Livro Metodologias Ativas de Ensino

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Organizadores

RAPHAELA BARROSO GUEDES-GRANZOTTI


KELLY DA SILVA
RODRIGO DORNELAS
CARLA P. H. A. R. CÉSAR

METODOLOGIAS ATIVAS DE ENSINO:


Experiência no Ensino em Saúde
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Bibliotecária responsável: Aline Graziele Benitez CRB-1/3129

M552 Metodologias ativas de ensino: experiências no ensino em saúde


1.ed. [recurso eletrônico] / [org.] Raphaela Barroso Guedes-Granzotti...
[et al.]. – 1. ed. – Curitiba, PR: Bagai, 2020.
Recurso digital.

Formato: e-book
Requisitos do sistema: adobe digital editions
Modo de acesso: world wide web
ISBN: 978-65-87204-74-1

1. Aprendizagem. 2. Educação em saúde. 3. Ensino superior. 4.


Instituição de ensino superior. I. Silva, Kelly. II. Dornelas, Rodri
go. III. César, Carla Patrícia Hernandez Alves Ribeiro.

CDD 610.7
11-2020/05 NLM WA-590

Índice para catálogo sistemático:


1. Aprendizagem: Educação em saúde: Ensino superior

https://doi.org/ 10.37008/978-65-87204-74-1.01.11.20
Raphaela Barroso Guedes-Granzotti
Kelly da Silva
Rodrigo Dornelas
Carla Patrícia Hernandez Alves Ribeiro César
(org.)

METODOLOGIAS ATIVAS DE ENSINO:


Experiência no Ensino em Saúde
1.ª Edição - Copyright© 2020 dos autores
Direitos de Edição Reservados à Editora Bagai.

O conteúdo de cada capítulo é de inteira e exclusiva responsabilidade do(s) seu(s)


respectivo(s) autor(es). As normas ortográficas, questões gramaticais, sistema de
citações e referencial bibliográfico são prerrogativas de cada autor(es).

Editor-Chefe Cleber Bianchessi

Revisão Os autores

Projeto Gráfico Alexandre Lemos Moreira

Conselho Editorial Dr. Adilson Tadeu Basquerote – UNIDAVI


Dr. Ademir A Pinhelli Mendes – UNINTER
Dr. Anderson Luiz Tedesco – UNOCHAPECÓ
Dra. Andréa Cristina Marques de Araújo - CESUPA
Dra. Andréia de Bem Machado - FMP
Dr. Antonio Xavier Tomo - UPM - MOÇAMBIQUE
Dra. Camila Cunico – UFPB
Dra. Elnora Maria Gondim Machado Lima - UFPI
Dra. Elisângela Rosemeri Martins – UESC
Dr. Ernane Rosa Martins - IFG
Dr. Helio Rosa Camilo – UFAC
Dr. Juan Eligio López García – UCF-CUBA
Dra. Larissa Warnavin – UNINTER
Dr. Luiz M B Rocha Menezes – IFTM
Dr. Marciel Lohmann – UEL
Dr. Márcio de Oliveira – UFAM
Dr. Marcos A. da Silveira – UFPR
Dra. María Caridad Bestard González - UCF-CUBA
Dr. Porfirio Pinto – CIDH - PORTUGAL
Dr. Rogério Makino – UNEMAT
Dr. Reginaldo Peixoto – UEMS
Dr. Ronaldo Ferreira Maganhotto – UNICENTRO
Dra. Rozane Zaionz - SME/SEED
Dr. Tiago Eurico de Lacerda – UTFPR
Dr. Tiago Tendai Chingore - UNILICUNGO - MOÇAMBIQUE
Dr. Willian Douglas Guilherme – UFT
Dr. Yoisell López Bestard- SEDUCRS
SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO................................................................................. 6

PREFÁCIO.............................................................................................7

FORMAÇÃO PARA O SUS: A PROBLEMATIZAÇÃO E A


APRENDIZAGEM BASEADA EM PROBLEMAS NO PROCESSO
ENSINO- APRENDIZAGEM .............................................................. 9
Raphaela Barroso Guedes-Granzotti
Kelly da Silva

DESAFIOS DA DOCÊNCIA EM METODOLOGIAS ATIVAS: DOS


ENCANTOS E SURPRESAS .............................................................. 19
Kelly da Silva
Vanessa Veis Ribeiro

A UNIVERSIDADE COMO CENÁRIO DE MODERNIZAÇÃO DAS


PRÁTICAS PEDAGÓGICAS...............................................................26
Carla Patrícia Hernandez Alves Ribeiro César
Raphaela Barroso Guedes-Granzotti

A AVALIAÇÃO NO CONTEXTO DE METODOLOGIAS ATIVAS:


UMA PROPOSTA DE DESCENTRALIZAÇÃO DOS SABERES......37
Rodrigo Dornelas
Carla Patrícia Hernandez Alves Ribeiro César

METODOLOGIAS ATIVAS: CONTRIBUIÇÕES E DIFICULDADES


PARA OS DISCENTES........................................................................50
Pablo Jordão Alcântara Cruz
Nathália Monteiro Santos

SOBRE OS AUTORES.........................................................................59
APRESENTAÇÃO

“Educação não transforma o mundo. Educação muda


pessoas. Pessoas transformam o mundo” (Paulo Freire)

Este livro tem como objetivo discutir a importância do uso de


Metodologias Ativas de Ensino para a formação de profissionais de
saúde preparados para os desafios da Saúde Pública Brasileira, bem
como compartilhar a experiência de docentes e discentes de um curso
de graduação estruturado em sua integralidade nas Metodologias Ativas
de Ensino e os desafios encontrados neste processo de construção do
Tutor-Aluno, que ensina e aprende mutuamente.
Este é um caminho de idas e vindas, da análise do ser educador.
As inquietações foram trazidas à tona, deixando-nos expostos, sensí-
veis e com um olhar ampliado para essa forma de construir conheci-
mento e fomentar profissionais da saúde mais responsáveis com o seu
entorno social.
Além disso, buscamos fomentar a reflexão a respeito da impor-
tância da modernização das práticas pedagógicas, do processo de Ensi-
no-Aprendizagem problematizador e significativo, do uso de jogos e
de estratégias artísticas como ferramentas integrativas dos materiais
estudados e as formas de avaliação de discentes neste cenário, consi-
derando as vicissitudes desse processo.

A todos e todas, uma agradável leitura.

Os organizadores

6
PREFÁCIO

Que livro é este? É um livro de ciência? É um livro de técnica?


É um livro de educação? De filosofia? De psicologia? Ousaria dizer que
é um livro que aponta caminhos para mudanças na educação.
“Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde”
é um livro que suscita e permite reflexões à luz do debate acerca da
educação que precisamos para o século XXI, rompendo com ideias
tradicionais e incorporando a concepção de uma aprendizagem ativa
para auxiliar os discentes no desenvolvimento das competências cogni-
tivas e socioemocionais e os docentes por meio da articulação eficiente
entre teoria e prática.
Cada capítulo que compõe este livro é atual, pois foi concebido
a partir das experiências vividas pelos autores, organizadas e orien-
tadas de acordo com suas crenças e práticas. Este livro é, pois, uma
viagem pelas metodologias ativas, ouso dizer que traz experiências
de profissionais que pensam “fora da caixinha” e que arriscam novas
possibilidades metodológicas.
O principal objetivo deste livro é promover o debate, a reflexão
crítica e a partilha de ideias que podem levar o leitor a semear planos
que estimulem a mudança de práticas pedagógicas. Os temas perpassam
desde a problemática conceitual das metodologias ativas de ensino até
as contribuições e dificuldades para os discentes. Desse esforço resulta
uma contribuição valiosa para os leitores, pois explicita de modo claro
os conceitos abordados.
Além disso, busca fomentar a reflexão a respeito da importância
da modernização das práticas pedagógicas, do processo de ensino-apren-
dizagem problematizador, das formas de avaliação de discentes e dos
desafios e valorização da docência, pois educação e atividade docente
não se fazem isoladamente, por serem atos interligados de afetividade/
amorosidade.
Assim, a riqueza deste livro está na preocupação dos autores em
apresentar diferentes olhares e induzir o leitor a adotar comportamentos
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Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

e atitudes que conduzam a uma construção coletiva sobre o conheci-


mento. A ideia é pensar na mudança e no papel que cada um de nós tem
nesse processo, entendendo as metodologias ativas como um meio de
construção do professor-aluno para ensinar e aprender mutuamente.
Do começo ao fim, o objetivo proposto pelos autores é escre-
ver algo que induza ao pensamento crítico e responsável, criando a
oportunidade para se refletir sobre a educação que temos, a educação
que queremos e a educação que precisamos para construir o País que
desejamos.

Profa. PhD, MD Isa Regina Santos dos Anjos


Departamento de Educação
Universidade Federal de Sergipe
Campus Prof. José Aloísio de Campos
São Cristóvão, Sergipe

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FORMAÇÃO PARA O SUS: A PROBLEMATIZAÇÃO
E A APRENDIZAGEM BASEADA EM PROBLEMAS
NO PROCESSO ENSINO- APRENDIZAGEM

Raphaela Barroso Guedes-Granzotti


Kelly da Silva

“A educação exige os maiores cuidados, porque influi


sobre toda a vida” (Sêneca)

Embora as últimas décadas tenham sido marcadas por profundo


avanço científico e tecnológico em diversas áreas do saber, na Edu-
cação, mesmo mediante um elevado números de estudos na área da
aprendizagem, o foco permanece majoritariamente na transmissão
de informações.
É ainda muito comum a influência do método tradicional de
ensino, centrado no docente e na transmissão de conteúdo, em que os
estudantes mantêm uma postura passiva, apenas recebendo e memori-
zando as informações em uma atitude de reprodução (DIESEL; BALDEZ;
MARTINS, 2017). Nessa perspectiva, a formação dos profissionais da área
da saúde tem sido marcada por práticas assistencialistas e reabilitadoras,
tendo como objetivo maior o diagnóstico de doenças, o atendimento
individualizado e regulado por demanda espontânea.
O perfil deste profissional, muitas vezes dissociado das reais
necessidades do sistema de saúde brasileiro, fez surgir diversos ques-
tionamentos e reflexões que fizeram com que as Instituições de Ensino
Superior passassem a buscar alternativas para que a formação destes
profissionais fosse capaz de contemplar a conjuntura das políticas
públicas vigentes, por meio de modificações nas práticas pedagógicas,
aproximando-se da realidade social, com destaque para o Sistema Único
de Saúde (SUS), com uma prática que valoriza a integralidade, o cuidado
humanizado e a promoção à saúde.

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Nesse contexto, discussões a respeito do uso das Metodologias


Ativas (MAs) de ensino-aprendizagem como Problem Based Learning (PBL)
ou Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP), a Metodologia da Pro-
blematização com o Método do Arco de Charles Maguerez, Tecnologias
Digitais de Informação e Comunicação (TDICs), Sistemas Tutoriais para
o ensino a distância (EaD), Laboratórios de Simulação, Peer Instruction
(ou Instrução entre Pares), Ensino Híbrido, Perestroika (Experience
Learning ou Aprendizagem Experencial), Team-Based Learning (TBL, ou
Aprendizagem Baseada em Times/Equipes), Project Based Learning (ou
Aprendizagem Baseada em Projetos), entre outras; receberam destaque.
Isso por terem como alicerce em comum a autonomia do estudante e
como objetivo a formação de sujeitos sociais com competências éticas,
políticas, técnicas e dotados de conhecimento, raciocínio, crítica, res-
ponsabilidade e sensibilidade para as questões da vida e da sociedade;
capacitando os futuros profissionais para intervirem em contextos
de incertezas e complexidades (BERBEL, 1998, 2011; FREIRE, 2006;
MASETTO, 2018).
Na perspectiva das Metodologias Ativas (MAs) a estratégia de
ensino é centrada no estudante, que deixa o papel de receptor passivo
e assume o de agente principal, responsável pela sua aprendizagem ao
pesquisar, refletir e analisar possíveis situações para tomada de deci-
são, ao serem apresentados a problemas e/ou desafios que mobilizam
o seu potencial intelectual, enquanto estuda para compreendê-los e/ou
superá-los (BERBEL, 2011; DIESEL; BALDEZ; MARTINS, 2017).
Se o foco das MAs é a autonomia do estudante, visando a
autoaprendizagem, qual o papel do docente? O primeiro passo é ter a
ciência de que esse processo não deve ser mecânico, de transmissão de
conhecimentos, mas sim de novas possibilidades para a construção do
conhecimento, como Freire, em 1996, já argumentava. O docente deve
assumir um papel de tutor, mediador, facilitador e ativador do processo
de aprendizagem, de tal forma que
(...) Percebe-se, assim, a importância do papel do
educador, o mérito da paz com que viva a certeza de
que faz parte de sua tarefa docente não apenas ensi-

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Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

nar os conteúdos, mas também ensinar a pensar


certo. Daí a impossibilidade de vir a tornar-se um
professor crítico se, mecanicamente memorizador,
é muito mais um repetidor de frases e de ideias
inertes do que um desafiador (FREIRE, 1996, p. 14).

