Racios e Relatorio

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Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

Capítulo V - A análise com rácios e a elaboração do diagnóstico


económico e financeiro
No capítulo anterior estudamos a
análise das demonstrações
financeiras, a sua interligação e
as perspetivas estáticas e
dinâmicas desses documentos. O
balanço, a demonstração de
resultados, a demonstração de
fluxos de caixa, as alterações ao
capital próprio e o relatório de
gestão são documentos que
servem de base para este capítulo. Neste capítulo começamos por estudar as relações entre valores nas
demonstrações financeiras, e para isso poderemos utilizar diversos nomes, como índices, indicadores,
coeficientes, quocientes, no entanto, vamos utilizar o termo rácio tendo em atenção a sua tradição na
literatura financeira portuguesa. O verdadeiro interesse no estudo da análise económica e financeira não
é propriamente o cálculo dos rácios, mas sim a sua interpretação. É a investigação que se faz após o cálculo
dos rácios que permite a elaboração do diagnóstico económico e financeiro de uma organização. No
entanto, é também importante alertar para as limitações desta técnica. As demonstrações financeiras que
são a base para calcular os rácios, não conseguem captar todos os ativos das organizações, nomeadamente,
aqueles que não se conseguem valorizar, isto é, não se consegue atribuir um valor a ativos que além da
imaterialidade têm essa característica da não mensurabilidade. Ativos como a qualidade dos recursos
humanos, a reputação da organização, a capacidade da sua equipa de gestão entre tantos outros que
aportam valor a uma organização, mas que não aparecem refletidos em nenhuma das demonstrações
financeiras.

Objetivos de aprendizagem
- Analisar o relatório de gestão

- Conhecer os tipos de rácios que existem para a análise económica e financeira

- Calcular os rácios e compreender a sua utilidade

- A alavancagem financeira

- O EVA valor económico criado

- Desenvolver análises integradas

- Elaborar o diagnóstico económico financeiro

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Considerações para a análise com rácios


Antes de estudarmos os rácios em concreto é importante realçar alguns aspetos bastante importantes. O
cálculo de cada rácio varia muitas vezes de autor para autor, de empresa para empresa de financeiro para
financeiro, em princípio estarão todos corretos porque quando fazemos análises o que importa é a relação
entre as grandezas e a sua interpretação. Assim sendo antes de iniciar uma análise, baseada nos rácios
teremos sempre de perceber como é que foram calculados. Para comparar relações iguais e dessa forma
evitar a armadilha da informação enviesada que seria obtida utilizando um rácio para comparar duas
realidades (temporais ou sectoriais) mas que o rácio numa e noutra situação tinham sido calculados de
forma diferente. Um exemplo que poderemos apresentar passo pelo momento do tempo em que vamos
buscar as grandezas às demonstrações financeiras. O balanço que é utilizado para o cálculo dos rácios é a
imagem da organização num momento do tempo. E isso é limitativo quanto à realidade, na semana a
seguir, ou mesmo no dia a seguir a imagem pode ser significativamente diferente, e isso é tanto mais
importante quanto mais relevante for o facto patrimonial que ocorra no período, ou após o período da
elaboração do Balanço. Se no dia a seguir a extrair os dados, a empresa vende metade do seu ativo, por
um valor superior ao escriturado essa única operação vai inutilizar qualquer análise que se faça com os
dados do balanço, mas esse facto patrimonial não está relevado no balanço, e, por esse motivo não está
refletido na análise. Mas por vezes, mesmo sem grandes variações, a própria construção do rácio pode ser
importante para a análise. Se num cálculo utilizamos o valor do saldo final do exercício e se no outro cálculo
utilizamos o saldo médio, se a atividade da empresa em análise, tiver uma grande sazonalidade, estaremos,
certamente, a comparar realidades distintas e por seguinte sem nenhum interesse para a nossa análise.

As demonstrações financeiras são a principal fonte de informação para a construção dos rácios, e são uma
fonte segura para extrair os valores, pois as normas e regras para a elaboração dos documentos financeiros
de uma organização têm um conjunto de características, nomeadamente, a compreensibilidade, a
relevância, a fiabilidade e a comparabilidade que são um certificado de qualidade. Além das normas
existem ainda elementos de controlo, interno e externo, sobre o cumprimento das normas,
nomeadamente, os contabilistas certificados, os revisores oficiais de contas os conselhos fiscais, as
agências de rating, entre outras. Mas, mesmo assim, por vezes, ocorrem algumas situações excecionais,
em que estamos perante demonstrações financeiras elaboradas com a contabilidade criativa que
distorcem os dados e inutilizam as análises, nomeadamente, os rácios calculados com esses valores.

Neste capítulo vamos apresentar os rácios com a sua denominação em inglês e em português, esta opção
passa pela proliferação da terminologia anglo-saxónica relativamente aos rácios, nomeadamente, quando
analisamos a informação financeira que é disponibilizada pelos relatórios e contas das empresas bem como
dos media da especialidade.

Se analisarmos os rácios isoladamente também não nos proporcionará grande informação a não ser
constatações numéricas. No sentido de analisarmos a performance de uma organização teremos de
comparar os nossos rácios com outros e só assim poderemos interpretar os seus resultados. A análise com

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rácios necessita de benchmarks para que faça sentido. São vários os benchmarks que poderemos utilizar
embora estes quatro são considerados os principais pela maioria dos financeiros:

- Objetivos previstos nos orçamentos e planos de atividade da empresa. Neste caso analisamos os
valores do relatório de execução com os valores previstos nos planos de atividade e avaliamos o
grau de cumprimento como projetado.

- Valores de empresas da mesma dimensão. Se conseguirmos encontrar dados de empresas


similares poderemos comparar a performance de cada uma das empresas. Estes benchmarks são
os mais difíceis de encontrar, pois mesmo com acesso aos dados de empresas que nos pareçam
similares, é difícil encontrar duas empresas com a mesma estrutura, ao nível do ativo, dos recursos
humanos, e com as mesmas práticas contabilísticas. Embora exista um esforço de todas as partes
para a normalização contabilística existe ainda margem para uma aplicação diferenciada de alguns
princípios, nomeadamente, os critérios de depreciação e amortização e a valorização dos bens no
armazém que dificultam a comparabilidade de alguns rácios.

- Valores de empresas do mesmo setor. Neste caso comparamos os rácios de uma determinada
empresa com os valores médios do seu setor de atividade, esta análise é comum e relativamente
fácil de se fazer tendo em atenção que estão disponíveis estatísticas de empresas de cada setor,
nomeadamente, no Banco de Portugal. O BP através dos quadros de setor
(www.bportugal.pt/QS/qsweb/Dashboards) disponibiliza estatísticas por setor e por dimensão da
empresa que facilita a análise. Existem outras fontes de informação, no entanto, são normalmente
pagas. Esta análise comparativa setorial ou cross section é importante para aferir a performance
da empresa com as suas concorrentes mais diretas.

- Valores de períodos anteriores da mesma empresa . Esta análise é uma sistematização da


performance histórica da organização e permite avaliar o seu desenvolvimento e comparar com
períodos anteriores.

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Categorias de rácios
No sentido de apresentar os rácios de uma forma sistematizada podemos categorizá-los de acordo com o
tipo de informação que estudámos, dessa forma encontramos cinco categorias e rácios.

- Rácios de Mercado informação importante para o investidor

- Rácio de estrutura e endividamento informação sobre o património e o endividamento da


organização

- Rácios de liquidez informação sobre a capacidade da empresa liquidar as suas dívidas de curto
prazo

- Rácios de funcionamento ou eficiência que medem a performance da empresa na utilização


dos recursos

- Rácios de rendibilidade que medem o rendimento da organização com as componentes


patrimoniais e de atividade

Rácios de Mercado
Os rácios de mercado servem de base informativa para os investidores em geral, pois são rácios que
utilizamos para comparar o desempenho dos títulos de uma empresa no mercado de capitais. Estes rácios
(com exceção do payout ratio) só podem ser calculados para empresas cotadas. São, portanto, indicadores
de desempenho bolsista que visam informar os investidores em particular e todos os interessados em geral
no desempenho da empresa.

Payout ratio (dividendos por resultado líquido)


𝑃𝑎𝑦𝑜𝑢𝑡 𝑟𝑎𝑡𝑖𝑜 = × 100
í í

Este rácio informa da percentagem dos resultados da empresa que são distribuídos pelos seus
acionistas. Este rácio vai ser analisado em detalhe no capítulo em que abordamos a política de
distribuição de dividendos.

Earning per share EPS (Resultado líquido por ação)


í í
𝐸𝑎𝑟𝑛𝑖𝑛𝑔 𝑝𝑒𝑟 𝑠ℎ𝑎𝑟𝑒 =
ú çõ é çã

Este rácio mede o resultado que é imputado a cada ação. Este indicador mede a rendibilidade por
unidade de propriedade acionista. Este indicador não tem em atenção o valor de cada ação pelo
que não reflete o rendimento financeiro do investidor. Se construirmos um exemplo em que duas
empresas iguais, com os mesmos resultados, com uma única diferença enquanto que a empresa
A tinha o seu capital inicial disperso por ações com o valor nominal de um euro. A empresa B tinha
o capital inicial disperso por ações com o valor nominal de dez euros. Num cenário em que não
haveria mais nenhuma alteração ao capital social a empresa B teria um EPS dez vezes superior ao

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da empresa A, pela única razão de existir somente um décimo do número de ações da empresa B
em circulação comparativamente à empresa A.

Price earning ratio P/E (Resultado por investimento por ação)


ç çã çã
𝑃𝑟𝑖𝑐𝑒 𝑒𝑎𝑟𝑛𝑖𝑛𝑔 𝑟𝑎𝑡𝑖𝑜 =
çã

Este rácio mede o prazo de recuperação do capital investido. Partindo do pressuposto de que os
resultados seriam constantes e integralmente distribuídos este rácio dá-nos o número de períodos
(ter em atenção os resultados podem ser trimestrais, quadrimestrais, semestrais ou anuais)
necessários para o investidor recuperar o investimento inicial não tendo em conta o valor de
mercado da ação. Quanto maior for o PER maior é a relação do capital investido com o
rendimento. Este indicador tem a vantagem de incorporar os resultados com o investimento
permitindo uma análise rápida da rendibilidade do investimento. PER´s elevado indicam, numa
análise rápida, baixa rendibilidade. Não podemos deixar de realçar que mesmo com um PER baixo
se a empresa não distribuir dividendos este indicador perde parte do seu interesse. Pois obriga a
uma análise detalhada da evolução do valor da ação, ao longo do tempo, para perceber se a
retenção de resultados tem em contrapartida um aumento do valor da ação.

