Lições Do Controle Externo Das Regras Fiscais - LRF-AFO - TCU - 2024

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Lições do Controle Externo

das Regras Fiscais


MINISTROS

Ministro Bruno Dantas, Presidente


Ministro Vital do Rêgo, Vice-presidente
Ministro Walton Alencar Rodrigues
Ministro Benjamin Zymler
Ministro Augusto Nardes
Ministro Aroldo Cedraz
Ministro Jorge Oliveira
Ministro Antonio Anastasia
Ministro Jhonatan de Jesus

MINISTROS-SUBSTITUTOS

Ministro Augusto Sherman


Ministro Marcos Bemquerer
Ministro Weder de Oliveira

MINISTÉRIO PÚBLICO JUNTO AO TCU

Cristina Machado Costa e Silva, Procuradora-Geral


Lucas Rocha Furtado, Subprocurador-Geral
Paulo Soares Bugarin, Subprocurador-Geral
Marinus Eduardo de Vries Marsico, Procurador
Júlio Marcelo de Oliveira, Procurador
Sergio Ricardo Costa Caribé, Procurador
Rodrigo Medeiros de Lima, Procurador
Lições do Controle Externo
das Regras Fiscais
Brasília, 2023

Brasília, 2024
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<www.tcu.gov.br>

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em parte ou no todo, sem alteração do conteúdo,
desde que citada a fonte e sem fins comerciais.

Brasil. Tribunal de Contas da União.


Lições do controle externo das regras fiscais. – Brasília : TCU, Secretaria-Geral de Con-
trole Externo, 2024.
43 p.

1. Gestão fiscal. 2. Responsabilidade fiscal. 3. Finanças públicas. 4. Execução 5. Política


fiscal. 6. Gasto público. 7. Dívida pública. I. Título.

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Ministro Ruben Rosa


Sumário

1 Introdução 5

2 O Controle Externo da Gestão Fiscal 6

3 Discussões e Lacunas da LRF 8

4 Discussões e Lacunas das Regras Fiscais 18

5 Descumprimento às Normas de
Gestão Fiscal
28

6 Melhorias Decorrentes de Ações


de Controle Externo Sobre a
Gestão Fiscal
35

7 Conclusão 43
1 Introdução
Um ambiente de transparência, planejamento e equilíbrio fiscal, consoan-
te os pressupostos da Lei Complementar 101/2000 – Lei de Responsabili-
dade Fiscal (LRF), oferece fundamentos seguros para a elevação da com-
petitividade, a atração de investimentos e a sustentabilidade das políticas
econômicas e sociais necessárias ao desenvolvimento do país.

O primeiro passo para a responsabilidade na gestão fiscal está no plane-


jamento da ação governamental, a ser pautado por orçamentos realistas.
Assim, todas as despesas obrigatórias e as essenciais ao funcionamento
da máquina pública devem figurar nas propostas orçamentárias de cada
órgão ou entidade, assegurando transparência às escolhas alocativas, na
forma exigida pela LRF.

O Tribunal de Contas da União (TCU), como parte fundamental da estrutu-


ra de governança da União, contribui para o enfrentamento dos desafios
atuais e futuros das finanças públicas. Por meio de auditorias, diagnósti-
cos, cooperação técnica, relatórios sistêmicos e análises de contas con-
solidadas, o TCU amplia a transparência e a confiança nas informações
financeiras, evidencia riscos, propõe alternativas e fornece subsídios téc-
nicos, para qualificar as discussões e as decisões do Poder Executivo, do
Congresso Nacional e da sociedade.

A Constituição Federal e as normas de gestão e controle da política fiscal


e da execução orçamentária definiram um modelo institucional em que os
Tribunais de Contas detêm atribuições de especial relevo. Na União, o TCU
exerce o controle externo da administração pública federal em auxílio ao
Parlamento. Para cumprir essa missão, o Tribunal contém diversas com-
petências voltadas à fiscalização da adesão dos entes públicos às regras
de disciplina fiscal, com destaque para:

• Apreciar as contas prestadas anualmente pelo Presidente da


República, mediante parecer prévio (artigo 71, inciso I, da Cons-
tituição Federal);

• Verificar o cumprimento das normas de finanças públicas voltadas


para a responsabilidade na gestão fiscal e emitir alertas aos Poderes
e aos órgãos (artigo 59 da LRF);

• Avaliar a previsão de receita incluída na proposta orçamentária (Re-


solução-TCU 142/2001);

• Acompanhar a execução orçamentária e financeira e avaliar a com-


patibilidade dos resultados fiscais alcançados com as respectivas
metas (LRF e Resolução-TCU 278/2016);

• Verificar os níveis de comprometimento das despesas com pes-


soal, das garantias, das operações de crédito e da dívida pública
diante dos respectivos limites (LRF e Resolução-TCU 142/2001);
5
• Acompanhar a evolução, a transparência, o desempenho e a
conformidade da gestão da dívida pública federal (Resolução-
-TCU 322/2020).

Com efeito, ao pressupor que a responsabilidade na gestão fiscal envolve


ação planejada e transparente, prevenção de riscos, correção de desvios,
preservação do equilíbrio das contas públicas, cumprimento de metas e
obediência a limites de natureza financeira, a LRF não restringiu o escopo
da gestão fiscal responsável, tendo apenas realçado seus aspectos mais
determinantes. De acordo com a LRF, compete ao TCU verificar o cumpri-
mento das metas fiscais e de limites e condições essenciais à gestão res-
ponsável. Ademais, a LRF prevê a emissão de alertas, pelo TCU, quando
constatadas situações de risco.

2 O controle Externo da Gestão Fiscal


A credibilidade da política fiscal depende do compromisso com as me-
tas fiscais estabelecidas e da transparência e da qualidade dos resulta-
dos apresentados. Atualmente, o país busca uma solução que equacione
as expectativas de proteção social oferecida pelo Estado e a capacidade
financeira do governo, para concretizar direitos sociais. Portanto, o mo-
mento exige a consolidação de alternativas que contribuam para a toma-
da de decisão, com vistas a solucionar os problemas fiscais vigentes. Ao
longo dos últimos anos, o Tribunal de Contas da União tem apresentado
diagnósticos sobre as finanças públicas, indicando oportunidades de me-
lhoria com destaque para as seguintes:

Instalação do Conselho de Gestão Fiscal previsto na LRF (Acórdão


1.274/2013-P)

• O Conselho de Gestão Fiscal está previsto no artigo 67 da Lei Com-


plementar 101/2000, mas jamais foi instituído. Entre os objetivos de
sua atuação, está a adoção de normas de consolidação das contas
públicas, a padronização das prestações de contas, assim como a
divulgação de análises, estudos e diagnósticos.

Necessidade de estrita observância às normas que regem o


relacionamento entre o governo federal e suas instituições
financeiras controladas (Acórdãos 825/2015-P e 3.297/2015-P)

• Tempestividade dos pagamentos a bancos controlados; transpa-


rência orçamentária dos empréstimos a bancos federais; adoção
de política de distribuição de dividendos.

6
Necessidade de institucionalização do Sistema de Planejamento
(Acórdão 3.580/2014-P)

• Carência de normas, diretrizes, competências e procedimentos


para a adequada coordenação entre planos e atores envolvidos.

Aprimoramento da governança e da gestão das Renúncias de


Receitas (Acórdãos 793/2016-P, 1.205/2014-P, 809/2014-P e
747/2010-P)

• Necessidade de normatização do processo de instituição de renún-


cias, para garantir a transparência e o controle desses recursos;

• Necessidade de avaliação dos resultados das políticas públicas fi-


nanciadas por renúncias;

• Necessidade de ampliação do controle sobre o impacto fiscal de-


corrente das renúncias.

Plano de ação para gestão de riscos orçamentários (Acórdão


927/2015-P)

• A Secretaria de Orçamento Federal deve instituir processo de


gestão dos riscos relacionados à elaboração do Orçamento
Geral da União.

Projeções orçamentárias mais realistas (Acórdãos 3.013/2014-P,


1.723/2015-P e 41/2016-P)

• Necessidade de aperfeiçoamento do processo de previsão


de receitas;

• Os indicadores econômicos utilizados no Projeto de Lei Orça-


mentária de 2015 estavam em desacordo com as expectativas
de mercado.

Aprimoramento das relações financeiras intergovernamentais


(Acórdãos 2.186/2013-P, 1.093/2013-P e 3.043/2012-P)

• Sucessivos refinanciamentos das dívidas de estados e municípios


junto à União fragilizam o pacto federativo e incentivam o endivi-
damento excessivo no presente, com base na crença de um so-
corro financeiro futuro, criando um problema de risco moral;

• A União concedeu garantias a operações de crédito de entes da Fe-


deração cuja capacidade de pagamento era desfavorável, assumin-
do elevado risco fiscal.

7
Aprimoramento da contabilidade pública (Acórdãos 1.979/2012-P,
158/2012-P e 3.608/2014-P)

• As distorções contábeis detectadas pelo Tribunal nas auditorias so-


bre o Balanço Geral da União induzem o governo federal a corrigir as
falhas e adotar medidas preventivas, buscando ampliar a transpa-
rência e a confiabilidade das informações divulgadas.

Nesse sentido, considerando o debate latente em torno de novo arcabouço


de regras fiscais para o setor público federal, pretende-se expor as princi-
pais lições derivadas da atuação do Tribunal no controle externo das finan-
ças públicas, com foco em: discussões e lacunas da LRF – especialmente
sobre despesas com pessoal, despesas obrigatórias de caráter continuado,
endividamento e renúncia de receita; discussões e lacunas das regras fis-
cais – especialmente Meta Fiscal, Regra de Ouro e Teto de Gastos; casos
concretos de descumprimento das normas de gestão fiscal.

Sabe-se que alterações de regras fiscais exigem amplo diálogo e refle-


xão por parte dos atores envolvidos, o que passa inequivocamente pela
atuação do Poder Legislativo. Ademais, mudanças na configuração ou nos
entendimentos sobre regras fiscais, pelo Parlamento ou pelas diferentes
instâncias decisórias (administrativa ou judicial), devem ser sopesadas,
uma vez que podem abrir flancos indesejáveis na condução fiscal do país.

3 Discussões e Lacunas da LRF

Despesa com pessoal


A preocupação com o controle das despesas com pessoal não é uma ino-
vação da Constituição de 1988 ou da LRF. A Constituição de 1891 já esta-
belecia a competência privativa do Congresso Nacional, para “criar e su-
primir empregos públicos federais, fixar-lhes as atribuições, estipular-lhes
os vencimentos”. Com isso, buscava o Constituinte vedar ao governante
dispor livremente sobre cargos públicos.

De fato, o gasto com pessoal constitui um dos principais itens da despesa


pública no Brasil, e o seu descontrole pode ter consequências negativas
graves para a gestão fiscal. Nesse sentido, a Constituição Federal prevê
que a despesa com pessoal ativo e inativo e pensionistas dos entes da Fe-
deração não pode exceder os limites estabelecidos em lei complementar.
Esses limites constam da LRF e, no caso da União, correspondem a 50%
da Receita Corrente Líquida (RCL), sendo 2,5% para o Poder Legislativo, in-
cluindo o TCU, 6% para o Poder Judiciário e 40,9% para o Poder Executivo.

8
Em seu artigo 18, a LRF adota um conceito bastante abrangente para a
despesa com pessoal, compreendendo o somatório dos gastos do ente
da Federação com os ativos, os inativos e os pensionistas, relativos a
mandatos eletivos, cargos, funções ou empregos, civis, militares e de
membros de Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais como
vencimentos e vantagens, fixas e variáveis, subsídios, proventos da apo-
sentadoria, reformas e pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas
extras e vantagens pessoais de qualquer natureza, encargos sociais e
contribuições recolhidas pelo ente às entidades de previdência.

Recente alteração promovida na LRF, por intermédio da Lei Complementar


178/2021, deixa claro que a apuração da despesa com pessoal, para fins de
controle fiscal, deve considerar a remuneração bruta do servidor sem qual-
quer dedução ou retenção, observando-se o teto remuneratório da adminis-
tração pública, nos termos do artigo 37, inciso XI, da Constituição Federal.
Não obstante, os casos selecionados a seguir revelam que a despesa com
pessoal tem sido um objeto de controle bastante desafiador para o TCU.

Acórdão: 553/2017-P, relator ministro José Múcio Monteiro – Acompanhamento


dos Relatórios de Gestão Fiscal (RGF) do 2º quadrimestre de 2015.

Principais achados: o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) alterou, por


ato infralegal, os limites de despesas com pessoal dos Tribunais Regionais do Trabalho
(TRT), o que é matéria reservada à lei complementar (artigo 169 da CF/88). O TRT-22
(Piauí) alegou que o critério histórico estabelecido pela LRF (média do período 1997-
1999) foi prejudicial, sendo o seu limite o menor de todos os TRT. Essa situaçãoinvia-
bilizaria a sobrevivência da instituição, pois o limite atual não suportaria qualquer au-
mento de pessoal, embora tenha havido significativo aumento de demanda.

Principais entendimentos e encaminhamentos: cabe aos tribunais executar a


despesa dentro dos limites fixados e não verificarse eles atendem à realidade viven-
ciada pelos tribunais.

