Defesa Final

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UNIVERSIDADE ÓSCAR RIBAS


FACULDADE DE DIREITO
DEPARTAMENTO DE ENSINO E INVESTIGAÇÃO EM DIREITO

“A PROTECÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO ARGUIDO NO


PROCESSO PENAL ANGOLANO”
UNIVERSIDADE ÓSCAR RIBAS
FACULDADE DE DIREITO
DEPARTAMENTO DE ENSINO E INVESTIGAÇÃO EM DIREITO

TRABALHO DE FIM DE CURSO DA LICENCIATURA EM DIREITO

“A PROTECÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO ARGUIDO NO


PROCESSO PENAL ANGOLANO”

DIONÍSIO LUCAS LAURINDO BANDA

______________________________________________

JOÃO ZAGE LUCAS


______________________________________________

Trabalho de Fim de Curso, apresentado a


Universidade Óscar Ribas como requisito parcial para a
conclusão da Licenciatura em Direito. Orientador: Lic.
Belmiro Sacunduinga

Luanda, 2024
DECLARAÇÃO DOS AUTORES

Declaramos abertamente que o presente trabalho de fim de curso é resultado de


uma profunda investigação, cujo seu conteúdo é original em conformidade com as
fontes consultadas em determinadas bibliografias.

O CANDIDATO

___________________________________________________________

O CANDIDATO

___________________________________________________________

Pretendemos ainda expressar que, fruto de um esforço excecionalmente acrescido


tornou este trabalho de fim de curso uma realidade de investigação pessoal e independente.

O ORIENTADOR

__________________________________________________________

III
DEDICATÓRIA

Ao meu amado pai, Josué Augusto, que


sempre estará vivo em nossos corações (in
memoriam)

(Dionísio Banda)

Às minhas queridas mães, Victória Lucas


e Teresa Lucas (in memoriam)

(João Lucas)

IV
AGRADECIMENTOS

Gostaria de aproveitar este momento para expressar minha profunda gratidão a todas
as pessoas que estiveram ao meu lado durante esta jornada acadêmica. Sem o apoio delas, não
teria sido possível alcançar este marco em minha vida.

Primeiramente, sou grato a Deus por me conceder saúde e força para superar os
desafios que surgiram em meu caminho. Sua orientação e amparo foram essenciais para
minha jornada.

Gostaria de fazer uma menção especial ao meu magnífico irmão, Nelson Augusto. Sua
atenção constante e educação exemplar foram verdadeiros impulsionadores para que eu
chegasse até esta licenciatura. Seu apoio moldou quem sou hoje.

À minha cunhada, Cecília António, expresso minha profunda gratidão pelo suporte
incansável que me proporcionou ao longo de toda a minha formação. Sua dedicação fez uma
diferença notável.

Agradeço também à minha querida colega Abiúd Garcia, tornando-se uma mãe que me
ofereceu sua atenção e valiosos conselhos ao longo desta caminhada. Suas palavras foram
como um farol que me guiou.

Uma palavra especial de agradecimento vai para minha amiga Almira Eduardo. Sua
crença em mim e seu apoio constante foram verdadeiramente motivadores em momentos de
dúvida.

Não posso deixar de mencionar meus colegas e amigos em geral. Seu carinho,
incentivo e paciência foram fundamentais para superar os desafios acadêmicos. Cada palavra
de encorajamento foi um combustível para minha determinação.

Ao meu excelentíssimo tutor, Dr. Belmiro Sacunduinga pelo grande trabalho


desempenhado e prestado com muito zelo e rigor.
Em suma, minha jornada acadêmica foi iluminada pela presença e apoio de todas essas
pessoas incríveis. Estou verdadeiramente agradecido por cada um de vocês, e este momento
não seria completo sem expressar minha sincera gratidão.

(Dionísio Banda)

OBRIGADO!

V
A Deus todo-poderoso pela terrina de bênção que me tem dado
Aos meus irmãos, Paulo Parentes, Bruno Parentes, Adelcio Leal e Selson Paim.
A minha querida tia Marisa Parentes pelo apoio imensurável e carinho inseparável
A minha cunhada Joelma Garcia pela participação directa e suporte ao longo da
trajectória académica
A minha excelentíssima professora Catiana pelo amor, ensinamentos e força que
serviram de grande impulso para a minha formação académica
A minha ilustre colega Abiud Garcia pelos conselhos, dedicação constante e apoios
gratificantes.
Aos familiares, colegas e amigos pelo contributo caloroso que prestaram.
Ao meu querido pai, Rafael Justino G. Dos S. Lucas, por ter acreditado e apoiado
quando mais precisei.
Ao meu excelentíssimo tutor, Dr. Belmiro Sacunduinga pelo grande trabalho
desempenhado e prestado com muito zelo e rigor.

Em especial a minha digníssima e excelentíssima mãe, Maria da Conceição pela sua


prazerosa educação e princípios orientadores que serviram de ponte para chegar a este grau de
licenciatura.
(João Lucas)

OBRIGADO!

VI
EPÍGRAFE

“A liberdade é o oxigênio dos


direitos fundamentais.”

Nelson Mandela

VII
RESUMO

Os direitos fundamentais possuem um inegável conteúdo ético (aspecto material). Eles são os
valores básicos para uma vida digna em sociedade. Neste contexto, eles estão intrinsecamente
ligados à ideia de dignidade da pessoa humana e de limitação do poder. Afinal, em um
ambiente de opressão não há espaço para vida digna. A dignidade humana é, portanto, a base
axiológica desses direitos. Além do conteúdo ético os direitos fundamentais também possuem
um conteúdo normativo (aspecto formal). Relativamente ao problema da pesquisa, pretende-
se saber “Quais são os direitos e garantias fundamentais do arguido consagrados no
ordenamento jurídico angolano, dentro da esfera processualista penal? ” E para isso, elaborou-
se o seguinte objectivo geral: Compreender o quadro jurídico da protecção dos direitos e
garantias fundamentais do arguido no processo penal angolano; e como específicos: Definir
direitos e garantias fundamentais; Explicar a evolução histórica dos direitos fundamentais em
Angola; Identificar os direitos e garantias concedidos ao arguido no processo penal angolano.
A Garantia Judiciária do arguido é um princípio fundamental que protege os direitos e a
dignidade das pessoas acusadas de crimes, assegurando que elas sejam tratadas justamente no
sistema de justiça penal. Relativamente aos direitos, Constituem direitos processuais do
arguido os constantes no art.º 67.º do CPPA.

Palavras-Chave: Direitos, Garantias Fundamentais, Arguido.

VIII
ABSTRACT

Fundamental rights have an undeniable ethical content (material aspect). They are the basic
values for a dignified life in society. In this context, they are intrinsically linked to the idea of
human dignity and the limitation of power. After all, in an environment of oppression there is
no space for a dignified life. Human dignity is, therefore, the axiological basis of these rights.
In addition to the ethical content, fundamental rights also have a normative content (formal
aspect). Regarding the research problem, the aim is to know “What are the fundamental rights
and guarantees of the defendant enshrined in the Angolan legal system, within the criminal
procedural sphere? ” And to this end, the following general objective was developed:
Understanding the legal framework for the protection of the defendant's fundamental rights
and guarantees in Angolan criminal proceedings; and as specific: Define fundamental rights
and guarantees; Explain the historical evolution of fundamental rights in Angola; Identify the
rights and guarantees granted to the defendant in Angolan criminal proceedings. The
Defendant's Judicial Guarantee is a fundamental principle that protects the rights and dignity
of people accused of crimes, ensuring that they are treated fairly in the criminal justice
system. Regarding rights, the defendant's procedural rights are those set out in article 67 of
the CPPA.

Keywords: Rights, Fundamental Guarantees, Defendant.

IX
LISTA DE ABREVIATURAS

ARTS Artigos

PÁG Página

PÁGS Páginas

ALS Alíneas

SS Seguintes

CFR Conforme

EX Exemplo

TC Tribunal Constitucional

UÓR Universidade Óscar Ribas

CPPA Código de Processo Penal Angolano

CRA Constituição da República de Angola

MP Ministério Público

DDHC Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadã

PIDCP Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos

CEDH Convenção Europeia dos Direitos Humanos

X
ÍNDICE GERAL

DECLARAÇÃO DOS AUTORES...................................................................................III

DEDICATÓRIA................................................................................................................IV

AGRADECIMENTOS.......................................................................................................V

EPÍGRAFE.......................................................................................................................VII

RESUMO.........................................................................................................................VIII

ABSTRACT.......................................................................................................................IX

LISTA DE ABREVIATURAS...........................................................................................X

INTRODUÇÃO...................................................................................................................1

CAPÍTULO I ⸺ ASPECTOS GERAIS SOBRE OS DIREITOS


FUNDAMENTAIS FUNDAMENTO HISTÓRICO SOBRE OS DIREITOS
FUNDAMENTAIS..............................................................................................................3

1. Conceito de Direitos Fundamentais.........................................................................................3


1.1. Origem dos Direitos Fundamentais......................................................................................4
1.1 Sentido e Forma dos Direitos Fundamentais......................................................................5
1.2 Positivação..............................................................................................................................7
1.3 Constitucionalização..............................................................................................................8
1.4 Fundamentalização................................................................................................................9
1.5 Características dos Direitos Fundamentais.......................................................................10
1.6 Dimensões dos Direitos Fundamentais..................................................................10

1.7 Direitos Fundamentais de Primeira Dimensão.................................................................11


1.8 Funções Dos Direitos Fundamentais......................................................................12

1.9 Função de defesa ou de Liberdade.....................................................................................12


1.10 Função de Prestação Social.................................................................................................12
1.11 Função de Protecção Perante Terceiros............................................................................13
1.12 Função de não Discriminação.............................................................................................13
CAPÍTULO II — GARANTIAS FUNDAMENTAIS DO ARGUIDO NO
PROCESSO PENAL ANGOLANO................................................................................15

2.1 O Arguido no Processo Penal Angolano............................................................................15


2.2 Constituição de Arguido......................................................................................................16
2.3 O Arguido enquanto Sujeito Processual Penal.................................................................20
2.4 Arguido versus Suspeito......................................................................................................20
2.5 Pretensa diferença entre Arguido e Réu............................................................................22
2.6 Garantias Constitucionais...................................................................................................23
2.7 Garantia Judiciária..............................................................................................................25
2.8 A Presunção de Inocência como Garantia Processual.....................................................26
2.9 Direitos Do Arguido no Processo Penal Angolano...................................................27

CONCLUSÃO...................................................................................................................32

SUGESTÕES.....................................................................................................................33

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................34
INTRODUÇÃO
A pesquisa que se leva a cabo tem o propósito de estudar os direitos fundamentais do
arguido no processo penal angolano. Importa referir a importância do tema, visto que em toda
sociedade de direito e democrática os direitos fundamentais são a primeira linha de defesa às
ameaças dirigidas ao cidadão.

