2857 870 PB
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&
Gestão Aprendizagem
v. 10, n. 2, jul./dez. 2021
Dossiê I
Habermas
Gestão & Aprendizagem
SUMÁRIO
EDITORIAL
RESUMO
O propósito de uma pedagogia, baseada na filosofia habermasiana, é construir formas de
experiência e racionalidade na vida cotidiana, superando conflitos e construindo a capacidade
de compreensão entre os sujeitos. A educação seria mais produtiva e criticamente
transformadora, se transmitisse menos, transmitisse ideias prontas e buscasse desenvolver o
raciocínio dos indivíduos, numa postura de cidadãos éticos capazes de compreender por meio
da linguagem. A compreensão mútua sobre o conhecimento é o grande telos da pedagogia, não
se trata de ter mais informação ou melhor raciocínio. A educação tem um fundamento mais
mimético, as imagens mentais desempenham um papel essencial na aprendizagem, pois não
se trata de uma simples transmissão de informações, mas de uma compreensão ampla da
existência e da vida social, sem perder a noção de subjetividade. A sala de aula é um espaço
aberto para despertar a partir de imagens representativas da realidade, o desenvolvimento
cultural é um fator único na perspectiva educacional habermasiana.
ABSTRACT
The purpose of a pedagogy, based on the Habermasian philosophy, is to build forms of
experience and rationality in everyday life, overcoming conflicts and building the capacity for
understanding between subjects. Education would be more productive and critically
transforming, if it transmitted less, transmit ready-made ideas and sought to develop the
reasoning of individuals, in a posture of ethical citizens capable of understanding through
language. Mutual understanding about knowledge is the great telos of pedagogy, it is not a
matter of having more information or better reasoning. Education has a more mimetic
foundation, mental images play an essential role in learning, as it is not a simple transmission
of information, but a broad understanding of existence and social life, without losing the notion
of subjectivity. The classroom is an open space to awaken from representative images of reality,
cultural development is a unique factor in the Habermasian educational perspective.
1 INTRODUÇÃO
ideias que transformam a vida social e visão de mundo dos sujeitos. É nesse prisma
que Habermas define três agentes fundamentais nesse processo, ‘a cultura, a sociedade
e a pessoa’ (HABERMAS, 2012, p. 252-253).
mais mimética no ensino. Por outro lado, o conceito de mímesis e formação topa na
questão do projeto de modernidade, que em Adorno é preciso ser superado; em
Habermas é retomado, quando explicita que a sua falha não está em ‘uma razão no
excesso de razão, mas sim em falta de mais racionalidade’ (TREVISAN, 2000, p. 131-
132).
Segundo Trevisan (2000, p. 150) a filosofia da educação deve pensar os meios
de superação do ensino técnico, mudando para uma perspectiva comunicativa. Em
Adorno, a mímesis é fundada numa ideia do caráter expressivo da arte; Habermas
defende uma visão mais argumentativa do ser mimético da arte. Dessa forma, busca
reconciliar a visão da mimese colocando a questão na relação de entendimento entre
os sujeitos, em uma forma de razão dialógica e interativa entre os sujeitos. Assim, as
experiências são mais significativas por considerar a realidade experimentada por cada
indivíduo, mas universalizada no debate racionalizado (TREVISAN, 2000, p. 136).
Outra controvérsia enfrentada pro Habermas é a diferença na concepção da
mímesis entre Adorno e Benjamin. Na visão adorniana, a mímesis é como algo
intocável; já na perspectiva de Benjamin, ela se manifestada na linguagem profana. Ele
defende que a democratização da arte leva a um crescimento humano pelo acesso das
classes menores em sua linguagem. Já para Adorno seria profanar o templo sagrada da
arte, perdendo o sentido mimético, que vai justamente levar a ideia de indústria
cultural à perca do sentido elevado de arte, empobrecendo a cultura e estagnando os
processos de humanização. (TREVISAN, 2000, p. 157-158).
Na filosofia de Walter Benjamin pode-se ver um otimismo na ‘desaurização da
arte’, pois agora não só uma classe elevada pode contemplar as obras artísticas em uma
linguagem elevada, mas as classes populares podem fazer sua contemplação e ter sua
participação nos benefícios da arte. Habermas pensa que a questão principal não é,
necessariamente, identificar a perca da aura na obra de arte, mas em identificar quais
são as ‘pretensões artísticas’, ou seja, é preciso desenvolver uma razão comunicativa,
na qual os sujeitos se entendam nessa relação artística. Também, para que a
intencionalidade do artista seja condizente com o próprio sentido da arte que ele
produz (TREVISAN, 2000, p. 158).
Habermas afirma que adorno está preso ao paradigma da
‘episteme/representação’, por isso propõe que a questão deve passar para o ‘paradigma
da metáfora especular’ (TREVISAN, 2000, p. 159). Com isso, é possível pensar uma
nova concepção de racionalidade, que assimile o conhecimento e as relações sociais no
A mímesis será mais efetiva na vida das relações humanas quando for
desenvolvida na vida educacional. Ela possibilita também uma interação voltada para
dimensão do outro, uma sensibilização de entendimento, na qual as pessoas se
compreendam mutuamente buscando sempre superar os conflitos gerados pelo
desentendimento e divergências. Isso é importante para evitar novamente que a
humanidade recaia na barbárie, como Adorno tanto alertava, e colocava como tarefa
fundamental da educação. (TREVISAN, 2000, p. 287).
Nesse seguimento, a educação não pode ser vista sem a relação com a ética, pois
a mímesis requer um conhecimento ampliado da racionalidade pautada no
entendimento intersubjetivo, de um saber dialógico entre os indivíduos do mundo da
vida. A ação ética é requer atitudes estéticas, na qual a produção artística alarga a
compreensão humana sobre a amplitude dos horizontes da saciedade, cultura e
personalidade. Essa visão ampla é a própria realidade de incomensurabilidade da
realidade em sua apreensão racional. Assim, é preciso uma integração do
conhecimento para haver maior claridade sobre uma realidade ou sobre o todo da
realidade.
A ética do discurso deve pensar a racionalidade da ética que está por trás das
afirmações, em um mundo marcado pela ciência moderna e lógica produtiva. É um
fundamental refletir as consequências e verdadeiro sentido das pretensões dos agentes
discursivos. Por outro lado, é preciso considerar uma ética universalista como nos
termos kantianos, superando a ética particularista de pequenos grupos, uma vez que o
mundo no processo de Pós-Modernidade está interligado, não tendo sentido pensar
em contextos locais, mas mundiais (OLIVEIRA, 1993, p. 9-10).
Segundo Muhl (1999, p. 245), “A razão comunicativa é uma razão que não é
alheia aos sentimentos, às vivências, à moralidade, à experiência estética dos
indivíduos [...]”. Essa racionalidade contempla as vivências do mundo da vida, pois ela
agrega a vida humana na integralidade ‘concretizada na história’, organizando a vida
comunicativa da realidade cotidiana. A consciência epistemológica do sujeito é movida
pela intersubjetividade, deslocando-se de um individualismo do ‘Eu’ cognitivo, o qual
só vê a si mesmo como base do conhecimento. Ao contrário, na ideia de Habermas
(1990, p. 212):
Segundo Manfrendo de Araújo Oliveira (1993, p. 12), a cultura moderna faz uma
divisão de áreas nas ciências, fomentado sua dimensão instrumental, confinando áreas
do saber a uma particularidade de ciência. Isso infere na realidade ética, uma vez que
parece ter campos individuais, como a religião, por exemplo, que desenvolve sua ética
própria. Mas isso dificulta a necessidade de uma universalização, que seria essencial
para o diálogo e entendimento entre as pessoas. Ademais, na visão de ação ética, em
Habermas, Manfrendo de Araújo Oliveira (1993, p. 14), define-se que o mundo da vida
sem racionalização, sem atuação da ação comunicativa recai no problema de um
mundo condicionado pelas forças mercadológicas, sendo o capital a mola propulsora
de toda a dinâmica da vivência e relações humanas. Por isso, o pensamento de
Habermas busca encontrar caminhos, dentro das organizações, como saída para o
desenvolvimento da razão comunicativa no âmbito da vida partilhada, nas relações
éticas e comunicativas.
Nesse sentido, o mundo da vida é regido por uma forma de comunicação entre
os indivíduos de forma que construam relações pautadas na racionalidade e
entendimento, possibilitando o surgimento de contextos de formalização da vida
social, regido por regras racionalmente instauradas, regendo as relações interpessoais.
Por outro lado, o crescimento do processo de modernização, movido pela razão
instrumental, provoca a formação de subsistemas, de forma que provoca o
“Afastamento progressivo das relações sociais da identidade dos agentes: a esfera do
agir comunicativo, cada vez mais, passa à periferia da estrutura social
sistematicamente integrada [...]” (OLIVEIRA, 1993, p. 16).
Muhl (1999, p. 214) mostra que a dificuldade do modelo de uma razão
comunicativa nas relações humanas enfrenta o entrave da dominância sistêmica,
provocando patologias na ‘reprodução cultural’ e na vida de interações sociais como
um todo. Isso provoca a crise de identidade, a qual dificulta a elaboração uma
identidade coletiva, consequentementede estabelecer uma falta de integração em toda
o mundo da vida, inclusive da educação que não tem um objetivo humanizador que
paute a formação humana. Assim, é preciso enfrentar o problema ético da vida
condicionada por forças exteriores ao processo de razão e comunicação entre os
indivíduos, sendo importante purificar os mecanismos de interação dessas forças
alienantes. (OLIVEIRA, 1993, p. 17-18).