Dividend yield DY (dividendo por ação pelo preço da ação)


çã
𝐷𝑖𝑣𝑖𝑑𝑒𝑛𝑑 𝑦𝑖𝑒𝑙𝑑 =
ç çã çã

Este rácio mede a rendibilidade de cada ação, é o indicador mais adequado para avaliar a liquidez
que o investimento no título gera ao longo do período. Este rácio tem que ser estudado de acordo
com a política de distribuição de dividendos da empresa. No capítulo de estudo sobre as políticas
de distribuição de dividendos vamos abordar ouros conceitos que ajudam na interpretação do
rácio, nomeadamente, a empresa não encontrar investimentos para os fluxos gerados, o excesso
de liquidez e os problemas de agência. No entanto, para o investidor que procura rendimentos
periódicos este rácio é o mais apropriado.

Market to book ratio (Preço por ação sobre o valor contabilístico da ação)
ç çã çã
𝑀𝑎𝑟𝑘𝑒𝑡 𝑡𝑜 𝑏𝑜𝑜𝑘 𝑟𝑎𝑡𝑖𝑜 =
í çã

Este rácio mede a relação entre o valor de mercado da empresa e o valor contabilístico da
empresa. A primeira observação que termos que fazer é a seguinte em mercados eficientes este
rácio deve ter o valor igual à unidade, o valor de mercado e uma empresa seria exatamente igual
ao seu valor contabilístico, para isso o valor contabilístico também teria que retratar
perfeitamente o património da empresa. No entanto esta asserção só tem validade académica, na

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realidade o valor contabilístico da empresa nem sempre está ajustado ao seu valor patrimonial,
seja por defeito, seja por excesso e o valor de mercado de uma empresa tem também um conjunto
de fator que estudamos no capítulo do risco que influenciam o valor de mercado de uma empresa.
Este rácio tem utilidade para identificar empresas que estejam subvalorizadas ou sobre
valorizadas e apurar se há oportunidades ou indicações de venda de determinado título. Se o rácio
for muito baixo teremos que avaliar o porquê de o mercado estar a desvalorizar a empresa, e,
avaliar a oportunidade de investimento. Se o rácio for alto teremos de avaliar o porquê da
valorização. Avaliar se o património está subvalorizado ou não, no sentido de acautelar uma
possível descida do valor do título.

O rácio na sua fórmula apresenta o valor por unidade e nesse sentido teremos que dividir o valor
da ação pelo quociente entre o capital próprio e o número de ações em circulação. Uma outra
forma é calcular o valor da empresa para isso multiplicamos o valor de mercado da ação pelo
número de títulos em circulação e dividimos pelo capital próprio da empresa.

Rácio de estrutura e endividamento


Os rácios de estrutura e endividamento analisam a construção do património da organização. Estes rácios
relacionam as componentes de financiamento, próprio e alheio de curto e longo prazo com o investimento
total da organização. O balanço, como representação contabilística do património da organização é a fonte
da construção destes rácios. Os rácios de estrutura e endividamento analisam a posição da empresa
relativamente aos seus credores, a sua dependência relativamente ao capital alheio, e, a pressão que a
empresa tem na relação do seu passivo de curto prazo e médio e longo prazo. Estes rácios são indicadores
do risco de crédito pois quanto maior for o endividamento da empresa maior será o risco. Estes rácios, na
perspetiva financeira, analisam as relações entre origens e aplicações de fundos, sendo certo que não há
uma regra universal que defina os valores ótimos dos rácios pois existem características específicas, dos
setores de atividade ou das próprias empresas, que condicionam a sua análise pelo que deveremos ter em
atenção essas características quando procedemos à análise.

Rácio de Endividamento (passivo sobre o ativo)


𝑅á𝑐𝑖𝑜 𝑑𝑒 𝑒𝑛𝑑𝑖𝑣𝑖𝑑𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 =

Este rácio representa a relação entre o ativo e o passivo e diz-nos a proporção do ativo que é
financiado por capitais alheios. Para os investidores este rácio é o primeiro indicador de risco, pois
quanto maior for o nível de endividamento maior será o volume de juros de financiamento pagos
pela organização. Tendo em atenção que os encargos com os créditos têm prioridade sobre a
distribuição de resultados pelos acionistas, um rácio de endividamento elevado pode indicar
baixos resultados para os acionistas. Este rácio varia entre 0 zero e 1 um.

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Tipo de endividamento (passivo de curto prazo sobre o passivo total)


𝑇𝑖𝑝𝑜 𝑑𝑒 𝑒𝑛𝑑𝑖𝑣𝑖𝑑𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 =

Este rácio analisa a relação entre o passivo de curto prazo com o total do passivo. O rácio de
endividamento analisa o peso do financiamento por capitais alheios na organização, o rácio Tipo
de Endividamento analisa a pressão que poderá existir na tesouraria, ao comparar o peso do
passivo corrente no passivo total.

Debt to equity D/E (passivo sobre o capital próprio)


𝐷𝑒𝑏𝑡 𝑡𝑜 𝑒𝑞𝑢𝑖𝑡𝑦 =
ó

Este rácio analisa a relação entre o passivo e o capital próprio de uma organização. Quando o debt
to equity é zero a empresa não recorre a capital alheio. Este rácio avalia a capacidade da
organização pagar as suas dívidas com o capital próprio. Se o rácio estiver entre o intervalo de
zero a um a empresa tem um capital próprio superior ao total das suas dívidas o que releva, em
princípio, uma boa situação financeira. Como todos os rácios individualmente esta informação é
pouco relevante, no entanto, conjugada com outros indicadores é uma informação fundamental
a avaliação de risco de crédito e de Investimento.

Solvabilidade (capital próprio sobre o passivo)


ó
𝑆𝑜𝑙𝑣𝑎𝑏𝑖𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 =

O rácio solvabilidade, tal como o debt do equity, avalia a capacidade da empresa pagar o seu
passivo com o capital próprio. No entanto a sua fórmula está definida numa relação inversa ao
debt to equity.

Autonomia Financeira (capital próprio sobre o ativo)


ó
𝐴𝑢𝑡𝑜𝑛𝑜𝑚𝑖𝑎 𝐹𝑖𝑛𝑎𝑛𝑐𝑒𝑖𝑟𝑎 =

Este rácio é um dos indicadores mais utilizados para avaliar a estrutura financeira das
organizações. A banca e outras instituições como as sociedades de garantia mútua utilizam este
indicador para avaliar o grau de investimento dos acionistas na organização. A relação matemática
entre o capital próprio e o ativo varia num intervalo teórico 7 que tem como limite a unidade. Uma
organização com uma autonomia financeira de 0,3 diz-nos que os acionistas asseguraram trinta

7
Matematicamente se o capital próprio for negativo este rácio vai assumir valores negativos e em teoria não tem um
limite. No entanto, uma autonomia financeira infinitamente negativa não existe, pois exigiria um capital próprio
infinitamente negativo.

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por cento do investimento total da organização e o restante está a se financiado por capitais
alheios. Esta relação com já afirmamos é utilizada pela banca para avaliar o investimento e mesmo
o comprometimento dos acionistas com a organização.

Rácios de liquidez
Os rácios de liquidez avaliam a gestão do curto prazo da organização no capítulo seguinte vamos estudar
este assunto com mais profundidade. A analise destes rácios deve ser enquadrada com o estudo da
construção das demonstrações financeiras, nomeadamente, no modelo dinâmico da gestão corrente. Os
rácios de liquidez evidenciam a capacidade de, no curto prazo, a empresa solver a suas dívidas, desta forma
criaram-se três rácios, Liquidez geral, Liquidez reduzida e Liquidez imediata, para avaliar a capacidade de a
empresa dispor de liquidez para pagar as dívidas do curto prazo. A necessidade de criar os rácios de liquidez
tem a sua origem na avaliação que inicialmente foi efetuada ao equilíbrio que deveria existir entre o
financiamento do ativo não corrente e os capitais permanentes. Esta relação que ficou conhecida com
regra do equilíbrio financeiro mínimo (Neves, 2015) postula que a organização deve financiar o seu ativo
fixo de modo que o tempo para a libertação de fundos gerados pelo investimento deve ser adequado à
exigibilidade para o pagamento das suas dívidas. Por outras palavras quando a organização compra um
equipamento através de financiamento alheio deve assegurar que o pagamento do financiamento deverá
ser efetuado de modo a que o equipamento comece a produzir e a gerar liquidez para amortizar o seu
financiamento. Caso contrário o equipamento seria pago antes de produzir liquidez para a sua amortização,
e, dessa forma teria de ser efetuado um novo financiamento para assegurar a viabilidade financeira da
organização. Esta regra tem a consequente análise de que o passivo de curto prazo deve servir somente,
para financiar o ativo de curto prazo, e, dessa forma criaram-se os rácios de liquidez para aferir o nível de
cobertura do passivo de curto prazo pelo ativo de curto prazo. A regra do equilíbrio financeiro mínimo foi,
entretanto, reequacionada quando apareceram organizações com estruturas que a desafiavam,
nomeadamente, os hipermercados, que pelo seu modelo de negócio podem ter uma estrutura de
financiamento que viola a regra sem afetar a sua viabilidade financeira. Estes rácios são muito utilizados
pelo sistema financeiro como métricas de risco para concessão de crédito.

Liquidez geral current ratio (ativo corrente sobre o passivo corrente)


𝐿𝑖𝑞𝑢𝑖𝑑𝑒𝑧 𝑔𝑒𝑟𝑎𝑙 =

Este rácio analisa a relação entre o ativo corrente, de curto prazo, e o passivo corrente, as dívidas que a
empresa tem de pagar nos próximos doze meses. Como o seu nome indica este rácio analisa a liquidez que
a empresa tem, através do seu ativo corrente, e a sua capacidade de liquidar as suas dívidas de curto prazo.
É a relação de tensão entre a liquidez e a exigibilidade corrente.

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Liquidez reduzida quick ratio (ativo corrente menos inventários sobre o passivo
corrente)
á
𝐿𝑖𝑞𝑢𝑖𝑑𝑒𝑧 𝑟𝑒𝑑𝑢𝑧𝑖𝑑𝑎 =

O rácio de liquidez reduzida, ou como também é conhecido acid test, deduz-se do rácio anterior, no
entanto, vamos retirar do ativo correntes o valor dos inventários, pois representam a componente menos
líquida do ativo corrente. No inventário podem estar contabilizados bens que já perderam o seu valor
comercial (monos) que ainda não foram abatidos, podemos encontrar problemas de valorização e custeio
e para transformarmos os bens em dinheiro teremos ainda de encontrar um comprador vender e esperar
que a venda seja cobrada. É por estas questões que consideramos este rácio liquidez reduzida8 um
indicador de liquidez acrescida, no sentido de que uma empresa que tenha este rácio superior à unidade
está numa situação de menor exposição ao risco de não conseguir pagar as suas dívidas de curto prazo.
Este rácio surgiu depois de se analisar diversas empresas com um rácio de liquidez geral superior à unidade,
mas que não conseguiam pagar as suas dívidas de curto prazo. Esta situação resultava parcela de
inventários que contribuía para o ativo corrente, mas com uma rotação de inventários lenta que não
proporcionava a liquidez necessária para assegurar os pagamentos de curto prazo.

