Acordao
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2ª CÂMARA CRIMINAL
a)-as medidas protetivas que haviam sido determinadas em favor da vítima Claudiane
Sotoriva, ex-companheira do Paciente, foram revogadas pelo Ilustre Magistrado titular da
Vara Criminal (mov. 39 dos autos 0011110-47.2023.8.16.0170);
c)- diante das informações,o Ilustre Magistrado revogou a prisão preventiva, contudo
“reimplantou” as medidas protetivas que haviam sido revogadas pelo Juiz Titular e
dispensadas pela vítima;
d)-o Paciente, após deixar a prisão, foi levado ao médico, que determinou internação
imediata,diagnosticando necessidade de urgente intervenção cirúrgica para extração da
vesícula e encaminhamento para médico oncologista;tal situação, com os documentos
médicos, foi levada ao Magistrado, para justificar a permanência do paciente em Toledo;
e)- foi apresentado novo pedido, com novos documentos médicos,inclusive resultado de
tomografia e ultrassonografia, bem como marcação de consulta no CEONC - Centro de
Oncologia de Cascavel, requerendo o Paciente autorização para permanecer em Cascavel
até o dia do exame oncológico (mov. 109), pedido que foi deferido;
f)-novo pedido foi apresentado, solicitando autorização para o Paciente vir a Toledo para
assinar uma escritura pública de reconhecimento e dissolução da união estável que até
então mantinha com a vítima Claudiane Sotoriva, a qual foi intimada para se manifestar
sobre a concordância, ou não, com a presença do Paciente para assinar a escritura;ainda,
se o ato poderia ser prestado, pelo Paciente, por meio de procuração;
g)- mesmo antes de ser intimada, a vítima Claudiane, acompanhada da advogada atuante
na dissolução da união estável, espontaneamente, compareceu à Vara Criminal e, de
próprio punho, assentou “que não se opõe em se encontrar com o Senhor Sulivan, para
assinatura da escritura de reconhecimento e dissolução de união estável, pois que, segundo
consta em dita declaração de próprio punho ‘está tudo em paz entre nós’.” (mov. 130.2);
j)-o monitoramento eletrônico é instrumento ineficaz, vez que a própria vítima pode entrar
em contato e ir até o local em que o paciente se encontra;
k)- que o monitoramento eletrônico pune inclusive a própria vítima, na medida em que
interfere nas relações pessoais e sentimentos íntimos daquela e do Paciente, pois
interferem na possibilidade de conversas e encontros presenciais para o fim de
concretizar, se for o caso, uma reconciliação conjugal.
Assim, diante do alegado constrangimento ilegal, requereu a concessão da ordem, em
caráter liminar, com a revogação da medida cautelar de monitoramento eletrônico, e, ao
final, seja-lhe concedido o writ em definitivo.
II.
Assinala-se, em síntese, que a própria vítima expôs que não mais existe qualquer temor de
sua parte quanto aos fatos, sendo a referida medida desnecessária.
[1]
Necessário se faz consignar a decisão ora impugnada :
“1.
Trata-se de pedido formulado pelo requerente por meio do qual pugnou pela revogação da
medida de monitoramento eletrônico, e da vedação de aproximação da vítima, dizendo, para
tanto, que (a) a vítima teria comparecido pessoalmente em Juízo solicitando a revogação das
medidas protetivas anteriormente concedidas, tendo ela demonstrado a ausência de temor em
relação ao acusado; (b) a manutenção da obrigação de não poder vir a Toledo e ser monitorado
eletronicamente não possuiria mais base e/ou necessidade; (c) a residência localizada na cidade
de Amambai-MS passaria a ser da propriedade da vítima com a assinatura da escritura pública,
não havendo mais vínculo dele com aquela localidade; (d) seu pai faleceu em 07.12.2022, certo
que ele residia em Toledo, na Rua Júlio de Castilho, n.º 3616 e sua irmã,atualmente residente
desse local, não quer deixá-la desabitada e pretende se mudar de lá; (e) possui váriasobrigações
em Toledo, tendo horário para consulta em Toledo.
Ouvido a respeito, o Ministério Público não se opôs à pretensão, batendo-se pela revogação da
monitoração.
