Barth Etnicidade e o Conceito de Cultura
Barth Etnicidade e o Conceito de Cultura
Barth Etnicidade e o Conceito de Cultura
ISSN 1414-7378
Antropolítica Niterói n. 19 p. 1-283 2. sem. 2005
© 2005 Programa de Pós-Graduação em Antropologia e Ciência Política da UFF
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Solange Pinheiro Lisboa Luiz Castro Faria (PPGACP / UFF)
SUMÁRIO
NOTA DOS EDITORES, 7
DOSSIÊ: FRONTEIRAS E PASSAGENS: FLUXOS CULTURAIS
E CONSTRUÇÃO DA ETNICIDADE
APRESENTAÇÃO: PAULO GABRIEL HILU DA ROCHA PINTO
E ELIANE CANTARINO O’DWYER, 11
ARTIGOS
NOTÍCIAS DO PPGACP
A INTERNACIONALIZAÇÃO DO PPGA: UMA PERSPECTIVA COMPARADA, 223
RELAÇÃO DE DISSERTAÇÕES DEFENDIDAS NO PPGACP, 227
RELAÇÃO DE DISSERTAÇÕES DEFENDIDAS NO PPGCP, 247
REVISTA ANTROPOLÍTICA: NÚMEROS E ARTIGOS PUBLICADOS, 265
COLEÇÃO ANTROPOLOGIA E CIÊNCIA POLÍTICA (LIVROS PUBLICADOS), 277
PPGACP NEWS
THE INTERTIONALIZATION OF PPGA: A COMPARATIVE PERSPECTIVE, 223
THESIS DEFENDED AT PPGACP, 227
THESIS DEFENDED AT PPGCP, 247
REVISTA ANTROPOLÍTICA: NUMBERS AND PUBLISHED ARTICLES, 265
PUBLISHED BOOKS AND SERIES – COLEÇÃO ANTROPOLOGIA E CIÊNCIA POLÍTICA
(LIVROS PUBLICADOS), 277
A PRESENTAÇÃO
Ë
Professor de antropologia
na Universidade de Oslo
(Noruega) e na Boston
University (USA).
16
cam a fronteira, mas sim em todos os outros interesses que não podem
ser estruturados ao longo de uma única linha de confronto. Foi o que
Roed Larsen6 fez na sua mediação secreta entre palestinos e israelenses
para romper o impasse nas negociações. Obviamente, é muito cedo para
dizer se foi um esforço bem-sucedido, mas ainda há esperança. Em com-
paração com as negociações sobre a Bósnia7 é possível perceber uma
clara diferença. Os negociadores bósnios estavam presentes com seus
símbolos e posições contrapostas, e as negociações tentavam uni-los. Essa
técnica é oposta àquela que seria indicada pela dinâmica da etnicidade,
a qual procurei expor aqui. Por mais frágeis e pouco reconhecidos que
sejam os pontos em comum, é com eles que devemos começar, sempre
pretendendo expandi-los progressivamente mediante a exploração de
questões compartilhadas. Somente assim as dicotomias das fronteiras
étnicas podem ser superadas, por meio do foco em vidas inteiras e na
continuidade da variação cultural que atravessa a sociedade mais ampla.
ABSTRACT
This article explores the relation between ethnicity and culture. The author
argues that culture is in a state o flux that is structured and expressed in the
interactions between the social agents. This generates cultural variation
within all social groups. Therefore, ethnicity cannot be defined as cultural
stuff that is homogeneously distributed in a particular group and distributed
across generations. The existence of any ethnic group is connected to
boundaries created and maintained by power relations e processes of control,
silencing and erasing of personal experiences that escape from the cultural
model reified as its own.
N OTAS
1
Texto apresentado na Conferência “Rethinking Culture” (“Repensando a Cultura”) em 1995, na Universi-
dade de Harvard.
2
Sentinel Island.
3
Nonviolent Sanctions and Cultural Survival Seminar.
4
Inferência que não deriva das premissas; falácia [N. T.].
5
BRINGA, Tone. Being muslim the Bosnian way: identity and community in a Central Bosnian Village. Princeton:
Princeton university Press, 1995. [N.T.]
6
Roed Larsen (1947- ), diplomata norueguês e professor de filosofia e sociologia nas universidades de Oslo e
Bergen. Em 1981, Larsen fundou o Instituto de Ciências Sociais Aplicadas em Oslo, no qual lançou um
projeto de pesquisa sobre as condições de vida dos palestinos em Gaza e na Cisjordânia sob ocupação
Ë
Professor do PPGA/UFF;
Coordenador do Núcleo
de Estudos sobre o Orien-
te Médio/UFF.
32
OS CURDOS NA S ÍRIA
Os curdos constituem uma comunidade de 1,2 milhões de pessoas, sendo
cerca de 8% da população total da Síria.10 As regiões da Síria cuja mai-
oria da população é curda estão localizadas no Kurd Dagh, uma região
montanhosa entre Alepo e a fronteira com a Turquia; na região ao lon-
go da fronteira com a Turquia de Ras al-‘Ayn até Qamishli; e na parte
nordeste da Mesopotâmia Síria ou Jazira. Essas regiões curdas não pos-
suem contigüidade territorial dentro da Síria, sendo conectadas às re-
giões curdas da Anatólia. Existem também grandes comunidades curdas
em Damasco e Alepo, tendo cada uma delas uma população de 300 mil
habitantes. Essas comunidades urbanas, por estarem localizadas nos
centros político e econômico da Síria, têm um papel importante na de-
finição das formas de participação dos curdos na sociedade síria.11
As comunidades curdas de Damasco e Alepo são muito diferentes em
sua composição e dinâmica social. A comunidade de Damasco data do
período da dinastia Aiúbida (séculos XII–XIII), quando soldados curdos
foram assentados por Saladino, o fundador da dinastia, no que hoje são
os bairros da Salihiyya e Hayy al-Akrad. Embora os curdos de Damasco
tenham mantido sua identidade étnica, a distância do Curdistão12 favo-
receu a sua integração cultural na sociedade damascena. Tal fato pode
ser visto na adoção do árabe como língua franca da comunidade em
contextos públicos e, mesmo, privados.13
Os curdos tiveram uma presença significante em Alepo desde o perío-
do Otomano (séculos XVI–XX), quando tribos e famílias curdas se ins-
talaram em seus subúrbios (RAYMOND, 1998, p. 48). Atualmente Alepo
é a segunda maior cidade da Síria com cerca de 2 milhões de habitan-
tes, sendo a capital da província (muhafaza) do mesmo nome e um im-
portante centro industrial. A economia de Alepo é baseada na indústria
têxtil e alimentícia, comércio e serviços. A importância econômica de
Alepo e sua posição geográfica geraram um grande fluxo migratório
das áreas de maioria curda na Síria, criando uma comunidade curda
que permanece conectada às suas origens rurais. Assim, as identidades
ação de novas zawiyas nos bairros curdos. Essas zawiyas podem ser clas-
sificadas em três tipos: a) comunidades urbanas criadas em torno de
shaykhs carismáticos locais; b) comunidades urbanas subordinadas a
zawiyas rurais criadas por shaykhs que seguiram a migração dos membros
de sua comunidade para Alepo, ou mandaram seus representantes (khalifas);
c) ramos locais de redes sufis centralizadas sob a autoridade de um shaykh,
com conexões hierárquicas e horizontais que cobrem um vasto território.
Enquanto o primeiro tipo de zawiya cria a possibilidade da criação de um
sufismo curdo “alepino”, os outros dois tipos conectam o universo reli-
gioso de Alepo com as áreas curdas da Síria, adicionando uma dimen-
são religiosa aos múltiplos laços que existem entre essas áreas.
Esses diferentes tipos de organização religiosa sufi não devem ser vistos
como estruturas estáticas, mas sim como configurações possíveis em um
processo dinâmico e contínuo de produção e reprodução das comuni-
dades sufis. Por exemplo, se um shaykh tem khalifas (representantes) em
diversos lugares, sua autoridade religiosa pode adquirir uma dimensão
translocal. Posteriormente, esses khalifas podem criar novas zawiyas, e
ele pode se tornar o elo central em uma rede sufi. Por outro lado, se
uma rede se torna grande demais, o controle dos shaykhs subordinados
pode se tornar inviável, e estes podem se separar da rede, criando re-
des menores. Da mesma forma, se o shaykh supremo morrer ou perder
sua atração carismática, a rede pode se fragmentar em comunidades
locais completamente autônomas. Essas comunidades locais, por sua
vez, podem permanecer como tal, começar novos processos de expan-
são, ou, eventualmente, desaparecer.
Os shaykhs sufis nas áreas rurais tendem a ter sua autoridade totalmen-
te reconhecida na comunidade onde residem, mas nos centros urbanos
das regiões curdas da Síria existe uma pluralidade de shaykhs em com-
petição para angariar seguidores para além das divisões tribais e da classe
social. Alguns desses shaykhs conseguem se tornar líderes religiosos em
uma escala regional ou, mesmo, transnacional como shaykh Naqshbandi
Ahmad Khaznawi, que tinha seguidores por toda a Jazira Síria e
Curdistão turco. O centro mais importante da Qadiriyya no Curdistão
sírio é ‘Amuda, onde nada menos que 30 shaykhs ligados a esta ordem
tinham as suas zawiyas nos anos 1930 (BRUINESSEN, 1992, p. 254).
