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Novos Cadernos NAEA


v. 15, n. 1, p. 131-159, jun. 2012, ISSN 1516-6481

O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em


Cuiabá-MT na ótica da Nova Economia Institucional
The Food Acquisition Programme (FAP) at Cuiabá-MT from the
perspective of the New Institutional Economics
Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello - Mestre em Agronegócios e Desenvolvimento Regional
(UFMT, 2011), professora Assistente do Departamento de Ciências Contábeis da UNEMAT em
Cáceres-MT. E-mail: [email protected]
Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo - Doutor em Economia Aplicada (UFV, 2002); professor da
Faculdade de Economia da UFMT, em Cuiabá-MT. E-mail: [email protected]

Resumo Abstract
O Programa de Aquisição de Alimentos The Food Acquisition Programme (FAP)
(PAA), em Cuiabá-MT, foi analisado na in the city of Cuiabá-MT was analyzed from
ótica da nova economia institucional the perspective of the New Institutional
quanto à operacionalização e metas; Economics as operation and targets;
resultados produtivos; e eventuais productive results; and any difficulties
dificuldades ou imperfeições na gestão. or failures in management. There was
Fez-se análise estatística das variáveis statistical analysis of variables such as
tecnológicas assim como produção e área, production and area, comparing groups
comparando-se grupos dos participantes of participants and non participants in
e dos não participantes do PAA. Os the FAP. The results indicated that the
resultados indicaram que o programa program was running with difficulties or
estava sendo executado com algumas failures due to its governance structure.
dificuldades ou imperfeições devido à The program goals were evaluated under
sua estrutura de governança. As metas do both the “MDS-Prefeitura” as “MDS-
programa foram avaliadas tanto no âmbito CONAB”. There were differences in
do “MDS-Prefeitura” como de “MDS- favor of the group of PAA regarding
CONAB”. Houve diferença favorável participation in organizations. There
ao grupo do PAA quanto à participação was no statistical difference in average
em organizações. Não existiu diferença production among the participating
na produção média entre os grupos groups and non-participants; and
participantes e não participantes; e foram institutional filters were detected at both
detectados filtros institucionais em ambos levels of analysis.
os níveis de análise.

Palavras-chave Keywords
Agricultura Familiar. PAA. NEI. Mato Grosso. Family Farming. PAA. NIE. Mato Grosso.
Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello • Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo

INTRODUÇÃO
Estudos têm apontado que a agricultura familiar vem despontando como
modelo alternativo de desenvolvimento para o meio rural. Abramovay (2000),
em seu estudo sobre desenvolvimento rural, ressalta que a agricultura familiar
também é reconhecida como agente dinamizador da economia local. Ele destaca
a importância dos agricultores familiares, através da capacidade de inovação,
assim como da sua interação com as instituições locais, no desenvolvimento local.
Nessa linha de raciocínio, a agricultura, principalmente a familiar, torna-se
um importante instrumento para que ocorra desconcentração de renda, geração
de divisas, criação de ocupações produtivas, aumento da produtividade e da
qualidade e diversificação e verticalização da produção. Isso se justifica ao analisar
o impacto que o segmento familiar representa no total dos estabelecimentos
rurais. Segundo o Censo Agropecuário de 2006, aproximadamente 85% do total
de propriedades rurais do país pertenciam a grupos familiares, cuja área média
era de 18,37 hectares. Outro resultado apontado pelo Censo é o número de
pessoas ocupadas na agricultura: 12,3 milhões de trabalhadores no campo estão
em estabelecimentos da agricultura familiar, que representa 74,4% do total de
ocupados no campo (IBGE, 2009). Ou seja, de cada dez ocupados no campo,
sete estão na agricultura familiar, que emprega 15,3 pessoas por 100 hectares,
contribuindo, assim, para uma forma de produção onde haja no campo um
desenvolvimento, e não somente um crescimento (BRAVO, 2002).
Diante da importância do segmento da agricultura familiar para o
desenvolvimento local, políticas públicas vêm sendo traçadas. Segundo Veiga
(2002), importantes medidas estão sendo tomadas para beneficiar o segmento
familiar, dentre elas destacam-se: a desapropriação de terras e o crédito fundiário,
que foram responsáveis por um aumento de mais de 15% na área de agricultores
familiares em menos de uma década.
Simultaneamente, houve outra ação que veio fortalecer ainda mais esse
segmento, através de cinco linhas de crédito do PRONAF: crédito de cus-
teio e investimento, infraestrutura e serviços públicos, assistência técnica e
extensão, capacitação e comercialização (VEIGA, 2002, p. 6).

Ainda objetivando um avanço maior para a agricultura familiar, surge o


Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em julho de 2003, através da Lei
Federal nº 10.696, de 2 de julho de 2003, cuja finalidade é comprar alimentos e
recompor os estoques públicos.
Outro ponto importante a ser observado é que a agricultura familiar
estabelece várias relações com a segurança alimentar. A mais lembrada é como

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O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá-MT
na ótica da Nova Economia Institucional

provedora de alimentos para a sociedade. Porém, a importância da agricultura


familiar para a segurança alimentar vai além da produção primária. Sua
característica de distribuição de renda e geração de empregos possibilita que
milhões de pessoas tenham acesso a alimentos.
Assim, as formas sob as quais os alimentos são produzidos e ofertados
determinam as condições de acesso a eles, e isto por alguns motivos como:
estruturas concentradas que conferem poder de mercado a poucos agentes
econômicos, como as grandes corporações agroalimentares e as redes de
supermercados; e, também, ao fato de estas estruturas dificultarem ou mesmo
impedirem a reprodução em condições dignas de um amplo conjunto de
pequenos e médios empreendimentos rurais e urbanos, constituindo-se fator
de iniquidade social e, portanto, de insegurança alimentar (RIO GRANDE DO
SUL, s.d.).
Cuiabá, capital do estado de Mato Grosso, possui uma população de
551.250 habitantes, (IBGE, 2010), densidade demográfica de 156,27 habitantes
por km²1. A população urbana corresponde a 541.002 (98,12%) habitantes e
a rural 10.348 (1,88%). Portanto, possui muitos consumidores de alimentos e
prováveis potenciais compradores dos produtos oriundos da agricultura familiar.
Conforme registro da EMPAER, de abril de 2009, existiam no município
de Cuiabá 1.687 agricultores familiares, distribuídos da seguinte forma:
Comunidades tradicionais: 30 propriedades, com 719 famílias; Assentamentos
de reforma agrária do Instituto Nacional de Reforma Agrária (INCRA/MT):
uma comunidade com 35 famílias; Assentamentos de reforma agrária do
Instituto de Terras de Mato Grosso (INTERMAT): 5 comunidades, com 691
famílias; Assentamentos de agrários via Crédito Fundiário: 18 comunidades, com
242 famílias (EMPAER, 2009). Observa-se que as comunidades tradicionais
representam 42,62% dos agricultores familiares desse município, seguidos de
perto por assentados de reforma agrária do INTERMAT (40,96%), e 14,34%
representam assentados via Crédito Fundiário.
Devido à importância da agricultura familiar no contexto nacional, o
governo federal vem atuando de forma concreta para melhorar as condições
desse segmento, através de implementação de programas e facilitação no acesso
ao crédito. Dessa forma, uma política que vem sendo importante para a agricultura
familiar é o PAA, como citado acima. Através do programa, alimentos são
adquiridos de agricultores familiares que se enquadram no Programa Nacional
de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), e destinados à formação
de estoques de segurança ou canalizados para populações em situação de risco
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Habitantes e densidade demográfica de 156,27 hab./km2 seguno Censo Demográfico 2010.

