Ritmos - Rudolf Meyer
Ritmos - Rudolf Meyer
Ritmos - Rudolf Meyer
Rudolf Meyer
As catástrofes que tem acontecido no mundo de hoje tem, em última análise, suas
causas nos problemas sociais que permanecem sem respostas ou soluções. Então, todas as
tentativas de renovação política no mundo, todas as medidas puramente econômicas, não
importam o quanto sejam audaciosas, vêm se revelando insuficientes para fazer com que a
humanidade saia desta crise. Não existe sistema que possa assegurar uma ordem social
verdadeira, pois aqueles que poderiam promover benefícios não se tornaram seres sociais
ou seres capazes de compreensão e, consequentemente, de ajudar o próximo. Até o
presente, a humanidade tem vivido através de forças sociais herdadas. Elas são a força do
sangue e da tradição, os laços entre os povos e os costumes religiosos, que garantiam uma
vida e uma atuação comum sadias. Em nossos dias, estas forças estão em vias de extinção,
sendo necessário procurar novos impulsos para a vida social, mas não podemos encontrá-las
no atual estado da evolução humana se não aprendermos a conhecer as forças sociais e
antisociais que trabalham dentro da natureza humana.
Abordamos desta maneira o mistério do sono, cuja verdadeira natureza nos escapa,
nos envolvendo numa profunda inconsciência, mas que podemos pressentir pelos efeitos. As
crianças pequenas, por exemplo, podem se tornar insuportáveis quando não dormiram o
suficiente ou foram bruscamente arrancadas do sono. De outro lado, elas se mostram
afetuosas, acolhendo seu ambiente com bom humor, quando foram impregnadas pelas
harmonias trazidas pelo sono. É um fato corriqueiro ao qual estamos muito habituados para
que nos espante outra vez: cada manhã, emergimos do reino da noite com um vivo interesse
pelo mundo. Mas este encerra também o germe do verdadeiro amor, de uma alegre
participação e dedicação para com nossas tarefas terrenas.
Esta constatação pode nos fazer pressentir o caráter sagrado do sono. Não está longe
deste sentimento a veneração a esta força cósmica desconhecida a qual cada noite abarca
nossa consciência. E como resultado, na manhã seguinte ela retorna regenerada e
harmonizada. Esta veneração pode servir de ponto de partida para a educação religiosa da
criança. Ela representa a primeira forma de ligação da alma humana com o mundo invisível.
Os povos da antiguidade desenvolveram sua piedade levantando seu olhar interior a essa
força cósmica que a cada noite acolhe a nossa consciência pessoal sem que saibamos,
guardando-a intacta, para nos devolvê-la fortificada a cada manhã. Contemplando-a com
veneração, pressentiram aí um Eu superior mais vasto, dentro do qual a alma humana pode
se sentir envolvida.
O salmista diz: “Aquele que te guarda, não dorme jamais.” O ser divino adorado pelo
homem piedoso, do antigo testamento sob o nome de Senhor é reencontrado no reino da
noite. Este grandioso Ser de Sabedoria conhecia e julgava seus desejos mais profundos e
orientava seus pensamentos e aspirações sobre a Terra. A expressão “Que o Senhor te
desperte entre os seus durante o sono”, que hoje nos faz sorrir, encerra uma profunda
sabedoria. As pessoas que ainda pressentem algo dessa força cósmica, a qual cada noite
entregamos o nosso eu, têm o costume de levar para o sono as grandes decisões, uma ou
várias vezes, antes de optar por elas.
Melhor ainda que estes versos de Frederic Hebbel, os “Hinos à Noite de Novali, que
nos fazem penetrar neste mesmo mistério. Para este poeta, o ato de fé nas profundezas
escondidas do reino noturno representavam ao mesmo tempo um ato de fé naquele que
nasceu outrora numa noite santa para santificar um dia o mundo das aparências sensíveis
pela força do amor.
