Livro História Da Arte I PDF
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Artes Plás�cas
F
iel a sua missão de interiorizar o ensino superior no estado Ceará, a UECE,
como uma ins�tuição que par�cipa do Sistema Universidade Aberta do
Brasil, vem ampliando a oferta de cursos de graduação e pós-graduação
na modalidade de educação a distância, e gerando experiências e possibili-
dades inovadoras com uso das novas plataformas tecnológicas decorren-
Artes Plás�cas
tes da popularização da internet, funcionamento do cinturão digital e
massificação dos computadores pessoais.
Comprome�da com a formação de professores em todos os níveis e
a qualificação dos servidores públicos para bem servir ao Estado, História da Arte I
os cursos da UAB/UECE atendem aos padrões de qualidade
estabelecidos pelos norma�vos legais do Governo Fede-
ral e se ar�culam com as demandas de desenvolvi-
Da arte rupestre ao neoclassicismo
mento das regiões do Ceará.
12
História
Educação
Física
Ciências Artes
Química Biológicas Plás�cas Computação Física Matemá�ca Pedagogia
Artes Plásticas
História da Arte I
Da arte rupestre ao neoclassicismo
Geografia
2ª edição
Fortaleza - Ceará 9
12
História
2019
Educação
Física
Ciências Artes
Química Biológicas Visuais Computação Física Matemática Pedagogia
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prévia autorização, por escrito, dos autores.
Editora Filiada à
Apresentação......................................................................................................5
Capítulo 1 – Arte e sociabilidade....................................................................07
Introdução..............................................................................................................09
1. Pressupostos para uma história das artes......................................................12
1.1. A evolução das artes:................................................................................13
1.2. A história da arte ocidental tomada como a história da arte universal:..15
2. Hipóteses sobre as origens das artes.............................................................16
2.1. A pintura mágica paleolítica......................................................................17
2.2. Arte neolítica..............................................................................................18
2.3. Os objetos sagrados.................................................................................20
2.4. A voz encantatória.....................................................................................21
2.5. A narrativa mítica.......................................................................................22
2.6. O trabalho..................................................................................................23
Capítulo 2 – A Arte na antiguidade................................................................29
1. A arte no antigo Oriente Médio e Próximo.......................................................31
1.1. Mesopotâmia.............................................................................................32
1.2. Egito...........................................................................................................34
1.3. Creta...........................................................................................................40
2. Da narrativa mítica à arte do período arcaico.................................................42
2.1. Período homérico: o mito estrutura o sentido do mundo........................43
2.2. Período da Grécia arcaica: o mundo é dotado de racionalidade...........46
2.3. Características das artes gregas.............................................................55
3. O século de Péricles: apogeu das artes e doutrinas estéticas
da Grécia clássica............................................................................................58
3.1. A doutrina estética de Platão....................................................................60
3.2. A doutrina estética de Aristóteles..............................................................63
Capítulo 3 – Do Helenismo ao Medievo Cristão..........................................69
1. O surgimento do Helenismo.............................................................................71
2. O surgimento de Roma.....................................................................................78
3. O sistema das artes romanas...........................................................................81
3.1. Os templos.................................................................................................81
3.2. O teatro......................................................................................................81
3.3. A escultura.................................................................................................82
3.4. A pintura.....................................................................................................84
4. O fim do império................................................................................................85
4. As artes na alta Idade Média: o bizantino, o gregoriano
e os períodos merovíngio e carolíngio.............................................................86
4.1. A protoarte Cristã.........................................................................................86
4.2. A Arte Bizantina............................................................................................87
4.3. O canto gregoriano e a música medieval..................................................91
4.4. A Arte da fase merovíngia e carolíngia............................................94
5. As artes na baixa Idade Média: o românico e o gótico.....................................98
5.1. O Estilo Românico......................................................................................98
5.2. O Estilo Gótico...........................................................................................102
Capítulo 4 – Do Humanismo Renascentista
ao Neoclassicismo Iluminista.......................................................................117
1. A Renascença e o maneirismo........................................................................ 119
1.1. Contexto sociohistórico da Renascença................................................. 119
2. O sistema das artes renascentistas................................................................123
2.1. A arquitetura...............................................................................................123
2.2. A pintura.....................................................................................................124
2.3. A escultura.................................................................................................128
3. A Renascença europeia...................................................................................130
4. O maneirismo...................................................................................................132
5. A música profana da modernidade renascentista..........................................133
6. O barroco e o rococó.......................................................................................135
6.1. O contexto sociohistórico do barroco......................................................135
6.2. O rococó....................................................................................................148
7. O neoclassicismo iluminista.............................................................................149
7.1. O contexto sociohistótico do neoclassicismo.........................................149
7.2. O sistema das artes neoclássicas...........................................................154
7.3. O classicismo musical: tonalismo, forma-sonata e a
historicidade da consciência burguesa...................................................157
Dados do autor................................................................................................166
Apresentação
Este livro percorre uma grande linha de tempo da história das artes ociden-
tais. Ele se inicia na chamada pré-história, quando as primeiras manifestações
dos povos caçadores nos legaram impressionantes figuras que adornavam as
paredes de suas cavernas, esculpiam objetos e dançavam para espantar os
espíritos que tanto temiam. Tais manifestações passaram a ser vistas como as
primeiras figurações e experiências estéticas de nossos ancestrais.
Desde então, a humanidade passou a contar com um espantoso, diversifi-
cado e belíssimo acervo de linguagens artísticas, que nos vem encantando, cuja
análise, para efeito deste livro, detém-se na outra ponta que conclui aquela grande
linha de tempo: o período neoclássico, quase às portas da nossa contemporanei-
dade. Preenchendo esse grande trajeto, sucederam-se outros períodos que mar-
caram a história das artes ocidentais como a antiguidade clássica, o helenismo, o
medievo cristão e seus diversos estilos como o bizantino, o românico e o gótico, a
modernidade renascentista, o maneirismo, o barroco e o rococó.
Para evitar armadilhas dissimuladas nesse grande percurso, como, por
exemplo, tomar a história das artes plásticas como a história da arte em geral,
procuramos articular a análise das obras perpetuadas na materialidade das
rochas, bronzes, cerâmicas e telas, com outras linguagens, como a música,
a jardinagem, eventualmente o teatro e a literatura, mediante a busca de suas
afinidades estéticas expressas no interior do contexto sociohistórico que ilumi-
na e entretece as vias do entendimento dessas linguagens.
Todos nós nascemos, biológica e espiritualmente, incompletos. A hu-
manidade de cada um de nós se constrói na história. E as artes, de forma
manifesta e clara ou latente e tortuosa, parecem nos conduzir a este grande
termo: superar as incompletudes e insuficiências de nossa humanidade, nos
tornando cada vez mais humanos. E essa História da Arte I procura narrar um
pouco dessa construção e desse desafio.
O autor
7
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
Capítulo 1
Arte e sociabilidade
9
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
Objetivos
• A amplitude das possibilidades para definir e configurar os limites do campo
artístico.
• A obra de arte como produto irrecusável de uma rede de sociabilidade.
• Os pressupostos críticos em relação a certas abordagens usualmente recor-
rentes em textos sobre a história das artes.
• A natureza hipotética das origens das artes.
Introdução
A sentença que dá título a esta unidade – Arte é o que eu e você chamamos
arte –, é tomada aqui de empréstimo do curioso e provocativo título do livro do
crítico de arte Frederico Morais, graças a seu caráter instigante, adensador de
um leque de sentidos relevantes para a nossa História da Arte.
Dentre as dimensões constitutivas da existência humana, ou seja, as
esferas do saber (a episteme)*, do agir (a ética) e do sentir (a estética), objetos
da reflexão de uma linhagem de pensadores ocidentais (v. adiante a seção
Saiba mais), a arte é certamente a que apresenta uma riqueza e amplitude
maior de entendimento e de conceitos.
O subtítulo do livro de Morais, 801 definições sobre arte e o sistema de
arte, é um flagrante testemunho dessa realidade. Na verdade, não se trata
de definições conforme o rigor teórico das chamadas “ciências duras”, como
as ciências naturais, a exemplo da lei da gravitação universal formulada por
Isaac Newton, passível de formulações matemáticas.
A palavra arte, correspondente ao termo grego techné, que, por sua
vez, dá origem ao termo técnica, deriva do latim ars, artis, termo que, no cor-
rer dos anos, passou a constituir um certo saber, fazer e sentir. Em Reflexões
sobre a Arte, Alfredo Bosi, procurando elucidar a etimologia da palavra arte,
afirma: “a palavra latina ars, matriz do português arte, está na raiz do verbo ar-
ticular, que denota a ação de fazer junturas entre as partes de um todo” (BOSI,
1991, p.13). Portanto, o artista seria um articulador de porções da realidade,
agenciando-as num todo de sentido estético. Mas o que seria mesmo a arte?
10
MIRANDA, D. S. de
o ‘ser’ obra de arte, ser perene, uma das manifestações ‘superiores’ da nature-
za humana” (COLI, 1981, p. 21/22). Mas logo o professor nos alerta:
A noção de arte que hoje possuímos, [...] não teria sentido para o artesão ar-
tista que esculpia os portais românicos ou fabricava os vitrais góticos. Nem
para o escultor que realizava Apolo no mármore ou Poseidon no bronze.
Nem para o pintor que decorava as paredes da gruta de Altamira ou Las-
caux. Desse modo, o “em si” da obra de arte, ao qual nos referimos, nâo é
uma imanência, é uma projeção. Somos nós que enunciamos o “em si”da
arte, aquilo que nos objetos é, para nós, arte. (COLI, op. cit. p. 22)
Dessa forma, uma obra de arte não detém um valor estético “em si”.
Seu estatuto artístico lhe é conferido por uma rede de agentes portadores de
sentidos e valores estéticos construídos socialmente.
Uma obra de arte, criada por uma individualidade, se apresenta como
um objeto singular nas suas origens e, a um só tempo, postulante de uma
dimensão social no seu destino. Assim, uma obra de arte detém uma objeti-
vidade que se inscreve num artefato particular e sinaliza para uma potencial
universalidade. Dessa forma, a alteridade e a sociabilidade tornam-se traços
constitutivos daquilo que denominamos arte. Para que uma determinada cria-
ção, fruto da pulsão inventiva e tensamente livre da subjetividade humana,
mediante suas mais variadas formas de expressão estética, se transforme
numa obra de arte, é preciso que essa mesma criação se “aliene” do seu cria-
dor e ganhe autonomia pela fruição de um “outro”.
Em O carteiro e o poeta, filme de Michael Redford (1994) sobre o exílio
do poeta chileno Pablo Neruda, na Itália, existe uma passagem bastante inte-
ressante. O carteiro, ao ser recriminado por Neruda por ter se apropriado de
um de seus poemas para presentear à mulher pela qual se apaixonara, lhe diz
que “a poesia não é de quem escreve, mas de quem dela precisa”.
A nosso ver, toda obra de arte só se constitui como tal, ao se descolar
do mundo particular da subjetividade do artista e imergir na receptividade do
“outro”. Se um quadro, ao ser pintado, for ocultado, impedindo assim sua con-
templação, será apenas um quadro pintado oculto e não uma obra de arte.
São os “olhadores” que fazem dele uma pintura artística, afirmava o artista
francês Marcel Duchamp no início do século XX (cf. COLI, 1981).
Vejamos dois interessantes episódios ocorridos com o pintor Pablo Pi-
casso que ilustram de forma bem expressiva a nossa reflexão. O primeiro
episódio refere-se à reação do artista ao final de uma entrevista concedida
a um jornalista num bistrô parisiense. Durante toda a entrevista, o jornalista
seguia com olhos ávidos os esboços desenhados pelo pintor, sempre jogados
numa cesta de lixo, após cumprir a tarefa de ilustrar algum trecho da entre-
vista. Finalizada a entrevista, quando o jornalista buscou recuperar no lixo os
12
MIRANDA, D. S. de
esboços, Picasso teria fixado um valor pelos desenhos. No lixo, eram apenas
papéis rabiscados. Na parede, para a fruição de algum olhar contemplante,
transformavam-se em obras de arte.
O sentido do segundo episódio, similar ao primeiro encontra-se expres-
so no filme Modigliani – paixão pela vida (2004), do cineasta Mick Davis, quan-
do Picasso, ao ser solicitado pelo dono do restaurante, onde comera e bebera,
para assinar o desenho que o artista lhe presenteara para pagar as despesas,
diz: eu só estou pagando a conta e não comprando seu restaurante (no caso,
a assinatura do artista atribuiria maior valor estético à obra).
Esta mesma reflexão pode ser estendida ao campo da arte musical,
visto que a sociabilidade é igualmente uma condição de viabilidade para o
acontecer musical. A música tem uma origem particular na produção autoral
do compositor. Mantendo-se nesse estágio, como qualquer outra criação com
pretensões de ser obra de arte, resta incompleta. Como vimos, a efetividade
da arte enquanto tal se dá na contemplação. No caso da música, sua incom-
pletude se supera na performance dos intérpretes (maestro, instrumentistas e
cantores) bem como na audição do público.
Portanto, a música, assim como qualquer arte conforme vimos, se faz
na alteridade. Ela se faz na escuta do outro. Quanto a esse caráter, o pensa-
2
A comunidade de sentidos dor alemão Theodor Adorno é enfático: "O sujeito que compõe não é uma enti-
e valores estéticos dade individual, mas coletiva. Qualquer música, por mais individual que o seu
refere-se à confluência da estilo possa ser, possui um caráter inalienável, um conteúdo coletivo: qualquer
compreensão e sensibilidade
som sempre diz Nós" (ADORNO, 1972, p. 11).
possível de ser detectada
em determinadas épocas, Em síntese, a nosso ver, no enunciado subjacente ao livro de Frederico
levando criadores e Morais – Arte é o que eu e você chamamos arte –, esse eu e você não se re-
contempladores (público,
duz a uma simples díade * stricto sensu, mas nos remete a uma comunidade
mecenas, etc.) a partilhar
uma certa consensualidade de sentidos2 e valores estéticos que constrói histórica e socialmente aquilo
instituída de apreciação que identificamos como obras de arte.
convergente das mesmas.
Na época dos grandes 1. Pressupostos para uma história das artes
estilos, como o classicismo
renascentista, o barroco, Autores que se ocupam da historia da arte, via de regra, costumam apresen-
o neoclassicismo e o
tar uma tendência que poderíamos denominar de reducionista, ao apresen-
romantismo, era possível
detectar esta comunidade de tar como foco quase exclusivo de sua abordagem, a história das artes plás-
sentidos, o que é rompido, ticas (arquitetura, escultura e pintura), centrada principalmente nesta última.
como será visto, pelas
Tal abordagem é compreensível, pois, desde “a aurora da humanidade”,
vanguardas artísticas no
início do século XX. tais modalidades de expressão artística possuem inúmeros registros físicos
como figuras fixadas em paredes e tetos de cavernas, templos, túmulos e di-
versas outras edificações que nos permitem visualizar estilos, formas e conte-
údos segundo épocas e lugares, algo totalmente impensável quando se trata,
por exemplo, da música.
13
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
Outra voz que teria ganhado poderes encantatórios foi a do aedo (poe-
ta-cantor que entoava suas próprias criações) e do rapsodo (poeta-cantor que
entoava obras alheias), cuja função era a narração mítica (poemas religiosos
e/ou épicos), a exemplo da Ilíada e da Odisseia de Homero, cuja sabedoria
sagrada partia do seu interior, daí sua figura ser associada a um poeta cego.
Conforme apontam algumas teorias, os sentidos da comunicação en-
tre os nossos ancestrais mais “primitivos” poderiam ter sido dados pela estreita
articulação entre o canto (melodia e ritmo) e a palavra, cujo vínculo semântico
da linguagem era dado pela íntima relação entre os dois (música e palavra). O
filósofo enciclopedista Jean Jacques Rousseau, ao fundamentar sua noção
de música como linguagem dos sentimentos, desenvolve uma teoria sobre a
gênese da linguagem falada em Ensaio sobre a origem das Línguas.
Para ele, teria existido no passado mítico das sociedades, uma unida-
de entre fala e música. Essa indissolubilidade permitia ao homem em estado
natural, expressar suas paixões de modo pleno. A civilização teria rompido
tal unidade. As línguas, ab origine (em suas origens mais recuadas), eram
acentuadas musicalmente e, por um perverso efeito da civilização, ficaram
desprovidas daquela melodicidade original, tornando-se aptas apenas para
expressar uma linguagem racional.
Essa mesma unidade entre a música e a palavra como forma original
de articulação de sentidos teria sido usada no canto para o comando do traba-
lho. As cantigas de trabalho, quase sempre entoadas no sistema responsorial
(chamada e resposta), foram uma prática universal, encontrada em todas as
culturas onde existisse o gesto comunal para a busca da sobrevivência. O
canto durante o trabalho serviria, a um só tempo, para imprimir um ritmo co-
letivo, assim organizando e comandando o gesto comum para torná-lo mais
eficaz, bem como para minorar a fadiga de uma jornada de trabalho.
Atividades de avaliação
1. Formule sua própria concepção sobre a arte.
2. Considerando a universalidade da expressão artística, justifique sua presen-
ça na existência humana.
3. Considerando o caráter relativo das abordagens sobre os pressupostos crí-
ticos em relação a determinadas perspectivas recorrentes sobre a história
das artes, emita sua opinião sobre as mesmas.
4. Emita sua opinião sobre as hipóteses das origens das artes apresentadas
por esta unidade.
5. Levando em conta todo o conteúdo apresentado pela unidade, elabore
um pequeno texto a partir de uma questão problematizada formulada por
você mesmo, e procure respondê-la desenvolvendo uma reflexão de for-
ma bem pessoal.
@
Leituras, filmes e sites
Leituras
Homero: A Odisseia
Platão: A República
Santo Agostinho: As Confissões
Filmes
Guerra do fogo (2003): do diretor Jean-Jacques Annaud, baseado no roteiro
assinado por Anthony Burguess, autor do livro Laranja Mecânica, o filme retra-
ta um período da pré-história a partir do encontro de dois grupos de homínidas:
o primeiro, ainda pouco diferenciado dos primatas, não possui o domínio da
fala, comunicando-se mediante gestos e grunhidos, e desconhece o fogo; o
segundo, mais evoluído, possui comunicação e hábitos mais complexos, in-
clusive a habilidade de fazer o fogo. O filme levanta algumas hipóteses sobre
a origem da linguagem.