Enquanto o número de shaykhs ativos em ‘Amuda se reduziu bastante
nas décadas subseqüentes, esta cidade ainda é um importante centro
religioso e atrai peregrinos e visitantes de todo o norte da Síria. Outro
centro religioso importante é ‘Afrin, no qual está localizada a zawiya do
sufismo até uma noite em que, segundo seu relato, viu Ali em um so-
nho e decidiu dedicar-se à vida religiosa. Então, shaykh Yasin reuniu
alguns amigos e começou a pregar e a liderar sessões de dhikr, revivendo
seu passado sufi de modo a legitimizar sua nova autoridade religiosa.
Em pouco tempo, outras pessoas se juntaram ao grupo, e ele fundou
uma zawiya.
Hoje em dia, shaykh Yasin tem cerca de 100 seguidores, 20 dos quais são
seus discípulos (murids), que freqüentam regularmente as hadras na sua
zawiya toda quinta-feira à noite. Os membros da zawiya de shaykh Yasin
são todos curdos, e geralmente, ou vivem em Alepo há muito tempo,
ou nasceram lá. A maior parte dos discípulos e seguidores de shaykh
Yasin vivem na Ashrafiyya e trabalham como empregados na indústria,
no comércio ou na construção civil. Alguns dos discípulos são professo-
res ou empregados na burocracia estatal. Shaykh Yasin dedica a maior
parte de seu tempo à zawiya, embora também tenha uma quitanda de
frutas e verduras na Ashrafiyya, que é gerenciada por um de seus fi-
lhos. Além disso, ele recebe doações em bens e dinheiro de seus segui-
dores.
O dhikr (evocação mística da presença de Deus) semanal é o principal
ritual coletivo da zawiya, sendo a ocasião na qual toda a comunidade se
reúne sob a liderança de shaykh Yasin. O ritual começa após a oração
noturna de ‘isha’ com uma curta recitação do wird (fórmula mística) da
ordem Qadiriyya, que é seguida pela saudação do shaykh por parte dos
participantes, que se posicionam de pé formando círculos concêntricos
em torno dele. Aqueles entre os discípulos de shaykh Yasin que estão
mais avançados no processo de iniciação sufi ocupam os lugares mais
próximos do shaykh, e os meros participantes no ritual ficam em posi-
ções mais distantes dele, fazendo com que a disposição espacial dos
participantes reflita sua posição na hierarquia religiosa da comunida-
de. O dhikr começa com a recitação de “la ’ilah ’ila Allah”, acompanhada
de movimentos corporais da esquerda para a direita, cadenciados pelo
ritmo dos tambores e címbalos. Em seguida, cantam-se canções em
kurmanci sobre o Profeta e o amor de Deus. Quando os cantores reali-
zam uma performance particularmente bonita ou emocional, alguns
dos participantes do ritual exclamam “Allah” ou “Ya Khuda” (Ó Deus).
Após uma hora de canto, as luzes são apagadas, dando início à parte
mais emocional do dhikr. Os participantes deixam-se envolver pelo flu-
xo de emoções e sensações causadas pelos movimentos corporais para a
frente e para trás, enquanto os cantores entoam versos sobre o amor e
a beleza de Deus. Após uma hora de entrega sensorial, as luzes são
ABSTRACT
This article analyzes the role of Sufism in the constitution of ethnic and
nationalist identities among the Kurds in Syria. The central role of religious
leaders, such as the Sufi shaykhs, in the cultural codification that served as
basis for Kurdish ethnicity, allowed the emergence of a Kurdish religious
nationalism in the twentieth century. The author explores the tensions between
the universalistic ethos of Islam and the particularistic character of ethnic
and nationalist identities among the Kurds in Syria, highlighting the
discursive and practical strategies used to “ethnify” Sufism as “Kurdish
Islam”.
R EFERÊNCIAS
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N OTAS
1
Cerca de 70% dos curdos são muçulmanos sunitas (BRUINESSEN, 1992, p. 23-24).
2
Existe também uma comunidade de judeus curdos que vivia no Curdistão iraquiano, principalmente nas
cidades de Zakhu, Arbil e Suleimaniya. Os membros dessa comunidade imigraram para Israel entre 1948
e 1952, onde muitos deles ainda conservam sua identidade curda. Os cristãos que viviam no Curdistão
nunca foram considerados curdos, mesmo quando falavam dialetos curdos, sendo classificados a partir de
categorias étnico-religiosas, como armênios, assírios, siríacos ou nestorianos. Ver Bruinessen, (1999) e
McDowall, (2000, p. 10-13).
ANTROPOLÍTICA Niterói, n. 19, p. 31-61, 2. sem. 2005
59
3
A narrativa de “secularização” pode ser vista em Ahmed (2001), Blau (1990), McDowall (2000). Um quadro
mais nuançado do papel da religião na constituição das identidades curdas pode ser visto na obra de antro-
pólogos que fizeram trabalho de campo entre os curdos, por exemplo, Martin van Bruinessen (1999).
4
Para o uso de símbolos islâmicos na mobilização nacionalista na Síria após o fim do Império Otomano, ver
Gelvin (1998).
5
Este processo não é limitado à Síria, pois a expressão de religiosidade também é um importante marcador
cultural entre os curdos sunitas da Turquia. A dinâmica da etnicidade curda deve ser compreendida em
relação aos vários contextos que se articulam a ela, tais como as sociedades local e nacional onde cada grupo
se insere, os discursos transnacionais sobre a identidade curda que são veiculados pela mídia e pelos parti-
dos políticos, assim como o fluxo de pessoas e idéias através das redes de imigração e laços familiares que
conectam as comunidades curdas no Oriente Médio à diáspora curda na Europa e nos EUA. Os processos
políticos e sociais que se desencadearam no Curdistão iraquiano desde a invasão e ocupação do Iraque por
forças anglo-americanas em 2003 também são de extrema relevância para os processos identitários dos
curdos em geral. O Curdistão iraquiano é visto por muitos curdos como o local para a possível concretização
das suas aspirações por independência ou, ao menos, ampla autonomia. Porém, muitos dos meus infor-
mantes curdos na Síria expressaram desconforto com o fato de que tais realizações tenham sido alcançadas
por meio de uma aliança estratégica dos curdos iraquianos com os EUA, que sempre apoiou as políticas
militaristas e repressivas da Turquia e de Israel.
6
A transliteração das palavras árabes segue uma versão simplificada do sistema do International Journal of
Middle East Studies.
7
Cf. Blau (1990, p. 372-377); Bruinessen (1999, p. 13-14).
8
Os dados etnográficos analisados neste artigo foram colhidos duante meu trabalho de campo em Alepo e
no Kurd Dagh, na Síria, de 1999 a 2001, e em um mês de pesquisa em maio de 2002.
9
Para o conceito de disciplina, ver Asad (1986, 1993).
10
A Síria possui 17 milhões de habitantes.
11
Cf. McDowall (2000, p. 466-467); Van Dam (1996, p. 1).
12
O termo “Curdistão” (kurdistan) já era usado por geógrafos árabes parta designar as áreas habitadas por
tribos curdas. Antes do século XIX, o termo “kurdi” era usado para designar os membros de tribos nômades
(MCDOWALL, 2000 p. 6-7). Nos séculos XIX e XX, houve um esforço por parte de intelectuais informados
pelas ideologias nacionalistas européias no sentido de selecionar e objetificar alguns traços culturais, como
a língua, os trajes típicos e a memória coletiva, que foram aglutinados em torno dessa categoria, transfor-
mando-a em um “significante étnico”.
13
Cf. Bottcher (1998, p. 129); MacDowall (2000, p. 466-467).
14
Kurmanci é o dialeto falado pelos curdos da Síria, Turquia e em partes do norte do Iraque (BRUINESSEN,
1992, p. 21-22).
15
Enquanto outras minorias étnicas e religiosas, como os armênios, podem ter educação em sua própria
língua, escolas curdas são proibidas na Síria. Entretanto, em um efeito irônico do baixo grau de investimento
estatal nas regiões curdas, a falta de professores nas escolas públicas permitiu que membros das comunida-
des locais se organizassem e passassem a ensinar o currículo em língua curda.
16
Devido à sua importância na afirmação das identidades étnica e nacional entre os curdos, as celebrações do
New Ruz adquiriram um caráter político. Essas festividades são geralmente toleradas pelo governo sírio,
embora elas sejam alvo de repressão violenta em períodos de tensão entre o Estado e os movimentos
curdos.
17
Cerca de 25% da população de Alepo é composta de cristãos ligados a várias igrejas – Ortodoxa, Melquita,
Maronita, Assíria, Siríaca, Católica, Protestante etc. – e identidades étnicas, armênia, árabe, siríaca etc.
18
O investimento curdo nessa estratégia fica mais evidente quanto se sabe que os cristãos de Alepo não
apreciam a crescente presença curda em bairros onde eram ou são maioria. Tal fato é particularmente
evidente entre os armênios, muitos dos quais descendem dos sobreviventes do Genocídio Armênio ocorrido
durante a Primeira Guerra Mundial, e lembram com ressentimento o papel dos curdos nos massacres que
dizimaram 75% da população armênia, assim como a de outras comunidades cristãs como os nestorianos, na
Anatólia.
Ë
Diretora de pesquisa no CNRS,
Centro de Estudos sobre a Reli-
gião e Cultos afro-americanos
(CERCAA). L aboratório de
Etno-logia e Sociologia Compa-
rativa MAE – Universidade de
Paris.
64
Como F. Ortiz, Nina Rodrigues (1900) publicou uma obra que preten-
dia ser uma “contribuição para a solução do problema da raça negra na
América portuguesa”, participando, assim, “da elucidação das graves
questões sociais relativas ao nosso destino de povo em via de formação”.