Os direitos fundamentais possuem os valores básicos para uma vida digna em


sociedade. Neste contexto, eles estão intrinsecamente ligados à ideia de dignidade da pessoa
humana e de limitação do poder. Afinal, em um ambiente de opressão não há espaço para vida
digna.

A dignidade humana é, portanto, a base axiológica desses direitos. Além do conteúdo


ético os direitos fundamentais também possuem um conteúdo normativo (aspecto formal). Do
ponto de vista jurídico, não é qualquer valor que pode ser enquadrado nessa categoria.

PROBLEMA DE PESQUISA

Quais são os direitos fundamentais do arguido dentro da esfera processualista penal?

OBJECTIVOS
GERAL
Compreender o quadro jurídico da protecção dos direitos fundamentais do arguido no
processo penal angolano
ESPECÍFICOS
 Definir os direitos fundamentais;
 Explicar a evolução histórica dos direitos fundamentais em Angola;
 Identificar os direitos concedidos ao arguido no processo penal angolano.

JUSTIFICATIVA
Nos últimos anos, tem sido observado um cenário de mudanças significativas nos
sistemas jurídicos em várias partes do mundo. Em particular, o sistema jurídico angolano tem
passado por transformações substanciais, especialmente no que diz respeito aos regulamentos
penais e à introdução do juiz de garantias. Essas mudanças têm o potencial não apenas de

1
influenciar a maneira como os processos penais são conduzidos, mas também de impactar
directamente os direitos e garantias fundamentais dos arguidos envolvidos nesses processos.

A evolução dos regulamentos penais é um reflexo da constante busca por um sistema


de justiça mais equitativo e justo. O reconhecimento da necessidade de proteger os direitos
dos indivíduos submetidos a processos penais é uma característica central dessas mudanças. A
introdução do juiz de garantias, por exemplo, demonstra um compromisso renovado com a
salvaguarda dos direitos dos arguidos desde o início da investigação até a conclusão do
processo. Essa figura desempenha um papel crucial na supervisão das medidas cautelares,
garantindo que elas sejam proporcionais e necessárias, e também contribui para a
imparcialidade e independência do processo. Esta evolução direcionou a escolha deste tópico
de pesquisa.

ENQUADRAMENTO METODOLÓGICO

A base metodológica da investigação parte do princípio de aceitar cada momento


histórico e suas próprias contradições. Para elaboração da presente pesquisa utilizou-se os
seguintes tipos de pesquisas: Pesquisa exploratória - a fim de criar familiaridade com o tema;
pesquisa descritiva - a fim de analisar minuciosamente o objecto de estudo.

Através da análise histórico-lógico, descrever-se-á a origem e evolução dos direitos e


garantias fundamentais. Através deste método, interpretar-se-á as conexões históricas que
serviram para o desenvolvimento do actual conceito de direitos fundamentais. Outros métodos
usados, incluem a analise-sintética que serviu para filtrar o conteúdo encontrado por meio da
revisão bibliográfica.

E no que se refere ao modelo de pesquisa, de acordo com o tema e tendo em conta as


características do tema e a natureza da pesquisa, metodologicamente enquadra-se no modelo
de abordagem qualitativa. Ainda na senda da metodologia, utilizaremos a pesquisa
exploratória, visto que visa proporcionar maior familiaridade com o problema com vista a
torná-lo explícito.

ESTRUTURA DO TRABALHO

O presente trabalho comporta dois capítulos, a fim de facilitar a compreensão dos


leitores, sendo que: o primeiro capítulo trata da fundamentação teórica onde abordar-se-á os
direitos e garantias fundamentais, as gerações dos direitos fundamentais e uma breve

2
abordagem histórica relativa aos direitos fundamentais. O segundo, abordará sobre questões
que tem que ver com a protecção dos direitos fundamentais do arguido enquanto sujeito
passivo da relação jurídico- processual.

3
CAPÍTULO I ⸺ ASPECTOS GERAIS SOBRE OS DIREITOS FUNDAMENTAIS
FUNDAMENTO HISTÓRICO SOBRE OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

1. Conceito de Direitos Fundamentais

Segundo Andrade, (2012, p. 15)


(...) os direitos fundamentais tanto podem ser vistos em quanto direitos naturais de
todos os homens, independentemente dos tempos e dos lugares (perspectiva filosófica
ou jusnaturalista) como podem ser referidos aos direitos mais importantes das pessoas,
num determinado tempo e lugar, isto é, num Estado concreto ou numa comunidade de
Estados (perspectiva estadual ou constitucional).

Ora, segundo a perspectiva estadual ou constitucional, os direitos fundamentais, tais


como se entende hoje, são verdadeiros direitos ou liberdades, reconhecidos em geral aos
homens ou a certas categorias de entre eles, por razões de humanidade. São, nessa medida,
direitos de igualdade, universais, e não direitos de desigualdade (Andrade, 2012, p. 20).

Em matéria de direitos fundamentais, a constituição da Republica de Angola de 2010


insere-se plenamente no marco do Estado constitucional ocidental, seguindo a matriz dos
grandes textos e recebendo e ampliando o legado que recebeu da lei constitucional de 1992
(Alexadrino, 2011, p.357).

O direito constitucional dos direitos fundamentais é o primeiro núcleo temático que,


ao nível da especialidade, se impõe esclarecer, logo a seguir à apresentação geral da
Constituição da República de Angola (CRA) que se tornou possível através dos seus prin-
cípios constitucionais. Isto quer dizer que é esta vertente do Direito Constitucional que tem a
finalidade de proteger a pessoa humana, ao mais alto nível e com todas as garantias que são
apanágio da força deste domínio jurídico. Em nenhum outro lugar do direito positivo estadual
se pode dar, nestes termos de máxima efectividade, tanta protecção à pessoa como pela
consagração de direitos fundamentais (Gouveia, 2014, p.299).

3
1.1. Origem dos Direitos Fundamentais

Os direitos fundamentais, também conhecidos como direitos humanos, são os direitos


básicos e essenciais que são inerentes a todas as pessoas, independentemente de sua
nacionalidade, raça, gênero, religião ou outras características. Esses direitos são reconhecidos
como fundamentais para garantir a dignidade, liberdade e igualdade de todas as pessoas. As
origens dos direitos fundamentais remontam a várias fontes históricas, filosóficas e jurídicas.

a. Fontes Filosóficas e Religiosas: Muitas das ideias fundamentais sobre direitos


humanos têm raízes em filosofias e religiões antigas. Por exemplo, na Grécia
Antiga, filósofos como Sócrates, Platão e Aristóteles discutiram a ideia de
justiça e igualdade. Além disso, várias religiões, como o Judaísmo, o
Cristianismo e o Islamismo, ensinam princípios de dignidade e respeito pela
vida humana, que influenciaram a formação desses direitos.
b. Magna Carta (1215): A Magna Carta foi um documento inglês histórico que
limitava os poderes do monarca e estabelecia certos direitos e liberdades para os
barões feudais. Embora tenha sido inicialmente um acordo entre a realeza e a
nobreza, ao longo do tempo, seus princípios foram estendidos para proteger os
direitos de outros grupos sociais;
a) Bill of Rights (1689): Na Inglaterra, a Declaração de Direitos de 1689 foi um
importante marco na limitação dos poderes da monarquia e na garantia de liberdades
individuais para os cidadãos;
b) Iluminismo: Durante o Iluminismo, nos séculos XVII e XVIII, pensadores como John
Locke, Montesquieu e Rousseau desenvolveram teorias sobre direitos naturais e o
contrato social, que influenciaram a concepção moderna de direitos fundamentais;
c) Declaração de Independência dos Estados Unidos (1776): A famosa declaração
proclamava que "todos os homens são criados iguais" e têm direitos inalienáveis,
incluindo "vida, liberdade e busca da felicidade". Essa ideia teve um impacto
significativo no desenvolvimento dos direitos humanos;
d) Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948): Após a Segunda Guerra
Mundial, a comunidade internacional sentiu a necessidade de estabelecer padrões
globais de direitos humanos para evitar atrocidades semelhantes às ocorridas durante a
guerra. A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi adotada pela Assembleia

4
Geral das Nações Unidas em 1948 e delineou uma ampla gama de direitos
fundamentais que todos os seres humanos devem desfrutar;
e) Tratados Internacionais e Convenções: Além da Declaração Universal, diversos
tratados e convenções internacionais foram estabelecidos para proteger e promover os
direitos humanos, como o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto
Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais;
f) Constituições Nacionais: Muitos países incorporaram direitos fundamentais em suas
constituições nacionais. Esses documentos estabelecem as bases para a proteção dos
direitos dos cidadãos dentro de um determinado país.

As origens dos direitos fundamentais são multifacetadas e refletem a evolução


histórica das ideias sobre dignidade, liberdade e igualdade. Esses direitos continuam a ser uma
parte crucial do direito internacional e das estruturas jurídicas nacionais em todo o mundo.

No regime geral dos direitos fundamentais, a constituição procede a incorporação de


dois princípios:

1. O princípio da universalidade (artigo 22.º da Constituição da Republica de Angola);


2. O princípio da autonomia.

De acordo com o primeiro princípio, a universalidade, a constituição afirma que toda a


pessoa pelo facto de o ser possui direitos determinados. Todos os indivíduos, nacionais e
estrangeiros, e ainda pessoas colectivas, gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres
consagrados na constituição.