2001 - Uma odisseia no espaço (1968): do diretor Stanley Kubrick, basea-
do na obra ficcional de Arthur Clarke. Um clássico da ficção científica, cobre
uma extensíssima linha de tempo, que vai desde a “aurora da humanidade”,
quando surge um misterioso monolito negro emissor de estranhos sinais de
outra civilização que perturbam os homínidas da terra até quatro milhões de
27
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
Referências
ADORNO, Theodor “Réflexions en vue d'une sociologie de la musique”. In
Musique en jeu, no.7. Tradução de Dilmar Miranda. Paris: Seuil. 1972
BOSI, Alfredo. Reflexões sobre a arte. Ática. São Paulo, 1991.
CARPEAUX, Otto Maria. Uma nova história da música, Rio de Janeiro:
Ediouro, 1958?
CHAUÍ, Marilena. Introdução à história da Filosofia. São Paulo: Companhia
Das Letras. 2002.
COLI, Jorge, O que é arte. São Paulo: Brasiliense, 2009.
GOMBRICH, E.H. A história da arte. Tradução de Álvaro Cabral, 15ª edição.
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1989
HAUSER, Arnold. História social da arte e da literatura. Tradução de Álvaro
Cabral. Martins Fontes, São Paulo, 1995.
MATOS, Olgária. “A Melancolia de Ulisses: a Dialética do Iluminismo e o canto
das sereias”. In Os Sentidos da Paixão (org. Adauto Novaes). S. Paulo. Fu-
narte/Cia. das Letras. 1989.
MORAIS, Frederico. Arte é o que eu e você chamamos arte. Rio de Janeiro/
São Paulo: Record. 1998.
PROENÇA, Graça. História da arte. São Paulo: Ática. 1989.
RICOEUR, Paul, (org.) et al. Introduction: Les cultures et le temps. Tradução
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VAZQUEZ, Adolfo Sanches. As ideias estéticas de Marx, São Paulo: Paz e
Terra, 1978.
WEBER, Max, Fundamentos racionais e sociológicos da música. Tradu-
ção de Leopoldo Waizbort. São Paulo: EDUSP. 1994.
WISNIK, José Miguel, O som e o sentido. São Paulo: Companhia Das Letras.
2001.
História da Arte: da Pré-história até a Arte Contemporânea. (DVD e folheto).
Edição: Grupo Cultural.
29
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
Capítulo 2
A Arte na antiguidade
31
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
Objetivos
• Examinar as manifestações artísticas da antiguidade (como a arte mesopo-
tâmica e egípcia);
• Percorrer seus períodos e obras mais marcantes e que irão provocar impor-
tantes influxos, sobretudo na arte da antiga Grécia;
• Analisar os períodos arcaico e clássico que irão fornecer padrões canônicos
constitutivos das artes ocidentais.
• Diversas linguagens artísticas da antiga Grécia, como a música, a escultura,
a pintura, a arquitetura e a tragédia, será articulada às principais doutrinas
estéticas do pensamento filosófico da época.
1.1. Mesopotâmia
A Mesopotâmia (em grego, “entre dois rios”) encontra-se na região sul da ba-
cia dos rios Tigre e Eufrates. Nela, percebem-se duas regiões bem distintas. A
porção norte, fria e montanhosa, foi ocupada por assírios e acádios. A porção
sul, formada por planícies férteis de clima quente, foi habitada pelos sumérios
e babilônios. O adensamento de suas várias aldeias, com seu consequente
crescimento, propiciou a criação de cidades-estado. Por se tratar de uma re-
gião altamente produtiva, diversos povos sentiram-se atraídos por ela ao longo
de milênios, dando origem a uma sucessão de conquistas. E, à medida que as
várias ocupações iam se sucedendo, foi-se consolidando uma impressionante
riqueza cultural, sempre acolhida pelas novas gerações de habitantes da região.
O que talvez possa explicar esse fenômeno seria o fato dos mesopotâ-
micos, a despeito dos dialetos de cada povo, compartilharem a mesma escrita
denominada de cuneiforme, sinais gráficos obtidos por meio de estiletes em
formato de cunha, notabilizando-se, assim, pela invenção de um dos mais
antigos sistemas de escrita que se tem notícia. Os tabletes feitos de argila
e pedra, os sinetes e cilindros-selo, além de documentar todo um processo
sofisticado e complexo de desenvolvimento da escrita, registram igualmente
aspectos da administração palacial da região mesopotâmica, especialmente
entre os assírios e os babilônicos. Graças a essa unidade cultural, foi-nos
possível identificar o que denominamos de civilização mesopotâmica, na ver-
dade, um grande encontro de diferentes culturas em cuja encruzilhada se so-
brepuseram e se coesionaram durante milênios, nutrindo-se umas das outras.
A tradição historiográfica ocidental costuma atribuir seus começos por
volta do ano de 4.000 a. C., com a chegada dos sumérios, cuja hegemonia,
como vimos, não se tornou única ou duradoura. Assim como os sumérios, os
acadianos, a partir de 2.400 a. C. e, depois, os assírios e os babilônios foram
adotando a cultura de seus predecessores.
Em 539 a. C., a região foi conquistada pelo rei Dario I, da Pérsia, dando
início a um longo e tumultuado império que iria durar até 330 a. C. quando Ale-
xandre Magno, rei da Macedônia, o mais célebre conquistador da antiguidade,
unifica todos os países contíguos da região, criando um grande império que
passa a integrar o mundo helênico, conhecido como o período do Helenismo,
conforme veremos adiante.
Da civilização mesopotâmica, surgiram importantes inovações como a
moeda e a roda, o sistema aritmético sexagesimal, usado tanto para simples
contagem de tijolos como para o uso rudimentar da astronomia, o Código de
Hamurabi, o correio, a irrigação artificial, o arado, a vela, os arreios dos ani-
mais, a metalurgia do cobre e do bronze.
A arte mesopotâmica, assim como outras da época, possuía uma pre-
ponderante intenção funcional, destinada a incumbências bem precisas como
o serviço do poder e da religião. Dessa forma, serão os reis e sacerdotes que
irão pautar, em proveito próprio, a produção artística.
33
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
a) A arquitetura
Na arquitetura da Mesopotâmia, vislumbramos os primeiros traços de monu-
mentalidade característica da arte da antiguidade oriental. Ela irrompe dos
templos e palácios, principais construções na Mesopotâmia. Os sumérios,
excelentes construtores, fincaram os alicerces da sua arquitetura. Por ser a
região escassa em rochas pedregosas e rica em argila, o tijolo foi o material,
por excelência, de suas construções.
Dispostos compactamente, os tijolos configuravam um sólido e maciço
edifício, via de regra sem janelas. A luz e o ar provinham dos pátios internos e
das aberturas feitas no teto. Ao longo do dia, gigantescas portas e os desta-
ques dos muros provocavam um impressionante jogo de sombra e luz.
Uma típica construção da arte arquitetônica da Mesopotâmia era o zi-
gurate, espécie de torre-santuário construído de tijolos em forma piramidal.
Vários terraços eram sobrepostos uns aos outros, formando grandes degraus,
diferenciando-se da pirâmide egípcia de formato inclinado contínuo: cada an-
dar possuia área menor que a plataforma inferior, podendo ser retangular, oval
ou quadrada. O episódio da Torre de Babel, narrativa bíblica do livro do Gêne-
sis, refere-se à edificação de um imenso zigurate, cujas ilustrações costumam
representar a Torre na forma de uma gigantesca espiral.
As formas retangulares e quadradas nos remetem ao formato das pi-
râmides egípcias, nos induzindo à ideia de possíveis relações entre elas e os
zigurates. Procedendo tal hipótese permanece um grande mistério se levar-
mos em conta a existência de construções piramidais escalonadas similares
em regiões bastante longínquas como as do planalto andino (civilização inca),
da meseta mexicana (civilização asteca) e da Ásia. Delas sabemos que cer-
tamente possuíam uma clara função sagrada: altares, tronos, observatórios
astronômicos, oratórios, câmaras funerárias, tudo funcionava para propiciar a
comunicação dos homens com as entidades divinas.
b) A escultura
Nesta arte, manifestam-se mais nitidamente os estilos dos diversos povos
constituidores da civilização mesopotâmica: os esquemáticos relevos sumé-
rios, o naturalismo das placas penduradas semitas e acadianas, os suntuosos
relevos em tijolos vidrados coloridos da Babilônia. Porém, o destaque fica por
conta dos assírios, indiscutíveis mestres da arte escultórica que adornavam
as paredes de seus palácios com esplêndidos relevos de temática variada tais
como cruéis batalhas, cenas cortesãs ou caçadas com animais. Tais relevos
eram dotados de realismo e grande expressividade.
Merece ainda menção a arte escultórica do período assírio, com seus
baixos-relevos híbridos contendo o corpo de touros com cabeças de reis bar-
bados guardando as entradas dos templos.
O tijolo decorativo era usado nas entradas das cidades e salas. Era
igualmente comum o uso da escultura monumental representando demônios
34
MIRANDA, D. S. de
a) A arquitetura
Os templos
O templo egípcio, ao contrário do uso corrente feito pelas religiões em geral
para o encontro de fiéis, era a morada da divindade, que possuía em seu
interior sua representação escultórica, alvo de um rito diário: lavada, vestida,
Figura 6 – A lei da frontalida- alimentada e objeto de oferendas, a divindade, em troca, concedia paz, pros-
de: pintura na câmara tumu- peridade e abundância nas colheitas propiciadas pelas boas cheias do Nilo.
lar de Nefertari, mulher de
Os templos do Antigo Império (3.200 a 2.300 a. C) eram, originariamen-
Ramses II.
te, simples e pobres, feitos de materiais perecíveis, deles restando poucos
35
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
As mastabas
Nos primórdios do Antigo Império, as tumbas eram câmaras mortuárias re-
vestidas com tijolos, construídas em grandes fossos escavados nos terrenos
arenosos do deserto e cobertas com simples construções retangulares. Esse
tipo de edificação recebeu o nome de mastaba (literalmente banco, derivado
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MIRANDA, D. S. de
b) A escultura
Dentro do princípio de uma arte voltada para a cultura da morte e da imortali-
dade do espírito, a escultura cumpria uma função muito precisa entre os egíp-
cios. Por acreditar convictamente numa vida eterna pós-morte regida pelos
deuses e pela figura divina do faraó, e para que o morto pudesse viver bem no
outro mundo, era imprescindível que seu corpo, morada de seu Ka, se con-
servasse intacto. Portanto, mumificavam os cadáveres mediante uma técnica
de embalsamento bastante sofisticada e desenvolvida.
1.3. Creta
Para melhor entender o legado cultural que a Grécia antiga nos deixou, de-
vemos partir da história dos povos que gravitavam em torno do mar Egeu,
dando especial atenção para sua pujante produção mercantil articulada à an-
tiga estrutura escravocrata. A região em torno do Mar Egeu compreendia uma
vasta área entre a península balcânica (abarcada pela Grécia continental e o
Peloponeso) e a Ásia Menor. Foram várias as populações que iriam formar um
povo que passou a ser chamado de grego, designação dada pelos romanos.
Contudo, os próprios gregos se autodesignavam de helenos.
Trata-se de um contexto crucial para a compreensão da civilização gre-
ga, do seu pensamento, cultura e vida material, deixando-nos um impressio-
nante sistema de artes, mas, sobretudo, a invenção, por volta do século VII a.
C., de uma forma inusitada de pensar: a filosofia.
Os primeiros registros da região partem de um período pré-helênico, em
torno do terceiro milênio a. C. (a história da ilha de Creta), com referências à
sua esplêndida e rica cultura também conhecida como minóica (termo atribui-
do ao arqueólogo inglês Arthur Evans e originário do rei mítico Minos), cujo
apogeu se dá entre 1700 e 1450 a. C.
Os minóicos – graças à sua posição privilegiada como habitantes da
maior ilha do Mediterrâneo, no mar Egeu, cercada por vários povos do conti-
nente e exercendo um poder na região baseado no comércio marítimo (tha-
lassocracia, poder do mar em grego) –, desenvolveram uma impressionante
civilização urbana, cujo modo de vida girava em torno de grandes palácios
que eram, a um só tempo, centros administrativos, econômicos, religiosos
e políticos. O palácio de Knossos se destacou como o mais importante de
todos. Estudos de suas ruínas revelam que ele foi construído entre 1.700 e
1.500 a. C. e sua planta era bem evoluída, possuindo um pátio central cercado
por muitas salas, algumas delas agrupadas e ligadas umas às outras numa
ordem bem planejada.
De um modo geral, esses imensos palácios, com evidentes influxos da
arquitetura egípcia e de outras civilizações orientais, possuíam um pátio inter-
no, dezenas de aposentos, corredores e enormes depósitos. Seu refinamento
e luxo levavam-nos a contar com banheiros, privadas e bueiros. Além das
colunas em policromia de tons vivos e contrastantes, as paredes, os tetos e
pisos eram ricamente decorados com vistosos afrescos, um dos traços mais
notáveis da arte cretense.
De característica marcadamente naturalista, nela se observam nume-
rosas representações de plantas e animais, com uma acentuada paixão pelo
movimento rítmico e ondulante. As figuras humanas são igualmente constan-
tes com patente intenção ritualística.
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História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
(...)
Mesmo admitindo que mito e logos (v. glossário) são esferas distintas,
na medida em que o mito, ao contrário do logos, não permite o discurso dialó-
gico do contraditório, da argumentação e contra-argumentação, o mito abriga
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MIRANDA, D. S. de
em seu interior, uma racionalidade, ainda que fechada em si mesma, que bus-
ca dar sentido ao mundo e à vida daqueles que a adotam.
No mito, a noção de origem confunde-se com a do nascimento e a no-
ção de produzir com a de gerar. Busca-se o sentido da vida na medida em
que, mediante a exposição genealógica, são desvelados os gestores (pai e
mãe), o que é igualmente buscado nas teogonias (racionalidade mítica) quan-
do somos projetados na escala cósmica.
Mediante sucessivos nascimentos, frutos da união e/ou confronto de for-
ças antagônicas, ficava estabelecida a ordem no mundo e entre os deuses. O
mundo dos deuses ordenado pela racionalidade mítica refletia o mundo orde-
nado dos homens e, por essa mesma racionalidade do mundo ordenado dos
deuses e dos mitos, estabelecia-se uma racionalidade para a vida humana.
Segundo o estudioso francês dos mitos, Vernant, tal racionalidade en-
volvia uma ambiguidade: "(...) operando sobre dois planos, o pensamento
apreende o mesmo fenômeno, por exemplo, a separação da terra das águas,
simultaneamente como fato natural no mundo visível e como geração divina
no tempo primordial" (VERNANT, 1973, p. 300)
Caberá ao período que se segue assumir a tarefa de superar a ambigui-
dade contida no mito e dar um novo caráter à elaboração desse pensamen-
to. Ele havia sido preparado pelos novos tempos trazidos pelo pensamento
racional laicizado e gestado no interior da pólis, onde os cidadãos participam
da vida pública, mediante as discussões da ekklesia *realizada na ágora*, e
12
Séries harmônicas movido pelo tipo novo de pensar advindo de pessoas especiais promotoras do
Uma corda esticada vibrando pensamento filosófico.
em dada frequência provoca
ressonâncias contínuas, 2.2. Período da Grécia arcaica: o mundo é dotado de racionalidade
mantendo relações
numéricas constantes Iniciado em fins do século VIII e indo ao começo do século V a. C., para a
entre si. Tomando o dó história da Filosofia, este período é também conhecido como pré-socrático. O
como 1º harmônico (nota
mito cede lugar ao logos como forma de explicar o universo. A denominação
fundamental), o 2º harmônico
é o mesmo dó, uma oitava de período arcaico vem de arkhé * (origem das coisas). Deve-se à caracterís-
acima; o 3º é o sol, que tica do pensamento dos primeiros filósofos, como Tales de Mileto (c. 625 - 548
compõe um intervalo de 5ª a. C.), Anaximandro (c. 610 - 547 a. C.), Pitágoras de Samos (c. 580 - 497 a.
justa com o 2º harmônico. C.), Heráclito de Éfeso (c. 540 - 470 a. C) Anaxímenes (c. 583 - 528 a. C.), que
O 4º é o dó, estabelecendo elaboraram explicações sobre a origem e a constituição do universo, identifi-
com o sol (3º harmônico)
cando, nos elementos como água, fogo, ar, terra, bem como no número ou no
um intervalo de 4ª justa;
o 5º harmônico é o mi, indeterminado (ápeiron), o princípio uno e originário de tudo.
estabelecendo um intervalo
de 3ª justa com o dó, e assim a) A música
por diante, conforme se pode Interessa-nos, examinar, de perto, a originalidade do pensamento pitagóri-
ver no seguinte exemplo:
co, responsável por uma inédita formulação teórica sobre a ordem do uni-
verso baseada na música e nas relações intervalares físico-matemáticas
das séries harmônicas12.
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sar ou conhecer algumas coisas sem aqueles” (Filolau de Crotona13). Os pita- V a. C.) apud Andery et alii,
góricos não viam o número como mero símbolo, senão como princípio consti- 2000, p. 40. Filolau foi um
tutivo (arkhé) da estrutura do cosmos. Pelo conhecimento de suas relações e dos maiores divulgadores da
doutrina pitagórica.
da harmonia cósmica, todo o universo tornava-se cognoscível.
Número e harmonia eram a condição necessária para a explicação da
existência do universo. Assim, os pitagóricos concebem a música como algo
fundante da ordem do ser. Existe uma racionalidade arquetípica no âmago
das coisas e do cosmos, o que era evocado a partir da teoria das séries har-
mônicas. Dessa forma, os pitagóricos incorporam a música a uma cosmolo-
gia: eis aqui um belo exemplo da diferença entre o pensamento mítico (período
homérico) e o pensamento racional filosófico (período arcaico).
No primeiro período, a cosmologia se ocupa de deuses e homens que
se vêem imbricados numa complexa narrativa genealógica dos fatos de na-
tureza mítica. No segundo, os pitagóricos estabelecem uma cosmologia que
funda um princípio ordenador a partir dos sons musicais: o princípio de que as
relações intervalares são de ordem físico-matemática, ampliando tal princípio
para todo o cosmos, incluindo os astros e o mundo humano (a pólis). Trata-se
do mundo visto como ordem harmônica. A música seria o agente regulador da
harmonia cósmica, que, por sua vez, ressoaria na ordem social.