Somando-se a mudança de postura do estudante e do docente


alguns princípios, sintetizados na figura a seguir (Figura 1), são essenciais
para uma abordagem pautada nas MAs de ensino-aprendizagem, sendo
importante salientar que o aprendizado se dá a partir de problemas e
situações reais capazes de representar antecipadamente, durante o
curso, vivencias futuras da vida profissional (MORÁN, 2015).

Figura 1. Princípios que constituem as Metodologias Ativas de Ensino

Fonte: Adaptado de Diesel; Baldez; Martins (2017)

Com o objetivo de iniciar um novo ciclo no processo de forma-


ção de profissionais da área de saúde a Universidade Federal de Sergipe

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(UFS), no ano de 2011, deu início a uma proposta inovadora: implantar


um campus no interior do Estado com oito cursos de graduação tendo
como proposta pedagógica a utilização exclusivamente de MAs de
ensino-aprendizagem.
A primeira percepção que se tem ao analisar o Projeto Peda-
gógico destes cursos é o fim dos semestres ou ano letivo que foram
substituídos por Ciclos, assim como a substituição das disciplinas por
Módulos teóricos e/ou práticos de aprendizagem. Cada Ciclo tem a
duração de um ano e é constituído por diversos Módulos a depender
do curso, com exceção ao Ciclo I - que é comum a todos os cursos.
O Ciclo I, também denominado de Ciclo Comum, contempla os
conteúdos básicos necessários à formação de todos os profissionais da
saúde e é obrigatório para aos estudantes dos cursos de Enfermagem,
Farmácia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Medicina, Nutrição, Odontologia
e Terapia Ocupacional na proposta de estudo interdisciplinar. Todos os
Módulos neste Ciclo são ofertados pelo Departamento de Educação em
Saúde que tem em seu quadro, docentes de diversas áreas de formação
possibilitando a troca de saberes e ciências.
A partir do Ciclo II, iniciam-se os chamados ciclos profissiona-
lizantes, com módulos direcionados à opção profissional do discente.
Ciclos esses que devem considerar segundo Masetto (2018), que
(...) não se ensina uma profissão: “aprende-se”,
desenvolve-se, conquista-se uma formação profis-
sional com o desenvolvimento de conhecimentos,
de competências e habilidades, e de atitudes e
valores profissionais.

Apesar do funcionamento dos cursos serem semelhantes, variam


quanto à duração e as peculiaridades de cada profissão. Especificamente
no curso de Fonoaudiologia, os Ciclos II e III seguem os ciclos de vida
e, dessa forma, o Ciclo II trabalha conteúdos relacionados à infância e
à adolescência; e o Ciclo III as questões do adulto e do idoso. Ficando
o Ciclo IV voltado para a realização de estágios clínicos e institucionais

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Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

e para a elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso (DORNELAS


et al., 2014).
Os Módulos têm objetivo de analisar os pressupostos teórico-
-práticos da Fonoaudiologia dentro de eixos temáticos estabelecidos no
ementário do projeto pedagógico, levando os discentes a conciliar a parte
teórica, ofertada na forma de ABP, com as habilidades e competências
necessárias para a prática clínica futura. Na proposta curricular, a ABP
é o eixo principal do aprendizado técnico-científico, desenvolve-se com
base na resolução de problemas propostos, com a finalidade de que o
estudante aprenda determinados conteúdos (DORNELAS et al., 2014;
GUEDES-GRANZOTTI et al., 2015a).
Em cada módulo temático o conteúdo é trabalhado por meio
de Sessões Tutoriais (STs) e práticas de habilidades. Cada ST, também
chamada de grupo tutorial, fundamenta e sustenta teoricamente todas
as outras práticas, ocorrendo em pequenos grupos (de oito a dez alunos)
e um docente/tutor. Entre os estudantes, um será o coordenador e outro
será o secretário, rodiziando em cada encontro, para que todos exerçam
essas funções. Desta forma, exercitam a liderança e a organização de
equipes, sendo esta uma habilidade e competência necessária para a
formação profissional.
Em cada ST os estudantes são apresentados a uma situação-pro-
blema (SP) como ferramentas disparadoras para detecção dos objetivos
de estudo a serem alcançados naquele momento. Para tanto, é necessário
que percorram um caminho constituído por sete passos: 1) leitura da
SP proposta; 2) identificação de palavras ou termos desconhecidos; 3)
formulação, pelos estudantes, de hipóteses explicativas; 4) levantamento
das prováveis fundamentações de tais hipóteses (etapa baseada em
conhecimentos prévios); 5) definição dos objetivos de aprendizagem,
que são as âncoras disparadoras do estudo individual; 6) aprendizagem
autodirigida (AAD). Nesse momento a sessão é interrompida para que o
discente busque referências e explicações para a solução do problema
em questão e 7) Fechamento da SP, em que os discentes voltam à ST para
apresentarem seus estudos individuais e coletivamente responderem

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Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

ao problema exposto na situação-problema (BERBEL, 1998; DORNELAS


et al., 2014).
Cabe ressaltar que na AAD, a busca pela resolução do problema
levantado é individual e livre, importante para a retenção do conheci-
mento, o que significa que o aprendiz pode pesquisar sobre os assuntos
nas variadas fontes informativas, assim como pode também ouvir a
opinião de especialistas na área.
Aqui é necessário fazer um adendo sobre a importância de um
espaço para a pesquisa, sobretudo para os discentes em vulnerabilidade
social que apresentam dificuldades de acesso à internet e livros didá-
ticos em suas residências, ou seja, a biblioteca, por ser o local onde os
estudantes vão em busca de atingir os objetivos cognitivos pretendidos
a partir dos problemas previamente discutidos. Para isso a instituição
deve oferecer, além de uma ampla infraestrutura, um acervo atualizado
e acesso à internet. Desta forma, na ST seguinte, no sétimo passo, o dis-
cente retorna à sessão para a rediscussão do problema frente aos novos
conhecimentos adquiridos e assim, elaboram uma síntese do assunto,
ratificando ou não suas hipóteses iniciais e agregando as informações
discutidas pelos colegas.
Frente ao exposto, denota-se que a situação-problema ocupa um
papel central na ST e deve ser elaborada com base em objetivos previa-
mente definidos e representando situações reais. Envolvem então, um
cenário desafiador que não se resolve apenas nas informações indivi-
duais, mas sim no coletivo, em que o grupo irá unir vários saberes de
forma crítica e com espírito de coletividade em busca de uma resolução
que responde ao problema elencado (DINIZ, 2018). Não se trata apenas
de objetivos de estudo de conteúdos isolados, mas do retorno à ST para
respondê-la, respeitando os diversos cenários utilizados.
Além disso, é importante que a SP suscite conhecimentos prévios
para melhor retenção e devem sempre estar relacionadas com a prática
profissional futura. Além das especificidades da área, alguns aspectos
como clareza, associação do assunto específico a ser tratado, articulado
à conjuntura atual do Sistema de Saúde locorregional, no Brasil e no

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Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

Mundo e as possibilidades de se levantar hipóteses relacionadas ao


assunto, devem ser observadas durante a sua elaboração (DORNELAS
et al., 2017; GUEDES-GRANZOTTI et al., 2015b; LIMA; LINHARES, 2008).
Como os cenários são dinâmicos, o mesmo deve ocorrer com as SPs.
A este respeito, Irineu et al. (2017) comentaram que os ajustes nas SPs
necessitam ser constantes para uma formação qualificada em saúde,
devem ser construídos de forma que permitam uma discussão sobre o
assunto no tempo a ele destinado e precisam sempre aumentar o grau
de complexidade.
Simultaneamente às STs, como parte dos Módulos, ocorrem
semanalmente as práticas de habilidades, também chamadas de oficinas,
que possibilitam a aprendizagem em modelos, pacientes simulados,
observação intensa do “como fazer” e o aprendizado de habilidades dos
estudantes com seus pares; práticas necessárias para o futuro exercício
profissional. Para Gesteira et al. (2012) é uma estratégia de ensino e
aprendizagem que auxilia também na diminuição da insegurança do
estudante ao adentrar nas atividades práticas e estágios do curso de
graduação, além de proporcionar autonomia e interesse pelo conteúdo
discutido.
Quando se fala em atividades práticas entramos também em
mais um dos pilares importantes das MAs que é a indissociabilidade da
teoria e da prática e o conceito de “aprender fazendo”, em que se discute
a sequência tradicional teoria-prática na produção de conhecimento,
trazendo a ideia de que o processo ensino-aprendizagem precisa estar
vinculado aos cenários da prática e deve estar presente ao longo de toda a
graduação. Isso requer dos profissionais constantes reflexões sobre suas
ações e planejamento baseado na realidade, sendo necessário incentivar
e adequar as práticas educativas. Contudo, não se deve supervalorizar
a aprendizagem prática em detrimento da teórica, mas sim encontrar
alternativas que equilibrem essas duas habilidades do saber (MITRE et
al., 2008), sendo isto o que vislumbramos em nosso campus.
Seguindo essa proposta, o curso possui nos Ciclos I, II e III módu-
los denominados Práticas de Ensino na Comunidade (PECs) que utilizam

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Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

a Metodologia da Problematização, que tem como referência o Método


do Arco de Charlez Maguerez, sustentada no referencial teórico-filo-
sófico de Paulo Freire que considera a necessidade de um cenário real
para que a construção do conhecimento ocorra a partir da vivência de
experiências significativas.
A Metodologia da Problematização se divide em cinco etapas
que se desenvolvem a partir da realidade ou um recorte da realidade,
a saber: 1) Observação da Realidade a partir da designação do tutor de
um tema ou unidade de estudo, sendo os estudantes orientados a olhar
atentamente e registrar detalhadamente tudo o que perceberem sobre os
problemas vivenciados dentro daquela realidade social; 2) Identificação
dos Pontos-Chave, em que o discente parte de informações prévias para
refletir sobre as causas e determinar os pontos essenciais do problema;
3) a Teorização é momento para a busca de conhecimentos científicos
no intuito de se compreender as manifestações e os princípios teóricos
do problema; 4) Hipóteses de Solução são construídas após o estudo,
como fruto da compreensão profunda que se obteve sobre o problema,
investigando-o de todos os ângulos possíveis; e 5) Aplicação à Realidade
é o momento em que o estudante coloca em prática as soluções mais
viáveis do estudo (BERBEL, 1998; GUEDES-GRANZOTTI et al., 2015a).
Como pode ser visto, a utilização de MAs no ensino superior como
eixo do Projeto Pedagógico têm um enorme potencial para despertar a
curiosidade do estudante fazendo com que insiram na teorização, seja
na forma da ABP ou da Problematização, novos elementos muitas vezes
não considerados na própria perspectiva do docente, proporcionando
que cada grupo origine discussões e resoluções muitas vezes diferentes
para um mesmo problema/situação.
Indo mais além, quando essas contribuições são acatadas, anali-
sadas e valorizadas pelo tutor são um novo estímulo para o engajamento
e empoderamento deste estudante, potencializando os sentimentos de
percepção de competência e de pertencimento, essenciais na formação
de um profissional crítico e reflexivo engajado na sua realidade social.