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Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello • Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo

alimentar. Portanto, o programa torna-se um fortalecedor do mercado interno,


pois eleva o poder aquisitivo da população rural; melhora a dieta das famílias e
garante a demanda dos alimentos produzidos na agricultura familiar.
Vários estudos têm evidenciado os benefícios do PAA brasileiro, em
várias regiões do país, podendo citar Chmielewska, Souza e Lourete (2010),
Chmielewska (2009), Muller (2007), Schmitt (2005), e Delgado et al. (2005).
Entretanto, na maioria das vezes, as análises não envolvem o estado de Mato
Grosso.
Em Cuiabá-MT, especificamente, não se têm estudos publicados sobre
o assunto. A modalidade do PAA operado no município de Cuiabá é a de
Compra Direta Local da Agricultura Familiar (CDLAF), “Compra para Doação
Simultânea”, cujo objetivo é a compra de alimentos produzidos por agricultores
familiares e a doação desses alimentos para entidades integrantes da rede
socioassistencial.
Para analisar a política pública “Programa de Aquisição de Alimentos
(PAA) executado no município de Cuiabá”, optou-se por utilizar o referencial
teórico da Nova Economia Institucional (NEI), através dos seus fundamentos:
ambiente institucional, estrutura de governança, filtros institucionais, dentre
outros.
Diante dessa realidade, o problema desta pesquisa foi assim formulado:
Como acontece a escolha de produtores, beneficiários e produtos no Programa
de Aquisição de Alimentos? A hipótese geral é que existem dificuldades
operacionais relacionadas com os filtros institucionais de primeiro nível que
delimitam a escolha entre os agentes e os produtos contemplados.
Nessa diretriz, este trabalho tem por objetivo geral investigar a
operacionalização do PAA em Cuiabá. Para isso, pretende atingir os seguintes
objetivos específicos: a) Avaliar o cumprimento das metas do PAA no município;
b) Comparar resultados produtivos entre produtores participantes do PAA e não
participantes; c) Averiguar eventuais dificuldades ou imperfeições na execução
do programa; e, d) Contribuir com sugestões de melhoria do programa.
Como hipóteses secundárias, associadas aos objetivos específicos, têm-se:
a) O programa não vem cumprindo as metas estabelecidas para o município de
Cuiabá; b) A produção média entre os grupos participantes e não participantes
do PAA não é diferente; c) O grau de participação em organizações comunitárias
como associações ou cooperativas é diferente entre os participantes e não
participantes do PAA; d) Em relação à utilização de técnicas modernas como
assistência técnica, irrigação e outras, existem diferenças de emprego entre os
produtores que participam do PAA e aqueles que não participam; e, e) Existem

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O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá-MT
na ótica da Nova Economia Institucional

filtros institucionais que interferem na escolha de quem participa entre os


produtores e entre os beneficiários, assim como dos produtos.

1 O MUNICÍPIO DE CUIABÁ-MT

Cuiabá foi fundada em 8 de abril de 1719. Apresenta área total 3.538,17 km²,
correspondendo 254,57 km² à macrozona urbana (Lei, n. 4.719/04) e 3.283,60
km² à área rural. A população, segundo Censo Demográfico 2010, (IBGE, 2010),
é de 551.250 habitantes e densidade demográfica de 156,27 hab./km². A população
urbana corresponde a 541.002 (98,12%) habitantes e a rural 10.348 (1,88%).
Faz limite com os municípios de Chapada dos Guimarães, Campo Verde, Santo
Antônio de Leverger, Várzea Grande, Jangada e Acorizal. É um entroncamento
rodoviário-aéreo-fluvial e o centro geodésico da América do Sul, nas coordenadas
15º06’56”,80 de latitude sul e 56º06’05”,55 de longitude oeste.
Garcia (2003), através da documentação pesquisada, traz uma estimativa
das dietas alimentares (dieta alimentar padrão), de acordo com as necessidades dos
habitantes da província à época (1800-1840). Assim, a dieta média recomendada
era: “farinha de milho 300g; feijão 150g; arroz 150g; milho (cozido) 30g; mandioca
(cozida) 50g; farinha de mandioca 10g; banana (crua) 60g; abóbora (cozida) 30g;
carne bovina 110g; carne de caça 20g; toucinho 30g; carne de peixe 30g; carne de
aves 30g” (GARCIA, 2003, p. 78).
Percebe-se que a dieta predominante da época era reflexo da cultura
indígena, e de acordo com dados apresentados sobre a alimentação nesse período,
verifica-se que existe grande ligação com os alimentos produzidos atualmente
pelo segmento da agricultura familiar no município de Cuiabá. Dessa forma,
esses produtos ainda representam a maioria dos alimentos ofertados pelos
agricultores para serem comercializados via PAA no município, pela Prefeitura
(feijão, mandioca, farinha de mandioca, milho verde, abacaxi, melancia, banana,
abóbora, maxixie, couve, alface), e pela Conab (abóbora, banana, berinjela,
mamão, maxixe, malancia, melão, milho verde, pepino, quiabo, mandioca).
Quanto à agricultura, neste município, conforme registro do censo
agropecuário de 2006, dos 1.311 estabelecimentos rurais, 1.031 dentre estes são
de agricultura familiar, representando 78,64% do total; 280 são estabelecimentos
de agricultura não familiar (21,36%). Quanto à área, os estabelecimentos de
agricultura não familiar detêm 111.550 ha, que representa 88,98% do total,
enquanto que os de agricultora familiar estão distribuídos em 13.816 ha e,
portanto, essa característica não difere do que acontece no estado e no Brasil, ou
seja, há concentração de terras.

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Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello • Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo

Quanto à produção de alimentos, a agricultura familiar é responsável pela


produção de alimentos básicos como: mandioca (60,48%), abacaxi (9,45%), cana-
de-açúcar (20,67%), milho em grão (4,68%), melancia (2,77%), produtos típicos
da lavoura temporária, que se compõem de 386 estabelecimentos familiares, e 58
não familiares. Já os produtos da lavoura permanente são: banana (52,23%), coco-
da-baía (5,87%) e manga (41,97%), cujos agricultores familiares representam 73
estabelecimentos e 44 são de não familiares (IBGE, 2009).

2 O PROGRAMA DE AQUISIÇÃO DE ALIMENTOS (PAA):


SEGURANÇA ALIMENTAR

O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) é associado às políticas de


Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) da Secretaria Nacional de Segurança
Alimentar e Nutricional (SESAN) do Ministério do Desenvolvimento Social e de
Combate à Fome (MDS). Foi instituído pelo artigo 19 da Lei nº 10.696, de 2 de
julho de 2003, regulamentado pelo Decreto nº 5.873, de 15 de agosto de 2006.
Apresenta-se como uma das ações do Fome Zero, e como importante inovação
do Plano Safra 2003/2004. Tem por finalidade comprar alimentos e recompor
os estoques públicos.
Os objetivos do PAA são: garantir o acesso aos alimentos em quantidade,
qualidade e regularidade necessárias às populações em situação de insegurança
alimentar e nutricional e promover a inclusão social no campo por meio do
fortalecimento da agricultura familiar; melhoria da qualidade das refeições das
entidades socioassistenciais; recomposição dos estoques públicos de alimentos.
Existem diferentes modalidades de acesso, como: a Compra Direta da
Agricultura Familiar (CDAF), que permite a aquisição de produtos da agricultura
familiar, para distribuição ou para formação de estoques públicos; a Compra
para Doação Simultânea, que propicia a compra de alimentos produzidos por
agricultores familiares e sua disponibilização para doação a entidades da rede
de promoção e proteção social, e assume importante papel na promoção
da segurança alimentar do público atendido; a Formação de Estoque pela
Agricultura Familiar, que propicia aos agricultores familiares instrumentos de
apoio à comercialização de seus produtos, sustentação de preços e agregação
de valor à produção; a Aquisição de Alimentos que atende a merenda escolar,
com base na Lei nº 11.947/2009, que determina a utilização de, no mínimo, 30%
dos recursos repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
(FNDE) para alimentação escolar, e compra de produtos da agricultura familiar.

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O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá-MT
na ótica da Nova Economia Institucional

O PAA é desenvolvido com recursos dos Ministérios do Desenvolvimento


Social e Combate à Fome (MDS) e do Desenvolvimento Agrário (MDA). As
diretrizes do PAA são definidas por um Grupo Gestor, coordenado pelo MDS
e composto por mais cinco ministérios: Fazenda; Planejamento Orçamento e
Gestão; Agricultura, Pecuária e Abastecimento, representado pela Companhia
Nacional de Abastecimento (CONAB); Desenvolvimento Agrário e Educação,
representado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)
(Figura 1).