9
Acórdão: 2.984/2018-P, relator ministro Vital do Rêgo – Consulta acerca da possi-
bilidade de alteração, por meio de Decreto Presidencial, dos percentuais dos limites
de despesas com pessoal dos ex-territórios de Amapá (AP) e Roraima (RR) para o
Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT).

Principais achados: o critério para a repartição do percentual de 3% dado pela LRF,


que estabelece como fórmula a média das despesas relativas em percentual da RCL,
verificadas nos três exercícios anteriores ao da publicação da LRF, deve ser visto
como ponto de partida. Ainda que a RCL tenha crescido 70,1% desde 2000, fazendo
aumentar, nessa mesma proporção, a cota decorrente do limite de 3%, inicialmente
conferida ao MPDFT, em 2001, a repartição inicial superdimensionou o quinhão para
os ex-territórios doAP e de RR e subdimensionou a cota deferida ao MPDFT.

Principais entendimentos e encaminhamentos: é possível ao Presidente da


República, pormeio deDecreto, alterar os percentuais inicialmente estipulados
pelo Decreto 3.917/2001, com vistas ao remanejamento de parcelas do limite
para as despesas com pessoal, entre os órgãos e os entes alcançados pelo arti-
go 20,inciso I, alínea “c” da LRF, de modo a harmonizar os percentuais fixados
em decorrência da repartição, com as reais necessidades da Administração, ob-
servado sempre o limite global de 3%. O Poder Executivo Federal deve definir,
em conjunto com os órgãos e os entes alcançados pelo artigo 20, inciso I, alínea
“c” da LRF, a distribuição mais adequada e consentânea do percentual fixo de 3%

Despesas obrigatórias de caráter continuado


Nos termos do artigo 17 da LRF, parece simples acompanhar a geração de
uma despesa obrigatória de caráter continuado (DOCC), pois bastaria: lo-
calizar o ato legislativo ou administrativo que criou a despesa; verificar se
se trata de uma despesa corrente; confirmar se o ato criou uma obrigação
legal de execução por um período superior a dois exercícios; uma vez ca-
racterizada a DOCC, averiguar se houve uma compensação também de
caráter permanente.

A identificação e o controle, ou mesmo a mera quantificação, das DOCC


são tarefas complexas. Em primeiro lugar, ressalta-se a amplitude do dis-
positivo da LRF, que envolve tanto medidas legislativas quanto atos admi-
nistrativos normativos. Além disso, inclui, como DOCC, as situações de
prorrogação de despesa por prazo determinado.

Outro ponto relevante diz respeito à ausência de transparência das DOCC


criadas por atos administrativos. Enquanto as medidas legislativas são pú-
blicas e de fácil acesso, os atos administrativos normativos são tomados
no âmbito dos órgãos, nos respectivos processos administrativos, com
regras e critérios de identificação próprios, e as despesas criadas, muitas
vezes, ficam diluídas nas demais despesas do órgão, por isso nem sempre
é possível identificá-las por meio das classificações orçamentárias.

10
Além disso, o extremo rigor estabelecido na LRF para a criação de DOCC
pode contribuir para a geração de atalhos e subterfúgios, de forma a des-
caracterizar as despesas criadas como obrigatórias e de caráter continu-
ado. O primeiro movimento nesse sentido ocorreu em 2001, com a cria-
ção da “compensação automática”, introduzida pelo Demonstrativo da
Margem de Expansão das Despesas Obrigatórias de Caráter Continuado,
que passou a incorporar, nos aumentos de receita passíveis de financiar
DOCC, os efeitos da projeção de crescimento real da economia, embora
os § 2º e 3º do artigo 17 da LRF não prevejam essa possibilidade.

Essa interpretação que abrandou os rigores do artigo 17 da LRF permane-


ce. Nesse sentido, cria-se a despesa obrigatória, sem haver a compen-
sação por redução permanente de despesa obrigatória ou por criação
permanente de receita, de acordo com os ditames do § 3º do artigo 17
da LRF. Em consequência, a norma instituidora de uma DOCC não preci-
sa obrigatoriamente incluir uma medida de compensação em seu próprio
corpo, podendo alternativamente demonstrar que sua neutralidade fiscal
já foi prevista na proposta orçamentária.

Considerando os entraves de natureza conceitual e operacional ainda pre-


sentes nesse âmbito, conquanto a LRF vigore há mais de duas décadas, o
TCU vislumbrou a premência de estabelecer um plano de ação que permi-
ta ao Poder Executivo definir e explicitar as medidas para o aprimoramen-
to do arcabouço normativo e da estrutura de governança das DOCC, de
modo que seja viabilizado o Demonstrativo Consolidado das DOCC.

Acórdão: 333/2022-P, relator ministro Walton Alencar Rodrigues – Acompanhamento


de DOCC no exercício de 2020, em especial quanto à adequação orçamentária.

Principais achados: dificuldade em caracterizar uma DOCC, em face de sutilezas


empregadas nostextos dos atos normativos instituidores que afastam os rigores
do artigo 17 da LRF. Uma despesa que, em princípio, teria todas as características
de obrigatoriedade, contém, em sua norma de criação, por exemplo, uma cláusula
que submete sua execução à existência de disponibilidade orçamentária; em outras
situações, a lei instituidora da despesa não determina expressamente, ou seja, não
fixa para o ente público a obrigação legal de sua execução, mas tão somente auto-
riza-a ou permite-a.

Principais entendimentos e encaminhamentos: plano de ação para que seja via-


bilizada a elaboração semestral do Demonstrativo Consolidado das Despesas Obri-
gatórias de Caráter Continuado, contendo informações sobre as DOCC da União
criadas no exercício, oriundas de leis e de medidas provisórias provenientes de todos
os Poderes e órgãos autônomos, bem como de atos administrativos, informando os
critérios utilizados para sua classificação, o aumento da despesa previsto no exercício
em que deva entrar emvigor e nos doissubsequentes, além das medidas de compen-
sação adotadas,devendo haver tópico específico sobre as DOCC de pessoal.

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Acórdão: 2.039/2022-P, relator ministro Bruno Dantas – auditoria operacional so-
bre controles acerca da expansão de obrigações continuadas da União.

Principais achados: necessidade de regulamentar a governança do processo de cria-


ção e expansão de obrigações de caráter continuado mediante a atribuição de respon-
sabilidades para cada agente envolvido, o aperfeiçoamento conceitual das DOCC e a
definição das formas de compensação para a geração desse tipo de despesa.

Principais entendimentos e encaminhamentos: a despeito dos comandos con-


tidos na LRF, a estrutura de governança das DOCC ainda é incipiente ou inexistente,
por isso é desejável a articulação entre os Ministérios responsáveis pelas áreas fiscal
e orçamentária e os demais órgãos da administração pública federal, com vistas a
conferir tratamento uniforme, no sentido de mitigar os riscos ao equilíbrio das con-
tas públicas, a médio e longo prazos

Endividamento
O endividamento público é um instrumento para financiar o investimento
público na construção de ativos de elevado custo e longa duração, como
uma hidrelétrica ou uma estrada. Assim, permite distribuir entre os contri-
buintes do presente e os do futuro o custeio e os riscos da construção de
ativos que vão gerar benefícios e rendimentos superiores ao seu custo por
longo período e para várias gerações.

A dívida pública permite também que os compradores de títulos públicos


poupem sua renda no presente e transfiram para o futuro um poder de con-
sumo ampliado, além de ser um instrumento muito útil para o financiamento
de despesas emergenciais e extraordinárias.

Idealmente, o pagamento de despesas de consumo deveria ser realiza-


do com impostos e não com dívida. A essência dessa regra está prevista
no artigo 167, inciso III, da Constituição. Em outras palavras, financiar uma
proporção grande e crescente do consumo público com dívidas sujeitas a
juros significa destruir riqueza.

O Senado Federal estabeleceu limites para operações de crédito e para


garantias da União. Carecem de fixação os limites da dívida consolidada
da União e os da dívida mobiliária federal. Aqueles são de competência do
Senado Federal; estes, do Congresso Nacional. No caso da dívida conso-
lidada da União, os limites foram sugeridos pelo Presidente da República
em termos de dívida líquida, propondo-se para a União o limite de 350%
da RCL para a Dívida Consolidada Líquida (DCL). A proposta para os esta-
dos, o Distrito Federal (200% da RCL) e os municípios (120% da RCL) foi
aprovada na forma da Resolução-SF 40/2001.

No caso da DCL da União, apenas em 2007, a proposta tornou-se o Projeto


de Resolução 84/2007, o qual foi arquivado ao final de 2018. O limite, portan-
to, carece de nova proposição pelo Presidente da República e de aprovação
pelo Senado Federal. Também foi sugerido pelo Poder Executivo o limite de
650% da RCL para a dívida mobiliária federal. No Senado, a proposta trami-

12
tou como o Projeto de Lei da Câmara 54/2009, tendo em vista a aprovação
inicial naquela casa legislativa. Em 2014, a proposta foi arquivada, e o limite
também carece de definição. A discriminação desses limites é importante
para que o endividamento federal se paute pelas balizas estabelecidas na
LRF, em prol do equilíbrio intertemporal das contas públicas.

Além dessas lacunas regulamentares, os casos selecionados a seguir re-


velam que a dívida pública tem sido um objeto de controle bastante desa-
fiador para o TCU.

Acórdão: 2.186/2013-P, relator ministro Valmir Campelo – Levantamento sobre os


haveres da União junto a estados e municípios decorrentes do refinanciamento das
dívidas subnacionais.

Principais achados: a eventual alteração dos critérios de indexação aplicáveis aos


contratos de refinanciamento de dívida celebrados entre União, estados e municí-
pios, ao amparo da Lei 9.496/1997 e da MP 2.185/2001, acarretaria osseguintesriscos:
potencial aumento do ônusfiscalsuportado pela União; provável elevação do endivi-
damento federal; consequente punição dos entes federados que se esforçaram no
ajuste fiscal de suas contas; possível transferência de renda dos estados e dos muni-
cípiosmais pobres para os mais ricos, em afronta ao inciso III do artigo 3º da Constitui-
ção Federal; incentivo ao endividamento excessivo no presente, combase na crença
de socorro financeiro futuro, caracterizando um problema de risco moral; fragilização
do pacto de corresponsabilidade fiscal e salvaguarda do equilíbrio macroeconômico.

Principais entendimentos e encaminhamentos: determinação à Secretaria do


Tesouro Nacional (STN) que elabore a estimativa do impacto fiscal para a União,
decorrente de possível alteração das regras aplicáveis aos contratos de refinancia-
mento da dívida subnacional na forma constante do Projeto de Lei Complementar
238/2013, de iniciativa da Presidência da República; recomendação à STN que avalie
a pertinência de considerar, na metodologia de elaboração do Demonstrativo da Dí-
vida Consolidada Líquida do Relatório de Gestão Fiscal do Poder Executivo Federal,
os saldos retificadores da Provisão para Perdas de Empréstimos e Financiamentos
e da Provisão para Perdas Realizáveis para fins de apuração das deduções relativas
aos haveres e aos demais ativos financeiros da União, em razão da alta materialida-
de dos valores envolvidos e em observância ao princípio contábil da prudência.

Acórdão: 1.084/2018-P, relator ministro Aroldo Cedraz – Auditoria da dívida pública


interna federal.

Principais achados: o não estabelecimento de limites para os montantes das dívidas


mobiliária federal e consolidada da União, assim como a não instituição do conselho
de gestão fiscal, constitui fator crítico para a limitação do endividamento público,
para a harmonização e a coordenação entre os entes da Federação, comprometendo
a efetividade do controle realizado pelo TCU e o exercício do controle social.

Principais entendimentos e encaminhamentos: desenvolvimento de ferramenta


tecnológica do TCU para o acompanhamento e o controle sistematizado dos leilões de tí-
tulos públicos; determinação ao Banco Central do Brasil e à STN que realizem estudo acer-
ca do intervalo desejável para a manutenção do estoque de operações compromissadas
e do nível de reservas internacionais, em face das peculiaridades da economia nacional.

13
Acórdão: 1.705/2018-P, revisor ministro Weder de Oliveira – Auditoria sobre as causas
e asconsequências do aumento da dívida interna federal, no período de 2011 a 2014.

Principais achados: um dos fatores do aumento da dívida bruta do governo geral


(DBGG) foi a concessão de créditos pela União ao Banco Nacional de Desenvolvi-
mento Econômico e Social (BNDES). Em dezembro de 2009, os créditos junto ao
BNDES como proporção do PIB equivaliam a 3,9%; evoluíram para 6%, em janeiro
de 2011; 8,8%, em dezembro de 2014; 9,1%, em outubro de 2015. A Secretaria do
Tesouro Nacional passou a estudar medidas para limitar o endividamento público
(limite de sustentabilidade e dívida prudencial), no âmbito do projeto “Avaliar nível
ótimo de endividamento do setor público”.

Principais entendimentos e encaminhamentos: proposta de estratégia de atua-


ção permanente do TCU em relação à gestão da dívida pública.

Acórdão: 2.924/2018-P, relator ministro José Múcio Monteiro – Auditoria sobre as


garantias honradas pela União em operações de crédito de estados e municípios.