No que concerne ao segundo princípio, a autonomia, valem aqui as considerações


expendidas quanto aos conceitos de autonomia privada e autonomia pública como princípio
co-originários. A ideia de indivíduo não corresponde hoje ao valor (individualista) da
independência, mas ao valor (humanista) da autonomia sobre se inclui, por definição, a
relação com os outros, isto é a sociabilidade (Queiroz, 2011, p. 27).

1.1 Sentido e Forma dos Direitos Fundamentais


Por direitos fundamentais entende-se os direitos ou as posições jurídicas activas das
pessoas enquanto tais, individual ou institucionalmente consideradas, assentes na
Constituição, seja na constituição formal, seja na constituição material. Donde direitos
fundamentais em sentido formal e direitos fundamentais em sentido material (Miranda, 2008,
p. 9).

5
Esta dupla noção, pois os dois sentidos podem ou devem não coincidir, pretende-se
susceptível de permitir o estudo de diversos sistemas jurídicos, sem escamotear a atinência
das concepções de direitos fundamentais com as ideias de Direitos, os regimes políticos e as
ideologias.

Em primeiro lugar, não há verdadeiros direitos fundamentais sem que as pessoas


estejam em relação imediata com o poder, beneficiando de um estudo comum e não separadas
em razão dos grupos ou das condições a que pertençam; não há direitos fundamentais sem
Estados, ou pelo menos sem comunidade política integrada. Em segundo lugar, não há
direitos fundamentais sem reconhecimento duma esfera própria das pessoas, mais ou menos
ampla, frente ao poder político, não há direitos fundamentais em Estados totalitários ou, pelo
menos, em totalitarismo integral.

Segundo Miranda, (2008, p. 10-11)

(...) Não custa aprender o conceito formal de direitos fundamentais. Não custa
aprendê-lo, à face do sentido formal de Constituição e, porque não se afigura
justificado desprender a priori qualquer norma da Constituição formal da Constituição
material, visto que essa norma, mesmo quando aparentemente sem relevância
constitucional, é parte de um todo, é possível da interpretação que possa ou deva
fazer-se na perspectiva do sistema e, se recebe o influxo de outros princípios e regras,
também conta para o sentido sistemático que recai sobre outros princípios e regras.
Deve ter-se por direito fundamental toda a posição jurídica subjectiva das pessoas
enquanto consagrada na lei Fundamental.

Participante, por via da constituição formal, da própria constituição material, tal


posição jurídica subjectiva fica, só por estar inscrita na Constituição formal, dotada da
protecção a esta ligada, nomeadamente quanto a garantia da constitucionalidade e a revisão. É
inconstitucional uma lei que a viole e só por revisão (seja qual for o sistema de revisão
constitucional adoptado) pode ser eliminada ou ter o seu conteúdo essencial modificado, ou
seja, todos os direitos fundamentais em sentido formal são também direitos fundamentais em
sentido material.

6
Nesta senda, revela-se ser necessárop conceituar Constituição formal e constituição
material. Numa primeira aproximação conceitual, pode-se definir a constituição em sentido
material como o conjunto de princípios jurídicos que constituem os fundamentos da
comunidade política. Tratar-se-á de referenciar os preceitos e os princípios jurídicos com
valor substancial para a compreensão estrutural de um Estado, independentemente do aspecto
formal que estes venham a assumir.

Por Constituição em sentido formal, entende-se o conjunto de disposições jurídicas a


que é atribuída uma superioridade formal em relação às leis comuns, há uma qualificação de
valor constitucional a partir de um processo especial de elaboração que assegura uma especial
salvaguarda das suas normas perante às leis comuns.

Percebe-se imediatamente que o conceito de Constituição em sentido formal,


pressupõe a existência de leis constitucionais diferenciadas das outras leis, na medida em que
a superioridade formal da Constituição é garantida pela formulação em textos escritos das
respectivas normas.

Daí que se tende hoje a identificar-se o conceito de Constituição formal com o de


Constituição escrita. Convertida em texto, a Constituição ganha um sentido instrumental de
garantia da ideia moderna de Constituição: ordenação sistemática e racional da comunidade
através de um documento escrito dirigido à salvaguarda dos valores da liberdade, da
estabilidade, da segurança, da publicidade e da previsibilidade, (Vaz, 2012).

1.2 Positivação
Os direitos fundamentais são estudados enquanto direitos jurídico-positivamente
vigentes numa ordem constitucional. A positivação de direitos fundamentais significa a
incorporação na ordem jurídica positiva dos direitos considerados naturais e inalienáveis do
individuo. Não basta uma qualquer positivação. É necessário assinalar-lhes a dimensão de
fundamentais colocados no lugar cimeiro das fontes do direito, as normas constitucionais
(Canotilho, s.d. p. 377).

Sem esta positivação jurídica os direitos do homem são esperanças, aspirações, ideias,
impulsos, ou, até, por vezes, mera retórica política, mas não direitos protegidos sob a forma
de norma (regras e princípios) de direito constitucional.

7
A positivação constitucional não significa que os direitos fundamentais deixem de ser
elementos constitutivos de legitimidade constitucional, e, por conseguinte, elementos legitima
fundamentais da própria ordem jurídico-constitucional positiva, nem que a simples
positivação jurídico-constitucional os torne, só por si, realidades jurídicas efectivas (ex.
catalogo de direitos fundamentais em constituições meramente semânticas).

Por outras palavras, a positivação jurídico-constitucional não dissolve nem consome


quer o momento de jusnaturalização quer as raízes fundamentantes dos direitos fundamentais
(dignidade humana, fraternidade, igualdade, liberdade). Neste sentido se devem interpretar
logo os artigos 1.º e 2.º. da Constituição da Republica de Angola, ao basearem
respectivamente a república na dignidade da pessoa humana e o Estado democrático de
Direito. Esta ideia, tornar-se-á mais transparente se aprofundar-se o sentido das categorias
(constitucionalização e fundamentalização de direitos).

1.3 Constitucionalização
A constitucionalização dos direitos fundamentais significa a sua positivação, a sua
incorporação na ordem jurídica positiva dos direitos considerados naturais e inalienáveis
do individuo. Essa positivação dos direitos fundamentais torna-os direitos protegidos sob
a forma de normas (regras e princípios) do direito constitucional (Araújo, 2018, p. 111-
112).

Designa-se por constitucionalização a incorporação de direitos subjectivos do homem


em normas formalmente básicas, subtraindo-se o seu reconhecimento e garantia à
disponibilidade do legislador ordinário. A constitucionalização tem como consequência mais
notória a protecção dos direitos fundamentais mediante o controlo jurisdicional da
constitucionalidade dos actos normativos reguladores destes direitos.

O direito subjectivo pode definir-se como o poder jurídico (reconhecido pela ordem
jurídica a uma pessoa) de livremente exigir ou pretender de outrem um comportamento
positivo (acção) ou negativo (omissão) ou de por um acto livre de vontade, só de per si ou
integrado por um acto de urna autoridade pública, produzir determinados efeitos jurídicos que
inevitavelmente se impõem a outra pessoa – contraparte ou adversário (Pinto, 2005, p.178).

Os direitos fundamentais apresentam-se, genericamente, como limite ao poder público,


e ainda como fim da própria actividade público-estadual (política dos direitos fundamentais).
A dignidade da pessoa humana (Artigo 1.º da Constituição da República de Angola) como

8
princípio constitucional supremo, presenta-se como fundamento da sociedade e do Estado,
isto é, como norma jusfundamental e como direito jusfundamental. Numa palavra como
compromisso fundamental do Estado.

Para este quadro, é usual distinguir-se os direitos fundamentais constitucionais, de um


lado, das simples pretensões e expectativas do outro. Alguns afirmam que as pretensões e as
expectativas não constituem direitos verdadeiros e próprios. Outros referem a existência de
um feixe de direitos que não são fixos, antes evoluem com o decurso do tempo. De todo o
modo trata-se de direitos amplamente aceites pela comunidade e que não podem como tal ser
eliminados sem uma mudança fundamental na compreensão social.

Esses direitos são genuinamente constitutivos de outros direitos no sentido em que


ajudam a criar ou constituem mesmo valores básicos da sociedade. Mas são também
compromissórios no sentido em que aspiram a desfrutar de um grau de estabilidade no tempo.
A sua violação corresponde a uma espécie de quebra ou ruptura da relação de confiança que
deve presidir as relações entre governantes e governados, numa palavra, uma violação do
princípio da protecção da confiança próprio de um Estado democrático de direito e
constitucional (Queiroz, 2011, p. 282).

No que concerne ao poder judicial, a Constituição atribui aos tribunais a tarefa


específica de assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos,
reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e
privados. (artigo 174.º da CRA)

Por isso, e para isso, os direitos fundamentais devem ser compreendidos, interpretados
e aplicados como normas jurídicas vinculativas e não como trechos osternatórios ao jeito das
grandes declarações de direitos (Canotilho, s.d. p. 378).

1.4 Fundamentalização
A inserção dos direitos fundamentais na Constituição faz com que eles sejam
analisados em várias dimensões, sejam elas formais ou materiais. Formalmente, essa
fundamentalidade constitucional tem as seguintes consequências:

a. As normas consagradas de direitos fundamentais, enquanto normas fundamentais, são


normas colocadas no grau superior da ordem jurídica;

9
b. Como normas constitucionais encontram-se submetidas aos procedimentos agravados
de revisão
c. Como normas incorporadoras de direitos fundamentais da própria revisão;
d. Como normas dotadas de vinculatividade imediata dos poderes públicos constituem
parâmetros materiais de escolhas, decisões, ações e controlo, dos órgãos legislativos,
administrativos e jurisdicionais (Canotilho, s.d. p. 355).