Tu que repousas,
dilatado
noite de luz e de estrelas,
imerso nas distâncias eternas,
Diga, o que sonhas aí?
O Ritmo da Semana
Há na natureza humana, ritmos que são descobertos somente por uma observação
mais profunda. A introdução da semana de sete dias, nos povos do Oriente Médio há
milhões de anos atrás, foi ma medida social de grande sabedoria. Ela expandiu-se para os
Gregos e Romanos no princípio da nossa era, passando então para toda a civilização
ocidental, acompanhando a expansão do Cristianismo.
Queremos chamar a atenção sobre as influências astrais que, no ritmo dos sete dias,
agem sobre a sensibilidade humana, sobre seus desejos e seus instintos, abaixo do limiar da
consciência diurna. Elas seguem a mesma progressão da escala musical que também possui
sete intervalos, para chegar ao oitavo no seu ponto de partida, uma oitava acima, como num
movimento em espiral. É o sonhador dentro do homem que se submete a este ritmo
septário (sétimo).
O cuidado e zelo com que os doutores e fariseus guardam o Sabbat nos parecem,
hoje, bem estranhos. Mas não podemos esquecer que um ritmo vigoroso se implantou
quando, durante tantos séculos, um povo praticou a santificação do sétimo dia com quanta
seriedade e fidelidade.
Guardando o sétimo dia, o zelo pelos dias de trabalho, a febre que sobe durante seis
dias, exerce uma ação marcante sobre a vida psíquica do indivíduo e de toda uma civilização.
O exercício continuo do trabalho ao longo da semana deve deixar lugar para o repouso
completo no sétimo dia. Consagrando-se o Sabbat ao estudo da lei, em busca da vontade
divina, o homem piedoso opera em si uma reviravolta radical em direção de sua vontade.
Durante sete dias ele atuou do interior para o exterior, esgotando-se, até certo ponto. No
sétimo dia, ele deve aprender a parar; ele deve acolher em si um querer divino que irradia
do exterior para o interior.
O Ritmo Lunar
Todavia seria um erro acreditar que este ciclo, fenômeno interior, dependesse
simplesmente das fases da lua, fenômeno exterior. Isto é verdadeiro sobretudo para a
intensidade , mais ou menos forte dos sonhos que para a maioria das pessoas, culmina sob a
ação da lua cheia. Cogitamos também no sonambulismo dos lunáticos. Mas estes fenômenos
são os últimos vestígios de antigas ligações cósmicas da natureza humana. Eles estão hoje
em dia em vias de desaparecimento. Por outro lado, o ritmo lunar que queremos abosdar
agora é independente de qualquer influência externa.
Mas o que representa esta visão do futuro do ser humano? A vitória da alma, tão
permeada pelas forças solares do universo que ela possa se libertar de todas as ligações
naturais que submetem a vida corporal à atividade da lua. São sobretudo aquelas forças
lunares que nos levam à encarnação; elas agem nas leis da hereditariedade.
A forma como os nossos humores circulam em nosso corpo e na medida em que noss
vida psiquica depende desta atividade humoral mais ou menos sadia, eis o que se mostra
nos temperamentos. A medicina antiga já conhecia o humorismo. Uma pessoa cujos
humores estejam em bom estado se dintinguirá por aquilo que chamamos de “humor”. O
temperamento sanguineo deve sua facilidade de se “inflamar” a uma constituição onde a
irrigação sanguinea é rápida; já o melancólico deve sua contração e suas horas sombrias ao
mau humos, à biles negra, como seu nome indica.
