A Construção Histórica Do Conceito de Dignidade Da Pessoa Humana

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A CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE

DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

LA CONSTRUCTION HISTORIQUE DE LE CONCEPT DE


LA DIGNITÉ DE LA PERSONNE HUMAINE

Analice Franco Gomes Parente


Marcus Vinícius Parente Rebouças

RESUMO: Este artigo analisa o processo de concepção e evolução histórica do conceito de


dignidade da pessoa humana no pensamento ocidental. Para tanto, num primeiro momento,
além de conter breves comentários acerca da consolidação da ideia de dignidade da pessoa
humana no rol de crenças dogmáticas que compõem o imaginário moderno do pós-
positivismo jurídico, enfatiza a importância de se examinar o evolver histórico do conceito de
dignidade com o fito de formular uma pré-compreensão consistente acerca das premissas
antropológicas que informam o Estado brasileiro na ordem constitucional em vigor. Na
sequência, discorre sobre o legado das culturas grega, romana e judaica antigas e do
pensamento cristão primitivo e escolástico na concepção da ideia básica da dignidade da
pessoa humana, bem como sobre o processo de laicização operado na era moderna, até a
formulação filosófica kantiana da noção de dignidade associada ao reconhecimento da pessoa
humana enquanto fim em si mesma. A pesquisa examina também a íntima relação existente
entre a concepção moderna de dignidade da pessoa humana e os direitos humanos.
PALAVRAS-CHAVES: DIGNIDADE. PESSOA HUMANA. EVOLUÇÃO HISTÓRICA.
RÉSUMÉ: Cet article analyse le processus de conception et de l'évolution historique du
concept de la dignité de la personne humaine dans la pensée occidentale. Pour atteindre cet
objectif, dans un premier temps, il contiennent de brefs commentaires sur la consolidation de
l'idée de la dignité de la personne humaine dans la liste des croyances dogmatiques qui
composent l'imagerie moderne du post-positivisme juridique, met l'accent sur l'importance
d'étudier l'histoire se déroule de la notion de dignité avec le but de formuler une pré-
compréhension cohérente sur les premisses anthropologiques qui informent l'État brésilien de
l'ordre constitutionnel en vigueur. En outre, analyse l'héritage de cultures grecque, romaine et
juive antiques et de le pensée chrétienne primitif et la conception scolastique de l'idée
fondamentale de la dignité de la personne humaine ainsi que sur le processus de laïcisation
exploité à l'époque moderne, jusqu'à la formulation kantienne philosophique de la dignité
associée à la reconnaissance de la personne humaine comme une fin en soi. La recherche
examine également la relation intime existant entre le conception moderne de la dignité de la
personne humaine et les droits de l´homme.
MOTS-CLÉS: DIGNITÉ. PERSONNE HUMAINE. ÉVOLUTION HISTORIQUE.
NOTAS INTRODUTÓRIAS

Desde o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), vivencia-se, numa dimensão


ímpar na história humana, um complexo processo de transformação e intensificação das
relações internacionais, que envolve um vasto e heterogêneo mosaico de elementos, atores e
efeitos em escala local, regional ou global, com profundos desdobramentos sociais,
econômicos, políticos e culturais.
Em certa medida, referido fenômeno dos tempos hodiernos associa-se à reengenharia
macroeconômica promovida pela expansão do capitalismo financeiro e industrial iniciada na
segunda metade do século XX. Nessa particular conjuntura histórica, tem-se operado uma
revolucionária mutação tecnológica, temporal, espacial e comportamental nos processos e
mecanismos de produção de bens e de prestação de serviços; de transporte de pessoas e de
mercadorias manufaturadas e commodities; de movimentação, “bancarização” e
“bolsificação” de recursos pecuniários; de comunicação, intercâmbio de informações e
manipulação computacional de dados etc. Pari passu, vem-se propagando, sob a lógica do
“laissez faire, laissez aller, laissez passer”, uma nova ordem econômica, de inspiração
ultraliberal, arquitetada no sentido da desobstruída circulação, reprodução, especulação e
acumulação internacionalizada do capital num livre mercado global (global free market)1.
Para tanto, têm-se estabelecido novos paradigmas empresariais de concorrência, de transação
negocial e de mais-valia e nova sistemática organizacional de empregabilidade flexibilizada e
de fragmentação planetária da força de trabalho, com eliminação progressiva das barreiras
comerciais, além da dissolução circunstanciada das fronteiras nacionais e das burocracias
estatais2. Imerso no que se tem denominado de “globalização” (globalization ou, para os
franceses, mondialisation)3, esse conjunto multifacetado de bruscas e fugazes mudanças
existenciais vem redefinindo drasticamente não só a relação espaço-tempo e a economia e
geopolítica mundiais; mas também, no plano da subjetividade e da intersubjetividade, o
próprio modo de ser, de viver, de consumir, de aspirar e de se relacionar dos seres humanos
na contemporaneidade.
Em meio à pujança desse movimento de irradiações planetárias, a revolução
tecnológica empreendida nos meios de transporte, de comunicação e de informação ampliou a
percepção da pluralidade e relatividade dos códigos e sistemas multiculturais de referência
que informam as aspirações existenciais, as definições valorativas (o que é justo, bom, belo
etc?)4 e o ideário difuso dos diversos grupos humanos embalados nesse processo histórico 5.
Em certas situações, as diferenças multiculturais têm, contudo, obstruído ou tencionado, de
forma sectária ou fundamentalista6, os canais de diálogo e de composição consensual em
torno da reflexão acerca de eventuais “valores comuns da humanidade” 7. A diversidade
cultural entre as nações é, decerto, um dos elementos mais complexos da plural realidade do
mundo pós-moderno8 9. Isso não significa, contudo, que não possam ser estabelecidos
diálogos e laços interculturais, sobretudo quando envolvam preocupações ou aspirações
isomórficas mutuamente inteligíveis compartilhadas por povos de distintas culturas10.
Nada obstante, para além da globalização econômica (e até mesmo contra muitos dos
seus efeitos), vem-se consolidando um resoluto consenso, de prospecto universalista, em
torno da crença dogmática na ideia de “dignidade da pessoa humana” 11. A afirmação de uma
consciência global nesse sentido vem-se dando mesmo em meio ao imaginário diversificado
e, em termos, culturalmente fragmentado da humanidade 12. Disso dimanou, na cultura
ocidental, o reconhecimento da validade teórico-especulativa do postulado filosófico, de base
kantiana, de que o fundamento último ou razão primeira do Estado e do Direito (interno e
internacional) radica no valor de fim em si mesma inerente à pessoa humana, cabe dizer, na
sua dignidade autorreferenciada.
Vale nota que, ao longo de sua evolução histórica13, a par de ter sido decodificada
como dogma teológico e proposição filosófica, a ideia multifacetada da dignidade da pessoa
humana logrou, por absoluta necessidade de humanização de várias instituições culturais,
também ser traduzida no domínio ético como princípio de suma envergadura axiológica. Em
razão disso, passou a servir de premissa fundante de sistemas dedutíveis de normas práticas,
com desdobramentos prescritivos na seara religiosa, moral e, mais recentemente, jurídica. É,
aliás, justamente com base nessa ideia capital, que coloca “o homem em primeiro plano” 14,
que se assentam as principais construções doutrinais, declarações ético-políticas e
experiências normativas fomentadas a partir do segundo pós-guerra em matéria de direitos
humanos. Por sinal, na perspectiva da dignidade da pessoa humana, os direitos humanos são
concebidos, ontologicamente, como direitos básicos dignificantes e intrínsecos da pessoa
humana, ou melhor, como “direitos [que] emanam da dignidade inerente à pessoa humana” 15;
como “garantias” destinadas a assegurar a proteção, o respeito e a promoção das condições
elementares da dignidade da pessoa humana 16.
Mesmo ante a problemática do multiculturalismo, a asserção dogmática da dignidade
da pessoa humana como standard ético-político global, associada à propagação do discurso
universalista dos direitos humanos, concebidos enquanto “fundamento da liberdade, da justiça
e da paz no mundo”17, constitui, decerto, fenômeno dos mais marcantes da metade final do
século XX. Essa mudança de perspectiva, assimilada na agenda institucional de muitos
Estados e organizações internacionais de âmbito regional ou global 18 19
, vem impactando, de
maneira revolucionária, os alicerces paradigmáticos da cultura jurídica contemporânea,
desvencilhando-a de dogmas clássicos, principalmente nas democracias laicas ocidentais.
Trata-se, no fundo, de uma autêntica “mudança de prioridades e [de] ênfase” 20 operada na
“consciência da humanidade”21, profundamente impactada pelo ultraje decorrente dos
“sofrimentos indizíveis”22 que lhe foram infligidos tão barbaramente, em tão pouco espaço de
tempo, durante as duas Guerras Mundiais; que, em última análise, tiveram como causa
justamente “o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos” 23.
Em suma, a globalização econômica (com suas virtudes e desapontamentos) coexiste
dialeticamente com outro movimento pulsante de globalização de valores e de direitos que se
tem irradiado pelo mundo contemporâneo mesmo em face da diversidade cultural que
permeia as complexas sociedades humanas na atualidade: a globalização do ideário em torno
da dignidade da pessoa humana e dos direitos humanos 24. Essa globalização humanista vem,
por sua vez, sendo juridicamente traduzida no que se tem denominado de “internacionalização
dos direitos humanos”. Trata-se de fenômeno marcado, sobretudo, pela universalização dos
direitos humanos no plano institucional e prescritivo, disseminando-os e assegurando-os não
só no âmbito do direito internacional, mas também no domínio interno do direito doméstico
dos Estados Constitucionais.
Nesse novo arquétipo civilizatório in fieri, que endossa a “profissão de fé”
(Glaubenssatzes)25 na dignidade da pessoa humana (e, por consectário, nos direitos
humanos)26, averba-se a sua primazia material na escala de valores espirituais da
contemporaneidade; o que, no âmbito cultural específico do Direito, vem sendo mais
associado ao movimento filosófico cognominado de pós-positivismo jurídico. Afirma-se,
pois, dogmaticamente, a pessoa humana, por sua dignidade imanente, como realidade
axiológica e teleológica fundamental de per si, que, decodificada juridicamente sob a moldura
normativa aberta de princípio objetivo supremo da ordem constitucional 27, fundamenta, limita
e anima finalisticamente o Estado como um todo (incluindo o direito positivo de fonte
estatal28), colocado a seu serviço em seu domínio doméstico e em suas relações
internacionais. Adquirindo referida envergadura normativa, o princípio fundamental da
dignidade da pessoa humana passa a reverberar sobre todo o corpus juris posto sob a alçada
institucional do Estado, detendo “eficácia irradiante”; de forma que se projeta materialmente
por todas as esferas parciais do Direito, bem como baliza juridicamente a legislação, a
administração e a atividade jurisdicional29, fixando-lhes um “sentido humanamente digno” 30.
Sob esse prisma, numa determinada vertente, referido princípio constitucional
polifacético assume o papel de vetor ético-político final das diretrizes emancipatórias eleitas
como “objetivos fundamentais” a serem perseguidos programaticamente pelo Estado 31. Por
sinal, em certa medida, estes nada mais refletem do que consectários do dever jurídico-estatal
de respeito, proteção e promoção da dignidade da pessoa humana, no contexto dinâmico de
um processo de concretização e atualização viva, expansiva e proativa do princípio enquanto
potência32.
De outro lado, a ideia de dignidade da pessoa humana também figura como “norma-
base” ou “norma estruturante” de todo o ordenamento jurídico 33, na qualidade de
superprincípio 34. Afirma-se, nessa esteira, como premissa axial de legitimação substantiva e
parâmetro de interpretação finalística de todas as regras e princípios jurídicos, de direito
interno (constitucional e infraconstitucional) e internacional, que lhe conferem dimensão
positiva e prescritiva. Demais disso, serve como critério material de superação ponderativo-
axiológica de colisões antinômicas (critério pro homine ou pro dignitate), mormente em hard
cases. Concebida a “substância da Constituição”, na perspectiva da teoria material, como
ordem objetiva dos valores existenciais supremos de uma sociedade politicamente organizada,
a suma ideia de dignidade da pessoa humana assume, no constitucionalismo hodierno, a
natureza jurídica de uma injunção constitucional principial representativa de um sistema
medular de valores fundamentais afetados teleologicamente a assegurar condições dignas de
vida (e até de morte) para todo e qualquer ser humano. É nessa direção que Paulo Bonavides
assinala que “[...] nenhum princípio é mais valioso para compendiar a unidade material da
Constituição que o princípio da dignidade da pessoa humana” 35.
À luz desse paradigma dogmático, a ideia de dignidade da pessoa humana adquire
preeminência ética não só frente ao Estado e ao Direito, mas também em relação à própria
sociedade, uma vez que a dignidade é concebida como atributo “inerente a todos os membros
da família humana”36. Serve, portanto, de alicerce teleológico para toda e qualquer
comunidade de pessoas, na medida em que seus fins existenciais passam a ser definidos em
função dela. Em razão disso, ao se juridicizar sob a forma de princípio objetivo da ordem
jurídica de um Estado Constitucional (Verfassungsstaat), passa a irradiar efeitos prescritivos
tanto sobre as relações jurídicas entre os indivíduos e o Poder Público (eficácia vertical),
quanto no âmbito das relações privadas (eficácia horizontal), entre particulares (unter
Privaten); daí porque se reconhece que, para além da “eficácia vinculante”
(Bindungswirkung), o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana detém também
“eficácia em relação a terceiros” (Drittwirkung)37. Na bilateralidade atributiva do relacionar-
se juridicamente, os homens estão sujeitos a um “dever geral de respeito”, de forma que hão
de velar pela dignidade não só de si, visto que também se tornam reciprocamente responsáveis
pelo respeito ético à idêntica dignidade do outro, que deve, dessarte, ser sempre tratado como
fim em si mesmo e não como meio para a consecução de fins alheios, na esteira do imperativo
categórico kantiano. Essa é, por sinal, uma “porta de entrada” (Einbruchstelle) para os direitos
humanos no domínio do Direito Privado, restringindo, assim, a esfera da autonomia da
vontade em função da dignidade da pessoa humana38.
Nesse particular, Peter Häberle tece as seguintes ponderações:

