A Atuação Das Equipes de Saúde Da Família Com As Pessoas Com Transtornos Mentais

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia

Carlos de Sousa Filho

A ATUAÇÃO DAS EQUIPES DE SAÚDE DA FAMÍLIA COM AS PESSOAS COM


TRANSTORNOS MENTAIS SEVEROS E PERSISTENTES

Belo Horizonte
2019
Carlos de Sousa Filho

A ATUAÇÃO DAS EQUIPES DE SAÚDE DA FAMÍLIA COM AS PESSOAS COM


TRANSTORNOS MENTAIS SEVEROS E PERSISTENTES

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Psicologia da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais, como
requisito parcial para obtenção do título de
Mestre em Psicologia.

Área de Concentração: Processos de


Subjetivação
Linha de Pesquisa: Intervenções Clínicas e
Sociais
Orientador: Prof. Dr. João Leite Ferreira
Neto

Belo Horizonte
2019
FICHA CATALOGRÁFICA
Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Sousa Filho, Carlos de


S725a A atuação das equipes de saúde da família com as pessoas com transtornos
mentais severos e persistentes / Carlos de Sousa Filho. Belo Horizonte, 2019.
117 f. : il.

Orientador: João Leite Ferreira Neto


Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Programa de Pós-Graduação em Psicologia

1. Política de saúde mental - Brasíl. 2. Educação permanente. 3. Equipe de


assistência ao paciente. 4. Atenção primária à saúde. 5. Programa Saúde da
Família (Brasil). 6. Doenças mentais. I. Ferreira Neto, João Leite. II. Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em
Psicologia. III. Título.
CDU: 614(81)
Ficha catalográfica elaborada por Fabiana Marques de Souza e Silva - CRB 6/2086
Carlos de Sousa Filho

A ATUAÇÃO DAS EQUIPES DE SAÚDE DA FAMÍLIA COM AS PESSOAS COM


TRANSTORNOS MENTAIS SEVEROS E PERSISTENTES

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Psicologia da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais, como
requisito parcial para obtenção do título de
Mestre em Psicologia.

Área de Concentração: Processos de


Subjetivação
Linha de Pesquisa: Intervenções Clínicas e
Sociais
Orientador: Prof. Dr. João Leite Ferreira
Neto

___________________________________________________________________________
Prof. Dr. João Leite Ferreira Neto (Orientador)

___________________________________________________________________________
Profa. Dra. Nara Pratta (Banca examinadora PUC Minas)

___________________________________________________________________________
Profa. Dra. Celina Maria Modena (Banca examinadora Fiocruz)

Belo Horizonte, 28 de Fevereiro de 2019


A uma amiga que me ajudou a transcender um
contato conceitual com a saúde mental, para
uma aproximação afetiva com o cuidado com
as pessoas com transtornos mentais e o
fomento a sua participação social a partir das
políticas públicas.
AGRADECIMENTOS

Em meu percurso desde a graduação trilhei alguns caminhos, mestrado e trabalho, nos
quais ambos se complementaram e nestes pude contar com muitas pessoas. Essas pessoas me
auxiliaram em meu crescimento profissional, acadêmico, científico e laboral. Desta maneira
gostaria de agradecê-las, pois contribuíram sobremaneira com esta pesquisa.
A Deus por me dar condição de galgar esta possibilidade de minha existência que é a
extensão de um sonho, que era a graduação em Psicologia e se expandiu. De existir esse bolsa
assistencial que me ajudou a custear essa pós-graduação. Em ter me dado paz para conciliar o
trabalho e o curso. E ter provido resiliência para ser capaz de continuar minha pesquisa e
cuidar de minha família, mesmo após o falecimento de minha irmã no ano passado decorrida
minha qualificação.
A Bernadete de Lourdes Carvalho e Sousa (mãe) e a Carlos de Sousa (pai), os quais
me acompanharam e me apoiaram em todos os momentos, me dando condições oras
financeiras, oras afetivas e assim formaram uma constante sustentação em minha vida.
Ao Prof. Dr. João Leite Ferreira Neto que me aceitou como seu orientando e me guiou
por este processo de aprendizado com grande maestria. Suas orientações possibilitaram o meu
desenvolvimento e construção enquanto pesquisador, apresentando novos caminhos e
instigando um processo crítico sobre o conhecimento acadêmico. Com seu conhecimento em
minha área de interesse da pesquisa pode mostrar diferentes literaturas, formas de pesquisar e
desenvolver um conhecimento. Ainda demonstrou grande prontidão recomendando textos e
respondendo os e-mails inclusive nos feriados. Apenas gostaria de ter mais oportunidade de
aprender ainda mais com o esse pesquisador, visto que forma apenas 2 anos de contato. Desta
maneira, agradeço imensamente o seu apoio na minha trajetória profissional, bem como na
realização deste sonho de ser mestre.
A Profa. Dra. Nara Pratta por ter me oferecido oportunidades e influenciado em meu
interesse em Saúde Mental na Graduação. E sua grande disponibilidade para me ajudar com
literaturas, orientações profissionais e oportunizar a exposição de minha experiência
acadêmica e profissional na Graduação de Psicologia. A ter aceitado participar de minha
banca e ao carinho demonstrado.
A Profa. Dra. Celina Maria Modena por ter aceitado participar de minha banca de
Mestrado e contribuído com muitas considerações acerca do que pode-se acrescentar em
minha pesquisa. Por ter feito sugestões que podem culminar em novos estudos e ao seu
carinho em cada ponderação.
Aos participantes que aceitaram contribuir com as entrevistas e assentiram com o
acompanhamento das reuniões. Por sua colaboração, que possibilitou o desenvolvimento
desta pesquisa.
Ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu de Psicologia da PUC Minas e a
coordenadora do programa Profa. Dra. Luciana Kind do Nascimento, que viabilizaram o
desenvolvimento deste curso em Poços de Caldas. Ao cuidado com os alunos, atendendo às
nossas necessidades e tentando nos incluir da melhor forma possível. E a concessão da bolsa
que possibilitou minha entrada e crescimento no decorrer da vivência do Mestrado.
Ao Cristiano de Jesus Andrade que me acompanhou na expectativa de iniciar o
Mestrado, trazendo tranquilidade, esperança e ajudando a ponderar as tensões durante o
percurso da pós-graduação. A sua parceria e amizade na discussão sobre o trabalho e na vida
de modo geral.
A Stela Maris Baldon que me apoio na entrada para o mestrado flexibilizando meu
horário de trabalho para que fosse possível assistir as aulas. Ao estímulo quando me colocava
para realizar palestras pela cidade, bem como na viabilização do contato com outros gestores
que permitiram e facilitaram o acesso ao participantes desta pesquisa.
A Profa. Dra. Roberta Carvalho Romagnoli que em sua visita em Poços de Caldas em
setembro de 2016 disse que poderia tentar participar do processo de mestrado com o tema que
desejava. Às suas aulas que buscavam incluir os alunos de Poços de Caldas nas discussões e a
sua didática que fomentou o nosso interesse nas disciplinas, bem como seu carinho para com
os alunos.
[...] no meio do mundo sereno da doença mental, o homem moderno não se
comunica mais com o louco; há, de um lado, o homem de razão que delega para a
loucura o médico, não autorizando, assim, relacionamento senão através da
universalidade abstrata da doença; há, de outro lado, o homem de loucura que não se
comunica com o outro senão pelo intermediário de uma razão igualmente abstrata,
que é ordem, coação física e moral, pressão anônima do grupo, exigência de
conformidade. (Foucault, 2006, p.154).
RESUMO

A partir das políticas do Sistema Único de Saúde, que têm como princípios a universalidade, a
integralidade, a equidade e a descentralização dos serviços, as Unidades de Saúde da Família
(USF) têm o papel de oferecer atenção em nível básico à população, sendo a elas incluídas as
pessoas com transtornos mentais. Devido a essa incumbência de oferecer cuidado a indivíduos
diagnosticados com transtornos mentais em sua atuação cotidiana, este estudo buscou
conhecer a atuação das equipes de saúde da família junto aos utentes com transtornos mentais
severos e persistentes, tendo como base o apoio matricial. A pesquisa pode ser caracterizada
como de campo, de caráter qualitativo e descritivo. Para tanto, foram entrevistados quatro
profissionais de uma USF urbana e quatro de uma USF rural, utilizando amostragem por
contraste e realizando uma triangulação metodológica com seis reuniões acompanhadas nas
duas unidades. As entrevistas foram gravadas, as reuniões registradas em diário de campo e
ambas posteriormente transcritas. Para a análise de dados foi utilizada a análise de conteúdo
com os dados das entrevistas. Da atuação das EqSF identificaram-se: alguns elementos do
trabalho com pessoas com transtornos mentais, como o medo e uma tentativa de dar sentido
aos utentes; o manejo com a clientela, que é demonstrado por intermédio das demandas, da
dificuldade em lidar com a família, dos procedimentos e do modo como alguns dos
participantes compreendem a complexidade da Atenção Básica; e a percepção dos
entrevistados sobre as reuniões de matriciamento, das quais emergiram dados sobre a
graduação, pós-graduação, capacitações e a educação permanente de modo geral. Foram
contrastados os dados de ambas as unidades, dos quais emergiram diferenças de ambos os
contextos, como acessos dificultados aos serviços da rede para a população rural, bem como
para as equipes por meio da falta de apoio matricial. Nesse sentido, estabeleceram-se
associações entre as informações das entrevistas e as reuniões, o que sinalizou uma
necessidade da realização de maior enfoque na educação permanente. Em suma, esta pesquisa
foi ao encontro dos objetivos, viabilizando conhecer a atuação dos participantes, assim como
de perceber a necessidade de novos estudos que ampliem o conhecimento sobre o trabalho das
equipes de saúde da família com pessoas diagnosticadas com transtornos mentais.

Palavras-chave: Reforma Psiquiátrica. Educação Permanente. Transtornos Mentais. Atenção


Básica. Apoio Matricial.
ABSTRACT

Based on the polities of the Unified Health System, whose principles are universality,
completeness, equality and decentralization of services, the Family Health Units (FHU) have
the role of providing basic attention to the population, including people with mental disorders.
Due to this task of providing care to individuals diagnosed with mental disorders in their daily
activities, this study sought to know the performance of family health teams with users with
severe and persistent mental disorders, based on matrix support. The research can be
characterized as field, qualitative and descriptive. For that, four professionals from one urban
FHU and four from a rural FHU were interviewed using contrast sampling and performing a
methodological triangulation with six meetings followed in the two units. The interviews
were recorded, the meetings were registered in field diary and both transcribed later. For data
analysis it was used the content analysis with the data by the interview. From the performance
of the EqSF, we identified: some elements of working with people with mental disorders,
such as fear and an attempt to make sense to users; the management with the clientele, which
is demonstrated through the demands, the difficulty in dealing with the family, the procedures
and the way in which some of the participants understand the complexity of the Primary Care;
and the interviewees' perceptions about the matricity meetings, from which data on
graduation, post-graduation, training and permanent education emerged in general. The data
from both units were associated, from which differences emerged in both contexts, such as
difficult access to the net services for the rural population, as well as to the teams through the
lack of matrix support. In this sense, the information from interviews and meetings were
associated, which signaled a need for greater focus on permanent education. In short, this
research met the objectives, making it possible to know the performance of the participants, as
well as to perceive the need for new studies that increase the knowledge about the work of the
family health teams with people diagnosed with mental disorders.

Keywords: Psychiatric Reform. Permanent Education. Mental Disorders. Basic Attention.


Matrix Support.
LISTA DE QUADROS

Quadro 1- Descrição dos participantes entrevistados das USF Urbana e USF Rural 55
Quadro 2 - A formação dos participantes 80
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ACS Agente Comunitário de Saúde


APAE Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais
AVC Acidente Vascular Cerebral
CAPS Centro de Atenção Psicossocial
CAPS Ad Centro de Atenção Psicossocial de Álcool e outras drogas
CEU Centro de Esportes e Artes Unificado
CFP Conselho Federal de Psicologia
CID 10 Classificação Internacional de Doenças, Décima Edição
CRAS Centro de Referência de Assistência Social
CREAS Centro de Referência Especializado de Assistência Social
Dinsam Divisão Nacional de Saúde Mental
DSM – 5 Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, Quinta Edição
ESF Estratégia de Saúde da Família
EqSF Equipe de Saúde da Família
NASF Núcleo de Apoio à Saúde da Família
PSF Programa da Saúde da Família
RAPS Rede de Assistência Psicossocial
SAMU Serviço de Atendimento Móvel de Urgência
SUDS Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde
SUS Sistema Único de Saúde
UAI Unidade de Atendimento Integrado
UBS Unidade Básica de Saúde
USF Unidade da Saúde da Família
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 16

1.1 O contexto da atuação das equipes de saúde da família ............................................... 16


1.2 O questionar-se em pauta: entendendo a construção da pesquisa............................... 19

2 O CONTEXTO HISTÓRICO DA ATUAÇÃO DAS EQSF COM DE PESSOAS COM


TRANSTORNOS MENTAIS ................................................................................................ 24

2.1 O panorama político e a implementação de ações em saúde por intermédio de


instituições substitutivas em saúde mental ........................................................................... 25
2.2 A Atenção Básica representada pela figura da USF: interseções entre USF, NASF e a
atenção a saúde mental .......................................................................................................... 28
2.3 Concepções sobre as pessoas com transtorno mental severo e persistente: sujeito,
família e sociedade .................................................................................................................. 34
2.4 A Saúde da Família e suas atuações com as pessoas com transtorno mental ............. 36

3 METODOLOGIA................................................................................................................ 47

3.1 Participantes ..................................................................................................................... 48


3.2 Instrumentos ..................................................................................................................... 49
3.3 Procedimento de Coleta de Dados ................................................................................... 51
3.4 Procedimento de Análise de Dados ................................................................................. 52
3.5 Devolutiva .......................................................................................................................... 54

4 RESULTADOS .................................................................................................................... 55

4.1 Elementos do contato com o usuário .............................................................................. 62


4.1.1 O medo do contato com usuários da SM ......................................................................... 62

4.1.2 Uma tentativa de dar sentido ao outro ............................................................................ 64

4.1.3 Síntese da categoria ........................................................................................................ 67


4.2 Manejo na atuação com pessoas com transtorno mental .............................................. 68
4.2.1 Demandas correntes de indivíduos com transtornos mentais ......................................... 68

4.2.2 Procedimentos realizados com a clientela com transtorno mental ................................. 71


4.2.3 O distanciamento familiar e o vínculo com a unidade .................................................... 74

4.2.4 A compreensão sobre a complexidade da atenção .......................................................... 77

4.2.5 Síntese da categoria ........................................................................................................ 79


4.3 A educação permanente dos profissionais ...................................................................... 79
4.3.1 Formação em graduação, pós-graduações e capacitações ............................................ 80

4.3.2 Reuniões de matriciamento: do NASF e do CAPS II....................................................... 83

4.3.3 Síntese da categoria ........................................................................................................ 89

5 DISCUSSÃO ........................................................................................................................ 91

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 101

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 105

APÊNDICE A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ...................................... 115

APÊNDICE B – Termo de Compromisso .......................................................................... 117


16

1 INTRODUÇÃO

A temática da saúde mental na Atenção Básica tem sido objeto de algumas pesquisas,
em vista das políticas de saúde mental instauradas pela Reforma Psiquiátrica, que reconhecem
o tratamento do cidadão com transtorno mental severo e persistente em sua própria
comunidade, como um movimento de desospitalização. (Amaral, Torrenté, Torrenté, &
Moreira, 2018; Büchele, Laurindo, Borges, & Coelho, 2006; Correia, Bastos, & Colvero,
2011; Cury & Galera, 2006; Lucchese, Oliveira, Conciani, & Marcon, 2009; Nunes, Jucá, &
Valentin, 2007; Pegoraro, Cassimiro, & Leão, 2014; Reis, Brito, Moreira, & Aguiar, 2013).
Da mesma maneira, essa visão se articula com os fundamentos da atenção em saúde previstos
pela Constituição Federal de 1988 que, segundo Nepomuceno e Brandão (2011), preconizam
a universalidade, a integralidade e a equidade e, com a política para a saúde mental, propõem
uma assistência em saúde mais complexa e sistemática.
Sob tal cenário esta pesquisa buscou conhecer a atuação das Equipes de Saúde da
Família com as pessoas diagnosticadas com transtornos mentais severos e persistentes e sua
relação com o matriciamento realizado pelo Núcleo de Apoio à Saúde da Família e do Centro
de Atenção Psicossocial. Para tanto, identificaram-se os sentidos produzidos sobre essa
clientela, foram descritas as ações em relação a esses usuários das unidades de saúde e
conheceu-se o desenvolvimento da educação permanente em saúde mental a partir do
matriciamento.

1.1 O contexto da atuação das equipes de saúde da família

Esta dissertação explora como os profissionais de saúde da Atenção Básica lidam com
pacientes com transtornos mentais severos e persistentes. Para compreender esse fenômeno no
primeiro nível de assistência em saúde, buscou-se uma aproximação do cenário de construção
do trabalho realizado pelos profissionais das equipes de saúde da família (EqSF). Este
trabalho foi compreendido em relação com a atuação das equipes, sua relação com a clientela
e sua formação e capacitação, sendo visadas também as interações promovidas entre as
equipes na Unidade da Saúde da Família (USF) e no matriciamento junto ao Núcleo de Apoio
à Saúde da Família (NASF) e ao Centro de Atenção Psicossocial (CAPS). O matriciamento
em saúde mental, no qual alguns casos de pessoas com transtornos mentais puderam ser
discutidos, na tentativa de lançar luz sobre a vivência do sofrimento psíquico,
17

algumas estratégias de manejos e uma pequena problematização por meio da sugestão de


estudos de caso com a rede, assim como, a educação permanente, na qual as temáticas
puderam ser mais exploradas. O apoio matricial foi uma possibilidade de compreender o
contexto no qual emergiram os transtornos e ressaltar os meios das equipes oferecerem
atenção em saúde no nível básico de atenção, bem como realizar maior comunicação com
dispositivos intersetoriais para atender a complexidade requerida pela clientela com
transtornos mentais.
A noção de transtornos mentais hoje em voga na psiquiatria, conforme o Manual
Diagnóstico de Transtornos Mentais de 2014 (DSM, 2014), advém de uma construção
histórica, na qual a ciência, a sociedade e a política tinham maior dificuldade em lidar com o
que desviava as normas e a lógica de produção e manutenção da pólis, das cidades, como a
loucura. Entretanto, atualmente, a loucura assumiu outras formas e passou a ser um campo de
atuação da saúde mental. A Reforma Psiquiátrica brasileira tomou como eixo prioritário de
trabalho o cuidado com a população com transtornos mentais severos e persistentes, os quais
envolveriam as “(...) pessoas com grave comprometimento psíquico, incluindo os transtornos
relacionados às substâncias psicoativas (álcool e outras drogas) e também crianças e
adolescentes com transtornos mentais” (Brasil, 2004, p. 15). Inclusive tal parcela da
população com a Reforma passou a ter como possibilidade de tratamento substitutivo em
relação ao hospital psiquiátrico, por intermédio dos CAPS, que são dispositivos para atender
indivíduos em grande sofrimento psíquico, seja decorrente do uso de substâncias psicoativas,
como também de todas as faixas etárias com transtornos mentais. Em geral esses casos de
transtornos mentais severos e persistentes estão associados a ideias de ausência de razão, à
perda de si mesmo, à inviabilidade de contribuir com as atividades de trabalho, apresentando-
se assim como um problema social. Tais concepções ainda se propagam em certa medida na
atualidade, o que reforça pressupostos discriminatórios e de exclusão social, uma vez que,
reduzem as possibilidades do sujeito ser visto para além da percepção já dada (Leão & Barros,
2008; Lucchese et al. 2009).
Até a construção de ações interdisciplinares e a elaboração de serviços que atendam
demandas de saúde mental na Atenção Básica, Média Complexidade e Alta Complexidade,
esses sujeitos com transtornos mentais eram “tratados” de outras maneiras. Eles eram
retirados de suas casas, mandados para hospitais psiquiátricos, amarrados, sofriam maus
tratos, ficavam trancados em prisões públicas, recebiam eletrochoques indiscriminadamente,
dentre outras práticas que não consideravam os direitos humanos (Arbex, 2013; Junqueira &
Carniel, 2012). Conforme Batista (2014) o tratamento resumia-se ao saber médico-
18

psiquiátrico, o qual definia os limites entre o normal e o patológico, assim como limitava os
espaços de participação desses sujeitos, por enfocar na doença. Entretanto com os avanços de
movimentos sociais voltados para a saúde foram se estruturando serviços e equipes
interdisciplinares para a saúde em amplas complexidades, tanto para a saúde de modo geral,
como para a saúde mental.
A partir da consolidação desses mecanismos de saúde foram se organizando uma rede,
ou seja, um entrelaçamento para prover cuidado. Como rede para a clientela de saúde mental
definiu-se, segundo a Portaria Nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011, a Rede de Assistência
Psicossocial – RAPS (Brasil, 2011). Nessa rede constam todos os níveis de complexidade,
sendo evidenciadas as USF e os NASF dos quais espera-se por meio dessa rede uma atuação
de apoio matricial. Apoio por meio do qual os profissionais do NASF venham a oferecer
suporte às USF, entre ações conjuntas no tratamento à população e reuniões para discussão de
casos, em um movimento de educação permanente por intermédio desses estudos de casos.
Nesse sentido, neste estudo, é observado como as ações de parte da RAPS e o
funcionamento do apoio matricial se estruturaram. Aliás, é identificado a partir do que se
parte nas intervenções em saúde mental e como esse conjunto de ideias fundamenta as ações
em saúde. A Atenção Básica como possibilidade de cuidado no próprio território e
descentralização da hospitalização se apresenta então por meio da articulação dessa rede em
favor do usuário do serviço que, mesmo encaminhado para outro serviço, não deixa de ser
referenciado pela USF de seu território. Assim o encaminhamento funciona como uma
atenção à necessidade do usuário e não como uma desresponsabilização da equipe pelo sujeito
e pela sua família, requerendo um trabalho conjunto.
Com base em tais dados, que se referem à capacitação de profissionais na área da
saúde para com a problemática da saúde mental, uma vez que também irrompe na Atenção
Básica, bem como a atuação profissional com as pessoas com transtorno mental severo e
persistente, a qual esta pesquisa buscou investigar: Como o trabalho das EqSF com as pessoas
com transtornos mentais severos e persistentes por intermédio do apoio matricial do NASF e
CAPS se apresenta no município de Poços de Caldas? A pesquisa destina-se a investigar o
fenômeno em uma cidade de médio porte, fornecendo informações sobre como essas políticas
estão se organizando em municípios com uma menor população.
Para tanto foi investigado o trabalho de duas EqSF com as pessoas com transtornos
mentais, tendo como base o seu manejo em relação ao atendimento direto aos usuários, os
contornos dados pelos profissionais sobre as especificidades das demandas, às intercorrências,
às percepções que embasam suas atuações e à educação permanente em saúde que afetam
19

diretamente este trabalho. Tais componentes da atuação profissional foram estudados


incluindo também o apoio matricial de outras equipes, o NASF e o CAPS, que auxiliam na
produção de discussões, saberes e práticas em relação à atenção à clientela. Nesse sentido, as
equipes foram arguidas quanto a sua relação com apoio do NASF e do CAPS, assim como
foram observadas reuniões com esses mesmos serviços junto às USF.
Nesse sentido foram observadas duas reuniões com profissionais do NASF, em uma
USF Urbana. Nessas estavam presentes três profissionais do NASF, sendo eles um psicólogo,
uma fisioterapeuta e uma nutricionista. Assim, pode-se compreender como o NASF apresenta
a equipe de suporte à Atenção Básica, no que tange à saúde mental; foi possível entender a
lógica de matriciamento e como a EqSF se implicaram nessa relação - algo presente em
pesquisas realizadas em municípios de grande porte.
Já quanto às reuniões com o CAPS, foi possível apenas a observação de uma reunião
desse serviço na USF Urbana. Os profissionais foram um psicólogo e uma enfermeira do
CAPS, os quais estavam escalados para o apoio matricial. A partir dessa observação, houve
uma pequena compreensão de como essa instituição desenvolve o matriciamento e se
propõem a desenvolver uma educação permanente em saúde junto à EqSF.
Destarte, esta pesquisa foi desenvolvida também devido a poucas pesquisas terem sido
identificadas que demonstrem o cenário da atenção em saúde do município estudado, assim
como a efetivação do NASF nesse contexto e o funcionamento do atendimento à saúde mental
na Atenção Básica em parceria com o CAPS. Em estudos como de Bernardes (2016),
Williams, Rocha, Ferraudo e Morraye (2010), assim como no documento de Poços de Caldas
(2014), é possível visualizar a organização em termos de profissionais para com os serviços
na atenção à população, restando a interrogação acerca do desenrolar das políticas de saúde
nos serviços e sua consolidação de modo universal, com enfoque em pessoas com transtorno
mental. É considerando o aparato de serviços que apoiam a Atenção Básica, assim como
outras pesquisas desenvolvidas em municípios com um maior contingente populacional. Este
estudo se voltou para a realidade da cidade de Poços de Caldas, um município de menor porte.

1.2 O questionar-se em pauta: entendendo a construção da pesquisa

Este estudo surge enquanto fenômeno experiencial durante um estágio, o qual foi
realizado em um CAPS II por meio de uma disciplina denominada Estratégias de Atuação do
Psicólogo em Saúde, do 9º Período de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais – Campus Poços de Caldas, ministrada pela professora doutora Nara Pratta.
20

Esse estágio aconteceu em um CAPS localizado no município de Poços de Caldas e tratava-se


de uma possibilidade de atuação na área de saúde, em serviço de saúde mental. Em tal
proposta foi desenvolvido um projeto de estágio com observações, diálogos e dinâmicas de
grupo. Dentre as temáticas discutidas nas dinâmicas com um grupo de usuários, uma delas foi
o preconceito em relação à pessoa com transtorno mental. Após a participação no grupo, os
usuários se destinaram ao refeitório onde seria oferecido o lanche no período da tarde.
Durante o lanche, uma senhora que havia participado da discussão se aproximou do
pesquisador e eles começaram a conversar. Nesse momento, a paciente contou que, em um
determinado dia, uma profissional da rede de saúde do município entrou no CAPS à procura
da gestora e começaram a conversar informalmente. A paciente foi questionada se era
funcionária da instituição, então informou que fazia tratamento no local, neste momento, a
profissional interrompeu o diálogo e foi procurar a gestora do CAPS. A usuária associou esse
ocorrido com o preconceito abordado no grupo, por perceber-se desvalorizada com a reação
da profissional.
O relato da usuária, assim como outros escutados em conversas com as pessoas que
faziam tratamento no CAPS não são, em sua maioria, uma forma de preconceito explicito, por
haver muitos não ditos da parte de quem os praticam em relação às pessoas com transtorno
mental. No entanto, sabe-se que o convívio com pacientes com transtorno mental costuma
gerar ações preconceituosas e estigmatizadoras. A partir dessa experiência, sendo um ato de
preconceito ou não, questionei-me quanto à pertinência de estudar sobre a atuação de
profissionais da saúde em relação às pessoas com transtornos mentais severos e persistentes.
Tal questionamento se balizou na compreensão de que são os profissionais da saúde precisam
manejar suas concepções em relação a sua clientela no desempenho de suas práticas
cotidianas, então surgiram em um primeiro momento algumas interrogações: Quais seriam os
sentidos que se atribuem sobre os usuários com transtornos mentais severos e persistentes?
Como seria o seu manejo a partir de suas concepções? O que estaria implicado na construção
de seus ideários?
Destarte, este estudo também investiga como a percepção repercute na atuação,
demonstrando assim, sua interferência no próprio trabalho em rede, na articulação da equipe
de um setor com os demais setores de saúde. E, simultaneamente, pode-se explicitar o modo
como tais discursos se apresentam no cenário institucional, sejam pautados no discurso
psiquiátrico, como transtorno, ou sob uma perspectiva mais ampliada, como uma forma de
sofrimento.
21

