Juris - Fgts
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PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
GABINETE DESEMBARGADORA TEREZE NEUMANN DUARTE CHAVES
ACÓRDÃO
ACORDA a Turma Julgadora da Segunda Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado
do Ceará, em não conhecer da Remessa e conhecer em parte da Apelação Cível para, acolhendo a
preliminar suscitada, provê-la parcialmente, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.
Fortaleza, 26 de julho de 2023
RELATÓRIO
Em sua petição inicial, às fls. 02/05 dos autos, a autora busca a condenação do ente público
promovido ao pagamento das verbas rescisórias inadimplidas relativas ao período em que
laborou por meio de sucessivos contratos temporários entre 01/08/2009 e 30/12/2016, o que
incluiria salário vencido, férias integrais em dobro com o terço constitucional, décimo terceiro
salário e FGTS, totalizando a quantia de R$ 9.873,00 (nove mil e oitocentos e setenta e três
reais).
"Ante as razões expendidas, com base no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil,
JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido autoral, de modo a reconhecer a nulidade
do contrato firmado entre a parte autora e a requerida; reconhecer prescritas as parcelas de
FGTS vencidas anteriores a 13/11/2009 e as parcelas anteriores a 21/09/2013 em relação aos
demais pedidos e, não obstante, condenar o Município de Miraíma a pagar à parte autora:
Tais valores deverão ser acrescidos de correção monetária pelo IPCA desde a data de aquisição
de cada benefício, bem assim de juros de mora a contar da citação, pelos índices oficiais de
remuneração básica da caderneta de poupança que, a partir de 08.08.2012, devem ser aplicados
nos termos do art. 1º, II, “a” e “b”, da Lei n.º12.703/12.
Deixo de arbitrar, por hora, os ônus sucumbenciais, uma vez que, em razão da iliquidez da
sentença, a fixação da verba honorária somente ocorrerá na fase de liquidação, conforme
expressa previsão do art. 85, § 4º, inciso II, do Código Processual Civil.
Sentença sujeita a reexame necessário, por tratar-se de condenação ilíquida contra a Fazenda
Pública, na forma da Súmula 490 do Superior Tribunal de Justiça.
[...]
É o relatório.
VOTO
Observa-se que o Juízo da causa julgou procedente em parte o pedido requerido na exordial,
com valor reputado em R$ 11.353,00 (onze mil e trezentos e cinquenta e três reais), referente ao saldo
de salário, aos depósitos do FGTS, 13º salário e férias, acrescidas do terço constitucional.
Contudo, apesar de se tratar de sentença ilíquida, embora proferida contra a Fazenda Pública,
evidencia-se que o montante condenatório estimado, quantia que, mesmo acrescida de juros e correção
monetária, se perfaz muito inferior ao valor de alçada definido no art. 496, § 3º, inciso III, do CPC,
circunstância que enseja o não conhecimento da remessa necessária.
Nesse sentido:
Dessa forma, embora, o juízo a quo tenha submetido o decisum ao reexame necessário, reputo
por dispensável sua apreciação, em alinhamento ao entendimento jurisprudencial supramencionado.
Por sentença, o demandado foi condenado ao pagamento de férias não gozadas, acrescidas do
terço constitucional, integralmente, gratificação natalina (13º salário), referente ao período trabalhado,
levando-se em consideração a prescrição das parcelas anteriores a 21/09/2013, depósitos do FGTS,
levando-se em consideração a prescrição das parcelas anteriores a 13/11/2009, além do saldo da
remuneração não recebida durante a vigência do contrato, referente ao mês de dezembro de 2016.
No tocante à prescrição, nas pretensões voltadas contra a Fazenda Pública, a teor do disposto
no art. 1º do Decreto nº 20.910/1932, é quinquenal o prazo prescricional adotado:
Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e
qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for
a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se
originarem. [grifei]
Assim, acolho a preliminar suscitada pelo ente público, contudo, a prescrição atinge as
parcelas anteriores a 17/05/2013.
A apelada afirma ter sido contratada temporariamente pelo ente público, sem a realização de
concurso, para prestar serviços na função de professora, através de contrato temporário, de 01 de agosto
de 2009 até 30 de dezembro de 2016.
O município em sua peça de defesa de fls. 25-39, assentiu que a parte autora fora contratada
para exercer função temporária e excepcional de relevante interesse público, acrescentando que o
vínculo firmado sempre foi excepcional e precário, à falta de aprovação em concurso público, não
fazendo jus as verbas pleiteadas. Nada falando em relação ao período da relação apontado pela
promovente.
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Por ocasião do apelo, o ente público arguiu que "não há qualquer prova quanto ao período de
duração da relação afirmada," e que "não há qualquer contrato, contracheque ou outro meio que
prove suas alegações. Não há nem mesmo qualquer prova quanto a seu vínculo ou salário" (fls. 141).