Principais achados: o critério de excepcionalizar operações de crédito de alto ris-


co (classificadas como “C” e “D”) era visto como regra, não existindo entre 2012 e
2017 operações de crédito de estados e municípios cuja tramitação tenha se en-
cerrado por negativa de garantia pela União ou cujo parecer da STN tenha sido pela
não autorização da operação. Mesmo diante de evidências sobre a deterioração da
capacidade de pagamento do estado do Rio de Janeiro (RJ), as operações de crédi-
to continuaram a ser autorizadas; a falta de zelo em utilizar-se a excepcionalização
colocou em risco o cumprimento das obrigações ante a fraca situação fiscal em que
o estado do RJ se encontrava; houve incentivo ao endividamento do RJ muito além
da sua capacidade, comprometendo o seu equilíbrio fiscal.

Principais entendimentos e encaminhamentos: audiência e responsabilização


dos gestores envolvidos: exministro da Fazenda e ex-secretário do Tesouro Nacional.

Renúncia de receita
A Constituição Federal, ao tratar das limitações do poder de tributar, exi-
ge a edição de lei específica como requisito indispensável à concessão de
qualquer benefício fiscal. Nos termos da LRF, os gastos tributários com-
preendem anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, isenção em ca-
ráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo
que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros
benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.

Por força do Novo Regime Fiscal, instituído pela Emenda Constitucional (EC)
95/2016, proposições legislativas que criem esse tipo de benefício devem
conter a estimativa do impacto orçamentário e financeiro. Adicionalmente,
a LRF impõe uma base trienal a essa estimativa, abrangendo o exercício ini-
cial de vigência do benefício e os dois subsequentes, além do atendimento

14
às disposições da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a uma das se-
guintes condições: que a renúncia seja considerada na estimativa de receita
orçamentária e não afete as metas fiscais; que a renúncia esteja acompa-
nhada de medidas compensatórias que ampliem a arrecadação.

Com efeito, os gastos tributários constituem recursos públicos alocados


para o atendimento a objetivos econômicos e sociais seja pelo incentivo
a setores empresariais ou regiões geográficas, seja pela compensação a
contribuintes, em face da insuficiência da atuação estatal. Por tratar-se
de fonte de financiamento de políticas públicas, tal como o orçamento,
merece a devida atenção quanto a sua correta destinação e aplicação.

O TCU identificou problemas no uso dos benefícios tributários como ins-


trumentos de financiamento de políticas públicas. As falhas colocam em
risco a eficiência e os resultados de centenas de bilhões de reais de recei-
tas tributárias que o Estado deixa de arrecadar anualmente.

De forma geral, os benefícios tributários: são instituídos ou ampliados sem


objetivos e metas a ser alcançados, sem indicadores que permitam medir
os resultados apontados e sem prazos de vigência definidos; são aprova-
dos sem estimativas de impacto orçamentário e financeiro, apesar de ser
exigidas pela Constituição, pela LRF e pela LDO; não são monitorados e
avaliados quanto aos resultados efetivamente gerados para a economia e
a sociedade.

Os problemas sinalizam que os benefícios são concedidos sem planeja-


mento adequado, não havendo real clareza quanto aos resultados busca-
dos e ao impacto fiscal correspondente. Também não há avaliação pré-
via, para analisar se a opção pelo benefício tributário seria mais eficiente
que realizar uma despesa orçamentária. Mais grave ainda é que, uma vez
aprovados, os benefícios tributários tendem a perpetuar-se, sem que haja
comprovação de que o custo associado à redução de receitas tributárias é
compensado pelos benefícios gerados.

Isso se deve especialmente a duas razões. Em primeiro lugar, os benefícios


tributários são concedidos por meio de leis e outras medidas que não se sub-
metem ao processo de revisão anual pelo qual o orçamento passa. Em se-
gundo lugar, a ausência de monitoramento e avaliação sistemáticos torna
ainda mais obscuro o processo de renovação dos benefícios tributários, cujos
resultados ficam, geralmente, restritos aos contribuintes beneficiados.

Os problemas colocam em risco a transparência, o controle e a efetividade


desses instrumentos para fomentar setores específicos, gerar emprego e
renda, aumentar a produtividade e, em última instância, promover o de-
senvolvimento econômico e social. Para além disso, agravam distorções

15
associadas às renúncias de receitas tributárias, em especial: redução da
concorrência e aumento da ineficiência na economia; piora dos desequilí-
brios fiscais; aumento da complexidade do sistema tributário; aprofunda-
mento das desigualdades sociais e econômicas.

Ao longo dos anos, o TCU verificou que houve alguns avanços na questão
da transparência dos dados. No entanto, ainda remanescem problemas
estruturantes na governança e na gestão das renúncias de receitas tribu-
tárias, especialmente no que concerne ao monitoramento e à avaliação
antes da concessão da renúncia (avaliação ex-ante) e dos resultados ob-
tidos com o benefício tributário (avaliação ex-post).

As competências e os procedimentos para instituição e ampliação de re-


núncias tributárias devem ser mais bem definidos. Há que se indicar quais
seriam os órgãos essenciais nas etapas de formulação, concessão, moni-
toramento e avaliação, assim como as respectivas atribuições. Há que se
avançar, também, na definição de objetivos, metas, indicadores, prazos
de vigência, órgãos gestores e informações quantitativas e qualitativas
necessárias para os processos de monitoramento e avaliação. Durante a
vigência do benefício, é preciso estabelecer mecanismos de coordena-
ção entre órgãos centrais e setoriais, para a gestão de políticas públicas
financiadas com renúncias tributárias. Resta, também, a necessidade de
formular uma estratégia sistematizada de acompanhamento das políti-
cas, incluindo cronograma de revisões periódicas.

Acórdão: 747/2010-P, relator ministro Augusto Nardes – Levantamento sobre os


procedimentos de controle do cumprimento do disposto no artigo 14 da LRF (con-
cessão de benefícios tributários).

Principais achados: nem todas as proposições convertidas em lei apresentaram


a estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deveriam
iniciar sua vigência e nos dois subsequentes, em razão de dificuldades técnicas. A
determinação da LDO quanto ao prazo de vigência das renúncias de receitas não
tem sido cumprida. Verifica-se inexistência de sistemática para as concessões de
renúncias de receitas, não sendo evidenciados os órgãos que participam do pro-
cesso nem suas competências.

Principais entendimentos e encaminhamentos: determinações ao Poder Exe-


cutivo para: definir metodologia para as estimativas de impacto orçamentário-fi-
nanceiro das renúncias; não utilizar ajustes na programação orçamentária e finan-
ceira da despesa nem excesso de arrecadação como medidas de compensação a
renúncias; sistematizar procedimentos e definir competências dos órgãos envolvi-
dos na avaliação das propostas de concessão de renúncias de receitas.

16
Acórdão: 1.205/2014-P, relator ministro Raimundo Carreiro – Levantamento sobre
a estrutura de governança das renúncias tributárias.

Principais achados: ausência de normatização do processo de instituição de re-


núncias tributárias; ausência de acompanhamento e de avaliação das renúncias tri-
butárias; deficiências de comunicação sobre os benefícios tributários entre Receita
Federal e órgãos gestores; ausência de regulamentação sobre a gestão das políti-
cas públicas por parte dos órgãos gestores.

Principais entendimentos e encaminhamentos: recomendações com o intuito


de aprimorar a estrutura de governança de renúncias tributárias, incluindo meca-
nismos de acompanhamento e avaliação, regulamentação da gestão, objetivos, in-
dicadores e metas; realização de auditorias de avaliação de controles internos exis-
tentes nos órgãos gestores associados às principais políticas públicas baseadas em
renúncias tributárias.

Acórdão: 263/2016-P, relator ministro Raimundo Carreiro – Consulta acerca da in-


terpretação do artigo 14da LRF no que concerne às medidas de compensação em
decorrência de renúncias fiscais.

Principais achados: dúvida sobre o período a ser considerado, para fins de cumpri-
mento da exigência de compensação, especialmente nos casos em que a elevação
de alíquotas de tributos deve observar a anterioridade nonagesimal. O exercício fi-
nanceiro é o marco referencial a ser considerado para fins do efeito das medidas de
compensação à instituição ou ampliação de renúncias de receitas.

Principais entendimentos e encaminhamentos: a exigência de implementação


de medidas de compensação para concessão ou ampliação de renúncias de recei-
tas é considerada cumprida a partir da elevação de alíquotas de tributos, por meio
de lei ou de decreto, na data de publicação da lei ou do decreto, conquanto tais tri-
butos devam obediência ao princípio da anterioridade nonagesimal, desde que o ato
normativo que promova a elevação de alíquota se mantenha eficaz ao longo de todo
o exercício financeiro e que o valor a ser arrecadado após a noventena, mas no mes-
mo exercício, seja suficiente para neutralizar o impacto orçamentário-financeiro da
renúncia naquele exercício.

Acórdão: 2.692/2021-P, relator ministro Aroldo Cedraz – Consulta acerca da apli-


cabilidade do inciso I do artigo 14 da LRF (consideração da renúncia da estimativa de
receita da lei orçamentária).

Principais achados: interpretação equivocada de que propostas legislativas para


concessão de benefícios de natureza tributária estejam impreterivelmente condicio-
nadas a medidas de compensação; legitimidade de ambas as condições previstas
nos incisos I e II do artigo 14 da LRF e característica alternativa a esses comandos.

Principais entendimentos e encaminhamentos: as condições estabelecidas


nos incisos I e II do artigo 14 da LRF são inequivocamente alternativas, de modo que
é legalmente possível cumprir apenas um desses incisos. A preocupação funda-
mental do legislador, ao permitir o atendimento ao artigo 14 da LRF pela via do seu
inciso I, foi salvaguardar a higidez das metas de resultados fiscais. A demonstração
de que a renúncia tributária foi considerada na estimativa de receita orçamentária
e de que não afetará as metas fiscais não exigirá medidas de compensação, se o
impacto orçamentário-financeiro da respectiva renúncia se der a partir do exercício
financeiro a que se referir a respectiva Lei Orçamentária Anual.

17
4 Discussões e Lacunas das
Regras Fiscais

Meta Fiscal
Planejamento, transparência, prevenção de riscos e correção de desvios
estão entre os pressupostos da gestão fiscal responsável, nos termos da
LRF. Tais pressupostos visam preservar o equilíbrio das contas públicas,
de forma a manter o endividamento público sob permanente controle. O
artigo 4º da LRF prescreve que a LDO será integrada pelo Anexo de Metas
Fiscais, no qual serão estabelecidas metas anuais de receitas, despesas,
resultados nominal e primário e montante da dívida pública para o exercí-
cio a que se referirem e os dois seguintes. As metas fiscais servem para
dar confiança à sociedade de que o governo garantirá as condições ne-
cessárias à estabilidade econômica.

Como instrumento de gestão das finanças públicas, a programação orça-


mentária e financeira contribui para o cumprimento das metas fiscais. As-
sim, de acordo com a LRF, as receitas e as despesas devem ser avaliadas
bimestralmente, e, caso necessário, os gastos devem ser limitados por
decreto do Poder Executivo e por ato próprio dos demais Poderes (atos
conhecidos como contingenciamento), a fim de garantir o alcance dos re-
sultados fiscais definidos na LDO.

Apesar de o orçamento apresentar os valores autorizados para a execu-


ção orçamentária durante o exercício, o contingenciamento restringe essa
autorização por meio de limites inferiores para empenho e pagamento das
despesas. A escolha das despesas a serem contingenciadas recai sobre
os órgãos executores, já que os limites são definidos por Poder e órgão.
Um conceito relevante nesse contexto é o de base contingenciável, que é
o conjunto de dotações sujeitas a contingenciamento por meio das quais
se define a participação proporcional de cada Poder e órgão autônomo na
distribuição dos montantes a serem contingenciados.

Os Relatórios Bimestrais de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias


informam a necessidade de contingenciamento a cada Poder e órgão.
Tais documentos contêm: atualização das estimativas de receitas e des-
pesas; demonstração da necessidade de contingenciamento; revisão dos
parâmetros macroeconômicos; justificativas das alterações de despesas
obrigatórias; cálculos relativos à frustração das receitas; justificativa dos
desvios em relação às projeções anteriores.

A despeito dessa sistemática, ao longo dos últimos anos, mudanças me-


todológicas e transações atípicas contribuem para reduzir a transparência
e dificultar o entendimento sobre qual resultado primário o governo fede-

18
ral, de fato, tem perseguido. A LRF previu o estabelecimento de uma me-
todologia oficial para apuração do resultado primário da União e a institui-
ção de um Conselho de Gestão Fiscal, para acompanhar e avaliar a política
e a operacionalidade da gestão fiscal com foco na eficiência e na transpa-
rência. Contudo, passados mais de 20 anos desde a edição da LRF, não foi
criada a referida metodologia, tampouco o mencionado conselho.