O conceito de harmonia estendido às diferentes esferas da existência
– a ordem epistêmica, ética e estética – passa a significar que verdade, virtu-
de e beleza expressam diferentes dimensões da harmonia, contidas no belo,
bom, justo e verdadeiro ou, conforme o princípio da Paidéia (formação dos
jovens): a busca do ideal do kalós kai agathós,o belo e o bom. Esse conceito
de harmonia deriva da matriz cosmogônica expressa pelas propriedades dos
sons musicais contidos nas séries harmônicas. Na verdade, os gregos não 14
Ditirambo do grego
concebiam a música como arte, como hoje a concebemos, mas como o que ditýrambos:
então se concebia como ciência. Era uma ode entusiástica
de intenso teor apaixonado,
b) O teatro entoada por um coro e
constituída por uma narrativa
O drama
recitada pelo corifeu, espécie
Outra rica herança deixada pelos gregos refere-se às artes cênicas. O anti- de solista; a parte coral
era de responsabilidade
go teatro grego teria forte procedência nos cultos dedicados a Dioniso, deus
de personagens vestidos
grego (Baco para os romanos) da festa e do prazer, da desmesura e da em- de faunos e sátiros (figura
briaguês. Filho de Zeus com a princesa Sêmele, foi o único gestado com híbrida, meio homem, meio
uma mortal. Durante as celebrações em sua honra, em meio a procissões e bode), acólitos do deus
Dioniso, importantes figuras
com o auxílio de fantasias e máscaras, eram entoados cânticos, ditirambos14,
nos cultos a ele dedicados.
que, mais tarde, deram formas às representações plenamente cênicas como
hoje a conhecemos mediante encenações consagradas.
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MIRANDA, D. S. de
A Arquitetura
Para as representações cênicas, os gregos contavam com uma imensa in-
fraestrutura de espaço. Eram grandiosas edificações feitas no declive das
encostas rochosas, com excelente aproveitamento do cenário natural e com
centenas de degraus feitos de pedra para a assistência: tratava-se de uma
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MIRANDA, D. S. de
Seus primeiros templos foram edificados no século VII a. C., sob forte infuxo
das plantas das casas micênicas que apresentavam um compartimento central
envolto por colunas, em forma de cabana de madeira, pedras ou tijolos de argila.
Os templos com colunas de pedras só foram construídos depois do
século VI, com a missão de proporcionar uma residência ao deus homenage-
ado, representado por sua estátua, com a comunidade reunida em torno dos
altares erigidos para a execução dos sacrifícios.
Ao contrario da monumentalidade típica da arquitetura oriental, o templo
grego caracterizava-se pela multiplicidade de suas formas e simplicidade de
seu sistema construtivo, constituindo-se numa das mais grandiosas edifica-
ções da arquitetura religiosa (v. texto complementar sobre a arte simbólica e a
arte clássica na concepção da estética do filósofo Hegel)
A planta nuclear do templo era formada pelo pronau. Todo esse núcleo
era envolto por uma série de colunas chamada peristilo. Com variações míni-
mas de uma região a outra, a planta arquitetônica dos templos contava com
três compartimentos: uma sala central retangular – nãos - de maior dimen-
são (onde ficava a imagem do deus), precedida de um pórtico – pronau -,
e seguida de um aposento posterior - opistodomo.
A colunata exterior podia possuir algumas fileiras de colunas na frente
ou atrás do templo ou rodeá-lo completamente, formando o peristilo mencio-
nado. Em cidades muito prósperas, o peristilo podia contar com duas séries
de colunas em torno do núcleo do templo. Sua função era suportar o peso da
cobertura de duas águas, construída normalmente em madeira. O templo er-
guia-se solidamente sobre uma base de pedra, o estereobato, o degrau mais
elevado de um lance de três.
Do telhado inclinado em duas águas, configurava-se, no pórtico de en-
trada e nos fundos, um espaço triangular sobre a cornija (parte superior do
entablamento onde se encaixa o telhado), nas partes que se opunham em seu
comprimento. Esse espaço, denominado de frontão, era ornado com escultu-
ras de figuras divinas, animais, cenas da vida cotidiana.
Arcos e abóbodas estão ausentes, pois o que ressaltava eram as li-
nhas retangulares. O núcleo do templo era fechado, formado por um ou mais
compartimentos onde era colocada a estátua da divindade homenageada.
As paredes dos templos poderiam receber desenhos, mas nada dessa arte,
como veremos adiante, foi conservado e chegou até nós. As colunas susten-
tavam um entablamento horizontal que continha um frontão. Esse conjunto
era construído segundo os modelos das ordens dórica, jônica e, posterior-
mente, a coríntia. Ao contrário desse conjunto, cujas colunas apresentavam o
fuste arredondado e liso ou com caneluras, havia edificações onde estátuas
externas ao núcleo do templo desempenhavam o papel de sustentar o enta-
blamento denominadas de cariátides.
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História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
Texto complementar
Texto 1
“Para Nietzsche, os gregos criaram a filosofia porque não teriam temido o dilaceramen-
to, a dualidade, o lado cruel e sombrio dos humanos e da natureza. Longe de serem os
homens da moderação ou da medida, seriam as criaturas da desmedida - a hybris- e da
luta sem tréguas entre os contrários - do agón, palavra grega que significa: batalha, luta,
jogo, disputa interminável entre os opostos. Os gregos, antes de inventarem a filosofia,
inventaram o que daria origem a ela: a tragédia.
Que é a tragédia? Culto religioso (só depois transformado em obra teatral), a tragédia
narra a morte e o renascimento do deus Dioniso e, ao narrá-los, expõe o princípio bárba-
ro, cruel, desmedido, de embriaguez e pessimismo, de lutas subterrâneas entre poderes
titânicos na batalha do sofrimento para fazer sair da indiferenciação caótica da matéria a
individuação organizada das formas. O princípio que guia a tragédia é a desumanidade e a
barbárie que fecundam o espírito grego, dando-lhe seu momento ou princípio dionisíaco.
Ao lado do princípio dionisíaco, oferecido pela tragédia, os gregos, afirma Nietzsche,
inventam um outro princípio, contrário e oposto ao primeiro, responsável pelo surgimen-
to da filosofia: o princípio da luminosidade, da forma perfeita, da individuação, da medi-
da ou moderação e da serenidade, figurado por Apolo, deus da luz e da palavra, patrono
da filosofia. Esse princípio é denominado por Nietzsche de apolíneo.
A antítese insuperável entre o dionisíaco e o apolíneo governaria o espírito dos gregos.
Somente por terem sido conquistadores cruéis, escreve Nietzsche, senhores de escravos,
dominadores de outros povos, animados pelo espírito agonístico da luta, da disputa e do
jogo, movidos pelo impulso das desarmonias da desmedida, divididos em suas cidades em
dezenas de facções contrárias sempre em guerra, puderam colocar como ideal inalcançável
o apolíneo: a estatuária, a poesia lírica e épica e a filosofia exprimiriam a busca desse ideal de
luz e serenidade, contrária à realidade brutal e sangrenta da vida grega”. (CHAUÍ, 2002, p.27)
Texto 2
Arte simbólica ou oriental: para o filósofo Hegel o simbolismo da monumentalidade orien-
tal é uma espécie de protohistória da arte, em que religião e arte encontram-se “promiscu-
amente” enredadas. Na arte simbólica “a ideia [conteúdo da obra de arte] é abstrata, não
encontrou ainda a forma absoluta; e a forma em que aparece é lhe exterior, inadequada,
não passa de matéria natural, de sensível em geral” (HEGEL, 1993, p. 49). Corresponde
ao momento do universal abstrato. O Espírito criador aspira a infinitude de modo ainda
inadequado, numa abstração que impede de constituir um sensível apropriado na finitude.
Para materializar o Universal no particular sensível, o protoartista constrói figuras
colossais. A arquitetura, a mais pesada das artes, é a primeira e mais adaptada a essas
concepções e atributos fantásticos do sagrado. O sensível desmesurado subjuga o espi-
ritual. “Na arte simbólica temos, de um lado, a ideia abstrata, e de outro lado, as forças
materiais que lhe não são adequadas. A ideia indefinida, a ideia infinita apropria-se da
forma e esta apropriação de uma forma que lhe não convém tem todos os aspectos de
uma violência” (p. 49). A arte dessa fase “pertence à categoria do sublime, e o sublime
define-se pelo esforço de exprimir o infinito [...] A expressão não passa de tentativa, de
ensaio, que produzirá gigantes e colossos, estátuas com mil braços, e mil corpos” (p. 50).
As fantásticas forças da natureza, ainda impenetráveis para a compreensão do ho-
mem, e a elas subjugado, constituem, para Hegel, a mais arcaica concepção do absoluto.
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MIRANDA, D. S. de
Essa etapa, que Hegel denomina de panteísmo oriental ou religião da natureza, é uma
espécie de protohistória da arte. A forma sensível se justapõe, ou melhor, se impõe arbi-
trária e inadequadamente à ideia. “O simbolismo caracteriza-se por uma diferença entre
o fora e o dentro, por uma falta de apropriação entre a ideia e a forma incumbida de a
significar, pelo que esta forma não constitui a expressão pura do espiritual. Uma distân-
cia afasta ainda a ideia de sua representação” (p. 50).
Arte clássica: esta sucede à arte simbólica. Momento de eticidade da Cidade grega,
onde se busca a perfeita harmonia entre os fins da individualidade e da comunidade atra-
vés da pólis. Essa nova concepção, que vê uma unidade harmoniosa entre o indivíduo e a
pólis, deve, de preferência, ser expressa somente na própria forma humana, e não mais
por símbolos naturais, como na etapa anterior. Aqui, existe livre adequação de forma e
da ideia, do conceito e de sua representação sensível. Nesse estádio superior da história,
as relações entre os homens e a natureza são mediadas pelo social. “Na arte clássica, o
sensível, o figurado, deixa de ser natural” (p. 51).
As forças supremas são as da pólis e não as da natureza, quando os deuses não são mais
forças naturais, como no simbolismo, mas têm um caráter social, fundadores que são da co-
munidade política. Aqui o homem se acha em harmonia com o mundo, o sujeito se sente em
sua casa, no objeto de arte. Esse momento, que Hegel denomina as religiões da individualida-
de espiritual, reveste-se de uma tensão entre o temporal e o espiritual. O sensível enquanto
forma, deve ser purificado, livre dos liames que o aprisionam à miserável finitude, e, a um só
tempo, a espiritualidade deve se expressar de forma exaustiva nas figuras humanas, porém
sem se identificar completamente, sem se confundir inteiramente com o sensível.
Se a arquitetura pesada representa, por excelência, a protoarte do simbolismo, a arte
clássica encontra na escultura o perfeito equilíbrio entre a significação interna do espiritual e
a forma externa sensível. Hegel enaltece a estatuária grega que criou um ideal do belo e do
bom (ideal grego das formas harmoniosas do kalós kai agathos (belo e bom). “Hegel, em belas
páginas, mostra que o ‘perfil grego’ é o tipo de rosto mais distante da animalidade: enquanto
o corpo animal existe somente em vista de fins naturais [...], o corpo e o rosto humanos, na
escultura grega, exprimem a perfeita harmonia do homem” (GARAUDY, 1993, p. 176)
sas durante as Guerras Médicas, a partir de 443 a. C., é objeto de uma extraor-
dinária recuperação, tendo sido reconstruída, sobretudo, sua bela arquitetura.
O Partenón, templo situado na acrópole de Atenas e dedicado à deusa
Atena, tendo em todo seu redor a majestosa colunata com elementos dóricos
e jônicos e esculturas do artista Fídias, é certamente o monumento que me-
lhor simboliza o esplendor da arte desse período.
São citações que nos fazem concluir que o conceito de belo ligado à
simetria, à ordem e à harmonia é um postulado geral da estética aristotélica. 16
Ekklésia: principal
Portanto, o atributo de beleza é inerente aos objetos, decorre tão somente de assembleia popular da
certa harmonia ou ordem existente entre as partes desses objetos entre si, democracia direta de Atenas,
com a participação dos
constituindo um todo uno. Além disso, para um objeto ser belo exigia-se ainda cidadãos (atenienses do
que tivesse certa grandeza ou imponência, mas que não comprometesse os sexo masculino acima de 18
atributos de proporção e medida, o que foi evidenciado nas citações acima. A anos), para deliberar sobre
diferentes assuntos como a
recorrência de Aristóteles à harmonia e à articulação proporcional das partes legislação sobre a guerra ou a
num todo ordenado deu origem a uma célebre assertiva dos seus seguidores, paz, julgamento de pessoas,
que costumam dizer que “a beleza consiste em unidade na variedade”. O ob- nomeação de magistrados,
dentre outros. A ekklésia foi
jeto belo dependente de suas propriedades expressas na ordem e harmonia
instituída por Sólon, em 594 a.
entre suas partes, constituindo um todo belo, nada tinha a ver com sua partici- C., e suas reuniões ocorriam
pação na ideia de uma beleza absoluta, como em Platão. inicialmente uma vez por
mês sendo, posteriormente,
Segundo Aristóteles, o cosmos se originou do caos, ao ser regido pela realizadas com maior
harmonia, conceito nascido da estética musical da escola pitagórica. Entre- frequência.
tanto, vestígios do caos original debatem com o desejo incessante de ordem. Ágora: praça aberta, principal
O belo imbricado com o conceito de harmonia será um importante legado, espaço público da pólis para
como veremos, para a arte renascentista, que a enxerga como uma espécie múltiplas atividades como as
reuniões da ekklésia, mercados
de “conveniência sensata”, constitutiva por conhecimentos científicos e racio- e feiras livres, tribunais. A ágora
nais. Em síntese, para a estética aristotélica, constitui o belo a concordância tornou-se a representação, por
das partes, sua harmonia, um cálculo matemático para a composição do todo excelência, do espaço público
para o exercício da democracia
que não admitia a contradição. direta grega. Sua instituição
Concluindo, podermos dizer que os dois grandes filósofos gregos, a estendeu-se posteriormente
despeito de suas diferenças, têm em comum uma concepção objetiva do para o mundo greco-romano.
belo, a saber, a beleza é um atibuto constitutivo do próprio objeto e jamais uma Arkhé: palavra com dois
sentidos básicos: 1) o que está
doação de sentido estético que parte do olhar contemplante, conforme será na frente de tudo e que, por
posteriormente tematizado pela estética racionalista da modernidade. isso, é o começo, o princípio
de tudo; 2) o que está à
As doutrinas estéticas subsequentes são, em verdade, continuadoras,
frente e que, por isso, tem o
via de regra, de modo eclético, das estéticas platônicas16 e aristotélicas. Da poder sobre todo o restante.
tradição clássica grega ao final do século XVIII, a beleza era vista como uma No primeiro sentido, o termo
propriedade constitutiva dos objetos belos, a exemplo de um quadro, uma significa fundamento, princípio
e origem, causa primeira, o
sonata, um poema, uma escultura. que está no começo de modo
absoluto, ponto de partida.
No segundo sentido o termo
significa comando, poder,
autoridade, dando, assim,
origem a palavras como
monarquia (poder de um) e
oligarquia (poder de poucos).
(v. CHAUÍ, 2001, p. 496/497)
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MIRANDA, D. S. de
Síntese do Capítulo
Esta unidade examinou as manifestações artísticas de um largo período his-
tórico iniciado com as primeiras organizações civilizatórias sedentárias, às
margens dos vales férteis da Mesopotâmia e do Egito, que propiciam a emer-
gência de obras de arte, como a arquitetura de templos, pirâmides e câmaras
funerárias, a escultura, a pintura e o mobiliário decorativo, cujos estilos, no
curso do tempo, provocarão influências e sofrer expressivas modificações,
mormente as realizadas pela arte da antiga Grécia, cujo apogeu dar-se-á no
chamado “século de Péricles”.
A análise sóciohistórica da arte grega apresentou-se articulada às dou-
trinas estéticas dos principais pensadores da filosofia grega, a exemplo da
cosmologia pitagórica sobre a música, a teoria socrático-platônica e aristoté-
lica sobre a arte, de um modo geral, e sobre o belo, de um modo particular,
enfatizando algumas de suas principais diferenças.
Atividades de avaliação
1. Levando em conta as manifestações artísticas dos povos nômades (v. Uni-
dade 1), analise a importância que se pode atribuir ao papel exercido pelos
vales úmidos das primeiras civilizações sedentárias na realização artística
dos povos antigos.
2. Apresente os principais argumentos que buscam explicar o surgimento do
pensamento filosófico na antiga Grécia.
3. Elabore um quadro comparativo entre o pensamento mítico do chamado
período homérico e a filosofia do período arcaico (pré-socrático), e suas
repercussões para o quadro das artes das respectivas épocas.
4. Apresente os principais aspectos da tragédia grega, levando em conta a
análise crítica do filósofo Nietzsche.
5. Analise o chamado “século de Péricles”, levando em conta as diferentes formas
de manifestação da cultura, das artes e da filosofia do período em questão.
6. Levando em conta todo o conteúdo apresentado pela unidade, bem como o
teor dos filmes abaixo indicados, elabore um pequeno texto a partir de uma
questão problematizada formulada por você mesmo, e procure respondê-
-la desenvolvendo uma reflexão de forma bem pessoal.
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História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
@
Leituras, filmes e sites
Livros
Ilíada e Odisseia de Homero
A República (Livros III e X) de Platão
A Poética de Aristóteles
Sites
Graça Proença, Editora Ática, 2001. Site:
www.aticaeducacional.com.br/imagens/complementos/hda/img/imagem26.swf
Filmes
A Odisséia (1997): do diretor Andrei Konchalovsky, megaprodução de Fran-
cis Ford Coppola adaptada da narrativa mítica atribuída a Homero, em que o
herói Odisseu (Ulisses) enfrenta várias vicissitudes, muitas provocadas pela
fúria dos deuses e monstros mitológicos, saindo-se sempre vitorioso, graças
às suas ardilosas estratégias e coragem, em sua viagem errática de volta ao
seu reino na ilha grega de Ítaca, onde sua fiel esposa, Penélope, o aguarda,
desde sua partida para a guerra de Tróia.