4 CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
HABERMAS. Passado como futuro. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1993. 92p.
MULTIDIMENSIONALIDADE, INTERLOCUÇÃO E
INTERAÇÃO DIALÓGICA NA EDUCAÇÃO EM DIREITOS
HUMANOS
RESUMO
A Educação em Direitos Humanos (EDH) tem como objetivo amplo a formação de uma
sociedade solidária, para tanto, adota práticas educativas multidimensionais, na articulação
entre sujeitos, saberes e metodologias. Partindo de tais ideias, este artigo busca responder a
seguinte pergunta: quais princípios que estruturam a multidimensionalidade da educação em
direitos humanos, para a formação de uma sociedade solidária, podem ser formulados a
partir das condições de entendimento dialógico presentes no mundo da vida? O estudo
desenvolve-se em uma perspectiva teórica e abordagem dedutiva, com o uso da revisão de
literatura. Inicialmente, apresenta-se o conceito de educação como processo dialógico e
multidimensional para, em seguida, indicar o sentido de multidimensionalidade na EDH. Na
segunda parte, trata-se dos princípios estruturantes EDH, a partir da ideia de solidariedade
como interlocução e diálogo. Ao final, compreende-se que a estrutura dialógica do mundo da
vida serve de fundamento para os princípios: interlocução de saberes e da interação dialógica
entre sujeitos. Tais princípios orientam as práticas multidimensionais para além do
conhecimento técnico-científico, incluindo aspectos normativos-sociais e subjetivos, através
de práticas educativas baseadas no diálogo e na crítica reflexiva, que leva à formação de sujeitos
comprometidos com o respeito à diferença e à coordenação social através do entendimento.
ABSTRACT
Human Rights Education (HRE) has as its broad objective the formation of a solidary society,
so it adopts multidimensional educational practices, in the articulation between subjects,
knowledge and methodologies. Based on such ideas, this article seeks to answer the following
question: which principles that structure the multidimensionality of human rights education
for the formation of a solidary society can be formulated from the conditions of dialogic
understanding present in the world of life? The theoretical study is developed from a deductive
approach, with the use of literature review. Initially, the concept of education is presented as a
dialogic and multidimensional process, followed by indicating the meaning of
multidimensionality in the HRE. The second part deals with the structuring principles of HRE,
based on the idea of solidarity as interlocution and dialogue. In the end, it is understood that
the dialogic structure of the lifeworld serves as a foundation for the principles: interlocution of
knowledge and dialogic interaction between individuals. Such principles guide
1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
1Lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros e intersexos, o símbolo de adição refere-se a outras formas de
manifestação que não se adequam aos termos anteriores.
G&A, João Pessoa, v.10, n.2, p.20-41, jul./dez. 2021 26
CRISTÓVÃO TEIXEIRA RODRIGUES SILVA | ANTONIO BASILIO
NOVAES THOMAZ DE MENEZES
como elemento fundamental “[...] ‘educar para o nunca mais’, para resgatar a memória
histórica, romper a cultura do silêncio e da impunidade que ainda está muito presente
em nossos países” (CANDAU, 2007, 405). A negação da história, os apagamentos dos
conflitos e a construção de sociedades pacificadas pelo uso da força apenas reforçam a
permanência latente do autoritarismo, que sempre emerge em momento de crise como
solução final. Para uma verdadeira emancipação, faz-se necessário ir de encontro ao
passado, trazer à tona os fantasmas coletivos, julgar as ações de outrora e construir um
futuro em alicerce democrático, plural e pacífico.
Além da aproximação com o contexto da vida, a multidimensionalidade da
EDH ainda expressa a utilização de múltiplas estratégias metodológicas, “[...] que
articulem teoria e prática, elementos cognitivos, afetivos e envolvimento em práticas
sociais concretas”. (CANDAU, 2007, p. 405). A formação de sujeitos ativos, criativos e
transformadores depende de estímulos adequados, os quais não são compatíveis com
aulas expositivas em que a passividade é o único requisito para participação do
estudante. É preciso utilizar “[...] metodologias ativas, participativas, de diferentes
linguagens. [...] que promovam interação entre o saber sistematizado sobre Direitos
Humanos e o saber socialmente produzido” (CANDAU, 2007, p. 405).
Há uma dimensão educativa que é apreendida pelas formas, técnicas e
metodologias adotadas, as quais concretizam uma maneira específica de estar e se
relacionar com o mundo. A melhor forma de aproximar teoria e prática ou promover a
valorização de diversos saberes é realizando-os no cotidiano das atividades educativas.
A repetição de conteúdo, a separação entre o que se aprende da teoria e o que se vive
na prática ou a negação de saberes não-científicos deixa de “[...] mobilizar diferentes
dimensões presentes nos processos de ensino-aprendizagem, tais como: ver, saber,
celebrar, sistematizar, comprometer-se e socializar” (CANDAU, 2008, p. 292).
Essa tipologia proposta por Candau (2008) parece apontar para um
movimento cíclico, que começa com a observação social crítica (ver) e termina com a
transformação dessa sociedade observada (socializar). A EDH é capaz de estimular a
análise da realidade a partir da compreensão de conhecimentos específicos, usando de
múltiplas linguagens – oral, escrita, audiovisual, musical etc. Essa dinâmica ativa faz-
se na construção coletiva e individual de ações e atitudes que são estimuladas e
adotadas nos processos educativos. Ao final, retorna-se à realidade vivida, que será
preenchida pelas novas experiências, atreladas aos saberes produzidos.
bem como pelas formas de interação entre instituições de educação, ambiente natural,
comunidade local e sociedade de um modo geral” (MEC; CNE, 2012, p. 11). A
perspectiva multidimensionalidade da EDH busca integrar as práticas educativas e a
sociedade em seus mais abrangentes aspectos, conteúdos, normas e individualidades.
É possível, por esse meio, criar elementos de unidade social em torno de valores,
saberes e normas que sustentem relações solidárias e democráticas. “A condição cidadã
como uma construção social é, realmente, algo viabilizada pelo processo educacional”
(REZENDE, 2020, p. 10).
O sentido de Direitos Humanos e de cidadania, que informam as práticas de
EDH, precisam manter coerência com o plano multidimensional e dialógico
apresentado. Para Charlot (2014) há dois fatores que devem ser levados em conta para
que não haja reducionismos ou desvio de finalidade em tais ações educativas. Primeiro,
a possibilidade de a educação para a cidadania ser prioritariamente pensada na
educação para pobres, funcionando como forma de “apaziguar o tolo”, ou seja,
dissuadir as pessoas indesejadas socialmente de expressarem sua revolta, insatisfação
e reivindicações, tornando-se cidadãos respeitosos para com os demais e suas
propriedades. A EDH não pode ser instrumento de reforço aos processos de opressão
econômico, social e político, limitando as formas e possibilidade de pensar novos
modelos sociais.
O segundo ponto diz respeito à estrutura escolar como local de educação para
a cidadania, tendo em vista os vínculos sociais que lá são formados e estimulados,
muitas vezes com desrespeito aos direitos dos estudantes e professores (CHARLOT,
2014). Há espaço na escola para formação de vínculos de solidariedade e interesses
comuns, tendo em vista que os estudantes são estimulados à competição, à
individualidade e tratados com desconfiança? A noção de solidariedade rompe com
alguns valores e crenças do sistema neoliberal de organização da vida, o que requer
algum nível de ruptura com os modos homogêneos de ver a relação com a natureza,
com os outros seres humanos e consigo mesmo.
Para escapar de tais armadilhas, Charlot (2014) propõe uma educação para a
humanidade, em substituição à educação para a cidadania. Aquela incorpora um
sentido de vínculo amplo entre pessoas e destas com o planeta, que é mais abrangente
que a ligação dos cidadãos com um país. A EDH, nesse sentido, só se realiza com a
adoção de um sentido solidário que enxergue as relações humanas como
complementares e a produção de saberes como produto dialógico.
para a ação, que, por esse meio, nos entendemos uns com os outros”. A língua permite
aos humanos a formação de entendimentos sobre a verdade, a correção e a sinceridade
de suas exteriorizações. Em um só tempo, constrói e sustenta o individual e o comum,
pois permite o compartilhamento de uma estrutura que possibilita a comunicação,
porém não determina qual o seu conteúdo nem suas formas de uso.
A perspectiva de condições simétricas de diálogo não pode deixar de lado a
existência de “[...] distorções produzidas pela estrutura social, resultando de uma
assimetria nas regras de produção de diálogo e desigualdade na distribuição dos papeis
linguísticos” (MARCONDES, 2012, p. 46). Há fatores como altos índices de
desigualdade social e cultural, baixo acesso às condições materiais dignas de vida e
elevadas taxas de violência, opressão e discriminação, que assolam sociedades como a
brasileira. A reciprocidade e a capacidade de formação de consensos são substituídas
por ações estratégicas, baseadas na imposição, caraterísticas das relações do tipo
sujeito-objeto. Além desse aspecto material, há elementos simbólicos, existentes nas
relações interculturais, baseados em uma assimetria estrutural, que Dussel (2016)
identifica como a desigualdade que impera no sistema-mundo moderno que divide as
culturas em centro e periferia, desenvolvidos e primitivos.