Além de ser um indicativo das atividades em saúde, esta pesquisa viabiliza uma
compreensão de quais são os ideários que sustentam a atuação da equipe de saúde em relação
a uma parcela do público alvo de cuidado, com transtorno mental severo e persistente e o que
poderá ser posteriormente revisto por meio de capacitações e discussões. Essas concepções
podem ser trabalhadas com as equipes de saúde e agregar à atuação de outros profissionais,
tanto da área da saúde de modo geral, quanto os da saúde mental.
Vale ressaltar que as percepções dos participantes são decorrentes de interações que
eles desenvolvem ao longo de sua existência e apresentam uma concepção de um lugar social
que esses indivíduos vivem, assim como são perpassadas por sua educação permanente
composta por formação técnica e discussões entre equipe. Diante disso, a pesquisa possibilita
uma apropriação dessas ideias para desmistificar uma compreensão depreciativa que ainda se
têm sobre o sujeito com transtorno mental, bem como serve de questionamento sobre o que os
profissionais concebem a respeito desse sujeito e de revisão de pressupostos sociais.
Portanto, além desta pesquisa ser uma proposta de compreensão de um fenômeno
social que se mostra a profissionais da saúde, ela também viabiliza expandir a concepção
desses para a sociedade e fomentar discussões sobre a temática. Assim, este trabalho aventou
descrever a atuação das EqSF com as pessoas que têm transtornos mentais severos e
persistentes, como uma forma de avançar ainda mais nas pesquisas sob tais pontos.
Assim, tal pesquisa objetivou conhecer o trabalho das EqSF com usuários com
transtornos mentais severos e persistentes, a partir da relação de apoio do NASF e do CAPS.
Já os objetivos específicos foram: identificar os sentidos atribuídos pelas equipes de saúde às
pessoas com transtornos mentais severos e persistentes, usuárias de unidades da Atenção
Básica; descrever as ações desenvolvidas pelos profissionais de saúde para o tratamento de
indivíduos com transtornos mentais severos e persistentes em consonância com o apoio
matricial; e conhecer o papel da educação permanente em saúde mental dos participantes das
USF para atuação com usuários que têm transtornos mentais severos e persistentes.
No segundo capítulo, são discutidas as Reformas Psiquiátrica e Sanitária e suas
repercussões para a assistência em saúde para a clientela de saúde mental por intermédio de
dispositivos substitutivos dos hospitais psiquiátricos. Além disso, é abordada a Atenção
Básica representada pelas Unidades de Saúde da Família que são portas de entrada para os
serviços de saúde e sua articulação com o Núcleo de Apoio à Saúde da Família, sendo que
esse último apoia inclusive as ações em saúde mental das equipes de saúde da família.
Consoante ao objetivo desta pesquisa são apresentados alguns sentidos atribuídos por
indivíduos com transtornos mentais, por sua família, pela sociedade, bem como pelas EqSF
22

compostas por médicos, enfermeiros e agentes comunitários de saúde às pessoas com


transtornos mentais severos e persistentes.
No terceiro capítulo, a pesquisa é descrita, conforme seus parâmetros metodológicos.
Ela é caracterizada como um estudo de campo, de cunho descritivo, triangulação de métodos,
de contraste, sendo realizada em duas unidades, uma urbana e outra rural, com observação
participante em reuniões de equipe e de matriciamento, assim como entrevistas
semiestruturadas. Aliás, propôs-se uma triangulação de dados por envolver a experiência de
equipes na zona urbana e rural, sendo possível realizar comparações. Por fim, é sinalizada a
análise de conteúdo como instrumento para analisar os dados coletados, sendo descritos o
processo de análise das entrevistas e o acompanhamento às reuniões que foi registrado em
diário de campo.
Já o quarto capítulo apresenta os dados coletados nas entrevistas e reuniões,
desenvolvendo sua análise. Dessa análise surgiram elementos presentes na atuação das EqSF
ligados ao medo de profissionais em seu trabalho com pessoas com transtornos mentais
severos e persistentes, uma compreensão biologicista, como também uma psicossocial. Foram
identificados os manejos em relação a esses usuários, apontando as demandas mais
frequentes, os procedimentos realizados, uma dificuldade apresentada por alguns profissionais
e uma concepção acerca da complexidade na Atenção Básica. Além disso, emergiram dos
relatos dos participantes alguns elementos da educação permanente como: capacitações,
cursos e matriciamento, e as diferentes percepções acerca das reuniões de matriciamento
desenvolvidas pelo NASF e pelo CAPS junta às USF.
No quinto capítulo é realizada uma discussão entre os resultados de ambas as
unidades, os quais são relacionados, tendo como base as diferenças dos contextos rurais das
dinâmicas urbanas. Ainda são relacionadas as informações presentes nas entrevistas com os
conteúdos observados nas reuniões de equipes e de matriciamento com o CAPS e o NASF. A
partir desses dados são gerados produtos por intermédio de mais uma articulação com a
literatura.
Como último capítulo, são apontadas algumas considerações finais que ressaltam que
a pesquisa conseguiu ir de encontro aos objetivos mesmo havendo uma alteração sobre o que
foi proposto em um primeiro momento. São reiterados alguns avanços que a pesquisa
conseguiu apresentar considerando as comparações entre contextos urbano e rural, bem como
o acompanhamento às reuniões. Por fim, é referida a necessidade de outras pesquisas para
explorar ainda mais a temática.
24

2 O CONTEXTO HISTÓRICO DA ATUAÇÃO DAS EqSF COM PESSOAS COM


TRANSTORNOS MENTAIS

Diante de toda a complexidade em saúde envolvida no tratamento de pessoas com


transtornos mentais, esses podem vir a receber atenção em saúde de várias instituições da
RAPS, inclusive e preferencialmente serem tratados em sua comunidade como usuárias da
Atenção Básica. Nesse aspecto, faz-se pertinente compreender os fatores implicados no modo
como ocorre a assistência junto à clientela com transtorno mental. Portanto, o texto a seguir
apresenta uma concepção de transtorno mental, o panorama político que implementa ações em
saúde por intermédio de instituições substitutivas em saúde mental, a Atenção Básica
representada pela figura da USF e algumas concepções associadas aos transtornos.
Na modernidade, as manifestações psicopatológicas, com base na história da loucura
retratada por Foucault (1995), eram relegadas a espaços de exclusão e estigmatizadas.
Atualmente são tratadas pela alcunha de transtornos mentais, sendo transtorno mental
conceituado como:

[...] Uma síndrome caracterizada por perturbação clinicamente significativa na cognição, na regulação
emocional ou no comportamento de um indivíduo que reflete uma disfunção nos processos
psicológicos, biológicos ou de desenvolvimento subjacentes ao funcionamento mental. Transtornos
mentais estão frequentemente associados a sofrimento ou incapacidade significativos que afetam
atividades sociais, profissionais ou outras atividades importantes. Uma resposta esperada ou aprovada
culturalmente a um estressor ou perda comum, como a morte de um ente querido, não constitui
transtorno mental. Desvios sociais de comportamento (p. ex., de natureza política, religiosa ou sexual) e
conflitos que são basicamente referentes ao indivíduo e à sociedade não são transtornos mentais a
menos que o desvio ou conflito seja o resultado de uma disfunção no indivíduo, conforme descrito.
(DSM 5, 2014, p. 20).

Sob tal conceituação nosológica, o transtorno mental seria a alteração do


funcionamento de alguma ordem constitutiva do sujeito que promoveria intercorrências ao seu
modo de se relacionar com os outros e se perceber. Assim, o surgimento de um transtorno
afetaria o desempenho das atividades comuns no âmbito da sociedade, como também o amplo
desenvolvimento do indivíduo que o apresentar, conforme o que lhe seria esperado
socialmente. Portanto, tal problemática envolveria aspectos cognitivos, afetivos e
comportamentais que passam a funcionar de modo dissonante a um âmbito comum, ou seja,
de uma articulação coletiva. De forma distinta a essa concepção classificatória que trata do
indivíduo sob uma perspectiva biomédica, na qual muitas vezes ele foi compreendido como
um problema para a sociedade e recluso desta. Entretanto, com a Reforma Psiquiátrica há a
25

promoção de mudanças em relação a esse ideário, assim como a criação de novas propostas,
as quais serão tratadas a seguir.

2.1 O panorama político e a implementação de ações em saúde por intermédio de


instituições substitutivas em saúde mental

Segundo Batista (2014), a Reforma Psiquiátrica tem seu início no horizonte mundial
devido à irrupção de críticas ao saber da psiquiatria, sob a tese de que era a psiquiatria quem
estaria criando o seu próprio objeto e não tratando de quem realmente teria uma doença, como
ela dizia fazer, e também ao modelo assistencial permeado por maus tratos, atendimento
precário e superlotação.
Na Itália, de acordo com Batista (2014), Franco Basaglia, um psiquiatra, se opunha à
existência dos manicômios e questionava a psiquiatria, por compreendê-los como
discriminatórios e excludentes. Historicamente, o louco era retirado de seu contexto social e
realocado em instituições médicas, como uma forma de gerir o que ele representava em
termos de periculosidade à sociedade, por isso a doença mental era tomada como objeto da
medicina. Basaglia se antepunha a essas práticas. Em 1960 buscou a humanização, nas
práticas no Hospital Psiquiátrico de Gorízia, tendo em vista que eram utilizadas no paciente
“[...] amarras, camisas de força, máscaras, grades (inclusive nas camas), uso indiscriminado
dos eletrochoques; os passeios eram somente permitidos no jardim e contidos” (Junqueira &
Carniel, 2012, p. 15). Além disso, fazia parte da agenda da reforma italiana “um projeto de
desinstitucionalização, desmontagem e desconstrução de saberes/práticas/discursos” que
objetificavam a pessoa em sofrimento mental e tomavam-na apenas por sua faceta da doença
(Amarante, 1995, p. 53). No ano de 1971, Basaglia chegou a Trieste e realizou uma
desmontagem dos serviços manicomiais, viabilizando a construção de outras alternativas de
atuação com as pessoas com transtornos mentais. Foram criados, na cidade de Triste, sete
Centros de Saúde Mental, locais para antigos usuários de hospitais psiquiátricos residirem,
assim como cooperativas de trabalho para esse contingente.
No Brasil, ao final do ano de 1970, teve início o processo de redemocratização do
Brasil, o que começou a montar um quadro favorável à Reforma Psiquiátrica no país (Barroso
& Silva, 2011). Reforma essa que surgiu em resposta a maus tratos, ineficiência do
tratamento, precariedade do trabalho, gastos onerosos com a assistência e privatização da
assistência psiquiátrica. Segundo Amarante (1995), a Reforma Psiquiátrica teve início por
volta dos anos 1978 a 1980 com a crise na Divisão Nacional de Saúde Mental (Dinsam),
26

envolvendo a greve dos funcionários, os quais foram posteriormente demitidos juntamente


com estagiários. A partir daí foram contratados profissionais como bolsistas, que trabalhavam
em péssimas condições, sob ameaças e vivenciavam violações. Devido a denúncias
formaram-se movimentos de apoio a tal causa, sendo produzidos documentos requerendo
mudanças salariais, uma formação teórico-técnica, o questionamento a cultura da instituição
em relação aos profissionais e usuários, ao modelo médico-assistencial e suas limitações e a
quantidade inferior de profissionais em relação à demanda, assim como as parcas condições
materiais. A partir de tais movimentos foram tecidas discussões apontando que todos
deveriam ter acesso à saúde e que precisaria haver um aprimoramento técnico para os
profissionais.
Outro marco importante do movimento foi o I Congresso Brasileiro de Psicanálise de
Grupos e Instituições, realizado em 1978, que contou com a presença de importantes nomes
da Reforma Psiquiátrica de outros países, tais como: Franco Baságlia, Feliz Guattarri, Robert
Castel, Erwing Goffman, dentre outros (Amarante, 1995). A participação de Basaglia nesse
congresso assim como no país, oportunizou a disseminação de seu pensamento da reforma e
suas contribuições por intermédio de suas experiências. Nesse congresso foram tecidas
críticas ao modelo asilar dos hospitais psiquiátricos. Assim, semelhante à experiência italiana
que criticava o paradigma asilar dos hospitais psiquiátricos, esses passaram a ser
interrogações também na Reforma Psiquiátrica Brasileira, acerca do tratamento que estaria
sendo proposto para os indivíduos com transtornos mentais. Além disso, inspirados nos
Centros de Saúde Mental italianos, foram implementados Centros de Atenção Psicossocial
(CAPS). Com base na experiência dos Grupos-apartamentos, desenvolveram estratégias de
acolhimento aos regressos de instituições psiquiátricas denominadas de Serviços Residenciais
Terapêuticos. No ano de 1980, no I Encontro Regional dos Trabalhadores de Saúde Mental,
foram discutidas questões sociais referentes à doença mental, à atuação profissional e feitas
denúncias de irregularidades em instituições psiquiátricas.
Além disso, conforme Barroso e Silva (2011), no ano de 1986, aconteceu a 8ª
Conferência Nacional de Saúde, na qual buscaram-se alternativas referentes à assistência
psiquiátrica, baseadas na integralidade, multidisciplinaridade e descentralização do
atendimento hospitalar. Entretanto, só houve mais ênfase nesses discursos a partir da 1ª
Conferência Nacional de Saúde Mental e do 2º Congresso Nacional dos Trabalhadores de
Saúde Mental, em 1987. Em contribuição à Reforma Psiquiátrica, o deputado Paulo Delgado
apresentou em 1989 um projeto de lei, que propunha uma assistência psiquiátrica comunitária
e o fim dos manicômios, sendo promulgado como a Lei 10.216, no ano de 2001, sob a
27

garantia de atendimento extra-hospitalar, de modo mais humanitário e protetivo às pessoas


com transtornos mentais.
Destarte, dissonante de uma compreensão biomédica, a qual concebe as pessoas com
transtornos metais primordialmente a partir de seus aspectos biológicos e destinando-os a
ambientes de reclusão (hospitais), onde sofriam uma série de abusos e violações de direitos, a
Reforma Psiquiátrica propõe outro paradigma. Assentado também na Lei 10.216, de 6 de abril
de 2001, o indivíduo com transtorno mental passa a ser reconhecido sob uma ótica
biopsicossocial, tendo resguardados seus direitos e demarcada a internação quando todos os
recursos extra-hospitalares forem esgotados, para não corroborar com um processo de
exclusão. Portanto, as internações tornaram-se os últimos recursos e ocorrem mediante
conduta médica e não devem ser realizadas em instituições asilares. Por meio de tais avanços
legais e da execução pelos serviços das políticas públicas, a pessoa tem o direito de ser
informada sobre a sua condição psicopatológica, sobre o tratamento, ser tratada com
humanidade, de preferência em serviços de saúde disponíveis em sua comunidade, com a
finalidade de manter os vínculos já estabelecidos, bem como ampliá-los e reforçá-los por
intermédio de ações de reinserção social. Por conseguinte o sentido psicossocial conquistado
pela Reforma Psiquiátrica promoveu uma nova configuração de atenção em saúde aliada ao
reconhecimento da relevância de um controle social.
Cohn (1989) apresenta outra reforma, de caráter mais amplo, que propunha mudanças
no âmbito da saúde pública: a Reforma Sanitária. Esta, assim como a Reforma Psiquiátrica,
também teve influência das experiências italianas e engloba “experiências de reformulação
normativa e institucional no campo da assistência em saúde dos cidadãos” (Cohn, 1989, p.
123), surgindo como um movimento na década de 70, com a implantação de serviços com
princípios de universalidade, integralidade e equidade na atenção em saúde. Tais experiências
evoluíram para a proposta do Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS) como
uma possibilidade de fortalecer os serviços públicos, com base na universalização, por meio
de financiamento em nível federal, estadual e municipal. Nesse aspecto a Reforma Sanitária
veio reforçar o movimento sócio-político em prol do Sistema Único de Saúde (SUS) na
década de 80 (Silva, 2014). Concomitantemente nesse período culminou na assimilação do
direito universalizado ao acesso à saúde e reconhecido como incumbência do Estado o qual se
resguarda na Constituição Federal de 1988. Desse modo, a Reforma Sanitária teria o papel de
transformação das relações sociais, seria uma forma de cidadania, sendo mais um movimento
que fortalece a participação social nas políticas públicas, propondo assim, uma reorganização
das políticas em saúde.
28

De acordo com Vidal, Bandeira e Gontijo (2008), surgiram em resposta a essas


reinvindicações políticas por melhorias na atenção em saúde, serviços como as Residências
Terapêuticas e os Centros de Atenção Psicossociais (CAPS). As Residências Terapêuticas são
casas localizadas na comunidade e destinadas a cuidar de pacientes que estiveram durante
muito tempo em hospital psiquiátrico e perderam seu vínculo com familiares. Os CAPS
surgiram com o objetivo de “evitar internações, acolher os egressos dos hospitais
psiquiátricos e poder oferecer um atendimento intensivo para portadores de doença mental,
dentro da nova filosofia do atendimento em saúde mental [...]” (Ribeiro, 2004, p. 95).
Uma definição mais ampla disso, segundo o Brasil (2011), é a RAPS, que seria uma
organização dos mecanismos de saúde em prol das pessoas com transtornos mentais, que
estejam vivenciando sofrimento e das que sejam usuárias de substâncias psicoativas. Ou seja,
ela é uma articulação dos serviços da rede de forma regionalizada, promovendo ações
intersetoriais para garantir o acesso ao direito em saúde conforme a necessidade do indivíduo.

2.2 A Atenção Básica representada pela figura da USF: interseções entre USF, NASF e a
atenção a saúde mental

Como um componente da RAPS, que segundo o Brasil (2010a) atua a partir das
diretrizes da Atenção Básica e oferece suporte a Estratégia de Saúde da Família, foi criado o
Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF) em 2008 pela Portaria GM nº 154. Sua criação
destina-se ao apoio da estratégia e ampliação da Atenção Básica, aprimorando-a por meio dos
pressupostos do SUS. Dessa forma, o NASF realiza um apoio matricial, com intervenções
junto às equipes de saúde da família (EqSF) e usuários, não havendo um contato direto e
diário com usuários, mas com tarefas que se dirigem a apoiar essas equipes. Nesse ínterim,
aparece também uma clientela de saúde mental e para “[...] o melhor manejo da saúde mental
na APS” (Atenção Primária à Saúde) “, propõe-se um trabalho compartilhado de suporte às
equipes de SF por meio do desenvolvimento do apoio matricial em saúde mental pelos
profissionais dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF).” (Brasil, 2010a, p. 36).
Assim, o NASF tem como função por intermédio do apoio matricial ampliar as condições das
EqSF em tratar do sofrimento mental e localizá-las com os fundamentos da rede assistencial
em saúde, viabilizando assim a prevenção, a promoção, o cuidado e a reabilitação às pessoas
com transtornos mentais no horizonte da Atenção Básica.
O NASF teria o papel de, por intermédio do apoio matricial, realizar a educação
permanente junto às unidades de saúde in loco. Diferentemente de outros dispositivos, o
29

NASF não tem como exclusividade oferecer educação permanente apenas sobre a saúde
mental, mas também das demais temáticas mais recorrentes para a EqSF. A partir da
compreensão do território, da clientela e das demandas é que essa educação precisará ocorrer
como uma maior instrumentalização, bem como uma construção de conhecimentos conjuntos,
tendo em vista os saberes locais das especificidades da unidade e dos conhecimentos prévios.
Dessa forma, o NASF como dispositivo em saúde, oferece apoio às equipes a partir de
discussões, suscitando novas questões e problematizando sentidos que terão implicações na
atuação com a clientela. Além disso, ainda sistematiza ações com a EqSF e contribui com o
aprendizado das equipes frequentemente formando um movimento de educação permanente
de ambas as equipes.
Como elemento do apoio matricial vale demarcar a educação permanente que traz a
concepção de educação cotidiana para o SUS, sob a perspectiva de responsabilidade com a
atenção a comunidade (Brasil, 2014). Os profissionais que lidam com o público
cotidianamente vão decidir acerca do acolhimento, escutar os usuários, oferecer cuidado e
tratar da demanda conforme sua complexidade. A educação permanente parte, então do dia a
dia como palco das criações, aceitação de mudanças e de construções de ações colaborativas,
no que tange a assegurar que a clientela seja ouvida, visto a pluralidade da população (Brasil,
2010a; Silva & Duarte, 2015). A Política Nacional de Educação Permanente em Saúde
(PNEPS) refere-se à mudança de serviços na aprendizagem e no desempenho da assistência
em saúde (Brasil, 2014). A partir dessa política, são consideradas as alterações relacionais, em
termos de processos, nas ações e primordialmente nos indivíduos partícipes desse processo.
Já a educação continuada pode ser vista de modo distinto sendo que conforme
Collares, Moysés e Geraldi (1999) haveria uma cisão entre a geração e o manuseio do
conhecimento, como uma separação da prática experiencial, desvalorizando o conhecimento
de quem o produz cotidianamente em sua prática diária em prol de um agente externo que
passaria o seu saber. Essa concepção desconsideraria o saber já existente e partiria de uma
substituição deste por outro mais atual, como se as experiências de trabalho não construíssem
nenhum conhecimento. Os autores ainda questionam a educação continuada, afirmando que
esta seria descontinua, não havendo escuta e uma investigação anterior considerando o que os
participantes demandam. A educação continuada, de modo oposto à educação permanente, é
tida como uma tecnicidade, na qual saberes são reproduzidos, sem uma dimensão de
transformação e reformulação as quais são viabilizadas pelo processo de aprendizagem em
serviço (Brasil, 2014). Ou seja, não haveria uma dimensão dialógica de elaboração conjunta
do processo de conhecimento, tal como na educação permanente.
30

Na educação permanente é fundamental as equipes deterem conhecimento acerca das


normas norteadoras e “[...] protocolos clínicos reconhecidos e desenvolvam habilidades para
orientar os usuários sobre os procedimentos necessários para acessar os medicamentos,
recursos e serviços de AF especializada no SUS e realizar a vigilância do uso dos
medicamentos nos territórios.” (Brasil, 2010a, p. 79). Nesse sentido, a educação permanente
viabiliza uma revisão e transformação de práticas, que parte de uma proximidade das equipes,
criando espaços de discussão de prioridade e das temáticas que atravessam a atuação.
À vista disso, conforme o Brasil (2010a) a atuação do NASF pode se estender a ações
educativas que envolvam discussões e construções conjuntas de maneiras a lidar com a
demanda em termos teórico-práticos. Portanto, a educação permanente é tratada aqui como
uma busca contínua de formação seja por estudos de caso, capacitação e educação formal. E
é por meio dessa educação permanente que se mantém durante todo o período de atuação, que
algumas concepções se criam e rearticulam.
Outro meio de assistência em saúde já mencionado são as equipes de saúde da
Atenção Básica que compõem a Estratégia de Saúde da Família (ESF), sendo essa atenção,
segundo o Brasil (2012), regulamentada pela Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) de
2011, que prevê o que se espera da Atenção Básica, mudança das configurações da ESF,
inclusão de Consultórios de Rua e aumento de NASF. Ela ainda viabilizou melhores
condições para a criação de Unidades Básicas de Saúde da Família (UBS) Fluviais e ESF para
a comunidade ribeirinha, dentre outras implementações nos serviços de saúde.
Segundo o Brasil (2010b) a ESF iniciou em 1994 um programa para os municípios
para colocar em ação a Atenção Básica, o qual passou a ser reconhecido como uma estratégia
em âmbito nacional que precisou ter revistas as suas normas, sob adequação frente à realidade
dos estados de acordo com a Portaria nº 648/ GM de 28 de março de 2006 (Brasil, 2006).
Conforme o Brasil (2012), devido a ESF compor o primeiro nível de complexidade em saúde,
é um dos recursos disponíveis na rede de saúde para pessoas que têm transtornos mentais. Tal
dispositivo de saúde é tido como uma estratégia de ampliação, aperfeiçoamento e de
estabelecimento desse primeiro nível de atenção em ventura de contribuir para a
reorganização da atuação profissional mediante os pressupostos da Atenção Básica. Em
virtude dessa configuração de atendimento e por ser porta de entrada, assim como visar o
atendimento às famílias, que a Atenção Básica se faz primordial no cuidado aos indivíduos
com transtornos mentais severos e persistentes, bem como ao seu entorno.
Como componente da Atenção Básica tem-se as Unidades de Saúde da Família (USF),
que são o primeiro contato dos indivíduos com o cuidado em saúde e por sua vez dos usuários
31

com transtornos mentais (Brasil, 2000). Segundo Büchele, Laurindo, Borges, & Coelho
(2006) uma alternativa para a saúde mental reorganizar a atenção psiquiátrica a partir da
Atenção Básica em saúde, de modo a fortalecer a rede de atenção no que tange a clientela
com transtornos mentais e os níveis de complexidade que estes demandarem. Ainda se torna
possível mediante o enfoque da ESF que funciona nas unidades, promover de acordo com a
inclusão social de seus usuários, tendo em vista que a atuação acontece no próprio território
no qual eles residem. E, mesmo havendo encaminhamentos, os indivíduos continuam sendo
da equipe, pelo tempo que esses residirem no mesmo bairro do serviço de saúde (Correia et
al., 2011; Dantas & Passos, 2018).
Segundo o Brasil (2000), existem diretrizes para implantação dessa estratégia a
concepção de áreas prioritárias, que indica que todos precisam ter acesso igualitário, é
realizado um levantamento da quantidade de habitantes que podem ser atendidos no território
geográfico da ESF. Inclusive, mensura-se a quantidade de agentes comunitários de saúde
(ACS) em relação ao número da Equipe de Saúde da Família e mapeiam-se as áreas e
microáreas para o acompanhamento. Além disso, o programa tem como fundamento
“estabelecimento de vínculos e a criação de laços de compromisso” com a família em seu
território “e de corresponsabilidade entre os profissionais de saúde e a população” (Brasil,
1997, p.7).
A implantação desse programa que ganhou outros contornos e passou a ser
denominado: Estratégia Saúde da Família (ESF) tem como princípio segundo o Brasil (2012)
reorganizar a Atenção Básica a partir do SUS. Para tanto, suas ações são realizadas por uma
equipe multidisciplinar que é integrada por:

No mínimo, médico generalista ou especialista em Saúde da Família ou médico de Família e


Comunidade, enfermeiro generalista ou especialista em Saúde da Família, auxiliar ou técnico de
enfermagem e agentes comunitários de saúde, podendo acrescentar a esta composição, como parte da
equipe multiprofissional, os profissionais de saúde bucal: cirurgião-dentista generalista ou especialista
em Saúde da Família, auxiliar e/ ou técnico em saúde bucal [...]. (Brasil, 2012, p. 54).

A equipe então seria esse conjunto de profissionais com o objetivo de oferecer


assistência à Saúde da Família no território da população atendida. Segundo Peduzzi (2001) a
concepção de equipe multiprofissional, como é correntemente mais conhecida, é um coletivo
de profissionais de áreas distintas trabalhando em parceria, no qual não há uma sistematização
muito grande na articulação de suas ações. Conforme a autora a atuação da equipe não exclui
as diferenças das atuações, uma vez que, são as diferenças que contribuem no desenrolar da
32

demanda, de modo a ampliar o conhecimento e a técnica frente às necessidades que o trabalho


requeira.
Dessa maneira as EqSF podem compor as Unidades de Saúde da Família, localidade
na qual se encontra apenas uma equipe para o atendimento ao território e onde a Estratégia de
Saúde da Família se organiza. De forma semelhante esses profissionais podem se localizar nas
Unidades Básicas de Saúde (UBS), que abrangem um contingente maior de profissionais
(Brasil, 2012; Brasil, 2017; Poços de Caldas, 2014). Sendo assim, uma UBS pode ser
composta de até quatro EqSF, as quais podem dar apoio às EqSF dos municípios. A
implantação de uma UBS acontece em um município com no mínimo 50 mil habitantes
(Brasil, 2013). Enquanto as USF atendem no máximo uma área com 4500 habitantes, sendo
de 600 a 1000 famílias abrangidas (Brasil, 2000). As UBS ainda têm condição de oferecer
suporte as USF que demandarem maior complexidade conforme a necessidade da
comunidade. Já na USF há apenas uma equipe de saúde, com um médico especialista em
saúde da família ou generalista. Em suma, a diferença primordial é que em uma UBS não
necessariamente haverá Saúde da Família, já em USF consta a Saúde da Família (Brasil,
2012; Brasil, 2000).
A USF foi escolhida devido ao seu contato direto com o usuário, uma vez que se
organiza a partir do território das famílias referenciadas e é a porta de entrada para os serviços
de saúde, sendo a primeira via de acesso da população a possibilidades de cuidado. Segundo
Yassui (2006) o cuidado apenas é desenvolvido com as pessoas a partir de um lugar, de um
contexto, de seu território onde as pessoas residem, circulam e se constroem. Souza e Andrade
(2014) afirmam que a noção de território na área da Saúde passa a ter mais importância em
decorrência da descentralização a partir do ano de 1990, momento em que o município tem
mais responsabilidade sobre a saúde de seus moradores. E com isso há uma “reorganização da
atenção básica baseada em espaços geográficos, considerados territórios dinâmicos, pois
envolvia equipamentos e relações sociais que estavam sempre em processo.” (Souza &
Andrade, 2014, p. 4115). Em outras palavras a concepção de território teve mais relevância
após uma sistematização da organização e atuação da Atenção Básica que passou a se
aproximar mais dos usuários do sistema de saúde. Para Ferreira Neto (2011) o termo território
ultrapassaria a percepção geográfica e seria um componente no processo de subjetivação, de
formação dos indivíduos, seria um “sujeito coletivo e espaço”. Nesse sentido, território seria
alvo e o palco do imaginário coletivo, da participação política da população e para tanto,
envolveriam um movimento de mudanças de um grupo. Então esse lugar do coletivo seria
formado pelo espaço e pelos indivíduos que assim dariam forma a este território, pelo coletivo
33

e o individual e esse seria reconhecido a partir dessas interações e com isso também estaria
sujeito a mudanças e transformações. E é, portanto, sob esta ótica que as EqSF atuam, se
inserindo nos territórios, nos quais também emergem as demandas em saúde e
consequentemente surgem as problemáticas que deverão ser abordadas pelo matriciamento,
como uma proposta de compreender a dinâmica desse território e elaborar junto às equipes
modos de lidar com a demanda.
Assim, o matriciamento aconteceria então por intermédio do NASF (apoiador
componente da Atenção Básica) e de outros serviços de maior complexidade, assim como de
outros profissionais da saúde que podem se aproximar da realidade apresentada pela EqSF e
acompanharem os usuários pós-alta, como o CAPS. Segundo Chiaverini (2011), o
matriciamento ou apoio matricial seria uma forma de gerar saúde, na qual duas equipes ou
mais a partir de discussões desenvolvem possibilidades de intervenções de cunho pedagógico
e terapêutico. O apoio matricial também pode ser compreendido como “um suporte técnico
especializado que é ofertado a uma equipe interdisciplinar em saúde a fim de ampliar seu
campo de atuação e qualificar suas ações” (Figueiredo & Campos, 2009, p. 130). O
matriciamento se configuraria então, como um suporte de uma equipe multiprofissional
especializada em uma problemática que buscaria construir o conhecimento sobre uma
demanda e vislumbrar novas formas de atuação. E no caso, tal suporte seria destinado às
EqSF que são referências compostas por múltiplos profissionais, com atribuições ligadas ao
cuidado sanitário, longitudinal, bem como de intervenções especializadas feitas
simultaneamente (Chiaverini, 2011). Portanto, são para o desempenho deste trabalho que
equipes como as do NASF e CAPS realizaram o apoio matricial.
Segundo Ferreira Neto (2011) o Programa de Saúde Mental iniciou-se no ano de 1984
em Minas Gerais como uma possibilidade de atender a clientela de saúde mental, o que foi
uma experiência inovadora e referência para ao pais, visto que antes as pessoas com
transtornos mentais tinham mais ofertas de tratamento apenas em serviços de maior
complexidade e não na Atenção Básica. Tomando o município de Belo Horizonte como
campo de análise, o autor discorre sobre diferentes momentos que a saúde mental
experimentou na cidade. Com a implantação do Programa de Saúde Mental, na região de Belo
Horizonte, buscou-se elaborar uma representação sobre o termo biopsicossocial e também
definir o trabalho em equipe. Nesse escopo, suas ações eram: “[...] atendimento a demandas
específicas (doença mental); apoio aos demais programas dos centros de saúde”; “[...] apoio
técnico ao nível primário; articulação com os recursos das comunidades (escolas, creches,
hospitais, associações de bairro); atendimento à criança, e avaliação periódica do Programa.”
34

(Ferreira Neto, 2011, p. 111). Dessa forma foi se delineando um trabalho de saúde mental
aliado à Atenção Básica, o que pôde ser visto posteriormente nas equipes de saúde mental
atuando de forma conjunta como um apoio matricial às equipes de saúde da família.
A partir dessas reconfigurações, nota-se que a equipe da ESF é responsável por
atender a população em nível básico e prestar serviço à, por exemplo, pessoas com transtorno
mental que podem utilizar dessa instituição como porta de entrada para outros serviços, ou
como recurso de tratamento pós-alta de alguma instituição de saúde mental, bem como de
atendimento contínuo em casos que requeiram menor complexidade. Considerando todo o
percurso histórico da loucura e o modo como era vista até ocupar o lugar de transtorno
mental, torna-se explicita a existência de vários sentidos, tanto por quem tem, quanto para as
pessoas que compõem o seu entorno e a própria equipe de saúde que se organiza formando
uma rede de cuidado.