Os dois filmes abaixo indicados são duas obras que podem ser vistas
como abordagens distintas que representam as respectivas concepções dos
filósofos Platão e Aristóteles sobre arte:
Morte em Veneza: (do cineasta italiano Luchino Visconti, a partir do romance
homônimo do escritor alemão Thomas Mann) o filme apresenta uma nítida fi-
liação à estética platônica, conforme atesta a paixão do músico alemão (escri-
tor no original) Gustav von Aschenbach pelo belo adolescente polonês Tadzio,
ocorrida durante suas férias em Veneza no início do século xx, tomada pela
peste; o filme trata de uma ideia de belo que parece nos remeter à noção da
beleza em si do mundo das ideias e das formas perfeitas.
Agonia e êxtase: (do cineasta inglês Carol Reed, baseado no livro de Irving
Stone) o filme aborda a relação tensa e conflituosa entre Michelangelo e o
Papa Júlio II, que lhe encomenda a pintura do teto da capela Sistina. O filme,
em determinado, momento apresenta uma cena de nítida filiação aristotélica:
o artista, ao ser interpelado pelo arquiteto Bramante, que o recriminara sobre
seu gesto de alisar o grande bloco de mármore, pronunciando o nome do
profeta Moisés quando existia apenas um bloco de pedra, teria dito: “Moisés já
está no mármore. Eu apenas o libero”. Ou seja, a matéria mármore já contém,
em potência, a escultura de Moisés, que a ação do artista efetiva em ato. Este
filme é também indicado para a Unidade IV, por apresentar interessantes ce-
68
MIRANDA, D. S. de
Referências
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Das Letras. 2001.
CUNHA, Newton. Dicionário do SESC A Linguagem da Cultura. São Paulo:
Editora Perspectiva. 2003.
GARAUDY, Roger. Para Conhecer o Pensamento de Hegel. Porto Alegre:
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GAZONI, Fernando Maciel. A Poética de Aristóteles: tradução e comentá-
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GOMBRICH, E.H. A história da arte. Tradução de Álvaro Cabral, 15ª edição.
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HEGEL Estética. Lisboa: Guimarães Editores. 1993.
NIETZSCHE, Friedrich. O nascimento da tragédia SP: Perspectiva. 1994.
PESSANHA, José Américo M. “Platão: as várias faces do amor” in Os Senti-
dos da Paixão. São Paulo: Companhia Das Letras. 1989.
PROENÇA, Graça. História da Arte. Sâo Paulo: Ática. 1989.
VERNANT, Jean-Pierre e VIDAL-NAQUET, Pierre. Mito e Tragédia na Gré-
cia Antiga. São Paulo: Livraria Duas Cidades, 1977.
WISNIK, José Miguel O Som e o sentido. S.P.: Cia Das Letras, 2001.
História da Arte: da Pré-história até a Arte Contemporânea. (DVD e folheto).
Edição: Grupo Cultural.
69
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
Capítulo 3
Do Helenismo ao
Medievo Cristão
71
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
Objetivos
• Examinar as artes de um largo período que se inicia com o grande império
de Alexandre Magno, responsável pela unidade cultural obtida em todo seu
território, denominada helenismo.
• Analisar da integração da cultura helênica no mundo latino, constituindo o
classicismo greco-romano. Será também analisada a difusão da arte cristã,
com suas diferentes linguagens e estilos por todo o medievo europeu.
1. O surgimento do Helenismo
A civilização grega, ao estender sua hegemonia política e econômica, bem
como sua cultura e artes a vários povos, feito sob o domínio do reino da Ma-
cedônia, com Filipe II, e pelas conquistas de Alexandre Magno e, depois, sob o
domínio romano, constrói uma civilização universal, ampliando e influenciando
todo o Mediterrâneo, compreendendo a parte ocidental da Ásia Menor, o mar
Negro, o Oriente Próximo e Médio e o norte da Europa continental e insular.
As trocas comerciais com o Oriente se expandiram e a posição social
derivada dos ativos financeiros adquiriu grande importância, maior do que a
pertinência tradicional a famílias. Como resultado, imprimiu-se uma mobilida-
de socioeconômica sem precedentes, trazendo consigo modificações cultu-
rais inevitáveis.
Com todas essas modificações, estabeleceu-se, pela primeira vez, um
verdadeiro commercium litterarum et artium, um intercâmbio cientifico, artístico
e intelectual até então inimaginável. A partir daí, verificou-se a primeira grande
experiência civilizatória do multiculturalismo, a oikoumene (termo greco-romano,
cujo sentido é mundo habitado) ou "civilização comum", baseada num só direito
e numa só língua (a koiné, variante simplificada do grego ático, usada, sobretudo,
durante o império romano), com a participação da latinidade romana.
Instituiu-se uma organização societária regionalmente agrupada por
corporações profissionais que acabou por desenvolver um pensamento cos-
mopolita que se abriu a Leste e a Oeste e que, a um só tempo, passou a
influenciar tais áreas intelectual e artisticamente.
72
MIRANDA, D. S. de
1) A Afrodite nua do escultor Praxíteles tornou sua obra mais famosa. Com-
prada pela cidade de Cnido, ficou conhecida como Afrodite de Cnido, cuja
cópia romana encontra-se em Roma (Museu do Vaticano). Nela, é possível
observar o estilo clássico de Policleto, presente em O Doríforo, em que o
artista opõe membros tensos e relaxados, combinando-os com o tronco
onde tais movimentos se refletem. Porém, tal princípio, aplicado às formas
arredondadas femininas, transparece um forte toque de sensualidade.
2) Nesse mesmo século IV, o
escultor Lisipo cria a Afrodite
de Cápua, cuja cópia romana
encontra-se no Museu de Ná-
poles. A estátua representa a
deusa com o tronco despido e
a parte inferior do corpo coberto
com uma túnica toda drapeada,
segurando um escudo onde ad-
mira a imagem refletida de sua
própria beleza, trabalho que irá
servir de modelo para outras es-
culturas, conforme veremos no
exemplo a seguir.
3) No século II a. C., surge cer-
tamente a mais célebre escul-
tura do período: a Afrodite de
Melos ou a Vênus de Milo para
Figura 24 – Vênus de Milo
os latinos, cuja designação tor-
nou-se mundialmente conhecida. Essa obra parece culminar a síntese
das características das duas obras anteriores, ao combinar a nudez par-
cial da Afrodite de Cápua, de Lisipo, com o princípio de Policleto aplicado
à Afrodite de Cnido, de Praxíteles.
A busca de uma maior mobilidade nas esculturas parece demarcar o
estilo dos artistas do início do século III a. C, que aparenta querer conduzir o
olhar do observador a percorrer o entorno das obras e, assim, atingir um tipo
de contemplação de 360 graus. Um belo exemplo dessa nova tendência é a
Vitória de Samotrácia. Existe a hipótese de que a escultura estaria atada à
proa de um navio líder de uma frota. As formas da figura alada de uma mu-
lher, personificando o desejo de vitória, induziriam tal hipótese: a túnica agitada
pelo vento, as asas abertas ligeiramente voltadas para trás e o impressionante
drapeado das vestes coladas ao corpo, são indícios configuradores de uma
forma feminina aérea e flutuante, dando forte sugestão de movimento.
76
MIRANDA, D. S. de
2. O surgimento de Roma
O surgimento de Roma já aconteceu envolto em lendas e narrativas míticas.
Segundo a mitologia romana, Rômulo, junto com seu irmão gêmeo Remo, seria
seu fundador e seu primeiro rei. Tradicionalmente a data da fundação de Roma
é atribuída ao ano de 753 a. C. Os dois gêmeos eram filhos do deus da guerra
Marte com a vestal Reia Sílvia, descendentes de Eneias, um troiano sobrevi-
vente da guerra de Tróia que, depois de uma viagem errática pelo Mediterrâneo,
teria aportado à região atual da Itália. Segundo esse mito, Eneias seria o ances-
tral de todos os romanos. A Eneida, poema épico de Vírgilio, narra a epopeia do
herói, depois de Tróia destruída. Encomendado pelo imperador Augusto, o po-
ema pretende ser uma versão latina da obra de Homero, a Ilíada e a Odisseia.
De origem obscura, os etruscos eram habitantes da antiga Etrúria, região
setentrional da península itálica, ocupando boa parte dela entre os séculos XII e VI
a.C. Mas eles não se limitaram à Etrúria e chegaram Lácio, região onde iria se loca-
lizar a futura Roma. Portanto, o domínio da civilização etrusca sobre grande parte da
península itálica, inclusive a parte romana, perdurou mais de seis séculos.
De forma bem sintética, podemos dizer que a arte romana, portanto,
sofreu duas fortes influências: a da arte etrusca, voltada de preferência para
a expressão mais realística da vida, e a da greco-helenística, orientada para
a expressão de um ideal de beleza, perseguido por muitos de seus artistas.
Porém, o legado artístico etrusco mais relevante deixado aos romanos
foi o uso do arco e da abóbada em suas construções, dois elementos arqui-
tetônicos desconhecidos na Grécia. Com esses dois elementos, os romanos
ampliaram os espaços internos, sem utilizar colunas, o que era próprio, por
exemplo, dos templos gregos.
Sem o uso do arco, o vão entre as colunas era delimitado pelo tamanho
do mesmo, cujas distâncias entre elas não podiam ser muito grandes: quanto
maior era a viga, maior a tensão sobre ela. E o uso frequente de materiais
rochosos mais resistentes como a pedra não suportava grandes tensões. Daí
o uso característico das colunatas dos templos gregos, ocasionando a redu-
ção do espaço de circulação. Com o uso do arco, permitiu-se ampliar o vão
entre as colunas, pois seu centro não ficava sobrecarregado, visto que o peso
encontrava-se distribuído de modo homogêneo sobre ele. Como o arco era
construído com blocos de pedra, a própria tensão desses os fazia serem com-
primidos uns contra os outros, dando ao arco maior estabilidade.
79
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
administrar com êxito a magnitude de seu território foi preciso encontrar solu-
ções eficazes, como o uso de novos materiais e procedimentos construtivos.
Premidos pelas circunstâncias históricas, os romanos aprenderam a ser exce-
lentes construtores, aliando em suas edificações, o pragmatismo de seus fins
com novos valores estéticos, conforme veremos.
Texto complementar
O Século de Augusto
Análogo ao século de Péricles, a civilização romana teve também seu correlato com Caio Julio
César Otaviano Augusto, cujo império cobriu um período de 40 anos, marcando uma das épo-
cas mais brilhantes da civilização romana. Após conhecer o poeta Virgílio, o imperador passa a
financiar sua arte. Além desse, favorece também o historiador Tito Lívio, o arquiteto Vitrúvio
e vários outros literatos, contando para a ampliação de seu patrocínio às artes e letras com a
parceria do seu ministro, Caio Mecenas.
Assim, no campo cultural, o Século de Augusto foi rico, cheio de promessas criadoras, inau-
gurando uma época clássica para a arte europeia, um classicismo latino que, mil anos depois, no
período renascentista, ainda dava frutos. Nessa época, foram fundadas várias bibliotecas públi-
cas, a literatura latina, anteriormente colada ao modelo grego, ganhou autonomia, tornando-se
uma das mais brilhantes da cultura ocidental. Como vimos, foi de fundamental importância,
para as artes, a sua aliança com o rico cidadão e estadista romano Caio Mecenas. Ao administrar
a grande fortuna familiar tornou-se hábil conselheiro de Augusto César. Retirado da vida políti-
ca, empenhou-se intensamente na proteção generosa das artes, incluindo, no seu círculo lite-
rário, famosos homens das letras como Horácio e Virgilio. Augusto construiu o fórum, que leva
seu nome, as primeiras termas, no campo de Marte, e vários templos, como o dedicado a Roma
e a ele próprio por todo o império. A Roma de Augusto tornou-se conhecida como “cidade de
mármore”. Ergueram-se templos à deusa Roma e a Augusto por todo o império.
O século de Augusto se notabilizou também por ter iniciado a Pax Romana ou Pax Octa-
viana, expressões latinas para designar a situação de relativa paz do Império, iniciada quando
Augusto César, em 27 a.C., declarou o fim das guerras civis, o que nem sempre foi obtido, e que
teria perdurado até 180 da era cristã, sob o império de Marco Aurélio. Mas a pax que caracteriza
o período deveu-se à neutralização das constantes investidas dos povos do Norte, os chamados
povos bárbaros, graças à ocupação das províncias por exércitos permanentes que impunham a
ordem, reprimindo pela força, qualquer tentativa de revolta. Apesar de seu caráter violento, a
pax romana proporcionou uma época de relativa estabilidade e prosperidade, durante a qual a
civilização romana se estendeu a todo o Império, consolidando assim o processo de romaniza-
ção do mundo sob seu domínio.
Vários historiadores atribuem a este período de relativa tranquilidade e paz – fincado em
certa unidade cultural propiciada pela mesma língua (o koiné, espécie de grego popular) e pelo
mesmo sistema jurídico e administrativo, bem como pelo intenso comércio e convívio entre os
vários povos –, as condições objetivas para a difusão do protocristianismo.
81
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
do fundo da construção. Com isso, estabelecia-se claramente sua diferença em que compõem a cúpula [do
relação aos templos gregos que se preocupavam em fazer da frente, fundo e la- Panteão] vão diminuindo
terais, partes equivalentes, duas a duas, em sua arquitetura. Existe outra distinção à medida que se aproxima
do centro. Esse recurso
marcante na concepção arquitetônica das duas civilizações: enquanto a grega aumenta a sensação de
edificava templos para sua contemplação externa, a romana preocupava-se mais perspectiva e termina numa
com seus espaços interiores. O Panteão, construído no reinado do Imperador abertura de 9 metros de
Adriano (117 - 138 d.C.), é um flagrante exemplo dessa característica. Marcos diâmetro, permitindo a
Agripa, genro de Otávio Augusto, teria iniciado sua construção em 27 a. C. entrada da luz natural que
torna o ambiente interno
O pragmatismo romano levou não apenas à tolerância da diversidade claro e leve, apesar da
de culto, mas chegou a edificar um templo onde se pudesse encontrar está- monumentalidade da
tuas de suas divindades. O Panteão (do grego pántheon18, todos os deuses) construção”. (PROENÇA,
possui uma planta circular fechada por uma cúpula, criando um local isolado 1989, p. 40)
do exterior, propicia um clima de recolhimento para o culto. Considerado como
o maior monumento representativo da arquitetura greco-romana que chegou
intacto até nossos dias, passou a ser um templo cristão a partir do século VI.
3.2. O teatro
Devido ao uso de arcos e abóbadas herdado dos etruscos, foi permitido, aos
romanos, construir edifícios muito mais amplos do que os de influência grega,
sobretudo quanto a seus anfiteatros, destinados a abrigar um número bem
maior de pessoas graças à alteração feita na planta grega.
Os construtores romanos, ao justapor fileiras de arcos, conseguiram
um sólido e seguro apoio para construir o auditório, uma grande arquibanca-
da para receber publico. Com tal procedimento, liberaram-se das encostas
rochosas das colinas, conforme o projeto grego, tendo como consequência
imediata a possibilidade muito mais flexível de erigir teatros em qualquer local,
independentemente de sua topografia.
Partindo do uso do arco e da abóbada como um dos recursos caracte-
rísticos de sua arquitetura, os romanos usaram ainda como suporte grossos
pilares. Além da pedra, empregaram com frequência o tijolo, mais flexível e
barato. Mas foi o opus caementicium, o concreto antigo, sua grande descober-
ta, espécie de argamassa líquida de cal, areia, partes de pedra e água, mistu-
ra que se consolidava e endurecia rapidamente, permitindo grandes projetos.
Armado o esqueleto da construção, recobriam-na em muitos casos, com már-
more e pedra, criando grandes espaços internos.
Como o povo romano apreciava as lutas dos gladiadores, o espetáculo
possuía boa visibilidade independente do ângulo que era usado, cuja ação se
82
MIRANDA, D. S. de
dava numa arena, espaço circular elíptico circundado por muros radiais, e um
gigantesco auditório composto por um grande número de filas de assentos,
formando uma arquibancada.
O subterrâneo da arena contava com um complexo sistema de galerias,
passadiços, depósitos, celas para os animais e mecanismos para elevar, à
arena, os homens e animais. Todas as cidades possuíam um anfiteatro, mas,
com toda certeza, o mais grandioso e belo foi o Flavio (século I d. C.), mais
conhecido como o Coliseu de Roma, com uma capacidade de aproximada-
mente 75.000 lugares. Nos seus alicerces foi utilizado o opus caementicium e
nos pilares e na fachada, blocos de pedra.
Externamente o edifício apresentava uma combinação de arcos entre
colunas e entablamentos, apresentando, em sentido ascendente, uma sobre-
posição de ordens toscana, jônica e coríntia. As colunas eram, na verdade,
meias colunas, pois ficavam atadas à estrutura das arcadas, não exercendo,
portanto, a função de apoio à construção, mas apenas, de ornamentação.
3.3. A escultura
Inicialmente, a admiração dos romanos dirigida à arte grega não impediu que,
graças às suas características culturais pragmáticas, procurassem caminhos
estéticos diferentes. Tendo herdado o realismo da arte etrusca, eles produzi-
ram esculturas que são uma representação fiel das pessoas e não do ideal de
beleza humana, conforme perseguiam os gregos.
No entanto, mediante o contato mais
frequente com esses últimos, os escultores
romanos sofreram forte influência das con-
cepções helenísticas a respeito da arte,
sem abdicar um interesse muito próprio e
peculiar: representar os traços individuali-
zadores da pessoa retratada. Ocorreu as-
sim uma síntese entre a concepção artísti-
ca romana e grega, o que se pode verificar
na estátua de Augusto (c.19 a. C).
Seu autor teria se inspirado no Dorí-
foro de Policleto (sempre ele) como para-
digma de beleza escultórica, porém com
algumas alterações para adaptá-la ao gosto
romano. A obra procura captar as reais fei-
ções de Augusto, vestindo-o com uma cou-
raça e uma capa romanas. Seu olhar fixo Figura 27 – Gaius Iulius Caesar Oc-
com o braço direito estendido como se diri- tavianus Augustus
gisse aos seus súditos e sua perna esquerda levemente dobrada lhe dão mais
flexibilidade e movimento.