Em locais como a América Latina, marcada por extensos períodos de
extermínio cultural e ausência de democracia, as perspectivas teóricas precisam ser
analisadas criticamente. Há dois elementos que se pode encontrar em Dussel (2016)
para pensar o diálogo intercultural entre saberes. Primeiro, não se trata de [...] um
diálogo entre os apologistas de suas culturas [...]. É, sobretudo, um diálogo entre os
críticos de sua própria cultura (intelectuais da “fronteira” entre a própria cultura e a
Modernidade) (DUSSEL, 2016, p. 68). O diálogo simétrico dá-se na fronteira, locus de
interlocução por definição, onde os sujeitos estejam dispostos às críticas e
questionamentos que exigem apresentar justificações de suas razões.
Segundo, como efeito das diferenças de força material e simbólica, as culturas
periféricas ou não-hegemônica tiveram seu potencial libertador, emancipador e crítico
negados. O reconhecimento de tal assimetria exige que seja estabelecido “[...] um
diálogo entre os “críticos da periferia”, um diálogo intercultural Sul-Sul, antes de ser
um movimento para o diálogo Sul-Norte” (DUSSEL, 2016, p. 68). O ponto de partida
e de chegada do pensamento não pode ser a cultura moderna (europeia), mas um novo
espaço. Nas palavras de Dussel (2016, p. 70), transmoderno, marcado pelo encontro
entre “[...] os críticos criadores de suas próprias culturas [...]”.
regional, nacional e local [...]” (BRASIL, 2009). A EDH não se restringe ao ensino do
conjunto de normas jurídicas que formam os Direitos Humanos, por meio de
disciplinas curriculares ou cursos de formação, por exemplo. Por outro lado, integra ao
processo educativo o contexto econômico, político, sócio-histórico de produção e
concretização de tais ideias, apresentando os pontos de ruptura e semelhança com as
epstemologias não-ocidentais.
Enquanto princípio estruturante das práticas multidimensionais, a
interlocução realiza-se abrangendo níveis cognitivo, social, ético e político (BRASIL,
2009). Esse princípio informa a importância do conhecimento científico, mas não o
utiliza para negar outras formas de saberes, mas, vê a possibilidade de mútua
transformação no encontro entre diversas tradições e culturas. A interlocução ainda se
rompe com a noção estanque da escola como único espaço para produção de
conhecimento e realização da aprendizagem. A integração entre todos os espaços
sociais (escola, família, religião, espaços públicos etc.) é expressão da interlocução de
saberes (BRASIL, 2009).
Pensar o processo de aprendizagem como interlocução de saberes, é
compreender que o conhecimento é “[...] uma relação social argumentativa, em vez de
uma relação com objetos” (MARQUES, 1996, p. 38). É no confronto, na crítica e na
justificação racional que os saberes novos são produzidos, “[...] reconstruído a partir
dos saberes prévios dos interlocutores [...]” (MARQUES, 1996, p. 83). Com a
interlocução de saberes, a EDH não se organiza em torno de saberes universais e
imutáveis, mas aposta na abertura de espaços para encontros horizontais entre
múltiplos saberes sociais, dos quais o conhecimento científico é espécie.
Nesse contexto, o ensino formal deixa de ser o locus para transmissão exclusiva
de saberes técnicos, tornando-se espaço para a confluência das diferenças. Para
Marques (1996, p. 83), a interlocução de saberes baseia-se no reconhecimento da “[...]
anterioridade dos lugares sociais originários dos saberes [...]” e da escola como
mediação. Os saberes são sempre contextualizados, se inserem em um horizonte
simbólico cultural, do qual a educação não pode fugir. A EDH realiza-se na integração
entre as novas e antigas formas de saber, encarando-o como processo cíclico de
(re)construção.
Ao organizar a prática educativa com base na interlocução de saberes, a EDH
abandona estruturas estáveis, imutáveis e universais de formas de vida e de saberes.
As ações pedagógicas deslocam-se “[...] para o âmbito da vulnerabilidade e da
imprevisibilidade. [...] uma estabilidade relativa, são sempre passíveis de revisão [...]”
(HERMANN, 1999, p. 121). Todos os saberes passam a depender de justificação em
permanente diálogo com contextos culturais distintos. Há uma tensão entre particular
e universal, unidade e pluralidade que não é apagada na EDH, mas utilizada como
motor para a promoção de uma reflexão crítica de todos os saberes existentes.
Em referência permanente ao mundo da vida (objetivo, social e subjetivo),
todas as exteriorizações estão passíveis de crítica (HABERMAS, 2019). Não há nada
que esteja fora da necessidade de justificação, fato que “[...] dá um carácter contingente
e parcial ao meu ponto de vista, ao mesmo tempo que reconhece aos outros o direito
de desafiarem os meus argumentos [...]” (ESTÊVÃO, 2011, p. 21). A interação dialógica
baseia-se em razões discursivas, por isso falíveis e postas ao crivo intersubjetivo.
Alinhado à perspectiva pluralista e não fundamentalista dos processos e
práticas educativas, o segundo princípio que pode ser formulado é a interação
dialógica entre sujeitos. A interação é dialógica quando simétrica, isto é, ao se
assegurar “[...] o direito do Outro contar a sua história ou de dar o seu testemunho com
a mesma autoridade e o mesmo valor do ponto de vista da situação comunicativa [...]”
(ESTÊVÃO, 2011, p. 20). A igualdade de importância, de autonomia e de capacidade
para manifestar suas ideias e influir na formação dos consensos e dissensos permitem
que as razões discursivas sejam os elementos de formação de entendimentos,
afastamento processos autoritários, opressores ou violentos.
A interação dialógica cria condições para a interlocução de saberes, permitindo
que a educação se realize em uma relação intersubjetiva que “[...] constitui os sujeitos
em abertura um para o outro, em relações não-objetivas, constitutivas do ser pessoa,
ser de frente ao Outro” (MARQUES, 1996, p. 104). A interação dialógica funda-se na
existência simétrica entre sujeitos e saberes diferentes e plurais, afirmando-se como
pressuposto para aprendizagem o interesse em ser com outros (MARQUES, 1996).
Os espaços para a EDH são construídos de “[...] forma participativa e na qual
aprofundam a solidariedade humana e autonomia individual na convivência
democrática entre todos” (MÜHL, 2020, p. 209-210). Desde a elaboração da política
educacional até as metodologias pedagógicas, as práticas educativas passam a ter na
sua base a relação de respeito e apreço à diferença de modos de vida. A educação como
processo dialógico rompe com a lógica autoritária do ensino tradicional e com a ideia
de independência entre conhecimento e contexto de vida.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
BANNEL, Ralph Ings. Habermas & a educação. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica
Editora, 2013.
CANDAU, Vera Maria Ferrão. Educação em Direitos Humanos: desafios atuais. R.M.
Godoy (Ed.), Educação em Direitos Humanos: Fundamentos teórico-
metodológicos. João Pessoa: Editora Universitária, 2007.
CANDAU, Vera Maria. KOFF, Adélia Maria Nehme Simão. A Didática Hoje:
reinventando caminhos. Educação & Realidade, Porto Alegre, v. 40, n. 2, p. 329-
348, abr./jun. 2015.
http://dhnet.org.br/dados/relatorios/a_pdf/r_unesco_educ_tesouro_descobrir.pdf.
Acesso em: 18 ago. 2021.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma sociologia das ausências e uma sociologia
das emergências. Revista Crítica de Ciências Sociais, 63, outubro, 2002, p. 237
– 280.
RESUMO
Este estudo foi construído a partir do recorte da pesquisa empírica da dissertação de mestrado
intitulada Racionalidade Comunicativa e o Conselho Escolar: um diálogo possível,
apresentada no Programa de Pós-Graduação em Educação (POSEDUC), da Universidade do
Estado do Rio Grande do Norte (UERN), na linha de pesquisa Políticas e Gestão da Educação.
Objetiva analisar e discutir a intersubjetividade, a democracia e a participação a partir de
práticas cotidianas do Conselho uma escola de Ensino Fundamental (1º a 9º ano) da rede
municipal de ensino da cidade de Mossoró no Estado do Rio Grande do Norte (RN). Esta
pesquisa ancora-se em uma abordagem qualitativa, articulando a perspectiva teórica
habermasiana e empiria, cujos dados foram construídos por meio de observação não
participante. Os resultados demonstram que a intersubjetividade, a democracia e a
participação são aspectos basilares da prática cotidiana do Conselho Escolar pesquisado. As
ações deliberativas são subsidiadas pelos discursos argumentativos que se orientam por
princípios democráticos e têm como foco proeminente a construção de consensos,
racionalmente, motivados reverberando, portanto, os pressupostos da racionalidade
comunicativa em suas ações e relações cotidanas.
ABSTRACT
This study was built from the empirical research of the master's dissertation entitled
Communicative Rationality and the School Council: a possible dialogue, presented at the
Postgraduate Program in Education (POSEDUC), at the State University of Rio Grande do
Norte (UERN), in the research line Policies and Management of Education. It aims to analyze
and discuss intersubjectivity, democracy and participation from the daily practices of the
Council of an Elementary School (1st to 9th grade) from the municipal education network in
the city of Mossoró in the State of Rio Grande do Norte (RN). This research is based on a
qualitative approach, articulating the Habermasian and empirical theoretical perspectives,
whose data were constructed through non-participant observation. The results demonstrate
that intersubjectivity, democracy and participation are basic aspects of the daily practice of the
School Council studied. Deliberative actions are supported by argumentative discourses that
are guided by democratic principles and have as a prominent focus the construction of
consensus, rationally motivated, reverberating, therefore, the assumptions of communicative
rationality in their everyday actions and relationships.
Key Words: School Council; Democracy; Intersubjectivity.