Uma Constituição que se compromete com a dignidade humana lança, com isso, os
contornos da sua compreensão do Estado e do Direito e estabelece uma premissa
antropológico-cultural. Respeito e proteção da dignidade humana como dever
(jurídico) fundamental do Estado constitucional constitui a premissa para todas as
questões jurídico-dogmáticas particulares. Dignidade humana constitui a norma
fundamental do Estado, porém é mais do que isso: ela fundamenta também a
sociedade constituída e eventualmente a ser constituída. Ela gera uma força protetiva
pluridimensional, de acordo com a situação de perigo que ameaça os bens jurídicos
de estatura constitucional. 39

Assumindo um compromisso imperativo e expresso perante si própria de mover-nos


na direção dessa ordem de coisas em matéria de direitos humanos, a Constituição de 1988
consagrou, em locus privilegiado, logo em seu primeiro artigo 40, a dignidade da pessoa
humana, em sua dimensão objetiva, como “fundamento textual” 41 da novel unidade político-
institucional constitutiva da República Federativa do Brasil. Ao assim inaugurar sua carta de
prescrições supremas, a Constituição reconheceu na dignidade da pessoa humana uma
“função fundante” (Grundlagenfunktion)42 e um caráter implicitamente pré-positivo ou
pressuposto43 44
, proclamando, dessarte, tal como assinala Ingo Sarlet, “que é o Estado
[brasileiro] que existe em função da pessoa humana, e não o contrário, já que o homem
constitui a finalidade precípua, e não meio da atividade estatal” (acréscimo nosso) 45.
No contexto da “cultura da dignidade da pessoa humana” 46, o art. 4º, II, da CF/1988
consagrou, também de forma pioneira na história constitucional brasileira, o princípio da
prevalência dos direitos humanos no rol dos imperativos cardeais que regem a República
Federativa do Brasil em suas relações internacionais 47. Trata-se, de fato, de uma natural
derivação normativa da decisão política fundamental do Constituinte de 1987/1988 de
reconhecer a dignidade da pessoa humana como premissa maior do Estado e do direito
brasileiro.
A efetividade da cláusula emancipatória da dignidade da pessoa humana, e, na
lapidar locução de Konrad Hesse, da própria “vontade da Constituição” (Wille zur
Verfassung)48, orientada globalmente pela referida norma básica, positivada sob a fórmula
aberta de “princípio fundamental” 49, demanda, por sua vez, o engajamento material e ideal do
Estado e o empreendimento de uma série de atividades densificadoras. Dentre estas,
destacam-se medidas concretizadoras de cunho eminentemente jurídico, no plano interno e
internacional, na luta pela “realização” da dignidade da pessoa humana 50, em suas múltiplas
dimensões existenciais, para o que os direitos humanos estão a serviço, afirmando-se, nesse
tocante, como instrumentos por excelência. Em razão disso, num Estado cujo ordenamento
jurídico funda-se no princípio da dignidade da pessoa humana, deve-se assegurar máxima
efetividade e garantias reforçadas em prol dos direitos humanos (incluindo os direitos
fundamentais).51
Em harmonia com essa ordem de coisas, vários tratados internacionais de direitos
humanos que o Brasil ratificou ou aos quais aderiu evocam a dignidade da pessoa humana
como premissa dogmática de base. Exemplo disso, pode ser colhido na primeira consideração
preambular da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), de 1948, que dispõe
que “o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de
seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo”.
No quinto considerando da Declaração, consta, ademais, que “os povos das Nações Unidas
reafirmaram, na Carta da ONU, sua fé nos direitos humanos fundamentais” e “na dignidade e
no valor do ser humano”. De mais a mais, seu art. 1º prescreve que “Todos os seres humanos
nascem livres e iguais em dignidade e direitos”.
De forma inédita na história constitucional brasileira, a cláusula do art. 1º, III, da
CF/1988 conferiu, de fato, uma posição de especial preeminência axiológica à dignidade da
pessoa humana na escala de valores constitucionais; de sorte que serve de ponto de partida do
poder estatal52 e de referência ou parâmetro para a interpretação, aplicação e controle de toda
e qualquer predicação normativa do ordenamento jurídico pátrio, inclusive das próprias
disposições constitucionais. Sem embargo, a Constituição não a conceituou e não especificou
o alcance da deliberação fundamental do Poder Constituinte Originário de alocar a dignidade
da pessoa humana no ápice do ideário da nação e do sistema político e jurídico brasileiro 53.
Nesse contexto, revela-se a noção de dignidade da pessoa humana como “necesario
punto de partida”54 para a pré-compreensão das premissas antropológico-culturais que
informam o Estado brasileiro na ordem constitucional em vigor. 55
Imersa nesse universo temático, esta pesquisa destina-se justamente a promover uma
breve incursão no seio da história do pensamento ocidental com o fito de melhor compreender
os processos ideológicos cujos desdobramentos culminaram na concepção filosófica
contemporânea da dignidade da pessoa humana, com o fito de, assim, poder fixar certas notas
pré-compreensivas acerca das premissas antropológico-culturais que informam o Estado
brasileiro na ordem constitucional em vigor. Colima-se, nesse mister, colher algumas
referências cognitivas, que explicitem o sentido da crença dogmática no reconhecimento de
um valor intrínseco à pessoa humana.
É mister ressaltar que, por razões didáticas, a abordagem a ser empreendida neste
tópico seguirá uma cronologia sequenciada em torno do processo dinâmico e ascendente de
amadurecimento da noção de dignidade da pessoa humana. Nada obstante, a evolução
histórico-conceitual dessa ideia no mundo ocidental não retrata um fenômeno perfeito e
acabado e não se operou de forma linear e contínua. O processo de aperfeiçoamento da
concepção de dignidade da pessoa humana tem sido, em verdade, entrecortado por lapsos de
retrocessos, sendo, ademais, profundamente marcado, até os dias atuais, por lutas, conflitos,
descontinuidades e assimetrias, à semelhança do que se verifica com o processo de afirmação
histórica dos direitos humanos. 56
Vale nota, ainda, que, tal como adverte Ingo Sarlet, uma conceituação clara, global e
universalmente válida do que efetivamente seja a ideia abstrata, de contornos vagos e
imprecisos, de dignidade da pessoa humana, inclusive para efeito de eventual delimitação, no
domínio jurídico, do seu âmbito de proteção como norma positivada, constitui uma tarefa
extremamente difícil; sobretudo no contexto do pluralismo mundividencial 57 e da diversidade
de valores e concepções éticas que marcam as hipercomplexas sociedades democráticas
contemporâneas58. Ademais, a “ambiguidade e porosidade” 59 dessa noção, a natureza
polissêmica da referida expressão, o seu caráter de categoria axiológica aberta e o fato de se
tratar de um conceito em permanente processo de construção, desenvolvimento e repactuação,
sobretudo numa ambiência pluricultural, rendem ensejo a diferentes modos de compreensão
de seu conteúdo. Não se há de falar propriamente, em razão disso, numa definição genérica
consensualmente aceita, numa verdadeira, fixa e fechada noção de dignidade da pessoa
humana. Além de seu conteúdo submeter-se a diferentes pontos de vista, a dignidade da
pessoa humana evidencia perspectivas amplas, passíveis de serem apreendidas sob diferentes
ângulos ou enfoques.

