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Universidade Federal de Pernambuco

Centro de Ciências Sociais Aplicadas


Mestrado Profissional em Gestão Pública para o Desenvolvimento do Nordeste

AVALIAÇÃO DA POLÍTICA DE HUMANIZAÇÃO EM SAÚDE


NO HOSPITAL BARÃO DE LUCENA:
O RECONHECIMENTO NO CUIDADO DA CRIANÇA

Arione Vieira do Nascimento

Recife
2010
Arione Vieira do Nascimento

AVALIAÇÃO DA POLÍTICA DE HUMANIZAÇÃO EM SAÚDE


NO HOSPITAL BARÃO DE LUCENA:
O RECONHECIMENTO NO CUIDADO DA CRIANÇA

Dissertação apresentada à diretoria de


Pós-Graduação Stricto Sensu da
Universidade Federal de Pernambuco
como requisito parcial para a obtenção do
título de Mestre em Gestão Pública.
Orientador: Prof. Dr. José Francisco
Ribeiro
Co-orientador: Prof. Dr. José Raimundo
de Oliveira Vergolino

Recife
Outubro, 2010
Nascimento, Arione Vieira do
Avaliação da política de humanização em saúde
no Hospital Barão de Lucena: o reconhecimento no
cuidado da criança / Arione Vieira do Nascimento. -
Recife : O Autor, 2010.
161 folhas : tab., graf. e quadro.

Orientador: Profº. Drº José Francisco Ribeiro


Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal de
Pernambuco. CCSA. Administração, 2011.

Inclui bibliografia, apêndices e anexos.

1. Humanização hospitalar. 2. Avaliação de


políticas. 3. Reconhecimento. 4. Reificação. I.
Ribeiro, José Francisco (Orientador). II. Título.

658 CDD (22.ed.) UFPE CSA2011 - 110


AGRADECIMENTOS

Ao Hospital Barão de Lucena, que acolheu esse estudo, em especial aos


pacientes e cuidadores que contribuíram para a realização da pesquisa num
momento de fragilidade e dor causado pelo adoecer.
Aos profissionais que dedicaram parte de seu tempo para responder as
perguntas de pesquisa.
Ao Governo do Estado de Pernambuco que patrocinou esse estudo.
Ao professor José Francisco Ribeiro, meu orientador, responsável por
ampliar meus conhecimentos, apresentando-me ao mundo da filosofia.
Ao Professor José Vergolino, que me “adotou”, guiando-me aos objetivos
desse estudo, como co-orientador.
À minha mãe, tão querida, responsável pelas minhas maiores conquistas.
Ao meu marido, Ageu Matos, e minha filha, Taís Matos, que não só
acompanharam como participaram dessa jornada.
À Anna Katarina, com suas ideias e sugestões.
A todos os amigos que sempre torceram por mim.
Por fim, acrescento que, assim como um quebra-cabeça feito de várias
peças, esta pesquisa foi construída com a colaboração de várias pessoas: mestres,
amigos, colegas de trabalho, familiares, parentes, profissionais de saúde, pacientes,
burocratas e demais construtores, aos quais agradeço pela dedicação e saberes.
“Certo dia, ao atravessar um rio, Cuidado viu um pedaço de
barro. Logo teve uma ideia inspirada. Tomou um pouco do
barro e começou a dar-lhe forma. Enquanto contemplava o que
havia feito, apareceu Júpiter. Cuidado pediu-lhe que soprasse
o espírito nele. O que Júpiter fez de bom grado. Quando,
porém, Cuidado quis dar um nome à criatura que havia
moldado, Júpiter o proibiu. Exigiu que fosse imposto o seu
nome. Enquanto Júpiter e Cuidado discutiam, surgiu, de
repente, a Terra. Quis também ela conferir seu nome à criatura,
pois fora feita de barro, material do corpo da Terra. Originou-se
então uma discussão generalizada. De comum acordo pediram
a Saturno que funcionasse como árbitro. Este tomou a seguinte
decisão que pareceu justa: “Você, Júpiter, deu-lhe o espírito;
receberá, pois, de volta este espírito por ocasião da morte
dessa criatura. Você, Terra, deu-lhe o corpo; receberá,
portanto, também de volta, o seu corpo quando essa criatura
morrer. Mas como você, Cuidado, foi quem, por primeiro,
moldou a criatura, ficará sob seus cuidados enquanto ela viver.
E uma vez que entre vocês há acalorada discussão acerca do
nome, decido eu: esta criatura será chamada de Homem, isto
é, feito de húmus, que significa terra fértil” (BOOFF, 2007,p.46).
RESUMO

Este estudo teve o objetivo de avaliar, a partir de estudo de caso na enfermaria da


pediatria do Hospital Barão de Lucena, localizado em Recife, Pernambuco, como
ocorrem as práticas de atendimento humanizado ao usuário-cidadão no cotidiano
deste hospital que, desde 2002, integra a rede do Programa Nacional de
Humanização de Assistência Hospitalar – PNHAH. A teoria do reconhecimento
descrita na obra de Axel Honneth foi o fio condutor deste estudo e pode contribuir
para encontrar o nexo teórico na prática no dia a dia de uma unidade hospitalar,
para explicar por que a sociedade moderna perdeu a essência do ser humano,
debatendo a reificação e a urgência em humanizar as relações nas práticas do
cuidado em saúde. Foi realizada uma pesquisa qualitativa através de entrevista
semi-estruturada, no período de julho a agosto de 2010, com 30 mães ou cuidadoras
e 30 profissionais de diversas categorias, que responderam perguntas elaboradas a
partir de eixos teóricos descritos pelo Ministério da Saúde, os quais tratam de
parâmetros para humanização de atendimento de usuários e profissionais. O
cruzamento de informações destes sujeitos foi realizado com o interesse de
identificar, nas perspectivas de mães (usuários) e profissionais, o grau de adoção
das práticas humanizadas no cuidado cotidiano. Os resultados obtidos após análise
dos dados coletados indicam que, na visão da maioria dos usuários, as teorias
postas no programa correspondem à prática, enquanto que, para os profissionais,
não há essa correspondência.

Palavras-Chave: Humanização hospitalar; Avaliação de políticas; Reconhecimento;


Reificação.
ABSTRACT

This study aimed to evaluate, from a case study in the pediatric ward of the Hospital
Barão de Lucena, located in Recife, Pernambuco, Brazil, how occur the practices of
humanized service to the user-citizen on the everyday of this hospital that, since
2002, integrates the network of the Programa Nacional de Humanização de
Assistência Hospitalar – PNHAH (Program for Humanization of Hospital Care). The
theory of recognition described in the work of Axel Honneth was the leitmotiv of this
study and may contribute to finding the link theory in practice on day by day of a
hospital unit, to explain why the modern society has lost the essence of being
human, debating the reification and the urgency to humanize relations practices of
health care. It was conducted a qualitative research by a semi-structured interview on
the period from July to August 2010, with 30 mothers or caregivers and professionals
from 30 different categories, which answered questions drawn from theoretical
orientations described by the Ministério da Saude (Brazilian Health Ministry), which
deals parameters of humanization of care for users and professionals. The cross-
check of information of these subjects was done with the interest of identify, from
perspectives of the mothers (users) and professionals, the degree of adoption of
humanized practices in everyday care. The results obtained after collected data
analysis indicates that, in the view of most users, the theories putted in the program
correspond to the practice, while for the professionals there is no comply.

Key-words: Humanizing hospital; Evaluation of policies; Recognition; Reification.


LISTA DE QUADROS

Quadro - Pontos positivos e negativos para humanização do serviço.................... 143


LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Qualidade das instalações, condições ambientais e equipamentos para


atendimento dos usuários ....................................................................................... 102
Gráfico 2 – Acesso e presteza no atendimento aos usuários................................. 107
Gráfico 3 – Qualidade das informações fornecidas aos usuários........................... 110
Gráfico 4 – Qualidade da relação entre usuários e profissionais ........................... 113
Gráfico 5 – Gestão hospitalar e participação dos profissionais na organização..... 121
Gráfico 6 – Qualidade da comunicação no setor .................................................... 125
Gráfico 7 – Relacionamento interpessoal no setor de trabalho .............................. 127
Gráfico 8 – Condições de trabalho dos profissionais ............................................. 129
Gráfico 9 – Motivação e valorização profissional do trabalho................................. 131
Gráfico 10 – Condições de apoio aos profissionais................................................ 133
LISTA DE TABELAS

TABELA 1 – Quantitativo dos profissionais no setor de pediatria ......................... 96


TABELA 2 – Avaliação dos usuários quanto à qualidade das instalações,
condições ambientais e equipamentos.................................................................... 157
TABELA 3 – Avaliação dos usuários quanto ao acesso e presteza no
atendimento ............................................................................................................. 157
TABELA 4 – Avaliação dos usuários quanto à qualidade da informação
fornecida.................................................................................................................. 157
TABELA 5 – Avaliação dos usuários quanto a qualidade da relação entre usuários
e profissionais ......................................................................................................... 158
TABELA 6 – Avaliação dos profissionais de saúde quanto à gestão hospitalar e
participação na organização.................................................................................... 159
TABELA 7 – Avaliação dos profissionais de saúde quanto à qualidade da
comunicação no setor ............................................................................................. 159
TABELA 8 – Avaliação dos profissionais de saúde quanto ao relacionamento
interpessoal no setor de trabalho ............................................................................ 159
TABELA 9 – Avaliação dos profissionais de saúde quanto às condições de
trabalho ................................................................................................................... 160
TABELA 10 – Avaliação dos profissionais de saúde quanto à motivação e
valorização do trabalho ........................................................................................... 160
TABELA 11 – Avaliação dos profissionais de saúde quanto às condições de
apoio........................................................................................................................ 160
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 12
2 CENÁRIOS RELATIVOS ÀS POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL E A
IMPORTÂNCIA DE AVALIÁ-LAS .............................................................................. 19
2.1 Políticas públicas: alguns apontamentos............................................................. 19
2.2 Interface entre os processos econômicos, políticos e as práticas de saúde. ...... 23
2.3 O cuidado hoje: a Política Nacional de Humanização ......................................... 38
2.4 Avaliação da política de humanização no campo da saúde ................................ 45
3 AS CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA DO RECONHECIMENTO DE AXEL
HONNETH NA HUMANIZAÇÃO DA SAÚDE ............................................................ 48
3.1 A Teoria Crítica e o Reconhecimento .................................................................. 49
3.2 A humanização no serviço de saúde: um comentário sob a ótica Honnethiana. . 63
3.3 Considerações sobre o ser humano .................................................................... 65
3.4 Acolhimento e humanização ............................................................................... 67
3.5 A visão holística influenciando no processo de humanização hospitalar ............ 72
4 O CONTEXTO HISTÓRICO E O CENÁRIO ATUAL DA ASSISTÊNCIA
HUMANIZADA DO HOSPITAL BARÃO DE LUCENA ............................................... 76
4.1 O Hospital Barão de Lucena: um breve histórico ................................................ 76
4.2 As práticas de humanização no Hospital Barão de Lucena ................................ 79
4.3 A cultura organizacional: a humanização nos hospitais ...................................... 84
5 METODOLOGIA ..................................................................................................... 93
5.1 Tipo de pesquisa ................................................................................................. 93
5.2 Relevância do método de abordagem ................................................................. 94
5.3 Lócus ................................................................................................................... 94
5.4 Campo de pesquisa............................................................................................. 95
5.5 Sujeitos: amostra e cuidados éticos .................................................................... 95
5.6 Procedimentos .................................................................................................... 97
5.7 Análises dos dados ............................................................................................. 98
6 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................ 100
6.1 A visão dos usuário ...................................................................................... 101
6.1.1 Qualidade das instalações, condições ambientais e equipamentos para
atendimento dos usuários ................................................................................. 101
6.1.2 Acesso e presteza no atendimento aos usuários..................................... 106
6.1.3 Qualidade da informação fornecida aos usuários .................................... 110
6.1.4 Qualidade da relação entre usuários e profissionais ............................... 112
6.1.5 sugestões dos usuários para melhoria dos serviços................................ 115
6.2 A visão dos profissionais de saúde ................................................................... 119
6.2.1 Gestão hospitalar e participação dos profissionais na organização......... 120
6.2.2 Qualidade da comunicação no setor ........................................................ 124
6.2.3 Relacionamento interpessoal no setor de trabalho .................................. 126
6.2.4 condições de trabalho dos profissionais .................................................. 128
6.2.5 Motivação e valorização profissional do trabalho .................................... 130
6.2.6 Condições de apoio aos profissionais...................................................... 132
6.2.7 Sugestões dos profissionais para melhoria dos serviços......................... 135
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 138
REFERÊNCIA ......................................................................................................... 146
APÊNDICE A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ............................... 152
APÊNDICE B – Formulários de pesquisa dirigidos aos usuários do serviço (1) e aos
profissionais do serviço (2) ...................................................................................... 153
APÊNDICE C – Tabelas demonstrativas dos eixos para humanização dos
usuários ................................................................................................................... 157
APÊNDICE D – Tabelas demonstrativas dos eixos para humanização dos
profissionais ............................................................................................................ 159
ANEXO A – Aprovação do Comitê de Ética ............................................................ 161
12

1 INTRODUÇÃO

Esta dissertação foi um estudo de caso realizado na enfermaria da pediatria


do Hospital Barão de Lucena, para avaliar como ocorrem as práticas de atendimento
humanizado ao usuário-cidadão no cotidiano deste hospital que, desde 2002, integra
a rede do Programa Nacional de Humanização de Assistência Hospitalar – PNHAH.
Sendo o Programa Nacional de Humanização uma política pública, é
pertinente sua avaliação, visando mensurar os resultados dos investimentos e
correções de rumos necessários à sua efetividade. Nesse sentido, este estudo teve
como proposta avaliar tal política, usando como referência os parâmetros propostos
pelo Ministério da Saúde para assistência hospitalar, durante o terceiro trimestre de
2010.
O Hospital Barão de Lucena (HBL), localizado na cidade do Recife, é parte
integrante da rede estadual de saúde de Pernambuco, sendo que 100 % dos seus
leitos são dedicados ao Sistema Único de Saúde (SUS). Caracteriza-se como
hospital de grande porte, terciário, com atendimento emergencial nas áreas de
obstetrícia e pediatria, disponibilizando ainda 33 ambulatórios nas diversas áreas
médicas e 314 leitos (PERNAMBUCO, 2004).
A unidade de pediatria do HBL atende mensalmente uma média de 5.264
crianças com idade de 0 a 12 anos, sendo 2.946 atendimentos provenientes da
emergência, 1.222 atendimentos de origem ambulatoriais e 1.096 internamentos. O
ambulatório possui várias clínicas especializadas, além da pediatria geral, Unidades
de Terapia Intensiva (UTIs) e uma enfermaria de 56 leitos, lócus específico desta
pesquisa.
A escolha da instituição para o estudo de caso baseia-se no fato de o
Hospital Barão de Lucena integra a rede do SUS, participando do Programa de
Humanização da Assistência Hospitalar, atual Programa Nacional de Humanização
(PNH). Outros fatores determinaram a opção por este hospital: ser referência
materno-infantil, ter o título da UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância)
de Hospital Amigo da Criança e possuir a Associação de Apoio às Crianças
(chamada de Barãozinho).
A necessidade de avaliar as práticas de atendimento no mencionado
Hospital, dentro das teorias abordadas pelo PNH, e a preo cupação com o
13

atendimento do usuário, trazem à baila questionamentos da efetividade do


programa, que procuram não só amenizar a intervenção hospitalar como promover a
capacidade de todos os atores envolvidos no processo – usuários, profissionais,
familiares e gestores de instituições – a participarem das atividades de prevenção e
cura, como promoção da saúde e da qualidade de vida individual e coletiva
(BRASIL, 2002).
A viabilidade deste estudo teórico-prático no ambiente de trabalho da autora
facilitou a obtenção dos dados que norteiam o planejamento de ações plausíveis,
quanto a sua empregabilidade à realidade concreta do serviço.
O atendimento nos serviços de saúde e seus resultados de pesquisa e
avaliação apontam a qualidade da atenção ao usuário como uma das questões mais
alarmantes do sistema de saúde brasileiro. A capacidade dos profissionais de saúde
em compreender as demandas e carências dos usuários chega a ser mais
enfatizada nas pesquisas que a própria ausência de médicos, de espaço nos
hospitais e de medicamentos, entre outros fatores relevantes. Assim, as ações em
humanização hospitalar não devem limitar-se à procura de melhorias na instituição
hospitalar, mas também à ampliação da formação educacional dos profissionais de
saúde, que pode encontrar-se defasada no que concerne a essa perspectiva
(BRASIL, 2002).
Os escândalos no âmbito da saúde pública ganham cada vez mais espaço
na mídia, chocando e incomodando cada vez menos a sociedade. Assiste-se
diariamente, como se fosse uma paisagem, a fatos que acontecem nas instituições
de saúde, denunciadores do despreparo e da falta de cuidados com a vida humana.
A morte de bebês por super lotação das UTIS, dezenas de mortes de idosos nos
asilos, as tragédias da hemodiálise, entre tantos outros. A perplexidade seguida do
pseudoconformismo passou a compor o rol de atitudes amorfas dos cidadãos diante
da dor e do ser.
Isso deixa exposto o deficiente sistema de atendimento médico à população
de baixa renda do País. A situação se agrava quando a televisão mostra os
pacientes nas longas filas de um atendimento que, muitas vezes, não se confirma. A
sociedade passou a gerar paradoxos em que os valores fundamentais da existência
humana passaram a ser relativos, principalmente em função do grande poder de
manipulação que a mídia possui (ANGERAMI-CAMON et al., 1997).
14

Tragédias similares se reproduzem em diversos países, passando a ideia de


que a desgraça individual é uma tragédia, e a coletiva, uma estatística, como se tudo
e todos pudessem ser resumidos a gráficos, em alguma tela distante e impessoal,
sem sentimentos, sem emoção, sem perplexidade, sem reação (ANGERAMI-
CAMON et al., 1997).
Nesse sentido, se estaria “coisificando” o ser humano, sem perceber nas
pessoas as características que as tornam humanas? Aqui se poderia recorrer à
teoria do reconhecimento e ao conceito de reificação de Axel Honneth, para explicar
a passividade e a indiferença do ser humano diante dos fatos e dos seus
semelhantes.
Para resgatar as relações humanas, necessárias nas práticas diárias do
cuidado e melhorar o atendimento ao usuário do SUS nos hospitais, foi lançado,
pelo Ministério da Saúde, o Programa Nacional de Humanização a Assistência
Hospitalar (PNHAH), no ano 2000 (BRASIL, 2002). Em 2003, o PNHAH excede os
limites dos hospitais, em sua perspectiva de rede, integrando todo o SUS, como
política prioritária e transversal. Surge então a Política Nacional de Humanização ou
Humanizasus (BRASIL, 2004). Nesse cenário iniciou-se a adoção de práticas
humanizadas nos hospitais da rede pública, dentre os quais figura o Hospital Barão
de Lucena, lócus desse estudo, que será mais bem abordado em outro momento.
Contextualizando os cenários das práticas de saúde com foco na
humanização, percebe-se que tais práticas partiram de uma visão integral do ser
humano em seu meio. O atendimento humanizado é considerado importante pelo
fato de estabelecer uma relação com bases nos princípios da participação social do
usuário, a integralidade da assistência, a equidade, entre outros. Isso leva a refletir
as práticas cotidianas, que devem visar o estímulo à criação de espaços de trabalho
menos alienantes e à valorização da dignidade do profissional de saúde e do
usuário.
É indiscutível o quanto a saúde pública brasileira tem avançado nas últimas
décadas, resultado da ampliação dos níveis de universalidade, equidade,
integralidade e controle social, princípios esses que norteiam o SUS. Por outro lado,
as dimensões sociais e subjetivas do cuidado parecem prejudicadas pela
fragmentação e verticalização dos processos (BRASIL, 2004).
A fundamentação teórica desta pesquisa é pertinente ao campo das políticas
públicas de saúde e seu objeto de estudo é o atendimento humanizado. A
15

importância de avaliar e monitorar políticas públicas de saúde é ressaltado nos


resultados de análises como as realizadas por Santos-Filho (2006) e Fagundes e
colaboradores (2009). No presente estudo, procura-se o entendimento da falta de
humanização na prática diária do cuidado ao paciente.
A formação acadêmica dos profissionais de saúde parece contribuir para
justificar o cotidiano do fazer. Observa-se diariamente um ritmo acelerado em busca
do conhecimento e tecnologia, onde profissionais de saúde são levados a
acompanhar tais transformações e mudanças. Certamente evoluiu-se muito nas
ciências física, química e biológica, entretanto não se pode dizer que se avançou no
mesmo ritmo em tecnologia social, psíquica e cultural.
Segundo Mattos (1992), a história da humanidade testemunha as poucas
mudanças que ocorreram em relação aos valores, emoções, vida e morte. As
indagações, tipicamente humanas, permanecem tão presentes quanto a mais de
dois milênios. Para se compreender melhor o homem, é indispensável conhecer sua
natureza, sua essência, suas necessidades básicas. É nesse sentido que o homem
tem necessidade de receber estima e consideração, que nada mais é que o
reconhecimento por seus méritos, a atenção em qualquer circunstância.
Em seu estudo publicado em 1992, sob o título “Luta por reconhecimento: a
gramática moral dos conflitos sociais”, Axel Honneth defende que a luta por
reconhecimento tem origem a partir de atitudes desrespeitosas, e que estas motivam
a resistência social, tornando-se base para movimentos coletivos. Sustenta ainda
que os indivíduos não almejam apenas o poder ou sua subsistência nos conflitos
sociais, como também esses conflitos não ocorrem essencialmente por questões
econômicas, podendo ser muitas vezes por necessidade de reconhecimento
enquanto ser humano. A resistência e a luta coletiva nascem quando a sociedade
percebe situações de desrespeito individual.
Para Honneth (2008), as relações humanas do cuidado, de reconhecimento
recíproco quando “esquecidas” resultam na patologia da reificação (amnésia), em
que o hábito de pensar numa perspectiva paralisada leva os homens a perderem a
capacidade de interesse pelo semelhante, por si mesmo e pelo mundo.
Transformam-se, assim, em observadores passivos que contemplam com
indiferença a si mesmo e a tudo em sua volta como “coisas”.
16

Dizer simplesmente que por questões morais não se pode tratar as pessoas
como coisas, não é apenas ir de encontro a uma norma de conduta. É atentar contra
as bases do discurso sobre moral, não reconhecer nem tratar o outro como próximo.
Hoje, muito se fala e reclama-se da desumanização das instituições de
saúde. O hospital reflete essa problemática como sendo um espelho da sociedade
tão indiferente e desumanizada. A humanização do atendimento nos hospitais
passa, obrigatoriamente, pela humanização da sociedade. Num contexto de
crescente tecnologização do cuidado, é urgente o resgate de uma visão
antropológica holística, que cuide da dor e do sofrimento humano, nas suas várias
dimensões, ou seja, física, social, psíquica, emocional e espiritual (PESSINI, 2006).
Redescobrir a humanização e reconhecer as pessoas como próximo,
fazendo parte existencial do outro é fundamental nas situações de sofrimento. Nessa
perspectiva, a teoria do reconhecimento parece contribuir para compreender a
urgência da sociedade moderna em humanizar-se e, nessa discussão, reconhece-se
a importância de um aprofundamento desses teóricos e até conhecer outros.
Uma vez realizada essa breve explanação, a tarefa proposta é descrever os
cenários relativos às políticas públicas de saúde no Brasil e da assistência
humanizada no Serviço de Pediatria do Hospital Barão de Lucena. Procura-se
revelar como a teoria do reconhecimento elaborada por Axel Honnet contribui para a
humanização do cuidado, a fim de responder não só como ocorrem, mas por que
ocorrem as práticas de atendimento humanizado, ao usuário-cidadão, na pediatria
do hospital Barão de Lucena.
A partir desse entendimento, é possível propor aos gestores do hospital,
ações complementares para melhoria dos serviços prestados a partir da análise dos
dados coletados na pesquisa.
O cumprimento dos objetivos deste trabalho, somado aos dados coletados e
analisados na pesquisa, são elementos elucidativos que dão conta das hipóteses
inicialmente formuladas: A surdez institucional (a ausência de uma cultura de
mecanismos de escuta-ouvidoria) e a falta de comunicação e monitoramento
permanente do grau de satisfação dos usuários e colaboradores podem prejudicar a
gestão do Hospital, dificultando a concretização das políticas públicas; aspectos
teóricos postos no Programa Nacional de Humanização não são observados nas
práticas diárias do hospital; a reificação, descrita na teoria de Honnet contribui para
criar ambientes menos humanizados.
17

Para isso, o trabalho é dividido em quatro capítulos. No primeiro capitulo


estão descritos cenários relativos às políticas públicas de saúde e a importância de
avaliá-las.
Com o objetivo de dar uma maior visibilidade ao assunto, será aqui
abordada à temática das políticas públicas, descrevendo alguns cenários e a
interface existente entre os processos econômicos, políticos e as práticas de saúde
para compreender o estado de arte da saúde no Brasil.
Continuando essa abordagem, faz-se imprescindível elucidar a importância
da humanização como política prioritária e transversal do SUS e para tanto,
conhecer a evolução da Política de Humanização da Saúde, conteúdo do programa
instituído pelo Ministério da Saúde e a importância de sua avaliação.
O segundo capítulo aborda como a teoria do reconhecimento de Axel
Honneth, descrita em sua obra A luta pelo reconhecimento: A gramática moral dos
conflitos sociais pode contribuir para explicar por que a sociedade moderna perdeu a
essência do ser humano e a urgência em humanizar as relações nas práticas do
cuidado em saúde.
Axel Honneth propõe uma teoria em que a formação da identidade é um
processo intersubjetivo de luta por mútuo reconhecimento em relação aos parceiros
de interação (HONNETH, 2009).
A sociedade parece fascinada pela ciência, pela tecnologia e pelos seus
progressos, a ponto de “coisificar” as pessoas e endeusar a técnica. Uma maneira
de amenizar a dureza dessa situação é voltar a descobrir que se é gente e que não
se vive sozinho. Precisa-se dos outros como os outros precisam de cada um.
Daí a importância de um olhar sob a teoria de Honneth para compreender
onde se perdeu a essência do ser humano e suas características tipicamente
humanas.
No terceiro capitulo descreve-se o contexto histórico e o cenário atual da
assistência humanizada no Hospital Barão de Lucena, utilizando dados primários
obtidos de memorandos, palestras, livro de ata e outros documentos internos do
Hospital.
O quarto e último capítulo serão reservados para análise e discussão dos
dados obtidos através de entrevista semi-estruturada no campo da pesquisa, com
perguntas elaboradas a partir de eixos teóricos do PNHAH (2002), que tratam de
18

parâmetros para humanização do atendimento de usuários e profissionais


(APÊNDICE B).
O estudo foi realizado sob cuidados éticos, com aprovação do comitê de
ética e pesquisa. A supracitada entrevista foi respondida por mães e profissionais,
no período de julho a agosto de 2010, após o pesquisador explicar o objetivo da
tarefa, ler e solicitar a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(APÊNDICE A).
A escolha deste recorte teve como objetivo questionar pessoas que já estão
recebendo os serviços do Hospital e passaram por processos de marcação de
consultas, avaliações profissionais, diagnóstico e encontram-se como
acompanhantes em internamento. Buscou-se avaliar também o grau de adoção das
práticas humanizadas no cotidiano do cuidado, na visão das mães (usuário) e dos
profissionais. Optou-se pela pesquisa qualitativa como metodologia de escolha, na
medida em que esta responde mais adequadamente às necessidades do presente
objeto de estudo.
Após análise e discussão dos dados coletados, finalizou-se a pesquisa
propondo aos gestores do HBL, ações complementares para melhoria dos serviços
prestados.
19

2 CENÁRIOS RELATIVOS ÀS POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL E A


IMPORTÂNCIA DE AVALIÁ-LAS

2.1 Políticas públicas: alguns apontamentos

O homem é um ser gregário. Necessita viver em grupo, na coletividade. Em


seu cotidiano, estabelece inúmeras relações, desempenhando variados papéis. Há
uma dimensão relacional nos contatos humanos de um modo geral, em diferentes
níveis. A diferenciação social presente nas sociedades modernas faz com que
pessoas de sexo, idade, religião, estado civil, valores, ideias, crenças, renda, entre
outras coisas, tenham que conviver lado a lado, o que torna algo complexo, gerando
muitas vezes conflitos (RUA, 1998). Para que a vida em sociedade seja possível,
segundo a autora, é preciso que o conflito seja mantido em níveis administráveis.
Isso só pode acontecer por dois meios: a coerção, pura e simples, e a política. O
primeiro modo, a coerção, quanto mais utilizada, mais reduzido se torna seu impacto
e mais elevado, seu custo. Desta forma, resta a política.
No entender de Rua (1998), embora a política também envolva coerção, não
está limitada a esta. A política consiste “no conjunto de procedimentos formais e
informais que expressam relações de poder e que se destinam à resolução pacífica
dos conflitos quanto a bens públicos” (RUA, 1998, p. 1). Já as políticas públicas –
policies – são, segundo a autora, outputs, resultantes da atividade política – politics:
consistem no conjunto das decisões e ações relacionadas à alocação imperativa de
valores.
Segundo a mesma estudiosa, distinguem-se política pública e decisão
política. A primeira geralmente envolve mais do que uma decisão e exige diversas
ações selecionadas de maneira estratégica, a fim de implementar as decisões
tomadas. A segunda corresponde a uma escolha diante de variadas alternativas, de
acordo com a hierarquia das preferências dos atores envolvidos, e expressa, de
algum modo, certa adequação entre os fins pretendidos e os meios disponíveis. Ou
seja, uma política pública pode implicar decisão política, mas nem toda decisão
política se constitui uma política pública.
20

Ainda na concepção de Rua (1998), as políticas públicas são decisões e


ações revestidas da autoridade suprema do poder público, envolvendo, portanto,
atividade política. Visam atender às demandas sociais expressas de forma
organizada ou não, envolvendo amplos setores da sociedade ou pequenos grupos.
Podem constituir reivindicações diversas como saúde, educação, transporte,
segurança pública, reconhecimento do direito do voto dos analfabetos, direitos de
greve, entre outros (RUA, 1998, p.2).
As políticas públicas ainda diferem das decisões políticas, uma vez que
envolvem mais do que uma opção e impõem variadas ações selecionadas de forma
estratégica a fim de implementar as decisões tomadas. A implementação significa
um conjunto de ações realizadas por grupos ou indivíduos, podendo ser de natureza
pública ou privada, direcionada a cumprir os objetivos estabelecidos. A dimensão da
política pública está relacionada não apenas ao tamanho do agregado social sobre o
qual incidem, mas ao seu caráter imperativo.
As políticas públicas podem ser definidas como um conjunto de disposições,
medidas e procedimentos que refletem a posição política do Estado, com o objetivo
de regular as atividades governamentais relacionadas às atividades de interesse
público (LUCCHESE, 2010). Para a autora, tais políticas se efetivam por meio de
ações concretas de sujeitos sociais e de atividades institucionais que as tornam
realidade em cada contexto em que são implementadas, condicionando seus
resultados. Muitos fatores influenciam de forma direta ou indireta as políticas
públicas, sendo importante acompanhar os processos pelos quais elas são
implementadas, bem como a avaliação do seu impacto sobre a situação existente.
Silva e Silva (2005) afirma que toda política pública é uma forma de
regulação ou intervenção na sociedade. Articula diferentes sujeitos, com interesses
e expectativas diversas. Consiste num conjunto de ações ou omissões do Estado
proveniente de decisões e não decisões, formado por jogo de interesses,
condicionados pelos processos econômicos, políticos e sociais. No seu entender:

a política pública se estrutura, se organiza e se concretiza a partir de


interesses sociais organizados em torno de recursos que também são
produzidos socialmente (...). São respostas institucionalizadas a situações
consideradas problemáticas, materializadas mediante programas, projetos e
serviços. Ainda, toda política pública é um mecanismo de mudança social,
orientada para promover o bem-estar de segmentos sociais, principalmente
os mais destituídos, devendo ser um mecanismo de distribuição de renda e
de equidade social (SILVA; SILVA, 2005, p. 38).
21

Percebe-se que a política pública visa atender demandas sociais através dos
bens produzidos também pela sociedade e solucionar problemas variados,
principalmente para as pessoas de menos recursos. Isso é alcançado através de
uma distribuição igualitária de renda e acesso a bens e serviços. Silva e Silva (2005,
p. 38-39) descreve que o processo das políticas públicas acontece num conjunto de
momentos não-lineares, articulados e interdependentes.
Para um melhor entendimento, há que se ter em mente algumas etapas
desse processo, que passa pela formalização do problema versus agenda
governamental. Isso significa dizer que, ao se fazer uma listagem de problemas e
assuntos que se destacam aos olhos da sociedade e do governo, esta pode ganhar
visibilidade por pressão social, transformando-se em questão social, que exige uma
política específica. Vale salientar que neste ponto surge uma equação da seguinte
forma: situação problema  questão social  agenda pública.
Uma segunda fase a ser aprofundada é a de formulação de alternativas de
política. Quando se busca o diagnóstico sobre a situação problema, as alternativas
para o enfrentamento dos empecilhos, baseadas no observar do conteúdo geral do
programa, são: o quê, qual programa, abrangência, escopo, quem beneficia; o onde
e quando; os recursos (quais, quanto e fonte); o aparato institucional (órgãos
responsáveis, legislação de apoio); responsabilidade (burocracia, equipe técnica,
parcerias).
É chegado o momento decisório, isto é, da adoção da política escolhida para
enfrentamento da situação problema que se resolve através do legislativo. Assim, a
política se torna um programa baseado em critérios técnicos apresentados pelos
formuladores e políticos do próprio legislativo.
Segue-se, então, a implementação ou execução do problema social,
constituindo a fase mais complexa e abrangente do processo de políticas públicas,
envolvendo mobilização de recursos humanos, financeiros ou materiais.
Evidentemente, trata-se da fase de execução de serviços, visando o cumprimento de
objetivos e metas pré- estabelecidas.
Observa-se, portanto, que uma política pública, desde seu nascimento, está
envolvida com a mobilização e alocação de recursos, com a divisão de trabalho
(tempo), com o uso de controles (poder), com a interação entre sujeitos, e lida com
interesses diversos, adaptações, riscos e incertezas sobre processos e resultados.
Vê-se que o processo de tais políticas é assumido por uma diversidade de atores,
22

orientados por diversas racionalidades e movidos por variados interesses, tornando-


o contraditório e não linear (SILVA; SILVA, 2005).
Tais sujeitos, segundo a autora, constituem-se de organizações sociais,
partidos políticos ou políticos individuais, administradores e burocratas, técnicos,
planejadores e avaliadores e, finalmente, o judiciário. Evidentemente, cada um
desses sujeitos volta-se para a natureza de seus propósitos, sendo as organizações
sociais (grupos de pressão e movimentos sociais diversos) aquelas que captam os
problemas da sociedade, transformando-os em questões sociais com a finalidade de
integrá-las, ou não, nas agendas públicas, orientadas pela lógica das necessidades,
e dos resultados.
Em relação aos partidos políticos e /ou políticos individuais, é pertinente
ressaltar que abraçam ou rechaçam determinadas políticas, sendo também
responsáveis pela tomada de decisões no estabelecimento das prioridades e
grandes objetivos políticos. Diferentemente dos grupos de pressão e organizações
sociais, focam prioritariamente as demandas. No que concerne a administradores e
burocratas, pela própria essência de suas funções, detêm-se eles na efetivação dos
programas sociais, sempre pautados para a racionalidade exigida nos
procedimentos, aplicando normas de acordo com a lógica legal (SILVA; SILVA,
2005).
Na etapa de formulação de alternativas de políticas e execução de
programas, evidenciam-se as participações de técnicos, planejadores e avaliadores
propondo alternativas de política e execução de programas, sempre atentando para
lógica dos fins de resultados. Segue-se, enfim, o judiciário, responsável por garantir
os direitos do cidadão, fundado na lógica da legalidade.
Junto a estes sujeitos, ainda se destaca o papel da mídia, no que se refere à
visibilidade dos problemas sociais e ao acompanhamento das ações, principalmente
da formação das políticas. Constata-se, desse modo, que são muitos os atores
envolvidos, desde a formulação até a implementação de uma política pública,
expondo a complexidade e a abrangência desse processo. Tem-se, então, uma
justificativa de muitas políticas não obterem sucesso ou não atenderem da forma
que se pretende às demandas que lhe deram origem.
23

2.2 Interface entre os processos econômicos, políticos e as práticas de saúde.

O Brasil tem um histórico de desigualdade social desde o seu


descobrimento. Colonizado com fins absolutamente ligados ao lucro, o povo
brasileiro sempre foi muito carente da participação efetiva do poder público e suas
políticas. A pobreza e a desigualdade no Brasil se mostram como algo gerado por
um déficit histórico de cidadania em um país que viveu sob regime escravo por
quatro séculos. As políticas públicas, portanto, visam atingir os mais excluídos e
carentes, proporcionando o acesso à saúde, saneamento básico, educação,
segurança, entre outros (FERNANDES, 2007).
Paim e Teixeira (2006) entendem política de saúde como a resposta social
(ação ou omissão) de uma organização (como o Estado) perante as condições de
saúde da população e seus demais determinantes. Diz respeito à produção,
distribuição, gestão e regulação de bens e serviços que atingem a saúde humana e
o ambiente, associados à questão do poder na área da saúde, ao estabelecimento
de diretrizes, planos e programas de saúde. Ou seja, “abrange o estudo das
relações de poder na conformação da agenda, na formulação, na condução, na
implementação e na avaliação de políticas” (p. 74). Assim sendo, a política de saúde
estuda o papel do Estado e sua relação com a sociedade, suas condições de saúde
e seus determinantes. Busca definir ações públicas que solucionem os problemas,
por ventura, detectados pelos instrumentos do poder público.
Lucchese (2010) define as políticas públicas em saúde como um conjunto de
disposições, medidas e procedimentos realizados pelo Estado, visando regular a
atividade governamental relativa às tarefas de interesse público. Integram o campo
de ação social do Estado, orientado no sentido de propiciar condições de saúde à
população, proteger o ambiente natural, social e do trabalho. Destacam-se das
outras políticas por buscar promover, proteger e recuperar a saúde dos indivíduos e
da coletividade.
Para se compreender as articulações entre os processos econômicos,
políticos e as práticas de saúde no Brasil, é necessário conhecer as raízes históricas
destas políticas que foram sendo implantadas ao longo da formação do Estado
brasileiro. Estudar a trajetória da política de saúde no Brasil, dos antecedentes da
24

ação estatal até os dias de hoje, é importante para se compreender quanto o setor
sofreu influências do contexto político-social que o Brasil atravessou. De acordo com
Polignano (2001, p. 2), para se analisar a história das políticas públicas de saúde no
Brasil, é relevante considerar algumas premissas:

A evolução histórica das políticas de saúde está atrelada de forma


indissociável à evolução político-social e econômica da sociedade;
A lógica do processo evolutivo sempre obedeceu à ótica do avanço do
capitalismo;
A saúde nunca ocupou lugar central dentro da política do estado
brasileiro; os problemas de saúde só chamam atenção quando se
apresentam em forma de epidemias e deixam de ter importância
quando se tornam endemias;
As ações de saúde propostas pelo governo sempre buscam incorporar
os problemas de saúde que atingem grupos sociais importantes, de
regiões sócio-econômicas também importantes, em detrimento de
grupos sociais dispersos e sem uma efetiva organização;
A conquista de direitos sociais (saúde e previdência) tem sido sempre
resultante de poder de luta, de organização e de reivindicação
popular, e nunca uma dádiva do Estado;
A história da saúde permeia e se confunde com a história da
previdência social no Brasil em determinados períodos;
A dualidade entre medicina preventiva e curativa sempre foi uma
constante nas ações política de saúde implementadas no Brasil.

