRASIL, 1988)

No mesmo passo, destaca-se o artigo 1.696 do Código Civil brasileiro, qual


regulamenta que: “O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e
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extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns
em falta de outros”. (BRASIL, 2002)

A compreensão quanto ao cabimento e aplicação do direito de alimentos sobre o


instituto da multiparentalidade se dá da mesma maneira que nos casos de sucessão, pois,
como já mencionado anteriormente, não existe distinção entre filhos biológicos e afetivos no
que diz respeito à justiça.

Quanto ao dever de assistência dos filhos para com seus pais, evidencia José
Neves dos Santos que:

Todavia arrisca-se, com base jurisprudencial, doutrinária e na


analogia, considerar que o filho deverá prestar igual parcela de
alimentos e questionar dos pais, que usualmente se estabelece em
um limite de 1/3 (um terço) dos vencimentos líquidos. Entretanto
nada impede que, de acordo com o binômio necessidade e
possibilidade ocorra a fixação de valor acima ou abaixo desse critério
usual. Na multiparentalidade o critério poderá ser inicialmente
sempre o mesmo, nos moldes da interpretação dos juízos e tribunais.
(SANTOS, 2014)

Destarte, que da mesma maneira em que o filho tem direito a receber os


alimentos de ambos os pais, sejam estes afetivos ou biológicos, os pais têm o direito a
serem assistidos pelo filho, independente de quantos será instituído pela multiparentalidade.

2.2 DO NOME DA PESSOA

Compondo o direito de personalidade que é intrínseco ao indivíduo, de modo a


não poder ser renunciado ou transmitido, o direito ao uso do nome dos pais pelos filhos,
está diretamente ligado ao princípio da dignidade da pessoa humana.

Sendo assim, cabe explicitar o entendimento de Venosa:

O nome é, portanto, uma forma de individualização do ser humano


na sociedade, mesmo após a morte. Sua utilidade é tão notória que
há exigência para que sejam atribuídos nomes a firmas, navios,
aeronaves, ruas, praças, acidentes geográficos, cidades etc. O
nome, afinal, é o substantivo que distingue as coisas que nos
cercam, e o nome da pessoa a distingue das demais, juntamente
com os outros atributos da personalidade, dentro da sociedade. É
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pelo nome que a pessoa fica conhecida no seio da família e da


comunidade em que vive. Trata-se da manifestação mais expressiva
da personalidade. (VENOSA, 2004. p 209)

O direito a dispor do nome dos pais como forma de reconhecimento veio com o
advento da Lei 6.015/73, que dispõe sobre registros públicos, porém, não consta no
mencionado dispositivo legal a possibilidade de existir no registro civil a dupla indicação de
nomes maternos ou paternos, posto que o instituto de multiparentalidade seja um fenômeno
recente na sociedade.

Portanto, apesar de existir alguns posicionamentos contrários à inserção dos

nomes no registro do filho, “não seria lógico alguém possuir efetivamente dois pais

e/ou duas mães e não poder vê-los legalmente inseridos em seu registro de
nascimento”. (SANTOS, 2014)

2.3 SUCESSÃO

De acordo com a observação da ordem de preferência e vocação


hereditária indicadas no dispositivo legal, quais sejam, os artigos 1.849 a 1.847 do
Código Civil, são reconhecidos os direitos sucessórios com a aplicação do instituto
da multiparentalidade.
Assim, importa esclarecer a distinção entre a sucessão legítima e a
sucessão testamentária, a fim de apontar em qual dos casos confere a sua
aplicabilidade nas situações de multiparentalidade.
A sucessão legítima ocorre quando, “na falta de testamento, defere-se o
patrimônio do morto a seus herdeiros necessários e facultativos, convocados
conforme relação preferencial da lei” (RIBEIRO, 2014). Ainda que exista testamento,
mas este não abarcando todos os bens, se aplicará a sucessão legítima pautada
pelo artigo 1.788 do Código Civil.
Assim, o deferimento da sucessão legítima é disciplinado pelo artigo
1.829 do Código Civil, que diz:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:


I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente,
salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão
universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640,
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parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da


herança não houver deixado bens particulares;
II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge;
III - ao cônjuge sobrevivente;
IV - aos colaterais. (BRASIL, 2002)