Ademais, a exclusão da contabilização do resultado primário de deter-


minadas despesas primárias não se coaduna com os preceitos da res-
ponsabilidade fiscal que requerem a ação planejada e transparente, em
que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio
das contas públicas. Ainda que a metodologia de apuração do resultado
primário adotada pelo Bacen (denominada “abaixo da linha”) tenha res-
paldo em procedimentos internacionalmente aceitos, alguns dispositi-
vos das sucessivas LDO têm sido objeto de alteração recente. Citem-se
como exemplos:

• A prerrogativa de redução da meta de superávit primário pelo


abatimento das despesas do PAC, prevista a partir da LDO
2009, em substituição às despesas do Projeto-Piloto de Inves-
timentos (PPI). Tal prerrogativa foi efetivamente exercida em
2009, 2010 e 2012;

• A fixação de metas em valores nominais, a partir da LDO 2011, em


substituição à sistemática anterior de metas fixadas em percentual
do PIB. Na prática, tal mudança configura-se em potencial alívio fis-
cal para o governo federal sempre que o crescimento real do PIB for
superior ao previsto quando da elaboração das metas;

• A prerrogativa de redução da meta de superávit primário pela reali-


zação de investimentos prioritários e de desonerações de tributos,
prevista na LDO 2013;

• A exclusão da meta de resultado primário dos créditos extraor-


dinários voltados às despesas com ações e serviços públicos de
saúde para enfrentamento à pandemia, com o Programa Nacio-
nal de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte
(Pronampe) e com o Programa Emergencial de Manutenção do
Emprego e da Renda (BEm), conforme previsões das LDO de
2021 e 2022.

Não obstante, como medida da capacidade do governo de arcar com os


juros de sua dívida, sem ter de recorrer ao crédito, o resultado primário,
mesmo com suas limitações conceituais e metodológicas, ainda é um in-
dicador oficial básico da situação econômico-financeira do setor público.
Por princípio, esse resultado deve depender essencialmente dos níveis de
arrecadação e gasto. Em face disso, o exercício pleno da capacidade tri-

19
butária, inclusive com ações de combate à sonegação, e o controle das
despesas e das renúncias de receitas são instrumentos-chave no modelo
de gestão fiscal preconizado pela LRF.

Por certo, os efeitos da conjuntura econômica não podem ser despreza-


dos, ao analisar-se esse indicador, razão pela qual o cumprimento da meta
de resultado primário somente fará sentido econômico, em qualquer tem-
po e lugar, se, de fato, decorrer do efetivo esforço fiscal do governo. Me-
didas atípicas, com impactos primários significativos, quase sempre são
percebidas e mensuradas pelo mercado. Isso significa que, no âmbito das
finanças públicas, o realismo deve sempre prevalecer sobre o formalismo,
sob pena de comprometer-se a credibilidade do governo, em especial de
sua política fiscal, afetando negativamente a confiança e as expectativas
dos demais agentes econômicos.

A título exemplificativo, nos exercícios de 2014 e 2015, o Poder Executivo


deixou de indicar e promover a limitação de empenho e movimentação
financeira a despeito da constatação de que a realização da receita não
comportaria o atingimento das metas fiscais. Tal omissão é prevista como
infração administrativa no artigo 5º, inciso III, da Lei 10.028/2000. Com
efeito, a LRF deixa claro que as metas fiscais não têm de ser cumpridas
apenas no final do exercício, mas avaliadas a cada bimestre para que não
se percam de vista o controle, a evolução e a limitação das despesas dis-
cricionárias, sujeitas ao contingenciamento, bem como a cobertura das
despesas obrigatórias.

Por conta disso, foi instituído um processo operacional que permite a via-
bilização do cumprimento da meta fiscal contido no artigo 9º da LRF, por
meio da reavaliação bimestral das estimativas das receitas e das despe-
sas, além da limitação de empenho e movimentação financeira. Assim, a
lei complementar condicionou o contingenciamento das dotações que
custeiam as despesas à vista de uma frustração de receitas a cada bimes-
tre, como forma de prevenir riscos ao equilíbrio das contas.

Tais contingenciamentos podem ser temporários ou permanentes segun-


do as condições econômicas durante o ano e podem ser suficientes até o
restabelecimento das receitas constantes do orçamento, com vistas ao
atingimento da meta fiscal a cada bimestre, de forma a assegurar a pre-
venção de riscos ao pleno cumprimento da meta, no final do exercício. As-
sim, justificar o não contingenciamento sob a alegação de que nova meta
estaria vigente no final do exercício é atentar contra todo o arcabouço de
execução orçamentária e financeira estipulado pela LRF, com base nos
princípios do planejamento, da prudência e do equilíbrio fiscal.

Nesse contexto, a existência da Junta de Execução Orçamentária (JEO)


como instância decisória do governo federal em matéria de política fiscal,
especialmente nas avaliações bimestrais de receitas e despesas primá-
rias que embasam a programação orçamentária e financeira, é fato incon-

20
troverso. Especificamente, a JEO atua como instância de validação dos
relatórios bimestrais das referidas avaliações, que, por sua vez, fornecem
fundamentos para a tomada de decisão acerca da necessidade ou não de
limitação de empenho e movimentação financeira, com influência, por-
tanto, sobre atos próprios dos chefes de Poderes e do Ministério Público,
o que ressalta a importância de sua atuação e a responsabilidade envolvi-
da em seu processo decisório.

Constata-se que houve, na estrutura do Poder Executivo, órgãos congê-


neres, formalmente constituídos, como a Junta de Programação Finan-
ceira (Jupof) e a Comissão de Controle e Gestão Fiscal (CCF). Instituída
pelo Decreto 1.099/1994 e extinta pelo Decreto 3.366/2000, a Jupof ti-
nha por finalidade coordenar a execução orçamentária, de modo a asse-
gurar o efetivo equilíbrio entre ingressos e dispêndios. Por sua vez, a CCF
foi criada pelo Decreto 2.773/1998, com a atribuição de monitorar a situ-
ação fiscal, visando à obtenção do resultado primário estabelecido para
cada exercício, e foi extinta pelo Decreto 4.120/2002.

Com o advento da LRF em 2000, a condução da política fiscal foi alçada a


novo patamar. Porém, a formalização da JEO e o registro em ata das suas
reuniões somente se deram em 2017, após a atuação incisiva deste Tribu-
nal, visando ao aperfeiçoamento da governança fiscal no âmbito da União.

Outro exemplo marcante de intervenção do TCU nesse âmbito envolveu


a meta variável de resultado primário proposta no projeto de LDO 2021
(versão original do PLN 9/2020, encaminhado ao Congresso Nacional em
15/4/2020). Em vez de buscar ajuste na redução da despesa caso a re-
ceita se mostrasse inferior ao estimado, conforme determinado no arti-
go 9° da LRF, a meta então propugnada ajustar-se-ia automaticamente,
a cada redução de receita ou aumento de despesa, configurando mera
operação matemática que buscava conformar à previsão da legislação
complementar um mecanismo incapaz de cumprir plenamente os prin-
cípios orientadores da LRF.

Conquanto se compreendessem as circunstâncias de incerteza que im-


peravam no momento de envio do PLDO 2021 ao Congresso Nacional,
com a emergência da crise sanitária decorrente da covid-19, em meados
de abril de 2020, em termos objetivos, a proposta subvertia o conjunto
de regras fiscais vigentes, pois anulava a busca por resultados primários
e restringia os limites à execução orçamentária e financeira somente ao
Teto de Gastos.

Após o alerta emitido pelo Tribunal, ante o atraso na apreciação do PLDO


2021 pelo Congresso Nacional, houve tempo hábil para o Poder Executi-
vo propor modificação no formato da meta, adequando-a aos ditames da
LRF, o que foi devidamente acolhido pelo Congresso Nacional. Assim, o
artigo 2º da Lei 14.116/2020 (LDO 2021) contemplou uma meta fiscal em
montante definido: o déficit primário de R$ 247,1 bilhões.

21
Acórdão: 3.324/2015-P, relator ministro José Múcio Monteiro – Acompanhamento
dos resultados fiscais e da execução orçamentária e financeira da União no 2º qua-
drimestre de 2015.

Principais achados: a falta da informação desagregada por órgão do Poder Exe-


cutivo em programas e ações impede que se avalie a eventual impossibilidade de se
efetuar contingenciamento superior ao montante já efetivado, não permitindo aferir
se era ou não possível ampliar o montante contingenciado; há condução temerária
da programação orçamentária e financeira com base em proposta de meta fiscal-
constante de projeto de lei ainda não apreciado pelo Congresso Nacional.

Principais entendimentos e encaminhamentos: a mera proposta de alteração


da meta fiscal não tem o condão de suspender a eficácia do artigo 9º da LRF. Uma
vez demonstrada a necessidade de contingenciamento, o Poder Executivo deveria
ter apurado o montante e informado os demais órgãos. A alteração da meta deve
ocorrer somente após a aprovação de projeto de lei pelo Poder Legislativo, sem que
o Poder Executivo se descuide da programação definida com base na meta em vi-
gor, até que nova meta seja aprovada.

Obs.: conferir os Relatórios e os Pareceres Prévios sobre as Contas do Presi-


dente da República de 2014 e 2015 (Acórdãos 2.461/2015 e 2.523/2016, ambos
do Plenário).

Acórdão: 803/2017-P, relator ministro José Múcio Monteiro – Acompanhamento


dos resultados fiscais e da execução orçamentária e financeira da União no 5º bi-
mestre de 2016.

Principais achados: falta de institucionalização formal da JEO. Embora a JEO exis-


tisse de fato, não tinha competências ou regra de decisão definidas, não tomava de-
cisões formais, não continha membros designados e ato normativo ou regulamento,
e não elaborava atas das reuniões realizadas.

Principais entendimentos e encaminhamentos: determinação à Casa Civil para


institucionalização formal da JEO.

Acórdão: 2.898/2020-P, relator ministro Bruno Dantas – Acompanhamento do


Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias da União para o exercício de 2021.

Principais achados: na versão original do PLDO 2021, encaminhado ao Congresso


em abril de 2020, sequer foi proposta meta fiscal em montante definido. O Poder
Executivo atrelou a meta à parcela da despesa sujeita ao Teto de Gastos sob a justi-
ficativa de que “a incerteza quanto à extensão e ao alcance da pandemia, bem como
quanto a seu impacto sobre a atividade econômica, reduz significativamente a pre-
visibilidade dos agregados fiscais para 2021”.

Principais entendimentos e encaminhamentos: a meta de resultado primário


apresentada pelo Poder Executivo não atende às disposições da CF/1988 e da LRF,
porque subverte a regra de resultado fiscal e torna-a ineficaz para os seus propó-
sitos. O modelo proposto fragiliza os esforços de consolidação fiscal e a trajetória
sustentável do endividamento e limita o controle legislativo concomitante à execu-
ção orçamentária e financeira. Embora a proposta se justificasse pelas excepcionais
circunstâncias, sua recorrência não pode ser tolerada, por afetar o planejamento
responsável e a credibilidade perante os agentes econômicos.

22
Regra de Ouro
Prevista na Constituição Federal (artigo 167, inciso III), a chamada “Re-
gra de Ouro” das finanças públicas impede que o Estado realize ope-
rações de crédito em montante superior ao das despesas de capital. A
LRF também contempla comando no mesmo sentido, ao dispor que o
montante previsto para as receitas de operações de crédito não pode-
rá ser superior ao das despesas de capital constantes do projeto de lei
orçamentária (artigo 12, § 2º).

Em suma, a Regra de Ouro busca evitar que o endividamento público,


como meio de obtenção de recursos pelo Estado, seja utilizado para cus-
tear as despesas ordinárias de manutenção e funcionamento da máquina
estatal, a exemplo de salários e serviços de terceiros. Assim, a captação
por meio de empréstimos ou emissão de títulos está sujeita a um limite
anual, correspondente à soma das despesas com investimentos, inver-
sões financeiras e amortização de dívidas anteriormente contraídas. Em
última instância, trata-se de um mecanismo de controle prudencial, que
visa assegurar um lastro patrimonial à assunção de passivos.

No âmbito da administração pública federal, a aferição do cumprimento


da Regra de Ouro ocorre em dois momentos distintos: na elaboração do
orçamento e no encerramento do exercício. No primeiro momento, são
confrontadas as dotações relativas às operações de crédito e às despe-
sas de capital constantes da proposta orçamentária enviada pelo Presi-
dente da República ao Congresso Nacional. No segundo momento, o co-
tejo envolve os valores efetivamente realizados em ambas as rubricas.

Um dos aspectos passíveis de discussão refere-se à abrangência da Re-


gra de Ouro. Em um critério restrito, são consideradas apenas as esfe-
ras orçamentárias fiscal e da seguridade social. Sob perspectiva ampla,
também seriam computadas as operações de crédito e as despesas de
capital das empresas estatais independentes. A Secretaria de Orçamen-
to Federal (SOF) e a STN, órgãos centrais de orçamento e administração
financeira da União, respectivamente, entendem que o cômputo dos va-
lores das estatais é juridicamente defensável. Porém, em termos macro-
econômicos, a SOF questiona a pertinência da inclusão das estatais. Por
sua vez, a STN alega a existência de óbices técnicos e operacionais para a
apuração do cumprimento do limite com o acréscimo das estatais.

Outro ponto sensível é o eventual descumprimento da Regra de Ouro.


Além das consequências negativas do ponto de vista fiscal, aspectos, tais
como a tipificação da conduta e a responsabilização, também merecem a
devida atenção, haja vista que se trata de infração grave à Constituição e à
LRF. Vê-se, portanto, que o debate conceitual acerca do tema não é trivial
e que a matéria carece de regulamentação tanto em relação à metodo-
logia de apuração quanto em referência a possíveis medidas que visem

23
mitigar os riscos de extrapolação do limite entre operações de crédito e
despesas de capital.