Vale ressaltar, ainda, o disposto no art. 1.014, do CPC,2 que autoriza as partes a levantarem, na
apelação, questões de fato não apresentadas no juízo de origem, desde que, comprovado motivo de
força maior para a proposição tardia na seara recursal.
Todavia, o ponto levantado pelo Município não se adequa à previsão legal de "fato novo",
uma vez que, o argumento aventado pelo Município, acerca de questão administrativa do servidor,
pertencia a sua esfera de conhecimento já por ocasião da apresentação da peça de defesa.
A vista disso, não merece acolhida essa parte do recurso, porquanto, de forma tardia, veiculou
em sua insurgência matéria sem o conhecimento das partes e do juízo que presidiu o feito na origem.
Como se sabe, a investidura em cargo ou emprego público é regida pelo princípio do concurso
público, previsto no art. 37, inciso II, da Constituição Federal, constituindo-se o trabalho temporário
em exceção legal, prevista somente em casos excepcionais.
A contratação temporária, para ser considerada válida, deve preencher requisitos, de acordo
com o STF, enumerados no julgamento do RE nº 658026/MG, julgado sob a sistemática da repercussão
geral, os quais determinam que:
1Art. 5º [...]
LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e
recursos a ela inerentes;
2 Art. 1.014. As questões de fato não propostas no juízo inferior poderão ser suscitadas na apelação, se a parte provar que deixou de fazê-lo por motivo
de força maior.
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Analisando o feito, sobressai-se que o pacto firmado com a parte autora, nos moldes do
contrato temporário, evidencia sua irregularidade, pois inexiste temporariedade a justificar a conduta
adotada para a contratação do recorrido; assim, deve ser considerada nula e, por essa razão, inapta a
gerar qualquer vínculo jurídico-administrativo entre as partes.
geram quaisquer efeitos jurídicos válidos, a não ser o direito à percepção dos salários
referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, ao
levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço -
FGTS. 3. Recurso extraordinário desprovido.” (RE 705140/RS, Relator: Min. TEORI
ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 28/08/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO
REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-217 DIVULG 04-11-2014 PUBLIC 05-11-2014).
[grifei]
Dessarte, embora o FGTS seja verba afeta ao regime celetista, tal entendimento objetiva evitar
enriquecimento ilícito da Administração, remunerando adequadamente o contratado pelo serviço
efetivamente prestado.
O STF, alterou a jurisprudência até então dominante, fixando o entendimento de que "o prazo
prescricional aplicável à cobrança de valores não depositados no Fundo de Garantia por Tempo de
Serviço (FGTS) é quinquenal, nos termos do art. 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal" (TEMA
608/STF – Leading case ARE nº 709212/DF).
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(a) à ação ajuizada até 13.11.2014, data do julgamento do ARE n. 709.212/DF, aplica-se a
prescrição trintenária;
(b) ao contrato de trabalho celebrado após 13.11.2014 aplica-se, de imediato, a prescrição
quinquenal; e
(c) no caso em que o prazo prescricional já estava em curso no momento do julgamento da
repercussão geral (Tema 608/STF), ou seja, contrato de trabalho celebrado até 13.11.2014,
mas ação pleiteando o recebimento do FGTS ajuizada após tal data, aplica-se "o que
ocorrer primeiro: 30 anos, contados do termo inicial, ou 5 anos, a partir desta decisão".
A hipótese a que se refere a alínea (c) merece algumas considerações.
O Supremo Tribunal Federal, ao modular o entendimento firmado no julgamento do ARE n.
709.212/DF, com o objetivo de garantir a segurança jurídica e evitar surpresa, adotou efeitos
ex nunc, preservando, assim, o direito ao recebimento de parcelas do FGTS em período
superior a 5 anos (limitado a 30 anos), para aquele cujo contrato de trabalho foi celebrado
até 13.11.2014 e a ação foi ajuizada dentro do prazo de 5 anos a contar de tal data, desde
que, entre o termo inicial e o ajuizamento da ação, o prazo não seja superior a 30 anos.