83
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
dos povos bárbaros, principalmente das tribos germânicas do norte que, cada
vez mais, investiam a partir das suas fronteiras. A impossibilidade de manter
unificado o imenso Império, que mais e mais se expandia, levou o Imperador
Teodósio I (395) a dividi-lo entre os dois filhos, o que foi feito após sua morte:
Honório ficou com a porção ocidental, capital Roma, e Arcádio ficou com a
porção oriental, capital Bizâncio, depois Constantinopla, em homenagem a
Constantino, o primeiro imperador a aderir ao cristianismo21. São diversas as
causas atribuídas à queda do Império Romano, dentre elas, as constantes
guerras intestinas e as frequentes investidas dos bárbaros cada mais vez di-
fíceis de serem mantidos nas linhas dos limes. Era o início do declínio do
grande Império. Durante o século V, Roma foi invadida e saqueada diversas
vezes até que, em 476, perde o domínio do seu vasto território do Ocidente
21
Reza a tradição que a para Odroaco, chefe da tribo germânica dos hérulos, que invade a Itália e
adesão de Constantino à depõe Rômulo Augusto, o último soberano do Império Romano do Ocidente.
fé cristã deu-se logo após A intensa vida urbana do período áureo do Império, resultado, dentre
a vitória sobre o Imperador
Maxêncio, na batalha da
outras coisas, do intenso comércio entre os vários povos dominados, adminis-
Ponte Mílvio (312), perto trados pelo pragmatismo de um competente sistema jurídico-organizativo, se
de Roma; Na noite anterior esvazia, dando lugar a um lento, progressivo e constante processo de rurali-
sonhara com uma cruz com zação. Para muitos historiadores, esta data marca o fim do longo período da
a seguinte frase em latim: in
Idade Antiga e o começo da Idade Méia.
hoc signo vinces (“sob este
símbolo vencerás”). Antes da
batalha, mandou pintar uma 4. As artes na alta Idade Média: o bizantino, o gregoriano
cruz em todos os escudos
dos soldados e obteve uma e os períodos merovíngio e carolíngio
vitória esmagadora, que
Constantino atribuiu ao Deus 4.1. A protoarte Cristã
cristão.
O nascimento e a propagação da fé cristã pelo Império, como se viu, se dá duran-
te o período da pax romana. Cedo, Roma passara a ser a residência do primeiro
papa, tornando-a também o centro da protocristandade. Porém, ao contrário do
pragmatismo tolerante com outras religiões, até Constantino, o Império Romano
perseguira cruelmente, em vários períodos, o cristianismo, devido, dentre outras
causas, ao combate à escravidão, crucial base do Império, bem como ao ques-
tionamento da divindade da figura do imperador. Contudo, a nova fé cristã passa
a ser a religião oficial do Império Romano, em 390, com Teodósio.
Para fugir das perseguições, os primeiros cristãos refugiavam-se nas
catacumbas, cemitérios subterrâneos, onde também praticavam o culto e pin-
tavam símbolos da religião como o peixe (ichtys em grego), na verdade as ini-
ciais da expressão Iesous Christos, Theous Yous Soter, isto é, “Jesus Cristo,
Filho de Deus Salvador”. Esse sinal cifrado da pessoa de Cristo e, a um só
tempo, espécie de código de identificação no interior da comunidade de fiéis
foi, de fato, a primeira imagem pintada da protoarte cristã. Quando a ocasião
lhes era propícia, os fiéis pintavam cenas das Sagradas Escrituras.
87
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
22
Cristo Pantocrátor (do grego
Outra convenção foi a lei da frontalidade, pela qual o olhar contemplante
pan + cratós, todo poder): na
podia observar a figura rígida do imperador e manifestar respeito e admiração iconografia bizantina o Cristo
por ela. Além dessa, várias outras normas foram estabelecidas, a exemplo da Pantocrátor é mostrado com sua
posição de cada personagem na composição total da obra, a indicação de como mão direita levemente inclinada,
em posição de bênção: o dedo
deveriam ser os gestos das mãos, a posição dos pés, o drapejado das vestes, os
polegar encontrata-se voltado
símbolos a serem utilizados, etc. Enfim, tudo já estava rigorosamente pré-determi- para o próprio Cristo, o médio
nado, restando, aos artistas, apenas a execução da obra. Esse cânone redundou e o indicador acham-se em
na ruptura com os padrões estéticos naturalistas de períodos anteriores (clássico posição oblíqua, quase vertical,
e helenístico), substituídos agora por formas sempre sagradas, cujas ideias de e os demais dedos estão
dobrados e fechados contra
representação divina não poderiam ser evocadas pelos critérios antigos. a palma da mão. O gesto da
Daí, além da lei da frontalidade, havia a prática generalizada da forma mão direita indica a dupla
natureza de Cristo: a humana,
solene de apresentar as personagens, uniformes em seus gestos, trajes e ex-
manifesta nos dois dedos
pressões, bem como o uso de simbolismos diversos da percepção cotidiana. erguidos, e a divina, indicada
A cor do céu, por exemplo, passou a ser constantemente dourada, sinalizando pelos três outros dedos unidos
para o homem mortal a busca do reino divino eternamente iluminado. A esta- nas pontas, o que representa
a sua participação na Trindade
tuária restringe-se apenas a imagens sagradas: o Cristo Pantocrátor22 (Cristo como Segunda Pessoa. A mão
todo-poderoso), a Virgem Maria, os apóstolos, os profetas, os santos e os esquerda sustenta as Sagradas
imperadores. Deriva daí o desprezo das artes plásticas para o corpo, conceito Escrituras. Esse gesto costuma
ser repetido pelas autoridades
e estética que acabam sendo disseminados para toda a arte medieval cristã eclesiásticas, desenhando um
que busca coibir qualquer expressão de corporidade e sensualidade, inclusive largo movimento em forma de
na música sacra gregoriana, conforme iremos ver mais adiante. cruz para abençoar os fiéis, a
exemplo da benção papal urbi
et orbe, direcionada à cidade de
Não existe arte menos sensual que a bizantina. A figura humana não é mais
Roma e ao mundo.
representada por si mesma, mas apenas como morada de um pensamen-
23
Têmpera e encáustica:
to religioso, de uma fé. A criação mais habitual [...] é a do asceta magro
“têmpera é o nome que recebe
e severo, as faces cavadas, olhos imensos, atitude dramática - eloquente um dos modos que os artistas
expressão do tipo monástico. (Paul Lemerle, apud CUNHA, 2003, p. 49) bizantinos utilizavam para
preparar a tinta usada em seus
Das linguagens artísticas bizantinas, quatro se destacam: os mosaicos ícones. Consiste em misturar
os pigmentos com clara de
(expressão máxima de luxo e suntuosidade), os ícones, os afrescos e a arquite- ovo, para facilitar a fixação das
tura, cujas técnicas chegaram a um grau de extremo requinte. O mosaico já era cores à superfície do objeto
conhecido pelos artistas egípcios, persas e romanos, mas, de uso preferencial- pintado. O resultado é uma
pintura brilhante e luminosa. [...]
mente decorativo, era destinado ao revestimento dos pisos das casas, templos Já a técnica da encáustica foi
ou termas, conforme vimos. O que o faz diferente é o estatuto de arte extre- utilizada desde a Antiguidade.
mamente sofisticada da pintura mural que os bizantinos lhe atribuíram. Quanto Os gregos usavam-na, p. ex.,
para colorir suas esculturas de
menores os cubos de pedra ou de vidro embutidos nas paredes, mais variados
mármore. O processo consiste
e ricos os efeitos policromáticos obtidos. Nos murais assim construídos, os artis- em diluir os pigmentos em
tas retratavam cenas da vida de Cristo, dos profetas e dos imperadores. cera derretida e aquecida no
momento da aplicação. Ao
Outro resultado extremamente requintado foi obtido pela técnica da arte contrário da têmpera, cujo
iconográfica bizantina23. Os ícones (do grego eíkon, imagem) eram pequenos efeito é brilhante, a pintura
quadros com personagens sagradas, pintados mediante o uso da encáustica, em encáustica é semifosca”.
(PROENÇA, 1989, p. 52)
mas, sobretudo, da têmpera, aplicada em superfícies de madeira ou metal: a pri-
90
MIRANDA, D. S. de
meira camada era totalmente dourada (procedimento muitíssimo usado, pela as-
sociação com o considerado maior bem existente na terra - o ouro), seguindo-se
a pintura da imagem; na sequência dava-se a retirada de parte dessa camada de
tinta, visando à revelação do traje das personagens e da auréola. Via de regra,
nos trabalhos que buscavam luxo e ostentação, os artistas usavam da colagem
de pedras preciosas ou semipreciosas, para, por exemplo, o adorno de coroas.
Na região euro-ocidental, os afrescos so-
mente iriam adquirir relevância na baixa Idade
Média, a partir do século XII, quando é difundida a
arte românica. Surgiram, na época, duas grandes
escolas: a cretense, que difunde sua influência
desde a região da Sicília ao norte da Itália, e a ma-
cedônica, cujos traços de maior rigidez e simpli-
cidade difundem-se sobretudo no Leste europeu.
O apogeu da arte bizantina foi alcançado
graças à riqueza obtida pelo desenvolvimento
econômico e pela centralização política do impé-
rio romano oriental, principalmente a partir do rei-
nado de Justiniano, apresentando as condições
objetivas para que a construção de vários edifí-
cios suntuosos – palácios, teatros, hipódromos,
Figura 29 – Cristo Panto- termas e, sobretudo, igrejas, – de concepções
crátor (Monastério de Santa arquitetônicas bastante inovadoras para a época.
Catarina) A basílica Hagia Shopia (Sagrada Sabedoria, co-
24
Medievo: do latim medium
nhecida como Santa Sofia), erguida entre 532 e
aevum, termo atribuído a 537, é um dos maiores triunfos da nova técnica bizantina, com uma cúpula de
pensadores da modernidade 55 metros apoiada em quatro arcos plenos. Com tal método, a cúpula passa
europeia para designar, a poder ser situada em nível extremamente alto, como que querendo se fundir
segundo eles, o período
intermediário de pouca
com a abóboda celeste, sugerindo universalidade e poder absoluto.
criatividade entre dois pólos Bizâncio, mediante sua arte, inspirou grande parte das obras do medie
de extrema inventiva (era vo cristão ocidental, a exemplo dos mosaicos e das pinturas em afrescos,
24
clássica greco-romana e a
renascentista).
retábulos, iluminuras e em outros tipos de miniaturas.
91
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
dendo ser uma sinagoga ou um templo, para participar de liturgias onde textos 26
O filósofo latino Boécio
(480-524), responsável pela
sagrados (sobretudo os salmos, base para elaborações poéticas e musicais) ponte erigida entre a cultura
e formas de canto – como a salmodia, certamente com as mesmas melodias clássica antiga e a medieval
–, eram compartilhados. Conforme o ofício, o gregoriano ganha sofisticação cristã, em De Institutione
Musica, dando continuidade
em formas mais ornadas, com a exuberância melismática do Oriente. Com à doutrina pitagórica sobre a
ele, a Igreja irá sustentar, em todo o medievo, a primazia conceitual da musica música, profere que a razão
mundana sobre a musica humana e a musica instrumentalis (v. adiante a se- divina estabeleceu a harmonia
universal segundo a ordem
ção saiba mais sobre o filósofo latino Boécio26) dos números, responsável por
Apesar de sua profunda espiritualidade, o gregoriano terá papel crucial na três grandes tipos de música:
mundana (música cosmológica,
música profana europeia. Os rigores da Igreja não serão suficientes para impe- suprassensível, portanto
dir a invasão de músicas, festas e danças profanas nos lugares sagrados, me- inaudível), harmonia fundamental
que preside o movimento e o
diante uma economia de trocas entre as artes populares e os cantos litúrgicos
equilíbrio do cosmos, articulando
já tomados por ricas polifonias em fins do primeiro milênio cristão. A primeira in- o humano com a verdade
dicação de uma “polifonia” bastante ingênua, convivendo com o gregoriano, foi superior; humana, musica
prática, sensível que estabelece
a duplicação da melodia em oitavas. Em meados do século IX, surge a Musica a harmonia entre corpo e alma,
Enchiriadis (de autoria incerta, era uma espécie de tratado de música), a prova entre sensibilidade e razão,
mais antiga de uma tentativa para estabelecer regras para a polifonia primitiva enfim, a música pela qual o ser
humano toma consciência de
ocidental. Além de descrever o método de canto em uníssono ou em oitavas, o sua harmonia com o mundo;
tratado expõe, pela primeira vez, novos princípios cuja base essencial é a dupli- instrumentalis, música que
cação do canto em intervalos de quartas e quintas paralelas. busca imitar a natureza.
Tal prática já era de certa forma usual em alguns países europeus. Por- 27
Os modos gregos, tendo
tanto o Musica Enchiriadis surgiu em certo momento do século IX, para des- como início uma nota alta em
crever uma prática, da mesma forma como Guido d’Arezzo, em seus escritos seu desenvolvimento escalar,
realizavam um movimento
sobre notação musical, na virada do século XI, falou de algo já em curso. descendente. Os monges
Com essa prática, além do uso simultâneo das oitavas, podia-se dobrar a me- medievais, ao conservar essas
lodia num duplo movimento, mediante a utilização dos intervalos das quintas matrizes modais, invertem
essa dinâmica. Suas trajetórias
(superiores) e das quartas (inferiores) paralelas como duas pálidas sombras passam a ter como ponto
acompanhando o corpo sonoro da vox principalis gregoriana. de partida, uma nota grave,
desenvolvendo percursos
Esses primeiros encontros de intervalos, a partir de uma leitura vertical ascendentes. O que nos sugere:
de melodias desenvolvidas horizontalmente, eram aceitas pela “harmonia” oficial não teria a ascese cristã medieval
intervertido o mundo mítico
eclesiástica como acordes destituídos de dimensão terrena, lugares de dissonân- grego? Não eram os deuses
cia e desvios harmônicos. Ainda atada ao conceito grego27 de harmonia, a noção gregos antropomorfizados, com
cristã refere-se a uma ordem cósmica em equilíbrio, sem dissonâncias, criada por desejos, paixões, iras, ciúmes
e prazeres, que desciam do
Deus, uma ordem parcimoniosa conforme requeria a estética apolínea. Durante Olimpo para se regozijarem nas
muito tempo, tais acordes representaram o acerto oficial de sons justos que res- festas dos humanos, ao contrário
soavam recorrentemente no espaço sagrado dos templos. Para a arquitetura da do mundo religioso judaico-
cristão que concebe o homem
baixa Idade Média, “a ogiva e o vazio interior das grandes catedrais góticas se como criatura feita à imagem e
refletem nesses intervalos paralelos” (MENDES, 1988/1989. p. 9). semelhança de seu criador e que
perde a inocência e, por isso, é
Com o entretecimento de notas de diferentes vozes, esboça-se, aos expulso do paraíso? Portanto
poucos, o princípio do contraponto. Para cada nota (punctum) correspondia um ser em permanente luta para
uma outra que lhe contra-acompanhava (contrapunctum), colada ao seu mo- superar sua condição terrena,
que busca sempre ascender à
mento de emissão, constituindo a vox organalis. Depois, as vozes secundá- perfeição celestial?
94
MIRANDA, D. S. de
rias começam a fazer um desenho autônomo, não mais como notas paralelas,
mas através da justaposição de linhas melódicas mais livres, procedimento
chamado discantus. Mediante seu uso, ousou-se acompanhar em movimento
contrário à vox principalis, surgindo, assim, o moteto (do francês petit mot).
Pouco a pouco, novas vozes são acrescidas à principal, tornando-se cada
vez mais independentes. O repertório gregoriano podia fornecer a vox prin-
cipalis, construindo-se daí as outras vozes. Já não se trata mais, portanto,
de uma única melodia ou de um leito melódico principal, definido por vozes
acompanhantes com proporções intervalares constantes. Muitas delas en-
tram livremente, criando novas sonoridades “consonantes”.
Via de regra, pelo encaixe de palavras em melodias conhecidas, as síla-
bas das várias linhas se cruzavam sem simultaneidade. O que importava era
a unidade musical produzida por sonoridade dessa massa vocal, a partir do
canto de duas, três, quatro, até dez linhas sonoras. Importava a valorização
das vozes e da altura do som. Surgem as primeiras figurações da polifonia
gótica, a ser vista adiante, alcançada pela justaposição das diferentes linhas
melódicas, tendo como parâmetro a forma monódica do cantochão. Gesta-
-se, assim, uma trama cada vez mais complexa de vozes cantadas simul-
taneamente, postulando novas formas de organização da música, conforme
veremos na música da baixa Idade Média e preparando, séculos depois, o
tonalismo, após o período polifônico.
Agora dividido, seus antigos valores culturais civilizatórios são substituídos pe-
los valores dos povos do norte europeu: ostrogodos, visigodos, francos, anglo-
-saxões, normandos, os chamados povos bárbaros.
Ganham espaço suas manifestações artísticas, caracterizadas por uma
preocupação decorativa e uma rara presença de figuras humanas. São peque-
nos objetos como brincos, colares, pulseiras e coroas, que revelavam um exce-
lente manejo da arte da ourivesaria: o uso de metais e pedras preciosas permitia a
criação de um sem-número de pequenas obras de formato geométrico e abstrato.
A arte merovíngia, termo que designa as manifestações artísticas da dinastia dos
reis francos (atuais França e Alemanha), durou do século V ao VIII. Descendentes
do rei Meroveu (c. 411 - c. 458), lendário fundador da dinastia, Clóvis I (466 - 511)
e Clotário II (497 - 561), convertidos à fé cristã, impuseram-na à antiga Gália, bem
como às vizinhas tribos germânicas. Seu advento na Gália levou a importantes
mudanças no campo das artes, como, por exemplo o desenvolvimento da ouri-
vesaria e das iluminuras, que fez ressurgir a tradição da decoração celta (antigo
povo da Europa centro-ocidental), base da arte merovíngia.