Figura 1: Organograma de funcionamento do PAA (conselho gestor e instituições).

Fonte: Adaptado de Müller (2007).

Além do grupo gestor, podem ser incluídos os demais agentes, os quais


configuram a rede de atuação do PAA: gestores executores: CONAB, estados,
municípios; atores locais: conselhos, cooperativas, associações de agricultores
familiares e entidades da rede socioassistenciais, conforme a Figura 2.

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Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello • Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo

Figura 2: Rede de atuação do PAA.

Fonte: Portal do MDS, MDA e CONAB (s.d.).

A rede de atuação de PAA possibilita a influência das instituições na


formulação de políticas públicas. No caso, o Programa de Aquisição de Alimentos,
como “regras do jogo” – os órgãos federais (o grupo gestor), e as organizações,
como “jogadores” – as entidades que direta ou indiretamente fazem parte do
processo (gestores executores e atores locais). Com a estrutura de governança
(gestão) os atores envolvidos se relacionam para dirimir conflitos que por ventura
venham a existir e solucionar problemas sobre assimetrias de informações.
Portanto, percebe-se a importância da utilização dos fundamentos da Nova
Economia Institucional na análise de atuação do PAA no município de Cuiabá.

2.1 O PAA EM CUIABÁ


A modalidade do PAA operado no município de Cuiabá é a de Compra
Direta Local da Agricultura Familiar (CDLAF), “Compra para Doação
Simultânea”, cujo objetivo é a compra de alimentos produzidos por agricultores
familiares e a doação desses alimentos para entidades integrantes da rede
socioassistencial.
O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)/MDS foi realizado através
de convênio entre o Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome,
e a Prefeitura Municipal de Cuiabá – Convênio 177/2007, oriundo do Processo
n. 71000.008006/2007-58, cujo objeto trata do apoio financeiro para implantar o

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O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá-MT
na ótica da Nova Economia Institucional

Programa de Aquisição de Alimentos, através da CDLAF (Compra para Doação


Simultânea), referente ao exercício 2007/2008, e teve seu prazo prorrogado por
Termo Aditivo n. 01 ao Convênio n. 177/2007 até 30.09.2009.
Como objetivo, o Programa pretendia adquirir produtos de 240 (duzentos
e quarenta) produtores da agricultura familiar do município de Cuiabá e distribuir
esses produtos alimentícios a 175 (cento e setenta e cinco) entidades cadastradas
no COMSEA, que participam dos programas sociais locais.

Figura 3: Organograma (informal) de funcionamento do PAA em Cuiabá.

Fonte: elaborado pelos autores.

Através desse organograma informal de funcionamento (Figura 3) do PAA/


MDS/Prefeitura Municipal de Cuiabá, percebe-se como o arranjo institucional
do PAA em Cuiabá vem sendo executado, isto é, o MDS firmou convênio
com a Prefeitura de Cuiabá (regras formais) dentro do ambiente institucional
e por outro lado existe a estrutura de governança – gestão de funcionamento
do Programa em nível local, onde se identifica quem são os atores que direta
ou indiretamente coordenam a execução do Programa (Secretaria Municipal de
Trabalho e Desenvolvimento Econômico (SMTDE) – Diretoria de Agricultura
e Abastecimento e Conselho Municipal de Desenvolvimento Agrário; Secretaria
Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos (SMASDH) – Conselho
Municipal de Segurança Alimentar e Conselho Municipal de Assistência Social
e Banco de Alimentos; Produtores e Entidades Socioassistenciais). Assim,
verifica-se a influência das vertentes da NEI (ambiente institucional e estrutura
de governança) na investigação: no Programa de Aquisição de Alimentos do
município de Cuiabá, como se dá a escolha de quem participa entre produtores e
entre os beneficiários, e a escolha dos produtos.

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Já o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)/CONAB foi


realizado através de Termo de Cooperação n°. 003/2009 (Processo
n. 71000.036137/20090-7; vigência: 04.05.2009 até 31.07.2011), cujo objetivo é
estabelecer parceria entre o Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à
Fome (MDS), e a Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB).
Na proposta do PAA/Conab (Sureg/MT) o município de Cuiabá,
através da comunidade Marcolana, constava a participação de 27 (vinte e sete)
agricultores familiares, que forneceriam os seguintes produtos: abóbora paulista,
abóbora menina, banana da terra, banana maçã, berinjela, mamão formosa,
maxixe, melancia, melão caipira, milho verde em espiga com palha, pepino
caipira, quiabo, mandioca in natura; e uma entidade – o Banco de Alimentos, o
qual seria o responsável pela entrega dos alimentos às entidades socioassistenciais
cadastradas.
Percebe-se, através da Figura 4, que os recursos vêem do MDS via
CONAB-matriz após análise das propostas formalizadas pelas respectivas
associações junto à CONAB/SUREG/MT, que, também, deverá ser aprovada
pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA)
em nível estadual ou Conselho de Alimentação Escolar (CAE), isso devido ao
fato do Conselho Municipal de Segurança Alimentar não estar até o momento
totalmente estruturado. Foi informado pela técnica da CONAB que a preferência
nessa avaliação é que seja feita por um conselho municipal.

Figura 4: Organograma (informal) de funcionamento do PAA (MDS/CONAB)


em Cuiabá.

Fonte: elaborado pelos autores.

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O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá-MT
na ótica da Nova Economia Institucional

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A Nova Economia Institucional (NEI) surgiu nas décadas de 1960 e 1970,


onde um grupo de economistas, dentre os principais destacam Ronald Coase,
Oliver Williamson e Douglas North, começaram a se preocupar com aspectos
micro e macroeconômicos das instituições.
Assim, a NEI trabalha com duas vertentes: primeiro o ambiente
institucional (macroinstituições), onde se destacam: as regras formais (leis,
políticas, regulamentação); regras informais (códigos de ética, laços familiares,
valores culturais e étnicos); e direitos de propriedade da terra; e segundo as
estruturas de governança (microinstituições) aquelas que regulam uma transação
específica – custos de transação são definidos como o conjunto de regras: contratos
entre particulares e normas internas às organizações (AZEVEDO, 2000).
Portanto, o conjunto de instituições econômicas e políticas formam a
matriz institucional da sociedade. E a dinâmica evolutiva das economias surge da
interação entre as instituições e as organizações, definidas como “os jogadores”
(organização) que estão enquadradas nas “regras do jogo” (as instituições).
De acordo com Milani e Solínis (2002), a governança engloba a constituição
de uma legitimidade do espaço público, a repartição do poder entre os que
governam e os que são governados, os processos de negociação entre os atores
sociais e a descentralização da autoridade e das funções ligadas ao ato de governar.
Dessa forma, a governança seria a prática pela qual se dá a gestão do
desenvolvimento, prática na qual se dá um processo de acordo entre atores, pela
formação e solução de conflitos e assimetrias, bem como pela constituição mínima
de consensos. Estes elementos balizam a organização dos atores locais, ou seja,
associações, cooperativas, ONG, entre outras organizações da agricultura familiar.
Portanto, ao se referir às instituições e à governança, procura-se trazer como
exemplo o PAA que está sendo executado no município de Cuiabá, pois, existe uma
estrutura de governança, como o conjunto de regras, o convênio entre o MDS e a
Prefeitura de Cuiabá, que determina as normas que irão gerir o comportamento entre
as partes: agricultores familiares, banco de alimentos, entidades socioassistenciais,
conselhos, que por sua vez pode ocorrer a presença de filtros institucionais. Isso
será analisado no decorrer da elaboração dessa pesquisa.
As regras formais são as mais evidentes no ambiente institucional, elas
se materializam de diversas formas: a constituição, legislações complementares,
conjunto de políticas públicas, dentre outros. No caso da agricultura, por
exemplo, uma política de preços mínimos para o milho pode induzir agricultores