2.3 Concepções sobre as pessoas com transtorno mental severo e persistente: sujeito,
família e sociedade

Em decorrência da pluralidade de ligações que o sujeito estabelece, há diversas


concepções acerca da pessoa com transtorno mental, por ela mesma, por sua família, pela
comunidade que a circunda, pelos profissionais de saúde, dentre outras. (Wagner, Duveen,
Themel, & Verma, 1999; Pereira, 2003; Nunes et al., 2007; Leão & Barros, 2008; Lucchese et
al. 2009; Maciel, Barros, Camino, & Melo, 2011).
Associada ao sentido da pessoa com transtorno mental, Wagner, Duveen, Themel, &
Verma (1999) apresentam, em sua pesquisa realizada na cidade da Índia de Patna, a imagem
da loucura, a qual se referia a um desajustamento familiar, entre as expectativas da família e
os desejos de um ente familiar, assim como também, era algo ameaçador à família na medida
em que passasse a ser do conhecimento do domínio público, sendo vista como motivo de
vergonha e estigma. Identificou-se também uma desconsideração por parte de familiares sobre
a condição e o sofrimento do indivíduo com transtorno nos achados de Dias (2011), como se
os usuários do CAPS pesquisado fingissem estar doentes para não trabalharem, sendo aliado o
sentido de vagabundo à pessoa com transtorno mental. Percepção essa que pode estar
relacionada a um descredito do sofrimento psíquico, uma vez que este não apresenta um
substrato orgânico, observável tal como outras condições patológicas. Ainda, foi elencado o
fator religioso, como se o estado psíquico de sofrimento adviesse de um “trabalho” realizado
35

por inveja do ente, ou de sua família, bem como o ente não ser adepto de uma religião e não
ter fé em um ser superior. Para além disso, foi atribuído sentido de agressividade na ausência
da medicação.
Já no que tange ao sentido das pessoas com transtornos mentais, Pereira (2003)
informa que estariam ligadas concepções de falha pessoal, o que lhe retira a humanidade e
pode fazer referência a um fator hereditário, ou até sobrenatural. Além disso, Câmara e
Pereira (2010) afirmam que o transtorno mental estaria associado ao sofrimento ao longo da
história do indivíduo, como também a conflitos familiares. Nessa primeira perspectiva o
transtorno seria proveniente de mazelas da existência humana, como perdas familiares,
problemas de saúde, relações amorosas conturbadas; tais condições seriam promotoras de
solidão, afastamento, poucas habilidades comportamentais e com isso, de uma demanda em
relação à disponibilidade do outro. De outra forma, a condição psicopatológica se referiria a
conflitos familiares, nos quais ambos não saberiam como lidar com a diferença do outro, o
que para o sujeito seria desagregador, sendo sinalizado inclusive uma necessidade afetiva por
parte do indivíduo com transtorno mental em relação ao familiar.
Na sociedade, conforme Maciel et al. (2011), são correntes os sentidos do indivíduo
com transtorno mental tido como louco, estranho, alguém perigoso, sem bom-senso,
repercutindo na difusão do medo sobre ele e na produção de ações contra esse medo, que
promovem a exclusão social. Medo também presente nos familiares que não sabem como
lidar com seu membro familiar, o que sugere a necessidade de hospitalização, para que tais
sujeitos estejam sob os cuidados de profissionais competentes, ao contrário da família.
Cândido et al. (2012) apresentam significados sociais, tais como, se a pessoa estivesse fora da
realidade, representassem uma anormalidade que dista de considerações éticas socialmente
constituídas e até de doentes mentais, o que parte de uma estigmatização, que tem
proporcionado um distanciamento visto no decorrer da história. Diante desse ideário,
atividades que envolvam a família e a comunidade são de suma relevância para a
compreensão da pessoa com transtorno mental como um cidadão que pode viver em
sociedade.
De outra forma, são atribuídos outros sentidos às pessoas com transtorno mental por
profissionais da saúde. Como exemplo tem-se a pesquisa de Leão e Barros (2008) acerca da
representação sobre as práticas de inclusão social de pessoas com transtorno mental para
profissionais que atuavam em um CAPS da cidade de São Carlos. Um dos participantes
afirma que a crise de um indivíduo com transtorno mental estaria ligada à necessidade dele ser
ouvido e que não havia sido sanada, outros relataram que a ausência de cura, somada à
36

instabilidade, inviabilizaria as possibilidades de inserção no mercado de trabalho. Além disso,


apontam uma necessidade de formação contínua para os profissionais que atuam com a saúde
mental.

2.4 A Saúde da Família e suas atuações com as pessoas com transtorno mental

Em outra pesquisa realizada por Lucchese et al. (2009) sobre a saúde mental no
Programa de Saúde da Família, foram coletados dados de algumas USF’s havendo a
discriminação de informações entre Profissionais de Nível Superior (médicos generalistas e
enfermeiros) e Profissionais de Nível Médio (técnicos em enfermagem e agentes comunitários
de saúde). Na instituição, fora sinalizada toda a problemática que as pessoas com transtorno
metal evocam, uma dificuldade da equipe em atuar com essa população no nível básico de
atenção em saúde e alguns sentidos atribuídos a essa clientela. Os participantes reconhecem a
grande demanda em saúde mental e caracterizam-na como uma população que requer mais
paciência e tempo do corpo técnico. Simultaneamente, não são formuladas ações de forma
planejada, e a ausência de atenção na própria comunidade é justificada pelos déficits na
formação para tal. Salienta-se inclusive que a percepção de cuidado dos profissionais de nível
médio e superior está mais ligada à medicalização e ao reconhecimento das pessoas com
transtorno mental como uma questão de maior complexidade, para a qual a assistência em
saúde apenas seria adequada quando fosse especializada e não passível à Atenção Básica.
Rosa e Labate (2003), em pesquisa desenvolvida com enfermeiros de um PSF,
apresentam alguns sentidos explicitados por seus entrevistados. Eles acreditavam que a pessoa
diagnosticada com transtorno mental poderia ser reinserida em seu âmbito familiar, havendo a
anuência da família para tal. Além disso, percebem uma dificuldade em lidar tanto com o
indivíduo com transtorno mental, quanto com seus familiares, o que atribui a falta de
conhecimentos que lhes provenha suporte. A partir de tal dificuldade desconsideram que a
própria população com transtornos mentais faça parte da clientela atendida pela USF, pois
partem da concepção de que esses teriam como referência serviços especializados. De
maneira complementar, os enfermeiros do estudo de Leão e Barros (2008) demonstram em
seus sentidos atribuídos às pessoas com transtorno mental uma desconsideração das
possibilidades de ser desses indivíduos, por se aterem a sua instabilidade, não sendo pensadas
e acreditadas ações de inserção social da pessoa com transtorno.
37

Nesse aspecto, há pouco investimento presente na formação de enfermeiros de um


PSF reiterado na pesquisa de Souza, Matias, Gomes e Parente (2007), pois 95,5% dos
entrevistados não possuíam uma formação em Saúde Mental, sendo que apenas 4,5% tinham
especialização nesta área. Rosa e Labate (2003) questionam a ausência de qualificação
profissional, apontando fatores, tais como, a formação deficitária e a ausência de treinamento
voltada para a saúde mental. Formação deficitária; pois, na perspectiva dos entrevistados, não
viabilizou instrumental suficiente, sendo que sua atuação teve início a partir de aproximação
com outros profissionais, capacitação em Saúde da Família e até pelo estudo de apostilas. As
autoras ainda complementam aludindo que a saúde mental é pouco trabalhada pelas
enfermeiras com as famílias referenciadas, em virtude da falta de instrumentalização por meio
de treinamentos que ofereçam aporte específico acerca da temática. Diante dessa dificuldade
dos enfermeiros, Silva et al. (2005) acrescentam que os profissionais não se envolvem muito
com a saúde mental na Atenção Básica por se sentirem despreparados, com conhecimentos
provenientes da Reforma Psiquiátrica. Portanto, é de suma relevância segundo esses
pesquisadores a capacitação da Estratégia de Saúde da Família para uma municipalização dos
cuidados em saúde mental. Mediante essa necessidade de ampliar o conhecimento e a
realização da Reforma Psiquiátrica, a educação permanente é componente fundamental para a
mudança desse quadro.
Nesse contexto o NASF se encontra como forte componente formativo por intermédio
do apoio matricial às EqSF, uma vez que teve início em janeiro de 2008, posterior a tais
pesquisas que apontam o déficit na formação dos profissionais da Saúde da Família (Brasil,
2014). Tal dispositivo surge como possibilidade de educação permanente, maior abrangência
à complexidade da demanda e aperfeiçoamento do trabalho (Aciole & Oliveira, 2017; Bispo
Júnior & Moreira, 2017; Santos, Uchôa-Figueiredo &, Lima, 2017). Assim, algumas de suas
ações estão na educação permanente, discussões de caso, atendimentos em grupo e
atendimentos individuais (Aciole & Oliveira, 2017; Bispo Júnior & Moreira, 2017; Costa,
Lima, Fioroni, 2015; Batista, Machado, Maciel, Morais, & Paula, 2017).
É enquanto educação permanente que a atuação do NASF pode ampliar o cenário das
demandas por formação. No entanto, considera-se por formação as próprias discussões entre
equipes, para além de uma educação escolar (Batista et al., 2017). Ou seja, as interlocuções
incitadas pelo NASF não se centram em aulas expositivas como alguns profissionais de EqSF
demonstraram acreditar que seria o único meio de aprendizagem legítima, desconsiderando
essa prática como meio de formação (Bispo Júnior & Moreira, 2017). De forma semelhante o
apoio matricial foi compreendido em outro estudo pelos participantes como um meio para ter
38

mais conhecimento em relação a qual dispositivo encaminhar, fortalecendo a lógica do


encaminhamento, como desresponsabilização (Aciole & Oliveira, 2017). Distintamente da
percepção de tais participantes o matriciamento seria a possibilidade de discutir e reconstruir
concepções acerca das temáticas vivenciadas no cotidiano de trabalho (Batista et al., 2017;
Costa, Lima, & Fioroni, 2015). Sob essa concepção, o apoio matricial surge como um suporte
na atenção a clientela da USF e para a ampliação da perspectiva de cuidado em relação a ela.
Sendo assim essa ação prevista para o NASF iria de modo contrário à desvinculação passível
à lógica do encaminhamento, e sim teria a finalidade de expandir o escopo de ações.
Na pesquisa de Santos, Uchôa-Figueiredo e Lima (2017) com EqSF e NASF foram
identificados que das atividades realizadas pelo NASF o apoio matricial comporia 14,85%
dessas, seguido de 7,35% de educação permanente ou capacitações. Entretanto os
profissionais sinalizaram o desejo de dobrarem essa porcentagem. Sob a consideração desses
dados pode-se perceber quão pouco dispêndio foi relegado à educação permanente. Essa
parca porcentagem demonstra então a falta de investimento nessa área, que é um dos
componentes da formação em saúde. Já na pesquisa de Aciole e Oliveira (2017) os integrantes
da USF compreenderam que o apoio do NASF trouxe novos conhecimentos que vieram a
agregar em suas práticas. Além disso, tais profissionais puderam fundamentar o
matriciamento e explicitar seu enfoque para a EqSF em questões de promoção e prevenção
em saúde, nas ações em relação aos quadros de maior complexidade, condições de
vulnerabilidade e considerando o sistema familiar. Portanto, a educação permanente encontra-
se como um meio de transformar as ações em nível básico de saúde e problematizá-las como
uma maneira de construção conjunta com as equipes da USF. Aliás, o matriciamento seria
uma possibilidade de discussão e revisão de sentidos sobre a saúde mental, abordando
inclusive, a problemática dos transtornos mentais severos e persistentes.
Conforme Lucchese et al. (2009) alguns dos participantes incluindo enfermeiros e
médicos apontaram que o cuidado às pessoas de saúde mental seria ainda mais uma adição
para os seus serviços prestados. A atuação junto às pessoas com comprometimento psíquico
não seria uma das atividades de suas atribuições como integrante da clientela de abrangência
de suas ações. Esse sentido reforça e é reforçado na percepção de que a problemática de saúde
mental seria de incumbência apenas das especialidades. Em virtude disso, muitos
profissionais procuram investir o mínimo possível na saúde mental, articulando-se no sentido
de encaminhar e medicar essas demandas. Essa dificuldade pode estar assinalada, na
afirmação de Oliveira, Ataíde e Silva (2004) de que as demandas de saúde mental por muito
tempo foram apartadas da rede de atenção em saúde. Portanto, o déficit no cuidado em saúde
39

desenvolvido pelo ESF estaria atrelado a um processo historicamente constituído


restritamente de uma atenção médico-psiquiátrica.
Similarmente, na pesquisa de Nunes et al. (2007, p. 2379) sobre PSF e saúde mental,
aponta-se que médicos da equipe de saúde da família têm maior tranquilidade em “[...]
prescrever antidepressivos, mas não ansiolíticos, e muito menos antipsicóticos”. O que as
autoras associam a depressão ser um transtorno mais banalizado para a população, bem como
mais próxima da vida contemporânea, algo que aproxima do sujeito a morbidade tornando-se
mais corrente sua atribuição. Por outro lado o receio em receitar ansiolíticos pode estar ligado
a possibilidade do desenvolvimento de dependência acerca da medicação, assim como, a
dificuldade em lidar com as psicoses em decorrência de uma construção social, para a qual
um dos participantes da pesquisa prefere encaminhar o usuário para o atendimento no CAPS.
Segundo Lucchese et al. (2009) os agentes comunitários de saúde (ACS) trouxeram
concepções relacionadas ao medo e a dificuldades em lidar com a população com transtorno
mental, denotando uma perspectiva leiga e estigmatizante, havendo a necessidade de um
maior preparo teórico-prático. Os ACS entrevistados por Pereira, Barbieri, Paula e Franco
(2007) relacionaram a loucura com a ausência da razão, de limites em relação à sociedade e
que o psicótico em surto deveria permanecer em Hospital Psiquiátrico. Para eles o sujeito com
transtorno mental não poderia ser emancipado e gerir-se, como se o transtorno inviabilizasse o
desenvolvimento humano, minando a possibilidade de crescimento enquanto cidadão e
envolveria bastante sofrimento psíquico. De outra forma, houve a associação da condição de
transtorno mental, tal como a deficiência mental, como se esses sinalizassem a mesma coisa, o
que, de acordo com Pereira et al. (2007), remeteria ao ideário das instituições manicomiais. A
partir dessas construções o ACS se encontra tendo que manejar a sua atuação segundo
Baralhas e Pereira (2010) realizando visitas domiciliares, levando informações e orientações
com a finalidade de serem facilitadores frente à problemática das famílias acompanhadas. Seu
trabalho se configura pelo contato inicial com o usuário, como ponte entre este e a unidade,
facilitando o acesso e o acompanhando à evolução in loco do sujeito, orientando sobre as
morbidades e as campanhas preventivas, a partir da construção do vínculo no território,
anterior a atuação, bem como, reforçada no fazer cotidiano.
Além das funções supracitadas que se acreditam estar a Estratégia de Saúde da Família
incumbida em relação à saúde mental, são apresentadas outras propostas (Souza et al., 2007;
Koga, Furageto, & Santos, 2006). Segundo Souza et al. (2007) cabe à equipe de saúde da
família realizar visitas domiciliares às famílias com entes que tenham transtornos mentais,
como também realizar consultas, encaminhamentos e entrega de medicação. Das funções
40

desempenhadas pela USF pesquisada, são realizados 72,3% encaminhamentos, 47,7%


atendimentos, sendo que desses últimos atendimentos 21% são realizados por um médico na
unidade. Ainda conforme Koga et al. (2006) devem ser realizadas orientações a respeito dos
efeitos das medicações ofertadas o que, de acordo com seu estudo, tem sido pouco tratado
com os usuários das unidades.
Quanto ao cuidado e papel da equipe da saúde da família, a equipe entrevistada por
Machado e Pereira (2013, p. 128) refere que esse cuidado com a clientela de saúde mental
estaria presente “no encontro, no acolhimento, no vínculo e na promoção da autonomia das
pessoas assistidas”. Decorrido o acolhimento, o indivíduo com transtorno mental se
apresentaria mais verdadeiro na aproximação, sendo esse considerado como um sujeito em
sofrimento, estabelecendo uma relação de modo humanizado. Entretanto, mostrou-se
perceptível uma concepção de doença mental pautada em um modelo médico, no qual ele
seria figura central e a forma de tratamento seria impreterivelmente a medicação e
posteriormente a internação realizada em hospital psiquiátrico. Nessa percepção tutelar, a
inclusão/exclusão seria delegada à figura do profissional que não teria cuidado do sujeito que
por sua vez seria inapto no que tange à gestão da sua vida. Ainda vale ressaltar que um dos
entrevistados pelos autores informou que em seu primeiro contato com indivíduos com
transtornos mentais teve medo, mas no decorrer de sua experiência os caracterizou como
crianças de grande estatura, que precisam ser compreendidas.
Como questionamento na visão da equipe de saúde da família entrevistada por
Mendes, Oliveira e Constantino (2011) muitos usuários com transtornos mentais apenas se
direcionariam para a USF para solicitar receitas, sendo que essa equipe reduziria seu trabalho
a essa ação, não enfocando em um trabalho preventivo segundo um dos participantes do
estudo. Esses notam inclusive uma dificuldade em compreender a experiência humana,
tratando-a na maioria das vezes como um transtorno que é rapidamente medicado e
encaminhado. Com essa destinação do usuário, conforme os profissionais há uma falta de
problematização sobre as possíveis ações pertinentes à Estratégia de Saúde da Família, sendo
subentendida sua desreponsabilização a respeito do acompanhamento em parceria com
dispositivo de maior complexidade para o qual o usuário foi encaminhado.
Tais procedimentos precisam então ser cada vez mais ampliados visto a demanda em
saúde mental presente no território de abrangência das USF, como foi apontado por Souza et
al. (2007), em vista de 97% dos participantes da pesquisa afirmarem haver uma clientela que
precisa de atenção em saúde específica para a saúde mental. Como contingente de pessoas que
demandam cuidados em saúde mental em nível básico, podem se destacar indivíduos que
41

apresentam: transtorno de ansiedade generalizada, depressão e agorafobia (Fortes, Villano &


Lopes, 2008). De forma semelhante à pesquisa de Gonçalves e Kapczinski (2008),
desenvolvida também em uma USF, identificaram-se transtornos mentais de humor, de
ansiedade e transtornos de somatização, compondo 38% da população de abrangência da
instituição de atenção básica, com a maior parte dos casos representados por indivíduos do
sexo feminino.
A partir da pesquisa das autoras são notáveis as percepções estereotipadas que
remetem a toda história das pessoas com transtorno mental e facilitam um distanciamento e
exclusão dos cenários comunitários aos quais atualmente eles têm direito reconhecido. Os
próprios profissionais de nível médio e superior reiteram esses pressupostos históricos
anteriores às políticas provenientes das reformas em saúde, seja em não reconhecer esse
público como seu campo de atenção, seja na primazia da dimensão física, estritamente
orgânica do sujeito. Entretanto, deve-se constar a falta de menção e talvez a ausência da
interdisciplinaridade como apoio matricial a essas equipes de saúde da família.
A esse respeito, faz pertinente aventar sobre os sentidos desses profissionais que
também em meio à sociedade desenvolvem seus pressupostos sobre indivíduos com
transtornos mentais severos e persistentes, aos quais deverão oferecer alternativas de cuidado
em saúde. Desta forma, mesmo com uma grande carga de significados negativos
historicamente constituídos sobre a loucura, vale questionar como se relacionam, a formação
em saúde mental (quando ela existe) e a atuação cotidiana acerca dos sentidos dos
profissionais da ESF para com um extrato do público de saúde mental atendido pela equipe de
saúde.
A pesquisa foi realizada no município de Poços de Caldas e pode ser contextualizada a
partir da Atenção Básica em Saúde e dos mecanismos em saúde para atendimento
especializado em saúde mental. A Atenção Básica conta, conforme o Plano Municipal de
Saúde, com:

35 Unidades Básica de Saúde, com Estratégia de Saúde da Família, sendo 27 na área urbana e
6 na área rural, com 33 Equipes de Saúde da Família cadastradas, 10 equipes de Saúde Bucal e 03
Equipes de Núcleo Apoio a Saúde da Família/NASF; 02 Unidades Básica de Saúde (UBS)
convencionais; 01 Equipe de Consultório na Rua; 01 Programa Materno Infantil; Saúde bucal: 01
Consultório Odontológico na Policlínica Central, 01 Consultório Odontológico no Centro Vila Unidas,
01 Consultório Odontológico no Centro de Referência DST/AIDS,03 Consultórios Odontológicos na
Zona Rural, 03 Consultórios Odontológicos na Regional Sul, 11 Consultórios Odontológicos nas UBS:
São José, Esperança I, Esperança II, Parque Pinheiros, Itamaraty, Country Club, Santa Rosália,
Kennedy I, Kennedy II, Quisisana e Santa Augusta; 03 consultórios odontológicos na Regional Leste.
(Poços de Caldas, 2018a, p.10)
42

Já na atenção especializada, segundo Poços de Caldas (2018a), existem três núcleos de


especialidades com Policlínica, um hospital, o Hospital Margarita Morales, e o Hospital da
Zona Leste que oferece atendimento a adultos, tem enfoque na atenção à mulher e à criança.
Essa atenção ainda conta com um Centro de Especialidades Odontológicas, serviços de saúde
mental como o CAPS II e CAPS Ad (Centro de Atenção Psicossocial de Álcool e outras
drogas). Os dispositivos da Rede de Urgência e Emergência são: a Unidade de Pronto
Atendimento; o pronto atendimento no Hospital Margarita Morales, o Serviço de
Atendimento Móvel de Urgência e um serviço de Atenção Domiciliar. Há um laboratório
municipal, assistência farmacêutica, um Centro de Referência em Saúde do Trabalhador, um
Centro de Referência em DST/AIDS e hepatites virais, Serviço de Vigilância Sanitária,
Vigilância Epidemiológica, Vigilância Ambiental, um Centro de Controle de Zoonoses e
Serviços de Fisioterapia.
Quanto à rede privada que presta serviço por intermédio do SUS estão: o Hospital Santa Casa
de Poços de Caldas; Hospital Santa Lúcia; APAE; a Comunidade Terapêutica Santa Clara; a instituição
APHAS; dois laboratórios de prótese dentária; a FUNGOTAC que realiza contratos para realização de
exames de apoio diagnóstico com oito laboratórios; cinco de fisioterapia, assim como, da AACD,
ADEFIPE, HEMOCENTRO e CISMARPA (Poços de Caldas, 2018a, p.10).

Vale ressaltar que uma das equipes é destinada à atuação nas seis USFs rurais e as
demais atuam no perímetro urbano e são matriciadas pelo NASF, o qual realiza o
matriciamento com frequência mensal em cada unidade. Já os serviços especializados para
atenção em saúde mental são um Centro de Atenção Psicossocial (CAPS II) e um Centro de
Atenção Psicossocial de Álcool e outras drogas (CAPS AD) que são localizados em região
central, bem como leitos para a Atenção Integral em Saúde Mental em um hospital geral
denominado Hospital Santa Lúcia (Poços de Caldas, 2013).
Salienta-se que a Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo e da
Floresta foi desenvolvida para assegurar os direitos da população rural, tendo em vista as suas
especificidades territoriais (Brasil, 2013). Tal política ainda reforça a universalidade do SUS,
por intermédio de atividades de integralidade em saúde em defesa desses direitos já apontados
pela Constituição Federal, porém são reafirmados pela política especificamente para a
população rural. Conforme Brasil (2013, p. 9) “a realidade rural brasileira é resultado de sua
história econômica, política e cultural fundada na concentração de terra, de riqueza, uso dos
recursos naturais, escravidão, extermínio de povos indígenas, marginalização de famílias e
mulheres camponesas(...)”. O contexto rural é composto por uma pluralidade de raças, povos,
construções culturais, religiões, modos de produção e tecnologias e diferenças
socioeconômicas. A falta de recursos para a manutenção da subsistência está atrelada a alguns
43

fatores, como: desemprego; residência em condições sanitárias inadequadas; alimentação que


não supre as necessidades dos moradores; ausência de sistema de esgoto adequado;
dificuldade de acesso aos dispositivos de saúde, educação; e a pequena participação dos
usuários em relação ao controle social nas políticas públicas. Devido às condições adversas,
essa população está sujeita a morbidades, tais como: “diarreia, vômito e com dores nos braços
ou nas mãos” (Brasil, 2013, p. 14)
Para o cuidado da saúde da população rural foi criada a Portaria n 2.866, de 2 de
dezembro de 2011. Ela objetiva desenvolver ações considerando a universalidade em saúde,
“visando ao acesso aos serviços de saúde, à redução de riscos e agravos à saúde decorrente
dos processos de trabalho e das tecnologias agrícolas e à melhoria dos indicadores de saúde e
da qualidade de vida” (Brasil, 2011). A portaria inclusive distingue a agricultura camponesa
da agricultura familiar. A agricultura camponesa caracteriza-se por levar em consideração as
constituições sociais e culturais dos agrupamentos, por intermédio de sua interação com a
natureza. Já a agricultura familiar é delimitada pela extensão territorial até quatro módulos
fiscais, o trabalho é realizado apenas pelos integrantes da família e sua renda primordialmente
é derivada e administrada por tal grupo familiar. Diante dessa população vale destacar o Eixo
3 que dispõe sobre a educação permanente e a popular por seu enfoque na saúde. O eixo
ressalta a relevância do tema da saúde no campo e no contexto da floresta na educação
permanente de EqSF e no SUS de modo geral. Seria então, uma educação que fortaleça a
participação social das lideranças comunitárias dos territórios rurais.
Tal contexto rural conta com diversidades, sendo sujeito à devastação florestal,
redução da fauna e flora, erosões, relações de trabalho precárias e constantes êxodos rurais
(Costa Neto & Dimenstein, 2017). Essa população ainda estaria submetida à estigmatização,
condição de marginalização, que podem afetar a saúde mental do indivíduo e
consequentemente repercutir em sua perspectiva de vida, assim como, o seu fechamento em
relação à sociedade. E nesse aspecto a violência e a ocorrência de abusos podem incorrer em
uso de drogas. Loureiro, Costa e Santana (2016) ressaltam um estereótipo sobre os transtornos
mentais na população rural, algo que dificulta o desenvolvimento do tratamento, percepção
também associada à construção social e pode ser vista como o seu modo de lidar com o
sofrimento, a partir de rezas, do aconselhamento, por meio dos quais o próprio coletivo
procura resolutividade para sua problemática (Silva, Dimenstein & Leite, 2013). Esse
ambiente também se caracteriza pela dificuldade de acesso à educação, favorecendo baixos
graus de escolaridade, o que limita mais as possibilidades de inserção social dos moradores de
regiões rurais, assim como, a disponibilidade de serviços nessas localidades, como serviços de
44

saúde fixos ou móveis e, na ausência desses, essa população precisa se deslocar para a região
urbana, como é observado em pesquisas (Dimenstein et al, 2016; Silva et al., 2016; Torquato
et al., 2016).
A USF da zona urbana está localizada na região leste da cidade e é responsável por
quatro bairros. A população total atendida são 2701 pessoas, contabilizando 912 famílias,
desses 27 são pessoas com transtornos mentais, 15 usuárias de drogas, 27 alcoolistas. Em
relação à situação socioeconômica, vale mencionar que 242 das famílias adstritas são
beneficiárias do Programa Bolsa Família. Há uma grande quantidade de adolescentes, com
baixo número de equipamentos sociais de cultura e lazer. Dentre os bairros encontram-se:
Itamaraty III - onde está sediada a unidade -, Itamaraty V, Chácara Poços de Caldas, e Morada
dos Pássaros.
No bairro Chácara Poços de Caldas, encontra-se a Escola Municipal de ensino
fundamental Dona Vicentina Massa. O Centro de Esportes e Artes Unificado (CEU), com
atividades de cultura, esporte e lazer e o CRAS localizam-se no bairro Itamaraty V. No
Itamaraty III, está sendo construído um Centro de Educação Infantil e tanto nesse bairro
quanto no Itamaraty V a população tem condições financeiras mais fragilizadas, considerando
que são os bairros mais novos da cidade, nos quais há condomínios também novos de
programas governamentais de moradias.
E são os condomínios que comportam a maior parte da população, nos quais residem
aproximadamente cerca de quatro filhos por família e seria onde haveria maior problemática
de consumo de substâncias psicoativas. Já em relação à população em geral, exceto os
condomínios desses dois bairros, pode-se considerar que seria um contingente de pessoas
mais jovens, com até dois filhos por casal jovem. A Morada dos Pássaros conta com muitas
chácaras e não aparece tanto a problemática do uso de drogas. Quanto à empregabilidade
haveria poucas possibilidades de trabalho no território, sendo que boa parte da população se
destinaria para a região central para trabalhar. Das possibilidades de trabalho na região
existem apenas uma fábrica de papel e outra de plástico.
A zona rural é dividida em seis microáreas, sendo essas fazendas: Córrego Dantas,
Lambari, Aparecida, Aleixo, Boa Vista e Souza Lima. Foi destacado pelo enfermeiro que a
Fazenda Souza Lima é o território com condições socioeconômicas mais frágeis, porém a
mesma fazenda e a Boa Vista são as fazendas com maior geração de empregos. Como
atividade trabalhista que provê o sustento em todas as fazendas, destaca-se o cultivo de café,
sendo em proporção menor a pecuária a qual é mais expressiva nas fazendas Souza Lima, Boa
Vista e Aleixo. A fazenda com melhores condições de subsistência é a Córrego D’Antas que é
45

marcada pela presença de uma população formada no processo imigratório italiano, que são
pequenos produtores rurais com atividades ligadas ao café. No mesmo espaço territorial,
encontra-se a empresa Frigonossa, que trabalha com o abate e comercialização de carnes e
emprega os moradores dessa fazenda. No mesmo local, existem casas de aluguel e pessoas
que se aposentaram e vieram da zona urbana para a rural e, vale ressaltar, que é a microárea
mais próxima da zona urbana se comparada às demais é a que mais apresenta pessoas
trabalhando na zona urbana.
Conforme o Plano de Ação em Saúde da Zona Rural de 2018, a população da zona
rural é distribuída de acordo com as famílias atendidas pela unidade, sendo: 129 na Córrego
D’Antas, 131 na Lambari, 102 na Aparecida, 40 na Aleixo, 9 na Boa Vista e 153 na Souza
Lima. Seu representativo em relação às pessoas é: 388 para Córrego D’Antas, 422 para
Lambari, 313 para Aparecida, 136 na Aleixo, 338 na Boa Vista e 476 na fazenda Souza Lima
(Poços de Caldas, 2018b).
Como demanda das famílias atendidas, é sinalizada a solicitação de um médico na
unidade da Fazenda Aparecida e Aleixo ao menos uma vez por semana, o que não é
considerado viável, visto que são as que têm o menor número de utentes, bem como a
quantidade de atendimentos não justifica a alocação de um médico. Assim, quando os
moradores das fazendas Aparecida e Aleixo apresentam uma demanda em saúde, estes
precisam se deslocar para uma das outras USF rurais que contam com a presença de um
médico. Quando ocorrem encaminhamentos, esses são enviados por terceiros ou motoristas
para que o paciente possa fazer um atendimento com especialistas ou exame, exceto os casos
em que o usuário tenha transporte próprio e possa fazer o agendamento na zona urbana. Os
automóveis estão disponíveis para o deslocamento da equipe duas vezes semanais para as
unidades, mas não para as fazendas Aleixo e Aparecida, que tem os veículos disponíveis
apenas uma vez durante a semana.
É notória também a dificuldade de comunicação telefônica, pois as unidades não
contam com telefone funcionando, menos a Fazenda Boa Vista. Nas demais fazendas, em
casos de agendamentos e de urgência, a equipe precisa utilizar seus próprios celulares e
referem que ao tentarem contatar o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) suas
ligações são atendidas em outra cidade. E quando foram disponibilizados celulares
corporativos para a EqSF, a operadora “Oi” não captava sinal nas zonas rurais, assim, eles
foram devolvidos para a Secretaria Municipal de Saúde, perpetuando uma condição de
precariedade do serviço.
46