O Ritmo da Encarnação
Existe ainda um ritmo mais lento que rege nosso corpo físico; ele abarca um período
de quatro vezes sete vezes dez dias. São os dez meses lunares ou quarenta semanas que o
embrião humano precisa para chegar à maturidade. Sem dúvida, devemos fazer aqui uma
diferença entre o organismo do homem e o da mulher. Nas suas conferências sobre “A
antropologia segundo a Ciência Espiritual”, que trazem à luz de uma maneira magistral as
leis do ritmo do homem, Rudolf Steiner mostrou que o corpo masculino, estando mais
densificado que o feminino, vive dentro de um ritmo mais lento: o do ano solar. Como o
desenvolvimento do embriaç acontece no envoltório protetor do corpo materno, ele é
submetido ao ritmo do organismo feminino de quarenta semanas. O maravilhoso é que
encontramos este período no calendário cristão. O 24 de dezembro é consagrado a Adão e
Eva, recordando a alma que se prepara para festejar o nasimento de Cristo, as origens
paradisíacas do gênero humano. Ela deve aprender o significado do acontecimento do Natal:
a renovação do gênero humano pelo segundo Adão, Jesus Cristo. Quando a alma recebe a
mensagem de Natal como convém, ela deve se sentir de volta ao princípio da vida. Então ela
própria pode se tornar Maria. Um germe de luz pode ser concebido por ela na noite santa.
Ele deve crescer e tomar forma no decurso do ano vindouro.
Estes acontecimentos tem ligação com os desafios que a criança, no começo de sua
vida, deve enfrentar, durante quarenta dias onde ela começa a fazer sua alma penetrar em
seu envoltório corporal; com a diferença que o Espírito do Cristo empreendeu este trabalho
em plena consciência e o completou em quarenta dias. Sabemos que era também num
periodo de quarenta dias que os místicos da Idade Média se retiravam para seus exercícios
de purificação, quando se entregavam à contemplação na solidão. Naquela época, também
era sabido que para se adquirir o domínio do espírito sobre o corpo e acordar de sua letargia
era necessário justamente este período de tempo. Antigamente em outros lugares esta lei
era era observada em relação à higiene. É assim que na idade Média se decretava a
“quarentena” contra os navios que encostavam nos portos italianos, em caso de suspeita de
peste. Vindo de um antigo conhecimento médico, conservava-se a noção que os fenômenos
de purificação – e consequentemente a eliminação das doenças infecciosas – se desenrolam
num período de quarenta dias.
O mesmo espaço e tempo aparece ainda no interior do calendário das festas cristãs,
como o ritmo que vai da Páscoa até a Ascenção. É este tempo de graça, onde os discípulos
foram considerados dignos de viver com o Ressureto. Estes quarenta dias representam
também um começo de vida. A morte no Gólgota é pois um nascimento espiritual. Nos
acontecimentos que se desenrolam da Sexta-feira Santa até a manhã de Páscoa, o Eu do
Cristo conquista sua nova forma de existência. A partir deste momento Ele se tornou o
Espírito da Terra. Ele começa a impregnar a vida deste planeta destinado à morte com forças
divinas de rejuvenescimento. Durante os quarenta dias onde o Ressureto brilha ao olhar
interior dos discípulos, homens e mulheres, o Eu do Cristo se adapta, por assim dizer, à
atmosfera da Terra. No final deste período ele é levado às nuvens, quer dizer, se une à vida
própria da Terra. Cada ano, no despertar da primavera, a alma se abre a um novo milagre.
Mas ela não deve mais ver a Terra sem o Cristo. É por esta razão que é tão importante
reencontrar em nossa época o ritmo de quarenta dias que nos leva da Páscoa à Ascenção e
nos ensina a sentor o Espírito de Cristo nascido na vida da Terra.
Ritmos Solares
São os ritmos lunares que nos introduzem na visa terrena. Antes do nosso
nascimento vivíamos neles. Eles continuam a atuar em nós como uma herança cósmica, que
nos determina. Por outro lado, são os ritmos solares que nos chamam à plena consciência na
existência terrestre. Eles libertam o eu humano das correntes do passado nos encorajando a
caminhar com segurança ao encontro do futuro.