16
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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rentes termos ou diferentes caminhos? Interface – Comunic, Saúde, Educ, v.
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17
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PINTO, N. M.; MEIRELLES, C. A. B.; PINTO-PORTO, C.; MOREIRA, T.; HOFF-
MANN, L. M. A. Metodologias ativas de ensino-aprendizagem na formação
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DESAFIOS DA DOCÊNCIA EM METODOLOGIAS
ATIVAS: DOS ENCANTOS E SURPRESAS

Kelly da Silva
Vanessa Veis Ribeiro

“O essencial é saber ver –


Mas isso (triste de nós que trazemos a alma vestida!).
Isso exige um estudo profundo,
Uma aprendizagem de desaprender...
Procuro despir-me do que aprendi
Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram
E raspar a tinta com que me pintaram os sentidos,
Desencaixotar as minhas emoções verdadeiras,
Desembrulhar-me e ser eu...”
(ALBERTO CAIEIRO)

Tem sido observado nos últimos anos acentuadas transforma-


ções na forma de ensinar. Discussões neste campo são precedidas por
reflexões, inquietações e mudanças de concepções que envolvem como
se aprende e como se ensina. A prática pedagógica dos tempos atuais
deve levar em consideração os desafios do tempo presente, por meio
de metodologias de ensino que respondam às limitações dos métodos
tradicionais de ensino e que auxiliem no desenvolvimento de habilidade
e competências necessárias para atuação em diversos cenários reais. As
modificações na forma de aprender dos discentes exigem hoje processos
cada vez mais interativos e colaborativos que resultam em discentes
com mais autonomia e independência (OLIVEIRA; PADILHA, 2017).
A sociedade do conhecimento é pautada em competências de
ordem cognitiva, pessoal e social. Esse tipo de conhecimento não é
adquirido de forma tradicional. Ele exige uma postura de proatividade,

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Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

colaboração, personalização e visão empreendedora (MORÁN, 2015). As


Metodologias Ativas (MAs) apresentam-se como uma nova perspectiva
para o processo de ensino-aprendizagem. Porém, há que se discutir os
desafios em sua implementação, principalmente por parte do docente
(PAIVA et al., 2016).
A construção da docência exige o diálogo de múltiplos saberes, em
que os conhecimentos profissionais de uma determinada área precisam
dialogar com os saberes pedagógicos. Entretanto, os docentes univer-
sitários carecem de formação pedagógica (ALTHAUS; BAGIO, 2017). Se
para os professores de metodologias tradicionais esta defasagem na
formação se configura como desafio, para os tutores de MAs soma-se
o fato de não ter participado, como aluno, desta proposta pedagógica.
Ser docente de um curso baseado em MA de Ensino é um desa-
fio que começa com a ruptura do uso da pedagogia expositiva ou de
transmissão de informação como ferramenta de Ensino. Boa parte
dos tutores de cursos em MA tiveram a sua formação em cursos que
utilizam metodologias tradicionais, em que o professor é o detentor da
informação e responsável pela transmissão aos seus discentes, e o pro-
cesso de ensino-aprendizagem é visto como uma relação causal, linear.
Aliado a isso, está o fato de que muitos docentes não receberam
nenhum tipo de formação pedagógica durante a sua formação, sendo
o mais próximo disso, eventuais disciplinas de metodologia de ensino
cursadas na pós-graduação stricto sensu (SEIXAS et al., 2017). Dessa
forma, grande parte dos docentes não tem formação pedagógica ou
experiência prática com o uso de MA, tornando difícil conduzir um
processo em que precisa conseguir que todos aprendam de forma
competente a conhecer, a construir seus projetos de vida e a conviver
com os demais (MORÁN, 2015).
A primeira provocação então é se despir dos modelos tradicio-
nais da docência e da previsibilidade de uma aula tradicional. Sentar
em roda, dialogar, tutoriar uma discussão em que os discentes têm a
liberdade de buscar os materiais de estudo de forma independente,
essas estratégias exigem do docente uma atualização constante e uma

20
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

flexibilização cognitiva para a acomodação das novas informações


compartilhadas.
Esta inovadora prática pedagógica leva ao desconhecido e, por
isto, muitas vezes é interpretada como uma ameaça ao posto de Docente.
Entretanto, este “desconhecido” possibilita novas perspectivas e promove
transformação. Assim, novos caminhos são reconstruídos por meio da
reflexão, da crítica e do compromisso de se fomentar a autonomia, a
liberdade, o diálogo e a solução dos conflitos (MITRE, 2008).
Além da mudança na postura do docente, o discente também pre-
cisa alterar sua postura passiva e tornar-se protagonista do seu processo
de aprendizagem por meio dos direcionamentos dos docentes. Assim,
nas MAs, o ensino-aprendizagem torna-se uma responsabilidade cole-
tiva (SEIXAS et al., 2017). Dessa forma, a dificuldade quanto à formação
profissional do educador é umas das mais frequentes (PAIVA et al., 2016).
Para os docentes de módulos e temas de saúde, soma-se o desafio
de pensar a saúde fora da dicotomia saúde-doença. Críticos da área da
Educação apontam a hegemonia nos cursos da área da saúde, da abor-
dagem biologicista, medicalizante e procedimento-centrada (CECCIM;
FEUERWERKER, 2004). As MAs buscam compreender o sujeito em suas
dimensões biopsicossociais e configura aí um desafio: contribuir nesta
troca constante para se tornar e formar profissionais que atuem nos
princípios de humanização, acolhimento e atenção integral à saúde.
Ainda, para que o docente tenha total conhecimento acerca das
competências profissionais esperadas para os alunos que estão em for-
mação, torna-se necessário que ele tenha conhecimento sobre o Projeto
Político-Pedagógico do Curso (PPC), bem como conhecimento e expe-
riência sobre a disciplina, ou módulo, que está ministrando. Essa difi-
culdade aumenta quando o docente atua em mais de um departamento.
Tais requisitos são necessários para que o docente possa auxiliar o
discente a desenvolver uma postura de autonomia, dedicação, proativi-
dade, reflexão, discussão, facilidade na resolução de problemas práticos
e tomada de decisão, a fim de adquirir e aprimorar as competências
necessárias para um bom desempenho profissional (SEIXAS et al., 2017).

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Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

Assim, o docente que utiliza MA se renova e se recria, a cada


encontro com o corpo discente, pois o conhecimento é construído
coletivamente, tendo a possibilidade de aprender e refletir sobre a
realidade, de forma coletiva e democrática. Tem ainda a oportunidade
de enxergar sob diversas ópticas e locais de fala.
Em um momento de elevado números de publicações científicas,
a diversidade das discussões tem sempre presença garantida. Cada
encontro é uma nova aprendizagem, pois mudam-se os cenários proble-
matizadores, mas sobretudo modificam-se os olhares para as resoluções
destes. A problematização começa a fazer parte da rotina mental, em
busca das melhores resoluções para as situações vivenciadas. O dis-
cente e o docente então deslocam o papel de problematizadores para
o de modificadores das Situações-Problemas ou dos Problemas reais.
Porém, é importante salientar que a efetividade dos processos de
ensinagem não são as únicas metas de um docente que atua em MA. Os
afetos e a aprendizagem significativa são utilizados como fim e como
meio no processo de aprender e ensinar mutuamente.
Assim, o uso de tecnologias e de jogos muitas vezes proporciona a
oportunidade de aprender de uma forma mais interativa e interessante
para o aluno (MORÁN, 2015). Unir as discussões teóricas às habilidades
e competências necessárias para a prática profissional é um grande
desafio do docente, e nesta direção os jogos podem ser utilizados como
ferramentas pedagógicas facilitadoras (SILVA, 2018). Este recurso pro-
move motivação, incentiva o raciocínio, a argumentação e a interação
entre os participantes (LEGEY, 2012).
No módulo: Linguagem no adulto e no idoso, ofertado pelo Depar-
tamento de Fonoaudiologia de Lagarto (DFOL) da Universidade Fede-
ral de Sergipe (UFS) a revisão de todo conteúdo teórico, bem como a
integração com os aprendizados que envolvem a prática profissional é
realizada por meio de um jogo de tabuleiro denominado como Detetive
da Linguagem. Este módulo é ofertado para no máximo doze discentes
por vez, quatro vezes ao ano.

22
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

Os participantes são divididos em equipes e juntos precisam


responder perguntas com temas centrais discutidos durante o módulo
e resolver casos clínicos, em que a cada jogada novas pistas que eluci-
darão o provável diagnóstico bem como sua etiologia serão apresenta-
das (SILVA et al., 2018). Para além do ganhar ou perder, esta estratégia
possibilita que a autoavaliação ocorra de forma mais consciente, visto
que facilita a percepção dos pontos que precisam ser revisitados, para
possibilitar as resoluções dos casos clínicos.
Esta experiência gerou um trabalho científico que teve como
objetivo descrever a percepção de discentes sobre a utilização da estra-
tégia do jogo detetive para revisão de conteúdo. Como resultados foram
apontadas quatro categorias de respostas: 1) A estratégia utilizada como
promotora da revisão do módulo, em que os discentes avaliaram o uso
desta estratégia pedagógica como dinâmica e em movimento; 2) A efi-
ciência do uso do jogo como facilitador da revisão em que a estratégia
foi avaliada como adequada e significativa para a revisão do módulo;
3) A construção do conhecimento adquirido em que foi apontado como
estratégia para se construir o conhecimento de forma coletiva; e, 4) O
contexto da aplicação deste recurso pedagógico, em que os discentes
conseguiram associar o conteúdo trabalhado no módulo com a prática
clínica profissional (SILVA et al., 2018).
Certamente, compreender o processo do Ensino-aprendizagem e
a influência da afetividade neste processo possibilita uma maior eficácia
(MAHONEY; ALMEIDA, 2005). Por isto, ainda neste módulo os discen-
tes são convidados a construir um portfólio paralelo ao exigido como
parte integrante da avaliação do módulo, chamado de “Portfólio das
emoções”, em que para cada assunto abordado o discente pode escolher
qualquer manifestação artística para expressar seu olhar subjetivo sobre
o assunto. Os que desejarem, ao final do módulo, podem apresentar ao
grupo. Emergem talentos diversos, visto que algumas pessoas preferem
criar a sua própria poesia, pintura ou letra de música. É um momento
de partilha mediado pela arte. Uma possibilidade de integração. Um
recurso de expressão das emoções frente ao conhecimento adquirido.
É, sobretudo, um momento de fomentar a motivação do discente.
23
Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

Motivar o discente é ainda importante função e um grande desa-


fio docente (SEIXAS et al., 2017). As MAs colocam o aluno no papel de
precursor da sua aprendizagem. O trabalho com motivação é muito
importante para que os alunos se expressem, dialoguem e contribuam
na construção e no desenvolvimento das competências e conhecimentos
necessários para a atuação profissional. Motivar o aluno é essencial
para que ele tenha mais vontade de participar e sentir-se desafiado e,
consequentemente, fornece maior chance de eficácia com o uso de MA.
Por fim, a responsabilidade de avaliar e mensurar o desempenho
dos discentes e o seu próprio, enquanto docente, requer uma atenção
acurada e sensível. Em MA, como discutido no capítulo 4 (“A avaliação
no contexto de Metodologias Ativas: uma proposta de descentralização
dos saberes”), a avaliação é mútua. O docente avalia e é avaliado, da
mesma forma que ensina e aprende, em um processo indissociável.
Mas a avaliação é sempre um momento de reflexão na prática
docente. Como avaliar o discente que não se sente à vontade para dis-
cussões em grupo? Como conseguir a sua participação voluntária sem
com isto gerar uma apreensão do ter-de-falar? Como avaliar o processo
de formação, sem com isto classificar os discentes entre os que tem
bom ou mal desempenho? Como libertar os discentes dos estigmas
carregados por anos, de maus alunos? São perguntas que precisam
inquietar o docente inserido nesta metodologia de ensino.
Para finalizar, o desenvolvimento da autonomia conciliada com o
coletivo e a busca por uma educação que promova a visão do todo e pro-
porcione mudanças sociais, em rede, são grandes desafios da atualidade.
Portanto, há uma busca crescente de aliar metodologias inovadoras de
ensino-aprendizagem, que promovam uma prática pedagógica ética,
reflexiva, que transponha o treinamento estritamente técnico e que pense
a formação como um diálogo entre ação-reflexão-ação (MITRE, 2008).
Assim, mesmo com tantos nós e desafios, acreditar em uma edu-
cação libertadora e com potencial para mudar sistemas e mundos é um
encantamento que motiva este eterno movimento de ensinar-aprender.

