Sumario 3
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Sumario 3
RESUMO: Após apresentar algumas questões referentes ao método bíblico, o autor procura
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apresentar a crescente e diversificada percepção de Deus presente no contexto dos patriarcas,
narrada no livro do Gênesis. Eles vão descobrindo a peculiaridade deste Deus único como
salvador que salva os necessitados. Depois, usando dois textos do livro do Êxodo (2,23-25 e 3,1 –
4,17) o texto faz transparecer, de modo exemplar, a dimensão divina do Deus salvador e revela
que ele estava presente e atuante nos diversos acontecimentos libertários das escravidões. A
libertação de Israel não se esgota na liberdade, mas tem como fim o compromisso com Deus e
com os irmãos, e a consequente constituição de um povo. O atuar divino coloca Israel diante de
uma proposta existencial: a vida feliz, repleta de gratuidades. Tal vida produz uma paz interior, um
sentimento de segurança num mundo tão conturbado, que só se encontra em Deus.
ABSTRACT: After presenting some questions referring to the biblical method, the author tries
to show the increasing as diverse perception of God present in the patriarchs’ contexts, narrated
in the book of Genesis. They discover the peculiarity of this unique God as savior who saves the
needy. Later on, making use of two texts from the book of Exodus ( 2, 23-25 and 3,1 – 4,17 ), the
text make clear, in an exemplary way, the divine dimension of the Savior God and reveals that
he was present and active in the various events of slavery libertarians. The liberation of Israel is
not limited to freedom, but has as its end the commitment to God and to the brethren, and the
consequent formation of a people. The divine action puts Israel before an existential proposal:
the happy life, full of gratuitousness. Such a life produces an inner peace, a sense of security in a
troubled world, which is found only in God.
* Mestre em Teologia Bíblica, professor e secretário do Studium Theologicum e professor da Pontifícia Universidade
de Curitiba.
1. ALGUMAS QUESTÕES
Primeiro a terra, é o marco natural onde vive o clã, círculo mais amplo,
demarca o ambiente natural da família / clã de Abraão. Segundo a parentela,
é o lugar do nascimento de seu clã. Nele encontra afeto, solidariedade, os
costumes. Simboliza a identidade da família, a cultura em geral. Em terceiro a
casa paterna, é o domicílio familiar. É onde o homem encontra a sua realização,
razão para viver, o que dá sentido para a vida. Aqui está a tensão da fé de Abraão
que se expõe à exigência de Deus. Ao responder o chamado de Javé, Abraão
28 parte (Gn 12,4), aqui passa a ser um sem terra, sem pátria e sem parentes,
é um órgão. De agora em diante ele deverá lançar-se para o futuro, guiado
somente pela providência divina. Ele se coloca a caminho. O Deus de Abraão
é um Deus providente e zeloso que se mantém fiel às promessas feitas. E estas
promessas são renovadas inúmeras vezes. São renovadas com Isaac: “Eu farei a
tua posteridade numerosa como as estrelas do céu, eu lhe darei todas estas terras,
e por tua posteridade serão abençoadas todas as nações da terra” (Gn 26,4). E logo
a seguir são renovadas com Jacó: “Tua descendência se tornará numerosa como
a poeira do solo; estender-te-ás para o ocidente e o oriente, para o norte e o sul, e
todos os clãs da terra serão abençoados por ti e por tua descendência” (Gn 28,14).
De fato, o Deus dos patriarcas cumpriu as promessas que fez a Abraãoi (Gn
12,1-4) ao se auto-revelar, ou seja, deu a terra, que havia prometido a Abraão e
seu clã e renovada várias vezes, a descendência numerosa veio por meio de Isaac,
e a proteção de Deus estava com eles. É só lembrar o episódio da destruição de
Sodoma e Gomorra, Abraão e sua gente foram avisados e poupados por Deus,
porque havia ali pessoas justas.
Finalmente Israel adora um Deus pessoal sob diversos nomes, este Deus
não é mero princípio abstrato, ou resultado da especulação sobre as suas forças
da natureza, sobre a sua essência, numa linguagem aristotélica, mas é um Deus
de pessoas e não de coisas; o Deus dos pais, de Abraão, de Isaac e de Jacó. O Deus
das promessas. Da Aliança com Abraão, Isaac, Jacó, Moisés e o seu povo.
Para a minha reflexão vou tomar como base dois textos do livro do
Êxodo. O primeiro texto é Ex 2,23-25. “23 Muito tempo depois morreu o rei do
Egito, e os filhos de Israel, gemendo sob o peso da servidão, clamaram; e do fundo 31
da servidão o seu clamor subiu até Deus. 24 E Deus ouviu os seus gemidos; Deus
lembrou-se da sua Aliança com Abraão, Isaac e Jacó. Deus viu os filhos de Israel.
25 Deus conheceu”. Esta perícope abre a porta, o caminho para o que se segue
Ex 3,1 – 4,17. Deus decide intervir e libertar o povo de Israel. É uma síntese do
contexto e da situação do povo de Israel e a atuação de Deus. Em Ex 2,23 começa
apresentando uma indicação de tempo, “muito tempo depois morreu o rei do
Egito”. Este rei teria sido o que desencadeou a opressão em Ex 1,8 “levantou-se
sobre o Egito um novo rei, que não conhecia José”. A ideia que passa com isso é
que pode sugerir algo de novo. Um período terminou e o outro pode começar.