1.5 Características dos Direitos Fundamentais

De acordo com o Professor Araújo (2018, p.112), aos direitos fundamentais são
apontadas as seguintes características:

a) Universalidade: os direitos fundamentais aplicam-se a todas as pessoas,


independentemente de serem ou não nacionais de um país, e sem exclusão de sexo,
raça, credo religioso ou convicção político-filosófica;
b) Historicidade: os direitos fundamentais são produto da evolução histórica;
c) Inalienabilidade: eles são intransferíveis e inegociáveis;
d) Imprescritibilidade: não deixam de ser exigíveis por falta de uso nem desaparecem
pelo decurso do tempo;
e) Irrenunciabilidade: nenhum ser humano pode renunciar aos seus direitos
fundamentais;
f) Inviolabilidade: os direitos fundamentais não podem deixar de ser exercidos devido a
leis infraconstitucionais por actos das autoridades públicas;
g) Efectividade: os poderes públicos devem agir no sentido de assegurarem a
efectivação dos direitos fundamentais;
h) Complementaridade: os direitos fundamentais não devem ser interpretados de forma
isolada. Deve ser feita uma interpretação para que não haja uma colisão de direitos,
uma vez que todos eles têm a mesma força jurídica.

1.6 Dimensões dos Direitos Fundamentais

Ao longo da História, assistiu-se à consagração dos direitos civis, dos direitos


políticos, dos direitos sociais básicos e econômicos, dos direitos colectivos e, mais
modernamente, dos direitos das minorias, do direito ao desarmamento etc. A existência de
várias dimensões é perfeitamente compreensível, já que decorrem da própria natureza
humana: As necessidades do Homem são infinitas, inesgotáveis, o que explica estarem em

10
constante redefinição e recriação, o que, por sua vez, determina o surgimento de novas
espécies de necessidades do ser humano. Daí falar em diversas dimensões de projeção da
tutela do Homem, o que só vem corroborar a ideia de que não há um rol eterno e imutável de
direitos inerentes à qualidade de ser humano, mas sim, ao contrário, apenas um permanente e
incessante repensar dos Direito.

Segundo Tavares, (2020, p. 443).

(…) é preciso anotar que os autores têm preferido falar em gerações, querendo
significar gerações sucessivas de direitos humanos. A ideia de “gerações”, contudo, é
equívoca, na medida em que dela se deduz que uma geração se substitui, naturalmente,
à outra, e assim sucessivamente, o que não ocorre, contudo, com as “gerações” ou
“dimensões” dos direitos humanos. Daí a razão da preferência pelo termo “dimensão.

Contudo, é preciso insistir, desde logo, que os direitos não se encaixarão em apenas
uma das dimensões, nem será possível estabelecer uma linha divisória estrita e precisa entre
categorias individuais de direitos e categorias sociais ou de exercício colectivo.

Os direitos fundamentais são tradicionalmente classificados em três gerações ou


dimensões, as quais estão intimamente ligadas aos lemas da revolução francesa: liberdade,
igualdade e fraternidade Provedoria de Justiça, (2022).

1.7 Direitos Fundamentais de Primeira Dimensão

São direitos de primeira dimensão aqueles surgidos com o Estado Liberal do século
XVIII. Foi a primeira categoria de direitos humanos surgida, e que engloba, atualmente, os
chamados direitos individuais e direitos políticos. Neste primeiro conjunto de direitos
encontram-se a protecção contra a privação arbitrária da liberdade, a inviolabilidade do
domicílio, a liberdade e segredo de correspondência.

Também pertencem à primeira dimensão liberdades de ordem econômica, como a


liberdade de iniciativa, a liberdade de actividade econômica, a liberdade de eleição da
profissão, a livre disposição sobre a propriedade etc. Já as liberdades políticas referem-se à
participação do indivíduo no processo do poder político. As mais importantes são as
liberdades de associação, de reunião, de formação de partidos, de opinar, o direito de votar, o
direito de controlar os actos estatais e, por fim, o direito de acesso aos cargos públicos em
igualdade de condições.

11
No fundamental, os direitos de primeira dimensão são aqueles que compreendem as
chamadas “liberdades clássicas”. Direitos individuais, civis e políticos, seus exemplos
clássicos, são pois, direitos negativos que implicam a abstenção do Estado em relação a actos
que interfiram na esfera de liberdade dos indivíduos (Provedoria de Jusiça, 2022, p.13).

1.8 Funções Dos Direitos Fundamentais

São funções dos direitos fundamentais as seguintes:

a) Função de Defesa ou de Liberdade;


b) Função de Prestação Social;
c) Função de Protecção Perante Terceiros;

1.9 Função de defesa ou de Liberdade

A primeira função dos direitos fundamentais, sobretudo dos direitos, liberdades e


garantias é a defesa da pessoa humana e da sua dignidade perante os poderes do Estado (e de
outros esquemas políticos coactivos). Os direitos fundamentais cumprem a função de direito
de defesa dos cidadãos sob uma dupla perspectiva:

a) Constituem num plano jurídico-objectivo, normas de competência negativa para os


poderes públicos, proibindo fundamentalmente as ingerências destes na esfera
jurídica individual;

b) Implicam, num plano jurídico-subjectivo, o poder de exercer positivamente


direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões dos poderes
públicos, de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos (liberdade
negativa). Assim, por exemplo o artigo 40.º da CRA garante subjectivamente:
Direito de exprimir e divulgar livremente o pensamento pela palavra, pela imagem
ou por qualquer outro meio, bem como o direito e a liberdade de informar, de se
informar e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações GOMES
CANOTILHO, (s/d, p. 407).

1.10 Função de Prestação Social

Os direitos a prestações significa, em sentido estrito, direito do particular ao obter algo


através do Estado (saúde, educação, segurança social). É claro que se o particular tiver meios
financeiros suficientes e houver resposta satisfatória do mercado à procura destes bens socias,
ele pode obter a satisfação das suas pretensões prestacionais através do comércio privado

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(cuidados de saúde privados, seguros privados, ensino privado). A função de prestação dos
direitos fundamentais anda associada a três núcleos problemáticos dos direitos socias,
económicos e culturais:

a) Ao problema dos direitos socias originários, ou seja, se os particulares podem derivar


directamente das normas constitucionais pretensões prestacionais (ex: derivar da
norma consagradora do direito à habitação uma pretensão traduzida no direito de
exigir uma casa);

b) Ao problema dos direitos sociais derivados que se reconduz ao direito de exigir uma
actuação legislativa concretizadora das normas constitucionais sociais (sob pena de
omissão inconstitucional) e no direito de exigir e obter a participação igual nas
prestações criadas pelo legislador (ex: prestações médicas e hospitalares existentes);

c) Ao problema de saber se as normas consagradoras de direitos fundamentais sociais


tem uma dimensão objectiva juridicamente vinculada dos poderes públicos no sentido
de obrigarem estes (independentemente de direitos subjectivos ou pretensões
subjectivas dos indivíduos) a políticas sociais activas conducentes à criação de
instituições (ex: hospitais, escolas), serviços (ex: serviços de segurança social) e
fornecimento de prestações (ex: rendimento mínimo, subsidio de desemprego, bolsas
de estudo, habitações económicas) (Canotilho, s.d. p. 408).

1.11 Função de Protecção Perante Terceiros

Muitos direitos impõem um dever ao Estado (poderes públicos) no sentido de este


proteger perante terceiros os titulares de direitos fundamentais. Neste sentido o Estado tem o
dever de proteger o direito à vida perante eventuais agressões de outros indivíduos. O mesmo
acontece com numerosos direitos como o direito de inviolabilidade de domicílio, o direito de
protecção de dados informáticos, o direito de associação.

Em todos estes casos, da garantia constitucional de um direito resulta o dever do


Estado adaptar medidas positivas destinadas a proteger o exercício dos direitos fundamentais
perante actividades perturbadoras ou lesivas dos mesmos, praticadas por terceiros. Daí o falar-
se da função de protecção perante terceiros. Diferentemente do que acontece com a função de
prestação, o esquema relacional não se estabelece aqui entre o titular do direito fundamental e
o Estado (ou uma autoridade encarregada de desempenhar uma tarefa pública) mas entre o
indivíduo e outros indivíduos (Canotilho, s.d. p. 409).

13
1.12 Função de não Discriminação

Uma das funções dos direitos fundamentais ultimamente mais acentuados pela
doutrina é a que se pode chamar função de não discriminação. A partir do princípio da
igualdade e dos direitos de igualdade específicos consagrados na constituição, a doutrina
deriva esta função primária e básica dos direitos fundamentais: assegurar que o Estado trate os
seus cidadãos como cidadãos fundamentalmente iguais. Esta função de não discriminação
abrange todos os direitos.

Tanto se aplica aos direitos, liberdades e garantias pessoais (ex: não discriminação em
virtude de religião), como aos direitos de participação política (ex: direito de acesso aos
cargos públicos) como ainda aos direitos dos trabalhadores (ex: direito ao emprego e
formação profissional). Alarga-se de igual modo, aos direitos a prestações (prestações de
saúde, habitação) (Canotilho, s.d, p. 409-410).

14
CAPÍTULO II — GARANTIAS FUNDAMENTAIS DO ARGUIDO NO PROCESSO
PENAL ANGOLANO

2.1 O Arguido no Processo Penal Angolano

Assume a qualidade de arguido num processo penal, todo aquele sobre quem recai
forte suspeita de que tenha praticado um crime suficientemente comprovado. (n.º1 do art.º
63.º do Código do Processo Penal Angolano). Porém, assume imediata e automaticamente a
posição de processual de arguido a pessoa contra quem foi deduzida acusação ou requerida a
instrução contraditória. A qualidade de arguido mantém-se durante todo o decurso do
processo AA.VV, (2022)

O artigo 25.º do CPP de 1929 já vinculava a mesma definição de arguido que se


consubstanciava no facto de existência, por um lado, de uma forte suspeita e, por outro, da
circunstância da infração estar suficientemente comprovada no processo.

Isto significa que não basta a existência de uma forte suspeita. Terá de existir um
crime suficientemente comprovado. Desde logo, se constata que a definição de arguido se
manteve incólume no CPPA. O código do processo penal de 1929 refere-se ao sujeito passivo
da relação processual ora como arguido, ora como réu de forma quase indiscriminada.