A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE DIGNIDADE DA PESSOA


HUMANA
Conforme assinala Peces-Barba, na tradição oriental, Confúcio (551 a.C. - 479 a.C.),
além de Lao-Tsé e outros profetas, já fazia referência a uma ideia do ser humano “como
grande, como perfecto y que se distingue de la naturaleza y de los restantes animales”, um
“hombre soberano, es decir, que es autosuficiente, y que tiene en sí mismo el principio de sus
acciones”60. E conclui o Jurista, “Sorprende la modemidad de estos textos de Confucio que se
vinculan directamente con lo que será la tradicion occidental”61. Com efeito, referida noção
milenar precedeu, por séculos, a noção kantiana radicada na autonomia ética do homem, que
está na raiz da concepção moderna de dignidade da pessoa humana 62.
Na tradição ocidental, à semelhança do que se deu com a própria noção de pessoa
humana, o conceito-chave de dignidade pessoal de todo ser humano deita igualmente raízes
remotas nos dois pilares espirituais da civilização atlântica: o ideário judaico-cristão e a
cultura greco-romana clássica, mais especificamente o estoicismo 63. Sem embargo, sua atual
associação direta com a ideologia dos direitos humanos, conforme será doravante melhor
abordado, é relativamente recente.
Consoante assinala Starck, embora não se colha propriamente na Bíblia um autêntico
conceito de dignidade, dela já se pode inferir uma concepção universalista de ser humano. Tal
como explicitado no tópico precedente, referida concepção serviu como pressuposto espiritual
para a noção ocidental moderna de dignidade da pessoa humana 64, que foi secularizada
durante a modernidade, mormente na empresa iluminista levada a efeito pela filosofia prática
kantiana. A reflexão ocidental sobre a dignidade da pessoa humana é, de fato, herdeira direta
do horizonte espiritual legado, sobretudo, pela teologia judaico-cristã65.
Embora, na Antiguidade, a noção corrente de dignidade vigorante na grande maioria
das sociedades não fosse propriamente associada à personificação do homem, coube, de fato,
à tradição religiosa judaica a concepção, ainda que não textual, de uma ideia de dignidade
pessoal, atribuída a cada indivíduo. Notadamente, preconizado em passagens bíblicas do
Antigo e do Novo Testamento, o dogma teológico da imago Dei proclama que não só os
hebreus ou os cristãos, mas todo homem foi criado à imagem e semelhança de Deus para
controlar e governar os demais seres vivos e a terra. Referida crença dogmática denota, no
fundo, a ideia de que o ser humano, representação viva do Creator omnium, foi dotado, pela
providência celeste, de um eminente teor axiológico no conjunto da criação terrena (cf. Gn
1:26-27; 5:1; 9:6 e Sl 8:5-9). Gozando, pois, neste plano existencial, do máximo grau de
estima divina, não poderia, em razão disso, ser equiparado aos demais seres vivos ou
submetido a qualquer forma aviltante de instrumentalização, de coisificação, de
desumanização. Sob essa perspectiva, afirmou-se a excelência da criatura humana e o elevado
valor existencial investido nos homens pela graça heterônoma de Deus, deidade planetária que
os teria alocado numa posição de ascendência axiológica no mundo. Demais disso, preconiza-
se, de modo ecumênico, a noção universalista, para além da unidade do gênero humano, da
identidade dos homens em dignidade 66.
É importante destacar que, na fase inaugural da institucionalização do cristianismo
como religião oficial do cosmopolita Império Romano, a doutrina eclesiástica dos antigos
padres também evocou o dogma bíblico da imago Dei. Assinalou-se, outrossim, que, além de
os homens possuírem dignidade pelo fato de terem sido criados à imagem e semelhança do
Criador, Deus, ao se fazer homem em Jesus, endossara o valor sagrado da natureza humana.
Colheu o ser humano, então enfermo e deformado, “caído y marcado por el pecado original”,
para reabilitá-lo “por el sacrificio de Cristo em la cruz”67, em nome da salvação da
humanidade e da purgação de seus pecados, para que os homens se tornassem “participantes
da natureza divina” (2 Pe 1:4). Sob o prisma da teologia cristã, a transcendental “dignidade da
pessoa humana” – expressão que, aliás, foi cunhada pelo cristianismo para diferenciá-la da
“dignidade das pessoas divinas” 68 – radicaria, assim, na origem pela criação à imagem e
semelhança de Deus (imago Dei) e na obra redentora e reconciliadora do Deus-feito-
homem69; que teria resgatado e remido os seres humanos, enquanto filhos do Pai Celeste, pela
expiação e pelo sangue derramado de Cristo, selando seus destinos mediante eterna aliança.
Na concepção tradicional do cristianismo, a dignidade do homem funda-se e realiza-
se, em última instância, em Deus, de forma que o ser humano não veicula um valor em si por
si mesmo, mas, sim, por sua comunhão com a fonte divina de sua vida e destino; da qual
haure a luz que dignifica a sua existência errante. Consoante Peces-Barba, “La luz del hombre
no será propia, sino sólo derivada de la luz de Dios”, de forma que “no es propiamente
dignidad humana porque no és autónoma, ni impulsa el desarrollo individual de la condición
humana, y no arranca del proprio individuo”70.
No pensamento filosófico e politico da Antiguidade Clássica, reconhecia-se a noção
de dignidade (dignitas71), mas, sobretudo, associada à posição ou ao conceito protagonizado
na esfera da vida pública, evidenciando-se, assim, pelo título eminente que se ostentasse; pelo
cargo ou alta função na qual se estivesse investido; pela honra e pelo grau de reconhecimento
pelos demais membros da comunidade 72. Essa postura axiológica retratava, segundo modelo
teórico desenvolvido por Benjamin Constant, Laboulaye, Fustel de Coulanges e Georg
Jellinek, a cosmovisão organicista greco-romana de que, em rigor, o homem não se afirmava
propriamente como personalidade individual, mas enquanto integrante da onipotente
comunidade cívica plasmada na polis helênica e na urbs latina; que absorvia, praticamente por
inteiro, a sua vida física e espiritual, o seu corpo e a sua alma, refletindo, portanto, as aptidões
e virtudes pessoais de sua existência73. O cerne da noção clássica de dignidade não residia,
dessarte, no valor individual do homem, em sua autonomia subjetiva; tratava-se de uma
espécie de dignidade publicizada ou socializada, cotada, sobretudo, em referência ao papel
social na consecução do bem comum e do progresso comunitário e à participação política do
cidadão na vivência e nos destinos coletivos da pátria. Nessa linha, havia diferenciações ou
modulações mensuráveis quanto a esse aspecto entre os homens, com pessoas mais dignas,
menos dignas e até sem dignidade alguma, num autêntico regime de escalonamento social
meritocrático. A dignidade não figurava como algo imanente e inalienável do ser humano,
como uma qualidade inerente à pessoa74; era, antes de tudo, uma aquisição ou graduação
social decorrente de causas exógenas, restrita a alguns homens livres e modulada de acordo
com a alocação na escala hierárquica do corpo social. Tratava-se, no fundo, de uma noção de
dignidade associada ao status, bem como ao mérito social, que poderia, portanto, ser alterada
ou mesmo perdida ao longo da vida.
Nada obstante, na filosofia estoica desenvolvida pelo jurisconsulto romano Marco
Túlio Cícero na obra “De Officcis” (“Dos Deveres”), a par da referida acepção relativa de
dignidade, foi concebida outra noção, definida como imanente, de igual modo, a todo ser
humano, fundada no fato de os homens serem “partícipes da razão”. Vista sob essa
perspectiva, a dignidade decorria da qualidade associada ao fato de o homem ser o único
animal rationale, o que lhe atribuiria posição de excelência axiológica frente às demais
criaturas na hierarquia natural do kosmos75. Tal como sustentado no pensamento universalista
de Cícero, os homens, de acordo com as leis naturais, haveriam de render respeito e
consideração aos seus pares, não podendo prejudicá-los, visto que todos seriam dotados, na
perspectiva dessa acepção específica, de igual dignidade cósmica.
Durante o período medievo, a associação da ideia de dignidade do ser humano com o
dogma da imago Dei foi também retomada por Santo Tomás de Aquino. Sem embargo, o
pensamento tomista não foi influenciado somente pela doutrina judaico-cristã, mas também
pela filosofia estoica e pela definição boeciana do homem enquanto “naturae rationalis
individua substantia” (“substância individual da natureza racional”). Nessa esteira, Santo
Tomás concebeu que a noção de dignidade encontraria sua justificação não só na crença
universalista, de fundo bíblico, de que o homem foi criado à imagem e semelhança de Deus,
dado inerente e inarredável de todos da espécie humana. Existiria também in actu, in
concreto, na condução, por cada um, da capacidade de autodeterminação defluente de sua
natureza racional, vinculando-se e diferenciando-se, assim, pela pureza moral da alma
singular de cada homem. A virtude que dignifica o homem, acometido, desde o “peccatum
originale”, pelas fraquezas e injunções terrenas de sua condição existencial pecadora e
pervertida, não se esgotaria, portanto, na reservada excelência de sua gênese criacionista;
residiria também na relação individual de cada ser humano com Deus a partir do uso da razão
na obediência estrita aos deveres da lei divina, revelada e inscrita no coração de cada um dos
homens. A inflexão tomista de uma dupla dimensão da dignidade direciona-se no sentido de
que, na afirmação de seu valor, o homem não mais deve olhar apenas em direção a Deus, mas
deve se voltar para si mesmo, tomando consciência de sua dignidade e agindo de modo
conforme. Vale-se, para tanto, do exercício da razão no cumprimento das leis naturais,
emanadas diretamente da autoridade divina 76.
Na aurora do antropocentrismo renascentista, o homem pré-moderno passara a
reivindicar seu quinhão de luz própria no mundo. Isso se converteu em expressões culturais
que almejaram equilibrar, de modo sincrético, fé e razão, o que deslocou o centro
gravitacional das especulações filosóficas de Deus para o homem, sem, no entanto, expurgar
completamente o elemento religioso ou teológico das construções intelectuais.
No que concerne à temática da dignidade do homem, destacou-se, nesse contexto, a
antropologia filosófica desenvolvida, de modo pioneiro (embora não completamente novo),
pelo italiano Giovanni Pico Della Mirandola (1463-1494) no opúsculo “Oratio de Hominis
Dignitate” (“Discurso sobre a Dignidade do Homem”), do século XV (1486). Referido texto
é, por sinal, considerado o ensaio fundador do renascimento humanista, o “primeiro horizonte
da Modernidade”, em razão de seu profundo compromisso com a valoração e promoção
filosófica do homem, perfilhando um caminho aberto por pensadores como Petrarca, Bruni e
Manetti77. Deveras, ao justificar a nobreza ímpar do ser humano, a hominis dignitate, Pico
conferiu, numa autêntica transferência de enfoque, especial tônica às potencialidades da razão
e à capacidade de autodeterminação e autotransformação que ela envolve; à virtude do
homem de ser artífice ou escultor de seu próprio ser inacabado, de seu próprio devir em
aberto, de seu projeto existencial cambiante; e de ser protagonista de sua práxis histórica e
recriador de si e do mundo, pelo exercício soberano do livre-arbítrio de cada um78. Sustentara,
pois, que a autonomia (“auto” [por si mesmo, próprio] + “nomos” [lei, regra, norma] = “dar-
se a sua própria lei”) figurava como propriedade excelsa que conferira ao homem uma imensa
liberdade pessoal, ao lhe assegurar o poder de forjar-se a si mesmo e o poder de ação
recriadora da realidade. Nessa esteira, Mirandola reconhecera que o valor eminente do
homem, ser livre e perfectível, radica, sobretudo, em sua força emancipatória e
transformadora de si e do mundo, pela inquirição de sua mente e pela luz do seu próprio
intelecto79. Não por acaso as teses de Pico foram consideradas heréticas por Inocêncio VIII,
embora tivesse sido absolvido pelo sucessor, Papa Alexandre IV.
De todo modo, Pico Della Mirandola não renunciou a inspiração do pensamento
cristão, da qual continuou tributário, e não rompeu, de modo decisivo, com o espírito anterior
da cultura medieval – cisão que só se deu, em verdade, com o materialismo ou laicismo
iluminista. Predicara, em verdade, que referida capacidade humana extraordinária constituiria,
em última instância, um dom, uma dádiva, um portentoso milagre infundido no ser humano
pela mercê ou graça transcendente das mãos celestiais, por suprema liberalidade e amor de
Deus; que, mediante um gesto de dignificação humana, posicionara o homem no epicentro da
criação, embora sem prefixar ou predeterminar direção definida para o seu destino. 80
Assimilada pelo discurso jusnaturalista de base teológica, a ideia de dignidade da
pessoa humana foi evocada como princípio jurídico, no contexto da expansão colonial ibérica,
pela teoria espanhola do direito natural desenvolvida por Francisco de Vitoria (1492/93-1546)
no século XVI, no domínio do Direito das Gentes. A dignidade foi, por sinal, aplicada à
problemática relativa aos saques, à exploração, à escravização e ao aniquilamento dos índios
americanos81. Com efeito, os espanhóis justificavam referidas práticas nefastas baseando-se
no argumento de que os índios, por serem pagãos, não seriam sujeitos de direito e não
induziriam qualquer vinculação jurídica em suas relações internacionais. Contrapondo-se,
Francisco sustentou que os indígenas, por sua natureza humana, ainda que não fossem
espanhóis ou cristãos, deveriam ser incondicionalmente respeitados em sua dignidade
imanente, razão pela qual não deveriam ser submetidos a qualquer tratamento ultrajante 82.
Durante o trânsito da Renascença para a Ilustração, nos séculos XVII e XVIII,
verificou-se um profundo processo de desmistificação da compreensão dos fenômenos
humanos e de substituição das fontes heterônomas tradicionais, típico do espírito laico da
modernidade. Nesse período histórico, operou-se, ademais, uma perda significativa do
protagonismo político-institucional da Igreja Católica. Foi nesse contexto que a concepção da
dignidade da pessoa humana foi racionalizada e laicizada, numa autêntica virada ou giro
antropológico no sentido de se afirmar o valor do homem em si e por si mesmo, à revelia de
evocações transcendentais de natureza cosmológica ou confessional. A ideia de dignidade do
homem foi, ademais, definitivamente incorporada, na qualidade de princípio da vida pública,
ao discurso político e jurídico no plano das relações intraestatais, figurando como “concepto
de referencia para la contrucción de la ética pública de las sociedades democráticas, sin
mitos”83. Deveras, “el movimiento ilustrado, el iluminismo pretende que el ser humano pueda