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Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello • Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo

a ampliar o seu cultivo, eventualmente em detrimento de culturas que concorrem


pelos mesmos fatores de produção.
Essa análise pode ser vivenciada com o PAA, pois o governo se
compromete em adquirir produtos agropecuários com recursos do MDS e/ou
MDA, através de convênio, produzidos por agricultores familiares, dessa forma
estes passam a ter segurança na comercialização de seus produtos por preços
mais justos e garantindo renda para o segmento da agricultura familiar.
No entanto, o comportamento humano está condicionado, também, por
regras informais, que são tão importantes quanto as formais. As regras informais
consistem em valores, tabus, costumes, religiões, código de ética, laços étnicos
e familiares, que representam o importante papel econômico de restringir o
comportamento dos agentes. Assim, ao restringirem ações, instituições como
estas podem facilitar as interações humanas, reduzindo os custos decorrentes da
coordenação.
O PAA é um programa único, que se desdobra em diferentes modalidades,
executadas por vários agentes operadores. Assim, algumas modalidades permitem
o atendimento de agricultores familiares, organizados ou não em associações ou
cooperativas, possibilitando, dessa forma, a constituição de diferentes tipos de
arranjos institucionais, de acordo com a realidade de cada segmento, de tal forma
que se podem aplicar os fundamentos da Nova Economia Institucional, tanto
em níveis microinstitucionais, como macroinstitucionais, para entender se esse
arranjo específico está permitindo a redução de risco de mercado, a garantia de
preço e a comercialização aos agricultores familiares, agentes desse processo.
Estudos têm demonstrado que atores e organizações, orientados por
um conjunto de regras formais (leis, normas, regulamentos etc.) e informais
(tradições, hábitos, conduta ética etc.), constroem determinado mercado. Portanto,
é importante entender como esses atores se interagem e quais as instituições
(normas e convenções) estabelecidas nesse processo de construção, com objetivo
de buscar um aperfeiçoamento contínuo desse ambiente institucional, através do
estímulo da cooperação entre os atores, e o combate às incertezas.
Nesse enfoque é que a Nova Economia Institucional, através da aplicação
dos seus conceitos, vem possibilitar uma melhor compreensão do funcionamento
do mercado institucional do PAA adotado no município de Cuiabá, uma vez que
esta abordagem privilegia a análise das regras (formais e informais) presentes no
ambiente e como elas interferem na eficiência das organizações.
Para isso, as organizações devem intervir nas lacunas e imperfeições
criadas pela racionalidade limitada e assimetria de informações dos agentes do
mercado institucional do PAA. Mundo Neto e Souza Filho (2005) citam que

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O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá-MT
na ótica da Nova Economia Institucional

essas lacunas e imperfeições criam filtros institucionais que acabam dificultando


o alcance das metas do programa.
Assim, Zezza e Llambí (2001) utilizam do conceito de filtros institucionais:
sistemas operacionais que podem danificar ou mesmo invalidar as regras
definidas pelos gestores públicos aos agentes do mercado, para avaliar a eficácia
das políticas públicas. Deste modo, os filtros institucionais trabalhariam como
entraves para qualquer efetivação de normas e acordos entre indivíduos deste
mercado, tornando ineficaz alguma política planejada.
Mundo Neto e Souza Filho (2005) apresentam três tipos de filtros
institucionais, classificados como: primeiro nível (macro analítico); segundo nível
(meso analítico); e o terceiro nível (micro analítico). Na sequência, descrevem-se
as características de cada tipo de filtro.
Os filtros de primeiro nível estão relacionados ao desenho e à concepção
da política, a partir desta oferta política transmitem-se os incentivos aos agentes,
no tocante a preços, recursos produtivos e condições de trabalho.
Já o filtro de segundo nível, denominado filtro de “transmissão do
incentivo”, está vinculado ao comportamento e as regras criadas pelos agentes
que participam do ambiente de operacionalização da política. Nesse caso, trata-
se da programação dos incentivos de preços e recursos produtivos para a efetiva
produção, consumo e investimento.
O terceiro filtro institucional atua como nível de “tomada de decisão” e
está relacionado com o comportamento dos atores que compõem o público-
alvo da política. No caso do PAA, estaria relacionado ao repasse da produção
aos beneficiários das doações e aos aspectos finais de compra e doação entre
produtores, CONAB e entidades beneficiadas.
Portanto, a ideia de usar os filtros institucionais e rede no acesso ao
Programa de Aquisição de Alimentos ajuda a entender como funciona a gestão
do PAA no município de Cuiabá: quem são os agentes envolvidos no processo
(conselhos, sindicatos, associações); como se dá a escolha de quem participa
entre os produtores, entre os beneficiários, escolha dos produtos, entre outros.

4 METODOLOGIA E FONTE DOS DADOS


A metodologia foi dividida em duas etapas: de obtenção dos dados (fase
exploratória, dados secundários e dados primários) e de processamento e análise
dos dados.
Na fase exploratória, buscou-se caracterizar o município de Cuiabá, objeto
da pesquisa, como apresentado anteriormente. Além disso, buscou-se identificar

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Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello • Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo

documentos disponíveis e páginas eletrônicas da internet, com informações


sobre Cuiabá no geral e sobre agricultura familiar, em especial.
Os dados secundários, bem como os documentos, foram obtidos junto
aos órgãos oficiais estaduais e federais, como IBGE, secretarias de governo do
estado de Mato Grosso, Prefeitura Municipal de Cuiabá, CONAB entre outros.
Constam de informações sobre o perfil demográfico do município de Cuiabá,
indicadores socioeconômicos, aspectos quantitativos da produção agropecuária
e da agricultura familiar, além de informações sobre as demandas e ofertas de
políticas públicas orientadas para a agricultura. A coleta de dados secundários foi
complementada pela análise de documentos e diagnósticos já realizados sobre o
município de Cuiabá.
Para atingir os objetivos propostos neste trabalho, foram utilizadas bases
de dados provenientes de fontes diversas. Uma delas se trata de dados da Empresa
Mato-grossense de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (EMPAER/
MT), referentes a 2009.
Somado à análise dos indicadores quantitativos, foram coletados dados
primários, através da aplicação de questionários nas 14 comunidades, compostas
por 143 propriedades e realização de entrevistas semiestruturadas com atores
locais, representantes da agricultura familiar e/ou de instituições relacionadas a
este segmento. Os atores entrevistados foram escolhidos em amostra intencional
segundo a ideia de agentes-chave, envolvendo: técnicos da SEDRAF-MT;
técnicos da EMPAER; técnicos da Prefeitura Municipal de Cuiabá; Diretoria de
Agricultura e Abastecimento do Município de Cuiabá; Asilo Santa Rita (entidade
socioassistencial); Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Cuiabá; Associação
dos Agricultores Familiares da Comunidade Mineira; CONAB; Banco do Brasil;
FETAGRI; produtores participantes e não participantes do PAA.
A seguir descrevem-se as variáveis tecnológicas e outras utilizadas na
pesquisa:
a) Participação no Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) – esse
programa é importante como instrumento facilitador de aquisição direta de
alimentos pelos órgãos públicos junto ao produtor familiar, portanto, impacta
diretamente na garantia da comercialização dos produtos desses produtores com
condição de pagamento de preço justo. A questão investigou a participação dos
produtores familiares no PAA.
b) Participação em associação – trata-se de uma variável que funciona
como instrumento de modificação social, ou seja, como um vetor que guia os
produtores para obtenção de benefícios proporcionados em diversos programas