A utilização destes termos nem sempre obedece a critérios objectivos, muito embora a
designação de arguido tenha estado frequentemente reservada à fase da instrução preparatória
até ao despacho de pronúncia, enquanto a de réu dizia respeito à fase judicial, isto é, depois do
despacho de pronúncia (Sambo, 2022, p. 273).

Noutros diplomas avulsos afectos ao direito processual penal, anteriores ao novo


Código de Processo Penal Angolano utilizava-se ainda as “expressões suspeito, indiciado,
acusado e culpado”.

O novo código de processo penal no seu artigo 63.º estabelece que assume a qualidade
de arguido em processo penal todo aquele sobre quem recai forte suspeita de que tenha
praticado um crime suficientemente comprovado. Por outro lado, assume imediatamente a
posição processual de arguido a pessoa contra quem foi deduzida acusação ou requerida a
instrução contraditória (n.º 2 do art.º 63 do CPPA.).

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Assume ainda a posição processual de arguido quem, como tal, for constituído nos
termos dos artigos 64.º e 65.º do mesmo código, isto é, como pressuposto para aplicação de
alguma medida de coação ou de garantia patrimonial e ainda de forma oficiosa ou a
requerimento, etc.

2.2 Constituição de Arguido

Assim é obrigatório a constituição de arguido:

 Logo que, em instrução preparatória, aberta contra pessoa determinada, esta prestar
declarações perante o Ministério Público ou Órgão de Polícia Criminal;
 Quando tenha de ser aplicada a alguém uma medida de coação de garantia
patrimonial;
 Em caso de detenção de qualquer pessoa nos termos do artigo 250.º e seguintes (como
o acto de privação precário);
 Sempre que seja levantado um auto de notícia e que se considere como agente de um
crime determinada pessoa, o auto lhe tiver sido comunicado e a notícia não seja
manifestamente infundida;

A constituição de arguido é um acto processual que se considere realizado quando


observados os seguintes termos (art. º 64.º do CPPA):

a) A comunicação oral ou escrita feita pelo Magistrado do Ministério Público ou


órgão de Polícia Criminal conforme o caso à pessoa visada em qualquer uma das
situações anteriormente referidas, de que a partir daquele momento passa a ter no
processo a posição de arguido;
b) A indicação dos direitos e dos deveres que competem a essa pessoa nos termos da
lei (art.º 67.º e 68.º do CPPA).

A entidade que proceder à referida comunicação e indicação deve entregar ao arguido


nota escrita em que se procede à identificação do processo e do defensor que lhe tenha sido
nomeado e em que se refiram os factos ou o crime que lhe são imputados.

A constituição de arguido pode ser efetuada oficiosamente ou a requerimento do


suspeito (arts.º 65.º).

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Se em qualquer acto de inquisição ou de declarações de pessoa que não é arguido
surgir fundada suspeita de que ela cometeu um crime, a entidade que preside o acto deve
suspendê-lo de imediato e proceder à comunicação da constituição de arguido e à indicação
dos seus direitos e deveres (n.º 2 do art.º 64.º).

Por outro lado, a pessoa que se der conta de que é objecto de suspeita de ter cometido
um crime e de que estão a ser efetuadas diligencias destinadas a imputar-lhe tem o direito de
requerer e exigir a sua constituição como arguido e de, nessa posição processual, passar a ser
ouvida (Sambo, 2022, p. 275).

Neste último caso, o requerente considera-se constituído a partir da data do


deferimento ou daquele em que for ouvido como arguido.

A constituição de arguido é feita mediante comunicação da autoridade judiciária que


dirige o acto em que o arguido nessa qualidade deve intervir. Neste sentido parece ter
caminhado do nosso legislador constituinte, ao considerar no artigo 63.º da Constituição da
República de Angola que toda a pessoa privada da sua liberdade deve ser informada, no
momento da sua prisão ou detenção, das respectivas razões e dos seus direitos. Essa
informação mais não é do que um retrato resumido das garantias concedidas pela lei ao
arguido ou seja, a partir desse momento o visado não tem duvidas de que foi constituído
arguido no processo.

O código de Processo Penal é mais claro quanto ao momento exato da constituição de


arguido, asseverando que a mesma só se considera realizada com a comunicação oral ou
escrita feita pelo Magistrado do Ministério Público ou Órgão de Polícia Criminal de que a
partir daquele momento a pessoa visada passa a ter no processo a posição de arguido, sendo,
desde logo, informado dos seus direitos e deveres decorrentes dessa condição. A entidade que
fizer a comunicação tem ainda a obrigação de entregar ao arguido uma nota escrita em que
procede à identificação do processo e do defensor que lhe tenha sido nomeado e em que se
refiram os factos ou o crime que lhe são imputados (Inácio, 2022, p.39-40).

17
Quanto à possibilidade de comunicação oral de constituição de arguido, impõe-se uma
breve consideração. O que será verdadeiramente oral é a comunicação e não a constituição.
Dito de outro modo, a constituição de arguido, como tal, deve ser feita por meio de despacho
escrito do Magistrado competente, porem como o processo nessa fase é secreto e a pessoa
visada precisa de saber sobre a sua condição processual, até mesmo para despoletar o
complexo de direitos e deveres que a lei lhe confere e consequentemente começar a montar a
sua defesa, determina a lei que tal constituição lhe deve ser comunicada, quer por escrito quer
por via oral. No entanto, é preciso estar atento aos riscos que se corre com uma comunicação
que seja estritamente oral, porque se futuramente o arguido alegar que não lhe foi comunicada
tal qualidade e na impossibilidade de meios documentados para provar o contrário, inutiliza-
se todo processo, se tiver em conta o disposto no n.º 4 do artigo 64.º do CPP. Por isso,
acautela-se que, sempre que possível, deverá haver nos autos uma notificação de constituição
de arguido, devidamente assinada pelo próprio arguido.

Ainda nos termos do código, concretamente nos termos do artigo 64.º é obrigatória a
constituição de arguido, logo que em instrução preparatória a pessoa vida preste declarações
perante Magistrado do Ministério publico ou Órgão de Policia criminal, quando tenha deve
ser aplicada a alguém medida de coação ou de garantia patrimonial. Havendo detenção de
qualquer pessoa ou sempre que, levantado auto de notícia em que se considere como agente
de um crime determinada pessoa, o auto lhe tiver sido comunicado e a notícia não tiver sido
infundada.

A primeira situação justifica-se, porque o arguido beneficia de um estatuto especial,


mais para que o mesmo seja despoletado é necessário que haja a constituição formal nessa
qualidade. Assim, a alínea a) do n.º 1 do artigo 64.º, pretende acautelar situações em que o
arguido prestasse declarações que pudessem comprometer a sua situação processual, sem
estarem informados dos direitos de que beneficia. Também é verdade que o disposto no n º 4
do artigo 64.º, em parte, já acautela tal situação, ao impor que as declarações prestadas no
processo por qualquer pessoa, antes de ter sido constituída como arguido, não podem ser
utilizadas como meio de prova contra ela. Ainda assim, o legislador preferiu não arriscar, ao
impor a constituição na qualidade de arguido quem tiver de prestar declarações perante
aquelas entidades.

Quanto às medidas de coação e de garantia patrimonial (alínea b do n.º 1 do artigo


64.º), justifica-se que seja obrigatória a constituição de arguido sempre que forem aplicadas,

18
porque elas implicam sempre restrições ou privação da liberdade e um sacrifício patrimonial
só justificado no âmbito dos pressupostos das medidas de garantia patrimonial. Assim, não se
justifica que as mesmas possam ser aplicadas ao pacato cidadão mesmo que sobre ele recaiam
suspeitas, resultantes de indícios de que possivelmente tenha perpetrado um ilícito penal,
senão for antes constituído arguido.

Alias, o n.º 2 do artigo 229.º do CPP determina que a aplicação das medidas de coação
pessoal depende da prévia constituição de arguido da pessoa a quem foram aplicadas e com
excepção do termo de identidade e residência, exigem ainda a existência de fortes indícios da
prática de um crime punível com pena de prisão superior no seu limite máximo a um ano.

Segundo Inácio, (2022, p.41)

No que concerne à detenção (al. c do n.º 1 do artigo 64.º), a constituição de arguido


justifica-se tendo em atenção as finalidades dessa figura jurídica assinaladas nas
alíneas do n.º 1 do artigo.º 250.º do CPP com a epígrafe conceitos e finalidades da
detenção. Ademais, o n.º 2 do citado artigo assevera que, em caso de detenção para
aplicação de medida de coação privativa de liberdade, é obrigatório o interrogatório do
detido, sem prejuízo de audição sumária do Ministério Público, para aferir da
necessidade, ou não, de requer aplicação de algumas medidas de coação pessoal na
competência do juiz. Bem vistas as coisas, é uma repetição do que se dispõe na al. a)
do n.º 1 do artigo 64.º do CPP, uma vez que se estaria a prestar declarações perante
autoridade judiciária.

Quando é levantado um auto de notícia, a pessoa nela considerada como agente da


infração, não é desde logo constituído arguido, é preciso que o auto seja comunicado ao
mesmo, entende-se também que deve assinar e que a notícia constante do auto não seja
infundada, porque não sendo assim faltaria a forte suspeita de que a condição de arguido é
refém e muito menos estaria a infracção suficientemente comprovada (al. d, do n.º 1 do artigo
64.º).

Existem situações em que a constituição de arguido é imediata e automática, é o caso


previsto no nº 2 do artigo 63.º do CPP isto é, ser deduzida a acusação ou requerida a instrução
contraditória contra determinada pessoa, que passa automaticamente à posição processual de
arguido.

19
Uma nota deve ser dada ao disposto no n.º 4 do citado artigo 63.º, segundo o qual a
qualidade de arguido matem-se durante todo o decurso do processo. Porem, a configuração
dessa norma pode originar uma ma interpretação. Ora, a mesma não quer dizer que uma vez
constituído arguido, tal situação não possa ser alterada antes do processo conhecer o seu fim.

O arguido pode não ser acusado e quando acusado pode não ser pronunciado, em
qualquer dessas situações, a pessoa antes arguida deixará de o ser, embora o processo possa
continuar contra outro arguido ou outros arguidos (Inácio, 2022, p. 42).