brillar com luz propia”84; de forma que tratou de “endeusar” as virtudes da razão humana e a
ideia de imanência do valor dos indivíduos frente à de transcendência, rejeitando qualquer
recurso de base religiosa na fundamentação da noção de dignidade da pessoa humana.
Mesmo com a secularização do conceito pela cultura ilustrada e a consagração da
autonomia axiológica do ser humano, preservou-se, contudo, a crença dogmática, entronizada
pelo pensamento estoico e judaico-cristão, no reconhecimento universal do homem pelo
homem como absolutamente igual em dignidade. O valor humano, plasmado na ideia de
dignidade pessoal, revestiria, assim, a feição de uma espécie de “constante antropológica”
(anthropologische Konstante)85, existente simetricamente em todos os homens, em idêntica
ordem de grandeza86. A consagração da concepção contemporânea de dignidade da pessoa
humana é, talvez, a maior herança ética legada pela modernidade 87.
Conquanto, nesse processo evolutivo, Hugo Grócio e Thomas Hobbes tenham feito,
em suas respectivas obras, alguma referência pontual à matéria da dignidade 88, Samuel
Pufendorf (1632-1694) foi o pioneiro no desenvolvimento de uma fórmula mais ampla e
puramente secular e racional da noção de dignidade da pessoa humana; marcando, assim, uma
clara ruptura com a tradição teológica de raízes medievais. Em seu modelo especulativo, a
ideia de dignidade não se reveste de caráter heterônomo, não se fundando numa causa externa
ao homem, tal como na concessão divina, típica da noção cristã, ou na condição, prestigio ou
reconhecimento meritório na esfera social, como concebida na cultura clássica. Residiria
propriamente na liberdade moral imanente ao próprio ser humano, vale dizer, na capacidade
inerente de autodeterminar-se, de optar de acordo com sua razão e agir autonomamente
conforme o seu entendimento e sua vontade89. O antropocentrismo subversivo da
modernidade, em que o homem passou, doravante, a figurar como centro do sistema
epistemológico, rompeu com a tradição intelectual que, desde a Antiguidade, pregava o
dogma de que a dignidade seria derivada de fontes exógenas. Chancelou-se, em seu lugar, a
crença de que o valor humano reside, por completo, em si por si mesmo, tratando-se, portanto,
de um substrato axiológico próprio, e não derivado.
Foi, contudo, na filosofia iluminista de Immanuel Kant (1724-1804), inspirada na
antropologia de Rousseau (1712-1778)90, que o processo de secularização da noção de
dignidade consolidou-se de vez por todas, abandonando definitivamente, no âmbito filosófico,
quaisquer vestes sacrais. Kant é, de fato, o ponto arquimediano da moderna concepção
laicizada da dignidade da pessoa humana, fundada na doutrina da autofinalidade
(Selbstzweck).
Conforme Kant, os seres humanos, concebidos como “pessoas” (Personen)91, foram
diferenciados dos demais seres vivos (além dos entes inanimados), estes qualificados como
“coisas” (Sachen), pelo seu gradiente de racionalidade (Vernünftigkeit)92, que lhes asseguraria
a aptidão existencial para serem virtualmente livres (frei). Com efeito, para Kant, em sua
“filosofia da liberdade”93, o homem, como “ser racional” (vernünftiges Wesen), detém
autoconsciência (Selbstbewusstsein) e livre-arbítrio (freien Willen)94, em virtude do que é
titular ou proprietário de sua autônoma vontade (Wille). Seria, pois, livre enquanto ser capaz
de subtrair-se de determinações biológicas95; de ter uma vida independente da animalidade
(unabhängiges Leben von der Tierheit); e de intervir e autodeterminar-se no mundo em que
vive, podendo, assim, perseguir fins (Zwecke), os quais pode racionalmente selecionar. Nessa
linha de raciocínio, a razão prática fundaria a autonomia ou liberdade do homem,
consubstanciada na capacidade de autodomínio (Selbstbeherrschung); de determinar a sua
causalidade (seine Kausalität zu bestimmen); da faculdade prática de conduzir e manipular
sua própria existência; de responder pela “gestação de si” 96, pela autoefetivação,
autoconquista ou aperfeiçoamento de sua subjetividade 97, independente de causas externas
que a determinem. Inexistindo qualquer ente existencial que lhe seja equivalente, o ser
humano distingue-se e possui especial valor (Wert) frente a tudo o que existe. A liberdade,
conceito-chave ou pedra angular da filosofia prática kantista e de seu conceito de dignidade,
servindo de “horizonte unificador de toda a vida humana” 98, relaciona-se, desse modo, à
dimensão racional do homem e à autonomia (ou propriedade) da vontade (Autonomie des
Willens)99.
Em verdade, recorrendo, na “doutrina do duplo reino”100, a um dualismo radical entre
Natureza (Natur) e liberdade (Freiheit)101, entre animalidade (Tierheit) e humanidade
(Menschheit)102, Kant sustenta que tudo o que está inteiramente subjugado à Natureza é
determinado ou condicionado por sua mecânica causalidade (mechanische Kausalität). Seria,
portanto, a racionalidade justamente o elemento libertador do homem das amarras instintivas
desse mundo limitador e aprisionador, separando-o do estritamente sensível (mundo
sensibilis), do determinismo natural, das austeras injunções das leis da Natureza
(Naturgesetzen)103. Tudo o que há na Natureza resigna-se, na visão kantista, às suas infalíveis
e imutáveis leis causais (Kausalgesetzen), que prescrevem o que é (sein), exceto o homem.
Desembaraçado, pois, em expressiva escala, de condicionantes naturais ou predeterminações
comportamentais instintivas, o homem, ser dotado de expressivo nível de racionalidade 104 105,
dispõe, ainda que dentro de certos limites, da aptidão em potência de orientar sua própria
aventura existencial; de fornecer-lhe foco e senso de direção; e de radicar-se como senhor e
utopia de seu próprio destino, pano de fundo de seus dramas pessoais e coletivos. Para tanto,
possui uma extraordinária capacidade de conferir, mediante sopesamento, valências
axiológicas diferenciadas aos infinitos fragmentos da realidade circunjacente, bem como de
atribuir finalidades e direcionamentos éticos às suas condutas, mediante juízos de valoração
sujeitos ao “tribunal da razão” (Gerichtshof der Vernunft).
De fato, para Kant, sendo livre, o ser humano é capaz de desenvolver uma práxis
racional orientada pelo princípio da determinação da vontade (Bestimmungsgrund des
Willens), fundado na razão prática (praktischen Vernunft). Conduz-se, assim, conforme a
representação de normas éticas106, denominadas de leis da liberdade (Gesetze der Freiheit),
que ele próprio formula mediante processos racionais (teoria da autolegislação da razão
prática) e que veiculam imperativos, hipotéticos ou categóricos, estruturados mediante juízos
de “dever ser” (sollen)107. As coisas atuam mecanicamente; a pessoa possui, ao contrário, a
capacidade de agir livremente, pela vontade, segundo a representação de normas
deontológicas, qualificando-se, portanto, como um “ser de liberdade” 108 e um “ser ético”109.
As condutas do homem, enquanto propriamente humanas, não radicam na Natureza, mas na
liberdade110, que é condição universal da possibilidade de comportamentos dotados de sentido
ético111. A liberdade, e, com isso, a eticidade, são justamente as fontes da grandeza existencial
do homem112. Na concepção kantista, a dignidade humana radica, pois, no poder da razão
prática e, sobretudo, na autonomia ética inerente aos homens113.
No modelo kantiano, o princípio norteador da autodeterminação da vontade humana
é o fim (Zweck), relacionado ao valor (Wert) que se atribui ao que existe; de forma que o
mundo dos seres racionais, a que denomina de mundus intelligibilis, é, antes de tudo, o “reino
dos fins” (Reich der Zwecke), expressão utilizada em oposição ao “reino da natureza” (Reich
der Natur)114. No reino dos fins, há duas categorias de valor: um valor relativo (relativen
Wert), que é externo ao ser valorado e cotado, a partir de interesses particulares volúveis e
contingentes, por um preço (Preis), comercial (Marktpreis) ou afetivo (Affektionspreis); ou
uma dignidade (Würde), um valor interno (innern Wert), absoluto (absoluten Wert),
incondicional (unbedingten Wert) e incomparável (unvergleichbaren Wert), não mensurável
de forma econômica ou passional, bem como associado a inflexões gerais e perenes da
moralidade inerente à natureza racional do homem. Quando, pela “disposição do espírito”
(Denkungsart), algo tem preço, pode ser substituído por outro equivalente (Äquivalent); por
outro lado, o que se acha “acima de todo preço” (über allen Preis), e, por isso, não admite
qualquer equivalência, é dotado de dignidade, para o que só a palavra respeito (Achtung),
regra ética maior, confere a expressão conveniente da estima que se lhe deve tributar 115.
Segundo Kant, todo ser racional (vernünftige Wesen) não se reflete, em rigor, como
uma coisa (Sache) ou objeto (Objekt). Consoante o próprio homem se autorrepresenta, a
humanidade (Menschheit) em sua pessoa (Person), plasmada em sua natureza racional
(vernünftige Natur) e autonomia (Autonomie), é algo cuja existência em si mesma detém um
valor interno, absoluto, incondicional, incomparável e não-precificável116. À luz de
ponderações com base no critério meio-fim, o ser humano afirma-se racionalmente não como
um meio (Mittel) para o uso arbitrário de qualquer vontade, mas, sim, antepõe-se a si mesmo
como um fim. Com efeito, reconhece a si mesmo como “sujeito dos fins” (Subjekt der
Zwecke), como um “fim em si mesmo” (Zweck an sich selbst), estimando-se, por amor
próprio (Selbstliebe), infinitamente acima de qualquer preço (über allen Preis unendlich)117.
Essa autorrepresentação racional, na qual o quantum de seu valor pessoal não é passível de ser
apreçado ou estimado, é, em princípio, replicada analogamente por todos os seres racionais.
Com consectário, estes, em todos os seus comportamentos, nos direcionados a si mesmos
isoladamente, assim como nos que o são aos outros (ad alterum), devem se reconhecer, por
imperativo categórico, necessária e reciprocamente, como fins em si mesmos, e não como
simples meios para a consecução de fins alheios. Referido preceito expressar-se-ia no seguinte
mandamento prático: “age de tal maneira que possas usar a humanidade, tanto em tua pessoa
como na pessoa de qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca
simplesmente como meio” 118. Isso significa que todas as normas práticas decorrentes da
vontade legisladora universal dos homens, estruturadas sob a forma de imperativos
categóricos, têm como finalidade última o próprio homem, a ser respeitado pelo valor de sua
autonomia pessoal. Esse princípio da humanidade (Prinzip der Menschheit), que predica um
“dever meritório” (verdienstlichen Pflicht) e contingente (zufälligen Pflicht) de respeito
(Achtung) com relação a si mesmo (gegen sich selbst) e aos outros (gegen andere) e figura
como “condição suprema restritiva da liberdade das ações de cada homem” (oberste
einschränkende Bedingung der Freiheit der Handlungen eines jeden Menschen), não é,
segundo Kant, extraído da experiência (Erfahrung); figura, de modo apodítico, como um
imperativo universal inteiramente a priori, derivado da razão pura (reiner Vernunft)119 120.
Vale destaque que, em sua concepção de dignidade do homem, Kant preceitua que o
dever meritório (relativo ao valor) e contingente (que compete a cada um) em face de si
mesmo e das demais pessoas não se restringe a uma postura negativa e passiva de simples
respeito, não bastando que não se macule a humanidade em nossa pessoa e na dos outros.
Envolve também uma injunção ética no sentido do esforço positivo e ativo de todos, na
medida das forças de cada um, para fomentar ou contribuir para a afirmação e maior
aperfeiçoamento da dignidade de si e do outro enquanto fim em si mesmo, de forma que a
ideia de dignidade possa, assim, exercer toda a sua eficácia. 121
Por oportuno, cabe esclarecer que, tal como assinalado por Ingo Sarlet, essa ideia de
liberdade ou autonomia ética, evocada como principal fundamento dogmático da noção de
dignidade da pessoa humana é, no evangelho kantiano, considerada em abstrato, como sendo
a capacidade potencial que cada ser humano virtualmente tem de autodeterminar sua conduta.
Não depende, portanto, da efetiva verificação no caso da pessoa em concreto, de tal sorte que,
sob essa perspectiva, também o absolutamente incapaz de se autodeterminar (por exemplo, o
nascituro e a pessoa com grave alienação mental) possui exatamente o mesmo coeficiente de
dignidade que qualquer outro ser humano física e mentalmente capaz 122. Não é tanto a pessoa
concreta na sua dimensão empírica que está no cerne do seu pensamento, mas a ideia da
humanidade encarnada em cada pessoa. Em outros termos, para a fundamentação do valor do
homem na capacidade de autodeterminação, Kant, o grande filósofo da dignidade, levou em
conta as qualidades virtualmente inerentes ao ser humano, com foco, portanto, na grandeza
em potencial da humanidade. A dignidade corresponde, na perspectiva kantiana, a um
gradiente axiológico aprioristicamente acoplado, em potência e ex hypothesi, ao homem ou,
na terminologia de Dworkin, um “valor potencial intrínseco” (intrinsic potential value)123.
Em suma, a iluminada equação kantiana, que serve de principal arquétipo filosófico
da concepção atual de dignidade do homem, parte de uma nobre disposição de espírito que
atribui, de forma igualitária, a todo ser humano um status axiológico supremo, reconhecendo-
lhe valor indisponível e infungível entranhado nas artérias de sua existência pessoal enquanto
sujeito moral. Funda-se, por sua vez, na natureza racional e, sobretudo, na liberdade intrínseca
à condição humana, concebida esta em termos de autonomia ética inerente, em potência, a
todos os homens. Nessa esteira, a ideia kantiana de justiça está diretamente associada à
promoção dos valores da igualdade e, sobretudo, da liberdade individual 124. Em seu conteúdo
prescritivo, veicula exigência ética que reclama respeito ou consideração incondicional, por si
mesmo e, reciprocamente, pelos outros, de forma que limita eticamente o arbítrio voluntarista
de cada um no desempenho de sua capacidade de autodeterminação e também concita a todos
no sentido de fomentar ou contribuir, na medida das forças de cada um, para a afirmação e
emancipação prospectiva do homem em dignidade. Preceitua, ademais, que, em suas
infindáveis condutas e relações interpessoais concretas, os homens devem, necessária e
mutuamente, ser considerados, sempre, como fins em si mesmos, e não como simples meios
para a consecução utilitária ou hedonista de fins próprios ou alheios, repudiando, assim, toda
espécie de instrumentalização ou coisificação (reificação) que inflija qualquer ultraje,
aviltamento ou amesquinhamento aos seres humanos.125 126