24
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALTHAUS, M. T. M.; BAGIO, V. A. As Metodologias Ativas e as aproximações entre
o ensino e a aprendizagem na prática pedagógica universitária. Rev. Docência
Ens. Sup., Belo Horizonte, v. 7, n. 2, p. 79-96, 2017.

CECCIM, R. B.; FEUERWERKER, L. C. M. Mudança na graduação das profissões


de saúde sob o eixo da integralidade. Cad. saúde pública.,Rio de Janeiro, v. 20,
n. 5, p.1400-1410, 2004.

LEGEY A. P.; MOL A. C. A.; BARBOSA J. V.; COUTINHO C. M. L. M. Desenvol-


vimento de jogos educativos como ferramenta didática: Um olhar voltado à
formação de futuros docentes de ciências. Alexandria: R. Educ. Ci. Tec., Flo-
rianópolis, v. 5, n. 3, p. 49-82, 2012.

MAHONEY, A. A.; ALMEIDA, L. R. de. Afetividade e processo ensino-aprendiza-


gem: contribuições de Henri Wallon. Psicol. educ., São Paulo, v. 20, p. 11-30, 2005.

MITRE, A. M.; SIQUEIRA-BATISTA, R.; GIRARDI-DE-MENDONÇA, J. M.; MORAIS-


-PINTO, N. M.; MEIRELLES, C. A. B.; PINTO-PORTO, C.; MOREIRA, T.; HOF-
FMANN, L. M. M. Metodologias ativas de ensino-aprendizagem na formação
profissional em saúde: debates atuais. Ciênc. Saúde Colet., Rio de Janeiro, v.
13, n. 2, p. 2133-2144, 2008.

MORÁN, J. Mudando a educação com metodologias ativas. In: SOUZA, C. A. DE;


MORALES, O. E. T. (Eds.). Convergências midiáticas, educação e cidadania:
aproximações jovens. 2. ed. Ponta Grossa: Foca Foto-PROEX/UEPG, 2015. p. 15-33.

OLIVEIRA, C. C. B.; PADILHA, M. A. S. A colocação em cena docente no ensino


médico em um contexto de metodologia PBL aliado a um ambiente virtual de
aprendizagem. Redin.,Taquara, v. 6, n. 1, p. 1-4, 2017.

PAIVA, M. R. F.; PARENTE, J R. F.; BRANDÃO, I. R.; QUEIROZ, A. H. B. Meto-


dologias ativas de ensino-aprendizagem: revisão integrativa. SANARE, Sobral,
v. 15, n. 2, p.145-153, 2016.

SEIXAS, E. P. A.; ARAUJO, M. V. P.; BRITO, M. L. A.; FONSECA, G. F. Dificulda-


des e desafios na aplicação de metodologias ativas no ensino de turismo: um
estudo em instituição de ensino superior. Turismo - Visão e Ação - Eletrônica,
Camboriú, v. 19, n. 3, p. 566-588, 2017.

SILVA, K.; GUEDES-GRANZOTTI, R. B.; CÉSAR, C. P. H. A. R.; DORNELAS, R.


O jogo como ferramenta de ensino e aprendizagem em Fonoaudiologia. Rev.
Íbero-Am. Estud. Educ., Araraquara, v. 13, n. 1, p. 78-88, 2018.

25
A UNIVERSIDADE COMO CENÁRIO DE
MODERNIZAÇÃO DAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

Carla Patrícia Hernandez Alves Ribeiro César


Raphaela Barroso Guedes-Granzotti

“A Universidade ideal é aquela que aproxima seus atores


da vida que desejam construir em sociedade, possibilitando
a interpretação de diferentes olhares sobre um mesmo
cenário” (Carla César)

Neste capítulo vamos focar nossa atenção em um tema que é


dinâmico e que precisa, para ser compreendido, ser interpretado dentro
do contexto sócio-histórico no qual está inserido.
Inicialmente, pode-se vislumbrar uma desarticulação entre os
ensinos médio e superior no Brasil. Em ambos, há a utilização majoritária
de métodos conteudistas, centrado na figura do professor – detentor
do conhecimento e o estudante como um ser passivo, memorístico e
mecânico (SILVA et al., 2016). Qual o impacto do estudante, que sempre
esteve acostumado a “ouvir o professor passar o conteúdo” para tornar-
-se um sujeito que busca ativamente o seu conhecimento? Podemos
afirmar, sem sombra de dúvidas, é grande.
Para tanto, há de se sensibilizar os jovens para essa mudança de
paradigma no ensino superior. O interessante seria uma revisitação em
todos os níveis de ensino, mas para não fugirmos do escopo pretendido,
vamos nos ater à Educação Superior, isto porque para adentrar no mundo
do trabalho em saúde, há a necessidade, para a grande maioria desses
profissionais, do ingresso em Instituições de Ensino Superior.
Na Universidade Federal de Sergipe essa sensibilização ocorre no
Primeiro Ciclo do curso, nos campi Lagarto e Sertão, cujos estudantes
ingressam em turmas heterogêneas para a configuração de turmas.
Assim, os estudantes da área da Saúde (Enfermagem, Farmácia, Fisio-
terapia, Fonoaudiologia, Medicina, Nutrição, Odontologia e Terapia
Ocupacional) cursam em pequenos grupos, como já descrito anterior-
26
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

mente, os módulos de ensino e aprendizagem. É lá que apreendem os


primeiros constructos das metodologias ativas (MAs).
E por que formar jovens mais autônomos, em ambientes de maior
colaboração e com maior criticidade? Porque estamos inseridos em uma
sociedade tida como a do conhecimento, em virtude do incremento da
informação, das tecnologias e da valorização da solução de problemas
complexos. No entanto,
(...) Para que as Metodologias Ativas façam a dife-
rença no ensino superior, sua utilização deve estar
integrada aos objetivos de formação profissional, ao
protagonismo do aluno e a uma atitude de mediação
pedagógica do professor (MASETTO, 2018, p. 650).

E esse é um grande desafio, em qualquer que seja o método de


educação (tradicional, ativa, presencial ou a distância): ter um Projeto
Político Pedagógico de um curso (PPC) construído de forma que todos
os atores envolvidos estejam ativamente envolvidos tanto na sua cons-
trução, quanto na execução e em sua avaliação. Gomes e Vazquez (2020)
comentaram que para a consolidação de um PPC há de se instigar a
gestão democrática, o incentivo à ecologia de saberes, a ampliação do
pertencimento social da Universidade no território de sua localização;
bem como o conhecimento dos limites e das possibilidades de produ-
ção coletiva.
Não é sem motivo que o projeto pedagógico é chamado de “polí-
tico”. As congruências entre o almejado e o alcançado é que serão os
indicadores de seu sucesso, bem como a conquista de um leque de
relações interinstitucionais com as secretarias da saúde, da educação,
do trabalho entre outras, possibilitando a aproximação dos problemas
reais, a discussão desses cenários e o seu enfrentamento com soluções
criativas. E tudo isto não se faz sozinho, mas com intenção e motivação
para a mudança por parte de todos os envolvidos.
O estabelecimento de alianças, de comprometimento e de senso
crítico permitem a ressignificação da realidade. Cabe aqui um destaque

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Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

que nos parece importante salientar, que diz respeito ao pertencimento


da sociedade no âmbito da Universidade, tendo em vista que a cada
quatro anos, novos gestores ocupam os cargos das alianças previamente
estabelecidas. Tendo-se esse desafio, o projeto político pedagógico do
curso (PPC) precisa ouvir e estar em consonância com o seu entorno,
em plena sintonia com as Políticas Públicas, favorecendo sua conso-
lidação e, ao mesmo tempo, sendo flexível para as novas conjunturas
políticas, além de os avanços técnico-científicos e tecnológicos do
mundo contemporâneo.
Assim, tivemos um avanço na Educação Superior que passou dos
currículos mínimos para as Diretrizes Curriculares Nacionais. Mais do
que estabelecer a carga horária mínima e os conhecimentos que deve-
riam ser adquiridos, houve a preocupação na formação de competências
e habilidades profissionais. No âmbito da saúde, as novas diretrizes
reforçam uma formação que fortaleça o Sistema Único de Saúde (SUS)
visando, dentre vários princípios que o constituem, a integralidade da
atenção e a interdisciplinaridade das ações em saúde.
Pode-se explicar a mudança desse paradigma a partir do exposto
no relatório para a Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura (UNESCO) elaborado pela Comissão Internacional
sobre Educação para o Século XXI, coordenada por Jacques Delors, em
1996. O ponto de partida da Comissão deu-se pela discussão da relação
entre o processo de globalização, o discurso da pós-modernidade e a
Educação, sugerindo que a Educação esteja alicerçada em quatro prin-
cípios, a saber (DELORS et al., 2003):
1. Aprender a conhecer–o aumento do conhecimento permite
um olhar plural de uma determinada situação ou problema,
além de despertar a curiosidade intelectual e estimular a cri-
ticidade para a tomada de decisões. Nas MAs, em especial, na
aprendizagem baseada em problemas, situações-problemas
(casos ou cases) são oferecidas para que objetivos de aprendi-
zagem sejam investigados e discutidos em pequenos grupos.
Nesse momento, os estudantes discutem porque um autor

28
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

acha que “A” é um evento importante para uma determinada


situação e outro autor que “B” é fundamental, contrapondo-se
a uma determinada concepção teórica. É um momento em
que a hipótese, a reflexão sobre novos pensamentos e ideias
são incitadas, para que haja a aquisição e, porque não dizer,
a idealização de novos instrumentos para o conhecimento.
2. Aprender a fazer–na prática (quer seja simulada ou em situa-
ção real) poder agir sobre o meio envolvente possibilita a
aquisição das habilidades e competências profissionais. Essa
prática, obviamente, deve ser subsidiada cientificamente e,
por tal motivo, tanto na aprendizagem baseada em problemas
quanto na problematização, o processo de fazer e refletir
sobre a prática, a avaliação do que foi feito e o realinha-
mento estratégico são exercícios contínuos e necessários
para o trabalho, quer seja no âmbito individual, quando por
exemplo, um profissional da saúde atende seu paciente em
seu consultório; quer seja coletivamente, quando o discute
com demais profissionais estabelecendo prioridades no aten-
dimento, abrangendo o seu fazer de forma coletiva, o que
permite também o alcance do próximo pilar;
3. Aprender a viver junto–aqui, faz-se fundamental a partici-
pação e a cooperação com o Outro e, para tanto, é preciso
estabelecer o respeito nas relações, aprender a ter uma escuta
ativa, compreendendo que todos os envolvidos (quer seja o
estudante, o seu colega, o seu tutor, o seu paciente e família
entre outros) tem percepções diferentes do mundo e, portanto,
os conflitos podem coexistir, sendo necessário mediá-los e
resolvê-los para que o trabalho possa ser harmonioso e pací-
fico. Nas MAs o estudante é exposto a este desafio, desde as
séries iniciais, ao trabalho coletivo, quer seja no respeito pelo
estudo que o outro fez sobre um determinado tema, quer seja
na divisão de trabalhos a serem realizados na comunidade,
de forma a prepara-lo para o trabalho interdisciplinar em
Saúde. O sucesso, quando obtido, não é de um, é da equipe;
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4. Aprender a ser–este pilar integra e completa os demais pila-


res, estimulando-se o desenvolvimento integral do sujeito,
sua autonomia, seu discernimento e sua responsabilidade,
valorizando suas potencialidades, bem como possibilitando
que lapide suas dificuldades. Nas MAs, esse é um exercí-
cio constante e, mediante as dificuldades encontradas, há
momentos de encontros individuais com o tutor (que em
nossa Universidade chamamos de consultorias), de refazer
suas atividades (quando escritas), de apoio psicopedagógico
mediante dificuldades na aprendizagem, ou seja, esse aprendi-
zado requer uma grande rede de apoio, que vai desde a ajuda
de um colega, perpassando pelo seu tutor, coordenador do
ciclo (ou ano, no ensino tradicional), apoio da Universidade
e, principalmente, pela motivação e autorreflexão do próprio
estudante. É um caminho que exige esforço, disciplina e
motivação, com a recompensa do reconhecimento profis-
sional e pessoal.
Uma formação pautada nos quatro pilares da educação, em
especial para os profissionais da Saúde, de acordo com Nascimento
e Oliveira (2010), pode colaborar na aquisição de conhecimentos e
desenvolvimento de habilidades e atitudes indispensáveis na atuação
na Saúde Pública. Para tanto, há a premência de que o corpo docente
e discente, bem como os gestores estejam dispostos para a mudança e
esforcem-se nessa tarefa, como afirmado por Masetto (2018).
Se é pelo Outro que aprendemos e constituímo-nos, boas relações
favorecerão o aprendizado, quer seja na Educação tradicional quer na
Ativa. No entanto, parece-nos que o trabalho em pequenos grupos a par-
tir de questões importantes e reais para aquela determinada realidade,
o enfrentamento desses problemas desde o ingresso do estudante na
Universidade aproximando a teoria da prática e o trabalho colaborativo
aceleram a construção de um profissional cidadão.
Gonçalves (2012), com o objetivo de analisar quais as contribuições
da formação universitária para uma atuação como profissional-cidadão,