Liquidez imediata cash ratio (meios financeiros líquidos sobre passivo o corrente)
í
𝐿𝑖𝑞𝑢𝑖𝑑𝑒𝑧 𝑖𝑚𝑒𝑑𝑖𝑎𝑡𝑎 =

O rácio de liquidez imediata é o rácio que analisa a relação entre os meios financeiros líquidos, que são
aqueles meios que a empresa possui, e, que estão na forma de dinheiro, ou de elevada liquidez, de modo
a que a empresa os consiga transformar em dinheiro no curto prazo. Este rácio analisa a capacidade de a
empresa pagar as suas dívidas do curto prazo com os seus meios financeiros líquidos. A análise deste rácio
embora possa ser interessante na perspetiva para concessão de crédito, tem de ser analisada de forma
restrita, pois não revela uma otimização da gestão financeira. Se a gestão financeira tem como objetivo
minimizar os valores excessivos nas aplicações de capitais, uma aplicação exagerada na tesouraria da
organização pode evidenciar ineficiência na política de investimentos ou de financiamento. Se a
organização tem dinheiro disponível pode investir esse dinheiro em ativos de investimento, que lhe
assegurem uma rendibilidade superior aquela que resultaria do juro que a empresa obtém por ter uma
conta de depósitos à ordem elevada, ou então pode diminuir o valor do financiamento externo
amortizando o seu passivo corrente ou não corrente, ou então distribuir pelos seus acionistas através do
pagamento de dividendos.

8
Na nossa opinião o nome adotado para este rácio não é feliz, pois a chamar de liquidez reduzida dá a entender que
estamos a reduzir a liquidez quando na realidade estamos a identificar ativos com mais liquidez do que o rácio de
liquidez geral. Na terminologia anglo-saxónica o nome utilizado quick ratio parece-nos mais adequado.

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Rácios de funcionamento ou eficiência


Os rácios de funcionamento são, por excelência, os indicadores de eficiência do funcionamento operacional
da organização. Se compararmos duas empresas iguais A e B, que operam no mesmo setor e no mesmo
mercado, com os mesmos volumes de vendas, mas o ativo da empresa é o dobro do ativo da empresa B,
podemos afirmar que a rotação do ativo da empresa B é o dobro do da empresa A, sendo por isso mais
eficiente do que a empresa A. Esta análise não fica por aqui pela simples leitura matemática dos rácios após
esta informação teremos de aprofundar a análise e perceber as causas, e aí podemos concluir que os
processos de produção são diferentes, que a empresa A tem ativos que estão subutilizados ou que nem
sequer são utilizados ou uma outra causa, mas esta situação foi identificada pela análise de um rácio de
funcionamento. Além da eficiência da utilização do ativo os rácios de funcionamento e eficiência fornecem
os dados para a análise do ciclo de conversão de caixa, nomeadamente ao calcular os tempos médios de
inventário, contas a receber e contas a pagar

Rotação do ativo (vendas sobre o ativo)


𝑉𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠
𝑅𝑜𝑡𝑎çã𝑜 𝑑𝑜 𝑎𝑡𝑖𝑣𝑜 =
𝐴𝑡𝑖𝑣𝑜
Este rácio é um indicador de eficiência da
Por vezes esta análise é feita apenas sobre a
utilização do ativo da empresa. A análise tem de
componente do ativo fixo
ser efetuada numa perspetiva comparativa, 𝑉𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠
𝑅𝑜𝑡𝑎çã𝑜 𝑑𝑜 𝑎𝑡𝑖𝑣𝑜 𝑓𝑖𝑥𝑜 =
temporal ou setorial, de modo a retirarmos 𝐴𝑡𝑖𝑣𝑜 𝑓𝑖𝑥𝑜

algumas conclusões dos valores apresentados. As vendas são retiradas da demonstração de


resultados para o período, no caso do valor do ativo teremos de escolher um valor. Podemos
utilizar o valor inicial do período, o valor final do período ou a média dos dois. Normalmente,
utilizamos a média dos valores iniciais e finais, mas mais uma vez alertamos da importância para
a consistência da metodologia de modo a aferir comparabilidade às grandezas. Temos de utilizar
a mesma metodologia para calcular os diversos rácios para os podermos comparar.

Tempo médio de inventário (inventário sobre o custo diário das vendas)


𝐼𝑛𝑣𝑒𝑛𝑡á𝑟𝑖𝑜
𝑇𝑒𝑚𝑝𝑜 𝑚é𝑑𝑖𝑜 𝑑𝑒 𝑖𝑛𝑣𝑒𝑛𝑡á𝑟𝑖𝑜 =
𝐶𝑢𝑠𝑡𝑜 𝑑𝑖á𝑟𝑖𝑜 𝑑𝑎𝑠 𝑣𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠
O tempo médio de inventário é um indicador O rácio dos custos das mercadorias
chave para análise do ciclo de conversão de vendidas e das matérias consumidas sobre
caixa. Este indicador calcula o tempo médio de o inventário dá-nos uma indicação sobre o
valor médio do inventário no balanço da
permanência do inventário na empresa. Este
organização.
rácio calcula a relação de um valor relativo a um 𝐶𝑀𝑉𝑀𝐶
𝑅𝑜𝑡𝑎çã𝑜 𝑑𝑜 𝑖𝑛𝑣𝑒𝑛𝑡á𝑟𝑖𝑜 =
período o custo diário das vendas com o valor do 𝐼𝑛𝑣𝑒𝑛𝑡á𝑟𝑖𝑜

inventário que é o valor num determinado momento, neste caso como já afirmamos no rácio

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anterior vamos utilizar o valor médio calculado entre o valor inicial e final do período. Um valor
baixo de permanência do inventário está associado a uma elevada rotação do inventário e é um
indicador de eficiência. No capítulo seguinte vamos abordar esta situação, no entanto, este rácio
também tem de ser analisado, comparativamente, e perceber as razões das variações. Uma
alteração drástica do valor médio de inventário de um período para o seguinte exige uma análise
detalhada da gestão do inventário para perceber as causas dessa variação .

Tempo médio de recebimento (clientes sobre vendas médias diárias)


𝐶𝑙𝑖𝑒𝑛𝑡𝑒𝑠
𝑇𝑒𝑚𝑝𝑜 𝑚é𝑑𝑖𝑜 𝑑𝑒 𝑟𝑒𝑐𝑒𝑏𝑖𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 =
𝑉𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠 𝑚é𝑑𝑖𝑎𝑠 𝑑𝑖á𝑟𝑖𝑎𝑠

O tempo médio de clientes, é em conjunto com


O rácio das vendas sobre clientes dá-nos a
o tempo médio de inventário e o tempo médio rotação da conta de clientes.
de pagamento central na análise do ciclo de 𝑉𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠
𝑅𝑜𝑡𝑎çã𝑜 𝑑𝑒 𝑐𝑙𝑖𝑒𝑛𝑡𝑒𝑠 =
conversão de caixa. Este rácio calcula o tempo 𝐶𝑙𝑖𝑒𝑛𝑡𝑒𝑠

médio que a empresa demora a receber após o momento da venda. Quantos dias os clientes
demoram em média, a pagar as nossas faturas. Um aspeto que teremos de ter em atenção prende-
se com o valor do IVA que está incluído na conta de clientes, no entanto, o valor das vendas não
está inflacionado pelo valor do IVA. Sendo assim teremos de encontrar uma metodologia para
aportar comparabilidade às grandezas vendas e clientes. Podemos adicionar às vendas o valor do
IVA ou retirar dos clientes o valor do IVA. O importante passa como já referimos analisar grandezas
comparáveis. A outra questão passa também pela utilização do valor de clientes inicial, final ou
médio. Neste caso alguns autores (Brealey, Myers, & Allen, 2014) sugerem a utilização do valor de
clientes no início do ano. No entanto, a opção escolhida tem de ser consistente durante toda a
análise. Um valor elevado no tempo médio de recebimentos pode demonstrar algum problema
no departamento de cobranças ou falta de poder negocial sobre os seus clientes. Os rácios de
tempo médio de recebimento e de inventários são considerados os elementos que pesam
negativamente no ciclo de conversão de caixa e dessa forma afetam a eficiência da organização,
no entanto, esta análise tem de ser efetuada com um pormenor que vai além do valor matemático
do rácio. E poderemos sempre encontrar outros rácios que podem ser utilizados para medir a
eficiência por exemplo uma transportadora de mercadorias pode analisar o número de
quilómetros por camião ou motorista, enquanto que um supermercado pode analisar o volume
de vendas por metro quadrado de área comercial e uma consultora financeira analisar a faturação
por analista. O importante passa sempre por encontrar os indicadores que consideramos mais
adequados para a avaliar a eficiência da organização.

César Ferreira, 2020 45


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Tempo médio de pagamento


𝐹𝑜𝑟𝑛𝑒𝑐𝑒𝑑𝑜𝑟𝑒𝑠
𝑇𝑒𝑚𝑝𝑜 𝑚é𝑑𝑖𝑜 𝑑𝑒 𝑝𝑎𝑔𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 =
𝐶𝑜𝑚𝑝𝑟𝑎𝑠 𝑚é𝑑𝑖𝑎𝑠 𝑑𝑖á𝑟𝑖𝑎𝑠

O rácio do tempo médio de pagamentos dá- O rácio das compras sobre fornecedores dá-nos
nos a informação do tempo médio que a a rotação da conta de fornecedores.
𝐶𝑜𝑚𝑝𝑟𝑎𝑠
empresa utiliza para pagar as faturas aos 𝑅𝑜𝑡𝑎çã𝑜 𝑑𝑒 𝑓𝑜𝑟𝑛𝑒𝑐𝑒𝑑𝑜𝑟𝑒𝑠 =
𝐹𝑜𝑟𝑛𝑒𝑐𝑒𝑑𝑜𝑟𝑒𝑠
seus fornecedores. É um elemento essencial
para o cálculo do ciclo de conversão de caixa embora neste caso, em princípio, o tempo que a
empresa tem para pagar aos seus fornecedores é o financiamento que obtém do passivo corrente
e é um elemento favorável para o ciclo de conversão de caixa. No entanto convém perceber se o
tempo que a empresa tem está em linha como setor, se resulta da capacidade negocial da empresa
sobre os seus fornecedores, ou se na realidade está a ser um indício de incumprimento das
obrigações de pagamento da empresa e nesta situação é um indicador de risco de falência da
empresa. Este rácio tem que ser analisado, tal como os dois anteriores, de acordo com as regras
da consistência e comparabilidade, e, como sabemos a conta de fornecedores tem o valor do IVA
incluído, dessa forma termos que expurgar o valor da conta ou então adicionar ao valor das
compras o valor do IVA. Tendo em atenção este aspeto e a questão da utilização do valor de
fornecedores inicial, final ou médio para a qual reafirmamos a necessidade de ter consistência na
construção dos rácios.