Fazendo cada vez mais conscientemente a experiência viva das relações terra – sol no
decurso do ano, a alma humana se impregna dos ideais que a elevam além dela mesma,
recebendo forças vigorosas para os realizar. O ritmo solar do ano se manifesta primeiro na
vegetação das plantas. Se a alma humana se detém na visão da natureza que cresce, flore,
dá frutos e murcha, ela se sentirá prisioneira de um fluxo de fenômenos imutáveis; ela só
poderá sentir a fragilidade de sua própria existência. É preciso completar sua existência com
outra abordagem. Lembremos que não é unicamente para poder se reproduzir no ano
seguinte que os campos de cereais e os pomares amadurecem seus frutos em abundância.
Com a frutificação eles sacrificam um adicional de forças vitais que não são absolutamente
necessárias à conservação da espécie, mas que servem de alimento a seres superiores. É
assim que a cada ano o mundo vegetal oferece aos reinos animal e humano os elementos de
sua existência. É um erro, ou ao menos um julgamento incompleto, dizer que a natureza só
conhece a luta pela vida ou só desempenha um instinto de conservação (de si e da espécie).
Ela conhece igualmente um espírito de sacrifício que inspira todo o crescimento e toda a
frutificação. Este atua na escala dos seres vivo como uma tendência misteriosa de se elevar
acima de si próprio, renunciando à sua própria vida para servir de degrau a vidas superiores.
É deste sacrifício da natureza que o homem depende para poder viver em nosso planeta. No
ritmo da atividade solar com sua luz fecundante, seu calor amadurecedor, a terra é
permeada por forças sublimes onde devemos reconhecer uma moralidade cósmica. Quando
o homem descobre estas leis ele pode se impregnar conscientemente delas. Elas renascerão
em seu coração sob a forma de amor criativo. Elas inspiram sacrifícios que levarão a vida
humana além do seu pequeno mundo egoísta. Com efeito, porque o homem não deveria,
ele próprio, com suas forças psíquicas e espirituais amadurecidas, servir, por sua vez, de
alimento a reinos superiores, em lugar de unicamente se esgotar na conservação de si
próprio e de sua raça? Assim como o reino vegetal faz com o reino animal e humano, não
deveria o próprio homem em sua vida terrena oferecer alimento e bebida para mundos
superiores?
Consideremos agora o reino animal e observemos como certas espécies se inserem, à
sua maneira, no ritmo anual do reino vegetal. O cervo descarta seus chifres todos os anos e
não contente em repeli-los, agrega ano a ano duas galhadas suplementares, de forma que
podemos saber sua idade pelo numero de galhos de seus chifres. Ou então, observemos a
muda dos pássaros no outono. Eles renovam a sua plumagem a cada ano. É um trabalho
admirável que se realiza no organismo de um ser tão pequeno. O homem não precisa se
cansar com um trabalho semelhante; ele pode economizar forças produtivas que a cada ano
ficam sobrando. Colocamos agora uma questão talvez um pouco ousada: o que faz o homem
de suas forças não utilizadas? Falando em imagens: ele pode se emplumar com as forças de
seu interior. Com a aproximação do inverno, quando as forças da alma começam a se
interiorizar, o homem é chamado a “fazer crescer” pensamentos em si, ele pode acordar em
si a força criativa da imaginação que lhe traz arrebatamento e calor interior, enquanto a
natureza retira os seus dons externos. Mas esta atividade criadora interna do homem difere
em um ponto daquela que repõe a plumagem do pássaro no outono: o homem tem a
possibilidade de deixar desempregadas as forças criativas que estão à sua disposição. O
pássaro, a natureza o domina; o homem é chamado à liberdade.
O homem está, hoje em dia, em vias de se desligar cada vez mais de suas origens.
Esta evolução será por fim o nível total de toda a riqueza da alma. Ela terminará por
acarretar um enfraquecimento de sua personalidade, uma de suas faculdades mais
profundas de vida interior, se não pudermos nos remeter livremente ao encontro das
relações com os ritmos do ciclo anual.
