Empowerment Monografia - Leticia - Ferreira - de - Carvalho

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ATENÇÃO BÁSICA EM SAÚDE DA FAMÍLIA

EMPOWERMENT:

UMA ALTERNATIVA EM PROMOÇÃO DE SAÚDE

Leticia Ferreira De Carvalho

CONSELHEIRO LAFAIETE/MG
2012
LETICIA FERREIRA DE CARVALHO

EMPOWERMENT:

UMA ALTERNATIVA EM PROMOÇÃO DE SAÚDE

Trabalho de Conclusão do Curso de


Especialização em Atenção Básica em Saúde
da Família, Universidade Federal de Minas
Gerais para obtenção do Certificado de
Especialista.
.

Orientador: Prof. Bruno Leonardo de Castro Sena

CONSELHEIRO LAFAIETE/MG
2012
LETICIA FERREIRA DE CARVALHO

EMPOWERMENT:

UMA ALTERNATIVA EM PROMOÇÃO DE SAÚDE

Trabalho de Conclusão do Curso de


Especialização em Atenção Básica em Saúde
da Família, Universidade Federal de Minas
Gerais para obtenção do Certificado de
Especialista.
.

Orientador: Prof. Bruno Leonardo de Castro Sena

Banca Examinadora:

Prof. Bruno Leonardo de Castro Sena (orientador)

Profa. Dra. Matilde Meire Miranda Cadete

Aprovado em Belo Horizonte, 18 de novembro de 2012.


Dedico este trabalho aos meus pais, Vera e Francisco, pelo incentivo e dedicação; a

meu irmão, Leandro, pela amizade; ao meu marido, Jeferson, pelo carinho e a minha

filha, Larissa, por alegrar minha vida.


AGRADECIMENTOS

A Deus pela oportunidade, força e saúde que me concedeu ao longo destes dois

anos de aprendizado.

A minha família, pelo carinho e amor.

Ao Orientador Bruno, a minha admiração pela compreensão, dedicação e

competência durante a orientação deste trabalho.

As minhas amigas, pelo companheirismo, apoio e incentivo.

A todos os professores que participaram de minha formação profissional durante

estes dois anos de curso.


RESUMO

A promoção de saúde é um campo de conhecimento na história da saúde pública


que se encontra em plena ebulição. Nos últimos 20 anos, temos assistido a um
crescimento exponencial dessa área, que tem realçado profundamente as
concepções e práticas públicas no setor. O objetivo deste trabalho é abordar a
aplicabilidade do empowerment em promoção de saúde, através de um breve
histórico sobre o surgimento da promoção de saúde, da descrição de conceitos
pertinentes ao tema e de uma revisão narrativa da literatura sobre promoção de
saúde e empowerment. Periódicos, textos e artigos científicos eletrônicos,
disponibilizados na internet através de bases de dados com credibilidade no meio
acadêmico, serviram como fonte de busca. As bases de dados utilizados foram
Lilacs, SciELO e Medline, acessados por meio dos portais Bireme, Google
Acadêmico e Capes. Assim, pôde-se constatar que o empowerment é um método
em que indivíduos ou um grupo de pessoas desenvolvem potenciais e habilidades a
fim de melhorar sua qualidade de vida, ou seja, através dele as pessoas ganham
maior controle sobre decisões e ações, que afetam sua saúde. É um processo
eficaz, pois aumenta a autoestima, gera organização, determinação, colaboração,
integração e autonomia no grupo em questão, permitindo controle e superação dos
problemas identificados. Além disso, um de seus focos é a continuidade que é
observada na maioria das intervenções. No Brasil, iniciativas para melhorar as
condições de saúde de grupos específicos, por intermédio do desenvolvimento do
empowerment, têm sido desenvolvidas de forma muito pontual. Entretanto, para
muitas pessoas, estas constituem a única forma de mudança e transformação.
Sendo assim, estamos carentes de políticas e ações em promoção de saúde e
também de investigações científicas que apontem estratégias apropriadas e
adequadas, pois a promoção de saúde demanda ações em outros setores, além do
setor saúde. Portanto, é necessária uma ação coordenada entre todas as partes
envolvidas: governo, setores sociais, econômicos, políticos, públicos, privados,
organizações voluntárias e não governamentais, autoridades locais, indústria, mídia
e instituições para envolver indivíduos, famílias, comunidades e profissionais de
saúde.

Palavras-chave: Promoção de Saúde. Empoderamento. Qualidade de vida.


ABSTRACT

The health promotion is a field of knowledge in the history of the public health that is
on the boil. In the last 20 years, we have seen exponential growth of this area, which
has deeply highlighted the concepts and the public practices in the sector. The aim of
this work is to approach the applicability of the empowerment in the health promotion
through a brief chronology of the emergence of the health promotion, the description
of concepts related to the theme and a non-systematic review of the literature on
health promotion and empowerment. Journals, electronic texts and articles, made
available online through databases with credibility in academia, served as a source of
search. The databases used were Lilacs, SciELO and Medline, accessed through
portals Bireme, Google Scholar and Capes. Thus it could be seen that the
empowerment is a method in which individuals or a group of people develop potential
and skills to improve their quality of life, in other words, through it people gain greater
control over decisions and actions that affect their health. This is an effective
process, as it helps to have high self-esteem, creates organization, determination,
cooperation, integration and autonomy among the group in question, allowing them
to handle and overcome the identified problems. Furthermore, one of its focuses is
the continuity that is observed in the majority of the interventions. In Brazil, the
initiatives aimed at improving the health conditions of specific groups through the
development of the empowerment have not been developed continuously. However,
for many people, these are the only way to change and transform. Therefore, we are
in need of policies and actions in health promotion and also of scientific research that
suggests appropriate and suitable strategies to each context. The health promotion
actions demand in other sectors, beyond the health sector. Therefore it is necessary
coordinated action among all stakeholders: government, social sectors, economic,
political, public, private, voluntary organizations and non-governmental organizations,
local authorities, industry, media and institutions. Involving individuals, families,
communities and health professionals.

Key-words: Health Promotion. Empowerment. Quality of life.


LISTA DE ABREVIATURAS

ABRASCO- Associação Brasileira de Saúde Coletiva


AIDS- Acquired Immune Deficiency Syndrome
ALpViver- Associação Lutando para Viver
Bireme- Biblioteca Virtual em Saúde
CAPES- Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CAPS – Centro de Atenção Psicossocial
CPHA- Canadian Public Health Association
CSEGSF- Centro de Saúde Escola Germano Sinval Faria
CNDSS – Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais da Saúde
CSDH - Commission on Social Determinants of Health
CONASEMS – Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde
CONASS - Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde
DSS- Determinantes Sociais da Saúde
ENSP/Fiocruz- Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz
EURO/OMS- Escritório Europeu da Organização Mundial da Saúde
HIV- Human Immunodeficiency Virus
IPCEC/Fiocruz- Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas da Fundação
Oswaldo Cruz
LILACS- Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde
OMS- Organização Mundial da Saúde
MEDLINE- Medical Literature Analysis and Retrieval System Online
PSBH- Problem Solving for Better Health
SCIELO- Scientific Electronic Library Online
SUS – Sistema Único de Saúde
WHO- World Health Organization
LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Determinantes Sociais: modelo de Dahlgren e Whitehead ...............................25

Figura 2 - Determinantes Sociais: modelo de Diderichsen e Hallqvist ....................26


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................10

2 JUSTIFICATIVA .........................................................................................................12

3 OBJETIVOS................................................................................................................13

3.1 Objetivo Geral ....................................................................................................13

3.2 Objetivos Específicos .......................................................................................13

4 METODOLOGIA .........................................................................................................14

5 REVISÃO DE LITERATURA ......................................................................................15

5.1 - Promoção de Saúde .......................................................................................15


5.1.1 Histórico.............................................................................................................15
5.1.2 Principais Conferências sobre Promoção de Saúde.....................................16
5.1.3 Promoção de Saúde no Brasil..........................................................................21
5.1.4 Aspectos Sociais...............................................................................................25

5.2 - Empowerment ....................................................................................................30


5.2.1 Conceito e Aplicabilidade.................................................................................30
5.2.2 Resultados Esperados......................................................................................39

6 DISCUSSÃO ..............................................................................................................45

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................50

REFERÊNCIAS ............................................................................................................52
10

1 INTRODUÇÃO

A promoção de saúde é um campo de conhecimento na história da saúde


pública que se encontra em plena ebulição. Nos últimos 30 anos, temos assistido a
um crescimento exponencial dessa área, que tem realçado profundamente as
concepções e práticas públicas no setor.
A partir dos anos 60, houve diversos debates, em várias partes do mundo,
para discutir a influência de fatores econômicos e sociais na saúde dos indivíduos, e,
com isso, abriram espaço para uma nova abordagem neste sentido. Desde então, a
Organização Mundial da Saúde (OMS) tem realizado múltiplas conferências, em
diferentes países, para discutir o tema. A Conferência Internacional sobre cuidados
primários de saúde, realizada na antiga União Soviética, em 1978, deu início a esse
processo, que, posteriormente, resultou em sete Conferências Internacionais sobre
promoção de saúde, realizadas respectivamente em Ottawa, Canadá, 1986; em
Adelaide, Austrália, 1988; em Sundsvall, Suécia, 1991; em Jacarta, Indonésia, 1997;
na Cidade do México, México, 2000; em Bangkok, Tailândia, 2005 e em Nairobi,
Quênia, 2009. Além disso, duas Conferências Internacionais, de caráter sub-
regional, aconteceram em Bogotá, Colômbia, 1992 e em Porto de Espanha, capital
de Trinidad e Tobago, no Caribe, 1993. Destas, a Carta de Ottawa tem sido o marco
de referência em todo o mundo, pois ampliou o conceito de promoção de saúde e
incorporou a importância e o impacto das dimensões socioeconômicas, políticas e
culturais sobre as condições de vida (BRASIL, 2002).
De acordo com o glossário elaborado pela World Health Organization
(WHO), a promoção de saúde representa um amplo processo social e político, que
abrange não só ações dirigidas a fortalecer as habilidades e capacidades dos
indivíduos, mas também orientadas para a mudança social, ambiental e econômica,
a fim de atenuar seu impacto sobre a saúde pública e individual. É um processo que
permite às pessoas o aumento do controle sobre os determinantes de saúde,
aplicação de suas competências e recursos coletivamente, definição de prioridades
e satisfação das respectivas necessidades sanitárias. Através dessa participação,
indivíduos e organizações dentro de uma comunidade podem prestar apoio social
para o setor e abordar os conflitos existentes. Os determinantes de saúde são
representados por uma gama de fatores pessoais, sociais, econômicos e
ambientais, que influenciam a qualidade de vida dos indivíduos ou populações. A
11

promoção de saúde preocupa-se com ações que defendam todos estes fatores, que
são múltiplos e interativos, tais como renda, condição social, educação, emprego,
condições de trabalho, acesso a serviços de saúde e ambientes adequados, pois,
em conjunto, criam diferentes condições de vida que influenciam a saúde (WHO,
1998).
A aplicabilidade do empowerment em promoção de saúde é um processo
através do qual as pessoas ganham maior controle sobre decisões e ações, que
afetam a qualidade de vida. Pode ser definido como um método social, cultural,
psicológico ou político, por meio do qual, indivíduos e grupos sociais são capazes de
exprimir suas necessidades, suas preocupações atuais e conceber estratégias para
a participação na tomada de decisões. Por meio dessa atuação existe uma
correspondência mais estreita entre os objetivos e como atingi-los, e uma relação
entre esforços e resultados. Empowerment significa, também, o aumento do poder e
da autonomia pessoal e coletiva de indivíduos e grupos sociais, nas relações
interpessoais e institucionais, principalmente daqueles submetidos a relações de
opressão, discriminação e dominação social. Um de seus aspectos fundamentais diz
respeito às possibilidades de que a ação local fomente a formação de alianças
políticas capazes de ampliar o debate da opressão no sentido de contextualizá-la e
favorecer a sua compreensão como fenômeno histórico, estrutural e político. O
trabalho comunitário, baseado nesse modelo, contribui para o surgimento de um
tecido social fortalecido e, essencialmente, confere poder aos sujeitos envolvidos
(BECKER et al, 2004).
Diante do exposto, pretende-se abordar a aplicabilidade do empowerment em
promoção de saúde. Para tal, este estudo se fundamentou em um breve histórico
sobre o surgimento da promoção de saúde, na descrição de conceitos pertinentes
ao tema e na análise de revisões de literatura e pesquisas, que avaliaram
intervenções cujo alvo é promover saúde através do desenvolvimento do
empowerment.
12