Em relação ao NASF, seu funcionamento, ainda que incipiente no município, data do


ano de 2008 conforme a Portaria Nº 1.616, de 6 de agosto de 2008, que passou a receber
incentivo do Governo Federal (Brasil, 2008). Nesse período o município ainda contava com
apenas uma equipe do NASF para apoio matricial, que tinha que oferecer apoio a todas as
Equipes de Saúde da Família, sendo menor a abrangência de suas ações. A partir disso, foram
formadas mais duas equipes, que se dividem por regiões e vale mencionar que a atuação dos
profissionais observados ocorreu com a equipe do NASF da zona leste. E é sob esse contexto
que esta pesquisa se desenvolve.
Portanto, este estudo buscou como as outras pesquisas apontaram a atuação de
profissionais tais como, de agentes comunitários de saúde, enfermeiros e médicos em relação
às pessoas com transtornos mentais. Distintamente de outros estudos que abordam alguns
elementos do sentido da atuação da EqSF, ou o manejo, ou até a formação, esta pesquisa
buscou abordar todos esses três aspectos. Além disso, relacionar-se-á os sentido e a atuação
com a educação permanente, principalmente com o apoio matricial. O apoio das equipes será
entendido a partir da realidade do município considerando os dispositivos disponíveis para
cada USF, sua periodicidade de atuação junto a elas e sua articulação. Dessa forma, tais
fatores serão considerados e discutidos no que tange ao trabalho desenvolvido.
47

3 METODOLOGIA

Como tal estudo teve o objetivo de conhecer o trabalho das equipes de saúde que
trabalharam com pessoas diagnosticadas com transtorno mental, tendo como base o apoio
matricial do NASF e CAPS, assim como, as interações com essas equipes foram realizados
acompanhamentos e observações para um maior contato com a problemática. A partir dessa
aproximação com o campo de estudo, a pesquisa foi delineada, assumindo um enfoque
qualitativo, por tratar de discutir uma problemática a partir da concepção dos indivíduos
envolvidos (Sampieri, Collado, & Lucio, 2013). Dessa forma pretendeu-se identificar e
interpretar esse saber presente nas experiências dos participantes narradas para o pesquisador,
sob a perspectiva de poucos participantes. O estudo também é de cunho descritivo, pois
buscaram-se descrever fenômenos, da maneira como ocorreram e apareceram.
Trata-se de uma pesquisa de campo, pois segundo Marconi e Lakatos (2004), almejou-
se encontrar resposta a uma questão e procurou, por meio da observação de fatos e
fenômenos, apreender o modo como esses se mostraram. Diante disso, foram realizadas
seções de observação participante e entrevistas semiestruturadas, concebidas como encontros
entre pessoas, para que o pesquisador obtivesse dados sobre o assunto preterido por
intermédio de um diálogo com atenção aos objetivos da pesquisa.
Enquanto pesquisa qualitativa, sua análise considerará algumas etapas como,
compilação, decomposição, recomposição, interpretação e conclusão (Yin, 2016). A
compilação objetiva construir uma base de informações e diz respeito a uma sistematização
dos dados. Na decomposição os dados são divididos em fragmentos, ou informações mais
concisas, as quais podem receber uma classificação. Nessa etapa são usadas codificações ou
conjuntos de dados para ordenar os fragmentos e vale salientar que a decomposição pode ser
repetida várias vezes no processo de análise. Já na recomposição as informações são
reorganizadas e podem ser representadas graficamente, ou por lista e elencar hierarquias. Para
evitar o viés do pesquisador, ele precisa estabelecer comparações frequentemente, considerar
as situações negativas (incongruências) e realizar o pensamento rival (questionamento crítico
vislumbrando outras possibilidades). Na etapa de interpretação, já devem ter sido formados
arranjos como um modo de recomposição dos dados, interpretação que também possa ser feita
por terceiros de outra forma. Essa quarta etapa será a possibilidade de atribuir significado aos
achados. São atributos da interpretação: a completude que contempla um processo; a justeza
questionando se terceiros encontrariam o mesmo dado; a precisão empírica sob a crítica
acerca da representatividade e coerência da interpretação; o valor agregado, considerando o
48

que o conteúdo interpretado acrescentou no âmbito científico; e a credibilidade que teria em


vista a percepção sobre o outro acerca do interpretar. Na conclusão é de suma relevância ter
uma interpretação consistente, mesmo que preliminar. A conclusão é uma forma de
declaração ampliada em que destacam os resultados de uma pesquisa, nesse ato é aglutinado o
sentido que compreende o estudo de modo mais pleno. A partir dessa conclusão novos
estudos podem ser apontados, fazerem generalizações com estudos anteriores, bem como
sendo construídos novos conceitos e teorias, ou expor um outro aspecto de uma pesquisa,
realizar previsões ou generalizações.

3.1 Participantes

Os participantes desta pesquisa foram profissionais de duas Unidades de Saúde da


Família (USF), sendo uma da zona urbana e outra da zona rural do município de Poços de
Caldas, as quais foram selecionadas entre todas as unidades do município. Salienta-se que
todos são efetivos na Secretaria Municipal de Saúde de Poços de Caldas por intermédio de
concurso público.
A partir dos dados das equipes distribuídas no município, esta pesquisa selecionou 8
participantes, sendo um médico, um enfermeiro e dois agentes comunitários de saúde (ACS),
provenientes de uma USF urbana e um médico, um enfermeiro e dois ACS de uma USF rural.
Essa proposta de selecionar unidades em espaço geográfico diferentes, visou ampliar a
percepção acerca desse fenômeno, com a diversidade social e multifatorial, nas quais os
profissionais estão imersos. As escolhas das equipes foram feitas por intermédio da agenda de
matriciamento do NASF e do CAPS II, tendo como prioridade escolher as unidades que
seriam as primeiras nas quais as equipes matriciais realizariam o apoio matricial. Esse critério
visou ser possível acompanhar o máximo de reuniões nas USF e otimizar o tempo, visto o
período do mestrado. Já no que concerne ao critério de exclusão, foram privilegiados
profissionais que trabalham há mais tempo nas unidades selecionadas. Já as USF rurais (seis)
são cobertas apenas por uma equipe, sendo assim, essa foi a única escolhida, porém foi
arguida conforme suas experiências em uma unidade que tenha maior problemática de
transtornos mentais severos e persistentes. O critério de exclusão foi o das USF que seriam as
últimas a terem o matriciamento, assim como os profissionais se recusassem a participar das
entrevistas.
Em relação à análise desses dois contextos, o estudo foi realizado mediante uma
amostragem por contraste, uma vez que o objetivo, segundo Poupart, Deslauriers, Mayer e
49

Groulx (2014), é viabilizar uma comparação, bem como apresentar uma totalidade diversa.
Em conseguinte, não se vislumbra uma quantidade numérica altamente representativa dos
participantes, mas de ter alguns representantes de diferentes grupos. Desse modo, são os
elementos que distinguem esses grupos e reiteram a relevância da “descrição proposta para
cada grupo.” (Poupart et al., 2014, p. 200).

3.2 Instrumentos

Nesta pesquisa foram realizadas entrevistas semiestruturadas entendidas a partir de


Triviños (1987), como questionamentos sustentados em conhecimentos prévios sobre o
fenômeno, que fornecem subsídio às interrogações que emergiram conforme os feedbacks dos
entrevistados, sob o foco fundamental do estudo. Conforme Minayo (2007) elas agrupam
interrogações fechadas e abertas, nas quais os sujeitos podem falar a respeito da temática sem
se ater inexoravelmente às questões formuladas. Portanto, foram feitas perguntas sobre os
sentidos que os participantes produziram sobre as pessoas com transtornos mentais severos e
persistentes que frequentaram o serviço. Tais perguntas compuseram as entrevistas, que foram
gravadas e transcritas em meio eletrônico, sendo que tais arquivos de áudio e texto somente
serão apagados após cinco anos, para assegurar a confidencialidade e identidade das
informações e dos participantes.
Devido à realização desses acompanhamentos nesses espaços, nos quais os
participantes constroem sua educação permanente, além de contextos de educação formal, a
inserção do pesquisador consistiu em uma observação participante. Observação essa,
contemplada como “[...] um processo pelo qual um pesquisador se coloca como observador de
uma situação social, com a finalidade de realizar uma investigação científica.” (Minayo, 2007,
p. 70). Nesse caso o pesquisador posicionou-se em uma relação direta com os sujeitos da
pesquisa, no local onde esses se encontravam, sob o escopo de coletar informações e
compreender o cenário das relações desses atores sociais. Diante de tais condições, o
observador constituiu o contexto que se propôs a observar e alterar.
Além de entrevistas foram realizadas observações participantes em reuniões de
matriciamento, que foram realizadas com as USF’s, sendo reuniões com o CAPS II a cada três
meses e com o NASF mensalmente, bem como das reuniões das Equipes de Saúde da Família
(EqSF) mensalmente. O pesquisador participou de algumas reuniões, sendo elas com uma
USF urbana e com a USF rural, nas quais se compõem o acompanhamento de ambas as
equipes (da USF, CAPS II e NASF). A ausência do matriciamento do NASF na zona rural foi
50

justificada pelos profissionais devido à pequena demanda em relação à zona urbana, segundo
o enfermeiro da USF Rural, que ainda relata que já aconteceu um trabalho realizado pela
fisioterapeuta na unidade, mas devido a frequência ser uma vez por mês, não havendo uma
constância maior, essa atividade foi suspensa, pois não supria a necessidade dos usuários.
O acompanhamento dessas reuniões gerou observações, que foram registradas em
diário de campo. O diário de campo foi escolhido enquanto instrumento de registro para
ampliar a compreensão sobre a percepção desses profissionais, como um meio para se ter
acesso a mais elementos da educação permanente dos participantes, de sua formação, por
intermédio da observação e do registro. Nesse aspecto, o diário de campo possibilitou o “[...]
registro dos movimentos, das leituras, dos tempos, espaços e das observações que ocorrem
[...]”, foi então, uma forma de demarcar o contexto no qual os fenômenos se desvelaram ao
olhar do pesquisador/observador, o que viabilizou reflexões durante o estudo. (Oliveira, 2014,
p. 71). Além disso, esse instrumento, segundo Lima, Mioto e Prá (2007), é caracterizado por
ser descritivo e reflexivo, pois inclui a possibilidade de se revisitar os fenômenos via memória
transcrita. Assim, por meio do diário, o pesquisador narrou a experiência desses profissionais
e a partir desse momento o diário de campo foi um “[...] retrato de todo o processo do
desenvolvimento [...]” da pesquisa. (Lima et al., 2007, p. 101).
Esse recurso então também viabilizou a construção de interpretações das informações
obtidas, assim como reflexões acerca dos dados colhidos, procedimentos que estariam em
segundo plano no manuseio do diário de campo (Lima et al., 2007). Segundo Afonso, Silva,
Pontes e Keller (2015), na reflexão buscaram-se apresentar conteúdos sobre o que foi
encontrado em campo, as temáticas evocadas na experiência, os padrões que permearam as
relações, reflexões sobre a aplicabilidade do método e os problemas que o estudo demonstrou.
O diário ainda ampliou a percepção sobre a pesquisa por intermédio da sistematização e o
estabelecimento de comparações entre modos de expressão da experiência que se divergem,
lançando luz e desmistificando os fenômenos observados. Nesse aspecto o delineamento na
análise, as relações entre pesquisador e pesquisado, bem como a interpretação dos relatos
presentes no diário são de suma relevância em estudos que utilizam a observação participante.
Em virtude dos objetivos delineados, aventou-se conhecer a formação dos
participantes para o desenvolvimento de suas concepções sobre a clientela de saúde mental,
incluindo sua formação original e a formação continuada. Para tanto, realizaram-se as
entrevistas e a observação participante como uma triangulação metodológica para obter uma
maior quantidade de dados sob mais de um ponto de vista. Segundo Flick (2009) a
triangulação acontece quando apenas uma abordagem metodológica é insuficiente, sendo
51

assim, mais de uma pode se articular para expandir o desenho da pesquisa. Além disso, o
autor exemplifica o uso de entrevistas e observação participante como uma forma de
triangulação. Desse modo, esse exercício de triangulação metodológica visou ampliar a
compreensão sobre o fenômeno estudado, em contextos diversos, nas entrevistas individuais
com os participantes e nas reuniões em equipe e de matriciamento, oferecendo vários olhares,
assim como, dados para comparação.

3.3 Procedimento de Coleta de Dados

A instituição e os participantes foram contatados para a anuência da pesquisa e


realização em suas dependências e foram apresentados os objetivos para sua adesão. A partir
da aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo Seres Humanos da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais, número do Parecer 2.485.822, o pesquisador realizou
as entrevistas com os participantes, cuja gravação foi feita em áudio em dispositivo móvel,
quando tiverem a anuência para o procedimento. Foram utilizadas perguntas previamente
formuladas nas quais constaram os elementos presentes no cuidado aos usuários com
transtorno mental, como os participantes perceberam sua atuação com esse contingente e a
sua formação em saúde mental. Ao término das entrevistas, os áudios foram transcritos em
um arquivo de texto para melhor acesso aos discursos, assim como, após as reuniões nas
unidades, essas foram transcritas em diário de campo pelo pesquisador.
Houve elementos dificultadores muito presentes, tais como a falta de transporte
disponível e as constantes alterações no cronograma de matriciamento e reuniões de equipes.
Quanto ao impacto da dificuldade de transporte, é importante acentuar que a zona rural é
composta por fazendas que são afastadas da zona urbana e não se localizam próximas a
rodovias. Assim, essa população conta com poucas possibilidades de mobilidade. O transporte
coletivo da cidade adotado (empresa Circullare) tem pouca disponibilidade para atender a essa
população. Seus horários de circulação são à tarde nas quartas-feiras e nos sábados e aos
domingos. Desse modo a mobilidade dos moradores da zona rural é bem restrita, dependendo
de transportes pessoais ou da colaboração de seus empregadores. Esses dias de transporte
coletivos eram dissonantes do período de trabalho das equipes da unidade. Em ambas as
unidades, as reuniões tanto de matriciamento como as reuniões de equipe tiveram suas datas
alteradas, seja devido a campanhas de vacinação, como em virtude da ausência de
combustível no período da greve dos caminhoneiros. Diante disso, muitas reuniões não
52

puderam ser observadas, além disso, o carro do CAPS II utilizado para o matriciamento foi
apreendido pela falta de pagamento de multas, outro fator que culminou na falta de
matriciamento desde outubro, havendo perspectiva de retorno apenas no ano de 2019, o qual
já apresenta cronograma.
Quanto à coleta de dados, haviam sido planejadas quatro entrevistas com um médico,
um enfermeiro e dois ACS de cada unidade, da zona urbana e da rural, que foram todas
desenvolvidas conforme esquematizado. As observações em reuniões foram planejadas da
seguinte forma: seriam realizadas observações em duas reuniões de equipe da USF Urbana, e
em duas reuniões tanto do NASF, quanto do CAPS II na mesma unidade; seriam
acompanhadas duas reuniões de equipe da USF Rural e duas com o CAPS II nessa unidade.
Entretanto, devido às intercorrências anteriormente mencionadas, apenas foram possíveis as
observações de: duas reuniões da EqSF Urbana, duas com o NASF e uma com o CAPS II na
referida instituição de saúde; já na USF Rural apenas foi observada uma reunião com a
mesma equipe desse serviço de saúde.
Os entraves que inviabilizaram o desenvolvimento de algumas das propostas foram as
mudanças constantes do cronograma das reuniões de matriciamento e de equipe, a dificuldade
de mobilidade para a zona rural e a falta de automóvel para o deslocamento da equipe do
CAPS II para uma reunião de matriciamento. Em relação às reuniões de matriciamento e de
equipe na região rural, os fatores que se antepuseram foram as mudanças constantes de
cronograma para a realização de campanhas, a ausência de combustível para o deslocamento e
a superlotação no automóvel da equipe, somado à ausência de transporte público o que
dificultou a presença do pesquisador na unidade. Já no que diz respeito à equipe urbana,
apenas não foi possível observar uma reunião de matriciamento com o CAPS II, pelo mesmo
motivo da região rural, em virtude dos profissionais do CAPS não disporem de veículo há
alguns meses, devido ao não pagamento de multas. Entretanto, assim como, houve mudanças
constantes de cronograma na zona rural, além da gestora da USF Urbana também reagendar
um dos matriciamentos com o CAPS e dessa forma esse serviço apenas iria realizar o apoio
matricial a partir do ano de 2019.

3.4 Procedimento de Análise de Dados

Após a transcrição das entrevistas dos participantes sobre a temática da atuação acerca
das pessoas com transtorno mental, foi realizada uma análise de dados conforme as técnicas
da Análise de Conteúdo. Inicialmente foi feita uma pré-análise que, segundo Franco (2005),
53

refere-se à própria organização como um primeiro contato com o material, tendo o objetivo de
sistematizar alguns pontos fundamentais para o desenvolvimento de um plano de análise.
Na pré-análise foi feita a leitura flutuante do material, formulação de hipóteses,
referência aos índices e elaboração de indicadores (Franco, 2005). A leitura flutuante foi o
primeiro contato com as narrativas transcritas para conhecer as mensagens e todos os sentidos
elencados nelas. Em seguida, foram escolhidos trechos que eram mais expressivos dentre a
imensidão das narrativas e que foram ao encontro do problema levantado pela pesquisa. Após
essa etapa, aconteceu a formulação de hipóteses, que disseram respeito às afirmações prévias,
que buscaram identificar a partir dos procedimentos de análise. São ideias elaboradas por
meio de um arcabouço teórico que sustenta o estudo e apareceu nos resultados. Entretanto, tal
ideário foi colocado em suspenso até ser confrontado com os dados empíricos coletados.
Como último passo da pré-análise, realizou-se a referência aos índices e a elaboração de
indicadores. O índice referiu-se ao tema presente na mensagem e o indicador à frequência que
esse tema apareceu. Concluída a seleção dos índices, passou-se à elaboração de indicadores
que puderam ser validados quando relacionados a trechos de textos das entrevistas.
Na pré-análise foi realizada uma primeira leitura das entrevistas, sendo selecionados
relatos que se referissem mais à problemática pesquisada. Em seguida, empreendeu-se o
trabalho de elaboração de hipóteses que foram de encontro às afirmações previamente
desenvolvidas a partir da bibliografia da área, que foi contrastado com as informações
identificadas pela pesquisa. E as mensagens extraídas desses trechos tiveram sua pertinência
comparada na frequência em que apareceram nas entrevistas, sendo elaborados indicadores.
Quanto à pré-análise do diário de campo das reuniões, ela também passou por uma
leitura flutuante, por meio da qual foram encontrados os trechos com maior expressividade
em relação ao tema do estudo, que se articularam com a pré-análise das entrevistas (Franco,
2005). Da mesma maneira, foi realizada uma construção de hipóteses baseada na literatura,
corroborando-a em certos pontos, bem como apontando outras possibilidades. Por fim, foram
desenvolvidos indicadores.
A próxima fase da análise de conteúdo, de acordo com Franco (2005), foi a construção
de categorias para a análise. Essa categorização consistiu em um processo de classificação de
dados que compôs uma unidade a partir de uma distinção dos sentidos mais expressivos e um
posterior reagrupamento mediante alguns pressupostos. Essas categorias não foram
elaboradas a priori, surgiram das narrativas, demandando um retorno contínuo ao material.
A construção de categorias das entrevistas para a análise foi pautada na classificação
das informações dessas entrevistas formando uma unidade de sentido, sendo diferenciados os
54

sentidos que condisseram com o problema de pesquisa, os quais, em seguida, foram


agrupados. No que tange às reuniões, essas também tiveram suas categorias construídas por
meio da classificação dos dados constituindo unidades que remeteram à problemática que se
pretendeu estudar, ou seja, o trabalho dos participantes com pessoas com transtorno mental
severo e persistente, bem como sua educação permanente para lidar com esse contingente,
tendo como base o apoio matricial.
Compondo a terceira e última fase desse procedimento, desenvolveu-se um tratamento
dos resultados no que concerne à inferência e interpretação das informações para análise. Na
inferência, conforme Franco (2005), o pesquisador prosseguiu da categorização dos conteúdos
manipulados para inferir, extrapolando o já dito nas narrativas, assim ela é um procedimento
que intermedeia a descrição e a interpretação e possibilita uma comparação, procedimentos
esses que foram realizados na última etapa da análise dos dados.
O tratamento dos resultados provenientes das entrevistas e das reuniões passou pela
inferência e interpretação, tendo a categorização dos conteúdos extrapolada para além do dito
nos relatos. Eles foram então, relacionados e comparados, tanto entre si, como com a
literatura. Essa comparação de dados da própria pesquisa terá como intuito triangular as
informações, observando a fidedignidade e a ampliação das perspectivas a partir de mais de
uma fonte. Já a comparação com a bibliografia visou a agregar outras percepções à pesquisa e
identificar em quais pontos ela avançou e outros, nos quais foi percebida a necessidade de
novos estudos.

3.5 Devolutiva

Concluída a pesquisa, será negociada uma devolutiva das informações produzidas,


após a defesa da dissertação, para as EqSF da Secretaria Municipal de Saúde do município de
Poços de Caldas.
55

4 RESULTADOS

Os resultados são compostos pelas informações coletadas em campo das reuniões de


equipe, com o NASF e com o CAPS, tendo como base os objetivos da pesquisa. A partir de
tais dados, foram encontrados pontos de convergência e divergência entre as duas equipes e
dentro de cada equipe considerando os diferentes contextos, formação, sentidos e interesses.
Tais experiências de contato com a problemática da pesquisa serão apresentadas da seguinte
forma: as reuniões acompanhadas na USF urbana, uma reunião observada na USF rural e as
entrevistas seguidas de análise e síntese da categoria. Salienta-se que as reuniões e as
entrevistas serão dialogadas com a literatura da área. E, para maior contextualização,
apresenta-se a seguir um quadro (Quadro 1), com uma breve descrição dos participantes que
foram entrevistados e estavam lotados nas USF urbana e rural da Secretaria Municipal de
Saúde de Poços de Caldas.

Quadro 1- Descrição dos participantes entrevistados das USF Urbana e USF Rural

Unidade Participantes Abreviações Idade Estado Número Escolaridade Tempo


civil de filhos em anos
de
serviço
em USF
USF Enfermeira E1 34 Casada - Mestrado 10
Urbana completo
USF Enfermeiro E2 27 Casado - Pós-Graduação 2
Rural completa
USF Médica M1 27 Solteira 1 Graduação 3
Urbana completa
USF Médico M2 33 Solteiro - Pós-Graduação 5
Rural completa
USF Agente ACS1 42 Casada 4 Ensino Médio 12
Urbana Comunitária de Completo
Saúde 1
USF Agente ACS2 41 Solteira 2 Ensino Médio 4
Urbana Comunitária de Completo
Saúde 2
USF Agente ACS3 35 Solteira 1 Ensino Médio
Rural Comunitária de Completo 6
Saúde 3
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USF Agente ACS4 58 Casada 1 Ensino Médio 25


Rural Comunitária de Completo
Saúde 4
Fonte: Dados da pesquisa

Durante as cinco reuniões observadas na USF Urbana, sendo duas com NASF, uma
com o CAPS II e uma da equipe, apenas os matriciamentos realizados pelo NASF e pelo
CAPS II continham conteúdos alusivos às pessoas com transtornos mentais severos e
persistentes. Nessas reuniões, surgiram discussões que envolviam tanto transtornos mentais,
como uso nocivo e dependência de substâncias psicoativas, sendo realizadas propostas de
atendimento e educação permanente. Na única reunião com a equipe da USF Rural também
foram identificados informações sobre pessoas com transtornos mentais severos e
persistentes.
Na primeira reunião, foi proposta pelo psicólogo da NASF a implantação de uma horta
comunitária nas dependências da unidade, o que foi avaliado como uma possibilidade de
manter uma rotina para alguns usuários do território, como por exemplo, pessoas
diagnosticadas com esquizofrenia. A possibilidade do desenvolvimento de uma horta
comunitária viabiliza um outro olhar para a clientela, uma vez que aproxima esses pacientes
da comunidade geral, visto que toda a comunidade teria acesso à horta e os usuários teriam
um contato maior com a comunidade como um meio de socialização. A horta inclusive se
tornaria um aporte a condições socioeconômicas mais frágeis dos usuários, como uma forma
de alimento, bem como desempenharia um importante papel terapêutico. Na pesquisa de Dias
(2011), há um relato da existência de uma horta como meio de geração de renda e
possibilidade de favorecer a uma condição ativa do sujeito na sociedade através da produção
pelo trabalho. Cardoso (2002) levantou a demanda de organizar uma horta comunitária, que
resgatava a história dos usuários, em virtude de muitos terem a zona rural como seu âmbito
laboral, agregando uma função terapêutica e o oferecimento de acesso a uma alimentação
mais nutritiva para a sobrevivência dos usuários.
Na mesma reunião, a nutricionista do NASF arguiu a equipe sobre qual temática
gostariam de abordar para uma educação permanente e a equipe permaneceu em silêncio, não
havendo sugestões. A fisioterapeuta sugeriu tratar de acidente vascular cerebral (AVC),
ansiedade e depressão. As equipes ainda discutiram seis casos envolvendo AVC, síndrome do
pânico, uso de substâncias psicoativas associadas a transtorno mental e usuários que
apresentavam alucinações e delírios. Os casos eram trazidos para discussão inicialmente pela
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técnica em enfermagem e era solicitado aos ACS, responsáveis pelo território de cada família
abordada, que expusessem o contexto e a atual realidade dos pacientes. Em todos os casos, os
transtornos mentais apareceram, inclusive no do usuário que sofrera AVC, que era cuidado
por uma pessoa com síndrome do pânico. Dos seis uma adolescente com transtorno alimentar
já era atendida pelo psicólogo na unidade o que foi reiterado pela técnica em enfermagem,
outra adolescente grávida era usuária de substâncias psicoativas e tanto a ACS responsável
quanto a técnica em enfermagem desconfiavam de comorbidade psiquiátrica, outras duas
mulheres adultas tinham transtorno de ansiedade e depressão respectivamente. Em relação à
adolescente usuária de drogas, a fisioterapeuta propôs uma discussão de caso com a rede (com
o Conselho Tutelar e CRAS). O psicólogo programou visitas domiciliares com os agentes
comunitários para as duas mulheres adultas e as ACS discutiram com a equipe do NASF a
importância de intervenções de caráter informativo, tendo como base a família do usuário que
tivera AVC. Tais intervenções teriam o objetivo de orientar, a partir do vínculo com os ACS,
a família dos usuários. As ACS e a técnica em enfermagem apontaram dificuldade em realizar
ações em saúde, visto o interesse político que ora entra em contraste com as diretrizes dos
serviços em saúde. Mediante essa problemática, o psicólogo sugeriu a criação de um relatório
da história do atendimento, com a finalidade de assegurar a ação realizada e resguardar o
profissional. Nessa reunião foi perceptível a ausência de um condutor fixo no matriciamento,
sendo um processo multiprofissional, no qual diferentes profissionais se colocavam e se
articulavam nas discussões. Tal como no estudo de Cirilo Neto e Dimenstein (2017), o apoio
matricial esteve limitado a uma percepção assistencial, na proposta de atendimentos na
própria unidade, em sua maioria discussões sobre os casos de maior complexidade e as visitas
domiciliares em condições bem específicas. Nesse aspecto o matriciamento tem deixado em
plano secundário seu caráter de educação permanente, sua perspectiva educativa, uma vez que
é a que menos aparece. Houve apenas como uma possibilidade oferecida pela nutricionista,
cuja participação foi eximida pelos profissionais da unidade.
Na segunda reunião de matriciamento, estava ausente o psicólogo do NASF e, quando
a fisioterapeuta perguntou à equipe se havia algum caso para discutir, eles disseram que não.
Entretanto, uma ACS da unidade comentou sobre uma usuária que teria dificuldade em aderir
ao tratamento e que sempre que queria algo fazia uma confusão. A técnica em enfermagem,
juntamente com uma ACS tratavam-na como alguém que teria ganhos secundários
beneficiando-se de sua condição. Por fim a enfermeira reiterou que ela teria transtorno
bipolar, o que não foi sistematicamente explorado.
58