A breve análise da experiência internacional em relação à adoção de re-


gras fiscais evidencia clara peculiaridade da Regra de Ouro no Brasil: a
inexistência de regras transitórias ou excepcionais a serem consideradas
em situações econômicas e fiscais adversas. Com efeito, relativamente
ao exercício de 2019, as operações de crédito superaram as despesas de
capital tanto em termos orçamentários quanto em aspectos de execu-
ção. Ambos os fatos ocorreram pela primeira vez, desde a promulgação
da Constituição Federal de 1988.

Na elaboração e na aprovação da Lei 13.898/2019 (Lei Orçamentária Anual


– LOA 2019), as operações de crédito estimadas (R$ 1.424 bilhões) supe-
raram em R$ 249 bilhões o volume fixado de despesas de capital (R$ 1.175
bilhões). A alternativa adotada pelo Poder Executivo e ratificada pelo
Parlamento consistiu em consignar o excesso de operações de crédito
(R$ 249 bilhões) e as correspondentes despesas correntes financiadas
por essa fonte de recursos como programações condicionadas à aprova-
ção legislativa, por maioria absoluta, de crédito adicional, conforme pre-
visto na Constituição.

A redução de investimentos e inversões financeiras conjugada com segui-


dos déficits fiscais conduziram ao desequilíbrio material da Regra de Ouro.
No entanto, o equilíbrio formal perdurou até 2018, graças a dois principais
fatores: o ingresso de receitas financeiras não recorrentes e o amplo con-
ceito de despesas de capital, que abrange as amortizações, além dos in-
vestimentos e das inversões financeiras.

Os ingressos de receitas financeiras não recorrentes, com destaque para


o resultado positivo do Banco Central e os pagamentos antecipados do
BNDES por empréstimos anteriores, foram decisivos para o cumprimen-
to formal da Regra de Ouro, notadamente entre os exercícios de 2016 a
2018. Isso ocorreu, porque esses recursos foram utilizados para executar
despesas com amortizações (tipo de despesa de capital) ou outras des-
pesas financeiras, como juros da dívida, liberando fontes para o custeio
de outras despesas de capital. No entanto, com a escassez dos recursos
a serem pagos antecipadamente pelo BNDES e as restrições impostas
pela Lei 13.820/2019 às transferências de resultados do Banco Central ao
Tesouro Nacional, a União tende a não mais contar com recursos tão volu-
mosos, para equilibrar formalmente a Regra de Ouro.

Cabe salientar, por fim, que, nos exercícios de 2021 e 2022, as operações
de crédito superaram as despesas de capital em termos orçamentários,
mas não em termos de execução.

24
Acórdão: 2.708/2018-P, relator ministro Vital do Rêgo – Levantamento sobre os
critérios de apuração do limite entre as operações de crédito e as despesas de ca-
pital (Regra de Ouro).

Principais achados: falta de padronização quanto à forma de apresentação e aos


procedimentos contábeis empregados na elaboração do demonstrativo da Regra de
Ouro; remanejamentos de fontes de recursos realizados no âmbito da gestão da dí-
vida pública mobiliária interna da União, com impactos sobre a apuração da Regra de
Ouro. As despesas de capital previstas no Orçamento de Investimento das Empresas
Estatais têm compensado o excesso de receitas de operações de crédito em relação
às despesas de capital, no âmbito dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social.

Principais entendimentos e encaminhamentos: determinação ao Poder Execu-


tivo para realização de estudo com vistas ao aperfeiçoamento da forma de apura-
ção e demonstração da Regra de Ouro.

Teto de Gastos
A Emenda Constitucional 95/2016 instituiu o Novo Regime Fiscal no âmbi-
to dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social, com vigência por vinte
anos. Esse regime, denominado Teto de Gastos, fixou limites individualiza-
dos para as despesas primárias dos órgãos dos Poderes Executivo, Legisla-
tivo e Judiciário, do Ministério Público da União (MPU), do Conselho Nacio-
nal do Ministério Público (CNMP) e da Defensoria Pública da União (DPU).

A Emenda Constitucional 113/2021 alterou a regra do Teto, estabelecendo


como limites, para os exercícios posteriores a 2017, a variação do Índice
Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) apurado no exercício an-
terior a que se refere a lei orçamentária, ou seja, o período de referência,
que era de doze meses, encerrado em junho do ano anterior, passou a ser
de janeiro a dezembro. Por sua vez, a Emenda Constitucional 126/2022,
entre outras disposições, prevê que o Presidente da República deverá en-
caminhar ao Congresso Nacional, até 31/8/2023, projeto de lei comple-
mentar, com o objetivo de instituir regime fiscal sustentável, para garantir
a estabilidade macroeconômica e criar as condições adequadas ao cres-
cimento socioeconômico. Foi então aprovada, em 30/8/2023, a Lei Com-
plementar 200, a qual revogou o Teto de Gastos consoante o disposto no
artigo 9º da EC 126/2022.

As despesas sujeitas ao Teto de Gastos, em 2016, totalizaram R$ 1.222,3


bilhão. Esse valor é R$ 1.180,0 milhão maior do que o montante considerado
até o exercício de 2021, em decorrência da reclassificação das despesas,
com a formação e a manutenção de estoques da Política de Garantia de
Preços Mínimos (PGPM), e da adoção pelo Instituto Nacional do Seguro So-
cial (INSS) ao modelo de contabilização da despesa de compensação previ-
denciária (Comprev), por meio de seus valores brutos, em atendimento ao
Acórdão 1.153/2021-TCU-Plenário (relator ministro Augusto Sherman).

25
Cabe esclarecer que o MPU e os órgãos do Poder Judiciário obtiveram au-
torização para computar, em seus limites, os valores pagos a título de au-
xílio-moradia, com amparo no crédito extraordinário da Medida Provisória
711/2016 (Acórdãos 3.072/2019 e 362/2020, ambos do Plenário do TCU e
de relatoria do ministro Bruno Dantas), com valores respectivos de R$ 105
milhões (MPU) e R$ 294,3 milhões (Judiciário).

A restrição fiscal imposta pelo Teto de Gastos visa conter a expansão de


gastos primários, de forma a preservar a sustentabilidade das contas pú-
blicas e, em última instância, garantir ao Estado a capacidade financeira
necessária ao fornecimento de serviços públicos essenciais aos cidadãos.
Para tanto, é relevante que as despesas obrigatórias não cresçam em pro-
porção superior à variação da inflação – tendência observada nos últimos
anos. Isso ocorre, porque essas despesas, compostas, em sua maioria,
por salários e benefícios previdenciários, comprimem os valores disponí-
veis para a execução dos demais gastos de custeio da máquina pública e
de investimentos em infraestrutura.

Esta Corte de Contas, atenta à relevância do Teto de Gastos como regra


fiscal estruturante para a sustentabilidade das finanças públicas, atua de
forma contínua, sistemática e tempestiva, em torno do tema, desde a vi-
gência da EC 95/2016, conforme excertos colacionados a seguir.

Acórdão: 2.779/2017-P, relator ministro Vital do Rêgo – Auditoria para verificar o


cumprimento do limite de gastos instituído pela Emenda Constitucional 95/2016 no
âmbito dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social.

Principais achados: os ajustes remuneratórios, incidentes nos primeiros meses de


2017 e não ocorridos em 2016, majoraram os efeitos financeiros no âmbito de órgãos
e Poderes, em decorrência da concentração de despesas no grupo de pessoal e en-
cargos. A projeção das despesas primárias da União, para o período 2017-2020, a va-
lores de 2017, mostrava que as despesas com pessoal e encargos e benefícios previ-
denciários tendiam a crescer acima da inflação, enquanto as despesas discricionárias
e o conjunto de outras despesas obrigatórias tendiam a crescer abaixo da inflação.

Principais entendimentos e encaminhamentos: recomendação aos órgãos e


às entidades da administração pública federal, sob a égide do Novo Regime Fiscal,
acerca das medidas necessárias a serem adotadas no período de 2018 a 2020, a
fim de assegurar o cumprimento do limite individualizado de gastos, instituído pela
Emenda Constitucional 95/2016, sem perder, contudo, as suas capacidades opera-
cionais de funcionamento.

26
Acórdão: 2.455/2019-P, relator ministro Bruno Dantas – Acompanhamento para
avaliar as medidas adotadas pelos órgãos sujeitos à EC 95/2016 para cumprimento
do Teto de Gastos nos exercícios de 2019 a 2022, tendo em vista, especialmente, o
término do período de compensação de despesas pelo Poder Executivo.

Principais achados: os órgãos planejavam cumprir o Teto por meio da contenção


das despesas com pessoal e das despesas discricionárias, além de medidas de ra-
cionalização administrativa.

Principais entendimentos e encaminhamentos: o TCU ressaltou o cenário de risco


vislumbrado, o esforço de gestão em curso, no âmbito das unidades jurisdicionadas
e a importância da atuação sistemática do Tribunal em prol da sustentabilidade fiscal.

Acórdão: 1.437/2020-P, relator ministro Bruno Dantas – Relatório e parecer prévio


sobre as Contas do Presidente da República do exercício de 2019.

Principais achados: a capitalização da Empresa Gerencial de Projetos Navais (Em-


gepron) fora realizada precipuamente para viabilizar a aquisição de equipamentos
para a Marinha do Brasil, como forma de terceirizar despesas de órgão da adminis-
tração direta, desviando-se dos pressupostos do Novo Regime Fiscal.

Principais entendimentos e encaminhamentos: o TCU consignou como irregu-


lares os aportes de capital da União em favor da Emgepron, sobretudo, com o fito
de alertar ao Poder Executivo acerca dos riscos de que manobras daquela natureza
podem afetar a credibilidade da EC 95/2016 e a eficácia da norma como regra de
contenção dos gastos públicos.

Acórdãos: 2.026/2020-P e 2.710/2020-P, relator ministro Bruno Dantas – Acom-


panhamento dos reflexos e dos riscos das mudanças nas regras orçamentárias e
fiscais aplicáveis durante e após a pandemia de covid-19.

Principais achados: as despesas de combate à pandemia, por terem sido autori-


zadas, em sua grande maioria, por créditos extraordinários, não foram computadas
no Teto de Gastos. Parcela desses créditos promoveu abertura de espaço fiscal no
Teto, pelas seguintes razões: houve créditos lastreados por dotações provenientes
do cancelamento de orçamentação inicialmente computada no Teto de Gastos;
houve créditos autorizados para substituir despesas computadas no Teto, como o
caso da substituição temporária do Programa Bolsa Família pelo Auxílio Emergencial.

Principais entendimentos e encaminhamentos: recomendou-se que eventuais


autorizações orçamentárias cujo lastro fosse o cancelamento de dotações ociosas
originalmente destinadas ao Bolsa Família, em face de substituição promovida pelo
Auxílio Emergencial, fossem “direcionadas exclusivamente ao custeio de despesas
com o enfrentamento do contexto da calamidade relativa à pandemia de covid-19 e
de seus efeitos sociais e econômicos” e que tivessem “a mesma classificação fun-
cional da dotação cancelada ou substituída”. Alternativamente, a despesa cancela-
da ou substituída poderia ser também destinada ao pagamento de abono salarial e
seguro-desemprego.

27
5 Descumprimento às Normas
de Gestão Fiscal
Apresentados os principais julgados do TCU envolvendo aspectos funda-
mentais da LRF e das regras fiscais, bem como os entendimentos deles
extraídos, listam-se nesta seção alguns casos paradigmáticos de descum-
primento às normas de gestão fiscal, especificamente associados a dispo-
sitivos da LRF.

Desvinculação de recursos
A vinculação de recursos ocorre quando receitas são destinadas, por
meio de norma, para atender determinadas despesas, entes, órgãos, en-
tidades ou fundos. A vinculação cria verdadeiro elo entre a receita e a des-
pesa. Por sua vez, a desvinculação dá-se em sentido contrário, ou seja,
é a permissão legal para a livre aplicação de recursos que anteriormente
recebiam uma destinação específica.

As principais regras que tratam de vinculação de recursos estão previstas


na Lei 4.320/1964, artigos de 71 a 73, e na LRF, artigo 8º, parágrafo único,
artigo 50, inciso I, e artigo 65, § 1º, inciso II. Em resumo, esses dispositivos
estabelecem que as receitas vinculadas a determinadas despesas, inclu-
sive as arrecadadas em exercícios anteriores (superávit financeiro), de-
vem respeitar a destinação estabelecida em lei, à exceção do período de
decretação de calamidade pública reconhecida pelo Congresso Nacional,
quando os recursos vinculados poderão ser destinados ao combate à ca-
lamidade.