2 JUSTIFICATIVA

Os determinantes sociais da saúde estiveram em evidência durante


todo o curso de especialização em Atenção Básica e Saúde da Família.
Considerando as atividades desenvolvidas e o diagnóstico situacional realizado, foi
possível observar e pontuar com maior clareza estes determinantes na população da
área de abrangência da equipe de saúde bucal Vilela I. Assim, observamos a
importância de a população enfrentar, com maior autonomia, os problemas
identificados, e como a maioria destes é de origem social, o empoderamento da
comunidade, a fim de organizar e potencializar suas ações, seria uma alternativa
viável.
Além disso, o perfil socioeconômico da população é favorável ao
desenvolvimento de ações neste sentido, visto que a maioria das famílias é liderada
por mulheres e existem no bairro diversos locais com potencial para a formação de
uma rede social e indivíduos disponíveis para o desenvolvimento da mesma.
Entretanto, a gestão de saúde no município é deficiente há anos. O sistema
municipal de saúde possui nós críticos que exigem soluções complexas e
dependentes de vontade política. Sendo assim, o desenvolvimento de ações menos
dependentes da administração municipal tem maior potencial de sucesso, o que
reintera nosso interesse em estudar o empowerment como uma alternativa para
promover saúde.
13

3 OBJETIVOS

3.1 Objetivos gerais

Realizar uma revisão da literatura referente à promoção de saúde e


empowerment, com vistas ao protagonismo e autonomia dos usuários dos serviços
de saúde.

3.2 Objetivos específicos

Relatar um breve histórico sobre promoção de saúde;


Pontuar as principais discussões e conclusões das conferências
internacionais sobre promoção de saúde;
Discutir os diversos conceitos de empowerment e sua aplicabilidade na área
da saúde;
Correlacionar empowerment e promoção de saúde;
Relatar experiências que utilizaram o empowerment para promover saúde.
14

4 METODOLOGIA

A metodologia utilizada para a elaboração deste estudo fundamentou-se em


uma revisão não sistemática da literatura sobre promoção de saúde e
empowerment.
Periódicos, textos e artigos científicos eletrônicos, disponibilizados na internet
por meio de bases de dados com credibilidade no meio acadêmico, serviram como
fonte de busca.
As bases de dados utilizadas foram: Literatura Latino-Americana e do Caribe
em Ciências da Saúde (LILACS), Scientific Electronic Library Online (SciELO) e
Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (Medline), os quais foram
acessados nos portais de pesquisa Bireme (Biblioteca Virtual em Saúde) e Google
Acadêmico e do portal de periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior (Capes).
Os descritores utilizados para a busca do material foram: promoção de saúde,
health promotion, empowerment e “empoderamento”. De um total de 15.000
referências localizadas, 46 foram selecionadas para inclusão neste estudo por
estabelecerem uma relação direta com o objetivo e cujos critérios de inclusão
focaram na promoção da saúde, relatos de experiências e empoderamento. As
demais referências foram descartadas porque não estabeleciam relação direta entre
os termos pesquisados.
A estrutura do texto foi definida para facilitar a compreensão do assunto e
expor com maior clareza o tema proposto.
15

5 REVISÃO DE LITERATURA

5.1 Promoção de saúde

5.1.1 Histórico

Durante a década de 60, realizou-se um amplo debate em várias partes do


mundo, que realçou a determinação econômica e social da saúde e abriu caminho
para uma nova abordagem nesse campo, visando superar a orientação
predominantemente centrada no controle da enfermidade. Merece destaque a
abertura da China Nacionalista ao mundo exterior, com a realização das duas
primeiras missões de observação de especialistas ocidentais, promovidas pela OMS,
sob a liderança de Halfdan Mahler (1973-1974), e também o movimento canadense
– Uma Nova Perspectiva na Saúde dos Canadenses (1974) –, evidenciando que o
tradicional padrão assistencial não favorecia a promoção de uma melhor saúde.
Esses dois acontecimentos estabeleceram as bases para importantes movimentos
de convergência na conformação de um novo paradigma, formalizado na
Conferência de Alma-Ata (1978), com a proposta de saúde para todos e destacado
na Primeira Conferência Internacional sobre Promoção de Saúde (1986), com a
promulgação da Carta de Ottawa e vem se enriquecendo com a série de
declarações internacionais periodicamente formuladas nas conferências realizadas
sobre o tema (BRASIL, 2002).
Ressalta-se, também, a “Primeira Conferência Nacional de Saúde”, em 1981,
no Canadá, que introduziu a ideia de que o contexto social era um poderoso
determinante, porque moldava o comportamento individual, admitindo-se que a
escolha do estilo de vida dependia da classe social. Assim, a promoção da saúde
passou de sua base nos estilos de vida à nova orientação centrada nos fatores
sociais e ambientais. Posteriormente, em 1984, em uma conferência canadense
denominada “Além do Cuidado da Saúde”, com a participação do Escritório Europeu
da OMS, dois novos conceitos foram introduzidos: o de política pública e o de cidade
ou comunidade saudável. Admitiu-se, com isso, a influência na situação de saúde a
partir de decisões políticas externas e, com a ideia de “cidade saudável”, avançou-se
16

no conceito de empowerment e participação social, promovendo saúde através da


descentralização do poder às comunidades locais (BRASIL, 2002).
A partir da Primeira Conferência, já foram realizadas nove iniciativas
multinacionais, sete de caráter internacional/global, respectivamente em Ottawa
(1986), Adelaide (1988), Sundsvall (1991), Jacarta (1997), México (2000), Tailândia
(2005) e Quênia (2009) e outras duas de caráter sub-regional em Bogotá (1992) e
Porto de Espanha (1993). Estes são documentos de grande relevância e são
resultantes do processo de discussão e construção coletiva sobre os conceitos
fundamentais abordados no contexto, realizado em várias partes do mundo. Cada
um deles desempenha importante papel na manutenção da motivação e do
interesse sobre o tema, com a contínua ampliação dos campos de ação e
abordagens mais efetivas, para o real alcance dos objetivos traçados (BRASIL,
2002).

5.1.2 Principais conferências sobre promoção de saúde

A declaração de Alma-Ata resultante da Conferência Internacional sobre


cuidados primários de saúde, realizada na antiga União Soviética, afirmou
enfaticamente que a saúde é um direito humano fundamental, que a consecução do
mais alto nível possível desta é a mais importante meta social mundial, cuja
realização requer a ação de muitos outros setores sociais e econômicos. Reafirmou,
também, que sua promoção e proteção são essenciais para o contínuo
desenvolvimento econômico e social e contribuem para a melhor qualidade de vida e
para a paz mundial, sendo direito e dever das pessoas participar, individual e
coletivamente, no planejamento e na execução de seus cuidados e na busca de uma
vida saudável. Enunciou que os cuidados primários representam o primeiro nível de
contato dos indivíduos, da família e da comunidade com o sistema nacional de
saúde e devem ter em vista os principais problemas da comunidade, proporcionando
serviços de proteção, prevenção, cura e reabilitação, conforme suas necessidades.
Chamou a atenção ainda para que os governos cooperem num espírito de
comunidade para assegurar serviço a todos (WHO, 1978).
A Primeira Conferência Internacional sobre Promoção de Saúde, realizada em
Ottawa, Canadá, foi, antes de tudo, uma resposta às crescentes expectativas por
uma nova saúde pública, movimento que vem ocorrendo em todo o mundo, e
17

apresentou suas intenções na Carta de Ottawa. Esta definiu promoção de saúde


como um processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria de sua
qualidade de vida, incluindo uma maior participação no controle deste processo.
Para atingir um estado de completo bem-estar físico, mental e social, os indivíduos e
grupos devem saber identificar aspirações, satisfazer necessidades e modificar,
favoravelmente, o meio ambiente (WHO, 1986).
A Carta de Ottawa se apresenta como um conceito positivo, que enfatiza os
recursos sociais e pessoais, bem como as capacidades físicas do setor,
direcionando para um bem-estar global. A carta também definiu pré-requisitos, ou
seja, condições e recursos fundamentais que são: paz, habitação, educação,
alimentação, renda, ecossistema estável, recursos sustentáveis, justiça social e
equidade. Esta consiste em reduzir as diferenças em seu estado populacional,
assegurar oportunidades e recursos igualitários para capacitar todas as pessoas a
realizar completamente seu potencial saudável. Isso inclui uma base sólida:
ambientes favoráveis; acesso à informação, a experiências e habilidades na vida,
bem como oportunidades que permitam fazer escolhas por uma vida mais sadia.
Reforçar a ação comunitária e desenvolver habilidades pessoais são estratégias da
Carta de Ottawa. Dois dos objetivos traçados por ela são: reconhecer as pessoas
como o principal recurso para uma vida saudável; apoiá-las e capacitá-las para que
se mantenham sadias, assim como suas famílias e amigos; e incentivar a
participação e colaboração da comunidade (WHO, 1986).
A Conferência de Adelaide, Segunda Conferência Internacional, realizada na
Austrália, afirmou que a saúde é ao mesmo tempo um direito humano fundamental e
um sólido investimento social, devendo os governos investirem recursos em políticas
públicas saudáveis para que as iniquidades resultantes da desigualdade social
sejam diminuídas. Destacou que a ação comunitária é um ponto central da
promoção de políticas saudáveis e que os governos têm um importante papel em
seu campo de atuação, mas este é também extremamente influenciado por
interesses corporativos e econômicos, organizações não governamentais e
organizações comunitárias. A Conferência identificou quatro áreas prioritárias para
promover ações imediatas em políticas públicas saudáveis: saúde da mulher,
alimentação e nutrição, tabaco e álcool e criação de ambientes saudáveis. Além
disso, mostrou a necessidade de eventos que permitam troca de experiências nos
níveis local, nacional ou internacional (WHO, 1988).
18