2.3 O Arguido enquanto Sujeito Processual Penal

É inegável hoje a posição do arguido como sujeito processual, como centro de


imputação de um conjunto de direitos e deveres, resultantes do seu status jurídico-processual
penal. Isto, naturalmente, tratando-se de Estados que adoptaram o processo de matriz
acusatória.

O processo penal concede ao Arguido o papel de sujeito do processo correspondendo


com a dupla referência que lhe é feita no texto constitucional, designadamente o direito de
defesa e a presunção de inocência até ao trânsito em julgado da condenação.

Entretanto, como aliás já frisado, o arguido nem sempre ocupou no processo penal a
posição que ocupa hoje na generalidade dos ordenamentos jurídicos dos Estados modernos,
posição essa que é a de verdadeiro sujeito processual no sentido de ser dono e senhor de
direitos e deveres processuais autónomos, com a possibilidade de influenciar a decisão do
tribunal, com a actividade que desenvolve no processo, assumindo agora a posição de parte
processual, posição que partilha com o representante do Ministério Público, não assume um
verdadeiro papel de parte, no processo penal, que mais não são do que interesses da
colectividade, e dos princípios que norteiam a sua atividade, nomeadamente, a legalidade e a
objetividade, este papel é sim reservado ao arguido que defende um verdadeiro interesse em
provar a sua inocência ou em não ver provada a sua culpabilidade (Inácio, 2022, p. 28-29).

O arguido pode constituir advogado em qualquer altura do processo. Nos casos em que
o arguido constituir mais de que um advogado para o defender, as notificações são feitas
àquele que, em primeiro lugar, tiver sido indicado no acto da constituição.

Nos casos em que a lei determinar que a assistência do arguido por advogado é
obrigatória (art.71.º).

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Na fase de instrução preparatória não pode nunca ser nomeado defensor do arguido
agente ou funcionário do organismo onde corre o processo e se realiza o acto. (art. 69.º).

2.4 Arguido versus Suspeito

No ponto anterior ficou claro que a posição do arguido no processo penal é a de um


verdadeiro sujeito processual, posição esta que lhe permite uma participação constitutiva na
declaração do direito do caso concreto, através da concessão de direitos processuais
autónomos, legalmente definidos, que deverão ser respeitados por todos os intervenientes no
processo penal.

A constituição de arguido é, ela mesma, uma garantia dada aquele que vê dirigir-se
contra si um processo penal. É devidamente formalizada no discurso da tramitação
processual, quando seja caso de constituição obrigatória de arguido por força do disposto nos
artigos 64.º do CPP (Antunes, 2022, p. 33).

Ao distinguir o arguido do suspeito, a lei processual penal supõe que a constituição de


arguido se liga o reconhecimento do estatuto de suspeito processual (art. 65.º do CPP), por
contraposição ao de mero participante processual.

Pretende-se agora saber se será esta a posição reservada também ao suspeito, visto que
a fronteira conceptual entre as duas figuras jurídicas é ténue, levando vezes em conta, a que se
confundam um e outro, tanto na opinião pública, como para alguns operadores de justiça
criminal, essencialmente aqueles que actuam na fase preliminar (instrução) do processo.

Antes de abordarmos com profundidade a posição do suspeito no processo penal e


todos os aspecto ligados à sua condição jurídico-processual, urge a necessidade de, tal como
fez-se em relação ao arguido, saber quem é o suspeito.

O suspeito, nos termos do artigo 65.º do CPP são todos aqueles que se procura na
instrução averiguar dos fundamentos da suspeita de ter cometido uma infração, mas não sendo
essa suspeita ainda forte, nas condições exigidas pelo artigo 63.º do mesmo diploma legal.

Nesta conformidade, infere-se que a diferença entre o suspeito e o arguido está nos
indícios ou suspeita da perpetração de um ilícito. Assim, se esses indícios ou suspeitas forem
fortes, representando uma probidade quase segura de que determinada pessoa cometeu um
crime, então pode-se constituir o respectivo agente na condição de arguido, caso tais suspeitas
sejam ainda inconclusivas ou fracas o agente manter-se-á na condição de simples suspeito.

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Porem, esta não parece que seja a diferença fulcral entre ambas as figuras. Observa-se
o n.º 2 do artigo 65.º do CPP que permite ao simples suspeito requerer que passe a ser tratado,
no processo, como verdadeiro arguido, sempre que verifique que na instrução preparatória
estão a ser efetuadas diligências destinadas a imputar-lhe o crime. Assim, o requerente,
suspeito, considera-se constituído arguido desde a data do despacho a deferir o requerimento
ou daquela em que for ouvido como arguido.

Chegados a este ponto, prevalece a questão de saber qual será a verdadeira diferença
entre o arguido e o suspeito, que inferencialmente demonstrará também a posição deste último
no processo penal. Na óptica da doutrina maioritária do processo penal, a diferença é
meramente formal, ou seja, a diferença vai residir na constituição formal da qualidade de
arguido ou não. Portanto, a diferença esta no acto formal de constituição. Nestes termos
havendo uma investigação dirigida contra determinada pessoa enquanto não for constituído
formalmente como arguido, que como já viu-se poderá ser inclusive a seu pedido, este será
um mero suspeito.

A existência de fortes suspeitas não nos parece que tenha fundamento para ser a
diferença entre ambas as figuras jurídicas, na medida em que, mesmo não havendo tais
suspeitas, a pessoa contra quem a investigação é dirigida pode, para acautelar determinados
interesses processuais, requer que seja constituindo arguido e a autoridade judiciaria que
esteja a dirigir o acto não pode negar o tal pedido sob pena de irregularidade processual ou dar
lugar a nulidade de todo o processo, salvo se não houver nenhum indício que justifique tal
constituição.

2.5 Pretensa diferença entre Arguido e Réu

No fundamental usa-se com bastante frequência o termo arguido para designar o


sujeito passivo durante a fase de instrução e o termo réu, após a pronúncia e, sobretudo, na
fase de julgamento.

O arguido será o sujeito passivo do processo, a partir do momento em que


determinado crime suficientemente comprovado é imputado a determinada pessoa.

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Será reu o arguido a partir do momento em que o juízo de suspeita que sobre ele recaía
se transformou em juízo de probabilidade, confirmado pelo juiz, ou seja, a partir da
pronúncia.

A posição e situação jurídica de um e outro, são de facto e de direito semelhantes entre


si. A de sujeito de relações jurídicas estabelecidas no processo e a de titular de direitos e
deveres processuais, se bem que elas não se mantenham constantes e rigorosamente iguais em
todas as fases do processo (Ramos, 2011, p.171-172).

O privilégio da não autoincriminação é uma garantia legalmente estabelecida que


assegura aos homens e mulheres a não poderem responder às perguntas que lhes poderão
levar à condenação num determinado crime. O privilegio, tal como é amplamente considerado
como fundamental para a liberdade humana, é venerado na historia do desenvolvimento dos
direitos civis (Satula, 2016, p. 21).

Por força do referido princípio, ao longo de todo processo o arguido deve ser tratado
como um inocente e nunca reduzido à mero objecto processual, sendo-lhe assegurado o
direito ao contraditório e o direito de participar activamente no processo oferecendo provas ou
informações que atestam a sua inocência, através de seu defensor ou pessoalmente.

A tendência universal na reafirmação dos direitos do homem como princípio basilar


das sociedades modernas, é cada vez maior o reforço da dimensão ética do Estado, imprimem
à justiça o estatuto de primeiro garante da consolidação dos valores fundamentais
reconhecidos pela comunidade, com especial destaque para a dignidade da pessoa humana.

Lembrando que desde a detenção até a fase de julgamento ocorre um lapso temporal
de tempo, ao arguido é sujeito a medidas que muitas vezes resultam violações. Lembrando
que é tarefa do Estado julgar, os processos penais modernos comportam limites resultantes da
obrigatoriedade de se respeitar a dignidade da pessoa humana e por sua vez proteger o arguido
durante toda a tramitação processual (www.julaw.co.ao).

2.6 Garantias Constitucionais

A Garantia Judiciária do arguido é um princípio fundamental que protege os direitos e a


dignidade das pessoas acusadas de crimes, assegurando que elas sejam tratadas justamente no
sistema de justiça penal.

Esse princípio tem várias implicações importantes para o sistema de justiça penal:

23
a) Ônus da prova: É responsabilidade do sistema de justiça provar a culpa do arguido e
não o contrário. Isso significa que a acusação deve apresentar evidências suficientes
para convencer o tribunal de que o arguido é culpado além de qualquer dúvida
razoável.
b) Preservação dos direitos do arguido: A Garantia Judiciária assegura que o arguido
tenha direitos fundamentais, como o direito a um julgamento justo, o direito de ser
informado sobre as acusações contra si, o direito de estar presente no julgamento, o
direito de ser defendido por um advogado e o direito de permanecer em silêncio.
c) Proibição de julgamentos midiáticos: A presunção de inocência ajuda a evitar que a
opinião pública e a mídia influenciem negativamente o processo judicial. Até que a
culpa seja comprovada legalmente, o arguido não deve ser tratado como culpado
perante a sociedade.
d) Prisão preventiva: A presunção de inocência também afeta a prisão preventiva. Ela
impede que um arguido seja mantido sob custódia antes do julgamento, a menos que
haja uma razão substancial para acreditar que a liberdade do arguido representaria um
perigo claro e iminente para a sociedade ou que há um risco significativo de fuga.
e) Apelações e recursos: A Garantia Judiciária garante que o arguido tenha o direito de
recorrer da decisão do tribunal, caso seja considerado culpado. Isso permite que a
pessoa condenada tenha a oportunidade de buscar revisão judicial e reexame do caso.

Rigorosamente, as garantias são também direitos, embora muitas vezes se salientasse


nelas o carácter instrumental de protecção dos direitos. As garantias traduzem-se quer no
direito dos cidadãos a exigir dos poderes públicos a protecção dos seus direitos, quer no
reconhecimento de meios processuais adequados a essa finalidade (Canotilho, S.d. p. 396).

