Apostila Oficina de Práticas e Processo de Criação

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APOSTILA DE PROCESSO DE CRIAÇÃO

Para as disciplinas
Oficina de Práticas do Curso Teoria e Prática
Junguiana
e
Ateliê e Processos de Criação e suas Linguagens
Para a disciplina em comum:
Mitos, Contos e Fábulas

Apostila de Elizabeth Christina Cotta Mello & Vanda Viola

MATERIAL BÁSICO

MATERIAL BÁSICO DESTA DISCIPLINA


1. xerox colorida da imagem do mito (pode ser qualquer mito de qualquer panteão; mas é
importante ser uma imagem de um mito)

MATERIAL BÁSICO DO PROCESSO CRIATIVO – trabalho de Ateliê ou de Oficina de


Práticas, utilizado, em geral no trabalho de Mitos, Contos e Fábulas.
2. caixa de lápis de cor (macia)
3. tesoura
4. cola
5. lápis grafite macio
6. borracha
7. bloco de papel Canson A3 200gr
MATERIAL BÁSICO DE OUTRAS DISCIPLINAS
Recortes de revistas
Xerox de fotos em geral, de família e de elementos da terra, ar, água e fogo.
Floresta, mar e temas ligados aos reinos: mineral, vegetal, animal e humano.

MATERIAL A SER SOLICITADO – OUTROS MATERIAIS SERÃO PREVIAMENTE


ENVIADOS QUANDO NECESSÁRIO
* lápis HB e 6B
* argila
* uma tela
* uma tinta que goste de pintar com pincéis de vários tamanhos
* imagens e palavras de revistas: de temas, cores, etc
* cartolinas ou papel cartão em cores
* suporte – base: de MDF ou de compensado
* material da Natureza
* folhas comuns de papel sulfite
* canetas de várias cores bic ou similar
* lápis de cera; lápis de cor pastel oleoso ou pastel seco
Tudo será solicitado mas é bom já saber onde compra
Quando tivermos necessidade veremos o que precisamos comprar para aulas específicas de História
da Arte
PARTE I

PROCESSO DE CRIAÇÃO

Elizabeth Christina Cotta Mello

“Quando meus pacientes projetam tais imagens, não o fazem sob sugestão, elas ocorrem
muito antes que eu conhecesse seu significado ou suas relações com as práticas do Oriente.
Essas imagens brotam espontaneamente de duas fontes. Uma delas é o inconsciente, que
produz de modo natural fantasias dessa espécie. A outra fonte é ainda que, quando vivida
com plena devoção, proporciona um pressentimento do si-mesmo, da própria essência
individual.”
C. G. Jung, O segredo da Flor de Ouro, p. 40

www.praticajunguiana.
com
“o próprio papel, com seu grão e sua fibra, provoca a mão sonhadora para uma rivalidade de
delicadeza. A matéria é, assim, o primeiro adversário do poeta da mão. Possui todas as multiplicidades
do mundo hostil, do mundo a dominar”. BACHELARD

CONCEITO DE ARTE E ESTÉTICA


“quando um homem observa uma árvore do ponto de vista de um carpinteiro, ele a associará aos
vários empregos que poderá dar a madeira [...]. Só aquele que se abandona simples e totalmente ao
objeto de sua percepção poderá experimentá-lo esteticamente” (PANOFSKY, 1991, p. 30-31). Há
uma relação entre a vivência íntima e pessoal do artista com sua arte e "por um certo lado, como ela
se projeta para fora desse entrelaçamento” (C. G. JUNG, 1985, p. 57).

Na medida em que conseguia traduzir as emoções em imagens, Isto é, ao encontrar as imagens que se
ocultavam nas emoções, eu readquiria a paz interior. Se tivesse permanecido no plano da emoção,
possivelmente eu teria sido dilacerado pelos conteúdos do inconsciente. Ou, talvez, se os tivesse
reprimido, seria fatalmente vítima de uma neurose e os conteúdos do inconsciente destruir-me-iam do
mesmo modo. Minha experiência ensinou-me o quanto é salutar, do ponto de vista terapêutico, tornar
conscientes as imagens que residem por detrás das emoções. (JUNG, 1989. p. 158)

ARTE: CONCEITO DE SORRIAU: Como resumi na minha monografia de Educação Artística


(MELLO, 2007) e posteriormente no livro sobre processo criativo (no prelo):

[...] um conjunto de ações orientadas e motivadas, que tendem expressamente a conduzir um ser [...]
factício [...] do nada ou de um caos inicial até a exigência completa, singular, concreta, que se atesta
em presença indubitável”.
CRIAÇÃO – etimologia - Origem latina, é “creare” (SARAIVA, s/d, 1993, p. 316). Creatio vem de
creare (ibid): “Procreação, ... [ou ainda] creação, escolha, eleição, nomeação”. Criar seria “Tirar do
nada, transformar, educar, cultivar, inventar” (p. 844).

IN-FORMAR Pela etimologia – imaginação – é dar forma e ao dar forma. Dar forma está
relacionado ao fazer da arte. Esse faze tem um significado profundo, o significado de criar. Estamos
falando de um fazer facere e támbém um fazer perfacere, aspecto que está associado ao ato de
criação. O ser humano ao criar, cria a si mesmo. (Como nos lembra Ostrower, 1977 apud MELLO,
2007).
IMAGINAÇÃO É REALIDADE
Um breve resumo, do livro Estéticas, Arteterapia e Psicologia Junguiana (MELLO, mimeo, 2013).
"'O homem racional [...] fascina-se sobretudo pelas conquistas de sua mente consciente. Identifica-
se com oque Jung chamou de "pensamento direto" (em contraste com "pensamento de fantasia") da
qual as mais claras expressões são a ciência e a tecnologia" (p. 12)
Lembremos que modelo estamos falando para a ciência.
“De que ciência estamos falando? Ciência e Tecnologia: Confundimos ciência com tecnologia: não
é melhorando as técnicas, as máquinas, que poderemos entender melhor o solo. As máquinas
sozinhas sem o conhecimento apenas recolhem material. Afirmar que mexer na terra é suficiente,
significa também que o sistema autocurativo da Terra e do ser Humano, por mais plástico que ele
seja, não opera transformações apenas com as substâncias certas. Como todo bom médico sabe,
entre o remédio e o individuo, com o seu corpo e psiquismo, este último é o determinante. Temos
sistema imunológico, sistema hormonal, etc, que provam que sem o organismo estar disposto não
há remédio que faça efeito.
Já dizia Jung que a técnica - e mesmo a teoria - nas mãos erradas não funciona.”