A compreensão das culturas africanas que tinham contribuído para a
formação da identidade nacional brasileira era, pois, indispensável para
determinar a posição ocupada pelo Brasil na comunidade internacio-
nal. A referência aos Estados Unidos era bem evidente, e Nina Rodrigues
(1900, p. VII) escrevia em sua introdução:
Essa afirmação permite que G. Freyre – assim como, antes dele, Nina
Rodrigues – negue a predominância dos banto que tinha sido reiterada
ao longo de todo o século XIX. A presença de negros de cultura “supe-
rior” metamorfoseia-se então, em um sinal diacrítico que mostra uma
“superioridade” brasileira em face do seu grande irmão do Norte, os
Estados Unidos:
Fique bem claro, para regalo dos arianistas, o fato de ter sido o Brasil
menos atingido que os Estados-Unidos pelo suposto mal da “raça
inferior”. Isto devido ao maior número de fula-fulos e semi-hamitas
– falsos negros e, portanto, para todo bom arianista, de stock superior
ao dos pretos autênticos – entre os emigrantes da África para as plan-
tações e minas no Brasil (FREYRE, 1943, p. 481).
Gilberto Freyre parece encontrar em um critério estético e sexual as
razões dessa particularidade brasileira: se nas colônias inglesas o escra-
vo tinha sido selecionado em função de sua força física para o trabalho
no campo, a colonização negra do Brasil fora influenciada por outras
necessidades, tal como a falta de mulheres brancas. Então, as negras
mina11 e fula (peul), “africanas não só de pele mais clara, como mais
próximas, em cultura e ‘domesticação’, dos brancos”, tinham sido as
amantes mais procuradas pelos colonos portugueses (FREYRE, 1943,
p. 483). A contribuição civilizadora desses escravos provenientes de áreas
de cultura negra “mais adiantada”, torna-se, pois, um elemento nobre
na colonização do Brasil: longe de terem sido apenas “animais de tra-
ção e operários de enxada”, esses negros “superiores” tinham desem-
penhado no Brasil uma verdadeira função civilizadora (FREYRE, 1943,
p. 485).
Entretanto, na medida em que o negro islamizado representava um
elemento civilizador “nobre” no processo de formação do povo brasilei-
ro, esta mesma “nobreza” foi igualmente atribuída, por contato, a ou-
tros negros. Todos os negros sudaneses e, sobretudo, os nagô, partici-
pavam desta “superioridade”. Não tinham eles colaborado ativamente
na revolta dos malê de 1835? Desse modo, Gilberto Freyre, como Nina
Rodrigues, ressaltava a importância da influência exercida pelos fula e
pelos hauçá muçulmanos sobre os ioruba ou nagô e sobre os ewe ou
jêje (FREYRE, 1943, p. 490).
Os malê tinham sido exterminados ou deportados para a África após as
rebeliões de escravos do início do século XIX. Serão, pois, os ioruba
que se tornarão os depositários desta “superioridade”. Freyre dedica-
se, então, a buscar as influências muçulmanas sobre os cultos de origem
africana, bem como sobre o catolicismo popular (FREYRE, 1943, p.
491-496). Se não era possível afirmar a predominância dos ioruba no
nível quantitativo sobre a totalidade do território brasileiro, sua supos-
ta predominância cultural permitia, por outro lado, eclipsar o espectro
de uma origem africana (a origem banta) que não era tida em alta con-
sideração:
OS RESISTENTES E OS SUBMISSOS
OS SACERDOTES E OS FEITICEIROS
O fato é que os bantos foram sempre apreciados por sua força física,
sobretudo por sua resistência ao trabalho e por suas qualidades de
agricultores. Enquanto o fon, os ioruba, os mina eram escolhidos como
“escravos domésticos” e se encontravam de maneira relativamente
numerosa nas cidades, a maioria dos bantos constituía-se de “escra-
vos do campo”, permanecendo nas plantações, onde, como já disse-
mos, era muito mais difícil reconstituir as “Nações” do que nas zonas
urbanas. Por outro lado, os bantos (e essa era uma das razões pelas
quais eram apreciados pelos brancos) mostravam-se mais permeáveis
às influências exteriores; compreendiam que sua cristianização ou
sua ocidentalização lhes permitiria, numa sociedade onde os mode-
los europeus eram o critério dos comportamentos, uma mobilidade
vertical que sua resistência cultural, por outro lado, podia compro-
meter. Deve-se acrescentar que esta cristianização foi facilitada pelo
fato de que as religiões bantos não constituíam “sistemas” tão bem
organizados como os das religiões sudanesas ou guineanas. A base
era o culto dos antepassados; ora, como dissemos freqüentemente, a
escravidão quebrava e dispersava as linhagens, tornando impossível
esse culto da descendência (BASTIDE, 1974, p. 101).
Essa oposição entre os banto, escravos das fazendas, e os ioruba, escra-
vos domésticos, é posta em causa por vários testemunhos da época co-
lonial, o que suscita algumas interrogações. Por que os senhores te-
riam preferido como escravos domésticos os africanos menos “permeá-
veis” à sua cultura, mais “insubmissos”, ou seja, os fon, os ioruba e os
mina? Além disso, se os banto ficaram concentrados no campo, onde
sabemos que a evangelização nunca foi muito ativa, como foram eles
capazes de compreender que a cristianização era a fonte de uma “mobi-
lidade vertical”? Na realidade, se as confrarias religiosas dos negros são
uma criação urbana, “lugar de concentração dos escravos ioruba”, essa
“ocidentalização” pelo viés da cristianização devia então ser deles, e não
dos banto. Enfim, a maioria dos cultos de origem africana tende a re-
criar o culto dos ancestrais, sejam eles banto ou ioruba.21
Para R. Bastide, se os banto são mais “permeáveis às influências exter-
nas”, eles são, em conseqüência, os mais atraídos pelo sincretismo, um
sincretismo marcado pela acumulação de elementos heteróclitos. Trata-
se, portanto, de um sincretismo mágico, e não religioso, caracterizado,
termo palo monte faz referência aos cultos congos em Cuba, ele também
inclui, para Barnet, todos os rituais de feitiçaria dos demais cultos
(BARNET, 1995, p. 99). A preparação das ngangas ou prendas23 com os
ossos de um morto ou com a terra das sepulturas é uma característica
do palero que, segundo a explicação de um antigo escravo quilombola
(de origem ioruba), pode ser “cristão” ou “judeu”, trabalhar para o
bem ou para o mal: “[...] entre o congo judeu e o cristão não havia
trato. Um era o bom e o outro era o mau. Isso continuou na mesma
Cuba. O lucumí e o congo também não se davam. Tinham a diferença
entre os santos e a bruxaria” (BARNET, 2000, p. 40). A Regla Conga, o
ritual de origem banta, está, pois, definitivamente identificada com a
feitiçaria e a influência congo na santería limita-se à assimilação de um
saber ritual ligado à magia (LACHATAÑERÉ, 1942).
Na realidade, a “feitiçaria” dos congo, a despeito de sua utilização pelos
santeros, funciona como uma real categoria de acusação no universo
religioso afro-cubano, reproduzindo o mesmo discurso que encontra-
mos nos cultos afro-brasileiros (CAPONE, 1999a). Desse modo, o mo-
delo de culto de origem ioruba torna-se central na constituição de um
continuum cultural, em que as contribuições bantas são reorganizadas
sob o signo da “africanidade” encarnada pelos ioruba: “[Em Cuba] Of
all the tributaries, only the Yoruba tended to be remembered as ancestral; all
innovation and change were fitted into it” (BRANDON, 1993, p. 162).
Essa valorização da cultura ioruba tem-se tornado hoje um dos traços
fundamentais do movimento de reafricanização, sempre mais forte no
Brasil e nos Estados Unidos. Esse movimento reinterpreta a história
dos escravos negros em termos de resistência, encarnada pelos ioruba
transformados em “heróis na grande luta pela liberdade” (MURPHY,
1988, p. 116). Mas essa resistência não pode ser posta em ação sem uma
adaptação paralela: “This experience with urbanism, pluralism, and theological
flexibility gave the Yoruba unique resources for regaining their spiritual equilibrium
amid the culture shocks of the New World” (MURPHY, 1988, p. 106). Esse
imaginário de “resistência-adaptação” é comum aos movimentos de
reafricanização americano e brasileiro. Assim, a mesma “flexibilidade”
que antes era uma das causas da perda das tradições dos banto se
metamorfoseia em uma das características principais do tradicionalismo
ioruba.
*
Vimos que a oposição entre cultos bantos e cultos iorubas, transforma-
da hoje em uma espécie de dogma nos estudos afro-americanos, tem
cia dos akan. Hoje, os chefes do culto akan, tais como Nana Okomfo
Korantemaa Ayeboafo, da Filadélfia, ou Nana Yaa Nkromah Densua,
de Maryland, reconhecem a supremacia do “rei dos ioruba da Améri-
ca”, Adefunmi I, que reina em Oyotunji Village, um vilarejo africano
construído no interior da Carolina do Sul (CAPONE, 2005).
Também Nana Korantemaa, chefe do Asona Aberade Shrine, um dos
primeiros centros de culto akan fundado nos Estados Unidos, garante
os laços com a África e seus representantes na diáspora. Ela passou sete
anos – número simbólico por excelência – em Gana, no Akonnedi Shrine,
onde aprendeu, entre 1976 e 1983, a língua, as tradições e “o protocolo
dos reis e das rainhas akan” sob a tutela de Okomfohene Akua Oparebea,
considerada a mãe da espiritualidade dos “akan” nos Estados Unidos.