A CONCEPÇÃO JURÍDICA MODERNA DE DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Trilhando referida jornada evolutiva, e fortemente inspirada nos postulados


filosóficos kantianos, com as redefinições de conteúdo empreendidas pelas diversas
formulações ideológicas que tomaram curso desde então (liberalismo clássico, socialismo,
marxismo, anarquismo, liberalismo moderno etc), o fato é que, num revés crítico e radical da
história recente, a ideia universalista de dignidade, como expressão representativa do valor
onipresente e autônomo da pessoa humana 127, findou por consolidar-se como standard axial
do imaginário ético-político do mundo ocidental na atualidade 128. Isso se deu, sobretudo,
depois das trágicas experiências totalitárias nazifascistas (de direita) e stalinista (de esquerda),
marcadas pela absoluta superfluidade e negação do homem, e das barbaridades indescritíveis
perpetradas por seres humanos contra seus pares durante a Segunda Guerra Mundial. Sua
força ideológica tem, de fato, servido como uma espécie de “ponte dogmática” (dogmatische
Brücke)129, unindo pessoas de diversas tradições culturais e dos mais remotos e matizados
confins da sociedade humana em torno da compreensão comum de que partilhamos, todos,
uma mesma humanidade130, representada em cada homem131.
Em sua concepção referencial moderna, a ideia de dignidade pessoal do homem, de
matiz antropocêntrico, igualitário, universal e inclusivo, envolve, em seu núcleo essencial, a
exigência ética de reconhecimento como pessoa, e não como coisa, de todo e qualquer ser
humano, em razão de sua simples condição humana. É, nessa ótica, absolutamente
inadmissível que seres humanos não sejam tratados como pessoas. Encerrando, por sua vez, a
afirmação indiscriminada da qualidade intrínseca de sujeito anímico, de membro da
humanidade, em favor de todos os seres humanos, repele categoricamente que qualquer
homem seja desnaturado ou rebaixado a algo análogo a meros instrumentos ou objetos
inanimados colocados à disposição arbitrária de outrem. No plano da alteridade, enuclea,
ademais, uma obrigação geral intersubjetiva de reconhecimento recíproco da subjetividade
individual de cada ser humano pelos demais, o que há de vincular toda a sociedade e o próprio
Estado132. No cerne absoluto da ideologia do personalismo ético, no qual todo homem, como
elo do círculo de vida da humanidade, é pessoa, individual e concreta, e, eticamente, um valor
em si mesmo, predica-se, dessa maneira, que cada indivíduo, por sua co-humanidade
(Mitmenschlichkeit)133, há de se ver e ver o próximo, face a face, como igual em pessoa, na
expressão moral de sua imanente dignidade 134.
Por seu turno, como a personalidade figura, na dogmática atual, como prius lógico da
titularidade genérica de direitos, dessume da ideia de dignidade que o homem faz jus, sempre,
ao “direito de ser sujeito de direito”, ou, conforme expressão de Hannah Arendt, ao “direito
de ter direitos” (“right to have rights”)135; o que designa de “cidadania” (citizenship). Gozam,
assim, todos os homens, por sua idêntica e ubíqua humanidade, de igualdade prima facie em
dignidade e em direitos, tal como enunciado na primeira parte do artigo inaugural da
Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), de 1948. Não é concebível, sob esse
paradigma de compreensão, a existência de seres humanos aprioristicamente destituídos ou
privados de um minimum de direitos dignificantes (Rechtlos)136, mormente no que diz respeito
à titularidade orgânica de certos direitos elementares inerentes à condição humana 137. O
atributo da humanidade, partilhado por todos os homens, passa a figurar, pela magnitude de
sua dignidade, como único e exclusivo requisito para se qualificar como sujeito ou titular de
determinados direitos mínimos, universais e inalienáveis 138, notadamente no que diz respeito
aos direitos humanos, que compõem o estatuto básico da pessoa humana, ainda que fora ou
independente da alçada institucional do Estado, coibindo, desse modo, as práticas nefastas da
desumanização e da despersonalização do homem139. A esse respeito, Ronald Dworkin
predica que, a seu ver, o “direito humano fundamental é o direito de ser tratado com certa
atitude: uma atitude que expressa a compreensão de que cada pessoa é um ser humano cuja
dignidade importa” (tradução livre)140.
Além de proclamar a inafastável subjetividade inerente aos homens, reconhecendo-
lhes uma espécie de direito geral de personalidade, a noção multifacetada de dignidade é
codefinida, numa outra aresta, pela crença dogmática de que radica na dimensão pessoal de
cada ser humano, em si e por si, pelo só atributo de sua inarredável humanidade, um valor
imanente, constante, infungível, indissociável, inalienável, irrenunciável e irredutível,
independente de qualquer merecimento pessoal ou social141 (princípio do valor intrínseco).
Trata-se, pois, de compreensão que não se compatibiliza, em absoluto, com quaisquer
gradações de dignidade entre os seres humanos, de sorte que o conteúdo em dignidade
reconhecido aprioristicamente em cada homem, sob esse prisma, não varia em função de
méritos ou deméritos pessoais. De mais a mais, consoante o consenso contemporâneo, esse
substrato essencial em dignidade, denominador comum e mínimo indisponível dos homens,
impregna-lhes toda a existência corporal, espiritual, individual e social e os qualifica enquanto
co-humanos (Mitmenschen) como seres moralmente valiosos (embora nem todos se portem de
modo igualmente digno). Nessa esteira, a dignidade reserva-lhes um status especial de
primazia ou eminência axiológica suprema frente a tudo o que existe, consagrando-os,
sempre, como fins em si mesmos (teleologia interior), e não como meios para a consecução
utilitária, arbitrária e voluntarista de fins próprios ou alheios, sejam quais forem os motivos
finais porventura evocáveis para se justificar eventual alienação ou espoliação da condição
humana142.
Nessa perspectiva, o prestígio erga omnes defluente da dignidade, bem fora do
comércio do qual não se pode despojar, sufraga a noção fundamental de que, para além de
seus atos e atributos143, todo e qualquer ser humano é igual e universalmente tributário, em
sua dimensão material e espiritual, de profunda e incondicional consideração, respeito e
proteção, por si mesmo (autointerdição pelo autorrespeito) e por seus pares
(independentemente de suas condições físicas e mentais e, para alguns, antes mesmo do
nascimento). Veda, por conseguinte, qualquer tipo de tratamento desumano ou degradante,
veiculando, desse modo, limites éticos invioláveis ao arbítrio ultrajante e atentatório da
incolumidade da condição existencial do ser humano por quem quer que seja. Repele, assim,
peremptoriamente qualquer forma indigna, aviltante ou estigmatizante de instrumentalização,
coisificação (reificação), submissão (subjugação), marginalização ou mercantilização do
homem144 (o que configuraria verdadeira negação ou antítese da dignidade da pessoa), quer
seja de modo ostensivo ou velado. Cada pessoa é, sob essa ótica, um ser intrinsecamente
digno por sua inalienável humanidade, e não “uma acumulação de bens comercializáveis,
permutável [ou descartável – acréscimo nosso] a qualquer tempo” 145.
Dentro da compreensão histórico-cultural da atualidade, alimentada pelo
reconhecimento de várias dimensões (ou gerações) de direitos humanos, manifesta-se, por sua
vez, como projeção essencial da dignidade da pessoa humana a exigência, em favor de cada
ser humano, enquanto sujeito de necessidades 146 e sujeito de dignidade e direitos 147, de um
livre e plural espaço, concomitantemente público e particular 148, de afirmação co-responsável
de sua identidade única e inconfundível; de condução de seu próprio modus vivendi; e de
emancipação de sua personalidade segundo suas diferentes preferências, escolhas,
idiossincrasias e projetos individuais de vida boa. Para tanto, imperiosa se faz a remoção de
toda sorte de barreiras ou obstáculos ilegítimos, bem como a interdição de ingerências,
intromissões ou restrições heterônomas desarrazoadas, no sentido de se maximizar ou
otimizar as margens de sua liberdade pessoal.
Para além da reserva de uma esfera real (não virtual) de efetivo exercício da
autodeterminação subjetiva, circunscrita na medida do que se compatibiliza com a paritária
liberdade dos outros, a ideia de dignidade da pessoa humana reclama também faculdades de
acesso e de participação cidadã ativa nos processos institucionalizados de debate e
deliberação social acerca dos destinos políticos globais e setoriais da coletividade e dos
indivíduos. Demanda, ademais, a garantia, ainda que minimamente satisfatória, dos
pressupostos fáticos de liberdade, igualdade, democracia e bem-estar social, mediante a
solidária promoção das condições materiais fundamentais (saúde, alimentação, educação,
moradia, segurança, saneamento básico etc), bem como a provisão distributiva dos bens,
meios e recursos primários potencialmente necessários à consecução da existência humana em
padrões condignos que viabilizem e fomentem, em favor de todos: a superação de
adversidades e a mitigação dos efeitos das assimetrias socioeconômicas; o pleno gozo de suas
liberdades; a inserção na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas; o
desenvolvimento de suas habilidades e potencialidades como ser livre e autônomo; a sua
completa realização pessoal e o usufruto dos resultados de seus esforços, estratégias e
investimentos.
Essas várias injunções parcelares extraídas do reconhecimento dogmático da
excelência axiológica do homem manifestam-se, por sinal, num quantitativo aprioristicamente
indeterminável e incircunscritível de exigências éticas e políticas (numerus clausus), já que
associadas ao valor ilimitável ou inesgotável da personalidade humana. Revelam, além disso,
uma paralela e conexa dimensão defensiva, de respeito e proteção, e prestacional, de
promoção, na estrutura de significado do conceito dinâmico e relativo de dignidade 149, cujos
respectivos conteúdos concretos variam de acordo com cada sociedade e cada época, na
esteira de sua dimensão histórico-cultural150. A concretização dessas aspirações existenciais
positivas e/ou negativas, que convergem no sentido de assegurar o pleno e efetivo usufruto da
autonomia humana151, fonte kantiana da dignidade, dá-se, sobretudo, por meio da imposição
de limites e tarefas aos poderes públicos e à sociedade em geral, de todos e de cada um, num
concurso comprometido de esforços na direção da valorização dignificante do homem 152.
Em arremate, a ideia fecunda da dignidade da pessoa humana, na qualidade de valor-
fonte, aglutina um significativo feixe de refrações e obrigações éticas e políticas correlativas
que se referem às mais variadas dimensões existenciais nas quais se decompõe a humanidade
em cada indivíduo e são indispensáveis à subsistência biopsíquica do homem em condições
minimamente dignas, com reflexos não apenas no plano reservado da individualidade, mas
também no âmbito da intersubjetividade, na esfera das relações públicas e interprivadas 153.
Envolve, de fato, profundas exigências de consideração, respeito, proteção e promoção dos
seres humanos, por si mesmos e pelos outros, a partir da satisfação de suas necessidades
existenciais essenciais. Para tanto, colocam-se a serviço, principalmente, os direitos humanos,
que, concebidos, em sua grande generalidade, como concretizações primárias da dignidade da
pessoa humana, figuram como instrumentos por excelência de efetivação de suas derivações
ético-políticas mais fundamentais, conforme será, doravante, melhor explicitado. Por sinal,
para além da previsão genérica do “direito de ter direitos” (“right to have rights”), decorrente
da afirmação elementar do homem como pessoa, a ideia de dignidade da pessoa humana vai
além; abrange, numa perspectiva deontológica, um autêntico “direito de ter direitos humanos”
(“right to have human rights”)154, concebidos estes, materialmente, como direitos básicos
inerentes à pessoa humana pelo só fato de sua humanidade.
NOTAS CONCLUSIVAS

A globalização econômica coexiste dialeticamente com outro movimento pulsante de


globalização de valores (e de direitos) que se tem irradiado pelo mundo contemporâneo
mesmo em face da diversidade cultural que permeia as sociedades humanas na atualidade: a
globalização do ideário em torno da dignidade da pessoa humana.
Nesse contexto cultural, a Constituição de 1988 consagrou, logo em seu primeiro
artigo, a dignidade da pessoa humana, em sua dimensão objetiva, como fundamento da
República Federativa do Brasil. Sem embargo, a Carta Magna não a conceituou e não
especificou o alcance da deliberação fundamental do poder constituinte originário de alocá-la
no ápice do ideário da nação e do sistema político e jurídico brasileiro, em razão do que o
estudo da noção dignidade da pessoa humana revela-se como necessário ponto de partida para
a pré-compreensão das premissas antropológico-culturais que informam o Estado brasileiro na
ordem constitucional em vigor.
Na tradição ocidental, o conceito de dignidade pessoal de todo ser humano deita
raízes remotas nos dois pilares espirituais da civilização atlântica: o ideário judaico-cristão e a
cultura greco-romana clássica, mais especificamente o estoicismo. De fato, a concepção
judaico-cristã serviu como pressuposto espiritual para a noção ocidental moderna de
dignidade da pessoa humana, que foi secularizada durante a modernidade, mormente na
empresa iluminista levada a efeito pela filosofia prática kantiana. Sua atual associação direta
com a ideologia dos direitos humanos é, contudo, relativamente recente, passando a ser
realizada com mais vigor somente depois da Segunda Guerra Mundial.
Com a laicização da noção de dignidade, concebeu-se a crença dogmática de que o
valor humano reside, por completo, em si por si mesmo, tratando-se, portanto, de um
substrato axiológico próprio, e não derivado. Nada obstante, mesmo com a secularização e a
consagração da autonomia axiológica do ser humano, preservou-se a crença dogmática,
introduzida pelo pensamento judaico-cristão e estoico, no reconhecimento universal do
homem pelo homem como absolutamente igual em dignidade. Foi, por sua vez, na filosofia
iluminista de Kant, fundada no postulado da autofinalidade humana, que o processo de
secularização da noção de dignidade consolidou-se de vez por todas, abandonando
definitivamente, no âmbito filosófico, quaisquer vestes sacrais. Desde então, passou-se a
conceber que as pessoas devem sempre ser consideradas como fins em si mesmas, e não como
simples meios para a consecução utilitária ou hedonista de fins próprios ou alheios;
repudiando-se, assim, toda espécie de instrumentalização ou coisificação que inflija qualquer
ultraje, aviltamento ou amesquinhamento da condição humana.
Em sua conformação atual, a ideia de dignidade da pessoa humana envolve a
exigência de reconhecimento como pessoa, e não como coisa, de todo e qualquer ser humano,
em razão de sua simples condição humana. Dela dessume, ademais, que o homem faz jus,
sempre, ao “direito de ser sujeito de direito”, ou, conforme expressão de Hannah Arendt, ao
“direito de ter direitos” (“right to have rights”), o que designa de “cidadania” (citizenship).
Não é concebível, sob esse paradigma de compreensão, a existência de seres humanos
destituídos ou privados de um mínimo de direitos dignificantes, concebidos como inerentes à
condição humana. Demais disso, a concepção de dignidade é codefinida pela crença
dogmática de que radica em cada ser humano, em si e por si, pelo só atributo de sua
humanidade, um valor imanente, constante, infungível, indissociável, inalienável e
irrenunciável, independente de qualquer merecimento pessoal ou social (princípio do valor
intrínseco).
Noutra perspectiva, a dignidade desdobra-se numa série de exigências ético-políticas
de respeito, proteção e promoção da pessoa humana, por si mesma e pelos outros, a partir da
satisfação de suas necessidades existenciais essenciais. Para tanto, colocam-se a serviço,
principalmente, os direitos humanos, em suas múltiplas dimensões. Para além da previsão
genérica do “direito de ter direitos” (“right to have rights”), decorrente da afirmação
elementar do homem como pessoa, a ideia de dignidade da pessoa humana vai além; abrange
um autêntico “direito de ter direitos humanos” (“right to have human rights”), concebidos
estes, materialmente, como direitos básicos inerentes à pessoa humana pelo só fato de sua
humanidade.