A jurisprudência desta Corte de Contas em relação à desvinculação de recur-


sos é firme no sentido de que, em regra, não pode ser instituída por normas
gerais. No caso de recursos vinculados a fundos especiais, nos termos dos
artigos de 71 a 73 da Lei 4.320/1964, a desvinculação deve ser realizada me-
diante a inequívoca modificação das leis instituidoras dos fundos. Além disso,
nos termos do Acórdão 2.737/2018-TCU-Plenário (relator ministro Vital do
Rêgo), as leis e as medidas provisórias que dispuseram, de forma geral, sobre
a desvinculação de recursos dos fundos especiais e dos legalmente vincula-
dos à finalidade específica, de que tratam o artigo 73 da Lei 4.320/1964 e o
parágrafo único do artigo 8º da LRF, careceram de eficácia, pois invadiram a
matéria constitucionalmente restrita às leis complementares.

28
Acórdão: 2.737/2018-P, relator ministro Vital do Rêgo – Consultas sobre o entendimen-
to do TCU quanto aos procedimentos para desvinculação de receitas orçamentárias.

Principais entendimentos e encaminhamentos: as leis e as medidas provisó-


rias que dispuseram, de forma geral, sobre a desvinculação de recursos dos fun-
dos especiais e dos legalmente vinculados à finalidade específica, de que tratam o
artigo 73 da Lei 4.320/1964 e o parágrafo único do artigo 8.º da Lei Complementar
101/2000, careceram de eficácia, pois invadiram matéria constitucionalmente res-
trita às leis complementares. O artigo 13 da Lei 11.943/2009, além da exceção de
seu parágrafo único, não incide sobre os recursos de que tratam o artigo 73 da Lei
4.320/1964 e o parágrafo único do artigo 8.º da Lei Complementar 101/2000, mas
somente sobre o superávit financeiro das demais fontes de recursos existentes no
Tesouro Nacional. O artigo 73 da Lei 4.320/1964, expressamente, e o parágrafo úni-
co do artigo 8.º da Lei Complementar 101/2000, implicitamente, possibilitam que,
mediante a inequívoca modificação das leis instituidoras dos fundos ou das leis que
destinam recursos à finalidade específica, haja a alteração da vinculação originária
dos recursos.

Acórdão: 2.027/2019-P, relator ministro Vital do Rêgo – Consulta acerca da nature-


za da vinculação aplicável à receita pública denominada Compensações Financeiras
pela Produção de Petróleo, Gás Natural e Outros Hidrocarbonetos Fluidos (fonte 42).

Principais entendimentos e encaminhamentos: A desvinculação do superávit


financeiro de órgãos da administração pública federal a que se refere o artigo 45,
§ 3º, da Lei 9.478/1997 (Lei do Petróleo) não se aplica aos recursos vinculados a
fundos especiais, que é o caso do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (FNDCT) e do Fundo Social (FS), a menos que a lei criadora desse tipo
de fundo autorize a transferência de superávit financeiro ao Tesouro Nacional (Leis
11.540/2007 e 12.351/2010, c/c o disposto no artigo 73 da Lei 4.320/1964); aos re-
cursos vinculados às áreas de saúde e educação por força da Lei 12.858/2013. Em
relação ao superávit financeiro da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Bio-
combustíveis (ANP), tal desvinculação pode ser aplicada, desde que garantidas as
necessidades operacionais da agência, consignadas no orçamento aprovado, a teor
do artigo 15, inciso II, da Lei 9.478/1997. Além disso, a desvinculação do superávit
financeiro de órgãos da administração pública federal a que se refere o artigo 45,
§ 3º, da Lei 9.478/1997 (Lei do Petróleo) pode ser aplicada independentemente da
expedição de ato normativo pelo Poder Executivo, com a ressalva de que os recur-
sos vinculados à União, por força do disposto nos artigos 49, inciso I, alínea d, inciso
II, alínea f, e 50, § 2º, inciso I, da Lei 9.478/1997, a serem destinados ao Fundo Social
(FS), dependem de regulamentação por parte do Poder Executivo para que parte
deles sejam vinculados a órgãos da Administração Direta da União.

Atrasos nos repasses a instituições financeiras


responsáveis pelo pagamento de despesas públicas
Os trabalhos do TCU realizados entre 2014 e 2015 apontaram que o Te-
souro Nacional estava atrasando os repasses a instituições financeiras,
destinados ao pagamento de programas sociais e previdenciários de res-
ponsabilidade do governo federal.

29
A sistemática regular exigia que o governo federal repassasse às instituições
os recursos para pagamento dos programas de governo e das subvenções
econômicas. No entanto, os repasses foram frequentemente insuficientes
e intempestivos, de modo que os benefícios e os projetos eram custeados
com recursos das próprias instituições, o que caracterizou operações de
crédito entre a União e as instituições financeiras controladas (Caixa, BN-
DES e Banco do Brasil), transação vedada pela LRF, artigo 36.

Em síntese, constatou-se que bancos públicos controlados pela União fi-


nanciaram políticas públicas federais com seus próprios recursos, incor-
rendo em uma prática ilegal, que permitiu ao governo federal alavancar
suas operações além da sua capacidade fiscal, gerando endividamento e
despesas financeiras que recaíram sobre os contribuintes.

Houve o agravante de que tais passivos não foram registrados nas esta-
tísticas fiscais do Bacen. Assim, essas dívidas da União eram omitidas das
informações prestadas sobre as contas públicas, ocasionando distorções
no resultado primário e no montante da dívida pública. O resultado primá-
rio era superestimado, ao passo que a dívida pública era subestimada. Por
conseguinte, a informação gerada apresentava um cenário melhor das
contas públicas do que aquele realmente suportado.

As despesas só eram computadas em momento posterior, quando o


governo quitava o passivo junto às instituições. Essa postergação de
registro e de impacto nos indicadores fiscais só foi possível, porque
as estatísticas fiscais oficiais não captaram adequadamente todas as
obrigações da União.

Dessa forma, grave falha de transparência impediu que uma prática irre-
gular e danosa ao Tesouro Nacional fosse evidenciada, de forma que ci-
dadãos, empresas, agentes econômicos em geral, além dos órgãos de
controle e do próprio Congresso Nacional, não conhecessem a realidade
precisa sobre as contas públicas.

O alcance dos resultados fiscais demanda a correta estimativa de recei-


tas e despesas a cada exercício financeiro, conforme exigência da LRF e
pressupõe um acompanhamento concomitante a essas estimativas, pois,
caso não se concretizem, serão feitos ajustes na execução orçamentária
e financeira, a fim de atingir as metas então fixadas.

O acompanhamento da execução orçamentária e dos resultados fiscais pelo


TCU, a partir de 2014, apontou que o governo federal descumpriu princípios,
limites, metas e condições no âmbito da responsabilidade fiscal, como su-
perestimação de receitas, subestimação de despesas, contingenciamento
abaixo do montante necessário e distorção das estatísticas fiscais.

As falhas de transparência verificadas não somente representaram a


omissão de informações relevantes à sociedade, aos agentes econômi-
cos, aos órgãos de controle e ao Congresso Nacional, que desconheciam,

30
sobretudo em 2014, o real estado das finanças públicas federais, como
também permitiram que não fosse realizada limitação de empenho no
montante necessário e no momento legalmente previsto. Com isso, não
houve adequado controle do processo de geração de resultados fiscais,
redundando em elevação do endividamento público e em despesas finan-
ceiras correspondentes.

Essas conclusões também fizeram parte do processo que ensejou, no pa-


recer, pela rejeição das Contas da Presidente da República do exercício
financeiro de 2014, correspondendo a irregularidades que feriram precei-
tos do direito orçamentário insculpidos na Constituição Federal de 1988,
na LRF, nas diretrizes orçamentárias e na lei orçamentária anual.

Nesse contexto, o Tribunal concebeu nova abordagem de fiscalização nos


exercícios de 2016 e 2017, consistindo em trabalhos sistemáticos e perió-
dicos (acompanhamento), especialmente a cada bimestre, com o fim de
verificar o cumprimento das regras da LRF relacionadas às metas fiscais
vigentes e as eventuais propostas de alteração.

Essa abordagem abriu espaço para determinações e recomendações,


além de emissão de alertas, de forma tempestiva, aos órgãos cen-
trais de planejamento, orçamento e contabilidade federal envolvidos,
promovendo melhorias na transparência da gestão fiscal. Assim, per-
mitiu-se um acompanhamento com maior rigor e visibilidade das es-
timativas de receitas e despesas primárias, com vistas a proporcio-
nar maior integridade à execução orçamentária e financeira da União.

Acórdãos: 825/2015-P, relator ministro José Múcio Monteiro, 992/2015-P, relator


ministro José Múcio Monteiro e 3.297/2015-P, relator ministro Vital do Rêgo – Re-
presentação sobre indícios de irregularidades relacionados ao atraso no repasse
às instituições financeiras dos valores destinados ao pagamento de despesas de
responsabilidade da União, tais como Bolsa Família, Abono Salarial, Seguro-Desem-
prego, Subsídios de Financiamento Agrícola e Benefícios Previdenciários.

Principais achados: dívidas e despesas primárias não registradas nas estatísticas


fiscais; realização de operação de crédito com inobservância de condição estabele-
cida em lei; atraso no repasse de recursos dos royalties do petróleo, da compensa-
ção financeira pelo uso de recursos hídricos, da cota-parte do salário educação e de
recursos para pagamento de benefícios previdenciários.

Principais entendimentos e encaminhamentos: audiências e multas a responsá-


veis; determinação para registros corretivos nas estatísticas fiscais; determinação de
medidas corretivas, incluindo a quitação dos passivos apurados; consignação de irre-
gularidades no Parecer Prévio sobre as Contas da Presidente da República de 2014.

Emissões diretas
O Tesouro Nacional vinha realizando operações com instituições financei-
ras federais, especialmente com o BNDES, desde 2008, as quais consis-
tiam em concessões de crédito do Tesouro às referidas instituições. Tais

31
operações foram realizadas, porque os bancos não teriam recursos em
caixa para amparar contratações de financiamento em volume suficiente
para atender à demanda dos agentes econômicos.

A maior parte das emissões diretas (R$ 403,7 bilhões) foi utilizada para
aumentar o limite operacional do BNDES. O aporte constituiu fonte de
recursos para expansão da atuação estatal, com custo reduzido para o
beneficiário do empréstimo (funding subsidiado pelo Tesouro).

Os empréstimos para o BNDES foram lesivos ao Erário, pois o custo de


carregamento da dívida pública era bastante superior à Taxa de Juros de
Longo Prazo (TJLP) – em 2014, a TJLP foi 5%, e a Selic, variou de 10,4% a
11,65%. A utilização desses recursos pelo BNDES gerou novos encargos
para os cofres federais, pois o BNDES emprestou a juros subsidiados,
contando com a posterior equalização pelo Tesouro (em 2015, a equaliza-
ção chegou a R$ 7,3 bilhões).

Nesse sentido, o artigo 36 da LRF disciplina duas situações distintas. A


primeira visa impedir que os detentores do poder político do ente da Fe-
deração possam obrigar que as instituições financeiras controladas se-
jam utilizadas para financiar a expansão de políticas setoriais, o que se
insere no conceito de operação de crédito vedada. O legislador proíbe
que bancos façam operação de crédito para destinar seus recursos pró-
prios e de seus clientes a financiar a expansão de políticas públicas de
interesse do ente controlador. As duas exceções previstas no parágrafo
único do artigo 36 da LRF têm em comum a permissão para as institui-
ções controladas adquirirem, no mercado, títulos da dívida pública para
fins de investimento de recursos dos clientes do banco ou aplicação

de recursos da própria instituição financeira, e, no segundo caso, a exce-


ção restringe-se à aquisição de títulos da dívida de emissão da União.

As emissões diretas para as instituições controladas representaram


uma solução fora dos padrões, para, diante da escassez de recursos, ex-
pandir, artificiosamente, por determinação do ente controlador (União),
o gasto público com políticas setoriais à margem do orçamento públi-
co,sem a necessária transparência.

32
Acórdão: 56/2021-P, relator ministro Aroldo Cedraz – Representação sobre a re-
gularidade dos empréstimos concedidos pelo Tesouro Nacional a instituições finan-
ceiras federais mediante a emissão direta de títulos públicos.

Principais achados: a emissão direta para financiamento de políticas públicas


tem efeitos danosos à gestão da dívida pública, uma vez que introduz incerteza e
opacidade nas decisões de oferta de títulos, com potencial de impactar o custo de
captação. A emissão direta de títulos pelo poder público, à margem do mercado
competitivo, afeta os princípios constitucionais da igualdade e da impessoalidade,
razão pela qual tais emissões necessitam de amparo constitucional, sob pena de
criar ambiente fértil para tratamentos diferenciados.

Principais entendimentos e encaminhamentos: são irregulares os contratos de


concessão de crédito firmados entre a União e suas instituições financeiras contro-
ladas e realizados por meio da emissão direta de títulos da dívida pública, com vistas
à implantação de políticas públicas setoriais ou ao aumento do capital/patrimônio
de referência da instituição financeira. Fez-se determinação à STN que se abstenha
de proceder a emissões diretas de títulos da dívida pública em favor das instituições
financeiras federais, ressalvadas as destinadas ao Bacen e as demais situações ex-
pressamente previstas em lei. Fez-se determinação ao Ministério da Economia em
conjunto com as instituições financeiras federais para que apresentem cronograma
de devolução à União dos valores recebidos em decorrência de emissões diretas.