Ela é também um dos mais novos membros da mais antiga confraria
negra das Américas, a Irmandade da Boa Morte da Bahia, de origem
jêje-nagô. Essa confraria constitui o símbolo da luta dos descendentes
de africanos para a preservação de suas tradições: as fundadoras do
primeiro terreiro de candomblé do Brasil, o terreiro do Engenho Ve-
lho de nação ketu, teriam sido, de fato, oriundas desse mesmo grupo
no início do século XIX (VERGER, 1981, p. 28). Ao se vincular a esse
grupo prestigioso, Nana Korantemaa tem assim se colocado na fonte
das religiões de origem africana em terra americana.
As religiões da África ocidental, sejam elas akan, fon ou ioruba, consti-
tuem um laço forte entre os descendentes de africanos no seio da
diáspora. Por isso, a observação comparativa dos domínios afro-brasi-
leiro, afro-cubano e afro-americano (Estados Unidos) revela-se, em nos-
sos dias, particularmente fecunda. A valorização da origem ioruba em
relação às demais, reafirmada ao longo dos estudos afro-americanos,
tem levado os negros americanos a se identificarem com a cultura e a
religião ioruba. Uma valorização que tem sua origem numa herança
evolucionista, considerada hoje como um fato consumado, incontestá-
vel, e cujo caráter de construção cultural merece ser ressaltado.
ABSTRACT
This article analyzes the constitution of the scientific discourse about the
Afro-American cults based on the opposition between traditional (ioruba)
and syncretistic (banto) cults. This opposition was informed by the dominant
racial stereotypes that shaped the emergence of the Afro-Brazilian and Afro-
Cuban studies at the end of the nineteenth century. The imaginary about
the various African populations that were brought to America informed the
R EFERÊNCIAS
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N OTAS
1
Este artigo é uma versão atualizada do texto original francês: “Entre Yoruba et Bantu: l’influence stéréotypes
raciaux dans les études afro-américaines”, publicado em 2000 nos Cahiers d’études africaines , [S.l.], v. 157, p.
55-77.
2
Beatriz Góis Dantas (1988) tem analisado a valorização do modelo ioruba ou nagô durante os anos 1930,
época da organização dos primeiros Congressos afro-brasileiros. J. Lorand Matory (2005, p. 13-14) critica
a análise de Dantas por ela ter enfatizado a influência de “local Euro-American elites” na invenção das tradições
afro-brasileiras, deixando de lado a “agency” dos iniciados nas religiões afro-brasileiras. Este autor substitui,
assim, a influência das elites intelectuais “euro-americanas” (designação que me parece particularmente
discutível no que diz respeito a intelectuais baianos como Edison Carneiro ou Arthur Ramos) por aquela de
outras elites, desta vez “afro-americanas”, que, graças a suas viagens entre o Brasil e a Nigéria, contribuíram
para a formação de redes comerciais e religiosas no espaço chamado “Atlântico negro” (GILROY, 1993). Em
outro trabalho (CAPONE, 1999a), tenho analisado o processo de construção do modelo dominante de tradi-
ção no candomblé como sendo o resultado de uma dupla “agency” que responde aos interesses de vários
atores: as elites religiosas dos terreiros nagôs e os antropólogos/iniciados que validaram cientificamente este
modelo.
3
Em 1815, o antropólogo francês Cuvier já via nos hotentote o elo perdido entre o macaco e o homem. Por
ocasião da morte de Saartjie Baartman, uma mulher queniana trazida da África do Sul em 1810 e exibida
como curiosidade nas praças da Inglaterra e da França sob o pseudônimo de Vênus hotentote, Cuvier
retirou seu cérebro e seus órgãos genitais e conservou-os em vidros que permaneceram expostos no Musée
de l’Homme de Paris até cerca de 15 anos atrás. Cf. FAUVELLE-AYMARD (1999).
4
Rui Barbosa era o ministro da Economia da jovem República brasileira. Diante da pressão dos proprietários
de escravos que demandavam com insistência uma indenização, Rui Barbosa promulgou o Decreto nº 29 de
13 de maio de 1891, ordenando a destruição de todos os documentos que provassem a propriedade de
escravos, exatamente três anos após a abolição da escravatura.
5
O termo “sudanês”, assim como o termo “banto”, provêm dos estudos lingüísticos de Wilhelm-Heinrich
Bleek de 1858, trabalhos retomados e atualizados 100 anos mais tarde, por Malcolm Guthrie e Joseph
Greenberg. Seguindo o modelo das línguas indo-européias, esses dois autores classificaram as línguas africa-
nas em várias famílias, entre as quais se incluíam as línguas sudanesas e as línguas bantas. Estes dois grupos
lingüísticos acabaram designando os povos africanos que falam estas línguas. Assim, no Brasil, os nagô (ioruba)
ou os jêje (fon) classificaram-se no grupo sudanês, enquanto os angola, congo ou cassanje fazem parte do
grupo banto.
6
Nina Rodrigues (1988, p. 215) explica assim a “lei de Ellis”: “Esta lei assim exemplificada e posta em evidên-
cia por A. Ellis para os povos negros da Costa dos Escravos dá a razão psicológica da preponderância adqui-
rida no Brasil pela mitologia e culto dos jêjes e iorubanos, a ponto de, absorvendo todos os outros, prevalecer
este culto quase que como a única forma ritual organizada dos nossos negros fetichistas. […] na influência
recíproca que exerceram uns sobre os outros os diversos povos negros acidentalmente reunidos na América
pelo tráfico, se havia de fazer sentir poderosa a ação absorvente das divindades de culto mais generalizado
sobre as de culto mais restrito, [a Lei de Ellis], nestes casos, se manifesta como lei fundamental da difusão
religiosa.”
7
No primeiro volume de sua obra consagrada aos negros cubanos, Ortiz (1995) utiliza abundantemente os
dados africanos fornecidos pelos estudos de Bowen e Ellis para falar do culto lucumí (ioruba) em Cuba.
Assim, a África ajuda a pensar a América.
8
Essa prática de procurar os dados que faltam em outras religiões “irmãs” continua na atualidade. Assim,
quando R. Bastide (1958, p. 136) não dispunha de dados brasileiros, utilizava os mitos transcritos por
Ë
Professora do Departamen-
to de Antropologia e do
Programa de Pós-Gradua-
ção em Antropologia da
UFF; Coordenadora do
Grupo de Estudos Amazô-
nicos – UFF/CNPq.
92
contou a sua mulher que foi levado ao fundo do rio, para conhecer um
hospital no qual os peixes o ensinaram a prescrever remédios, sem a
ajuda dos doutores brancos da cidade. Dizia para a mulher: “Maria, o
outro mundo é muito bonito. Só que a gente não pode ficar lá, só se
criar guelra.” Assim, consideram que Chico Melo aprendeu remédios
para lepra, para o câncer e uma série de doenças. Era famoso também
por descobrir o paradeiro das pessoas e agir para que mudassem seus
destinos e voltassem para o convívio das famílias.
Desse modo, este “imbricado complexo de terras e direitos” (REVEL,
1989, p. 103) é simbolicamente construído como um território unifica-
do sob o controle de uma população, por meio dos seus “sacacas”. Pode-
se dizer que esse tipo de conhecimento deles do território, dos seus bens
e seres naturais, atribuídos pelos membros dos grupos “remanescentes
de quilombo”, assim como os grandes deslocamentos espaciais dos
“sacacas” (Balduíno era visto crivando os pés nas águas do rio na veloci-
dade atual das chamadas lanchas “voadeiras”) e sua prática itinerante
permitem, ao mesmo tempo, a produção de um único território per-
tencente às “comunidades remanescentes de quilombo” do Trombetas
e Erepecuru-Cuminá, e da legitimidade do domínio que sobre eles rei-
vindicam e, de fato, exercem.
A crença em mundos paralelos habitados por seres sobrenaturais e o
domínio desse espaço adquirido pelos “sacacas”, inclusive no aprendi-
zado sobre o uso dos recursos naturais e das potências que lhes ultra-
passam em suas práticas terapêuticas, permite a construção do territó-
rio como uma totalidade simbólica, que define as fronteiras do grupo.
Assim, os “aspectos fundiários” são igualmente transpostos na delimita-
ção de um território por “códigos culturais específicos” (OLIVEIRA,
1998, p. 9, 17). As referências a um tempo histórico e mítico fazem de
imponentes paredões altos e talhados a pique na beira do rio Erepecuru
– como o Barracão de Pedra –, um monumento do passado, marco
memorial inscrito no espaço que os define como “comunidades
territoriais fortemente enraizadas” (REVEL, 1989, p. 165).
Á FRICA NO B RASIL ?
Tal visão sobre a pouca contrastividade cultural e continuidade no tem-
po dos quilombos no Brasil em contraposição à América Latina pode
estar referida ao paradigma africano das etnias, como vimos, e também
à herança de culturas negras originárias no Novo Mundo, representa-
da pelos “africanismos sobreviventes no Brasil” (RAMOS, 2005, p. 15-
16). Do ponto de vista dos estudos empreendidos por Nina Rodrigues
e Roger Bastide, a persistência das culturas africanas no Brasil, no caso
das chamadas comunidades negras rurais, tem sido contestada, inclusi-
ve, no domínio religioso, pois, segundo esses autores, “os quilombos
não apresentavam qualquer elemento sociocultural que evocasse as so-
ciedades africanas, nem mesmo um eco dos seus sistemas religiosos,
diferentemente do que era observado nos cultos de possessão” (BOYER,
2002, p. 101). Assim, enquanto
C ONSIDERAÇÕES F INAIS
Por fim, gostaríamos de sugerir que essa busca pelas diferenças que
fazem toda diferença pode estar relacionada ao próprio campo de cons-
tituição da disciplina antropologia, herdeira de significados que prece-
deram sua formalização, como aquele do savage slot, temática constitutiva
do próprio ocidente, segundo Trouillot (1991), que deve ser recusada
pela prática antropológica de hoje.