1
Cf. GRAY, John Nicholas. False dawn: the delusions of global capitalism. The New Press: New York, 1998.
2
Julios-Campuzano assinala que “a mudança radical na dinâmica de atuação do sistema de produção e organização dos mercados em nível
planetário se constitui em um fator determinante da crise das instituições jurídicas do Estado-Nação, que se vê progressivamente
transbordando pelas estruturas, mecanismos e procedimentos jurídicos no âmbito da economia global.” (JULIOS-CAMPUZANO, Alfonso
de. Constitucionalismo em tempos de globalização. Tradução de José Luiz Bolzan de Morais e Valéria Ribas do Nascimento. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 88).
3
A respeito da temática da globalização, perfilhamos a orientação de Boaventura de Sousa Santos, para o qual: “A globalização é muito
difícil de definir. Muitas definições centram-se na economia, ou seja, na nova economia mundial que emergiu nas últimas duas décadas como
consequência da intensificação dramática da transnacionalização da produção de bens e serviços e dos mercados financeiros – um processo
através do qual as empresas multinacionais ascenderam a uma preeminência sem precedentes como actores internacionais. Para os meus
objectivos analíticos privilegio, no entanto, uma definição de globalização mais sensível às dimensões sociais, políticas e culturais. Aquilo
que habitualmente designamos por globalização são, de facto, conjuntos diferenciados de relações sociais; diferentes conjuntos de relações
sociais dão origem a diferentes fenômenos de globalização. Nestes termos, não existe estritamente uma entidade única chamada
globalização; existem, em vez disso, globalizações; em rigor, este termo só deveria ser usado no plural.” (SOUSA SANTOS, Boaventura.
Por uma concepção multicultural de direitos humanos. In: Contexto internacional. Rio de Janeiro, v. 23, n. 1, jan./jun. 2001, p. 10).
4
BARCELLOS, Ana Paula de. Ponderação, racionalidade e atividade jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 261.
5
MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Tratados internacionais de direitos humanos e direito interno. São Paulo: Saraiva, 2010, pp. 37-38.
6
SUPIOT, Alain. Homo juridicus: ensaio sobre a função antropológica do direito. Tradução de Maria Ermantina de Almeida Prado Galvão.
São Paulo: Martins Fontes, 2007, pp. 240-255; e SEN, Amartya. Desenvolvimento com liberdade. Tradução de Laura Teixeira Motta. São
Paulo: Companhia das Letras, 2010, pp. 297-317.
7
SUPIOT, op. cit., p. 241.
8
MAZZUOLI, op. cit., 2010, p. 37.
9
Um dos traços marcantes da pós-modernidade reside justamente na descrença na existência de valores universais absolutos e com pretensão
de totalidade conglobante de todas as visões de mundo e culturas. Nesse paradigma dogmático, relativista, concebe-se que a verdade é
construída intersubjetivamente, ou melhor, interculturalmente, e não objetivamente, daí a defesa categórica do pluralismo, da tolerância, da
abertura democrática e do diálogo tendente a harmonizar diferenças em torno de aspirações isomórficas, na medida do possível. A esse
respeito, cf. MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Fundamentos do direito. São Paulo: Atlas, 2010, pp. 63-70.
10
SOUSA SANTOS, op. cit., pp. 18-20.
11
MAURER, Béatrice. Notas sobre o respeito da dignidade da pessoa humana… ou pequena fuga incompleta em torno de um tema central.
Tradução de Rita Dostal Zanini. In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Dimensões da dignidade: ensaio de filosofia do direito e direito
constitucional. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009a, p. 119.
12
A diversidade cultural existente entre os vários grupos humanos não significa que as culturas singulares existam em estado de absoluta
“insularidade ubíqua”, de forma que as pessoas, mesmo vinculadas a diferentes sistemas de referência cultural, têm potencial para
“compartilhar muitos valores e concordar em alguns comprometimentos comuns” (SEN, op. cit., pp. 311 e 313).
13
Cabe esclarecer que o termo “evolução” utilizado ao longo deste trabalho não denota a ideia comum e otimista, associada ao progresso, de
uma mudança linear no sentido de algo necessariamente melhor e mais bem elaborado. Envolve apenas o conceito de passagem ou
deslocamento sucessivo, gradual e comumente lento de estados existenciais do homem, num processo vivo, dinâmico e dialético, com
avanços e retrocessos, fluxos e refluxos, no qual emergem novos e diferenciados elementos, circunstâncias, crenças e formas d e organização
sociocultural, em configurações geralmente mais complexas e heterogêneas, como resultado de inovações e/ou de modificações ou
(re)adaptações contínuas e progressivas de fatores anteriores.
14
MAZZUOLI, op. cit., 2010, p. 21.
15
Extraído do preâmbulo da Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes, de 1984,
aprovada pelo Decreto Legislativo nº 04, de 23.05.1989 (DOU de 24.05.1989), bem como promulgada pelo Decreto nº 40, de 15.02.199 1
(DOU de 18.02.1991).
16
HESSE, Konrad. Temas fundamentais do direito constitucional. Tradução de Carlos dos Santos Almeida [et al.]. São Paulo: Saraiva,
2009a, p. 39.
17
Preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), aprovada pela Resolução 217-A (III) das Nações Unidas, de
10.12.1948.
18
Para Amartya Sen, a ideia dos direitos humanos avançou tanto nos anos recentes que adquiriu “uma espécie de status oficial no discurso
internacional” (SEN, op. cit., p. 292).
19
LUCAS DA SILVA, Fernanda Duarte Lopes. Fundamentando os direitos humanos: um breve inventário. In: TORRES, Ricardo Lobo
(org.). Legitimação dos direitos humanos. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, pp. 169-170.
20
SEN, op. cit., p. 292.
21
Preâmbulo da DUDH.
22
Carta das Nações Unidas, assinada em São Francisco, em 26 de julho de 1945, após o término da Conferência das Nações Unidas sobre
Organização Internacional, entrando em vigor em 24 de outubro de 1945.
23
Preâmbulo da DUDH.
24
BONAVIDES, op. cit., p. 571.
25
HÄBERLE, Peter. A dignidade humana como fundamento da comunidade estatal. Tradução de Ingo Wolfgang Sarlet e Pedro Scherer de
Mello Aleixo. In: SARLET, op. cit., 2009a, pp. 101-102.
26
A fé na dignidade da pessoa humana e nos direitos humanos é textualmente afirmada nos preâmbulos da Carta das Nações Unidas e na
Declaração Universal dos Direitos Humanos, entre outros documentos internacionais.
27
HESSE, op. cit., 2009a, pp. 35-40.
28
“El Derecho es una creación del hombre. En este sentido el Derecho es una herramienta, un artefacto, un constructo. Debido a que toda
creación humana se define en función de su finalidad, es necesario preguntarnos por la finalidad del Derecho. Dicho de modo sencillo, y
básico para generar acuerdo, el Derecho tiene por fin último a la persona humana, dicho mejor, su fin es favorecer la convivencia humana
a través de la regulación de las relaciones humanas. La persona humana es una realidad ontológicamente relacional.” (CÓRDOVA, Luis
Castillo. Los derechos constitucionales: elementos para una teoria general. 3. ed. Lima: Palestra, 2007, p. 35).
29
HESSE, op. cit., 2009a, p. 38.
30
HESSE, op. cit., 2009b, p. 88.
31
Cf. art. 3º da Constituição de 1988.
32
HESSE, op. cit., 2009b, p. 83.
33
HESSE, op. cit., 2009b, pp. 81-82.
34
PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos, o princípio da dignidade humana e a constituição brasileira de 1988. Juris Plenum Ouro, Caxias do
Sul: Plenum, n. 27, set./out. 2012a. 1 DVD. ISSN 1983-0297. Segundo Rizzato, o princípio da dignidade humana “[...] é um verdadeiro
supraprincípio constitucional que ilumina todos os demais princípios e normas constitucionais e infraconstitucionais”(NUNES, Luiz Antônio
Rizzato. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. São Paulo: Saraiva, 2002. pp. 50-51).
35
BONAVIDES, Paulo. Teoria constitucional da democracia participativa. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 233.
36
Preâmbulo da DUDH, 1º considerando.
37
HESSE, op. cit., 2009b, p. 82.
38
Vários exemplos dessa natureza podem ser colhidos da Constituição de 1988, tal como se dá com o reconhecimento do direito à
indenização por dano moral ou material no caso de abuso do direito de livre manifestação do pensamento (art. 5º, IV e V), cer tamente não
oponível apenas quando o Estado for o causador do dano, assim como o direito à inviolabilidade do domicílio (art. 5º, X) e o sigilo da
correspondência e das comunicações (art. 5º, XII). Isso ocorre, aliás, especialmente com os direitos dos trabalhadores (arts. 7º e ss. da
Constituição de 1988), cujos destinatários precípuos são os empregadores, em regra, particulares.
39
HÄBERLE, op. cit., 2009a, p. 81.
40
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em
Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (…) III - a dignidade da pessoa humana;
41
HÄBERLE, op. cit., 2009b, pp. 45-46.
42
HÄBERLE, op. cit., 2009b, p. 51.
43
HÄBERLE, op. cit., 2009b, pp. 54 e 73.
44
Dante Aliguieri define o Direito em termos de “proporzione reale e personale dell´uomo verso l´uomo, la quale conservata conserva la
umana congregazione, e quando corrotta corrompe la societá” (ALIGHIERI, Dante. La monarchia. Livorno: Livorno, 1844, pp. XXIII,
XXXVI e 49). Numa tradução livre: “O direito é uma proporção real e pessoal de homem para homem, que, quando mantida, mantém a
sociedade, e quando se corrompe, corrompe-a”. Inspirando-se no referido conceito, Glauco Barreira assinala que “o fundamento material da
unidade da Constituição é a dignidade da pessoa humana („homem para homem‟)”, bem como leciona que “O direito foi criado para o
homem, que é um fim e não meio. O princípio da dignidade da pessoa humana, embora esteja consagrado na Constituição, é um valor
suprapositivo, pois é pressuposto do conceito de Direito e a fonte de todos os direitos, particularmente, dos direitos fundam entais.”
(MAGALHÃES FILHO, Glauco Barreira. Hermenêutica e unidade axiológica da constituição. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2011, pp.
177-178).
45
SARLET, op. cit., 2009a, p. 67.
46
HÄBERLE, op. cit., 2009b, p. 86.
47
Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: (…) II - prevalência dos
direitos humanos;
48
HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1991,
passim.
49
O Título I da Constituição de 1988, no qual se insere o art. 1º, III, tem, por sinal, a denominação “Dos Princípios Fundamentais”.
50
HÄBERLE, op. cit., 2009b, pp. 61, 90 e 91.
51
Nesse sentido, Castillo Córdova assinala: “La consideración de la persona humana como fin y no como medio tiene una consecuencia
directa y además necesaria en el ámbito jurídico: la promoción de la plena vigencia de sus derechos humanos o fundamentales. Colocar a la
persona humana como fin de toda realidad estatal y social, jurídicamente significa colocar a sus derechos humanos o fundament ales como
fin, lo cual significa que todo lo demás (el poder estatal, por ejemplo) es medio, es decir, que todo lo demás deberá estar dirigido a
conseguir la plena vigencia de los mencionados derechos. Esa es la razon por la que en el ámbito internacional y en el nacional se ha
comprometido al poder estatal con el favorecimiento de la plena vigencia de los derechos fundamentales.” (CÓRDOVA, op. cit., p. 53).
52
HÄBERLE, op. cit., 2009b, p. 57.
53
Béatrice Maurer chama atenção para o fato de que “paradoxalmente, ainda que proclamada em inúmeros textos jurídicos, a dignidade da
pessoa humana nunca é [neles] definida” (MAURER, op. cit., p. 121).
54
Cf. CÓRDOVA, Luis Castillo. Los derechos constitucionales: elementos para una teoria general. 3. ed. Lima: Palestra, 2007, p. 27.
55
Pertinentes a esse respeito são as lições de Glauco Barreira, segundo o qual: A pessoa humana é o valor básico da Constituiçã o, o Uno do