A Terceira Conferência Internacional, realizada na Suécia, que elaborou a


Declaração de Sundsvall, chamou a atenção para a necessidade de ações urgentes
para se atingir uma maior justiça social em saúde. Esta Conferência sublinhou
quatro aspectos para um ambiente promotor de saúde: social, político, econômico e
a necessidade de reconhecer e utilizar a capacidade e o conhecimento das
mulheres em todos os setores, inclusive os setores político e econômico, para que
se desenvolva uma infraestrutura mais positiva e ambientes favoráveis. Entre as
quatro estratégias fundamentais identificadas pela Declaração de Sundsvall,
constam: reforçar a defesa da proposta de ações comunitárias, particularmente
pelos grupos organizados de mulheres, e capacitar a comunidade e os indivíduos a
ganharem maior controle sobre sua saúde e ambiente, através da educação e
participação nos processos de tomada de decisão (WHO, 1991).
No que concerne à Declaração de Santafé de Bogotá, elaborada em uma
Conferência Internacional de caráter sub-regional, realizada na Colômbia, tratou da
promoção de saúde na América Latina. Segundo esta declaração, a promoção de
saúde destaca a importância da participação ativa das pessoas nas mudanças das
condições sanitárias e na maneira de viver, condizentes com a criação de uma
cultura de saúde. Dessa forma, o repasse de informação e a promoção do
conhecimento constituem valiosos instrumentos para a participação e as mudanças
dos estilos de vida nas comunidades. Cabe destaque três dos 11 compromissos
assumidos nesta conferência: fortalecer a capacidade da população nas tomadas de
decisões que afetam a vida e a opção por estilos de vida saudável; reconhecer como
trabalhadores os agentes e todas as pessoas comprometidas com os processos de
sua promoção e os profissionais formados para a prestação de serviços
assistenciais que podem contribuir para promovê-la e estimular a investigação para
gerar ciência e tecnologia apropriada, disseminar o conhecimento resultante, de
forma que se transforme em instrumento de liberdade, mudança e participação
(WHO, 1992).
A Quarta Conferência Internacional, realizada em Jakarta, Indonésia, teve
como tema central a Promoção de Saúde no Século XXI. Esta declaração foi a
primeira a incluir o setor privado em seu apoio. Ela ofereceu uma ocasião para
refletir o aprendizado sobre promoção de saúde, para reexaminar os determinantes
e para identificar as direções e as estratégias necessárias para enfrentar os seus
desafios no século XXI. Reafirmou os pré-requisitos: paz, abrigo, instrução,
19

segurança social, relações sociais, alimento, renda, direito de voz das mulheres, um
ecossistema estável, uso sustentável dos recursos, justiça social, respeito aos
direitos humanos e equidade. E colocou a pobreza como a maior ameaça a uma
vida sadia. Mostrou também que as tendências demográficas tais como
urbanização, aumento no número de pessoas idosas, prevalência de doenças
crônicas, comportamento mais sedentário, resistência a antibióticos e a outros
medicamentos disponíveis, aumento do uso abusivo de drogas e violência civil e
doméstica ameaçam a saúde e o bem-estar de centenas de milhões de pessoas. As
prioridades estabelecidas para o século XXI foram: promover a responsabilidade
social para com a saúde; aumentar os investimentos para fomentá-la; consolidar e
expandir parcerias em prol dela; aumentar a capacidade comunitária e dar direito de
voz ao indivíduo e conseguir uma infraestrutura adequada. Fez ainda
recomendações para a ação, entre as quais está o apoio à criação de atividades de
colaboração e de redes para o desenvolvimento sanitário (WHO, 1997).
Na Cidade do México, por ocasião da Quinta Conferência Global sobre
promoção de saúde, denominada “Das Ideias às Ações”, foi elaborada a Declaração
do México. Esta mostrou um aumento significativo no nível de consciência em
relação aos serviços de saúde de muitos países, mas ainda há prejuízo no
desenvolvimento social e econômico que merecem soluções equitativas em termos
de saúde e bem-estar. Este encontro constatou a necessidade urgente de abordar
os determinantes sociais, econômicos e ambientais, sendo preciso fortalecer os
mecanismos de colaboração para a promoção de saúde em todos os setores e
níveis da sociedade. Concluiu que a promoção deve ser um componente
fundamental das políticas e programas públicos em todos os países
(ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE, 2000).
A sexta Conferência Global, realizada em Bangkok, firmou quatro
compromissos determinantes para alcançar a promoção de saúde como: a
promoção de saúde deve ser um componente primordial e mundial; todos os níveis
de governo possuem responsabilidade essencial no seu desenvolvimento; deve ser
um objetivo fundamental das comunidades e da sociedade civil e um requisito das
boas práticas empresariais (WHO, 2005).
A sétima Conferência Internacional, que foi realizada em Nairobi, no Quênia,
em outubro de 2009, teve uma significado especial por ocorrer em território africano
e destacou a promoção de saúde e o desenvolvimento como temática central. A
20

conferência da África mostrou a importância de reforçar a promoção da saúde


perante as ameaças decorrentes da crise financeira, do aquecimento global e das
alterações climáticas. Além disso, realçou a necessidade de aproveitar os
ensinamentos obtidos nas últimas décadas com as cartas, declarações e resoluções
que trataram da promoção da saúde e sua real aplicabilidade. O encontro afirmou
que a maioria das orientações preconizadas não foi praticada, assim estamos muito
aquém dos compromissos assumidos. Na versão do documento distribuído no final
da conferência africana, denominado “Nairobi call to action”, foi realçada a
importância da promoção como um elemento fundamental para melhorar a
qualidade de vida, reduzir as iniquidades e a pobreza e ajudar a promover
sociedades justas. Além disso, a natureza multissetorial dos desafios abordados foi
preconizada numa tentativa de que as propostas apresentadas sejam divulgadas
aos membros da Organização Mundial da Saúde, Organização das Nações Unidas,
organizações internacionais de desenvolvimento, governos, dirigentes nacionais e
locais, políticos, populações, sociedade civil, organizações privadas e não
governamentais, profissionais de saúde e acadêmicos, indivíduos, famílias,
comunidades, organizações comunitárias e redes sociais (WHO, 2009).
Portanto, as parcerias e ações intersetoriais foram consideradas condições
imprescindíveis para intervir eficazmente sobre os fatores determinantes da saúde e
atingir a equidade em saúde, implementando formas de colaboração, cooperação e
integração entre diferentes áreas, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida e
o bem-estar das populações. O compromisso global assumido neste encontro
assenta-se em três eixos fundamentais:
¾ Utilizar o potencial inexplorado da promoção da saúde;
¾ Tornar a promoção da saúde um princípio integral das políticas e das
agendas de desenvolvimento;
¾ Desenvolver mecanismos eficazes e sustentáveis de expansão da
promoção da saúde (WHO, 2009).
Como estratégias e ações foram propostas cinco orientações temáticas,
visando atuar relativamente aos fatores que limitam a eficácia dos processos de
promoção da saúde:
¾ Empoderamento individual;
¾ Empoderamento comunitário;
¾ Fortalecimento dos sistemas sociais;
21

¾ Parcerias e ação intersetorial;


¾ Capacitação para a promoção da saúde (WHO, 2009).
Segundo o documento, no empoderamento individual, a aprendizagem em
saúde é fundamental, pois proporciona os meios através dos quais o indivíduo
efetua a escolha de comportamentos saudáveis. Além disso, este processo
educativo deve ser desenvolvido considerando as necessidades de saúde, sociais e
culturais das pessoas. As ações nesta área implicam apoiar o empoderamento,
adotar tecnologias de informação e comunicação e construir e aplicar bases de
dados.
Já no empoderamento comunitário, as comunidades devem partilhar o poder,
os recursos e as capacidades de decisão, a fim de assegurar as condições
sustentáveis para a equidade em saúde. Consiste numa conjugação de esforços que
permitam colocar em prática uma intervenção ou defender uma determinada
mudança política ou social. Refere-se ao processo de capacitação das comunidades
para aumentar o controle e a capacidade de decisão, adquirindo domínio sobre os
fatores e deliberações que têm impactos decisivos sobre suas vidas. As
intervenções neste âmbito envolvem possibilitar a apropriação da comunidade,
desenvolver recursos sustentáveis e construir e aplicar bases de dados.
Durante esta conferência, houve um significativo apelo para uma ação
conjunta e global, considerando que tanto os países desenvolvidos quanto os em
desenvolvimento enfrentam riscos significativos de surgimento de surtos de doenças
que podem ser prevenidas. Assim, foram destacadas cinco responsabilidades
urgentes, para os governos e demais interessados, que consistem em reforçar as
lideranças e os grupos de trabalho; fomentar a promoção da saúde; capacitar as
comunidades e os indivíduos; melhorar os processos participativos e construir e
aplicar o conhecimento (WHO, 2009).

5.1.3 Promoção de saúde no Brasil

No Brasil, a Constituição Federal de 1988, artigo 196, estabeleceu com


grande propriedade que "a saúde é um direito de todos e dever do Estado",
garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de
doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços
22

para sua promoção, proteção e recuperação. Estas premissas são as mesmas


propostas anteriormente em nível mundial (BRASIL, 1988).
A concepção de participação social na saúde é reiterada na Lei n. 8.080 de
1990, que criou o Sistema Único de Saúde e definiu as atribuições dos diferentes
níveis de governo. Reconhece, em seu artigo terceiro, como múltiplos determinantes
a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a
renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais.
A Lei n. 8.080 não exime a sociedade de sua corresponsabilidade, mas define como
papel do Estado garantir a saúde através da:

[...] formulação e execução de políticas econômicas e sociais que


visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no
estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e
igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e
recuperação (BRASIL, 1990, p. 1).

Segundo Costa (1998), à medida que nos últimos anos, avançou no Brasil o
debate a respeito da reforma sanitária, têm aparecido referências genéricas aos
"movimentos sociais" como interlocutores das tentativas de desenvolvimento de um
novo padrão de serviços públicos de saúde. O aspecto positivo deste fato é que
esta preocupação tem permitido discutir, na área, a ação dos distintos grupos e
classes na definição das políticas sociais. Destacou que, de alguma maneira, as
propostas sobre a reorganização dos serviços de saúde deixam de ser tratadas
como questão administrativa ou de interesse puramente técnico e começam a
considerar o papel que as demandas coletivas exercem na definição da utilidade e
amplitude das políticas sociais.
No Brasil, a partir da Oitava Conferência Nacional de Saúde, realizada pelo
Ministério da Saúde em 1986, muito tem sido falado sobre promoção de saúde.
Embora a mesma esteja assinalada na Lei Orgânica e encontre ancoradouro nos
encaminhamentos da Nona Conferência Nacional de Saúde, políticas e ações não
têm sido implementadas no cotidiano dos serviços. Observa-se, com frequência, o
uso inadequado do termo, geralmente confundido com práticas de prevenção,
educação e comunicação (MELLO et al., 1998).
Mello et al. (1998) estudaram uma comunidade rural no município de
Quixadá, Ceará, com o objetivo de fortalecer as ações organizadas da comunidade
23

e sua participação na esfera institucional, através de pesquisa articulada à educação


popular. A pesquisa demonstrou a capacidade dos participantes quanto ao
reconhecimento crítico e consciente do significado e da importância da promoção de
saúde como meta política de ação. Além disso, o diálogo durante os trabalhos
proporcionou a democratização do saber, que se transformou em sugestões para
ações objetivas e reais, visando transformar as condições de vida da população. A
principal dificuldade encontrada no estudo foi de ordem financeira, sendo
solucionada com o apoio da Secretaria de Saúde do município. Concluíram que
estamos carentes não somente de políticas e ações, como de investigações
científicas que contribuam para apontar estratégias apropriadas e adequadas a cada
contexto.
O Brasil é integrante da Rede de Megapaíses para a Promoção de Saúde, da
OMS, que foi criada num encontro em Genebra, na Suíça. Nasceu do
reconhecimento, da necessidade e do potencial para possibilitar maior impacto
mundial, por meio da formação de uma aliança entre os países mais populosos.
Juntos, esses países atingem 60% da população do mundo. São eles: Bangladesh,
Brasil, China, Índia, Indonésia, Japão, México, Nigéria, Paquistão, Federação Rússia
e Estados Unidos da América. Trabalhando em conjunto, podem se constituir em
voz poderosa na agenda mundial de políticas de promoção da saúde. Podem, ainda,
direcionar os seus graves problemas na área, a fim de fortalecerem sua capacidade,
nos âmbitos mundial e nacional, no sentido de ampliar a oferta de saúde às suas
populações e também à população mundial (WHO, 1998).
Zancan e Adesse (2004) uniram a colaboração da Associação Canadense de
Saúde Pública (CPHA), da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo
Cruz (ENSP/Fiocruz) e da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), para
criar conhecimento e trocar experiências por intermédio do “Projeto de Promoção de
Saúde em Ação”. Os autores mostraram que a liderança do Canadá é reconhecida
mundialmente e que este intercâmbio técnico fortaleceu e expandiu os
ensinamentos e ações já existentes na ENSP/Fiocruz. Afirmaram, também, que os
parceiros canadenses e brasileiros se propõem, através de um novo projeto de
cooperação, apoiar municípios selecionados nas várias regiões do país, na
implementação, avaliação de intervenções e na construção de capacidades para o
desenvolvimento local e ação intersetorial. Concluíram que existe um grande
número de iniciativas em desenvolvimento, mas são poucas as experiências que se
24