Compreende-se como sucessão testamentária “aquela em que a


transmissão hereditária se opera por ato de última vontade, revestido da solenidade
requerida por lei, prevalecendo as disposições normativas naquilo que for ius
cogens, bem como no que for omisso o testamento”. (JURÍDICA, 2018)
Quanto à aplicação da sucessão no instituto de multiparentalidade, vale
enfatizar o esclarecimento de José Neves dos Santos, à medida que indica:

Relembramos também que conforme princípio constitucional prevista


expressamente no artigo 227, § 6º da CF “os filhos, havidos ou não
da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e
qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias
relativas à filiação”. Assim sendo, independentemente da forma de
reconhecimento dos filhos, serem esses naturais, afetivos ou
multiparentais, possuem os mesmos direitos, inclusive sucessórios.
Esse também é o sentido jurídico da regra do art. 1.596 do Código
Civil. (SANTOS, 2014)

Portanto, ao filho multiparental é conferido o direito de herdeiro


necessário de todos os pais que o mesmo tiver. Uma vez já sendo reconhecida a
multiparentalidade no momento da transmissão da herança, posto que não haja
distinção jurídica entre pais e filhos biológicos ou afetivos.

2.4 DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO

Da mesma maneira que ocorre no direito sucessório, uma vez que os


filhos passam a ter direito de herança em relação aos pais e, consequentemente, os
pais passam a ter direito na herança em relação aos filhos, e também nos alimentos
onde os pais têm como obrigação alimentar seu filho, e os filhos por sua vez,
também ficam obrigados a prover alimentos a seus pais, ocorre de igual modo no
que diz respeito aos direitos previdenciários, tendo em vista a reciprocidade
existente entre eles. Pois é o que se compreende por meio do art. 16, da Lei Federal
nº.8.213/91, que determina:
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Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na


condição de dependentes do segurado:
I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não
emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos
ou invalido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne
absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente.
(BRASIL, 1991)
 
Assim sendo, a partir do momento em que houver a parentalidade
socioafetiva ou multiparentalidade, consequentemente, se fará necessário o
reconhecimento dos direitos previdenciários. Também será atribuído esse direito aos
pais e irmãos socioafetivos, desde que estes últimos não sejam emancipados, e
sejam menores de 21 anos ou inválidos. O que ocorre em virtude do princípio da
igualdade, como já mencionado anteriormente.
Esclarecendo de forma sucinta, insta salientar que se qualquer um dos
pais do filho multiparental for preso, desde que ele segurado do INSS, sendo
submetido à reclusão no sistema fechado ou semiaberto, observada a renda mensal
estipulada pelo INSS e desde que o filho tenha idade inferior a 21 (vinte e um) anos,
não sendo emancipado, ou invalido, de acordo com as peculiaridades expostas no
artigo 80 da Lei 8.213/91, bem como nos artigos 116 a 119 do Decreto 3048/99,
esse filho terá direito ao recebimento do auxilio reclusão. De igual modo, quando a
situação é inversa, onde o filho for submetido à reclusão nos mesmos moldes da
hipótese supracitada, o direito ao recebimento de auxilio reclusão pelos pais também
é verdadeiro, desde que haja comprovação da dependência dos pais com relação a
este filho.
Outro caso que inspira a aplicação do direito previdenciário é na situação
de morte deste filho, onde qualquer um dos pais, desde que comprovada a
dependência econômica para com o filho, terá direito a solicitação do recebimento
de pensão por morte. Da mesma forma quando do falecimento dos pais, o filho
também terá direito ao recebimento de tal pensão, uma vez que as determinações
dos artigos 105 a 115 do Decreto 3048/99 e dos artigos 74 a 79 da Lei 8.213/91
sejam acatadas.
Cumpre esclarecer que o artigo 124, VI da Lei de Benefício (Lei nº
8.213/91) dispõe em seu teor sobre a proibição quanto a cumulação de duas
pensões por morte, proveniente da morte de cônjuge ou companheiro. De igual
modo se compreende o artigo 167 do Decreto nº 3.048/99. Com base na
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interpretação dos referidos artigos, compreende-se que em caso de morte de mais


de um pai, cabe ao filho cumulação de pensão por morte, uma vez que a
Administração Pública deve agir em concordância com a determinação legal e filho
não é companheiro.
Desta forma, observa-se que em virtude da omissão da lei quanto a
cumulação de pensões proveniente das mortes dos pais, é compreensível que uma
pessoa, desde que tenha sua filiação socioafetiva reconhecida e registrada,
possuindo, portanto, mais de dois pais, poderá fazer jus ao recebimento de duas ou
mais pensões por morte.