144
O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá-MT
na ótica da Nova Economia Institucional

(PRONAF, PAA e outros). A questão investigou a participação em associações,


cooperativas e de outros tipos.
c) Acesso a assistência técnica – trata-se de instrumento fundamental de
sucesso dos arranjos produtivos do município de Cuiabá, pois objetiva levar aos
produtores familiares capacitação, através de palestras, seminários, orientações
quanto à eficiência na utilização do solo, de acordo com as características do
local, quanto às escolhas de sementes de qualidade, manejo integrado, controle de
pragas e doenças, colheitas, armazenagem etc. A pergunta prevê a possibilidade
de assistência via EMPAER, Prefeitura ou ainda empresas privadas.
d) Tipo de solo – também é importante conhecer o tipo de solo existente
na região para que se tomem as decisões corretas quanto ao tipo de tecnologia
a ser empregada, objetivando, claro, melhorar a produtividade da produção. A
pesquisa investiga os tipos de solos existentes nas propriedades: arenoso, misto,
argiloso e pedregoso.
e) Irrigação – trata-se de uma variável de suma importância, pois é um
indicador que permite tecnologias alternativas para produção em diferentes
momentos do ano. Essa variável permite que o produtor defina o que plantar e
suas respectivas colheitas, principalmente nas épocas de entressafra. A questão
identificou os seguintes tipos de irrigação: gotejamento, aspersão, sulco ou outra.
f) Energia elétrica – trata-se de uma das variáveis promotoras do
desenvolvimento rural, tanto que contempla o programa Luz para Todos,
do governo federal. Assim, essa variável, integrada com outras políticas de
desenvolvimento rural, vem auxiliando para que aconteça desenvolvimento social
e econômico, contribuindo dessa forma para a redução da pobreza. A questão
identificou a existência ou não de energia elétrica nas propriedades.
g) Adubação – trata-se de variável importante, juntamente com o relevo,
solo, irrigação, portanto, é a aplicação de nutrientes em quantidade e qualidade
certas em época apropriada. A pergunta investigou que tipo de adubação os
agricultores estão utilizando: adubação orgânica, adubação química ou se não
faz adubação.
h) Conservação de solos – variável que demonstra a importância de se
utilizar práticas conservacionistas, outra variável diretamente influenciada pela
qualidade da assistência técnica juntos aos produtores rurais. A questão investigou
se os agricultores adotam alguma prática que auxilia a conservação de solos:
plantio em nível, curva de nível, terraços, ou se não fazem conservação de solo.
i) Mecanização – trata-se de variável importante na prestação de serviços
na zona rural, ao analisar se as máquinas e implementos são próprios ou alugados.

145
Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello • Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo

A mecanização da lavoura auxilia a aumentar a produtividade das terras. A questão


identificou a forma de utilização da mecanização pelos agricultores familiares:
máquina própria, máquina alugada ou não utilizam mecanização.
A análise estatística utiliza o teste Z para as proporções de duas amostras
(MCCLAVE; BENSON, 2009), quando se compara os participantes do PAA com
os não participantes. Ou seja, testa-se a hipótese nula de que as proporções são
iguais (equivalente a H0: PPAA-PNPAA = 0: não existe diferença entre as proporções),
hipótese alternativa H1: PPAA-PNPAA ≠ 0: existe diferença entre as proporções),
para as variáveis: participação em associação; acesso a assistência técnica (se tem
ou não, independente do órgão que a realiza); irrigação (dos diferentes tipos:
gotejamento + aspersão + outras); energia elétrica; adubação (realizam adubação
química, orgânica ou ambas); conservação de solos; análise de solo, agrotóxicos,
mecanização (utilizam máquinas próprias ou alugadas).
Para comparar a quantidade produzida e a área plantada, utilizou-se um
teste unilateral de distribuição de t de comparação das médias, sendo a hipótese
nula de que as médias são iguais (H0: PAA = não PAA) e a hipótese alternativa
de que a média dos participantes do PAA é superior a dos não participantes
(H1: PAA> não PAA).

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO
A proposta apresentada no âmbito do MDS-Prefeitura era que o programa
atuasse em duas frentes: primeira: a produção com o escoamento do produto, e
a segunda: o consumo com a suplementação alimentar às pessoas atendidas pelas
entidades socioassistenciais. Assim, o objetivo era que 240 (duzentos e quarenta)
produtores familiares participassem do programa, com 11 tipos de produtos, que
beneficiassem 175 entidades socioassistenciais, as quais atenderiam diretamente
48.963 pessoas.
De acordo com o relatório de prestação de contas, referente ao convênio
nº. 177/2007 – Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) – Modalidade:
Compra Direta Local da Agricultura Familiar do Município de Cuiabá (CDLAF –
com doação simultânea), encaminhado ao Ministério de Desenvolvimento Social
e Combate à Fome, tem-se que o número exato de produtores atendidos foi
de 195 sem repetição, sendo que 17 produtores comercializaram seus produtos
apenas em 2008, 72 em 2009, e 106 produtores comercializaram seus produtos
em 2008 e 2009 com repetição de 106 agricultores perfazendo um total de 301
nomes beneficiados.
As instituições socioassistenciais beneficiadas foram as que estavam
habilitadas através do cadastro no banco de alimentos com o número do CNPJ

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O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá-MT
na ótica da Nova Economia Institucional

da instituição, o nome e CPF do responsável legal da entidade, número de pessoas


atendidas. Foram atendidas 83 instituições, envolvendo escolas, creches, outros,
mas sem a identificação precisa de quais.
Portanto, verifica-se que, a princípio, não foi cumprida a meta inicial do
programa que era de apoiar 240 agricultores familiares por meio da compra de
seus produtos, pois foram atendidos 195; e distribuir os produtos adquiridos aos
beneficiários do programa, 175 entidades socioassistenciais, foram beneficiadas
83, com recursos no valor de R$ 886.500,00, sendo R$ 840.000,00 de repasse do
concedente (MDS) e R$ 46.500,00 de contrapartida do convenente (Prefeitura
de Cuiabá), no período de novembro de 2007 a outubro de 2008. Como não
foi cumprido, prorrogou-se por termo aditivo por mais um ano, até outubro
de 2009. Assim, em 2009 houve a participação de mais 106 agricultores, com
repetição, perfazendo um total de 301 nomes beneficiados, portanto, cumpriu-se
a meta.
Verificando-se o Termo de Convênio n°. 177/2007, percebe-se que existe
certa fragilidade em relação à prestação de contas, no tocante aos produtos
a serem entregues às instituições socioassistenciais, pois, de acordo com a
cláusula segunda – dos deveres das obrigações, item 2.2 do convenente, subitem
2.2.6, diz:
[...] fornecer ao Concedente, trimestralmente, relatórios com o número
de instituições beneficiárias e/ou beneficiários dos programas sociais que
receberam os alimentos adquiridos, bem como o número de agricultores
familiares apoiados e o valor médio do incentivo, em reais, por agricultor,
e as toneladas de alimentos adquiridos.

Portanto, não é necessário ser informado nominalmente quais as


instituições socioassistenciais que foram beneficiadas e nem os respectivos
produtos doados, tornando-se difícil fazer um acompanhamento mais acurado
sobre quais produtos realmente forem entregues e avaliar a qualidade dos mesmos.
Esta fragilidade pode ser considerada um filtro institucional do Programa de
Aquisição de Alimentos, pois se trata de lacunas e imperfeições que podem
prejudicar o alcance das metas do programa.
Esse tipo de filtro pode ser considerado de primeiro nível, que segundo
Mundo Neto e Souza Filho (2005), os filtros de primeiro nível estão relacionados
ao desenho e concepção da política. Portanto, a fragilidade detectada na
elaboração do convênio, ou seja, as lacunas existentes, no tocante à prestação
de contas referentes à não obrigatoriedade de se informar nominalmente as
instituições beneficiadas pelo programa e nem nominar os produtos entregues a
estas, dá margem a falhas no monitoramento e avaliação da proposta, pois, não se