têm conseguido tirar do papel e levar à prática os conceitos de desenvolvimento


humano sustentável, promoção de saúde, particularmente em territórios complexos,
como são as grandes cidades.
No Brasil, a Constituição Federal, promulgada em 1988, enfatizou a
importância de promover a saúde como direito fundamental de cidadania e defendeu
a assistência médico-sanitária integral, universal, com acesso igualitário dos
usuários aos serviços, sendo estes hierarquizados e a sua gestão descentralizada.
Estabeleceu que as ações de saúde devem ser submetidas a organismos do
executivo com representação paritária entre usuários e demais representantes
(governo, profissionais de saúde e prestadores de serviços). Assim, firmaram-se os
princípios norteadores do Sistema Único de Saúde (SUS): universalidade;
integralidade; participação e descentralização Posteriormente, as leis 8.080 e 8.142,
ambas de 1990, e as Normas Operacionais Básicas, nos anos subsequentes,
complementaram e moldaram o processo de implantação da política em questão e
definiram fóruns federativos de negociação e pactuação, tais como as Comissões
Intergestoras Bipartite e Tripartite. Desde então, o processo de implementação do
SUS tem sido um desafio, principalmente no que diz respeito à meta de garantir
saúde para todos de forma igualitária (MAIO; LIMA, 2009).
Entretanto, antes do surgimento do SUS, em outras ocasiões, a sociedade
brasileira já havia dado centralidade política à saúde pública em debates sobre as
condições de vida da população. Durante a Primeira República, um grupo de
sanitaristas, educadores e engenheiros elegeu o saneamento como primordial para
a construção da nacionalidade e da civilização. Em 1950 e 1960, o binômio
saúde/desenvolvimento foi bastante discutido, apesar das divergências de opiniões.
Embora haja continuidade entre as propostas desses períodos de nossa história e a
Reforma Sanitária, iniciada na década de 70, é importante destacar que o
movimento sanitarista contemporâneo se diferencia por propor uma articulação entre
saúde, democracia e equidade. Portanto, a construção do SUS é um desafio
permanente e tem sido muito criticada, tanto em ambiente acadêmico quanto em
diferentes espaços institucionais onde é efetivado como política social, devido a sua
institucionalização (MAIO; LIMA, 2009).
25

5.1.4 Aspectos sociais

Os determinantes sociais da saúde (DSS) foram organizados por diversos


autores através de modelos explicativos para facilitar sua análise e compreensão.
Assim, o modelo de Dahlgren e Whitehead expõe estes determinantes em camadas
diferentes que vão desde fatores individuais até os denominados
macrodeterminantes. A base do modelo representa características individuais que
possuem influência sobre a saúde de uma pessoa como idade, sexo e fatores
genéticos. Posteriormente, são indicados os comportamentos e estilos de vida
individuais, que também são considerados como integrantes dos DSS, pois são
fortemente influenciados por fatores sociais.
A próxima camada diz respeito às redes comunitárias e de apoio,
demonstrando que o nível de coesão social é fundamental para determinar a saúde.
No próximo nível, aparecem as condições de vida e de trabalho, disponibilidade de
alimentos e acesso a ambientes e serviços essenciais, como saúde e educação,
destacando que pessoas em desvantagem social possuem risco aumentado de
desencadear problemas de saúde, devido às condições precárias de habitação,
maior exposição a fatores nocivos ou estressantes de trabalho e menor acesso aos
serviços. Finalmente, no último nível, estão situados os macrodeterminantes
relacionados às condições econômicas, culturais e ambientais da sociedade e que
possuem grande influência sobre as demais camadas (GUNNING-SCHEPERS,
1999).

FIGURA 1 - Determinantes Sociais: modelo de Dahlgren e Whitehead

FONTE: GUNNING-SCHEPERS (1999)


26

De acordo com Evans et al.( 2001) estudiosos adaptaram o modelo de


Diderichsen e Hallqvist, de 1998, enfatizando a estratificação social gerada pelo
contexto social, que coloca as pessoas em posições sociais distintas e provoca
condições diferentes de saúde. Este modelo considera o processo através do qual
os indivíduos ocupam uma determinada posição social, como o sistema educacional
e o mercado de trabalho. Assim, a exposição a fatores nocivos à saúde, a
vulnerabilidade à ocorrência de doenças e as consequências sociais ou físicas das
morbidades estão relacionadas com a posição social ocupada pelo indivíduo, pois
pessoas em condições sociais desfavoráveis estão mais propensas a adquirir
problemas de saúde. As consequências sociais referem-se ao impacto que a doença
pode ter sobre a situação socioeconômica do indivíduo e sua família.

Figura 2 - Determinantes Sociais: modelo de Diderichsen e Hallqvist

FONTE: GUNNING-SCHEPERS (1999)

O modelo biomédico vigente tem como propósito a cura das doenças e a


recuperação do indivíduo, isto é, atua quando a doença já está instalada, e não se
preocupa com suas causas. Assim, o sucesso depende, também, de uma
transformação dos técnicos do setor. As diferenças naturais ou de variações
biológicas, ou a livre escolha de comportamentos de risco, não podem ser
consideradas causas da iniquidade. Mas, quando estes comportamentos de risco ou
27

exposição a situações de vida e trabalho insalubres ocorrem por falta de opção da


população e o acesso aos serviços de saúde é inadequado, caracteriza-se a
iniquidade. Concluíram que a promoção de saúde propõe uma atuação que reverta
esta situação, para que a equidade seja alcançada, isto é, possam ser criadas
oportunidades para a justiça social, que diferenças biológicas e de livre escolha
sejam respeitadas, ao mesmo tempo em que sejam asseguradas condições
mínimas para uma sobrevivência digna (BYDLOWSKI; WESTPHAL; PEREIRA,
2004).
Perante as mudanças sociais, políticas e culturais, o esgotamento do
paradigma biomédico e a mudança do perfil epidemiológico desenvolveu-se, nas
últimas décadas, um projeto em resposta aos desafios sanitários atuais, sendo uma
das principais linhas de atuação da OMS, influenciando a elaboração de políticas de
saúde de diversos países. Concluiu que o conceito/estratégia de empowerment
constitui um eixo central de Promoção de Saúde (CARVALHO, 2004).
Na visão de Braveman ( 2006), a desigualdade na saúde faz com que grupos
sociais desfavorecidos, como população de baixa renda, minoria de raças ou etnias,
mulheres, ou outros grupos que experimentaram desigualdades e discriminação
social, sofram maiores riscos que os grupos sociais mais favorecidos. A vantagem
social refere-se a uma hierarquia social, determinada pela riqueza, pelo poder, e/ou
pelo prestígio. Assim, perseguir a equidade na saúde significa perseguir a
eliminação de tal desigualdade.
Em março de 2006, foi criada, no Brasil, a Comissão Nacional sobre
Determinantes Sociais da Saúde (CNDSS), indo ao encontro do movimento global
desencadeado pela OMS, no ano anterior, com a criação da Commission on Social
Determinants of Health (CSDH), objetivando conscientizar a comunidade
internacional sobre a importância dos determinantes sociais sobre a saúde de
indivíduos e populações e a necessidade de combater às iniquidades por eles
geradas. A CNDSS possui constituição diversificada, reforçando assim a
participação solidária de todos os setores da sociedade brasileira. O Decreto
Presidencial que criou a CNDSS constituiu também um Grupo de Trabalho
Intersetorial, integrado por diversos ministérios e pelos Conselhos Nacionais de
Secretários Estaduais e Municipais de Saúde (Conass e Conasems). O trabalho
articulado da CNDSS com esse grupo permite que se multipliquem ações integradas
28

entre as diversas esferas da administração pública e que as propostas já existentes


ganhem maior coerência e efetividade (CNDSS, 2006).
Três compromissos orientam a atuação da Comissão:

¾ compromisso com a ação;


¾ compromisso com a equidade;
¾ compromisso com a evidência.

Os principais objetivos da CNDSS são:

¾ produzir conhecimentos e informações sobre os DSS no Brasil;


¾ apoiar o desenvolvimento de políticas e programas para a promoção da
equidade em saúde;
¾ promover atividades de mobilização da sociedade civil para tomada de
consciência e atuação sobre os DSS (CNDSS, 2006).

Para o alcance desses objetivos, a CNDSS desenvolveu as seguintes linhas


de atuação:

¾ produção de conhecimentos e informações sobre as relações entre os


determinantes sociais e a situação de saúde, particularmente as iniquidades
de saúde, com vistas a fundamentar políticas e programas;
¾ promoção, apoio, seguimento e avaliação de políticas, programas e
intervenções governamentais e não governamentais realizadas em nível
local, regional e nacional;
¾ desenvolvimento de ações de promoção e mobilização junto a diversos
setores da sociedade civil;
¾ manutenção de uma página institucional na internet com informações sobre
as atividades da CNDSS, além de publicações de interesse, como dados,
informações e conhecimentos sobre o assunto existentes nos sistemas de
informação e na literatura mundial e nacional;
¾ criação de um espaço de interação para intercâmbio e discussão de grupos
estratégicos relacionados aos DSS, como pesquisadores, tomadores de
decisão, profissionais de comunicação e outros (CNDSS, 2006).
29

Segundo a Comissão Nacional sobre os Determinantes Sociais da Saúde,


fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e
comportamentais influenciam nos problemas de saúde da população e em seus
fatores de risco. Entretanto, a Organização Mundial da Saúde adota uma definição
mais curta, segundo a qual os determinantes sociais da saúde são as condições
sociais em que as pessoas vivem e trabalham. Embora hoje já exista um consenso
sobre a importância destes determinantes na situação de saúde, este foi sendo
construído ao longo da história (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007).
No século XIX, predominavam estudos sobre a contaminação da água e dos
alimentos e sobre riscos ocupacionais, que respondiam às mudanças sociais e
práticas de saúde observadas nos processos de urbanização e industrialização
daquele momento. Posteriormente, com o trabalho de bacteriologistas como Koch e
Pasteur, aplica-se um novo conceito para explicar o processo saúde-doença. Assim,
o conflito entre saúde pública e medicina e entre os enfoques biológico e social do
processo saúde-doença começou a ganhar maior significado, predominando ações
voltadas para o controle de doenças específicas, baseadas na bacteriologia, o que
contribuiu para restringir a atuação da saúde pública, distanciando-a das questões
políticas e das reformas sociais e sanitárias mais amplas. Apesar do enfoque médico
biológico durante o surgimento da saúde pública como campo científico, em
detrimento dos fatores sociopolíticos e ambientais, houve períodos mais centrados
em aspectos biológicos, individuais e tecnológicos, intercalados com outros focados
nos fatores sociais e ambientais. Nas últimas décadas, avançou-se muito no estudo
das relações entre a organização e o desenvolvimento de uma determinada
sociedade e as condições de saúde de sua população. O principal desafio, neste
caso, é estabelecer uma relação hierárquica entre os fatores sociais, econômicos e
políticos e as formas como influenciam a situação de saúde de grupos e pessoas,
visto que a relação de determinação não é uma simples relação direta de causa-
efeito (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007).
São inúmeras as abordagens em relação ao modo como os determinantes
sociais geram iniquidades na saúde da população. Merece destaque o desgaste do
chamado “capital social”, ou seja, das relações de solidariedade e confiança entre
pessoas e grupos, como um meio através do qual as iniquidades de renda
influenciam negativamente a situação de saúde. Neste contexto, observa-se que as
30

sociedades com melhores níveis de saúde são as mais igualitárias e com alta
coesão social e não as mais ricas (BUSS; PELLEGRINI FILHO, 2007).