A partir destas premissas, Polignano (2001) descreve, junto com outros


autores, a trajetória das políticas de saúde no Brasil a partir dos períodos históricos.
A preocupação com a saúde no Brasil não constitui uma discussão ou um
acontecimento recente. De acordo com revisão histórica feita por Marinho, Moreno e
Cavalini (2001), a assistência médico-hospitalar neste País iniciou-se como atividade
de caridade e filantropia da Igreja Católica, com a fundação das Santas Casas de
Misericórdia. Tais instituições visavam à internação de pacientes com transtornos
mentais, abrigo para pessoas sem habitação e doentes terminais portadores de
25

enfermidades não infecto-contagiosas, desde que estes fossem isolados do convívio


social. Assim, os hospitais não tinham finalidade terapêutica, mas serviam para
retirar do seio da sociedade pessoas que não se enquadravam nos parâmetros do
considerado como adequado.
Tal constatação histórica denota a falta de preocupação dos governantes do
período colonial, Império, República Velha e Estado Novo. Estes, até meados do
século XX, deixam por conta das Santas Casas a prestação de serviços hospitalares
no País.
A partir da década de trinta, surgem as primeiras instituições hospitalares de
cunho privado, que rapidamente apresentam crescimento e avanço econômico e
têm em vista a necessidade premente na sociedade que recebe os hospitais
privados como a possibilidade de preencher, até então, o vazio do cuidado com o
setor no Estado.
Em Pernambuco, podem-se citar como exemplo os hospitais D. Pedro II e
Ulysses Pernambucano que, no princípio do século XIX, iniciaram suas construções.
Em 1847, foi lançada a pedra fundamental do Hospital Pedro II e anos depois, em
1874, iniciou-se a construção do Hospital dos Alienados (Tamarineira). Toda área da
Tamarineira foi adquirida com dinheiro do tesouro da então Província de
Pernambuco e doações maciças do povo (BARBOSA, 2008; CARVALHO, 2010).
O Hospital D Pedro II começou a funcionar em 10 de março de 1861. Mesmo
sem ter concluído suas obras, em 1859 foi palco de um baile oferecido pela
Associação Comercial de Pernambuco em homenagem ao Imperador D. Pedro II,
que visitava o Recife. Nesse evento, houve liberação de recursos financeiros da
província, para a área de saúde (BARBOSA, 2008).
Além de ter abrigado o curso de obstetrícia para mulheres e uma escola de
enfermagem, ao longo de sua existência, em 1920 o Hospital D. Pedro II passa a
servir ao ensino da medicina. Mediante convênio firmado em 1946 com a
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), o Hospital recebe a denominação de
Hospital das Clínicas (BARBOSA, 2008).
Paralelo à história do hospital D. Pedro II, em 1924, através de decreto
governamental, o Estado de Pernambuco assume a administração do Hospital da
Tamarineira, que mantém em precárias condições. Em 1930, o hospital passa a ser
administrado pelo médico Ulysses Pernambucano, responsável pela sua
restauração e criador da escola de psiquiatria nesse hospital, colaborando para o
26

desenvolvimento acadêmico e o tratamento dos pacientes da região (CARVALHO,


2010). Embora tombado pelo Patrimônio Histórico do Estado pelo decreto estadual
15650 de 1992, o Hospital Ulysses Pernambucano está em negociação com a
iniciativa privada para construção de um shopping center.
Durante muitos anos, a administração desses hospitais ficou sob a
responsabilidade das irmãs de caridade da Santa Casa de Misericórdia, instituição
que, não apenas no Recife, mas em muitas cidades brasileiras, se preocupou com a
assistência médica para os menos favorecidos (BARBOSA, 2008; CARVALHO,
2010).
Da fase do descobrimento ao primeiro reinado, aproximadamente no ano
1825, não havia no Brasil nenhum modelo de atenção à saúde da população e nem
mesmo o interesse, por parte do governo colonizador (Portugal) em criá-lo. Na
época, este País encontrava-se à margem do capitalismo mundial, dependente
econômica e politicamente de Portugal. Nesse contexto, a atenção à saúde limitava-
se aos próprios recursos da terra (plantas, ervas) e àqueles oriundos dos
conhecimentos empíricos (curandeiros), que desenvolviam as suas habilidades na
arte de curar.
A vinda da família real ao Brasil exigiu a necessidade da organização de
uma estrutura sanitária mínima, capaz de fornecer suporte ao poder que se instalava
na cidade do Rio de Janeiro. De acordo com Bertolozzi e Greco (1996), naquela
época inexistia um sistema de saúde formalmente estruturado, com ações de caráter
focal para a população em geral, uma vez que apenas uma pequena minoria, como
os senhores do café, tinham acesso aos profissionais legais da medicina, trazidos de
Portugal. Até então, funcionava no País uma saúde pública baseada na corrente do
sanitarismo, com ações promovidas mediantes campanhas, as quais eram
abandonadas logo que se conseguiam conter os surtos então presentes.
Na ocasião, a carência de profissionais médicos no Brasil Colônia e no Brasil
Império era imensa. A falta de uma mínima assistência médica estruturada fez com
que proliferassem pelo País os boticários (farmacêuticos). Diante da escassez de
profissionais devidamente habilitados, em 1808, Dom João VI fundou o Colégio
Médico – Cirúrgico no Real Hospital Militar da Cidade de Salvador (Bahia). Nesse
mesmo ano, foi criada a Escola de Cirurgia do Rio de Janeiro.
Na República, de 1889 a 1930, ainda não havia um modelo sanitário para o
País, o que deixava as cidades brasileiras à mercê das epidemias. Este fato, aliado
27

à falta de políticas sociais e de saúde, gerou uma eclosão de epidemias de febre


amarela e peste bubônica, entre outras (BERTOLOZZI; GRECO,1996).
No período em que a sociedade brasileira esteve dominada por uma
economia agro-exportadora, apoiada na monocultura do café, o sistema de saúde
nacional era apenas uma política de saneamento destinado aos espaços de
circulação das mercadorias exportáveis e a erradicação ou controle das doenças
que poderiam prejudicar a exportação. Portanto, no final do século XIX até o início
dos anos 60, predominou o modelo do sanitarismo campanhista (POLIGNANO,
2001).
De acordo com Braga e Paula (1986 apud BRAVO, 2001, p. 4), as principais
alternativas adotadas para a saúde pública brasileira, no período de 1930 a 1940,
foram:

Ênfase nas campanhas sanitárias;


Coordenação dos serviços estaduais de saúde dos estados de fraco poder
político e econômico, em 1937, pelo Departamento Nacional de Saúde;
Interiorização das ações para as áreas de endemias rurais, a partir de 1937,
em decorrência dos fluxos migratórios de mão-de-obra para as cidades;
Criação de serviços de combate às endemias (Serviço Nacional de Febre
Amarela, 1937; Serviço de Malária do Nordeste, 1939; Serviço de Malária da
Baixada Fluminense, 1940, financiados, os dois primeiros, pela Fundação
Rokefeller – de origem norte-americana);
Reorganização do Departamento Nacional de Saúde, em 1941, que
incorporou vários serviços de combate às endemias e assumiu o controle da
formação de técnicos em saúde pública.

Conforme referido, na época, os operários não tinham quaisquer garantias


trabalhistas e lutaram para mobilizar e organizar a classe operária no Brasil pela
conquista dos seus direitos. Dadas as péssimas condições de trabalho existentes e
da falta de garantias de direitos trabalhistas, o movimento operário formulou e fez
eclodir duas greves gerais no País, uma em 1917 e outra em 1919, conquistando
alguns direitos. Assim, em 24 de janeiro de 1923, foi aprovada pelo Congresso
28

Nacional a Lei Eloi Chaves, marco inicial da previdência social no Brasil, instituindo as
Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAPs) (POLIGNANO, 2001).
As CAPs concediam benefícios pecuniários, nas modalidades de
aposentadorias e pensões, prestação de serviços do tipo consultas médicas e
fornecimento de medicamentos. Para que isso fosse possível, criou-se um fundo
composto pelo recolhimento compulsório do empregado: 3 % do salário do
empregador, 1 % da renda bruta das empresas e da União, 1,5 % das tarifas dos
serviços prestados pelas empresas (CORDEIRO, 1981 apud BERTOLOZZI; GRECO,
1996).
Vale ressaltar que a crise do modelo exportador capitalista, o aumento da
dívida externa, a crise mundial do café, entre outros, afetaram a economia brasileira,
criando condições propícias para a Revolução de 1930. O êxodo rural, decorrente da
bancarrota do café, acelerou o processo de industrialização e urbanização do País,
aumentando os surtos epidêmicos, por conta do excesso populacional. Nesse
período, delineou-se uma política nacional de saúde por meio da criação do Ministério
da Educação e Saúde, embora fosse de caráter restritivo, limitado a certos
segmentos de trabalhadores. Os programas de saúde eram voltados para a criação
de condições sanitárias mínimas, que garantiam a infraestrutura necessária para
suportar o contingente migratório. O salário mínimo foi estabelecido e os Institutos de
Assistência Previdenciária (IAPs) começaram a prestar serviços no âmbito da
assistência médica (BERTOLOZZI; GRECO, 1996).
Em 1953, foi criado o Ministério da Saúde, embora limitado a um mero
desmembramento do antigo Ministério da Saúde e Educação, sem apresentar nova
postura do governo quanto à saúde pública. Em 1956, surge o Departamento
Nacional de Endemias Rurais (DNERU), absorvendo os antigos serviços nacionais de
febre amarela, malária e peste (POLIGNANO, 2001).
Nesse mesmo ano, no Estado de Pernambuco, dá-se o início da construção
do hospital Barão de Lucena e, posteriormente, instala-se o Instituto de Medicina
Integral Professor Fernando Figueira, o IMIP. Como lócus desse trabalho, o HBL será
abordado no terceiro capítulo.
O IMIP é fundado, em 1960, por iniciativa de um grupo de médicos liderados
pelo professor Fernando Figueira. Como entidade filantrópica, atua nas áreas de
assistência médica-social, ensino, pesquisa e extensão comunitária, sendo o primeiro
hospital do Brasil a receber o título de “hospital amigo da criança”, concedido pela
29

Organização Mundial de Saúde/UNICEF/MS, por seu trabalho de incentivo ao


aleitamento materno (IMIP, 2010).
Em 2006, nos cinquenta anos de sua fundação, o Instituto de Medicina
Integral Professor Fernando Figueira (IMIP) assumiu o compromisso de reativar o
Hospital Pedro II, após 20 anos inativo, agregando-o a outros dez prédios, formando
o maior complexo hospitalar do Norte e Nordeste do Brasil. O projeto liderado pelo
IMIP para restaurar o prédio do Hospital Pedro II, para que o mesmo voltasse a ser
como antigamente, um hospital-escola, foi concluído, e agora pertence à Faculdade
de Medicina do IMIP. Em agosto de 2010, o Hospital Pedro II foi reinaugurado,
estando restaurado e preservado arquitetonicamente, voltando a oferecer à
população serviços médicos de excelência, por meio da instalação de equipamentos
de última geração (BARBOSA, 2008). Para tanto, o IMIP conta com as contribuições
financeiras dos governos federal, estadual e municipal, além de doações individuais.
Voltando aos anos 60, grande passo foi dado no que diz respeito à proteção
do povo brasileiro com a Lei Orgânica da Previdência Social – lei 3.807, de 1960. A
partir desse ponto, estabeleceu-se a unificação do regime geral da previdência social,
destinado a abranger todos os trabalhadores sujeitos ao regime da CLT, exceto os
trabalhadores rurais, os empregados domésticos e os servidores públicos e de
autarquias, que tivessem seus próprios regimes de previdência. Os trabalhadores
rurais só viriam a ser incorporados ao sistema três anos depois, com a promulgação
da lei 4.214, de 03/03/1963, que instituiu o Fundo de Assistência ao Trabalhador
Rural - FUNRURAL (BRAVO, 2001).
O movimento instalado em 31 de março de 1964 agravou ainda mais os
grandes problemas brasileiros. Em 1967, implantou-se o Instituto Nacional de
Previdência Social (INPS), reunindo os seis Institutos de Aposentadorias e Pensões,
o Serviço de Assistência Médica e Domiciliar de Urgência (SAMDU) e a
Superintendência dos Serviços de Reabilitação da Previdência Social. A criação do
INPS propiciou a unificação dos diferentes benefícios ao nível do IAPs. Unificando o
sistema previdenciário, o governo militar se viu na obrigação de incorporar os
benefícios já instituídos fora das aposentadorias e pensões, como o da assistência
médica, já oferecida pelos vários IAPs, sendo que alguns destes já possuíam serviços
e hospitais próprios. Para alocar recursos, foram estabelecidos convênios e contratos
com a maioria dos médicos e hospitais existentes no País, pagando-se pelos serviços
produzidos (pro-labore), o que propiciou a estes grupos a capitalização. Tal
30

procedimento desencadeou um efeito cascata com o aumento no consumo de


medicamentos e de equipamentos médico-hospitalares, formando um complexo
sistema médico-industrial, que veio a se tornar o Instituto Nacional de Assistência
Médica da Previdência Social (INAMPS) em 1978, com a criação de uma estrutura
própria administrativa (BRAVO, 2001).
Oliveira e Teixeira (1986) apontam as características desta conjuntura com
seu modelo de privilegiamento do agente privado. Isso significava promover a
extensão da cobertura previdenciária, abrangendo quase toda a população urbana.
Após 1973, seriam incluídos os trabalhadores rurais, empregados domésticos e
trabalhadores autônomos.
Outro aspecto bem nítido na formação do INAMPS se refere à ênfase na
prática médica curativa individual, assistencialista e especialista, e articulação do
Estado com os interesses do capital, via indústrias farmacêuticas e de equipamento
hospitalar.
Não se pode deixar de assinalar a criação do complexo médico-industrial,
responsável pelas elevadas taxas de acumulação de capital das grandes empresas
monopolistas internacionais na área de produção de medicamentos e de
equipamentos médicos. A esta altura, é pertinente evidenciar a interferência estatal
na previdência. Tal procedimento estimulou um padrão de organização da prática
médica orientada para a lucratividade do setor de saúde. Isso veio propiciar a
capitalização da medicina e privilegiar o agente privado desses serviços.
É mister apontar que o instituto em foco objetivava a organização da prática
médica em moldes compatíveis com a expansão do capitalismo no Brasil, com a
diferenciação do atendimento em relação à clientela e das finalidades que esta
prática cumpre em cada uma das formas de organização da atenção médica.
Segundo Polignano (2001), esse modelo não foi capaz de solucionar os
principais problemas de saúde coletiva, uma vez que privilegiava a medicina apenas
curativa. Além disso, constatou-se a incapacidade do sistema em atender a uma
população cada vez mais pobre, bem como as irregularidades e os desvios de verba
do sistema previdenciário para cobrir despesas de outros setores. Salienta-se a
realização de obras por parte do governo federal, o que provocou o não repasse pela
União de recursos do tesouro nacional para o sistema previdenciário.
É pertinente destacar que os anos 80 sinalizaram uma virada política no
Brasil com o movimento das Diretas Já (1985), rompendo com o regime ditatorial
31

instaurado em 1964. O setor público entrou em crise, e o setor privado passou a


direcionar seu modelo para parcelas da população, classe média e categorias de
assalariados, organizando uma nova base estrutural. Nesse mesmo período, o
subsistema de atenção médico-supletiva cresce vertiginosamente, de tal modo que,
no ano de 1989, chega a cobrir 31.140.000 brasileiros, correspondentes a 22 % da
população total, e apresentando um volume de faturamento de US$ 2,423 milhões de
dólares (MENDES, 1992 apud POLIGNANO, 2001). Este sistema era baseado num
universalismo excludente, beneficiando e fornecendo atenção médica apenas para
aqueles que tinham condições financeiras para arcar com o sistema, excluindo a
população como um todo.
Quanto ao subsistema público, este ficou com a incumbência de atender à
grande maioria da população (em torno de 120.000.000 de brasileiros em 1990), com
os minguados recursos dos governos federal, estadual e municipal. Em 1990, o
Governo edita as Leis 8.080 e 8.142, conhecidas como Leis Orgânicas da Saúde,
regulamentando o SUS, criado pela Constituição de 1988 (POLIGNANO, 2001).
Em um cenário político em transição de um regime militar para um
democrático, ocorreu a VIII Conferência Nacional de Saúde (CNS), com o objetivo de
mudar as precárias condições de saúde da população. Aquele fórum reuniu
representantes de toda sociedade e não apenas técnicos profissionais de saúde,
intelectuais e políticos, que decidiram três temas cruciais: saúde como direito do
cidadão e dever do Estado, reformulação do Sistema Nacional de Saúde e o
financiamento do setor (AROUCA et al., 1986).
A VIII Conferência Nacional de Saúde, em 1986, trouxe à tona as políticas de
saúde que deveriam ser discutidas pelo coletivo, fato este que marcou de forma
incisiva a história da saúde no Brasil, ao definir um programa para a reforma sanitária.
Segundo Bertolozzi e Greco (1996), a VIII Conferência representou:

Um avanço técnico e um pacto político, ao propor a criação do


Sistema Único de Saúde (SUS), tendo como diretrizes: a
universalidade, a integralidade das ações e a participação social,
além de ampliar o conceito de saúde, colocando-o como um direito
dos cidadãos e um dever do Estado (p. 392).

Os autores ressaltam que o Estado se antecipou à implementação do SUS,


criando por decreto o Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS), que
reduzia a máquina previdenciária do nível federal, transferindo os serviços de saúde
32

para os estados e municípios, estabelecendo um gestor único da saúde em cada


esfera do governo.
A VIII CNS representa, portanto, um marco na política de saúde, vez que
seu relatório final traduz a vontade da maioria dos participantes, servindo como base
para a pré-constituinte da saúde realizada dois anos depois, com suas diretrizes
incorporadas à Constituição Brasileira (AROUCA et al., 1986).
A exclusão e, por consequência, a pobreza e a desigualdade não são novas
no Brasil. Ressalte-se terem distintas faces que se perpetuaram por fatores
históricos e culturais e se consolidaram pela sistemática omissão do Estado e da
nação brasileira de enfrentá-las como questão social de enorme gravidade, por meio
de políticas públicas voltadas à proteção e ao desenvolvimento social. Nesta
perspectiva, Maria Paula Dallari Bucci (2008) reflete que “[...] Os direitos sociais
representam uma mudança de paradigma no fenômeno do Direito, a modificar a
postura abstencionista do Estado para o enfoque prestacional, característico das
obrigações de fazer que surjam com os direitos sociais” (p. 22).
A formação da sociedade e a ação do Estado no Brasil foram, desde o
nascimento da Nação até praticamente o final do século XX, dramaticamente
concentradores de renda e de oportunidades e, portanto, geradores de desigualdade
e de distintas manifestações de formas de exclusão. Nos dias de hoje, para a
construção de um modelo de proteção social não-contributiva, estão intimamente
relacionados fatores como a pobreza, a desigualdade, a vulnerabilidade e risco que
afetam os indivíduos, famílias ou grupos, independente até mesmo da classe social
a que pertencem. É essencial para que se garanta igualmente uma multiplicidade de
“ações” que, em última análise, cercam as diferentes situações apresentadas pelos
usuários (MATTOS, 1992).
No Brasil, os anos 60, 70 e 80 foram marcados por lutas que impunham não
apenas a recolocação das funções e deveres do Estado, como também os direitos
dos homens. Nos anos 80, com o surgimento da Reforma Sanitária, iniciou-se a
formação de um projeto novo na área de saúde, tornando este direito de todos,
firmando os princípios de atenção íntegra e participação social do usuário e
igualdade no atendimento.
Sendo a valorização da saúde formada no contexto de direito do cidadão,
percebe-se, inclusive, uma mudança de visão, já que em décadas anteriores via-se
o doente como ser frágil e dependente. Modificar a maneira de se entender o
33

usuário do serviço de saúde, direcionando a construção da cidadania, ainda é um


desafio.
A Constituição de 1988, no capítulo VIII da Ordem social e na secção II
referente à saúde, institui no artigo 196 que a saúde é direito de todos e dever do
estado, garantidos mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do
risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e
serviços para sua promoção, proteção e recuperação. No art. 198, o SUS tem a
seguinte definição:

Art. 198 - As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede


regionalizada e hierarquizada, e constituem um sistema único,
organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II - atendimento integral, com prioridade para as atividades
preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;
III - participação da comunidade.
§ 1º - O sistema único de saúde será financiado, nos termos do Art.
195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras
fontes.
§ 2º - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde
recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados
sobre:

Com o nascimento do Sistema Único de Saúde, o SUS, a saúde passa a ser


vista como um direito social universal custeado pelo Estado, representando um novo
marco no campo das políticas públicas de saúde (ANDRADE, 2001). Nesse
contexto, segundo o autor, nasceu a Seguridade Social no Brasil, objetivando, entre
outros:

“universalidade da cobertura e do atendimento, uniformidade e


equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e
rurais, seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e
serviços, irredutibilidade do valor dos benefícios, equidade na forma
de participação no custeio” (p. 27).

Estabelecendo a saúde como direito de todos e dever do Estado, a


Constituição determina que as ações e serviços de saúde tenham relevância política
e, portanto, devem ser regulamentadas, fiscalizadas e controladas pelo Poder
Público.
34

A concepção do SUS adotada pela Carta Magna, de 1988, repousa na


formulação de um modelo de saúde voltado para as necessidades da população,
buscando resgatar o compromisso do Estado para com o bem-estar social,
especialmente no que refere à saúde coletiva. Apesar de esse serviço ter sido
definido pela mencionada Constituição, somente foi regulamentado em 19 de
setembro de 1990, através da Lei 8.080, que lhe definiu o modelo operacional,
propondo a sua forma de organização e de funcionamento.
Concebido como o conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por
órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da administração
direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, o SUS tem como
princípios doutrinários a universalidade, a equidade, a integralidade, a
descentralização e comando único. Também a resolutividade, a regionalização e
hierarquização, a participação popular, com objetivos voltados para a identificação e
divulgação dos fatores condicionantes e determinantes da saúde. Visa também à
formulação de políticas de saúde destinadas a promover, nos campos econômico e
social, a redução de riscos de doenças e outros agravos; e execução de ações de
promoção, proteção e recuperação da saúde, integrando as ações assistenciais com
as preventivas, de modo a garantir às pessoas a assistência integral à sua saúde
(POLIGNANO, 2001).
Ressalta-se que, o SUS, embora sofrendo ao longo da sua existência as
consequências da instabilidade institucional e da desarticulação organizacional na
arena decisória federal, apresentou progressos significativos, no nível da atenção
básica, como os programas de saúde da família. No entanto, ainda continua
enfrentando graves problemas com o setor privado, que detém a maioria dos
serviços de complexidade e referência no nível secundário e terciário.
No Sistema Único de Saúde, o indivíduo apresenta direcionamento às
práticas de qualificação da saúde, prestando ação integral e equânime, valorizando
os trabalhadores, usuários, controle social e participativo. Com base nestes
conceitos, pode-se dizer que há a preferência do indivíduo subjetivo e social na
prática e gestão do SUS, sendo firmado o compromisso dos direitos do cidadão,
respeitando as diferenças no que tange à raça, ao gênero, à etnia, à opção sexual,
ao compromisso com a democratização das relações de trabalho e à relevância dos
profissionais de saúde, havendo estímulo de educação permanente (BRASIL, 2002).
35

O conceito de cidadania está ligado aos valores éticos, tais como a


liberdade, a dignidade e a igualdade da humanidade. Não indiferente às condições
dignas de sobrevivência, concedendo os direitos nos diversos aspectos, ou seja,
físico, social, psíquico, emocional e espiritual. Valorizar o usuário de tais serviços de
saúde como sujeito de direitos, significa valorização do conceito de cidadania,
capacitando-o a ter autonomia, levando-o a discernir que a humanização se difere
da caridade e direcionando-o para a possibilidade de ser participante das ações e
decisões (LEITE; STRONG, 2006).
O que é produzido no plano da coletividade entre governo-Estado-políticas
públicas é o que garante o significado das mesmas e norteia o Estado no que se
refere à política pública, política dos coletivos, saúde pública, saúde coletiva, saúde
de cada sujeito e saúde da população. Foi o caminho do movimento das políticas
públicas de saúde, elaboradas para os cidadãos, que impulsionaram o SUS. Este
último é, fundamentalmente, uma rede comprometida na defesa da vida, direitos e
relações de cidadania.
Paralelo ao caminho percorrido na construção do SUS, não se pode deixar
de referir o quanto também esteve presente o debate da humanização das práticas
de saúde no Brasil. O processo de humanização no Brasil dá-se, portanto, a partir
de décadas anteriores a 1980, surgindo de uma nítida preocupação com a forma de
atendimento hospitalar vigente. Nessa época, a assistência à saúde centra-se no
atendimento especializado, curativo e individual, não se constituindo como direito de
todos. (BENEVIDES; PASSOS, 2005a).
Em contrapartida, nessa mesma década, a organização e o funcionamento
dos sistemas de saúde foram marcados pelos princípios da eficácia, efetividade e
eficiência. A partir dos anos 90, são incorporadas às noções de qualidade, equidade,
satisfação e autonomia do usuário. Nesse contexto, inicia-se o debate da temática
da humanização como caminho para a qualidade na atenção ao usuário (FORTES,
2004). Desenham-se outras políticas e programas, dentre eles, o PNH (Programa
Nacional de Humanização) que será abordada mais adiante.
A partir de 1992, a opção neoliberal, que se torna hegemônica no campo
econômico, procura rever o papel do Estado e o seu peso na economia nacional,
propondo redução para o chamado estado mínimo, inclusive na área social. Assim
amplia os espaços nos quais a regulação se fará pelo mercado capitalista. Na
ocasião foram editadas as chamadas Normas Operacionais Básicas (NOB),
36

instrumentos normativos, cujo objetivo consistia em regular a transferência de


recursos financeiros da União para estados e municípios, o planejamento das ações
de saúde, os mecanismos de controle social, dentre outros.
A primeira NOB foi editada em 1991. Polignano (2001, p. 26-29) afirma que
muitas mudanças então ocorreram principalmente a extinção do INAMPS, com a
criação do SUS. O impeachment sofrido pelo Presidente Collor; o governo de
Fernando Henrique Cardoso, que manteve a ideologia neoliberal, intensificando a
crise no setor da saúde; a criação do CPMF (contribuição provisória sobre
movimentação financeira),pelo então Ministro da Saúde, Adib Jatene; a edição da
NOB-SUS 01/96, que representa um avanço importante no modelo de gestão do
SUS, principalmente no que se refere à consolidação da municipalização, entre
outros.
Para Bravo (2001), a proposta de política de saúde construída na década de
1980 acabou sendo desconstruída nos anos 90. Assiste-se ao redirecionamento do
papel do Estado, influenciado pela política de ajuste neoliberal, ficando a saúde
vinculada ao mercado. Quanto ao SUS, seu avanço ficou comprometido por diversas
razões:

O desrespeito ao princípio da equidade na alocação dos recursos


públicos pela não unificação dos orçamentos federais, estaduais e
municipais;
Afastamento do princípio de integralidade, ou seja, indissolubilidade entre
prevenção e atenção curativa, havendo prioridade para a assistência
médico-hospitalar em detrimento das ações de promoção e proteção da
saúde.

No governo Lula, de acordo com Bravo (2001), manteve-se a política


macroeconômica do governo anterior, e as políticas sociais continuam fragmentadas
e subordinadas à lógica econômica. Assim sendo, a concepção de seguridade social
não foi valorizada, prevalecendo a segmentação das três políticas: saúde,
assistência social e previdência social.
Embora constasse na agenda presidencial a reforma sanitária, o atual
governo sustentou a polarização entre os dois projetos: reforma sanitária e projeto
37

de saúde articulado ao mercado ou privatista. Bravo (2001, p. 16) destaca alguns


aspectos de inovação da política de saúde no atual governo:

O retorno da concepção de reforma sanitária, abandonado nos anos 90;


A escolha de profissionais comprometidos com a luta pela reforma
sanitária para ocupar o segundo escalão do Ministério;
As alterações na estrutura organizativa do Ministério da Saúde;
A convocação extraordinária da 12ª Conferência Nacional de Saúde e a
escolha do representante da CUT para assumir a secretaria executiva do
Conselho Nacional de Saúde, embora esta não tenha avançado no
fortalecimento da mencionada reforma.

De acordo com Bravo (2001) como continuidade da política de saúde dos


anos 90, ressalte-se a ênfase na focalização, na precarização, na terceirização dos
recursos humanos, no desfinanciamento e na falta de vontade política para viabilizar
a seguridade social. Cite-se, também, o não enfrentamento das grandes questões
do SUS (universalização das ações, financiamento efetivo, política de recursos
humanos e política nacional de medicamentos).
São indiscutíveis os avanços na saúde pública brasileira. Entretanto, não se
pode negar que o SUS constitucional, descrito em lei, está longe do SUS que hoje
se vivencia. Seu fortalecimento constitucional não se tem desenvolvido como
esperado no governo Lula, havendo uma grande distância entre a proposta do
movimento sanitário e a prática social do sistema público de saúde vigente (BRASIL,
2004).
Desse modo, a luta pelo Projeto de Reforma Sanitária ainda continua, e há
um longo caminho a ser percorrido, sendo importante defender, segundo Bravo
(2001, p. 210), as propostas aprovadas no 8º Simpósio sobre Política Nacional de
Saúde ocorrido em Brasília, em junho de 2005, como:

Definição de uma política nacional de desenvolvimento que garanta uma


redistribuição de renda de cunho social;
Defesa da Seguridade Social como política de proteção social universal;
Defesa intransigente dos princípios e diretrizes do SUS;
38

Retomada dos princípios que regem o Orçamento da Seguridade Social,


mas imediatamente, regulamentar a Emenda Constitucional nº 29;
Cumprimento da deliberação do Conselho Nacional de Saúde, contrária a
terceirização da gerência e gestão de serviços e de pessoal do setor de
saúde;
Avançar no desenvolvimento de uma política de recursos humanos em
saúde, com eliminação de vínculos precários.

Na prática, o que se assiste é a contratação de gestores da saúde, através de


seleção simplificada, sem concurso público, privilegiando aqueles oriundos da
iniciativa privada. Ressalta-se também a gestão do IMIP, para as diversas unidades
de pronto- atendimento a saúde (UPAS), recém inauguradas no atual governo.

2.3 O cuidado hoje: a Política Nacional de Humanização

A saúde pública brasileira tem se esforçado para cumprir os princípios e


diretrizes do SUS definidos em legislação, e, dessa forma, avançar no que compete
ao direito do cidadão. Por outro lado, as dimensões sociais e subjetivas do cuidado
parecem prejudicadas pela fragmentação e verticalização dos processos que
envolvem saúde - doença (BRASIL, 2004).
Segundo Benevides e Passos (2005), a partir do marco histórico do SUS, o
Ministério da Saúde passa a propor várias ações e programas no campo da
humanização, como: Carta ao Usuário do SUS, Programa Nacional de Avaliação
dos Serviços Hospitalares (PNASH), Programa de Humanização do Pré-Natal e
Nascimento e Programa de Acreditação Hospitalar, entre vários outros1.
Vale aqui pôr em destaque a íntima relação entre humanização, qualidade e
satisfação do usuário. Dentre tantas, contudo, umas das propostas de humanização
mais popularizadas no âmbito das políticas públicas é o Programa de Saúde da
Família (PSF), implantado pelo Ministério da Saúde a partir de 1994. Tal proposta

1
Esclareço que, no espaço para construção da presente dissertação de mestrado, foram citados tais programas,
mas o foco será o Programa Nacional de Humanização.
39

aproxima as políticas e os profissionais da população, mergulhando na realidade das


pessoas, adentrando suas casas, visando conhecer, mais de perto, cada sujeito
objeto do cuidado ou para os quais tais políticas foram formuladas. Dessa forma,
não mais o usuário tem que ir ao serviço, mas o serviço vai até o usuário. Portanto,
um novo modelo de cuidado.
No Estado de São Paulo, este projeto teve início em 1996, como um modelo
de atenção que incorporou as perspectivas do SUS, priorizando reordenar a
assistência nos aspectos relacionados à prevenção, à promoção da saúde e ao
atendimento aos doentes. O enfoque na humanização compreende a atenção
integral voltada para o indivíduo e a família, por meio de ações de equipes
multidisciplinares desenvolvidas nos âmbitos da unidade de saúde, do domicílio e na
própria comunidade.
Diante do aumento significativo de reclamações no que tange à qualidade do
atendimento nas redes de saúde, a temática de humanização na rede hospitalar no
País foi fator relevante para a criação do Programa Nacional de Humanização da
Assistência Hospitalar. Houve, então, o convite do Ministro José Serra aos
profissionais da rede de saúde mental, com a finalidade de desenvolver melhoria de
trabalho voltada à humanização dos serviços prestados em hospitais públicos.
(BRASIL, 2002).
O Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar (PNHAH) -
lançado em 24 de maio de 2000 e instituído através das portarias ministeriais:
GM/MS nº 881, SAS/MS nº 202, ambas de 19/06/2001e SAS/MS nº 210 de
20/06/2001, originou-se por meio de interfaces do Ministério da Saúde. Ele tem
como proposta reduzir as dificuldades encontradas durante o tratamento, favorecer a
recuperação da comunicação entre as equipes de profissional de saúde e o usuário,
incluindo a família, diante do momento de fragilidade emocional do paciente,
garantindo a qualidade do funcionamento do Sistema Único de Saúde ao absorver a
política de valorização e respeito à vida humana (BRASIL, 2002).
De certa forma, é recente a discussão sobre humanização no contexto
hospitalar. Diariamente, no atendimento aos indivíduos nos serviços de saúde e nos
resultados oriundos de pesquisas de avaliação desses serviços, transparece a
qualidade da atenção ao usuário sendo uma das questões mais alarmantes do
sistema de saúde brasileiro.
40

A Política Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar – PNHAH –


tem como propostas ações que venham modificar a forma de atender o usuário nos
hospitais públicos do Brasil, desenvolvendo a eficiência e eficácia em tais serviços,
sendo o ponto fundamental deste o estreitamento das relações entre o profissional
de saúde, o usuário e a comunidade. Assim, procura-se a valorização do
dimensionamento humano e subjetivo de toda assistência à saúde, constituindo uma
medida protetiva, aproximando-se às carências do usuário. Assim, permite também
ao profissional de saúde, melhores condições de enfrentamento ao esgotamento
originado pelos limites impostos no desempenho de suas funções profissionais
(BRASIL, 2001).
O Programa tem, como principais objetivos, o estímulo à realização de
parcerias, a modernização das relações de trabalho dentro dos hospitais públicos
(ocasionando uma relação humanizada, objetivando recuperação e confiança do
serviço de saúde pública prestado na comunidade) e também o fortalecimento e
articulação de tais iniciativas.
O público alvo do PNHAH são as Secretarias Estaduais e Municipais de
Saúde e os hospitais da rede pública de saúde do Brasil. A metodologia utilizada é
com base na multiplicação dos preceitos acima discutidos em hospitais da rede
pública, tendo o apoio das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, como dos
hospitais capacitados, sendo estes transformados em Centros de Referência em
Humanização (BRASIL, 2002).
Grupos de Multiplicadores formados por profissionais capacitados bem como
por representantes de todas as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde foram
distribuídos pelas regiões do Brasil. Tais multiplicadores responsabilizaram-se em
difundir o PNHAH dentro das regiões, contando com o apoio logístico das
secretarias de saúde que participam do Programa, juntamente com os
representantes das secretarias já capacitados pelas equipes de consultores. Os
multiplicadores atuam na capacitação técnica dos representantes dos hospitais e no
acompanhamento e supervisão do trabalho realizado nos hospitais participantes. Os
estados e municípios que constituem cada Grupo de Multiplicação representam-se
por um coordenador de Humanização e suplente, indicados pelas Secretarias de
Saúde, com a responsabilidade de acompanhamento e implantação do Programa e
comunicação das necessidades, oportunidades e respostas alcançadas em seu
estado ou município (BRASIL, 2002).
41