Reserva de contingência
A reserva de contingência é especificada no artigo 5º da LRF, que esti-
pula que a forma de utilização e o montante, definido com base na RCL,
serão estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias. Ademais, é des-
tinada ao atendimento de passivos contingentes e outros riscos e even-
tos fiscais imprevistos.

A título exemplificativo, a LDO 2019, no caput do artigo 12, por sua vez, dis-
punha que a reserva de contingência corresponderia a, no mínimo, 0,2%
da RCL prevista e destinada a ser utilizada em eventos fiscais imprevistos,
referindo-se à abertura de créditos adicionais para o atendimento de des-
pesas não previstas ou insuficientemente dotadas na Lei Orçamentária.
Esta é a parte que atende à especificação da LRF.

Adicionalmente, este mesmo artigo da LDO 2019 estatuía que a lei orça-
mentária conteria reservas específicas para atendimento de programa-
ções de emendas individuais e de bancadas estaduais. Por constarem
do mesmo artigo, estas reservas específicas, embora não se destinem a
atender riscos e eventos fiscais imprevistos, foram incluídas na mesma
denominação de reserva de contingência.

A memória de cálculo da estimativa da reserva de contingência, apresen-


tada na página 49 do volume II das informações complementares à LOA
2019, estipulou reserva de contingência como o equivalente à soma de
três parcelas destinadas a atender: passivos contingentes e outros riscos
e eventos fiscais imprevistos, conforme determina a LRF; emendas parla-
mentares individuais; emendas parlamentares de bancada.

33
O valor da primeira parcela, destinada a atender passivos contingentes e
outros riscos e eventos fiscais imprevistos, foi calculado como exatamen-
te 0,2% da RCL, sendo este o valor mínimo estipulado no caput do artigo
12 da LDO.

Assim, não há conexão entre os valores estimados como riscos no


Anexo de Riscos Fiscais e os provisionados na reserva de contingên-
cia, a título de atendimento a eventos fiscais não previstos quando da
elaboração da LOA.

Desse modo, há espaço para melhoria nesse aspecto, devendo os va-


lores dos eventos apontados como riscos e quantificados no Anexo de
Riscos Fiscais serem fonte, ainda que parcial, dos que comporão a re-
serva de contingência, de modo a dar maior efetividade tanto ao Anexo
quanto à reserva, para que cumpram, de modo pleno, suas funções pre-
vistas na LRF.

Em contrapartida, a SOF ponderou que os Orçamentos Fiscal e da Se-


guridade Social apresentam déficits primários sistemáticos nos últimos
exercícios financeiros, sem perspectiva de reversão deste quadro para
os próximos anos. Ora, nesta situação, demonstra-se extremamente in-
factível a elaboração de orçamento, contendo reservas ou provisões para
eventos imprevistos. A forma como são tratadas as contingências é, por
diversas maneiras, como créditos extraordinários ou remanejamentos e
repriorizações de programações. A criação de uma reserva primária ocu-
paria um espaço desnecessário no orçamento, contribuindo para mais ri-
gidez no ambiente deficitário apresentado.

Entendeu-se pertinente a preocupação demonstrada pela SOF, conside-


rando-se as restrições orçamentárias. Entretanto, ainda que a médio prazo,
faz-se necessário que os passivos contingentes e outros riscos e eventos
fiscais imprevistos identificados e mensurados no Anexo de Riscos Fiscais
sejam refletidos, de alguma forma, nas leis orçamentárias anuais, por meio
da reserva de contingência ou outros itens a serem estabelecidos.

Acórdão: 2.937/2018-P, relator ministro. José Múcio Monteiro – Auditoria sobre


sustentabilidade fiscal.

Principais achados: a metodologia para a estimativa da reserva de contingência


é apresentada nas Informações Complementares ao PLOA e envolve percentual
sobre a Receita Corrente Líquida e provisões para atendimento de emendas par-
lamentares. O cálculo não leva em consideração, de fato, os riscos e os eventos
fiscais imprevistos, conforme especifica o artigo 5º, inciso III, da LRF, como seria
desejável para a correta gestão de riscos fiscais.

Principais entendimentos e encaminhamentos: elaboração de estudos e plano


de ação com vistas a que, futuramente, os passivos contingentes e outros riscos e
eventos fiscais imprevistos identificados e mensurados no anexo de riscos fiscais
sejam refletidos, de alguma forma, nas leis orçamentárias anuais, ainda que parcial-
mente, por meio da reserva de contingência ou outros itens a serem estabelecidos.

34
6 Melhorias Decorrentes de Ações de
Controle Externo Sobre a Gestão Fiscal

Implementação de mecanismos de avaliação de


políticas públicas
A LRF exige, como pressuposto da responsabilidade na gestão fiscal, a
ação planejada. Por sua vez, o planejamento governamental depende da
avaliação de políticas públicas, que é um processo fundamental em todas
as etapas do ciclo de política pública. A Emenda Constitucional 109/2021
incluiu o § 16 no artigo 37 e o § 16 no artigo 165, destacando a necessida-
de de que as políticas sejam avaliadas e os resultados sejam utilizados na
elaboração das leis orçamentárias.

Conforme exigido pelo artigo 228, § 2º do Regimento Interno do TCU, o


relatório que acompanha o Parecer Prévio sobre as Contas do Presidente
da República contém informações sobre o cumprimento dos programas,
o alcance de metas e a consonância com o Plano Plurianual (PPA) e com
a LDO. Em capítulo próprio, o referido relatório examina uma seleção de
programas. Desde 2013, realizam-se anualmente análises das informa-
ções de desempenho, notadamente indicadores e metas dos programas,
apontando eventuais fragilidades e sugerindo correções necessárias.

Os resultados são encaminhados ao Congresso Nacional e ao Poder Execu-


tivo como subsídio para as revisões do PPA e para o aperfeiçoamento das
políticas públicas analisadas. Informações de desempenho confiáveis, tem-
pestivas, mensuráveis e que reflitam as políticas públicas são úteis tanto para
a tomada de decisão por parte dos gestores quanto para a prestação de con-
tas à sociedade e ao Parlamento, órgão titular do controle externo.

O TCU publicou, em 2020, o Referencial de Controle de Políticas Públicas,


documento que contém um bloco sobre avaliação de políticas públicas,
com boas práticas, critérios de auditoria, questões de auditoria, itens de
verificação e matrizes de planejamento.

Na mesma linha, o Referencial de Controle de Benefícios Tributários, de


2022, estabelece critérios para avaliar o nível de maturidade de políticas
implementadas por subsídios tributários. A atuação do TCU na governan-
ça e na gestão de renúncias de receitas é de longa data. Cita-se o Acór-
dão 1.205/2014-TCU-Plenário (relator ministro Raimundo Carreiro), que
recomendou a criação de mecanismos de acompanhamento e avaliação
de benefícios sem órgão gestor definido, incluindo o cronograma e a pe-
riodicidade de avaliações, bem como a definição de objetivos, indicado-
res e metas para que os resultados pudessem ser avaliados.

35
Após diversas rodadas de monitoramento, o Acórdão 1.112/2020-TCU-
-Plenário (relator ministro Raimundo Carreiro) recomendou a efetiva insti-
tucionalização de um modelo de governança para a concessão e a gestão
de benefícios, com uma estratégia sistematizada de acompanhamento
das políticas.

Em continuidade, a EC 109/2021 exigiu Lei Complementar, para tratar de


informações de desempenho de renúncias e regras para avaliação perió-
dica dos impactos sociais e econômicos. No âmbito do Poder Executivo,
o Decreto 9.834/2019 instituiu o Conselho de Monitoramento e Avaliação
de Políticas Públicas, órgão de excelência que desenvolve avaliações de
programas financiados por gastos diretos e por desonerações fiscais.

Foram elaborados os guias práticos ex-ante e ex-post de avaliação, os


quais orientam os gestores sobre as boas práticas a serem adotadas,
buscando retroalimentar o processo de alocação de recursos públicos.

Acórdãos: 1.205-2014-P, 2.461/2015-P, 1.112/2020 e 1.515/2021.

Principal achado: Fragilidades no sistema de governança, gestão e avaliação de


políticas públicas.

Principais entendimentos e encaminhamentos: o TCU identificou falhas rela-


cionadas ao processo de avaliação de políticas públicas seja no nível central de co-
ordenação, seja na baixa maturidade da cultura de avaliações de desempenho. As
recomendações propostas induziram diversos aperfeiçoamentos na última déca-
da, os quais endereçaram as principais questões identificadas pelo controle. Ape-
sar disso, para que a alocação de recursos públicos seja efetivamente baseada em
evidências oriundas de avaliações de desempenho, faz-se necessário percorrer um
caminho desafiador, que envolve, entre outros fatores, coordenação do centro de
governo e capacitação de gestores.

Regulamentação de procedimentos sobre


a classificação de empresas estatais como
dependentes
A LRF conceitua uma empresa dependente como uma empresa controla-
da, que receba do ente controlador recursos financeiros para pagamento
de despesas com pessoal ou de custeio em geral ou de capital, excluídos,
no último caso, os provenientes de aumento de participação acionária.
As empresas não dependentes têm tratamento diverso das dependen-
tes quanto às normas orçamentárias e fiscais, razão pela qual o correto
enquadramento de uma empresa quanto à eventual dependência do ente
público se torna relevante.

Sobre a atuação do TCU na área, destaca-se o Acórdão 3.145/2011 do


Plenário, no qual foi abordado o processo de programação e execução
orçamentária do Orçamento de Investimentos das empresas estatais e
o Programa de Dispêndios Globais, bem como o Acórdão 3.561/2014 do
Plenário, que tratou da necessidade de desenvolvimento de metodologia

36
que permitisse a apuração objetiva do atributo de dependência em rela-
ção ao ente controlador.

Em novo monitoramento, o Acórdão 1.960/2017-TCU-Plenário relatou


avanço insuficiente no processo de elaboração da metodologia e deter-
minou o encaminhamento ao TCU de estudos para a referida definição.
Em resposta, o Poder Executivo elaborou o Projeto de Lei 9.215/2017, o
qual “dispõe sobre a verificação da situação de dependência e sobre o
Plano de Recuperação e Melhoria Empresarial aplicável às empresas es-
tatais federais”. No citado PL, propõe-se uma etapa prévia à classificação
da empresa estatal como dependente, visto que, uma vez incluída nos
Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social (OFSS), a empresa sujeita-se
a regras e controles rígidos que podem dificultar ainda mais o seu reequi-
líbrio econômico-financeiro.

No âmbito do processo TC 007.142/2018-8, o Tribunal desenvolveu meto-


dologia para identificação de indícios de dependência, a exemplo da utili-
zação de aportes de capital para cobrir déficit operacional.

No Parecer Prévio sobre as Contas do Presidente da República de 2018, o


TCU desenvolveu metodologia para identificar se houve utilização de apor-
tes de capital para cobrir despesas correntes. Tal análise é realizada anual-
mente, em item próprio, no capítulo de conformidade orçamentária e fiscal.

Diante da não aprovação do referido PL, até o momento, editou-se o Decreto


10.690/2021, regulamentando o processo de transição entre estatais federais
dependentes e não dependentes, com a previsão de uma proposta de plano
de reequilíbrio econômico-financeiro para empresas que se encontrassem
em determinada situação. Após a execução do plano de sustentabilidade,
ocorre a classificação da empresa como dependente ou não dependente.

Acórdãos: Acórdão 3.145/2011, 3.561/2014, 1.960/2017, 1.331/2018 e 937/2019,


todos do Plenário do TCU

Principal achado: Ausência de metodologia objetiva sobre o enquadramento de


uma empresa estatal federal como dependente da União.

Principais entendimentos e encaminhamentos: O TCU buscou induzir o desen-


volvimento da metodologia objetiva para o enquadramento de uma empresa estatal
federal como dependente da União. Diante do não avanço, determinou a realização
de estudos que culminaram no PL 9.215/2017 e na edição do Decreto 10.690/2021.
Em paralelo, o Tribunal desenvolveu metodologias a partir de contas próprias do or-
çamento de investimento das empresas estatais, para identificação de indícios de
dependência nas empresas.

37
Implementação de metodologia de análise da
Capacidade de Pagamento dos entes federados
(Capag)
A concessão de garantias em operações de crédito, as condições e os li-
mites dessas concessões pela União estão dispostos no artigo 40 da LRF
e em seus incisos e parágrafos, em combinação com o artigo 32, atualiza-
dos pela LC 178/2021. O oferecimento de contragarantias pelos entes fe-
derativos é uma das condições para a concessão de garantias pela União.
Tal requisito, no entanto, não se demonstrou capaz de afastar totalmente
o risco dessas operações.

Ademais, a despeito da exigência de aferição da capacidade de pagamen-


to do pleiteante à garantia, não havia iniciativa concreta do Poder Execu-
tivo para disponibilização de metodologia e sistema que estabelecessem
critérios objetivos de concessão de garantias pela União e que instrumen-
talizassem a avaliação da probabilidade de pagamento de dívida dos entes
beneficiados pelas garantias.

Atento à questão, o TCU destacou, no Acórdão 2.071/2014-P, os riscos


tanto para as finanças estaduais e municipais quanto da União, em apro-
var operações de crédito de entes que não apresentam capacidade de
pagamento adequada e suficiente para arcar com as obrigações assumi-
das. Levantou também a necessidade de inclusão, nos normativos que re-
gulamentam a análise da concessão de garantia em operações de crédito,
de mecanismos objetivos de impedimento da concessão de garantias aos
entes que não apresentem capacidade adequada de pagamento.