5.2 Empowerment

5.2.1 Definição e aplicabilidade

Hagquist e Starrin (1997) estudaram a tipologia de diferentes modelos para a


educação em saúde nas escolas e dividiram em quatro tipos principais, entre eles os
modelos do empowerment, que são caracterizados por uma estratégia bottom-up
(de baixo para cima). Nestes, a participação é essencial e o ambiente da escola e
as condições sociais são considerados importantes para a educação em saúde.
Todos aqueles que estão envolvidos na escola devem participar ativamente em
todas as fases do trabalho, sempre mantendo um diálogo democrático. O ponto de
partida é a participação dos alunos na identificação de problemas e necessidades.
As outras fases são destinadas à investigação, análise, preparação de uma proposta
de alteração, formulação de um programa de ação e implementação de mudanças.
Na fase final do processo, os alunos, professores e outros devem,
conjuntamente, acompanhar o que efetivamente resultou do trabalho. Concluíram
que a estratégia do empowerment tem um potencial considerável em educação
sanitária nas escolas, uma vez que é caracterizada por uma perspectiva de baixo
para cima e que, embora o conceito de empowerment como tal seja relativamente
novo, ele integra antigos ingredientes como participação e mobilização (HAGQUIST
e STARRIN,1997).
Empowerment é uma palavra da língua inglesa sem tradução para o
português. Uma tradução do verbo empower oferece os sentidos de autorizar, de
habilitar ou permitir. O sentido de habilitar, tornar hábil, apto, prover de
conhecimentos pode ser interpretado nos termos de capacitação. Para a OMS, sua
definição é bastante ampla, tendo o significado de uma mobilização de indivíduos e
grupos e a tomada de consciência do que está em jogo para alcançar seus objetivos
(WHO, 1998).
No que concerne à mobilização, Costa, Ribeiro e Silva (2000) estudaram
recentemente hospitais no Rio de Janeiro e São Paulo e uma das constatações foi a
31

de que 36% desses instituíram a participação de associações e comunidades em


itens de decisão do hospital.
Carvalho (2004) definiu empowerment como uma forma de redistribuir o poder
que se encontra desigualmente distribuído na sociedade. Descreveu duas noções
distintas: a psicológica e a comunitária. O empowerment psicológico é definido como
sendo um sentimento de maior controle sobre a própria vida que os indivíduos
experimentam através do pertencimento a distintos grupos, podendo ocorrer sem
que haja necessidade de que as pessoas participem de ações políticas coletivas,
sendo esta uma perspectiva individualista. Já o comunitário seria um elemento-
chave de politização das estratégias da nova promoção de saúde, sendo um
processo e um resultado de ações que afetam a distribuição do poder.
O autor destacou que indivíduos são capazes de reconfigurar o contexto
social no qual vivem e que isso tem consequências positivas. Concluiu que o
conceito de empowerment é útil para repensarmos práticas de educação, de gestão
de organizações, de reorganização do processo de trabalho em saúde e estratégias
de participação comunitária na área. Desta maneira, a implementação de práticas e
processos que tenham como meta o "empowerment comunitário" demanda
abordagens educativas que valorizem a criação de espaços públicos como rodas,
grupos de discussão, colegiados, gestores, que logrem promover a participação
individual e coletiva na identificação e na análise crítica de problemas vivenciados.
Visam, assim, à elaboração de estratégias de ação que busquem a transformação.
Sugeriu também trabalharmos com uma noção de parceria entre profissionais,
indivíduos e comunidades no lugar da relação hierárquica que confunde o
trabalhador com o provedor de serviços e o usuário com o cliente.
Fetterman (2004) definiu quatro etapas básicas para a aplicação do
empowerment: o desenvolvimento de uma finalidade; o estabelecimento de
estratégias de ação; a análise de forças e fraquezas; a elaboração de objetivos para
o futuro, deixando que os participantes determinassem suas próprias estratégias. O
autor concluiu que, em um momento de grande cinismo sobre negócios, educação e
futuro, a avaliação do empowerment, no Brasil, confirma que a boa-fé e a esperança
ainda existem em indivíduos e em instituições, visto que bons trabalhos vêm sendo
realizados tanto em pequena quanto em grande escala. Acrescentou que, apesar de
o trabalho baseado em comunidades ainda não ser perfeito e possuir falhas, é uma
forma de mudança e transformação. Portanto, um modelo em que a determinação
32

pessoal seja fundamental, cria uma força em nossas comunidades para fazer o bem
e perseguir a justiça social.
O termo empowerment tem sido traduzido pelos neologismos de
apoderamiento (espanhol) e “empoderamento” (português, espanhol), sem
significado dicionarizado na língua portuguesa. O termo introduz o paradoxo de que
categorias que dispõem de poder possam criar condições para que grupos excluídos
socialmente venham a adquiri-lo. Empowerment, contudo, não é visto como meio de
fortalecer a ação coletiva contra as estruturas de poder. Para expressar a teoria
social implícita, é um método de construção de consenso que exige negociação e
ajuste social. O papel dos “empoderadores” pertencentes aos serviços públicos é o
de estabelecer uma mediação entre as demandas dos grupos de pessoas menos
favorecidas ou “excluídas” e os interesses de grupos situados em posições mais
favorecidas na sociedade. Assim, a melhoria na qualidade dos serviços e ações de
saúde, preventivas ou de promoção, só é possível com a participação efetiva da
população, pois somente ela pode mostrar os problemas e as soluções que atendam
às suas necessidades (STOTZ; ARAÚJO, 2004).
Porém, no Brasil, a dificuldade de sobrevivência, o déficit educacional, a baixa
renda per capita e a desconfiança mútua não contribuem para a mobilização popular
em prol de um bem comum, gerando uma pequena capacidade de organização da
sociedade civil. Mesmo assim, durante os últimos dez anos, as associações de
pacientes têm crescido, explicitando objetivos que vão desde a defesa dos direitos
dos pacientes até a busca por mais informação, maior autonomia e responsabilidade
pela própria saúde. Os grupos voltados às questões do HIV/AIDS, os quais reúnem
pacientes, familiares, amigos e profissionais de saúde, têm se destacado no cenário
das associações. Portanto, os “promotores de saúde” - especialistas, técnicos,
profissionais, lideranças – deveriam ser aliados dos movimentos populares nos
conflitos em curso na sociedade. Esses “promotores” poderiam, então, superar a
concepção tradicional de promoção que ainda orienta as suas práticas (STOTZ;
ARAÚJO, 2004).
A proposição de mudanças no estilo de vida, que podem influenciar o
princípio da autonomia das pessoas, tem de ser esclarecida e discutida com os
indivíduos em questão. As decisões e deliberações destes têm de ser respeitadas,
pois, em certas circunstâncias, decisões tecnicamente satisfatórias podem não ser
33

aceitas por determinado indivíduo ou grupo (BYDLOWSKI, WESTPHAL; PEREIRA,


2004).
O profissional de saúde também precisaria ser “empoderado”, na medida em
que não esteja consciente de seu real papel. Entretanto, nas atuais circunstâncias, o
setor público, estatal, não consegue cumprir, sozinho, esta tarefa. Mas, por outro
lado, os espaços públicos não estatais, como as organizações não governamentais
e as frágeis instâncias responsáveis pelo apoio social, estão longe de representarem
áreas alternativas suficientemente consistentes. Assim, sabemos o que fazer hoje,
“empoderar”, e quem deve ser “empoderado”, a população e o profissional de saúde,
mas não temos claramente estabelecido como, onde e o que fazer. Um possível
começo seria realizar pesquisas empíricas que pudessem trazer à luz as
representações sociais dos profissionais e dos indivíduos. Estas poderiam constituir
uma significativa matéria-prima que ajudaria muito no desenho do conteúdo e da
forma destes processos “empoderadores” (LEFÈVRE; LEFÈVRE, 2004).
Para a construção de autonomias de sujeitos, sejam estes gestores, técnicos,
profissionais, usuários dos serviços de saúde, família, comunidade, enfim, cidadãos,
é importante enfrentar os limites postos, sejam sociais, econômicos, culturais ou
biológicos. Empowerment adota o fenômeno do poder, como trunfo para virar a
mesa do jogo e resgatar o sujeito como protagonista, instrumentalizando a indicação
de estratégias de superação dos problemas, dando oportunidade para que os
poderes se expressem também de baixo para cima, a partir das necessidades dos
usuários (PIRES, 2005).
Burwen, Sylvester e Patow (2006) estudaram organizações interessadas em
promover saúde. Mostraram que a coordenação entre a associação das
organizações comunitárias e os departamentos públicos pode ser mutuamente
benéfica. Elas podem utilizar os dados coletados e publicados para determinarem as
necessidades de saúde de suas populações e realizarem ações regionais
aumentando a eficácia do serviço. Concluíram que as tarefas complementares, que
cada setor pode executar, devem ser identificadas e esta integração pode ajudar a
assegurar que os serviços mais importantes sejam fornecidos, bem como aumentar
os esforços realizados por cada organização isoladamente.
O empowerment tem assumido significações que se referem ao
desenvolvimento de potencialidades, aumento de informação e percepção, com o
objetivo de que exista uma participação real e simbólica que possibilite a
34

democracia. Este tem sido tema recorrente no discurso político mundial, nas últimas
décadas, e uma de suas expressões tem sido a implantação de conselhos gestores
nos diversos níveis governamentais em vários países. A criação destes conselhos
foi a partir de 1988 e suscitou diversas experiências participativas, embora ainda
predominem práticas autoritárias que inviabilizam a participação e o empowerment
(WENDHAUSEN; BARBOSA; BORBA, 2006).
O objetivo dos autores em seu estudo foi mapear recursos/participação, em
quatro conselhos gestores municipais de Itajaí, Santa Catarina, para a saúde,
assistência social, segurança alimentar e nutricional e para o conselho do idoso. Os
conselheiros foram questionados acerca de suas redes de apoio, a quem recorrem
para algum tipo de ação ou reivindicação. Chamou a atenção que, de todos os
pesquisados (53), somente três, ou seja, 5,66% citaram diretamente a comunidade e
sete, 13,2%, a entidade que representam. Quanto ao perfil dos participantes,
constaram que a maioria concentra-se na idade adulta, é do gênero feminino, possui
um alto grau de escolaridade e trabalha no setor público. Detectou-se a presença de
um elevado número de pessoas ligadas à Igreja, as quais se concentram na
representação usuária e/ou não governamental. A maior parte dos entrevistados
está em sua primeira gestão e foi indicada, sem processo eletivo. Um terço dos
participantes relatou possuir algum tipo de formação sobre a função que exerce,
porém não conseguiu explicitá-la (WENDHAUSEN; BARBOSA; BORBA, 2006).
Concluíram que a atuação nesses conselhos deve “desmonopolizar” o poder
e o saber, tornando-o um espaço de diálogo e articulação dos envolvidos, o que
pressupõe habilidades específicas que poderiam ser garantidas através de
capacitação ou educação permanente e formativa. Os momentos de capacitação
devem se tornar cotidianos e com metodologias ativas, fundamentadas numa
concepção crítica das relações humanas, inspirando uma prática educativa
transformadora e participativa, centrada na construção do conhecimento e na
aprendizagem de conteúdos vivos, significativos e atualizados, que levam ao
empowerment, passando a ser o papel de gestão, parceria e responsabilidade que
cada ator social assume, junto com o Estado, na acepção de tomar rumos para
influenciar no destino dos recursos públicos e na formulação de políticas públicas
que representem a necessidade e a vontade dos cidadãos (WENDHAUSEN;
BARBOSA; BORBA, 2006).
35