1 INTRODUÇÃO
1Instituído pela lei nº 2.717, de 27 de dezembro de 2010, que implementa a política de Responsabilidade
Educacional no município de Mossoró/RN e dá outras providências.
papel fundamental porque eles estão no colegiado de frente das principais decisões da
escola em todas as suas instâncias (pedagógica, administrativa, financeira).
Foram realizadas 3 (três) observações em reuniões extraordinárias. A primeira
teve a seguinte pauta: Construção do adendo para o Projeto Político Pedagógico (PPP)
e construção do dispositivo avaliativo para a prática dos docentes e demais
profissionais da escola. A reunião contou com a presença média de 65% (sessenta e
cinco por cento) dos membros titulares com participação significativa e debates bem
articulados. Inicialmente, foi apresentada a pauta e iniciada a explanação sobre,
primeiramente, a construção do dispositivo avaliativo dos profissionais da escola que
recebeu a contribuição mais ativa da gestora e da presidente do Conselho que é
representante dos professores.
Na sequência, ocorreu a construção do adendo 001/2019 que foi o principal foco
das discussões realizadas nesta reunião. Na ocasião, ficou muito explícito o nível de
envolvimento dos conselheiros com as questões do próprio Conselho escolar,
evidenciando que o conhecimento acerca do âmbito de atuação é fundamental para que
sejam desenvolvidas práticas com rigor e competência.
O adendo 001/2019, construído pelos conselheiros e incorporado ao PPP,
dispõe sobre o Conselho Escolar e caracteriza-se como dispositivo normativo que o
orienta e o regulamenta na escola lócus da pesquisa. Os principais itens tratados no
documento são: o perfil dos conselheiros, as atribuições, os direitos, os deveres, as
proibições e o cronograma das reuniões ordinárias e suas respectivas pautas. Ademais,
sua construção coletiva configura-se como um movimento de edificação da autonomia,
e da democratização dos processos de elaboração dos documentos que estão na base
normativa da escola.
higienização do espaço social que os alunos ocupam; eles limparam as suas respectivas
mesas e cadeiras, o quadro e as janelas da sala de aula.
Logo após, o pai apresentou eu ponto de vista, acusando a escola de colocar os
alunos para fazer a função dos auxiliares de serviços gerais. Ao mesmo tempo,
assumindo que a esposa deveria ter, primeiramente, conversado com a escola sobre o
ocorrido, antes de tomar qualquer atitude. É como Habermas (1990) afirma: uma ação
prática não fala por si só sobre suas intencionalidades tampouco sobre seu plano de
ação, apenas atos de fala comunicativos empenhados, discursivamente, em esclarecer
as suas intenções e como a própria ação foi pensada é capaz de clarificar e resolver
possíveis desentendimentos.
O consenso torna-se mais difícil de ser atingido quando há resistências, de uma
das partes, em ouvir e considerar o posicionamento dos demais sujeitos envolvidos no
debate. Diante disso, os representantes do Conselho foram colocando argumentos para
agregar nas discussões, viabilizar o entendimento e estabelecer as pretensões de
validez acerca do dissenso entre a escola e o pai.
A representante de pais se posicionou falando sobre a cidadania, que ela deve
ser discutida na escola e que a atividade realizada contribuía com a percepção dos
alunos enquanto corresponsáveis pelo espaço social no qual estão inseridos. Inclusive,
relatando que sua filha já havia realizado esta atividade e que tinha gostado bastante.
A presidente do Conselho dá continuidade destacando a função social da escola,
afirmando que, além de conteúdos didáticos, os alunos também aprendem valores,
conceitos atitudinais e procedimentais que agregam em sua construção como cidadão.
Ademais, reforça a seriedade da postagem, que pode ser caracterizada como Fake
News, podendo chegar a ser enquadrada como crime e levar a um processo judicial.
O pai segue tentando colocar a prática da professora como inapropriada, mesmo
diante da explicação dos objetivos da mesma e que a participação era voluntária. A
representante de funcionários afirma que a limpeza da escola é feita regularmente,
antes e depois das aulas, destaca que os alunos são recebidos com os ambientes
devidamente higienizados e organizados para a realização das atividades pedagógicas.
Logo após, um representante suplente de pais do Conselho, que também teve filho
partícipe na atividade, se posicionou a favor porque ela contribuía para o
comportamento do filho em casa, ao aprender a importância de zelar pelo seu espaço.
Em seguida, a segunda representante titular de pais sugere que a professora dê
continuidade ao projeto, mas que antes disso seja realizada uma reunião com os pais
para que seja feita a triagem de quais concordam com a sua realização. A representante
de alunos também contribuiu com a discussão, reforçou que o desenvolvimento desse
projeto é muito importante para a fixação de valores e atitudes simples de cuidados
com o espaço social, acrescentou ainda, que a necessidade do projeto advém de uma
carência na educação familiar. Além disso, destacou que, levando em consideração é
uma prática realizada em apenas um dia de aula, não interfere na aprendizagem dos
conteúdos didáticos.
Após muitas discussões, o pai concordou com os argumentos apresentados e a
decisão consensual foi que a mãe se retrataria pela mesma rede social com relação à
postagem anterior de acusação à escola. Além disso, que fosse realizada uma reunião
com os pais da turma para a discussão coletiva acerca da realização das ações do
projeto. O Conselho, mais uma vez, mostrou-se, coletivamente, forte e bem orientado
quanto aos princípios norteadores, além do respeito à liberdade de expressão, bem
como a capacidade de conduzir atos comunicativos ao consenso racional. Foram
ouvidos todos os envolvidos, e, juntos, após muito debate e questionamento das
pretensões de validez, chegaram a uma resolução do problema, contemplando todos os
envolvidos.
O Conselho Escolar tem, portanto, um papel muito abrangente e complexo na
escola, englobando a resolução de problemas e conflitos, construção e dinamização de
documentos diretivos da escola, construção e encaminhamento de ações que agreguem
na potencialização do processo de ensino/aprendizagem, discussão de planos
financeiros e administrativos, acompanhamento dos alunos quanto à frequência, à
disciplina e ao cumprimento das regras da escola. São demandas que exigem empenho
e comprometimento nesse processo, perpassando respeito, democracia e
entendimento.
Foram realizadas 3 (três) observações em assembleias escolares que também se
subsidiam nos princípios da democracia representativa, constituindo-se como um
ambiente ancorado na coletividade destinado para a discussão sobe o cotidiano da
escola, seus entraves e suas conquistas. As assembleias são mecanismos que auxiliam
na democratização do espaço escolar, levando em consideração que é um espaço
voltado para a participação ampla e equitativa dos sujeitos que compõem a escola,
respeitando as particularidades contextuais e subjetivas, bem como um espaço de
construção de entendimento e de consenso. Para tanto, estímulos à coparticipação e à
corresponsabilidade são construídos no intuito de discorrer sobre encaminhamentos
que contribuam com a ascensão da escola, busca-se, através do diálogo, articulado com
respeito e igualdade, atingir a resolução de possíveis conflitos iminentes ou já
instalados. A assembleia é mais um espaço plural, heterogêneo e diversificado que
permite que a intersubjetividade do Conselho Escolar se aflore e, dessa vez, de maneira
mais ampla, pois envolve mais sujeitos – representantes e representados – e,
consequentemente, mais subjetividades. Logo, é possível afirmar que desenvolver uma
gestão escolar democrática na escola depende de princípios e práticas democráticas.
Diante disso, no que se refere à participação da comunidade escolar nas
assembleias organizadas pelo Conselho Escolar em parceria com a gestão,
consideramos que é satisfatória, tanto quantitativamente, quanto ao nível da
participação e intervenção. Um dos principais desafios da escola pública brasileira é a
ausência dos pais, isto é, a articulação entre família e escola. Obviamente, na escola
pesquisada, essa realidade, também, faz-se presente, mas com menor evidência. Por
meio das observações, foi possível perceber que há uma boa relação da escola com os
pais e responsáveis dos alunos. Em assembleia, a gestora solicita “[...] a colaboração
dos pais, para que juntos com a escola amenizem as situações recorrentes que
prejudicam o rendimento escolar do aluno” (ATA DO CONSELHO, p. 74). Os pais se
fazem presentes, questionam, intervém, fazem propostas e sugestões para contribuir
com as pautas discutidas. A construção conjunta entre escola e pais é fundamental para
o bom desenvolvimento da escola e do ensino/aprendizagem dos alunos, colocando
como foco uma boa comunicação e favorecendo, portanto, o reconhecimento
intersubjetivo. A parceria que se instala é possível porque a escola, na figura do diretor
e do Conselho Escolar, busca uma linguagem clara e acessível para que os pais e
responsáveis entendam a sua importância na aprendizagem dos filhos, assim como
repassam informações acerca do contexto cotidiano que são imprescindíveis para que
os pais acompanhem a evolução do ensino/aprendizagem da escola, bem como expor
eventuais dificuldades e problemas enfrentados.