Em todas as reuniões de matriciamento do NASF, foi notório que nenhum profissional


era o facilitador das discussões, uma vez que todos os membros da equipe do NASF discutiam
os casos e traziam informações de igual modo, sem que a condução da reunião se
centralizasse em um profissional. Tal posicionamento dinâmico foi distinto da pesquisa de
Dantas e Passos (2018), na qual o psicólogo era a figura articuladora do matriciamento. No
que diz respeito à participação da equipe da USF, era predominante a postura dos ACS da
EqSF nas discussões, mas vale reiterar que eram a maioria de profissionais na reunião,
fenômeno que corrobora com o estudo das autoras (Dantas & Passos, 2018). Todavia, as
discussões não se trataram de movimentos de desresponsabização, nos quais uma equipe
passa o caso para outra e se desresponsabiliza, nem de meros agendamentos, mas muitos
casos se constituíram como possibilidades de atendimentos conjuntos e criação de estratégias.
Consecutivamente, o apoio matricial teve papel informativo e de desenvolvimento de
atividades em conjunto com a finalidade de ampliar o atendimento à complexidade das
demandas e de construir novas práticas na saúde das famílias (Bispo Junior & Moreira, 2018).
A última reunião observada na USF urbana foi com o CAPS II, foram discutidos
vários casos e serão abordados aqui os mais problematizados. O psicólogo arguiu a uma
agente sobre o usuário R., a técnica em enfermagem informou que ele só procura a unidade
para buscar receita e está desempregado. A técnica ainda acrescenta que R. afetou-se por ver o
abatimento de animais no frigorífico onde trabalhou e chegou até a tentar autoextermínio.
Inclusive era atendido pelo CAPS II e foi referenciado para o psiquiatra da rede. A agente e a
técnica relataram que P. teve recaídas (surtos) após sua separação, porém não procura o CAPS
por não ter dinheiro para se deslocar até o serviço de saúde. Em função disso, P. está em um
processo de requisição de pensão e no momento está em uso de haldol e fenergam pela USF.
A técnica comenta que libera medicação com controle semanal para evitar uso abusivo, relata
ainda que W. comparece na unidade para renovar receitas e está bem, o psicólogo afirma que
sua genitora não frequenta os grupos de família no CAPS e o agente complementa referindo
que a genitora tem deficiência visual, o que dificulta sua locomoção. Outra agente diz que G.,
outra paciente atendida nessa unidade, está bem, faz tratamento odontológico e não pega
receita, a enfermeira informa que ela tem depressão e não adere à medicação, demonstrando
apatia e ideação suicida. Atualmente sua filha se reaproximou da usuária, está desempregada,
mas tem frequência na unidade. A técnica corrige dizendo que pega sertralina e clonazepan,
porém é resistente à terapia. Já L. tem 17 anos, passa por psiquiatra da rede devido à
depressão, sua genitora relata que a filha se mutila e teria vergonha das pessoas do território
descobrirem que sua filha é atendida por um psicólogo. Além disso, a direção da escola
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contatou a unidade relatando que ela surta (se corta), e também parou de fazer atividades
físicas. Concluem na reunião que L. tem prazer quando se corta; mas, apesar da vergonha, a
genitora procura constantemente a USF. O psicólogo disse que deu entrevista para o Plantão
47 (Programa Televisivo Local), onde discutiu sobre automutilação e sugeriu visita domiciliar
de psicólogo do NASF para casos como esse. A enfermeira e a técnica discutem sobre
atendimento à genitora e visita do psicólogo e da técnica com quem a genitora tem vínculo. A
técnica reitera que seriam cortes superficiais, mas que genitora não deixa filha (L.) falar
diretamente com a técnica. O psicólogo propõe que discutam ações em conjunto com o NASF
sobre o Setembro Amarelo, que o NASF também poderia criar um grupo preventivo com as
pessoas que vão buscar receitas e que podem também tratar das questões sobre suicídio. Neste
momento uma das agentes compara sua história com a dos adolescentes afirmando que
começou a trabalhar desde seus sete anos e nunca apresentou um quadro de sofrimento
psíquico, tal como as adolescentes que tentam suicídio e se mutilam. Outra agente acredita
que seja uma questão de falta de comunicação. É exposto pelo psicólogo que o suicídio é
multicausal, pode envolver a perda de um emprego, separações conjugais e para tais
eventualidades ser uma forma de aliviar o sofrimento. Para tanto o profissional expõe a
necessidade de um trabalho preventivo de ações na unidade com enfoque informativo. O
profissional ainda apresenta dados do Ministério da Saúde sobre o suicídio, os índices no
Brasil e no Mundo. Ainda apresenta sua experiência pessoal como escoteiro, na qual percebia
uma dificuldade na comunicação entre pais e filhos, o que se relaciona com a dificuldade de
diálogo entre familiares vista em sua prática profissional, fator que considerada como risco
para o autoextermínio. Na perspectiva do psicólogo, o autoextermínio seria uma solução para
o desprazer. A agente acrescenta que é de extrema importância o diálogo familiar, e o
psicólogo concluí a reunião dizendo que o adolescente precisa ser escutado e não rotulado.
No matriciamento do CAPS II realizado na USF Urbana, foram apresentados casos de
pessoas com transtornos mentais tanto pela equipe da unidade, quanto pelos profissionais do
CAPS. Em relação à participação da equipe que desenvolve o matriciamento, é notável a
participação do psicólogo como articulador das discussões, perguntando e expondo sobre a
relação familiar com o serviço (Dantas & Passos, 2018). Entretanto, a médica praticamente
não participou da reunião, não discutindo nenhum caso, apenas relatando sobre a sua
percepção a respeito da juventude. Vale ressaltar que houve o predomínio da discussão de
casos clínicos e que em sua maioria apareceu a temática da depressão e do suicídio dentre os
usuários de saúde mental da unidade (Santos, Uchôa-Figueiredo, & Lima, 2017). No que
tange a educação permanente, foi desenvolvida uma discussão sobre o suicídio no qual
60

tentaram identificar com quais fatores a tentativa estaria envolvida, como lidar com a
possibilidade de autoextermínio, se por meio da educação, sendo proposta a criação de um
grupo, e ações no mês de setembro, em virtude de ser nesse mês realizada uma campanha de
prevenção ao suicídio. Houve um pequeno diálogo, com uma pequena problematização,
inclusive com comparação de experiências pessoais e por fim o psicólogo apontou alguns
dados do Ministério da Saúde acerca do suicídio (Brasil, 2017b). Em suma houve um pequeno
movimento de educação permanente, porém não se considerou primordialmente informações
científicas que poderiam ser contrastadas com a história de vida da clientela. Além disso, vale
fazer menção que a enfermeira da USF não estava presente na reunião, sendo que ela poderia
contribuir para o diálogo e a construção de saberes.
Na reunião da EqSF rural, os profissionais empreendem uma discussão sobre a
problemática de álcool e drogas e demais questões de saúde mental e seus encaminhamentos.
Inicialmente é abordada pelo enfermeiro a Fazenda Barreiro, tendo como grande problemática
o uso de álcool e outras drogas, ele solicitou uma palestra sobre a temática na Escola Lúcia
Sacomam Junqueira ao pesquisador, que também é psicólogo do Centro de Atenção
Psicossocial Álcool e outras drogas (CAPS Ad). Já na Fazenda Corrego D’antas, há uma
família com dois filhos acamados, o marido com um câncer na laringe e a filha com
transtorno mental. Acordou-se, em discussão do enfermeiro com a agente comunitária, que
essa daria banho na filha e a levaria na Unidade de Atendimento Integrado (UAI) para tirar
seus documentos. Como a família não gosta de tomar banho, o enfermeiro sugeriu à técnica e
à agente que ensinassem a filha a gostar de tomar banho. Uma técnica salienta que D. da
Fazenda Souza Lima sofre abusos e a direção de sua escola solicita encaminhamento para
ginecologista. Os profissionais das unidades acreditam que ela seria ameaçada e abusada por
pessoas de modo aleatório, por ficar transitando na via de trânsito e entrar em qualquer carro
sem discriminar o risco e sem ter conhecimento de quem lhe oferece carona. Acreditam que
ela não teria crítica o bastante para evitar situações de risco, como um abuso. Além disso, uma
das agentes acredita que ela tenha deficiência intelectual, pois foi recomendado que
frequentasse a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), mas seus pais se
recusaram a levá-la. A técnica refere que a adolescente foi acompanhada pelo Centro de
Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) por dois anos, porém da perspectiva
da profissional esse serviço não resolveu nada. A agente questiona se é abuso ou não, por ela
procurar situações de risco, já o enfermeiro pensa em se resguardarem solicitando avaliação
psiquiátrica e ginecológica. O médico apresenta a possibilidade de oferecerem
anticoncepcional; porém, segundo o enfermeiro, o genitor não aceita que a filha use
61

anticoncepcional, discutem sobre o injetável e a agente acrescenta que a diretora da escola


disse que iria conversar com a mãe sobre isso. O enfermeiro acrescenta que mesmo a diretora
sabendo do abuso não notificou. Segundo o enfermeiro e os ACS, o Conselho Tutelar e o
CRAS não funcionam como deveriam. E por fim, a técnica e o enfermeiro relatam que os
usuários de álcool do Córrego D’antas frequentam diariamente a unidade e não querem parar
de ingerir álcool.
A ingestão de álcool e outras drogas, na região rural, seriam fatores de risco ao
aparecimento de transtornos mentais associados a essas substâncias: a disponibilidade da
substância, a forte cultura de uso, conflitos pessoais e familiares, o uso em festividades, dentre
outros (Dimenstein et al., 2016; Silva et al., 2016). Para além desses fatores estariam
envolvidas as condições sociais, modos de vida e todo um contexto, que precisa ser visto para
entender e atuar sobre essa questão das repercussões do frequente consumo de álcool e outras
drogas. Vale ressaltar a solicitação de palestras, a equipe estaria interessada em uma ação
com caráter preventivo e informativo. No que concerne ao cuidado pessoal de uma usuária, a
equipe realiza atividade de cunho assistencialista, assumindo a postura de agir sobre o
autocuidado de outrem, porém acredita que será uma ação temporária até a construção de uma
responsabilização pela parte da usuária. O que é mais discutido pela equipe seria a
possibilidade de abuso sexual de uma adolescente, cujos pais se negariam a dar
anticoncepcional, visto que ela teria deficiência intelectual. A ESF ainda atua em território
perpassado por difíceis condições financeiras, sociais, poucas formas de acesso a direitos, o
que favorece a geração de “[...] violência, abusos, perdas de anos de vida, perdas de laços
sociais e familiares, não acesso a serviços fundamentais, perda de capacidade de participação
social etc” (Dimenstein et al., 2016, p. 322). Nesse aspecto, a população rural se vê exposta a
muitos fatores de risco, como a possibilidade de abuso levantada pela pesquisa e que é
apontada pela equipe em relação a uma de suas usuárias. Ou seja, o abuso seria uma das
condições de risco, às quais a utente estaria submetida, pois não se podem perceber outras
questões, em virtude da história de vida da adolescente não ter sido amplamente apresentada.
Como resultados baseados nas oito entrevistas realizadas, foram estabelecidas três
categorias: elementos do contato com o usuário, o manejo na atuação com pessoas com
transtorno mental e a educação permanente dos profissionais em relação a sua atuação em
saúde mental. Cada uma delas se desdobrou em outras subcategorias.
62

4.1 Elementos do contato com o usuário

A referida categoria vai ao encontro a um dos objetivos que trata dos sentidos
atribuídos à clientela com transtornos mentais e esses são ressaltados como alguns elementos
presentes no contato das equipes de saúde com os usuários. Assim ela visa demonstrar
algumas significações que foram construídas durante a formação dos profissionais e na sua
experiência prática. São abordadas nas subcategorias algumas percepções que tratavam
especificamente da pessoa com transtorno mental severo e persistente. Em tais subcategorias
são demonstradas as perspectivas de profissionais de ambas as equipes, são elas: O medo do
contato com usuários da Saúde Mental e uma tentativa de dar sentido ao outro. Nas duas serão
vistas alguns modos de entender o indivíduo, a partir de experiências prévias e de construções
sociais, que foram tecidas na construção subjetiva de cada um dos participantes.

4.1.1 O medo do contato com usuários da SM

Um dos elementos presentes na percepção sobre a clientela referida por dois dos oito
entrevistados foi o medo em lidar com a clientela de saúde mental. Nos depoimentos, há
elementos de experiências traumáticas em atendimentos com pessoas com transtornos
mentais, assim como um receio da equipe em sua atuação. Medo esse, que é associado à
possibilidade de que o usuário, em momento de crise, reaja com agressividade com o
profissional durante uma abordagem técnica, como pode ser observado a seguir:

(...) Na minha percepção, “né” (sic), como médica, como pessoa, a gente tende a ter o medo da pessoa.
Ah, é esquizofrênico, ou tem até outros tipos de transtorno. Mas não sei qual a minha percepção
(pausa). Tipo a gente tem que, pensando na área da Atenção Básica, a gente sempre acolhe a pessoa e
tenta fazer o melhor, “né” (sic), tentar encaminhar para as áreas específicas. Mas são doenças que
sempre causam medo nas outras pessoas, até quando a gente está atendendo paciente. Se tem um
paciente em surto as outras pessoas ficam incomodadas, mas para mim é tudo a mesma coisa. A gente
começa, a gente tem medo de ser agredida, que já aconteceu algumas vezes. (...) Sim. Eu e os meus
colegas (já foram agredidos). (M1)

Ah, sim, é na minha área não tem muito paciente assim com transtornos mentais,
“né” (sic), é. Mas eu fico até apreensiva sim, quando chegar abordar sabe. (ACS1)
O medo presente no discurso das participantes está relacionado a construção desses
indivíduos em relação às suas experiências e transmissão social. Nesse sentido, o medo pode
estar muito ligado à percepção social e comunitária tanto presente na vida anterior ao trabalho
na unidade, quanto da própria experiência profissional. Assim, há uma dificuldade para pensar
para além deste medo, uma vez que, uma ação de agressividade venha a se apresentar por
63

parte de um usuário, como no relato da médica. É certo que a médica apresenta seu sentido
que adveio de sua formação, em um estágio, e essa concepção ainda se mantém, sendo
reproduzida até então. A profissional ainda faz e parte de uma generalização de que os
usuários com transtorno mental severo e persistente ainda causassem medo em toda a
população, como algo comum e que é transmitido intergeracionalmente. Não há um
questionamento em relação a esse contato no estágio, nem se identificou um outro encontro
com a problemática que reiterasse ou questionasse esse ideário. Já a agente comunitária
apresenta o medo que pode ser compreendido tanto como um medo em relação à
possibilidade de ser agredida, como a médica, ou um medo diante do desconhecido, para o
qual ela se sente despreparada sobre como oferecer o cuidado em saúde. Portanto, o medo da
médica demonstra estar muito ligado à sensação de risco à sua integridade física, quanto o
sentimento da agente estaria mais ligado ao modo como esta acredita estar instrumentalizada e
capaz de atuar com um utente de saúde mental, o que não elimina a possibilidade de haver um
pensamento de que poderia ocorrer uma agressão física.
Esse medo presente em metade dos participantes da USF urbana sinaliza que, mesmo
havendo o apoio matricial, certos preconceitos não foram superados por parte dessa equipe.
Assim a educação permanente se faz necessária como um modo de mostrar outras facetas aos
profissionais pelas quais possam ver e se aproximar da clientela, quebrando preconceitos de
experiências anteriores. Esse medo diz de uma construção que não passou por uma elaboração
e requer maior investimento tanto de informação e de experiências que possam ser
apresentadas por outros profissionais por intermédio do matriciamento, mas
fundamentalmente de uma abertura subjetiva dos profissionais para vislumbrar e ir de
encontro a novas possibilidades de práticas em sua atuação.
Nos relatos é perceptível o medo associado ao indivíduo com transtorno mental severo
e persistente, como algo que advém de uma construção subjetiva tanto cultural como
particular. Enquanto construção social, o medo seria perpassado pela concepção de que o
sujeito representaria algum perigo na relação com o outro (Amaral, et al. 2018; Maciel et al.
2011; Pegoraro et al., 2014). O que é expresso no relato da médica “Mas são doenças que
sempre causam medo nas outras pessoas” como uma percepção socialmente constituída e
essa profissional reproduz e reforça esse discurso que associa o indivíduo com transtorno
mental à periculosidade. No fragmento “Se tem um paciente em surto as outras pessoas ficam
incomodadas” a médica apresenta uma concepção sobre um estranhamento que nota em sua
atuação diante do surto, do inesperado e reitera o sentido que atribui à clientela com uma
percepção social, com base em uma impressão e pouca problematização. Já a agente
64

comunitária informa “Ah, sim, é na minha área não tem muito paciente assim com
transtornos mentais, “né” (sic)” e, de maneira oposta à médica, a agente demonstra falar de
um lugar de pouco contato de experiência, o que também pode estar ligado a uma percepção
social. E assim, “Mas eu fico até apreensiva sim, quando chegar abordar sabe” por tal
concepção, bem como provavelmente pela falta de informação, é perceptível um temor em
entrar em contato e atuar com essa população. Para a médica esse sentimento está em seu
fazer conforme a experiência de ter sofrido episódios de agressão em decorrência de um surto
psicótico, fato histórico para ela e que perpassou sua formação. Fato explicitado na fala “A
gente começa, a gente tem medo de ser agredida, que já aconteceu algumas vezes”, que tem
um peso emocional, pois aconteceu mais de uma vez e foi consonante à agressividade
concebida pela a sociedade, proveniente de uma percepção de que a pessoa com transtorno
mental seria alguém agressiva, violenta. Mesmo com sua compreensão sobre o surto enquanto
um momento de crise, sua experiência lhe traz reservas no cuidado com a clientela de saúde
mental. No entanto a questão se tornou uma estigmatização, pois foi significada pela médica
como uma generalização.
De outra forma, existem concepções do sujeito com transtorno como um indivíduo que
destoa em relação ao que lhe é esperado no convívio social, sendo visto como estranho.
Entretanto, esse medo também tem ligação com a relação estabelecida prioritariamente, a
partir de uma medicalização predominante na atuação das EqSF, como prescrições de
medicamentos e orientações em relação a eles, apenas pautada em uma compreensão
orgânica, como se tal fenômeno tivesse apenas que ser medicalizado e essa fosse a primeira
opção para o sujeito (Machado & Pereira, 2013; Pegoraro et al., 2014). Aliás, assim como
para tais profissionais a medicação aparece como principal conduta e esta é considerada da
mesma forma pela população conforme a pesquisa de Bispo Junior e Moreira (2018), como
sendo a primeira possibilidade que o serviço teria a oferecer.

4.1.2 Uma tentativa de dar sentido ao outro

Outro elemento na aproximação com o usuário identificado foi uma tentativa de dar
sentido ao outro, de lidar com o diferente, como isso ressoa na relação e demarca uma
estranheza da parte do profissional. A equipe, ao tentar sinalizar a diferença das pessoas com
transtornos mentais severos e persistentes da clientela geral, descreveu tais indivíduos como
não sendo normais nem estranhos o que pode ser observado nos relatos abaixo:
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São pessoas que controladas, muitas delas conseguem dependendo do grau de


capacidade lógico tem, conseguem ter uma vida normal, “né” (sic). (E1)
Então a pessoa que tem a doença mental, ela tem um sofrimento muito grande na
parte social e é muito difícil tentar achar um equilíbrio a enfermidade, manter o controle da
enfermidade e a pessoa ter uma vida normal. (E2)
Ah, eu acho, como eu trabalho há muito tempo, eu acho muito natural “né” (sic).
(M2)
Se distingue (pausa) sim tem diferença. Que cada um age de uma forma, “né” (sic).
Quem tem problemas, a saúde mental afetada, eles agem de forma diferente do que outro que
não, digamos assim que é normal, “né”. (risos). (ACS1)

É uma das pacientes que eu ultimamente achei que estava muito surtada, mas ela não faz tratamento no
CAPS, não faz tratamento em lugar nenhum, porque ela não quer aderir aos tratamentos. Ela fala que
a vida dela é cuidar do filho, então ela não toma nenhum medicamento. Ela é somente cuidar do filho,
ela não gosta de vir, ela fala que ela não vai. E aí ela de uns dias pra cá, ela ficou muito estranha,
muito estranha. Ela já é estranha, ficou mais estranha ainda. E aí que a gente percebeu que agora não
dá para ficar do jeito que está. Que antes ela era estranha, mas era uma estranha que passava meio
que despercebida. (...) Assim, elas destacam mais, “né” (sic). Elas destacam mais, sim. A gente vê que
tem um problema, “né” (sic). (ACS2)

O físico já fala, eles geralmente têm uma aparência diferente, são mais agitados, é a vida social não é
tão fácil, “né” (sic). (...)Muito parado, tem uns que ficam até com a boca aberta, é falam coisas
repetitivas, geralmente, nos meus casos são assim. (ACS3)

Como indivíduos, aí como eu vou te responder é, assim eles não ficam muito, como se diz na sociedade,
“né” (sic) mais ou menos isso. Eles têm dificuldade infelizmente, porque não é todo mundo que aceita,
tem muita gente que recrimina eles, então é uma situação bem complicada. (ACS4)

É prevalente, no discurso dos enfermeiros, um sentido sobre a pessoa com transtorno


mental pautado no controle dos sintomas, para haver um convívio social. Esse ideário se
mantém a partir de uma construção social que concebe esse sujeito apenas a partir da crise.
Nesse aspecto, é visto como alternativa algo que contenha, por intermédio de contenção física
ou química, a medicação que seria a maneira de viabilizar a participação social, ou esconder o
que é difícil de olhar e conviver. Já o médico distinto de todos os relatos percebe o usuário de
saúde mental de modo natural e não fornece subsídios para uma discussão para além disso:
Como seria esse natural? A qual paralelo seria compreendida essa concepção natural?
Dentre os agentes comunitários de saúde entrevistados, é perceptível uma tentativa de
significar o que destoa, que em suas relações lhes provocam estranhamento. A primeira tentou
descrevê-los como sendo diferentes e não normais, como uma tentativa de demarcar uma
fronteira entre o normal e o patológico, sendo esse um argumento encontrado para distinção.
A segunda agente associou a pessoa com transtorno mental com a concepção de alguém
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estranho, que chama a atenção, destaca-se sob uma perspectiva negativa; de forma
semelhante, a terceira percebe a partir de estereotipias e a quarta como pessoas apartadas do
convívio social. Vale ressaltar que a terceira (ACS3) ainda concebe a pessoa com transtorno
mental como alguém agitada demais, ou que fica parada em demasia, com boca aberta e
falando coisas repetitivas. Tais comportamentos estariam ligados aos transtornos, mas
também podem estar relacionados aos efeitos colaterais de medicações psiquiátricas.
Entretanto, essa tentativa de dar sentido é o que conduz as aproximações, ou até
distanciamentos, avaliações e a atuação em relação ao usuário e possibilitam o entendimento
de como os usuários são vistos a partir de suas capacidades. Muitos desses sentidos embasam
a compreensão sobre a participação social do utente, o que interfere nas propostas de
ampliação desta rede.
O sentido de controle apresentado pelos enfermeiros pode ser observado em “São
pessoas que controladas, muitas delas conseguem dependendo do grau de capacidade lógico
tem, conseguem ter uma vida normal(...)” e “(...) é muito difícil tentar achar um equilíbrio a
enfermidade, manter o controle da enfermidade e a pessoa ter uma vida normal. Nestes o
controle aparece como algo necessário, para haver uma suposta normalidade, normalidade que
requer uma medicação, um procedimento que provenha condições a esse sujeito de ter “uma
vida normal”. Normal que não é sistematizado e pode estar ligado apenas ao controle de
sintomas e fortalecer uma compreensão de que o usuário deve ser tutelado em sua vida, como
se fosse limitado para além de seu momento de crise (Machado & Pereira, 2013). Uma
concepção que desconsidera o sujeito como agente de mudanças e para além de uma condição
psicopatológica.
Além disso, o indivíduo com transtorno mental é reconhecido também pela alcunha de
“estranho” como no relato: “Que antes ela era estranha, mas era uma estranha que passava
meio que despercebida”, essa fala carrega um estereótipo negativo, podendo ser essa
estranheza reconhecida a partir de um juízo moral, como os ACSs do estudo de Moura e Silva
(2015) que associaram a pessoa com transtorno mental a indivíduos que não são bons. Nesse
aspecto, o contato com o “estranho” também pode ser algo que teria aumentado essa
percepção, de que a usuária estaria mais “estranha”, uma vez que há maior proximidade com
sua problemática. Todavia o ser estranho não explica a condição e a maneira que uma pessoa
se apresenta diante da outra, apenas reforça um distanciamento em relação ao outro.
A percepção de que não seriam normais “eles agem de forma diferente do que outro
que não, digamos assim que é normal”, ou seja, há algo que é esperado pela agente e no modo
como esta percebe o usuário não atribui sentido de que seria normal. Essa tentativa de dar
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sentido também é proveniente de uma construção social, para a qual a loucura, ou transtorno
mental estariam ligados à anormalidade, característica que aparta o sujeito de uma identidade
coletiva (Cândido et al., 2012). Essa é uma construção social, que interfere na participação
social dos usuários, como é visto em um dos trechos de duas agentes “são mais agitados, é a
vida social não é tão fácil, “né”” e “não é todo mundo que aceita, tem muita gente que
recrimina eles”.
Além disso, a expressão ser “estranho” e “destacar mais” em si mesmas não lançam
luz sobre a problemática, porém são modos de se referir à outra pessoa que provoca
estranhamento no contato entre duas subjetividades. Essa percepção ainda diz sobre uma
construção a partir das interações que os participantes tiveram com esses indivíduos e de suas
formações em relação à saúde mental. Aliás, esse significado de ser estranho relaciona-se a
uma percepção social, que por sua vez pode estar relacionada ao medo de quem se mostra
diferente nas relações cotidianas (Maciel et al., 2011). Assim, tal sentido aponta a necessidade
de maior investimento na educação permanente em saúde mental, que poderá ser melhor
empregada na identificação e no cuidado da clientela. Essa estranheza por estar ligada ao que
uma das agentes relatou, de que os utentes com transtorno mental severo e persistentes “são
mais agitados” o que se apresenta a ela como diferença e marca o indivíduo. Marca que deixa
de ser um estado, para um modo de ser que afeta o outro, ainda acrescenta que também são
“(...)Muito parados, tem uns que ficam até com a boca aberta, é falam coisas repetitivas”
sentidos esses que podem estar relacionados ao excesso de medicação para conter o que
atribuem como estranheza, que, por exemplo, seria a agitação intensa.

4.1.3 Síntese da categoria

Os resultados apontaram alguns elementos do contato com o usuário, que foram o


medo de contato e uma tentativa de dar sentido ao outro. Tais elementos compõem a
construção de cuidado com o usuário, pois é por meio de uma percepção do outro que a
relação se estabelece. É perceptível que, mesmo após alguns anos trabalhando na Atenção
Básica, duas das participantes ainda têm medo em relação aos indivíduos com transtornos
mentais severos e persistentes, o que pode interferir na atenção à saúde prestada. Há também
uma tentativa de nomear o modo de ser no mundo do sujeito, porém o compreendem sob uma
concepção estigmatizada e imutável, o que restringe algumas possibilidades do sujeito.
Assim, tais resultados representam temáticas a serem discutidas em matriciamento,
concepções que podem ser construídas em conjunto e mais exploradas. São elementos que
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dão contornos ao manejo e à atuação dos profissionais e podem se representar em temáticas


propostas pelas equipes para serem abordadas pelo NASF e ou CAPS II nas reuniões de
matriciamento.

4.2 Manejo na atuação com pessoas com transtorno mental

Essa categoria se coaduna com o objetivo de descrever as ações desenvolvidas pelos


participantes para as pessoas com transtornos mentais severos e persistentes em relação ao
apoio matricial. Em seguimento a compreensão dos profissionais sobre a clientela de saúde
mental segue o seu modo de atuação, em seu manejo específico com esses usuários, propõem
ações a eles e sugerem mudanças de comportamentos a partir de orientações. Além das
especificidades do usuário propriamente dito, ele é permeado por uma conflitiva que
ultrapassa a nosologia, trazendo dificuldades presentes no tratamento, sejam provenientes do
usuário ou da equipe nessa atenção, ou melhor dizendo, da própria relação estabelecida entre
ambos. Observa-se também a percepção das equipes sobre o desempenho de seu trabalho e os
seus atravessamentos, visto que faz parte do que é oferecido pela RAPS, e essa percepção
afeta o manejo em relação à destinação do utente na rede de saúde. Diante disso, para lançar
luz acerca do manejo com as pessoas com transtornos mentais, serão apresentadas as
demandas mais prevalentes de transtornos, os procedimentos realizados com as pessoas que
apresentam tais psicopatologias, as dificuldades na atuação e uma concepção sobre a
complexidade da atenção, em relação à Atenção Básica.

4.2.1 Demandas correntes de indivíduos com transtornos mentais

Foram observados, dentre as demandas mais frequentes, alguns quadros


psicopatológicos mais comuns na unidade, sendo estes variados. Contudo, dentre os
participantes, a maioria apontou a depressão e a esquizofrenia como o transtorno mental mais
prevalente, sendo que para tais sujeitos são pensadas ações.