Estes grupos capacitam os profissionais indicados pelas secretarias de


saúde para desenvolverem o Programa Nacional de Humanização. Os mesmos,
ainda, em conjunto com as equipes técnicas de capacitação, devem acompanhar e
avaliar a implementação dos resultados do programa, agindo como referência local
da Rede Nacional de Humanização.
Com este trabalho nos hospitais, prevê-se a criação de um Grupo de
Trabalho de Humanização Hospitalar, formado por lideranças representativas do
coletivo de profissionais, cujos objetivos estão em divulgar as vantagens de uma
assistência humanizada. Este grupo deverá levantar pontos críticos referentes ao
funcionamento da instituição, expondo ideias para mudanças e criando estratégias
que venham beneficiar os usuários, profissionais de saúde e comunidade,
fortalecendo as iniciativas humanizadoras já existentes (BRASIL, 2002).
Os Grupos de Trabalho de Humanização Hospitalar apresentam como
objetivo a construção de espaço coletivo democrático, de escuta, análise,
elaboração e decisões sobre os projetos de humanização. Além de apoiar a
ressonância à diversidade de iniciativas humanizadoras dentro do hospital em prol
dos usuários e profissionais de saúde.
A proposta do Programa de Humanização é a condução de um processo
firme de mudança da cultura de atendimento nas redes de saúde. Tem ainda como
propostas: promover o respeito à dignidade humana e realizar um trabalho em
conjunto com a gestão hospitalar através do vínculo à Rede Nacional de
Humanização, voltada para o Programa Nacional de Humanização da Assistência
Hospitalar e a interligação às propostas existentes entre os setores das instituições
de saúde, a gestão, os usuários e a comunidade.
A intervenção dos Grupos de Trabalho de Humanização Hospitalar se
expressa em quatro planos diferenciados, sendo eles: o pedagógico, no qual se
pensa em contribuir para educação continuada, promoção de eventos voltados para
educação e treinamento de áreas e profissionais e divulgação de temas de interesse
da coletividade; o político, que desenvolve o processo de democratização das
relações de trabalho; o subjetivo, que sustenta um processo de reflexão contínua no
que se refere às mudanças na área de trabalho e, por último, o comunicativo, que
cria linhas de informações importantes aos profissionais, ofertando conhecimento de
projetos relevantes à humanização em andamento no hospital.
42

O Comitê Técnico de Humanização desempenha atividades tais como:


acompanhamento do trabalho das secretarias, dos mecanismos de incentivo aos
hospitais, das parcerias estabelecidas, das avaliações parciais e finais dos
resultados, criação e manutenção de canais de comunicação com a equipe e com o
Ministério da Saúde, implantação da Rede Nacional de Humanização, dentre outras.
Às equipes técnicas de capacitação competem as seguintes ações:
promoção do programa junto às secretarias, o desenvolvimento regional do
Programa de Humanização, a eleição de prioridades e possibilidades de
implantação do programa como também a sua divulgação e difusão, o apoio à
promoção de eventos e a distribuição do material de suporte do Programa.
Competem ainda a essas equipes: capacitar, instruir, treinar, acompanhar e
supervisionar os recursos humanos, utilizando metodologia e acompanhamento
adequado às necessidades e às possibilidades de cada região, além de ministrar o
curso de formação e capacitação dos agentes de humanização.
Neste sistema, cada equipe tem um responsável para delegar as funções de
expor ao Comitê informações sobre as questões conceituais e metodológicas nos
encontros, como sugestões e relatórios de seu grupo, além de distribuir os materiais
arrecadados nas reuniões.
O título de Hospital Humanizado serve de incentivo para aprimoramento da
instituição, que atender satisfatoriamente aos indicadores de serviço humanizado e
tiver um Grupo de Trabalho de Humanização Hospitalar concreto e atuante,
obedecendo adequadamente às atribuições estabelecidas para seu funcionamento.
É importante que haja o reconhecimento e estímulo do processo de
humanização entre os profissionais e as instituições, tornando-se imprescindível que
o hospital, de fato humanizado, tenha um tratamento diferenciado pelos gestores
públicos de saúde e órgãos governamentais.
Em 2002, avançando na agenda pública de saúde no Brasil, é realizada a
11° Conferência Nacional de Saúde, em que se estabeleceram as diretrizes para a
política de saúde com o tema “Efetivando o SUS: acesso, qualidade e humanização
na atenção à saúde, com controle social” (BRASIL, 2002).
Em março de 2003, durante o XX Seminário Nacional dos Secretários
Municipais de Saúde e o 1º Congresso Brasileiro de Saúde e Cultura de Paz e não
Violência, realizado em Natal/RN, lançou-se a Política Nacional de Humanização
(PNH) ou HUMANIZASUS. A partir de então, o Ministério da Saúde aponta a
43

humanização da saúde como área prioritária de sua atuação, ampliando o programa


que anteriormente tinha seu foco nos hospitais (PNHAH), passando para todo o
sistema de saúde.
Com o objetivo de viabilizar uma saúde digna para todos, conforme reza a
Carta Magna Brasileira, bem como preparar profissionais comprometidos com a
ética da saúde e com a defesa da vida, criou-se no Brasil a Política Nacional de
Humanização e Gestão da Saúde (PNH/Humaniza SUS). Essa apresentou questões
fundamentais que podem nortear a construção de políticas em saúde. Nesse
contexto, “humanizar é, então, ofertar atendimento de qualidade, articulando os
avanços tecnológicos com acolhimento, com melhoria dos ambientes de cuidado e
das condições de trabalho profissionais” (p. 6). Deve ser adotada como política
transversal, com princípios e diretrizes transformadas em ações nos diversos
serviços, nas práticas de saúde e instâncias do sistema (BRASIL, 2004).
O desempenho deste programa exige responsabilidade, colocando cada
instituição a assumir o lugar de sujeito ativo no exercício de transformar a cultura de
atendimento e de redesenhar a imagem do serviço público de saúde, tão
desvalorizado ao longo da história diante da comunidade, garantindo, assim, o bom
funcionamento do Sistema Único de Saúde, o SUS; (BENEVIDES; PASSOS,
2005b).
Atualmente, o PNH funciona como uma rede de comunicação através de
vários portais eletrônicos governamentais e não governamentais, trocando
experiências institucionais e profissionais. Tem o objetivo de aprimorar o
aprendizado das práticas do cuidado em saúde e vem se firmando como política
transversal do SUS, na perspectiva de rede. Entretanto tem enfrentado grandes
desafios para qualificação de um sistema solidário e inclusivo (BRASIL, 2004).
Assim, a PNH tem como princípios norteadores o estímulo à produção de
saúde e de sujeitos; a modernização das relações de trabalho, fortalecendo a
transdisciplinaridade; a valorização da dimensão subjetiva e social nas práticas de
atenção e gestão; o funcionamento em rede de modo solidário e de acordo com as
diretrizes do SUS e a utilização da informação na construção de aprendizado de
sujeitos e coletivos.
A implantação de novas práticas de humanização tem a finalidade de prestar
benefício tanto aos usuários quanto aos profissionais, capacitando estes últimos
para uma nova definição de assistência à saúde que enfatize a cidadania e a vida
44

humana, aprimorando a qualidade e a eficácia da atenção dispensada aos usuários


do SUS (BRASIL, 2004).
Santos-Filho (2009) afirma que a PNH coincide com os próprios princípios
do SUS, com ênfase na necessidade de assegurar a atenção integral à população,
propondo estratégias que ampliem a condição de direitos e de cidadania das
pessoas. Como política voltada para a transdisciplinariedade, visa à organização dos
processos de trabalho em saúde, focalizando transformações nas relações sociais
entre trabalhadores e gestores, na maneira como conduzem seus serviços e nas
formas de produzir e prestar serviços à população. O trabalho em equipe e a
participação dos atores são valorizados, vez que os processos decisivos dizem
respeito a todos, numa co-responsabilização de gestores, trabalhadores e usuários.
A acessibilidade e a integralidade são elementos dessa política, as quais almejam
uma “clínica ampliada”, que trate melhor as necessidades dos sujeitos, bem como a
formação dos profissionais, numa educação permanente. O autor destaca as marcas
e objetivos centrais que deverão permear a atenção e a gestão da saúde:

A responsabilização e o vínculo efetivos dos profissionais para com o


usuário; o seu acolhimento em tempo compatível com a gravidade de
seu quadro, reduzindo filas e tempo de espera para atendimento; a
garantia dos direitos do código do usuário do SUS; a garantia de
gestão participativa aos trabalhadores e usuários; estratégias de
qualificação e valorização dos trabalhadores, incluindo educação
permanente, entre outros (p. 30).

Percebe-se que a humanização visa, como política pública, atender aos


usuários de forma digna e também valorizar os trabalhadores. Isso deve incluir, em
suas ações, a obtenção de respostas concretas para as necessidades da população
e para a formação e reconhecimento dos profissionais que atuam no campo da
saúde. Nesse sentido, como saber se os resultados obtidos com determinada
política são ou não o esperado e qual o impacto causado para determinada
situação?
Essas respostas são captadas através das avaliações. A Política Nacional
de Humanização possui objetivos e princípios bem definidos, como o SUS (Sistema
Único de Saúde), e assim sendo, critérios e indicadores de sua efetividade devem
ser utilizados, contribuindo para sua visibilidade e consolidação.
45

Santos-Filho (2006) e Fagundes e Moura (2009) apontam para a importância


de avaliar e monitorar políticas públicas de saúde. Avaliar é atribuir valor, com a
finalidade de aprovar ou desaprovar uma determinada política ou programa. É
através da avaliação que o gestor se orienta para a tomada de decisões, corrigindo
os erros para atingir os resultados com maior eficiência, efetividade e eficácia, não
se esquecendo de que o compromisso da administração pública moderna é com o
bem estar – social.
Evidencia-se que tal estudo tem como proposta avaliar a Política Nacional
de Humanização, de acordo com os parâmetros propostos pelo Ministério da Saúde
para assistência hospitalar.

2.4 Avaliação da política de humanização no campo da saúde

A relevância de avaliar e monitorar políticas públicas de saúde deve-se ao


fato das informações obtidas nessas análises constituírem ferramentas de gestão.
Para Figueiredo, M (1986) e Figueiredo, A (1986) não existe análise neutra de
políticas públicas, ou seja, supõe-se que o analista traz, em si, um juízo de valor.
Arretche e Brant (2006) ressaltam a importância de usar instrumentos corretos de
análise, uma vez que não se pode deixar confundir opção pessoal com resultados
da avaliação. Ainda para Figueiredo, M (1986) e Figueiredo, A (1986) o
estabelecimento de conexões lógicas entre objetivos, critérios e modelos analíticos é
o mais importante nas avaliações.
Santos Filho (2009) afirma que a avaliação acompanha a história do homem
desde muito tempo. Em seus estudos, aponta a complexidade desse procedimento
no âmbito da humanização. Segundo ele, “O desenho das avaliações deve ser
precedido por amplas discussões que definam bem os objetivos e situações
desejadas, e aquelas que possam configurar-se como linhas de base e parâmetros
para análises subsequentes” (p. 32). A avaliação deve ser conduzida por todos os
envolvidos, buscando verificar se tais políticas respondem aos anseios dos usuários
e trabalhadores. Deve ser utilizada a associação de métodos, além da mesclagem
de técnicas de abordagens quantitativas e qualitativas.
46

As marcas e objetivos centrais das políticas públicas no campo da saúde


definem prioridades, recursos a serem aplicados e metas a serem atingidas, o que
permite que se façam avaliações sobre seus resultados, não apenas averiguando o
cumprimento das metas pré-estabelecidas e reafirmando os conceitos macro-
referenciais destas, mas também a complexidade das dimensões deles derivados.
Nesse sentido, deve-se atentar para aquilo a ser avaliado, a ser mensurado
(SANTOS-FILHO, 2009). O autor aponta duas vertentes que devem direcionar a
avaliação das ações de humanização: delimitação dos objetivos específicos da PNH,
selecionando um elenco de indicadores, que servirão para acompanhamento e
monitoramento permanente das ações/intervenções e estruturação dos desenhos de
pesquisas avaliativas, buscando dimensionar os efeitos das intervenções.
Através dos indicadores, podem-se obter informações relevantes sobre
dimensões do estado de saúde e também do desempenho do sistema de saúde,
pois trazem no seu bojo uma noção de quantificação de informações e estão
vinculados a critérios de confiabilidade e validade. Na perspectiva metodológica e
operacional, os indicadores vêm sendo classificados como de estrutura, processo e
resultados.
Os indicadores de estrutura englobam os recursos ou insumos utilizados no
sistema de saúde (que podem ser humanos, materiais e financeiros); os de processo
incluem as atividades e procedimentos envolvidos na prestação de serviços; e os de
resultados referem-se às respostas das intervenções para aqueles que tenham sido
beneficiados por elas.
Atualmente, têm sido incluídas medidas de qualidade de vida em geral,
graus de incapacidade, autonomia, avaliações de satisfação dos usuários,
mudanças de comportamento das pessoas, entre outros. Eficiência, eficácia e
efetividade são efeitos de intervenção a serem avaliados. Além destes, incluem-se
também a equidade, o acesso, a adequação, a aceitação e a qualidade técnico-
científica (SANTOS-FILHO, 2009).
Ainda de acordo com Santos-Filho (2009), a avaliação na perspectiva da
PNH deve-se constituir buscando os significados específicos de sua contribuição
para as mudanças e resultados, como, por exemplo, no acolhimento com avaliação
de risco, em que se deve buscar identificar os aumentos ocorridos nos percentuais
de cobertura dos usuários (incluindo os casos nos quais esse atendimento não foi
realizado) e de encaminhamentos adequados. Define os seguintes princípios a
47

serem considerados na discussão dos indicadores na PNH, com vistas à


apropriação dos conceitos básicos presentes em sua concepção e a ampliação dos
pressupostos para sua construção:

O desafio de definirem indicadores, quantitativos e/ou qualitativos,


contextualizados nas diferentes dimensões abrangidas pela PNH,
refletindo inclusive seus processos de caráter menos estruturados e
às vezes mais subjetivos. Isso evitaria o distanciamento entre os
princípios da humanização e o recorte apenas de variáveis “mais
fáceis” de serem mensuradas. A seleção isolada de variáveis
consideradas “ideais” ou “convenientes” para medidas reduziria a
visibilidade do processo e alcance da Política de Humanização. (...) É
necessário definir indicadores confiáveis e válidos, evitando o risco de
se definirem indicadores inadequados para refletir as situações
desejadas... (p. 46).

O autor ressalta, ainda, a importância da inclusão de diferentes tipos de


indicadores, com aspectos de confiabilidade e validade. A confiabilidade refere-se aos
processos de aferição (dados objetivos, resultados concretos, transformações no
próprio processo, dinâmica dos serviços, nas relações entre as pessoas, interação
com os usuários etc.), ou seja, buscando identificar como observar essas situações.
Quanto à validade, buscar formas de chegar a instrumentos válidos, mesclando
métodos de aferição, buscando validação. Por isso, é relevante definir claramente o
que ser quer observar e como isso vai ser processado.
Assim, autores, como Martins e Bógus (2004), acreditam que a utilização de
vários métodos de abordagem para avaliar a política de humanização, se justifica
pela complexidade do tema que carece dar conta de todos os aspectos envolvidos, o
que implica vários enfoques complementares. Defendem ainda a análise qualitativa
para essa avaliação, por acreditarem ser insuficiente a simples verificação de
critérios.
Como Minayo e Sanches (1993), estes autores procuram justificar os
números encontrados na pesquisa, utilizando abordagens mais amplas que
respondam questões referentes ao “como” e ao “por que” do processo, partindo do
princípio de que os estudos quantitativos e qualitativos acabam se completando.
Avaliar o PNH é, no entanto, tarefa difícil, por sua complexidade. O simples
fato de atender aos critérios preconizados pelo Ministério da Saúde, não é suficiente
como indicador e sim o seu significado, sua essência e o que ele modifica no modo
de fazer e de existir da instituição (SANTOS-FILHO, 2007).
48

3 AS CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA DO RECONHECIMENTO DE AXEL


HONNETH NA HUMANIZAÇÃO DA SAÚDE

Este capítulo aborda como a teoria do reconhecimento de Axel Honneth


descrita, em sua obra, “A Luta pelo Reconhecimento: a gramática moral dos conflitos
sociais”, em 1992, pode contribuir para explicar por que a sociedade moderna
perdeu a essência do ser humano e a urgência em humanizar as relações nas
práticas do cuidado em saúde. Antes, porém, é preciso situá-lo no tempo e no lugar
em que vive nos postos que ocupou ou ocupa e denotadamente as influências
recebidas por autores que lhe precederam ou lhe foram contemporâneos.
Pensador alemão da atualidade, nascido em Essen, em 1949, Honneth teve
uma formação cultural ampla, estudando filosofia, sociologia e germanística em
grandes centros da Alemanha. Ainda jovem, aos 34 anos, teve sua tese de
doutoramento aprovada em Berlim. Pouco tempo depois, foi publicada em livro sob o
título de “Críticas do poder: estágios de reflexão de uma teoria social crítica”
(NOBRE apud HONNETH, 2009).
Teve a oportunidade de ser assistente de Jurgen Habermas na Universidade
de Frankfurt - Instituto de Filosofia, entre 1984 e 1990. Lá apresentou sua tese de
livre docência, publicada como livro em foco neste trabalho. No ano de 1996,
Honneth sucedeu Habermas na Universidade de Frankfurt. Em maio de 2001,
assumiu a direção do Instituto de Pesquisa Social na mesma universidade.
A obra de Axel Honneth revela sua preocupação com a realidade social na
moderna sociedade contemporânea democrática. Há um contínuo questionamento
deste filósofo sobre o pensamento dos seus antecessores e deles vai refutando
algumas posições, ampliando outras ou mesmo abraçando muitas. Falar em
Honneth é ir ao encontro da posição singular e notória que ele estabeleceu no
interior da Teoria Crítica, na qual detecta um “déficit sociológico” no trabalho de
Horkheimer.
Explica-se a esta altura o posicionamento de Max Horkheimer, que
juntamente com Felix Weil e Friedrich Polloch fundou o Instituto de Pesquisa Social
na Universidade de Frankfurt em 1930. O Instituto era financiado por doações
privadas e seu diretor teria uma posição acadêmica consolidada. Isso possibilitaria a
efetivação de estudos nitidamente marxistas, o que era restrito a poucas instituições
49

universitárias naquele momento histórico. Logo que lhe foi viável, assumiu, em 1930,
o Instituto de Pesquisa Social, ocupando a cátedra que cabia ao Instituto e cujo
nome foi designado por ele de Filosofia Social. O objeto precípuo que ele perseguiu
constituiu um programa de pesquisa interdisciplinar, cuja referência teórica era a
obra de Marx e o marxismo. Surgia, assim, a vertente intelectual da Teoria Crítica
(NOBRE apud HONNETH, 2009).
Mais adiante, serão aprofundados neste trabalho aspectos da Teoria Crítica
ainda sob tal visão e as discordâncias de outros teóricos, especialmente de
Honneth. Esclareçam-se agora, as características mais gerais da Teoria Crítica, e
como essa foi se desenvolvendo.
É oportuno falar que a expressão “Escola de Frankfurt” ficou bastante
conhecida, por motivos políticos e históricos. Conforme se sabe, alguns pensadores
ligados a tal teoria assistiram a mudanças sucessivas da sede para Genebra, Paris e
Nova York, durante o nazismo (décadas de 30 e 40). Só após a Segunda Guerra
Mundial viram-na retornar. Esses pensadores obtiveram postos de direção no
Instituto de Pesquisa Social e na Universidade de Frankfurt. A partir desse momento
(1950), Horkheimer foi a grande figura da “Escola de Frankfurt” na direção do
Instituto. Theodor W. Adorno, seu íntimo colaborador, o sucedeu como reitor da
Universidade em 1958 (NOBRE apud HONNETH, 2009).
As décadas de 50 e 60, como não podiam deixar de ser, foram de grande
agitação política e intelectual. A designação “Escola de Frankfurt” pode dar força ao
debate público alemão através do posicionamento e prestígio de Adorno e
Horkheimer. Vale ressaltar que a mencionada “Escola” constituiu-se uma forma de
intervenção não partidária, quer no âmbito acadêmico, quer no da esfera pública
entendida mais amplamente.

3.1 A Teoria Crítica e o Reconhecimento

De tudo que foi comentado, chega-se ao entendimento de que “Escola de


Frankfurt” e Teoria Crítica não representam uma só realidade. Originalmente,
Horkheimer, em 1937, usava a primeira designação querendo significar o campo
50

teórico do marxismo. Por isso, o assunto em questão dizia “Teoria Tradicional e


Teoria Crítica”. O pensamento expresso na Teoria Crítica pretende compreender a
sociedade à luz de uma emancipação. Partia da convicção de que era viável tal
emancipação, estando essa apenas cercada pela lógica própria da organização
vigente. Horkheimer defende que a sociedade em seu conjunto só é compreendida
se houver uma “orientação para emancipação da dominação”. Segundo Nobre (apud
HONNETH, 2009, p. 9):

sendo efetivamente possível uma sociedade de mulheres e homens


livres e iguais, a pretensão a uma mera “descrição” das relações
sociais vigentes, por parte do teórico tradicional é duplamente
parcial: porque exclui da “descrição” “as possibilidades melhores
inscritas na realidade social e, porque, com isso, acaba encobrindo-
as.

Então parece claro que a atividade do teórico crítico tem inerente a exigência
de que a teoria seja a expressão de um comportamento crítico relativamente ao
conhecimento produzido e à própria realidade social que tal conhecimento pretende
apreender. Esses princípios da teoria crítica, herdados de Marx, fundamentam-se no
pensamento de que uma sociedade emancipada está calcada na forma atual de
organização social, como uma tendência real de desenvolvimento. Nos anos 40,
foram Horkheimer e Adorno afastando-se criticamente do diagnóstico e das soluções
propostas por Marx e pelo marxismo. Nesse ponto, constata-se a existência de um
foco de sociedade posta entre estruturas econômicas determinantes e a socialização
do indivíduo, não sendo a ação vista como mediadora necessária (NOBRE apud
HONNETH, 2009).
Em relação a Jürgen Habermas, é necessário comentar que esse “trabalhou”
a Teoria Crítica alargando o conceito de nacionalidade e de ação sem captar como o
próprio sistema e sua lógica instrumental são resultado de permanentes conflitos
sociais. É exatamente aí o ponto em que Honneth vê o conflito como objeto central
da Teoria Crítica. Conforme é sabido, foi ele buscar embasamento em vários autores
antigos ou contemporâneos, estando entre tantos Maquiavel, Hegel, Horkheimer,
Adorno, Marx, Mead e outros. Honneth chama mais atenção para as proximidades
que para as diferenças entre Habermas e os demais pelo procedimento profícuo,
qual seja, trabalhar os elementos negligenciados para identificar a viabilidade social
51

crítica. A partir daí seu estudo estaria ancorado no processo de construção social
(NOBRE apud HONNETH, 2009).
Assim, no concernente às concepções básicas de conhecimento, há que se
fazer referência ao fato de que elas são diferentes daqueles de Horkheimer, “uma
vez que a teoria habermasiana pretende oferecer à ação social um lugar mais
destacado que no modelo de Horkheimer“ (SOUZA, 2009, p. 66). Pode-se então
afirmar que na perspectiva de Honneth, Habermas parte do interesse prático,
enfatizando que, apesar das mudanças, a Teoria Crítica tem ali seu primeiro ponto
de definição através do tempo e das gerações. Ressalta-se que sua apreensão só
pode ser realizada por meio do estudo sobre seu contexto constitutivo.
Em Horkheimer havia apenas dois tipos de interesse cognitivo (o empírico e
o crítico), enquanto Habermas aponta para a existência de um terceiro, o
hermenêutico (SOUZA, 2009). Sabe-se, pois, que a forma teórica que Harbemas
chama de teoria analítica das ciências, pautada por interesse técnico, é um tipo de
conhecimento fundamentalmente positivista. Percebe a si mesmo de forma reificada,
sem qualquer foco para um interesse hermenêutico em sua composição e também
seu entendimento histórico. Como método da compreensão do fenômeno humano, a
hermenêutica surge em resposta a uma tentação de “absoluto”, típico dos sistemas
filosóficos até Hegel, com seu conceito de “espírito”. (SOUZA, 2009).
Honneth identifica, em sua teoria, convergências com o pensamento
habermasiano. Este pensador diagnostica que o capitalismo passou a ser regulado
pelo Estado, e chegou então às duas tendências fundamentais para a emancipação
como colocadas no marxismo (a do colapso interno e a da organização do
proletariado contra a dominação do capital), que tinham sido neutralizadas. É aí que
surge a evidência de que tanto em Habermas quanto em Horkheimer e Adorno,
estão presentes esses elementos. Esclareça-se que Habermas não constata que as
oportunidades para a emancipação estejam estruturalmente bloqueadas, mas sim
que seria necessário repensar o próprio sentido da emancipação da sociedade.
(SOUZA, 2009).
Na opinião de Honneth, Habermas faz a caracterização da ciência como o
processo teórico de apropriação da natureza de modo não tão distante de
Horkheimer. Este defendia a existência de uma “atitude crítica”, mas Habermas
pretende fazê-lo de maneira indireta, mostrando que a compreensão da existência
de formas alternativas de interesses cognitivas são bloqueadas pela generalização
52

positivista dos ideais e interesse empírico-analítico. Habermas quer mostrar que a


essência tradicional visa a que seu método de universalização dos procedimentos
positivistas possua validade geral, mesmo que tais procedimentos somente sejam
aplicáveis às questões de apropriação técnica da natureza (HONNETH, 2009).
Em suma, a crítica habermasiana reside nas questões sociais que
parecerem ser tratadas tecnicamente, isso pelo fato de prevalecer a consciência
positivista. Neste momento, contrapondo-se a submissão de tudo à lógica positivista,
“Habermas busca fundamentar sua teoria em uma noção de auto-entendimento
comunicativo que ultrapasse os limites da teoria científica e se refira à constituição
mesma dos homens” (SOUZA, 2009, p.68).
O interesse cognitivo denominado de hermenêutico surge como uma
condição necessária à reprodução humana. Salienta-se que o hermenêutico
combina a dimensão antropológica, do trabalho e comunicativa do entendimento.
Este é o momento crucial em que Habermas se distancia da teoria crítica tal qual se
postara desde sua fundação. A ênfase é dada para os acordos comunicativos, que,
para ele, garantem até mesmo a capacidade de apropriação da natureza, assim
como o desenvolvimento das identidades, as quais só podem ocorrer por meio da
intersubjetividade (SOUZA, 2009).
Um ponto honnethiano de discordância de Habermas é o de “mundo de
vida”. Este estudioso via aquelas tendências derivadas do domínio de racionalidade
instrumental no capitalismo, administrado como forma de colonização do mundo da
vida, à qual podem se opor estruturas próprias da ação comunicativa (teoria da ação
comunicativa). Assim, Honneth acredita que Habermas apenas ampliou o conceito
de racionalidades e de ação social, ambos operando segundo princípios de
integração opostos. Desse modo, o ponto de distinção entre sistema e mundo de
vida pode ser colocado na assertiva de que a Teoria da Ação Comunitária versus
dialética do conhecimento tem aspectos em comum: identificação dos conflitos da
sociedade e a socialização do indivíduo, sem que considere a ação social como
mediadora. Por isso, Honneth julgou a Teoria de Habermas como detentora de um
“déficit sociológico” (NOBRE apud HONNETH, 2009).
Ao lado da hermenêutica e dos entendimentos técnicos, Habermas
reconhece uma terceira habilidade da razão. Para este autor, seria liberar uma
consciência correta: “movimento de reflexão”. Honneth questiona a validade desse
conceito em função de acreditar ser ele ou não um processo básico para o
53

desenvolvimento da espécie humana. Fala-se de uma “teoria do ego” no qual a


identidade, isto é, sua formação, assume estatuto específico na Teoria Crítica.
(HONNETH, 1991 apud SOUZA, 2009).
Se Horkheimer e Adorno faziam análises problemáticas acerca da formação
psíquica do indivíduo a partir de um conjunto externo de fatores que influenciavam a
sua constituição, Habermas simplesmente as substitui, passando a olhar para dentro
do indivíduo proporcionando uma análise serial atenta às motivações individuais
(SOUZA, 2009).
Após mergulhar em diversos modelos de estudiosos da Teoria Crítica, os
quais negavam certos posicionamentos, acrescentavam olhares novos, Honneth
detecta que Horkheimer teria visto uma esfera de ação:

na qual os sujeitos representam suas expectativas normativas quanto


à vida social e desta forma, por meio de conflitos sociais que marcam
a interação, tentam traduzir suas demandas em padrões e valores
socialmente institucionalizados (SOUZA, 2009, p.79).

Para Honneth, cabe a uma teoria crítica reconstruída vir em busca de um


entendimento para a dominação social e de possíveis meios para superá-la. Neste
ponto, Honneth é levado a notar que Horkheimer identificara a esfera de interesse
emancipatório, e o teórico francês Foucault desenvolvera uma promissora teoria do
conflito, posteriormente abandonada, possibilitando a Habermas estabelecer uma
relação entre o social e os processos históricos de mudança. Tal iniciativa foi
embasada na crítica que este fez à forma com que o trabalho era até então
conceituado (SOUZA, 2009).
Mesmo assim, Honneth continua identificando falhas na teoria de Habermas,
porque acreditava que este se desviara de penetrar devidamente a esfera de análise
por optar por um modelo que transformava os pressupostos da interação
comunicativa, ou seja, abandonando a teoria da interação (SOUZA, 2009).
No entanto, Honneth percebe que os sujeitos se dão conta de sua identidade
particular, tratando em cada caso de uma nova dimensão do seu Eu; abandonam a
etapa da eticidade atingida, também de modo conflituoso para chegar de certo modo
ao reconhecimento de uma forma mais exigente de individualidade. Há um
afastamento de Honneth no concernente ao conceito teleológico de natureza para
um conceito social (HONNETH, 2009).
54

Na perspectiva do autor, a caracterização de Habermas acerca da ciência


como o processo teórico de apropriação da natureza, não difere muito de
Horkheimer, a não ser pela defesa que esse último autor fazia da existência de uma
atitude crítica.
O modelo da teoria da ação comunitária de Habermas seria, segundo o
autor acima referido, como um estudo da alienação da racionalidade humana frente
ao crescente poder tecnocrata. Pode-se deduzir que, ao entrar em contacto com os
múltiplos conceitos não desenvolvidos de Horkheimer e Habermas, dedicou-se
Honneth a retomá-los. Coloca-se em evidência que, buscando esses pensamentos,
Honneth assume retomar as tarefas de Horkheimer. Ao mesmo tempo, porém,
segue o caminho de uma desontologização do conceito de trabalho, pois em sua
visão, é apenas por meio de uma teoria da comunicação colocada ao lado do
conceito de trabalho que uma teoria social pode atingir o espaço das expectativas
trazidas pelos sujeitos para o momento de interação (SOUZA, 2009).
Para entender “A Luta por Reconhecimento”, indispensável se faz
compreender que Hegel se dispôs a retirar o caráter de uma mera exigência do
dever-ser, impresso em Kant, no que concerne à autonomia individual. Sua filosofia
política é exposta como um elemento da realidade social já atuante historicamente; e
acreditava que se obteria a solução dos problemas postos com isso seria uma
tentativa de mediar à doutrina da liberdade dos novos tempos e a compreensão
política antiga, moralidade e eticidade. (HONNETH, 2009).
Somente veio Hegel elaborar um caminho teórico para vencer essa tarefa
durante o tempo que viveu em Jena. Tal diretriz caminha para “além do horizonte
institucional de seu presente” e o mantém crítico em relação ao modo de dominação
política.
Naquele momento, defende que tudo se fundamenta em uma luta dos
sujeitos pelo reconhecimento recíproco de sua identidade. Isso seria geradora de
uma pressão intrassocial para o estabelecimento prático e político de instituições
garantidoras da liberdade (HONNETH, 2009).
Fazia assim parte da convicção de Hegel, quando jovem, que tendem os
indivíduos ao reconhecimento intersubjetivo de sua identidade inerente à vida social.
Essa pressão intra-social conduziria, pouco a pouco, a um estado de liberdade
comunicativamente vivida, pelo caminho negativo de um conflito a se repetir de
maneira gradativa.
55

Vale ressaltar que a concepção acima, uma vez que esteve estudando um
modelo da “luta social” de Maquiavel e Hobbes, deu-lhe uma nova feição. A partir de
então, o processo de conflito entre os homens fundamentava-se em impulsos
morais, não aos motivos de autoconservação. É importante enfatizar que Hegel
retoma o modelo conceitual de uma luta social entre os homens, que Maquiavel e
Hobbes empregaram. Num certo momento da história das ideias, a vida social é tida
como uma relação de luta por autoconservação, isto é, os sujeitos individuais se
conflitam numa ocorrência permanente de interesses.
Surge então Thomas Hobbes em seu pensamento – teoria do contrato –
estabelecendo a soberania do Estado. Hobbes viveu em um contexto social que lhe
fez enxergar uma realidade bem diferente a que cercava Maquiavel. Num aparelho
estatal moderno e com a expansão crescente das mercadorias, quis o filósofo inglês
investigar as “leis da vida civil” pelas observações do cotidiano que vão tornando a
figura do enunciado científico sobre a natureza particular do homem. Valoriza, então,
o fato de estar voltado para o seu bem-estar futuro e, no confronto com o próximo,
surge-lhe “a suspeita” de uma forma de intensificação preventiva do poder. Ele
fundamenta o respeito à doutrina do estado de “natureza”, em que essa deve expor
o estado geral entre os homens, caso fosse subtraído todo órgão político da vida
social, instalando uma guerra de todos contra todos (HONNETH, 2009).
A duradoura luta entre os homens, o temor permanente e a desconfiança
recíproca conduziram à conclusão de que só a submissão regida por contrato de
todos a um poder soberano, poderia resultar em uma ponderação de interesses por
parte de cada um. O contrato social seria a única forma de apaziguamento entre os
homens, dando fim a guerra ininterrupta que visa à alta conservação individual.
Sabe-se que Hegel realizou seus estudos em 1802 a respeito das “maneiras
científicas de tratar o direito natural” e era o esboçar do programa de seu trabalho
futuro sobre filosofia prática e política. Progressivamente, lendo Platão e Aristóteles,
foi se deixando familiarizar com uma corrente da filosofia política que valorizou muito
a intersubjetividade da vida pública (HONNETH, 2009).
Parece relevante ressaltar que, passo a passo, essas impressões e
orientações foram calcando o pensamento de Hegel. Em um dado momento, ficou
claro para ele que, para estabelecer uma ciência filosófica da sociedade, era preciso
superar os equívocos atomísticos a que estava cingida toda a tradição do direito
56

natural moderno. É pelo ensaio sobre o “Direito natural”, que Hegel enxerga uma
possível solução para as tarefas teóricas.
Vê Hegel que as duas versões do direito natural, embora diferentes,
persistem no mesmo erro: tanto na maneira empírica quanto na formal de referir-se
ao direito natural, o “ser do singular” é pressuposto categoricamente “como o
primeiro e o supremo” (HONNETH, 2009).
Seriam “empíricos” aqueles enfoques do direito natural que tem como ponto
de partida, definições fictícias ou antropológicas da natureza humana para projetar,
com base nelas, uma organização racional do convívio social. Acrescenta-se a isso
diversas suposições suplementares.
Em princípio, os enfoques da tradição natural que Hegel denomina “formal”
não são divergentes porque partem, no lugar das definições sobre a natureza do
homem, num conceito transcendental da razão prática. As premissas atomísticas,
representadas por Kant e Fichte, são reveladas através do fato de as ações éticas
existirem como resultantes de operações racionais, purificados de todas as
inclinações e necessidades empíricas da natureza humana. As disposições
egocêntricas, ou seja, “aéticas”, constituiriam aquelas que deveriam ser reprimidas
em si, para finalmente poder tomar atitudes que estimulam a comunidade – atitudes
éticas (HONNETH, 2009).
Os enfoques da tradição natural (formal e empírico) subsistem enlaçados em
seus conceitos básicos a um atomismo. Assim, fica claro que um atomismo
pressupõe o existir de sujeitos isolados uns dos outros como uma base natural para
a socialização humana. Segundo Hegel, “... uma comunidade de homens só pode
ser pensada segundo o modelo abstrato dos „muitos associados‟. Isto é, uma
concatenação de sujeitos, individuais isolados, mas não segundo o modelo de uma
unidade ética de todos” (HONNETH, 2009, p. 40).
Eticidade é, para Hegel, uma coletividade ideal que acreditou ter encontrado
na polis. A vida pública seria, portanto, a possibilidade de uma realização da
liberdade de todos os indivíduos em particular e nos costumes e usos
comunicativamente exercidos no interior de uma coletividade (médium social), que
deve se efetuar a integração da liberdade geral e individual. Desse modo, o sistema
de legislação pública tem de expressar os costumes de fato existentes (HONNETH,
2009).
57