qual provém os direitos fundamentais, não por emanação metafísica, mas por desdobramento histórico, ou seja, pela conquista direta do
homem. Só podemos compreender os direitos fundamentais mediante o retorno à ideia de dignidade da pessoa humana, pela regressão à
origem. […] A dignidade da pessoa humana (Uno) serve de pré-compreensão para os direitos fundamentais (emanações) […]
(MAGALHÃES FILHO, op. cit., 2011, p. 179). No mesmo sentido, Ingo Sarlet assinala: […] o reconhecimento e proteção da dignidade da
pessoa pelo Direito resulta justamente de toda uma evolução do pensamento a respeito do que significa este ser humano e de que é a
compreensão do que é ser pessoa e de quais os valores que lhe são inerentes que acaba por influenciar ou mesmo determinar o m odo pelo
qual o Direito reconhece e protege esta dignidade. (SARLET, Ingo. As dimensões da dignidade da pessoa humana: construindo uma
compreensão jurídico-constitucional necessária e possível. In: SARLET, op. cit., 2009a, p. 16).
56
SAMPAIO, José Adércio Leite. Direitos fundamentais: retórica e historicidade. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 135.
57
Nas palavras de Hannah Arendt, “A pluralidade é a condição da ação humana pelo fato de sermos todos os mesmos, isto é, humano s, sem
que ninguém seja exatamente igual a qualquer pessoa que tenha existido, exista ou venha a existir.” (ARENDT, op. cit., 2007, p. 16).
58
Rejeitando qualquer fundamentalismo em torno de uma concepção específica de dignidade da pessoa humana, Jonatas Machado leciona
que “o conceito de dignidade humana apresenta-se desvinculado de qualquer concepção mundividencial fechada e heterônoma acerca do
sentido existencial e ético da vida, não podendo servir para a imposição constitucional de qualquer absolutismo valorativo.” (MACHADO,
Jônatas E. M. Liberdade de expressão: dimensões constitucionais da esfera pública no sistema social. Coimbra: Coimbra Editora, 2002, p.
358). No mesmo sentido, adverte Chaim Perelman que, “ante as divergências sobre a própria ideia de pessoa humana e sobre as obrigações
impostas pelo respeito à sua dignidade, é não somente utópico, mas mesmo perigoso, crer que existe uma verdade nessa questão, pois essa
tese autorizaria os detentores do poder a impor suas visões e a suprimir toda opinião contrária, que supostamente expressa um erro tolerável”
(PERELMAN, Chaim. Ética e direito. São Paulo: Martins Fontes, 1996, p. 403).
59
ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. O princípio da dignidade da pessoa humana e a exclusão social. In: Revista do Instituto Brasileiro de
Direitos Humanos, ano 02, vol. 02, nº 02, 2001, pp. 46-67.
60
MARTÍNEZ, op. cit., pp. 21-22.
61
Id. Ibidem.
62
FIGUEIREDO, op. cit., p. 47.
63
SARLET, op. cit., 2010b, p. 32.
64
STARCK, Christian. Das Bonner Grundgesetz. 4. ed. München: Franz Vahlen, 1999, v. I, pp. 34-35.
65
MAURER, op. cit., p. 123.
66
Conforme Sarlet chama a atenção, muitas das noções humanistas defluentes diretamente da concepção bíblica do homem foram
lastimavelmente renegadas, em vários episódios da história, pelas próprias instituições cristãs e seus integrantes, a exemplo do que se deu
com as inúmeras crueldades perpetradas pela Santa Inquisição durante o período medieval (SARLET, op. cit., 2010b, p. 32). A esse respeito,
Comparato assinala que a igualdade universal dos filhos de Deus só valia, efetivamente, no plano sobrenatural, pois o cristianismo continuou
admitindo, durante muitos séculos, a legitimidade da escravidão, a inferioridade natural da mulher em relação ao homem, bem como a dos
povos americanos, africanos e asiáticos colonizadores, em relação aos colonizadores europeus (COMPARATO, op. cit., p. 30).
67
MARTÍNEZ, op. cit., p. 29.
68
FIGUEIREDO, op. cit., p. 48.
69
MAURER, op. cit., p. 123.
70
MARTÍNEZ, op. cit., p. 28.
71
Etimologicamente, o termo “dignidade” advém do latim “dignitas” ou “dignitate”, significando distinção ou honraria conferida a alguém,
consistente em cargo de elevada graduação, alta função, título eminente, podendo, ainda, ser empregado no sentido de postura socialmente
conveniente diante de determinada pessoa ou situação (ROCHA, op. cit., pp. 46-67; e SILVA, De Plácido e, op. cit., p. 526). Segundo Bodin
de Morais, o termo teria também se desdobrado do vocábulo latino “dignus”, que diz respeito àquele que “merece estima e honra, aquele que
é importante”. Assinala, ademais, que o referido termo chegou a ser associado, durante a Antiguidade, à espécie humana como um todo, sem
que tivesse, contudo, havido qualquer personificação (MORAES, op. cit., p. 115). Conquanto tenha evoluído para adquirir outros sentidos,
referidas acepções ainda continuam sendo utilizadas atualmente, tal como dessume da expressão “dignité honneur”, empregada na literatura
francesa (MAURER, op. cit., p. 122). Por sinal, o termo “dignidade”, ou mais precisamente, no plural, “dignidades”, foi utilizado, no sentido
de cargos ou honrarias, no art. 6º da própria Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, que predicara que “Tous les citoyens
[…] sont également admissibles à toutes dignités, places et emplois publics, selon leur capacité et sans autre distinction que celle de leurs
vertus et de leurs talents.” [gn] (Numa tradução livre: “Todos os cidadãos são […] igualmente admissíveis a todas as dignidades, lugares e
empregos públicos, segundo a sua capacidade e sem outra distinção que não seja a das suas virtudes e dos seus talentos”. Sem embargo, na
histórica declaração francesa, constava, ainda que de forma subentendida, a ideia de dignidade da pessoa humana existente à época,
sobretudo fundada, na compreensão liberal, no valor da liberdade.
72
SARLET, op. cit., 2010, p. 32.
73
BONAVIDES, Paulo. Do estado liberal ao estado social. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, pp. 139-164; BOBBIO, Norberto.
Liberalismo e democracia. 3. ed. São Paulo: Brasiliense, 1990, pp. 07-10; e REALE, Miguel. Horizontes do direito e da história. 2. ed.
São Paulo: Saraiva, 1977, pp. 17-33.
74
MAURER, op. cit., p. 122.
75
BECCHI, Paolo. O princípio da dignidade humana. In: Revista Brasileira de Estudos Constitucionais, vol. 7, jul./set.2008, pp. 192-193.
76
MORAES, op. cit., pp. 115-116.
77
MORAES, op. cit., p. 116.
78
MIRANDOLA, Pico Della. A dignidade do homem. Tradução de Luiz Feracine. São Paulo: Escala, 1985, pp. 39-40.
79
Conforme David E. Cooper, no discurso de Pico, “a dignidade do homem não se deve ao fato de compartilhar a natureza divina. Os seres
humanos são sui generis, sem afinidade com os animais, nem com os anjos, nem com Deus. É verdade que devem tentar se aproximar da
natureza de Deus pela contemplação [...] A dignidade humana não depende do sucesso deste empreendimento, mas da capacidade de realizá-
lo livremente, de tornar-se igual a Deus.” (COOPER, David E. As filosofias do mundo: uma introdução histórica. São Paulo: Loyola, 2002,
p. 251).
80
MIRANDOLA, op. cit., pp. 19-24.
81
KRIELE, Martin. Introdução à teoria do estado: os fundamentos históricos da legitimidade do estado constitucional democrático.
Tradução de Urbano Carvelli. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris, 2009, p. 285.
82
SARLET, op. cit., 2010b, p. 35.
83
MARTÍNEZ, op. cit., p. 14.
84
MARTÍNEZ, op. cit., p. 28.
85
HÄBERLE, Peter. Die Menschenwürde als Grundlage der staatlichen Gemeinschaft. In: J. Isensee-P. Kirchhof (org.). Handbuch des
Staatsrechsts der Bundesrepublik Deustschland, vol. I. Heidelberg: C.F. Müller, 1987, p. 860.
86
Para Joaquin Arce y Flórez-Valdés, “[…] la persona, ante al Derecho, ha llegado a dar expresión unívoca a una dignidad que no es
susceptible de medida ni de variabilidade; toda persona, por serlo, tiene el mismo coeficiente de dignidad.” (FLÓREZ-VALDÉS, Joaquin
Arce y. Los principios generales del derecho y su formulación constitucional. Madrid: Civitas, 1990, p. 147).
87
JESUS, Carlos Frederico Ramos de. Direitos humanos: por que sua fundamentação moral é necessária? In: AMARAL JUNIOR, Alberto
do; JUBILUT, Liliana Lyra (orgs.). O STF e o direito internacional dos direitos humanos. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 59.
88
Para Grócio, a dignidade humana manifesta-se no âmbito do direito à sepultura, guardando relação com o respeito com o cadáver. Já para
Hobbes, que adotava uma acepção que remontava, em parte, à concepção do período clássico greco-romano, a dignidade relacionava-se ao
valor do indivíduo no contexto social. Dizia respeito, portanto, ao prestígio pessoal e aos cargos exercidos pela pessoa, cuidando-se, assim,
de um valor atribuído pelo Estado e pelos demais membros da comunidade a alguém (SARLET, op. cit., 2010b, pp. 35-36).
89
SARLET, op. cit., 2010b, pp. 35-37.
90
FERRY, op. cit., pp. 91-99.
91
KANT, Immanuel. Grundlegung zur Metaphysik der Sitten. 3. ed. Leipzig: Durrschen Buchhandlung, 1906, p. 52-53.
92
FERRY, op. cit., p. 92.
93
OLIVEIRA, op. cit., p. 133.
94
“Nos seres racionais a causa das ações é o seu próprio arbítrio (por oposição ao mero desejo ou inclinação que não são objetos de
escolha).” (ANDRADE, Regis de Castro. Kant: a liberdade, o indivíduo e a república. In: WEFFORT, Francisco C. Os clássicos da política.
11. ed. São Paulo: Ática, 2006, p. 53).
95
FERRY, op. cit., p. 97.
96
OLIVEIRA, op. cit., p. 136.
97
OLIVEIRA, op. cit., pp. 154-155.
98
OLIVEIRA, op. cit., p. 131.
99
Segundo Bonavides: “Como se vê, a liberdade para Kant é apenas uma ideia, apanágio de todos os seres racionais, autonomia de vontade.”
(BONAVIDES, op. cit., p. 109).
100
“Para Kant, natureza e liberdade indicam duas esferas radicalmente diversas e, por decorrência, duas dimensões fundamentalmente
distintas […] elas constituem dois mundos, duas instâncias em níveis inteiramente diversos da realidade.” (OLIVEIRA, op. cit., p. 137). Nas
palavras de Paulo Bonavides: “Esse dualismo é o que Kant anuncia existir entre o mundo intelligibilis e o mundo sensibilis […]”
(BONAVIDES, op. cit., 2009, p. 106).
101
OLIVEIRA, op. cit., p. 134, 135, 136. 136 e 140.
102
FERRY, op. cit., p. 86.
103
“Ser livre significa, num primeiro momento, liberar-se da submissão aos mecanismos da natureza interior e exterior, portanto, da
causalidade natural, do jugo da temporalidade. […] Então, liberdade, negativamente, é independência do tempo, das determinações da
causalidade sensível; positivamente, liberdade é autolegislação, autodeterminação.” (OLIVEIRA, op. cit., pp. 136-137).
104
Para Alain Supiot, como todo animal vivo, o homem, de início, está no mundo por seus sentidos, mas, diferentemente de todos o s outros,
tem acesso a um universo que transcende o aqui e o agora dessa experiência sensível. A razão humana é, em verdade, sempre uma conquista,
a conquista frágil de um sentido compartilhado. O homem, assim, “não nasce racional, ele se torna racional ao ter acesso a um sentido
partilhado com outros homens”. (SUPIOT, op. cit., p. IX).
105
Hugo Segundo assinala que não há uma distinção estanque, mas, sim, gradual, entre o homem e os outros animais (MACHADO
SEGUNDO, op. cit., pp. 12-13).
106
KANT, op. cit., pp. 34 e 51-52.
107
ANDRADE, op. cit., p. 51.
108
FERRY, op. cit., p. 82.
109
OLIVEIRA, op. cit., p. 132. No mesmo sentido, pronunciou-se Paulo Bonavides: “A liberdade em Kant aparece, pois, como problema
puramente ético, que se resolve na esfera dos valores.” (BONAVIDES, op. cit., 2009, p. 108).
110
FERRY, op. cit., pp. 95-96.
111
OLIVEIRA, op. cit., p. 134.
112
OLIVEIRA, op. cit., p. 132.
113
KANT, op. cit., pp. 61-62.
114
KANT, op. cit., pp. 64-65.
115
KANT, op. cit., pp. 60-62.
116
JESUS, op. cit., p. 73.
117
“Nun sage ich: der Mensch, und überhaupt jedes vernünftige Wesen, existiert als Zweck an sich selbst, nicht bloß als Mittel zum