Por aqui a gente tem, esquizofrenia conta “né”(sic). (...) Relacionado a drogas a gente tem um caso,
talvez e tenha uma dificuldade de falar sobre esse assunto, mas a gente tem um paciente do Souza Lima
[Fazenda] (...). Nós temos, pacientes com alto grau, eu não sei se isso não se enquadra, paciente
alcoólatra, a gente tem casos no Córrego Dantas [Fazenda], pacientes alcoólatras e mesmo um
inclusive é esposo de uma funcionária nossa e que tem depressão(...) (E2)
69

Depressão, transtorno afetivo. Mas assim, depressão, ansiedade são os que são mais
rotineiros aqui. Acho que em todos os lugares, não sei. (M1)

Quantidade certinha eu não sei. Assim, eu tenho uma quantidade boa que frequenta o CAPS, uma
quantidade boa. Em quantidade uns 10. A maioria depressão, essa que começou agora a gente ainda
não conseguiu saber direitinho o que é, só que assim, ela não fala coisa com coisa e cada hora “tá”
(sic) de um jeito, não sabe ainda se ela é esquizofrênica, não sabe ainda. Mas eu acho que a maioria é
depressão, a maioria tem depressão. (ACS2)

Em relação à região urbana, foi apontada pelas participantes a prevalência de


demandas de transtornos mentais como depressão, transtorno bipolar e esquizofrenia, sendo
que dos quatro apenas a enfermeira referiu esquizofrenia e a médica transtorno bipolar, já a
depressão foi sinalizada pela maioria. Na região rural, aparecem transtornos como:
esquizofrenia, depressão, usuários de álcool e outras drogas, e transtorno de déficit de atenção
com hiperatividade em crianças. Desses o transtorno mais prevalente na zona rural foi o
transtorno mental devido ao uso de álcool, seguido pela esquizofrenia e depois pela depressão.
A relação entre as duas unidades demonstra que os transtornos mais comuns na
perspectiva das duas equipes são a depressão e a esquizofrenia. Não se associaram entre as
unidades o transtorno bipolar e o transtorno de déficit de atenção com hiperatividade.
Observa-se uma diferença entre a avaliação dos profissionais graduados e dos com nível
médio, sendo que em sua maioria os graduados apontaram uma visão de maior amplitude
sobre as demandas do território, já as agentes apontaram em sua maioria apenas um
transtorno, havendo desconhecimento sobre especificidades de condições psicopatológicas.
No entanto a depressão foi o transtorno mais identificado, mas sem muita especificação pelos
profissionais de nível superior e médio, o que pode estar relacionado a uma falta de
compreensão diagnóstica, culminando em uma generalização.
Mesmo com essa prevalência de demandas na USF Urbana, esses temas não foram
abordadas especificamente nas reuniões de matriciamento tanto do NASF como a equipe do
CAPS, nem quando foram arguidos pelos profissionais do NASF a respeito das temáticas que
gostariam de discutir. Diferentemente a EqSF Rural em sua reunião de equipe os profissionais
discorreram sobre a problemática de saúde mental e abordaram o consumo de álcool e drogas,
solicitando palestras ao psicólogo do CAPS Ad e o cuidado com a clientela com saúde
mental.
Consonante a outras pesquisas mais antigas, a depressão é a psicopatologia que mais
se destacou na perspectiva dos entrevistados, como relatado pelo enfermeiro, médico e agente
70

comunitária sequencialmente: “um inclusive é esposo de uma funcionária nossa e que tem
depressão”; “Mas assim, depressão, ansiedade são os que são mais rotineiros aqui.”; “Mas
eu acho que a maioria é depressão, a maioria tem depressão.”. Tal incidência encontrada por
este estudo esteve presente tanto na USF Urbana quanto na USF Rural, fenômeno que
também aparece em outras pesquisas, nas quais a depressão foi referida entre a população
atendida (Fortes, Villano, & Lopes, 2008; Gonçalves & Kapczinski, 2008). Entretanto vale
notar que nos relatos do médico e da agente comunitária há componentes conflitivos sobre as
suas percepções. O médico expressa “Mas assim, depressão, ansiedade”. Nesse pequeno
fragmento, depressão e ansiedade são tratadas não como transtornos e nem são explorados,
essa fala traz a ideia de que se tratam de sintomas isolados e não apresenta relação com
quadro nosológico. No fragmento do discurso da agente “Mas eu acho que a maioria é
depressão” há o uso da expressão “eu acho” que denota imprecisão, o que pode ser
reconhecido pela falta de conhecimento sobre a problemática, ou inclusive discussão na
unidade sobre essa condição psiquiátrica. Assim, esses discursos apresentam pouca
problematização da morbidade dos usuários e sugerem uma generalização imprecisa a partir
de um estado previamente visto no contato com o utente.
Vale salientar que, mesmo com essa problemática, não houve uma discussão nas
entrevistas sobre tais temas, apenas casos que os tangenciavam. Nesse sentido, o
aparecimento da depressão pode ser associado com a pesquisa de Pereira e Andrade (2017)
que trata da busca dos participantes por conhecimentos sobre transtornos mentais, nesta
destaca-se que era maior a depressão, já os transtornos psicóticos foram os de menor
interesse, e neste estudo se tratam dos mais prevalentes. Dessa forma, percebe-se a
necessidade de discutir mais a respeito de tais demandas, uma vez que essa é uma das maiores
problemáticas em saúde mental para as equipes. Ou seja, percebe-se pouco interesse das
equipes das unidades em buscar conhecimento e discussões sobre esses transtornos mentais
severos e persistentes, assim como, há uma falta de investimento em se tratar dessas questões
nos matriciamentos. Ao mesmo tempo, os usuários são concebidos como tendo transtornos
sem uma maior sistematização e para tal seria necessária uma construção conjunta sobre as
temáticas de saúde mental junto ao apoio matricial. Segundo Pereira e Andrade (2017) pode
até haver um interesse sobre as temáticas, mas é necessário existir um investimento pessoal e
institucional para um maior cuidado no manejo em relação ao usuário. Interesse e
investimento dos profissionais e da instituição que pouco aparece nas entrevistas e que por
sua vez pode repercutir no manejo com a população.
71

4.2.2 Procedimentos realizados com a clientela com transtorno mental

Quanto ao manejo realizado pelos profissionais da unidade, foram elencados alguns


procedimentos desenvolvidos com a clientela de saúde mental. Dessa forma, tais propostas
visam compreender a problemática da demanda e construir estratégias de cuidado, tal como
será apresentado:

A gente sempre faz uma primeira consulta, “né” (sic). (...) Uma anamnese completa pra gente, a gente
não diagnostica na primeira vez, a gente vai fazendo todo um acompanhamento de uns 3 a 6 meses, pra
poder ter alguma noção do diagnóstico que não pode fazer de primeiro. (M1)

Então, assim, em primeiro momento é tentar diagnosticar o mais rápido possível e tentar. Eu já começo
tratando, entendeu. Alguns casos, o severo a gente não consegue porque a demanda que a gente tem é
muito grande. (...) Em um primeiro momento a gente tenta tratar, já começa a medicação e orienta a
família. (M2)

Os procedimentos realizados com as pessoas com transtornos mentais severos e


persistentes foram: a realização de anamnese, um acompanhamento de uns 3 a 6 meses para
uma compreensão do quadro nosológico e o diagnóstico. Dentre os relatos, o da médica se
destaca, pois esta tenta tratar dos usuários com transtornos mentais com naturalidade,
realizando procedimentos semelhantes ao dos demais usuários da unidade, mas
simultaneamente com uma sistemática no cuidado. Distintamente o médico aponta que
procura inicialmente realizar um diagnóstico e começar o tratamento, que seria a partir de
uma prescrição ou realização de encaminhamentos.
Em meio aos discursos dos médicos nota-se uma diferença. A médica tem um cuidado
em diagnosticar, para uma maior precisão e tratamento, como pode se observar “a gente não
diagnostica na primeira vez, a gente vai fazendo todo um acompanhamento de uns 3 a 6
meses, pra poder ter alguma noção do diagnóstico que não pode fazer de primeiro”. Como
elemento reforçado em seu relato, a médica procura acompanhar e ter uma maior
compreensão sobre a complexidade pela qual emerge o transtorno, há uma maior preocupação
de conhecer o sujeito que apresenta a condição patológica. Já o médico acredita que “em
primeiro momento é tentar diagnosticar o mais rápido possível” e demonstra uma
preocupação imediata para iniciar o tratamento, como afirma “Eu já começo tratando”.
Todavia essa rapidez no diagnóstico pode culminar em uma imprecisão e consequentemente
em um equívoco no manejo do cuidado, como, por exemplo, na prescrição de medicações que
não sejam efetivas para a singularidade que for apresentada e vivida pelo usuário. Além disso,
essa preocupação sinaliza uma dificuldade em lidar com um desconhecimento sobre o sujeito,
72

que pode ser conhecido a partir de mais tempo de contato durante um acompanhamento por
um maior período até uma percepção acerca de uma hipótese diagnóstica. O ato de ouvir e
coletar a história de vida está presente na maioria das entrevistas, em outras pesquisas também
aparece como parte das atividades da EqSF: consultas, encaminhamentos, orientações e
entrega de medicações, apesar destas duas últimas não terem sido mencionadas por nenhum
dos participantes (Baralhas & Pereira, 2010; Koga, Furageto & Santos, 2006; Souza et al.,
2007).
Nos relatos dos demais participantes, é prevalente a utilização de um procedimento
comum tanto no discurso dos enfermeiros como no das agentes comunitárias de saúde, que foi
a visita domiciliar. A visita domiciliar seria uma das maneiras de atuação mais prevalentes no
fazer cotidiano, mas pode acontecer com diferentes propostas e objetivos como se pode
observar:

Olha a gente (...) conversa com a família tenta apoiar a família, (...) conversa com o
paciente, tenta adquirir aquele vínculo com ele. Então a nossa atuação é direta nas visitas
domiciliares(...) (E2)

Visito sempre mais eles que os outro pessoal. (...) Então, como eles chegam eles têm
sempre, mesmo que não tem mais vaga com a médica, a gente encaixa eles, para passar na
nossa médica (ACS2)

Orientação, “né” (sic). A gente orienta, a gente. É orientação e fica encima também, não deixa acabar
os medicamentos, se não aí, se tiver que voltar no médico 6 meses por exemplo, ás vezes eles dão uma
receita que vale por 6 meses, durante esses 6 meses a gente não deixa eles ficarem sem remédio, “tá”
(sic) sempre atento pra pegar receita e acompanhando sempre. A gente não desiste nunca, “né” (sic).
(ACS4)

As visitas domiciliares são um procedimento apontado por seis participantes,


compondo a estratégia mais utilizada. Fenômeno esse que demonstra a possibilidade de tratar
do sujeito considerando uma percepção psicossocial deste, ou seja, o seu contexto e de sua
organização familiar. Esse procedimento é realizado de diferentes formas, pode ser
desenvolvido apenas pelas agentes, ou com a presença dos enfermeiros e médicos. Ele pode
acontecer com a família como apresentado pelo enfermeiro, com o objetivo de apoiar a
família pela aproximação e elaboração de um vínculo. Conforme a ACS2, a visita para as
pessoas com transtornos mentais severos e persistentes teria o papel de identificar demandas e
oferecer atendimento médico na unidade, ou seja, de acompanhar a evolução do sujeito e,
73

quando ocorrerem mudanças, oferecer atendimentos. A visita, ainda segundo a ACS4, teria o
papel de levar orientações sobre cuidados em saúde, de observar o uso da medicação e se esta
estaria acabando, com a finalidade de evitar uma crise. Portanto, as visitas domiciliares
podem acontecer para as famílias ou para os usuários com objetivos de construção de vínculo
com a família/usuário para identificação de demandas, acompanhamento de evolução,
oferecimento de orientação, bem como de atendimentos.
Tal prática de visita domiciliar é correntemente utilizada por diversas pesquisas na
atuação das EqSF (Baralhas & Pereira, 2010; Koga, Furageto & Santos, 2006; Souza et al.,
2007). Ela ocorreria com o objetivo de conhecer, orientar, informar e acompanhar tanto o
utente de saúde mental, como a sua família. Entretanto a visita como proximidade e
oferecimento de assistência à família apenas aparece na entrevista do enfermeiro da USF
Rural, “conversa com o paciente, tenta adquirir aquele vínculo com ele”. E como em seu
relato esse é um procedimento fundamental na unidade rural, por meio do qual estabelecem
contato com os usuários que residem até a alguns quilômetros de distância da unidade USF.
Nesse sentido, o vínculo seria um modo de oferecer o serviço de saúde, de sistematizar um
cuidado e de corresponsabilizar o indivíduo por seu autocuidado.
Já a ACS2 aponta que “Visito sempre mais eles que os outro pessoal.”, o que pode
estar relacionado à crença de que tais usuários teriam menor adesão à unidade, até mesmo
pela falta de vinculação com a EqSF, ou a falta de ação dos próprios profissionais na
construção desse vínculo (Cardoso & Galera, 2009). E por acreditar na dificuldade na adesão
ao tratamento que é predominantemente medicamentoso nas unidades, há uma preocupação
como referido pela ACS4 “(...) fica encima também, não deixa acabar os medicamentos, se
não aí, se tiver que voltar no médico 6 meses por exemplo”. Da mesma maneira a orientação
“A gente orienta” também é uma fala que vem juntamente com um discurso de medicalização
e assim pode ser tida como uma orientação sobre como tomar a medicação e de indicação
para o atendimento médico. Além disso, as visitas são uma possibilidade de acompanhar a
evolução do indivíduo e, havendo alterações nessa evolução, também podem ser propostas
consultas médicas, como afirma a ACS2 “(...) mesmo que não tem mais vaga com a médica, a
gente encaixa eles, para passar na nossa médica”. Em suma, as visitas podem acontecer com
amplos objetivos e direcionadas tanto à família, quanto ao indivíduo e produzir diferentes
manejos de acordo com a demanda.
74

4.2.3 O distanciamento familiar e o vínculo com a unidade

Quando os entrevistados foram arguidos se tinham dificuldades em lidar com as


pessoas com transtornos mentais severos e persistentes, a maioria afirmou não ter dificuldades
no cuidado, sendo eles as agentes comunitárias de ambas as unidades e o enfermeiro da USF
rural. No entanto, os demais profissionais relataram não ter dificuldade com o indivíduo com
transtorno, mas com sua família, que é um componente que perpassa. Como segue, foi
apontada a dificuldade de três profissionais em lidar com a relação familiar na mediação de
cuidado com o usuário.

(...) o que eu mais vejo assim, de dificuldade é, eu acho que é a família ainda tem algumas dificuldades
assim, auxiliar no medicamento, em evitar que os surtos aconteçam. Então esse é o nosso maior
desafio, “né” (sic). Muitas e muitas vezes, a gente já organizou medicamento para paciente vir até aqui
tomar, por conta da família não oferecer este medicamento. (E1)

Até, ás vezes, é a família que nunca diagnosticou este tipo de pessoa, então ela deixa a pessoa vir
sozinha e a gente tem dificuldade para colher a história, dificuldade para saber os tipos de
medicamentos. (M1)

Muitas vezes o lado familiar é o que pega mais, vem casos assim, igual eu trabalhei em hospital
psiquiátrico o paciente estava estável saia, voltava porque a família não queria dar remédio, não
entendia que o paciente tinha uma doença achava que era fingimento e tudo mais. Então o mais difícil
para nós de PSF é porque a gente tem que abordar toda a família, no consultório ás vezes o psiquiatra,
o especialista no CAPS vê o paciente, medica e pronto. (M2)

Nessa subcategoria a dificuldade da maior parte dos profissionais de nível superior das
EqSF em relação à família foi percebida em três entrevistas, nas quais expressam uma falta de
compreensão do grupo familiar sobre a condição psicopatológica do indivíduo, o que
associam à falta de auxílio na rede de cuidado do sujeito junto à unidade. Essa dificuldade é
atribuída à família, sem a tentativa de explicação sobre as aproximações realizadas com ela. O
que contrasta com a fala anterior do enfermeiro que tenta “(...) conversa com a família tenta
apoiar a família, (...)” e da ACS4 que informa “A gente orienta,” que buscam se aproximar
das famílias, por meio de orientação e visita domiciliar, algo que não se repete com aqueles
três participantes. Diante disso, poderia se perguntar: Essa dificuldade é algo apenas
percebida por esses profissionais ou seria um problema para a equipe? Alguns membros da
equipe veem a participação da família no tratamento de pessoas com transtornos mentais
severos e persistentes como uma dificuldade, e outros ainda acreditam em uma possibilidade
de mudança?
Por consequência, a dificuldade em relação à família não é um elemento que aparece
como necessidade de discussão nas reuniões de matriciamento, mesmo sendo essa a única
75

dificuldade apontada por três dos oito entrevistados. Tal tema poderia ser mais abrangido em
discussão com as equipes que oferecem apoio matricial, para a criação de estratégias para
maior vinculação e aproximação das famílias. Dessa maneira, é notória a ausência da família
enquanto partícipe do tratamento, visto que é ela que se encontra mais próxima da pessoa com
transtorno mental e muitas vezes este demanda um cuidado mais sistemático, que ultrapassa o
realizado em instituições de saúde. Assim, uma das barreiras que a equipe ainda precisa
enfrentar é sair do modelo clínico e pontual de atendimento, para uma compreensão mais
contextual do sujeito, a partir de sua família, sendo que este é um dos elementos que circunda
o usuário. Nesse sentido, esse contato poderia transcender essa relação pontual, uma vez que é
tocada por outros elementos, como contexto do sujeito, por seu território. Segundo Ferreira
Neto (2011) há uma necessidade em considerar a família e a integração com sua comunidade
e um modo de fazer sob uma perspectiva clínica que compreenda e interaja com os elementos
da cidade e que dão contorno à subjetividade do utente. Como o autor há uma influência da
clínica privada para a atuação nos contextos públicos, servindo de paradigma para o
entendimento de uma clientela que difere do âmbito privado, tanto em condições financeiras,
como sociais. A relevância de aproximar a família da comunidade tem como objetivo
potencializar o andamento do tratamento. No entanto pode haver uma crença de despreparo
tanto de atuações anteriores como de aporte teórico para o desenvolvimento de trabalhos com
o grupo familiar, como os participantes de outro estudo (Ferreira Neto, 2011).
O cuidado com a família estaria ligado ao modo como ela lida com o usuário, o que
pode ser entendido também como a inclusão dela no processo de atenção ao usuário
(Dimenstein et al., 2016; Onocko Campos, 2001). Assim, a família se vê contemplada na
atenção em saúde, o que vem a fortalecer o vínculo com a unidade, bem como estimular e
viabilizar um cuidado conjunto da família e a EqSF em prol do utente.
A falta de auxílio do grupo familiar pode estar relacionada ao desconhecimento da
condição do ente com transtorno mental desconsiderando até a psicopatologia (Dias, 2011). O
desconhecimento está mais presente no relato da médica da USF urbana, no qual informa que
“(...) é a família que nunca diagnosticou este tipo de pessoa, então ela deixa a pessoa vir
sozinha e a gente tem dificuldade para colher a história, dificuldade para saber os tipos de
medicamentos”. Nesse trecho, a médica percebe a necessidade da família saber do diagnóstico
para acompanhar o utente nas consultas médicas e assim participar do tratamento, pois podem
faltar muitas informações para a compreensão da história de vida do indivíduo e um
conhecimento mais contextual das relações que se estabelecem. De forma semelhante, o
médico apresenta a dificuldade em relação à família, por meio de uma relação com uma
76

situação vivenciada em um hospital psiquiátrico “(...) a família não queria dar remédio, não
entendia que o paciente tinha uma doença achava que era fingimento e tudo mais”. Além do
desconhecimento da família apontado pela médica, o médico sinaliza que haveria uma
concepção estigmatizadora dos transtornos mentais, no qual a família acreditaria “que era
fingimento”, compreensão que se antepõe ao tratamento e diz respeito a uma ausência de
validação sobre o que não tem substrato orgânico. No entanto, esboça a ausência de
informação para a família quanto à patologia, ao tratamento e o seu papel inserido neste
último, como mais um recurso de acesso do ente que demanda cuidados em saúde mental.
Além disso, a dificuldade observada pela enfermeira, que “(...) e a família ainda tem algumas
dificuldades assim, auxiliar no medicamento, em evitar que os surtos aconteçam. Então esse é
o nosso maior desafio (...)”, também aparece em outra pesquisa com esta categoria em ESF,
na qual a família não contribuiria com o cuidado na organização da medicação (Rosa &
Labate, 2003). E quando nota-se na perspectiva da enfermeira que a família não contribui na
entrega da medicação para o usuário, a equipe assume o papel de dispensar a medicação para
o sujeito, o que sugere dificuldade na vinculação, ou compreensão do diagnóstico, ou até
cuidado com o ente.
A informação sobre o transtorno e manejo pode então, ser compartilhada e trabalhada
junto à própria EqSF a partir da construção do vínculo com as famílias para um trabalho em
conjunto, para responsabilização e construção de novas ações (Machado & Pereira, 2013;
Moura & Silva, 2015). Já o discurso do médico da USF Rural como se observa “Então o
mais difícil para nós de PSF é porque a gente tem que abordar toda a família, no consultório
ás vezes o psiquiatra, o especialista no CAPS vê o paciente, medica e pronto” apresenta uma
dificuldade de compreensão da dimensão da política pública de atendimento ao grupo
familiar, visto que essa não é dissociada de seu contexto familiar. Isto está localizado em suas
comparações com os atendimentos hospitalares e em clínica privada, o que destoa da proposta
de atenção à família e reduz uma compreensão pautada no contexto em um atendimento
clínico pontual. E a concepção de que no CAPS a atuação do especialista se reduz apenas à
medicação, vista em “(...) o especialista no CAPS vê o paciente, medica e pronto” também
seria restritiva de tal maneira que obscurece as demais propostas deste serviço, tais como
visitas domiciliares, grupos com familiares, dentre outros realizados nesse dispositivo de
saúde mental (Conselho Federal de Psicologia, 2013; Figueiredo, 2005).
77

4.2.4 A compreensão sobre a complexidade da atenção

É perceptível, na atuação profissional, uma dificuldade de compreensão acerca da


complexidade da atenção em saúde no nível básico de um dos participantes. A Atenção
Básica é tida pela médica como uma atuação mais fácil por ocorrer no nível básico de
assistência, como se pode identificar a seguir:
Mas assim, é (pausa) eu prefiro mais trabalhar na Atenção Básica “né” (sic),
enquanto não tem especialização pela facilidade e pelo contato que você tem “né” (sic), com
a população. (M1)
A médica sinaliza em seu discurso que prefere trabalhar na Atenção Básica por não ter
especialização, sugerindo uma facilidade, o que pressupõe que a atuação na complexidade
básica seria mais fácil. Esse discurso desconsidera a amplitude das demandas e das ações
realizadas para abranger as diversas problemáticas na Atenção Básica para que não requeiram
maior complexidade.
Essa concepção de facilidade na Atenção Básica apontada pela médica no trecho “eu
prefiro mais trabalhar na Atenção Básica “né” (sic), enquanto não tem especialização pela
facilidade” também está presente na pesquisa de Cecílio et al. (2012) na qual alguns
participantes, usuários de uma unidade de saúde, expressam que a UBS seria para lidar com
problemas mais simples. Essa percepção é reforçada pela crença de que o médico generalista
teria menos assertividade em relação às problemáticas apontadas. Assim esse discurso
desvaloriza a própria ação do profissional e deixa de lado a sistemática do cuidado e a
capacidade de resolutividade na Atenção Básica. Vale salientar que o termo Atenção Básica
foi adotado no Brasil, ao invés de Atenção Primária internacionalmente reconhecida, devido a
este último estar ligado a algo primário, que seria destinado apenas para populações de baixo
poder aquisitivo (Oliveira & Pereira, 2013). Diferentemente, no Brasil, é adotado o termo
Atenção Básica, pois essa assistência em saúde não é apenas um direito básico à saúde para
uma parcela dos cidadãos, mas para toda a população, sendo um direito de todos. Nesse
aspecto, mesmo em relação com outros níveis de assistência, por intermédio do
matriciamento, há uma supervalorização das maiores complexidades em prol da básica.
De maneira semelhante há um fluxo da Atenção Básica para a Média Complexidade,
como se a primeira funcionasse como um direcionamento para as especialidades. No trecho
abaixo, é subentendido que se recorre ao encaminhamento nos casos de pacientes com
transtornos mentais severos e persistentes, como se entende:
78

Então, assim, não tem condição de ficar com um paciente, atendendo. Lógico que a gente tenta o
máximo possível a melhor consulta. No severo, grave a gente sempre busca apoio de, do psiquiatra, do
psicólogo, do apoio de assistente social, terapeuta ocupacional é muito importante, “né” (sic). (M2)

A partir da percepção do médico da USF Rural, o transtorno mental severo e


persistente não poderia ser tratado apenas no nível básico, visto que os profissionais que seu
discurso evoca não prestam serviço na região rural pela Atenção Básica, mas sim na Média
Complexidade, como em dispositivos como o CAPS II. Assim, o profissional deixa de
considerar a possibilidade de atendimento na Atenção Básica, ainda que tivesse condições de
prestar, visto casos de transtornos severos e persistentes, nos quais as pessoas recebem alta de
serviços como o CAPS e são encaminhados para as USF. Além disso, perde-se neste relato a
concepção de que, mesmo havendo um encaminhamento para maior complexidade, o usuário
e sua família ainda são abrangidos e devem ter como referência primária a Atenção Básica.
Essa percepção se propaga e está presente no estudo de Cecílio et al. (2012), a
concepção de que a unidade de saúde seria apenas um meio para terem acesso às
especialidades, uma vez que para o médico “não tem condição de ficar com um paciente,
atendendo”. Sob essa perspectiva, se não há condição de ficar atendendo este tipo de paciente:
como seria o trabalho com a Saúde da Família em relação à pessoa com transtorno mental e a
sua família? A USF não seria mais uma referência para esse usuário, com o encaminhamento?
Segundo Cecílio et al. (2012), o médico generalista passa a ser visto como um
encaminhador de uma demanda e a unidade como essa via pela qual o encaminhamento se
realizaria, principalmente quando o médico afirma que “No severo, grave a gente sempre
busca apoio de, do psiquiatra, do psicólogo, do apoio de assistente social, terapeuta
ocupacional”, uma vez que tais profissionais são da Média Complexidade. Consequentemente
tal serviço passa a ser reconhecido pela lógica do encaminhamento e aí sim perde sua
resolutividade (Aciole & Oliveira, 2017). E frente a essa nova referência: como o
encaminhamento seria conduzido, recairia em uma desresponsabilização da unidade sobre o
usuário? (Lucchese et al., 2009; Mendes, Oliveira, & Constantino, 2011).
De forma distinta do discurso do médico, os participantes da pesquisa de Fernandes et
al. (2017) apontaram que tais transtornos teriam sim a possibilidade de receber assistência em
saúde na Atenção Básica. Entretanto conforme os autores seria necessária uma consultoria de
um psiquiatra, o que poderia ser sanado se o psiquiatra da rede ou do CAPS participasse do
matriciamento. Um dos recursos que difere da pesquisa, era o fato de que no estudo de
Fernandes et al. (2017) faziam parte da equipe matricial um psiquiatra e um psicólogo, já as
79

equipes do CAPS II e NASF observadas não contavam com a figura de um psiquiatra. Vale
ressaltar que diferente da USF urbana, na qual havia a presença de um psicólogo que atuava
mensalmente na unidade, além do apoio matricial contar com dois psicólogos (um do CAPS e
outro do NASF), na USF rural a figura do psicólogo não aparecia nem no matriciamento. Já
de modo semelhante os médicos diagnosticam, prescrevem e costumam referenciar para o
psiquiatria de ambas as unidades observadas.

4.2.5 Síntese da categoria

Em relação à atuação das equipes relacionadas ao atendimento das pessoas com


transtornos mentais, foram encontradas algumas subcategorias que são diretamente
relacionadas ao desenvolvimento deste trabalho. As demandas mais frequentemente
observadas em ambas as unidades foram a depressão e a esquizofrenia, sendo os transtornos
mentais severos e persistentes que mais atravessam suas ações, os quais demandam mais do
apoio matricial, mas como observado, nem tanto em quanto discussão sobre a temática e sim
como a discussão de casos clínicos que foram pouco sistematizados. Os procedimentos
mencionados foram consulta, anamnese, diagnóstico, visita domiciliar e orientação. Houve
perspectivas distintas quanto ao diagnóstico imediato e um diagnóstico com mais tempo de
avaliação, bem como um enfoque na realização de visitas domiciliares, tidas como meios de
maior contato com o usuário e assistência às famílias. Como intercorrência nota-se um
distanciamento da família como parte do cuidado com o ente com transtorno mental, o que
pode sugerir dificuldade no estabelecimento do vínculo com a unidade. Nesse sentido, há uma
necessidade da construção de estratégias, até mesmo no matriciamento de como romper e
aproximar a família do tratamento e da unidade. Consonante a isso, há um descrédito por
parte de alguns profissionais sobre a complexidade na Atenção Básica, a qual pode estar
reforçando esse distanciamento, uma vez que se percebe a ESF como lugar do que é simples,
não se acredita que seria espaço de grandes mudanças na vida do utente e apenas quem
poderia ser agente de mudança estaria localizado nas especialidades em saúde.

4.3 A educação permanente dos profissionais

Tal categoria se associa a um dos objetivos que diz respeito à compreensão sobre a
educação permanente em saúde mental das EqSF para seu trabalho com indivíduos com
80

transtornos mentais severos e persistentes. Essa categoria possibilita entender como os


sentidos e o manejo se desenvolveram na atuação cotidiana dos profissionais em relação aos
utentes com transtornos mentais. Demonstra uma construção que perpassa a experiência
social, profissional e a viabilidade de uma mudança e aquisição de conhecimentos por
intermédio da educação permanente realizada nos matriciamentos com o NASF e o CAPS II,
no que tange à saúde mental. Assim, será apresentada a formação de todos os participantes
entrevistados para uma compreensão de quais foram as suas aproximações iniciais por meio
da educação com a saúde mental até a educação permanente com as equipes matriciais. Nesse
aspecto serão tratadas das graduações, pós-graduações e capacitações como elementos que
contribuíram para o seu posicionamento diante da clientela. Por fim, serão apresentadas as
percepções a respeito das reuniões das EqSF, visando entender a maneira como lidam com a
problemática e a concebem e as reuniões com o NASF e o CAPS II e como realizam o
matriciamento, tendo como foco seu movimento de educação permanente em saúde mental.

4.3.1 Formação em graduação, pós-graduações e capacitações

Nesta subcategoria são apresentadas as formações dos participantes e sua educação


permanente. Educação permanente em relação aos conteúdos de saúde mental, podendo ser
observado o interesse e os movimentos realizados no sentido desses se capacitarem para
atender as demandas de pessoas com transtornos mentais.