Rácios de rendibilidade
O estudo da rendibilidade, é o alfa e o ómega da análise económica e financeira, na realidade o que se
pretende avaliar é a rendibilidade do dinheiro que é investido num determinado ativo. Avaliar a
rendibilidade de um ativo de um investimento compreende um conjunto de indicadores e análises que
estudamos em vários capítulos deste livro, mas é neste ponto que abordamos o âmago da análise. É
verdade que como vimos no capítulo anterior a rendibilidade deve ser analisada tendo em atenção um
determinado nível de risco. Mas quando comparámos os resultados gerados, com as vendas de um
determinado período, estamos a analisar a rendibilidade das nossas vendas, e, a analisar a eficiência e a
qualidade do processo e da gestão. Quando comparámos os resultados com o ativo de determinada
organização, avaliamos em que medida o investimento efetuado está a gerar fluxos financeiros suficientes
para manter a aplicação dos capitais ou atrair novos investidores. Quando comparámos os resultados de
determinado período com os capitais permanentes avaliamos a capacidade da organização remunerar os
acionistas e pagar os juros de financiamento. Esta avaliação é crucial para avaliar oportunidades de
crescimento ou de investimento em novos negócios. Quando analisamos os resultados e os comparamos
com o capital próprio calculamos a rendibilidade da aplicação de capitais pelos acionistas e em que medida
supera as expectativas de rendibilidade, e, remunera o risco e o custo de oportunidade dos capitais
investidos. Como defendem (Fernandes, Peguinho, Vieira, & Neiva, 2016, p. 203) a análise de rendibilidade

César Ferreira, 2020 46


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

junta duas perspetivas distintas mas inter-relacionadas a operacional e a estratégica, a operacional quando
compara os resultados com as vendas e a estratégica quando analisa a relação dos resultados com o
investimento.

Margem de contribuição
𝑉𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠 − 𝐶𝑢𝑠𝑡𝑜𝑠 𝑉𝑎𝑟𝑖á𝑣𝑒𝑖𝑠
𝑀𝑎𝑟𝑔𝑒𝑚 𝑑𝑒 𝑐𝑜𝑛𝑡𝑟𝑖𝑏𝑢𝑖çã𝑜 =
𝑉𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠
Este rácio analisa a relação entre o valor que resulta da subtração dos custos variáveis por unidade
ao preço de venda sobre o preço de venda e desta forma calculamos a margem de contribuição
unitária. Se multiplicarmos pelo número de unidades vendidas estamos a calcular em volume. Este
rácio é importante para análise de valor, mas tem a dificuldade de aplicabilidade na maioria das
organizações que têm múltiplas margens de contribuição, e múltiplos produtos produzidos e
comercializados. No entanto, o princípio que está na base desta análise é essencial para produto
a produto, avaliarmos a sua rendibilidade marginal e a sua adequação aos valores normais
esperados de rendibilidade da organização.

Rendibilidade operacional
𝑅𝑒𝑠𝑢𝑙𝑡𝑎𝑑𝑜𝑠 𝑂𝑝𝑒𝑟𝑎𝑐𝑖𝑜𝑛𝑎𝑖𝑠
𝑅𝑒𝑛𝑑𝑖𝑏𝑖𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑂𝑝𝑒𝑟𝑎𝑐𝑖𝑜𝑛𝑎𝑙 =
𝑉𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠

A rendibilidade operacional é o rácio mais utilizado na linguagem financeira, na realidade este


indicador calcula a viabilidade da operacional da organização. No numerador temos o conhecido
EBIT (earnings before interest and taxes) que em português traduzimos para resultados antes de
juros e impostos, e, no denominador o volume de negócios. Este indicador calcula a capacidade
de a organização libertar fundos da sua operação para renovar o investimento, pagar os custos de
financiamento por capitais alheios, e, os impostos sobre o rendimento. Normalmente este
indicador é analisado em conjunto com o EBITDA (earnings before interest, taxes, depreciation,
and amortization) em que neste rácio estão incluídas as depreciações e amortizações comparando
os dois rácios analisamos o valor de fundos que a empresa está a alocar à sua renovação
(depreciações e amortizações) e na perspetiva financeira temos também um importante indicador
sobre a formação de fluxos financeiros tendo em atenção que as amortizações e depreciações não
consomem liquidez.

Rendibilidade das vendas


𝑅𝑒𝑠𝑢𝑙𝑡𝑎𝑑𝑜𝑠 𝑙í𝑞𝑢𝑖𝑑𝑜𝑠
𝑅𝑒𝑛𝑑𝑖𝑏𝑖𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑑𝑎𝑠 𝑣𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠 =
𝑉𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠

O rácio rendibilidade das vendas é o indicador de lucratividade das vendas e deve ser analisado
em comparação o rácio da rendibilidade operacional, de modo a analisar o impacto dos custos de
financiamento e dos impostos na formação dos resultados. Por vezes o aumento das vendas não

César Ferreira, 2020 47


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

se traduz num aumento dos lucros, este rácio analisa essa relação de modo a avaliar se o nível de
rendibilidade mantém-se, num cenário de evolução ou diminuição do volume de vendas. É um
indicador útil para comparar com os valores do mercado e aferir a capacidade da organização
gerar resultados com a sua quota de mercado é importante saber se a empresa está a aproveitar
a sua quota de mercado e a otimizar a sua rendibilidade. Tendo em atenção a construção
matemática do rácio, podemos concluir que para o mesmo nível de vendas, se aumentarmos os
resultados estamos a aumentar a rendibilidade, e, para o mesmo montante de resultados se
diminuirmos as vendas também estamos a aumentar a rendibilidade, esta análise parece
elementar, no entanto, tem na sua base um argumento que queremos explorar que passa pelo
cenário de uma diminuição das vendas resultar num aumento da rendibilidade. Este cenário que
parece um pouco irracional, quando falamos sempre de crescimento sustentável ao longo do
tempo, pode ser perfeitamente racional. Se verificarmos que temos um mercado ou um produto
que não está a ter a rendibilidade média da organização, a venda ou descontinuidade dessa
operação tem como reflexo uma diminuição do volume de negócios, mas pode traduzir-se num
aumento da rendibilidade das vendas. Esta análise estratégica é muitas vezes suportada pelo rácio
rendibilidade das vendas.

Rendibilidade do ativo ROI or ROA return on investment or return on assets


𝑅𝑒𝑠𝑢𝑙𝑡𝑎𝑑𝑜𝑠 𝑙í𝑞𝑢𝑖𝑑𝑜𝑠 + 𝑗𝑢𝑟𝑜𝑠 × (1 − 𝑡)
𝑅𝑒𝑛𝑑𝑖𝑏𝑖𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑑𝑜 𝑎𝑡𝑖𝑣𝑜 =
𝐴𝑡𝑖𝑣𝑜
O rácio rendibilidade do ativo representa a rendibilidade do investimento da organização. A
primeira questão que analisamos passa, tal como em outros indicadores, pela comparação de um
valor referenciado a uma determinada data (ativo) e um valor que está relacionado como um
período (resultados e juros). Qual o valor do Cenário A B
Resultado operacional - EBIT 2.000 2.000
ativo o inicial, o final ou o médio? O valor Juros 100 0
médio parece ser uma opção razoável, no Resultados antes de impostos 1.900 2.000
Imposto 30% 570 600
entanto, teremos sempre de analisar com Resultados líquidos 1.330 1.400
Resultados líq. + juros x (1-t) 1.400 1.400
detalhe9 se houve variações significativas ao Tabela 5. 1
valor do ativo. A segunda questão que é muitas vezes colocada passa na explicação pela
construção do denominador com a soma dos resultados líquidos acrescidos juros após o efeito
dos impostos. Tendo em atenção que este rácio analisa a capacidade de o ativo remunerar os
capitais investidos vamos calcular os resultados líquidos que remuneram os acionistas e os juros
que remuneram os credores. No entanto, os juros têm de ser deduzidos do efeito fiscal conforme
defendem (Brealey, Myers, & Allen, 2014) porque pretendemos avaliar a rendibilidade da
organização sem o benefício fiscal da dívida. Para explicar este processo a Tabela 5. 1retrata dois

9 As variações do ativo estão referenciadas no relatório de gestão e podemos ter também uma análise rápida ao
construir o mapa de origens e aplicações de fundos.

César Ferreira, 2020 48


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

cenários A e B em que, em ambos cenários, o EBIT é igual a 2.000 unidades monetárias (um.) e a
taxa de imposto sobre lucros é de 30%. No entanto, no cenário A a empresa paga 100 um. de juros
e no cenário B a empresa não paga juros. Os resultados líquidos do cenário A são afetados pelos
juros, no entanto, a diferença entre os resultados dos cenários A e B não resulta da diferença
direta dos juros, porque nesse caso no cenário A o resultado líquido seria de 1.300 (1.400-100),
quando na realidade o resultado líquido do cenário A é de 1.330, Esta diferença resulta do efeito
fiscal que vamos abordar quando estudarmos a estrutura de capitais das organizações, neste
momento, importa explicar o porquê da construção do rácio e a sua interpretação. Tendo em
atenção o explicado e resumindo que o cálculo deste indicador deve de incluir no numerador as
componentes que remuneram os capitais investidos (dos acionistas e dos credores). Os juros
remuneram os credores, mas têm de ser deduzidos do efeito fiscal, pois os juros entraram na
fórmula para calcular os resultados antes de impostos, e, o imposto foi calculado sobre esse efeito.
Este cálculo é necessário tendo em atenção que o objetivo deste rácio é avaliar a rendibilidade do
investimento e dessa forma teremos de equacionar todas a componentes que financiam o
investimento. Sobre a interpretação do rácio este rácio é o indicador adequado para medir a
eficiência do ativo e a política de investimento da empresa. Quando comparativamente, com
outras empresas do setor, a nossa empresa tem a mesma rendibilidade sobre as vendas, mas tem
uma baixa rendibilidade sobre o ativo, estamos perante uma situação que nos indica uma baixa
eficiência da utilização do ativo. Esta análise tem implicações na avaliação da política de
investimentos da empresa.

Rendibilidade dos capitais permanentes return on capital10


𝑅𝑒𝑠𝑢𝑙𝑡𝑎𝑑𝑜𝑠 𝑙í𝑞𝑢𝑖𝑑𝑜𝑠 + 𝑗𝑢𝑟𝑜𝑠 × (1 − 𝑡)
𝑅𝑒𝑛𝑑𝑖𝑏𝑖𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑑𝑜𝑠 𝑐𝑎𝑝𝑖𝑡𝑎𝑖𝑠 𝑝𝑒𝑟𝑚𝑎𝑛𝑒𝑛𝑡𝑒𝑠 =
𝐶𝑎𝑝𝑖𝑡𝑎𝑖𝑠 𝑝𝑒𝑟𝑚𝑎𝑛𝑒𝑛𝑡𝑒𝑠

O rácio sobre capitais permanentes avalia a rendibilidade dos capitais investidos na empresa. Este
rácio como analisa a rendibilidade do investimento dos acionistas e dos credores vai ter no seu
numerador os resultados líquidos que são os rendimentos dos acionistas e os juros deduzidos do
efeito fiscal que são o rendimento dos credores e no denominador vamos ter os capitais
permanentes. Este indicador é o adequado para avaliarmos a rendibilidade dos investidores e dos
credores, no entanto, conforme (Neves, 2015) temos de fazer uma ressalva para o modelo de
contabilização do capital próprio e a sua atualização. As políticas de contabilização,
nomeadamente, do custo histórico e justo valor, podem enviesar a análise quando comparamos
organizações que utilizam metodologias diferentes. Este rácio como acontece com outros tem a

10
Na terminologia anglo-saxónica capital tem uma interpretação que não pode ser traduzida diretamente para
português. Capital representa os capitais investidos e é a soma dos capitais próprios (equity) e empréstimos de médio
e longo prazo em Portugal a terminologia adequada é capitais permanentes.