O texto não menciona o nome do rei da opressão.
Até este momento Deus se fez presente de duas formas: “através do anjo”
(Ex 3,2) e a outra através “da chama de fogo, no meio de uma sarça, que não se
consome” (Ex 3,3). Em seguida em Ex 3,6 este Deus se identifica: “o Deus de teus
pais”, isto é, é o Deus da família de Moisés, de Israel. Depois o “Deus dos patriarcas”,
o “Deus das promessas” e o “Deus da Aliança”. Em Ex 3,7-8 Deus está falando, aqui
temos duas observações a fazer. A primeira é um Deus que se revela. Este Deus
não é desconhecido, mas é o Deus dos pais, um Deus ligado a uma história e
comprometido com as promessas. Um Deus que vê a miséria do seu povo, que
ouve o clamor de seu povo por causa dos opressores, é um Deus que sabe,
conhece o que está se passando no povo de Israel. Diante desta situação Deus
toma a iniciativa e entra na história para resgatar o povo de Israel. A segunda
ideia é que este Deus toma uma decisão, fará algo e isto aparece pelos três verbos
“Desci”, “a fim de libertá-los” e “fazê-los subir” (Ex 3,8). 33
No entanto, agora este Deus irá revelar-se a Moisés. Ao dar-se a conhecer a
Moisés, Deus lhe confere uma missão. Será determinante para a missão de Moisés
o conhecimento do nome de Deus. Num encontro entre os dois personagens
(Deus e Moisés), acontece a revelação do nome divino: “Moisés disse a Deus.......
Qual é o seu nome? Que direi? Disse Deus a Moisés: Eu sou aquele que sou. Disse
mais: Assim dirás aos filhos de Israel: Eu SOU me enviou até vós” (Ex 3,13-14).
No hebraico o verbo ser está no imperfeito (qal), indica uma ação continuada,
permanente, inacabada. Então pode ser traduzido “Eu sou (presente) o que farei
para vocês no futuro”. A ideia tem que ser num sentido ativo, dinâmico. O Deus dos
antepassados de Israel (patriarcas) de agora em diante esse Deus se chamará Javé.
Javé significa “Ele é”. Ele existe. Ele tem um nome. Tudo isto no sentido de presença
real, efetiva, existe verdadeiramente, a realidade do ser.
Diante disto Deus faz a Moisés uma promessa “Eu estarei contigo” (Ex 3,12).
É um convite para Moisés abandonar-se, entregar-se, crer na missão que Deus
lhe confiou. E dá um sinal “vocês vão servir a Deus nesta montanha” (Ex 3,12). Este
sinal é o cumprimento da promessa da saída. Começa a partir daqui o relato das
pragas (Ex 7,8 – 10,29). É uma narrativa de dramaticidade entre Deus e o faraó. O
relato das pragas mostra que é inútil e doloroso resistir a Deus. Em Ex 7,5 diz o
motivo das pratas: “saberão que os egípcios que eu sou Javé, quando estender minha
mão sobre o Egito e fizer sair do meio deles os filhos de Israel”. Quer dizer, Javé é o
Senhor, poderoso para agir. O faraó se nega a reconhecer a Javé, e este oferece
“dez oportunidades” para ratificar-se.
Em Ex 3,12 diz: vocês vão servir a Deus nesta montanha. A montanha que
o texto fala, não é qualquer montanha, é a montanha de Deus, o Horeb, ou o
Sinai. Aqui Deus fará uma aliança. A montanha de Deus é o ponto de partida para
o Deus da salvação, não somente um lugar de parada no caminho do deserto.
O Sinai se apresenta como a montanha de onde Deus vem para salvar. Ali se
realiza o encontro entre Deus e o povo (Exodo cap, 19 - 20). No livro do Êxodo, a
montanha é o cenário dos acontecimentos tão significativos como: a teofania, a
reformulação da aliança (Ex 20,22 – 23,19), a instauração do culto (Ex 25,1 – 31,18)
e a entrega da Lei (Ex 20,1ss). Portanto, o livro do Êxodo consiste na transição
da servidão para o serviço. Israel passa do serviço ao faraó para a liberdade do
serviço a Javé.
Para concluir esta breve reflexão sobre a jovialidade de Deus nas narrativas
do Pentateuco, feitas nos livros do Gênesis e do Êxodo, quero neste momento
apresentar algumas conclusões:
1. BRIGHT, J, História de Israel, São Paulo, Edições paulinas, 1978, pgs. 51-222.
2. FOHRER, Georg, História da religião de Israel, São Paulo, Editora Academia Cristã
e Paulus, 2006, pgs. 31-128
3. GERSTENBERGER, Erhard S., Deus no Antigo Testamento, São Paulo, Aste, 1981,
pgs. 11-176.
4. METTINGER, Tryggve N. D., O significado e a mensagem dos nomes de Deus na
Bíblia, São Paulo, Editora Academia Cristã, 2008, pgs. 21-115
5. RENCKENS, H. A religião de Israel, Editora Vozes, Petrópolis, RJ, 1969, pgs. 11-114.
6. SHREINER, J. Palavra e mensagem do Antigo Testamento, São Paulo, Editora
Teológica, 2004, pgs. 77-113.
7. VAUX, R. DE, Instituições de Israel, São Paulo, Editora Teológica, 2003, pgs. 309-
550.
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