Em consequência da modulação aplicada, emergem as seguintes conclusões com relação aos
contratos de trabalho em curso no momento do julgamento do Supremo Tribunal Federal
(ARE n. 709.212/DF - Tema 608/STF), conforme a hipótese:
(i) se o ajuizamento da ação, objetivando o recebimento das parcelas do FGTS, ocorreu até
13.11.2019, aplica-se a prescrição trintenária, ou seja, o trabalhador tem direito ao
recebimento das parcelas vencidas no período de 30 anos antes do ajuizamento da
ação; e
(ii) se o ajuizamento da ação, objetivando o recebimento das parcelas do FGTS, ocorreu
após 13.11.2019, aplica-se a prescrição quinquenal, ou seja, o trabalhador faz jus
somente ao recebimento das parcelas vencidas no período de 5 anos antes do
ajuizamento da ação. [grifos originais]
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Nesse contexto, como dito no julgado em referência, no item (i), para os casos em que a ação
objetivando o recebimento das parcelas do FGTS, se o ajuizamento da ação ocorreu até 13/11/2019,
aplica-se a prescrição trintenária, ou seja, o trabalhador tem direito ao recebimento das parcelas
vencidas no período de 30 anos antes do ajuizamento da ação.
Por sua vez, o magistrado a quo, ao reconhecer a nulidade dos contratos firmados entre o
servidor e a edilidade, concluiu pela aplicação da prescrição quinquenal, não havendo insurgência da
parte autora nessa questão.
Entretanto, repise-se que a data a ser reputada como do ajuizamento é a da propositura perante
a Justiça do Trabalho, em 17/05/2018 (fls. 03).
Desse modo, com o acolhimento da preliminar de prescrição quinquenal, suscitada pelo ente
público, as parcelas referentes as férias não gozadas, acrescidas do terço constitucional, 13º salário e ao
FGTS, anteriores a 17/05/2013, deverão ser desconsideradas pela incidência da prescrição quinquenal,
considerando que não houve insurgência da parte recorrida no que pertine à aplicação da prescrição
aplicada à verba fundiária.
Acerca pagamento do 13º salário e das férias acrescidas de um terço, em recente julgado RE
1.066.677/MG, sob o rito da repercussão geral, o STF adotou o entendimento segundo o qual, em caso
de nulidade do contrato temporário, os servidores, além do direito às verbas de FGTS, têm direito
também ao recebimento de décimo terceiro salário e férias remuneradas acrescidas do terço
constitucional (Tema 551).
Por conseguinte, esta Corte de Justiça, a par do precedente supracitado do STF, tem seguido o
mesmo entendimento:
APELAÇÕES CÍVEIS. REMESSA NECESSÁRIA. CONSTITUCIONAL E
ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE TRABALHO
TEMPORÁRIO CONSIDERADO NULO. INVESTIDURA SEM CONCURSO
PÚBLICO. NÃO IDENTIFICAÇÃO DE NECESSIDADE DE ATENDIMENTO A
INTERESSE PÚBLICO EXCEPCIONAL. ART. 37, IX, CF/88. OBRIGAÇÃO
QUANTO AO PAGAMENTO DOS VALORES DEPOSITADOS ALUSIVOS AO
FGTS, DO DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO E FÉRIAS ACRESCIDAS DO
TERÇO CONSTITUCIONAL DEVIDOS. CONFORME ENTENDIMENTO
FIRMADO PELO STF NO RE 1.066.677 (TEMA 551 DA REPERCUSSÃO
GERAL). JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. RECURSOS CONHECIDOS E
DESPROVIDOS. 1. Trata-se de Apelações Cíveis, visando reformar sentença que
julgou parcialmente procedente a Ação de Cobrança, condenado o Município de
Jaguaretama ao pagamento do eventual saldo de salário e FGTS referente ao período
laborado, devidamente corrigido de acordo com a orientação jurisprudencial do
Superior Tribunal de Justiça, sob a sistemática dos recursos repetitivos (Tema nº
905). 2. Autora, contratada temporariamente pelo Município de Jaguaretama para
exercer a função de professora, pelo período de 04.02.1993 a 30.12.2016, alega que o
ente público durante o tempo trabalhado não assinou sua CTPS, nem realizou o
pagamento do salário proporcional referente ao mês de outubro de 2014 a dezembro
de 2014, aviso prévio indenizado, décimo terceiro salário proporcional, férias
acrescidas do terço constitucional, depósito de FGTS de todo o período, acrescido de
multa de 40%, seguro desemprego, multa prevista no art. 477 da CLT e art. 467 da
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Por sua vez, a Administração Pública não se desincumbiu de demonstrar que efetivamente
adimpliu as verbas reclamadas, nos moldes do art. 373, inciso II, do CPC, o qual estabelece ser ônus do
réu a comprovação da existência dos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito autoral,
ou seja, a demonstração da adimplência dos valores pleiteados na exordial.
Com relação aos consectários legais, deve se proceder de acordo com o definido no Resp
1495146/MG,3 acrescentando-se que, a partir de 09/12/2021, data da publicação da Emenda
Constitucional nº 113/2021, adota-se o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação
e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente, que deverá incidir uma única vez, até o efetivo
pagamento (art. 3º, EC nº 113/2021)4.
É como voto.