César Ferreira, 2020 49


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

questão da comparação de duas grandezas que se referem a períodos diferentes, neste caso
consideramos adequado utilizar a médias dos capitais permanentes.

Rendibilidade dos capitais próprios return on equity


𝑅𝑒𝑠𝑢𝑙𝑡𝑎𝑑𝑜𝑠 𝑙í𝑞𝑢𝑖𝑑𝑜𝑠
𝑅𝑒𝑛𝑑𝑖𝑏𝑖𝑙𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑑𝑜𝑠 𝑐𝑎𝑝𝑖𝑡𝑎𝑖𝑠 𝑝𝑟ó𝑝𝑟𝑖𝑜𝑠 =
𝐶𝑎𝑝𝑖𝑡𝑎𝑖𝑠 𝑃𝑟ó𝑝𝑟𝑖𝑜𝑠

A rendibilidade dos capitais próprios é o indicador adequado para o investidor acionista. Este rácio
avalia a rendibilidade do investimento na empresa. Tem de ser analisado estudando a política de
distribuição de resultados da empresa, porque se a empresa tiver uma elevada rendibilidade, mas
não distribuir resultados o investimento pode não interessar aos investidores que pretendam
rendimentos periódicos dos seus investimentos. Quanto à composição do rácio teremos também
de ter em atenção a temporalidade implícita e defendemos a utilização valor médio do capital
próprio. No entanto (Fernandes, Peguinho, Vieira, & Neiva, 2016) levanta uma questão pertinente
que passa pela expurgação, do valor do resultado do exercício, do montante utilizado no
denominador como capital próprio, já que este valor não contribuiu para a formação do resultado
em análise. Este rácio também importante para comparar com o custo de oportunidade de
investimento, pois é sobre ele que comparamos se a rendibilidade da empresa compensa o custo
de oportunidade, o prémio de risco e o rendimento esperado conforme estudamos no capítulo
anterior.

A alavancagem financeira
O efeito da alavancagem financeira é o resultado da utilização de dívida no financiamento do investimento
da empresa e beneficiar os acionistas através de um aumento da rendibilidade dos capitais próprio. Por
outras palavras a empresa endivida-se e os acionistas ganham mais. Isto acontece em determinados
intervalos de rendibilidade e de custos de financiamento. Quando uma organização precisa de dinheiro
para um projeto tem duas formas de o obter, pede emprestado ou arranja novos sócios que investem
dinheiro na organização. Se pedir emprestado vai ter de pagar os juros fixados, independentemente, dos
resultados do projeto. Se o projeto for muito lucrativo a organização paga os juros e fica com os lucros se
der prejuízo paga os juros e não tem lucro os acionistas não recebem nada. No entanto esta análise só fica
completa se analisarmos a Cenário A B C
Investimento 1 000 1 000 1 000
distribuição de resultados e a Capitais próprios 1 000 600 200
rendibilidade dos acionistas. Para Dívida 0 400 800
Financiamento 1 000 1 000 1 000
esse efeito criamos três cenários Volume de negócios 100 100 100
Taxa de juro 6,00% 12,00%
conforme o apresentado na Tabela Juro 0 24 96
5. 2. No cenário A a organização é Resultados antes de impostos 100 76 4
Imposto 30% 30 22,8 1,2
totalmente financiada por capitais Resultados líquidos 70 53,2 2,8
Rendibilidade dos capitais próprios 7,00% 8,87% 1,40%
próprios, no cenário B a organização
Tabela 5. 2

César Ferreira, 2020 50


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

é financiada a 50% por capitais próprios e 50% por capitais alheios, e, no cenário B em que a empresa é
financiada a 20% por capitais próprios e 80% por capitais alheios. Tendo em atenção os valores escolhidos
o cenário B é o cenário que tem maior rendibilidade dos capitais investidos. Isto acontece porque a margem
operacional é de 10% em todos os cenários, e, no cenário B a taxa de juro (6%) é inferior à margem
operacional. No cenário C em que a taxa de juro (12%) é superior à margem operacional a rendibilidade
dos capitais próprios é a menor dos três cenários. Esta tabela exemplifica o conceito de alavanca financeira
em que uma organização recorre a dívida para aumentar a rendibilidade dos seus acionistas. Ao passar do
cenário B para o cenário A os acionistas vão diminuir os custos da empresa deixam de pagar os juros, mas
vão partilhar os lucros com mais acionistas, e, por essa via a sua parte é inferior. O efeito demonstrado pelo
cenário C, em que o aumento do endividamento provoca um aumento do custo desse endividamento vai
voltar a ser abordado quando estudarmos as teorias da estrutura ótima de capitais de uma organização.
Mas, para já podemos perceber que os credores vão exigir um prémio de risco mais elevado quanto maior
for o endividamento da organização.

O EVA economic value added11


O EVA valor económico criado é também conhecido como o lucro residual utiliza um conceito central para
avaliação de desempenho de um investimento, o custo de oportunidade. Quanto é que os investidores
exigem pelo seu capital e quanto é que a organização ganha. O valor económico criado é a diferença entre
o lucro que a empresa obtém deduzido do rendimento exigido pelos acionistas no momento do seu
investimento. Este conceito já é conhecido e estudado como o lucro residual que seria a diferença entre o
lucro da empresa e o lucro exido pelos acionistas. Para operacionalizar o conceito o EVA utiliza o conceito
de custo do capital12 como a métrica para avaliar o desempenho exigido à organização e compara-o com o
rendimento gerado no período, a diferença é o EVA ou o lucro residual. Utilizando os dados da Tabela 5.
2e adicionando a informação que os Cenário A B C
1 - Investimento 1 000 1 000 1 000
acionistas exigem um rendimento de 2 - Capitais próprios 1 000 600 200
3 - Dívida 0 400 800
8% do seu investimento vamos calcular 4 - Financiamento 1 000 1 000 1 000
o EVA nos três cenários já abordados 5- Volume de negócios 100 100 100
6 - Taxa de juro 6,00% 12,00%
no ponto anterior. Construímos a 7 - Juro 0 24 96
8 - Resultados antes de impostos 100 76 4
Tabela 5. 3. Quando calculamos o EVA
9 - Imposto 30% 30 22,8 1,2
nos três cenários, verificamos que no 10 - Resultados líquidos 70 53,2 2,8
11 - Rendibilidade dos capitais próprios 7,00% 8,87% 1,40%
cenário A a rendibilidade dos capitais 12 - Juros após impostos +RL 70 70 70
13 – WACC12 x Capitais permanentes 80 72 112
próprios é de 7%, os resultados líquidos
14 – EVA = 12-13 -10 -2 -42
Tabela 5. 3

11
Este indicador foi criado pela empresa de consultoria SVM - Stern Value Management e está disponível no site
https://sternvaluemanagement.com/
12 O conceito custo do capital vai ser abordado em pormenor quando estudarmos o custo médio ponderado do capital

WACC – weighted average capital cost. No caso da tabela 5.3 calculamos o WACC através da média ponderada do custo
do capital (8%) mais a taxa de juro da dívida (6% cenário B e 12% cenário C). WACC cenário A 8%, B 7,2% e C 11,2%.

César Ferreira, 2020 51


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

de 70 um., no entanto o EVA é negativo em 10 um. Já no cenário C o EVA é negativo em 42 unidades


monetárias e no cenário B o EVA é negativo em 2 unidades monetárias. Este exemplo identifica um dos
principais erros na análise financeira que passa por não considerar o custo de oportunidade dos capitais
investidos. Os investidores exigem 8% caso contrário vão investir o seu dinheiro em outras opções de
investimento, e, esta questão é fundamental para analisar a rendibilidade de um investimento. Existem
custos de oportunidade e eles têm de ser equacionados. Só depois dos custos de oportunidade estarem
assegurados é que a empresa pode considerar que teve um ganho efetivo e assim ter a certeza de que
criou valor. O EVA é um modelo de avaliação que tem em conta esse pressuposto, e, pode ainda ser
utilizados nos diferentes níveis da organização. Definindo um custo de oportunidade diferente, para o
investimento em cada produto, setor ou mercado, tendo em atenção o risco para cada uma das situações,
podemos calcular o EVA e avaliar a operação. A organização pode avaliar com certeza quais as operações
a manter e quais as que deve desinvestir. Com este modelo o conselho de administração pode criar
incentivos de distribuição do EVA pelos gestores, e, dessa forma remunerar a gestão com o lucro após a
remuneração dos acionistas. Por outro lado, os gestores vão tentar otimizar o investimento e vão trabalhar
com o menor valor do ativo procurando otimizar os recursos afetos à operação. Matematicamente
podemos apresentar o EVA com a seguinte fórmula:
𝑅𝑒𝑠𝑢𝑙𝑡𝑎𝑑𝑜𝑠 𝑙í𝑞𝑢𝑖𝑑𝑜𝑠 + 𝑗𝑢𝑟𝑜𝑠 × (1 − 𝑡)
𝐸𝑉𝐴 = − 𝑊𝐴𝐶𝐶 × 𝐶𝑎𝑝𝑖𝑡𝑎𝑖𝑠 𝑝𝑒𝑟𝑚𝑎𝑛𝑒𝑛𝑡𝑒𝑠
𝐶𝑎𝑝𝑖𝑡𝑎𝑖𝑠 𝑝𝑒𝑟𝑚𝑎𝑛𝑒𝑛𝑡𝑒𝑠

Está é a fórmula utilizada para calcular o EVA de acordo com (Brealey, Myers, & Allen, 2014), no entanto,
(Neves, 2015) apresenta uma fórmula alternativa para o cálculo do EVA:

𝐸𝑉𝐴 = 𝑅𝑒𝑠𝑢𝑙𝑡𝑎𝑑𝑜𝑠 𝑜𝑝𝑒𝑟𝑎𝑐𝑖𝑜𝑛𝑎𝑖𝑠 × (1 − 𝑡) − 𝑊𝐴𝐶𝐶 × 𝐶𝑎𝑝𝑖𝑡𝑎𝑖𝑠 𝑝𝑒𝑟𝑚𝑎𝑛𝑒𝑛𝑡𝑒𝑠

Em ambas equações o capitais permanentes devem de ser os referentes ao início do período de formação
dos resultados.