A imaginação:
No Ocidente atual, podemos citar pensadores, como Jung, Hillmann, Barfield, Cassirer, citados por
Avens, e na Arte muitos outros como Read, etc, que entendem como um "talento
caracteristicamente humano - alguns chamaram-na de poder divino dos homens - que trabalha em
direção à autotranscendência e à reconciliação do espírito no mundo." (AVENS, 1993, p. 19)
Jung e o instinto da criatividade.” (MELLO, mimeo, 2013, p. 3).

Apesar da postura diferente de Ostrower – ela se fundamenta do gestaltismo - seus livros são muito
ilustrativos e é uma das nossas estudiosas que mais pode contribuir com a arteterapia. Incluímos
aqui a Herbert Read que foi o tradutor das obras de Jung para o Inglês e que foi fundamental no
estudo da História da Arte como um todo sem preconceitos sobre os novos movimentos da arte em
sua época.
Para Jung fazer envolve um trazer da virtualidade para o mundo concreto, enfim, criar. Há um
acontecer em vários níveis. O acontecer depende da disponibilidade do sujeito, mas o sujeito não
está separado do social e de seu coletivo - “social” interno. Todas essas influências precisam ser
levadas em conta: a saber: o interno como subjetivo e coletivo, logo em parte objetivo, e a
construção no ato de acontecer a criação.”

UM EXEMPLO DE PROCESSO CRIATIVO


Nessa escultura composta de duas peças, a figura feminina parece estar recolhida a algo semelhante
a uma concha. Deitada, percebe-se que suas formas vão se diluindo a partir da cintura. Por esse
motivo, suas pernas parecem ainda incompletas. A concha poderia representar um lugar ou estado
de gestação.
A ESCULTURA da folha e da mulher
Figura 6 – A mulher deitada sobre a folha: verde e dourada, nascendo, com olhos fechados. Bronze.

Mulher nascendo sem pés do objeto criado: a mulher e sua criação. Só uma das mãos que existe, a
esquerda, nascendo do que muitos colegas chamaram de concha – do mar, concha que guarda a
pérola, concha de lugar fechado.

Sobre o desenho:
O desenho apresenta tema similar ao da escultura da mulher na concha. Nessa obra, povoada de
figuras que nos remetem ao psicodelismo sessentista, notamos um movimento circular realizado
pelos elementos da composição, que flutuam ao redor como se pertencessem a um sonho da figura
principal. A princípio, a menina aparenta estar brincando em um balanço.
No início da elaboração do trabalho, o fluxo desse movimento circular foi interrompido na área das
pernas da figura. As pernas também estavam com proporção errada. Após a observação e reparo
desses detalhes, a artista, ainda involuntariamente, se omitiu de colorir as pernas. O que, por sua
vez, ainda representava uma obstrução no fluxo do movimento circular.

O processo criativo, percebe-se paralelos


atuais, com o desenho de uma mulher
agora com pés. Porém observa-se que estas pernas estavam interrompidas
e sem cor, sem continuidade com os elementos da composição.
Ao elaborar o desenho e a pintura este processo foi parcialmente transformado
A partir daqui lembrei de todos, estão refeitos:
O processo criativo a partir do suporte redondo parece deixar a artista mais à vontade. As obras
trazem referências de mandalas, e todo processo se dá de forma mais espontânea e fluida. A
aplicação das cores é feita de forma vibrante e decidida Os processos nos mandalas – suporte
redondo – oferece uma possibilidade de produções mais
livres e completas.

Nesse trabalho, é interessante a artista ter colocado a cor somente nos limites do contorno das
pedras porque isto permitiu com que a luz do espaço do céu, se equilibrasse com o espaço do céu,
no caso vazio. Dessa forma, a imensidão acima se relaciona com o espaço abaixo desse contorno.
Nessa projeção para o infinito, temos a expansão acontecendo em todo redor.

Figura 14
A figura está com a coluna ereta, firme, concentrada na tarefa que lhe cabe. A atividade remete à
maternidade, trazer à vida, dar à luz.
Ela está firme, compenetrada e altiva, com a postura rígida e mergulhada no que está fazendo; A
rigidez do corpo dela é o próprio empenho em sua atividade.
Ela está nascendo a partir dali.

Figura 15
Nessa escultura composta por duas peças, a figura da mulher parece ter chegado ao término do seu
processo de trabalho. O produto de sua criação remete às formas barrocas. Ela, por sua postura
inclinada, quase em queda, está cansada. Todo peso de seu corpo se concentra sobre a perna
esquerda nesse momento. Parece ter gastado muita energia.
É a última.

Figura 22
A figura feminina traz a oferta de forma quase santa. Sua postura remete à devoção das imagens
barrocas. Ela transborda generosidade e parece estar flutuando, nas nuvens, de forma espontânea e
voluntariosa.
Destaque
Essa imagem nos remete instantaneamente à Vênus de Willendorf. Assim como essa referência, a
imagem pretende, antes do realismo, representar a fertilidade feminina.Se reerguendo com uma
dificuldade
Desenho 1 – Início – anjo e o fio
O anjo, o tema das asas e do anjo, vai se unir posteriormente a questão dos pássaros

[...] os pássaros simbolizam os estados espirituais, os anjos, os estados superiores do ser. Os


numerosos pássaros azuis (Maeterkinck) da literatura chinesa dos Hans são fadas, imortais,
mensageiros celestes. No Ocidente como na Índia, os pássaros pousam – hierarquicamente – sobre os
ramos da Árvore do mundo. [...] As aves viajantes – como as de Fari-od-Din Attar e do Conto do
Pássaro de Avicena – são almas engajadas na busca iniciatória. Guénon assinala, além disso, o caso
dos vaticínios de Roma. A adivinhação por meio do vôo e canto das aves ao vem a ser, de sertã
maneira, uma compreensão da linguagem dos pássaros, e portanto da linguagem celeste? O poeta
Saint-John Perse tem, sem dúvida, a intuição de uma espécie de pureza primordial nesta linguagem,
quando escreve: Os pássaros guardam entre nós alguma coisa do canto da criação.
[...] Os passarinhos, bem como as borboletas, simbolizam muitas vezes não apenas as almas dos
mortos, isto é, as almas liberadas que voltam à pátria celeste onde liberadas que voltam à pátria
celeste, onde ficam à espera de sua reencarnação, mas também as almas das crianças (CHEVALIER &
GHEERBRANT, 1997, p. 687-690).