Wilson et al. (2006) avaliaram um projeto de empowerment para promover


habilidades de solucionar problemas, ação social e participação cívica entre jovens
de uma escola de ensino fundamental e médio. O objetivo do programa era
identificar e construir capacidades e forças na juventude, como meio de diminuir o
uso do álcool, do tabaco, de drogas ilícitas e comportamentos de risco. Discutiu-se a
intervenção e os fatores que contribuem à ação social bem-sucedida, incluindo a
dinâmica de grupo, a liderança dentro deste, as habilidades do facilitador e o
contexto da comunidade e da escola. Os adolescentes foram recrutados em cinco
escolas, de populações menos favorecidas, em outubro de 2003, totalizando 122
participantes, divididos em 13 grupos. Dois facilitadores trabalharam em cada grupo,
dando instruções para o programa, guiando os grupos em suas decisões, facilitando
o diálogo crítico, a organização de estratégias, a gestão, a compreensão
multicultural, a familiarização com questões de saúde na comunidade, e o
desenvolvimento dos alunos. Os autores concluíram que os trabalhos, neste sentido,
devem engajar os participantes na ação social, logo no início da formação do grupo,
e reservar tempo suficiente para completar e avaliar o projeto. Planos do programa
devem abordar os obstáculos que limitam as iniciativas mais profundas. Os
mediadores, para ajudar os jovens, precisam “olhar para o problema por detrás",
para ir além de sua primeira impressão e explorar o contexto social. Apesar dos
desafios apresentados, as estratégias podem realizar programas refinados a fim de
envolver jovens e adolescentes, na concepção e condução da ação social, no
contexto da comunidade, com base em prevenção e investigação (WILSON et al.,
2006).
Kleba, Comerlato e Colliselli (2007) estudaram o novo caráter que a gestão
pública assumiu, no Brasil, a partir de 1990. Observaram que a sociedade foi
“convocada” a participar na definição das políticas sociais por meio da criação de
conselhos deliberativos em todos os níveis de governo e em diferentes áreas da
administração pública. Esta mudança ampliou não apenas o poder dos diferentes
segmentos sociais, garantindo maior participação nos processos constitutivos da
política e, consequentemente, na organização dos serviços públicos, mas também
sua responsabilidade, na medida em que esta requer capacidade de análise,
proposição e articulação na defesa de interesses ou concepções.
Esses autores concluíram que participar do planejamento e do controle das
políticas públicas exige dos interessados mais do que boa vontade e engajamento
36

pessoal, requer o domínio de instrumentos como acesso e análise de informações,


formulação e negociação de propostas, estabelecimento de prioridades e definição
de estratégias, comunicação e negociação com diferentes atores sociais e, o mais
complexo, compreensão de conceitos e capacidade de análise social e política.
Tengland (2007) observou que o empowerment é um conceito que tem sido
muito usado e discutido nos últimos anos, entretanto, nem sempre seu significado
central é esclarecido explicitamente. O termo é utilizado de diversas maneiras na
literatura, porém estes usos normalmente são similares. O autor relacionou o
referido termo com promoção de saúde, dividindo-o em duas categorias principais:
como objetivo ou alvo de uma atividade e como um processo, método, ideologia ou
filosofia para alcançar estes objetivos. Para ele, como um objetivo, consiste em
maneiras diferentes de ajudar os indivíduos a ganharem melhor controle sobre sua
vida, equivalendo a um aumento na habilidade geral de alcançar os objetivos
pretendidos, ou seja, diminui os efeitos de fatores externos: físicos, sociais,
obstáculos políticos, econômicos; liberdade, oportunidade, conhecimento,
desenvolvimento das habilidades e da autonomia.
Sendo assim, é uma meta da promoção de saúde, pois gera autoestima,
autonomia, bem-estar e autoconfiança. Já como um processo tem aplicabilidade na
promoção de saúde somente em um grupo ou em uma comunidade e envolve
fundamentalmente os participantes na formulação do problema, na tomada decisão
e na ação. Entretanto, o autor evidenciou que, especialmente como um processo,
ele não é tão facilmente aplicável à população. Dessa forma, para sua implantação,
requer mais treinamento dos profissionais da área, ajustes no currículo dos
trabalhadores de saúde pública, na promoção e educação em saúde e em outros
setores, como trabalho e educação social. Finalmente, requer a coragem dos
profissionais de minimizar seu controle e seu poder, acreditar que as pessoas têm
potencial e usar as ferramentas necessárias para a mudança (TENGLAND ,2007).
Carvalho e Gastaldo (2008) descreveram o arcabouço teórico e as estratégias
centrais da Promoção à Saúde e analisaram um de seus conceitos estruturantes, o
conceito de empoderamento, explorando seu potencial para a transformação
comunitária e profissional e buscando entender as relações de poder que se
estabelecem a partir das práticas e políticas de Promoção à Saúde. O estudo
sugeriu que, embora seja pertinente reconhecer os potenciais do empoderamento
para a promoção da saúde, são necessárias precauções antes de aplicar esta
37

estratégia nas práticas sociais e sanitárias, pois a noção de empoderamento, um


dos eixos da Promoção à Saúde moderna, admite interpretações diversas.
O empoderamento social/comunitário, por exemplo, é capaz de contribuir para
o avanço de políticas públicas intersetoriais com potencial político em prol da
cidadania, produzindo sujeitos reflexivos, autônomos e socialmente solidários.
Assim, pode contribuir para a consolidação de modelos de saúde de caráter
universal e equitativo e para a construção de políticas públicas e sociais que
interfiram sobre os múltiplos determinantes do processo saúde/doença. Os autores
destacaram as contribuições teóricas e práticas da referida categoria para repensar
estratégias de educação para a saúde. Porém, concluíram que a noção de
empoderamento apresenta limitações importantes como, por exemplo, a
insuficiência da referida categoria para compreender múltiplas formas de opressão
que ocorrem no cotidiano social, como as relações de gênero e de raça
(CARVALHO e GASTALDO, 2008).
A Estratégia saúde da Família é um lócus favorável para o exercício da
democracia e fortalecimento da promoção da saúde no Brasil. A participação popular
é a possibilidade de os cidadãos exercerem o papel de protagonistas na construção
e organização do sistema local de saúde. Assim, é uma atitude e um comportamento
a ser construído pela reflexão crítica e pelo amadurecimento do cidadão, sendo
imprescindível a consolidação de práticas democráticas no processo de trabalho das
equipes de saúde. Estas equipes devem interagir com a comunidade, sendo
reconhecidas como integrantes da mesma e como facilitadoras da melhoria das
condições de vida, gerando melhores condições de saúde. Para a produção de
sujeitos reflexivos autônomos e socialmente solidários, é necessária a busca
constante por espaços que valorizem a participação da comunidade e o encontro
dos profissionais e usuários do SUS, atuando como parceiros, além de práticas
democráticas no campo da saúde. Portanto, o Programa Saúde da Família é um
lócus favorável para o empoderamento/libertação não só da população, mas dos
gestores e profissionais da área da saúde (MARTINS et al., 2009).
Empoderamento é um termo multifacetado que se apresenta como um
processo dinâmico, envolvendo aspectos cognitivos, afetivos e condutais. As origens
acerca da concepção do empoderamento são diversas. Assim, duas vertentes
teóricas são destacadas para este termo polissêmico: a primeira ligada a ações
assistencialistas que cumprem políticas de ajustamento estrutural, com o objetivo de
38

integrar os indivíduos ao sistema capitalista; a segunda vertente defende a


autodeterminação de indivíduos e comunidades, objetivando uma participação
simbólica e real na busca da democracia e equidade, em que o profissional assume
um papel importante na mediação de processos propulsores do empoderamento
(KLEBA E WENDAUSEN, 2009).
Assim, Kleba e Wendausen (2009) descreveram o processo de
empoderamento a partir de dimensões da vida social em três níveis: psicológica ou
individual; grupal ou organizacional; e estrutural ou política. O empoderamento
pessoal possibilita a emancipação dos indivíduos, aumenta a autonomia, a
liberdade, a compreensão crítica sobre o contexto e as relações sociopolíticas, a
autoconfiança, o desejo de ser ativo e de exercer influência sobre o meio e
desencadeando convicção acerca da própria competência e capacidade. No nível
grupal, desencadeia respeito recíproco e apoio mútuo entre os membros do grupo,
promovendo o sentimento de pertencimento, práticas solidárias e de reciprocidade.
Além disso, promove estruturas decisórias e participativas, ação social coletiva,
articulação em rede com outras pessoas e organizações. Já o empoderamento
estrutural favorece e viabiliza o engajamento, a corresponsabilização e a
participação social na perspectiva da cidadania. Assim, defende a sensibilização
para recursos existentes, a utilização de oportunidades de apoio externo, a
mediação de capacidades associativas e a motivação para projetos que promovem
ações conjuntas. Os processos de empoderamento são mediadores dos espaços
de participação política, facilitam a superação de conflitos e as relações sociais e
possibilitam a revisão de papéis e de sentidos na vida cotidiana.
Entretanto, desde a implantação dos conselhos gestores em várias áreas
sociais, em 1998, estes ainda não possuem efetividade e qualidade em suas
participações. Assim, a participação social é considerada fundamental na aplicação
da promoção de saúde, pois permite agregar parceiros que, ao serem empoderados,
possam qualificar o processo de mudança do modelo de saúde, de assistência
social e de democratização, possibilitando transformações nas condições sociais
que afetam a qualidade de vida das pessoas e da sociedade como um todo (KLEBA
E WENDAUSEN, 2009).
39

5.2.2 Resultados esperados

O empowerment é visto como emergente em um processo de ação social, no


qual indivíduos tomam posse de suas próprias vidas pela interação com outros, o
que gera um pensamento crítico em relação à realidade, favorece a construção da
capacidade social e pessoal e possibilita a transformação das relações de poder. No
nível individual, refere-se à habilidade das pessoas em ganhar conhecimento e
controle sobre forças pessoais, sociais, econômicas e políticas para agir na direção
da melhoria de sua situação de vida. O caso da aids é representativo da busca de
empowerment pela mobilização dos pacientes, profissionais e familiares. No
contexto dos usuários dos serviços de saúde, o termo significa pacientes passarem
a ter uma voz na organização, a adotar postura mais ativa no tratamento, com
discussão e questionamentos ao médico, na busca de informação, assumindo
também a responsabilidade por sua própria saúde, além de serem informados sobre
decisões do tratamento. Alguns aspectos foram discutidos em relação à participação
de usuários do Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas da Fundação Oswaldo
Cruz (IPCEC/Fiocruz), localizado no Rio de Janeiro, que presta atendimento e faz
pesquisa na área das doenças infectocontagiosas, na Associação Lutando para
Viver (ALpViver), que atua dentro do hospital e apoia estes pacientes com cestas
básicas de alimentos e com um local de troca de informações e experiências
(ANDRADE; VAITSMAN, 2002).
Os dados foram levantados a partir de pesquisa qualitativa, com entrevistas
semiestruturadas, visando apreender percepções e opiniões a respeito do papel e
da atuação da ALpViver, no IPCEC. Foi observado que a valorização de uma cultura
participativa dentro das instituições de saúde contribui para aumentar a autonomia e
elevar a autoestima dos usuários, melhorando a qualidade de vida e de saúde dos
mesmos. O estudo mostrou também que houve uma maior integração entre os
pacientes, formando laços de amizade e fortalecendo a rede social dentro do
hospital, que envolveu também funcionários, familiares e amigos. A sua atuação
implicou então a formação de uma rede de apoio e o fortalecimento desta contra o
isolamento, proporcionou a retomada da sociabilidade. A iniciativa contribuiu para
que os pacientes ganhassem mais autonomia e cuidassem melhor da própria saúde,
sem a necessidade permanente do aval e/ou da intervenção do médico. A maior
convivência entre pacientes/pacientes e pacientes/profissionais também possibilitou
40

a detecção de algumas dificuldades que podem interferir na eficácia do tratamento.