Há um ser que deseja vir em ajuda da alma humana,, nesta tomada de consciência
vinda do curso do ano. Da mesma forma que o sol exterior com sua força brilhante é
indispensável à natureza e suas manifestações, assim o Cristo será para a alma humana e
para seu desenvolvimento espiritual ele atuava na existência terrestre através dos ritmos
solares do ano; os profetas dos tempos antigos o viam trabalhar no sol. É nele que pensavam
quando o adoravam sob este ou aquele nome, a divindade da luz.
Após ele se unir por amos à vida do nosso planeta, pelo sacrifício de sua morte, ele
impregna a existência terrestre com as forças divinas do sol, como em uma respiração.
Contrário ao que normal se acredita, não é a Bíblia que se opõe a tal enfoque. Do
ponto de vista ela própria nos dá a prova em todas as suas páginas, mas antes o pensamento
materialista dos últimos séculos (tempos). Todavia assistimos atualmente a uma grande
reviravolta na concepção científica formada no decorrer dos últimos tempos segundo
métodos puramente matemáticos e físicos, estes não podem senão representar a terra e o
universo como um aglomerado sem vida de substâncias de um lado ígneas e gasosa e de
outro lado condensadas em (escorias). O século 20 tem a tarefa de mostrar à humanidade
uma concepção de mundo que seja orgânica. A geologia e a meteorologia são obrigadas,
pela própria linguagem dos fatos, a reconhecer que a estratificação do globo terrestre e
sobre tudo da atmosfera que o envolve, são testemunhas de uma construção orgânica
maravilhosa que se manifesta em ritmos vitais.
Quando soubermos disto, não estamos longe de admitir que o que os poetas de
todos os tempos pressentiam e o que as antigas religiões acreditavam com veneração que a
terra tem uma alma. E é para esta alma da terra que um ser vindo de mundos divinos de luz.
O Cristo se tornou o eu superior da alma da terra. É por esta razão que, na última
ceia, onde ele começou a se unir em sacrifício de amor à vida da terra que ele pronunciou
estas palavras: ESTE É O MEU CORPO, ESTE É MEU SANGUE....
A santa ceia é mais que um símbolo da presença do Cristo no ser da terra. Sob a
evolução do alimento terrestre, do pão e do vinho, um ser divino se doa perpetuamente à
vida da terra que morre para conduzir a transfiguração.
Nesta época também devemos virar nossa alma para o interior, para aprendermos a
contemplar, na escuridão da matéria, o ser luminoso da terra. O espírito de Cristo, que vela
no coração da terra, enquanto a natureza exterior mergulha no sono. Se neste momento
dirigimos nosso olhar para a vegetação que definha, para a natureza entorpecida, nos
tornaremos então presas das forças de morte da terra. A alma experimenta a melancolia, se
as profundezas místicas da existência terrestre, onde se cria uma vida superior, solar,
permanecem inacessíveis.
Podemos agora retornar ao círculo dos temperamentos, onde a alma humana deve
se refletir aprofundando e se soltando de seu corpo.
Nos quatro ambientes do ano é a própria alma da terra que o permeia. Mais
precisamente: são as imensas legiões de espíritos elementais que trabalham na vida da
terra, ora profundamente enfeitiçados, ora ressurgindo alegremente de seu cativeiro. Se,
por exemplo, observamos a melancolia, que de repente irresistivelmente invade a lama com
as brumas de novembro e para a qual não encontramos nenhuma razão em nossa vida
pessoal. É a opressão das criaturas que aguardam sua libertação; como fala São Paulo, a
melancolia dos seres elementais. É ela que abate a alma desarmada do homem, ignorantes
que são eles suspiram perante o homem como perante seu salvador, que deverá trazê-los à
luz.
