PMMC 2.2 Tema 6 13.09.2019

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Psicologia Médica e Medicina Comportamental

Antes de mais nada, devo dizer que não há slides disponibilizados desta aula, pelo que será apenas texto
corrido.

Aspetos psicológicos da doença cardíaca


Os aspetos psicológicos em determinadas patologias têm um determinante muito
marcado.

Algumas formas de tratamento das doenças cardíacas, nomeadamente quando falamos


de doença coronária, envolvem: controlo dos fatores de risco, intervenções mais agudas
(ex: angioplastia, bypass coronário), introdução de medicação ao doente e, o que vamos falar
hoje, o tratamento do doente numa unidade de reabilitação cardíaca.

E porque é que este tema se enquadra nesta Unidade Curricular? Cada doente cardíaco
tem as suas crenças e a sua forma de reagir à doença. Neste caso específico de doença
cardíaca, sabemos como pode mudar drasticamente a vida de um doente e é neste contexto que
surge a Unidade de Reabilitação Cardíaca e esta aula.

O Programa de Reabilitação Cardíaca, na sua definição dada pela American


Association of Cardiovascular and Pulmonary Rehabilitation, tem como objetivos:

• Potenciar o bem-estar físico, psicológico e social. Esta tríade é indissociável. Um


tratamento meramente físico não cumpre os objetivos de um plano terapêutico para um
doente cardíaco;

• Estimular a convivência confiante, que é algo que está extremamente abalado numa
pessoa que sofre de doença cardíaca;

• Reforçar comportamentos que minimizem o risco de ventos cardíacos subsequentes.

O funcionamento da Unidade de Reabilitação Cardíaca dado como exemplo na aula foi


a do Hospital de Santa Cruz.

Os objetivos terapêuticos em Reabilitação Cardíaca resumem-se essencialmente em:

• Prevenção do evento cardíaco agudo;

• Prevenção do evento cardíaco subsequente ao evento cardíaco agudo;

• Promoção de estilo de vida saudável.

Este último ponto é das tarefas mais difíceis de se fazer na Unidade. É fácil prescrever
uma embalagem de medicamentos e ensinar o doente a tomá-la. O que é complexo é alterar os
comportamentos de vida que esse doente levava há anos. Esta tarefa difere de doente para
doente, de profissional de saúde para profissional de saúde e é por isso que tem que haver
convergências para se conseguirem atingir objetivos comuns.

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A promoção de um estilo de vida saudável passa por uma intervenção a nível:

• Do exercício físico;

• Da alimentação racional;

• Do bem-estar em oposição ao stress;

• Da cessação tabágica;

• Do controlo de peso.

Evidentemente que tem que haver uma boa monitorização dos cuidados genéricos e da
progressão da doença.

E como é que se consegue alcançar todos estes objetivos? O Programa de Reabilitação


Cardíaca é um programa que propõe uma intervenção central num horizonte de um ano no
doente cardíaco, isto é, segue uma espécie de cronograma:

1) O doente tem um evento cardíaco (ex: EAM, cirurgia by-pass, descompensação de uma
insuficiência cardíaca, preparação para transplante, pós-transplante cardíaco, etc);

2) Segue-se a avaliação clínica do doente;

3) E por fim, a monitorização terapêutica e de hábitos.

O exercício físico terapêutico é extremamente importante na reabilitação cardíaca, pois


esta conjuga duas componentes fundamentais: o treino do exercício e a educação do doente
e dos seus familiares.

Não vale a pena só educar os doentes – os seus familiares vão ser


importantes para reforçar os comportamentos de mudança que nós
planeámos.

Numa primeira fase, o exercício físico é maioritariamente supervisionado por


profissionais de saúde (entre os quais, os fisioterapeutas e fisiatras), mas com o decorrer do
tempo, o montante e volume de exercício deixa de ser tão supervisionado, uma vez que o que
nós queremos, em segunda instância, é promover a autonomia do exercício físico no doente
e, portanto, dar-lhe competências para saber monitorizar o seu treino e avaliar a sua progressão
no volume da atividade física que vai fazendo a partir daí.

No contexto do doente cardíaco, não basta termos apenas uma intervenção a nível do
exercício físico. Temos toda a componente do ensino, que é fundamental. Este ensino decorre
a vários níveis, nomeadamente:

• Consultas de cessação tabágica;

• Acompanhamento nutricional;

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• Acompanhamento psicológico;

• Apoio social.

Só assim, no decorrer de um ano, conseguimos trabalhar com mudanças de


comportamentos e estilo de vida saudável e promover o controlo dos fatores de risco.

Esta intervenção só faz sentido se for feita em contexto de uma equipa clínica
multidisciplinar.