Sendo assim, os autores concluíram que a ALpViver, através de ações de apoio
social, possibilitou a formação e o estreitamento de uma rede de relações sociais e
ajuda mútua. Estas ações contribuíram para o empowerment no sentido do
desenvolvimento e da descoberta de capacidades individuais, do aumento da
autoestima e de um papel mais ativo no tratamento (ANDRADE; VAITSMAN, 2002).
Becker et al. (2004) discutiram o conceito de empowerment em promoção de
saúde, através da análise de uma intervenção territorial, a Iniciativa de Vila
Paciência, uma proposta de ação social realizada na Zona Oeste do Rio de Janeiro,
em um contexto de grande vulnerabilidade. Trata-se de uma experiência em que o
empowerment pessoal e coletivo constituiu objetivo central. O processo avaliativo
foi estruturado em três níveis complementares: o diagnóstico comunitário, seus
resultados e implicações; o estudo das intervenções realizadas pelos próprios
moradores, capacitados por uma metodologia participativa de planejamento e
solução de problemas, chamada de Problem Solving for Better Health (PSBH); e a
sistematização de depoimentos e relatos dos participantes sobre as experiências
vivenciadas no programa.
A metodologia PSBH, chamada no Brasil de Construção Compartilhada de
Soluções em Saúde, pode ser definida como uma ferramenta de capacitação de
profissionais e lideranças comunitárias para o enfrentamento de suas dificuldades e
obstáculos. Caracteriza-se por permitir que os participantes aprendam a priorizar e
analisar os problemas e recursos de suas comunidades ou organizações,
elaborando projetos de intervenção que solucionem ou contribuam para resolver
estes problemas. A construção participativa é a marca do programa, a interação
entre a ação técnica e a iniciativa popular constitui o eixo estrutural, que confere
identidade ao mesmo. O trabalho contribuiu para elevar a autoestima e fortalecer o
potencial dos moradores, que perceberam que são capazes de realizar uma ação
concreta para suas famílias e comunidade. Além disso, fortaleceu um clima de
solidariedade e trabalho em rede (BECKER et al., 2004).
Este movimento favoreceu também o surgimento de grupos que se
articularam no sentido de criar instâncias de representação e organização
comunitária. Muitas outras atividades informais e espontâneas vêm surgindo e são
agregadas à iniciativa. O processo resultou em moradores mais “empoderados” para
a conquista de melhores condições de vida para suas comunidades. Um dos
41

principais resultados foi o aumento da mobilização comunitária e o envolvimento


progressivo da comunidade, que resultou no estabelecimento de uma maior
autonomia de seus moradores no que se refere à organização de suas ações locais.
Os moradores produzem, atualmente, suas próprias atividades comunitárias e, deste
modo, superam o imobilismo e avançam na consolidação de uma organização social
mais fortalecida (BECKER et al., 2004).
Reis e Vianna (2004) avaliaram ações de promoção de saúde no Centro de
Saúde Escola Germana Sinval Faria (CSEGSF) da ENSP/Fiocruz, localizado no Rio
de Janeiro. Entrevistaram pessoas relacionadas com ações do CSEGSF, por meio
de questionário semiestruturado baseado em indicadores como controle social,
preocupação com justiça e equidade, participação para o desenvolvimento social e
econômico saudável e capacitação profissional para mudanças de atitude. Os
resultados mostraram que muitos usuários não fazem parte do conselho gestor e
dos centros de estudos, que são reuniões abertas. Além disso, a maioria dos
entrevistados (78%) correlacionou promoção de saúde e responsabilidades
institucionais e profissionais. Somente o restante correlacionou com iniciativas
individuais e 28% acharam que a participação precisa melhorar. A relação
profissional/usuário foi considerada boa por 71% dos participantes. Destacaram as
parcerias com instituições governamentais, não governamentais, empresariais,
escolas e creches, assim como a contribuição para as mudanças no estilo de vida
dos que frequentam o serviço.
Esses autores concluíram que ações de capacitação profissional para
mudanças de atitude estão restritas a iniciativas individuais, apontando a
importância de políticas e ações direcionadas ao desenvolvimento profissional.
Sendo assim, ainda existe um grande caminho a percorrer no campo da formação
política, tanto dos profissionais do setor, que têm participação desarticulada nos
processos decisórios e de reorientação, quanto da população, seja como membros
do conselho gestor ou como lideranças comunitárias.
Arneson e Ekberg (2005) avaliaram uma intervenção com o objetivo de
promover empowerment e saúde entre empregados de três organizações do setor
público na Suécia, Europa, através de uma estratégia bottom-up (de baixo para
cima). O estudo foi executado em 13 grupos, de seis a oito pessoas, que se
encontraram uma vez por semana, num período de quatro meses. Os grupos
criaram objetivos e desenvolveram estratégias para alcançá-los; criticaram e
42

discutiram as carências e as necessidades da gestão e do local e propuseram novos


métodos de trabalho. Após a intervenção, 30 informantes foram entrevistados em
sete grupos. Foi relatado que a autoconscientização melhorou, resultando em
aumento na autoestima e reforço da saúde. Após a reflexão sobre as condições,
eles priorizaram a si mesmos e a sua saúde, em vez de dar prioridade à produção.
As discussões explicitaram sua situação de trabalho e facilitaram a
compreensão das experiências e reflexões dos colegas. Os trabalhadores
partilharam suas experiências e opiniões. Esta visão causou confiança e uma
sensação de não estarem sozinhos. Disseram ter ganhado o conhecimento e a
compreensão sobre si, tanto profissionalmente como particularmente. Concluíram
que a coerência do grupo facilitou situações diárias de trabalho quando algum tipo
de apoio era necessário. Assim, o trabalho conjunto foi uma grande vantagem do
processo e rentável socialmente.
Bandesha e Litva (2005) estudaram as diferenças na percepção da
participação, entre a comunidade e o profissional de saúde, em um projeto, no sul da
Ásia. Através de entrevistas realizadas para explorar as opiniões dos profissionais e
da comunidade, utilizaram uma estrutura qualitativa e constataram que a população
em questão não sentiu ter participação ativa no projeto, devido à falta de consciência
cultural que dificultou a participação. Os entrevistados concordaram que houve um
aumento na autoconfiança dos participantes e a criação de uma população mais
informada. Entretanto, houve pouca sustentação para reivindicações de melhorias
na coesão social e mudanças diretamente no estilo de vida. Concluíram que a
promoção de saúde rejeita antigas e individualistas tentativas e abraça a base
comunitária para reduzir desigualdades, mas converter a participação em realidade
é um grande desafio, pois os indivíduos devem estar dispostos.
Mendonça, Andrade e Ferreira (2005) avaliaram a participação de
adolescentes do projeto Guanabara da Universidade Federal de Minas Gerais em
atividades de saúde e utilizaram duas metodologias: participação a partir do
planejamento e a partir das atividades planejadas. Contribuíram para este estudo 37
adolescentes de escola pública, na faixa etária de 12 a 14 anos, de menor condição
socioeconômica, divididos em dois grupos. As atividades foram planejadas e
desenvolvidas de maneira participativa somente pelo grupo 1. Já o grupo 2 entrou
após a conclusão do planejamento. As ações foram avaliadas segundo a relação
educador/educando e o desenvolvimento de cada grupo.
43

No grupo 1, observou-se colaboração, autonomia, participação decisória e


operacional e desenvolvimento do direito de opinar, modificar, questionar ou inventar
ações. O grupo 2 demonstrou colaboração, dependência e limitou-se a seguir o que
havia sido determinado, apesar de ter tido a oportunidade de opinar, sugerir e fazer
modificações no planejamento durante a execução das atividades. Assim, não
desenvolveram o poder de decisão. Portanto, a metodologia que inclui o
planejamento das atividades possibilitou ao grupo 1 uma postura de independência,
iniciativa e execução das atividades, com percentuais mais expressivos de
participação operacional, planejadora e/ou decisória; ainda mais efetiva quando o
tema foi escolhido espontaneamente, sem influência das monitoras. A atuação a
partir do planejamento pôde favorecer a formação de um sujeito mais autônomo e
com maior capacidade de decisão. O indivíduo é um sujeito em transformação
quanto quer e pode realizar alguma coisa. O querer está relacionado às
necessidades, ao desejo, à emoção, à afetividade e aos valores assimilados. No
entanto, é necessário também o poder, como capacidade de agir, de realizar, tanto o
poder material e estrutural quanto na forma de conhecimento e habilidades
(MENDONÇA, ANDRADE E FERREIRA, 2005).
Almeida, Dimenstein e Severo (2010) analisaram o funcionamento de uma
associação que agrega pacientes dos serviços de saúde mental, familiares e
profissionais, com a finalidade de identificar os efeitos que este funcionamento
produz no cotidiano desses usuários e os obstáculos que entravam sua organização.
Esta investigação evidenciou o enfraquecimento das tentativas de empoderamento
dos usuários devido à complexidade de fatores institucionais, políticos e financeiros,
como, por exemplo, o enrijecimento e burocratização da rotina da associação, a
passividade dos usuários e a participação predominantemente dos técnicos nas
tomada de decisões. Além da pouca participação e exercício do controle social por
parte dos usuários e familiares, também foi observada uma desarticulação da
associação com outros movimentos sociais locais. Os autores concluíram que
estabelecer contatos e alianças com outros movimentos sociais, organizações não
governamentais e projetos de ação social é essencial na dinâmica da rede de
serviços substitutivos ao manicômio e em outros setores da sociedade.
Figueiró e Dimenstein (2010) discutiram a ajuda mútua e o empoderamento
entre usuários de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Fazendo uso da
entrevista e de observação participante, relataram que o modo de funcionamento, a
44

concepção terapêutico-clínica que norteia os profissionais e serviços, a dinâmica de


funcionamento e a gestão dos CAPSs, principalmente a “heterogestão” das
atividades, dificultam possíveis articulações entre os usuários, atitudes de ajuda
mútua e empoderamento. Assim, os CAPSs estudados mostraram-se como espaços
de captura e de anulação do potencial de seus usuários. Os autores concluíram que
precisamos acreditar no ser humano e em sua capacidade de se apropriar da
própria vida, vencer obstáculos, transpor limites e expandir possibilidades. Porém,
enquanto essa for a realidade da atenção em saúde mental, dificilmente
conseguiremos os avanços nas dimensões culturais e de cidadania, referentes ao
processo de reforma psiquiátrica brasileira.
45

6 DISCUSSÃO

A Primeira Conferência Nacional de Saúde, no Canadá, em 1981, introduziu a


ideia de que o contexto social é um poderoso determinante da saúde, pois molda o
comportamento individual e esta começou a ser discutida mais detalhadamente.
Assim, a promoção de saúde passou a ser centrada nos fatores sociais e ambientais
(BRASIL, 2002).
Promoção de Saúde é o processo de capacitação da comunidade para atuar
na melhoria de sua qualidade de vida, ou seja, atua nas condições e recursos
fundamentais que são: paz, habitação, saneamento básico, educação, alimentação,
trabalho, renda, transporte, lazer, acesso aos bens e serviços essenciais,
ecossistema estável, recursos sustentáveis, justiça social e equidade. Fatores
políticos, econômicos, sociais, culturais, ambientais, comportamentais e biológicos
podem tanto favorecer como prejudicar a saúde. Tendências demográficas tais
como urbanização, aumento da população idosa, prevalência de doenças crônicas,
comportamento sedentário, resistência a antibióticos e a outros medicamentos
disponíveis, aumento do uso abusivo de drogas e a violência civil e doméstica
ameaçam o bem-estar de centenas de milhões de pessoas (BRASIL, 1990; WHO,
1986; WHO, 1997).
Ações em outros setores, além do setor saúde, com a finalidade de promover
melhorias, foram citadas por um número considerável de autores que evidenciaram
que a promoção de saúde demanda uma ação coordenada entre todas as partes
envolvidas: governo, setores sociais, econômicos, políticos, públicos, privados,
organizações voluntárias e não governamentais, autoridades locais, indústria, mídia
e instituições. Envolvem indivíduos, famílias, comunidades e profissionais de saúde
(WHO, 1978; WHO, 1986; BRASIL, 1988; WHO, 1988; WHO, 2000).
As ações comunitárias foram evidenciadas por diversos autores,
demonstrando que a promoção de saúde trabalha através do reforço de ações
concretas e efetivas no desenvolvimento das prioridades, na tomada de decisão, na
definição de estratégias e na sua implementação, visando à melhoria das condições
de vida. Somente a população pode mostrar os problemas e as soluções que
atendam às suas necessidades. Entretanto, no Brasil, a dificuldade de
sobrevivência, o déficit educacional, a baixa renda per capita e a desconfiança
mútua não contribuem para a mobilização popular, gerando uma pequena
46

capacidade de organização da sociedade civil, mas, durante os últimos dez anos, as