Após a abertura de conclusão, foi juntado novo pedido (seq. 46) em que o requerente disse ter
sido consultado em Cascavel, em que foi marcada ressonância magnética para o dia
28.11.2023, havendo necessidade de sua vinda à Toledo tanto para assinatura da escritura
pública quanto para realização de consulta médica e eventual extração de vesícula, que estava
agendada para o dia 07.11.2023, mas que não se realizou. Contou que a permanência da
monitoração estaria "causando enorme trabalho para todos", "tolhendo a possibilidadede
tratamento médico".
Relatei. Decido.
É imperioso, primeiramente, destacar que a revogação ou revisão de qualquer decisão se
baseia, precipuamente, na alteração das premissas que a sustentam, e não, tão-somente, na
contrariedade ou na irresignação que a parte possui com o que deliberado.
Dito de outro modo: caso se verifique que os elementos que geraram a decisão se mantiveram
inalterados, de pouca (ou nenhuma) relevância o fato de que o cumprimento da ordem pode
estar dando "trabalho" ou gerando "dificuldades", já que é evidente que cabe à parte se
adequar ao comando judicial, e não o contrário. Aliás, acolher esse tipo de argumento como
possível para modificar a decisão significaria transformar o Poder Judiciário em "balcão de
negócios" em que se poderia suscitar questões pessoais de somenos importâncias para que a
deliberação fosse modificada.
Assim, uma coisa é haver um elemento de razoabilidade e gravidade na ordem dada (p.ex., uma
situação de saúde vinculada ao próprio uso da tornozeleira como vaso constrição, dores etc.);
outra, muito diversa, é a utilização da monitoração causar "trabalho".
Esse fundamento do pedido, com todo o respeito possível, é de diminuto peso para permitir a
revisão da decisão anterior.
E ela, como se verá, foi alicerçada em algumas premissas:(i) o requerente disse que passaria a
residir em Amambai-MS, local distante de Toledo; (ii) houve medidas protetivas que teriam
sido descumpridas pelo requerente, mas, igualmente, foi formulado pedido de sua revogação
por parte da vítima; e (iii) houve registros de que ele seria financeiramente responsável por
sua filha - que mora em Amambai-MS com seu neto.
A verificação do andamento processual, contudo, denota que ele nem sequer chegou a sair de
Cascavel,tendo lá permanecido desde sua soltura que, repito, havia condicionado sua liberdade
a manutenção de sua residência em Amambai-MS. Não ignoro, aliás, que isso se deu por
força dos exames médicos aos quais se submeteu; de todo o modo, todo o périplo por ele
lançado nos autos em suas variadas manifestações (todas elas, ressalto, albergadas pelo direito
constitucional da inafastabilidade do Poder Judiciário, e do exercício sagrado do direito de
defesa), indica, contudo, aparente resistência empírica no cumprimento dessa ordem, que
poderia levar ao indeferimento de seus pedidos.
Veja-se que, não ignoro(e jamais ignorei esses elementos - como aparentemente mencionado
de modo implícito no pedido de seq.39 -, até porque fiz referência expressa à isso na decisão
que deferiu o pedido aqui formulado) as manifestações volitivas da vítima acerca da revogação
das medidas protetivas e pedido aqui formulado do que por ela dito em Juízo; ocorre que a
aplicação das decisões e seu conteúdo - notadamente quando se trata de ações penais públicas
incondicionadas - não se submetem e não estão igualmente vinculadas ao que as partes
desejam com o processo.
A análise judicial (independente, até por força do que contido no Princípios de Bangalore),
embora não possa deixar de considerar os limites subjetivos e objetivos do que é posto à decidir,
respeitando-se, também, o princípio da inércia e a imparcialidade, que são apanágios do
Judiciário, se dá com base no convencimento(sendo criticável a sua verificação de modo ‘livre’)
racional e fincado em elementos probatórios e lógicos extraídos dos pedidos feitos, não estando,
assim, adstrito ao mero desiderato dos envolvidos (repito:notadamente em demandas desse jaez
em que há, para além da incondicionalidade da ação penal, elementos próprios de violências
estruturais e acachapantes cometidas contra mulheres).
E, justamente por isso, é que seria possível, quiçá, a manutenção das medidas impostas.
Contudo, não se pode deixar, igualmente, de levar em conta a manifestação volitiva de quem é
sujeito de proteção das medidas, que partem e repousam naquilo que essas pessoas pretendem
com o processo.
Assim, embora esses desejos não vinculem, eles não podem ser olvidados ou deixados de lado,
como se fossem desinfluentes na prolação da decisão, especialmente quando (e se) a decisão
gera efeitos e consequências para determinados indivíduos.