Conforme vimos na análise da função das imagens na biblia paupe-
rum, tudo convergia para a necessidade da evangelização. Nesse período,
existia uma nítida preferência pela estilização e pela abstração conferidas ao
tratamento temático nas expressões pictóricas e nas iluminuras de textos sa-
grados e uma preferência pelas formas antinaturalistas. Mais ricas e fantasio-
sas ainda são as ilustrações de influência celta, cujos arabescos coloridos
e complicados podiam, por exemplo, camuflar a face de um monge. Visu-
almente, desenvolveu-se uma arte caligráfica e incorpórea, que dissolvia o
mundo objetivo exterior em filigranas entrelaçadas, aproximando-se de signos
esotéricos ou mesmo mágicos. Essas estruturas formalistas e lineares foram
introduzidas pelos povos setentrionais, como os celtas, cujo contato com o
mundo greco-romano havia sido raro.
b) A escultura e a pintura
As paredes das naves eram decoradas com pinturas murais de uma inten-
sa policromia, mais uma marca da estética bizantina, cujas formas aliavam traços
da antiga pintura romana com as dos ícones orientais. Os temas mais frequentes
abordavam cenas das sagradas escrituras e da vida de santos e mártires, plenas
de exemplos edificantes, igualmente para fins didáticos. Temas como vícios e
virtudes eram alegorizados por representações de animais próprios do bestiário
oriental. Assim como a escultura, as figuras humanas não apresentavam qual-
quer plasticidade, cujos corpos eram apenas insinuados. As linhas do rosto eram
acentuadas por traços grossos e escuros. Para o desenvolvimento desse tipo de
pintura mural, os artistas utilizavam a técnica dos afrescos.
Em escala oposta à pintura mural, mas não por isso sendo menos im-
portante, desenvolveu-se a arte da iluminura encontrada na decoração de bí-
blias e manuscritos. Adquirindo cada vez mais sofisticação, tais iluminuras
eram realizadas simultaneamente às outras formas de arte pictórica, tanto na
forma como na técnica.
Concomitante à arte pictórica, quando os recursos permitiam, usava-se
igualmente a arte do mosaico ou do vitral, buscando sempre pelos intensos efei-
tos policromáticos. O vitral já era conhecido na época, visto que a arte românica
o trouxera de Bizâncio conseguindo aperfeiçoá-lo antes mesmo do esplendor
gótico. O abade Suger, um dos responsáveis pela futura arquitetura gótica, re-
gistrou não ter encontrado dificuldades para contratar profissionais do vitral de
vários lugares, para a reforma da abadia em Saint Denis, no norte de Paris.
Conforme costuma ocorrer com grandes períodos e em vastas regiões de larga
vigência de certos estilos, é possível detectar diferenças de estéticas no curso
das épocas e lugares. Assim, por exemplo, existiu um estilo românico a partir da
reforma do mosteiro beneditino de Cluny, na França do século XI e que se es-
tende nos séculos seguintes por toda a cristandade europeia, abrangendo mais
de mil mosteiros. Assim também ocorreu com um estilo românico na Itália. Devi-
do à proximidade com a arquitetura greco-romana, os italianos souberam cons-
truir templos menos pesados, bem como usar de frontões e colunas à moda da
antiguidade clássica. Um dos exemplos típicos apontados como modelo do ro-
mânico italiano é o conjunto da catedral de Pisa, com seu campanário inclinado
isolado desse conjunto, a famosa Torre de Pisa.
Para finalizar a análise do românico, não podemos deixar de mencionar
o desenvolvimento da ourivesaria que, assim como as demais artes do perí-
odo, revestiu-se de intenso caráter religioso voltado para o fabrico de objetos
como pequenas estátuas, relicários, cruzes, objetos litúrgicos, bem como para
decoração de altares, bíblias, paramentos religiosos e outros objetos sagra-
dos. Naturalmente, a realeza feudal não podia deixar de se sentir igualmente
atraída para tal forma de arte para expressar ostentação e grandeza, enco-
mendando com frequência luxuosas coroas incrustadas, mantos decorados,
bem como globos e cetros de ouro.
102
MIRANDA, D. S. de
Graças aos seus laços estreitos com a realeza (Suger, como se viu, foi
conselheiro de Luís VI e Luís VII e regente durante a 2ª Cruzada), Saint-Denis
sediou, desde cedo, corpos da realeza, tornando-se a necrópole dos sobera-
nos da França. A partir do século VI, a maioria dos reis e rainhas foi enterrada
em seu interior: 42 reis, 32 rainhas, 63 príncipes e princesas, e 10 grandes
personalidades do reino.
Em sua fachada, erguiam-se originalmente dos portais laterais, duas tor-
res altas (atualmente, como se pode verificar na foto acima, a torre da direita
não existe mais, danificada por um raio, no século XIX). O portal central é consti-
tuído de vários planos que caracterizam o estilo gótico de quase todas as igrejas
construídas entre o século XII e XIV: a porta principal envolta por um arco com
frisos que emolduram o tímpano*, uma grande janela longitudinal encimada por
uma forma abobadada, e outra grande janela circular, chamada rosácea*.
Mas, a maior marca arquitetônica do gótico certamente reside na abó-
boda de nervuras. Vimos que no período românico, uma das soluções para
minimizar a pressão do arco pleno foi a técnica da abóboda de arestas, cujas
curvaturas foram aos poucos sendo alteradas com a introdução de nervuras
e formas mais alongadas, prefigurando os arcos ogivais. O efeito estético ime-
diato foi a possibilidade de edificação de templos maiores, com ogivas alonga-
das apontando para o alto, enfatizando a sensação de verticalidade.
Outro recurso técnico usado em Saint-Denis foram os pilares de apoio
distribuídos de forma regular. Com tal recurso desaparecem as grossas es-
pessuras das paredes, como as do estilo românico, para apoiar sua estrutura,
provocando uma sensível alteração de grande efeito estético: a criação de
espaços vazios, possibilitando a substituição das estreitas janelas do estilo
românico, pela alternância da pequena largura das paredes com áreas de
grandes vitrais policromáticos, buscando sensações extáticas, mediante a
profusão de cores e luzes dos desenhos sagrados. Com pequenas altera-
ções, o modelo de Saint-Denis foi seguido na construção de outros templos
como a Catedral de Notre-Dame de Chartres, vista como um dos mais belos
conjuntos escultóricos do gótico, construídos entre 1145 e 1155.
Outro edifício que merece igualmente nossa atenção é a catedral de
Notre Dame de Paris, cuja construção iniciou-se c. de 1160, devido á novida-
de do arcobotante*. Com tal expediente, abriu-se uma grande possibilidade de
uso de grandes aberturas preenchidas por belíssimos exemplares da arte dos
vitrais aplicada em janelas, rosáceas de várias dimensões ou qualquer outro
espaço que permitia o uso dos vidros multicoloridos, articulados em grandes
armações estruturais de ferro.
A vigência do gótico, assim como o estilo românico, também se estendeu
por vários lugares, chegando à Alemanha, cujo exemplo mais candente de sua
típica estética encontramos na Catedral de Elizabethkirche, em Marburg, Sua
107
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
seguinte inscrição: “Jan van Eyck esteve aqui”. Giotto e Jan van Eyck sinalizam
em suas obras as mudanças estéticas que virão com os novos tempos.
Além dos grandes murais, a pintura gótica foi igualmente constituída de
trabalhos de menores proporções. Assim, numa escala oposta aos grandes
afrescos e retábulos, desenvolveu-se também uma arte em miniaturas de ex-
tremo capricho e preciosismo – as iluminuras, os manuscritos iluminados ou
miniaturas em forma de saltério (livro de salmos), breviários e livros de horas,
para leitura das horae canonicae.
e) A música gótica
Se o gregoriano continua sendo a música da esfera religiosa das basílicas,
abadias e catedrais, a música profana continua sua busca de autonomia
com relação ao sagrado. Vimos que a música do período românico prepara
a polifonia gótica, graças ao discanto dos motetos e ao contraponto. Na poli-
fonia, o pensamento musical se exercita pelo entretecimento da textura mu-
sical feita por vozes atuantes em momentos defasados: uma voz pode estar
no início, enquanto outra, no mesmo instante, estar no meio do canto, e uma
terceira terminando a frase. Polifonia vocal, politextualidade e plurilinguismo
tornam-se traços identificadores de um gênero que ganha grande prestígio
em fins da Idade Média.
Sobrepostas ao canto litúrgico, as vozes acrescidas eram portadoras
de falas distintas (o antigo/o novo, o letrado/o popular, o sagrado/o profano,
o latim/o vernáculo, o puro/o pornográfico) entretecendo a simultaneidade de
textos em línguas diferentes. Podia ser uma canção popular erótica, uma me-
lodia trovadoresca e o gregoriano fundidos num mesmo canto. O que mais
contava era a textura dessa massa sonora entretecida por múltiplas vozes e
não a inteligibilidade das partes, ensejando claramente novas experiências de
simultaneidade musical.
Os motetos trazem um problema com relação à medida temporal. A
prosódia musical, que no gregoriano monódico era resolvida pelo ritmo da
frase, se torna bastante problemática quando aparece a necessidade de
sincronizar canto e acompanhamento. O período entre o final do século XII
e até inícios do XIV, chamado de Ars antiqua, introduz na vida musical da
época o cantus mensurabilis.
Aqui, é impossível evitar a menção do aflorar do compasso concomi-
tante ao relógio mecânico, no início do século XIV. Seu uso pela Ars novae
musicae, foi longamente preparado, desde as primeiras sistematizações da
notação musical (c. ano 1000) feitas pelo monge italiano Guido d’Arezzo (992-
1050) simplificando a confusa notação neumática, até a reforma da Ars anti-
qua feita por Franco de Colonia (c. 1215 - c. 1270), em Ars cantus mensurabilis
(c. 1260) sobre a notação medida da música. O cantus mensurabilis, polifonia
111
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
arte que iria proporcionar, no próprio seio da igreja, [em seus ofícios], prazeres
intelectuais aliados aos prazeres dos sentidos, dispersando com isso a aten-
ção dos fiéis e desviando-os dos mistérios divinos” (FERRAND, 1997, p. 197).
O papa João XXII percebe os alcances das novidades dessas técnicas
musicais: a mistura de textos sacros e profanos, a fragmentação do canto, a
dispersão das melodias em células rítmicas breves, e sobretudo as alterações
dos modos gregorianos, com deslizamentos de semitons, levando-o a conde-
nar a polifonia sacra. Em 1324, o Papa promulga um decreto, Docta Santorum
Patrum, síntese perfeita do pensamento estético de uma Igreja ainda apegada
à tradição, atônita face aos novos rumos da arte e da cultura. A citação abaixo
é um manifesto explícito da consciência papal dotada de uma extraordinária
compreensão dos fenômenos que estavam em curso. na vida musical euro-
peia. Queixa o papa de certos adeptos da Ars nova:
Síntese do Capítulo
Esta unidade buscou examinar o período que segue a dissolução da pólis gre-
ga, cuja civilização, exposta ao contato de vários povos integrantes do império
de Alexandre Magno, logrou costurar uma expressiva unidade cultural conhe-
cida como helenismo, destacando-se, posteriormente, sua difusão no mun-
do latino constituindo um extraordinário resultado civilizatório: o classicismo
greco-romano que perde força com a quebra da unidade do Império Romano,
ensejando sua divisão em duas partes: o Império do Ocidente, capital Roma
e o Império do Oriente, capital Constantinopla. Foi também analisada a arte
cristã, responsável pela constituição de uma estética que marcou linguagens
e estilos das artes ocidentais, como o canto gregoriano, os estilos bizantino,
românico e gótico presentes na arquitetura, escultura e pintura do período
milenar do medievo europeu.
Atividades de avaliação
1. Destaque as razões e a importância do helenismo para a constituição do
classicismo greco-romano bem como para a difusão do cristianismo.
2. Analise os principais feitos de Alexandre Magno responsáveis pela unidade
cultural do período do helenismo.
3. Aponte e analise as principais diferenças entre os estilos arquitetônicos da
arte clássica grega, greco-romana, bizantina, românica e gótica.
4. “A estética cristã medieval procurou negar a materialidade e a sensualidade
do corpo, em suas diversas linguagens artísticas”. Explique onde e como
este princípio se efetivava.
5. Elabore um pequeno texto a partir de uma questão problematizadora formu-
lada por você mesmo, e procure respondê-la desenvolvendo uma reflexão
bem pessoal.
115
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
@
Leituras, filmes e sites
Filme
O nome da Rosa (1986), de Jean-Jacques Annaud, baseado no romance
homônimo (1980) de Umberto Eco, apresenta a vida monástica da baixa
Idade Média, envolvida em polêmicas religiosas, teológicas e filosóficas (o
protagonista é baseado no frade franciscano e filósofo inglês Guilherme de
Ockham), tendo como pano de fundo a figura de Aristóteles, inclusive sobre a
existência e o teor de um possível livro II de sua Poética dedicado à Comédia,
protagonizadas por beneditinos, defensores do rigor e austeridade do claustro,
e franciscanos, defensores de uma vida religiosa que sinaliza para os novos
tempos. Tudo se encontra ambientado numa antiga abadia medieval, cuja tra-
ma é marcada por mortes misteriosas de monges, tendo como pano de fundo
a marcação do tempo pelas horae canonicae e o canto gregoriano.
Site
www.aticaeducacional.com.br/imagens/complementos/hda/img/ima-
gem26.swf.
Referências
ATTALI, Jacques. Bruits essai sur l’économie politique de la musique.
Tradução de Dilmar Miranda Paris: PUF, 1977.
BRACONS, José. Saber ver a arte gótica, São Paulo: Martins Fontes, 1992.
CARDINI, D. Eugène. Primeiro Ano de Canto Gregoriano e Semiologia
Gregoriana. S. Paulo: Attar Editorial/Palas Athena. 1989.
CUNHA, Newton. Dicionário Sesc a linguagem da Cultura, São Paulo:
Perspectiva, 2003.
FERRAND, Françoise et al. “A Ars nova e Guillaume de Machaut” In: História
da Música Ocidental. R. Janeiro: Nova Fronteira, 1997.
GOMBRICH, E.H. A história da arte. Tradução de Álvaro Cabral, 15ª edição.
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1989
HEGEL, G.W.F. Estética. Lisboa: Guimarães Ed. 1993
MENDES, Gilberto. “Cânone na música? E por que não?” in Revista USP.
S. Paulo: 1998/99
116
MIRANDA, D. S. de
Capítulo 4
Do Humanismo Renascentista
ao Neoclassicismo Iluminista
119
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
Objetivo
• Esta unidade visa estudar o período compreendido entre os séculos XV e
XVIII, a grande época em que as artes ocidentais logram conquistar certa
autonomia em relação às instâncias da tradição medieval cristã que deter-
minavam os conteúdos e as formas das obras de arte. A unidade visa ainda
estudar os grandes estilos, como o renascentista, o maneirista, o barroco, o
rococó e o neoclacissista, enfatizando a vida e a obra dos principais realiza-
dores das linguagens artísticas do período.
1. A Renascença e o maneirismo
O termo Renascença ou Renascimento surge pela primeira vez com Giorgio
Vasari em sua Vite, para se referir ao novo ciclo que começa após Cimabue
e Giotto, a “restaurazione delle arti e per dire meglio rinascità” (apud BAZIN,
1989, p. 33). O termo é comumente usado para identificar o período da cul-
tura europeia compreendido entre o século XIV (alguns historiadores recuam
ao final do século XIII) e meados do século XVII, largo período em que houve
grande interesse pela retomada dos valores éticos, estéticos e filosóficos da
cultura grega, vista como autêntica fonte da beleza e do saber. Como o termo
conota a desqualificação do medievo, feita por Vasari e outros contemporâne-
os, opondo-o à cultura que renasce sobre bases antigas, outros pensadores
procuram enfatizar mais a retomada dos studia humanitatis, compreendendo a
gramática, a retórica, a dialética e a língua neolatina clássica, preferindo, assim,
falar de Humanismo (v. FAGIALO, 1992, p. 63 e BYINGTON, 2009, p. 7). E o
artista humanista seria aquele capaz de traduzir plasticamente essa nova idade
da história da humanidade ocidental que passa a ser conhecida como moderna.
o mundo europeu entrasse em contato direto com outras culturas. Tudo isso
concorreu para preparar o que ficou conhecimento como revolução comercial,
iniciada em fins do medievo, fortalecida na alvorada dos tempos modernos e
consolidada com as grandes viagens e descobertas de países que se torna-
ram presas coloniais dos europeus, em plena era moderna. Após séculos de
vida rural dispersa, com o reaquecimento do mundo dos negócios, a Europa se
urbaniza e a cidade torna-se o centro das trocas comerciais, adquirindo uma
autonomia que era a própria antítese dos feudos rurais, o que estimula a desa-
gregação deles e a transição para o modo de produção capitalista.
No próprio seio da economia agrária de subsistência, voltada substan-
cialmente para o consumo imediato, irá irromper outra economia mais vigo-
rosa. O enfraquecimento do poder feudal (inclusive o da Igreja, a maior pro-
prietária fundiária de então), o fortalecimento da realeza, aliada à nova classe
urbana burguesa conforme a conveniência de seus interesses, tudo concorre
para urdir uma nova mentalidade. O europeu moderno parecia estar ciente de
viver um novo tempo de celebração do homem e da história.