associações têm crescido (CARVALHO, 2004; COSTA, 1998; STOTZ; ARAÚJO,
2004; WHO, 1986, 1988, 1991, 1992, 1997).
O empowerment adota o fenômeno do poder para resgatar o sujeito como
protagonista, por meio de estratégias de superação dos problemas identificados,
dando oportunidade para que este se expresse também de baixo para cima, a partir
das necessidades dos usuários. Assim, introduz o paradoxo de que categorias que
dispõem de poder possam criar condições para que grupos excluídos socialmente
venham a adquiri-lo, ou seja, é uma forma de redistribuir o poder que se encontra
desigualmente distribuído na sociedade. Portanto, este é um método de construção
de consenso que exige negociação e ajuste social. Consiste em maneiras diferentes
de ajudar os indivíduos a ganhar melhor controle sobre sua vida, aumentar sua
habilidade geral de alcançar metas pretendidas e diminuir os efeitos de fatores
externos (físicos, sociais, obstáculos políticos, econômicos), fornecendo liberdade,
oportunidade, conhecimento e autonomia.
Sendo assim, ele é um dos focos da promoção de saúde, pois gera
autoestima, autonomia, bem-estar e autoconfiança. Empowerment foi interpretado
como capacitação, mas, segundo a OMS, sua definição é bastante ampla, tendo o
significado de uma mobilização de indivíduos e grupos e a tomada de consciência
para alcançar seus objetivos. No contexto dos usuários dos serviços de saúde,
significa os pacientes passarem a ter uma voz na organização, a adotar postura
mais ativa no tratamento, com discussão e questionamentos ao médico, na busca de
informação, assumindo a responsabilidade por sua própria saúde (ANDRADE;
VAITSMAN, 2002; CARVALHO, 2004; PIRES, 2005; STOTZ; ARAÚJO, 2004;
TEGLAND, 2007; WHO, 1998).
Um número considerável de estudos, incluídos na presente revisão, avaliou
intervenções cujo objetivo era promover o empowerment em grupos diversos,
incluindo escolas, associações de pacientes em centros de saúde e hospitais,
comunidades, empregados de organizações do setor público e associações
interessadas em promover saúde.
Hagquist e Starrin (1997), Mendonça, Andrade e Ferreira (2005) e Wilson et
al. (2006) corroboram que a estratégia do empowerment tem um potencial
considerável em educação sanitária nas escolas. Além disso, a metodologia inclui o
planejamento das atividades pelo grupo envolvido e possibilita uma postura de
47

independência, colaboração e autonomia na execução das ações e maior


participação operacional, planejadora e decisória. Por outro lado, se o mesmo
começa a participar após a conclusão do planejamento, observa-se dependência,
passividade, limitação e não ocorre o desenvolvimento do poder de decisão.
Portanto, se o planejamento de uma atividade tiver colaboração de todos os
envolvidos, estará acontecendo uma formação para a autonomia. Sendo assim,
concluíram que, apesar dos desafios apresentados, esta estratégia pode realizar
programas refinados para envolver adolescentes e jovens, na concepção e
condução da ação social.
Costa, Ribeiro e Silva (2000) constataram que 36% dos hospitais no Rio de
Janeiro e São Paulo aceitaram a participação de associações e comunidades em
seus itens de decisão. Andrade e Vaitsman (2002) e Reis e Vianna (2004) também
estudaram associações de usuários dentro de unidades que prestam serviços de
saúde. O estudo de Andrade e Vaitsman (2002) mostrou que a associação em
questão proporcionou maior integração entre pacientes e profissionais; formou laços
de amizade; fortaleceu a rede de apoio social dentro do hospital; retomou a
sociabilidade; envolveu funcionários, familiares e amigos; gerou maior autonomia e
cuidado com a própria saúde, sem a necessidade permanente do aval e/ou da
intervenção do médico.
Concluíram que a associação proporcionou a descoberta de capacidades
individuais; aumentou a autoestima, gerou um papel mais ativo no tratamento e
constituiu mecanismos de aproximação dos pacientes em direção a objetivos
comuns, atuando no verdadeiro sentido do empowerment. Entretanto, os resultados
de Reis e Vianna (2004) mostraram que muitos usuários não participam desses
grupos, por livre escolha. A maioria dos entrevistados (78%) correlacionou promoção
de saúde e responsabilidades institucionais e profissionais, somente o restante
correlacionou com iniciativas individuais e 28% acharam que a participação precisa
melhorar. Ainda existe um grande caminho a percorrer no campo da formação
política, tanto dos profissionais de saúde, que têm participação desarticulada no
processo de reorientação e nos processos decisórios, quanto da população, seja
como membros de conselhos gestores ou como lideranças comunitárias.
Intervenções desenvolvidas em comunidades foram avaliadas por Mello et al.
(1998) e Becker et al. (2004), em que concluíram que o diálogo durante os trabalhos
proporcionou a democratização do saber, que se transformou em sugestões para
48

ações objetivas e reais visando transformar as condições de vida da população, e


que este tipo de intervenção contribuiu para elevar a autoestima e fortalecer o
potencial dos moradores, que perceberam que são capazes de realizar uma ação
concreta para suas famílias e comunidade. Além disso, fortalece um clima de
solidariedade e trabalho em rede, bem como o surgimento de grupos que se
articulam no sentido de criar instâncias de representação e organização comunitária.
Assim, o processo resultou em moradores mais “empoderados” para a
conquista de melhores condições de vida. O projeto influenciou nos chamados
determinantes da saúde e na capacitação da comunidade para desenvolver sua
autonomia e ampliar suas conquistas, circunscrevendo a experiência no campo da
promoção de saúde. Entretanto, os estudos de Bandesha e Litva (2005) constataram
que a população em questão não participou ativamente no projeto devido à falta de
consciência cultural. Houve melhora na autoconfiança dos participantes e criou-se
uma população mais informada, mas houve pouca sustentação para reivindicações
de melhorias na coesão social e mudanças diretamente no estilo de vida.
Concluíram que a promoção de saúde abraça a base comunitária para reduzir
desigualdades, mas converter a participação em realidade é um grande desafio.
Arneson e Ekberg (2005) promoveram o empowerment e a saúde entre
empregados de organizações do setor público, na Suécia, Europa, e constataram
que a maioria dos trabalhadores mudou sua maneira de pensar; houve melhora na
autoconscientização, com aumento na autoestima e reforço da saúde; e que as
discussões explicitaram sua situação de trabalho e facilitaram a compreensão das
experiências e reflexões dos colegas. Todos consideraram que predeterminar o
objetivo global da intervenção foi relevante. A coerência do grupo facilitou situações
diárias de trabalho quando algum tipo de apoio era necessário. Assim, o trabalho em
grupo foi uma grande vantagem do processo e rentável socialmente.
O estudo em organizações interessadas em promover saúde mostrou que a
cooperação entre organizações comunitárias e departamentos públicos de saúde
pode ser mutuamente benéfica, pois as organizações podem utilizar os dados
coletados e publicados pelos departamentos para determinar as necessidades de
saúde de suas populações e realizar ações regionais, aumentando a eficácia do
serviço (BURWEN; SYLVESTER; PATOW, 2006).
Finalmente, Lefèvre e Lefèvre (2004) concluíram que sabemos o que fazer
hoje, “empoderar”, e quem deve ser “empoderado”, ou seja, a população e o
49

profissional de saúde, mas não temos muito claro como, onde e o que fazer. Um dos
começos possíveis seria a realização de pesquisas empíricas que pudessem
esclarecer as representações sociais dos profissionais e dos indivíduos. Isso
ajudaria muito no desenho do conteúdo e da forma destes processos
“empoderadores”.
Um novo caráter é assumido pela gestão pública, no Brasil, a partir de 1990,
por meio da criação de Conselhos Gestores, com a pequena participação da
comunidade. Assim, a atuação nos conselhos gestores deve “desmonopolizar” o
poder e o saber, tornando-o um espaço de diálogo e articulações dos envolvidos, o
que pressupõe habilidades específicas que poderiam ser garantidas através de
capacitação ou educação permanente e formativa (KLEBA; COMERLATO;
COLLISILLI, 2007; WENDHAUSEN; BARBOSA; BORDA, 2006).
A avaliação do empowerment, no Brasil, confirma que a boa-fé e a esperança
ainda existem em indivíduos e em instituições, visto que bons trabalhos vêm sendo
realizados tanto em pequena quanto em grande escala (FETTERMAN, 2004). No
entanto, Zancan e Adesse (2004) afirmaram que existe um grande número de
iniciativas em desenvolvimento, mas são poucas as experiências que têm
conseguido tirar do papel e levar à prática os conceitos de desenvolvimento humano
sustentável, promoção da saúde, particularmente em territórios complexos como são
as grandes cidades.
50

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A promoção de saúde é um campo de conhecimento na história da saúde


pública que se encontra em plena ebulição. Nos últimos 30 anos, temos assistido a
um crescimento exponencial dessa área, que tem realçado profundamente as
concepções e práticas públicas no setor. De acordo com o glossário elaborado pela
World Health Organization (WHO), a promoção de saúde representa um amplo
processo social e político, que abrange não só ações dirigidas a fortalecer as
habilidades e capacidades dos indivíduos, mas também orientadas para a mudança
social, ambiental e econômica, a fim de atenuar seu impacto sobre a saúde pública e
individual. É um processo que permite às pessoas o aumento do controle sobre os
determinantes de saúde, aplicação de suas competências e recursos coletivamente,
definição de prioridades e satisfação das respectivas necessidades sanitárias.
A aplicabilidade do empowerment em promoção de saúde é um processo
através do qual as pessoas ganham maior controle sobre decisões e ações, que
afetam a qualidade de vida. Pode ser definido como um método social, cultural,
psicológico ou político, pelo qual indivíduos e grupos sociais são capazes de
exprimir suas necessidades, suas preocupações atuais e conceber estratégias para
a participação na tomada de decisões.
Com base no trabalho “empowerment: uma alternativa em promoção de
saúde”, concluiu-se que:
¾ Promoção de Saúde é processo de capacitação da comunidade para atuar na
melhoria de sua qualidade de vida, ou seja, atua nas condições e recursos
fundamentais que são: paz, habitação, saneamento básico, educação,
alimentação, trabalho, renda, transporte, lazer, acesso aos bens e serviços
essenciais, ecossistema estável, recursos sustentáveis, justiça social e equidade.
Fatores políticos, econômicos, sociais, culturais, ambientais, comportamentais e
biológicos podem tanto favorecer como prejudicar a saúde. Tendências
demográficas, tais como urbanização, aumento da população idosa, prevalência
de doenças crônicas, comportamento sedentário, resistência a antibióticos e a
outros medicamentos disponíveis, aumento do uso abusivo de drogas e a
violência civil e doméstica ameaçam o bem-estar de centenas de milhões de
pessoas;
51

¾ A promoção de saúde demanda ações em outros setores, além do setor


saúde, sendo necessária uma ação coordenada entre todas as partes
envolvidas: governo, setores sociais, econômicos, políticos, públicos, privados,
organizações voluntárias e não governamentais, autoridades locais, indústria,
mídia e instituições. Envolvendo indivíduos, famílias, comunidades e
profissionais de saúde;
¾ O empowerment é um método utilizado para promover saúde, em que
indivíduos ou um grupo de pessoas desenvolvem potenciais e habilidades a fim
de melhorar sua qualidade de vida;
¾ É um processo eficaz, pois aumenta a autoestima, gera organização,
determinação, colaboração, integração e autonomia no grupo em questão,
permitindo controle e superação dos problemas identificados. Além disso, um de
seus focos é a continuidade e esta é observada na maioria das intervenções;
¾ O empoderamento da comunidade é ótima alternativa para o enfrentamento
dos problemas identificados no diagnóstico situacional da área de abrangência
da equipe de saúde bucal Vilela I, visto que a maioria destes é de origem
social. Além disso, esta estratégia é adequada para gerar organização na
comunidade, maior autonomia da população e potencializar suas ações,
formando assim redes sociais com potencial para avaliar, sugerir, cooperar e
complementar ações deficientes da gestão de saúde do município.
¾ No Brasil, iniciativas com o objetivo de melhorar as condições de saúde de
grupos específicos, através do desenvolvimento do empowerment, têm sido
desenvolvidas de forma muito pontual. Entretanto, para muitas pessoas, estas
constituem a única forma de mudança e transformação. Sendo assim, existe a
carência de políticas e ações em promoção de saúde e também de
investigações científicas que apontem estratégias apropriadas e adequadas a
cada contexto.
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