Análise integrada
A análise integrada das demonstrações financeiras tem a sua origem na metodologia desenvolvida na
empresa DuPont Powder Company por Donaldson Brown e conhecida por fórmula DuPont. Esta fórmula
utiliza um princípio que assenta na decomposição da rendibilidade do investimento, em duas
componentes, a rotação do ativo e a
rendibilidade operacional. A Figura 5. 1
apresenta o modelo original criado por
Donaldson Brown. Desde o início até aos
dias de hoje a fórmula teve diversos
evoluções e adaptações. O princípio
baseava-se na observação da formação
do lucro das empresas, nem sempre as
Figura 5. 1
empresas com maior margem eram as

César Ferreira, 2020 52


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

mais lucrativas e esta situação devia-se à da rotação do ativo. Esta observação foi um marco decisivo no
estudo das finanças das organizações e hoje é utilizada com diversas aplicações. A primeira fórmula que
apresentamos é a da rendibilidade composta do ativo. Na Figura 5. 2 apresentamos o desenvolvimento do
modelo gráfico da fórmula DuPont adaptado ao SNC.

[ ]× í [ ]× í
ROI = = ×

Rendibilidade do Ativo = Rotação do Ativo × margem de lucro operacional

Inventários

vendas mais

Rotação do ativo dividido Ativo corrente Contas a receber


Ativo
(Investimento mais mais
total)
Ativo não meios
corrente financeiros
Rendimento do
investimento multiplicado
Custos de
produção
Vendas
mais
Resultados menos Custos das
vendas
% de ganhos das dividido Custos totais
vendas mais
Vendas Custos de
transporte

mais
Figura 5. 2 Custos
administrativos

A fórmula DuPont adaptada para a análise à rendibilidade dos capitais próprios é atualmente uma das
fórmulas mais utilizadas em finanças, é um desenvolvimento da fórmula inicial que apresentamos:
𝑅𝐿 𝐴𝑡𝑖𝑣𝑜 𝑉𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠 𝑅𝐿 + 𝑗𝑢𝑟𝑜𝑠 × (1 − 𝑡𝑥 ) 𝑅𝐿
𝑅𝐶𝑝 = = × × ×
𝐶𝑃 𝐶𝑃 𝐴𝑡𝑖𝑣𝑜 𝑉𝑒𝑛𝑑𝑎𝑠 𝑅𝐿 + 𝑗𝑢𝑟𝑜𝑠(1 − 𝑡𝑥 )

Rácio de Rotação Margem de Lucro “debt


leverage do Ativo Operacional Burden”

Nesta fórmula o primeiro elemento que chamamos rácio de leverage ou alavancagem mede a relação

do investimento que está financiada por capitais próprio. Se a totalidade do ativo for financiada por capitais
próprios o valor do elemento será igual a um, e, como tal será um elemento neutro da multiplicação. Caso
a organização tenha dívida o valor do primeiro elemento vai ser superior a um e nesse caso vai contribuir
positivamente para a rendibilidade do capital próprio, e por isso chamamos a este elemento a alavanca

financeira pois a dívida vai alavancar a rendibilidade dos capitais próprios. O segundo elemento é

César Ferreira, 2020 53


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

também conhecido como a rotação do ativo e mede o valor produzido por cada euro investido no ativo. Se
por cada euro investido no ativo, vendo dois euros, tenho uma rotação de 2, e, essa indicação é importante
para avaliar a eficiência do investimento da organização. Se tenho duas organizações A e B, com o mesmo
volume de negócios e a mesma rendibilidade sobre as vendas, mas a empresa A necessita de mais
investimento, por essa via a rotação da empresa A será menor e a rendibilidade do capital investido
também será menor porque vou ter o mesmo resultado do que na empresa B mas investimos mais dinheiro
na empresa A. Este elemento é essencial para a rendibilidade dos capitais próprio e foi o elemento que
×( )
esteve na base da fórmula DuPont. O terceiro elemento da fórmula que chamamos

margem de lucro operacional é o elemento que traz para o modelo a rendibilidade, no entanto, considera
a rendibilidade operacional pois soma aos resultados após impostos o juros também eles sem o efeito fiscal
pelo que podemos considerar este valor como os resultados operacionais líquidos de impostos este fator
é importante pois apresenta a rendibilidade da área operacional após impostos, é a rendibilidade da
organização se não tivesse encargos com juros de financiamento. O quarto e último elemento

que na terminologia anglo-saxónica é conhecido como debt burden, e que traduzimos


( )

como fardo da dívida representa o elemento que faz contraponto com o primeiro elemento. Neste caso se
a empresa não tiver dívida não paga juros e nesse sentido o elemento também tomará o valor da unidade
e será um elemento neutro da multiplicação, no entanto, existindo juros de financiamento eles vão fazer
que o elemento seja inferior à unidade e nesse sentido vai reduzir o valor da multiplicação, e, como
consequência algébrica a rendibilidade dos capitais próprios. Por este efeito é que chamamos o fardo da
dívida pois a dívida acarreta juros que implicam que este fator seja inferior à unidade diminuindo o valor
da rendibilidade. É contraponto do primeiro fator porque se a alavancagem aumenta com o aumento da
dívida este fator vai também ser menor porque mais dívida origina mais juros e mais juros fazem com que
o fardo da dívida seja mais pesado. Quando analisamos uma organização temos de ter em atenção esta
equação para perceber quais os
Cenário A B C
pontos que contribuem para a sua
1 - Investimento 1 000 1 000 1 000
rendibilidade e quais estão a 2 - Capitais próprios 1 000 600 200
3 - Dívida 0 400 800
limitar essa mesma rendibilidade. 4 - Financiamento 1 000 1 000 1 000
5- Volume de negócios 100 100 100
A análise ao limite da dívida, e, o
6 - Taxa de juro 0 6,00% 12,00%
impacto que essa dívida tem, nas 7 - Juro 0 24 96
8 - Resultados antes de impostos 100 76 4
contas da empresa, através da 9 - Imposto 30% 30 22,8 1,2
10 - Resultados líquidos 70 53,2 2,8
alavancagem, tem de ser
11 - Ativo/Capital Próprio 100,00% 166,67% 500,00%
equaciona da pelo fardo que essa 12 - Vendas/Ativo 10,00% 10,00% 10,00%
13 - (Juros após impostos + RL)/Vendas 70,00% 70,00% 70,00%
mesma alavancagem acarreta 14 - RL/(Juros após impostos + RL) 100,00% 76,00% 4,00%
15 - Rendibilidade dos capitais próprios 7,00% 8,87% 1,40%
com os juros. O valor dos juros
Tabela 5. 4
suportados e a sua relação com os resultados líquidos também é crucial para a análise que estamos a fazer.
Se o aumento dos juros é pouco relevante na relação juros resultados líquidos o quarto fator vai ser pouco
afetado e nesse sentido o efeito da alavancagem pode ser positivo. No entanto, se o aumento dos juros

César Ferreira, 2020 54


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

tem um impacto significativo e o quarto fator é afetado significativamente este efeito é percetível na tabela
Tabela 5. 4 em que no cenário C o fator de alavancagem é um multiplicador por cinco, mas o fardo da dívida
faz com que a rendibilidade desça significativamente.

A Elaboração do Diagnóstico Económico Financeiro


O relatório de análise económica e financeira é um documento em que o financeiro faz um diagnóstico
fundamentado da organização, emitindo uma opinião sobre a situação analisada e perspetivas para o
futuro. Para elaborar o relatório o analista precisa de informação económica e financeira que vai recolher
em diversas fontes, sendo a mais importante a disponível pelas demonstrações financeiras 13. A informação
deve ser analisada, e, aferida a sua fiabilidade e coerência. O parecer da certificação legal de contas de ver
analisado para perceber se existem reservas ou alguma anotação sobre as demonstrações financeiras
estudadas. As demonstrações financeiras, de acordo com o SNC, não evidenciam as operações
extraordinárias, aquelas que a sua ocorrência não se repete no tempo esta situação pode enviesar a análise.
Como exemplo se uma organização opera num espaço próprio e por motivos de necessidade de aumentar
a sua atividade muda de instalações e arrenda um espaço para se instalar. A venda das instalações ocorre
num exercício e não se irá repetir. Se compararmos as vendas desse exercício com o anterior ou com o
seguinte14 vamos concluir que tivemos um aumento ou uma diminuição significativa do volume de vendas,
quando na realidade até poderíamos estar a ter o mesmo nível de vendas da nossa operação só que o
ganho, se houver, da venda do edifício pode influenciar significativamente os nossos resultados. Por causas
das variações patrimoniais não repetíveis, sejam ganhos ou perdas, devem ser identificados e analisados
como resultados extraordinários na nossa análise.

A análise também deve ser efetuada tendo por base um objetivo e de acordo com um plano de trabalho.
Existem vários objetivos para se fazer uma análise, desde a análise global à situação da organização até
uma análise específica sobre um produto, setor ou mercado. Os objetivos devem ser formulados através
de questões15. Após a definição dos objetivos da análise vamos definir um plano de trabalho que passa por
identificar as fontes de informação, e, escolher os melhores indicadores para responder às questões
formuladas nos objetivos. Um dos erros que o analista deve de evitar é iniciar um trabalho com
preconceitos sobre o resultado do estudo. É frequente o analista ter um pré-conceito das conclusões do
estudo, e, cair na armadilha de procurar os indicadores que validem a sua opinião formada antes da análise.

13
As demonstrações financeiras são constituídas pelo balanço, demonstração dos resultados, demonstração das
alterações no capital próprio, demonstração dos fluxos de caixa, anexo em que se divulguem as bases de preparação
e políticas contabilísticas adotadas e outras divulgações
14 Esta situação ocorre se o valor de venda das instalações originar um ganho significativo comparando-o com o
volume médio de vendas anuais.
15
As questões têm de ser simples e concretas como exemplo: Qual é a rendibilidade da empresa face ao setor? Qual
é o valor da empresa? A empresa tem capacidade para pagar o empréstimo que está a solicitar? Estas, entre outras,
questões são as bases para se definir o plano de trabalho.

César Ferreira, 2020 55


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

Para evitar este erro o analista deve definir um projeto de trabalho, e, só no final é que deve sintetizar
todas as componentes e formular a sua análise e perspetivas para o futuro.

A análise das demonstrações financeira de uma organização deve seguir um modelo composto por sete
patamares.