beliebigen Gebrauche für diesen oder jenen Willen, sondern muß in allen seinen, sowohl auf sich selbst, als auch auf andere v ernünftige
Wesen gerichteten Handlungen jederzeit zugleich als Zweck betrachtet werden. […]Die Wesen, deren Dasein zwar nicht auf unserm Willen,
sondern der Natur beruht, haben dennoch, wenn sie vernunftlose Wesen sind, nur einen relativen Wert, als Mittel, un d heißen daher Sachen,
dagegen vernünftige Wesen Personen genannt werden, weil ihre Natur sie schon als Zwecke an sich selbst, d.i. als etwas, das nicht bloß als
Mittel gebraucht werden darf, auszeichnet, mithin so fern alle Willkür einschränkt (und ein Gegenstand der Achtung ist). […] Der Mensch
aber ist keine Sache, mithin nicht etwas, das bloß als Mittel gebraucht werden kann, sondern muß bei allen seinen Handlungen jederzeit als
Zweck an sich selbst betrachtet werden. Also kann ich über den Menschen in meiner Person nichts disponieren, ihn zu verstümmeln, zu
verderben, oder zu töten.” (KANT, op. cit., pp. 52-54). Numa tradução livre: “Agora eu afirmo: o homem – e, de uma maneira geral, todo o
ser racional – existe como fim em si mesmo, e não apenas como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade. Em todas as suas ações,
pelo contrário, tanto nas direcionadas a ele mesmo como nas que o são a outros seres racionais, deve ser ele sempre considera do
simultaneamente como fim. […] Os seres, cuja existência não assenta em nossa vontade, mas na natureza, têm, contudo, se são seres
irracionais, um valor meramente relativo, como meios, e por isso denominam-se coisas, ao passo que os seres racionais denominam-se
pessoas, porque a sua natureza os distingue já como fins em si mesmos, ou seja, como algo que não pode ser empregado como simples meio
e que, portanto, nessa medida, limita todo o arbítrio (e é um objeto de respeito). […] Mas o homem não é uma coisa; não é, portanto, um
objeto passível de ser utilizado como simples meio, mas, pelo contrário, deve ser considerado sempre em todas as suas ações como fim em si
mesmo. Não posso, pois, dispor do homem em minha pessoa para o mutilar, degradar ou matar.”. Vale transcrever ainda as seguintes
passagens: “Der Mensch ist zwar unheilig genug, aber die Menschheit in seiner Person muß ihm heilig sein. In der ganzen Schöpfung kann,
was man will, und worüber man etwas vermag, auch bloß als Mittel gebraucht werden; nur der Mensch, und mit ihm jedes vernünft ige
Geschöpf, ist Zweck an sich selbst.” (numa tradução livre: “O homem é, de fato, muito profano, mas a humanidade em sua pessoa deve ser
sagrada para ele. Tudo o que existe na criação, tudo o que se quiser, e sobre o que se tenha algum poder, pode-se utilizar como simples meio;
somente o homem e, como ele, toda criatura racional é um fim em si.”) e “Daß in der Ordnung der Zwecke der Mensch (mit ihm jedes
vernünftige Wesen) Zweck an sich selbst sei, d. i. niemals bloß als Mittel von jemanden (selbst nicht von Gott), ohn e zugleich hierbei selbst
Zweck zu sein, könne gebraucht werden, daß also die Menschheit in unserer Person uns selbst heilig sein müsse […]” (numa tradução livre:
“Que, na ordem dos fins, o homem (e com ele todo o ser racional) seja um fim em si mesmo, isto é, não possa nunca ser utilizado por alguém
(nem mesmo por Deus) apenas como um meio, sem ao mesmo tempo ser um fim; que, portanto, a humanidade, em nossa pessoa, deve ser
para nós sagrada […]”). (KANT, Immanuel. Kritik der Praktischen Vernunft. 8. ed. Leipzig: Felix Meiner, 1922, pp. 112-113 e 168).
118
KANT, op. cit., 1906, pp. 53-54.
119
KANT, op. cit., 1906, p. 56.
120
Na esteira de Kant, José Afonso da Silva assinala que a dignidade da pessoa humana “não é uma criação constitucional, pois ela é um
desses conceitos a priori, um dado preexistente a toda experiência especulativa, tal como a própria pessoa humana” (SILVA, José Afonso da.
A dignidade da pessoa humana como valor supremo da democracia. In: Revista de Direito Administrativo, vol. 212, 1998, pp. 89-94). No
mesmo sentido, cf. ROCHA, op. cit., pp. 46-67.
121
KANT, op. cit., 1906, pp. 55-56.
122
SARLET, op. cit., 2010b, p. 53.
123
DWORKIN, Ronald Myles. Is democracy possible here?: principles for a new political debate. 3. ed. Princeton: Princeton University
Press, 2006, p. 10.
124
MEDEIROS, Ana Letícia Baraúna Duarte. Direito internacional dos direitos humanos na América Latina: uma reflexão filosófica da
negação da alteridade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, pp. 14-15.
125
Sarlet esclarece que Kant nunca afirmou que, num certo sentido, o homem não possa ser “instrumentalizado” de tal sorte que venha a
servir, espontaneamente e sem que com isto venha a ser degradado na sua condição humana, à realização de fins de terceiros. Isso ocorre, de
certo modo, com todo aquele que presta um serviço a outro. Com efeito, Kant refere expressamente que o homem constitui um fim em si
mesmo e não pode servir “simplesmente como meio para o uso arbitrário desta ou daquela vontade”. Com efeito, o desempenho das funções
sociais em geral encontra-se vinculado a uma recíproca sujeição. Compreendida como vedação da instrumentalização humana, a dignidade
da pessoa humana proíbe, em princípio, a completa e egoística disponibilização do outro, no sentido de que se está a utilizar outra pessoa
apenas como meio para alcançar determinada finalidade. O critério decisivo para a identificação de uma violação da dignidade passa a ser,
em rigor, o objetivo da conduta, isto é, a intenção de instrumentalizar (coisificar) o outro. Nesse tocante, cf. SARLET, op. cit., 2010b, pp. 58-
59.
126
Ao discorrer sobre os postulados kantianos acerca da dignidade do homem, Bodin de Moraes predica que “O substrato material da
dignidade desse modo entendida pode ser desdobrado em quatro postulados: i) o sujeito moral (ético) reconhece a existência dos outros como
sujeitos iguais a ele; ii) merecedores do mesmo respeito a integridade psicofísica de que é titular; iii) é dotado de vontade livre, de
autodeterminação; iv) é parte do grupo social, em relação ao qual tem a garantia de não vir a ser marginalizado”. (MORAES, op. cit., p. 120).
127
Conforme lição de Antônio Junqueira de Azevedo a respeito da dignidade da pessoa humana, “o conceito, além de normativo, é
axiológico, porque a dignidade é valor – a dignidade é a expressão do valor da pessoa humana. Todo „valor‟ é a projeção de um bem para
alguém; no caso, a pessoa humana é o bem e a dignidade, o seu valor, isto é, a sua projeção.” (AZEVEDO, Antônio Junqueira de. A
caracterização jurídica da dignidade da pessoa humana. Revista da USP, São Paulo, n. 53, p. 90-101, mar./mai.2002).
128
Conforme sustentado por Otfried Höffe, para se assegurar a validade intercultural do princípio da dignidade da pessoa humana, de tal
sorte a alcançar vinculatividade mundial, o próprio conteúdo e significado do princípio teve de ser necessariamente compreendido como
interculturalmente válido e secularizado, portanto, mediante renúncia a qualquer específica mundovisão ou concepção religiosa (HÖFFE,
Otfried. Medizin ohne Ethik? Frankfurt am Main: Suhrkamp, 2002, p. 49 apud SARLET, op. cit., p. 2010b, p. 46).
129
HÄBERLE, op. cit., 1987, pp. 843 e ss.
130
Segundo Francis Fukuyama, “Variamos grandemente como indivíduos e pela cultura, mas partilhamos uma humanidade comum que
permite a cada ser humano comunicar-se e estabelecer uma relação moral potencialmente com todos os outros seres humanos no planeta.”
(FUKUYAMA, Francis. Nosso futuro pós-humano: consequências da revolução da biotecnologia. Rio de Janeiro: Rocco, 2003, p. 23).
131
ROCHA, op. cit., pp. 46-67.
132
Segundo Cármen Lúcia Antunes Rocha: “Dignidade é alteridade na projeção sócio-política tanto quanto subjetividade na ação individual”
(ROCHA, op. cit., pp. 46-67).
133
HOFMANN, Hasso. Die versprochene Menschenwürde. In: Archiv des Öffentlichen Rechts (AöR), nº 118, 1993, p. 364.
134
COUTINHO, op. cit., pp. 166 e 170.
135
ARENDT, Hannah. The origins of totalitarianism. 7. ed. New York: Meridian Books, 1962, pp. 296-298.
136
KRIELE, op. cit., p. 279.
137
Nas palavras de Celso Lafer, “A experiência histórica dos displaced people levou Hannah Arendt a concluir que a cidadania é o direito a
ter direitos, pois a igualdade em dignidade e direito dos seres humanos não é um dado. É um construído da convivência coletiva, que requer
o acesso a um espaço público comum. Em resumo, é esse acesso ao espaço público – o direito de pertencer a uma comunidade política – que
permite a construção de um mundo comum através do processo de asserção dos direitos humanos.” (LAFER, Celso. A reconstrução dos
direitos humanos: um diálogo com o pensamento de Hannah Arendt. São Paulo: Cia. das Letras, 1988, p. 26).
138
FIGUEIREDO, Patrícia Cobianchi. Os tratados internacionais de direitos humanos e o controle da constitucionalidade. São Paulo:
LTr, 2011, pp. 15 e 61.
139
Conforme Piovesan, “O legado do nazismo foi condicionar a titularidade de direitos, ou seja, a condição de sujeito de direitos, à
pertinência a determinada raça – „a raça pura ariana‟.” (PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 13.
ed. São Paulo: Saraiva, 2012b, p. 184).
140
No original: “The fundamental human right, we should say, is the right to be treated with a certain „attitude‟: an atitude that expresses the
understanding that each person is a human being whose dignity matters.” (DWORKIN, op. cit., p. 35).
141
ROCHA, op. cit., pp. 46-67.
142
KRIELE, op. cit., p. 283.
143
ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na constituição portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 1987, p. 101.
144
ROCHA, op. cit., pp. 46-67.
145
NEUNER, Jörg. O código civil da Alemanha (BGB) e a lei fundamental. In: SARLET, op. cit., 2010a, p. 229.
146
FACHIN, Luiz Edson; RUZYK, Carlos Eduardo Pianovski. Direitos fundamentais, dignidade da pessoa humana e o novo código civil:
uma análise crítica. In: SARLET, op. cit., 2010a, pp. 97-110, passim.
147
RANGEL, Helano Márcio Vieira; MONT´ALVERNE, Tarin Cristino Frota. O planeta Terra como sujeito de dignidade e direitos: um
legado andino para a constituição da UNASUL e para a humanidade. In: MORAES, Germana de Oliveira [et al.] (orgs.). A construção
jurídica da UNASUL. Florianópolis: UFSC – Fundação Boiteux, 2011, pp. 319-336.
148
MARTINS-COSTA, Judith. Os direitos fundamentais e a opção culturalista do novo código civil. In: SARLET, op. cit., 2010a, p. 57, nota
de rodapé 46.
149
Para Antônio Junqueira de Azevedo, “a dignidade da pessoa humana como princípio jurídico pressupõe o imperativo categórico da
intangibilidade da vida humana e dá origem, em sequência hierárquica, aos seguintes preceitos: 1 - respeito à integridade física e psíquica das
pessoas; 2 - consideração pelos pressupostos materiais mínimos para o exercício da vida; e 3 - respeito pelas condições mínimas de liberdade
e convivência social igualitária.” (AZEVEDO, loc. cit.).
150
SARLET, op. cit., 2010b, p. 109.
151
JESUS, op. cit., pp. 53-78.
152
SARLET, op. cit., 2010b, p. 55.
153
Vale nota que Sarlet propõe uma definição da sua compreensão da dignidade da pessoa humana nos seguintes termos: “[…] a qualidade
intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e considera ção por parte do Estado e da
comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem à pessoa tanto contra todo e
qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável,
além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os
demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida.” (SARLET, op. cit., 2010b, p. 70).
154
KESBY, Alison. The right to have rights: citizenship, humanity and international law. New York: Oxford University, 2012, p. 93.

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