Ex.: direito de acesso aos tribunais para defesa dos direitos, princípios do nullum
crimen sine lege e nulla poena sine crime, direito de habeas corpus.

As garantias constitucionais do arguido cumprem uma função muito importante,


sobretudo porque o mesmo goza do princípio da presunção da inocência até ao trânsito em
julgado de sentença condenatória.

Ciente que o Estado cumpre construir os mecanismos que garantem a liberdade dos
cidadãos, o programa do Estado angolano para a justiça, elegeu a Constituição como
objectivos fundamentais a segurança dos cidadãos, a prevenção e repressão do crime e a

24
recuperação do delinquente como forma de defesa social, tal entendimento se depreende do
preceituado no artigo 1º da Constituição da República de Angola.

O legislador constituinte na idealização das opções primárias do Estado angolano não


quis deixar órfão o arguido, ou seja, abandona-lo a sua sorte, tal como acontecia nos tempos
idos, com o foco na dignidade da pessoa humana decidiu dedicar alguns artigos no catálogo
dos direitos fundamentais da Constituição da República de Angola aspectos importantíssimos
sobre as garantias do mesmo face ao sistema judicial.

Não é menos verdade afirmar neste trabalho que, a luz do ordenamento jurídico
angolano as garantias são verdadeiros meios de defesa para quem está na posição de arguido.

É precisamente por se afigurarem meios de defesa que o próprio legislador constituinte


assegura no artigo 63.º da Constituição da República que, toda a pessoa privada da liberdade
deve ser informada, no momento da sua prisão ou detenção, das respectivas razões e dos seus
direitos.

No mesmo diapasão é notória a pretensão tutelar do legislador constituinte ao


consagrar nos diferentes números do artigo 67.º da Constituição da República, de onde se
depreendem as garantias primordiais do arguido.

Não é menos verdade se afirmar que o artigo 68.º da Constituição da República de


Angola resulta o reforço das garantias resultantes do preceito acima descrito, dando-se
ferramentas ao arguido de opor-se perante violações crassos de seus direitos fundamentais.

É claro e impressivo que ninguém hoje admitiria discutir em tribunal os seus direitos
sem a garantia de um juiz legal, independente.

2.7 Garantia Judiciária

Garantia judiciária quer dizer concretamente intervenção de um juiz nos diferentes


momentos do processo. Só o juiz, munido do seu múnus de independência e imparcialidade
poderá por isso assumir plenamente o papel de garante último dos direitos, liberdades e
garantias do arguido. Trata-se de um juiz de garantias em fase de instrução preparatória
(Patricio, 2000).

A figura do juiz de garantias, constitui, hoje um dos princípios basilares estruturantes


do processo penal angolano. É um juiz de cariz constitucional, pelo simples facto de ser o

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garante da legalidade em termos de direitos fundamentais dos cidadãos, durante a fase de
instrução preparatória no processo penal (Henriques, 2021, p. 71).

O juiz de garantias é um magistrado judicial que tem a competência de fazer a


fiscalização dos actos que possam pôr em causa os direitos, liberdades e garantias
fundamentais dos cidadãos, durante a fase preparatória dos processos penais.

Só um juiz pode intervir no processo penal, na fase de investigação, para controlar a


regularidade dessa investigação, para restringir direitos fundamentais, quer aplicando medidas
coactivas quer autorizando actos investigatórios que violem direitos fundamentais, quer
mesmo para controlar a remessa do processo à fase subsequente de julgamento.

2.8 A Presunção de Inocência como Garantia Processual

Inicialmente, em 10 de Dezembro de 1948, na Declaração Universal dos Direitos


Humanos (DUDH), seguido por sua incorporação análoga no Pacto Internacional dos Direitos
Civis e Políticos (PIDCP) em 1976 e na Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH)
de 1950, o princípio da presunção de inocência ascendeu à categoria de princípio fundamental
na Constituição da República de 2010 (CRA).

Esse princípio perdura até os dias atuais como um dos institutos de defesa mais
relevantes em favor do acusado em processos penais. De acordo com o artigo 67.º, n.º 2 da
CRA, "Todo cidadão é presumido inocente até que a sentença de condenação seja definitiva".

Deste modo, torna-se evidente que somente mediante a apresentação de provas


inequívocas e irrefutáveis por parte da entidade acusadora é possível formular um veredito
condenatório contra o acusado, acompanhado de uma pena penal específica, seja de prisão ou
multa. Por conseguinte, é inferível que, uma vez protegido por uma presunção de inocência, o
acusado adota uma postura passiva, ou quase abstêmica, em relação à produção de provas,
uma vez que, não lhe pode ser atribuído o ônus de provar sua inocência. Segundo ele, a
"ausência de comprovação de qualquer fato relevante para a imposição de uma sanção, ou a
exposição incompleta desses fatos, deve invariavelmente beneficiar o acusado" (Dias, 1974).

À luz do artigo 67.º da Constituição da República de Angola, a presunção de inocência


constitui uma garantia constitucional relativa ao processo criminal.

26
O n.º 2 do artigo 67.º dispõe que se presume inocente todo cidadão até ao trânsito em
julgado da sentença de condenação.

O princípio da presunção de inocência encontra-se igualmente consagrado na


Declaração Universal dos Direitos do Homem (art.º 11.º).

Como regra de tratamento processual, impede que se formulem juízos antecipados de


culpa sobre o arguido que o possam afectar ou prejudicar socialmente ou moralmente.

Este principio tem especial relevância no domínio das medidas de coação que não
deverão ser aplicadas, senão nos estritos limites das necessidades processuais e compaginadas
com as exigências cautelares do caso concreto. O desvio na aplicação das medidas cautelares,
nomeadamente, como antecipação da pena, é incompatível com o princípio da presunção de
inocência.

O individuo deve presumir-se inocente até decisão transitada em julgado. Basta que
seja evocada a presunção de inocência para que seja reservado ao arguido tratamento igual ao
conferido aos restantes participantes processuais. São, por isso, absolutamente inadmissíveis
quaisquer considerações ou insinuações que representam uma antecipação do juízo de culpa.

Grande parte das vezes não se mostra necessário evocar o princípio da presunção de
inocência, bastará fazer recurso às normas éticas e de mera cortesia. A presunção de inocência
não exige que o arguido seja tratado por excelência, mas como senhor e pelo seu nome
próprio que constitui o tratamento habitual na nossa sociedade.

O arguido só se presume inocente porque existe fundada suspeita de que seja culpado.
Por haver indícios de responsabilidade é que lhe são concedidos direitos de defesa para ele
poder ilidir.

A incorporação do princípio da presunção de inocência na Constituição não se resume


a uma mera duplicação do conceito de que, em situações de incerteza, a decisão deve
favorecer o arguido (Vilela, 2000).

2.9 Direitos do Arguido no Processo Penal Angolano

Constituem direitos processuais do arguido os constantes no (art.º 67.º do CPPA). Os


artigos 67.º e 68.º do CPPA fazem uma enumeração respectivamente dos direitos e dos
deveres do arguido. A doutrina refere que estes, não são taxativas, nem exaustiva, por quanto,

27
para além destes direitos e deveres, existem outros igualmente importantes para o regime
jurídico do arguido em processo penal.

Ninguém contesta hoje a existência do dever de colaboração para com as autoridades


judiciárias como condição de realização da justiça e do direito ao respeito pela integridade
física e moral (al. c) do n.º 3 do artigo 36.º e n.º 1 do artigo 31.º, n.º 1 do artigo 32.º, n.º1 dos
artigos 33.º e 34.º, n.º 3 do artigo 40.º da CRA. Trata-se de direitos e deveres constitucionais
usufruídos independentemente da sua posição de arguido.

O artigo 67.º do CPPA faz alusão a direitos de presença, de audiência, de informação


de silêncio, de defensor, de intervenção de recurso. Estes direitos reconduzem-se ao direito de
defesa.

Assim, constituem direitos de defesa os seguintes:

a) Presença: Presença em sede do processo penal" refere-se à participação física ou


comparecimento de uma pessoa em um local específico onde ocorre um processo
penal. No contexto jurídico, "sede do processo penal" se refere ao tribunal ou local
onde ocorre o julgamento e outros procedimentos legais relacionados a um caso
criminal.

A presença em sede do processo penal é importante para garantir o direito à defesa,


permitindo que o acusado e seus advogados estejam presentes para apresentar argumentos,
depor, fazer alegações e responder às acusações feitas pela promotoria. Também permite que
o tribunal tome decisões informadas com base nas evidências apresentadas e nas declarações
das partes envolvidas (Lopes, 2019).

O arguido tem o direito de estar presente nos actos processuais que directamente lhe
digam respeito, nomeadamente no debate instrutório e na audiência de julgamento. (art.º
379.º, 342.º e 343 do CPPA). Salvo as excepções admitidas por lei, o arguido tem o direito de
estar presente nos actos processuais que directamente lhe disserem respeito. (art.º 67.º do
CPPA).

a) Audiência: A audiência em sede do processo penal é um evento legal em que várias


partes envolvidas em um processo criminal se reúnem perante um tribunal para
discutir questões relacionadas ao caso. Essa audiência tem como objetivo esclarecer
fatos, apresentar provas, ouvir testemunhas e tomar decisões judiciais (Capez, 2010).

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Na instrução preparatória, nos termos dos artigos 169.º, 171.º, 172.º, 165.º, 166.º, al. a) no n.º
2 do artigo 312.º, al. c) do n.º 1 do artigo 313.º e artigo 446.º.

Na instrução contraditória, nos termos do n.º 2 do artigo 338.º. No julgamento, à luz


dos arts. 390.º e 406.º do CPPA. O direito de audiência mostra-se mais limitado durante a
instrução preparatória, manifestando-se através dos interrogatórios do arguido.