1. Definição do objetivo e contexto da análise


2. Recolha de informação
3. Processamento da informação
4. Análise e interpretação dos resultados
5. Elaboração do relatório com o parecer e conclusões da análise
6. follow up
7. Disclaimer
1. Definição do objetivo e contexto da análise – Normalmente o objetivo da análise está previsto,
pelas normas das entidades de regulação e supervisão, e, passam por elaborar os documentos de
prestação de contas ou validar a informação presente nas demonstrações financeiras. Há, no
entanto, alguns trabalhos de análise específicos como a compra ou venda da parte ou da
totalidade de uma organização, ou uma análise específica para uma tomada de decisão sobre
investimento ou desinvestimento. Nestes casos o analista tem de definir o contexto (por exemplo
se estamos a comparar com um setor o porquê desse setor, se a comparação é regional, nacional
ou internacional etc.), o tempo de análise também tem de estar definido pois se a decisão está
dependente da análise o tempo para a tomada de decisão é muitas vezes crucial para o sucesso
ou não da operação. Um outro ponto importante passa por definir os recursos técnicos e humanos
disponíveis para a elaboração da análise. Por fim temos de definir as questões para as quais
queremos ter uma resposta no final da nossa análise.
2. Recolha de informação – Na sequência da definição prevista no ponto anterior é necessário
recolher a informação. Neste ponto temos de ter em atenção a qualidade da informação que
recolhemos. Quando comparamos séries temporais de informação de uma organização temos de
aferir da consistência das políticas contabilísticas ao longo do tempo da análise. Mais difícil é
avaliar a qualidade das comparações com os concorrentes, com os setores ou com outros
benchmarks, regionais, nacionais ou internacionais. Nesta fase recolhemos a informação e
validamos a sua qualidade.
3. Processamento da informação – Nesta fase a informação recolhida anteriormente é convertida
em rácios e taxas de variação. Elaboramos gráficos e calculamos regressões para construir um
dashboard (quadro de análise, painel de controlo ou em francês um tableau de bord). Neste ponto
importa realçar que os indicadores têm de estar construídos de modo a responder às questões
identificadas no ponto inicial deste modelo de análise.
4. Análise e interpretação dos resultados – Nesta fase analisamos os resultados e validamos se temos
todas as respostas para as questões previamente definidos. Se identificarmos sinais de alerta

César Ferreira, 2020 56


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

termos necessariamente que voltar ao ponto da recolha de informação para a recolha adicional
de informação de modo a estudar de modo específico o sinal de alerta e verificar se é ou não
materialmente relevante para incluir na nossa análise com um enfase específico.
5. Elaboração do relatório com o parecer e conclusões da análise - o relatório deve ter uma estrutura
simples com uma síntese inicial, um enquadramento, a análise, uma conclusão e perspetivas de
futuro.
A síntese inicial deve de sumarizar o trabalho efetuado e as próprias conclusões. A síntese inicial
serve para o leitor ficar com uma ideia do relatório e das conclusões do mesmo, mas sumarizada
para poder ser lida em poucos minutos.
O enquadramento engloba os pressupostos da análise, um estudo de mercado e das varáveis
externas com impacto na atividade da empresa. Uma apresentação da empresa e do seu passado
recente. Uma apresentação do setor e das principais concorrentes. E por fim os objetivos do
estudo e a metodologia que foi utilizada.
A análise, tendo em atenção os objetivos do trabalho, faz um estudo, económico e financeiro nas
componentes de risco, rendibilidade, dívida, liquidez, mercado e funcionamento da empresa
numa perspetiva temporal e/ou setorial, de acordo com os pressupostos definidos no projeto de
estudo. A análise deve conjugar as análises estáticas com as dinâmicas para compreender as
tendências internas e externas à organização. A análise deve ter em atenção todas as ferramentas
que existem, para avaliar o desempenho das organizações, e, deve procurar as melhores métricas
para cada setor. A análise deve de abordar as diversas dimensões que existem nas finanças das
organizações. O curto, médio e longo prazo. A atividade operacional e extraordinária. Os ciclos
operacionais de investimento e financiamento. Bem como todas as outras dimensões que são
mais específicas para os setores em análise. Por exemplo se estivermos a analisar uma empresa
de transporte rodoviário de mercadorias, será importante encontrar métricas que tenham em
consideração do número de veículos de transporte, número de condutores afetos à atividade de
transporte, número de quilómetros totais e por veículo, número de toneladas transportadas e
volume transportado. Depois de construída a bateria de indicadores da organização, do setor ou
das empresas concorrentes, procedemos à organização da informação, de modo a produzirmos
sínteses específicas sobre a cada elemento que consideramos importante para a análise. Como
exemplo voltamos à empresa de transporte rodoviário onde a análise operacional vai incluir os
tradicionais rácios de recebimento e pagamento, eventualmente de inventário se for relevante,
mas todos os indicadores (toneladas transportadas, quilómetros percorridos, etc.) que já foram
mencionados também devem de estar incluídos nesta síntese da área operacional.
A conclusão deve ser fundamentada com os dados da análise, e, o analista deve de assumir a sua
opinião face aos dados que estudou. A conclusão deve ser escrita com uma linguagem acessível
evitando conceitos técnicos que dificultem a compreensão ou conduzam a alguma dúvida. A
conclusão tem de responder às questões formuladas nos objetivos. Só dessa forma é que
podemos considerar que o trabalho foi bem conduzido.

César Ferreira, 2020 57


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

Esquema de elaboração e apresentação de um relatório

Definição de um plano de trabalho

Análise de Contexto Análise económica e financeira Análise da Concorrência

Risco Rendibilidade Dívida Liquidez Mercado Funcionamento

Cross section Objetivos Temporal

Síntese da análise

Conclusão da análise

Prospectivar o futuro

6. A perspetiva de futuro é a parte mais arriscada para o analista pois vai apresentar as suas previsões
sobre o que vai acontecer no futuro. Para que o analista possa fazer previsões tem de ter
preparado informação para poder formular as suas previsões. O analista não pode utilizar o
oráculo de Delfos. Para fazer as suas previsões deve de ter informação necessária, no capítulo
sobre análise de decisões de investimento vamos abordar algumas técnicas de previsão
nomeadamente, análise de cenários, de sensibilidade, método de Monte Carlo, entre outras, que
podem ser úteis para ao analista elaborar as suas previsões. Estas metodologias ajudam o analista
a elaborar as suas previsões, mas também defendem o seu trabalho, ao demonstrar o racional
que está na base das suas previsões a analista defende a tecnicidade das suas previsões.
7. Como todos os trabalhos a própria análise está sujeita a riscos, e, esses riscos devem ser
apresentados num disclaimer que proteja o analista, nomeadamente, sobre as demonstrações
financeiras e sobre imprevistos que ultrapassam qualquer perspetiva no momento em que está a
ser feita a análise. Relativamente às demonstrações financeiras existe sempre o risco de
encontrarmos uma organização que utilizou a contabilidade criativa o que enviesa toda a análise
que possa ser feita e relativamente aos riscos imprevistos posso dar o exemplo do que se está a
passar no momento em que estou a escrever este texto abril de 2020 em que vivemos uma
situação que era imprevista até a algumas semanas pandemia COVID 19 mas que vai inutilizar
todos os trabalhos de análise financeira que foram feitos até fevereiro deste ano.

César Ferreira, 2020 58


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

Sinais de alerta na análise das demonstrações financeiras


Existem vários sinais que devem de ser analisados para averiguar se as demonstrações financeiras sofreram
uma eventual manipulação enviesando a realidade económica e financeira da organização. As principais
causas de enviesamento são o reconhecimento de rendimentos fictícios ou a ocultação de gastos, existem
mesmo situações em que gastos foram considerados rendimentos. Quanto ao património é importante
analisar os valores registados dos ativos e dos passivos e aferir a sua adequação.

Relativamente aos rendimentos, várias são as situações que podem ocorrer.

Momento de reconhecimento da receita, antecipar receitas é muitas vezes um expediente que enviesa
a análise.

Analisar a política de troca de mercadorias vendidas pela empresa e perceber qual é a sua relação com
o valor de faturação do período. Os descontos oferecidos podem também enviesar a análise dos
rendimentos, como foram contabilizados os descontos oferecidos?

O analista tem de estudar as relações e as variações dos valores registados nas constas de rendimentos.
Se verificarmos um crescimento das contas de rendimentos temos de comparar com os concorrentes
e com o setor de atividade. Tendo em atenção, os mercados em análise, temos de estudar o
crescimento, e, se for superior temos de encontrar a justificação. É a diferenciação do produto? É o
modelo de gestão? Se não encontrarmos nenhuma justificação então temos um sinal de alerta.

Uma análise que também temos de fazer é estudar o crescimento dos rendimentos com o crescimento
das contas a receber. É normal que as contas a receber cresçam em linearidade com o crescimento do
valor da receita. Quando há desfasamentos teremos que verificar. Se a contas a receber crescerem mais
rápido que as contas de vendas e prestações de serviços poderemos ter problemas de relaxamento
com os recebimentos16 ou alargamos o prazo para os clientes pagarem. Se, no entanto, as contas de
rendimentos crescerem, mas contas a receber estiverem no mesmo nível, a empresa diminuiu o prazo
para os clientes pagarem? O valor nas contas de clientes em atraso diminuiu? Caso contrário temos um
sinal de alerta.

Relativamente aos gastos é importante estudar com o mesmo cuidado as políticas de reconhecimento dos
gastos. A contabilização de juros e rendas podem enviesar a análise transportando para períodos diferentes
gastos através das constas de acréscimos e diferimentos. O custo das mercadorias vendidas e das matérias
consumidas também é uma conta que necessita de uma análise cuidada. A relação entre as contas de
vendas e o custo dessas vendas é, à partida linear, temos, no entanto, de conjugar essa linearidade com o
valor dos inventários iniciais e finais e analisar o preço das matérias-primas ao longo do período. Caso a
relação não seja linear e as variações das contas de inventário não justificarem a relação não linear, temos
um sinal de alerta.

16
Por vezes identificamos situações em que as organizações por um motivo ou outro deixam de acompanhar as contas
a receber, e dessa forma deixam acumular dívidas de clientes para além do que está previsto.

César Ferreira, 2020 59


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

O inventário é também uma conta que nos dá sinais muito importantes para aferirmos algum eventual
enviesamento. A rotação do inventário dá-nos a eficiência da gestão do inventário. A diminuição da rotação
do inventário dá-nos indicação que a empresa está a perder eficiência, que pode resultar por diversos
motivos, um deles é a obsolescência das mercadorias, mas as empresas podem também estar a inflacionar
o seu inventário para reduzir os custos das vendas do período. Temos que comparar a evolução dos valores
de inventário com os concorrentes, com o setor e tentar perceber o porquê do crescimento. Se não
encontrarmos uma justificação temos um sinal de alerta.

Relativamente ao ativo não corrente é importante analisar a variação do valor de registo dos ativos. As
reavaliações positivas dos ativos têm implicações diretas nas contas do capital próprio e por isso têm de
ser analisadas com cuidado. O goodwill é também uma conta que merece uma atenção especial. Sabemos
que o valor do registo inicial é aferido, mas as alterações têm que refletir o justo valor dos ativos em causa.

Negócios com empresas do grupo ou participadas têm que ser analisadas. O mecanismo de estudo dos
preços de transferência é um bom indicador da adequação dos registos.

As operações no último mês ou trimestre são também um bom indicador. Rendimentos superiores (ou
inferiores) ao normal no último período (trimestre para empresas cotadas) são sinais de alerta

Classificação como despesas não recorrentes ou extraordinárias despesas que são correntes e cíclicas é
também um sinal de alerta. Em sentido contrário é também um sinal de alerta a consideração como receita
corrente uma receita extraordinária.