Conforme se verifica da seq. 31.1, as medidas cautelares diversas da prisão aqui lançadas se
deram, em grande parte, com base na necessidade de resguardo da própria vítima, mantendo-
se ali obrigações de impedimento de contato e aproximação com ela.
Embora a vítima tenha mencionado que não possuiria problemas em se encontrar com o
requerente para assinatura da escritura pública, nada há, nos autos, que indique seu desejo de
voltar a ter contato com ele, de modo que a inferência lançada na seq. 39 de que inexistiria
temor, receio, ou oposição, não parece ter arrimo nas manifestações da vítima, inclusive
quando se verifica nos autos da medida protetiva que há, nas conversas de seq. 35.1, aparente
preocupação dela em relação ao conhecimento de suas manifestações.
Contudo, se ela própria disse não mais pretender as medidas protetivas aplicadas, e se,
aparentemente, não se opôs à assinatura do termo, parece razoável (e proporcional, sob o
aspecto duplo dessa garantia) que se permita a modificação, mesmo que parcial, da decisão de
seq. 31.1.
Isso porque se há (a) contato entre as partes, mesmo que intermediado por suas Advogadas para
realização deassinatura de escritura pública; e (b) manifestação da vítima indicando que não
teria problemas em encontrá-lo para esse fim, parece seguro concluir que a presença do
requerente em Toledo não é mais elemento que poderia causar, na vítima, qualquer elemento
de perigo ou risco.
As demais medidas, porém, e até para que haja, igualmente, respeito à vítima e à
proporcionalidade em sua dupla acepção, devem ser mantidas por pelo menos mais 6 (seis)
meses, período suficiente para verificação da adstrição e comprometimento do acusado com o
respeito às deliberações judiciais aqui proferidas.
Assim, entendo possível revogar o item "d", de modo que não há mais óbice imposto para que o
requerente venha, permaneça e/ou resida em Toledo, bem como alterar o item "c" para que ele
fique autorizado a fixar sua residência em Toledo, cabendo ao requerente, em 5 (cinco) dias,
informar o Juízo o local em que passará a morar, ficando ciente de que somente poderá mudar
de residência mediante prévia autorização judicial.
3.
Ante o exposto, defiro, em partes, os pedidos de seq. 39 e 46, para (a) revogar o item "d" da
decisão de seq. 31.1 autorizando e permitindo ao requerente que possa vir e morar em Toledo;
(b) alterar os itens "a" e "c", da decisão de seq. 31.1, para que ele fique obrigado a comparecer
em Juízo sempre que for intimado, sem necessidade de sua vinda mensal ao Fórum, e para que
informe o Juízo o local em que passará a residir em Toledo, ou em outra localidade, juntando
aos comprovante de residência em até 10 (dez) dias; e(c) manter, por mais 4 (quatro) meses as
medidas de proibição de contato com a vítima, proibição de aproximação com a vítima,
mantendo distância mínima de 200 (duzentos) dela e monitoração eletrônica.
Considerando o deferimento parcial dos pedidos e o fato de que à vinda do não haverá mais
obstáculo à vinda do requerente `a cidade de Toledo, fica prejudicada a análise do pedido de
seq. 46.1, já que ele poderá,querendo, residir aqui, em Cascavel ou em qualquer outra
localidade, podendo, igualmente, comparecer para quaisquer consultas, exames ou
procedimentos médicos a serem realizados nessa cidade.
Decorrido o prazo de 4 meses fixado, sem notícia de descumprimento e sem pedido expresso da
vítima para manutenção das medidas cautelares diversas da prisão, sem necessidade de
ulterior conclusão, fica desde já determinada a revogação da monitoração eletrônica, com a
expedição do respectivo contramandado para retirada do aparelho instalado.
De se pôr a realce que a decisão que decretou a prisão preventiva foi motivada no risco à
ordem pública e à vítima, bem assim na possibilidade de aquele reincidir na conduta.
Registre-se que o paciente, além deste procedimento em trâmite, também está sendo
processado pela prática do crime de porte ilegal de arma de fogo (art. 14. Da Lei nº 10.826
/2003) – processo crime n. 0007797-88.2017.8.16.0170; foi condenado no processo crime
n. 0012132-87.2016.8.16.0170,pela prática do crime de embriaguez ao volante (art. 306
do CTB).
Relator