Não é demais reafirmar que Hegel, diante do desafio de solucionar o


problema das distintas doutrinas do direito natural, propõe substituir as categorias
atomísticas por aquelas tendentes ao vínculo social entre os sujeitos. O ponto de
partida de toda teoria filosófica da sociedade seriam os vínculos éticos, em que os
sujeitos se movem juntos, e não isolados. Isso é a etapa denominada de eticidade
natural, que transita enfim para a forma de organização de sociedade como uma
relação de totalidade ética (HONNETH, 2009).
Hegel pressupõe, no entanto, a existência de obrigações intersubjetivas na
qualidade de uma condição quase natural de todo processo da socialização
humana. É interessante assinalar que, neste ponto, Hegel busca na antologia
aristotélica a ideia de que o processo deve ser teleológico, isto é, desdobrável pouco
a pouco. Reconhece, nesse processo, o caráter conflituoso e trabalhará em projetos
sempre renovados com base no conceito de reconhecimento. Vai evoluindo e ainda
no que concerne à particularidade do “sistema da eticidade”, é válido evidenciar que
Hegel coloca espécies distintas de luta, em contraposição às duas formas “naturais
de reconhecimento”. Prosseguindo com seus projetos de filosofia social, será visto
que eles serão construídos numa escada, isto é, indo de uma etapa da eticidade à
subsequente.
Na primeira fase, um único estágio de lutas distintas aparece entre as duas
etapas da eticidade elementar e a da eticidade absoluta. Não se pode afirmar o
porquê dessa opção para tal encaminhamento, mas deve ter resultado das pressões
metodológicas impressas no esquema da teoria do conhecimento de Schelling.
Acrescenta-se, também, a influência e a confrontação direta com Hobbes, tendo
provocado a exposição homogênea de um estado “natural” de eticidade isenta de
conflitos (HONNETH, 2009).
Deve-se, ainda, salientar que o grande interesse de Hegel reside no modo
como transcorre o decurso da luta nos momentos de perturbações no convívio
social. Para esse teórico, os atos destrutivos seriam manifestações de um crime, ou
seja, formas de exercício negativo da liberdade abstrata, já atribuída aos indivíduos
sob as condições das relações jurídicas de reconhecimento (HONNETH, 2009).
Segundo Smaniotto (2010), nos conflitos sociais, os indivíduos vão à procura
de um reconhecimento de sua individualidade quando se sentem desrespeitados:
“Mesmo a luta entre senhor e escravo é uma luta onde o escravo tenta fazer com
que o senhor reconheça suas pretensões a uma identidade”. Honneth é crítico em
58

relação à teoria sociológica justamente por esta não levar em consideração o


reconhecimento moral em suas teorias, pois:

já no começo da sociologia acadêmica, foi cortado teoricamente, em


larga medida, o nexo que não raro existe entre o surgimento de
movimentos sociais e a experiência moral de desrespeito: os motivos
para a rebelião, o protesto e a resistência foram transformados
categoricamente em „interesses‟, que devem resultar da distribuição
desigual objetiva de oportunidades materiais de vida, sem estar
ligados, de alguma maneira, à rede cotidiana das atitudes emotivas
(HONNETH, 2003, p. 255 apud SMANIOTTO, 2010)

Ainda com referência ao conceito de individualidade e eticidade, acredita-se


que o processo de estabelecimento das primeiras relações sociais consistiria tão
somente o afastamento dos sujeitos das determinações sociais. O aumento de
individualidade ocorre em uma das etapas de reconhecimento recíproco, cujas
diferenças se medem pelas dimensões da identidade pessoal que, desta forma,
encontram uma confirmação prática. Hegel exemplifica com uma “relação de ação
recíproca universal e de formação dos homens” aquela entre pais e filhos em que há
um reconhecimento de seres amantes e emocionalmente carentes. Acredita-se,
ainda que o elemento da personalidade individual que encontra reconhecimento por
parte do outro é o “sentimento prático”, isto é, a dependência do indivíduo relativa às
dedicações e aos bens necessários para a vida (HONNETH, 2009).
Hegel enfatiza as relações de troca entre proprietários regulados por
contrato, uma nova relação social. As relações práticas que sempre foram feitas
entre outros sujeitos tinham validade particular; agora passam a ter pretensões de
direito universais porque são contratualmente garantidas. Veem-se como
proprietários e, por isso, com pretensões legítimas e a posse com direito “formal” de
aceitar ou rejeitar as possíveis transações ofertadas. Com o estabelecimento das
relações jurídicas, é criado um estado social, marcado pelo “princípio da
singularidade”.
É pertinente que, numa organização social caracterizada por formas
jurídicas de reconhecimento, os sujeitos não estejam constitutivamente incluídos
senão mediante liberdades negativas, isto é, apenas com sua capacidade de negar
ofertas sociais. Sabe-se que o movimento socializador do reconhecimento toma
59

feição diferente sem os limites particulares inicialmente traçados pelos vínculos


emocionais da família (HONNETH, 2009).
Hegel chegou a um princípio da filosofia da consciência num todo unitário,
lançando mão da realphilosofia e de pressuposto teóricos do conceito de “espírito”
num movimento de que ele é capaz de fazer de si outro de si mesmo e retornar para
si mesmo (HONNETH, 2009).
Na “luta por conhecimento”, Axel alia-se a alguns pensadores, discorda de
muitos, transforma e burila as teorias de outros. É em George Mead que ele
identifica o quanto os sujeitos humanos devem sua identidade à experiência de um
reconhecimento intersubjetivo sob os pressupostos conceituais naturalistas –
psicologia social.
Essa psicologia apresenta coincidências com a obra de juventude de Hegel,
correspondendo exatamente ao ponto essencial, qual seja fazer da luta por
reconhecimento de Axel uma construção teórica que deve explicar a evolução moral
da sociedade. Mead revela interesse crucial pela pesquisa psicológica, pela
necessidade de tornar mais compreensíveis os problemas filosóficos do idealismo
alemão de forma não especulativa. Constata que, para o sujeito individual, surge um
mundo de vivências psíquicas quando diante de um problema prático. A partir disso,
ele enche-se de dificuldades para interpretar a situação, a qual termina privada de
validade e separada da realidade, não raro tornando-se representações subjetivas
(SOUZA, 2009).
O controle empírico desejado por Honneth é encontrado na psicologia social
de Mead, que defende o processo psicológico de formação da identidade. “Como
uma relação intersubjetiva conflituosa em etapa de ampliação de seu círculo social
da família à divisão social do trabalho passando pela atribuição de direitos” (SOUZA,
2009, p. 78).
Há várias coincidências entre a obra do autor e a de Hegel no que diz
respeito à luta por reconhecimento: “o ponto referencial de uma construção teórica
que deve explicar a evolução moral da sociedade” (HONNETH, 2009, p. 126).
Interessou-se pela pesquisa psicológica com vistas dos desejos de clarificar os
problemas filosóficos de idealismo alemão, e questiona como pode a pesquisa
psicológica obter acesso ao seu objetivo específico, o psíquico.
Mead ainda faz referência à ideia pragmatista herdada de Peirce, por
intermédio do Dewey: são justamente as situações de problematizações de ações
60

habituais que o ser humano aproveita em suas operações congnitivas. À medida que
o sujeito entra em dificuldades, suas interpretações da situação até então
objetivamente comprovadas, ficam sem validade e separadas da realidade restante
a título de meras representações subjetivas. Em suma, o “psíquico” é a experiência
que um sujeito faz consigo próprio, quando um problema prático surge impedindo-o
de um cumprimento habitual de sua atividade. Sob a pressão de um problema
prático, o indivíduo é forçado a reelaborar criativamente suas interpretações da
situação (HONNETH, 2009, p. 126).
Prossegue Mead ao enfatizar que o indivíduo, aprendendo a assumir as
normas sociais de ação do “outro generalizado” vai alcançando a identidade de um
membro socialmente aceito de sua coletividade, então tem todo o sentido empregar
para essa relação intersubjetiva o conceito de reconhecimento. Como Hegel, Mead
pretende que “a compreensão que aquele que aprende a conceber-se da
perspectiva do outro generalizado tem de si mesmo, seja entendida como uma
pessoa de direito” (HONNETH, 2009, p. 136).
Um aspecto relevante da teoria de Mead é o que diz respeito a como o “ME”
se transforma no processo de desenvolvimento social, pois a partir desse momento,
o indivíduo aprende a se conceber como membro de uma sociedade organizada
pela divisão do trabalho.

Essa inserção social da extensa atividade do respectivo todo social


ou da sociedade organizada no domínio de experiência de cada
indivíduo envolvido ou incluído nesse todo é a base ou o pressuposto
decisivo para o desenvolvimento pleno da identidade do indivíduo...
(HONNETH, 2009, p. 136).

A inclusão da psicologia social de Mead fez com que Hegel formasse o


nascedouro de uma teoria social com enfoque normativo. Isso se configura como a
máxima que visa esclarecer os processos de mudança social, que se refere às
pretensões normativas estruturalmente inscritas na relação de reconhecimento
recíproco. Em outras palavras, a reprodução da vida social só ocorre se houver um
reconhecimento recíproco.
Não só Hegel como Mead admitiram que a auto-relação prática dos
indivíduos só ocorre quando estes se reconhecem como destinatários sociais das
ações de seus parceiros de interação. No entanto, isso só pode ser visto como uma
teoria social quando excede a formação da identidade e entra no âmbito da vida
61

coletiva. Entende-se por vida coletiva como a aceitação de valores e normas


culturais diferentes (SOUZA, 2009).
Mead enfoca a relação entre a tripartição estabelecida por ele e Hegel e as
fontes empíricas. Outro aspecto posto em evidência são as formas de desrespeito,
cujo nascedouro é a luta por reconhecimento. Desse modo, estaria diagnosticando
as patologias da sociedade capitalista. Honneth tem, então, a preocupação de
esclarecer os meios que formam as auto-relações de reconhecimento, e que
representam as bases normativas do seu modelo de teoria social.
No momento, Honneth não polemiza sobre o valor teórico das formas de
reconhecimento defendidas por Hegel. Para ele, o que importa é conhecer, o
conteúdo concreto das relações de amor, direito e solidariedade com o objetivo de
identificar sua legitimidade como esferas de conhecimentos (SOUZA, 2003).
Não se pode pensar numa teoria social que não seja pela noção de
intersubjetividade, dando caráter sociológico a sua dimensão normativa. No caso
específico da teoria social pretendida por Honneth, é do sentimento de desrespeito a
sua capacidade de participar ativamente na sociedade que vêm os protestos dos
grupos desfavorecidos.
O sujeito percebe-se desrespeitado, segundo Honneth, porque não vê um
reconhecimento recíproco entre os sujeitos, como parceiros de igual status, o que é
essencial numa relação comunicativa. Sentindo-se injustiçado moralmente, sob o
enfoque honnethiano, estaria vivenciando o sentimento de desrespeito social,
suscitando-lhe vergonha, raiva e indignação (SOUZA, 2009).
Entende-se por vergonha o sentimento que pressupõe a existência de
alguém frente ao qual se sente a baixa de auto-estima. Essa baixa pode ser
provocada pelas ações de um ou do outro sujeito. Na última opção, Honneth
entende que há uma violação das normas morais que se esperava que fossem
respeitadas. Para Honneth, uma teoria da intersubjetividade tomada deste ponto de
vista negativo, aproxima-se das experiências empíricas do desrespeito. Por outro
lado, é necessário esperar a impossibilidade de uma reação neutra do sujeito ao
sentimento a que é submetido.
Para Honneth, três seriam os níveis dos sentimentos morais formados pelos
sujeitos, e a cada esfera corresponde um tipo de sentimento intersubjetivo: o amor, o
reconhecimento jurídico e a solidariedade.
62

A fundamentação do sistema hegeliano baseia-se em premissas que


Honneth não aceita como válidas, e assim, recorre à psicologia social de Mead, na
qual busca atualizar a ideia de luta por reconhecimento. Desse modo, Honneth
chega a que aqueles sentimentos intersubjetivos originariam auto-relações de
confiança, respeito e estima, viabilizando a integração do indivíduo de maneira plena
na vida social da comunidade. Entretanto, não se pode deixar de falar da
necessidade de Honneth em identificar as relações patológicas no seu entorno.
Entende-se a busca pelos comportamentos de desrespeitos presentes no mundo da
vida social (SOUZA, 2009).
As formas de reconhecimento do amor, do direito e da solidariedade
constituem dispositivos de proteção intersubjetiva que asseguram as condições da
liberdade interna e externa, das quais depende o processo de articulação e de
realização espontânea de metas individuais de vida (HONNETH, 2009).
Em relação ao amor, é a primeira forma de reconhecimento, e por sua
própria natureza, não pode levar à formação de conflitos sociais. Isso significa dizer
que embora as relações amorosas impliquem luta, à medida que o equilíbrio entre
os egos é obtido pela delimitação e superação de resistências recíprocas, não se
torna assunto de interesse público. Portanto, faz parte dos círculos de relações
primárias. Quando se fala nas formas de reconhecimento do direito e da auto-estima
social, entra-se no universo de um quadro moral de conflitos sociais (SMANIOTTO,
2010).
É importante destacar que as experiências individuais do desrespeito, ao
serem percebidas por um grupo de indivíduos, possibilitam à comunidade uma
reivindicação de relações justas entre o agressor e o agredido. Com isso, está se
dizendo que o desrespeito individual é gerador de conflitos coletivos. Mas Honneth
refere que, em certos casos, a coletividade está voltada para propiciar sua
sobrevivência econômica e mesmo as condições de sua reprodução. Não raro
ocorrem sentimentos coletivos de injustiça, gerados por experiências morais que os
grupos sociais fazem perante denegação do reconhecimento jurídico ou social.
63

3.2 A humanização no serviço de saúde: um comentário sob a ótica


Honnethiana.

É facilmente identificada a dicotomia existente entre as políticas de


atendimento humanizado em saúde, bem como os resultados oriundos de pesquisas
de avaliação dos serviços públicos dessa área e da própria escrita aos anseios do
público em foco.
Não se pode esquecer que o atendimento médico, quer ambulatorial, quer
hospitalar, congrega inúmeras exigências no sentido de oferecer adequadas
condições de trabalho. Isso visa que os profissionais de saúde estejam qualificados
não apenas para o exercício de uma prática no atendimento, como também na
utilização da tecnologia e conhecimentos científicos. Aqui entram necessidades de
grande importância e profundidade, com foco à humanidade uma vez que o
paciente, devido ao entorno da situação de doenças, está fragilizado.
A sociedade contemporânea vem atentando para o fato de uma
verticalização dos estudos e para uma perspectiva holística, abandonando uma
visão biocêntrica/tecnocêntrica. Entende-se por holística o caminho em que os
pacientes são indivíduos em que sentimentos, emoções e frustrações coexistem
num corpo físico e que tudo está interrelacionado. Tratar uma lesão na face ou
submeter-se a uma cirurgia cardíaca, num ambiente hospitalar frio e sem atentar
para suas necessidades, torna-se fonte de conflito para o indivíduo sob tensão. Ele
experimenta o sentimento de desrespeito.
Seguindo a linha de raciocínio honnethiana, quando as expectativas
normativas são desapontadas pela sociedade, “isso desencadeia exatamente o tipo
de experiência moral que se expressa, no sentimento de desrespeito” (HONNETH,
2009, p. 251).
Nota-se claramente que a sociedade contemporânea se deslumbra diante da
ciência e da tecnologia. Não raro, então, passa-se as pessoas para um plano
secundário ou mesmo coisificado, reificado.
Para Honneth (2008), o esquecimento das relações humanas e o não
reconhecimento de si nas outras pessoas resultam no que o autor chama de
reificação do ser, patologia tão presente na sociedade atual.
64

Na reificação não se percebe mais as características tipicamente humanas


das outras pessoas, passando a vê-las como uma “coisa”, despida de quaisquer
características ou habilidades humanas (HONNETH, 2008).
Querendo o profissional de saúde humanizar os hospitais, tem que partir dos
múltiplos significados da palavra em questão. Sintetizando, porém, há uma
convergência semântica, a saber: “compaixão pelas desgraças dos semelhantes,
afabilidade, magnanimidade, fazer-se benigno, fazer uma coisa mais humana,
menos cruel para os homens. Constata-se, portanto, que predomina, na relação
terapêutica, valores mais indulgentes para quem sofre.
A palavra „humano‟ é tomada do latim humanus, que significa relativo ao
homem. O humano é relacionado inicialmente com húmus-terra e só depois com
homo-homem. Parece ter semelhança etmológica entre homem e terra com a
tradição bíblica onde nasce o primeiro homem da argila (SPINK, 1992).
Segundo Rios (2009), a humanização encontra suas raízes no humanismo,
que reconhece o valor e a dignidade do Homem, considerando sua natureza, seus
limites, interesses e potenciais. O humanismo tem como proposta compreender o
homem em sua complexidade e amplitude, criando meios para que os indivíduos
compreendam uns aos outros. Na linha psicanalítica, o humanismo se refere ao
lugar da subjetividade; o encontro da psicanálise com a corrente humanista coloca o
homem e sua natureza no centro do seu campo de investigação, entendendo-o
como possuidor de pulsões que podem levá-lo para a agressão ou para a
construção. Reconhecer a importância dessas características é o primeiro passo
para a humanização, segundo a autora.
A humanização é, atualmente, um tema que vem marcando presença nos
serviços públicos de saúde, nos textos oficiais e nas publicações da área da Saúde
Coletiva. A humanização está relacionada com os movimentos que visam recuperar
valores atualmente esquecidos, nos quais a ética tem sido desprezada, ignorada,
dando lugar ao individualismo e à competição acirrada entre as pessoas. Tem como
propósito recuperar a dignidade humana, que vem sendo desconsiderada e
destruída nos tempos pós-modernos. Busca em sua essência, reconhecer em cada
indivíduo aquilo que lhe pertence: sua dignidade, já defendida pelos direitos
humanos, embora não garantida (RIOS, 2009).
O profissional de saúde engajado realmente na implantação de um plano de
humanização, só levará a termo sua meta pela assunção de um compromisso ético.
65

O hospital humanizado busca eliminar o excesso de burocracia, bem como reduzir


os efeitos negativos da massificação. Quando há a tecnificação da assistência, pura
e simples, existe a defasagem do tentar implantar a humanização.
Conforme preceitua o Ministério da Saúde, a doença gera uma situação de
fragilidade que faz com que o paciente necessite de um sistema sanitário o mais
humano possível. A própria tecnificação da medicina e a massificação
despersonalizada adicionam suficientes componentes para que o paciente se sinta
frequentemente desvalido, frente a essa situação que não domina (BRASIL, 2001).
À medida que as pessoas foram reconhecendo em sua cidadania, o direito à saúde,
infelizmente desencadeou-se uma tecnificação e massificação, e em contrapartida, a
desumanização.
Um sistema de saúde humanizado está a serviço da pessoa e, portanto,
deve ser pensado e concebido em função do homem. Para que tal fim seja atingido,
é preciso que esse sistema se torne: integrado, protetor e promotor da saúde;
corretor das desigualdades sanitárias; eliminador das discriminações de qualquer
ordem; promotor de participação ao cidadão no mesmo; garantidor da saúde de
todos os cidadãos (ANGERAMI, 2004).
Sem uma gestão envolvida com o funcionamento das estruturas de saúde,
desde sua concepção a mentalidade das pessoas envolvidas no sistema, não se
pode pensar em humanização hospitalar. Segundo Campos (1988):

Muitas vezes um processo de humanização não é tanto um


processo de estruturas, de mecanismos, senão de atitudes; não é
tanto um problema de recursos, tantas vezes nos queixamos da falta
de recursos, quando todos sabemos que se pode avançar muito
num processo de humanização com os recursos atuais com atitudes
diferentes” (CAMPOS, 1988, p. 112).

3.3 Considerações sobre o ser humano

Para Bettes (2009), o humano é a soma da comunicação de três elementos:


a materialidade do corpo, a imagem do corpo e a palavra que se escreve do corpo.
A natureza humana se diferencia da dos animais porque o corpo biológico do
homem é capturado desde seu nascimento numa rede de imagens e palavras,
66

através do contato com sua mãe, e em seguida pela família e posteriormente pela
sociedade. São esses banhos de imagem e de linguagem que vão moldando o
desenvolvimento do corpo biológico (comportamental), transformando-o num ser
humano com um estilo de funcionamento do seu modo singular de ser.
O fato do ser humano ser dotado de linguagem possibilita a construção de
redes de significados que podem compartilhar em maior ou menor grau com seus
semelhantes, o que lhes dará certa identidade cultural (BETTES, 2009).
Para compreender melhor o homem, é necessário que se conheça sua
natureza, sua essência, suas necessidades básicas, que são elas:

a) Instinto de conservação – necessidade do homem de prover sua


subsistência pessoal e dos seus familiares, compatível com um padrão de
vida razoável;
b) Sentimento de dignidade – consciência de direitos fundamentais: a
liberdade de expressão, religião, direito à vida, educação, livre escolha, etc.;
c) Necessidade de receber estima e consideração – reconhecimento por
seus méritos, atenção, em qualquer circunstância.

“O homem tem mais necessidade de respeito do que pão. E se às


vezes, reclama o pão com violência não é unicamente para matar a
fome; é porque vê, na preocupação de lhe assegurarem o pão de
cada dia, sinal de respeito à sua pessoa” (VIEUJAN apud MEZOMO,
2001, p. 54).

d) Desejo de segurança - estabilidade no emprego, garantias para dias


incertos no futuro para si e seus familiares. A expectativa da imprevisão
angustia o homem;
e) Instinto social - necessidade de interagir, viver em sociedade, buscar a
associação, a coletividade;
f) Ânsia pelo sobrenatural – necessidade de reverenciar, cultuar, algo além
da natureza física e material.

Todos esses anseios encontram-se arraigados na natureza humana e


alguns são considerados como condições pré-éticas e devem ser preservados.
Qualquer quebra da integridade dessas necessidades gera a insatisfação do
homem, tanto na esfera pessoal, como profissional. Analisando desta maneira, é
67

possível compreender melhor porque a ética neste País é tão precária, visto que
grande parte da população não atinge condições para viver eticamente.

3.4 Acolhimento e humanização

Certamente a história recente das sociedades humanas fala de uma estreita


relação entre construir o mundo e ser construído por esse. Tal assertiva não é fácil
de ser entendida, porque o homem tende a uma melhor compreensão das coisas
divididas por partes, isto é, os acontecimentos fragmentados, as pessoas isoladas
uma das outras. O que é mais importante: não se está separado daquilo que se
observa. Ao mesmo tempo em que se observa, participa. Então, o que se vê? Uma
sociedade cuja marca é a rejeição, a exclusão e a divisão. Se não acolhe, também
não se é acolhido.
A evolução tecnológica vem envolvendo os profissionais de saúde em um
pensamento mecanicista. Essa visão tecnocrática esquece que na busca dos
serviços de saúde, o paciente não deseja apenas acabar com a doença existente
em seu organismo, mas também eliminar suas angústias. Desse modo, deseja ser
ouvido e tratado como alguém no mundo dos casos clínicos e impessoal da
medicina (MEZOMO, 2001).
O despreparo dos profissionais de saúde em lidar com questões emocionais
e afetivas advém de uma formação acadêmica voltada para objetividade e não
envolvimento com o paciente, o que favorece uma relação impessoal, autoritária e
desigual. Os pacientes são tratados a distância, colocando-os cada vez mais “no
lugar” de doentes, ou seja, no lugar daqueles que nada sabem e que devem se
submeter sem questionamentos ao tratamento por eles determinado.
A negação de sentimentos e emoções por parte dos profissionais de saúde
para com o paciente contribui para o desenvolvimento de uma atividade marcada
pela indiferença da compreensão humana, aumentando os efeitos deletérios
provocados pelo próprio internamento em si, e tornando duplamente doloroso o
processo de adoecer (SABBATINI, 2004). Poder-se-ia então comparar a esterilidade
biológica dos hospitais a uma esterilidade emocional?
68

A escola médica, em geral, tem a graduação baseada no famoso relatório


Flexner, do ano 1912, que fundamenta o ensino da medicina com uma visão
biocêntrica/tecnocêntrica. O corpo humano é estudado por partes, e a doença é vista
como sendo o mau funcionamento dos mecanismos biológico, estudado sob o ponto
de vista da biologia molecular e celular. O objetivo da ação médica é intervir física ou
quimicamente para normalizar o funcionamento da unidade esfacelada. A finalidade
da escola médica seria formar estudiosos em doenças, especialmente especialistas
que atuassem em hospitais, e não capacitar os profissionais para cuidar de doentes.
Tal modelo resulta numa visão reducionista da pessoa como um todo.
De acordo com reflexões de Boff (2007), o mundo virtual, fruto da sociedade
contemporânea, criou um novo habitat para os seres humanos, onde é escassa a
relação com a realidade concreta através do cheiro, tato, toque e contato humano,
afetando o homem naquilo que ele precisa possuir como essência: o cuidado e a
compaixão.
Partindo desta perspectiva, cuidar é mais que um ato, é uma atitude que
abrange mais que um modelo de atenção, representando uma atitude de ocupação,
preocupação, de responsabilização com o desenvolvimento afetivo do outro. Cuidar,
antes de tudo, significa acolher e respeitar. Dentro das organizações tais atitudes
são desempenhadas por pessoas, principalmente profissionais de saúde.
Nos hospitais públicos, há um reflexo do que ocorre na sociedade. Saliente-
se que é nas ações de saúde em que mais se evidenciam o que há de mais negativo
e que fere os sentimentos da humanização (SÃO PAULO, 2002).
O paciente idoso, a criança em tratamento quimioterápico ou com outra
qualquer enfermidade está em estado de sofrimento de todo seu organismo. Isso
inclui os sentimentos, emoções e intersubjetividade. É necessário compreender o
que se passa com ele, de aprender a lidar com o medo da doença – que muitas
vezes a potencializa ou simplesmente é causadora de mais sofrimento. Tudo isso
está nas mãos dos profissionais da área, que deverão estar conscientes do seu
papel e qualificados para tal. Há o oposto ao acolhimento e à humanização quando
se deixa de ver o paciente como um todo.
A propósito desse tema, parece pertinente transcrever os versos do poeta
brasileiro Ferreira Gullar (SÃO PAULO, 2002, p. 40):
69

“Uma parte de mim, é todo mundo:


Outra parte é ninguém:
Fundo sem fundo.
Uma parte de mim, é multidão
Outra parte, estranheza e solidão
Uma parte de mim, almoça e janta
Outra parte, se espanta”

Esses versos fazem alusão à perspectiva honnethiana de individuação e


reconhecimento recíproco, que vai buscar em Hegel o fenômeno do amor. Sobre
esse sentimento, assinala que para sua efetivação “os sujeitos se confirmam
mutuamente na natureza concreta de suas carências, reconhecendo-se assim como
seres carentes” (HONNETH, 2009, p. 160). As carências e os afetos só são
preenchidos e alimentados quando satisfeitos ou correspondidos – reciprocidade.
Além dessa referência, Honneth, em observações sobre a reificação,
(HONNETH, 2008), explana que, diante de certos acontecimentos no “nosso mundo
de vida”, o indivíduo se mostra com acessibilidade existencial. Isso significa assumir
diante desses acontecimentos uma postura de aceitação do outro, como de si
próprio.
Voltando ao foco principal deste trabalho – a humanização da saúde pública
– é mister ressaltar que a desumanização é vivenciada pelo que Honneth denomina
de reificação, essa em oposição ao desejável. Na teoria do reconhecimento, a
reificação é o esquecimento desse reconhecer no outro a si próprio.
O reconhecimento elementar é quando se vê em cada pessoa a si mesmo.
Se este reconhecimento prévio não se realizar, se não houver uma relação mútua e
não se tomar mais parte existencial no outro, passa-se a tratá-lo como objeto,
reificando o ser. Para Honnet (2008), o sujeito pode “esquecer” a forma de
reconhecimento elementar quando adota repetidamente práticas unilaterais,
abstraindo características “qualitativas” do ser humano.
Vários fatores devem levar o profissional de saúde a parar e pensar sobre
suas práticas, sobre a forma como gradativamente ele é envolvido pelo pensamento
mecanicista-cartesiano que o torna especialista. Entende-se cada vez mais de
pequenas partes do homem e distancia-se, na mesma proporção, deste mesmo
homem. Essa assertiva daria sentido à necessidade de humanização nos hospitais
por adotarem o modelo biomédico no cuidado ao paciente.
70

Assim para Giordani (2008), desigualdades e injustiças já fazem parte do


tecido social e são aceitas naturalmente sem questionamentos. Os profissionais de
saúde contribuem com essa prática quando, no desempenho de suas atividades,
deixam de reconhecer o paciente, como parte integrante de seu mundo, esquecendo
sua condição humana e seus direitos como cidadão. Com isso, cresce
continuamente a insatisfação dos pacientes pela assistência recebida. Avolumam-se
as demandas judiciais por parte dos usuários, agora mais conscientes de seus
direitos como cidadãos.
Como já citado, paulatinamente as pessoas foram se tornando indivíduos
através do processo de construção social de identidade (pessoal e coletiva) e sua
luta pelo reconhecimento como cidadãos. É notável que o pensamento Honnethiano
faz parte dos conflitos e de suas configurações sociais e institucionais, em direção a
suas lógicas. Aqui, ele encontra convergência de pensamento com Hegel, cujas
pretensões universalistas se unem à preocupação com o desenvolvimento do
indivíduo.
Atender às necessidades do enfermo requer uma equipe multidisciplinar, na
qual se forme a soma dos conhecimentos setorizados, de maneira que cada
profissional possa dar sua contribuição. Na formação de uma equipe interdisciplinar,
os conhecimentos são integrados como um único saber, visando o bem estar do
paciente como um todo (MEZZOMO, 2001).
Há alguns esclarecimentos a serem postos, pois se lida com o corpo, a
alma, a matéria, o espírito, a doença e a saúde. Faz-se necessário, no entanto, ver
essas facetas da vida não só sob a ótica honnethiana, mas complementando com a
visão de outros autores.
Giordani (2008) reconhece a existência, na Saúde, de muitos profissionais
cuidando dos pacientes por partes, quando esses necessitariam de cuidados
integrais. Muitas vezes desgastados física e emocionalmente, sem admitir as
próprias limitações, acabam por fechar canais importantes de comunicação com o
paciente e colegas de equipe, como a visão e a escuta. Embora se cobre nesse
campo de atuação uma assistência humanizada, o que se vê nas instituições
públicas e privadas são cenas de “desrespeito à vida, o descaso frente à limitação e
à dor alheia, o autoritarismo de administradores e médicos, o abuso do poder, a
banalização do sofrimento e a indiferença aos direitos do paciente, entre outros”
(p. 24). A autora compreende a palavra humanizar como sinônimo de acolhimento,
71

afabilidade, benevolência, dignidade, civilidade, respeito pelo outro, atendimento e


tratamento igualitário para todos e, sobretudo, interesse em resolver os problemas
de saúde.
Ainda segundo Giordani (2008), humanizar a relação com a pessoa enferma
exige que o profissional valorize a afetividade e a sensibilidade, componentes
inerentes ao cuidado, que caracterizam um encontro entre pessoas. Tais
profissionais precisam, além de refinar o processo do cuidar, dar um sentido
humanizado ao atendimento e assistência à população em geral. Mesmo diante de
um quadro desumano no contexto em foco, é preciso desconstruir essa realidade
repleta de situações de desigualdade, em que imperam sentimentos de inferioridade
e gestos que ferem a dignidade humana, em momento tão crítico e difícil, quando a
doença toma conta do indivíduo, fragilizando-o.
A proposta de humanização aponta para a necessidade da transformação da
maneira como os sujeitos se relacionam no campo da saúde. Essa mudança só é
possível a partir do momento em que os processos de trabalho, a dinâmica de
interação da equipe e os mecanismos de planejamento, decisão, avaliação e
participação também sejam alterados, rumo a uma cultura de humanização.
Problemas como a baixa qualidade das relações interpessoais e a falta de
capacitação constante dos profissionais da área, dificultam suas condições de
trabalho, afetando a qualidade do mesmo (GIORDANI, 2008).
Humanizar a saúde passa, inclusive, pela estrutura física dos hospitais e
locais de atendimento ao usuário, pelos métodos administrativos adotados nas
diversas instituições de saúde, pela imagem do serviço público, pela carência de
medicamentos, pelos baixos salários e jornada dupla ou tripla que provoca o
cansaço. Passa também pelo ambiente tóxico que existe em muitos hospitais e pelo
contato constante com pessoas em estado de tensão, causando o desgaste
emocional (GIORDANI, 2008). A humanização da saúde está intrinsecamente ligada
à questão das relações interpessoais, da comunicação entre os indivíduos. Salienta-
se que essa vai muito além da fala, inclui gestos, olhares, toques, apertos de mão,
boa vontade em cuidar, consideração pelo outro, que se encontra carente. É de
suma importância evidenciar que só cuida bem do outro aquele que está cuidado e
tem preservada sua integridade emocional.
Bettinelli e colaboradores (2006) destacam a importância dos profissionais
de saúde valorizarem aspectos qualitativos dos fenômenos presentes na vida
72

humana, compreendendo o significado dela para cada pessoa e como cada uma
desenvolve sua identidade e constrói sua própria história. Tal cuidado não pode
estar desvinculado e descontextualizado dessas circunstâncias, por ser efetivado a
partir da compreensão do ser humano total, em suas diferenças e individualidades.
Do mesmo modo, aquele que cuida precisa estar ciente de suas possibilidades e
limitações. Assim, o “grande desafio dos profissionais de saúde é cuidar do ser
humano na sua totalidade, exercendo uma ação preferencial em relação a sua dor e
seu sofrimento, nas dimensões física, psíquica, social e espiritual, com competência
científica e humana” (p. 91).
Como já foi mencionado, percebe-se a necessidade do cuidado numa
perspectiva global, não sendo fragmentado e direcionado apenas à questão física da
doença propriamente dita. O ser humano tem valores, crenças, sentimentos, fé,
várias preocupações e temores, que precisam ser levados em consideração pelos
profissionais de saúde. No que diz respeito ao uso da tecnologia a serviço do
cuidado médico, Bettinelli e colaboradores (2006) acreditam que estas precisam
respeitar os padrões técnicos e éticos e não têm sentido se não estiverem
integradas ao processo relacional. Não se pode ignorar a importância dos múltiplos
instrumentos modernos na área médica, todavia é importante compatibilizar seu uso
com a humanização no atendimento.