3 POSICIONAMENTO DOS TRIBUNAIS

Diante da temática, o Supremo Tribunal Federal aprovou significativa


tese sobre direito de família, norteando alguns pontos da parentalidade no atual
cenário jurídico brasileiro. O posicionamento do Supremo Tribunal Federal foi
fundamental para a tradução contemporânea das peculiaridades da filiação e
relações de parentesco, sendo considerado um leading case sobre o assunto.
Por se tratar de um tema de extrema relevância, bem como de
repercussão geral, a tese aprovada apresentava uma análise eventual  quanto à
“prevalência da paternidade socioafetiva em detrimento da paternidade biológica”.
Ao promover a decisão sobre o mérito da questão, o Supremo Tribunal Federal
preferiu não estabelecer nenhuma prevalência entre as mencionadas modalidades
de vínculo parental, reconhecendo a possibilidade de existência simultânea de
ambas.
Inúmeros são os desafios propostos aos juristas todos os dias quanto
aos conflitos familiares refletidos pelas múltiplas relações interpessoais existentes.
No cenário da atual, a possibilidade do reconhecimento de pluralidade nos vínculos
parentais é uma realidade fática que necessita de uma acomodação jurídica, a fim
de que esses eventuais conflitos sejam extintos.
Ao analisar a temática implícita à repercussão geral apresentada, o STF,
por maioria, decidiu aprovar uma orientação qual se adequará como parâmetro
para casos semelhantes.
A aprovação teve o seguinte contexto: “A paternidade socioafetiva,
declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de
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filiação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos


próprios”.
Tal texto foi oferecido pelo então ministro e relator Luiz Fux, sendo
acolhido por maioria, divergindo dessa compreensão apenas os ministros Dias
Toffoli e Marco Aurélio, visto que apresentavam divergências, ainda que de forma
parcial, da redação final proposta.
A tese é clara e objetiva quando afirma a possibilidade de existência
simultânea de uma paternidade socioafetiva e uma paternidade biológica, estando
ambas em específico caso concreto, de forma a admitir a possibilidade da
existência jurídica de mais de um pai. Ao regulamentar sobre a possibilidade
jurídica da pluralidade de vínculos familiares e parentescos, a Corte Suprema
trouxe um importante avanço: que foi de fato o reconhecimento da
multiparentalidade.
A equiparação proveniente do instituto da multiparentalidade é
importante e determina em um grande avanço para o direito de família. Visto que
diante disso, não há que se mencionar quanto à prevalência de uma modalidade
sobre a outra, sendo necessária uma análise minuciosa a cada caso concreto a fim
de apontar a melhor solução para a situação fática. Como exemplo, temos as
decisões:

APELAÇÃO. DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. RELAÇÃO DE


PARENTESCO. AÇÃO DE RECONHECIMENTO DE
PATERNIDADE. ANULAÇÃO DE REGISTRO CIVIL.
MULTIPARENTALIDADE. RECONHECIDA A EXISTÊNCIA DE
DOIS VÍNCULOS PATERNOS, CARACTERIZADA ESTÁ A
POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DA
MULTIPARENTALIDADE. TEMA Nº 622 DA REPERCUSSÃO
GERAL DO STF. EM JUÍZO DE RETRATAÇÃO, DERAM
PROVIMENTO AO RECURSO. (Apelação Cível Nº 70073977670,
Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liselena
Schifino Robles Ribeiro, Julgado em 12/12/2017).
(TJ-RS - AC: 70073977670 RS, Relator: Liselena Schifino Robles
Ribeiro, Data de Julgamento: 12/12/2017, Sétima Câmara Cível,
Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 14/12/2017)

APELAÇÃO CÍVEL. INVESTIGATÓRIA DE PATERNIDADE.