Os doentes fazem reabilitação cardíaca em grupo, permitindo que exista uma força
conjunta e uma união de esforços e partilha de experiências e motivações, reforçando
comportamentos entre pares.

A unidade de reabilitação cardíaca é composta pela equipa de reabilitação cardíaca e


pela equipa de apoio diferenciado e secretariado.

A equipa de reabilitação cardíaca é constituída por o médico cardiologista, médico


fisiatra (complementa a abordagem do cardiologista), fisioterapeutas e enfermagem
(sobretudo a nível do controlo analítico – glicémia, controlo dos fatores de risco e colesterol).

Há ainda o secretariado e uma equipa de apoio diferenciado que é composta por:


psiquiatria, cessação tabágica da responsabilidade da pneumologia, nutrição e assistência
social.

A unidade tem instalações próprias onde são realizadas as sessões de exercício e as de


ensino e existe um gabinete de consulta ao qual está alocado uma distribuição de horas
especificas para que toda esta equipa de apoio diferenciado se possa deslocar até à unidade e
doente cardíaco quando está em sessões pode consultar, de acordo com o dia, a acessibilidade
da equipa diferenciada.

O fisioterapeuta é um técnico de diagnostico e terapêutica. O fisiatra é um médico.

Na intervenção, a avaliação medica é feita pelo cardiologista. O fisiatra faz o


diagnóstico funcional, a força, o equilíbrio e a segurança dos exercícios e intensidades de treino.

A avaliação clínica destes doentes faz-se a nível de consultas e prova de esforço


cardiorrespiratório ou clássica que integra a componente cardíaca e ventilatória e permite avaliar
a intensidade do treino.

São ainda usados o ecocardiograma, eletrocardiograma, análises e questionários.

A bateria de questionários para os doentes incluí questionários sobre o estado de


saúde, estado de mudança, atividade física, ansiedade e depressão, qualidade de vida e
hábitos tabágicos.

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Ansiedade e depressão é avaliada pela escala de ansiedade e depressão (ADS –


questionário aplicado no início de um seguimento em unidade de reabilitação cardíaca) faz a
triagem de níveis de ansiedade e depressão, muito utilizado na clínica, pode ser útil para
referenciar para a cirurgia ou a psiquiatria.

A equipa de psiquiatria elaborou ainda um conjunto de perguntas que permitem avaliar


o estado de mudança em que o doente cardíaco se encontra quando começa o programa de
reabilitação cardíaca.

Ex: O exercício físico regular é uma atividade física treinada, por exemplo, caminhada
corrida, andar de bicicleta, nadar realizada com o objetivo de melhorar a aptidão física. A
atividade deve ser realizada 3 a 5 vezes por semana, com a duração de 30 a 60 min por sessão.
O exercício não tem de ser doloroso para ser eficaz, mas tem de ser feito a uma
intensidade que aumente a sua frequência respiratória e provoque suor. Ou seja, exercício
(estar 30 min a pedalar) é diferente de atividade física (usar escadas em vez de elevador).

Face a esta definição de exercício físico, o doente assinala:

• sim, faço há mais de 6 meses;

• sim, faço há mais de 3 meses;

• não, mas espero iniciar nos próximos 30 dias;

• não, mas espero iniciar nos próximos 6 meses;

• não e não pretendo iniciar nos próximos 2 meses.

Temos diferentes estádios de ação e reação. Para quem está motivado usamos umas
estratégias, a quem está motivado, mas ainda não começou outras e a quem não esta motivado
temos de reequacionar objetivos.

É também inquirida sobre a prática da alimentação saudável com o mesmo tipo de


opções. Há, portanto, fases ativas, contemplativas e pré-contemplativas.

Em relação à cessação tabágica é inquirido se é fumador ou ex-fumador. Se já foi


fumador ou nunca foi. Trata-se, portanto, de uma abordagem multifatorial, multidisciplinar e
individualizada.

O controlo dos fatores de risco é um ponto de honra: tabagismo, diabetes, HTA,


dislipidemia, obesidade, sedentarismo, stress, ansiedade e depressão.

O nível de stress, ansiedade e depressão é diferente entre os doentes e a forma como


vamos trabalhar o controlo dos diferentes fatores de risco é afetada por estes níveis.

O controlo ao longo do tempo permite perceber repercussões, sinais de alerta e arranjar


estratégias para dar continuidade à progressão dos estilos de vida saudáveis.

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Para além das sessões de treino e de exercício existem as sessões de ensino. Há várias
temáticas de ensino como:

• Doença aterosclerótica

• Controlo dos fatores de risco

• Terapêutica cardiovascular

• Atitudes em situação de urgência

Estas sessões são normalmente dadas pela equipa dos cardiologistas.