3.5 A visão holística influenciando no processo de humanização hospitalar

De acordo com Leite e Strong (2006), a visão holística, ao contrário da visão


biomédica, que defende princípios que valorizam a eficiência técnica e o
conhecimento científico, em detrimento do conhecimento metafísico, enfoca sempre
o ser humano total. Do ponto de vista do microcosmo, cada parte representa o todo,
e do ponto de vista do macrocosmo, o todo interage com os seus componentes. A
visão cartesiana do homem, que compreende o ser humano dividido em corpo e
mente, acabou por fragmentar o atendimento médico, o qual atua sobre as partes do
corpo humano, ignorando sua totalidade como pessoa.
Essa visão vem sendo amplamente criticada na atualidade. O
descontentamento de usuários e profissionais gerou a necessidade de resgatar
73

valores subjetivos, de se lançar um novo olhar frente ao adoecimento humano e aos


cuidados para com este processo saúde-doença. Na realidade, isso não quer dizer o
abandono das inovações científicas e tecnológicas, mas sim a união de valores
humanos às relações que acontecem nos espaços destinados à educação e à
saúde.
Historicamente, os processos saúde e doença vêm se alterando. Para
Minayo (1991), a doença é tanto um fato clínico quanto um fenômeno sociológico,
exprimindo um acontecimento biológico e individual, mas também uma angústia que
atinge o corpo social, simbolizando a forma como a sociedade vivencia o medo da
morte e os limites entre o bem e o mal. Para a autora, a doença é uma realidade
construída, e o doente, um personagem social. Por isso, existe a necessidade de
tratar o fenômeno saúde-doença de uma forma completa, ampla, holística,
considerando o homem total, e não apenas como os instrumentos anátomo-
fisiológicos da medicina ou com as medidas quantitativas da epidemiologia clássica.
Boff (2007) defende que o corpo seria uma parte do ser humano e não sua
totalidade. Nas ciências, existe uma tendência a se falar em corporeidade,
expressando o ser humano como um todo, vivo e orgânico. O que se quer significar
é não mais o dualismo corpo-alma, homem-alma para designar dimensões totais do
humano e sim uma visão mais globalizante.
“Cuidar do corpo de alguém é prestar atenção ao sopro que o anima”,
continua Boff (2007, p. 42). Tal enfoque inclui o conceito de que o corpo vivo é
subjetividade. Nele se realizam os vários níveis da consciência (a originária, a oral, a
anal, a autônoma e a transcendental), nos quais essas memórias se expressam e se
enriquecem, interagindo com o meio.
É de suma importância destacar que, conforme Boff (2007), é pelo corpo que
se mostra a fragilidade humana. A morte não vem no fim da vida: “vamos morrendo
lentamente, até acabar de morrer”. A doença é, portanto, um dano à totalidade da
vida. Vêm, então, algumas perguntas que não querem calar, resumíveis na seguinte:
Como atender a um paciente, seja ele adulto ou criança, ofertando-lhe tão somente
os recursos técnicos e científicos para lhe sarar uma úlcera no estômago, se todo
ele sofre e não apenas a parte doente? Vê-se, então, que é a vida que adoece em
suas várias dimensões: em relação a si mesmo; em relação à sociedade; em relação
ao sentido global da vida.
No que concerne ao internamento hospitalar ou mesmo ambulatorial, sabe-
74

se que a evolução científica tem oferecido aos enfermos muitos benefícios. Por outro
lado, estabelece-se uma assistência tão sofisticada que os profissionais estão tão
impregnados com a tecnologia e pela burocracia que não mais ouvem o paciente,
sua vontade ou as angústias dos familiares. O paciente, embora tenha direito a
decidir conjuntamente com o médico sobre o tratamento indicado, é pouco ouvido,
não lhe sendo permitida voz e escuta.
Na visão de Ballone (2005), a necessidade de se falar em humanização no
campo em foco surgiu em decorrência da evolução científica e técnica de saúde, o
qual não conseguiu ser acompanhado, como deveria de uma correspondente
qualidade no contato humano, que privilegiasse as relações interpessoais entre
todos os envolvidos no processo do adoecimento, bem como o conforto e a
qualidade de vida do paciente. É importante que médicos e demais pessoas
envolvidas no cuidado do paciente considerem as necessidades emocionais e
psíquicas deste, evitando o descaso humanitário que inclui a falta de intimidade
entre as pessoas que atendem na área da saúde, o desrespeito pela subjetividade
humana, a empáfia, a arrogância, o descaso, a falta de vocação, o desinteresse, a
insensibilidade, entre outros.
A escuta, sobretudo, é uma atitude que deve ser estimulada, pois a partir
dela se acolhe, se compreende, se considera e se respeita as opiniões, queixas e
necessidades dos pacientes. Desse modo, humanizar o atendimento em saúde é
“fortalecer o desejável comportamento ético e o arsenal técnico-científico, com os
cuidados dirigidos às necessidades existenciais dos pacientes, investindo nas
condições de trabalho dos profissionais da área” (BALLONE, 2005, p. 1). Segundo o
autor, algumas atitudes estão relacionadas com o que se pretende com a
humanização no atendimento:

Aprimorar o conhecimento científico continuadamente é uma


conseqüência do interesse e competência; aliviar, sempre que
possível, controlar a dor e atender as queixas físicas e emocionais;
oferecer informações sobre a doença, prognóstico e tratamento;
respeitar o modo e a qualidade de vida do paciente; respeitar a
privacidade (e dignidade) do paciente; compreender a importância de
se oferecer ao paciente um suporte emocional adequado; a
instituição deve oferecer condições de trabalho adequadas ao
profissional de saúde (BALLONE, 2005, p, 3).
75

O saber ouvir, eis um hábito pouco utilizado na sociedade e de grande


importância na construção de uma convivência mais justa e solidária. O aprendizado
do ouvir não se encontra nos currículos escolares e acadêmicos. Todos querem falar,
mas ninguém quer ouvir. Talvez este seja o motivo de haver tantos cursos de
oratórias e nenhum de “escutatória”. Ouvindo-se mais se erra menos, economizam-se
recursos, fortalecendo a cidadania (VILANOVA, 2010).
Evidentemente não se fala aqui em abandonar a técnica e desprezar os
avanços científicos na área da saúde. O importante é aliar esse conhecimento a um
atendimento humanizado, primado pela escuta verdadeira, em que o paciente é
considerado como pessoa, como ser humano fragilizado num período de
atendimento, no qual a cura começa pelo reconhecimento de sua dignidade. Afinal, o
trabalho de um profissional para ser eficiente e humanizado vai necessitar do
conhecimento, da qualidade técnica e de uma boa qualidade de inter-relação
humana.
Após todas as reflexões, vê-se que é simultaneamente complexa e linear a
compreensão do que seja humanizar o atendimento público hospitalar e a luta pelo
reconhecimento. É não deixar que os profissionais de saúde permitam cair no
esquecimento a práxis original no qual o homem adota uma relação de implicação
com respeito a si mesmo, aos outros e aos objetos em geral. Fala, portanto, de não
distanciamento pelo reconhecimento (HONNETH, 2009, p.81).
76

4 O CONTEXTO HISTÓRICO E O CENÁRIO ATUAL DA ASSISTÊNCIA


HUMANIZADA DO HOSPITAL BARÃO DE LUCENA

4.1 O Hospital Barão de Lucena: um breve histórico

O Hospital Barão de Lucena nasceu do sonho do usineiro José Pessoa de


Queiroz que, diante da imensa dificuldade de oferecer assistência médica aos
trabalhadores rurais, vislumbrou a necessidade da construção de um hospital para
atender tal demanda. O mesmo não só se deparou com dada realidade, mas passou
a tentar convencer demais usineiros da região, com iguais dificuldades de saúde dos
trabalhadores em suas propriedades, a contribuírem com uma pequena quantia em
dinheiro proporcional a cada saco de açúcar produzido para angariar os recursos
necessários ao empreendimento.
José Pessoa de Queiroz nasceu em 09 de outubro de 1881 e, oriundo de
uma realidade de vida árdua desde a infância, começou cedo sua vida profissional,
aos 13 anos. Aos 23 anos, em 1909, já era dono do próprio negócio, conseguindo
fazê-lo prosperar, junto aos irmãos João e Francisco, em meio à Guerra Mundial.
Transformaram-se em uma das famílias mais influentes em Pernambuco. Na década
de 40, José Pessoa de Queiroz, o então presidente da Cooperativa dos Usineiros,
iniciou um importante trabalho social na área de saúde com a Fundação da
Sociedade Beneficente Hospitalar das Usinas de Açúcar.
Os passos iniciais para as obras de construção do projeto hospitalar foram
dados em 04 de julho de 1948, pelo Presidente da República Eurico Gaspar Dutra.
No entanto, a construção só foi iniciada efetivamente, em 1953, quando seu
idealizador acreditava já ter arrecadado quantia que permitisse levar a obra até o
fim.
Quase dez anos depois, em 18 de janeiro de 1958, o Hospital Barão de
Lucena (HBL) foi inaugurado pelo então Presidente da República Juscelino
Kubitschek, demonstrando o interesse da Associação – e por que não dizer dos
governantes – na real efetivação do grandioso projeto de benefício à população. A
escolha deste nome foi uma homenagem ao político e magistrado Dr. Henrique
Pereira de Lucena, fundador da primeira escola de obstetrícia do Brasil.
77

Vale ressaltar que o HBL também atenderia toda categoria empresarial


ligada à cana-de-açúcar e a sociedade pernambucana em geral, cujos andares
superiores existiam os apartamentos luxuosos e os inferiores, dotados de
instalações mais simples, para a população menos assistida. Com 450 leitos,
modernos laboratórios e bloco cirúrgico, o Barão de Lucena foi pioneiro em diversas
áreas da medicina, além de ser considerado o melhor Hospital de Pernambuco
(PERNAMBUCO, 2004).
Apesar do passo da inauguração, o HBL teve dificuldades em atingir o
objetivo para o qual foi criado. A história informa que a ocorrência de queda no preço
do açúcar fez com que a contribuição da Sociedade dos Usineiros ficasse bastante
defasada. A direção do HBL, então, tentou convênios e parcerias com entidades
públicas além de, conforme Oscar Coutinho Neto, em sua conferência em menção
aos 50 anos do Barão de Lucena (2008), tentar trazer os melhores médicos para
oferecerem seus serviços no local, internando pacientes e instalando consultórios no
Hospital, o que não se concretizou neste momento. Tais dificuldades prejudicavam o
funcionamento da Instituição, comprometendo-a também quanto à implicação de
recursos humanos, já que construir um hospital exige além de recursos financeiros
para erguer a estrutura física, demanda de profissionais especializados para oferta
de serviços de qualidade à população.
Contudo, iniciativas semelhantes a do Sr. José Pessoa de Queiroz, de
fundar uma Instituição hospitalar para atendimento de trabalhadores rurais, mostra
que, a essência humana não se perdeu. De acordo com Boff (2007), o cuidado faz
surgir os seres humanos sensíveis, solidários, complexos e conectados com tudo e
todos no universo.
Apenas em 1973, com o precário funcionamento do Hospital, o mesmo foi
negociado com o Instituto Nacional da Previdência Social em troca das dívidas
existentes. Em 1990, o Barão de Lucena passa para gestão do Sistema Único de
Saúde (SUS), como Hospital Terciário da Rede Estadual de Saúde.
O HBL possui, atualmente, uma área construída de 28.784m, 314 leitos,
distribuídos em diversas especialidades e 19 salas de cirurgia em três centros
cirúrgicos (ambulatorial, obstétrico e geral). Sua principal vocação assistencial é a
materno-infantil (atendimento médico-hospitalar, ambulatorial e emergencial), sendo
referência para gestante de alto risco e soropositivo ao HIV, possuir banco de leite,
incentivando a amamentação, recebendo em setembro de 1998 da UNICEF-MS por
78

sua atuação nessa área, o título de “Hospital amigo da criança”. Conta ainda, com
um atendimento de alta complexidade em oncologia e terapia renal substitutiva,
funcionado como central reguladora do Estado na área de diálise (PERNAMBUCO,
2004).
Assim sendo, o Hospital Barão de Lucena (HBL) é parte integrante da rede
estadual de saúde de Pernambuco, com 100 % dos seus leitos dedicados ao SUS.
Caracteriza-se como hospital de grande porte, com atendimento emergencial nas
áreas de obstetrícia e pediatria, disponibilizando ainda, 33 ambulatórios nas diversas
áreas médicas. Tem uma média/mês de 8.746 atendimentos nas diversas
especialidades médicas. Está localizado na cidade do Recife, convivendo com
graves problemas sociais, econômicos e financeiros.
Segundo dados fornecidos pelos recursos humanos do HBL, esse conta com
os serviços de 2071 funcionários, dos quais 284 são terceirizados e 172 contratados
por tempo determinado. São eles distribuídos em diversas categorias funcionais e
vinculados a vários empregadores.
O Hospital possui vocação para a área de ensino, existindo residências nas
áreas médicas, de enfermagem e de nutrição, além de servir de campo de estágios
para os estudantes de nível médio e superior nas demais áreas de atenção à saúde,
como psicologia, serviço social, fonoaudiologia, fisioterapia, terapia ocupacional,
biomedicina,farmácia, patologia clinica e imagenologia.
A unidade de pediatria do HBL, lócus deste estudo, atende mensalmente
uma média de 5.264 crianças com idade de zero a 12 anos, dos quais 2.946
atendimentos provenientes da emergência, 1.222 atendimentos de origem
ambulatorial e 1.096 internamentos. O ambulatório é constituído por várias clínicas
especializadas (nefrologia, cardiologia, endocrinologia, neurologia, neurocirurgia,
cirurgia pediátrica, reumatologia, pneumologia e Alergia, ecocardiografia pediátrica,
terapia ocupacional e fisioterapia respiratória), além da pediatria geral. Existe, ainda,
um centro de infusão para pacientes com doenças lisossômicas, único no Estado,
que funciona como hospital-dia. A pediatria ainda possui enfermaria (local de
aplicação dos formulários de entrevista desta pesquisa) com 56 leitos, sendo 8 para
recém-nascidos externos, 10 para diarréia e 38 para pediatria geral. Conta com UTI
“aberta”, ou seja, é a única do SUS que oferece alojamento para as mães em frente
à mesma, possibilitando o acompanhamento dos seus filhos 24 horas por dia. O
79

acompanhamento das crianças tem início na maternidade que possui alojamento


conjunto para os bebês a termo, e o alojamento canguru para bebês prematuros.

4.2 As práticas de humanização no Hospital Barão de Lucena

O HBL passou a integrar o PNHAH, quando em 19 de julho de 2002, através


do ofício da Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco, foi convidado a
participar do primeiro encontro de capacitação do programa de humanização, que se
realizou nos dias 30 e 31 de julho desse mesmo ano. Para tanto, foram enviadas
duas servidoras: Kátia Salgado (enfermeira) e Valéria Bezerra (médica), com a
missão de descrever o perfil do hospital e as ações humanizadoras já em uso, além
do compromisso de tornarem-se agentes multiplicadores do programa. Nesse
encontro, estavam presentes representantes de 25 unidades hospitalares (ATA
2002, p.1). O encontro teve os seguintes objetivos:

Apresentar o PNHAH, como estratégia reestruturante do SUS;


Integrar os participantes com os facilitadores da SES;
Definir os papéis e funções dos autores envolvidos no processo;
Identificar o público alvo a ser trabalhado;
Levantar o perfil inicial das instituições selecionadas.

Em 02 de agosto de 2002, acontece a primeira reunião dos multiplicadores


para definir as ações necessárias para iniciar a implantação da política de
humanização no hospital. Como ponto de partida fora apresentado o PNHAH à
direção do Hospital e, posteriormente, aos gerentes das clínicas, na primeira reunião
de sensibilização, no dia 16 deste mesmo mês (ATA, 2002).
Dando continuidade ao processo de implantação do programa, outro curso
de capacitação para os multiplicadores fora realizado em 23 de agosto de 2002, bem
como uma segunda reunião de sensibilização dos servidores, com a proposta de
formar de maneira voluntária o grupo de trabalho da humanização (GTH), com a
participação de cinco membros além dos dois agentes multiplicadores já existentes
80

(ATA, 2002).
O GTH, em 25 de agosto de 2002, aprovou seu regimento interno com suas
atribuições, funções e composição. A composição fica assim definida: um
coordenador, um secretário, um representante da direção do hospital, um
representante dos usuários e nove outros profissionais do serviço, representando os
demais segmentos (ATA, 2002).
Além disto, dentre outros enfoques na humanização presentes na Instituição,
criou-se a Casa da Mulher (espaço para pacientes do sexo feminino pós-alta, com
filhos internados ou gestantes de alto risco que não habitam no Recife) e o
Barãozinho (associação criada pela pediatria do Hospital com o objetivo de atender
de forma mais integral as crianças e seus familiares que buscam aquele serviço).
Fundada em 5 de setembro de 2002, a Associação Barãozinho é uma
entidade sem fins lucrativos. O objetivo principal era de proporcionar condições
melhores de saúde e vida para crianças e adolescentes, a partir da humanização do
atendimento no Hospital Barão de Lucena. Tal iniciativa adveio de profissionais de
saúde e voluntários, cujo entendimento passa pela assertiva de que apenas os
recursos do governo para a saúde não atendem à necessidade da população. Aqui é
importante citar as contribuições da médica pediatra Valéria Bezerra.
A escassez de recursos para a saúde é uma das principais dificuldades
deste setor, seja em nível federal, estadual, municipal e/ou distrital. Além disto, os
usuários do serviço público de saúde no Brasil vivem de forma precária, com até
50 % deles abaixo da linha de pobreza, especialmente no Nordeste Brasileiro. Desta
forma, a população infantil também sofre com esse quadro (BARÃOZINHO, 2009).
A reciclagem tem desempenhado papel importante como fonte de recurso
para a Associação, com realização de feiras beneficentes, e organização de eventos
festivos. Para este fim, dentre outros projetos para melhoria da qualidade de vida
destas pessoas, estão a realização de reuniões semanais para informação sobre
higiene e saúde e a de oficinas de trabalhos manuais com as mães. Contanto, com a
ajuda de voluntários, a Associação promove o aprendizado de trabalhos manuais,
bordados, recicláveis e pintura, objetivando a uma atividade rentável para as mães.
O informativo Barãozinho que explicita ações de novembro de 2004 a janeiro
de 2005, traz um exemplo de solidariedade e responsabilidade social desenvolvido
pela Associação junto à Escola Palatino com o Projeto Reciclarte, onde alunos da
escola estimulam as mães das crianças internadas no Hospital Barão de Lucena
81

para a utilização de material descartável (tampas de garrafas) para criação de


tapetes, luminárias e outros objetos. Isso visa estimular a ocupação do tempo ocioso
destas mães no Hospital, além de oferecer uma possibilidade para geração de renda
na família (BARÃOZINHO, 2005a).
Os benefícios de trabalhos como estes são vistos, certamente, não apenas
na geração de renda, mas também contribuem para resgatar a cidadania das mães
através de seu trabalho e faz do Hospital um ambiente mais humano e mais
saudável.
Uma campanha de sensibilização foi promovida no sentido de alertar sobre a
importância do uso do crachá por parte de todos os funcionários do H.B.L. Também
foi realizado um projeto para implantação da “Capelania”. Com o desenvolvimento
da humanização no Hospital, constatou-se a necessidade da assistência religiosa, a
fim de aliviar a dor, o sofrimento, a desesperança e o medo tão presentes no
adoecer. Assim, convocaram-se representantes das Igrejas Católica, Evangélica e
Espírita, para que juntos organizassem a Capelania. O objetivo deste projeto é
prestar assistência aos pacientes, familiares e funcionários, dando-lhes o conforto
espiritual. Através de visitas diárias às enfermarias, os religiosos teriam como meta,
prestar atendimento individual, além de agendarem atos religiosos mensais,
comemoração de datas religiosas, entre outros (ATA, 2003).
Discutiu-se com os participantes do GTH, a importância de criar um espaço
de convívio entre a gestão do HBL e os servidores. Nesse sentido, surge a ideia de
mensalmente promover um café da manhã com o diretor do hospital. Esse momento
seria reservado para escuta direta dos anseios dos trabalhadores, criando desse
modo um fórum de discussão. Também foi proposta uma campanha contra o fumo
dentro das dependências do Hospital, com a confecção de cartazes informativos
sobre os danos do tabagismo (ATA, 2003)
Dando seguimento às práticas de humanização do H.B.L, iniciam-se as
atividades dos Doutores da Alegria na pediatria, com o pessoal voluntário, dedicado
a levar alegria às crianças hospitalizadas, seus pais e profissionais de saúde,
através da arte do palhaço, nutrindo esta forma de expressão como meio de
enriquecimento da experiência humana. Na ocasião, foi mostrado o carrinho da
recreação, para que todos tomassem conhecimento da decoração feita pelas
psicopedagogas, voluntárias da pediatria (ATA, 2003).
O projeto Música é Vida, apresentado no dia 07/01/2004 pelo GHT, objetivou
82

levar a alegria e leveza da música aos enfermos. A partir desse momento, o GHT
passa a organizar as atividades festivas do Hospital, ficando responsável pelos
eventos comemorativos como Dia das mulheres, Páscoa, Dia das mães, São João,
Dia das crianças, entre outros, incluindo distribuição de brindes, com a finalidade de
arrecadar fundos para suprir necessidades dos diversos setores do Hospital e
pacientes (ATA, 2004).
Foi realizada a Semana da Pessoa Portadora de Necessidades Especiais,
durante a qual foram distribuídos panfletos informativos e cartazes. Também foi
discutida a programação da Semana Mundial da Amamentação, sendo proposta a
confecção de cartazes, além de faixas e montagem de stands no térreo, para a
divulgação do banco de leite, expondo o trabalho realizado nesse setor,
corroborando seu título de Hospital Amigo da Criança. Na oportunidade, várias
propostas de melhorias nas condições estruturais foram lançadas: reforma das
cadeiras dos acompanhantes da pediatria, banheiros, instalação de uma
brinquedoteca na pediatria cirúrgica, televisões no quarto das mães das UTIs e
URN, varais nos banheiros, recuperação do sistema de som do Hospital e
sinalização de toda instituição, no intuito de contribuir para um ambiente mais
acolhedor (ATA, 2004).
O trabalho voluntário é uma realidade dentro do HBL. Através do seu
aspecto humanitário, tem ajudado ao próximo e colaborado com as políticas de
saúde, levando solidariedade às pessoas ali internadas por longos períodos, tendo
suas necessidades biopsicossociais afetadas pela doença. O voluntariado assume
um compromisso contínuo, com responsabilidade pelo paciente, através de ações
assistenciais prescritas pela equipe de saúde da instituição. O trabalho voluntário no
hospital Barão de Lucena destina-se, prioritariamente, aos pacientes que passam
um longo período de internação nas unidades clínicas e cirúrgicas e que necessitam
de ajuda no atendimento de suas necessidades básicas e não têm acompanhantes
ou familiares (ATA, 2007).
Desde a primeira reunião da humanização no HBL, em 02 de agosto de
2002 e sua posterior formação de um Grupo de Trabalho em Humanização, que
passou a se reunir a cada quinze dias, diversos projetos foram encaminhados à
diretoria, levando-se em conta a escuta de funcionários e usuários de diversos
setores, através de pesquisas, na tentativa de identificar os maiores problemas no
dia a dia do Hospital. São alguns dos projetos encaminhados: voluntariado, serviço
83

de assistência religiosa (Capelania), comemoração de datas festivas, café com o


diretor, Pastoril do HBL, ginástica laboral, assistência psicológica aos pacientes da
oncologia e hemodiálise, reunião dos Alcoólatras Anônimos (AA) no HBL,
assistência psicológica aos funcionários, brinquedoteca da pediatria, Associação
Barãozinho, cirurgia sem medo, música é vida, acompanhamento de pacientes
idosos e ostomizados (ATA, 2007).
O GTH, além desses projetos, tem recebido solicitações de diversos setores,
de dentro e fora do hospital, e tentado encaminhar e acompanhar a resolução das
mesmas, através de suas reuniões, agora mensais. Também o grupo tem
apresentado trabalhos em congressos e encontros de humanização, além de
participar de eventos em outros hospitais e instituições, divulgando o trabalho do
GTH e trocando experiências com os outros. Seus projetos futuros são: terapia com
animais, sinalização do hospital, sonorização do hospital, coral de funcionários e
capacitação dos setores em humanização (ATA, 2007).
Várias propostas e projetos foram feitos ao longo dos anos, algumas se
concretizaram (como o voluntariado e assistência religiosa); outras ainda se
encontram em construção (como o acolhimento), e há as que foram descontinuadas,
(como o acompanhamento das ações).
Em agosto de 2009, o Hospital passa por grandes mudanças
administrativas. Um novo modelo de gestão é apresentado aos servidores, agora
mais voltado para metas e desempenho, assemelhando-se, nesse ponto, à
administração privada.
Nesse contexto, o GTH apresenta seu trabalho à nova administração e
propõe eleição de nova coordenação para lhe dar continuidade. Na mesma reunião,
a direção do hospital informa que a SES indicou o HBL para receber o projeto de
Acreditação Hospitalar, promovido pelo Hospital Alemão Osvaldo Cruz (ATA, 2009).
A partir daí, vários procedimentos vieram contribuir para humanização do
cuidado: reformas estruturais em todo o Hospital, incluindo a pediatria; treinamentos
dos profissionais para qualidade na assistência; implantação da certidão de
nascimento na saída da criança da maternidade; instalação e inauguração da
ouvidoria; treinamento para o atendimento com classificação de risco, entre outras.
Certamente o processo de acreditação é um divisor de águas para o
Hospital, pois ele traz recursos financeiros, tecnológicos e qualificação profissional
nas diversas áreas, fatores que, associados aos humanos, são imprescindíveis para
84

um atendimento de qualidade e humanizado.


Percebe-se que a gestão de um hospital de grande porte, com atendimento
contínuo durante 24 horas/dia, não poderia deixar de contar com o monitoramento
permanente do grau de satisfação dos seus usuários, uma vez que a supervisão
direta não consegue atingir o controle efetivo de todas as ações, relações e
procedimentos envolvidos na assistência hospitalar. Daí a importância da ouvidoria
inaugurada em fevereiro de 2010. Representa um canal de comunicação entre o
usuário e a administração do HBL, no intuito de colaborar com o crescimento
institucional e contribuir de forma efetiva na promoção da humanização. A ouvidoria
tem, portanto, um importante desafio a enfrentar, que é democratizar a relação da
administração com o usuário.
É comum no serviço público a falta de continuidade das ações e seu não
monitoramento, repercutindo de modo negativo nos resultados das políticas
públicas, que enfrentam grandes dificuldades de sair do papel e se concretizarem.
Daí este estudo focar a importância de avaliar a política pública da humanização.

4.3 A cultura organizacional: a humanização nos hospitais

Para Rios (2009, p. 58), cultura institucional refere-se ao “conjunto de


valores, hábitos, procedimentos, normas e afetos produzidos pelas pessoas e pelo
conjunto institucional no trabalho”. É a cultura que caracteriza um ambiente de
trabalho, que influencia o comportamento das pessoas na rotina laboral, ao seu
favor ou contra, no caso da contracultura. Engloba a dimensão tecnológica material
e organizacional, a dimensão institucional (normas de funcionamento) e a dimensão
afetiva (sentimentos e emoções entre as pessoas que compõem a instituição). A
cultura institucional é o resultado da interação das pessoas dentro de determinada
organização, oriunda deste espaço físico e humano que gera valores, atitudes e
práticas traduzidas no modo de ser dos trabalhadores que fazem parte daquele
contexto.
No âmbito da saúde, a mudança na cultura institucional começou com a
necessidade da humanização no contexto hospitalar. Essa surgiu em resposta ao
sofrimento dos profissionais, pacientes e pessoas envolvidas com o atendimento em
85

saúde, subjugados por uma cultura institucional de violência. Acabou por se tornar
relevante, dentro do setor público brasileiro, uma política de humanização, voltada
para a mudança da cultura institucional, e para os processos de gestão e de
organização do trabalho. A partir daí, importantes estratégias têm sido
desenvolvidas para a implementação da Humanização nos serviços de saúde
pública brasileiro, que requer inúmeras ações, metodologias e ferramentas,
principalmente a educação dos profissionais da saúde dentro dos princípios da
humanização e o desenvolvimento de ações protetoras contra as variadas e
constantes situações de sofrimento e estresse decorrentes do próprio trabalho e
ambiente, cenário das práticas de saúde (RIOS, 2009).
Um hospital pode atender aos mais rígidos critérios tecnológicos e, mesmo,
assim ser desumano no atendimento. Isso ocorre quando ele trata os pacientes
como simples objetos de intervenção técnica e considera desnecessário, e até
mesmo perda de tempo, ouvir suas angústias, temores e expectativas.
Para o Ministério da Saúde (2002), humanizar a assistência é dar lugar não
só a palavra do usuário como também a do profissional de saúde, de forma que
tanto um quanto o outro, possa fazer parte, como atores dos processos de
prevenção, cura, reabilitação, oferta de um atendimento de saúde de qualidade,
promoção da saúde e da qualidade de vida individual e coletiva. Por isso, tais
processos geram muitas vezes incômodos e conflitos ao mexer com concepções de
saúde, formas de trabalho e relações de poder estabelecidas nas instituições
hospitalares.
Não é só do diálogo, do acolhimento, de boas maneiras e intenções, que
brota o processo de humanização hospitalar. Ele nasce de um olhar crítico das
equipes hospitalares para a própria instituição, no que se referem à estrutura física,
formas de funcionamento, tipo e características dos relacionamentos. Da
persistência em processos de médio e longo prazo, que possibilita a recriação do
sentido de intervenção e do investimento articulado em três frentes: promoção de
uma cultura de práticas de cuidado, participação e diálogo, existência de condições
estruturais da instituição e capacitação técnica permanente da equipe hospitalar. Isto
visa uma mudança de modelo mental instituído no ambiente hospitalar, de curadores
de doenças sem nenhum relacionamento de amor, só de utilização de uma técnica
médica de tratamento.
86

A preocupação com a humanização hospitalar começou no Brasil nas


últimas décadas, graças aos esforços de grupos de profissionais e de movimentos
populares de saúde, no contexto de redemocratização da sociedade brasileira e da
luta por uma política pública de saúde universal e de qualidade.
É necessário associar-se as mudanças sócio-econômicas recentes
retomadas do discurso político, fazendo renascer de um período de tecnocracia e
centralização, bases de democracias pluralista e liberal que a sociedade almeja.
Os teóricos da mudança organizacional defendem, em suas abordagens, a
mudança como sinônimo de desenvolvimento. Mudar é bom e significa crescer,
enquanto a permanência das coisas é ruim. Acreditar que tudo à nossa volta está
mudando e que os indivíduos e organizações devem acompanhar o ritmo frenético
das mudanças pode distorcer a compreensão e adoção das práticas humanizadas
(MATTOS, 1992).
Segundo Mattos (1992), o ser humano pouco mudou em relação aos
valores, emoções, vida e morte. Os avanços sociais e culturais, de longe
acompanharam os progressos das ciências físicas e químicas. Percebe-se que os
problemas humanos, em seu nível individual e social, permanecem os mesmos após
vários séculos. O que se vê na mídia é corrupção, violência, mentiras políticas e
econômicas, fatos tão antigos quanto o ser humano.
A mudança como sinônimo de progresso deve ser considerada em sua
relatividade, evitando-se tomá-la como dogma. Às vezes muda-se tanto um
ambiente que é necessário mudar as pessoas para nele viverem. Desse modo, o
diagnóstico de uma organização é complexo. A permanência pode não ser uma
estagnação e sim uma adaptação à realidade. O importante é ter em mente que o
progresso leva a dois caminhos: cria a possibilidade ou pode levar à restrição. Cabe
refletir sobre a realidade que se apresenta (MATTOS, 1992).
O contexto histórico pós-moderno trouxe mudanças no campo tecnológico,
na produção econômica guiada pela lógica capitalista, na cultura, nas formas de
socialização, na política, nos valores e na vida cotidiana. A influência do capitalismo
foi implacável dentro desse processo. A época da pós-modernidade trouxe um novo
reordenamento social, afetando todas as instâncias (RIOS, 2009). Para a autora, a
modernidade, ao fracassar em seu projeto, em que viu desabarem os ideais
utópicos, políticos, éticos e estéticos que preconizava e que creditava ao projeto
iluminista a construção de um mundo melhor, movido pela razão humana, dá lugar
87

ao pós-moderno, em que desaparece qualquer modelo de sociedade. Assim, os


atores estão concentrados em si mesmos, buscando satisfazer suas necessidades
narcísicas, mergulhando num consumismo exagerado, doentio e desenfreado. Não
acreditando mais nos governos corruptos e demais sistemas sociais, incapazes, na
prática, de promover o bem da nação, as pessoas optaram pelo isolamento, pelo
individualismo.
Para muitos autores, a época atual é denominada de hipermoderna ou
supermoderna. Para Lasch, a sociedade atual é nomeada de Cultura Narcísica, para
Debors, de Sociedade do Espetáculo. No dizer de Edgar Morin (1999 apud
ARAGÃO, 2006, p. 37), “um tempo superficial, fútil, épico e ardente, onde o cheio
provoca o oco, a saciedade gera a angústia, o permanente é trocado pelo atual, o
mais „novo‟, o mais „moderno‟”.
Revolução Industrial, sistema capitalista, economia baseada no
consumismo, pessoas vivendo seus dias programados, com agenda repleta de
compromissos, entregues ao presente e ao prazer, ao consumo e ao individualismo;
intolerância às diferenças, uso da violência para resolver conflitos, competição
acirrada em todos os campos, corrupção, escândalos e mentiras: esse é o contexto
pós-moderno (MONTEIRO, 2009).
Rios (2009) afirma que, do meio do século XX para cá, começa-se a buscar
respostas para a sociedade atual. Temas como direitos humanos, bioética, proteção
ambiental, cidadania, sustentabilidade e responsabilidade social, começam a ser
discutidos em todas as instâncias sociais, ganhando espaço no dia a dia das
pessoas. O convite é para a construção coletiva de outra realidade. Também na
área da saúde, iniciativas rumo à humanização começam a dar sinais: luta anti-
manicomial na área da saúde mental, do movimento feminista pela humanização do
parto e nascimento, na área da saúde da mulher. Essas posturas começaram a
ganhar volume e produzir ruído suficiente para registrar marca histórica.
A partir desses primeiros movimentos, vários hospitais, na sua grande
maioria pertencente ao setor público, experimentam desenvolver ações
denominadas de “humanizadoras”. A princípio, tais ações buscavam tornar o
ambiente hospitalar mais afável, mais humano, incluindo atividades lúdicas,
entretenimento ou arte, melhorando a aparência física dos serviços. Essa nova
postura, ainda incipiente e imatura, não chegava a causar mudanças na estrutura da
organização do trabalho ou na gestão, nem mesmo na vida das pessoas ali
88

envolvidas, funcionando, apenas, como válvula de escape para diminuir um pouco


do sofrimento daqueles pacientes e trabalhadores. No entanto, gradualmente, a
proposta humanizadora foi ganhando consistência, o que gerou alterações na rotina,
como por exemplo, a visita livre, o direito ao acompanhante e a dieta personalizada
(RIOS, 2009).
Para Rios (2009, p. 10), a humanização pode ser compreendida sob
diversos enfoques, tais como:

Princípio de conduta de base humanista e ética;


Movimento contra a violência institucional na área da Saúde;
Política pública para a atenção e gestão no SUS;
Metodologia auxiliar para a gestão participativa;
Tecnologia do cuidado na assistência à saúde.

Para a autora, a humanização tem como suporte o respeito e a valorização


da pessoa humana, constituindo um processo cujo objetivo é a transformação da
cultura institucional, através da construção coletiva de compromissos pautados na
ética e nos métodos para as ações de atenção à Saúde e de gestão dos serviços.
Tal conceito contempla as diversas visões da humanização supracitadas como
abordagens complementares, que vão permitir a realização dos propósitos para os
quais aponta sua definição:

a humanização reconhece o campo das subjetividades como


instância fundamental para a melhor compreensão dos problemas e
para a busca de soluções compartilhadas. Participação, autonomia,
responsabilidade e atitude solidária são valores que caracterizam
esse modo de fazer saúde que resulta, ao final, em mais qualidade
na atenção e melhores condições de trabalho. Sua essência é a
aliança da competência técnica e tecnológica com a competência
ética e relacional (RIOS, 2009, p. 10).

A humanização surge, segundo esse enfoque, como um processo de


construção da ética relacional, que visa recuperar valores humanísticos outrora
esquecidos dentro do cotidiano institucional, reconhecendo a natureza humana em
sua essência, buscando a cooperação entre os atores, baseado nas diretrizes e
condutas profissionais éticas que respeitem os valores humanos. Procura, em sua
prática, métodos que incluam, sobretudo, a ética e o respeito humano no pensar e
89

agir sobre os processos saúde-adoecimento e nas relações de trabalho. Tal conduta


envolve a fala e a escuta na relação do profissional com o paciente, sendo a última
um imprescindível recurso técnico para o diagnóstico e a adesão terapêutica. Entre
os profissionais, a escuta favorece a gestão participativa e a transdisciplinariedade.
No aspecto da moral, a humanização relaciona-se com valores como:
respeito, solidariedade, compaixão, empatia, bondade, todos os valores visando
resgatar a dignidade humana na área da Saúde e o exercício da ética, aqui pensada
como um princípio organizador da ação, que se reflete no pensamento e ação
voltados para o bem, para aquilo que é bom e justo, não violento e humanizador.
Nesse sentido, a humanização surge como “resposta espontânea a um estado de
tensão, insatisfação e sofrimento tanto dos profissionais quanto dos pacientes,
diante de fatos e fenômenos que configuram o que chamamos de violência
institucional na Saúde” (RIOS, 2009, p. 14).
Ainda segundo Rios (2009), a humanização nasceu dentro do SUS que se
apoia em princípios humanistas: universalidade, integralidade, equidade e
participação social, sendo hoje o principal sistema de inclusão social do Brasil.
Embora procure atender aos anseios do povo brasileiro, o SUS ainda convive com
inúmeras contradições oferecendo modernos serviços, com alta tecnologia, ao lado
de outros sucateados, além do atrapalho da burocratização e de outros graves
problemas como a violência institucional.
As ações de saúde devem estar associadas a comprometimento,
envolvimento e compaixão. Ela requer uma cultura humanística. Na cultura racional
predominam os pensamentos lógicos, binários, e/ou. Trata-se de uma lógica de
exclusão, ou tudo ou nada, ou bem ou mal. É este o modelo mental que aqui
predomina; e o que é pior, as pessoas nem percebem o quanto estão condicionadas
a ele. É necessário complementar esse modo de pensar com outro mais abrangente,
ou seja: pensar o todo sem deixar de lado as partes. É pensar de modo sistêmico,
as partes e suas relações. O equilíbrio entre o pensar linear e sistêmico chama-se
pensamento complexo, e este define os dois lados do ser humano (racional-técnico
e simbólico-mágico). É este pensamento complexo que serve como base teórica do
acolhimento e que define a condição natural de que todas as coisas e processos do
universo estão ligados a tudo e tudo depende de tudo (SÃO PAULO, 2002).
Continuando este raciocínio de mudança, o que fazer para modificar uma
organização ou instituição? É preciso mudar o modo de fazer sua cultura. Eis,
90

portanto, o desafio de mudar a vigente cultura de atendimento de serviços de saúde.


Essas mudanças são adquiridas com muito trabalho e em longo prazo. Para isso, é
necessário iniciar uma jornada difícil, em busca de novas ações de saúde, evitando
a escalada da exclusão social e, é claro, a chamada desumanização. As pessoas
precisam abrir mão de suas individualidades, que leva à exclusão. Assim, o
processo de mudança cultural de uma organização deve contemplar o
desenvolvimento pessoal e interpessoal, visão e comprometimento, compartilhando
aprendizagem em grupo e compreensão da complexidade (SÃO PAULO, 2002).
O modelo cultural em que aqui se acredita fundamenta-se na máxima de que
todos os problemas da humanidade serão resolvidos com o crescimento econômico
e progresso tecnológico. Assim, se não houver mudança deste modelo mental e
cultural, continuará a sociedade incorrendo nos mesmos erros, gerando mais
exclusão, em vez de aproximação, confiança, equidade e justiça. Então, humanizar
é garantir à palavra a sua dignidade ética. Ou seja, os sofrimentos humanos, as
percepções de dor ou de prazer no corpo, para serem humanizadas precisam tanto
que as palavras com que o sujeito as expressa sejam reconhecidas pelo outro, tanto
quanto esse sujeito precisa ouvir do outro, palavras brandas e de seu
reconhecimento. Pela linguagem se faz as descobertas de meios pessoais de
comunicação com o outro, sem o que desumaniza reciprocamente. Isto é, sem
comunicação não há humanização. A humanização depende da capacidade de falar
e ouvir, pois as coisas do mundo só se tornam humanas quando passam pelo
diálogo com o semelhante (BRASIL, 2002).
Humanizar o cuidar é dar qualidade à relação profissional da saúde-
paciente. É acolher as angústias do ser humano diante da fragilidade de corpo,
mente e espírito. Destaca-se aqui a presença solidária do profissional com
habilidade humana e científica.
A humanização dos hospitais pode ser entendida como o estabelecimento
efetivo dos direitos do paciente sobre a estrutura operacional e administrativa local.
Afirmando que o doente é a razão de ser do hospital, não se esquece a finalidade
pela qual foi criado: cuidar, servir e acolher o paciente. Como é ali que a saúde
humana é tratada, as imperfeições, no seu funcionamento são rapidamente notadas,
necessitando de correções adequadas.
A humanização não é resultante apenas de recursos financeiros ou
materiais, ela envolve pessoas, atitudes. A equipe de saúde entra em contato
91

permanente com a dor e o sofrimento humano, e seus olhos veem camas, paredes,
lágrimas e os mistérios da vida: o nascer e o morrer. O paciente não necessita
apenas de tecnologia, apesar desta ser importante e necessária no processo de
cura; ele precisa de, sobretudo, comunicação humana. Tudo deve ser feito em favor
do paciente, para o seu bem e garantia. Qualquer programa fora deste postulado é
sem propósito e imoral, pois a medicina foi gerada pela dor, sofrimento e em função
unicamente do doente.
A assistência à saúde tem como principais objetivos; a prestação de bom
atendimento técnico e o cuidado de modo integral do paciente, um complementando
o outro, vez que nenhum complexo tecnológico poderá substituir a capacidade
humana de formar outro complexo - o de pessoas. Se a equipe de saúde não se
entende como formada por pessoas, não poderá transmitir afeto, cuidado e
segurança ao paciente. Entretanto, quando a equipe interage de forma harmônica e
afetiva, o resultado é refletido de forma positiva na assistência prestada ao paciente.
O paciente só procura o hospital quando doente, e no estado de doença
ocorrem várias mudanças de hábitos diários, além da ameaça do equilíbrio
psicológico. Nestas condições, além da preocupação com a doença, ele teme pelo
mundo desconhecido ao qual será inserido no momento de sua internação. Esse
medo, do desconhecido, é bem maior que sua hospitalização. Após sua internação,
o paciente centra sua atenção na doença (natureza, gravidade e tratamento). Surge
então o primeiro personagem, o médico, aquele que dará todas as respostas desses
questionamentos. O simples ato de ouvir e falar conforta e alivia o paciente
(MEZOMO, 2001).
Os profissionais de saúde são de fundamental importância ao
restabelecimento do doente, vez que a eles, o paciente revela seus problemas
pessoais, familiares, além de pedir explicações sobre sua doença, tratamento e tudo
que não entendeu, quando dito pelo médico. Deste modo, torna-se importante uma
boa formação psicológica e social desses profissionais para tratar o homem e não a
doença dele.
É de fundamental importância investir em recursos humanos, pois as
pessoas, sem dúvida alguma, são o maior bem das organizações. As organizações
dependem das pessoas para funcionar e alcançar sucesso, e as pessoas dependem
das organizações para atingir seus objetivos pessoais, o que se conclui que uma é
dependente da outra.
92

A humanização é algo que se percebe, que se sente presente ou ausente,


mas que é difícil de definir com palavras. Um programa de humanização só poderá
ter sucesso se for abrangente, envolvendo todos os profissionais, usuários e outros
atores que participem de modo direto ou indireto no processo e que tenha um bom
nível de comunicação, tanto interpessoal como institucional.
A proposta de humanização de um hospital consiste em recriar laços entre
homens doentes e os que se propõem a cuidá-los (MEZOMO, 2001).
93

5 METODOLOGIA

Neste capítulo, estão apresentados aspectos relacionados aos


procedimentos metodológicos utilizados para a realização do estudo em tela.
A partir da escolha da pesquisa qualitativa como a mais adequada, de
acordo com a proposta de investigação, primeiramente se decidiu circunscrever o
Hospital Barão de Lucena como lócus, já que faz parte da rede pública hospitalar, o
que permitiu, assim, a realização de um estudo de caso como em metodologia
científica.
Ainda completando o quadro metodológico, ressaltam-se especificidades
referentes ao campo de pesquisa, sujeitos, forma escolhida para coleta de dados,
como também aspectos sobre a análise dos resultados obtidos, formas escolhidas
para buscar compreender, através das categorias de análise, as informações
colhidas.
Para a coleta dos dados, foi utilizada a entrevista semi-estruturada como
instrumento na pesquisa. Por fim, foram apresentados os cuidados éticos do estudo,
já que a supracitada entrevista foi respondida por mães e profissionais situados na
enfermaria da pediatria do Hospital Barão de Lucena como se especifica nos
próximos tópicos.