Assim, o destino rebelde dos saramaka do Suriname, dos palenques da
Colômbia e, por que não, dos quilombolas no Brasil pode contribuir
para a construção de uma “antropologia do presente, uma antropolo-
gia do mundo em mudança e suas histórias irredutíveis”, afastada de
qualquer pressuposto dos quilombos como o lugar de uma “fenda sel-
vagem”, que termina por negar a especificidade da diversidade.
ABSTRACT
This article analyzes the emergence of ethnic among the groups that claim
recognition from the Brazilian state of their rights over the teritory where
they live based on the Constitution of 1988. The analysis interrogates about
the use of the category “descendants of quilombo”. This identity based on a
supposed common origin is assumed by the groups that orient their actions
by the constitutional precepts (article 68 of the ADCT). These identity dy-
namics have raised debates in the anthropological field in Brazil and abroad
about issues of cultural differences and the reification od differences in
contrast to the construction of ethnicity by social agents.
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N OTAS
1
Oficialmente, o governo brasileiro tem mapeado 743 comunidades remanescentes de quilombos, segundo
dados de 2003. Atualmente dizem que são mais de 2 mil. Essas comunidades ocupam cerca de 30 milhões de
hectares, com uma população estimada em 2 milhões de pessoas, sendo que, em 15 anos, apenas 71 dessas
áreas foram tituladas (ALMEIDA, 2005, p. 17).
Porém, o que mais distingue esses que não possuem qualquer vínculo
associativo/sindical é a filiação partidária e, particularmente, a maior
quantidade de troca de partido. Em relação à atual filiação (2005), a
associação mais intensa é com o PFL e o PP, entre outros, e o contrário
ocorre com o PT (7,1% contra 12,2% do universo total). Isso significa,
em primeiro lugar, que o problema das relações entre engajamento
associativo e filiação partidária depende do tipo de partido político,
aliás, o que foi constatado também para a França no período do gover-
no socialista (GAXIE; OFFERLÉ, 1985). Em segundo lugar, isso tam-
bém mostra que a tendência do reforço do capital político “associativo”
está diretamente associada com a expansão do PT, principal aglutinador,
em termos partidários, dos portadores desse tipo de recurso.6 Além
disso, no que tange à troca de partidos, somente uma quarta parte
(25,1%) possui apenas uma filiação partidária em seu respectivo traje-
to, contra quase a terça parte do universo total (31,3%). Os que não
possuem vinculação associativa/sindical se concentram, em termos pro-
porcionais, particularmente, na faixa de cinco filiações (11,5% contra
7,4% do universo total) e naquelas acima.
dor e de uma deputada estadual pelo Piauí, ele também teve um trajeto
composto pela ocupação de cargos públicos, atividades empresariais e
de dirigente de associações/sindicatos de empresários. Por um período
de cerca de 20 anos, foi presidente da federação das indústrias daquele
estado e participou da diretoria de uma série de organizações em âmbi-
to estadual e nacional (como a vice-presidência da Confederação Nacio-
nal da Indústria). Ou seja, não apenas a condição de empresário, mas
também aquela de dirigente de grupos de interesse empresariais são
interdependentes e podem-se confundir com aquela de herdeiro polí-
tico.
À primeira vista, esse padrão teria mais afinidade com a região nordes-
tina e, de fato, pelo menos para o universo em pauta, há uma maior
quantidade de “clãs políticos” que, em geral, incorporam atividades em
associações/sindicatos de empresários. Isso, no entanto, não significa que
não possam ser encontrados casos muito semelhantes na maior parte
dos estados ou regiões brasileiras. Outro exemplo vem de Santa
Catarina: Jorge Konder Bornhausen. Filho de um banqueiro e político
(Irineu) que foi um dos fundadores da antiga UDN (União Democráti-
ca Nacional), sobrinho de um deputado federal e governador do esta-
do (Adolfo Konder), o poder político do “clã” no estado remonta à
década de 1920. Apesar da tentativa dos comandantes da Revolução de
Trinta em afastá-los do poder político apoiando o “clã” rival (os Ra-
mos), os Konder Bornhausen recuperaram sua importância (ABREU
et al, 2004). O próprio Jorge K. Bornhausen, após um período como
advogado e diretor de empresas do grupo familiar, aos 29 anos “in-
gressou na política pela mão do pai”, ao ser indicado, durante o regime
militar, para ser governador. Posteriormente, passou a exercer outros
cargos, eletivos e de “confiança”, como aqueles de ministro, de embai-
xador e de senador, enquanto parentes próximos das novas gerações
ingressavam na política eleitoral.
Quanto àqueles cuja condição de empresário está vinculada a determi-
nadas profissões, em geral a classificação profissional insere-se numa
posição social de origem que, além de títulos escolares valorizados, in-
clui uma herança de capital econômico considerável, com investimentos
em diversos setores. O título profissional, como, por exemplo, o de
médico, por mais importante que possa ser em termos simbólicos ou
para a legitimação do exercício de cargos públicos de “confiança”, é
completamente secundário para a definição do conjunto dos recursos e
da posição social e, em muitos casos, para a entrada na política eleitoral.
Se para alguns, mais do que na classificação e no título escolar, a princi-
apenas pouco mais de uma quinta parte (22,2%) dos vinculados a asso-
ciações/sindicatos de empresários.
Porém, os indicadores que destacam mais fortemente os vinculados a
associações/sindicatos de professores são aqueles relativos ao trajeto
político e, entre estes, particularmente a filiação partidária. Se no caso
dos vinculados a associações/sindicatos de empresários ocorre uma cer-
ta concentração em alguns partidos (particularmente o PFL e o PPB), e
no dos vinculados a associações/sindicatos de médicos, advogados, en-
genheiros e assemelhados há uma dispersão que não resulta em maio-
res associações (pequena concentração no PDT, no PPS, no PSB e no
conjunto de pequenos partidos), a forte associação dos vinculados a
associações/sindicatos de professores é com o PT, que abrange mais de
quatro quintos das filiações (82,1% dos filiados a associações/sindicatos
de professores contra apenas 18,2% do universo total). Esse partido é o
único ao qual os vinculados a associações/sindicatos de professores de
todos os níveis mantêm uma proporção maior de adesão. Do restante,
numa proporção bem menor, uma parte é filiada ao PSDB (10,4% con-
tra 14,1% do universo total) e ao PMDB (7,1% contra 16,8% do univer-
so total, com apenas dois casos contra 153 do universo total). Os demais
partidos não contam com qualquer ocorrência de filiação (tomando-se
a última) dos vinculados a associações/sindicatos de professores. Isso
tem efeitos muito diretos no número de filiações partidárias, visto que,
como já indicado, os filiados ao PT são os que menos mudam de parti-
do. Desse modo, mais da metade (67,7%) dos que possuem vínculos
com associações/sindicatos de professores teve uma única filiação parti-
dária, contra menos de um terço (31,3%) do universo total. Quase todo
o restante dos vinculados a associações/sindicatos de professores, com
exceção de apenas dois indivíduos, teve duas filiações (25,8% contra
22,6% do universo total com duas filiações).
Mas, além dessa forte concentração em apenas um partido, há também
uma associação intensa com o exercício de cargos de direção partidária.
O cargo mais diretamente associado é o de membro de diretório ou
comissão executiva estadual, sendo que mais de uma quinta parte (22,6%
contra 4,9% do universo total) ocupa ou já ocupou esse tipo de cargo.
Em seguida, vêm os cargos de direção em diretório ou comissão execu-
tiva nacional, com mais de um terço, embora isso signifique uma pro-
porção menor que o conjunto do universo (32,3% contra 49,8% do uni-
verso total) e, por fim, para uma quantidade bem menor, a participação
como membro de diretório ou comissão executiva em âmbito regional
(12,9% contra 3,6% do universo total), ou em outros níveis. Portanto, a
C ONSIDERAÇÕES FINAIS
ABSTRACT
Based on the finding of continuous growth in the number of nationally
active politicians (federal deputies, senators and ministers) connected with
some type of association or uunion, relations between this and their respective
social careers in the political space are examined. The main finding is that,
in the Brazilian case, intensified electoral competition had the effect of
increasing the uses of “associative capital” in recruiting poplitical elites.
However, this reconversion of “associative capital” into political resources
is not the result of some general rule and therefore it depends on specific
configurations of relations between associative/union commitment and
political/electoral disputes. Consequently, this increased connection with
associations/union has specific effects, depending on the different
compositions of resources and modalities of entry into politics.