Figura 8 – A mulher e o cachorro: surge uma mulher nascendo da terra e sua vegetação. Lápis 6b e
papel Canson A4. Lápis de cor aquarelado e lápis cera.
Observamos acima também a questão do corpo e a mulher deitada por nascer.
No próximo trabalho, foi solicitado que acompanhássemos uma transformação de uma folha. Ela
ficou assim.
Figura 9 - A folha – que se fechou. Desenho. Papel Canson A3 e Lápis 6B.

A folha surgiu após o professor da disciplina obrigar a amplia-la.

Figura 10 - A segunda
versão: o pássaro nascendo no desenho. Papel Canson A3 e Lápis 6B.

Foi orientado que selecionássemos da folha um círculo de aproximadamente 03 (três) centímetros


de raio e deixássemos fluir para ver que figura ia aparecer. Em uma primeira surgem uma mulher e
o pássaro nascendo no desenho, mas não gostei, e achei essa ideia de pássaro estranha. O tema do
pássaro retorna nesta figura. Observa-se dois pássaros, um em frente ao outro. Para mim é um
papagaio. Devido ao tema criação selecionei esse tópico do sentido simbólico do pássaro. Um tema
comum é o sentido da comunicação, dom da palavra.
Nesta época recebi um “Pensamento do Mês” de uma cliente. Comecei a receber nesta época
história sobre diferentes pássaros. Uma destas histórias me chamou a atenção, era a história da
águia, onde estava simplesmente escrito ao final que ela retirou da internet.
“A águia é a ave que possui a maior longevidade da espécie”.
Em seguida foi solicitado pelo professor fazer uma colagem buscando preencher o que havia sido
desenhado. Procuramos buscar texturas adequadas.

Fi
gura 11 - A figura colorida, a nenúfare. E o surgimento das mãos escondidas da mulher. Colagem.
Figura 13- O casal e a paisagem.

Após o casal (bem pequeno que coloquei dentro de uma folha). Figura acima.
Figura 15 – O sujeito está agora separado do objeto criado: a mulher e sua criação.

Depois de se apropriar das mãos surge o quadro todo, uma mulher agora separada de sua criação se
encosta nas folhas, como que rezando, As mãos foram liberadas, diante da tela “surge a obra como
em Monet” (SILVEIRA, ibid). Diante de sua obra ainda seu rosto não está totalmente definido.
Depois surge o rosto, o rosto que se aproxima do real, de uma face direita que só consigo fazer ao
final do processo. Foi feita em três etapas: do lado esquerdo, de frente e do lado direito. Tive a
impressão do mito das três faces: Jannus, também associo à Hermes e aos três mundo, estou diante
de um lado novo, prático.
Aqui surge uma espécie de paisagem onde a flor junto com folhas e uma mulher com a face ainda
desfigurada foi esculpida.
Ela estava rezando. Acredito que isto simbolize que estou pedindo ajuda, já que sempre fiz tudo
sozinha profissionalmente e existencialmente. Naturalmente com a doença, muitas coisas
aconteceram, e muitas pessoas me ajudaram a rezar por mim.. Nesse sentido estou me sentido mais
apta a saber pedir ajuda, inclusive em termos religiosos, coisa que nunca achei que necessitava.
Assim, a espiritualidade ligada ao pássaro surgiu, apesar de meu desinteresse sobre o tema
inicialmente.
Também é a mesma sequência que ocorreu nos desenhos da Moira. A figura 3 era agora a mulher
olhando para o animal, sua animalidade, simbolizando sua corporalidade, frente à frente. Há uma
mulher que surge abaixo, esta nova mulher.
Mulher esta que aparece no desenho seguinte que se solta, como vimos antes.
Talvez realmente não fosse preciso até hoje, mas agora acho que estou melhor como pessoa e por
isso mesmo posso receber auxílio para trabalhar com o que for preciso.
Fiz só uma cara depois, e essa face esteve então não mais desfigurada, fui fazendo os dois lados de
perfil e de frente ao mesmo tempo.
Agora acho que um ciclo fechou.
O fato mais importante é que tanto na mulher que faz cerâmica, como nesta diante da obra realizada
e no pé que vemos a seguir é que há uma diferenciação (VIOLA, informação oral, 20071). Há tudo
um processo de “construir uma boa base” (ibid). Eu diria, um novo nascimento no mundo do chão e
da forma.

Figura 22 – A mulher já com formas mais definidas, parte sem roupa, surgindo e com flores para
dar. Bronze.

As flores agora estão nas mãos, saíram do vaso: sujeito e objetos juntos.

1
Em orientação sobre as imagens para fechamento da monografia.
Para Viola (ibid) o mesmo tema se repete, há uma “generosidade” no ato de dar flores.

Figura 23 – A mulher doente, a mulher esfinge – escultura: sem saber de nada. Cimento.
É essencial aqui lembrar que há uma sincronicidade entre os temas apresentados com o momento
anterior à cirurgia, e a aproximação do diagnóstico.
Figura 25 – A mulher se reerguendo: tinta verde e tinta dourada.

Precisamos entender o verde como enxofre, podemos citar Jung em Psicologia e Alquimia (1991), o
autor afirma que “é necessário passar pelo inconsciente, pelo verde da putrefação” para chegar ao
ouro.
Comentamos sobre processo de individuação, sobre adoecer criativo, sobre o momento de
destruição para que haja a transformação, mas ainda vemos doença como um defeito do corpo e da
alma. Jung cita Tales e explicita a importância da luz e da sombra estarem juntas:

Eis o que o homem ambiciona:


Apenas a ferrugem torna a moeda valiosa.
[...] o inconsciente é sempre o cisco no leite; o defeito temerosamente escondido da perfeição, o
desmentido doloroso de todas as pretensões idealistas, os resquícios da terra que não se despegam da
natureza humana, turvando-se tristemente a transparência cristalina tão almejada. Segundo a
concepção dos alquimistas, a ferrugem e a pátina são doenças do metal. No entanto, é justamente esta
lepra que constitui a “vera prima materia” (“verdadeira matéria-prima”), base para o preparo do ouro
filosofal. O Rosarium philosophorum diz a respeito: “Nosso ouro não é o ouro vulgar. Mas indagaste a
cerca do verde (viriditas, provavelmente a pátina), supondo que o bronze fosse um corpo ‘leprsum’
devido ao verde que o recobre. Por isso eu te digo que se há algo perfeito no bronze é esse verde, uma
vez que ele será em breve transformado pelo nosso método (magisterium) no ouro mais verdadeiro”.
(ibid, p. 170).