Já falamos da festa de Natal com sua preparação no decorrer dos quatro domingos
do Advento e terminando nas quatro semanas da Epifania. Esta festa trás as forças
sanadoras necessárias à cura da melancolia em nós, com efeito ela nos alerta para o futuro
da terra, com suas asas de esperança ela nos arranca da força paralisante que quer
aprisionar a alma no passado. O homem melancólico é aquele que vive mais na esfera de
seus interesses pessoais; ele sofre apenas com seus próprios males. O Natal, festa do amor
que nos convida a pensar no sofrimento dos outros e lhes dar alegria, vem trazer justamente
o contraponto para este temperamento. Elevado acima de si próprio, o melancólico poderá
simpatizar, da maneira mais íntima com o sofrimento de seu próximo. Com a chegada da
primavera, as forças da água que amolecem a terra e fazem crescer a vegetação, ameaçam
entorpecer os movimentos da sensibilidade. Se a alma se abandona passivamente às forças
vegetativas do corpo, elas o deixam fleumático. Em vista disso, o cristianismo medieval
instituiu a quaresma com seu severo jejum (e isto durante quarenta dias). Isto deve preparar
o clima da paixão. O fleumático é aquele que precisa de emoções fortes para sair do seu
torpor. É no principio da primavera que desceu a cruz no Gólgota. Ela nos lembra este ato de
amor pelo qual um ser divino tomou para si os erros e os sofrimentos da humanidade
terrestre. Ajudar os outros é a força do temperamento fleumático, uma vez que ele possa
sair de sua inércia e realmente se convencer da necessidade de uma tarefa. O ar ensolorado
que faz brotar o prado florido no mês de maio, como por encantamento, eleva a lama acima
de todo o peso terrestre; é ao temperamento que se inflama facilmente, o sanguíneo em
nós, que apela esta época feliz do ano. A flor que eleva seu cálice ao sol, a borboleta que
volteia ao seu redor, o pirilampo que vaguei na noite de verão, todos manifestam a alma da
terra, enlevados nesta época às alturas etéricas. E a alma humana, que se abre a tanta
beleza, não deveria subir em suas asas? A força positiva do temperamento sanguíneo é a
faculdade do entusiasmo que pode coloca-lo à disposição de uma grande ideia. Ele está
sempre pronto a empreender algo novo. O que ele deve aprender, então é servir com
fidelidade, em vez de se perder num deleite egoísta. A alma sanguínea deve desenvolver a
faculdade de resistir a seus impulsos. A festa de São João, colocada na hora solar do ano,
serve de modelo para aquele que, com suas forças entusiásticas, possa colocar em
movimento um mundo envelhecido, perante aquele que deve chegar. Se soubermos festejar
São João da maneira correta, colocamos na alma a vontade de fazer silêncio, de trazer o
fruto: sabedoria antiga e madura que nos mostra a natureza estival que se aquieta na
renúncia de si. Nas trovoadas de verão, nos frutos que amadurecem e se tornam doces, no
abrasamento das cores outonais das florestas e jardins, a natureza do fogo se exprime no
tempo da colheita, inflamando e transfigurando toda a vida sobre a terra, correndo o risco
de a consumir. Esta natureza do fogo, quando impregna o ser humano, pressiona-o para a
ação muitas vezes procurando libertação num temperamento explosivo. Com a aproximação
do outono, as forças criadoras da terra procuram mergulhar o mais profundamente possível
na matéria para trazer à plena maturação os frutos alimentícios numa profunda alquimia.
Uma força contida executa o milagre do outono na vida frutífera da terra; mas de repente
ela pode explodir em raios e tempestades.