Além das grandes alterações advindas da nova economia mercantil ur-
bana, com os efeitos conhecidos, dois fatos aparentemente isolados, mas de
relevância crucial quando articulados, concorreram também para o advento
dos tempos modernos: a invenção da imprensa e a Reforma Protestante. Jo-
hannes Gutenberg (1390-1468) inventou a imprensa móvel, aperfeiçoando os
blocos de impressão. Sua grande contribuição foi introduzir tipos de impres-
são individuais móveis de chumbo fundido, mais resistentes e reutilizáveis,
diferentes dos de madeira. Associada ao uso de tinta a óleo, sua invenção
deu enorme versatilidade à feitura de livros e outros impressos, permitindo sua
massificação. Na cidade de Mogúncia, associado a um comerciante, Guten-
berg imprimiu a primeira Bíblia (de 1450 a 1455).
ao se buscar construir uma sociedade ideal num lugar imaginário. Integram Renascimento,
essa linhagem de autores utópicos os ingleses Thomas Morus (1478 - 1535) Agnes Heller
com Utopia (um lugar outro não existente) e Francis Bacon (1561 - 1626) com "Durante o Renascimento,
Nova Atlântida, e o italiano Tommaso Campanella (1568 -1639) com Cidade os conceitos de medida e
de beleza pressupunham
do Sol. No entanto, o autor que melhor encarna o ideal humanista é o holan-
um ao outro. Efetivamente, a
dês Erasmo de Roterdam (1467 - 1536), sobretudo em sua obra-prima Elogio temeridade e a imoderação
à loucura, dedicada ao amigo Thomas Morus podiam parecer muitas vezes
fascinantes e ser alvo de
Mesmo não rompendo com Roma, a crítica à Igreja Católica feita por
simpatias e, todavia, nunca
Erasmo leva-o, no início, a se aproximar de Lutero, com quem mantém diá- eram vistas como 'belas',
logo até seu rompimento em 1525. O humanismo de Erasmo buscava dar mas sim como 'grandes' [...].
uma interpretação cristã à sabedoria antiga, insistindo numa espiritualidade A imoderação atraia, mas,
simultaneamente, repelia.
universal baseada na liberdade de expressão, ao contrário do que pregava a
Provocava o prazer, mas
Reforma que condenava as “contaminações pagãs”. também o medo, enquanto a
Em tom provocador, Erasmo faz da loucura uma personagem muito co- beleza só atraia e suscitava
nhecida, mas pouco discutida. Indignada com a falta de elogios, ela resolve o prazer: de fato, a beleza
era o objeto do amor [...]. O
elogiar a si própria e mostrar o quão se encontra presente na vida das pessoas. estético e o utilitário uniam-se
Assuntos como a cultura clássica, a religião, a paz e a sociedade preenchem neste conceito de medida.
o imaginário temático do autor, sendo cada um sempre usado como objeto Ter temperança, viver com
sobre a reflexão da loucura. Mas, dentre aqueles, sobressai o tema da razão, moderação, respeitar a
medida justa - tudo isto era
aparentemente o “outro” da loucura. O Elogio é uma sátira contra a estultícia não só bom e belo para o
humana (do latim stultitia, tolice), apresentada nas mais variadas formas. homem, como ainda útil. Esta
unidade era particularmente
2. O sistema das artes renascentistas32 natural em Florença [...].
Era um hábito social que,
2.1. A arquitetura no entanto, estava longe de
ser 'natural' ou apenas um
Diferente dos ideais arquitetônicos anteriores, ora preocupados com adapta- costume tornado habitual;
ções de templos pagãos (as basílicas protocristâs), ora com desenhos geo- era sempre uma norma.
métricos (estilo bizantino), ora com grandes espaços para acolher peregrinos Constituía uma das normas
concretas de comportamento
(estilo românico), ora com a verticalidade das ogivas (estilo gótico), o ideal
da época" (apud CUNHA,
construtivo da Renascença se expressou nas representações racionais or- op.cit.p. 546)
ganizadas em "proporções justas" entre as partes que compunham o todo
edificado, cuja marca principal foi perseguir uma ordem e disciplina que trans-
124
MIRANDA, D. S. de
2.2. A pintura
Consolidam-se na pintura renascentista, princípios que haviam surgido entre
os artistas do período gótico tardio: o traço perspectivado, o uso do claro-escu-
ro e o naturalismo. Naturalismo, proporção e simetria se constituíram nas vias
de acesso à beleza, levando os artistas a perscrutar, cientificamente, o traço
anatômico dos corpos e a forma dos objetos, incorporando em suas obras um
realismo insuperável. Modelos clássicos antigos renascem e se adaptam a
novas postulações e gostos estéticos.
O ideal de beleza revive a figuração grega, agora integrada a uma har-
monia de composição ditada matematicamente, evitando desproporções e
excesso de traços. Com a perspectiva linear, escalonam-se os objetos repre-
sentados em razão das distâncias ou dos segmentos geométricos tendentes
ao "ponto de fuga" central ou pouco acima do espaço pictórico. O efeito é
imediato, estabelecendo a ilusão de profundidade, noção que desliza para a
linearidade do tempo histórico moderno, mantendo-se por vários séculos.
125
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
2.3. A escultura
Assim como na pintura, a escultura ganhará traços similares, quando não
idênticos. Busca fixar movimentos sutis e dinâmicos, exprimir o naturalismo
dos afetos e dos estados de espírito, explorar o ideal de beleza pela nudez e
pela sensualidade, algo também detectável na pintura. Tem-se aqui a grande
síntese (ou seria uma das grandes contradições íntimas da Renascença) do
espírito da época: a Renascença “não vê salvação da arte fora do paganismo
[leia-se fora do classicismo greco-romano] nem da alma fora do cristianismo
[leia-se Contra-reforma]” (BAZIN, 1989, p. 33).
Uma análise sumariada da época pode ser representada pela obra de
Michelangelo, tido como o maior escultor renascentista. Um dos motivos do
constante conflito com Júlio II foi este tê-lo contratado como pintor para deco-
rar o teto da capela Sistina, quando o grande desejo do artista era terminar de
esculpir o profeta Moisés, para ser colocado na tumba do papa. Conta a lenda
que, ao ver terminado seu Moisés, impressionado com o resultado estético
de seu realismo em mármore, teria golpeado o joelho do profeta e proferido:
“Perché non parli?”/ “ Por que não fala?”
No Davi (1501 - 1504), Michelangelo expressa a dignidade humana
mediante um realismo anatômico impressionante. Ao contrário da narrativa
mítica, não se trata de um menino que derrota o gigante Golias com uma pe-
dra atirada de uma funda, mas de um esbelto jovem adulto que, na dignidade
de sua nudez contida em 5,17m de mármore de Carrara, apresenta um corpo
129
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
A Pietà de Michelangelo (1498 - 99) tem 174 centímetros por 195 centí-
metros. Ao contrário do pathos de outras esculturas do gênero, sempre mos-
trando Maria como Mater dolorosa, Michelangelo a representa muito jovem e
com uma nobre resignação, cuja expressão facial é idealizada, contrastando
com a angústia usual que os artistas, até então, lhe imprimiam. O esmero re-
quintado da modelação do conjunto da obra, representado pelo registro realis-
ta do drapeado das vestes e das saliências dos músculos e veias, bem como
o tratamento da superfície do mármore, polido como um marfim, conferem à
obra a reputação de ser uma das mais belas obra-primas de todos os tempos.
Nota-se a harmonia da composição obtida pela horizontalidade do corpo de
Cristo com a verticalidade da figura de Maria.Trata-se de um trabalho escul-
tórico organizado segundo um esquema em forma piramidal, de uso corrente
entre os artistas renascentistas.
Michelangelo tinha então 23 anos. Devido à sua pouca idade e por
muitos desacreditarem de sua autoria, o artista colocou sua assinatura na
faixa que atravessa o peito de Maria: Michael Angelus. Bonarotus. Florent.
Facieba(t), i.e, “Miguel Angelo Buonarotus de Florença fez.”
130
MIRANDA, D. S. de
3. A Renascença europeia
Assim como o gótico, que se irradia pela Europa a partir da França, o mesmo
ocorre com a Renascença, que se espraia no continente a partir da Itália.
Vários países europeus aderem ao princípio da revitalização da cultura greco-
-romana depois de superar, de forma sintética, o choque entre estéticas nacio-
nais e concepções italianas. Dentre as várias linguagens, a pintura foi a que
melhor refletiu tal síntese. Na Alemanha e nos Países Baixos, artistas como
Hieronymus Bosch (1450 - 1516) e Albrecht Dürer (1471 - 1528) conseguem
conciliar o gótico com a nova pintura italiana.
Bosch tornou célebre, com seu estilo inconfundível, o tríptico Jardins das
delícias (c.1500), cujo painel central é ladeado por dois painéis representando
o Paraíso (à esquerda) e O inferno musical (à direita). A força de sua fantasia
livre com suas formas oníricas é vista como prenunciadora do surrealismo,
séculos antes de sua irrupção. Uma das qualidades mais famosas de seu
estilo era a forma de representar a maldade humana. No painel sobre o inferno,
por exemplo, “amontoam-se horrores sobre horrores, labaredas e tormentos
de toda espécie, e todos os tipos de demônios pavorosos, meio animais, meio
humanos ou meio máquinas, que flagelam e castigam por toda a eternidade
as pobres almas pecadoras” (GOMBRICH, 1989, p. 276).
131
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
4. O maneirismo
Derivado do termo italiano maniera ("maneira") e usado com intenções po-
sitivas por Vasari, ele próprio visto como representante desse novo estilo,
o maneirismo seria sinônimo de graça, leveza, estabilidade e sofisticação,
fruto do estilo pessoal do artista que, no limite, transforma-se num capricho
idiossincrático como em Michelangelo, que se permitia buscar constante e in-
cansavelmente novas formas de expressão. Depois, o maneirismo sofre uma
grande inflexão passando a conotar artificialidade e virtuosismo excessivo.
A expressão “à maneira de” deixou de retratar a inventiva do artista, para se
referir ao modelo que se imitava, isto é, “à maneira” de outrem.
O historiador Gombrich (1989) vê no maneirismo um tempo de “crise da
arte”. Poderíamos buscar as causas da crise nos fatos ocorridos na Europa,
algumas já analisadas como a perda da primazia de Roma e a quebra da
unidade da cristandade, com o movimento reformista (Lutero, Calvino, John
Knox, Zwingle, Henrique VIII), abalando a instituição, sólido esteio para a ins-
133
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
piração e as encomendas dos artistas. O abalo foi tal que precisou de uma
ordem religiosa (a Companhia de Jesus), fundada em 1534, para combater os
reformados, e de um grande conclave (Concílio de Trento, de 1545 a 1564).
convocado pelo papa Clemente XIV, para reparar os estragos feitos.
O contexto sociohistórico do novo estilo, além da esfera religiosa, foi
também marcado por profundas mudanças na economia, política e cultura.
Os permanentes conflitos da Itália com a França, Alemanha e Espanha provo-
caram uma radical mudança no equilíbrio de forças do continente, culminando
no Saque de Roma de 1527: oito dias de terror e devastação, provocando a
diáspora de artistas e intelectuais para fora da Itália. No plano econômico, a
Itália já vinha perdendo primazia no quadro do capitalismo mercantil, com o
deslocamento das rotas de comércio para o Atlântico, quebrando de vez seu
monopólio das linhas do Mediterrâneo, o que irá trazer também consequên-
cias para o campo das artes e da cultura, considerando o papel, há anos,
desempenhado pelos burgueses italianos.
Gombrich assinala que, depois de 1520 (leia-se após Da Vinci, Miche-
langelo e Rafael, quando as artes da Renascença atingiram os limites de sua
perfeição e glória), era muito difícil à nova geração impor seu próprio estilo. Daí
se poder dizer que subjaz ao maneirismo um desejo inconsciente de superação
por parte da nova geração. A partir de então passou a ser considerado como a
fase final do ciclo renascentista. A longa vida de Michelangelo propiciou-lhe a
possibilidade de experienciar diferentes etapas da vida artística de sua época.
Por isso, alguns autores vêem a sua última fase como a mais vigorosa, mística
e monumental servindo de paradigma para o estilo maneirista. Pelo seu aspec-
to impreciso e ambivalente, por se tratar de um período de transição entre o
ápice da Renascença e o aflorar de um novo estilo, o barroco, várias noções
do maneirismo sofrem igualmente de ambiguidades e imprecisões quando não
contraditórias, algumas se confundindo com o próprio estilo barroco.
6. O barroco e o rococó
6.1. O contexto sociohistórico do barroco
O abalo sofrido pela Reforma fez a Igreja Católica se reunir, durante anos, em
Trento, Itália, onde a cúpula eclesiástica reafirma sua doutrina como a expres-
são mais pura e legítima da herança cristã. Apesar da motivação religiosa ini-
cial, gerando uma cisão no interior da cristandade, as ressonâncias da Reforma
ultrapassaram o campo da fé. Com a noção de estados nacionais já em curso
desde o medievo tardio, a dissolução do poder de Roma, inclusive em assuntos
terrenos, deu ensejo para a realeza se libertar de seu jugo, com a criação de
Igrejas nacionais, fugindo, assim, do conceito de uma Igreja universal (católica).
Importa notar o episódio de Henrique VIII que, não obtendo a licença papal para
se divorciar de Catarina de Aragão, rompe com Roma para fundar a Igreja Angli-
cana, mostrando, sem nenhum pudor, o desejo de uma Igreja nacional.
Ao retomar os rumos da pureza doutrinal, a Igreja tridentina conta ainda com
o valioso apoio da recém fundada Companhia de Jesus, uma das últimas ordens
criadas no século XVI, em plena era moderna europeia. Estruturada segundo o mo-
delo castrense pelo ex-militar Inácio de Loiola, onde a virtude maior era a prática
da obediência ao papa, a nova ordem ganha grande prestígio na Igreja. Liberados
da vida claustral contemplativa, os jesuítas definem sua missão evangelizadora em
duas pontas de atuação: de um lado, a educação dos filhos da nobreza e burguesia
europeias para sustar o avanço das Igrejas reformadas; de outro, a evangelização
dos gentios nos vários países, alvos da ação colonizadora europeia
Assim, encerradas as atividades conciliares, contando com a atuação
dos jesuítas, Roma recupera em grande parte o prestígio abalado, inclusive
ditando estética e construindo templos. Estavam criadas as condições fa-vo-
ráveis para o barroco. Weisbach, em El Barroco, arte de la Contrareforma afir-
ma que a Igreja Tridentina, além de retomar a religião tradicional, eafirmando
seus dogmas, também estabelece diretrizes estéticas para a sua produção
artística, surgindo daí o barroco (v. SIQUEIRA,1993, p.9). Assim, o estilo é
visto como a estética da Contra-reforma.
Contudo, se, no início, o barroco tinha intenções de glorificar a Igreja
romana, assim como ocorreu em outras épocas com outros estilos, existiu
igualmente um barroco civil com intenções laicas e de glorificação do poder
profano, sobretudo dos monarcas absolutistas. O papa, reis e príncipes des-
cobrem o poder do barroco para “dominar pela emoção”. Eugenio D’Ors, em
O Barroco, enxergando uma metafísica trans-histórica no estilo, capaz de se
materializar em determinados períodos, sem negar a afinidade estético-ideo-
lógica com a Contra-reforma, não nega a possibilidade do uso do novo estilo
pela Igreja reformada, como veremos mais adiante.
136
MIRANDA, D. S. de
que o elegeu como foco de seu estudo, tendo sido seguido pelo seu discípulo
Heinrich Wölfflin, que, em sua famosa obra Renascença e Barroco, adota um
enfoque valorativo, cuja análise é tomada por uma exaustiva abordagem, bus-
cando suas ricas transformações estilísticas, sempre cotejadas com o classi-
cismo renascentista.
Segue um quadro sintético onde Wölfflin (2005) apresenta um in
teressante e sugestivo cotejo entre os dois estilos, levando em conta a con-
quista científica do estudo da perspectiva dos renascentistas:
1) O classicismo é linear por privilegiar a linha que delimita, com nitidez, os
objetos, suas formas e volumes; o barroco é pictórico, pois nele os limites
lineares não são precisos e os objetos não estão mais delimitados entre si,
mas se imbricam.
2) O classicismo usa planos cuja construção se faz em sucessivos planos
precisos, contando com a ajuda de um desenho rigoroso; o barroco usa a
profundidade, sem fatiar os planos por etapa, pois nosso olhar circula sem
repouso e sem percepção de seus limites.
3) O classicismo tem formas fechadas cujas construções possuem eixos
estáveis, claros, verticais e horizontais; o barroco expressa formas aber-
tas, obedecendo o princípio da diagonalidade e, a um só tempo, ultrapas-
sando seus limites físicos.
4) O classicismo valoriza a multiplicidade, com a unidade do todo sendo
dada pela articulação harmoniosa das partes; o barroco valoriza a unida-
de com a abolição da autonomia das partes.
5) O classicismo expressa uma clareza absoluta pela claridade homogênea
presente em suas composições, cujas partes, via de regra, são iluminadas pela
mesma intensidade; o barroco expressa uma luminosidade relativa cujo
traço mais característico é o jogo de luz do chiaroescuro, emprestando às suas
formas uma intensa dramaticidade.
Enfim, surgem abordagens crítico-analíticas que ultrapassam as apre-
ciações desqualificadoras, buscando, inclusive, explicações nas alterações
provocadas pelo desenvolvimento da ciência moderna, o que faz o homem
europeu adotar uma nova Weltanshauung (visão de mundo).
No Renascimento o artista voltara-se para a análise e interpretação da Natu-
reza, para a valorização do Homem, seu corpo e sentidos. Mas a partir do mo-
mento em que os homens da ciência [Galileu], se propuseram a decodificar e
compreender a linguagem da natureza, estava superada para as linguagens
artísticas, a doutrina que dominara os séculos XV e XVI. Era natural que sur-
gisse na arte uma nova forma de representação. (SILVA, 2005, p. 14)
Expurgados os aspectos desqualificantes, desvela-se uma estética
que se expressa nos excessos, no jogo de pares antinômicos, na desmesura
dionisíaca ou na harmonia apolínea, fazendo coexistirem os dualismos, sem
138
MIRANDA, D. S. de
a) A pintura
Entre os pintores italianos, destacam-se Tintoretto (1518 - 1594) e Caravaggio
(1573 - 1610). Tintoretto produziu muito, logrando expressar uma temática
variada como motivos religiosos, mitológicos, além de retratos. Por sua ener-
gia na arte de pintar, era conhecido como I1 Furioso e sua utilização dramática
dos efeitos da luz fez dele um dos maiores representantes do barroco italiano.
O que justamente impressiona em seu vigoroso estilo é o uso intensivo da luz/
cor como realiza na pintura Cristo em casa de Marta e Maria, onde os corpos
das figuras são mais expressivos do que seus rostos, graças àquele jogo de
cor/luz. Para ele, o primeiro contato visual com um quadro deveria ser para a
contemplação do seu conjunto, para, depois, se deter nos detalhes.
Caravaggio não se sentia atraído pela
beleza clássica da Renascença. Ele, ao
contrário, se inspirava nas pessoas comuns
das ruas de Roma, como músicos das fei-
ras, vendedores ou ciganos, para retratar
o aspecto mundano de eventos bíblicos.