Resume Jung que a observação paradoxal de Tales significa que a ferrugem dá a moeda seu valor
autêntico é uma espécie de paráfrase da alquimia, cujo significado é o de que “não há luz sem
sombra, nem totalidade anímica sem imperfeição.” (ibid, p. 170). A vida necessita ser completa, o
que inclui os “‘espinhos da carne”, aceitação dos defeitos, sem os quias não há progresso nem
ascensão” (ibid, p. 171).
Devo lembrar também que o verde indica esperança, sempre entendido como favorecendo o
relaxamento e, por isso, sendo usado em hospitas em geral, espsecialmente nas salas de cirurgias,
em resumo, estando sempre associado à saúde e à doença.
Porém, em termos de análise cromática aparece o verde em todas as produções em geral, situação
repetitiva. Segundo Chevalier e Gheergbrant (apud VASCONCELLOS e GÍGLIO, 2006, p. 158), o
verde é uma cor que simboliza a tranquilidade e o equilíbrio,

[...] pois é mediadora entre opostos, como calor e frio, alto e baixo, azul celeste e vermelho infernal.
Está entre o dia e a noite, entre a germinação e a putrefação, sendo um ponto de equilíbrio na balança.
Como representante do reino vegetal, é considerada o despertar da vida.

Figura 33 – A vontade de terra, uma casa no campo. Pintura, Guache.

ANÁLISE DAS FIGURAS

Observa-se que no início dos desenhos não havia mãos, há um nascimento da vida no processo
criativo inicial. Também posteriormente com a aula foi sugerido um início de processo pela folha,
conforme foi visto, e este tema da criação inicialmente pela natureza e depois da “Natureza
Humana” apareceu em todo o meu processo. Também com argila há um nascimento pela folha e
inicialmente só um dos braços e uma das mãos apareceu. Posteriormente foi surgindo os dois braços
e as mãos. Os pés não surgiram rapidamente. Junto com as figuras as formas do corpo começaram a
serem delineadas. Fiz um pé com asas e rosas, mas que surgiu separado do corpo. Somente com a
penúltima figura é que os pés surgiram unidos ao corpo, mas em função da falta de técnica o peso
dificultou que os pés inicialmente ficassem no corpo. Sabemos também que os pés, símbolos de
realidade e adaptação, não deixaram de estar presentes por acaso. Esta penúltima figura é
“sombria”, mas positiva. Ela é uma negra, a que um personagem interno e externo, que “não
estudou e teve onze filhos”. Lembra minha ex-empregada por muitos anos na época em que era
solteira; depois perdemos o contato, mas era próxima e companheira. Resumidamente podemos
afirmar que: há uma estrutura observada nas imagens:

Há a casa no campo de terra que representa a nova fase do processo criativo.


Observações gerais sobre o conteúdo das imagens podem ser resumidas em comentários de Carla
Portella Bezerra (informação oral, 2007) em suas reflexões sobre o processo criativo. Sabendo que
os temas foram escolhidos por mim de forma não dirigida, e somente o material foi indicado, ela
percebeu que: as únicas figuras abstratas foram solicitadas pelos professores da graduação. O tema
mais importante foi o tema da mulher, do feminino que surge, tema este que posso afirmar, já
aparecia em meus desenhos do início da universidade de psicologia. O tema do relacionamento – do
casal, dos pássaros – dois pássaros, e das flores em geral. O animal quase não aparece e somente o
humano e o vegetal
Nas figuras 28 e figura 32 observamos a mesma figura de uma mulher com um filho nos braços
(BEZERRA, ibid), no caso da 32 é uma menina. A 32 foi após a cirurgia. A 32 “só que liberta e com
pés” (ibid): agora está claro que é uma criança-menina interior, já que estou elaborando
internamente a situação de também não poder ter mais filhos. O incrível é que comecei pela criança,
pois achei que a peça de barro sugeria uma menina no colo de alguém.
O tema da mulher da terra, primitiva, é enfatizado por Viola (informação oral, 2007) e por Bezerra
(op. cit.).
Essencialmente “não está parindo uma menina” (ibid), uma filha, “mas está parindo um feminino”
(ibid), um renascimento interior. Um feminino que brota do chão da terra, que já tem pés e está livre
para refazer a vida (VIOLA, informação oral, 2007).

ANÁLISE CROMÁTICA
O processo foi longo e as cores foram muitas, mas na maior parte as cores foram preto, verde, azul e
laranja. O preto inicial, o verde também, junto com o azul, junto com o preto, foi o laranja, e a terra
cozida da argila, bem como o dourado as cores que chegaram ao final deste primeiro ciclo do
processo de criação que está terminando com a faculdade de Educação Artística.
A ausência do roxo e do lilás, minha cor preferida e o abandono do azul com um tom mais lilás, a
segunda cor que mais gosto, me impressionou. A inexistência do lilás/roxo, e o abandono da cor
azul símbolos de espiritualidade (GÍGLIO & VASCONCELLOS; 2006 e CHEVALIER &
GHEERBRANT, 1997) e mundo interior, muitas vezes depressão e profundidade, e o abandono da
distância do azul, seu sentido de céu e de anjos com asas é uma característica da descida para a
realidade foi um fato.
É fato impressionante que as cores que ficaram são as cores da terra, bem como tanto as cores do
preto e do laranja estão associadas a morte e ao renascimento, mas a nigredo e vida terrena em
geral. Incluo aqui a sincronicidade dos vídeos que recebi pela internet por minha irmã, e o laranja
que foi organizado por nós e realizado pela irmã da Maria José com quem fiz o trabalho sobre a cor
laranja, que seguem em anexo.
Durante toda a faculdade me defrontei com o medo do espaço, dos materiais. Neste sentido vale
incluir dois pontos, o medo da matéria em si, por ser a função sensação, ou seja da realidade
cotidiana, minha função inferior, bem como a dificuldade de lidar com minha existência terrena,
incluindo medo da agressividade. Isso significa que é natural que qualquer manifestação destrutiva
de pessoas intuitivas sejam marcadas no corpo. O corpo para estas pessoas é o principal
desconhecido, logo, caminho privilegiado de aprendizado, canal mais inconsciente, e assim, elo
onde os sonhos e os pesadelos vão se comunicar melhor. A gravidade, ou a falta de comunicação se
dá não pelo canal por onde se expressa, mas pela continuidade do problema. Ou seja, pela maneira
crônica ou aguda, com solução ou não das dificuldades encontradas.
A questão de danificar os objetos e o tempo necessário para a realização das atividades práticas era
maior do que a maioria, bem como o resultado melhor também. Era claro que além do
perfeccionismo do início até dois terços do curso estava relacionado a dificuldade psicomotora, mas
também ao medo de errar e estragar o material.
EM RESUMO: TEMAS ENCONTRADOS NO PROCESSO CRIATIVO
O meu processo criativo
Realizamos uma análise das imagens e dos temas do meu processo criativo, para realizar uma
análise das imagens como uma análise do discurso no sentido clássico.
Basicamente observamos o surgimento de uma cosmogonia, do informe à forma, do não-humano ao
humano, mantendo-se a união da realidade com o mundo da imaginação, ou mundo dos arquétipos,
especialmente em algumas figuras.
Meu tema foi da criação em geral, tema que está em sintonia com meus estudos anteriores.
Sempre fui uma pessoa de fundamentos das coisas, de origem, o resgate do feminino como origem.
Nascimento, desenvolvimento, morte e renascimento, foram temas que surgiram, especialmente em
função da questão da doença, onde todo dia passou a ser um dia de vida e um dia para pensar na
finitude da vida. O processo caminhou em um enfrentamento entre o sujeito que cria e o objeto
criado, até a questão de que todos viemos de um mesmo mundo-cosmos e que todos estamos
conectados.
Dentro desta visão há uma “narrativa subterrânea” em tudo o que realizamos, e normalmente
percebemos a coerência de nossos temas (“mitemas”).