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Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

aplicou questionário a egressos de dois cursos superiores: Medicina e


Pedagogia. Para os médicos participantes, os aspectos mais importan-
tes para a sua formação foram as atividades práticas, o contato com os
docentes e as vivências universitárias. Já os pedagogos revelaram as
vivências universitárias, a formação crítica e reflexiva e a forte funda-
mentação teórica. Ambos apresentaram autopercepção de sua atuação
em direção a uma sociedade mais humana e ética, enfatizando que houve
uma forte relação entre a formação acadêmica e a atuação profissional.
E não é isso que o mundo contemporâneo precisa: de profissionais
competentes, éticos, críticos, reflexivos, que humanizam suas práticas,
pautados na ética profissional?
Cremos que dificilmente teríamos alguém que respondesse nega-
tivamente ao questionamento acima. Reafirmamos o exposto por Vieira
e Radke (2019, p. 6051), quando argumentaram que “(...) a educação
profissional precisa ser tratada como processo educativo ampliado e
relacionado com as exigências do mundo do trabalho”.
No entanto, os enfrentamentos para tais resultados são de diversas
naturezas. Por um lado, temos no Nordeste uma realidade econômica
bastante diferente do Sul e Sudeste do Brasil. Em outubro de 2019,
a Universidade Federal de Sergipe divulgou relatório das condições
socioeconômicas de seus estudantes, revelando que
Os dados fornecidos pela PNAD 2018 mostram de
forma inequívoca que a renda per capita domici-
liar da população sergipana é baixa e insuficiente
para arcar com despesas de educação privada em
qualquer nível de ensino, e não apenas no ensino
superior, razão pela qual é cada vez mais estra-
tégica, para a superação do hiato educacional,
o fortalecimento da rede pública de ensino nos
diferentes níveis e, de forma particular, no tocante
à expansão de vagas no ensino superior público
(p. 5 e 6).

Assim, as dificuldades enfrentadas pelos estudantes são mais


profundas do que as dificuldades enfrentadas por qualquer estudante
universitário, no que diz respeito à demanda alta de estudos necessária

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para se tornar um profissional da Saúde. Precisa enfrentar a dificuldade


para seu sustento, aquisição de materiais e acervos bibliográficos para
seus estudos, além de recursos tecnológicos, como computadores,
por exemplo. Sem o auxílio de programas como o Reuni e a política
de cotas, o acesso à Educação Superior seria mais difícil, segundo o
informe supracitado.
Mas a Educação tem algo de inspirador para esse cenário: apesar
de todas as dificuldades, alunos cotistas, quando comparados a não
cotistas, apresentaram desempenhos acadêmicos similares e, em alguns
campi, os cotistas tiveram desempenhos ainda melhores (UFS, 2019).
Outro aspecto a ser salientado diz respeito à influência da tec-
nologia na Educação. Oliveira; Casagrande; Galerani (2016), em estudo
bibliográfico, salientaram as mudanças advindas da tecnologia na vida
humana. O desenvolvimento de máquinas contribuiu para o surgimento
da Revolução Industrial, ampliando as obras públicas e as cidades, de
forma geral. Quando aplicada na Educação, possibilitou o surgimento
de uma nova forma de linguagem (a digital), além de possibilitar maior
divulgação do conhecimento, estando atrelado à isso a “era da informa-
ção”, facilitando assim a construção do conhecimento e a aprendizagem.
Pinto e Leite (2020) ratificaram o exposto acima, afirmando que
as tecnologias digitais funcionam como mediadoras importantes nos
processos de ensino e aprendizagem na Educação Superior, podendo
ser utilizados dois tipos de tecnologias: as não oficiais, que são aquelas
utilizadas pelos estudantes por escolha própria, a depender de suas
necessidades, geralmente com diferentes formatos multimídia (desde o
uso de aplicativos sociais como o Facebook e o Whatsapp, como softwares
para: criar textos (Word); vídeos; ler documentos eletrônicos (eBook ou
eTextbook;), uso da internet para pesquisa em sites de busca e dispositi-
vos de arquivamento das mídias digitais, como o Dropbox, entre outros)
e as oficiais, que são aquelas empregadas pela Instituição de Ensino
Superior (IES) ou então sugeridas pelos docentes (como e-mail institu-
cional; documentos eletrônicos (eBook ou eTextbook;) e PowerPoint; sites
de pesquisa bibliográfica; sistema de gestão da aprendizagem como o

32
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

Moodle ou ainda algum software específico de uma unidade curricular).


As autoras concluíram que tais recursos tecnológicos voltados para
a Educação possibilitaram, aos estudantes, suporte à autonomia na
gestão e flexibilidade do tempo e locais dedicados ao estudo, à comu-
nicação interpessoal (entre os estudantes e destes com o tutor), ao
acesso facilitado aos materiais de estudo, aos dados de pesquisa e ao
compartilhamento de informações e materiais.
Frente aos avanços tecnológicos, é possível, no ensino superior,
mediações de educação a distância (EaD) com uso de interfaces tec-
nológicas. No Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da Educação Nº
9.394/96, que foi regulamentada em 20 de dezembro de 2005, explicita
em seu artigo 80, que “(...) O Poder Público incentivará o desenvolvi-
mento e a veiculação de programas de ensino a distância, em todos
os níveis e modalidades de ensino, e de educação continuada”. Esse
artigo foi regulamentado em 25 de maio de 2017, pelo Decreto Nº 9.057,
apresentando no artigo 2º, que as IES precisam se responsabilizar pelas
condições de acessibilidade que “devem ser asseguradas nos espaços e
meios utilizados”. Esta recomendação é de extrema importância, tendo
em vista que caso isso não seja possível, haverá exclusão do estudante
e, portanto, falta de equiparidade.
Já a Resolução CNE/CSE Nº 1/2016, estabelece Diretrizes e Normas
Nacionais para a oferta de programas e cursos de Educação Superior
na modalidade a distância, não fazendo restrições a uma determinada
área. Isto implica dizer que os cursos da saúde podem, legalmente, ser
oferecidos em sua totalidade, à distância. No entanto, essa área prevê
contato direto dos usuários com os profissionais da saúde, podendo
incorrer em risco à vida quando não houver qualificação profissional
para a execução dessa atividade laboral, como afirmado por Humerez
et al. (2019), em relação à Enfermagem.
Frente ao exposto, o Conselho Nacional de Saúde posicionou-se
contrário à oferta à distância dos cursos da Saúde, promulgando seu
posicionamento pelas Resoluções Nº515/2016 e 569/2017.Compartilhamos
desse posicionamento, embora enfatizemos que recursos tecnológicos

33
Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

devam ser utilizados no Ensino Superior, tendo em vista que esta é uma
via sem volta. Caso queiramos profissionais capacitados para o mercado
de trabalho, a tecnologia precisa permear a sua formação profissional.
Gossenheimer; Castro; Carneiro (2017) comentaram que o desem-
penho de estudantes não se diferenciaram quando comparadas as moda-
lidades a distância e presencial, porém elencaram aspectos positivos
e negativos. Em relação aos positivos, relataram a inovação, a comodi-
dade, a facilidade de comunicação e o acesso aos materiais. Quanto aos
negativos, relataram a sobrecarga de trabalho dos participantes (tanto
instrutores quanto alunos).
Melo e Oliveira (2019, p. 13), fazendo um paralelo da Educação
com a Revolução Industrial 4.0, comentaram que na
Educação 4.0 - O aluno passa a viver a experiência
da aprendizagem por meio de projetos colabora-
tivos, nos quais os professores e colegas atuam
juntos. Os recursos disponíveis na escola passam
a ser usados de maneira criativa e novas estraté-
gias são baseadas nas metodologias ativas para as
atividades em sala de aula.

Assim, parece-nos pertinente afirmar que os cursos da UFS que


utilizam as MAs, em especial, os do campus Lagarto, Sergipe, onde há
a oferta de oito cursos da Saúde estão à frente de uma Universidade que
pretende inserir-se no cenário de modernização das práticas pedagógicas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Decreto Nº 9.057, de 25 de maio de 2017, que regulamenta o art. 80 da
Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases
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Acesso em: 25 maio 2020.

BRASIL. Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e


bases da educação nacional. Brasília: Ministério da Educação, 1996. Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm. Acesso em: 25 maio 2020.

34
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Resolução Nº 515, de 7 de outubro de 2016.


Brasília: Ministério da Saúde, 2016.

BRASIL. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Resolução Nº 569, de 8 de dezembro de 2017.


Brasília: Ministério da Saúde, 2017.

BRASIL. Resolução CNE/CSE Nº 1/2016, estabelece Diretrizes e Normas Nacio-


nais para a oferta de programas e cursos de Educação Superior na modalidade
a distância. Brasília: Ministério da Educação, 2016. Disponível em: http://portal.
mec.gov.br/escola-de-gestores-da-educacao-basica/323-secretarias-112877938/
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maio 2020.

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35
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contexto atual do mundo do trabalho. RBEPT, Natal, v. 1, n. 16, p. 6051, 2019.