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Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello • Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo

consegue determinar com clareza quais as entidades que foram beneficiadas pelo
programa e nem quais produtos foram entregues, muito menos sobre a qualidade
dos mesmos. Isso contribui negativamente ao cumprimento do Princípio
Constitucional da transparência que rege o Ente Público. Então, percebe-se, já
neste momento, a existência de algumas dificuldades ou imperfeições na execução
do PAA em Cuiabá.
Como foi mencionado, o PAA/CONAB foi realizado através de Termo
de Cooperação n. 003/2009 (Processo n. 71000.036137/20090-7; vigência:
4.05.2009 até 31.07.2011), cujo objetivo é estabelecer parceria entre o Ministério
de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), e a Companhia Nacional
de Abastecimento (CONAB).
O município de Cuiabá participou somente com a comunidade Marcolana,
localizada no distrito do Aguaçu, através da assinatura da Cédula de Produtor
Rural (CPR-DOAÇÃO), cujo projeto contemplava a participação de 27 famílias
de agricultores familiares, com o fornecimento dos seguintes produtos: abóbora
paulista, abóbora menina, banana da terra, banana maçã, berinjela, mamão
formosa, maxixe, melancia, melão caipira, milho verde em espiga com palha,
pepino caipira, quiabo e raiz de mandioca in natura. Havia a participação de uma
entidade, o Banco de Alimentos, que ficaria responsável pela distribuição dos
alimentos às entidades socioassistenciais cadastradas.
O período contemplado por esse convênio com a comunidade Marcolana
teve início em 2009, porém sua execução aconteceu em outubro de 2009, com
término previsto para outubro de 2010. No decorrer desse período houve
a necessidade de prorrogação com termo aditivo de prazo para conclusão
da proposta original, pois, até novembro de 2010, ainda faltava o valor de
R$ 4.913,76 para concluir a proposta inicial que era de R$ 114.391,50 (valor
líquido). Portanto, até junho de 2011, a comunidade Marcolana ainda não havia
cumprido o acordo firmado na proposta original de 2009.
Percebe-se, também, que existe certa fragilidade no tocante à fiscalização
por parte da CONAB, quanto à entrega dos alimentos, via Banco de Alimentos,
às instituições socioassistenciais. Pois, foi informado pela técnica da CONAB/
MT, que esta regional não dispõe de técnicos suficientes para acompanhar in loco
a distribuição dos alimentos às instituições cadastradas. Porém, foi informado,
também, que a CONAB realiza reuniões uma vez ao ano com as instituições
socioassistenciais, esclarecendo dúvidas do PAA, e como estas devem proceder
ao receber os alimentos. Dessa forma, percebe-se que são as instituições que
fiscalizam e denunciam quaisquer eventuais irregularidades em relação à qualidade

148
O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá-MT
na ótica da Nova Economia Institucional

ou entrega dos produtos elencados na proposta, através de denúncia anônima,


reclamação via ouvidoria da CONAB, entre outros meios.
Aqui, percebe-se que a CONAB-SUREG/MT não dispõe de técnicos
suficientes para fiscalizar se os alimentos estão sendo entregues às entidades
socioassistenciais, em quantidade e qualidade estipuladas no contrato, porém
depara-se com uma estratégia adotada pela Conab (agente do processo) de
realizar reuniões anuais com as entidades beneficiárias para informar sobre os
objetivos, incentivos e benefícios do programa, de tal forma que essas entidades
passam a ser as principais fiscalizadoras em relação à quantidade e qualidade
dos produtos constantes do contrato. Aqui, verifica-se a existência do filtro
institucional de segundo nível “transmissão do incentivo”, que pode resultar em
sucesso ou fracasso do programa. O convênio analisado usou desse filtro para o
sucesso do programa.
As informações de entregas de produtos revelam que não ocorrem em
todos os meses do ano, concentrados em janeiro, março, agosto, setembro,
outubro e novembro de 2010. Esta entrega sem fluxo regular é outra fragilidade
do programa, uma vez que as entidades beneficiadas enfrentam períodos sem
entrega alguma. Este fato pode estar associado ao pequeno período de existência
do programa na cidade, uma vez que este teve entregas apenas a partir de 2010
(MDS/CONAB) e ainda não houve estabilização das entregas. Em 2011, outra
comunidade entrou no programa, mas ainda está no início das atividades.
Em análise da Cédula do Produtor Rural em questão, percebe-se que
existe certa flexibilidade no prazo e na regularidade da entrega do produto, visto
como desejável pelas entrevistas com agentes públicos, em face das incertezas da
produção agrícola. Aqui, percebe-se a importância da estrutura de governança
na flexibilidade de contratos firmados entre a CONAB e as associações
e/ou cooperativas de agricultores familiares do município de Cuiabá, no caso
específico, a comunidade Marcolana.
Diante da análise dos convênios, tanto em nível de município de Cuiabá,
quanto com a CONAB, percebe-se que não existe uma preocupação maior com
quem recebe os alimentos (entidades socioassistenciais), conforme descrito
acima, configurando-se como fragilidade do programa ou filtro institucional de
primeiro nível.
Na análise das proporções das amostras: participantes do PAA e os não
participantes, tem-se o que segue. Estatisticamente, rejeita-se a hipótese nula (H0:
não existe diferença entre as proporções dos grupos com respeito à realização de
análise de solo) a 5% de significância, ou seja, as proporções entre os participantes
do PAA e os não participantes podem ser consideradas diferentes, pois, os que

149
Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello • Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo

participam do PAA e fazem análise de solo é de 40%; e dos que não participam
e fazem análise de solo é de 58%. Então, os não PAA usam mais análise de solo
e pode ser considerada diferente (z= -2,076; prob.= 0,037).
Já, em relação à utilização de calcário, rejeita-se a hipótese nula (H0: não
existe diferença entre as proporções dos grupos com respeito à utilização de
calcário) a 5% de significância, ou seja, as proporções entre os participantes do
PAA e os não participantes podem ser consideradas diferentes, pois a proporção
dos que participam do PAA que fazem uso do calcário é de 18% contra 53% dos
não participantes e que usam o calcário. Então, os que participam do PAA usam
menos calcário (z=-4,33; prob.=0,000).
A análise estatística não permitiu rejeitar a hipótese nula (H0: não há
diferença entre as proporções dos produtores participantes e não participantes
do PAA com uso de irrigação) a 5% de significância, ou seja, as proporções
entre os participantes do PAA e os não participantes não pode ser considerada
diferente, pois o grupo dos que participam do PAA e fazem irrigação são 72%
e os do que não participam e fazem irrigação são 82% dos respectivos totais
(z = -1,549; prob. = 0,12).
Quanto ao uso de energia elétrica, em termos estatísticos, não se rejeita
a hipótese nula (H0: não existe diferença entre as proporções dos grupos)
a 5% de significância, ou seja, as proporções entre os participantes do PAA e
os não participantes não pode ser considerada diferente, pois o grupo dos que
participam do PAA e usa energia é de 93% e os dos que não participam do PAA
e usam energia é de 91% (z=0,439; prob.=0,66).
Em relação à assistência técnica, estatisticamente, não se rejeita a hipótese
nula (H0: não existe diferença entre as proporções dos grupos com respeito ao
recebimento de assistência técnica) a 5% de significância, ou seja, as proporções
entre os participantes do PAA e os não participantes não pode ser considerada
diferente (z = -1,770; prob. = 0,07). Entretanto, poderia rejeitar a hipótese nula a
10% de significância, ou 90% de confiança – a proporção dos não PAA é maior
(67%) contra 52% para os participantes do PAA. O Programa (ATER) existe
desde 2006, porém não existe infraestrutura adequada para seu funcionamento, os
técnicos estão carentes de qualificação e os recursos financeiros são escassos para
tocar o Programa dentro da finalidade proposta que é de levar aos agricultores
familiares conhecimento técnico para elaboração de projetos e técnicas de gestão
através de palestras, cursos, seminários, dentre outros.
Já em relação à utilização de agrotóxicos, estatisticamente, não se rejeita
a hipótese nula (H0: não existe diferença entre as proporções dos grupos
com respeito à utilização de agrotóxicos) a 5% de significância, ou seja, as