TEMAS ENCONTRADOS NO PROCESSO CRIATIVO DAS PESSOAS NOS CURSOS DE


PÓS-GRADUAÇÃO DE ARTETERAPIA DA UNIRIO E DA PÓS-GRADUAÇÃO DE
TEORIA E PRÁTICA JUNGUIANA DESDE 2006 ATÉ 2016.
Aproveito para relacionar os temas que costumam aparecer nos livros e nas monografias e trabalhos
apresentados sobre o mesmo assunto, ainda que a maior parte dele não publicados. No caso
utilizamos apenas alguns mas que se repetem até a presente data (19 de julho de 2016). Essa síntese
foi realizada em 2008. Pretendemos seguir com a sistematização deste assunto, já que possuímos
pouco material disponível ainda sobre o processo criativo do adulto, suas similaridades e diferenças.
Os temas observados foram relatados nos estudos psicooncológicos em arteterapia, mas também
incluíram outros que foram por mim orientados em grande parte dos processos criativos. Neste
sentido surge uma necessidade de estudar, o que pretendo fazer em um trabalho posterior, sobre os
temas comuns entre estes processos.
Pássaros/asas, árvores e folhas, flores e figuras femininas (no caso de mulheres)2.
Nestes meus estudos com meus alunos (de graduação e pós-graduação), e pacientes, que realizaram
o mesmo processo criativo, ou trabalharam em algum momento a criatividade (no Rio de Janeiro e
de Brasília) observei os temas se repetirem.

TEMAS MAIS COMUNS NO PROCESSO CRIATIVO DAS PESSOAS


De forma bem recorrente no trabalho, por exemplo, Pássaros/asas (FERRETTI, 2007; MIRANDA;
2007; ARRUDA, 2007;. BORGES, 2006; SILVA, 2006; CAPOBIANGO, 2007; PORTO, 2005;
ALMEIDA, s/d3), árvores (COELHO, 2006; MIRANDA; 2007; ARRUDA, 2007; RICARTI, 2006;
PORTO, 2005) e folhas (COELHO, 2006; NASÁRIO, 2007; CAPOBIANGO, 2007), flores
(NASÁRIO, 2007; COELHO, 2006; e figuras femininas, muitas delas com partes faltando e sendo
criadas ao longo do tempo (no caso de mulheres) e partes específicas do corpo (COELHO, 2006;

Aspectos que deverão incluir também o estudo das cores mais utilizadas. O próprio curso utiliza o
preto (e a arte em geral) para iniciar os trabalhos criativos antes de incluir a cor, seja, no desenho,
como é de se esperar, mas também nas disciplinas de plástica.
3
Texto dado em 27 de julho de 2004 pela professora Marília Accioly no curso de pós-graduação de
arteterapia da UNIRIO.
FERRETTI, 2007; MIRANDA; 2007; ARRUDA, 2007, SILVA, 2006; RICARTI, 2006;
CAPOBIANGO, 2007) e também o tema da Luz e da Sombra (FERRETTI, 2007; COELHO, 2006;
MIRANDA; 2007), incluindo a idéia das opostos em geral.
E todos os temas acima em algum momento de seu processo criativo comentaram sobre estes temas.
Em termos corporais a parte do corpo escolhida para ser desenhada, pintada, moldada ou esculpida
estava relacionada ao tema do processo criativo. Os mais comuns era os pés e as mãos. A ideia dos
pés e das raízes das árvores, particularmente, como o resgate do chão, bem como das asas como o
resgate da criação e transcendência, apareceram na maior parte dos trabalhos, desenhados ou
ausentes nas figuras humanas, como vimos no meu processo criativo. Apontam para um tema básico
do processo criativo e do simbolismo já citado da árvore em geral.
Conforme esperado outros temas comuns são útero (e útero como vaso alquímico), e círculo e
mandala; (NASÁRIO, 2007; BORGES, 2006, RICARTI, 2006, etc.)
Além disso, no caso destes trabalhos, as alunas acima foram também realizaram atividades
dirigidas, por coordenadores e professores de arte-terapia e/ou psicologia analítica. Estes temas
ocorreram em outras atividades. Devo acrescentar que outros trabalhos foram realizados de forma
apenas espontânea, tal como os citados por Giglio e Vasconcellos (2006).
Ao contrário de constatarmos que são elementos induzidos e apontar para uma construção
psicológica teórica, a repetição destes elementos coincide com os temas mais marcantes no processo
de criação, usado atualmente em arte-terapia e arte-educação, como na psicoterapia em geral. Os
professores de arte e de psicologia em todos os lugares utilizam estes temas de forma recorrente em
suas atividades dirigidas, temas, que por sua vez foram utilizados também em outras civilizações
(GÍGLIO & VASCONCELLOS; 2006 e CHEVALIER & CHEERBRANT, 1997).
Ao contrário do que muitos estudiosos podem argumentar, não utilizamos aqui temas que incluem
todas as possibilidades, cito a questão de frutas. Só vi em um caso no consultório, e esta tinha
problemas com o corpo e em outra pessoa que me relataram do curso de arte-terapia, mas que era
nutricionista. Para citar a fruta que foi desenhada por uma arteterapeuta, esta é realmente diferente:
a romã, com suas multiplicidade de sementes e rara importância mitológica.
Eu sou uma fã da maçã, mas apesar de seu simbolismo de fruta de mitos e contos de fada da
tradição ocidental, como a fruta do centro do paraíso, aparecendo no mito de Helena e Paris, bem
como da Branca de neve e os sete anões, ela não aparece nos trabalhos realizados, nem pelos
estudantes de arte, que sempre convivem com a sua presença em suas inúmeras aulas de desenho e
pintura.
Pelas figuras observadas podemos afirmar, com Vanda Viola (informação oral, 2007) que há todo
um processo de colocar os pés no chão, de experimentar o contato com a raiz, com a terra, seja nos
tons cromáticos, como nos temas utilizados. As asas aparecem em pássaros e anjos, repetidamente,
mas para podermos voar mais alto e melhor, tendo lugar para voltar, é necessário construirmos uma
boa base.