Quadro 2 - A formação dos participantes

Participante Graduação Pós-Graduações Capacitações


E1 Enfermagem Especialista em Saúde Pública; Em Saúde Mental
Especialista em Saúde da Família;
Preceptora no SUS; Preceptora em
Residência Médica; e Mestra.
E2 Enfermagem Especialista em Urgência e Emergência -
M1 Medicina - -
M2 Medicina Especialista em Medicina do Trabalho; -
Especialista em Medicina da Família; e
Especialista em Nutrologia
ACS1 - - Em Saúde da
81

Família
ACS2 - - Em Saúde da
Família; e em
Saúde Mental
ACS3 - - Em Saúde da
Família
ACS4 - - Em Saúde da
Família
Fonte: Dados da pesquisa

O quadro acima apresenta as formações de cada um dos participantes para a sua


atuação na Atenção Básica, seguindo seus pré-requisitos como ensino médio completo e para
profissionais de nível superior a graduação. A graduação e a pós-graduação são cursos
realizados em instituições de nível superior ao ensino básico e reconhecidas pelo Ministério
da Educação, bem como conferem títulos aos profissionais da equipe compondo uma
educação formal. Em conseguinte a graduação provê um norte sobre a aproximação do
profissional com a temática da saúde mental, oferecendo elementos a partir dos quais os
conhecimentos prévios, seu manejo e sentidos sobre esta clientela se constituíram até então.
As pós-graduações são componentes da educação permanente a que o trabalhador pode
recorrer e se aprofundar em uma temática que contribuem para o seu fazer cotidiano.
Distintamente as capacitações não necessariamente são compreendidas aqui como associadas
a instituições de nível superior e com reconhecimento pelo Ministério da Educação, como um
ensino formal. Essas podem ser provenientes de minicursos, de ciclos de palestras, ou de
discussões entre profissionais de nível superior com a equipe, além das oferecidas por órgãos
governamentais.
Tanto na formação de pós-graduação, como de graduação é evidenciado o pouco
contato com a temática da saúde mental. Apenas os dois médicos teriam visto em sua
graduação conteúdos em termos teóricos sobre a temática e práticas com a clientela com
transtorno mental. Na graduação, os profissionais de nível superior teriam tido o contato em
estágio com indivíduos com transtornos mentais. Vale ressaltar que está no planejamento do
médico realizar uma pós-graduação a distância em Psiquiatria, para ampliar os seus
conhecimentos, sendo o único dos profissionais de nível superior que apontou o desejo em se
especializar para o cuidado com as pessoas com transtornos mentais. Já as capacitações foram
realizadas com a enfermeira e é relatada por apenas uma das ACS da região urbana que teria
82

feito uma capacitação específica sobre saúde mental. As agentes comunitárias da região rural
informam que não tiveram capacitações específicas sobre saúde mental, apenas sobre saúde
da família.
A enfermeira relata que não teve disciplinas nem viu conteúdos sobre saúde mental na
graduação, sendo dissonante ao estudo de Villela, Maftum e Paes (2013), no qual todos os
cursos de graduação em enfermagem tinham a disciplina ou módulo de saúde mental ou
enfermagem psiquiátrica. Essa ausência ou pouco enfoque na problemática está presente em
cursos que têm apenas um módulo que aborda saúde mental ou as poucas horas dedicadas à
disciplina, o que não oferece instrumentalização teórica para as vivências com o campo, sejam
em estágios nos quais transtornos mentais apareçam ou na atuação profissional cotidiana
(Rodrigues, Santos & Spriccigo, 2012; Villela, Maftum & Paes, 2013). Consonante à
pesquisa de Rodrigo, Santos e Spriccigo (2012), no curso do segundo enfermeiro, havia uma
disciplina que abordava a temática com atividades teóricas e práticas, o que viabiliza uma
compreensão do sujeito em sofrimento psíquico e o desenvolvimento de ações de cuidado em
saúde a partir do conhecimento de modelos psicossociais. E mesmo com a estimulação sobre
a saúde mental, o participante nota que foi desestimulado por seu professor devido ao retorno
financeiro que a atuação nessa área poderia lhe trazer, o que explica um pouco o porquê dele
não buscar uma formação para essa área.
Como foi relatado pela médica em sua experiência de psiquiatria na graduação,
diferente do médico da zona rural que não informou sobre a disciplina em sua graduação, esta
apresentou ter tido a disciplina no terceiro ano do curso de medicina. Não se identificou
quanto conteúdo programático foi ministrado em sua formação, entretanto pode-se considerar
um pequeno investimento em sua graduação. Segundo Pereira e Andrade (2017) a falta de
investimento de conteúdo sobre saúde mental/psiquiatria é muito comum em cursos de
medicina, muitas vezes sem os estágios em campo e a devida supervisão, havendo um
enfoque no paradigma biomédico e hospitalocêntrico, bem como pouca explanação sobre o
paradigma psicossocial de atendimento comunitário. Assim, como a pesquisa dos autores e
relato da participante, há a necessidade de maior atenção à saúde mental na Medicina, para
uma Medicina que considere mais a pessoa e as condições psicossociais da problemática em
saúde.
A pós-graduação foi uma das possibilidades da educação permanente mais procurada
pelos profissionais de nível superior, sendo que: a enfermeira já tem quatro pós-graduações
lato sensu e uma stricto sensu; o enfermeiro tem uma pós-graduação lato sensu, o médico
concluiu três pós-graduações lato sensu; já a médica ainda não iniciou nenhuma pós-
83

graduação. Vale ressaltar que apenas dois desses têm especialização para atuar na Atenção
Básica e nenhum deles tem em saúde mental. Stahlschmidt (2012) salienta que a elaboração e
a consolidação de paradigmas em saúde dependem muito de movimentos de educação
permanente, como de pós-graduações e de capacitações. Sob essa mesma concepção inserem-
se as mudanças nas políticas de saúde mental e o oferecimento de serviços por meio de
cuidados em saúde. Nessa perspectiva a realização de especializações é algo que precisa ser
fomentado pelos gestores, uma vez que há pouco investimento nesse sentido e essa é uma das
possibilidades de educação permanente em saúde.
As capacitações são tidas como uma educação permanente, realizadas tanto pela
enfermeira da unidade, quanto pelo NASF, sendo que a desenvolvida pela gestora não
enfocaria exclusivamente em saúde mental, tendo foco prioritário em hipertensão, diabetes,
dentre outras condições de saúde. No entanto, são propostas capacitações em temáticas
alusivas à saúde mental, das quais a enfermeira e as ACS relataram ter participado, e segundo
Pegoraro et al. (2014) servem de subsídio para o cuidado com as pessoas com transtornos
mentais. Contribuição em relação ao conhecimento que viabiliza o contato com a clientela,
seu manejo, a construção e reelaboração de sentidos, ou seja, uma ampliação no repertório
técnico para atuação do profissional diante a demanda que se altera historicamente a partir de
suas mudanças socioeconômicas e culturais. Portanto ainda é notória a falta de estudos e
capacitações voltadas para a problemática frente à dificuldade em lidar com as pessoas com
transtornos mentais severos e persistentes, bem como sua necessidade (Rosa & Labate, 2003).

4.3.2 Reuniões de matriciamento: do NASF e do CAPS II

Como última subcategoria, foram encontrados posicionamentos da unidade em relação


aos seus sentidos acerca do matriciamento com o NASF e com o CAPS II. Assim, serão
apresentadas as concepções sobre o papel de equipes matriciais na unidade, e também a
maneira como sua atuação é compreendida em termos de relevância e desafios.

Olha o que eu vejo hoje, são os matriciamentos que a gente tem é, que a gente discute isso auxilia
muito, com médico, com os enfermeiros, psicólogos e outros profissionais do CAPS. Então eles ajudam
bastante a nortear, então eu acredito que isso seja um investimento né, de parar para pensar e discutir
sobre isso. (E1)

Então eu acho que é mais no sentido de tentar trocar conhecimento com a gente, de passar algumas
coisas que talvez no dia a dia deles eles tem mais facilidade de lidar com determinadas situações do
que a gente. Então eu acho que é uma questão mesmo de troca de experiências e de troca de
conhecimentos e informação. (E2)
84

Fundamental né, fundamental. Até a gente tem vários, como é que chama (pausa) que a gente fez
aquele dia. Matriciamento a gente faz, era trimestral. Então, assim a gente sente discute os casos e
tudo. É a gente tem um vínculo muito bom, liberdade de ligar qualquer coisa que precisar, a gente,
fazer um encaixe e tudo. (M2)

O apoio deles é muito importante, muito interessante, porque através deles a gente
chega num consenso, tenta resolver aquele problema. (...) Um é (pausa), completa o outro.
(ACS1)
(...) na reunião que a gente faz eles vem procuram saber tudo certinho o que está
acontecendo, para ficar atualizado sobre situação, a gente passa pra eles como está o
paciente e para pelo menos estar sendo informado, “né” (sic). (ACS4)
A enfermeira e uma das agentes da região urbana percebem a importância do
matriciamento, o que é perceptível na fala da enfermeira e da agente comunitária,
respectivamente “os matriciamentos que a gente tem é, que a gente discute isso auxilia muito,
com médico, com os enfermeiros, psicólogos e outros profissionais do CAPS” e “O apoio
deles é muito importante, muito interessante, porque através deles a gente chega num
consenso, tenta resolver aquele problema”. Nesse aspecto, o matriciamento se apresentou
como a realização de discussões, na tentativa de proposições e elucidações sobre os casos das
famílias abrangidas. O que também pode ser visto como a promoção de ações em conjunto,
como a afirmação da agente comunitária “Um é (pausa), completa o outro”. Ou seja, um
complementaria o outro, no sentido de apresentar uma nova perspectiva, fazer novas
propostas de tratamento e até realizar encaminhamentos. A médica não tinha o conhecimento
sobre como era o apoio matricial, justamente porque até a data de sua entrevista não havia
participado de nenhuma reunião de matriciamento, nem de equipe das que foram observadas
pelo pesquisador.
Semelhante à equipe urbana na EqSF Rural não houve, consenso entre o
matriciamento de modo geral, porém em sua maioria os profissionais relatam que há uma
contribuição do CAPS II em relação à compreensão e ao encaminhamentos dos casos. Na
zona rural, M2 nota a importância do apoio matricial como possibilidade de discussão de
casos e maior compreensão sobre esses, como se observa “(...) a gente sente discute os casos
e tudo”. Aliás, a aproximação com as especialidades segundo o médico facilita o atendimento
do usuário, por meio de encaixes, tal como pode se identificar no trecho “É a gente tem um
vínculo muito bom, liberdade de ligar qualquer coisa que precisar, a gente fazer um encaixe
e tudo”, percepção que se assenta sob a lógica dos encaminhamentos. Para o enfermeiro o
matriciamento seria uma troca de conhecimentos e um aprendizado mútuo entre as equipes,
perceptível na afirmação “Então eu acho que é mais no sentido de tentar trocar conhecimento
85

com a gente, de passar algumas coisas que talvez no dia a dia deles eles têm mais facilidade
de lidar com determinadas situações do que a gente” E essa troca de conhecimentos da
experiências, por meio de discussões e informações, pode estar associada ao desenvolvimento
de uma educação permanente na unidade. Uma das agentes comunitárias (ACS4) compreende
o matriciamento como uma maneira de manter os profissionais do CAPS a par da situação
atual dos utentes, o que é visto neste fragmento “para ficar atualizado sobre situação, a gente
passa pra eles como está o paciente e para pelo menos estar sendo informado”. Nesse trecho,
é perceptível a noção de matriciamento como um movimento de “passar o caso”, em outras
palavras, de informar a condição atual para conhecimento, porém o simples ato de apresentar
a condição atual do sujeito sem problematização não vislumbra possibilidades de mudança e a
discussão em si se perde nesta proposta. Entretanto, a maioria dos participantes atribui
significações positivas ao modo como o matriciamento é desenvolvido e a sua proposta,
apontando a discussão de casos como seu maior pilar.
Distintamente duas agentes comunitárias questionam o modo como acontecem tanto o
matriciamento e como percebem a efetividade do trabalho no apoio matricial. Elas
demonstram um desencontro do que se espera com o que acontece em seus discursos.

O CAPS vem, ajuda sim. Nem sempre é pontual, sempre deixa a gente esperando. A última vez eles
deixou todo mundo esperando feito tonta, mas ajuda. Agora o NASF (pausa), pra gente não tem muita
utilidade não. Agora que começou o psicólogo, “né” (sic). Mas é, pra ser bem sincera não tem muita
utilidade não. (ACS2)

(...)Eu acredito assim, que quando a gente tem os matriciamentos, a gente discute os casos, a gente
passa o que está acontecendo, eu acredito que eles poderiam estar visitando estes pacientes pra ver
uma realidade física, estrutural, como que é a família, como que é a casa. (...)A, eu assim, eu não acho
muito bacana não, na verdade quem resolve é a gente mesmo, a gente que acaba resolvendo, eu acho
que eles não resolvem muita coisa não. (...) Aí, papel, papel, papel, estar indo lá estar passando numa
consulta psiquiátrica, estar sendo medicado e pronto. (ACS3)

Quando a ACS2 foi questionada se o NASF contribui para outras questões de saúde, a
profissional acrescentou:

(silêncio). Pode falar isso (pausa), não (risos). Ah, o nosso NASF é muito fraco, muito fraco. Assim,
tanto é que eu vou te falar, a gente tinha um grupo aqui, o grupo “bombava” (sic) de atividade física,
assim de mais de 30 pessoas. Aí a professora vinha um dia, faltava outro, vinha um dia, faltava outro.
Acabou o grupo. O pessoal vinha, chegava na aula não tinha professora, foi desanimando,
desanimando. Parou de vir. O nosso NASF é muito fraco. Agora que tá mudando o pessoal, quem sabe
melhora. Por exemplo o psicólogo é novato, novato para nós, “né” (sic), e a fisioterapeuta é novata.
(ACS2)
86

A agente da USF urbana (ACS2) não considera efetivo o matriciamento realizado pelo
NASF por suas ações descontínuas com a clientela como, por exemplo, em um grupo que a
professora faltava com frequência, como pode ser visto “(...) a gente tinha um grupo aqui, o
grupo “bombava” (sic) de atividade física, assim de mais de 30 pessoas. Aí a professora
vinha um dia, faltava outro, vinha um dia, faltava outro. Acabou o grupo.”. Esse exemplo
apresentado pela ACS2 diz respeito à atuação do NASF diretamente com a clientela, que é
uma das formas de realizar o apoio à ESF. Dessa maneira, é tecida uma crítica a uma das
formas de apoio para a EqSF e considerado o fim de um projeto pela descontinuidade de um
trabalho, considerando que isso prejudica o contato do usuário com a unidade. A ACS2 ainda
questiona os atrasos dos profissionais do CAPS II, mas percebe sua contribuição também “O
CAPS vem, ajuda sim. Nem sempre é pontual, sempre deixa a gente esperando.”. A equipe do
CAPS já seria vista de modo diferente, sendo que a maior proximidade que a EqSF teria com
ele seria por intermédio do apoio matricial e nesse apoio a discussão de casos seria visto como
o objetivo do matriciamento do CAPS. E frente a essa proposta ainda percebe um contributo,
mesmo com seus atrasos. Até então todos da USF rural apontaram perspectivas da relevância
do apoio matricial, apenas outra agente (ACS3) considera que quem resolve a problemática
mesmo é a unidade, como aponta “(...) na verdade quem resolve é a gente mesmo, a gente que
acaba resolvendo, eu acho que eles não resolvem muita coisa não.”. Na afirmação da ACS3,
pode-se notar que não há uma percepção de que a partir da discussão haveria uma elucidação
ou ampliação de visão sobre o caso. A agente demonstra uma expectativa de efetividade no
trabalho cotidiano a partir de visitas e conhecimento sobre o contexto dos usuários por parte
do CAPS, algo explicitado no trecho “(...) eu acredito que eles poderiam estar visitando estes
pacientes pra ver uma realidade física, estrutural, como que é a família, como que é a casa”.
Há uma expectativa de algo que ultrapasse as discussões e perceber uma atuação mais em
conjunto com a EqSF. Assim, as duas agentes apresentam questionamentos entre o que espera
e o que efetivamente acontece no matriciamento.
Nessa perspectiva o apoio matricial pode ser um mecanismo de ação conjunta em
relação à clientela e viabiliza a atuação com a problemática de saúde mental, como salienta a
ACS1 “Um é (pausa), completa o outro” (Amaral et al., 2018; Dantas & Passos, 2018).
Então, na percepção do médico, dos enfermeiros e de duas agentes comunitárias (ACS1 e
ACS4), a atuação do CAPS e do NASF no que tange ao apoio matricial estaria sendo efetiva e
desenvolver-se-ia conforme a sua compreensão primordial que seriam as discussões de casos.
Já a ACS2 acredita que a proposta do NASF deixa a desejar por sua descontinuidade no
desempenho de suas propostas e o do CAPS por sua falta de pontualidade. De modo
87

semelhante, a ACS3 questiona a efetividade do apoio matricial da equipe do CAPS II. Em


relação a essas duas perspectivas divergentes da maioria dos entrevistados, pode-se notar que
o que ambas questionam é uma ação efetiva diretamente com a clientela, para além de uma
discussão, ou de uma proposta apenas medicamentosa.
Na pesquisa de Bispo Junior e Moreira (2018), os integrantes de uma USF também
apontaram frustração em relação ao que esperavam e ao que era realizado por profissionais do
NASF. Tais sentimentos para além da prática estão relacionados a questões técnicas e
administrativas, que perpassam as relações institucionais e sua conflitiva. Já a médica
desconhece o funcionamento do matriciamento, alegando que agora que se tornou fixa na
unidade, porém, mesmo estando fixa, não compareceu a nenhuma das reuniões do NASF que
foram acompanhadas pelo pesquisador. Portanto é de suma relevância a participação de todos
os integrantes da EqSF nas reuniões de matriciamento, não apenas para ter conhecimento do
fluxo de cuidado com a clientela, mas também para um movimento de educação permanente e
aprimoramento de conhecimento do profissional e aperfeiçoamento de sua atuação na atenção
em saúde para a população. Para além disso, faz-se necessária a compreensão do papel do
apoio matricial de seus objetivos para um trabalho conjunto mais consciente sobre a atuação
das equipes matriciais.
No relato de uma participante, pôde-se notar inclusive uma demanda e um
questionamento em relação ao apoio matricial que apresenta o desejo de uma educação
permanente para além de discutirem os casos, também abordarem temáticas de saúde mental,
como pode ser visto abaixo:

(...)Algumas vezes, até algumas informações bacanas, sabe no começo quando a gente começou foi bem
legal, que o psiquiatra vinha, ele falava a respeito das doenças, dos quadros de doenças, das formas de
lidar. Agora eu acho que não, sumiu esse interesse. Vem pergunta do paciente, você fala o paciente está
estável, está tomando a medicaçãozinha, beleza, ponto. (ACS3)

Na entrevista, a agente comunitária (ACS3) questiona que não há mais uma


preocupação do CAPS II nos matriciamentos de discutir problemáticas, o que pode ser
visualizado no fragmento “(...) no começo quando a gente começou foi bem legal, que o
psiquiatra vinha, ele falava a respeito das doenças, dos quadros de doenças, das formas de
lidar. Agora eu acho que não, sumiu esse interesse.”. Na perspectiva da agente comunitária
“sumiu esse interesse”, ela acredita que essa preocupação em discutir, por exemplo, as
condições psicopatológicas e o manejo com a clientela teria desaparecido. Simultaneamente
essa queixa diz da falta de contribuições do apoio matricial no sentido de uma educação
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permanente, construindo conhecimentos específicos com a equipe da unidade, que é algo de


que notadamente a agente sente falta. Há uma crítica também ao apoio matricial apenas como
um movimento de passar a condição de um caso como na afirmação “Vem pergunta do
paciente, você fala o paciente está estável, está tomando a medicaçãozinha, beleza, ponto.”.
Conforme relatado pela agente, sob essa visão não haveria uma problematização e o que seria
uma discussão se encerra na medicalização do sujeito, quando diz “tomando a
medicaçãozinha”. É retratada uma redução do sujeito apenas ao aspecto orgânico e a atuação
à prescrição da medicação, como se o sujeito fosse apenas alvo de cuidado em seu momento
de crise e visto por seu momento disfuncional. Nesse escopo, a participante apresenta em seu
discurso uma necessidade de uma maior problematização no apoio matricial, de que as
equipes que realizam o matriciamento possibilitem mais oportunidades de aprendizado com
este, bem como construções de estratégias para ampliar o cuidado.
De modo dissonante de um sentido elencado ao exercício da equipe matricial como
atendimento especializado, a afirmação da ACS3 demonstra a relevância desse apoio ocorrer
para a além de uma exposição de casos, mas por intermédio das discussões e capacitações
como componentes de uma educação permanente (Bispo Junior, & Moreira, 2018). Questiona
um enfoque de trabalho pautado em apenas uma diretriz que seria a discussão para uma visão
mais ampla. Essa perspectiva propõe deixar de ter um foco no matriciamento como em outros
estudos, como discussões de casos, com possibilidade de ações conjuntas como, visitas,
encaminhamentos e estudos de casos com a rede de modo geral (Cirilo Neto & Dimenstein,
2017). Entretanto, atuações como essas podem ser solicitadas e colocadas em pauta pelas
próprias unidades que podem sinalizar essa necessidade que, mesmo sendo um dos papéis das
equipes de matriciamento, as EqSF têm liberdade de questioná-las sobre isso. Tais ações
compõem o que se espera do apoio matricial, porém não são tudo que o matriciamento pode
oferecer, este ainda tem uma dimensão de educação permanente, que ultrapassa o
conhecimento adquirido no questionamento e proposição sobre a condição e ações em relação
ao usuário, ele também está nas temáticas e sentidos que atravessam e perpassam o utente
(Batista et al., 2017; Costa, Lima, & Fioroni, 2015). E é na discussão e reconstrução de
saberes que a educação permanente acontece e é isso que se apresenta também como demanda
das equipes em relação aos profissionais que oferecem matriciamento. Segundo se observam
nas pesquisas, a educação permanente tem pouco espaço no apoio matricial, assim como neste
estudo e tem sido alvo de questionamento, sendo que mais uma vez como aqui tem havido
pouco investimento no conhecimento sobre saúde mental. Assim, também há uma
89

obnubilação acerca do que se tem como parâmetro para o matriciamento e como ele vem
acontecendo na visão dos entrevistados, não sendo algo claro para os participantes.

4.3.3 Síntese da categoria

Com base nos resultados, a atuação dos profissionais vista a partir da educação
permanente elencou algumas temáticas tais como: a formação em pós-graduação, graduação e
capacitações, assim como, as reuniões de matriciamento. Dos que têm graduação todos
tiveram experiência prática com pessoas com transtornos mentais nesse período de sua
formação, porém nem todos tiveram conteúdos teóricos sobre o assunto. Em relação à pós-
graduação vale evidenciar que nenhum dos participantes de nível superior tem especialização
em saúde mental. Quanto às capacitações apenas dois dos entrevistados relataram ter
capacitações sobre saúde mental. No que diz respeito às reuniões de matriciamento, a grande
maioria dos profissionais das equipes apontou a relevância do apoio matricial, ressaltando a
construção conjunta de conhecimento e a proximidade de outros serviços com a Atenção
Básica. No entanto também houve questionamentos em relação ao trabalho descontínuo, aos
atrasos, às expectativas acerca do que é desenvolvido pelas equipes matriciais, bem como uma
demanda por maior enfoque na educação permanente e não apenas nas explanações sobre os
casos.
90
91

5 DISCUSSÃO

Com base no contato com a literatura e com os participantes, desvelou-se a


experiência de trabalho das equipes de saúde da família em relação às pessoas com
transtornos mentais severos e persistentes. Do encontro teórico como a problemática e das
entrevistas e observações surgiram elementos que viabilizam uma percepção sobre essa
atuação das EqSF, que puderam ser exploradas como categorias e subcategorias. Tais
elementos também têm seus atravessamentos por meio dos quais o trabalho junto aos
indivíduos com transtornos mentais puderam se apresentar, são eles: as dificuldades na
realização do matriciamento, a participação das equipes no matriciamento, as diferenças
contextuais entre território urbano e território rural, a supervalorização de uma lógica pautada
nas especialidades e a educação permanente como elemento a ser priorizado.
Ambas as unidades de saúde demonstraram dificuldades na realização do
matriciamento e das reuniões de equipe. Essas dificuldades dizem respeito à compreensão do
apoio matricial e das reuniões de equipe como ações de suma relevância para a equipe, das
condições de mobilidade e da execução de propostas com as equipes que realizavam o
matriciamento. As duas USF observadas mudaram as reuniões com frequência priorizando o
contato com o usuário, porém nas reuniões é que seu manejo poderia também ser construído e
planejado. Com a ausência de reuniões, poucas ações são pensadas tendo como base que as
decisões e formação de concepções podem ser compartilhadas com as equipes. De modo
semelhante houve entraves em relação à mobilidade dos profissionais do CAPS II e do NASF,
ligados à falta de combustível para a sua presença no desenvolvimento do apoio matricial nas
unidades e o automóvel estar retido devido a questões administrativas. São assim,
intercorrências que se antepuseram ao acompanhamento sistemático das reuniões.
Quanto à participação das equipes nas reuniões de matriciamento, sinalizam-se alguns
pontos nos quais houve poucas manifestações dos profissionais da Saúde da Família nas
discussões, assim como sua presença física na sala de reuniões. As pequenas manifestações
referem-se em sua maioria aos participantes não terem apresentado, nas reuniões, as questões
percebidas nos resultados, como a dificuldades de alguns membros em lidar com a família do
usuário de saúde mental, bem como quanto a solicitações de informações a respeito da saúde
mental. Dessa forma, ambas as equipes demonstraram dificuldade em relação às famílias, mas
nenhuma delas levou essa questão para a discussão em equipe, ou até requereram capacitação
para o cuidado em relação ao manejo com a família. As duas equipes também não sinalizaram
92

em nenhum momento uma demanda em relação a conteúdos de saúde mental nas reuniões. A
USF urbana ainda se destaca por não solicitar informações acerca de transtornos mentais
quando arguida pela equipe do NASF em uma das reuniões. Soma-se a essa questão a
ausência de membros da USF urbana em reuniões de equipe como a falta da enfermeira
(coordenadora da USF) em uma dessas e a falta da médica nas primeiras reuniões observadas,
o que pode ser relacionado ao seu desconhecimento acerca do funcionamento de
encaminhamentos para a rede. Nesse sentido a participação de toda a equipe é de extrema
relevância para a pactuação de ações, informações sobre o fluxo, alinhamentos de
procedimentos, bem como uma problematização sobre as temáticas de saúde mental.
Nas reuniões ainda ficou claro o desinteresse sobre a saúde mental nas duas unidades
escolhidas, como fruto de um investimento (Pereira & Andrade, 2017). Na USF urbana, em
nenhuma das reuniões de equipe, foram abordadas informações que fizessem alusão aos
transtornos mentais, bem como na última reunião de matriciamento realizada com a presença
do NASF. Já na reunião desenvolvida pelo CAPS foram discutidos casos sobre saúde mental
e abordada uma condição de adoecimento, porém sem muita problematização. Já quando
perguntado sobre o que gostariam que a equipe do NASF abordasse não apontaram nenhum
tema de interesse, sendo um sugerido por uma profissional do NASF. Sob tais condições há
de se considerar pouco interesse da EqSF urbana em tratar sobre saúde mental, pois em
nenhum momento esses profissionais sugeriram ou perguntaram nas reuniões mais sobre as
condições psicopatológicas. Em relação à EqSF rural esta demonstrou maior preocupação
com a problemática de saúde mental, a partir das discussões de caso em equipe. Entretanto,
assim como na maioria das reuniões da USF urbana, na rural não houve abordagens sobre a
educação permanente, exceto na discussão sobre o suicídio empreendida pelos profissionais
do CAPS II. Dessa forma, nota-se o pouco interesse das equipes em se colocar, perguntar e
construir conhecimentos em relação aos atravessamentos da saúde mental. Semelhantemente
às equipes matriciais praticamente não se dispuseram a tratar da educação permanente em
saúde mental.
Os territórios das unidades apresentaram diferenças, uma vez que os território são os
âmbitos a partir dos quais os cidadãos se constituem e constroem um saber coletivo e por
meio destes se posicionam socialmente, politicamente, em relação ao labor, dentre outras
formas (Ferreira Neto, 2011). Nesse sentido, a população rural tem acesso a poucos serviços
neste território, mas se organiza para ter uma participação social, como por exemplo a partir
do Conselho Municipal do Desenvolvimentos Rural Sustentável (CONDRAS) que está ligado
ao desenvolvimento sustentável das produções agrícolas no município. Aliás, esta população
93

predominantemente obtêm seu sustento da agricultura e estabelece suas relações neste


contexto. Já quando necessita ter acesso a outros serviços as pessoas com menor poder
aquisitivo dependem de vale transporte nos poucos horários que o transporte coletivo dispõe,
sendo esses fatores que perpassam o modo como este território rural se apresenta. No
território urbano os cidadãos tem acesso ao trabalho em seu bairro, mas principalmente no
centro da cidade, tem seu ambiente de socialização a partir de amplos dispositivos, como por
exemplo a partir de instituições que se dedicam ao oferecimento de atividades esportivas e de
lazer. Além disso, a população pode participar da execução dos serviços por intermédio dos
conselhos municipais, uma vez que a cede deles se encontra no centro do município. E vale
ressaltar que, muitos ainda podem precisar de vale transporte, mas mesmo assim, tem mais
condições de mobilidade nos espaços urbanos.
As diferenças marcantes entre os contextos rural e urbano estiveram mais fortemente
presentes na ausência de recursos de serviços no âmbito rural em relação ao urbano. Sob a
ótica do território ambas as unidades de saúde se inseriram conforme Souza e Andrade (2014)
nestes contextos dinâmicos, haja vista, que na zona urbana a EqSF permanece fixa em uma
unidade, sendo referência de alguns bairros, já na região rural há várias unidades, mas apenas
com uma equipe que circula por essas USF semanalmente. Desta maneira, na USF rural não
havia equipe completa na unidade todos os dias, uma vez que eles circulavam pelas USF,
assim como outros dispositivos como CRAS que era volante, não tendo uma base fixa. Tal
como Silva, Dimenstein e Leite (2013) o acesso da população rural aos serviços se vê
fortemente prejudicado, como o CAPS, por exemplo, que é caracterizado como um
dispositivo urbano, bem como a dificuldade desses cidadãos no acesso à zona urbana, tais
como serviços de assistência social e educação. Dessa forma, serviços como o CAPS se
encontram mais distantes do contingente rural, o que foi apontado como necessidade de estar
mais presente. Semelhantemente, o NASF também não se aproxima dessa população, o que
prejudica ainda mais a atenção em saúde dessas famílias. Dessa feita, o NASF não desenvolve
na zona rural o papel que realiza na região urbana, de atuação direta com a clientela,
discussões de caso e educação permanente, deixando assim uma lacuna no cuidado com a
clientela, que tem um percurso dificultado para ter suas demandas atendidas, quando não as
deixa negligenciadas pelo caminho dificultoso que tem de percorrer. Em relação às unidades
rurais, é notável a ausência de salas de vacina e com isso, nas campanhas de vacinação, a
equipe rural precisa se organizar para trazer as vacinas e aplicá-las nos mesmos dias que
trouxerem. Muitos ainda contam com o apoio dos empregadores para o deslocamento, sendo
que apresentam condições socioeconômicas muito baixas para o seu deslocamento. E, devido
94