36
A AVALIAÇÃO NO CONTEXTO DE
METODOLOGIAS ATIVAS: UMA PROPOSTA DE
DESCENTRALIZAÇÃO DOS SABERES

Rodrigo Dornelas
Carla Patrícia Hernandez Alves Ribeiro César

“Para que as luzes do outro sejam percebidas por mim


devo por bem apagar as minhas, no sentido de me tornar
disponível para o outro” (Mia Couto)

As metodologias ativas (MAs) de ensino e aprendizagem pres-


supõem que o estudante tenha autonomia e seja responsável por sua
formação. Assim, todo o conteúdo apresentado é baseado nas compe-
tências, habilidades e atitudes em que o estudante deve adquirir para se
formar. Quando a formação é pautada nessas três esferas, a avaliação
precisa seguir alguns aspectos que diferem do ensino tradicional. É
inadequado pensar o estudante como protagonista de sua formação,
realizando uma avaliação somativa e estritamente conteudista, porque
como protagonista da sua formação, apesar de alcançar os objetivos de
aprendizagem, ele tem como opção trilhar novos caminhos, apresentar
novos rumos para a resolução de problemas novos ou antigos. Deste
modo, um dos percalços nas ditas metodologias de ensino e aprendi-
zagem inovadoras é o processo de avaliação.
O primeiro passo é que a avaliação seja condizente com o con-
teúdo abordado e com os objetivos de aprendizagem colocados para os
estudantes, que, também, podem ou devem ser modificados tanto em
virtude da demanda da turma quanto contextualizados com ela.
Assim, uma avaliação deve ser realizada de modo formativo,
que possa acompanhar o percurso do estudante ao longo do processo
de aprendizagem. A produção de materiais como portfólios, segundo
Gomes et al. (2010), e de mapas conceituais e mentais, como citado por
Oliveira (2010), por exemplo, contribuem não só para a organização

37
Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

do conteúdo para posterior pesquisa do estudante, mas também para


que o tutor tenha elementos que possam nortear o percurso proposto
pelo estudante.
A opção por produção de material gráfico não se deve ater a uma
única opção, mas sim considerar o que otimizará o aprendizado. Prio-
rizam-se as ferramentas que serão de fácil acesso e que terão sentido
para o estudante.
O que a literatura tem demonstrado é que quanto mais partici-
pativo e crítico o estudante é nas sessões tutoriais (STs), melhor será o
seu desempenho nas atividades que envolvem as habilidades e práticas,
evidenciando que a avaliação formativa e processual favorecem um
melhor desempenho ao futuro profissional, no caso em questão, da Saúde
(OLIVEIRA-BARRETO et al., 2017). Faz-se necessário, portanto, “priori-
zar o que realmente importa na avaliação” (GOMES et al., 2010, p. 394).
Como protagonista do processo de ensino-aprendizagem o estu-
dante deve também avaliar o seu percurso, deste modo a auto-avalia-
ção é imprescindível no processo de descentralização do saber. Deste
modo, a avaliação deve contemplar a percepção do estudante sobre
seu desempenho durante determinado módulo, para que assim sejam
apontados os pontos que precisam ser aprimorados ou os objetivos de
aprendizagem que já estão contemplados com o material produzido.
O aprendizado é dinâmico, como a vida é dinâmica, “(...) o que ela quer
da gente é coragem”, como já dizia Guimarães Rosa.
O processo de avaliação nesses moldes desloca o caráter punitivo
das avaliações e traz à tona os obstáculos para a aprendizagem que devem
ser modificados e retomados para a construção do saber e formação
do estudante, principal elemento nesse processo. Essa construção é
dialogada na tríade tutor-estudante-turma. É e deve ser considerada
como uma importante ferramenta de autorreflexão, uma vez que o
estudante analisa se consegue trazer elementos já observados, ou até
mesmo vivenciados, para contribuir com a ampliação de determinado
tema de estudo, possibilitando expor seus conhecimentos prévios, se
fez um estudo prévio adequado, se conseguiu sintetizar os principais

38
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

conceitos do problema, se argumentou e contra-argumentou com sub-


sídios técnico-científicos, entre outros.
Retomando, foram supramencionados dois aspectos necessários
nas avaliações em contextos ativos de ensino e aprendizagem: a cons-
trução de materiais de acompanhamento formativo e a auto-avaliação
do estudante e, agora será abordada o terceiro aspecto, a avaliação da
turma. A turma conduzirá o aprendizado de acordo com as colocações
de seus componentes. Para que a turma se torne um grupo, é necessário
saber escutar o silêncio, respeitar o Outro, desenvolver a capacidade de
escuta e a habilidade de entender os turnos dialógicos. Tais caracterís-
ticas são imprescindíveis para que todas e todos tenham seu lugar de
fala respeitado, seu conhecimento prévio contemplado e o aprendizado
construído de forma coletiva e generosa.
O tutor, em seu papel de mediador, também deve ser avaliado
pela turma, de forma a considerar se a sua postura é de facilitador ou
dificultador nas relações dos estudantes. Assim, ao receber as avaliações
realizadas pelos estudantes, precisa refletir, a cada grupo que media, o
que precisa mudar ou aprimorar para que a interação seja aprimorada.
Outro aspecto a ser considerado é a avaliação das situações problema
(SP), tanto pelos estudantes quanto pelo tutor.
Os estudantes avaliam as SPs quanto à facilidade para: identificar
as questões e os objetivos de aprendizagem, as hipóteses, sua resolubi-
lidade e o tempo a ele destinado (se o tempo foi ou não exequível), se
foi ou não motivador entre outros.
Já o tutor as avalia identificando se os objetivos previamente
estabelecidos foram alcançados pelos estudantes, se geraram ampla
e diversificada discussão, se foi ou não complexo o suficiente para
um olhar plural sobre a realidade, sempre contemplando os aspectos
biopsicossociais que envolvem os eventos em Saúde. O ideal é que
haja uma Comissão de SPs, tendo em vista a importância da avaliação
deste instrumento no problem basead learning (PBL ou na aprendizagem
baseada em problemas, já apresentada no primeiro capítulo deste livro).

39
Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

E, por fim, os estudantes avaliam o módulo como um todo, envol-


vendo desde as STs, as Habilidades, as Práticas de Ensino na Comunidade
e os Estágios Supervisionados. Esta avaliação é geralmente realizada no
final do módulo, de forma a propiciar que o Núcleo Docente Estruturante
do Curso e a Comissão Setorial de Avaliação (que faz parte da Avaliação
Institucional) possam analisar os resultados obtidos e realizar discus-
sões, quer sejam no âmbito do próprio Curso, intercursos e intercampi.
O objetivo não é expor as fragilidades, mas pensar, coletivamente, nas
soluções para um ensino superior em Saúde de qualidade.
Todo esse processo de avaliação tem como objetivo aprimorar
o processo de aprendizagem e, para isso, exige de todas e todos os
envolvidos maturidade para considerar os aspectos relevantes, respon-
sabilidade para propor mudanças que possam gerar impactos positivos
no processo de formação dos estudantes e generosidade para que os
futuros estudantes possam usufruir determinados apontamentos rea-
lizados nas avaliações.
O ensino e a avaliação devem estar centrados, em nosso ponto
de vista, no diálogo e na amorosidade, conforme defendido por Paulo
Freire (1987, 1996a,b). Deste modo a avaliação é realizada com afeto,
considerando o lugar de fala, o conhecimento prévio e a disponibilidade
do outro em demonstrar o que sabe para os outros, generosidade é a
palavra-chave no processo de ensino-aprendizagem em MAs.
Assim, apoiamos Toniolo (2010), quando afirmou que na pers-
pectiva freiriana há a instigação da (re)criação, (re)invenção, da (re)
descoberta de novas formas de (re)educar, para que os conceitos deixem
de ser discursos e passem a ser atitudes efetivas que estejam próximas
de nossos princípios.
Além disso, é um processo complexo e realizado de forma pro-
cessual, ampliando o olhar do educador e rompendo, no caso das MAs,
com o “tradicional, isto é, tem levado o discente a desenvolver habi-
lidades, competências e construção dos saberes”, como afirmado por
Dias-Lima et al. (2019).

40
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

Para facilitar os processos avaliativos utilizados no curso de


Fonoaudiologia do campus Lagarto, no anexo, podem ser visualizadas
as planilhas norteadoras da avaliação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DIAS-LIMA, A.; SILVA, M. C.; RIBEIRO, L. C. V.; BENDICHO, M. T.; GUEDES,
H. T. V.; LEMAIRE, D. C. Avaliação, ensinagem e metodologias ativas: uma
experiência vivenciada no componente curricular mecanismos de agressão e
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FREIRE, P. Educação como prática de liberdade. 22. ed. São Paulo: Paz e
Terra, 1996a.

FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1987.

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.


25. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996b.

GOMES, A. P.; et al . Avaliação no ensino médico: o papel do portfólio nos cur-


rículos baseados em metodologias ativas. Rev. bras. educ. med., Rio de Janeiro,
v. 34, n. 3, p. 390-396, set. 2010.

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OLIVEIRA, G. A.; COSTA, E. (Org.). Metodologias ativas: aplicações e vivências
em educação farmacêutica. Brasília: Associação Brasileira de Ensino Farmacêu-
tico e Bioquímico, 2010. p. 11-33.

OLIVEIRA-BARRETO, A. C.; GUEDES-GRANZOTTI, R. B.; DOMENIS, D. R.;


PELLICANI, A. D.; SILVA, K.; DORNELAS, R.; CÉSAR, C. P. H. A. R. Métodos
de avaliação discente em um curso de graduação baseado em metodologias
ativas. Rev. Íbero-Am. Estud. Educ., Araraquara, v. 12, n. 2, p. 1005-1019, 2017.

TONIOLO, J. M. S. Diálogo e amorosidade em Paulo Freire: dos princípios às


atitudes na formação de professores. 106f. 2010. Dissertação [Mestrado em Edu-
cação], Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, Rio Grande do Sul.

41
Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

ANEXOS
AVALIAÇÃO DO ESTUDANTE PELO TUTOR
FICHA A
(AO FINAL DE CADA SESSÃO TUTORIAL)
Tutor Ciclo
Módulo Problema Nº
Nome do Problema
ITENS
SESSÃO DE ABERTURA 2. Discutir o problema

2.1. Demonstra habilidade de identificar questões


2.2. Utiliza conhecimentos prévios
Passos 1 a 5
2.3. Demonstra capacidade de gerar hipóteses
2.4. Demonstra capacidade de sintetizar e expor
ideias de forma clara e organizada
Dinâmica do grupo 4. Interação no trabalho em grupo
4.1. Pontualidade
4.2. Capacidade de desempenhar o papel
(membro do grupo, coordenador ou secretário)
Passos 1 a 5 4.3. Relacionamento interpessoal efetivo (tutor,
colegas, pacientes)
4.4. Capacidade de criticar e receber críticas
(pontos fortes e fragilidades)
SESSÃO DE
FECHAMENTO
1. Solucionar o problema
1.1. Demonstra estudo prévio trazendo
informações pertinentes aos objetivos propostos
1.2. Demonstra capacidade de sintetizar e expor
Passos 6 e 7
informações de forma clara e organizada
1.3. Apresenta atitude crítica em relação às
informações trazidas
Dinâmica do grupo 3. Interação no trabalho em grupo
3.1. Pontualidade
3.2. Capacidade de desempenhar o papel
(membro do grupo, coordenador ou secretário)
Passos 6 e 7 3.3. Relacionamento interpessoal efetivo (tutor,
colegas, pacientes)
3.4. Capacidade de criticar e receber críticas
(pontos fortes e debilidades)

42
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

AUTO-AVALIAÇÃO E AVALIAÇÃO DO GRUPO TUTORIAL APLICADA DUAS


VEZES DURANTE O MÓDULO
FICHA B

1ª VEZ ENTRE O 4º E O 6º
2ª VEZ NO PENÚLTIMO PROBLEMA
PROBLEMA
Aluno:
Ciclo: Grupo:
Tutor:
Avaliação nº: Data:
Módulo: Problema do nº ............. ao nº ..............
Dinâmica AVALIAÇÃO DA HABILIDADE DE... Auto
conceito
Conceito S/
grupo
Tutorial
Código: 0=insuficiente 1=fraco 1,5=médio 2= bom
3= ótimo 0a3 0a3
1. Solucionar os problemas

1.1. Demonstra estudo prévio trazendo infor-


mações pertinentes aos objetivos propostos
Passos 6 e 7 1.2. Demonstra capacidade de sintetizar
e expor informações de forma clara e
organizada
1.3. Apresenta atitude crítica em relação às
informações trazidas
2. Discutir o problema 0a3 0a3
2.1. Demonstra habilidade de identificar
questões
2.2. Utiliza conhecimentos prévios
Passos 1 a 5
2.3. Demonstra capacidade de gerar
hipóteses
2.4. Demonstra capacidade de sintetizar e
expor ideias de forma clara e organizada.
Código: 0=insuficiente 1=fraco 2=médio 3= bom
4= ótimo
0a4 0a4
3. Interação no trabalho em grupo
3.1. Pontualidade

Dinâmica 3.2. Capacidade de desempenhar o papel


do grupo (membro do grupo, coordenador ou
Passos 6 secretário)
e7
3.3. Relacionamento interpessoal efetivo
(tutor, colegas, pacientes)

3.4. Capacidade de criticar e receber críticas


(pontos fortes e debilidades)

43
Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

TOTAL
Aponte um ponto positivo e um negativo concernente às habilidades de solucionar
os problemas e de discutí-los, bem como os concernentes à dinâmica do trabalho
em grupo.