Um outro traço marcante de sua pintura foi
a dimensão e o impacto que deu aos seus
quadros, ao usar um fundo sempre raso e
obscuro. O artista não usava a luz de forma
tradicional, isto é, a luminosidade refletida
pelo sol, mas a compunha a partir de seu
próprio arbítrio para realçar alguma cena
e, assim, atrair o olhar contemplante. Com
esse efeito plástico, fazia os corpos ganha-
rem volume.
Entre os espanhóis, nos chamam a
atenção El Greco (1541 - 1614) e Velas-
quez (1599 - 1660). O nome El Greco sin-
Figura 49 – Cristo em casa de Marta e Ma-
ria (1578)
tetiza três origens étnico-culturais. O El é
espanhol, o Greco é italiano, que significa
o Grego, indicando sua origem greco-cretense. Talvez tal síntese explique a
dificuldade de reduzir a maniera desse artista a um só estilo. Ele é tido como
um artista tão singular que não é considerado como pertencente a nenhuma
das escolas convencionais. Mesmo vivendo em plena época do chamado
barroco espanhol, seus conhecidos traços verticalizados de figuras tortuosa-
mente alongadas, prenunciando segundo alguns o expressionismo, parecem
139
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
b) A escultura e a arquitetura
O escultórico barroco não prima pelas nuances, mas, ao contrário do equi-
líbrio entre o sensível e o intelectivo na Renascença, prima pela exaltação
dos sentidos. As formas são estetizadas em expressivos movimentos. O linear
renascentista cede lugar às formas côncavas e convexas, às linhas curvas
de suas figuras, aos drapejamentos de suas vestes. Predomina o gosto pelo
dourado. Rostos, corpos e gestos desvelam fortes emoções, sendo, no limite,
violentas e atingindo, portanto, uma dramaticidade até então desconhecida. 36
Baldaquino: elemento
O escultor (também arquiteto, urbanista e pintor) mais representativo do escultórico-arquitetônico
no formato de um dossel
barroco italiano é Bernini (1598 - 1680) e sua obra mais expressiva é o balda que serve de cobertura
quino36 (1624 - 1633) encomendado pelo papa Urbano VIII para a Basílica de para resguardar um andor,
S. Pedro no Vaticano. Nessa obra, toda em bronze dourado, o artista esculpiu leito, trono ou então para
as quatro colunas do baldaquino de 29 metros de altura, majestosamente re- resguardar um altar, como
o imenso baldaquino da
torcidas e decoradas com motivos florais. Basílica de S. Pedro.
140
MIRANDA, D. S. de
7. O neoclassicismo iluminista
7.1. O contexto sociohistórico do neoclassicismo
O Setecentos mostrou um dinamismo inédito para um mesmo século, ao abri-
gar valores estéticos bastante díspares, às vezes, inteiramente antagônicos e
de difícil delimitação para o observador pouco afeito ao mundo das artes. Em
menos de cem anos, tivemos o barroco tardio, também chamado por alguns
historiadores de barroco-classicista, o rococó, o neoclassicismo, também tido
como academicismo, o classicismo musical, além das manifestações vigoro-
sas do movimento alemão Sturm und Drang/ “tempestade e ímpeto", espécie
de movimento romântico avant la lettre.
150
MIRANDA, D. S. de
sobretudo na famosa tríplice crítica (v. seção Saiba mais, na Introdução deste
livro). Sua máxima de vida era sapere aude (ouse saber). Para ele, a huma-
nidade, ao atingir sua maioridade – a era da razão –, saberia equilibrar sua
formação social coletiva com seu agir moral a partir de critérios racionais sem
prejuízos para sua liberdade individual. A razão, e somente ela, deveria ser a
instância capaz de guiar todas as condutas humanas, seu saber, agir e sentir,
enfim, todas as suas ações e criações.
É importante atentarmos para um fenômeno que surgira no pensamen-
to que antecede o iluminismo kantiano: a crítica. Tal procedimento, impensável
no momento hegemônico do cartesianismo, toma conta da cena intelectual
europeia desde o início do século XVIII. Impensável, se considerarmos as
diferenças entre a modernidade precoce (razão clássica cartesiana), incapaz
do uso da razão para refletir sobre seus próprios limites, e a modernidade
madura (razão iluminista kantiana), possivelmente capaz de estabelecer os
limites e as condições de possibilidades da própria razão em suas diferentes
esferas, conforme tematiza a tríplice crítica de Kant.
No século XVII, preparando a crítica setecentista, predominam obras de
caráter poético em seu senso aristotélico, isto é, como sistematizações canô-
nicas que acabavam por se transformar em normas prescritivas dos fazeres
artísticos. Naquele contexto, o belo, por exemplo, seria uma modalidade do
verdadeiro, conforme afirma Nicole Boileau em sua Art Poétique (1674), ao
estabelecer a razão como a suprema instância para julgar o mérito e a virtude
de uma obra de arte: rien n’est beau que le vrais, ou “nada pode ser belo, se-
não o verdadeiro” (apud BRAS, 1990, p. 16).
A partir do século XVIII, o termo crítica toma vulto como flagrante índice
do processo de autonomização que atinge tanto a arte como o pensamento
que dela se ocupa, a estética, se espraiando em várias obras, revelando, as-
sim, uma nova postura intelectual dos pensadores da época, sobretudo os
iluministas. Eis alguns exemplos: Réflexions sur la critique, de Antoine Houdar
de la Motte (1672 - 1731); Dissertation critique sur L'Iliade d'Homère, de Jean
Terrasson (1670 - 1750); Réflexions critiques sur la poésie et sur la peinture, de
Jean-Baptiste Dubos, o Abade Du Bos (1670 - 1742). Nesse século, o crítico
de arte começa a se profissionalizar.
É flagrante a aversão iluminista aos velhos estilos, ao ditar uma estética
apoiada na simplicidade e no despojamento, princípios norteadores da nova
estética elaborada principalmente pelo teórico Johann Joachim Winckel-
mann. Assim, difunde-se o ideal de comedimento, equilíbrio e serenidade, ex-
presso no sentimento de domínio tanto da natureza externa (objetiva) quanto
interna (pessoal). As paixões não deviam ser expurgadas, porém comedidas
e vividas com serenidade. Aos poucos, a estética plasmada no seio da nova
152
MIRANDA, D. S. de
b) A pintura
Winckelmann e Mengs foram fundamentais na definição dos rumos da pintu-
ra neoclássica, que teve como modelo os mesmos princípios ditados para a
escultura. O idealismo pictórico teve a nítida marca de uma visão intelectua-
lista, submetida a cânones agora subordinados ao princípio da simplicidade,
serenidade e grandeza, embora sem grandes aversões, por exemplo, aos
contrastes do claro-escuro. Mas a clareza luminosa da cena, bem como a
linearidade, a nitidez e o apuro dos contornos das formas ganharam força,
apoiados marcadamente em exemplos renascentistas como Rafael, pelo
equilíbrio de suas composições e pela harmonia do colorido. Os temas po-
diam ser variados – mitos clássicos, religiosos, profanos, históricos, cenas
prosaicas, retratos –, porém havia uma unidade estética na busca menos
pela verdade mais pelo verossímel.
Jacques-Louis David (1748 - 1825) e Jean-Auguste Dominique Ingres
(1780 - 1867) foram certamente duas personalidades centrais da pintura neo-
clássica francesa. O parisiense David foi considerado o pintor da Revolução,
porém, depois, adere ao bonapartismo, tendo se transformado no pintor oficial
do império napoleônico (“premier peintre de Napoleon” / “primeiro pintor de
Napoleão) e em cujo estilo transparece quase sempre o elogio de virtudes
cívicas. Fatos históricos ligados à vida de Napoleão foram por ele registrados
a exemplo de sua coroação e o quadro Bonaparte atravessando os Alpes
(1801). Mas David foi também detentor, a um só tempo, de um vibrante realis-
mo e de um intenso páthos, como o quadro A morte de Marat (1793), dedicado
ao amigo e militante da Revolução Francesa. Diz-se do quadro que se trata
de um tema religioso em que o Cristo morto é substituido pelo corpo inerte
do amigo, pendido sobre uma banheira em plena luminosidade em contraste
com o fundo escuro da composição.
Ingres conserva a tendência neoclássica do seu mestre David, cujo ateliê
frequentou com certa assiduidade. Sua temática é variada, compreendo assun-
tos mitológicos e paisagens, mas, sobretudo, retratos e nus, seus trabalhos mais
admirados. O retrato de Louis François Berlin (1832), exímio modelo pictórico de
uma persona para expressar a fisionomia de um membro da classe burguesa
da época, deixa transparecer o gosto pelo poder e a fé inabalável na individuali-
dade, em cores discretas e contornos precisos. O esmero técnico de Ingres nos
nus se sobressai na célebre tela Banhista de Valpinçon (1808), onde evidencia
o domínio dos tons claros, quase transparentes para a representação da pele.
157
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
c) A escultura
Ao contrário do volume e da sinuosidade das espirais barrocas, a escultura re-
torna às formas graciosas e leves, realçando contornos e gestos suaves, cuja
sobriedade idealiza expressões que exploram, de preferência, a polidez das
superfícies do mármore branco. A temática mitológica dá relevo ao gosto pelo
nu para melhor idealizar as proporções humanas, como se pode observar na
grande quantidade de trabalhos de um dos escultores mais celebrados do
neoclassicismo, o italiano Antonio Canova (1756 - 1822), a exemplo de Eros
e Psique (1793). Ele também se dedica a bustos e tumbas papais, conseguin-
do, ao mesmo tempo, a realização de uma intenção de monumentalidade e
tranquilidade, como em Clemente XIV (1783 - 87) e Clemente XIII (1792). Na
segunda, a morte costumeiramente representada por um esqueleto, como no
barroco, é substituída pela beleza plena de um anjo.
O neoclassicismo escultórico do francês Jean-Antoine Houdon (1741
- 1828) dá preferência temática a celebridades como os enciclopedistas Di-
derot, Rousseau e Voltaire, sendo o último o mais marcante, graças à sensi-
bilidade do escultor em captar a força interior do filósofo, estampada em sua
expressão corporal e facial. Houdon trabalhou também nas estátuas de Ben-
jamin Franklin, Molière, George Washington, Thomas Jefferson, Louis XVI,
destronado pela Revolução, Robert Fulton e Napoleão Bonaparte.
Músicos falam a respeito das ideias (= temas) [...] e, com frequência, nos
damos conta de que há mais ideias em suas músicas do que aquilo que se
fala a seu respeito.[..] Mas a música instrumental pura não cria, ela mesma,
seu próprio texto? E não é seu tema desenvolvido, confirmado, variado, e
contrastado, da mesma maneira que o objeto de meditação numa filosofia
de ideias? (apud ROSEN, 2000, p.120).
160
MIRANDA, D. S. de
Síntese do Capítulo
Assumindo uma postura crítica ao sentido subjacente à noção de Renascen-
ça, que via a Idade Média como a “idade das trevas”, esta unidade analisou o
processo de constituição das artes ocidentais, a partir da modernidade preco-
ce, dando ênfase ao seu processo de autonomização em relação à estética
cristã medieval que as constrangia em seu teor e forma.
Cobrindo quatro séculos dos grandes estilos – do renascentismo ao
neoclassicismo –, a unidade buscou analisar de forma articulada, as diversas
linguagens do período, visto que elas, em grande parte, expressaram solida-
riamente afinidades estéticas em suas manifestações artísticas.
162
MIRANDA, D. S. de
Atividades de avaliação
1. Opine sobre a visão renascentista em relação à Idade Média vista como idade
das trevas.
2. Disserte sobre as diferenças entre a antiguidade clássica e a estética humanista
renascentista, em que pese a afirmação que essa última retomou os ideais
artísticos da cultura greco-romana.
3. Elabore um quadro comparativo, confrontando as principais características
dos grandes estilos que marcaram as artes ocidentais da era moderna.
4. Analise o contexto sócio-histórico em que se deu o surgimento do barroco
no Brasil, levando ainda em conta seus principais traços característicos.
5. Elabore um pequeno texto que contenha uma questão problematizadora que
leve em conta fatores responsáveis pela constituição dos novos tempos e
suas conseqüências nas mais diversas esferas da vida européia moderna.
Texto complementar
Texto 1
“Quattrocento e Cinquecento: duas ênfases. A arte do Quattrocento ainda conviveu com o
período anterior do gótico ‘internacional’, mas soube produzir dessemelhanças ou particu-
laridades regionais relativamente destacadas. Cada cidade desenvolveu, sob os auspícios de
seus ricos mercadores e novos burgueses, um estilo inerente às suas próprias corporações de
ofícios. A influência e a riqueza dessas associações foi bastante forte para impor os interesses
de seus membros, tanto na aceitação e na instrução dos aprendizes e oficiais, na obediência
às concepções dos mestres locais, como na ‘reserva de mercado’ para seus trabalhos. Em
consequência, o Renascimento evoluiu de maneira a mostrar uma diversidade formal e temá-
tica muito mais abrangente do que a época medieval, em grande parte fruto desse incipiente
‘nacionalismo’ das cidades.
O século seguinte - o Cinquecento - constituiu o ápice da Renascença, em sua poética ou
concepção clássicas. Durante o seu transcorrer, o estatuto e o consumo das artes se modifi-
caram profundamente. A economia, então decisivamente mercantil e financeira, estimulou
o aparecimento de uma sociedade urbana, composta, em linhas gerais, de uma classe média
de comerciantes e de artesãos e dos estamentos das cortes principescas, incluindo-se os seus
banqueiros. Estes últimos diferiam de seus congêneres medievais tanto pela origem da rique-
za quanto por seus princípios éticos e políticos. Os antigos [...] haviam estabelecido ideais de
heroísmo, de amor cortês e abstrato e de moralidade mais rígida. Os novos passaram a aceitar
em seus círculos os endinheirados recentes, os aventureiros de várias origens, os humanistas
plebeus e os artistas, com reputação ou sem nome. Tornaram-se intelectualizados, eruditos,
mais refinados, sensualistas e moralmente dúbios, dado o indispensável utilitarismo da época”.
(CUNHA, 2003. pp. 447-448)
163
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
Texto 2
“A heroína é a Loucura, alegoria que se dirige ao público fazendo seu próprio elogio [...]. Ela
conduz a ronda com competência, não esquecendo nenhum figurante. Aparecem diante do
público os caçadores, os arquitetos, os alquimistas, os jogadores, os devotos, os nobres, os
negociantes, os gramáticos, os poetas, o retores, os jurisconsultos, os filósofos, os monges, os
bispos, os papas, os reis, os militares, cada um mais louco do que o outro, mais convencido de
sua própria importância, confundindo seus desejos com a realidade, todos iludidos pelo amor
de si mesmo, pela Philautia [o amante de si próprio], dama de companhia da Loucura.
Mas a leitura se complica e se torna mais fascinante quando descobrimos que a loucura não
é apenas criticada, mas exaltada. Superficialmente, a oradora elogia todas as manifestações da
loucura, mas [...] é um elogio irônico, confundindo-se com a sátira, e em outros parece ser uma
verdadeira apologia. A distinção é tão fina que muitas vezes é difícil perceber a diferença. Mas
a própria loucura nos dá uma pista, quando nos diz que há dois tipos de insanidade (insanitas),
uma vomitada pelo inferno e responsável pela sede de ouro e pelo amor da guerra, e outra,
amável, inspirada pela heroína. Podemos supor, portanto, que há também dois tipos de stultitia,
uma loucura sábia e uma loucura louca”. (ROUANET, 1992, p. 295)
Texto 3
Em resumo, eis os principais traços da festa barroca: participação popular, pela participação
de irmandades; vestimentas luxuosas bordadas em ouro, prata e pedrarias preciosas; animais,
sobretudo cavalos, ricamente ajaezados; carros alegóricos com efeitos especiais ilusionistas, com
figuras representando mitos pagãos, nativos e santos ou virtudes cristãs, onde as figuras pagãs ou
indígenas encontram-se submetidas à fé católica; pessoas de prestígio (civis, militares e religiosas)
em “destaque”, vestidas com pompa e cerimônia para reafirmar sua superioridade no interior
da sociedade colonial; caminhos a serem percorridos pela procissão, ricamente enfeitados com
luminárias, flores, lagos artificiais; casas com testadas recém-pintadas, com sacadas ornadas com
panejamento luxuoso (“colchas de Pequim ou China”); representantes das etnias formadoras
da população nacional, como negros e índios, ricamente vestidos, representando o “outro” do
colonizador, submetidos à sua fé e lei; máscaras coloridas e coreografias policrômicas de danças
profanas; uso da música onde a sonoridade esfuziante de vozes e instrumentos, articulada aos
efeitos audiovisuais, busca reforçar a idéia de poder e riqueza a serviço da fé e da lei; requintados
espetáculos pirotécnicos das “máquinas de fogo”, fabricadas por jesuítas que as conheceram no
Oriente por ocasião da catequese (Japão, Macau, Goa) (MIRANDA, 2001, p. 104s).
@
Leituras, filmes e sites
O grego: filme de Luciano Salce (1966) sobre o artista Doménikos Theo-
tokópoulos, mais conhecido como El Greco (1541 - 1614), pintor, escultor e
arquiteto cretense, que desenvolveu a maior parte de sua carreira artística
na cidade de Toledo, Espanha, onde, inclusive, existe tem um museu dedi-
cado à sua obra.
164
MIRANDA, D. S. de
Referências
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Perspectiva. São Paulo. 1994.
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na Itália da Renascença. Tradução de Maria Cecília P. R. Almeida. Rio de
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165
História da Arte 1 - Da arte rupestre ao neoclassicismo
F
iel a sua missão de interiorizar o ensino superior no estado Ceará, a UECE,
como uma ins�tuição que par�cipa do Sistema Universidade Aberta do
Brasil, vem ampliando a oferta de cursos de graduação e pós-graduação
na modalidade de educação a distância, e gerando experiências e possibili-
dades inovadoras com uso das novas plataformas tecnológicas decorren-
Artes Plás�cas
tes da popularização da internet, funcionamento do cinturão digital e
massificação dos computadores pessoais.
Comprome�da com a formação de professores em todos os níveis e
a qualificação dos servidores públicos para bem servir ao Estado, História da Arte I
os cursos da UAB/UECE atendem aos padrões de qualidade
estabelecidos pelos norma�vos legais do Governo Fede-
ral e se ar�culam com as demandas de desenvolvi-
Da arte rupestre ao neoclassicismo
mento das regiões do Ceará.
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