150
O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá-MT
na ótica da Nova Economia Institucional

proporções entre os participantes do PAA e os não participantes não podem


ser ditas diferentes, pois, o grupo dos que participam do PAA e usam
agrotóxicos é de 88% e dos que não participam e usam agrotóxicos é de 84%
(z= 0,74; prob.= 0,45).
Quanto à utilização de adubo, estatisticamente, não se rejeita a hipótese
nula (H0: não existe diferença entre as proporções dos grupos com respeito
à utilização de adubo) a 5% de significância, ou seja, as proporções entre os
participantes do PAA e os não participantes não pode ser ditas diferentes, pois o
grupo dos que participam do PAA e utilizam adubo é de 85% e os dos que não
participam e usam adubo é de 89% (z=-0,67; prob.=0,50).
Na utilização de técnicas para conservação de solo, estatisticamente,
não se rejeita a hipótese nula (H0: não existe diferença entre as proporções dos
grupos com respeito à utilização de técnicas para conservação de solo) a 5% de
significância, ou seja, as proporções não podem ser ditas diferentes, pois, o grupo
dos que participam do PAA e fazem conservação de solo é de 96% e dos que não
participam e fazem conservação de solo é de 91% (Z=1,28; prob.=0,20).
Na mecanização, estatisticamente, rejeita-se a hipótese nula (H0: não
existe diferença entre as proporções dos grupos com respeito à utilização de
mecanização) a 5% de significância, ou seja, as proporções entre os participantes
do PAA e usam mecanização é de 91% e os que não participam e usam
mecanização é de 98%. Então, os não PAA usam mais mecanização e pode ser
considerada diferente (z=-2,058; prob.=0,039).
E na participação em associações, estatisticamente, rejeita-se a hipótese
nula (H0: não existe diferença entre as proporções dos grupos com respeito
à participação em associações) a 5% de significância, ou seja, as proporções
entre os participantes do PAA e os não participantes podem ser consideradas
diferentes. De fato, a proporção dos associados participantes do PAA é 95%
contra 73% (z=3,41; prob.=0,0006). Porém, através dos relatos dos agentes-chave
entrevistados, ficou claro que a maioria dessas associações estão funcionando
irregularmente, não cumprindo seu papel de representar os agricultores junto
aos órgãos públicos.
Enfim, diante da realidade apresentada acima, torna-se possível elaborar
um resumo das características das variáveis tecnológicas analisadas nesta
pesquisa. Assim, dentre as variáveis tecnológicas que apresentaram diferença nas
proporções entre os participantes do PAA e os que não participam, têm-se as
seguintes: participação em organizações e uso de calcário a um nível de confiança
de 99%; uso de análise de solo e tem mecanização com nível de confiança
de 95%; e utilização de assistência técnica a um nível de confiança de 90%
(Tabela 1).

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Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello • Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo

Tabela 1: Teste da presença de diferença estatística das variáveis tecnológicas


entre os grupos: participantes do PAA x não participantes.
Estatística de
Variável Resultado* Probabilidade
teste**
Faz irrigação não existe -1,550 0,121
Participa em organizações existe (99%) 3,412 0,001
Uso de adubo não existe -0,674 0,501
Uso de calcário existe (99%) -4,331 0,000
Uso de agrotóxicos não existe 0,747 0,455
Uso de análise de solo existe (95%) -2,077 0,038
Faz conservação de solo não existe 1,280 0,200
Tem mecanização existe (95%) -2,058 0,040
Tem energia elétrica não existe 0,439 0,660
Utiliza assistência técnica existe (90%) -1,771 0,077
Fonte: Elaborada pelos autores com base nos dados COATER – EMPAER/MT (2009).
* Entre parênteses está o nível de confiança (90%, 95%, 99%) e “existe” indica que há diferença
entre os grupos.
**Teste bilateral Z de proporções, sendo H0: diferença igual a zero; H1: diferença diferente de zero.

Das dez variáveis tecnológicas avaliadas, em cinco (participação em


organizações, uso de calcário, uso de análise de solo, mecanização e assistência
técnica) existem diferenças entre quem participa e quem não participa do PAA,
isto é, quem participa do PAA apresenta resultados diferentes no aproveitamento
dessas tecnologias, no trato da terra. A análise das proporções revela, entretanto,
que apenas a participação em organizações do grupo do PAA é superior ao do
grupo não participante do PAA. Para uso de calcário, uso de análise de solo,
ter mecanização e utilização de assistência técnica os resultados revelam uma
proporção menor para o grupo do PAA relativamente ao outro, o que é motivo
de preocupação para os objetivos de aumento de produtividade e geração de
renda, a partir da atividade agrícola.
No entanto, percebe-se que em outras cinco variáveis tecnológicas (faz
irrigação, uso de adubo, uso de agrotóxicos, faz conservação de solo, tem energia
elétrica) não há diferença entre esses dois grupos.
Analisou-se os produtos com diferença estatística entre a produção dos
grupos participantes do PAA e dos não participantes, fazendo um teste estatístico
unilateral (teste t) de médias, sendo a hipótese nula para produção igual entre
grupos (H0: PAA = não PAA) e alternativa para participantes com produção
maior que não participantes (H1: PAA> não PAA).

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O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá-MT
na ótica da Nova Economia Institucional

Estatisticamente (a 90% de confiança), a produção dos participantes do


PAA evidenciaram média acima dos não participantes para abóbora, berinjela,
mandioca, milho verde e quiabo. No entanto, alguns produtos analisados não
tiveram diferença nas médias, isto é, estatisticamente não foi possível rejeitar que
as médias entre os grupos participantes e não participantes do PAA são iguais.
São eles: abacaxi, abobrinha, alface, banana maçã, banana da terra, batata doce,
berinjela (área), cebolinha, coentro, couve, jiló, limão Taiti, maracujá, maxixe,
melancia, melão, pepino, pimenta, pimentão, quiabo (produção), repolho, rúcula,
salsa/salsinha, tomate e rapadura.
Portanto, na maioria dos produtos oriundos dos agricultores familiares
do município de Cuiabá não há diferença entre a produção média entre os
grupos participantes e não participantes do PAA, dessa forma, aceita-se a
hipótese secundária de que a produção média entre os grupos participantes e
não participantes do PAA não é diferente.
Diante da realidade deparada no Convênio MDS e Prefeitura de Cuiabá,
verifica-se a existência do filtro institucional de terceiro nível “tomada de decisão”,
isto é, quem são os atores que compõem o público-alvo do PAA, quem escolhe
os que vão participar do programa, quais os produtos que serão contemplados, e
quais as entidades socioassistenciais que irão participar desse processo. Portanto,
verifica-se a importância dos atores que compõem o organograma informal
de atuação do PAA – Convênio MDS e Prefeitura de Cuiabá, já mencionado
anteriormente, pois, a atuação dos conselhos que fazem o controle social é de
suma importância, tanto, na determinação dos agricultores que farão parte do
convênio, quanto dos produtos que irão compor a proposta, como também, das
entidades socioassistenciais que serão beneficiadas pelo Programa.
Com respeito aos resultados apresentados pelos entrevistados (agentes-
chave do processo), verifica-se que a estrutura de governança (organograma
informal) do PAA em Cuiabá (convênio MDS – Prefeitura), a qual seria a
responsável pela gestão de funcionamento do programa em nível local, isto é, os
atores que deveriam coordenar a execução do programa: SMTDE – Diretoria de
Agricultura e Abastecimento, através de seus técnicos, e do conselho (CMDA);
SMASDH, através dos conselhos (COMSEA e CMAS), e do Banco de Alimentos;
além de representante dos produtores e entidades socioassistenciais, não está
funcionando, pois, basicamente, são os técnicos da Diretoria de Agricultura e
Abastecimento que determinam quem são os produtores, os beneficiários e os
produtos que irão compor o programa.
Logo, percebe-se a importância da adoção conjunta dos conceitos de
coordenação e eficiência trabalhados por Azevedo (2000), pois, através da