5.1 Tipo de pesquisa

Optou-se aqui pela pesquisa qualitativa, na medida em que esta responde


mais adequadamente às necessidades do presente objeto de estudo. Minayo (2000)
diz que a pesquisa qualitativa (...) trabalha com um universo de significados,
motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço
mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser
reduzidos à operacionalização de variáveis (p. 22).
Um fato importante na pesquisa qualitativa é a relação estabelecida em um
clima de acolhimento e confiança mútua com o sujeito que participa para tratar de
94

questões em que o discurso pode mobilizar o indivíduo sujeito e suscitar


sentimentos e emoções variadas.

5.2 Relevância do método de abordagem

O método escolhido foi o estudo de caso.


De acordo com Yin (2004), o estudo de caso parte de um caso único e,
dessa maneira, são comuns as críticas sobre a metodologia por oferecer poucos
argumentos que sirvam de base para generalização científica. Assim como os
experimentos, o que é relevante e generalizável, entretanto, são as proposições
teóricas.
Outro fator expressivo destacado por esse mesmo autor é que estudando o
cotidiano e a vida real das pessoas ou instituições, o pesquisador não tem o controle
dos sujeitos e eventos como em laboratórios ou bibliotecas, além de passar a fazer
parte do mundo dos entrevistados como observador. Desse modo, o pesquisador
deve buscar respostas espontâneas em suas entrevistas para obter o máximo de
informações e outras fontes de evidência.
A utilização do estudo de caso – nesta pesquisa, no Hospital Barão de
Lucena – contribui para o conhecimento de fenômenos organizacionais e individuais,
bem como processos e programas, focalizando questões do tipo „como‟ e „por que‟,
aproximando-se dos objetivos desta pesquisa. Com este instrumento, é possível
ganhar evidências qualitativas, fazer observações específicas e descrições do
mundo real para proceder às avaliações (YIN, 2004)

5.3 Lócus

O Hospital Barão de Lucena (HBL) foi o lócus deste estudo. Localizado na


cidade do Recife, o Hospital é parte integrante da rede estadual de saúde de
Pernambuco, com 100 % dos 314 leitos dedicados ao SUS, distribuídos em diversas
95

especialidades médicas. Também são disponibilizados 33 ambulatórios e 19 salas


de cirurgia em três centros cirúrgicos.
Sua principal vocação assistencial é a materno-infantil, sendo referência
para a assistência à gestante de alto risco e soro positivo para HIV. Caracteriza-se
como hospital de grande porte, com uma média/mês de 8.746 atendimentos,
realizados por 2071 funcionários, dos quais 284 são terceirizados, 172 contratados
por tempo determinado e os demais, servidores concursados, distribuídos em
diversas categorias funcionais (PERNAMBUCO, 2004).

5.4 Campo de pesquisa

O campo de pesquisa foi a enfermaria da pediatria do lócus (HBL). A


pediatria do Hospital Barão de Lucena possui uma enfermaria com 56 leitos, sendo
oito para recém-nascidos externos, 10 para diarréia e 38 para pediatria geral.

5.5 Sujeitos: amostra e cuidados éticos

A amostra foi constituída por mães e/ou outras cuidadoras que estivessem
como acompanhantes de seus filhos (ou outros) na enfermaria de pediatria do
referido Hospital e por profissionais que fazem parte desse setor ou estão envolvidos
no cuidado da criança. Em um universo com 56 leitos e 87 profissionais envolvidos
no cuidado, foi proposta da banca que qualificou o projeto uma amostragem com 30
mães ou cuidadoras e 30 profissionais das diversas categorias.
Para não deixar de fora nenhuma categoria profissional, optou-se por
entrevistar pelo menos um profissional de cada uma delas. Como médicos,
enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem são as categorias com maior
número de funcionários, adotou-se o critério da proporcionalidade para o número de
entrevistados. Sendo assim, foram entrevistados 03 médicos, 04 enfermeiros, 13
técnicos e auxiliares de enfermagem e 01 representante das demais categorias. A
96

Tabela 1 exibe o quantitativo dos profissionais do setor de pediatria, e a amostra


tomada para este estudo a partir deste grupo.

Tabela 1 – Quantitativo dos profissionais no setor de pediatria


Profissionais Quantitativo Amostra
Médicos 10 3
Enfermeiras 13 4
Técnico ou Auxiliar de Enfermagem 48 13
Fisioterapeuta 2 1
Terapeuta Ocupacional 1 1
Psicólogo 1 1
Assistente Social 1 1
Nutricionista 2 1
Fonoaudiólogo 1 1
Recreadores 2 1
Burocratas 3 1
Gerente 1 1
Serviços Gerais 2 1

A entrevista foi realizada no período de 19/07/2010 a 20/08/2010, com todas


as mães e profissionais que se disponibilizaram a responder a entrevista e, após o
pesquisador explicar o objetivo da tarefa, ler e solicitar a assinatura do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (ver Apêndice A).
Optou-se por este recorte com os seguintes objetivos:

Questionar pessoas que já estão recebendo os serviços do Hospital e


passaram por processos de marcação de consultas, avaliações
profissionais, diagnóstico e encontram-se como acompanhantes em
internamento.
Avaliar o grau de adoção de práticas humanizadas no cotidiano do cuidado,
na visão das mães (usuário) e dos profissionais.

Foram excluídas da amostra (ou seja, não foram entrevistadas) as mães que
se negaram a participar, já que se imagina que ter um filho em recuperação em
97

unidade hospitalar pode suscitar questões emocionais que justifiquem a negativa.


Também foram excluídas aquelas acompanhantes que não percorreram o trajeto até
o internamento da criança em enfermaria, privilegiando àquelas que participaram de
todo processo. Caso no momento da solicitação da aplicação este alguém
representativo não estivesse, seria feito anotação de previsão de presença deste,
para retorno e aplicação do questionário.
Esta conduta deve-se ao fato de os objetivos da pesquisa estão ligados à
avaliação da política de humanização do Sistema Único de Saúde e, para tanto, é
preciso delinear aquelas pessoas que, por passarem por várias etapas até o
internamento da criança, poderão ter conceitos mais firmes no que diz respeito às
perguntas feitas.
Por motivos legais, mães menores de 18 (dezoito) anos foram excluídas,
pois exigiria a demanda de autorizações legais que, talvez, exigissem tempo e
prejudicassem o cronograma de pesquisa. Pelos mesmos motivos, a coleta de
dados foi iniciada após a autorização do Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital
Agamenon Magalhães (ver Anexo A).
Aos profissionais, também, foi dado o direito de recusa a participarem da
pesquisa.

5.6 Procedimentos

A entrevista semi-estruturada foi eleita como principal instrumento da atual


pesquisa, por ser uma forma de coleta de dados privilegiada, que possibilita
interação social entre o sujeito e o pesquisador.
De acordo com Chizzotti (1995), é interessante que a entrevista seja
elaborada pelo pesquisador com base no seu conhecimento teórico e
especificidades do local de aplicação do mesmo. É fundamental ser montada em
linguagem simples, para que o participante compreenda com clareza o que será
perguntado. As perguntas foram elaboradas a partir de eixos teóricos do PNHAH
(2002), que tratam de parâmetros para humanização de atendimento de usuários e
profissionais (ver Apêndice B).
98

Tais parâmetros apresentam quatro eixos para humanização do atendimento


aos usuários e cinco eixos para humanização do trabalho dos profissionais, a citar:

a) Eixos para humanização do atendimento dos usuários:


1) Qualidade das instalações, equipamentos e condições ambientais do
hospital; 2) condições de acesso e presteza dos serviços; 3) clareza nas
informações oferecidas aos usuários; 4) qualidade da relação entre
usuários e profissionais.
b) Eixos para humanização do trabalho dos profissionais:
1) Gestão hospitalar e participação dos profissionais na organização; 2)
qualidade da comunicação entre os profissionais; 3) relacionamento
interpessoal no trabalho; 4) condições de trabalho na instituição; 5)
motivação e valorização profissional do trabalho; 6) condições de apoio
aos profissionais.

Dessa maneira, os citados eixos representaram as categorias teóricas de


análise desta pesquisa, sendo o instrumento formulado com 3 (três) perguntas
ligadas a cada um deles, perfazendo o total de 12 (doze) perguntas para usuários e
18(dezoito) perguntas para os profissionais.
Tal pensar é oriundo de definições de categorias analíticas de pesquisa,
categorias pré-estabelecidas dentro de uma compreensão teórica e que balizam o
conhecimento do objeto determinado. Contudo, entrando em contato com o local de
pesquisa, profissionais e usuários do hospital, sabe-se que podem surgir categorias
empíricas, que emergem na coleta dos dados e com a aproximação com o objeto
(MINAYO, 2000).

5.7 Análises dos dados

Foi realizada uma análise descritiva dos dados por meio de distribuições de
frequências as quais foram representadas por gráficos. O software usado para
analisar os dados foi o STATA versão 9.0 e, na confecção dos gráficos, o Microsoft
99

Excel versão 2007.


Para responder o porquê dos dados obtidos, prossegue-se com uma análise
temática. De acordo com Bardin (apud MINAYO, 2000, p. 208), “o tema é a unidade
que se liberta naturalmente de um texto analisado segundo critérios relativos à teoria
que serve de guia à leitura”.
Na análise temática, através da leitura do material obtido, é possibilitada a
descoberta de núcleos de sentido a partir dos quais se faz uma aproximação com os
objetivos e as teorias que guiaram o estudo. Vale ressaltar que tanto a frequência
quanto a presença de algum elemento é significante para o objetivo analítico.
Procede-se, assim, com a contagem das frequências das unidades de significação
presentes e/ou qualitativamente pela presença de determinados temas no discurso
do sujeito.
A análise temática diz respeito ao tratamento dos resultados obtidos e sua
interpretação, submetidos a operações estatísticas simples (tipo percentagens), na
maioria dos casos e onde as informações encontradas se tornam mais relevantes.
É importante destacar que, ao final de tal análise, percebe-se que as
inferências são relevantes em torno dos significados e não apenas a partir das
numerações estatísticas.
100

6 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Considerando a proposta metodológica, dois grandes tópicos e seus


resultados pontuam as discussões: a visão dos usuários do Hospital – a dizer, mães
ou cuidadoras de crianças atendidas na enfermaria da pediatria e a dos profissionais
de saúde – de atuações diversas como médicos, enfermeiros e outros, sendo esta
escolha aleatória – no momento em que exerciam suas práticas na mesma unidade
supracitada no período de julho a agosto de 2010, quando ocorreu a coleta dos
dados.
Em cada um destes tópicos, o diálogo entre os achados de pesquisa e as
teorias que fundamentam este trabalho foi posto antecedido por gráficos – que
facilitam a compreensão das respostas dadas dentro da escala ofertada como
espaço de resposta. Simbolizam também, a discussão de cada eixo de pesquisa,
como igualmente estabelecido na metodologia.
Todos os itens são composições de avaliação dos parâmetros do programa
de humanização de assistência hospitalar (ver Apêndice B). Atualmente, tem-se
incluído medidas de qualidade de vida em geral como avaliações de satisfação dos
usuários, eficiência, eficácia, efetividade, acesso, adequação e aceitação, efeitos de
intervenção a serem avaliados. Partindo também deste princípio para a discussão
dos resultados, da mesma maneira e focado nos eixos de pesquisa previamente
estabelecidos, resultados e discussões foram organizados, por blocos,
correspondentes a cada um dos itens avaliados.
Parte-se da concepção de Santos Filho (2009) que afirma que a avaliação
deve ser conduzida por todos os envolvidos – acrescenta-se, a busca por verificar se
tais políticas respondem aos anseios dos usuários e trabalhadores, devendo ser
utilizada a associação de métodos, além da mesclagem de técnicas de abordagens
quantitativas e qualitativas.
101

6.1 A visão dos usuários

Foram entrevistados 30 usuários da enfermaria de pediatria do Hospital


Barão de Lucena, quanto à qualidade das instalações, condições ambientais e
equipamentos, acesso e presteza no atendimento, qualidade da informação
fornecida e qualidade da relação entre usuários e profissionais de saúde, (com
escala que permitia a classificação entre ótimo, bom regular e ruim). Ao final foi
questionado como pergunta para resposta aberta, o que ele, usuário, sugere para
melhoria do serviço.
As mães ou cuidadoras, de maneira geral, demonstraram atenção e
responderam as perguntas com interesse, levando de cinco a dez minutos para
conclusão da entrevista. Antes, a cada uma foi explicado o motivo da solicitação das
respostas, como posto no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (ver
Apêndice A).
A avaliação dos eixos para humanização do atendimento aos usuários do
setor, de acordo com a análise dos indicadores, está demonstrada nas Tabelas 2, 3,
4 e 5 (ver Apêndice C) e gráficos correspondentes:

6.1.1 Qualidade das instalações, condições ambientais e equipamentos para


atendimento dos usuários

Quanto à qualidade das instalações, condições ambientais e equipamentos


para atendimentos dos usuários, o roteiro de entrevista, como instrumento de
pesquisa, sobre este primeiro eixo, abordou questões sobre a qualidade das
refeições, tratamento às reclamações e aparência do setor. Os resultados são
apresentados no Gráfico 1.
102

Gráfico 1 – Qualidade das instalações, condições ambientais e equipamentos para atendimento dos
usuários

Segundo as opiniões dos usuários em relação à qualidade das refeições


oferecidas às crianças, 40 % opinaram como boa e 13,3 % ótima, enquanto que
26,7 % consideram regular e 20 %, ruim. Assim, 53,3 % dos pesquisados
consideram a qualidade das refeições como boas ou ótimas. Sugere-se que a
comida, ao ser pensada como proposta dentro da política de humanização, é
compreendida não só para nutrir uma necessidade básica, mas também como fonte
geradora de satisfação (DAVIDOFF, 2000). Vale aqui pôr em destaque a íntima
relação entre humanização, qualidade e satisfação do usuário (BRASIL, 2002).
Pode-se interpretar, de acordo com a PNH, que oferecer alimentação
estimula a produção de saúde dos sujeitos e a valorização da dimensão subjetiva e
social nas práticas de atenção e gestão. Apesar de obter uma avaliação favorável,
um grande percentual (46,7 %) classificou como regular ou ruim a comida oferecida.
Esse achado deve ser considerado, pois de acordo com Honneth (2009), é preciso
atentar para a individualidade do sujeito, ou seja, nem sempre o que pela Instituição
é considerado bom ou suficiente é assim considerado pelo sujeito.
Aqueles que se alimentam no Hospital precisariam, desta forma, ser ouvidos
a respeito daquilo que realmente o satisfazem para que a gestão seja caracterizada
103

como valorizadora da subjetividade destes. A reciprocidade apontada pela


humanização é justamente a troca, em que os profissionais e a gestão também
levariam em consideração a opinião dos usuários para a elaboração dos cardápios,
por exemplo. De acordo com Silva e Silva (2005), suprir necessidade de alimentação
atentando para a satisfação das pessoas é sinal de uma política pública como
mecanismo de mudança social, orientada para promover o bem-estar de segmentos
sociais.
No que se refere ao tratamento dado às queixas dos responsáveis pelas
crianças, 31 % consideraram ruim, e 24,1 %, regular. Os pesquisados classificaram
37,9 % como boa e 7 % como ótimo o tratamento das reclamações. Observa-se que
a maioria (55,1 %) classificou como ruim ou regular. Este dado é bastante
significativo dentro do que se debate neste trabalho, que é o conceito de
humanização.
Para discutir tal resultado, utilizamos do defendido por Fernandes (2007),
que o povo brasileiro sempre foi muito carente da participação efetiva do poder
público e suas políticas, e que as políticas públicas, portanto, visam atingir os mais
excluídos e carentes, proporcionando o acesso à saúde, saneamento básico,
educação, segurança, entre outros.
De acordo com Mezomo (2001), o paciente não deseja apenas acabar com
a doença existente em seu organismo, mas também eliminar suas angústias e,
dessa forma, deseja ser ouvido e tratado como alguém no mundo. Ao que se vê, não
é assim que a maioria dos usuários se sente quanto ao tratamento das informações.
Questiona-se: será que este número implica dizer que não são ouvidos ou que não
houve retorno quanto à queixa feita? Ainda: será que se sentem ouvidos?
Como a questão foi colocada em escala, não foi possível captar o porquê
das respostas. As perguntas acima podem soar como sugestões no espaço desta
pesquisa. Lucchese (2010) sugere que uma política, para se configurar como tal,
precisa de ações concretas de sujeitos sociais e de atividades institucionais que a
torne realidade em cada contexto em que são implementadas.
Conclui-se, então, que para que o usuário reclame e, principalmente, sinta
que a sua reclamação foi ouvida e valorizada ou despertou o interesse de alguém, é
preciso que haja um espaço de fala. Indispensável que exista uma resposta à
reclamação, ou seja, que torne concreto este espaço para a pessoa e a instituição,
pois as reclamações e sua avaliação, dentro da interação das instâncias e da
104

relação de reciprocidade, precisam causar impacto sobre a situação existente. A


cultura de escuta, representada aqui pela ouvidoria, por exemplo, poderia ofertar
uma esfera de ação ao sujeito, na qual este pode representar suas expectativas
normativas quanto à vida social. Desta forma, por meio da interação, traduzir suas
demandas em padrões e valores socialmente institucionalizados. Ou seja, as
reclamações acarretariam mudanças.
Ressalta-se, neste ponto, a teoria honnethiana e “luta pelo reconhecimento”
que pode, neste contexto, ser traduzida nas respostas dos sujeitos e na possível
alegação de que “eu tenho uma reclamação e a considero importante”. Se o usuário
percebe, todavia, que seu questionamento não causa impacto, é possível que isto
influencie o processo de formação social da identidade (pessoal e coletiva), tendo
como referência o processo de “luta” pela construção dessa identificação.
Os processos de mudança social devem ser explicados com referência às
pretensões normativas estruturalmente inscritas na relação de reconhecimento
recíproco. Em Honneth, quando se coloca a questão da luta por reconhecimento,
sugere-se que o sujeito requer que algo de subjetivo em si seja reconhecido, e que
tal reconhecimento venha de fora para dentro e sua subjetividade, reconhecida e
respeitada exteriormente no âmbito familiar, jurídico e social.
Além disso, sugere-se que ouvir as reclamações sinaliza respeito ao sujeito.
De acordo com o supracitado autor, é importante destacar que as experiências
individuais do desrespeito, ao serem percebidas por um grupo de indivíduos,
possibilitam à comunidade uma reivindicação de relações mais justas. Ressalta-se
que o desrespeito em nível individual pode gerar conflitos coletivos – nesta
circunstância, dentro da instituição de saúde. Isso pode justificar as respostas do
usuário a este quesito, pois sugere “sentimento coletivo de injustiça”, gerado pela
denegação do reconhecimento jurídico ou social.
Reclamações e especialmente reclamações “não tratadas” inserem-se no
contexto de carência de reconhecimento e desrespeito à alteridade. Talvez, a
palavra que melhor defina a importância dedicada àqueles que se colocam
próximos, neste caso, na Instituição de saúde em tela, seja a palavra alteridade. Leal
e Duarte (1998) afirmam que “construir uma identidade é, ao mesmo tempo,
construir ideia de alteridade, sem a qual a primeira não seria possível. Assim, lidar
com o tema da identidade é lidar com diferenciadas tomadas de posição em relação
ao outro” (p. 137). Ou seja, a identidade se constrói a partir das diferenças e
105

semelhanças nas posições que os indivíduos assumem em meio à sociedade na


qual nasceram.
Relembra-se, a este ponto, que dialogando com a teoria de George Mead,
Honneth identifica o quanto os sujeitos humanos devem sua identidade à
experiência de um reconhecimento intersubjetivo sob os pressupostos conceituais
naturalistas – o que hoje é discutido em psicologia social. Assim, defende o
processo psicológico de formação da identidade.
Ter reclamações “tratadas”, partindo do diálogo com Honneth, tange ao
conteúdo concreto das relações de amor, direitos e solidariedade com o objetivo de
identificar sua legitimidade como esferas de conhecimentos. O sujeito se sentirá
desrespeitado, de acordo com o autor, quando não vê um reconhecimento recíproco
entre os sujeitos, como parceiros de igual status, o que é essencial numa relação
comunicativa.
Corrobora-se, então, com o que trata Ballone (2005), apontar a escuta,
sobretudo, como uma atitude que deve ser estimulada, pois a partir dela se acolhe
se compreende, se considera e se respeita as opiniões, queixas e necessidades dos
pacientes. Desse modo, humanizar o atendimento em saúde é fortalecer o desejável
comportamento ético e o arsenal técnico-científico, com os cuidados dirigidos às
necessidades existenciais dos pacientes, investindo nas condições de trabalho dos
profissionais da área.
A aparência do setor, em relação à climatização, decoração, mobiliário e
espaço físico, em sua grande maioria (76,6 %) consideraram como regular ou boa,
enquanto que 6,7 % como ótima. Em 16,7 % das responsáveis, classificaram como
ruim a aparência do setor de pediatria do Hospital. Assim, 43,3 % dos usuários
consideram a aparência do setor ótima ou boa.
Silva e Silva (2005) acrescentam que consta como uma das fases na
formulação das políticas públicas, a proposta de alternativas para a sua execução.
Assim, a atenção para a aparência do local pode ser interpretada como uma
alternativa para que o usuário se sinta acolhido no hospital.
De acordo com Giordani (2008), humanizar a Saúde deve passar, inclusive,
pela estrutura física dos hospitais e locais de atendimento ao usuário, enfatizando a
cidadania e a vida humana e aprimorando a qualidade e eficácia da atenção
dispensada aos usuários dos hospitais públicos no Brasil. Contudo, os resultados
desta pesquisa mostram opiniões divididas dentre os usuários. Se não classificaram,
106

em sua maioria, a aparência do local como ótima ou boa, cabe perguntar qual o
critério que usam para avaliar este parâmetro ou se o local realmente está atentando
para a importância da estrutura e do ambiente de atendimento para a humanização
em saúde.
O Hospital Barão de Lucena (HBL) é parte integrante da rede estadual de
saúde de Pernambuco, com 100 % dos seus leitos dedicados ao SUS e convive com
graves problemas sociais, econômicos e financeiros. Se a proposta é humanizar,
para Rios (2009), ela tem que estar relacionada com os movimentos que visam
recuperar valores atualmente esquecidos. No contexto desta pesquisa, é pertinente
conferir a uma unidade pediátrica, características na aparência que permitam à
criança o máximo de bem-estar, ofertando-lhe dignidade humana que vem sendo
desconsiderada, destruída nos tempos pós-modernos. Atentar para a aparência do
local busca, em sua essência, reconhecer em cada indivíduo aquilo que lhe
pertence: sua dignidade, já defendida pelos direitos humanos.
Novamente, retoma-se a importância da instância subjetiva dos sujeitos. O
senso comum poderia apontar que um hospital é lugar onde se vai tratar de doença
e que não existe aparência que o descaracterize. Mas não se trata de caracterizar,
mas de proporcionar ao usuário um local com aparência acolhedora, ainda mais se
tratando de uma unidade pediátrica. Questiona-se, portanto, se a aparência não
pode ser melhorada ou se questões subjetivas – como o fato de estar ali com uma
criança em necessidade de tratamento – atravessam o sujeito e sua percepção do
local.
Estas respostas são compreensíveis uma vez que o hospital possui estrutura
antiga, carente de reformas. Atualmente grande parte dele está passando por
reformas em sua estrutura física, inclusive a enfermaria em estudo. Esperam-se,
com isso, melhorias nas instalações do hospital, possibilitando um aspecto mais
agradável e acolhedor.

6.1.2 Acesso e presteza no atendimento aos usuários

Quanto ao acesso e presteza no atendimento aos usuários, o roteiro de


entrevista, como instrumento de pesquisa, sobre este segundo eixo, abordou
107

questões sobre ao tempo de espera, modo como foi feita a internação e acesso de
acompanhantes. Os resultados são resumidos no Gráfico 2.

Gráfico 2 – Acesso e presteza no atendimento aos usuários

Quanto aos itens, 66,7 % (2/3) dos usuários classificaram como bom ou
ótimo o tempo de espera para o atendimento. O modo como foi feita a internação da
criança também foi classificado como bom por metade dos entrevistados e como
ótimo por 30 % deles, o que corresponde a 80 % das opiniões como bom ou ótimo.
Apenas 10 % dos usuários classificaram como ruim o modo como foi feita a
internação. Pode-se dizer que um número significativo da composição da amostra
estava satisfeito com o tempo de espera para o atendimento, bem como com a
maneira que a internação foi feita.
Pode-se, então, inferir que a política de humanização a estes critérios, deve
ser avaliada positivamente nesta instituição. É importante salientar que a unidade de
pediatria do HBL, lócus deste estudo, atende mensalmente uma média de 5.264
crianças, com idade de zero a 12 anos. Ainda assim, apesar da grande demanda,
agrada ao usuário quanto ao tempo de espera e forma de atendimento.
Trata-se, então, de um importante achado de pesquisa dentro do Sistema
Único de Saúde (SUS), ou seja, da efetividade da política de humanização. Não que
108

encontrar estes dados seja uma surpresa, pois é esperado que a proposta seja
evidenciada pelos sujeitos, mas é exatamente este o ponto importante: os usuários
percebem e recebem a teoria da humanização na prática mediante suas respostas.
Ao expressarem satisfação, com o tempo de espera e forma de internação, infere-se
que os indivíduos sentem-se, de acordo com o que Honneth debate, em certos
níveis, reconhecidos, respeitados e estimados, favorece sua integração de maneira
plena na vida social da comunidade.
Santos-Filho (2009) também trata sobre esta responsabilização e o vínculo
efetivo dos profissionais para com o usuário; o seu acolhimento em tempo
compatível com a gravidade de seu quadro, reduzindo filas e tempo de espera para
atendimento.
Em relação ao acesso de acompanhantes à criança, 66,6 % considerou
como bom ou ótimo o acesso, enquanto que 33,4 % classificaram como ruim ou
regular. Mais uma vez, é significativa a amostra que expressou satisfação com este
quesito. Vale ressaltar que a enfermaria, local de aplicação dos formulários de
entrevista desta pesquisa, conta com 56 leitos, sendo 8 para recém-nascidos
externos, 10 para diarréia e 38 para pediatria geral. Conta com UTI “aberta”, ou seja,
é a única do SUS que oferece alojamento para as mães, em frente a mesma,
possibilitando o acompanhamento dos seus filhos 24 horas por dia. O
acompanhamento das crianças tem início na maternidade que possui alojamento
conjunto para os bebês a termo, e o alojamento canguru para bebês prematuros.
Apesar da resposta em escala não oferecer a possibilidade da exposição do
por que pelos usuários, pode-se concluir que ações como acima ressaltadas,
tenham favorecido a satisfação dos mesmos. O cuidado com os vínculos, o
manifesto em possibilitar este contato com o outro significativo na vida é uma
expressão de humanização em saúde.
Silva (2008) postula sobre a importância do outro e discute sobre o estar em
sociedade, partindo dos contatos estabelecidos nos espaços que transitam,
focalizando a respeito do campo das relações pessoais, sejam elas amorosas ou
familiares, como de suma importância para a constituição do sujeito. Para a autora,
apoio, amor, presença física e estímulos são para que a pessoa suporte o
acometimento da doença e as situações advindas a partir desta. É considerável sua
afirmação sobre as categorizações sociais suportando emoções. Retoma-se, assim,
109

na discussão destes resultados, a importância da alteridade para a constituição da


identidade, ou seja, para tomadas de posição em relação ao outro.
Não se pode pensar numa teoria social que não seja pela noção de
intersubjetividade. Tomando por base colocações de Honneth, quando valoriza o
bem estar do sujeito a este nível, pensa-se, também, em evitar o sentimento de
desrespeito social, suscitando-lhe raiva e indignação. Valoriza-se o sentimento do
sujeito ao ponto de atuar para evitar sentimentos negativos onde não se viola a
“norma moral” da importância da convivência familiar. A resposta mediante a
pergunta seria, então, fruto do sentimento ao qual o sujeito foi submetido.
Ainda sobre a importância de favorecer os relacionamentos, relembre-se que
para Honneth, três seriam os níveis dos sentimentos morais formados pelos sujeitos.
Cada esfera corresponde a um tipo de sentimento intersubjetivo: o amor, o
reconhecimento jurídico e a solidariedade. Focando no primeiro, concorda-se com o
autor que acredita ser este um dispositivo de proteção intersubjetiva – sentir-se
amado, inclusive, dentro da instituição - que assegura condições da liberdade
interna e externa, das quais depende o processo de uma articulação e de uma
realização espontânea de metas individuais de vida. Para Honneth (2009), o
movimento socializador do reconhecimento, toma feição diferente sem os limites
particulares inicialmente traçados pelos vínculos emocionais da família.
É sabido que, em relação ao amor, este é a primeira forma de
reconhecimento e, por sua própria natureza, não leva à formação de conflitos
sociais. Com base nos dados desta pesquisa, esta é uma das formas de fazer
humanização.
O acesso do acompanhante à criança no HBL sinaliza a concretização das
políticas por meio de ações concretas de sujeitos sociais e de atividades
institucionais, tornando-as realidade em cada contexto em que são implementadas e
condicionando seus resultados. Tal avaliação contribui com a discussão que tece
Lucchese (2010), políticas públicas são exatamente isto: um conjunto de
disposições, medidas e procedimentos que refletem a posição política do Estado,
objetivando regular as atividades governamentais relacionadas às atividades de
interesse público.
110

6.1.3 Qualidade da informação fornecida aos usuários

Sobre a qualidade da informação fornecida aos usuários pelos profissionais


de saúde, utilizaram-se questões que abordaram o nível de compreensão, a clareza
das informações e o modo com que os profissionais se apresentam.

Gráfico 3 – Qualidade das informações fornecidas aos usuários

Na pesquisa, 70 % classificaram como bom ou ótimo o nível de


compreensão das informações repassadas pelos profissionais sobre o cuidado da
criança. Apenas 6,7 % dos usuários classificaram como ruim. Em relação à clareza
das informações fornecidas, apenas 23,3 % consideraram como ruim ou regular,
enquanto que 76,7 % categorizaram como bom ou ótimo.
Retorna-se às questões já colocadas a respeito da relação entre usuários e
profissionais, fortalecendo a ideia de que a compreensão está relacionada à clareza
utilizada na transmissão da informação. Os números encontrados, certamente
apontam para um nível de reciprocidade na relação de reconhecimento do outro, o
contrário da reificação que, na teoria honnethiana, seria representar o ser humano
como objeto físico privado de qualidades pessoais ou de individualidade. Ao
111

considerar o indivíduo e suas vicissitudes no transmitir das informações, até a forma


de repassá-las é repensada. Sugere-se, então, que o conceito de humanização, já
amplamente discutido neste trabalho, pode estar se tornando implícito nas práticas
de comunicação dentro da instituição em tela que simbolizam, dentro da perspectiva
honnethiana, o desejo de reconhecimento.
O outro índice no Gráfico 3 também está ligado à clareza: O modo como os
profissionais se apresentam para facilitação do reconhecimento deles teve também
um ótimo nível de aceitação: 30 % consideraram ótima e 43,4 % como boa a
apresentação dos profissionais. Citam-se as palavras de Rua (1992): “É importante
utilizar a informação na construção de aprendizado de sujeitos e coletivos.”
Antes de prosseguir, é interessante fazer objeção ao conceito de cidadania,
que está justamente ligado aos valores éticos, tais como a liberdade, dignidade e
igualdade humana, não indiferente às condições dignas de sobrevivência,
concedendo os direitos nos diversos aspectos, ou seja, físico, social, psíquico,
emocional e espiritual. Quando há comunicação, nas instituições de saúde, como
em qualquer lugar, se é cidadão e contribui-se para a formação de outros cidadãos.
Valorizar o usuário de tais serviços de saúde, como sujeito de direitos, significa a
valorização do conceito de cidadania. Conduzir o mesmo a compreender que formar
cidadãos não se dá em nível de caridade, mas na necessidade de reconhecimento e
que naquele local acontece o que se denomina humanização. Há a construção,
neste ponto, da frase: “Entendo o que você diz e entendo que isto envolve seu
cuidado por mim.”
Mas, ao mesmo tempo, pretende-se lançar uma questão dentre os dados
desta pesquisa: se o usuário não se sente plenamente acolhido em suas
reclamações, porque os achados em campo apontam o contrário quanto às
informações fornecidas? Não caberia, no espaço de uma dissertação de mestrado,
uma discussão sobre as relações de poder ou sobre o profissional como sujeito de
suposto saber. Basta apontar tal ambivalência e a descoberta de que,
possivelmente, a fluência de comunicação ou o reconhecimento, não se configura.
Ao menos, é o que sugerem os dados, como “uma via de mão dupla”. Basta circular,
enfim, que acontece e que, especialmente, os sujeitos percebem que, por exemplo,
suas reclamações “não são tratadas como gostaria”. Ou seja, existe uma sensação
que merece ser reconhecida. Este reconhecimento do sujeito enquanto autônomo,
que detém opiniões, é significativo para o que se propõe. Só o fato do incômodo da
112

“não escuta” já sinaliza transformações em nível social. Pode-se perceber a


humanização como ponto relevante no processo de construção da saúde, levando
em consideração sujeitos que podem transformar realidades e a si mesmos.
Para unir o assunto tecido nos três gráficos apresentados acima, retoma-se
Betts (2009) e se sugere a necessidade de conhecer o homem em suas
necessidades básicas, em sua natureza e em sua essência. Os seres humanos são
dotados de instinto de conservação (necessidade de prover sua subsistência
pessoal e dos seus familiares, compatíveis com um padrão de vida razoável),
sentimento de dignidade (consciência de direitos fundamentais como liberdade de
expressão, religiosa, direito à vida, educação, livre escolha) e necessidade de
receber estima e consideração (reconhecimento por seus méritos e atenção, em
qualquer circunstância). Tudo o que foi tratado até aqui, iniciando com a comida, que
seria uma necessidade básica, até o desejo de ser ouvido e de receber informações,
apontam sobre a importância da humanização, o quanto humanizar é sinal de
respeito à pessoa.