R EFERÊNCIAS
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N OTAS
1
O material deste texto foi extraído de um trabalho mais amplo, no qual foram consideradas como modalida-
des de vinculação associativa/sindical as que se seguem: associações/sindicatos de empresários; de trabalha-
dores urbanos, rurais e de funcionários públicos; de professores, de todos os graus de ensino; de médicos,
advogados, engenheiros e assemelhadas; de moradores, assistenciais, religiosas, feministas e de defesa de
“direitos” ou de “cidadania” e assemelhadas; organizações estudantis; clubes esportivos e assemelhados; e,
por fim, associações de prefeitos, vereadores, deputados e assemelhadas. Seguindo as sugestões de Gaxie e
Offerlé (1985), foram considerados os vínculos associativos/sindicais tanto com organizações de “trabalhado-
professor-visitante na Uni-
versidade de Manchester, Mundo (futebol); identidade nacional.
professor adjunto no
PPGCSA/Unisinos. Autor
de “Pátria, chuteiras e propa-
ganda – o brasileiro na publi-
cidade da Copa do Mundo”
(AnnaBlume/Unisinos,
2002) e organizador de
“Erving Goffman, desbra-
vador do Cotidiano” (Tomo
Editorial, 2004).
148
I NTRODUÇÃO
A Copa do Mundo de 2002 pode ser considerada singular sob muitos
aspectos. Afora o fato de ser a primeira Copa disputada fora do eixo
Europa/América, foi também a primeira a ocorrer em dois países simul-
taneamente, Coréia do Sul e Japão. No âmbito puramente futebolístico,
foi uma Copa de graves e numerosos erros de arbitragem – vários deles
favorecendo uma das seleções anfitriãs, a Coréia do Sul, que acabou em
quarto lugar. Além disso, foi uma Copa de resultados surpreendentes,
como a derrocada sumária dos principais “favoritos” ao título, como
França, Argentina, Portugal e Itália. Paralelo a tudo isso, foi a Copa em
que a seleção brasileira sagrou-se pentacampeã, com um retrospecto
invejável: sete vitórias em sete jogos, 18 gols a favor, quatro contra,
média de 2,5 gols por jogo. Não obstante os números favoráveis, a sele-
ção brasileira, comandada pelo técnico Luiz Felipe Scolari, o “Felipão”,
foi severamente criticada pela imprensa esportiva de todo o país, até
pelo menos as quartas-de-final, quando venceu a seleção da Inglaterra,
uma das últimas favoritas ao título que ainda estava na competição.
Boa parte das críticas veio do fato de o Brasil ter feito uma péssima
campanha nas eliminatórias sul-americanas, tendo trocado quatro ve-
zes de técnico e convocado mais de uma centena de jogadores na estei-
ra de sucessivos fracassos, como a histórica derrota de 2 x 0 para a
seleção de Honduras.2 A surpreendente trajetória de Luiz Felipe e seus
jogadores, indo em exatamente um ano do “fundo do poço” à apoteose
como pentacampeões do mundo, suscita muitas reflexões acerca da re-
lação entre futebol e identidade nacional no Brasil.
Simoni Guedes (1998) ressaltou com propriedade as complexas ques-
tões simbólicas envolvendo este time de futebol especial, a “seleção bra-
sileira”, e seu caráter de “metonímia” do povo brasileiro no discurso da
imprensa esportiva, mesmo que, nos últimos anos, esta vinculação pa-
reça estar se enfraquecendo (ver, nesse sentido, HELAL; SOARES,
2003). No caso da Copa de 2002, a questão simbólica da seleção brasi-
leira foi tensionada por um outro elemento: o fato de “Felipão” ser
gaúcho e ter montado sua equipe com um número bem maior de joga-
dores e profissionais da comissão técnica gaúchos do que jamais houve
em toda a história da participação do Brasil na Copa.3 Acresce-se a esta
escolha a firme decisão de Luiz Felipe de não convocar o polêmico jo-
gador Romário, centroavante e símbolo da seleção vencedora da Copa
de 1994, além de uma espécie de ícone do “futebol malandro”, perso-
nificação do que se convencionou chamar de “estilo brasileiro” de fute-
bol. Luiz Felipe foi pressionado por uma espécie de “campanha” para
A “ IMPRENSA DE CHUTEIRAS ”
P ARA CONCLUIR
ABSTRACT
This paper wishes to analyse the relation between football and contempo-
rary Brazilian culture, since the social definition of categories articulated
to the ‘Brazilian identity’ present on newspapers discourse during the 2002
World Cup Finals in newspapers from Rio de Janeiro, São Paulo and Rio
Grande do Sul. This specific World Cup tournament is a particularly in-
teresting case in this sense, given the protagonism of Luis Felipe Scolari,
the Brazilian coach, traditional elements related to a ‘Brazilian way’ of
football playing - of which Romário is maybe one of the best examples - were
rearticulated on media discourse. The objective of this research is to analyse
the sense making practices related to ‘Brazilian identities’ from the stand-
point of newspaper stories regarding the ‘facts’ of World Cup Finals in
2002. My intention is to discuss the role of football as a ‘symbolic operator’
of nationality in Brazil through its appropriation by the discourse of sports
press.
R EFERÊNCIAS
DA MATTA, R. Esporte na sociedade: um ensaio sobre o futebol brasi-
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573p.
N OTAS
1
Uma versão preliminar deste artigo foi apresentada na XXVII Reunião da ANPOCS. Caxambu, MG, 2003.
2
Na ocasião, o cronista Luis Fernando Verissimo relacionou o significado de “Honduras” (“funduras”,
“profundezas”) com a situação de “fundo do poço” vivida pela seleção brasileira.
3
Na convocação original, constavam seis gaúchos: três jogadores (Emerson – que acabou afastado por lesão,
Anderson Polga e Ronaldinho Gaúcho) e três membros da comissão técnica (Luiz Felipe, seu auxiliar Murtosa
e o preparador físico Paulo Paixão).
4
Para uma reflexão antropológica acerca da vinculação afetiva entre torcedores e clubes e sua conseqüente
sociabilidade/rivalidade, ver Damo (2002).
5
Ver, nesse sentido, o debate entre Soares (1999), Gordon e Helal (1999) e a réplica de Soares (1999a).
O MOTE ETNOGRÁFICO
Buraco da Filomena (II e IV), Beirada dos Fernandes (I, II, IV e V), Duro de
Fora (II, IV e V), As Pedras do Canal Grande (II, IV e V), Barro Vermelho
(II e IV), Capão de Baga (I, IV e V), Ponta de Ilha Nova (I, IV e V), Canal
das Flechas (I, IV e V), Canto dos Imbiuá (I, IV e V), Boca da Valeta (I, IV
e V), Beirada do Luiz de Souza (I e IV), Areinha (I, IV e V), Canto Fundo (I,
III, IV e V), Coroa Baixa (I e V), Porto do Trator (I, IV e V), Porto do
Macaco (I e IV), Porto do Ingá (I, IV e V), Porto do Soares (I e IV), Canto do
Pastor (II e III), Canto do Boneco (II, IV e V), Quiosque de Quinho (III, IV
e V), Moita Preta (III e IV), As Caraquinha (I, IV e V), Buraco do Nizo (I e
V), Carrapato (I e V), Rio Ururaí (I e V), Boca do Rio Jacaré (I e V), Canto
do Limão (I e V), Canto das Palmeiras (II e V), Rio de Macabu (IV e V),
Coroa dos Piau (IV e V), Gamboa (IV e V), Ilha do Norval (IV e V), Canto
do Oliveira (IV e V), Ilha de Catete (IV e V), Entrada do Rio Ururaí (IV e
V), Largo da Lama (IV e V), Canto do Curral Velho (IV e V), Canto das
Táuba (IV e V), Lagoa do Jacaré (IV e V).
Outros locais, como Lagoinha de Duas Pontas, Farinha Seca, Canto
Barra, Canto do Loro, Porto da Beirada, Porto da Balmineira, Ilha do
Servo, são mencionados apenas no primeiro mapa. A Coroa da Vara
Grande, a Coroa do Pocinho, o Guaxini, o Duro Pegador, As Pedrinha,
o Morinete de Dentro, o Morinete de Fora, o Duro da Verga, Buraqui-
nho, Os Barrinhos, a Coroa de João Bagre, a Coroa do Pocinho, As
Pedra de Chico Luiz, as Brovidade(s) figuram no segundo mapa. O
terceiro, por sua vez, registra os seguintes locais: Cajueiro, Porto de
José de Abreu, Porto de Nilton, Porto Cajueiro, Capivari, Pipiri. No
quarto mapa, podem ser encontrados: o Porto de Ponta Grossa, o Por-
to de Carmélio, o Porto dos Homens, o Rio Velho, o Duro da Valeta, a
Barra do Macabu, a Barrinha, a Boca do Valão, a Beirada do Imbaíba,
a Coroa de Luca, o Engenho Velho, o Porto de Normélia, a Coroa do
Pau Assobio, a Pedra Funda, a Beirada da Jangada, o Duro do Lereta,
o Barracão, o Cavaleiro. No quinto e último mapa, finalmente, temos a
Ilha do Mandinga, o Rio da Prata, o Canto do Rio Velho, a Boca do
Valão, o Porto de Luciano, a Caixa d´água, o Rio Pontal, o Canto de
Onofre, a Ilha do Capim, a Lagoinha de Duas Pontas, o Engenho Ve-
lho, o Pesque-Pague, As Pedras do Cemitério, a Coroinha, o Canal Gran-
de, a Ilha dos Carões.