[...] o que nos fascina no mistério da criação é que ao fazer, isto é, ao seguir certos rumos a fim de
configurar a matéria, o próprio homem com isso se configura.
Quando vemos uma jarra de argila produzida há 5 mil anos por algum artesão anônimo, algum homem
cujas contingências da vida desconhecemos e cujas valorizações dificilmente podemos imaginar,
percebemos o quanto esse homem, com um propósito bem definido de atender certa finalidade prática,
talvez a de guardar água ou óleo, em moldando a terra moldou a si próprio. Seguindo a matéria e
sondando-a quanto à “essência de ser”, o homem impregnou-a com a presença de sua vida, com a
carga de suas emoções e de seus conhecimentos. Dando forma à argila, ele deu forma à fluidez fugidia
de seu próprio existir, captou-o e configurou-o. Estruturando a matéria, também dentro de si ele se
estruturou. Criando, ele se recriou. (OSTROWER, 1977, p. 51)
PARTE II
PROCESSO DE CRIAÇÃO SEGUNDO A ARTE DE
OSTROWER: PARA COMPLEMENTAR: A ARTE
E SEUS ELEMENTOS BÁSICOS
Vanda Viola

com base em Fayga Ostrower

Criar é dar formas a fenômenos que foram relacionados de modo novo e compreendidos em termos
novos.
O homem busca ordenações e significados para suas necessidades existenciais. “impelido a
compreender, o homem é impelido a criar”. (ibid, p.11)
O processo criador é para a autora uma síntese de múltiplos processos:

POTENCIAL CRIADOR
No processo criativo entendido como ordenador e configurador, ao escolhermos uma possibilidade
excluímos outras, então, apenas nesse sentido é que “No formar, Todo construir é um destruir.”
(p. 26)

TENSÃO PSÍQUICA
“A criatividade, como a entendemos, implica uma força crescente; ela se reabastece nos próprios
processos através dos quais se realiza.
“Ao criar, ao ordenar os fenômenos de determinada maneira e ao interpretá-los, parte-se de uma
motivação interior. A própria motivação contém intensidades psíquicas” (p. 28).

“Compreendemos, na criação, que a ulterior finalidade de nosso fazer seja poder ampliar em nós a
experiência da vitalidade. Criar não representa um relaxamento ou esvaziamento pessoal, nem uma
substituição imaginação da realidade; criar representa uma intensificação do viver, um vivenciar-se no
fazer; e, em vez de substituir a realidade, é a realidade; é uma realidade nova que adquire dimensões
novas pelo fato de nos articularmos, em nós e perante nós mesmos, em níveis de consciência mais
elevados e mais complexos. Somos nós a realidade nova. Daí o sentimento do essencial e necessário
no criar, o sentimento de um crescimento interior, em que nos ampliamos em nossa abertura para a
vida. (p. 29).

MATERIALIDADE
Cada materialidade abrange certas possibilidades de ação e outras tantas impossibilidades, que
podem ser limitadoras e orientadoras, trazendo sugestões para se prosseguir num trabalho ou
ampliá-lo.
Admitir e respeitar os determinantes da matéria com que se lida. Imaginar seria um pensar
específico sobre um fazer concreto.
“Através das formas próprias de uma matéria, de ordenações específicas a ela, nos movemos
no contexto de uma linguagem.” (p. 33)
“A imaginação do pintor, consiste em ordenar, ou preordenar – mentalmente – certas possibilidades
visuais, de concordâncias ou de dissonâncias entre cores, volumes, de espaços visuais com ritmos e
proporções.” (p. 35).
Observação: o conceito de imaginação é extremamente amplo e complexo, vejamos a ideia na
primeira parte da apostila, dentro da perspectiva junguiana.

REFERÊNCIAS
OSTROWER, F. Criatividade e Processos de Criação. Rio de Janeiro: Imago.1977

PONTO

Ponto geométrico
O ponto geométrico é um ser invisível. Portanto, deve ser definido como imaterial. Do ponto de
vista material, o ponto é igual a Zero.
Mas esse Zero esconde diferentes propriedades "humanas". De acordo com nossa concepção, esse
Zero - o ponto geométrico - evoca a concisão absoluta, isto é, a maior reserva, que no entanto fala.
Assim, o ponto geométrico é, de acordo com nossa concepção,
a derradeira e única união do silêncio e da palavra.
É por isso que o ponto geométrico encontrou sua forma material em primeiro lugar na escrita - ele
pertence à linguagem e significa silêncio.

Escrita
Na fluidez da linguagem, o ponto é o símbolo da interrupção, do Não-Ser (elemento negativo) e, ao
mesmo tempo, é a ponte entre um Ser e outro (elemento positivo). Na escrita, isso é sua
significação interior.
Exteriormente ele é, aqui, apenas um signo em sua aplicação prática, trazendo em si o elemento
"utilitário" que já aprendemos quando crianças. O signo se toma um hábito que vela o som
profundo do símbolo.
O interior é murado pelo exterior.
O ponto faz parte do domínio dos hábitos arraigados em nós com sua ressonância tradicional, que é
muda.