Em geral, as assembleias tratam de questões e responsabilidades a serem
assumidas pelos alunos sob a coordenação dos pais ou responsáveis, daí a importância
da presença e da participação articuladas aos objetivos centrais. Conhecer e estar a par
do que ocorre no cotidiano escolar, do que precisa ser melhorado, do que já está sendo
feito, ajuda, inclusive, na orientação de como os pais podem conduzir e redirecionar
seus filhos ou tutelados. Essa relação intersubjetiva é, extremamente, relevante e
precisa ser bem construída, pois a escola não atua sozinha, muito menos consegue ser
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
RESUMO
O objetivo do trabalho é analisar elementos do discurso de posse presidencial em 2019 que
confrontam as proposições de Jürgen Habermas. Para fins de recorte metodológico e
considerando os limites da natureza do trabalho selecionou-se os elementos “povo”, soberania”
e “democracia” presentes de maneira destacada no discurso de posse do presidente Jair
Bolsonaro. No que se refere as três concepções analisadas, foi possível perceber que o discurso
presidencial se contrapõe às proposições de Jürgen Habermas, pois desconsiderou que em
sociedades complexas, heterogêneas e plurais não é possível designar um “só povo”. Apesar do
termo povo ser frequentemente usado no sentido de unicidade, suas construções linguísticas
baseiam-se nos incluídos e nos adversários, tentando localizar nessas entidades, que divergem
de sua perspectiva, como inimigos. A categoria soberania presente no discurso de posse
assemelha-se ao conceito de soberania monárquica em que o monarca detém e exerce o poder.
As concepções presentes nessas duas categorias violam o conceito de democracia, que, entre
outros aspectos, está ligada ao respeito do direito das minorias e a exigência de procedimentos
inclusivos que permitam um fluxo comunicativo. Diante desse contexto, revelar esses
paradoxos e tensões reforçam a atuação do direito como fonte de justiça, fomentam o exercício
do pensamento crítico a respeito dos instrumentos de dominação para determinados fins e
tornam imprescindível a presença de uma memória histórica com possibilidades à
aprendizagem social em um país que já vivenciou o horror da ditadura.
ABSTRACT
The aim of the work is to analyze elements of the presidential inauguration speech in 2019 that
confront the propositions of Jürgen Habermas. For the purposes of methodological clipping
and considering the limits of the nature of the work, the elements “people”, sovereignty” and
“democracy” present in a prominent way in the inauguration speech of President Jair
Bolsonaro were selected. With regard to the three concepts analyzed, it was possible to realize
that the presidential speech is opposed to the propositions of Jürgen Habermas, since he
disregarded that in complex, heterogeneous and plural societies it is not possible to designate
a “single people”. Although the term people is often used in the sense of uniqueness, its
linguistic constructions are based on the included and the adversaries, trying to locate in these
entities, which diverge from their perspective, as enemies. The category sovereignty present in
the discourse of possession resembles the concept of monarchical sovereignty in which the
monarch holds and exercises power. The conceptions present in these two categories violate
the concept of democracy, which, among other aspects, is linked to respect for minority law
and the requirement of inclusive procedures that allow a communicative flow. In this context,
revealing these paradoxes and tensions reinforce the role of law as a source of Justice, promote
the exercise of critical thinking about the instruments of domination for certain purposes and
make the presence of a historical memory with possibilities for social learning essential in a
country that has already experienced the horror of dictatorship.
1 INTRODUÇÃO
que somos (sujeito falante e de direitos), como um meio de discussão e inclusão dos
participantes do mundo da vida. A transição da pré-modernidade para modernidade
provocou o aumento do grau de complexidade das sociedades, incrementa a
racionalização, com a busca de respostas não mais apoiadas no dito de uma autoridade
antiga, mas sim em argumentos racionais não mais construídos com base em tradições,
costumes e a presença de uma autoridade inquestionável. Essa organização impacta o
sistema (formado pelo mercado capitalista e o Estado burocrático) e o mundo de vida
(espaço onde vivemos nossa vida cotidiana, no qual construímos nossa identidade e
estamos submetidos a normativas –regras, ética, moral, família).
Habermas gradativamente se aproxima da teoria da Moral e da teoria do Direito,
posicionando o Direito como dobradiça (articulação). Ora o sistema se vale do Direito
para invadir e colonizar o mundo da vida, com a excessiva burocratização e por outro
lado, também o Direito se acopla ao mundo de vida, pois as expectativas desenvolvidas
pelo Direito chegam pela vida da política a se consubstancializar em normas jurídicas
que criarão obstáculos ao sistema, limitando os imperativos do sistema. O Direito,
portanto, pode se prestar a ambos.
O objetivo do trabalho é analisar elementos do discurso de posse presidencial
em 2019 que confrontam as proposições de Habermas. O livro Facticidade e Validade
(HABERMAS, 2020) e suas interlocuções com o Direito Constitucional será adotado
como referencial teórico, além de outros autores que possam contribuir para o escopo
do artigo. Para fins de recorte metodológico e considerando os limites da natureza do
trabalho foram eleitos os seguintes conceitos para discussão: povo, soberania e
democracia, que mais se destacaram no discurso de posse do presidente Jair
Bolsonaro.
Nesse sentido, este artigo busca responder a seguinte questão disparadora:
Quais são as concepções adotados nas práticas discursivas do presidente Jair
Bolsonaro no ato de posse no que se refere aos conceitos de povo, soberania e
democracia?
A tensão entre Direito e política se faz cada vez mais acirrada e presente
atualmente, tendo em vista que a todo momento a política desrespeita as normas
jurídicas. É preciso ressaltar que as bases patriarcais, racistas e misóginas da sociedade
brasileira, com ameaças ao Estado democrático de Direito nas práticas discursivas do
cotidiano, provocam a impossibilidade do diálogo e da emergência do “igual respeito e
consideração”.
1De acordo com Habermas (2020, p. 220) “Esse poder comunicativo só pode se formar em esferas
públicas não deformadas, resultando das estruturas de intersubjetividade intacta de uma comunicação
não distorcida. Ele surge no contexto de uma formação da opinião e da vontade (...) com as liberdades
comunicativamente desencadeadas”
Ainda sobre esse princípio, Durão (2009) explica que Habermas ao invés de
identificar a soberania popular no povo no sentido de um macrossujeito, escolhe por
expandi-la por meio do “intercâmbio entre redes informais de comunicação da esfera
pública e as instituições formais do estado de direito, com o objetivo de produzir uma
figura política anônima ou carente de sujeito” (Durão, 2009, p. 126). Levando em
consideração então que a soberania popular não se localiza num lugar ou sujeito
especial, é preciso que se garanta um amplo espaço de participação na apresentação e
contribuição de temas com o objetivo de formação de opinião e vontade capazes de
transformar-se em leis, sem a manipulação dos grandes grupos de interesses e do
próprio estado de direito. Como os cidadãos, na sociedade civil, dada a complexidade
dos subsistemas não podem organizar-se para deliberar, é preciso a introdução do
princípio parlamentar, para a institucionalização de corpos legislativos que tomarão
decisões. Durão (2009) sintetiza que a “lei é o resultado da tomada de decisão dos
corpos legislativos, na medida em que estes representam a institucionalização jurídica
dos discursos práticos e das negociações sob condições equitativas, implementadas
pelos próprios cidadãos que formam a opinião e a vontade na esfera pública” (DURÃO,
2009, p. 132).
O segundo princípio, da ampla proteção jurídica, Habermas afirma que a
competência legislativa, que se assenta no nível fundamental sobre a cidadania em sua
totalidade, é exercida por assembleias parlamentares que fundamentam as leis de
acordo com os procedimentos democráticos. Essas leis constituem a base para as
pretensões jurídicas individuais, que decorre da aplicação das leis aos casos
individuais, sejam tais normas autoaplicáveis ou carentes de complementação
normativa, sendo que, dessas pretensões, surge a garantia de ações jurídicas
(HABERMAS, 2020).
O princípio da legalidade e do controle judicial da Administração reforça o
significado central da separação de poderes. A distinção institucional expressa na
constituição de ramos separados de governo tem a finalidade de vincular o uso do
poder administrativo ao Direito democraticamente promulgado de um tal modo que o
dominação. Assim como em Habermas (2020), Müller (2003) defende que o povo
enquanto totalidade não possui nenhum corpo unitário, não constitui nenhuma
vontade unitária, não é homogêneo nem sujeito, pois “são sempre os representantes de
representantes que agem pelo povo” (MÜLLER, 2003, p. 37).
As promessas no discurso de posse são incompatíveis com o projeto político-
ideológico que venceu as urnas em 2018. A pauta econômica liberal com promessas de
reformas envolvia riscos que não foram analisados pela parcela da população. A
ampliação do mercado às custas da diminuição de determinados setores do Estado
também não foi levada em consideração. O profº David Gomes elenca as consequências
da ampliação do mercado:
mobilizadas, que encontram uma base nas associações de uma sociedade civil.
Partindo de uma visão procedimentalista, a ideia de soberania do povo atenta para as
condições sociais marginais, não se concentra no povo nem pode ser colocada em
anonimato das competências jurídico-constitucionais.
(...) Nossas Forças Armadas terão as condições necessárias para cumprir
sua missão constitucional de defesa da soberania, do território nacional e
das instituições democráticas, mantendo suas capacidades dissuasórias para
resguardar nossa soberania e proteger nossas fronteiras.
Habermas (2020) esclarece que a conexão interna entre direito e poder político
impacta nas implicações que os direitos subjetivos tem em relação ao direito positivo,
pois
O direito a iguais liberdades subjetivas de ação se concretiza em
direitos fundamentais, que enquanto direitos positivos são reforçados
com ameaças de sanção e podem ser reivindicados contra a infração de
normas ou interesses contrários. Assim, tais direitos pressupõem o
poder de sanção de uma organização que dispõe dos meios de aplicação
legítima da violência para assegurar o respeito pelas normas jurídicas.