O simples número dessas referências, citadas de cor, tende a impressi-
onar o etnógrafo. Mais ainda, a variedade semântica mediante a qual
se compõem essas designações próprias e precisas, manejadas não só
com desembaraço, mas com verdadeira paixão topográfica por todos
os nossos interlocutores nesse tema. Em seu conjunto, tais fatos permi-
A lógica classificatória
O pensamento selvagem (1970) de Claude Lévi-Strauss, que se inscreve na
posteridade antropológica direta de Durkheim e Mauss, incorpora e
atualiza de modo crítico e inovador a discussão seminal destes no texto
“Sobre algumas formas primitivas de classificação”. Admite, neste sen-
tido, a origem social das classificações. As coisas são distintas e classifica-
ABSTRACT
In the period between 1939/1941 anthropologist Luiz de Castro Faria pro-
duced a huge ethnographical work, still to be printed, about an artesanal
fishermen village known by the name of Ponta Grossa dos Fidalgos, in the
outskirts of Campos dos Goytacazes-RJ, precisely at the north shore of the
Lagoa Feia. In this work, the anthropologist had his researches based on
subjects such as geographical knowledges that local people have about all
that concerns their environment. The present work aims to find out on
which ways this knowledgement – understood hereby by the differences of
R EFERÊNCIAS
BIDEGAIN, Paulo et al. Lagoas do Norte Fluminense: perfil ambiental.
Rio de Janeiro: SEMADS, 2002.
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LÉVI-STRAUSS, Claude. A ciência do concreto. In: ______. O pensa-
mento selvagem. São Paulo: Editora Nacional: EDUSP, 1970.
N OTAS
1
Trabalho apresentado oralmente sob a forma de paper por ocasião do Seminário Comemorativo dos 100
anos de publicação do texto “De Quelques Formes Primitives de Classification”, realizado entre os dias 3 e 5 de
junho de 2003, no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IFCS/
UFRJ) através de convite formulado pelo professor Marco Antonio da Silva Mello, então chefe do Departa-
mento de Antropologia Cultural do referido Instituto.
2
Este estudo, inacabado e ainda inédito, e do qual existe uma cópia, no abaixo mencionado acervo, e cuja
publicação futura está prevista sob o título (provisório) Os pescadores de Ponta Grossa dos Fidalgos: um estudo de
Morfologia Social.
3
Essa documentação encontra-se, atualmente, sob a guarda do Museu de Astronomia e Ciências Afins –
MAST.
Ë
Antropóloga e historiadora,
professora do Departamen-
to de Antropologia (DEAN)
do Centro de Filosofia e
Ciências Humanas (CFCH)
da Universidade Federal do
Pará (UFPA). Endereço
eletrônico: [email protected].
ËË
Engenheiro agrônomo e dou-
tor em Socioeconomia, profes-
sor adjunto do Centro
Agropecuária da (CAP) da
UFPA. Endereço eletrônico:
[email protected].
192
A anta ou tapir (tápirus terrestris, L.) é um mamífero que tem dupla in-
terpretação na cultura da população brasileira. Sua carne é apreciada
entre os indígenas. Alguns afirmam que a anta dá ou reforça o dom
atribuído aos pajés. Caçar anta ultrapassa as fronteiras da sobrevivên-
cia física, adquirindo contornos mágicos religiosos. Entre os brancos, a
anta é símbolo de pessoa desajeitada, pachorrenta, vagarosa, pouco in-
teligente, mas a anta é mais inteligente do que se pensa, como veremos
no texto. Assim sendo, o título é ao mesmo tempo uma provocação e
um desafio para evitar que conhecimento e ignorância – ou desconhe-
cimento – se contraponham. Nosso esforço é apresentar o conhecimen-
to nativo – ciência concreta, como quer Levi-Strauss (1970) – versus a
reconhecida ignorância de branco do pesquisador ao entrar na floresta
– tomada em sentido ancho, espaço de trabalho de campo – local onde
mesmo um pesquisador curioso e atento precisa pisar com cautela para
se assenhorear das entranhas da mata.
Fazer ciência, produzir novos conhecimentos, exige disciplina e con-
centração. Elaborar conceitos ou refazê-los, um dos pilares da atividade
científica, exige ir e voltar sobre eles, burilando-os, refinando-os até que
representem o melhor possível o objeto ou a ação que se pretende des-
crever ou analisar. O registro escrito, fotografado, memorizado é maté-
ria-prima dessa elaboração. Autores importantes de todas as áreas utili-
zaram cadernos de campo cotidianamente em seus trabalhos. Podemos
citar alguns como exemplos e referências, publicados como diários, ar-
tigos, crônicas, cartas, prefácios ou livros, entre tantas possibilidades.
As formas foram diversas, mas o que vamos aproveitar é o fato de terem
sido registros que permitiram um grau de maior precisão na elaboração
dos seus textos. Euclides da Cunha pode ensinar muito em seu Diário de
uma expedição (2000). O mesmo pode-se dizer de Marx, considerando as
observações de Engels (1967, p. 23):
– O que é isso?
Eram compridos dizeres bíblicos que ele num átimo decorou. Saiu
dali sabia todinha a inscrição. Eu, intrigada: Vais pôr em livro? Não
especialmente. Faz parte do meu exercício cotidiano. Exercício? Pois
claro. E com toda paciência deu-me essa aula, preciosa: A nossa pro-
fissão é feita destas coisas. Principalmente desse captar tudo, a cada
hora, cada momento. Não é só saber escutar o que as pessoas falam,
ou o que a leitura nos traz. Ouvir, ver, gravar o máximo. Mas isso é
impossível, Dalcídio. A gente devia então andar de caderno na mão,
a vida toda. Ele: “Tem quem o faça. Eu, às vezes, quando posso, quando
dá, depende. Mas é importante demais esta ginástica” (1983, p. 73).
Muito se aprende também nos trabalhos do poeta Castro Alves que em
suas cartas aos parentes e amigos referia sua preocupação com a elabo-
ração e revisão dos textos, colocando em relevo a importância da crítica.
Mas passemos ao nosso antropólogo gaúcho e seu exercício profissional
na Amazônia.
D OMESTICANDO O OLHAR
Tudo isso me contou o velho Nyaam Hi, hoje à tarde, num passeio
pelo mato. Enquanto ele falava, eu gravava as explicações, a fim de
escutar mais tarde e aprender a língua Hupdu, que ainda entendo
mal (POZZOBON, 2002, p. 35-36).
O instrumento de trabalho para o registro é o gravador, e a estratégia é
seguir o informante até o local sobre o qual ele pretende falar e ouvi-lo
na língua nativa. Isto obriga o pesquisador ao esforço de aprendizado
da língua que se torna igualmente instrumento de apreensão da reali-
dade apresentada pelo interlocutor. Falar ou fazer falar o informante
vendo o que ele deseja faz a diferença de registro construído ao largo,
feito a partir da memória do pesquisador. Para os que trabalham sobre
a compreensão do uso dos recursos naturais ou cultivados, é recomen-
dável uma caminhada na roça, na mata, na capoeira, porque ali se esta-
belece um diálogo que pode ser enriquecido com a provocação dos olhos,
dos cheiros, do tato, dos gostos e dos ruídos comuns a estes lugares. Há
diferença entre entrevistar o agricultor em sua casa, em sua roça, em
seu lote e fazê-lo na sede do sindicato, ou em uma sala de aula, na
universidade. É sensível a diferença entre conversar com alguém em
um ambiente ao qual ele deve fazer referência e dialogar sobre este
mesmo ambiente fora dele, especialmente porque o indígena e/ou o
camponês pensam tendo como lastro seu universo cultural.
No caso da leitura feita por Nyaam Hi, aliás, um belo exemplo de leitu-
ra, o que importa não é apenas o detalhe observado, mas a conclusão
que dele se pode tirar. A leitura, no caso, vai bem além da linha do
signo, materializa-se nas entrelinhas, no não-dito, no ficar em silêncio.
É dessa outra forma de ver, no detalhe, dialogando com o que se nos
apresenta à visão, que se faz a diferença entre o pesquisador e outros
observadores, mesmo os mais argutos, embora, muitas vezes, se utilize
observação de terceiros, pois jamais se despreza informação. É o caso
das informações oriundas de viajantes e naturalistas do século XIX, fonte
de conhecimento a antropólogos, historiadores e agrônomos, entre ou-
tros profissionais.
Indicar a nomenclatura nativa das espécies, sem a qual nenhum mateiro
pode nos auxiliar em campo; preservar espécies, quer em seus nichos
originais, pelo respeito aos ciclos biológicos de animais, por meio de
interditos, quer pela domesticação de espécies; descobrir “novas” es-
pécies, informando, ao pesquisador, sobre seus hábitos e utilidade para
o grupo, também se incluem no repertório das contribuições do nativo.
Estas práticas não ajudam somente o pesquisador, mas os usuários em
potencial.
Os especialistas nativos não se furtam em oferecer detalhadas descri-
ções do como e onde encontrar o animal, de quando e como utilizá-lo,
constituindo uma rede de iniciados, mesmo não tendo uma banca esco-
lar. As “aulas práticas” implicam “[...] ouvir explicações tão precisas in
loco, no meio do mato, com os exemplos pulando diante do nariz”
(POZZOBON, 2002, p. 36), afirma Jorge, ao comentar os ensinamentos
de Nyaam Hi, seu mestre Maku.
É fácil aprender fazendo,
T ESOURO ESQUECIDO
ABSTRACT
A part of the anthropologist work is to understand meaning construction.
The precise and comprehensive data collection is one of the techniques used
in anthropological research. The book by Jorge Pozzobon, Vocês, brancos,
não têm alma: histórias de fronteiras (You white people don’t have
souls. Stories from the Frontier.) reveals such technique as a tool to
write a piece of literature. An anthropolgist himself, Pozzobon demonstrates
his professional ability to the level of precision essential to the craft. This
article reflects on his field notes to unveal the anthropological practice.