6.1.4 Qualidade da relação entre usuários e profissionais

Nesta questão é avaliada a qualidade da relação entre usuários e


profissionais. Observa-se que os números são bem favoráveis, dado que 50 % dos
usuários classificaram como ótimo o interesse dos profissionais pela criança e
36,7 % como boa. Ou seja, 86,7 % aprovaram a relação entre os pacientes e os
profissionais de saúde.
Quanto às informações fornecidas à mãe sobre o estado de saúde da
criança, 40 % dos usuários classificaram como ruim ou regular, enquanto que 60 %
opinaram como boa ou ótima. O grau de confiabilidade dos serviços prestados pelos
profissionais também mostrou resultados satisfatórios. Apenas 6,7 % dos
entrevistados classificaram como ruim, enquanto que 73,3 % avaliaram como boa ou
ótima a confiança no atendimento.
113

Gráfico 4 – Qualidade da relação entre usuários e profissionais

Estes resultados apontam para a humanização que ocorre na prática: não


apenas nas páginas das políticas, mas efetivamente, real, quando as mães e
cuidadoras percebem o profissional implicado no cuidado à criança, quando se
sentem esclarecidas quanto à patologia e confiam no profissional que cuida de seu
familiar. Vê-se, além disso, o aceitar deste profissional como alguém merecedor de
confiança. Isto é um aspecto positivo, já que indica um vínculo criado. Não se
abordará o mérito das relações de poder, apesar do reconhecimento que está
imbuído neste processo. Opta-se por valorizar, neste espaço de discussão, esta
relação profissional de saúde-usuário, através do olhar humanizado.
Há uma dimensão relacional nos contatos humanos de um modo geral, em
diferentes níveis, e ela acontece no espaço do hospital. Tais dados confirmam o
homem como ser gregário, que necessita viver em grupo, na coletividade. Tanto o
profissional como o usuário buscam um nível de interação, de relacionamento e no
cotidiano da internação hospitalar há o estabelecimento de relações e o
desempenhar de variados papéis.
Usuário e profissional podem até ter diferenciações (social, sexo, idade,
religião, estado civil, valores, ideias, crenças, renda variada, entre outras), mas na
114

instituição convivem lado a lado, o que pode gerar conflitos e também confiança
mútua, apesar das diferenças. Aponta-se o convergente no público pesquisado:
ambos estão interessados no cuidado, no bem estar da criança.
Na contramão, a negação de sentimentos e emoções por parte dos
profissionais de saúde para com o paciente, deve contribuir para o desenvolvimento
de uma atividade marcada pela indiferença da compreensão humana, tornando
duplamente doloroso o processo de adoecer. Não é isto que se pretende com a
humanização na saúde, mas, justamente, o contrário: que seja amenizado o adoecer
através do reconhecimento de todos os atores como pessoas humanas. A
comunicação é muito importante para o humano, à medida que expressa o desejo
do reconhecimento.
Segundo Rua (1998), para que a vida em sociedade seja possível, é preciso
que o conflito seja mantido em níveis administráveis. As políticas públicas, então,
condensam as relações de poder, pois consistiria no conjunto de procedimentos
formais e informais que expressam essas relações e que se destinam à resolução
pacífica dos conflitos quanto aos bens públicos.
Para Sabbatini (2004), a formação acadêmica dos profissionais de saúde,
voltada para objetividade e não envolvimento com o paciente favorece uma relação
impessoal, autoritária e desigual.
Para Honneth (2009), a comunicação e os acordos comunicativos fazem
parte do desenvolvimento das identidades, que só pode acontecer por meio da
intersubjetividade, do reconhecimento do outro. Ele valoriza as expectativas do
sujeito – nesse caso, do usuário do serviço de saúde – que advém da interação e da
comunicação com o profissional, o que coloca no trabalho, nestes casos, o aspecto
mecanicista (de fazer uma atividade repetida ou diária de forma a vê-la como
comum) o caráter de relação. Assim, numa instituição de saúde “humanizada”,
aqueles que trabalham se relacionam, interagem, reconhecem, se comunicam com
base não só apenas no que têm a dizer, mas naquilo que o outro precisa ouvir. Estar
num ambiente hospitalar “frio”, onde os profissionais não atendem às necessidades
do paciente, torna-se fonte de conflito para o indivíduo sob tensão. Aqui se dá
ênfase à importância da visão holística dos pacientes, com enfoque à humanidade.
Vale trazer à baila que, para Minayo (1991), a doença expressa uma
angústia que atinge o corpo social. É preciso estar atento ao paciente, sua vontade
ou as angústias dos familiares. O paciente tem direito a decidir conjuntamente com o
115

médico sobre o tratamento indicado, precisa ser ouvido e ter escuta. Na falta disto,
ele experimenta o sentimento de desrespeito, já debatido anteriormente. Para
Mezzomo (2001), atender às necessidades do enfermo requer uma equipe
multidisciplinar, na qual a soma dos conhecimentos setorizados é integrada como
um único saber que visa o bem-estar do paciente como um todo.
Há o desejo de “reclamar”, de falar o que acham a respeito, de questionar.
Contudo, se a satisfação expressada nestes últimos tópicos significa comunicação
recíproca ou unilateral, a pergunta por ser respondida em escala não permitiu que tal
aspecto fosse captado. Tratar-se-ia, talvez, do que se chama reconhecimento.
Estes achados de pesquisa indicam que, se quer o profissional de saúde
humanizar os hospitais, tem que partir dos múltiplos significados da palavra em
questão, que pode englobar compaixão pelos semelhantes, afabilidade,
magnanimidade. Fazer-se benigno, fazer algo de forma mais humana, menos cruel
para os homens. Constata-se, portanto, que isto pode predominar nas relações
terapêuticas na pediatria do HBL.
Faz-se alusão à perspectiva honnethiana de individuação e reconhecimento
recíproco, que vai buscar em Hegel o fenômeno do amor, já mencionado
anteriormente. Sobre esse sentimento, assinala que para sua efetivação os sujeitos
se confirmam mutuamente na natureza concreta de suas carências, que só são
preenchidas e alimentadas quando satisfeitos ou correspondidos – reciprocidade.
Vale ressaltar que o profissional também precisa se relacionar e ser olhado através
desta perspectiva.

6.1.5 sugestões dos usuários para melhoria dos serviços

Estas respostas foram concedidas mediante pergunta aberta. Ao analisar os


relatos das usuárias, alguns pontos principais das melhorias podem ser destacados.
São eles: alimentação, estrutura e qualificação dos profissionais de saúde. Em cinco
casos (16,7 %), as usuárias não sugeriram melhorias.
No ponto da alimentação, dez usuárias (1/3) citaram melhorias na
alimentação, em que se observa que dois problemas são relatados: quanto à
116

qualidade da alimentação, e ao fato das mães terem que deixar seus filhos na
enfermaria para ir se alimentar. Como relata uma das mães:

“Precisa melhorar a alimentação das crianças e das mães. Ter


alguém pra tomar conta das crianças menores para a mãe poder
descer pra comer, tem mãe que não se alimenta porque não pode
descer, chega a dar dó.”

Aqui, é retomada a importância da comida e do vínculo afetivo, aspectos já


mencionados anteriormente. Tais repostas confirmam o que antes já discutido: como
tais dimensões são significativas no que tange à humanização.
Em relação à estrutura, 13 usuárias (43,3 %) sugeriram melhoria na
estrutura física do hospital quanto ao ambiente propício para as crianças (pinturas,
desenhos, brinquedos), melhoria na limpeza e segurança, divisão do ambiente por
doença e faixa de idade, como também no sistema de ventilação. A seguir, relatos
que representam as melhorias de estrutura:

“Um espaço físico melhor, ou um lugar onde, assim, as crianças não


fiquem muito perto das outras, crianças com diarréia, com outros
casos de doenças juntas.”

“O que eu acho que deve melhorar é sobre a ventilação, né? Que


aqui é muito quente, a gente sofre muito aqui com as crianças. Esse
meu neto mesmo, tem vez que eu tenho que tá abanando ele com
jornal porque não tem ventilador, né?”

Com estas duas falas também é possível reler aspectos apresentados em


outros tópicos. Como o vínculo afetivo – amor – está associado com o cuidado. A
discussão amplia-se para cuidadores e profissionais de saúde. Para o ato de cuidar
em si, que na primeira fala parece intimamente ligado ao afeto. Há o desejo de
cuidar, de proteger, implicado nesta fala, desde que se quer impedir que a pessoa
cuidada se contamine com outra doença. O outro, que sofre ao lado, é percebido; o
próximo, que cuidamos, é protegido; desta forma, todos se “protegem”, todos
exercem cuidado e são cuidados.
Outro ponto citado por cinco usuárias (16,7 %) é a qualificação dos
profissionais no trato com as crianças e melhoria da linguagem dos profissionais
médicos na orientação aos pais:
117

“Os médicos precisam chegar e dizer o que nossos filhos têm, e o


que precisamos fazer... Quando vêm, usam palavras que agente
nem entende.“

“Melhor qualificação... Tem algumas enfermeiras que não são


qualificadas e não sabem trabalhar bem com as crianças...”

Nestas falas, vê-se algo também já discutido: a relevância da comunicação,


da escuta e do espaço de fala. O bônus da pergunta aberta, que permite, ao menos
neste momento do trabalho de pesquisa, conectar a “escala” com a própria “fala”,
com as palavras das pessoas. Tal fala parece ir de encontro ao defendido
anteriormente, mas apenas reforça o que se propõe: que o profissional fale o que
precisa falar atentando para o que o usuário precisa ouvir e com uma linguagem de
seu entendimento. Isto porque há um relacionamento de confiança se construindo
entre profissionais e cuidadores, e a reciprocidade inclui a compreensão, a
valorização mútua. Percebe-se que, à medida que o usuário não se sente informado,
isto já interfere na sua confiança, ou seja, a mera presença do profissional de saúde
não é suficiente.
Assim, para Giordani (2008), desigualdades e injustiças já fazem parte do
tecido social atual e são aceitas naturalmente sem questionamentos. Os
profissionais de saúde contribuem com essa prática quando no desempenho de
suas atividades deixam de reconhecer o paciente como parte integrante de seu
mundo, esquecendo sua condição humana, suas limitações e seus direitos como
cidadão.
Isto é visível também na segunda fala, que permite aprofundar a discussão
para o quesito intersubjetividade, o que, para aquela cuidadora, significa “trabalhar
bem com as crianças”. Leve-se em consideração que o que vale pontuar – ou, ao
menos, o que cabe, dentro da resposta concedida – é o sentimento do usuário de
“não cuidado”.
Encerrando as discussões quanto à visão do usuário, cita-se Lucchese
(2010), que define as políticas públicas em saúde com destaque das outras políticas,
por buscar promover, proteger e recuperar a saúde dos indivíduos e da coletividade.
Desta forma, o usuário está, sim, implicado na execução da política de
humanização, por ser seu alvo principal. Esta pesquisa favorece a expressão dos
sujeitos – mais adiante dos profissionais – pode ter, inclusive, estimulado o
118

sentimento do “eu faço parte disto que eu avalio e questiono”, a autonomia do sujeito
social.
Marinho, Moreno e Cavalini (2001) apontaram que, durante muito tempo, o
cuidado não era papel do Estado. Foi em um cenário político de transição de um
regime militar para um democrático – em que se ouviu a “voz” das pessoas –
aconteceu a VIII Conferência Nacional de Saúde (CNS), com o objetivo de mudar as
precárias condições de saúde da população. Esse fórum reuniu representantes de
toda sociedade, e o usuário estava implicado em todo este processo.
Com o nascimento do Sistema Único de Saúde, o SUS, a saúde passa a ser
vista como um direito social universal custeado pelo Estado. Representa um novo
marco no campo das políticas públicas de saúde, mas à população compete o
controle social, princípio que norteia o SUS, ou seja, mais uma vez, a escuta é
trazida à tona.
Ao usuário, assim, não cabe apenas vislumbrar as carências do sistema,
como ausência de médicos, de espaço nos hospitais, de medicamentos, dentre
outros fatores relevantes. O usuário precisa ser visto como ator no processo de
humanização, ativo, não passivo, buscando a melhoria na instituição hospitalar,
sugerindo a ampliação da formação educacional dos profissionais de saúde, que
pode encontrar-se realmente defasada quando se fala em humanização do
atendimento.
Bettinelli e colaboradores (2006) destacam a importância dos profissionais
de saúde valorizarem aspectos qualitativos dos fenômenos presentes na vida
humana, compreendendo o significado dela para cada pessoa e como cada uma
desenvolve sua identidade e constrói sua própria história. Tal cuidado não pode
estar desvinculado e descontextualizado dessas circunstâncias, por ser efetivado a
partir da compreensão do ser humano total, nas suas diferenças e individualidades.
Assim, redescobrir a humanização e reconhecer as pessoas como próximo, fazendo
parte existencial do outro é fundamental nas situações de sofrimento.
Os achados desta pesquisa, até este ponto, demonstram a importância da
humanização e da reciprocidade, do abandono da reificação, quando, como política
pública, visa atender aos usuários de forma digna e também valorizar os
trabalhadores. Ambos precisam de respeito; todos fazem a humanização real. As
formas de desrespeito são nascedouro da luta por reconhecimento apontada por
Honneth.
119

Na teoria do reconhecimento de Honneth, injustiça e desrespeito decorrem


da noção de uma experiência moral, que é o ponto de partida para o
dimensionamento intersubjetivo de uma luta por reconhecimento. Sua teoria da
intersubjetividade recorre a uma noção de experiência cujo centro não é ação
comunicativa, mas de uma luta por reconhecimento que repousa em noções
intuitivas de justiça.
O conceito de reificação desenvolvido pelo autor (2008) tange a implicação
dos sujeitos e, neste estudo, pode ser colocado em paralelo com o conceito de
“práxis de implicação” para a dimensão da intersubjetividade. Ou seja: “Estou
envolvido nisto que participo”. Este conceito envolve cuidado e envolvimento não só
de uma parte, é preciso haver reciprocidade. A reificação seria o esquecimento do
reconhecimento: “O outro é importante”. A partir do momento que o usuário for visto
apenas como explicita o termo – aquele que faz uso do serviço, de certa forma,
desrespeito àquele que também constrói o serviço e participa dele. A fala e a escuta,
tão debatidas nesta primeira parte, são formas de reconhecimento e respeito ao
usuário.
É preciso contribuir para que as pessoas se interessem pelo que é
apresentado a elas, pois não podem esquecer-se do reconhecimento, fazem parte
do apropriado para a superação das crises sociais.

6.2 A visão dos profissionais de saúde

Na análise dos profissionais, foram entrevistados 30 da prática em saúde.


Dentre eles, enfermeiras, técnicos de enfermagem, médicos, nutricionista, psicóloga
e outros, além da parte administrativa. Esta amostra seguiu a proporcionalidade nas
categorias profissionais e de acordo com a disponibilidade dos mesmos no período
de coleta de dados, já mencionado. No questionário referente aos profissionais,
várias questões foram abordadas a respeito da gestão hospitalar e participação dos
profissionais, qualidade da comunicação, relacionamento interpessoal, condições de
trabalho, motivação e valorização e condições de apoio aos profissionais.
Os profissionais, de maneira geral, demonstraram interesse. Entretanto,
alegavam sempre falta de tempo, sendo necessário por várias vezes ir-se à
120

enfermaria e até mesmo deixar alguns formulários para resposta posterior, com o
objetivo de concluir a pesquisa. Nesse caso, também foi deixado o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (ver Apêndice A).
Antes de partir para a discussão dos dados também expostos em gráficos, é
preciso reforçar a importância de ouvir os profissionais. Estes, engajados realmente
na implantação de um plano de humanização, também levarão a termo sua meta
quando assumirem um compromisso ético-profissional. Assim, mesmo que não se
repita aqui tópicos já debatidos quanto aos usuários, eles serão relembrados, o que
visa conferir ao texto característica de coerência em meio olhar teórico que valoriza
a reciprocidade: Existem ligações entre usuário e profissionais, o que exclui a
necessidade de repetir certas reflexões, mas, requer aprofundá-las e circunscrevê-
las dentro deste público. Prossegue-se então, para os resultados e discussões no
que diz respeito aos profissionais em saúde.
A avaliação dos eixos para humanização do trabalho dos profissionais do
setor, de acordo com a análise dos indicadores, está demonstrado nas tabelas 6, 7,
8, 9, 10 e 11 (ver Apêndice D) e gráficos correspondentes, de maneira semelhante à
utilizada na avaliação dos usuários.

6.2.1 Gestão hospitalar e participação dos profissionais na organização

Quanto ao bloco de perguntas sobre a gestão hospitalar e participação dos


profissionais na organização, cujos resultados estão apresentados no Gráfico 5,
observa-se que 76,7 % dos profissionais classificaram como ruim ou regular sobre a
oportunidade de discutir a qualidade dos serviços prestados, 23,3 % consideraram
boa e não houve avaliação ótima desse item. No que se refere à participação na
discussão das dificuldades de execução de seu trabalho, constataram-se resultados
semelhantes, em que 40 % classificaram como ruim, 33,3 % como regular e 20 %
opinaram como boa ou ótima. Em relação à adoção de normas de atendimento no
setor, 73,3 % classificaram como ruim ou regular.
121

Gráfico 5 – Gestão hospitalar e participação dos profissionais na organização

Vê-se, então, certa uniformidade nas respostas, ou seja, não há referência à


reciprocidade entre profissional e instituição, falta de oportunidade de fala ou escuta
quanto ao serviço ou dificuldades na execução do trabalho, inclusive, no que diz
respeito à adoção de normas de atendimento. Admitem-se as dificuldades em
humanizar o atendimento em tal quadro.
Com base em reflexões do tópico anterior, o profissional não deseja apenas
trabalhar, mas também, como os usuários, ser ouvido e tratado como alguém no
mundo e, pelo que se vê, não é assim que a maioria dos profissionais se sente. Será
que este número implica dizer que não são participantes da gestão a este nível
porque não há espaço de fala ou porque não falam sobre suas inquietações? Ainda:
se falam, será que se sentem ouvidos? Será que aquele posicionamento é
reconhecido, avaliado como significante no processo de humanização?
Como a questão foi colocada em escala, não foi possível captar o porquê
das respostas. O que chama atenção é o sentimento de não reconhecimento,
implícito na predominância das respostas. Não é apenas comunicar, mas sentir que
a sua reclamação foi ouvida e valorizada ou desperta o interesse de alguém, que é
122

importante para alguém. Esta pesquisa, por exemplo, pode soar como o
reconhecimento de que “o que eu tenho pra falar é importante para alguém”.
Silva e Silva (2005) já afirmam que, os problemas podem ganhar visibilidade
por pressão social: como se sentem os profissionais de saúde em suas práticas?
Ressalta-se, novamente, a teoria honnethiana da “luta pelo reconhecimento” que,
neste contexto, pode interferir na construção da identidade daquilo que é
denominado profissional com práticas humanizadas. Os processos de mudança
social devem ser explicados com referência às pretensões normativas
estruturalmente inscritas na relação de reconhecimento recíproco. Se a instituição
não ouve o que diz o profissional, a relação de trabalho pode sofrer interferências
sérias, pois, para Honneth, o reconhecimento precisa vir de fora para dentro, onde a
subjetividade é reconhecida e respeitada exteriormente no âmbito profissional.
Ouvir o profissional em suas demandas é, prioritariamente, sinal de respeito.
Se estes não se sentem ouvidos, então, se sentem desrespeitados. O desrespeito
individual pode gerar conflitos coletivos – neste caso, dentro da instituição de saúde,
o que pode se evidenciar na insatisfação dos profissionais. A ausência de um
espaço de reciprocidade, do interesse pela intersubjetividade do profissional, se
insere no contexto de carência de reconhecimento e de desrespeito à alteridade, ou
seja, a reificação. Os profissionais desempenham papéis, mas são, antes de tudo,
pessoas, seres no mundo. O sujeito se sentirá desrespeitado quando não vir um
reconhecimento recíproco. Por isto, dentro de uma instituição de saúde, pode-se
pensar no contexto da pesquisa - o que é essencial numa relação comunicativa.
Mais uma vez, pondera-se a importância do sentir-se ouvido, da escuta das
demandas do outro.
Se a Política Nacional de Humanização prevê a modernização das relações
de trabalho dentro dos hospitais públicos, ocasionando uma relação humanizada - a
implantação de práticas de humanização tem a finalidade de prestar benefício tanto
aos usuários quanto aos profissionais, evidencia-se que os profissionais também
precisam ser reconhecidos. Tal política precisa permitir, na prática, também ao
profissional de saúde, melhores condições de trabalho.
Cabe refletir ainda sobre a atitude do profissional frente a este entrave. Não
foi objetivo da presente pesquisa, mas de acordo com Campos (1988), o processo
de humanização está pautado em atitudes e não tanto questão de limitações e
recursos. O que o profissional faz diante desta limitação é o que pode fazer a
123

diferença no contexto. Guardar para si as questões, falar sobre elas ou reivindicar


espaço para estas. Fica, então, esta reflexão.
O SUS requer dos profissionais de saúde qualificação, e prevê a valorização
dos trabalhadores e usuários. O profissional está implicado neste processo? Resta
questionar se não reconhecer é sinônimo de valorizar. Entende-se como o contrário.
Para que o SUS se concretize neste valor que a si mesmo impõe é preciso que se
repense atitudes e se discuta o que está escrito com bases em elementos como os
que esta pesquisa fornece.
Citam-se Santos-Filho (2006) e Fagundes e Moura (2009), que apontam
para a importância de avaliar e monitorar políticas públicas de saúde. Aprofunda-se
a necessidade de sua tomada de decisões, corrigindo os erros para atingir os
resultados voltados para o bem-estar social. Ainda cabe recorrer à reificação,
descrita em Axel Honneth, para explicar a passividade e a indiferença do ser
humano diante dos fatos e dos seus semelhantes – a dizer, se há tantas impressões
no sujeito, talvez estes não estejam sendo valorizados em suas demandas. Para
Honneth (2008), o esquecimento das relações humanas e o não reconhecimento de
si nas outras pessoas resultam no que o autor chama de reificação do ser, patologia
tão presente na sociedade. O profissional não é uma “coisa”, é uma pessoa.
O próprio profissional, ao expressar-se nos resultados desta pesquisa,
demonstra que não esqueceu as formas de reconhecimento elementar quando
adota repetidamente suas práticas laborais. Logicamente, há a preservação de
características qualitativas em si e, nas respostas dos usuários já discutidas, vê-se
que também não se abstraem características “qualitativas” do usuário, ou seja, do
ser humano.
Para Giordani (2008), é preciso que o profissional se reconheça desse
modo, pois se sentem muitas vezes desgastados física e emocionalmente, e nem
sempre admitem as próprias limitações. Acabam por fechar canais importantes de
comunicação com o paciente e colegas de equipe, como a visão e a escuta, fazendo
com que as outras instâncias alimentem-se de reificação com relação ao
profissional. Embora se cobre nesse campo de atuação uma assistência
humanizada, a supracitada autora relata que se veem nas instituições públicas e
privadas cenas de desrespeito à vida, o descaso frente à limitação e à dor alheia, o
autoritarismo de administradores e médicos, o abuso do poder, a banalização do
sofrimento e a indiferença aos direitos do paciente, entre outros. Isto acontece
124

quando o sujeito reifica a si mesmo; o profissional abandona sua humanidade e,


antes de desprezar outrem, tornou-se indiferente às próprias vivências, o que se
replica na atuação junto a outros. O termo humanizar diz tudo em seu antônimo: não
há benevolência, afabilidade e respeito nem consigo nem com os outros.

6.2.2 Qualidade da comunicação no setor

No bloco de questões referentes à qualidade da comunicação do setor,


observa-se que, em relação aos mecanismos de coleta de sugestões, 53,3 % dos
profissionais consideraram como ruim, 26,7 % consideraram regular e 20 % como
boa ou ótima a qualidade de comunicação. Segundo canais de comunicação, 36,7 %
dos profissionais avaliaram como ruim e 30 % como regular. Um percentual de
26,7 % dos profissionais classificou como boa e apenas 6,6 % como ótima a
qualidade dos canais de informação interna entre profissionais. No que se refere à
qualidade dos canais de informação oficiais da administração, 60,6 % consideram
como regular.
125

Gráfico 6 – Qualidade da comunicação no setor

Retorna-se à teoria honnethiana: como o profissional parece insatisfeito? Se


as políticas de humanização prevêem a satisfação das pessoas, cabe refletir a que
nível os profissionais estão satisfeitos. A comunicação (valorizada por teóricos que
foram discutidos por Honneth) é o quesito que focaliza o debate no reconhecimento,
ou seja, a valoração do profissional enquanto pessoa, se não há participação ou
aprovação na comunicação, há desrespeito. Vale questionar se o profissional se
sente implicado em meio à comunicação na instituição, se há reciprocidade em sua
relação com ela e com aqueles que a compõem. É possível que a descentralização
prevista pelo SUS talvez gere o “a quem me dirigir para questionar tal comunicação”,
por exemplo, e se existe a quem me dirigir, “o que este com o qual consigo me
comunicar pode fazer mediante tal quadro”. Estas são questões deixadas aqui, para
reflexão.
O interessante é pôr em paralelo, novamente, os dados dos usuários nesta
pesquisa. Estes percebem o profissional implicado sim. Quem sabe, os profissionais
precisem ouvir mais o que os usuários têm a dizer de suas práticas, pois, muitos
deles, estão satisfeitos, lhe ofertam reconhecimento, ainda que instâncias
superiores, talvez, não façam. Se o reconhecimento vem dos usuários, trata-se,
também, de algo a ser valorizado, percebido, pelos profissionais. Afinal, entre estes
126

dois – profissionais e usuários – há o estabelecimento de uma relação de


reciprocidade.
Para Honneth (2009), não é apenas o dever – neste caso, a exigência da
atividade profissional que implica o dever cuidar – mas é patente que os
profissionais em saúde lutem pelo reconhecimento recíproco de sua identidade, o
que geraria uma pressão intrassocial para o estabelecimento prático e político de
instituições garantidoras da liberdade, que conduzem os indivíduos ao
reconhecimento intersubjetivo de sua identidade inerente à vida social.
Contudo, esta pressão conduziria, pouco a pouco, a um estado de liberdade
comunicativamente vivida, que poderia se traduzir na luta por autoconservação, isto
é, os sujeitos individuais se conflitam numa ocorrência permanente de interesses.
Não é isto que se pretende, mas, segundo já referido, que paulatinamente as
pessoas se tornem indivíduos – processo de construção social de identidade
(pessoal e coletiva) em sua luta pelo reconhecimento enquanto cidadãos, sem abrir
mão da reciprocidade.

6.2.3 Relacionamento interpessoal no setor de trabalho

Analisando as questões referentes ao relacionamento interpessoal no setor


de trabalho, cujos resultados são expostos no Gráfico 7, observa-se que 36,7 % dos
profissionais classificaram como regular e 43,3 % como bom. Resultado semelhante
observa-se quanto à relação de confiança entre os profissionais, dos quais 43,4 %
consideram boa a relação e 33,3 % com regular, assim em 76,7 % esse item foi
classificado como regular ou bom. Em relação ao nível de cooperação, 56,6 %
consideram como bom ou ótimo e 26,7 % classificaram como regular.
127

Gráfico 7 – Relacionamento interpessoal no setor de trabalho

Aqui, vê-se confirmado o antes apontado: o fato de o homem ser gregário,


necessitando viver em grupo, na coletividade. Em seu cotidiano, estabelece
inúmeras relações, em diferentes níveis, mas o interessante é questionar se não é
neste espaço de relação onde o profissional encontra a reciprocidade. Enfim, esta
característica gregária humana pode significar um “escape” para o profissional de
saúde em uma instituição hospitalar.
A PNH reconhece a importância da transdisciplinariedade, o trabalho em
equipe, e a participação dos atores é valorizado, uma vez que os processos
decisórios dizem respeito a todos, numa corresponsabilização de gestores,
trabalhadores e usuários. Mas as relações interpessoais vão além disso, incluindo o
afeto, a reciprocidade. Não é apenas o fazer, é o ser.
Santos-Filho (2009) fala sobre estratégias de qualificação e valorização dos
trabalhadores, incluindo educação permanente, mas é preciso atentar para o
significado das relações estabelecidas no espaço de trabalho, onde a pessoa
permanece bom tempo do seu dia. Ali exerce um papel, mas também é pessoa e,
muitas vezes, o colega de trabalho é que favorece este reconhecimento de que “eu
sou uma pessoa antes de ser um profissional”. O que na relação com o usuário é um
reconhecimento do humanizar, nas relações profissionais trata-se de um
128

reconhecimento do ser humano e sua tendência gregária. A teoria honnethiana


novamente dá conta desta discussão, quando prevê que a interação é carregada de
expectativas, mesmo quando no trabalho, já que o indivíduo aprende a se conceber
como membro de uma sociedade organizada pela divisão do trabalho, fator decisivo
para o desenvolvimento pleno da sua identidade.
Aqui é válido apontar a humanização das e nas relações humanas entre os
profissionais de saúde, analisando o homem em sua natureza, essência e
necessidades básicas, como aponta Betts (2009). O trabalho permite ao homem
prover sua subsistência pessoal e dos seus familiares, mas também pode suprir a
necessidade de receber estima e consideração – é o reconhecimento por seus
méritos, a atenção, em qualquer circunstância – neste ponto, dos profissionais.
Existe o instinto social, a necessidade de interagir, viver em sociedade, buscar a
associação, a coletividade. Na reciprocidade, no reconhecimento do outro, existe o
respeito à sua pessoa.
Repensando a não reciprocidade institucional, talvez percebida pelo
funcionário, pensa-se na quebra da integridade das necessidades, gerando a
insatisfação do homem, tanto na esfera pessoal, como profissional. Os
relacionamentos interpessoais parecem remontar um pouco da satisfação expressa
nas respostas a este tópico. Pensa-se, assim, que problemas como a baixa
qualidade das relações interpessoais dificultam as condições de trabalho, afetando a
qualidade do mesmo.

6.2.4 condições de trabalho dos profissionais

Os resultados das opiniões sobre condições de trabalho está explicitado no


Gráfico 8. O conforto oferecido aos profissionais teve 63,3 % das opiniões
classificadas como ruim e, em 86,6 %, como ruim ou regular. A metade dos
profissionais entrevistados classificou como ruim a disponibilização de materiais para
o trabalho, enquanto que 26,7 % classificaram como regular, 16,7 % como boa e
apenas 6,7 % como ótima. Em relação ao ambiente reservado ao descanso, 79,3 %
dos profissionais classificaram como ruim ou regular a estrutura oferecida.
129

Gráfico 8 – Condições de trabalho dos profissionais

Agora, retorna-se à insatisfação do profissional. Na reciprocidade junto à


instituição, o profissional parece não se sentir respeitado como pessoa. São ruins as
condições, a disponibilização de matérias e os locais de descanso no trabalho.
Sendo o trabalho uma das instâncias que conferem ao homem o sentido de ser
humano, como lembrado a pouco no que Betts (2009) pondera. Qual o sentido
destas informações vindas do profissional de saúde?
Se, de acordo com Polignano (2001), a saúde nunca ocupou lugar central
dentro da política do estado brasileiro, onde estaria a saúde do trabalhador, no
contexto da presente pesquisa? Se os profissionais sofrem emocionalmente, talvez,
não chame tanta atenção quanto uma epidemia. E se existisse uma “epidemia” de
profissionais sofrendo por condições de trabalho nos hospitais?
Tais questões, mais uma vez, não são para resposta imediata, mas para
reflexão. O profissional deve despir-se do mecanicismo dentro do humanismo,
porém é preciso que este seja tratado como humano para que isto aconteça. Onde
está o respeito? O reconhecimento? Vê-se, com relação ao profissional, a reificação
do ser. Ao menos, é o que apontam os achados deste estudo.
Se for medida protetiva se aproximar das carências do usuário (BRASIL,
2001), o que dizer das carências dos profissionais? Ora, quando se fala de
humanização, também se fala deles a todo tempo, vez que, como os usuários,
130

participam a todo tempo do processo. Mas como ter práticas humanizadas se não
são, assim, tratados? Onde está a reciprocidade?
À medida que o sujeito entra em dificuldades, suas interpretações da
situação até então objetivamente comprovadas, ficam sem validade e separadas da
realidade, restante a título de meras representações subjetivas. Em suma, o
“psíquico” é a experiência que um sujeito faz consigo próprio, quando um problema
prático surge impedindo-o de um cumprimento habitual de sua atividade. Aí, sob a
pressão de um problema prático, é forçado a reelaborar criativamente suas
interpretações da situação (HONNETH, 2009).
Desta forma, esperar-se-ia que o profissional de saúde somatizasse ou
desenvolvesse patologias em decorrência das condições de trabalho para que se
avalie, desde já, que o mesmo, de certa forma, é impedido de exercer
humanização?
Chegando ao final das análises dos resultados, é importante discutir que o
humanismo, raiz da humanização, reconhece o valor e a dignidade do homem,
considerando sua natureza, seus limites, interesses e potenciais. Vale considerar,
mediante estes resultados, se está sendo visto desse modo o profissional de saúde.

6.2.5 Motivação e valorização profissional do trabalho

No que diz respeito à motivação para seu trabalho, os dados apresentados


no Gráfico 9 mostram que 36,7 % dos profissionais avaliaram como ruim, enquanto
que 1/3 opinaram como regular e 30 % como boa ou ótima. Em relação ao
reconhecimento da dedicação do profissional pela Instituição, 33,3 % classificaram
como ruim e 50 % como regular, o que significa que 83,3 % das opiniões variam
entre ruim e regular, em relação ao nível de reconhecimento. O grau de realização
pessoal dos profissionais entrevistados, em 46,7 % das opiniões classificou como
boa ou ótima, onde 23,3 % avaliaram como ruim.
131

Gráfico 9 – Motivação e valorização profissional do trabalho

O dito acima praticamente completa a discussão tecida no tópico anterior.


Se faltam condições, poderiam ser esperadas motivações, sim, pois parte-se do
conceito de sujeito autônomo. Considera-se, no entanto, que condições e escuta
institucional avaliadas negativamente, poderiam, sim, também, atravessar as
motivações dos sujeitos. A PNH prevê prestar benefício tanto aos usuários quanto
aos profissionais, capacitando estes últimos para uma nova definição de assistência
à saúde que enfatize a cidadania e a vida humana, aprimorando a qualidade e a
eficácia da atenção dispensada aos usuários dos hospitais públicos no Brasil
(BRASIL, 2002), mas se os profissionais não se sentem assim tratados, como serem
motivados a agirem de acordo com o preconizado?
Isto implica a reciprocidade que, de certa forma, é atravessada por
instâncias diversas. Contudo, novamente, aponta-se que a atitude do profissional
frente a “aspectos desmotivadores” é que vai conferir a ele uma ação humanizadora.
Ainda que as circunstâncias gritem as dificuldades, o profissional, enquanto ser
humano, precisa prender-se, de certa forma, ao nível de satisfação pessoal: “Estou
fazendo o que gosto de fazer”.
Humanizar prevê a satisfação do sujeito. Nestes resultados, as relações
interpessoais e a satisfação pessoal – instâncias intersubjetivas – são o que pode
132

estar conduzindo as práticas de humanização em contextos avaliados como caóticos


quanto às condições. É patente que haja o reconhecimento e estímulo do processo
de humanização entre os profissionais e as instituições, tornando-se imprescindível
que o hospital, de fato humanizado, tenha um tratamento diferenciado pelos
gestores públicos de saúde e órgãos governamentais, podendo ser prioridade ao se
firmar parcerias e convênios no futuro.
No pensamento honnethiano, é compreensível que exista o “falso
reconhecimento” que, talvez, para o senso comum, esteja ocorrendo quando se
publica alguma notícia sobre o salário de um médico (em relação ao número de
salários mínimos por hora trabalhada). O dinheiro pode, sim, ser motivador em uma
sociedade capitalista, mas a satisfação pessoal, colocada na balança, parece
motivar o sujeito a buscar o real reconhecimento: “Quero ganhar um salário fazendo
o que gosto”.
Para o autor, ser reconhecido como “bom médico”, por exemplo, pode
preencher essencialmente a função de motivar as pessoas a consentir com posições
de subordinação. Contudo, é difícil determinar o limite exato entre formas “falsas” ou
“corretas” de reconhecimento. Honneth diz que todas as formas de reconhecimento
que são adequadas e promovem a emancipação são aquelas que, com base em
princípios já aceitos de reconhecimento, possibilitam ampliar social e
substancialmente sua aplicação.
Trata-se, neste caso, de emancipação. Onde há expansão nas relações de
reconhecimento que promovem a emancipação, já existia, nos sujeitos, a
capacidade para tanto. Cabe, então, aos sujeitos – sejam usuários, sejam
profissionais – posicionarem-se como potencialmente capazes de serem humanos,
fazendo com que as políticas de humanização se tornem cada vez mais reais para
todos os atores envolvidos.

6.2.6 Condições de apoio aos profissionais

No bloco de questões relativas às condições de apoio aos profissionais,


cujos resultados são ilustrados no Gráfico 10, em nenhum dos itens houve opiniões
com avaliação ótima. Em 63,3 % dos profissionais consideraram como ruim a
133

frequência com que o setor oferece cursos e treinamentos, e 26,7 % como regular, o
que significa que 90% dos profissionais classificaram como ruim ou regular esse
item de avaliação. Em relação à qualidade das refeições fornecidas, 34,5 %
classificaram como ruim, 44,8 % regular e 20,7 %, boa. Não houve citações de
níveis ótimos na qualidade da alimentação fornecida. No que se refere à oferta de
atendimento às necessidades psicossociais dos profissionais, 86,6 % avaliaram
como ruim ou regular e, em 13,4 %, como boa.