Isso concerne ao aspecto segundo o qual o Estado mantém na reserva
uma força de caserna para, por assim dizer, "assegurar" seu poder de
comando (HABERMAS, 2020, p. 184)
2 Na compreensão dos autores como “o ato de evitar ações que, embora respeitem a letra da lei, violam
claramente o seu espírito (LEVITSKY; ZIBLATT, 2018, p. 122)
4 CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA
RESUMO
No atual estágio da Modernidade, promover a inovação ou a cultura que lhe é subjacente
(cultura da inovação) parece ter tornado algo natural, indistintamente: “Cultura” é uma
palavra que nos remete ao passado das sociedades. As temáticas próprias à modernidade se
multiplicam, tais como: Inovação, cultura, desenvolvimento, intervenção estatal, relação entre
público e privado, ciência e tecnologia, diversidade cultural, democracia, liberdade, dentre
outros; ao mesmo tempo essas temáticas mantém uma ligação fecunda com o novo, e, por
extensão com o ato de inovar; Simultaneamente esta nova fase da modernidade: descolou a
ideia de Estado do entendimento que se tinha de território, fazendo (re)surgir: novas
territorialidades; a questão relativa ao problema da diversidade cultural nos territórios; e a
questão relativa à aderência – ou não – da noção de cultura da inovação que se pretende
promover às diferentes manifestações culturais próprias das novas territorialidades que
emergem. Pretende-se com esta pesquisa: compreender o conceito de cultura da inovação,
indagando acerca da importância da cultura da inovação no contexto da modernidade.
Entender o problema ao sabor do contraste entre a cultura da inovação na modernidade atual
e a diversidade cultural que desponta com a nova questão territorial que se coloca para o
desenvolvimento do capitalismo. Propõe-se que os objetivos sejam alcançados através da
investigação na obra de quatro autores a relação possível de ser estabelecida entre inovação e
modernidade e o conteúdo da noção de cultura da inovação. Os autores são: Joseph
Schumpeter (1883 -1950) David Harvey (1935-) Agnes Heller (1929-2019) Zygmunt Bauman
(1925-2017) Assim, propomos o estudo da cultura da inovação, no primeiro capítulo,
principalmente a partir da obra de Schumpeter - A teoria do desenvolvimento econômico
(1982), passando ao escopo da inovação na teoria da modernidade em David Harvey e na
condição política pós-moderna, de Agnes Heller, tomando-se as suas obras – Condição Pós-
moderna e A Condição Política Pós-Moderna. No terceiro capítulo, verificamos se a noção de
cultura da inovação inscrita como cultura na Modernidade Líquida, adere ao conceito
formulado por Zygmunt Bauman nesta sua obra, diante do que nos colocamos a pergunta,
teríamos todos nos transformados em meros prestadores de serviço ao capital, ou a obra de
seu epígono e último iluminista, a saber, Karl Marx, já não adequa-se ao metro-critico em
apenso a este período que é proposto pelo velho Marx adequando-se ao tema da teoria dos
sistemas segundo a influência de Parsons, adequando-se ao neopragmatismo advogado pelo
filósofo alemão Jurgen Habermas, enfim, para entender se este mundo passou de fato por uma
transformação numa época tal qual teorizado de uma certa forma, redefinindo a modernidade
ocidental pelo conceito de pensamento pós-metafísico desde a perspectiva desenvolvida pelo
neopragmatismo até Habermas e sua ótica fundada no iluminismo da sociedade esclarecida
(auffklarer).
ABSTRACT
In the actual stage of modernity to prommote the innovation and the culture that is subsumed
to it, appears to happen with any distinction: Culture is one word that is stribed in the past of
the socyeties. The themes wich are properly related to modernity are multiplied: Innovation,
culture, development, State Intervention, relation between the public sphere and the private
sphere, Science and technology, cultural diversity, democracy, freedom, among others; While
it happens, the new phase of modernity: diferentiates the idea of State and the notion of
territory; that, makes the ressurgence of: new territorializations; the question related to the
new territorialization in the territory; and the question of the adherence – or not – between
the culture of innovation that is intendend to prommote and the cultural diversity manifested
in the new territorializations that is emergent. The core aim of this research is given by the
objective of the work as put it next: to verify what is the place of the culture of innovation,
inquiring he importance of the culture of innovation in the context of modernity. Also, to
understand in the form of this type of contrast between the culture of innovation in the actual
modernity and the cultural diversity that is pointed at the center of the territorialization
brought by the economical transformations of the capitalist system. We propose that these
objectives are going to be enhanced by the study of those four authors that could be taking in
the work of each one the relation between the modernity notion of society and what innovation
is at this context, as well the content of the culture of innovation. The authors considered are:
Joseph Schumpeter (1883-1950); David Harvey (1935-); Agnes Heller (1929) and Zygmunt
Bauman (1925-2017)This work evolves in three chapters in which is intended to study the
culture of innovation, in the first chapter, in terms of the work made by Joseph Schumpeter,
The Theory of Capitalist Development, as we pass by it, to the scope of those concepts of
innovation in the theory of modernity by David Harvey, and in the political Theory of Agnes
Heller, taking theirs Works. In the third chapter, we treat to verify if the conceptualization of
the culture of innovation, that is inscripted as culture in the contemporaneity is due to the
concept of Liquidity Modernity, such as it is formulated by Zygmunt Bauman, when we
formulate the question that: Do we all have to become merely serviced to the capital, or the
world doesn’t evolve like treated by the last auffklaurer that is Marx from the foresee influencer
in Das Kapital and furthermore for the theory of systems by Talcott-Parsons, as developer by
Habermas, to understand if this world passed for these epocal transformation theorized at this
way redefined the western modernity for the concept of post-metaphisical thought since the
understanding of neopragmatism from Habermas in The dialetics of enlightment.
mais, na modernização política ocidental, quando, tem no iluminismo o seu fator chave
para aclarar o quê, de fato, consiste, ou se resume, o problema que procura e que se
pode entender, a partir de então - e é o que autores da teoria social fazem
hodiernamente a partir do racionalismo das luzes - a saber, por que este requisito, a
razão, partindo da idéia de inovação para os autores que trataram da modernidade,
incluindo, ainda o Joseph Schumpeter, dado a herança Schumpeteriana que estava
predicando tal operação no capitalismo, encaram o mundo ocidental como a arena
política “par excellence” da democracia, onde se remontam ao renascimento, a origem
da ciência política bem como a noção de pós-modernismo, por um viés anti-
racionalista assim o fazem, portanto, determinando das mesmas teses da pós-
modernidade um vínculo com o fim das ideologias políticas, que o mundo carreou, com
a globalização, mas não da modernidade como progressiva iluminação da razão -
(HARVEY, 1992).
O que se pode verificar, atualmente, diante disto, portanto, da busca do lucro, ou,
sua consolidação atual numa história que é própria da expansão do capitalismo, cujo
elemento histórico, realmente contemporâneo, se tornou notável no após-guerra e que
é constituído na medida em que vinha se constituindo como tal, como uma revolução
tecnológica, temos a segunda base de seu pensamento, que culminou na sua crítica a
razão funcionalista. Com efeito, chamada de pós-modernidade, pode ser estudada pela
forma onipresente como, do ponto de vista econômico, isto é, principalmente depois
do após Segunda-Guerra, dentro da história do moderno capitalismo imperialista, vale
dizer, pela constante defesa da livre-empresa nos sistemas econômicos, temos pela
primeira vez na história, um sistema de Estados que formou a história contemporânea
dividindo casos de êxito de outros casos de “Estados fracassados” – (HABERMAS,
2010), de um lado, para os empresários todo o panorama histórico se pode
desvelar, pela razão propriamente de autores da teoria social contemporânea, pelo que,
para Domingues:
Se, para autores como Harvey (2012), o capitalismo então, terá levado a uma
constante forma de colonização do espaço pelo tempo, e, a aceleração do
desenvolvimento em todo o chamado terceiro-mundo, mas que, não impedindira em
nossa era, guerras e os conflitos de todo gênero, sendo a face mais concreta, daquilo
que para este segundo autor remonta pelo fim desta das ideologias, sendo isto o cerne
das transformações atuais como a compressão do tempo-espaço, exatamente, a relação
internacional se torna o mobil mais relevante do vetor que Habermas reconhecendo,
entre nós, ocidentais, dentre os três propriamente princípios modernos, discerniveis
em sua demarche, a saber, renascimento-Iluminismo-cientificismo, quando, pois,
segundo expressão de Harvey, tomada de Guattari, “o capital reterritorializa com uma
mão o que des-territorializa com a outra”, para o sociólogo alemão o Estado-Nação que,
para Habermas, enfatizemos aqui, tomado pela noção de trabalho que estava predicado
pela liberdade econômica e a liberdade nas relações de trabalho entre o patrão, os
operários, e demais constitutivos das relações societárias, desde que, evidentemente
sob as relações entre o capital e o operariado, cumpria notar ademais, que sua tese, a
saber, de que o projeto da modernidade, pelo que Weber conceituara como
desencantamento do mundo, aliás, tese esta que em sua obra passa a determinar uma
heurística, pode-se entender, conseguintemente – e daí a menção forçosa ao sociólogo
mais próximo da tese do Marx de O Capital – que, sob o prisma da razão comunicativa,
exatamente, enquanto para alguns, nele se prende o tal intento de visualizar, a cultura
atual do capitalismo, diferentemente de Harvey, para quem à concepção embutida no
discurso da teoria social que se legitima, quando se faz por uma variável econômica
(uma constante que está diretamente vinculada as noções entre progresso material
lado a lado no ciclo econômico), vemos, emergindo “in nucce” o indivíduo-social, mas,
para Habermas tudo isto o faz dar um passo mais além antes da crítica a razão
econômica, apelando para isto, ao neopragmatismo. O ponto de partida no que diz
respeito ao estudo em tela, é notar que deve estar claro quando se fala de cultura da
inovação, propriamente, a que está sendo referido exatamente. Na pesquisa
sobejamente conhecida da Sociologia e da teoria política, mas com acréscimos
substanciais dos economistas clássicos e neoclássicos, em que o indivíduo, que para
nós constituise no centro da argumentação, tanto de Weber pelo método tipológico que
viera sendo estudado pela Sociologia (mas também pela Economia), passaria, então,
por Habermas, desde a ótica da modernidade, ao estudo da sociedade politicamente e
2 OBJETIVOS
Quando Raban (1974) fez seu relato em um livro que Harvey considera
interessante para confirmar o relato como marco histórico inicial sobre a condição pós-
moderna, portanto, uma dentre as muitas relações que o termo poderia ter com a
sociedade atual, fez com que jamais deixasse de ter em conta que, nesta obra, mais que
uma manifestação anti-moderna, haveria um presságio – detectado pelo próprio
Harvey – da vida urbana, por causa de certa maneira de tratar os problemas, dados
como eram tratados nos círculos populares e acadêmicos.