• Estilo de vida saudável é dado por psiquiatria

• Cuidados nutricionais pelos nutricionistas

• Exercício individual autónomo pelos fisioterapeutas

O tema “Plano pessoal de cuidados” é um conjunto de tudo e tenta-se que estejam


todos presentes apesar de nem sempre ser possível.

As sessões de ensino são concomitantes com sessões de exercício.

O exercício físico é supervisionado no primeiro mês com treinos trissemanais. No mês


2 há sessões bissemanais e no mês 3 e seguintes: há uma sessão por mês.

Isto não quer dizer que os treinos diminuem, mas quer dizer que a quantidade de
treinos que os indivíduos realizam sozinhos e autónomos aumenta! É da responsabilidade
dos mesmos e quando vêm ao treino mensal podemos ver se têm perfil que demonstra adesão
ao treino.

Temos protocolos diferentes conforme o motivo de referenciação.

Exemplo:

Motivo: Insuficiência Cardíaca - protocolos de treinos trissemanais por 3 meses porque


a evidencia científica mostra que são precisos programas mais longo para a mesma adaptação
fisiológica ao treino com benefícios cardiovasculares.

Para ter custo-benefício a nível hospitalar, quando um grupo trissemanal termina outro
grupo trissemanal pode entrar.

Não há 100% de referenciação para o programa de reabilitação cardíaca. Menos de 3%


dos verdadeiros candidatos são os que são referenciados.

Estes programas não trazem lucro imediato, trazem ganhos em saúde, é preciso tempo
e investir em mudanças de estilo de vida.

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As sessões de exercício terapêutico são sessões de 60 a 90 minutos em que nós iniciamos


com monitorização clínica, ou seja, fazemos uma avaliação da tensão arterial, frequência
cardíaca, sensação de esforço do doente, medicação, se tem as análises em dia, peso, quantos
cigarros fumou, se dormiu bem, para termos tudo orientado antes de começar o treino:

1. Fase de aquecimento;

2. Treino aeróbio – com a FC alvo determinada pela prova de esforço;

3. Treino de força muscular;

4. Treino funcional – questões de equilíbrio;

5. Alongamentos;

6. Sessões de relaxamento – Esta fase é muito importante para manter o coração do


doente saudável. Previne arritmias, baixando a FC e a TA.

Então, nós demos várias estratégias para o envolvimento do doente cardíaco:

• Contrato de um programa de reabilitação cardíaca – o doente entra e recebe


um contrato que diz “Eu comprometo-me a realizar as sessões de treino de
exercício, a realizar uma frequência que me vai fazer sentir que o exercício é um
grau intenso e comprometo-me a ir as sessões de ensino etc.” o doente assina
e data-se à entrada.

• Diploma de programa – dá a sensação que concretizou o objetivo e é


fundamental sentirem esse reconhecimento que é entregue pela equipa.

• Passaporte do atleta – registo de todas as particularidades da avaliação inicial


e do controlo da atividade física dos doentes.

• Questionário da avaliação do programa – para saber se temos que mudar a


nossa intervenção, são critérios de qualidade importantes.

Assim, esta é uma intervenção contínua, A ideia é não criar dependências, pelo
diferenciada, integrada. Desde os cuidados que temos de promover a
autoeficácia e criar o conceito de
intensivos até adquirir um estilo de vida saudável. independência e autonomia.

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Caso clínico:

Ø Homem, 45 anos, solteiro, pai de uma filha de 3 anos, gestor, vive sozinho (alguns
fatores psico-sociais importantes);
Ø EAM submetido a angioplastia coronária;
Ø Proposta de tratamento em unidade de reabilitação cardíaca;
Ø Antecedentes Pessoais: HTA não medicada, tabagismo, exercício físico
vigoroso em academia de crossfit aos sábados;
Ø Personalidade: competitividade, impaciência, hostilidade, exigência;
Ø Trabalha a partir de casa;
Ø Relações sociais e familiares são poucas, contactos com a filha são esporádicos.

Análise do caso:

Ø Por viver sozinho e tem uma filha, que dá a ideia de não a ter por perto – fator de stresse

Ø Gestor – fator de stresse

Ø Crossfit ao sábado – exercício físico muito intenso em apenas 1 dia por semana

Ø Hostilidade – parte para o conflito com alguma facilidade e é muito exigente

Ø Fatores de risco identificados no doente: todos os que estão destacados em no caso.

Ø Viver só – quando alguém vive só, a adesão ao tratamento é automaticamente menor


por não terem o contexto familiar que faz a pessoa aderir ao tratamento.

Ø Ansiedade – pode ter impacto na função cardíaca e respiratória

As características da pessoa têm influência na adesão ao tratamento.

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