Nas conferências sobre as estações do ano, Rudolf Steiner falou sobre a espantosa
arte médica que atua nos fenômenos cósmicos: no decorrer das noites de agosto, quando
uma bruma densa sobe do solo, o céu envia nuvens de estrelas cadentes e impregna a
atmosfera da terra com uma poeira de meteoros. Diríamos que um médico cósmico deseja
aplicar uma poderosa dose de ferro no organismo febril da terra. Este ferro que impregna
fortemente a atmosfera da terra e faiscante se expande, Rudolf Steiner chama “A Espada de
Micael”. Nossa época é rica em forças de fogo contidas, prestes a explodir. Elas ameaçam
continuamente provocar explosões de vontades destruidoras na vida social se não pudermos
compreendê-las e traze-las à luz. O colérico se torna um revolucionário se não lhe é
permitido empregar suas forças de uma maneira válida. Mas ele pode também se tornar um
campeão da justiça e da liberdade. O tratamento do temperamento colérico consiste em lhe
proporcionar tarefas concretas onde ele possa empregar suas energias, se possível tendo
que vencer obstáculos e se engajando em empreendimentos que lhe pareçam valorosos, ele
deve ter consciência de seu mérito pessoal. As ações que demandam esforços fornecem a
melhor ocasião. Sempre pronto a intervir, ele deve almejar um fim nobre e grandioso a fim
de provar seu valor. A poderosa imagem de Micael combatendo o dragão pode inspirar a
justa iniciativa da alma. A humanidade de hoje necessita de um ideal como esse para não
cair no abismo da autodestruição. Uma visão apocalíptica da nossa época e o senso de
responsabilidade serão absolutamente necessários para fazer da festa de Micael uma
terapêutica eficiente para a civilização moderna e para completar o milagre da cura da
vontade humana, entregue aos demônios.
O tempo das festas abrem, por assim dizer, as portas do espirito por onde o Cristo
pode penetrar na vida da terra. Elas contem forças capazes de transformar tudo o que traz
doença para o homem, ameaçando prendê-lo na escuridão da matéria ou de dissolvê-lo na
leveza do ar. Restabelecem nele o equilíbrio cósmico entre altura e profundeza. E escondem
outro segredo: através da transformação do homem, elas podem agir também na
transformação da terra. Celebrando as festas cristãs de maneira correta, inspirando-se com
o conhecimento dos ritmos cósmicos, promoveremos a libertação dos seres elementais
cativos na matéria. A alma da terra acorda de seu sonho na luz de Cristo e se transfigura.
O ritmo macrocósmico
Considerando este grande ritmo da precessão dos equinócios como um ano na vida
deste Ser macro cósmico, descobriremos correspondências bastante harmoniosas na vida
humana. Dissemos que o ponto vernal recua um grau em 72 anos. Como o equador celeste
está dividido em 360 graus, estes 72 anos completam justamente um dia no ritmo cósmico.
(Se contamos um ano de 365 dias, será um período de 71 anos o equivalente a um dia
cósmico). Uma vida humana inteira, do nascimento à morte, corresponderia a um dia no
curso do ano cósmico. Se é verdade que 71 anos terrestres compreendem, por sua vez,
25920 dias que representam cada uma das respirações da alma humana (ritmo sono-vigília),
este dia cósmico – uma vida do homem – ele terá também um ritmo de 25.920 respirações.
Não é senão se referindo à esta “escritura” das estrelas que podemos falar destas
épocas de civilização. Devemos aprender a ver como o futuro do gênero humano está
impregnado com a pulsação de vida de um Ser macro cósmico. Poderemos então escolher,
com conhecimento de causa, submetermos livremente à estas leis e de as servir ou, ao
contrario, nos revoltar cegamente contra elas nos chocando assim contra a inexorabilidade
dos fatos cósmicos.