Termos como gentrification (surgimento de uma camada social média) e
yuppies, enquanto jovens profissionais urbanos passam a ser tidos como descrições
comuns da vida urbana. Harvey explicita o nexo, não necessariamente férreo, entre
formas de experiência mutante, entre a vivência prática do tempo e do espaço e,
subsequentemente, propõe que esta “[...] ascensão de formas culturais pós-modernas
[...] [está relacionada aos] [...] modos mais flexíveis de acumulação de capital e uma
compressão do tempo-espaço” (HARVEY, 1992, p. 288).
Inicialmente, Harvey procura entender a razão pela qual tenha corrido tantos
anos, desde quando escritos críticos surgiram, tratando de cidades e temas urbanos,
detendo-se, por exemplo, em problemas de grandes urbanizações depois de intensa
modernização nos EUA. Se pensarmos em livros como A Morte e Vida de Grandes
Cidades, de Jacobs (2007), o autor considera que descrições vibrantes surgem, então,
“[...] que demonstram aspectos vibrantes e tons coloridos em situações que outros
autores somente viam dentro de prismas quadrados e tons de cinza” (HARVEY, 1992,
p. 15).
Porém, segundo o relato de Harvey, durante os anos que se seguiram à
publicação de Soft City, enquanto era escrito por Raban, trouxera uma novidade, pois,
importante é notar que a cidade deveria dar o quanto de liberdade fosse necessário
para cada um se tornar aquilo que realmente queria fazer de si mesmo.
A cidade seria ocidental porque não era dada à mera disposição das pessoas,
uma realidade matematizada (ao contrário do que se poderia imaginar pela pena da
teoria social). A cidade era mais parecida com uma linguagem teatral, uma série de
palcos que, segundo Raban (1974) e de acordo com Harvey (1992), os indivíduos
poderiam operar nos seus afazeres uma magia distintiva, enquanto respondiam a uma
multiplicidade de papéis.
Este berro altissonante é mais que uma mera descrição num relato de um jovem
homem profissional. Contrapõe-se ao temor de que as cidades estivessem sendo
devoradas pelo totalitarismo dos planejadores, dos burocratas e elites O que é uma
cidade para Raban (1974), é uma questão que pode ser arguida, como se fosse
direcionada a cada um, assim como o que nela receberia o cognome de pós-moderno,
ou seja, sua conotação adveio de padrões sempre derivados de uma forma bastante
comum de inovação, o indivíduo social.
A resposta a estes tipos de indagações são importantes noutro sentido e o qual
convém especificar, isto é, quando se aponta, em meio às modas da cidade, que o estilo
arquitetônico e sua mudança melhor seriam aproximados das preocupações da alta
cultura e da vida diária, através da produção da forma construída, temos um problema
relacionado ao capitalismo.
Para Harvey (1992), o problema é que o texto fora bem recebido por causa das
máscaras da cidade, encorajadas pelo perigo do assassinato, da violência, quando todo
o empreendimento se tornou uma moda; e aquilo que se chama de "novo" no
capitalismo, apenas fornecia mais um elemento desta gramática da cidade. Ora,
quando se sabe que Londres é uma cidade que se organiza com máscaras, sob o risco
do assassínio absoluto, o fato a que nos referimos aqui, ou o ato de situar o que seja
uma inovação aí ainda que seja potencialmente um valor considerado importante, não
será mais que uma mixórdia: fantasias e disfarces ganham cor e tela para pintar, e cada
pessoa diz ser o que a cidade é.
Dizemos instalar-se o problema da pós-modernidade mesmo em textos como o
de Raban (1974), por problemas intrínsecos da modernidade, porque na sua tensão
constituinte, o cânone da modernidade, como sendo metade transitória, fugidia,
fortuita, metade eterna e imutável (HABERMAS, 2002). Não se pode querer
estabelecer o novo sem negar o velho, como bem sabiam as vanguardas do século XX.
Mas, o que vemos ser retesado como uma noção válida de pós-modernismo tem relação
com um contexto de relação com o "novo", que agora colocou a última moda em tensão
com o modernismo, insinuando um valor absoluto que a modernidade detinha para
manifestações pueris.
O projeto filosófico da modernidade tinha sua “raison détre” numa constituição
inequívoca do projeto político das classes modernizantes, sempre que modernização e
modernidade retroagiam sobre o quadro político da industrialização. Isto levará a uma
divisiva em relação ao homem antigo e medieval: a dominação, a força, a violência e o
sadismo eram valores não reconhecidos, mas sim a universalização do racionalismo,
as leis científicas, os valores morais universais e as leis universais, além da autonomia
interna da arte, que serviram para este projeto se tornar hegemônico como um
moderno sistema filosófico - com as suas leis internas.
Desde que a modernidade se tornou um elemento importante, o cientificismo
determinava o padrão de conduta de uma sociedade que instalara não menos que uma
regra: a de uma vida bem vivida. Adorno e Horkhmeier citados por Harvey (1992), em
A Dialética do Esclarecimento, retrata que este projeto era machista turvo, imaginário
que, realizado ou não, buscava-se tal intento por meio da certeza de que todas as
questões seriam resolvidas pela razão, na medida em que suas faculdades estivessem
determinando as regras da moral, do direito, da filosofia e da teologia.
Tanto o regime imposto pelo Fuhrer, como as sombras que vinham do leste se
assenhorearam de um projeto ulterior, já deveras adiantado, mas, que poucos nutriam
esperança de que pudesse levar ao fim pressuposto, imperando uma descrença nas
finalidades desta busca axial (de uma ciência neutra). Se por um lado isto levou a um
dênodo engano quanto a possibilidade do projeto da modernidade, nas regiões mais
inóspitas ao ideal do universalismo, já que o nazi-fascismo impunha regras de
comando político centralizado, inclusive com relação aos juízes, absolutamente
submissos ao hitlerismo, isto não deixou de gerar uma cultura, a cultutra da tragédia
em vista da modernidade, que soava como uma kulturkritik, para autores como Goerg
Simmel.
A pergunta se uma nova configuração das relações de poder nos territórios e
entre os territórios se faz pela determinação daquilo que se chama de inovação? Qual
a importância da ideia de inovação no contexto da modernidade? Porquê - e como - o
“Estado-Nação” se esforça para promovê-la e qual o conteúdo da noção de “cultura da
inovação”? Para que entendamos o conteúdo da noção de “cultura da inovação”, vamos
analisar as orientações gerais das ações de política de ciência e tecnologia voltadas para
a sua promoção: queremos saber, de fato, quê ações são estas que de fato que se quer
promover, e o seu conteúdo.
A idéia de inovação, então, ocupa um lugar teórico importante no sentido em
que Schumpeter deu à noção de dinâmica econômica, mas isto, junto de autores
Marxistas: tais como Harvey, Bauman, que determinam como “mais do mesmo”, nisto
que equivale a dizer que a modernidade e a inovação estão relacionadas de forma
instrumental e diretamente prática.
Em outras palavras, busco responder a questões que vêm demonstrando em
nossa época, ser a inovação importante, tais como demonstradas pela “cultura da
inovação” que, primeiro, existe a partir de uma relação entre a inovação e as políticas
de ciência e tecnologia adotadas pelo governo; em segundo lugar, ao que poderíamos
realizar um levantamento destas políticas no contexto periférico, para responder se
esta relação entre inovação e modernidade, alterada pelo esforço do poder público, mas
que, segundo a visão de Zygmunt Bauman, está em uma posição menos estratégica,
dado a forma como uma modernização recolocou em cena os capitais voláteis no início
do século XXI, ou mesmo, a partir do momento em que este Estado foi remodelado,
“enxugado”, temos qual o lugar das pessoas se a cultura vincula uma consideração
cerrada que faz do local da cultura (espaço concreto) e o grupo social (língua, etnia,
crença).