R EFERÊNCIAS
CELINA, Lindanor. Pranto por Dalcídio Jurandir: memórias. Belém:
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POZZOBON, Jorge. Vocês, brancos, não têm alma: histórias de fronteiras.
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POZZOBON, Jorge; SILVA, Maria de Nazareth F. da; SALLES, Lean-
dro Oliveira. Os índios Hupdu (Maku) e a diversidade de mamíferos na região
do alto rio Negro. Texto inédito submetido ao Boletim do Museu Nacio-
nal em 2000.
N OTAS
1
POZZOBON, Jorge. Vocês, brancos, não têm alma: histórias de fronteiras. Belém: UFPA/MPEG, 2002.
BRUNO LATOUR
VERLAN VALLE GASPAR NETOË
antifetichista, Latour quer mostrar que sua supressão revela não haver
maiores diferenças entre sociedades modernas e não modernas, e que
mesmo nós, expoentes máximos das ciências exatas, jamais deixamos
de conferir autonomia aos nossos objetos enquanto nos consideramos
criadores destes.
Não há, portanto, qualquer contradição, quando se afirma ter-se “pro-
duzido” algo ao mesmo tempo que se lhe assevera uma certa “autono-
mia”, como fazem os adeptos do candomblé, ao descreverem suas divin-
dades como assentadas, fabricadas e, simultaneamente, reais (e relativa-
mente autônomas). Ou, como fez Pasteur, quando anunciou seu fer-
mento lático que, num primeiro momento, tem a sua existência atribu-
ída ao cientista, ao passo que, posteriormente, apresenta-se como fato
em si. Para Latour, há uma outra explicação possível para essa “mistu-
ra” não desejada, desde que abramos mão do pensamento crítico mo-
derno, das noções de crença, magia, má-fé e de autonomia, tão fasci-
nantes.
Com a negação da crença, o antifetichismo, que se vangloria pela cria-
ção de fatos explicáveis objetivamente, passa a ser objeto de estudo da
Antropologia, numa perspectiva simétrica, qual seja, a de nos inquirir-
mos sobre nossos objetos cultuados da mesma forma que fazemos com
os outros. Eis, então, que desponta uma significativa diferença entre
uma concepção moderna e uma não moderna sobre o que seja fato.
Para a primeira, há uma quebra entre fato fabricado e fato não fabrica-
do, ao passo que, para a segunda, o fato é um passe para a solução de
continuidade entre a ação humana e sua independência. Daí a impor-
tância dos scienses studies ou da Antropologia da ciência que, para o au-
tor, obrigam a teoria a levar em conta a prática dos cientistas e utilizar os
mesmos mecanismos empregados para dar conta dos fetiches.
A Antropologia simétrica possui um operador que a auxilia no exercício
comparativo sem acreditar na crença. Latour denomina-o fe(i)tiche, um
objeto que é fabricado e que fala ao mesmo tempo. A grafia é retirada
das bases etimológicas da palavra fetiche, reflexão sobre a qual não nos
deteremos aqui. Basta-nos apenas compreender que, para o autor, o
fe(i)tiche pode ser entendido como um objeto que faz falar, e que ele
representa a certeza inquebrantável de que, ao nos voltarmos para a
prática, não temos que, necessariamente, escolher entre construção e
verdade.
Esta não-crença na crença (Felix culpa) permite-nos desvendar o duplo
repertório dos modernos, que se estrutura do seguinte modo. De um
Uma outra visão se anuncia com a proposta de Latour. Para ele, como
os homens não têm o domínio total sobre o que fazem, outros entes os
superam na ação. Faz-se, então, uma mediação na qual o sujeito ganha
autonomia ao conceder a autonomia que não possui aos seres que advêm
graças a ele. Para realizá-lo, é preciso que se armem de um elemento
que permita essa interlocução, que nada mais é do que o fe(i)tiche, que
adquire, aqui, uma expressão positiva. Assim, os modernos se vêem
obrigados a prestar um culto explícito a estes objetos que fazem-falar a
si mesmos e aos humanos que os produzem.
Esta reflexão sobre o tipo de culto que os modernos fazem aos seus
deuses, entidades, objetos-causa, fatos objetivos, como se queira cha-
mar, amplia nossa capacidade de pôr em primeiro plano um dos mais
significativos atributos da Antropologia, que é o de nos olharmos atra-
vés dos outros. O posicionamento simétrico almejado pelo autor exige
que se coloquem, sob a mesma pressão acusatória, deuses pagãos e fer-
mentos industrializados, alertando-nos para o quanto há de fé em nossa
soberba racionalidade.
R EFERÊNCIAS
LATOUR, Bruno. Jamais fomos modernos: ensaio de Antropologia Simé-
trica. Tradução de Carlos Irineu da Costa. Rio de Janeiro: Editora 34,
1994. 152 p. (Coleção Trans).
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SE
Dalva Maria da Mota
A beleza traída: percepção da usina nuclear pela população de Angra dos Reis
Rosane M. Prado
Povos indígenas e ambientalismo – as demandas ecológicas de índios do rio
Solimões
Deborah de Magalhães Lima
Raízes antropológicas da filosofia de Montesquieu
José Sávio Leopoldi
Resenhas
A invenção de uma qualidade ou os índios que se inventa(ra)m
Mercia Rejane Rangel Batista
China’s peasants: the anthropology of a revolution
João Roberto Correia e José Gabriel Silveira Corrêa
Artigos
As concertações sociais na Europa dos anos 90: possibilidades e limites
Jorge Ruben Biton Tapia
A (re)construção de identidade e tradições: o rural como tema e cenário
José Marcos Froehlich
A pílula azul: uma análise de representações sobre masculinidade em face
do viagra
Rogério Lopes Azize e Emanuelle Silva Araújo
Homenagem
René Armand Dreifuss
por Eurico de Lima Figueiredo
DossiÍ
Maneiras de beber: proscrições sociais
Apresentação: Delma Pessanha Neves
Entre práticas simbólicas e recursos terapêuticos: as problemáticas de um
itinerário de pesquisa
Sylvie Fainzang
Alcoólicos anônimos: conversão e abstinência terapêutica
Angela Maria Garcia
“Embriagados no Espírito Santo”: reflexões sobre a experiência pentecostal e o
alcoolismo
Cecília L. Mariz
Artigos
Visões de mundo e projetos de trabalhadores qualificados de nível médio em seu
diálogo com a modernidade tardia
Suzana Burnier
O povo, a cidade e sua festa: a invenção da festa junina no espaço urbano
Elizabeth Christina de Andrade Lima
Antropologia e clínica – o tratamento da diferença
Jaqueline Teresinha Ferreira
Mares e marés: o masculino e o feminino no cultivo do mar
Maria Ignez S. Paulilo
Resenhas
Antropologia e comunicação: princípios radicais
José Sávio Leopoldi
Politizar as novas tecnologias: o impacto sócio-técnico da informação digital e ge-
nética
Fátima Portilho
Criminologia e subjetividade no Brasil
Wilson Couto Borges
Homenagem
Luiz de Castro Faria: o professor emérito
por Felipe Berocan da Veiga
DossiÍ
Políticas públicas, direito(s) e justiça(s) – perspectivas comparativas
Apresentação: Roberto Kant de Lima
Drogas, globalização e direitos humanos
Daniel dos Santos
Detenciones policiales y muertes administrativas
Sofía Tiscornia
Os ilegalismos privilegiados
Fernando Acosta
Artigos
Estado e empresários na América Latina (1980-2000)
Álvaro Bianchi
O desamparo do indivíduo moderno na sociologia de Max Weber
Luis Carlos Fridman
A construção social dos assalariados na citricultura paulista
Marie Anne Najm Chalita
As arenas iluminadas de Maringá: reflexões sobre a constituição
de uma cidade média
Simone Pereira da Costa
Resenhas
Ética e responsabilidade social nos negócios
Priscila Ermínia Riscado
Novas experiências de gestão pública e cidadania
Daniela da Silva Lima
Uma ciência da diferença: sexo e gênero
Fernando Cesar Coelho da Costa
ANTROPOLÍTICA Niterói, n. 19, p. 265-276, 1. sem. 2005
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DossiÍ
Por uma antropologia do consumo
Apresentação: Laura Graziela Gomes e Lívia Barbosa
Pobreza Da Moralidade
Daniel Miller
O consumidor artesão: cultura, artesania e consumoem uma
Sociedade Pós-Moderna
Colin Campbell
Por uma sociologia da embalagem
Franck Cochoy
ARTIGOS
A Antropologia e as políticas de desenvolvimento: algumas orientações
Jean-François Baré
Arquivo público: Um segredo bem guardado?
Ana Paula Mendes de Miranda
A concepção da desigualdade em Hobbes, Locke e Rousseau
Marcelo Pereira de Mello
Associativismo em rede: uma construção identitária em territórios
de agricultura familiar
Zilá Mesquita e Márcio Bauer
Depois de Bourdieu: as classes populares em algumas
abordagens sociológicas contemporâneas
Antonádia Borges
RESENHAS
Modération et sobriété. Études sur les usages sociaux de l’alcool
Fernando Cordeiro Barbosa
Governança democrática e poder local: A experiência dos
conselhos municipais no Brasil
Debora Cristina Rezende de Almeida
Uma ciência da diferença: sexo e gênero
Fernando Cesar Coelho da Costa
ANTROPOLÍTICA Niterói, n. 18, p. 265-276, 1. sem. 2005
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