153
Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello • Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo

existência de uma coordenação de todo o processo de rede do PAA é possível


minimizar os custos de transação inerentes ao convênio, isto é, detectar os
possíveis filtros institucionais existentes e os possíveis ajustes a serem propostos
para sanar tais imperfeições, assim como torna-se provável a adaptação mais
rápida às modificações de ambiente e de conflitos que porventura venham a
ocorrer entre os atores envolvidos nesse sistema.
Williamson (1985) ressalta a importância da coordenação, como uma
característica dos agentes econômicos, onde é possível regular uma transação
através do mecanismo da estrutura de governança, isto é, os atores que compõem
a rede de atuação do PAA no município de Cuiabá estão atuando coerentemente,
estão respaldados formal e legalmente para desempenharem essa função?
Percebe-se que não.
Nessa ótica, verifica-se que alguns conselhos diretamente envolvidos nesse
processo encontram-se inativos, caso do Conselho Municipal de Desenvolvimento
Agrário (CMDA) e outros funcionando precariamente: Conselho Municipal de
Segurança Alimentar (COMSEA) e Conselho Municipal de Assistência Social
(CMAS). Portanto, tal situação está influenciando negativamente na concretização
das metas do PAA no município de Cuiabá, pois deixarm de atuar como agentes
de controle social.
Na sequência, são formuladas algumas sugestões de melhoria para o PAA
em Cuiabá:
a) Fortalecer a estrutura de governança do PAA em Cuiabá, isto é,
definir formalmente e com clareza quais são os atores chave do processo, suas
responsabilidades, a partir daí sugerir mudanças estratégicas para sanar as falhas,
fragilidades, filtros detectados na execução do programa;
b) Regularizar e efetivar o funcionamento dos conselhos que são
responsáveis, principalmente pelo controle social dos projetos e, também, pela
fiscalização e monitoramento na execução dos mesmos, e atualmente, senão
todos, a maioria encontram-se atuando de forma precária, sendo que alguns
estão inativos;
c) Assim, dentro dessa nova ótica, reativar o atual Convênio (MDS/
Prefeitura de Cuiabá), cujo período de execução está previsto para 2012. Com
isso, atuar no sentido de resgatar a confiança dos agricultores familiares no ente
municipal; e,
d) Reestruturar o Programa Municipal de Assistência Técnica e Extensão
Rural (ATER), criado em 2006, porém, dessa data até a atual não teve atuação
concreta junto aos agricultores familiares, devido a vários fatores de ordem política

154
O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá-MT
na ótica da Nova Economia Institucional

e de gestão. Esse ponto é fundamental para que qualquer projeto direcionado


ao segmento familiar tenha êxito, pois, só com uma equipe técnica capacitada
continuamente, dotada de infraestrutura, autonomia de ação e apoio da instituição,
poderá desenvolver seu papel com profissionalismo e responsabilidade junto ao
segmento da agricultura familiar.

CONCLUSÕES
Este trabalho teve por objetivo investigar a operacionalização do Programa
de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá – MT. Portanto, seus objetivos
específicos foram: avaliar o cumprimento das metas do PAA no município;
comparar os resultados produtivos entre produtores participantes do PAA e não
participantes; averiguar eventuais dificuldades ou imperfeições na execução do
programa; e contribuir com sugestões de melhoria do programa.
No decorrer da elaboração da pesquisa, verificou-se que a meta do PAA –
convênio 177/2007 entre o MDS e a Prefeitura Municipal de Cuiabá, através da
modalidade Compra Direta Local da Agricultura Familiar (CDLAF) com Doação
Simultânea – foi considerada cumprida pelos órgãos oficiais, porém, quanto às
entidades socioassistenciais, cuja proposta era de beneficiar 175 entidades apenas
83 foram atendidas adequadamente.
No Programa, no âmbito do MDS-CONAB, o município de Cuiabá
participou somente com a comunidade Marcolana, cujo projeto contemplava a
participação de 27 famílias e o período de execução outubro de 2009 a outubro
de 2010, tendo sido prorrogado e até junho de 2011, não tendo sido concluído.
Portanto, não foi cumprida a meta inicial.
A pesquisa detectou que na maioria das unidades produtivas oriundas
da agricultura familiar do município de Cuiabá não apresentam diferença da
produção média entre os grupos participantes e não participantes do PAA.
Quanto à participação em associação, a pesquisa permitiu avaliar que
a proporção dos associados participantes do PAA é maior do que os não
participantes, isto é, 95% do participantes do PAA participam de associações,
contra 73% dos não participantes. Porém, nas entrevistas com os agentes-chave
do processo, foi detectado que a maioria das associações estão irregulares,
considerando sua documentação, assim como também quanto à inadimplência
de algumas obrigações legais, não cumprindo, assim, seu papel de representar e
facilitar ações junto aos órgãos públicos em benefício dos agricultores familiares.
Não houve diferença estatística entre as proporções dos produtores
participantes e não participantes do PAA, em relação a algumas variáveis

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Geni Cecília Figueiredo do Carmo Mello • Adriano Marcos Rodrigues Figueiredo

tecnológicas como: uso de irrigação; uso de energia elétrica, uso de agrotóxicos,


realização de conservação de solo, e, uso de adubo.
Porém, houve diferença estatística nas proporções entre os participantes do
PAA e os não participantes em outras variáveis tecnológicas, a saber: utilização de
assistência técnica; participação em organizações; uso de calcário; uso de análise
do solo; e uso de mecanização. Porém, apenas a participação em organizações do
grupo do PAA foi superior ao do grupo não participante.
Com relação aos filtros institucionais detectados nos programas, tanto na
prefeitura quanto da CONAB, percebe-se que não existe uma preocupação maior
com quem recebe os alimentos (entidades socioassistenciais), configurando-se
como fragilidade do Programa ou filtro institucional de primeiro nível, relacionado
ao desenho da política, no caso o convênio MDS-Prefeitura e o contrato MDS-
CONAB, que se detalha no contrato entre a CONAB e associações descritas.
Com relação à estrutura de governança, tem-se que através dos relatos
apresentados pelos entrevistados (agentes-chave do processo), a estrutura de
governança (organograma informal) do PAA em Cuiabá (convênio MDS/
Prefeitura), a qual seria a responsável pela gestão de funcionamento do
Programa em nível local, isto é, os atores que deveriam coordenar sua execução:
SMTDE – Diretoria de Agricultura e Abastecimento, através de seus técnicos e
do conselho (CMDA); SMASDH, através dos conselhos (COMSEA e CMAS),
e do Banco de Alimentos, além de representante dos produtores e entidades
socioassistenciais, não está funcionando, pois, basicamente, são os técnicos
da Diretoria de Agricultura e Abastecimento que determinam quem são os
produtores os beneficiários, e os produtos que irão compor o Programa.
Quanto à atuação dos conselhos, segundo relato dos entrevistados, a
maioria está funcionando precariamente ou, em alguns casos, estão inativos. Isso
prejudica a atuação do PAA, pois, trata-se de um segmento imprescindível para o
controle social, através do monitoramento na execução do Programa.
Quanto à variável ATER, ocorre outro gargalo a ser resolvido. O
Programa existe desde 2006, porém não existe infraestrutura adequada para seu
funcionamento, os técnicos estão carentes de qualificação e os recursos financeiros
são escassos para tocar o Programa dentro da finalidade proposta, que é de levar
aos agricultores familiares conhecimento técnico para elaboração de projetos e
técnicas de gestão através de palestras, cursos, seminários, dentre outros.
Outro ponto negativo revelado pela pesquisa foi a interrupção do PAA, no
final do ano de 2009, e o não funcionamento no ano de 2010, transformando-se
em um pesadelo para os agricultores que continuaram a plantar e não conseguiram
a comercialização da produção na sua totalidade, portanto, gerando prejuízo a
esses atores.

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O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) em Cuiabá-MT
na ótica da Nova Economia Institucional

Assim, o PAA está sendo executado no município de Cuiabá com algumas


dificuldades e/ou imperfeições, devido à forma de atuação da estrutura de
governança – atualmente é bastante precária – a qual é responsável pela gestão
do programa. Isso foi possível detectar por meio dos questionários e entrevistas
com agentes-chave do processo, no segmento rural do município de Cuiabá,
especificamente o da agricultura familiar, foco da pesquisa.
Enfim, diante da realidade detectada pela pesquisa, apresentam-se algumas
sugestões para o PAA executado no município de Cuiabá: fortalecer a estrutura
de governança do PAA em Cuiabá; regularizar a situação dos conselhos; que
seja reativado o atual convênio (MDS/Prefeitura de Cuiabá), cujo período de
execução está previsto para 2012 e reestruturar o Programa Municipal de ATER,
criado em 2006.

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Texto submetido à Revista em 15.01.2012


Aceito para publicação em 06.05.2012

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