a essas condições de subsistências bem restritas, alguns acabam optando por se mudar para a
zona urbana, em busca de melhores possibilidades de vida.
O trabalhador rural tem sua saúde mental sujeita a “fatores sociais, raciais, de gênero,
econômicos, tecnológicos, organizacionais, ao perfil de produção e consumo, além de fatores
de risco de natureza física, química, biológica, mecânica e ergonômica presentes nos
processos de trabalho rural” (Cirilo Neto & Dimenstein, 2017). Da mesma forma a população
urbana é influenciada por tais condições, o que muda é o contexto, o território, o fato de
estarem imersos espaços distintos e com diferentes possibilidades, culturas e acesso à
mobilidade e aos serviços, o que afeta o âmbito laboral, social e de lazer, e compõem o
quadro patológico de cada população. E tal contexto é pano de fundo para a formação das
demandas mais frequentes, como as mais informadas nas entrevistas. Todavia, nas reuniões de
ambas as unidades observadas, a esquizofrenia e a depressão são os transtornos que mais
aparecem, assim como os transtornos mentais devido ao uso de substâncias psicoativas, algo
também presente nas entrevistas. Tal como os autores afirmam, o uso de substâncias
psicoativas pode estar relacionado ao tráfico e à progressão de violência no contexto rural.
A pesquisa de Uchoa et al. (2011) aponta que diferentemente de outros contextos
rurais, tais como da USF de pequenos municípios do Rio Grande do Norte, que contava até
com cuidado odontológico, as USF rurais pesquisadas tinham suas peculiaridades. A equipe
rural deveria atender a todas as seis fazendas durante a semana e não contava com apoio
odontológico, para tal os usuários deveriam ser referenciados para serviços urbanos,
deparando-se com a mesma problemática de ausência de mobilidade para a zona urbana. Ou
seja, além das condições materiais parcas, havia deficiências de pessoal para atendimentos, tal
como a fisioterapia, visto que a fisioterapeuta havia sido dispensada pela pequena carga
horária que esta poderia oferecer no mês para o atendimento à clientela.
Segundo Cirilo Neto e Dimenstein (2017) é marcante no contexto rural a ausência de
meios de comunicação, como telefone, modem de internet, rede de celular, algo muito
perceptível nas unidades rurais que em sua maioria não contavam com telefone e não tinham
sinal de celular, o que dificultava o acesso do pesquisador à equipe. Aliás, esta falha na
comunicação, é mais uma dificuldade colocada para o acesso do usuário à assistência
prestada. Nesse sentido, a USF urbana também apresentava essa problemática, sendo que seu
único telefone fixo não funcionava, incluindo o aparelho celular disponibilizado pela
Secretaria Municipal de Saúde, o único dispositivo de comunicação utilizado que funcionava
e que foi passado para o pesquisador foi o telefone celular da enfermeira da unidade. No
entanto, mesmo com essa similaridade na dificuldade de comunicação, todas as operadoras
95

funcionavam na região urbana e o acesso tanto à equipe, quanto aos outros serviços da rede é
muito mais facilitado, visto as condições de mobilidade da zona urbana, como: ônibus com
frequência de 30 em 30 minutos, mototáxi, UBER, táxi, dentre outros. Vale ressaltar que
ações como palestras educativas desenvolvidas pelos participantes da pesquisa dos autores
não aparecerem na atuação tanto dos profissionais rurais, quanto dos urbanos.
Destarte, o constante encaminhamento do usuário pelo agente comunitário ao médico,
bem como a conduta médica observada sugere um estímulo à prescrição, ou direcionamento a
um nível mais especializado, mais sinalizado no discurso da enfermeira da zona urbana e do
médico da zona rural (Aciole & Oliveira, 2017). Conduta que não é muito visível no relato da
médica da zona urbana por seu pouco conhecimento sobre o fluxo da rede, que solicita
informação à enfermeira da unidade. Essa realidade se assemelha ao que foi percebido na
pesquisa de Cirilo Neto e Dimenstein (2017) sobre a prevalência no caráter prescritivo e de
encaminhamentos para médicos da unidade ou para um nível de maior complexidade. Em
relação a esses encaminhamentos, é notável o direcionamento das pessoas com transtornos
mentais severos e persistentes para as especialidades, como apontado pelo médico: esses
indivíduos deveriam ser encaminhados para maior complexidade, essa fala é reiterada no
discurso da médica que aponta a Atenção Básica como mais fácil.
Há uma atribuição supervalorizada das especialidades em relação ao sujeito, ao passo
que essa é a uma estratégia priorizada pelas equipes que demonstram acreditar que o melhor
desenvolvimento de cuidado para pessoas com esses transtornos seria na Média
complexidade, ou a partir da medicalização delas. Esse discurso também desconsidera a
capacidade de resolutividade da unidade de saúde de lidar com condições mentais mais
graves. Tal percepção dificulta ou até inviabiliza o tratamento do usuário com transtorno
mental severo e persistente que retorna de dispositivos de média complexidade (como, por
exemplo, o CAPS) para o nível básico, em USF. Uma vez que é de grande relevância a
continuidade do cuidado desse sujeito nas USF, como meio de maior participação comunitária
e acesso a outros serviços da RAPS. A mesma concepção inclusive deixa de lado a
possibilidade de atenção em saúde na Atenção Básica, a qual pode se valer de outras
possibilidades para o atendimento da clientela. Sob esse panorama não está clara a
compreensão de que, mesmo com o encaminhamento da Atenção Básica para maior
complexidade, os usuários encaminhados continuam tendo como referência a USF. Aliás, o
médico demonstra que essa clientela seria para a Média Complexidade, o que sinaliza a
possibilidade de perda de referência, sendo uma problemática visto que a unidade está
inserida no território e por sua vez mais próxima do usuário, fazendo um elo com a
96

participação na comunidade. Para além disso, a unidade é referência para a família do utente
com transtorno mental e assim é essa aproximação inicial das pessoas com a assistência em
saúde. Portanto, deve evitar posicionamento de desresponsabilização, relegando toda a
atenção a outro serviço.
Tal como a ótica de medicalização apresentada na prática dos médicos, as próprias
famílias consideram a medicação como o único método de tratamento e cuidado,
suficientemente capaz de tratar das diversas condições de saúde (Cirilo Neto & Dimenstein,
2017; Silva, Dimenstein & Leite, 2013). Entretanto essa percepção que é reproduzida e
reiterada pelo modelo biomédico é um dos fatores que se contrapõe ao modelo psicossocial e
um empecilho na conciliação da atuação em conjunto com a família do indivíduo com
transtorno mental. Ou seja, como se espera uma compreensão da família sobre a condição do
usuário e participação do tratamento juntamente com o usuário, mantém sob uma perspectiva
curativa e lança mão primeiro da medicação? Resta a atenção à ressocialização, à
desinstitucionalização e ao enfrentamento a uma concepção estereotipada do sujeito.
Distintamente se apresenta o procedimento levantado por parte dos profissionais,
principalmente pelo enfermeiro da USF rural que ressalta a possibilidade da visita domiciliar
como meio de aproximação com o usuário, assim como, com a família deste (Baralhas &
Pereira, 2010; Koga, Furageto & Santos, 2006). A visita é apresentada como uma via de
acesso às famílias e de construção da noção da unidade como referência. E assim, o
desenvolvimento desse contato deve acontecer visando todas as possibilidades que o sujeito
possa ter de cuidado com sua saúde em seu território, pois se nessa visita já se sinaliza a
medicação e não se exploram outros serviços/procedimentos prováveis, a medicação ou
internação poderá ser a única proposta de tratamento que as famílias terão como válida.
Validade pautada no conhecido, no vivenciado que é transmitido pela comunidade, sobre algo
de que muitas vezes não se tem conhecimento, da psicopatologia, de seu curso, do manejo e
das capacidades de autocuidado do indivíduo que tem o transtorno.
As constantes tentativas dos gestores em naturalizar a condição de transtorno mental
para a equipe, muito presente no discurso da enfermeira da EqSF urbana, são em virtude da
loucura ser fortemente associada à agressividade, o que perpetua o medo e consequentemente
a ausência de atendimento, assim como a aproximação dos agentes no território (Cirilo Neto e
Dimenstein, 2017). Esse distanciamento e essa necessidade de naturalização estariam
relacionados com a falta do desenvolvimento de habilidades para a abordagem dos utentes
diagnosticados com transtornos mentais e usuários de substâncias psicoativas (Machado &
Pereira, 2013). Falta essa observável na ausência de estudos de conteúdos teóricos na
97

formação de membros da equipe para a atuação junto à clientela com transtornos mentais
sejam na graduação da enfermeira da USF urbana, como em capacitações em saúde mental
para os demais profissionais. Há então, uma falta de investimento em aprendizado a respeito
da saúde mental, o que reduz a atuação na proposta exclusivamente de tratamento
medicamentoso e na crença da atenção a essa clientela ser apenas na Média à Alta
complexidade. Consequentemente a ausência de informações sobre saúde mental repercute
nos sentidos atribuídos à clientela, que restringem a percepção com ela e em poucos recursos
a serem ofertados no nível básico.
Entre as críticas realizadas pelas agentes comunitárias às equipes que desenvolvem o
matriciamento, vale destacar a descontinuidade em uma das propostas de atuação com grupos
de idosos. Esse grupo teria sido construído junto à unidade, mas a educadora física teria
faltado constantemente, o que conforme a agente comunitária teria desmotivado os integrantes
do grupo que até então estaria coeso e com isso se desfez. De maneira semelhante, essa
descontinuidade foi observada na reunião do NASF, na qual foi proposta a realização de uma
festa junina, mas na reunião subsequente o tema não foi tratado e a EqSF ficou sem saber
como se realizaria e se ainda aconteceria essa confraternização para organizar os usuários.
Ações em parceria demandam uma coesão tanto dos utentes, como de uma pactuação entre as
duas equipes e de um fluxo constante de informações, o que não aconteceu pela ausência de
feedbacks por parte da equipe do NASF. Assim a EqSF ficou sem saber o que informar aos
usuários, pois não sabia onde se realizaria a festividade. Portanto essa relação entre USF e
NASF demonstrou fragilidade nas propostas, visto que demandava a interação entre mais de
um serviço, principalmente na comunicação como se observou nessa experiência (Campos &
Domitti, 2007; Melo, Miranda, Silva & Limeira, 2018). Dessa maneira, a descontinuidade de
um serviço representa a ausência de profissionais que atuem com o usuário e sua falta no
trabalho com a própria equipe da USF, o que pode ser percebido no questionamento feito pela
agente em relação a uma das atividades do NASF. Essa relação demanda uma maior
comunicação e colaboração para implementar, sustentar as propostas e manter a progressão do
tratamento proposto com a clientela e dessa maneira reduzir essa fragmentação sobre o que se
planeja, para ações mais sistemáticas e efetivas.
As reuniões de matriciamento do CAPS e do NASF enfocaram em discutir casos
clínicos e propor estratégias, sendo pouco percebido um incentivo ou ocorrência de discussões
sobre temáticas alusivas a saúde mental. Nesse sentido a educação permanente teve pouco
espaço tal como, na literatura (Batista et al., 2011; Bispo & Moreira, 2018, Costa, Lima &
Fiorini, 2015). Na reunião com o CAPS, foi observada apenas uma discussão sobre o suicídio
98

e uma pequena problematização, sendo um breve movimento de educação permanente, mas


com pouco referencial científico. Nessa reunião foi prevalente a discussão de casos com
pouca sistematização e constantes direcionamentos para o trabalho do NASF. Já na reunião do
NASF, houve maior espaço para a educação permanente, com discussões sobre as
implicações da implantação de uma horta comunitária para pessoas com esquizofrenia,
arguiram a equipe quanto aos temas sobre os quais mais gostariam de se aprofundar e
discutiram o fluxo em relação a casos de saúde mental. Já na segunda reunião do NASF, não
houve aprofundamentos sobre a problemática estereotipada minimamente levantada. Portanto,
das reuniões realizadas, destaca-se a do NASF que teve maior enfoque em discussões de
temáticas da saúde mental, porém vale salientar que não foi possível observar uma segunda
reunião do CAPS II com a EqSF urbana. Aliás, principalmente nas reuniões de equipe, foram
mais perceptíveis questões sobre puérperas, vacinação, hipertensão e diabetes, enquanto a
saúde mental praticamente não teve espaço. E, conforme os interesses dos profissionais de
nível superior, há pouco desejo em desenvolver novos conhecimentos a respeito das questões
relacionadas às pessoas com transtornos mentais, exceto em relação ao médico e às agentes
comunitárias rurais. Há um esforço destes últimos em buscar conhecimento sobre tais
assuntos de acordo com seus relatos. Dessa maneira, é notável a falta de um caráter
preventivo nas ações na Atenção Básica e um constante trabalho prescritivo.
Como base nas queixas das agentes comunitárias que solicitam em seus discursos
maiores contribuições das equipes matriciais no sentido de uma educação em saúde, é clara a
falta de formação e organização do apoio matricial no sentido de discussões sobre temas de
interesse e de assuntos que insurgem no território (Fernandes et al., 2017). Assim como os
participantes da pesquisa de Fernandes et al. (2017), os entrevistados deste estudo demandam
um processo de aprendizagem contínuo, componente da educação permanente. Neste aspecto,
é perceptível nas reuniões e entrevistas que não está claro o que seria uma educação
permanente em saúde que agregue uma dimensão da educação, nesse processo.
Segundo Silva e Duarte (2015) a educação permanente parte de um quadrilátero:
“ensino, atenção, gestão e controle social”. Essa proposta enfocaria na aprendizagem das
equipes, na atenção a sua problemática advinda da clientela, a gestão, em outras palavras, na
atuação profissional e manejo da equipe, assim como, na facilitação do controle social da
população atendida. Aspectos esses que pouco se apresentaram no desenvolvimento do apoio
matricial, uma vez que teve mais enfoque na atenção à discussão de caso. Esse modo de
educação, é composto pela aprendizagem significativa, para a qual as informações construídas
devem ter instrumentalidade prática e significação para o trabalhador, que parta do seu saber
99

como possibilidade de construção de conhecimentos (Silva & Duarte, 2015). Nessa


perspectiva a educação permanente, seria um processo de aprendizagem que faça sentido para
a prática profissional, considerando o seu fazer cotidiano na elaboração de uma ação da
equipe, o que pode aparecer apenas de modo breve nas reuniões, uma vez que as equipes
pouco se colocaram e houve pouco enfoque no processo de aprendizagem.
De acordo com Bispo Júnior e Moreira (2018) o apoio matricial aonde a educação
permanente deveria acontecer é composto pelas: dimensão pedagógica, dimensão terapêutica
e dimensão institucional, que são consonantes ao quadrilátero. Nesse sentido, a dimensão
terapêutica não é colocada como única, ou principal, mas integra um escopo de ações em prol
de uma qualificação do trabalho. Assim, a dimensão terapêutica teve maior destaque em todas
as reuniões, enquanto a dimensão institucional quase não apareceu apenas na reunião do
NASF, os quais propõem a construção de um protocolo e nas reuniões de equipe. Já a
dimensão pedagógica, apenas foi tangenciada em uma breve discussão na reunião com o
CAPS II na região urbana. E semelhantemente ao estudo de Aciole e Oliveira (2017) há a
necessidade de um investimento em educação permanente, tanto na compreensão de sua
amplitude, como na realização desta aprendizagem pelas equipes do CAPS e NASF junto às
EqSF.
Em suma, mostra-se como relevante um desenvolvimento de estudos relacionados à
educação permanente para maior instrumentalização dos profissionais. Nesse sentido, vale
ressaltar a necessidade de capacitações para além da Saúde da Família que os agentes
comunitários demonstraram ter, mas de capacitações sobre saúde mental para toda a equipe, a
partir de um investimento do munícipio fomentando o cuidado com essa problemática, visto a
existência dessas demandas, bem como o desenvolvimento de capacidades para identificá-la.
Em tal escopo encontram-se como possibilidades a educação formal (filiada a instituições de
ensino) ou informal (realizada pelas próprias equipes no matriciamento) como componentes
da educação permanente. Assim, a gestão poderia investir no conhecimento por intermédio de
instituições de educação para abarcar essa necessidade aventada. Além disso, poderia haver
uma maior preocupação em discutir questões como os sentidos e o manejo e suas dificuldades
em relação às pessoas com transtornos mentais severos e persistentes com as EqSF como, por
exemplo, na divisão de tempo para as discussões de casos e para a educação permanente. Para
isso, a unidade poderia se colocar apontando mais sua problemática e as equipes do CAPS e
NASF selecionando as questões que se colocam nas discussões de caso de modo a
problematizá-las, para que construam um conhecimento conjunto e caracterizado pela
singularidade do território.
100
101

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir dos resultados obtidos pode-se considerar que esta pesquisa foi ao encontro
dos objetivos e viabilizou conhecer a atuação de equipes de saúde da família com as pessoas
com transtornos mentais severos e persistentes, considerando o apoio matricial dos
profissionais do NASF e do CAPS. Dessa atuação emergiram elementos presentes na relação
estabelecida das equipes com os usuários, a identificação sobre o manejo - incluindo
procedimentos - as psicopatologia, as dificuldades e sua percepção sobre a Atenção Básica
com RAPS, assim como a educação permanente, vista principalmente pelo apoio matricial.
Entretanto foi vislumbrado realizar o acompanhamento de quatro reuniões na USF
rural e seis na USF urbana para ter mais informações sobre a educação permanente por
intermédio do apoio matricial e do cuidado com a clientela de saúde mental, o que não foi
possível de ocorrer. Como foi apresentou-se anteriormente, houve a dificuldade de transporte
das equipes de matriciamento, mudanças constantes das reuniões por essas equipes, como
também pelas EqSF, principalmente pelas campanhas de vacinação, ou pela ausência da
apoiadora. Além disso, vale assinalar a dificuldade de mobilidade do pesquisador que contava
com a carona da equipe rural para participar das reuniões, devido à falta de transporte próprio
e de transporte coletivo nos horários e dias das reuniões. Houve também a dificuldade em se
comunicar com as EqSF, em virtude da falta de funcionalidade dos meios de comunicação das
equipes, sendo que a comunicação foi apenas mais facilitada pelas equipes do NASF e do
CAPS. Dessa forma, acompanhou-se apenas cinco reuniões na USF urbana, faltando apenas
uma com o CAPS e apenas uma da equipe da USF rural. Assim, os dados mais considerados
foram as entrevistas para a compreensão da percepção, do manejo e da educação permanente
em relação ao matriciamento, tendo em vista que essas viabilizaram maior acesso às
informações do trabalho da EqSF. Aliás, uma vez que foi acompanhada apenas uma reunião
das quatro pretendidas na USF rural, o trabalho dessa EqSF foi fundamentalmente
considerado por intermédio das entrevistas.
Os elementos da experiência com a clientela foram o medo de contato e ao mesmo
tempo uma tentativa de dar sentido à pessoa com transtorno mental que se relacionaram com a
literatura e apresentaram várias percepções distintas sobre a usuários inclusive sobre
profissionais da mesma equipe. Nessa categoria valeu-se apenas das entrevistas e da mesma
maneira demonstrou-se a necessidade de algumas temáticas serem abordadas pelo
matriciamento como uma educação permanente. Tais elementos apresentaram o modo como
os profissionais percebem as pessoas com transtornos mentais severos e persistentes e como
102

esses sentidos se constituíram por meio de sua formação profissional e experiências. E a partir
desses elementos, pôde-se entender como são desenvolvidos os manejos presentes na atuação
cotidiana dos profissionais.
O manejo que diz da atuação prática diária com os indivíduos com transtornos mentais
pôde ser identificado nas entrevistas. Encontraram-se procedimentos comuns, mas diferenças
entre as avaliações médicas, uma mais rápida com foco no diagnóstico e outra mais
sistematizada demandando maior período de tempo. Foi comum a utilização da visita, porém
ressaltado um endereçamento tanto para o usuário, quanto para a família e objetivos diferentes
nessa abordagem em domicílio. Ressaltaram-se as diversas demandas, que demonstram a
diversidade do território. Dessa diversidade emergiu uma dificuldade de alguns participantes
em lidar com a família do utente de saúde mental que pode ser compreendida como um
desafio para a formação do vínculo e algo a ser alvo de estratégias do apoio matricial. Uma
percepção que acompanha o manejo foi o modo como os dois médicos sinalizam ver a
atuação na Atenção Básica e sua repercussão para os indivíduos diagnosticados com
transtornos mentais severos e persistentes, sendo que para alguns a USF não era o seu lugar.
A educação permanente também foi vista, mas de uma perspectiva de necessidade para
as equipes. Essa categoria foi amplamente observada principalmente na USF urbana, pois
nesta o pesquisador pôde realizar uma observação participante nas reuniões de matriciamento
Nesse sentido esses dados foram articulados, questionando o desenvolvimento do apoio
matricial, bem como compreendendo o seu papel para a percepção da clientela e para o
manejo das EqSF. Assim, o acompanhamento das reuniões e as entrevistas demonstraram que
o processo de educação permanente tem pouquíssimo espaço no matriciamento, que prioriza a
discussão de casos e não dispõe de muitas possibilidades para tratar de saberes fundamentais
para a saúde mental. E haveria pouca compreensão sobre a que se destina o apoio matricial,
visto muitas vezes apenas como uma atuação direta com a clientela, ou discussão sobre essa.
Entendeu-se então, a educação permanente como o percurso de educação formal e informal
dos profissionais e como eles têm se dedicado e recebido aporte para o aprendizado na
educação permanente em saúde mental. Consoante a isso, vale ressaltar a falta de preocupação
em apresentar as temáticas sobre saúde mental nas reuniões de equipe principalmente na USF
urbana.
É notável uma dificuldade em relação a alguns membros das equipes acercar do
trabalho com as pessoas diagnosticadas com transtornos mentais severos e persistentes. Esse
desafio para as equipes associa-se com a dificuldade em lidar com a saúde mental, como no
sentimento de medo atribuído à relação com esses indivíduos e pouca proximidade com a
103

família do usuário. Questões que aumentam o distanciamento da EqSF com o usuário/família


e perpassam sua percepção sobre a saúde mental, o que pode ser visto na falta de interesse e
investimento presente na maioria da formação dos profissionais que em sua maioria têm
pouco contato com cursos (pós-graduações e capacitações) acerca da temática. Nesse sentido,
o distanciamento em relação ao usuário demonstra como a saúde mental é percebida e
possibilita entender a formação e as experiências desenvolvidas pelos participantes com a
população com transtornos mentais. Inclusive o modo como o manejo é desenvolvido, tendo
como base a saúde mental, pode ser associado ao entendimento de que os indivíduos com
transtornos mentais severos e persistentes não seriam uma atribuição da Atenção Básica e sim
de serviços especializados. Questão essa que distancia o cuidado em nível básico dessa
população e pode influir na perda de referência em relação à USF.
Um desafio apresentado pelas equipes foi em compreender o papel do matriciamento e
o desenvolvimento deste por parte das equipes do CAPS e NASF. Aliás, alguns participantes
esperavam mais ações em conjunto e a ocorrência da educação permanente no apoio
matricial. Distintamente, essas expectativas não foram verbalizadas nas reuniões de
matriciamento, não havendo uma ação para tentar construir um fazer diferente do que se
desejava. Esse fenômeno sinaliza a necessidade das equipes que realizam o matriciamento de
expor o que seria essa proposta de apoio matricial, seus objetivos e propostas e até quando
vão suas possibilidades de atuação conjunta. Além disso, ressalta-se a dificuldade de
comunicação que interfere nesse trabalho conjunto e afeta as EqSF, as equipes de
matriciamento e as famílias.
Em suma, as observações e entrevistas viabilizaram conhecer e contrastar dados sobre
o trabalho das EqSF em relação às pessoas com transtornos mentais severos e persistentes.
Houve convergências na triangulação de informações e na amostragem por contraste realizada
considerando a USF urbana e a USF rural, assim como dados distintos. Em decorrência desses
procedimentos da pesquisa, observou-se uma realidade diferenciada em termos de território,
em relação à cultura, à organização social e aos serviços oferecidos para os contextos urbanos
e rurais. Vale destacar a ausência do NASF como apoio a USF rural, mais uma característica
que traz implicações e diferenciação na atuação da equipe. Salienta-se que enquanto muitos
usuários são acompanhados na USF Urbana que conta com atendimentos psicológicos,
fisioterápicos, nutricionais, de educador físico e odontológico, os utentes do território rural
contam com poucos recursos e, para terem acesso a mais possibilidades de serviços, precisam
deslocar-se para a região urbana. Assim, para tais utentes rurais terem acesso a outros
profissionais teriam que ser encaminhados. E diferentemente da USF urbana, na rural os
104

profissionais como enfermeiro e médico não ficam na mesma unidade todos os dias. Portanto,
essas diferenças por sua vez influenciam na atuação cotidiana das EqSF e moldam as suas
experiências.
Além disso, esta pesquisa possibilitou uma compreensão sobre o matriciamento e da
atuação das EqSF que pode contribuir para a revisão desse trabalho, tanto para as que foram
observadas, quanto para outras Unidades de Saúde da Família tanto do município, como em
outras cidades. Tais conteúdos abordados pelo estudo ainda compõe fonte de informações
para discussões de educação permanente em saúde que podem ser tratados e problematizados
com os profissionais da saúde. Nesse aspecto, outros equipamentos da RAPS podem ter
elucidados o papel da Atenção Básica e se organizarem tendo como base a atenção as
questões de saúde mental e o seu manejo.
Assim, pelas dificuldades em participar de todas as reuniões de matriciamento e de
equipe propostas inicialmente, foram consideradas principalmente as entrevistas. Nesse
sentido, fazem-se necessárias novas pesquisas que acompanhem por um maior tempo a
dinâmica e as construções de saberes nas reuniões de matriciamento. De maneira
semelhantemente é relevante o acompanhamento e a observação de práticas diárias das
equipes com os usuários com transtornos mentais severos e persistentes, bem como a
problematização do investimento em educação permanente em saúde mental para as Equipes
de Saúde da Família.
105

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APÊNDICE A – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS


PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E DE PÓS-GRADUAÇÃO
COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA - CEP

Título do Projeto: Os sentidos produzidos por membros de equipes de saúde da família sobre as
pessoas com transtornos mentais severos e persistentes.

Número de registro no CEP: CAAE

1) Introdução: Você está sendo convidado(a) a participar desta pesquisa em virtude de seu
envolvimento com a Atenção Básica. A sua participação é fundamental para o desenvolvimento da
pesquisa, porém, não é obrigatória, e a qualquer momento você poderá desistir de participar, retirando
o seu consentimento.
2) Objetivo: Compreender os sentidos produzidos por profissionais de equipes de saúde da família que
atuam em USFs sobre as pessoas com transtornos mentais severos e persistentes.
3) Procedimentos do Estudo: Você será solicitado(a) a responder a uma entrevista, que será gravada e
posteriormente transcrita para análise. As informações registradas destinar-se-ão à estudos sobre a
temática da pesquisa.
4) Riscos e desconfortos: O entrevistador mestrando em Psicologia têm conhecimentos do método
previsto e formação adequada para identificar constragimentos pessoais e institucionais. Contudo, caso
ocorram constrangimentos pessoais e institucionais para os participantes a serem envolvidos, poderão
ser sugeridas alterações, pelos pesquisadores ou pelos sujeitos. Os pesquisadores se comprometem a
reparar eventuais danos decorrentes da pesquisa. Sua participação é muito importante e voluntária e,
desta forma, não haverá pagamento por participar desse estudo. Em contrapartida, você também não
terá nenhum gasto.
5) Caráter Confidencial dos Registros: As informações recolhidas serão trabalhadas apenas pelo
pesquisador e esses dados serão mantidos confidenciais. Você não será identificado quando o material
de seu registro for utilizado, seja para propósitos de publicação científica ou educativa, ou
apresentação oral. Os registros gravados ficarão sob a responsabilidade do pesquisador e serão
utilizadas apenas para as finalidades da pesquisa, sendo destruídas após cinco anos.
6) Para obter informações adicionais: Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e
o endereço do pesquisador responsável e o telefone do coordenador da pesquisa, podendo tirar
suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a qualquer momento.
116

Para todos os participantes, em caso de eventuais danos decorrentes da pesquisa, será observada, nos
termos da lei, a responsabilidade civil.

Pesquisador responsável: Mestrando em Psicologia: Carlos de Sousa Filho, Rua Padre Cletus Francis
Cox, nº 1661, Jardim Country Club, Poços de Caldas, telefone (35) 3319-4568 e 99811-8017.
Coordenador: Prof. Dr. João Leite Ferreira Neto, no telefone (31) 3319-4568 e 99976-8626

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa envolvendo Seres Humanos da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais, coordenado pela Prof.ª Cristiana Leite Carvalho, que poderá
ser contatado em caso de questões éticas, pelo telefone 3319-4517 ou e-mail
[email protected].

O presente termo será assinado em 02 (duas) vias de igual teor.

Poços de Caldas,
Dou meu consentimento de livre e espontânea vontade para participar deste estudo.

____________________________________________
Nome do participante (em letra de forma)

____________________________________________ ____________________
Assinatura do participante ou representante legal Data

Eu, Carlos de Sousa Filho, comprometo-me a cumprir todas as exigências e responsabilidades a mim
conferidas neste termo e agradeço pela sua colaboração e sua confiança.

____________________________________________ _____________________
Assinatura do pesquisador Data
117

APÊNDICE B – TERMO DE COMPROMISSO

Prefeitura Municipal de Poços de Caldas

Secretaria Municipal de Saúde

TERMOS DE COMPROMISSO

Declaro, para os devidos fins, estar ciente da realização da pesquisa “Os sentidos produzidos
por membros de equipes de saúde da família sobre as pessoas com transtornos mentais
severos e persistentes”, sob a responsabilidade do pesquisador Carlos de Sousa Filho. A
pesquisa, que tem como propósito compreender os sentidos produzidos por profissionais da
equipe de saúde da família que atuam em uma USF sobre as pessoas com transtorno mental
severo e persistente. Declaro, ainda, que conheço e cumprirei os requisitos da Resolução CNS
466/12 e suas complementares e como esta instituição tem condições para o desenvolvimento
deste projeto, autorizo sua execução.

Poços de Caldas, ______ de ____________________ de 2017.

____________________________________________
(ASSINATURA E CARIMBO DO RESPONSÁVEL)

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