A Avaliação do TUTOR pelo aluno deverá ser aplicada no mesmo dia da Ficha B

44
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

AVALIAÇÃO DO PROBLEMA PELO ALUNO E TUTOR APLICADA AO FINAL


DE CADA TUTORIAL FICHA
C
Ciclo: Grupo: Data: Tutor (T) Aluno (A)

Módulo:
Nº do
Nome do problema:
problema

Código: 0=insuficiente 1 = fraco 2 = médio 3=bom 4=ótimo


Pontuação
ITENS AVALIADOS
1. Houve facilidade para identificar as questões dos problemas
(T e A)
2. Houve facilidade para levantar hipóteses (T e A)
3. Houve facilidade para estabelecer os objetivos do estudo (T
e A)
4. Houve facilidade para resolver o problema (T e A)
5. O problema estimulou a discussão em grupo (passos 3 e 7 - T e A)

6. O problema abordou as questões biopsicossociais (T e A)

7. Os objetivos educacionais planejados no módulo para o pro-


blema foram elencados (T)
8. O problema motivou o estudo individual (A)
9. O tempo disponível para a resolução dos problemas foi
adequado (A)
10. Como avalia o desempenho do Aluno Coordenador neste
problema, considerando as atribuições definidas para essa
função? (A)
11. Como avalia o desempenho do Aluno Secretário neste
problema, considerando as atribuições definidas para essa
função? (A)
12. Quais os recursos de aprendizagem utilizados? (A) SIM NÃO
a. Livro texto
b. Periódicos
c. Consultores oficiais
d. Consultores não-oficiais
e. Internet
f. Recursos audiovisuais
g. Outros. Especifique:
13. Sugestões concernentes ao trabalho com os problemas:

45
Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

AVALIAÇÃO DO MÓDULO FICHA D

ATENÇÃO: Esta ficha é utilizada pelo aluno e deverá ser aplicada no 1º tutorial do
módulo seguinte
Ciclo: Grupo: Data:
Módulo:
I. Conteúdo do Módulo quanto COMENTÁRIOS
1. A sequência e organização
2. A programação proposta

3. Ao aprofundamento dos conteúdos repetidos


4. As palestras
5. As atividades de habilidades
6. O treinamento de atividades práticas
7. Os objetivos educacionais foram alcançados
II. Organização do Módulo
1. Cronograma das atividades laboratoriais
2. Cronograma de atividades clínicas
3. Tamanho dos grupos de práticas
4. Tempo para atividades tutoriais
5. Tempo para as atividades clínicas
6. Tempo para o estudo individual
III. Sistema de Avaliação
1. Auto-avaliação
2. Do grupo tutorial
3. Do aluno pelo tutor
4. Da avaliação cognitiva
5. Das atividades práticas
6. Da avaliação do tutor
IV. Recursos Materiais
1. Horário de funcionamento da biblioteca
2. Espaço da biblioteca
3. Conforto do ambiente da biblioteca
4. Quantidade e qualidade de livros
5. Quantidade e qualidade dos periódicos
6. Horário de funcionamento dos laboratórios

46
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

7. Disponibilidade de equipamentos dos


laboratórios
8. Quantidade e qualidade dos equipamentos dos
laboratórios
9. Agendamento dos laboratórios
10. Laboratório de Habilidades Clínicas
11. Laboratório de Informática
V. Recursos Humanos
1. Disponibilidade dos docentes
2. Disponibilidade dos funcionários/técnicos

47
Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

AVALIAÇÃO DO TUTOR PELO ALUNO APLICADA DUAS VEZES DURANTE O


MÓDULO
1ª VEZ ENTRE O 4º E O 6º
PROBLEMA 2ª VEZ NO PENÚLTIMO PROBLEMA

Tutor: Ciclo: Grupo:


Avaliação nº:
Módulo: Data:
Código:
0=insuficiente 1=fraco 2=médio 3= bom 4=
ITENS AVALIADOS ótimo Pontuação
COMENTÁRIOS

1. Pontualidade

2. Apresentação pessoal

3. Capacidade de receber
críticas

4. Capacidade de criticar
com objetividade
5. Conhecimento dos
objetivos do módulo
6. Capacidade de esti-
mular o interesse pelo
conteúdo da atividade
7. Capacidade de auxiliar
os estudantes para
atingir os objetivos do
módulo
8. Capacidade de
estimular o desenvolvi-
mento do raciocínio dos
estudantes
9. Incentivo no uso de
recursos (material de
referência, serviços de
saúde, comunidade e
outros)
10. Estímulo à partici-
pação ativa de todos os
estudantes no grupo
tutorial
11. Facilitador do rela-
cionamento positivo
interpessoal no grupo

48
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

12. Percepção das neces-


sidades individuais dos
alunos
13. Desembaraço e segu-
rança nas discussões dos
grupos tutoriais

Ponto Positivo

Ponto Negativo

49
METODOLOGIAS ATIVAS: CONTRIBUIÇÕES E
DIFICULDADES PARA OS DISCENTES

Pablo Jordão Alcântara Cruz


Nathália Monteiro Santos

“Diga-me e eu esquecerei, ensina-me e eu poderei lembrar,


envolva-me e eu aprenderei.” (Benjamin Franklin)

Ao ingressar no ensino superior, o discente observa muitas mudan-


ças, desde as mais básicas na rotina diária até as mais complexas como
o desenvolvimento de habilidades profissionais para a futura atuação
no mercado de trabalho. Essas mudanças fazem parte deste processo
de transição no ciclo da vida, sendo observada uma carga emocional
forte e que, se não acompanhada, muitas vezes, podem desencadear
complicações que afetam a rotina acadêmica e a vida do indivíduo.
Dentre essas mudanças, há de se pesar a metodologia de ensino
proposta pela instituição de ensino superior. Este capítulo pretende
narrar os desafios de dois discentes que se formaram em Fonoaudio-
logia, no Campus de Lagarto da Universidade Federal de Sergipe, que
utiliza integralmente as Metodologias Ativas (MAs) de Ensino como
estratégia pedagógica.
A maioria dos discentes calouros não tem um entendimento do
que seja “metodologia ativa”, pois passaram a maior parte de suas vidas
expostos ao método tradicional. Isso configura, para muitos, como
um problema ao se deparar com uma maneira diferente de se obter o
conhecimento.
As MAs retiram o estudante de uma aprendizagem passiva e o
coloca em uma posição de protagonismo, aguçando suas capacida-
des críticas e analíticas e desenvolvendo competências e habilidades
necessárias para resoluções de problemas. Por diversas vezes surgem
questionamentos como observado no quadro 1, o que é natural já que
muitos discentes não tiveram algum contato (teórico ou prático) com
esses métodos anteriormente.

50
Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

Quadro 1. Questionamentos frequentes de universitários ao


ingressarem no ensino com metodologias ativas.

- Será que irei me adaptar a este novo método?


- Como aprenderei?
- Esta metodologia funciona?
- Quais as diferenças entre um profissional formado pelo modelo
tradicional e outro pelas metodologias ativas?

Ao longo da graduação, as respostas a esses questionamentos


são construídas, o discente descobre novos meios de aprendizagem
notando o funcionamento da metodologia nos seus saberes, contudo
há uma necessidade de dedicação contínua para que isto aconteça. Em
um estudo sobre atitudes promovidas por meio da metodologia ativa
para a vida profissional, o trabalho em equipe, a responsabilidade e o
raciocínio crítico foram as três atitudes de maior destaque (MENDES
et al., 2017).
Após sair da Universidade, pensar criticamente além da sua
área de atuação, perceber o indivíduo de forma global e saber discutir
em equipe são diferenciais do profissional das MAs. Assim, um ponto
notável é o perfil profissional formado com esse tipo de metodologia
para o desenvolvimento da aprendizagem continuada.
Segundo Mitre et al. (2008), a graduação tem uma duração curta
para um profissional que poderá atuar por décadas, sendo que nesse
período os conhecimentos e competências vão sendo transformados,
assim, sendo necessário a construção de uma formação que torne o
indivíduo apto a “aprender a aprender” constantemente. Com isso,
esse método permite o desenvolvimento da habilidade autodidata e da
aprendizagem continuada.
Para aprofundar o olhar do discente nas MAs, separaremos em
temas de acordo com o enfrentamento e contato com o método, a saber:
as contribuições e os desafios nas sessões tutoriais (STs), a ressignifi-

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cação da avaliação, a aprendizagem em diferentes cenários, desde o


ingresso no curso.

5.1 As contribuições e os desafios nas STs vivenciadas


por discentes

As STs dividem-se em problematização, estudo autodirigido e


discussão final do problema. Na figura 2, destacam-se algumas das
especificidades que o estudante realiza em cada etapa. Vale destacar que
o espaço de tempo entre elas, para o discente, é fundamental a fim de
que consiga atingir os objetivos, pois um curto espaço de tempo poderia
gerar uma grande sobrecarga ao estudante visto que prejudicaria o seu
estudo individual, já que o mesmo exige tempo para pesquisas e filtros
de informações relevantes ao assunto.
Figura 2. Habilidades requeridas dos discentes em cada etapa de um
tutorial em problemas (ABP – do inglês: problem based learning – PBL).

Durante a interação em grupo, a humanização, o respeito e a ética


do estudante são fundamentais. Estas discussões o auxiliam para futuros
debates em reuniões profissionais quando formado, principalmente,

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Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

em módulos de estudo comuns a diferentes cursos que poderão atuar


em um mesmo cenário. Assim, ao mesmo tempo em que o discente
precisa falar também precisa saber escutar, pois a qualidade da fala,
a empatia e o posicionamento em grupo podem contar mais do que a
quantidade de discurso proferido.
Nas STs, o discente também desempenha o papel de coordenador
e secretário, todos do grupo devem experienciar essas funções que
para alguns pode ser desafiante, especialmente para os mais tímidos.
Como coordenador, a gestão do tempo e do fluxo da discussão
no tutorial caminham juntas, é necessário ter uma visão de grupo
e perceber se todos estão conseguindo expor suas ideias no debate,
sendo um desafio, pois deve controlar a sessão para que todos tenham
o mesmo espaço de fala e que o debate flua tranquilamente com res-
peito e interação.
Enquanto isso, o secretário que escreve as ideias e objetivos de
estudo, deve realizar uma síntese dos principais pontos discutidos. Isso
é importante para o desenvolvimento das capacidades de objetividade,
síntese e contemplação de assuntos argumentados.
Ao término do tutorial, o tutor que faz papel de mediador da
discussão disponibiliza um tempo para realização de um portfólio em
que o discente sintetiza o que foi discutido, por isso deve estar atento
às informações expostas pelos colegas de turma que podem trazer um
referencial teórico diferente e complementar, este um desafio que o ajuda
no desenvolvimento da construção de ideias chaves para o aprendizado.
O estudante, às vezes, não percebe a real grandeza do portfólio e
o vê apenas como uma avaliação e não como algo que também retrata
o individual, aquilo que conseguiu refletir e associar, que retrata um
estudo de percepção dos discentes em um curso da área de Saúde
(FORTE et al., 2015).
Na metodologia ativa as estratégias são aplicadas para que não
haja foco somente no docente tutor, como na visão tradicionalista do
ensino, ou seja, um dos seus desafios é desenvolver novos caminhos

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viáveis para ensinar e se comprometer com uma construção democrá-


tica durante o processo de ensino-aprendizagem (SOUZA et al., 2020).