Mais que mero atendimento às exigências legais, a disponibilização de um


sistema de aferição da capacidade de pagamento sempre foi uma neces-
sidade na administração pública brasileira, para auxiliar os gestores nas
escolhas mais eficientes, acerca da aplicação dos recursos. A Portaria MF
501/2017 revogou a Portaria MF 306/2012 e definiu nova metodologia de
cálculo da capacidade de pagamento com critérios mais objetivos. Atual-
mente, a Portaria ME 5623/2022, em seu artigo 13, inciso I, dispõe que um
dos requisitos de elegibilidade para a continuidade da análise de pedido
de verificação de limite e condições de operação de crédito com garantia
da União é que o pleiteante tenha capacidade de pagamento classificada
como “A” ou “B”.

Apesar do avanço, ainda há questões a serem equacionadas, tais como


a necessidade de fazer que a metodologia se torne ferramenta cada vez
mais efetiva na evidenciação da liquidez e da solvabilidade dos pleitean-
tes, com maior interação entre os diversos sistemas da administração pú-
blica (Cadip, Sadipem, Siconfi).

38
Assim, a atuação do TCU contribuiu não apenas para a melhoria da me-
todologia de aferição da capacidade de pagamento dos entes, mas tam-
bém tem incentivado, principalmente, sua efetiva utilização pelos órgãos
federais como ferramenta de aperfeiçoamento da gestão pública.

Acórdãos: 3.403/2012-Pl (relator ministro José Jorge); 2.071/2014-Pl (rela-


tor ministro José Jorge) e 607/2015-Pl (relator ministro José Múcio Monteiro);
2.924/2018-Pl (relator ministro José Múcio Monteiro); 1.562/2020-Pl (relator minis-
tro Vital do Rego) – Sistema de Controle da Capacidade de Pagamento.

Principal achado: a LRF já vigorava havia quatorze anos, e um sistema e metodo-


logia, com vistas à melhoria dos critérios de análise de concessão de garantias pela
União previsto em seu artigo 40 e seus incisos e parágrafos, combinados com o ar-
tigo 32, ainda não havia sido devidamente instituído.

Principais entendimentos e encaminhamentos: o TCU identificou uso inadequa-


do de excepcionalização, ocasionando concessão de garantias a entes com baixa ca-
pacidade de pagamento e induziu o aperfeiçoamento da metodologia e a diminuição
de excepcionalizações que poderiam obrigar a União a honrar garantias concedidas.

Implementação de Sistema de Informações de


Custos do Governo Federal
A exigência da aferição de custos dos bens e dos serviços na adminis-
tração pública não é novidade na legislação brasileira. A Lei 4.320/1964,
ainda que mencionasse custos de “serviços públicos industriais”, já exi-
gia a apuração de contabilidade especial para esse fim. O Decreto-Lei
200/1967 ampliou essa exigência para toda a administração. O suporte
normativo posterior foi estabelecido pela LRF em 2000, no sentido de
que “a administração pública manterá sistema de custos que permita
a avaliação e o acompanhamento da gestão orçamentária, financeira e
patrimonial” (artigo 50, § 3º).

A despeito dessas exigências, não havia iniciativa concreta do Poder


Executivo para disponibilização de um sistema de custos para toda a ad-
ministração federal, que instrumentalizasse a avaliação da eficiência da
ação governamental.

Atento à questão, o TCU destacou a necessidade de disponibilização de


sistema de custos para avaliação e acompanhamento da gestão orça-
mentária, financeira e patrimonial. Em vista do não atendimento à reco-
mendação inserida em Pareceres Prévios sobre as Contas do Presidente
da República de vários exercícios, o Acórdão 3.895/2009-TCU-1ª Câmara
(relator ministro Augusto Nardes) fez determinação ao Ministério do Pla-
nejamento, Orçamento e Gestão e ao Ministério da Fazenda, visando à
implementação do referido sistema.

39
Mais que mero atendimento às exigências legais, a disponibilização de um
sistema de custos sempre foi uma necessidade na administração públi-
ca brasileira, para auxiliar os gestores nas escolhas mais eficientes acerca
da aplicação dos recursos. Desde 2010, o sistema encontra-se disponível
para uso por todos os Poderes. A Portaria STN/MF 157/2011 oficializou a
criação do Sistema de Informação de Custos (SIC), com a finalidade de
“evidenciar os custos dos programas e das unidades da administração
pública federal”. Integram o sistema, como órgão central, a STN e, como
órgãos setoriais, as unidades de gestão interna dos ministérios e da Ad-
vocacia-Geral da União (AGU). O normativo estabelece também que “as
unidades de gestão interna do Poder Legislativo, do Poder Judiciário e do
Ministério Público da União poderão integrar o SIC como órgãos setoriais”.

Em contrapartida, ainda há questões a serem equacionadas para que o sis-


tema se torne ferramenta cada vez mais efetiva na evidenciação dos cus-
tos na administração pública, como, por exemplo, melhor interação entre
os diversos sistemas da administração pública (Siafi, Siape, Siop), alocação
orçamentária e institucional da despesa com pessoal, entre outras.

Assim, a atuação do TCU contribuiu não apenas para o desenvolvimento


e a implantação do Sistema de Informação de Custos, mas também tem
incentivado, principalmente, sua efetiva utilização pelos órgãos federais
como ferramenta de aperfeiçoamento da gestão pública.

Acórdãos: 3.895/2009-1C e 3.246/2011-1C, ambos pelo relator ministro Augusto


Nardes – Sistema de Informação de Custos do Governo Federal.

Principal achado: a LRF já vigorava havia nove anos, e o Sistema de Informação de


Custos, previsto em seu artigo 50, § 3º, ainda não havia sido devidamente instituído.

Principais entendimentos e encaminhamentos: o TCU reconheceu as dificul-


dades de disponibilização do sistema de custos; foram estabelecidos dois pontos
de controle: i) apresentação da modelagem inicial do sistema ao fim de 2009; e ii)
início de sua operacionalização em junho de 2010. O monitoramento desses dois
pontos concluiu que a operacionalização do estabelecido na LRF foi atendida e que
as correções e os aperfeiçoamentos necessários ao bom desempenho do sistema
seriam feitos à medida que outros problemas, além dos comentados no processo
mencionado, fossem detectados pelos usuários.

40
Implementação do Sistema de Análise da Dívida
Pública, Operações de Crédito e Garantias da União,
estados e municípios (Sadipem)
A exigência do registro eletrônico centralizado e atualizado das dívidas pú-
blicas interna e externa de todos os entes da Federação pelo Ministério da
Fazenda foi determinada pelo § 4º do artigo 32 da LRF. O objetivo é dar amplo
acesso público aos cidadãos quanto às informações sobre encargos e condi-
ções de contratação, saldos atualizados e limites relativos às dívidas consoli-
dada e mobiliária, às operações de crédito e à concessão de garantias.

A despeito dessas exigências, não havia iniciativa concreta do Poder Exe-


cutivo para disponibilização de um sistema eletrônico centralizado que
garantisse o acesso público às informações e que instrumentalizasse a
avaliação da sustentabilidade do endividamento público federal, estadual
e municipal. A situação fiscal dos estados e dos municípios tem impacto
direto sobre a da União, que lhes concede empréstimos internos e garan-
tia nos contratos externos.

Atento à questão, o TCU destacou a necessidade de disponibilização de


sistema centralizado de endividamento público para avaliação e acompa-
nhamento da trajetória desses itens de controle. No primeiro decêndio
que seguiu à publicação da LRF, o Tribunal reconheceu a dificuldade de
implementação de um sistema único, e o órgão procedeu à implantação
paulatina, construída por vários sistemas ou módulos. Nas decisões mais
recentes, a Corte ateve-se ao aperfeiçoamento dos sistemas em con-
tínuo acompanhamento da tempestividade de atualização das informa-
ções e de sua disponibilização ao público.

Mais que mero atendimento às exigências legais, a disponibilização de um


registro eletrônico centralizado e atualizado das dívidas públicas interna
e externa pelo Ministério da Fazenda sempre foi uma necessidade na ad-
ministração pública brasileira, para auxiliar os gestores sobre as escolhas
mais eficientes acerca da aplicação dos recursos e da transparência para
a sociedade. Desde 2009, os registros exigidos encontram-se parcial-
mente disponíveis para consulta pelos cidadãos.

Atualmente, o acesso às informações dá-se por meio do portal Tesouro


Transparente, em plataforma denominada “Visão Integrada das Dívidas
da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios”, que apresen-
ta dados e consultas estruturadas com informações oriundas, principal-
mente, do Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público
Brasileiro (Siconfi) e do Sistema de Análise da Dívida Pública, Operações
de Crédito e Garantias da União, dos estados e dos municípios (Sadipem).

41
Em contrapartida, ainda há questões a serem equacionadas para que o
acesso público se torne cada vez mais efetivo com a evidenciação do en-
dividamento da administração pública, como, por exemplo, o fato de que
os encargos e as condições da dívida contratual externa federal carecem
de atualizações que permitam o acesso tempestivo do público. De igual
modo, itens que servem ao monitoramento das operações de crédito e
das garantias aos governos municipais e estaduais também precisam de
atualização e aprimoramento.

Assim, a atuação do TCU contribuiu não apenas para o desenvolvimento e


a implantação do sistema, mas também tem incentivado, principalmente,
sua efetiva disponibilização ao público pelos órgãos federais como ferra-
menta de transparência e de aperfeiçoamento da gestão pública.

Acórdãos: 1.573/2006-Pl (ministro Valmir Campelo), 451/2009-Pl (ministro Augus-


to Nardes), 2.541/2009-Pl (ministro Augusto Nardes), 806/2014-Pl, (ministro Ben-
jamin Zymler), 1.655/2017 (ministro Aroldo Cedraz),1.084/2018-Pl (ministro Aroldo
Cedraz), 1.048/2021 (ministro Aroldo Cedraz) – Sistema Eletrônico Centralizado de
Transparência do Endividamento Público.

Principal achado: a LRF já vigorava havia quatorze anos, e o Sistema Eletrônico


Centralizado de Transparência do Endividamento Público, previsto em seu artigo
32, § 4º, ainda não havia sido devidamente instituído.

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7 Conclusão
A atuação do TCU no controle externo das regras fiscais visa salvaguardar
a higidez das contas públicas em prol da estabilidade macroeconômica e
do desenvolvimento do país. O arcabouço normativo é deveras complexo,
e sua plena observância constitui verdadeiro desafio tanto para os órgãos
de gestão quanto para os responsáveis pela sua fiscalização.

Os trabalhos do TCU ora apresentados demonstram que, apesar do cum-


primento das regras fiscais e das melhorias alcançadas, ainda perma-
necem desafios para garantir a retomada do equilíbrio fiscal , condição
essencial para assegurar a trajetória sustentável da dívida pública e a ma-
nutenção da capacidade do Estado de implementar políticas públicas.

A elevação do custo fiscal da dívida coloca em risco a disponibilidade de


recursos para atender as demandas da sociedade em áreas, como educa-
ção, saúde, assistência social e infraestrutura. Além disso, a condução da
política fiscal afeta toda a economia, repercutindo sobre o nível de inves-
timento, emprego e renda do país.

Nesse contexto, regras fiscais bem desenhadas e devidamente cumpri-


das tornam-se instrumentos essenciais para buscar trajetórias sustentá-
veis de dívida e resultados fiscais, reduzindo os custos do serviço da dívi-
da e mantendo o gasto público compatível com a capacidade do Estado
de financiar-se ao longo do tempo.

Como se vê, os aprimoramentos incluem aprovação de medidas legisla-


tivas e formulação de estratégias robustas, capazes de enfrentar riscos
fiscais atuais e emergentes. Portanto, requerem atuação coordenada
entre os Poderes Executivo e Legislativo, capaz de assegurar o com-
prometimento necessário para que as regras cumpram seus objetivos e
resultem, efetivamente, na preservação da sustentabilidade do Estado
para atender as necessidades do país.

As lições extraídas de todas as discussões e casos concretos apresenta-


dos certamente contribuirão para o aprimoramento das normas de dis-
ciplina fiscal. Por sua vez, este Tribunal permanecerá vigilante e atuante,
com o intuito de promover o efetivo cumprimento dessas normas.

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Responsabilidade pelo conteúdo
Secretaria-Geral de Controle Externo (Segecex)
Unidade de Auditoria Especializada em Orçamento, Tributação e Gestão Fiscal (AudFiscal)

Projeto gráfico, diagramação e capa


Secretaria de Comunicação Social (Secom)
Unidade de Auditoria Especializada em Orçamento, Tributação e Gestão Fiscal (AudFiscal)

Tribunal de Contas da União


Secretaria-Geral da Presidência (Segepres)
70.042-900, Brasília – DF
[email protected]

Ouvidoria do TCU
0800 644 1500
[email protected]
Missão
Aprimorar a Administração Pública em benefício da
sociedade por meio do controle externo.

Visão
Ser referência na promoção de uma Administração
Pública efetiva, ética, ágil e responsável.

www.tcu.gov.br

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