Silêncio
A ressonância do silêncio, habitualmente associada ao ponto, é tão forte que suas outras
propriedades ficam ensurdecidas por ela.
Todo fenômeno habitual e tradicional perde sua expressão com um emprego restrito. Não ouvimos
mais sua voz e somos cercados de silêncio. Somos mortalmente subjugados pelo "utilitário-útil" .
(KANDINSKY,1977, p. 18)

O ponto é a unidade de comunicação visual mais simples e irredutivelmente mínima. Na natureza, a


rotundidade é a formulação mais comum, sendo que, em estado natural, a reta ou o quadrado
constituem uma raridade. Quando qualquer material líquido é vertido sobre lima superfície, assume
uma forma arredondada, mesmo que esta não simule um ponto perfeito. Quando fazemos uma
marca, seja com tinta, com uma substância dura ou com um bastão, pensamos nesse elemento visual
como um ponto de referência ou um indicador de espaço. Qualquer ponto tem grande poder de
atração visual sobre o olho, exista ele naturalmente ou tenha sido colocado pelo homem em resposta
a um objetivo qualquer.
Quando vistos, os pontos se ligam, sendo, portanto, capazes de dirigir o olhar. Em grande número e
justapostos, os pontos criam a ilusão de tom ou de cor, o que, como já se observou aqui, é o fato
visual em que se baseiam os meios mecânicos para a reprodução de qualquer tom contínuo. O
fenômeno perceptivo da fusão visual foi explorado por Seurat em seus quadros pontilhistas, de cor e
tom extraordinariamente variados, ainda que ele só tenha utilizado quatro cores - amarelo,
vermelho, azul e preto - e tenha aplicado a tinta com pincéis muito pequenos e pontiagudos. Todos
os impressionistas exploraram os processos de fusão, contraste e organização, que se concretizavam
nos olhos do espectador. Envolvente e estimulante, o processo era de alguma forma semelhante a
algumas das mais recentes teorias de McLuhan, para as quais o envolvimento visual e a participação
no ato de ver são parte do significado. Mas ninguém investigou essas possibilidades tão
completamente quanto Seurat, que, em seus esforços, parece ter antecipado o processo de
quadricromia a meio-tom, pelo qual são atualmente reproduzidos, na impressão em grande escala,
quase todas as fotos e os desenhos em cores, de tom contínuo.
A capacidade única que uma série de pontos tem de conduzir o olhar é intensificada pela maior
proximidade dos pontos. (DONDIS, 2003.p. 54)

LINHA
Quando os pontos estão tão próximos entre si que se torna impossível identificá-Ios
individualmente, aumenta a sensação de direção, e a cadeia de pontos se transforma em outro
elemento visual distintivo: a linha.
Também poderíamos definir a linha como um ponto em movimento, ou como a história do
movimento de um ponto, pois, quando fazemos uma marca contínua, ou uma linha, nosso procedi-
mento se resume a colocar um marcador de pontos sobre uma superfície e movê-Io segundo uma
determinada trajetória, de tal forma que as marcas assim formadas se convertam em registro. A
linha é também um instrumento nos sistemas de notação, como, por exemplo, a escrita. A escrita, a
criação de mapas, os símbolos elétricos e a música são exemplos de sistemas simbólicos nos quais a
linha é o elemento mais importante. Na arte, porém, a linha é o elemento essencial do desenho, um
sistema de notação que, simbólicamente, não representa outra coisa, mas captura a informação
visual e a reduz a um estado em que toda informação visual supérflua é eliminada, e apenas o
essencial permanece. Essa sobriedade tem um efeito extraordinário em desenhos ou pontas-secas,
xilogravuras, águas-fortes e litografias.
Nas artes visuais (DONDIS, 2003), a linha tem, por sua própria natureza, uma enorme energia.
Nunca é estática; é o elemento visual inquieto e inquiridor do esboço. Onde quer que seja utilizada,
é o instrumento fundamental da pré-visualização, o meio de apresentar, em forma palpável, aquilo
que ainda não existe, a não ser na imaginação. Dessa maneira, contribui enormemente para o
processo visual. Sua natureza linear e fluida reforça a liberdade de experimentação. Contudo, apesar
de sua flexibilidade e liberdade, a linha não é vaga: é decisiva, tem propósito e direção, vai para
algum lugar, faz algo de definitivo. A linha, assim, pode ser rigorosa e técnica, servindo como
elemento fundamental em projetos diagramáticos de construção mecânica e de arquitetura, além de
aparecer em muitas outras representações visuais em grande escala ou de alta precisão geométrica.
Seja ela usada com flexibilidade e experimentalmente, ou com precisão e medidas rigorosas, a linha
é o meio indispensável para tornar visível o que ainda não pode ser visto, por existir apenas na
imaginação.
A linha é também um instrumento nos sistemas de notação, como, por exemplo, a escrita. A escrita,
a criação de mapas, os símbolos elétricos e a música são exemplos de sistemas simbólicos nos quais
a linha é o elemento mais importante. Na arte, porém, a linha é o elemento essencial do desenho,
um sistema de notação que, simbólicamente, não representa outra coisa, mas captura a informação
visual e a reduz a um estado em que toda informação visual supérflua é eliminada, e apenas o
essencial permanece. Essa sobriedade tem um efeito extraordinário em desenhos ou pontas-secas,
xilogravuras, águas-fortes e litografias.
A linha pode assumir formas muito diversas para expressar uma grande variedade de estados de
espírito. Pode ser muito imprecisa e indisciplinada, como nos esboços ilustrados, para tirar proveito
de sua espontaneidade de expressão. Pode ser muito delicada e ondulada, ou nítida e grosseira, nas
mãos do mesmo artista. Pode ser hesitante, indecisa e inquiridora, quando é simplesmente uma
exploração visual em busca de um desenho. Pode ser ainda tão pessoal quanto um manuscrito em
forma de rabiscos nervosos, reflexo de uma atividade inconsciente sob a pressão do pensamento, ou
um simples passatempo. Mesmo no formato frio e mecânico dos mapas, nos projetos para uma casa
ou nas engrenagens de uma máquina, a linha reflete a intenção do artífice ou artista, seus
sentimentos e emoções mais pessoais e, mais importante que tudo, sua visão.
A linha raramente existe na natureza, mas aparece no meio ambiente: na rachadura de uma calçada,
nos fios telefônicos contra o céu nos ramos secos de uma árvore no inverno, nos cabos de uma
ponte. O elemento visual da linha é usado principalmente para expressar a justaposição de dois tons.
(DONDIS,2003, p.57)