5.2 Um novo olhar sobre as avaliações

Nesta metodologia, as avaliações são diárias e não somente após


o fim dos módulos de ensino, como aquelas utilizadas nos métodos
tradicionais de ensino. Para os discentes, as avaliações diárias podem
gerar certa ansiedade, medo e frustração (OLIVEIRA; BATISTA, 2012).
Não são todos os dias que o estudante apresenta total plenitude para as
discussões e atividades, podendo ter como causas, por exemplo, uma
má noite de sono, problemas pessoais e familiares, má organização do
tempo, ou ainda, dificuldades com o conteúdo.
Por outro lado, permite um feedback com as considerações que o
tutor faz de forma individual e em grupo, proporcionando um redire-
cionamento do estudo, havendo a possibilidade de aperfeiçoamento,
seja utilizando estratégias de estudo diferentes ou sabendo expor suas
ideias de forma mais clara e vencendo a timidez, muito comum nas
exposições orais das STs.
O processo de autoavaliação, as avaliações do grupo e a avaliação
do tutor são outra parte muito importante e complexa. Aqui, o discente
desenvolve um senso crítico que deve englobar a percepção de sua
capacidade de discussão, aproveitamento do conteúdo e interação
com o grupo e com o tutor. Essa etapa de se tornar um avaliador, pode
ser difícil para alguns. Qual estudante já havia avaliado a si próprio
com notas reais, o seu grupo de colegas e seu próprio professor? A
responsabilidade desta ação auxilia no desenvolvimento de autocrítica
e desenvolve uma perspicácia analítica situacional que é benéfica para
um futuro profissional.
A timidez, a objeção de receber críticas e de se auto avaliar são
dificuldades intrínsecas dos estudantes que relatam ficar pouco à vontade
com a situação, a falta de honestidade também é relatada na percepção

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Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

discente quanto a auto avaliação (OLIVEIRA; BATISTA, 2012) e precisa


ser superada.
Ao adentrar nas práticas de ensino na comunidade e nos estágios
supervisionados haverá o fomento do raciocínio sobre a coletividade,
além do raciocínio clínico que, segundo Fornaziero; Gordan; Garanhani
(2011), auxiliam na formação do saber, direcionando à compreensão
de uma temática específica ou da resolubilidade de uma determinada
situação clínica, gerando atitudes e processos reflexivos (FORNAZIERO;
GORDAN; GARANHANI, 2011).
Além disso, segundo Dias-Lima (2019), diferentes meios de ava-
liação do discente auxiliam os docentes a perceber globalmente a
dimensão do ensino-aprendizagem.

5.3 Aprender fazendo: as práticas e os laboratórios

As atividades práticas nas MAs são de fundamental importância


para o desenvolvimento das habilidades socioafetivas e profissionais
que o indivíduo precisa. Por meio delas, o discente é posto frente a
situações problemas que poderá encontrar no seu cotidiano profissional,
colocando em prática os conhecimentos teóricos adquiridos nas STs.
Esta categoria pode ser dividida em Habilidades, Práticas de
Laboratório e Práticas de Ensino na Comunidade (PEC). Em Habilidades
são trabalhadas as diversas competências práticas que o profissional
deve apresentar. As atividades desenvolvidas são distribuídas em blocos
de acordo com as temáticas chaves trabalhadas nos demais módulos
(Tutorial, PEC e Laboratórios) para que assim o discente consiga absor-
ver ainda mais os conteúdos abordados.
No primeiro Ciclo em Habilidades, diversos temas que envolvem
desde abordagens com comunicação e ética até assuntos como suporte
básico de vida e primeiros socorros, cruciais para qualquer profissional
da saúde, foram abordados em nossa formação. Nos demais Ciclos,

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desenvolvemos habilidades específicas para nossa área de atuação,


ditas profissionalizantes.
Nos laboratórios são trabalhadas as atividades de base para os
profissionais (como histologia e anatomia). Ademais, envolve atividades
como produção de materiais terapêuticos, aspecto em que o discente
estimula a criatividade e a versatilidade em construir e adaptar dife-
rentes materiais com um objetivo terapêutico pensando criticamente
e na condição social do paciente.
Em PEC, as atividades são baseadas em uma problematização,
inserindo o discente desde o primeiro Ciclo universitário com as diversas
realidades que poderão encontrar futuramente como visitas às Unida-
des Básicas de Saúde, comunidades e escolas. Aqui, são trabalhados os
aspectos profissionais com fundamentação nos princípios do Sistema
Único de Saúde (SUS). Diante destas tarefas, o estudante pratica e vê o
que está na teoria acontecer, casos fictícios tornam-se reais. Permite aos
discentes a reflexão sobre o que a experiência pode influenciar em seu
comportamento, conduta e estudo (GUEDES-GRANZOTTI et al., 2015).
O Primeiro Ciclo é voltado paras as práticas gerais, ou seja, todas
as abordagens são centradas nos conhecimentos de base para todos
os profissionais da área da saúde, em questão. Por isso, os discentes
de todos dos cursos realizam as mesmas atividades teóricas-práticas,
sendo agrupados de forma mesclada entre os grupos. Isso proporciona
uma interação mais dinâmica entre os futuros profissionais, com esta
experiência o discente tem a possibilidade de conhecer a importância e
as atribuições de cada profissão da área da saúde, podendo futuramente
atuar em equipes multi e/ou transdisciplinares.
Nos demais Ciclos os discentes são redistribuídos para seus res-
pectivos departamentos iniciando a sua formação profissionalizante,
com assuntos específicos do curso. A mudança dos colegas de turma,
em cada módulo, é outra situação observada. Para muitos isso causa um
certo desconforto, pois cria-se uma certa comodidade estar junto das
mesmas pessoas, as quais se tem uma afinidade criada, para realizar
as atividades do curso. Mas nisto há grande aprendizado: aprender a

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Metodologias Ativas de Ensino: Experiência no Ensino em Saúde

trabalhar em equipe sem contudo escolher a mesma. Aprender a lidar


com respeito e cordialidade, em busca de uma meta comum a fim de
adquirir conhecimentos que serão necessários para a prática profissional.
Percebe-se que as possibilidades das MAs são vastas, alguns dis-
centes podem se identificar mais com um tipo que de outro, contudo
juntas englobam habilidades em diferentes contextos acadêmicos
e sociais.
A MA é um desafio para muitos estudantes que preferem as
formas de aprendizagem do método tradicional, o que configura, em
alguns casos, a não adaptação com aquele método de ensino. Por outro
lado, pode existir pessoas que demonstram interesse por este método
por conhecer algum familiar ou amigo que vivencia esta prática. Cabe
ressaltar inclusive, que alguns ex-discentes de MAs afirmam não mais
se adaptar ao modelo tradicional.
Vale ressaltar que construir redes de estudo colaborativo poderá
ajudar o estudante no processo de adaptação por proporcionar mais
interação, troca de conhecimento, além de construção de vínculos
de apoio e não de competitividade entre os discentes. Instruções de
autoaprendizado para organização dos estudos aos calouros poderiam
também reduzir o medo e a insegurança do início.
Assim, o fato de propiciar ao estudante uma nova posição, a de
protagonista do seu próprio amadurecimento (pessoal e profissional),
o condiciona a ser mais proativo e ágil, além de desenvolver uma boa
capacidade crítica/analítica associada aos conhecimentos teórico-práti-
cos necessários. Nas MAs, todos se transformam, estudantes, docentes
e comunidade.

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REFERÊNCIAS
DIAS-LIMA, A., SILVA, M. C.; RIBEIRO, L. C. V.; BENDICHO, M. T.; GUEDES,
H. T. V.; LEMAIRE, D. C. Avaliação, ensinagem e metodologias ativas: uma
experiência vivenciada no componente curricular mecanismos de agressão e
de defesa, no curso de Medicina da Universidade do Estado da Bahia, Brasil.
Rev. bras. educ. med., Brasília, v.43, n. 2, p. 216-224, abr. jun. 2019.

FORTE, F. D. S., VIEIRA, L. B.; PESSOA, T. R. R. F.; FREITAS, C. H. S. M.; FER-


REIRA, M. S. L. M. Portfólio como estratégia de avaliação de estudantes de
Odontologia. Trab. educ. saúde, Rio de Janeiro, v. 13, supl. 2, p. 25-38, 2015.

FORNAZIERO, C. C.; GORDAN, P. Al.; GARANHANI, M. L. O processo de ensino


e aprendizagem do raciocínio clínico pelos estudantes de medicina da Univer-
sidade Estadual de Londrina. Rev. bras. educ. med., Rio de Janeiro, v. 35, n.
2, p. 246-253, jun. 2011.

GUEDES-GRANZOTTI, R. B.; SILVA, K.; DORNELAS, R.; DOMENIS, D. R. Metodo-


logias ativas e as práticas de ensino na comunidade: sua importância na formação
do fonoaudiólogo. Distúrbios Comun, São Paulo, v. 27, n.2, p. 369-374, jun. 2015.

MENDES, A. A., et al. A percepção dos estudantes do curso de administração a


respeito do processo de implantação de metodologias ativas de ensino-aprendi-
zagem - o desenvolvimento da aprendizagem significativa. Pensar Acadêmico,
Manhuaçu, v. 15, n. 2, p. 182-192, jul. dez. 2017.

MITRE, S. M.; SIQUEIRA-BATISTA, R.; GIRARDI-DE-MENDONÇA, J. M.; MORAIS-


-PINTO, N. M.; MEIRELLES, C. A. B.; PINTO-PORTO, C.; MOREIRA, T.; HOF-
FMANN, L. M. A. Metodologias ativas de ensino-aprendizagem na formação
profissional em saúde: debates atuais. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro,
v. 13, supl. 2, p. 2133-2144, dez. 2008.

OLIVEIRA, V. T. D; BATISTA, N. A. Avaliação formativa em sessão tutorial:


concepções e dificuldades. Rev. bras. educ. med. Rio de Janeiro, v. 36, n. 3, p.
374-380, set. 2012.

ROMAN BAUTISTA, T. E.; et al. Estrategia de aprendizaje basado en problemas


en la asignatura de Anatomía de la licenciatura en Medicina. RIDE. Rev. Ibe-
roam. Investig. Desarro. Educ, Guadalajara, v. 9, n. 18, p. 557-581, jun. 2019.

SOUZA, C. D. F., CORREIA, D. S.; ARAÚJO, M. D. P.; WANDERLEY, R. A.;


MACHADO, M. F. E o passado é uma roupa que não nos serve mais: uma refle-
xão sobre integração ensino-saúde-comunidade em curso médico do nordeste.
Rev. bras. educ. med., Brasília, v.43, n.1, supl.1, p. 7-11, jan. 2020.

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SOBRE OS AUTORES

Carla Patrícia Hernandez Alves Ribeiro César

Fonoaudióloga com Mestrado e Doutorado em Distúrbios da


Comunicação Humana pela UNIFESP e pós-doutorado pela Universidade
Fernando Pessoa. Docente do Departamento de Fonoaudiologia da UFS.

Kelly da Silva

Fonoaudióloga com Mestrado e Doutorado em Ciências pela USP/


Ribeirão Preto. Docente do curso de Fonoaudiologia e do Programa de
Pós-Graduação em Ciências Aplicadas à Saúde da UFS.

Nathália Monteiro dos Santos

Fonoaudióloga, pós-graduada em Neuropsicopedagogia e Gestão


Hospitalar e, mestranda em Ciências Aplicadas à Saúde na Universidade
Federal de Sergipe.

Pablo Jordão Alcântara Cruz

Fonoaudiólogo, pós-graduado em Neuropsicopedagogia e Gestão


Hospitalar e, Mestre em Ciências Aplicadas à Saúde na Universidade
Federal de Sergipe.

Raphaela Barroso Guedes-Granzotti

Fonoaudióloga com Mestrado e Doutorado em Neurociências


pela USP/Ribeirão Preto. Docente do curso de Fonoaudiologia e tutora
do Programa de Residência Multiprofissional de Atenção Hospitalar à
Saúde da UFS.

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Raphaela B. Guedes-Granzotti | Kelly da Silva | Rodrigo Dornelas | Carla Patrícia H. Alves (org.)

Rodrigo Dornelas

Fonoaudiólogo com Mestrado em Ciências da Saúde pela UnB


e Doutorado em Fonoaudiologia pela PUC/SP. Docente do curso de
Fonoaudiologia da UFRJ.

Vanessa Veis Ribeiro

Fonoaudióloga, Doutora em Ciências pela USP e pós-doutoranda


em Distúrbios da Comunicação pela UNIFESP. Docente do curso de
Fonoaudiologia da UFS e do Programa de Pós-Graduação em Fonoau-
diologia da UFPB.

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Este livro foi composto pela Editora Bagai.

www.editorabagai.com.br /editorabagai

/editorabagai [email protected]

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