Na fase de julgamento é obrigatória a audiência do arguido. O direito de audiência não


se resume ao facto de o arguido se pronunciar sobre os factos que lhe são imputados, mas
também tem a ver com o facto de se poder pronunciar sempre que o tribunal tenha de tomar
uma decisão que o possa afectar pessoalmente.

b) Informação: O direito à informação no processo penal é uma garantia essencial para a


justiça e a equidade, assegurando que todas as partes tenham acesso adequado às
informações necessárias para participar efetivamente do processo e exercer seus
direitos (Nucci, 2020).

O arguido deve ser informado, pelas autoridades judiciárias ou pelo Órgão de Polícia
Criminal perante quem seja obrigado a comparecer, dos direitos que a lei lhe concede.

O n.º 2 do artigo 390.º, n.º 3 do artigo 64.º, n.º 3 do artigo 166.º, n.º 2 do artigo 170.º e
al. b) do n.º 2 do artigo 84.º

c) Ao Silêncio: O direito ao silêncio no processo penal é um princípio jurídico


fundamental que assegura a um indivíduo o direito de não ser obrigado a produzir
provas contra si mesmo. Isso significa que uma pessoa que está sendo investigada,
acusada ou submetida a um processo penal não pode ser forçada a testemunhar contra
si mesma, confessar um crime ou fornecer informações que possam incriminá-la.

O arguido tem direito a não responder às perguntas que lhe forem formuladas, quer
sobre os factos que lhe forem imputados quer sobre o conteúdo das declarações que acerca
deles prestar. O n.º 3 do artigo 390.º e n.º 3 do artigo 166.º do CPPA.

O arguido deve ser informado que goza do direito ao silêncio antes do interrogatório,
com a explicação que se mostre necessária (Reale, 2001).

O silêncio do arguido não pode ser interpretado como presunção de culpa. Por
desconhecer-se as razões que conduzem à opção pelo silêncio, não pode o arguido ser
prejudicado por esta razão, mantendo-se a presunção de inocência. A lei não estabelece

29
punição para o arguido que fale à verdade. Não se trata de um direito de mentir, mas
simplesmente a não punição da mentira.

d) Defensor: Um defensor em processo penal é um advogado ou advogada que


representa um indivíduo acusado de cometer um crime durante o processo legal. O
direito a um defensor é uma garantia fundamental em muitos sistemas jurídicos,
visando assegurar que o acusado tenha uma oportunidade justa de apresentar sua
defesa perante o tribunal.

O arguido tem o direito de escolher defensor ou pedir ao magistrado competente que lho
nomeie. Este direito está consagrado na constituição (n.º 3 do art.º 67.º da CRA e alíneas
e) e f) do artigo 67.º do CPPA).

O arguido tem o direito a escolher defensor e a ser por ele assistido em todos os actos
do processo, especificando a lei os casos e as fases em que a assistência por advogado é
obrigatória. O arguido tem o direito de escolher defensor que o acompanhe nas diligências
policiais e judiciais (al. d) do art.º 67.º, 63.º da CRA e art.º 67.º 71.º do CPPA.

É uma garantia de defesa com dupla função, visto que por um lado têm uma função de
assegurar ao arguido o direito de ser assistido por uma defesa de sua livre escolha no curso do
processo, por outro lado, impõe que essa assistência seja obrigatória em certos casos e por sua
vez, seja definida pelo próprio legislador (Miranda & Medeiros 2010).

e) Intervenção: O direito à intervenção no processo penal refere-se ao princípio legal


que garante às partes interessadas a oportunidade de participar ativamente no decorrer
do processo penal. Isso permite que essas partes exerçam seus direitos e interesses
legais, apresentem provas, argumentem suas posições e, de maneira geral, contribuam
para a busca da verdade e a administração da justiça.

O arguido tem o direito a intervir nas fases de instrução preparatória e contraditória,


oferecendo provas e requerendo as diligências que reputar necessárias. Tem também o
direito de requerer a abertura da instrução contraditória, quando acusado (al. g) do art.º
67.º 67.º e n.º 4.º do art.º 332.º

O arguido pode, em qualquer fase, apresentar memoriais, exposições ou


requerimentos, desde que eles se mantenham no âmbito do objecto do processo ou tenham por
finalidade salvaguardar os seus direitos fundamentais (art.º 111.º do CPPA).

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A al. g) do art.º 67.º do CPPA faz menção à intervenção do arguido unicamente na
instrução preparatória e contraditória, mas ele também tem direito de intervir na audiência de
julgamento, onde a sua presença e consequente interrogatório são, em princípio, obrigatórios.

f) Recurso: O direito a recurso no processo penal é um princípio fundamental do sistema


de justiça que permite que uma parte insatisfeita com a decisão de um tribunal possa
recorrer a instâncias superiores em busca de uma revisão ou reconsideração da decisão
proferida. Esse direito visa garantir que assegurem-se oportunidades para revisar e
corrigir eventuais erros ou injustiças que possam ter ocorrido durante o processo ou na
tomada de decisões judiciais.

O arguido tem direito a imputar, mediante reclamação ou recurso, nos termos da lei, as
decisões que lhe forem desfavoráveis (al. h) do artigo 67.º

À luz do artigo 460.º do CPPA, é permitido recorrer de todas as decisões judicias que
não forem excluídas por lei.

O estatuto do arguido integra também deveres processuais. Nos termos do artigo 68.º
do CPPA, os deveres processuais são os seguintes:

g) De Comparência: O direito de comparência em sede de processo penal refere-se ao


direito que uma pessoa acusada de um crime tem de comparecer perante um tribunal
ou autoridade competente durante o decorrer do processo. Isso permite que a pessoa
esteja presente em audiências, interrogatórios, julgamentos e outras etapas do processo
penal em que sua presença seja necessária.

Comparecer perante o juiz, o Ministério Público ou os Órgãos de Policia Criminal


quando, para tanto, tiver sido convocado nos termos legais (al. a) do artigo 68.º do CPPA.

O dever de comparência é imposto por lei, devendo o arguido ser devidamente


convocado. A ordem de comparência terá de lhe ser comunicada, nos termos do n.º 1 do
artigo 126.º do CPPA. A falta de comparência e a justificação da ausência estão reguladas
respectivamente nos artigos 135.º e 136.º.

h) Responder com verdade sobre a sua Identidade: Responder com verdade sobre a
sua Identidade" em um processo penal significa que, quando questionado durante o
processo judicial, a pessoa está obrigada a fornecer informações precisas e verdadeiras
sobre sua identificação pessoal. Isso inclui fornecer nome completo, endereço, data de

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nascimento e outros detalhes relevantes que ajudem a estabelecer sua identidade de
forma clara e inequívoca.

Responder com verdade às perguntas sobre a sua identidade ou sobre os seus


antecedentes criminais (sob pena de responsabilidade criminal) constitui um importante dever
do arguido (n.º 2 do art.º 166.º e n.º 2 do art.º 390.º do CPPA).

CONCLUSÃO
A protecção dos direitos e garantias fundamentais do arguido no processo penal
angolano desempenha um papel crucial na promoção da justiça, equidade e Estado de direito
no sistema de justiça criminal do país. Ao longo das últimas décadas, houve um
reconhecimento global da importância de assegurar que mesmo aqueles acusados de crimes
tenham seus direitos respeitados e garantidos durante todo o processo legal.

No contexto angolano, a proteção dos direitos do arguido é essencial para garantir que
o sistema de justiça seja justo, transparente e respeitador dos princípios democráticos. Isso
inclui o direito a um julgamento justo, o direito a ser informado sobre a natureza das
acusações, o direito a um advogado de defesa competente e independente, o direito a
permanecer em silêncio, o direito a não ser submetido a tortura ou tratamento cruel, entre
outros.

Através da proteção desses direitos e garantias, o processo penal angolano pode evitar
condenações injustas, assegurar a integridade das provas e contribuir para a construção de
uma sociedade mais justa e confiante no sistema de justiça. Além disso, a conformidade com
padrões internacionais de proteção dos direitos humanos também pode fortalecer a imagem de
Angola perante a comunidade internacional.

32
Portanto, é essencial que Angola continue a investir em formação jurídica e em
infraestrutura judiciária, além de promover a conscientização sobre a importância da proteção
dos direitos do arguido. Isso envolve a colaboração entre órgãos judiciais, advogados,
defensores dos direitos humanos e outras partes interessadas para garantir que os direitos do
arguido sejam respeitados em todos os momentos.

Em última análise, a proteção dos direitos e garantias fundamentais do arguido no


processo penal angolano não é apenas um imperativo legal e ético, mas também uma base
essencial para a construção de um sistema de justiça confiável e uma sociedade justa. Ao
manter esse compromisso, Angola pode reforçar a confiança nas instituições judiciais,
promovendo assim uma cultura de respeito pelos direitos humanos e pelo Estado de direito.

Relativamente aos direitos, Constituem direitos processuais do arguido os constantes


no art.º 67.º do CPPA. O mesmo faz alusão a direitos de presença, de audiência, de
informação de silêncio, de defensor, de intervenção de recurso. Estes direitos reconduzem-se
ao direito de defesa.

SUGESTÕES

Os direitos fundamentais do arguido no processo penal representam pilares essenciais


na manutenção de um sistema de justiça equitativo e justo. Esses direitos garantem que,
mesmo em face da aplicação da lei penal, a dignidade da pessoa humana e os princípios de
justiça sejam preservados, protegendo os cidadão de abuso de poder e de violações de suas
liberdades de e garantias individuais.

Por tanto, para reforçar a proteção dos direitos fundamentais do arguido no processo
penal angolano, sugere-se o seguinte:

 Aos operadores de direito concretamente Ministério Público em sede de


Instrução preparatória, reforçar o cumprimento rigoroso dos direitos e garantias
fundamentais do arguido;
 Cumprimento dos princípios gerais do direito penal e processo penal, com o
maior destaque no princípio da intervenção mínima, em obediência a dignidade
da pessoa humana;

33
 A criação de programas televisivos, palestras e cursos gratuítos informando e
ensinando às pessoas quais são os direitos e garantias do arguido, combatendo
desse jeito a ignorância que a nível cultural jurídico existente em Angola;
 Outrossim, Rubricas nas Rádios para falar de direitos e garantias fundamentais.

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 AAVV Código de Processo Penal Angolano de 2020
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