O ritmo de Saturno
Destacamos um ultimo ritmo planetário que tem uma importância decisiva para a
vida humana: é o ano Saturnino, que dura 29 anos e 167 dias. Mas se considerarmos que
neste intervalo a terra realiza suas próprias revoluções, o tempo que separa duas posições
análogas de Saturno sob a abóboda celeste se modifica um pouco para o observador
humano. Devemos contar com um ritmo de aproximadamente 30 anos. Calculado a partir do
nosso nascimento esse período representa em nossa vida a época de “plasticidade” da
juventude. Ao redor dos trinta anos ainda vivemos com estas forças de crescimento que
trouxemos conosco para a terra. Elas dão para a alma uma impulsividade natural. Podemos
facilmente constatar que perto do trigésimo ano aparece o primeiro enfraquecimento das
forças vitais, sobretudo no desenvolvimento psíquico. Quando um homem chega na idade
de um ano saturnino, forças endurecedoras entram em jogo em sua organização. Na
antiguidade o deus Saturno (os gregos o chamavam Cronos e viam nele o regente do tempo)
era representado por um velho, muitas vezes com a foice. Na antiga ordem dos planetas,
onde não aparecia ainda Urano e Netuno, ele era o sentinela do nosso sistema solar. Do
ponto de vista macro cósmico ele age fixando os limites aos impulsos vitais. Muitas vezes
podemos observar no curso da vida humana – seja a nossa própria ou a de outros – que ao
redor do trigésimo ano começa uma crise que logo se manifesta por problemas de saúde e
muitas vezes provoca desordens psíquicas. É como um esgotamento de ânimo, uma
imprecisão na orientação do esforço ou uma clara cisão na melodia do destino. As pessoas
que não percebem nada disso – que, como se diz, “não mudaram” – nesta idade começam a
se aburguesar. Isto não as impede de “se sentirem sempre jovens”, de ter prazer em reviver
façanhas de sua juventude ou ainda sendo felizes em as repetir, pois não se deram ao
trabalho de desenvolver forças de evolução enquanto era tempo.
Quando vemos como o impulso vital de inúmeras pessoas que vieram dotadas de
tantos talentos promissores, se extinguem ao redor do trigésimo ano, podemos avaliar como
é decisivo para o destino de uma alma que ela tenho sido capaz ou não de se unir ao Cristo
na sua juventude. Tais considerações nos trazem o sentimento da mais grave
responsabilidade no que concerne a educação religiosa da criança e do adolescente. Com
efeito, a maneira mais salutar de preparar a segunda metade da vida dos jovens confiados a
nós é permitir que cada um, à sua maneira, posa reencontrar o Cristo no momento certo e
ajuda-los a realmente se unir a Ele no coração. Desta maneira eles atravessarão de outra
forma a crise do trigésimo ano.
Para terminar, lembremos que se uma pessoa vem a falecer antes da idade em
questão, será no momento de sua morte que ela realizará esta união vitoriosa com o Cristo.
Saturno atua nas forças da morte; a doença e a morte também aceleram a sua ação, pois
sem ela só no trigésimo ano a maturidade será possível. Porém o Cristo não cessa de
transfigurar a morte em vida superior e pode conceder para a alma uma juventude celeste
do outro lado do limiar.
O ritmo do ano saturnino e seus três anos solares que se juntam pela graça do Cristo,
fazendo desabrochar na morte uma vida superior, engloba um período de trinta e três anos.
A vida terrestre de Jesus Cristo se torna sagrada para nós. Podemos seguir este ritmo de
trinta e três anos no destino das grandes personalidades e também nas civilizações da
humanidade. Descobrindo seus traços, podemos chegar à compreensão luminosa do poder
do Destino que atua na vida dos homens.
Observações deste gênero nos fornecem uma chave inestimável para compreensão
dos mistérios da biografia humana. A vida de gênios criativos como Goethe, Schiller e
Richard Wagner (ou ao contrário, Nietzsche) confirmam a fecundidade destes pontos de
vista revestidos de uma nova sabedoria do Graal – no sentido da Ciência Espiritual de Rudolf
Steiner.
Para compreender melhor os destinos humanos seria necessário agora falar do ritmo
de sete anos, onde as forças dos planetas se sucedem, da infância até a idade mais
avançada. A individualidade eterna do homem até sua pátria nas estrelas. Não é senão por
etapas de sete anos que se introduz na existência terrestre aquilo que lhe foi confiado como
dote pelos céus.
Sobre o autor:
Rudolf Meyer nació en 1896 en Hannover, comenzó el estudio de la teología en Kiel y Heidelberg y
de la filosofía en Göttingen, como estudiante de Edmund Husserl. Allí entró en contacto amistoso con
Edith Stein.