Gráfico 10 – Condições de apoio aos profissionais

Observando que a capacitação dos profissionais é um dos ancoradouros das


políticas de humanização, por que o funcionário a percebe tão deficitária? O
oferecimento de cursos e sua frequência não são avaliados positivamente nesta
pesquisa. O porquê não está presente nas respostas por escala, mas, novamente,
valorizando a percepção do sujeito, pensa-se nos motivos destas respostas. O
profissional não passa mesmo com frequência nos cursos? Isto é decorrente da
sensação de “incapacidade” mediante aos tópicos já discutidos, como comunicação
e condições de trabalho? Se for falar em relações de poder, como no tópico do
usuário, pensaria neste sujeito supondo saber que, na realidade, estaria
134

necessitando “saber mais”? Sente que é pouco o que tem recebido diante da
especificidade da demanda da saúde pública brasileira?
De acordo com Giordani (2008), humanizar a Saúde passa, também, pelos
métodos administrativos adotados nas diversas instituições de saúde no País, pela
imagem do serviço público, pela carência de medicamentos, pelos baixos salários,
pela jornada dupla ou tripla que provoca o cansaço, pelo ambiente tóxico que existe
em muitos hospitais, pelo contato constante com pessoas em estado de tensão,
causando o desgaste emocional. Assim, além de cursos, outras instâncias
atravessam os profissionais, como já anteriormente avaliadas. Se ainda os cursos
ocorressem, a ocorrência da humanização, na prática, seria questionável em alguns
aspectos.
O que se pode perceber é que são muitos os atores envolvidos, desde a
formulação até a implementação de uma política pública. Observa-se, portanto, que
uma política pública, desde seu nascimento, envolve divisão de trabalho (tempo), o
uso de controles (poder) e a interação entre sujeitos, lida com interesses diversos,
adaptações, riscos e incertezas sobre processos e resultados. Tornam-se, em certo
nível, contraditórias as políticas: postulam algo que não fazem.
A falta de valorização e o desrespeito começariam em nível do não
cumprimento de propostas básicas, como a capacitação dos funcionários. Ironizando
com o mecanicismo, se por acaso os indivíduos fossem máquinas, precisaria ser
programado para funcionar de acordo. Como isso não existe, criam-se mecanismos
próprios do humano para humanizar a saúde. Ao menos, é isso que se conclui, se
os profissionais afirmam não serem capacitados e, na contramão, os usuários, em
sua maioria, se sentem acolhidos em suas demandas. É, na pratica diária, que pode
ser vista como provocadora de frieza e distanciamento, que se desenvolvem
relações e o afeto, indispensáveis para o processo de humanização. Não se quer,
aqui, avaliar se os cursos acontecem ou não, de fato, mas sim o sentimento do
profissional mediante a realidade expressa pelos usuários.
Avaliando a qualidade das refeições oferecida aos profissionais, encontra-se
um alto nível de insatisfação, com 79,3 % de respostas desfavoráveis. A
alimentação entendida como necessidade básica é também fonte geradora de
satisfação, e desse modo, deve ser regularmente avaliada. Aqui mais uma vez,
pergunta-se: falta escuta ou atendimento às queixas?
135

Assim, para Ballone (2005), a escuta, sobretudo, é uma atitude que deve ser
estimulada, pois a partir dela se acolhe, se compreende, se considera e se
respeitam as opiniões, as queixas e as necessidades.
Para Vilanova (2010), ouvir é um hábito pouco utilizado na sociedade
contemporânea e de grande importância na construção de uma sociedade mais
justa e solidária.
Ao pensar no último quesito sobre aspectos psicossociais, então, vê-se outro
nível de desrespeito. Como aplicar a humanização, ainda que se sinta não acolhido
em suas demandas psicossociais? É claro que é preciso refletir até que ponto esta
“falta de acolhimento” sentida pelo profissional não interfere nas práticas
humanizadas. Tem que ofertar acolhimento, mas não o tem. A instituição contribui
para a individuação, e o reconhecimento recíproco é fruto do amor. Amor pelo outro,
amor pelo que se faz.
Fecha-se este debate consciente de tantas coisas importantes aqui
apontadas, talvez não devidamente aprofundadas, mas corroborando com Honneth,
acredita-se que a expressão do desejo por melhores condições de trabalho, ainda
que num contexto de pesquisa como este, sinaliza a inquietação dos profissionais.
Indica que o desejo de uma melhora nas condições de trabalho nunca foi
abandonado pelos colaboradores. Esse interesse, embora seja negativamente
perceptível na forma de recusas de trabalho e de manifestações de insatisfação,
estende-se não apenas à garantia de um salário capaz de assegurar a subsistência,
mas a uma melhora qualitativa da situação de trabalho, ou seja, à criação de
atividades suficientemente complexas e que não causam danos psíquicos ou físicos.
Isto inclui vários aspectos do humanizar, como debatido em outros tópicos.

6.2.7 Sugestões dos profissionais para melhoria dos serviços

Neste tópico, traça-se primeiramente o perfil das respostas dos profissionais


entrevistados. Avaliando as sugestões dos profissionais quanto à melhoria nas
condições de trabalho, é possível destacar quatro pontos: atualização profissional,
melhoria do espaço físico e condição de trabalho, e as definições de normas por
136

setor e reuniões de avaliação e encaminhamentos. Em seis casos (20%), os


profissionais não opinaram por melhorias.
No que se refere à capacitação profissional, dos 24 profissionais
entrevistados que se pronunciaram por melhorias, 14 (58,3 %) sugeriram
capacitações periódicas para os profissionais em todos os níveis. A melhoria do
espaço físico foi citada por 11 profissionais, no que diz respeito tanto ao aumento do
espaço físico como a melhoria em equipamentos (aquisição e manutenção).
Neste ponto, relembra-se o sentido de cuidado e o de humanidade como
inseparáveis: a condição humana que aponta para melhores condições e
capacitações, e o cuidado em atentar para as condições do usuário e capacitações
para atendê-lo. Este pedido traduz-se com uma frase: “quero respeito ao que se
propõe nas políticas, respeito a mim e ao usuário”.
Assim, sempre é bom lembrar que a PNH tem como princípios norteadores o
estímulo à produção de saúde e de sujeitos; a modernização das relações de
trabalho, fortalecendo a transdiciplinaridade; a valorização da dimensão subjetiva e
social nas práticas de atenção e gestão; o funcionamento em rede de modo solidário
e de acordo com as diretrizes do SUS e a utilização da informação na construção de
aprendizado de sujeitos e coletivos.
Ponto citado por 20,8 % dos profissionais foi o da definição e padronização
de normas para cada setor, e em 16,7 % deles a questão de se ter uma rotina de
reuniões de avaliação e encaminhamentos das demandas de cada setor, o que pode
sinalizar aspectos também discutidos. Pouca capacitação pode implicar formas não
padronizadas do fazer humanizado e a importância das relações interpessoais para
o exercício da humanização. Quando se valoriza o saber do outro, exerce-se
respeito junto a ele.
Neste quesito, espera-se que a acreditação hospitalar, promovida pelo
Hospital Alemão Osvaldo Cruz, traga a padronização dos processos, capacitação
profissional, reformas estruturais e outros benefícios financeiros, como previsto no
convênio firmado com a Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco e este
órgão. Como mencionado anteriormente, o processo de acreditação será um divisor
de águas para o Hospital, pois ele traz recursos financeiros, tecnológicos e
qualificação profissional nas diversas áreas, fatores que associados aos humanos,
são imprescindíveis para um atendimento de qualidade e humanizado.
137

Outros pontos citados pelos profissionais foram as questões da melhoria da


comunicação entre profissionais (três citações), apoio psicossocial (três citações),
política salarial, progressão de carreira (uma citação) e valorização profissional (uma
citação). Quatro profissionais sugeriram a melhoria de todos os pontos levantados
no questionário aplicado. Isto tange, também, às necessidades do ser humano
debatidas aqui.
Os Grupos de Trabalho de Humanização Hospitalar apresentam como
objetivo a construção de espaço coletivo democrático de escuta, análise, elaboração
e decisões sobre os projetos de humanização, além de apoiar a ressonância à
diversidade de iniciativas humanizadoras dentro do Hospital em prol dos usuários e
profissionais de saúde. Neste sentido, o que se propõe na política de humanização
está acontecendo?
Para tanto, ressalta-se como Arretche (2006), a importância de definir
indicadores, quantitativos e/ou qualitativos, contextualizados nas diferentes
dimensões abrangidas pela PNH para evitar o distanciamento entre os princípios da
humanização e o recorte apenas de variáveis “mais fáceis” de serem mensuradas.
Avaliar o PNH é tarefa difícil, por sua complexidade. O simples fato de
atender aos critérios preconizados pelo Ministério da Saúde não é suficiente como
indicador e sim o seu significado, sua essência e o que ele modifica no modo de
fazer e de existir da Instituição (SANTOS-FILHO, 2007). O trabalho realizado aqui
permitiu ver as posições dos usuários e dos profissionais, o que sinaliza valorizar a
individualidade de cada sujeito e suas vicissitudes.
138

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo de caso, realizado na enfermaria pediátrica do Hospital Barão


de Lucena, para avaliar como ocorrem as práticas de atendimento humanizado ao
usuário-cidadão no cotidiano da Instituição, possibilitou considerações não só
apenas do Programa Nacional de Humanização, mas também de aspectos
organizacionais, das relações interpessoais e, também, pessoais. A opção de avaliar
o grau de adoção das práticas humanizadas na visão das mães (usuário) e dos
profissionais permitiu o cruzamento de informações destes sujeitos e teve o objetivo
de apreender ambas as perspectivas.
Sendo o Programa Nacional de Humanização uma política pública, tornou-se
relevante e pertinente sua avaliação, especialmente das práticas de atendimento no
mencionado Hospital, dentro das teorias abordadas pelo PNH, e a da efetividade do
programa, e o envolvimento real de todos os atores envolvidos no processo:
usuários, profissionais, familiares e gestores da instituição.
Como já mencionado anteriormente, a saúde pública brasileira tem
avançado nas últimas décadas com a ampliação dos princípios doutrinários que
norteiam o SUS. No entanto, percebe-se que o ponto fraco de uma política publica é
a dificuldade de sair do papel e portarias ministeriais para a realidade concreta.
Basta ler as manchetes de jornais, noticiando as longas filas de espera para
atendimento médico e a superlotação dos leitos. Vê-se até uma fotografia do cenário
atual da saúde, onde os precipícios do SUS, como equidade, integralidade,
descentralização e a participação popular, ainda carregam um pouco de idealismo.
O SUS constitucional, descrito em lei, está longe do SUS que hoje se vivencia.
Os resultados obtidos após análise dos dados coletados indicam que, na
visão da maioria dos usuários, as teorias postas no programa de humanização
correspondem à prática, enquanto que, para os profissionais em relevo, não há essa
correspondência. Isso se revela na observância do percentual de respostas
desfavoráveis às questões que tratam dos eixos para humanização do trabalho, o
que é bastante significativo.
Destaca-se ainda um desejo do profissional por mais investimentos em prol
de seu cuidado; condições de trabalho, motivação e educação continuada. No
entanto, esses resultados antagônicos podem refletir o nível de aspiração tanto dos
139

profissionais como dos usuários que, na sua maioria, são pessoas humildes, com
pouca escolaridade e de baixa renda. Em contrapartida, os profissionais de saúde,
são pessoas mais esclarecidas, conhecedoras de seus direitos e certamente com
um nível maior de exigência.
Aqui é questionado o entendimento dos usuários e seus direitos como
cidadãos: o direito à assistência médica; o direito a cuidados de enfermagem
personalizados, respeitosos e carinhosos; o direito a terapias adequadas; o direito
do doente de saber sobre a realidade da sua situação; o direito do paciente decidir
sobre o seu tratamento e, finalmente, o direito das pessoas a um ambiente humano
propício a viver e morrer com dignidade.
A historia da saúde no Brasil é marcada por uma assistência pautada na
caridade através das Santas Casas de Misericórdia. O direito do cidadão à saúde e
o dever do Estado ainda não estão sedimentado como cultura na sociedade.
Percebe-se que o simples fato do usuário conseguir atendimento, já lhe causa
satisfação e mesmo gratidão.
Ao que parece, atualmente os usuários sentem-se assistidos, mas nem
sempre ouvidos. Os profissionais trabalham, mas quase sempre insatisfeitos, como
debatido nas análises. Percebeu-se isto também não só pelas respostas às
perguntas, mas também pelo interesse demonstrado pelas cuidadoras em responder
as questões (muitas desejando prolongar o diálogo) e na dificuldade de realizar as
entrevistas com os profissionais (muita demanda no setor a ponto de ter marcado
sucessivas vezes com alguns a realização das mesmas e, por estarem imersos em
tarefas e em suprir escalas de trabalho, postergaram a realização).
O que dizer? Percebe-se que, na prática, os profissionais são muito sofridos,
com muito trabalho e pressão. É comum o déficit de profissionais nas escalas de
trabalho, sendo necessário muitas vezes dobrar plantões, pois a lei do servidor em
saúde não permite sua saída sem seu substituto. Esse, muitas vezes, não vem por
estar em outro hospital, também aguardando o colega. É uma corrida diária
preenchida com vários empregos, jornadas duplas, triplas e de finais de semana
para manter uma condição de vida compatível com a sua dignidade.
Quanto à pressão, esta faz parte da rotina dos profissionais que se veem
diariamente atendendo um número maior de pacientes que o padronizado pelas
entidades profissionais e Ministério da Saúde, sendo ainda comum a falta de leitos e
a superlotação. Como optar em atender corretamente seguindo padrões ou
140

simplesmente não atender? São escolhas certamente difíceis e que influenciam no


cotidiano do trabalhador. É preciso atentar em “como” o profissional vai agir sem
mecanicismo e com envolvimento, favorecendo uma relação pessoal, distante do
autoritarismo e da desigualdade quando ele se sente tratado desta forma. Ou seja,
meros executores de tarefas, sem oportunidade de participação nas decisões que
estão diretamente relacionadas ao seu trabalho.
A necessidade de participação, consideração e auto-estima são aqui
levantadas. São essas características e necessidades que diferenciam o ser
humano dos demais, e elas não podem ser menosprezadas. Mas como trabalhar
satisfeito se não existem incentivos para que o profissional se sinta motivado,
valorizado pelo seu trabalho e, com isso, adotar práticas diárias com mais
dedicação, diferentemente de outro profissional, sem de alguma forma ser
reconhecido? Sem um plano de cargos e carreiras dignos, como o governo do
Estado, pode incentivar seus servidores?
Percebe-se o reconhecimento e a motivação para o trabalho como um
sentimento pessoal e entre os seus pares. É preciso destacar e levar ao
conhecimento do profissional o reconhecimento de seu trabalho pelos usuários
como apontam os números na pesquisa.
Os profissionais de saúde cuidam, mas também necessitam de cuidado. E
para Boff (2007), cuidar é mais que um ato, é uma atitude que abrange mais que um
modelo de atenção, significa acolher e respeitar e, dentro das organizações, tais
atitudes são desempenhadas por pessoas, principalmente profissionais de saúde.
Utilizando a alimentação como exemplo, nessa discussão, não é apenas
oferecer o alimento, é partir da pergunta “para quem estamos oferecendo o
alimento?”. Quem vai receber a comida precisa não só ser ouvido, mas ser
considerado, pois é ele quem come. O que acha da comida, o que pode melhorar e
o que gostaria de comer são perguntas que poderiam ser feitas, especialmente, aos
usuários dentro de uma unidade pediátrica. Sabe-se que a situação de adoecimento
quase sempre é acompanhada de alterações negativas na rotina do paciente, mas é
sabido também que o papel do profissional é minimizar estes sofrimentos com as
ferramentas que lhe cabem para não contribuir com os efeitos deletérios provocados
pelo próprio internamento em si.
Não é intenção atribuir maior valor ao conhecimento humano em detrimento
do conhecimento científico. Ambos são necessários e dessa forma se completam,
141

para compreender e explicar a complexidade da vida. Entretanto, a adoção de


políticas como a humanização contribui para a construção de práticas solidárias,
humanizadas e comprometidas com a saúde.
É em prol dessa dignidade e do reconhecimento proposto em Axel Honneth
que se deve trabalhar para transformar sujeitos autônomos, responsáveis por si
mesmos e pelo mundo que se quer em sociedade. Desta forma, as políticas
públicas, de uma forma geral, tornar-se-ão mais efetivas e eficazes. Em
contrapartida, a reificação ou a perda de interesse pelo semelhante, precisa ser
combatida.
Nesse contexto, pode-se compreender o conceito de nexo teórico- prático e
entender humanização e acolhimento (SÃO PAULO, 2005). Ideias e ações foram
teorias um dia. Hoje fazem parte da prática diária. Para que as ações sejam
mudadas, é preciso mudar as práticas. Também é verdadeiro dizer que as práticas
mudam as ideias, e esse é o sentido de nexo teórico-prático. É sintonizar o conceito
com a prática para transformar as práticas de construção de políticas em saúde.
Sendo assim, propõe-se aos gestores públicos de saúde mais do que
ouvidorias, um espaço de troca entre hospital e usuários. Não consiste apenas em
fazer a queixa, mas ter a queixa tratada, valorizada, isto dentro da própria instituição.
Quanto aos profissionais, sugere-se que a insatisfação dos mesmos seja ouvida,
mas não apenas isto; que também sejam tratadas: que surjam as respostas, não só
nas condições de trabalho, mas na saúde emocional do trabalhador, que tem
exercido suas funções em estado de insatisfação.
Para tanto, pode-se estabelecer calendário de reuniões periódicas com os
profissionais de todas as áreas, para ouvir queixas, sugestões e avaliar resultados
alcançados pelo grupo. O direito à fala, à escuta e ao tratamento das queixas,
inserem os profissionais na gestão. É a tão desejada gestão participativa.
A cultura de escuta, ainda não sedimentada como a ouvidoria que entrou
recentemente em funcionamento, também é fator importante e corrobora com uma
das suposições desse trabalho chamada, inicialmente, de surdez institucional.
Apesar de participar do programa de humanização desde 2002, o HBL só implantou
sua ouvidoria no final de 2009, sete anos depois. A ouvidoria é um dos critérios
exigidos pelo Ministério da Saúde para a humanização.
Quanto ao usuário, incentivar o canal da ouvidoria para registro de queixas,
estabelecendo fluxo para tratamento das mesmas e prazos para as respostas com
142

retorno ao usuário/profissional. Pode-se também ampliar canais de comunicação,


através de caixas de sugestões para usuários e profissionais. Esse canal receberia
críticas e elogios.
Percebe-se que a cultura das instituições públicas de não avaliação de suas
práticas é um ponto negativo; se não há avaliação e as capacitações são percebidas
como falhas se vão perpetuando em fazer o básico e não buscar fazer melhor, ou
seja, uma atitude diferente. Aqui se enfatiza, novamente, a importância de avaliar
políticas públicas sistematicamente, vez que os resultados das avaliações são
utilizados como ferramenta de gestão para transformar a realidade em prol da
coletividade.
Observa-se que apesar de fazer parte do programa de humanização há oito
anos, o Hospital não passou por avaliações internas ou externas. Pergunta-se: o que
se tem feito, aonde se quer chegar e o que mudou nas práticas diárias do
atendimento hospitalar? Sem dados não se tem informações, e sem informações
não se tem ferramentas. Então como avançar ou transformar realidades? Aqui ficam
essas perguntas para reflexões, ao mesmo tempo em que se sugere a implantação
de mecanismos de avaliações periódicas do nível de satisfação dos usuários e
profissionais, criando uma cultura de divulgação de cada meta atingida para o
alcance do objetivo geral. É importante para o profissional ver medido o fruto do seu
trabalho.
Nesse sentido, o conceito de humanização em saúde vai além da satisfação
do cliente. Para tanto, o gestor deve priorizar o gerenciamento para o contínuo
aperfeiçoamento dos processos e não ter visão só para o resultado e sim para um
trabalho de equipe, participativo e com raciocínio estatísticos e práticas
humanizadas.
A instituição hospitalar deve estar sempre preocupada com a qualificação
técnico-científica dos seus profissionais, uso eficiente dos recursos financeiros,
administração voltada para os resultados e aprimoramento dos processos com
vistas à recuperação da saúde e satisfação dos seus pacientes e colaboradores. Os
recursos humanos devem ser estimulados ao trabalho de equipe multifuncional e
receber treinamento contínuo que assegure a qualidade do cuidado da prevenção de
doenças, da reabilitação dos pacientes e da promoção à vida.
143

Os achados da presente pesquisa são apresentados no Quadro abaixo,


achados estes que podem ser considerados como pontos positivos e pontos
negativos para o processo de humanização na enfermaria da pediatria.

Quadro - Pontos positivos e negativos para humanização do serviço

PONTOS POSITIVOS PONTOS NEGATIVOS

Ausência de um programa de educação


Funcionários dedicados
continuada

Os profissionais gostam do seu trabalho Falta de maior participação na gestão

Ausência de um programa de incentivos


Qualidade dos serviços profissionais
aos colaboradores
Humildade das pessoas que utilizam o Não existe cultura de avaliação de
serviço resultados

Vontade de cooperar dos usuários Baixo nível de instrução dos usuários

Credibilidade dos usuários nos


Mecanismos de comunicação deficiente
profissionais
Bom relacionamento interpessoal
Falta de padronização do serviço
(profissional-usuário)

Este estudo cumpriu, no entanto, com os objetivos a que se propôs:


descrição de cenários relativos às políticas públicas de saúde e a importância de
avaliá-las; revelou, ao menos sucintamente, como a teoria do reconhecimento
elaborada por Axel Honneth contribui para a humanização do cuidado, e descreveu
o contexto histórico e o cenário atual da assistência humanizada no Serviço de
Pediatria do Hospital Barão de Lucena.
Durante a pesquisa, buscou-se a neutralidade, contudo, há um respaldo
caso as análises não pareçam assim. A pesquisa abriga-se na colocação de
Figueiredo (1986) de que não existe análise neutra de políticas públicas, ou seja,
supõe-se que o analista traz, em si, um juízo de valor. Abrem-se, então, todas as
questões para discussões vindouras. Mas, muitas vezes, houve identificação até
mesmo nas falas dos colegas e foram questionadas ou comemoradas as colocações
dos usuários.
No que tange à Instituição, tratar do tema humanização permitiu olhar de
maneira mais crítica o ambiente de trabalho. A viabilidade deste estudo teórico-
144

prático no ambiente de trabalho trouxe, no entanto, confortos e desconfortos. Os


entrevistados estavam ali, colegas de trabalho, mas o papel da pesquisa era captar
suas impressões e isto vai além de um “bom dia”. Também ao lado das mães que
cuidavam dos seus filhos no momento das entrevistas, foi perceptível o quanto o dia
a dia de trabalho pode roubar do profissional momentos como estes: estar ali
presente e ouvir aquela demanda, naquele exato momento.
Assim, profissionais e usuários dos serviços receberam um “zoom” do seu
status de pessoa: se a temática da humanização já despertava interesse, conhecer
o que as pessoas tinham a dizer sobre as políticas ultrapassou a análise institucional
e tornou-se, também, uma análise pessoal. Houve identificação com muitas queixas
dos colegas, ouviram-se as expressões das mães e houve reflexão no meio disto
tudo. O Hospital Barão de Lucena deu passos significativos rumo à humanização,
mas ainda há um longo caminho a trilhar.
Questiona-se aqui como fazer humanização senão pelo simples fato de ser
humano, reconhece-se em Honnet (2008) que o sujeito pode “esquecer” a forma de
reconhecimento elementar quando adota repetidamente práticas unilaterais,
abstraindo características “qualitativas” do ser humano. Com a aproximação das
pessoas para a coleta de dados desta pesquisa, foi perceptível o quanto há um
distanciamento dos profissionais delas e das vivências e impressões que lhe
atravessam.
Acredita-se no processo de humanização na saúde e vibra-se para que ele
seja real em todos os âmbitos; assim, houve frustração, avaliação individual,
reflexão e, certamente, crescimento profissional e ser humano (se bem que não é
necessário fazer esta divisão). A humanidade foi uma categoria de achado empírico
desta pesquisa. Não se pensou que, com a realização desta, fosse feita uma revisão
tão profunda das condições humanas.
Ao final destas análises, o posicionamento enquanto profissional buscou
valorizar também a individualidade dos pesquisadores. Assim, também a
pesquisadora do presente trabalho sente-se respeitada nas suas vicissitudes; poder-
se-ia dizer que estando à procura de reconhecimento da sua individualidade se a
“restrição” de apresentar apenas dados da pesquisa, como se não fizesse parte do
que descreve, fosse um desrespeito.
145

Por fim, pode-se afirmar que de pequenas ações são realizadas as grandes
mudanças no fazer e no pensar, transformando realidades. Ficam aqui
contribuições, ao menos neste momento, para a discussão sobre humanização.
146

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152

APÊNDICE A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Eu, ___________________________________________________, sem qualquer


constrangimento ou imposição, autorizo a pesquisadora Arione Vieira do
Nascimento, mestranda do curso de Mestrado Profissional em Gestão Pública para
o Desenvolvimento do Nordeste, a utilizar, para fins exclusivamente científicos,
informações que eu conceder mediante a realização de entrevista de interesse para
a pesquisa intitulada Avaliação da Política de Humanização em Saúde no Hospital
Barão de Lucena: o reconhecimento do cuidado da criança realizada no Hospital
Barão de Lucena (HBL – PE), que tem por objetivo avaliar como ocorrem as práticas
de atendimento à criança, na enfermaria da pediatria do referido hospital, e se estas
práticas correspondem às descritas pelo Programa Nacional de Humanização do
Ministério da Saúde. Sei que terei minha identidade preservada, além da
possibilidade de interromper a aplicação da entrevista na hora que quiser e desistir
de participar da pesquisa sem existir, para mim, qualquer dano. Declaro que a
participação nesta pesquisa, sabendo ser aprovada pelo conselho de ética do
hospital, não traz riscos para minha integridade física, moral ou psicológica. De
benefícios desta amostragem, estou ciente que teremos o aperfeiçoamento dos
profissionais de saúde, bem como de diversas áreas, todos buscando a melhoria da
qualidade de vida dos pacientes e indicações para futuros trabalhos. Fica
esclarecido, também, que não terei perdas nem ganhos financeiros ao participar da
mesma.
Recife, ___ de _________ de 2010.

__________________________________________________
Assinatura do paciente ou profissional pesquisado
________________________________________________________
Assinatura do profissional ou pesquisador

TESTEMUNHAS:
1. ____________________________________________________
2. ____________________________________________________
153

APÊNDICE B – Formulários de pesquisa dirigidos aos usuários do serviço (1) e


aos profissionais do serviço (2)

FORMULÁRIO 1 (aos usuários do serviço)

AVALIE O ATENDIMENTO DO SETOR DE ACORDO COM OS PARÂMETROS DE


HUMANIZAÇÃO, ATRIBUINDO NOTAS DE 1 A 4 ,SEGUNDO A ESCALA
SEGUINTE:
1 = RUIM
2 = REGULAR
3 = BOM
4 = ÓTIMO

1 – Qualidade das Instalações, Condições Ambientais e Equipamentos para Atendimento dos


Usuários

1 2 3 4
1.1 - QUALIDADE DAS REFEIÇÕES OFERECIDAS À
CRIANÇA.
1.2 - TRATAMENTO DADO AS SUAS QUEIXAS
(RECLAMAÇÕES)
1.3 - AVALIE A APARÊNCIA DO SETOR
(CLIMATIZAÇÃO, DECORAÇÃO, MOBILIÁRIO,
ESPAÇO FÍSICO)

2 – Acesso e Presteza no Atendimento aos Usuários

1 2 3 4
2.1 - TEMPO DE ESPERA PARA O ATENDIMENTO
2.2 - O MODO COMO FOI FEITO A INTERNAÇÃO DA
CRIANÇA
2.3 - ACESSO DE ACOMPANHANTES PARA CRIANÇA
154

3 – Qualidade da Informação Fornecida aos Usuários

1 2 3 4
3.1 - NÍVEL DE COMPREENSÃO DAS INFORMAÇÕES
REPASSADAS PELOS PROFISSIONAIS SOBRE O
CUIDADO DA CRIANÇA

3.2 - A CLAREZA DAS INFORMAÇÕES DADAS PELOS


PROFISSIONAIS, SOBRE OUTROS SERVIÇOS
DISPONÍVEIS NA COMUNIDADE

3.3 - MODO COMO OS PROFISSIONAIS SE


APRESENTAM (CRACHÁS E FARDAMENTOS) PARA
QUE VOCÊ POSSA RECONHECÊ-LO COMO
CUIDADOR DA CRIANÇA

4 – Qualidade da Relação entre Usuários e Profissionais.

1 2 3 4
4.1 - O INTERESSE DOS PROFISSIONAIS COM A
CRIANÇA
4.2 - INFORMAÇÕES FORNECIDAS A MÃE
(ACOMPANHANTE), SOBRE O ESTADO DE
SAÚDE/DOENÇA DA CRIANÇA
4.3 - GRAU DE CONFIABILIDADE DOS SERVIÇOS
PRESTADOS PELOS PROFISSIONAIS PARA
MELHORIA DA CRIANÇA

APÓS ESTA AVALIAÇÃO, O QUÊ VOCÊ SUGERE PARA MELHORIA DO SERVIÇO?


155

FORMULÁRIO 2 (aos profissionais do serviço)

AVALIE SEU SETOR DE TRABALHO DE ACORDO COM OS PARÂMETROS DE


HUMANIZAÇÃO, ATRIBUINDO NOTAS DE 1 A 4, SEGUNDO A ESCALA
SEGUINTE:
1 = RUIM
2 = REGULAR
3 = BOM
4 = ÓTIMO

1 - Gestão Hospitalar e Participação dos Profissionais na Organização

1 2 3 4

1.1 - OPORTUNIDADE DE DISCUTIR A QUALIDADE


DOS SERVIÇOS PRESTADOS

1.2 - OPORTUNIDADE DE DISCUTIR AS


DIFICULDADES NA EXECUÇÃO DE SEU TRABALHO

1.3 - ADOÇÃO DE NORMAS (PADRÕES) DE


ATENDIMENTO NO SETOR

2 - Qualidade da Comunicação no Setor

1 2 3 4
2.1 - MECANISMOS DE COLETA DE SUGESTÕES
(CAIXA DE SUGESTÕES, OUVIDORIA, OUTRAS)
2.2 - CANAIS DE COMUNICAÇÃO INTERNA ENTRE
OS PROFISSIONAIS SOBRE AS ATIVIDADES DO
SETOR (QUADRO DE AVISOS E ENCONTROS
SISTEMÁTICOS)

2.3 - CANAIS DE INFORMAÇÕES OFICIAIS DA


ADMINISTRAÇÃO (JORNAIS, MURAIS E QUADROS
DE AVISOS)
156

3 - Relacionamento Interpessoal no Setor de Trabalho

1 2 3 4
3.1 - NÍVEL DE INTEGRAÇÃO DO GRUPO
3.2 - RELAÇÃO DE CONFIANÇÃ ENTRE OS
PROFISSIONAIS

3.3 - NIVEL DE COOPERAÇÃO NA EQUIPE

4- Condições de Trabalho dos Profissionais.

1 2 3 4

4.1- O CONFORTO OFERECIDO AOS PROFISSIONAIS


(ILUMINAÇÃO, VENTILAÇÃO, RUIDO, ESPAÇO FÍSICO)

4.2-DISPONIBILIZAÇÃO DE MATERIAIS PARA O


TRABALHO (EQUIPAMENTOS, INSUMOS E EPIS)

4.3 -. AMBIENTE RESERVADO AO DESCANSO DOS


PROFISSIONAIS

5 - Motivação e Valorização Profissional do Trabalho

1 2 3 4

5.1- MOTIVAÇÃO PARA O SEU TRABALHO

5.2- NÍVEL DE RECONHECIMENTO DA DEDICAÇÃO DO


PROFISSIONAL PELA INSTITUIÇÃO
5.3- GRAU DE REALIZAÇÃO PESSOAL POR
TRABALHAR NO SETOR.

6 - Condições de Apoio aos Profissionais.

1 2 3 4

6.1- FREQÜÊNCIA COM QUE O SETOR OFERECE


CURSOS E TREINAMENTOS

6.2- QUALIDADE DAS REFEIÇÕES FORNECIDAS

6.3- OFERTA DE ATENDIMENTOS AS NECESSIDADES


PSICOSSOCIAIS DOS PROFISSIONAIS.

APÓS ESTA AVALIAÇÃO, O QUÊ VOCÊ SUGERE PARA MELHORIA DO SERVIÇO?


157

APÊNDICE C – Tabelas demonstrativas dos eixos para humanização dos


usuários

TABELA 2 – Avaliação dos usuários quanto à qualidade das instalações, condições


ambientais e equipamentos
Classificação Opiniões
Itens
Ruim Regular Bom Ótimo Desfavoráveis Favoráveis
N (%) N (%) N (%) N (%) N (%) N (%)
1.1* 06 (20,0) 08 (26,7) 12 (40,0) 04 (13,3) 14 (46,7) 16 (53,3)
1.2** 09 (31,0) 07 (24,1) 11 (37,9) 02 (7,0) 16 (55,1) 13 (45,9)
1.3*** 05 (16,7) 11 (40,0) 12 (36,6) 02 (6,7) 16 (56,7) 14 (43,3)
* Qualidade das refeições
** Tratamento as reclamações (um entrevistado não opinou)
*** Aparência do setor

TABELA 3 – Avaliação dos usuários quanto ao acesso e presteza no atendimento


Classificação Opiniões
Itens Ruim Regular Bom Ótimo Desfavoráveis Favoráveis
N (%) N (%) N (%) N (%) N (%) N (%)
2.1* 06 (20,0) 04 (13,3) 09 (30,0) 11 (36,7) 10 (33,3) 20 (66,7)
2.2** 03 (10,0) 03 (10,0) 15 (50,0) 09 (30,0) 06 (20,0) 24 (80,0)
2.3*** 05 (16,7) 05 (16,7) 13 (43,3) 07 (23,3) 10 (33,4) 20 (66,6)
Tempo de espera
** Modo como foi feita a internação
*** Acesso de acompanhantes

TABELA 4 – Avaliação dos usuários quanto à qualidade da informação fornecida


Classificação Opiniões
Itens Ruim Regular Bom Ótimo Desfavoráveis Favoráveis
N (%) N (%) N (%) N (%) N (%) N (%)
3.1* 02 (6,7) 07 (23,3) 15 (50,0) 06 (20,0) 09 (30,0) 21 (70,0)
3.2** 04 (13,3) 03 (10,0) 17 (56,7) 06 (20,0) 07 (23,3) 23 (76,7)
3.3*** 04 (13,3) 04 (13,3) 13 (43,3) 09 (30,0) 08 (26,6) 22 (73,4)
*
Nível de compreensão
** Clareza das informações
*** Modo como os profissionais apresentam
158

TABELA 5 – Avaliação dos usuários quanto a qualidade da relação entre usuários e


profissionais
Classificação Opiniões
Itens Ruim Regular Bom Ótimo Desfavoráveis Favoráveis
N (%) N (%) N (%) N (%) N (%) N (%)
4.1* 01 (3,3) 03 (10,0) 11 (36,7) 15 (50,0) 04 (13,3) 26 (86,7)
4.2** 06 (20,0) 06 (20,0) 09 (30,0) 09 (30,0) 12 (40,0) 18 (60,0)
4.3*** 02 (6,7) 06 (20,0) 10 (33,3) 12 (40,0) 08 (26,7) 22 (73,3)
* Interesse do profissional
** Informações fornecidas à mãe
*** Grau de confiabilidade
159

APÊNDICE D – Tabelas demonstrativas dos eixos para humanização dos


profissionais

TABELA 6 – Avaliação dos profissionais de saúde quanto à gestão hospitalar e participação


na organização
Classificação Opiniões
Itens Ruim Regular Bom Ótimo Desfavoráveis Favoráveis
N (%) N (%) N (%) N (%) N (%) N (%)
1.1* 12 (40,0) 11 (36,7) 07 (23,3) 00 (0,0) 23 (76,7) 07 (23,3)
1.2** 12 (40,0) 10 (33,3) 06 (20,0) 02 (6,7) 22 (73,3) 08 (26,7)
1.3*** 12 (40,0) 10 (33,3) 06 (20,0) 02 (6,7) 22 (73,3) 08 (26,7)
* Qualidade dos serviços prestados
** Dificuldades na execução de seu trabalho
*** Adoção de normas e atendimentos

TABELA 7 – Avaliação dos profissionais de saúde quanto à qualidade da comunicação no


setor
Classificação Opiniões
Itens Ruim Regular Bom Ótimo Desfavoráveis Favoráveis
N (%) N (%) N (%) N (%) N (%) N (%)
2.1* 16 (53,3) 08 (26,7) 05 (16,7) 01 (3,3) 24 (80,0) 06 (20,0)
2.2** 11 (36,7) 09 (30,0) 08 (26,7) 02 (6,6) 20 (66,7) 10 (33,3)
2.3*** 05 (18,2) 18 (60,6) 05 (18,2) 01 (3,0) 23 (78,8) 06 (21,2)
* Mecanismos de coleta
** Canais de comunicação interna
*** Canais de informação (um profissional não opinou)

TABELA 8 – Avaliação dos profissionais de saúde quanto ao relacionamento interpessoal


no setor de trabalho
Classificação Opiniões
Itens Ruim Regular Bom Ótimo Desfavoráveis Favoráveis
Nº (%) Nº (%) Nº (%) Nº (%) Nº (%) Nº (%)
3.1* 02 (6,7) 11 (36,7) 13 (43,3) 04 (13,3) 13 (43,4) 17 (56,6)
3.2** 04 (13,3) 10 (33,4) 13 (43,3) 03 (10,0) 14 (46,6) 16 (53,4)
3.3*** 05 (16,7) 08 (26,7) 12 (40,0) 05 (16,6) 13 (43,4) 17 (56,6)
* Nível de integração
** Relação de confiança
*** Nível de cooperação
160

TABELA 9 – Avaliação dos profissionais de saúde quanto às condições de trabalho


Classificação Opiniões
Itens Ruim Regular Bom Ótimo Desfavoráveis Favoráveis
N (%) N (%) N (%) N (%) N (%) N (%)
4.1* 19 (63,3) 07 (23,3) 02 (6,7) 02 (6,7) 26 (86,6) 04 (13,4)
4.2** 15 (50,0) 08 (26,7) 05 (16,6) 02 (6,7) 23 (76,7) 07 (23,3)
4.3*** 16 (55,2) 07 (24,1) 02 (6,9) 04 (13,8) 23 (79,3) 06 (20,7)
* Conforto oferecido
** Disponibilização de materiais
*** Ambiente reservado ao descanso (um profissional não opinou)

TABELA 10 – Avaliação dos profissionais de saúde quanto à motivação e valorização do


trabalho
Classificação Opiniões
Itens Ruim Regular Bom Ótimo Desfavoráveis Favoráveis
N (%) N (%) N (%) N (%) N (%) N (%)
5.1* 11 (36,7) 10 (33,3) 07 (23,3) 02 (6,7) 21 (70,0) 09 (30,0)
5.2** 10 (33,3) 15 (50,0) 03 (10,0) 02 (6,7) 25 (83,3) 05 (16,7)
5.3*** 02 (6,7) 12 (40,0) 09 (30,0) 07 (23,3) 14 (46,7) 16 (53,3)
* Motivação
** Reconhecimento da dedicação do profissional
*** Grau de realização pessoal

TABELA 11 – Avaliação dos profissionais de saúde quanto às condições de apoio


Classificação Opiniões
Itens Ruim Regular Bom Ótimo Desfavoráveis Favoráveis
N (%) N (%) N (%) N (%) N (%) Nº (%)
6.1* 19 (63,3) 08 (26,7) 03 (10,0) 00 (0,0) 27 (90,0) 03 (10,0)
6.2** 10 (34,5) 13 (44,8) 06 (20,7) 00 (0,0) 23 (79,3) 06 (20,7)
6.3*** 16 (53,3) 10 (33,3) 04 (13,4) 00 (0,0) 26 (86,6) 04 (13,4)
* Oferecimento de cursos
** Qualidade das refeições (um profissional não opinou)
*** Oferta de atendimento psicossocial
161

ANEXO A – Aprovação do Comitê de Ética

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