Para OSTROWER, as linhas podem ser comparadas a palavras ditas por alguém, ou a gestos. Por
mais que se quisesse, nunca essas palavras ou gestos se repetiriam - são únicos, no fluir do tempo e
no espaço. São tão passageiras como palavras ou gestos. São únicas, impossível refaze-las ou
repeti-las.
A repetição de qualquer elemento na linguagem visual sempre adquire o significado de uma nova
vez e de uma outra coisa.
Assim, se a comparação de palavras com elementos visuais pode nos ajudar a imaginar a maneira
como eles se organizam em conjuntos maiores - palavras-frases ou então elementos-imagens - cabe
frisar que palavras e elementos não são iguais. Ao contrário de palavras, os elementos visuais não
têm significados preestabelecidos, nada representam, nada descrevem, nada assinalam, não são
símbolos de nada, não definem nada - nada, antes de entrarem num contexto formal. Precisamente
por não determinarem nada antes, poderão determinar tanto depois.
Se, perguntarmos: o que vem a ser uma linha? a resposta natural virá: uma linha é uma linha (o que
pouco esclarece). Seria necessário perguntar: o que faz uma linha? E mais especificamente: o que
faz a linha em termos de estrutura espacial? Neste caso, perguntando pela função espacial da linha,
receberemos uma resposta mais clara, porque, ao participar de uma composição, cada elemento
visual configura o espaço de um modo diferente. E, ao caracterizarem o espaço, os elementos
também se caracterizam.
Com respeito ao clima expressivo, vale notar ainda que, no fundo, as linhas nascem do poder de
abstração da mente humana, pois não há linhas corpóreas no espaço natural. Sem dúvida,
percebemos a linha do horizonte, assim como também percebemos linhas em figuras humanas ou
em rostos. Mas, fisicamente, essas linhas não existem. A pele de um rosto, por exemplo, não é
composta de linhas. Quando alteramos nosso ponto de observação, elas desaparecem e dão lugar a
outras linhas, tão incorpóreas quanto as primeiras. Ao percebe-las, no ato mesmo da percepção, as
interpretamos variadamente, como manifestação de energias naturais, de forças que se expandem ou
se contraem, ou como pessoas e objetos presentes.
Produzidas pela mão humana, as linhas se tomam fato físico. Se compararmos, por exemplo, linhas
com cores, sentimos de imediato o clima expressivo diferente. Enquanto que a linha evoca toda
uma ambiência intelectual, a cor é antes de tudo sensual.
"Emoções (aliás, a palavra ,EMOÇÃO é bem visual, significa isso mesmo em
termos de espaço: e = direcional, lançado para fora; moção= movimento, Daí o apelo francamente
emotivo dessas imagens, evocando inquietação e afetos intensos.
A imagem se toma portadora de conteúdos através da configuração espacial.
(OSTROWER,1983,pg.69)

FORMA
Nas imagens - que são portadoras da comunicação artística - se preservam intactos os elementos de
orientação espacial. Este fato extraordinário que faz com que as mensagens visuais provenientes de
épocas remotas (cujas línguas faladas ou escritas desconhecemos por exemplo, a arte pré-histórica,
ou a arte etrusca, ou a arte chinesa, ou mesmo a arte da Idade Média) ainda possam ser "legíveis" e
ter sentido para nós. O fato dessas mensagens se comporem '"de elementos espaciais é da maior
relevância. Veremos que o conteúdo expressivo das obras de arte não se articula de maneira verbal,
através de palavras e sim de maneira formal, através de formas. São sempre as formas que se
tomam expressivas. (OSTROWER, 1983, p. 23).
Queremos definir aqui o uso da palavra forma. A compreensão do termo é importante para que se
avalie o fato criador, seja nos processo de criação, seja na recriação de formas e significados.
A forma é algo em si delimitado - mas não no sentido de uma área demarcada por fronteiras. Nem,
aliás, nas artes plásticas a forma se resume a configurações de superfície, a uma espécie de
silhuetas.
A forma é o modo por que se relacionam fenômenos, é o modo como se configuram certas
relações dentro de um contexto.
Exemplo visual:
Ao se observar duas manchas vermelhas lado a lado, vê-se uma Forma. Ela abrange as manchas e
os relacionamentos existentes entre as manchas. Portanto, a forma não seria uma mancha isolada,
seria a mancha relacionada a alguma coisa. Se a mancha estiver sozinha no plano pictórico, estaria
relacionada ao fundo branco (que é extensão, é superfície, é cor). Se a mancha vermelha for
colocada ao lado de uma mancha verde, teremos outra forma (cujo significado afeta a mancha ver-
melha embora fisicamente não a altere), isto é, teremos um outro relacionamento com outros
componentes, outro contexto. E se essas manchas a vermelha e a verde, forem colocadas nas
margens laterais de um plano, afastadas entre si por um intervalo espacial, configurarão outra forma
ainda, pois veremos um novo tipo de relacionamento entre os componentes anteriores.
A forma será sempre compreendida como a estrutura das relações, como o modo por que as relações
se ordenam e se configuram.
Teremos a forma de uma mesa, mas também teremos a forma de uma ação, de uma teoria, de
determinada situação, de determinado caráter, ou de outro fenômeno.
Desde que a forma é estrutura e ordenação, todo fazer abrange a forma em seu 'como fazer', Para
nós não há nada, nem o existir em si, que não contenha uma medida de ordenação. Esta, nós a
vivenciamos.
É a forma das coisas que corresponde - não poderia deixar de corresponder - ao conteúdo
significativo das coisas. (OSTROWER, 1983, p.78)

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR DA DISCIPLINA


AUMONT, Jacques. A imagem. Campinas. São Paulo: Papirus Editora, 1995.
MELLO, E. C. C. O Processo Criativo, notas de aula, 1995.
FOCILLON, Henri. A vida das formas. Rio de Janeiro: Zahar Editores,1983.
HUYGHE, René. O Poder da Imagem. São Paulo: Martins Fontes.
OSTOWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. Rio de Janeiro: Imago Editora, 1977.
________________ Universos da Arte. Campus. Rio de Janeiro: 1993.
READ, Herbert. A educação pela arte. São Paulo: Martins Fontes.2001.
_________________ As origens da forma na Arte. Rio de Janeiro: Zahar.1981

BIBLIOGRAFIA ADICIONAL
ARNHEIM, Rudolf. Intuição e intelecto na arte. São Paulo: Martins Fontes Editora Ltda., 1989.
_______________ Arte e Percepção Visual: Uma psicologia da Visão Criadora. São Paulo:
Pioneira.2000.
DONDIS, A. Dondis. Sintaxe da Linguagem Visual. São Paulo: Martins Fontes.2001.
PAREYSON, Luigi. Os problemas da Estética. São Paulo: Martins Fontes.2001.
PEDROSA, Mário. Forma e Percepção Estética: Textos Escolhidos II. São Paulo: Editora da
Universidade de São Paulo

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