A apresentação de margens brutas ou operacionais superiores à concorrência e ao setor é também um


sinal de alerta. A política, de amortização e depreciação dos seus ativos, também tem de ser analisada de
acordo com o princípio da consistência e da comparação com o setor e a concorrência.

Uma análise importante que podemos fazer para avaliar sinais de enviesamento, nos resultados líquidos
da organização, passa por calcular uma série temporal de fluxos de caixa e dos resultados líquidos e
calculamos o rácio entre os fluxos de caixa e os resultados líquidos. Se o rácio é consistentemente inferior
a um ou então está em declínio constante, temos um importante sinal de alerta. Esta informação diz-nos
que a organização está a usar políticas agressivas no regime do acréscimo, de modo a adiar as despesas
para períodos futuros. Não é viável uma organização ter um resultado líquido superior ao seu fluxo de caixa
constantemente ao longo do tempo, por isso essa informação diz-nos que temos um sinal de alerta
importante sobre a fiabilidade dos valores reportados como resultados líquidos

Em resumo os sinais que identificamos são, na realidade, sinais e não provas de manipulação da informação
contabilística e financeira da organização. A presença de um sinal é um motivo para uma análise específica
e concreta para determinar se existe ou não manipulação relativamente ao elemento em análise. Só após
uma análise específica, com informação adicional, é que o analista pode identificar uma potencial
manipulação.

César Ferreira, 2020 60


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

Resumo do capítulo - Análise com rácios e a elaboração do diagnóstico económico


e financeiro
- Com uma análise, baseada nos rácios teremos sempre de perceber como é que foram calculados. Para
comparar relações iguais, e, dessa forma evitar a armadilha da informação enviesada que seria obtida
utilizando um rácio para comparar duas realidades (temporais ou sectoriais) mas que numa e noutra
situação os indicadores tinham sido calculados de forma diferente.

- Uma análise isolada dos rácios não nos proporcionará grande informação a não ser constatações
numéricas. No sentido de analisarmos a performance de uma organização teremos de ter benchmarks,
nomeadamente, objetivos previstos, Valores de empresas da mesma dimensão, Valores de empresas do
mesmo setor, Valores de períodos anteriores da mesma empresa.

- Os principais problemas da análise com os rácios são: Comparação de grandezas estáticas com dinâmicas
dificultando a escolha da melhor medida para construir o quociente; Normalmente é difícil encontrar
informação financeira disponível de empresas semelhantes para comparação; As políticas contabilísticas
podem ser diferentes entre as diversas empresa o que dificulta a análise; A contabilidade criativa pode
distorcer as demonstrações financeiras e proporcionar a comparação entre uma realidade e uma fantasia.

- Os rácios de mercado servem de base informativa para os investidores em geral, pois são rácios que
utilizamos para comparar o desempenho dos títulos de uma empresa no mercado de capitais. Os rácios de
estrutura e endividamento analisam a construção do património da organização. Estes rácios relacionam
as componentes de financiamento, próprio e alheio de curto e longo prazo com o investimento total da
organização. Os rácios de liquidez avaliam a gestão do curto prazo da organização. Os rácios de
funcionamento são, por excelência, os indicadores de eficiência do funcionamento operacional da
organização. O estudo da rendibilidade, é o alfa e o ómega da análise económica e financeira. Os rácios de
rendibilidade pretendem avaliar o retorno do dinheiro que é investido num determinado ativo

- O efeito da alavancagem financeira é o resultado da utilização de dívida no financiamento do investimento


da empresa e beneficiar os acionistas através de um aumento da rendibilidade dos capitais próprio

- O EVA valor económico criado quantifica o lucro económico da empresa. É a diferença entre o lucro que
a empresa obtém, deduzido do rendimento exigido pelos acionistas no momento do seu investimento

- A análise integrada das demonstrações financeiras utiliza um princípio que assenta na decomposição da
rendibilidade do investimento, em duas componentes, a rotação do ativo e a rendibilidade operacional.

- Os sinais de alerta são isso mesmo sinais que obrigam o analista a procura validar a informação com outras
fontes de informação contabilística e financeira

- O relatório de análise económica e financeira é um documento em que o financeiro faz um diagnóstico


fundamentado da organização, emitindo uma opinião sobre a situação analisada e perspetivas para o
futuro. O Relatório deve ter uma estrutura simples com uma síntese inicial, um enquadramento, a análise,
uma conclusão e perspetivas de futuro.

César Ferreira, 2020 61


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

Exercícios sobre análise com rácios

Exercício AR1
O gestor financeiro da empresa Alpha SA., precisa de construir o balanço patrimonial para os anos n e n-1.
Com base nos elementos disponíveis construa o balanço patrimonial com o maior nível de desagregação
possível para os anos n e n-1, e apresente uma breve análise através dos rácios que pode calcular.

O capital próprio subiu 1.000 € do ano n-1 para o ano n. No ano n os capitais permanentes são de 31.000
€ e subiram 5.000 € relativamente ao ano n-1. O fundo de maneio no ano n é de 11.000 € e no ano n-1 é
de 7.000 €. No ano n o ativo corrente é constituído por 25% de inventário, 50% de clientes a receber e 25%
de caixa, com as seguintes variações relativamente ao ano n-1, inventário +2.000 €, clientes a receber
+1.000 € e caixa +1.000 €. O passivo corrente, no ano n, tem a seguinte composição: fornecedores
55,5(5)%, outros passivos correntes 33,3(3)% sendo o restante empréstimos de curto prazo, relativamente,
ao ano n-1, registaram-se as seguintes variações, fornecedores +1.000 €, outros passivos correntes -1.500
€, empréstimos +500 €.

No ano n, os investimentos financeiros representam 25% do ativo não corrente e mantiveram o valor do
ano n-1. A empresa tem o seu capital social disperso por 10.000 ações (valor nominal de 1 euro) com um
valor no ano n de 2,0 euros. e no ano n-1 de 3,0 euros. As reservas mantiveram-se no montante de 2.000
€. nos anos em análise. Nos dois anos distribuíram-se 500 € de dividendos antecipados.

No relatório de gestão consta que a Demonstração de Resultados n n-1


autonomia financeira, no ano n-1, é de 40%, Proveitos operacionais: 100 000 90 000
Vendas 100 000 90 000
e a solvabilidade do ano n é igual a 60%. A Gastos Operacionais 84 000 75 500
rendibilidade do capital próprio, do ano n-1, Custo das vendas 51 000 45 000
Fornecimentos e serviços externos 5 000 5500
é de 25%, e a rendibilidade do ativo é de
Gastos com o pessoal 25 000 20 000
11,25% para o ano n, e 18,75% para o ano n- Outros Gastos e perdas 3 000 5 000
EBITDA 16 000 14 500
1. A taxa de imposto do ano n é de 40% e
Amortizações de Depreciações 8 500 7 000
12,5% no ano n-1. Resultados Operacionais 7 500 7 500
Proveitos financeiros 0 0
Gastos financeiros 5 000 3 500
Resultados Financeiros -5 000 -3 500
Resultado antes de impostos: 2 500 4 000
Imposto sobre o rendimento 1 000 500
Resultado líquido do exercício 1 500 3 500

César Ferreira, 2020 62


Finanças das Organizações A análise com rácios e o relatório económico financeiro

Exercício AR2
A empresa Beta SA. tem de construir o seu Demonstração de Resultados n n-1
balanço patrimonial partindo dos elementos que Proveitos operacionais: 102 125 90 090
Vendas 102 125 90 090
tem disponíveis neste momento que são os
Gastos Operacionais 84 625 75 590
seguintes: O capital social da empresa é Custo das vendas 50 000 45 000
Fornecimentos e serviços externos 7 000 5590
constituído por 10.000 milhões de ações com o
Gastos com o pessoal 25 125 20 000
valor nominal de 1 euro. No ano n-1 o valor das Outros Gastos e perdas 2 5000 5 000
contas de reservas e resultados transitados era EBITDA 17 500 14 500
Amortizações de Depreciações 8 500 7 000
de 3.725 M€. No ano n foram distribuídos Resultados Operacionais 9 000 7 500
dividendos no montante de 1.275 M€. A conta de Proveitos financeiros 0 0
Gastos financeiros 4 000 4 500
fornecedores cresceu 2.450 M€. Valores em M€. Resultados Financeiros -4 000 -4 500
As compras no ano n foram de 54.000 M€ e de Resultado antes de impostos: 5 000 3 000
Imposto sobre o rendimento 1 000 450
41.500 no ano n-1. No ano n-1, o saldo inicial de
Resultado líquido do exercício 4 000 2 550
clientes era de 10.000M€, de fornecedores de Autonomia Financeira 40% 38,75%
Solvabilidade 66,6(6)% ?
5.000 M€ e de inventário 2.500. A taxa de
Rácio de Liquidez Geral 250% 216,6(6)%
imposto efetiva em n-1 foi de 15% e de 20% em Rácio de Liquidez Reduzida 150% 150%
Rácio de Liquidez Imediata 50% 50%
n. Os valores estão em milhões de euros M€.
Rotação do Ativo 2,15 2,145
Calcule os rácios económico financeiros para a Tempo médio de Inventário 43,80 20,28
empresa Beta SA. Tempo médio de
32,17 40,52
Recebimento
Tempo médio de pagamento 24,00 43,98

Exercício AR3
A empresa Gamma, SA. apresentou a seguinte demonstração de resultados relativos aos anos n e n-1. O
capital social da empresa é constituído por 20.000 ações com o valor nominal de 1 euro, e, mantem-se
constante nos dois anos em análise. No ano n-1 o valor das contas de reservas e resultados transitados era
de 3.500 €. No ano n foram distribuídos Demonstração de Resultados n n-1
dividendos no montante de 146 €. O passivo Proveitos operacionais: 102 125 90 090
Vendas 102 125 90 090
corrente cresceu 3.000€ no ano n. O ativo Gastos Operacionais 84 625 75 590
cresceu 6.000€ e o Capital Próprio cresceu Custo das vendas 50 000 45 000
Fornecimentos e serviços externos 7 000 5590
2.654€ relativamente ao ano n-1. A conta de Gastos com o pessoal 25 125 20 000
empréstimos de curto prazo cresceu 300€ e a Outros Gastos e perdas 2 5000 5 000
EBITDA 17 500 14 500
conta de IRC a pagar reflete o imposto calculado
Amortizações de Depreciações 8 500 7 000
para o exercício correspondente. O valor das Resultados Operacionais 9 000 7 500
Proveitos financeiros 0 0
ações, à data de 13/dez/n-1, era de 1,2750€,
Gastos financeiros 4 000 4 500
durante o ano n o valor das ações cresceu 15 Resultados Financeiros -4 000 -4 500
Resultado antes de impostos: 5 000 3 000
cêntimos por ação. O ativo não corrente é
Imposto sobre o rendimento 1 000 450
constituído por ativos tangíveis nos anos em Resultado líquido do exercício 4 000 2 550
análise.

César Ferreira, 2020 63

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