RECONHECIMENTO DO VÍNCULO BIOLÓGICO E
PRESERVAÇÃO DA PATERNIDADE REGISTRAL PRÉ-
EXISTENTE SOCIOAFETIVA. MULTIPARENTALIDADE.
INEXISTÊNCIA DE DEFEITO DE CONGRUÊNCIA ENTRE PEDIDO
E SENTENÇA. Caso em que não há defeito de congruência entre o
15

pedido e a sentença, pois o reconhecimento da multiparentalidade


(dupla paternidade) se insere no âmbito do pedido do autor (pai
biológico) que se limita à inclusão, no registro de nascimento da
filha, da paternidade biológica, no qual já consta registrada uma
paternidade socioafetiva. Nesse passo, estando bem provada a
relação de afeto existente entre a menor e o pai registral
socioafetivo, a sentença que reconheceu a paternidade biológica,
preservando a paternidade registral pré-existente, julgou conforme
a jurisprudência da Corte, pois possível e adequado o
reconhecimento da dupla paternidade (multiparentalidade), em
casos como o presente. NEGARAM PROVIMENTO. (Apelação
Cível Nº 70076327162, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 28/06/2018).
(TJ-RS - AC: 70076327162 RS, Relator: Rui Portanova, Data de
Julgamento: 28/06/2018, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação:
Diário da Justiça do dia 06/07/2018)

Diante desse emblemático tema, e entre todo o delinear formado por


limites, perspectivas e possibilidades, cabem por oportuno o reconhecimento do
cuidado da decisão do STF e o destaque da fundamental participação do Instituto
Brasileiro de Direito de Família como Amicus Curiae na regulamentação dessa
matéria.

CONCLUSÃO

Diante do estudo percorrido ao longo do presente trabalho, fica


incontestavelmente firmada que o instituto de família é a mais antiga instituição
social-histórica. Sofrendo com o transcurso do tempo, grandes e relevantes
transformações, de acordo com as modificações dos preceitos, costumes e condutas
humanas.
Como foi de clara compreensão, a inovação do instituto da
Multiparentalidade foi muito bem recepcionada pelos dispositivos legais que
regulamentam as questões dos direitos pertinentes às relações familiares, justificada
tal recepção pelo fato da atual amplitude conceitual que o direito de família e a
própria entidade possui.
Esse avanço alcançado pelo direito de família só foi possível em virtude
do desenvolvimento da sociedade, que passou a priorizar dentro das relações
familiares, além do princípio da dignidade da pessoa humana o princípio da
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afetividade, e a partir desses, deram espaço a todos os outros vislumbrados no


estudo.
Em contraponto, a Multiparentalidade se mostrou um instituto que ainda
carece bastante de maturidade e desenvolvimento por conta de sua recente
existência, pois apesar de estar bem embasado, restam muitos questionamentos
que precisam ser sanados de forma mais objetiva, e não por analogia como tem sido
feito.
Conclui-se, portanto, que o fenômeno da Multiparentalidade trouxe a
possibilidade de que houvesse um reflexo da realidade atual familiar no mundo
jurídico, desde o seu reconhecimento por meio do registro de nascimento até os
direitos sucessórios, abrangendo todos os efeitos pertinentes e oportunamente
cabíveis da filiação.
Por tudo isso, resta claro que os ganhos foram muitos, de maneira que
merecem destaque a fim de que possa repercutir de forma adequada na avançada
doutrina jusfamiliarista brasileira. É auspicioso o posicionamento do Supremo
Tribunal Federal, que automaticamente atinge a outras questões e a novos
desafios, trazendo a esperança de uma nova primavera para o direito de família
brasileiro.

ABSTRACT

The purpose of this study is to briefly analyze the historical and legislative
evolution of the family institution up to the present time, emphasizing along this
trajectory the evolution of the rights conquered. Considering that marriage was the
only way to establish a family, and given the impossibility of its dissolution, which
made the family entities much more severe and without a bond of affection, it
identifies in the work the moments of great relevance in the evolution of law family's.
Making it possible to highlight the transformations of the hierarchical, conservative
and patriarchal model that once existed in family law, which was why a proliferation
of extramarital unions occurred, which eventually undermined and brought great
disruption to the family structure of the time, now in the contemporary family which
presents diversified peculiarities, which is justified by an unceasing search for
affection and happiness. It also addresses the breadth of the concept of the family
that has allowed recognition of other family entities, such as homoaffective unions,
recognition of socio-affective affiliation, among other advances. Thus, the research is
about the new relationships that lead the operators of the right to a search and,
consequently, the possible insertion of practical solutions within the scope of the
Family Law.
17

Key-words: Family Law. Socio-activity. Multiparentality.

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