Então, de onde vêm, qual o lugar, em qual território e em quê condições esta
cultura da inovação se manifesta? A pergunta central que orientava esta presente
pesquisa seria como pensar a idea de cultura da inovação para o conjunto das pessoas
excluídas do processo de desenvolvimento do capitalismo? Em Habermas, pressupõe-
se que, certa noção, a de “cultura da inovação”, vem organizando a relação “público-
privada”, e, particularmente, a intervenção do setor público com o objetivo da
promoção da melhora coletiva
Em segundo lugar, com o objetivo de entender, ou determinar no âmbito do
sistema nacional de economia que se formava no século XVIII, o que apontamos nas
considerações iniciais desta introdução, se não estávamos propriamente em terreno
propriamente do método em economia política, mas no seio do que Marx denominava
processo de produção: nada há que acrescentar a isto, pretendo entender que aquilo
Habermas atesta como um projeto da modernidade desde o iluminismo, transparece
não apenas no discurso filosófico da modernidade, bem como está presente nas suas
3 METODOLOGIA
Deste modo, as perguntas se formam nos nossos dias, mas travando-se o debate,
entre nós, quando em 1961 a guerra-fria se inicia com a construção do Muro de Berlim,
e a divisão entre leste e oeste, deturpando o liberalismo, numa ocasião em que -
lembremos, por enquanto, que temos uma apreciação disto quando Marx escreve na
Ideologia Alemã, que, para o capital, o sistema se faz, porque depende do lucro de seu
negócio mesmo quando está às voltas com o comércio é o lucro do inovador (MARX,
2007, p. 293) como decorrência, a tese construída no imediato histórico, de que afinal
o que dissemos ser a noção basilar, a tese do Capitalismo de Estado, ao vindicar para o
conceito de remessas de lucro, que instaurou entre nós, no Brasil um movimento
pendular entre política nacionalista de um lado, que, vez por outra, em situação de
liquidez no mercado internacional, deve levar a um novo ciclo de políticas
liberalizantes, prestes a alterar os dados amainados da conjuntura internacional,
culturais; o desenvolvimento do ‘seu lugar’ depende disto e você é responsável por ele!
Coopere, se associe, crie soluções inovadoras; você será recompensado por isto!” Ora,
segundo a interpretação por fatores endógenos, os atores intervêm no que disséramos
ser a base do universalismo das relações entre os entes estatais, pois, já ninguém ignora
o fator intermediário do capitalismo, através do Estado, isto é, as relações sociais têm
seu estatuto universal na medida em que solicitadas pelo Estado e o capitalismo, na
arena internacional, toma os estamentos sociais da categoria política república,
sobretudo levando-se em conta alguns documentos de referência desde a emergência
do principado como categoria intermediária da política ocidental, os quais
correspondem atualmente, em um contexto de hegemonia e áreas de influência, até
um termo político determinado pela aspiração de que a existência destes Estados,
assim como outrora surgira em meio ao renascimento, como fator de unificação social
sob a égide do politicismo, atualmente, isto a que apensamos ao que ocorre à baila, sob
o enfoque da mudança social, pelas instituições e o desempenho econômico pela ótica
da Welltaschtung, cujos documentos de referência, se antes passavam pelas fontes
gregas e anglófonas, desta feita se dão pela história da política ocidental na figura de
Maddison, Jay e George Washington, nos leva, ao falarmos sobre as novas perspectivas
na Europa, ao quadro da primeira fase da modernidade, quando retroage até a
estrutura do projeto europeu de união política, fator político, portanto, mas que instou
Jurgen Habermas a uma asseveração sobre a democracia como um dilema atual, sendo
este o ponto central de sua obra, a qual pretendíamos nos acercar, com base em teoria
do agir comunicativo consonante a teoria crítica de Habermas, na qual, sob a linha
obscurantista do capital, desde Karl Marx, pelo primado de sua noção de democracia
em verdade, as quais somente podem ser restauradas pelos nexos inter-subjetivos da
razão comunicativa. Para isto, referimo-nos a ótica Schumpeteriana, que o próprio
Jurgen Habermas em sua obra, principal expoencia do estudo do mundo estranhado
(“entfrendunng”) utiliza-se pelo esclarecimento do seu fundamento pela noção de
Razão Comunicativa.
5 CONCLUSÃO
A América Latina, que, desde há algum tempo atrás, provara ser eficaz para
retirar contingentes enormes de seu inominável atraso, indica desde sua experiência
política que seria necessário, pois, que a independência política tivesse sido alcançada
uma metáfora elegante para o capitalismo desde então pelo termo “destruição criativa”
(SCHUMPETER, 1961. Pág 108)
Como entender distintas fases de concessão e alcance de direitos políticos
dentro do processo político brasileiro, que determinantemente, se aprofunda a partir
de meados do século XX? Este padrão se alterou, quando os ventos democráticos
passaram a ser um fator preponderante com a globalização aprofundada a partir da
década de 1980? O que vêm a ser esta forma de desenvolvimento em bases
nacionalistas desde o primeiro governo Vargas (que encabeça o governo central a partir
de 1930, e retorna ao governo através de um fenômeno político chamado de populismo,
sufragando a democracia em 1937, quando institui a ditadura estado-novista?), senão
como uma questão fulcral, mas que, tem como centro a arena internacional? Além
disto, portanto, se a liberdade, quando teoricamente temos como característica do
segundo vetor como condicionante externo e que se torna vetor da internacionalização
lado a lado a inovação e o meio-de-troca, que serão o que muitos consideravam como
“turn-page”, a virada conceitual da sociologia contemporânea, que lado-a-lado as
atividades-meio, ou de reflexo do sistema, apensa as consequências nacionais da
crescente interdependência, e que pode ser teorizada, no ciclo financeirizado da
acumulação global, pelo conceito determinado não somente pela via da acumulação
por ciclos históricos de acumulação (geradas pela análise de Giovanni Arrighi com as
três fases da hegemonia histórica), como apreende-la já que a noção marxista de
acumulação somente pode vir acompanhada de um conceito genérico de território, a
saber, pelo conceito de espaço produtivo, vinculado ao trabalho fabril e às comunas
operárias, o que, nem sempre é o caso, vemos que, em Habermas – (Ver (Habermas,
2010 PÁG 775) -, quando inserido neste quadro histórico, dentro dos princípios
traçados teóricamente, abrem-se horizontes novos, a saber, desde a livre-iniciativa, a
livre-contratação de trabalhadores no mercado de trabalho, a livre circulação, e que, a
seu modo, acabaram, pois, em alguns casos, por silogisticamente, proceder através da
existência de uma lacuna, fazendo de todo argumento da falta do Welfare, a distorção
conceitual dentro de um mundo sem garantias de direitos inalienáveis, o que o autor
marxista denomina de Entwicklung, ou colonização do mundo da vida, numa nova
matriz da racionalização, adentrando a tradição marxista no mundo pós-metafísico
(HABERMAS, 2010), o que, por obra dela, o escritor de crítica social pode falar em
princípio do desacoplamento (entkopplung) e, enfim, colonização do mundo da vida.
REFERÊNCIAS
FURTADO, Rosa Freire D’aguiar (ORG) e Celso Furtado. Arquivos Celso Furtado.
Primeiras reflexões – Que Somos? Rio de Janeiro: Contraponto: Centro
Internacional Celso Furtado, 2012. (Arquivo Celso Furtado; v 5).
HARVEY, David. Condição Pós-moderna. Edições Loyola, São Paulo, Brasil, 1999.
RESUMO
O presente artigo tem origem em exposição realizada em 24 de novembro de 2021 no I
Simpósio Internacional Habermas, organizado pela Rede Interdisciplinar de Estudos sobre
Violências. Começo aproximando o diagnóstico sobre a sociedade moderna nas obras de
Jürgen Habermas e Walter Benjamin, especialmente no tocante à função e ao significado das
ideologias. Em seguida, discuto as objeções de Habermas à filosofia de Benjamin: contra a
despolitização da teoria crítica; a confusão entre mundo objetivo e social; e o menosprezo dos
esforços materiais da crítica. Essas objeções, que foram desdobradas no artigo Crítica
conscientizadora ou salvadora?, serão gradualmente revistas em escritos posteriores.
Pretendo mostrar que, após releituras, Habermas recua nos dois primeiros pontos e concede
algo no terceiro. A ideia de justiça careceria de complementação pela ideia de solidariedade.
Finalizo mostrando como a teoria habermasiana da solidariedade deve bastante à filosofia de
Benjamin.
ABSTRACT
This essay has its origin in a presentation given on November 24, 2021 at the I Habermas
International Symposium, organized by the Interdisciplinary Network for Studies on Violence.
I begin by approaching the diagnosis of modern society in the works of Jürgen Habermas and
Walter Benjamin, especially with regard to the function and meaning of ideologies. Next, I
discuss Habermas' objections to Benjamin's philosophy: against the depoliticization of critical
theory; the confusion between objective and social worlds; and the contempt of the material
efforts of the critique. These objections, which were unfolded in the essay Consciousness-
Raising or Rescuing Critique?, will be gradually reviewed in later writings. I intend to show
that, after re-readings, Habermas retreats in the first two points and concedes something in
the third. The idea of justice would need to be complemented by the idea of solidarity. I
conclude by showing how the Habermasian theory of solidarity owes to Benjamin's philosophy.
1 INTRODUÇÃO
2 A IDEOLOGIA DO PROGRESSO
1 BENJAMIN, Walter. Der Erzähler. In: ________. Gessamelte Schriften. Rolf Tiedemann und
Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. II. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1977, p. 439-40 [as
traduções foram retiradas da edição BENJAMIN, Walter. Magia e técnica, arte e política: ensaios
sobre literatura e história da cultura. Obras escolhidas. Vol. I. Trad. Sérgio Paulo Rouanet. 8ª ed. São
Paulo: Brasiliense, 2012, p. 213].
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que a escrita já pode existir solitariamente.2 Outra figura recorrente nesse diagnóstico
é o vidro utilizado pela arquitetura moderna. Nada se agarra ao vidro, ele não tem
nenhuma história, não carrega consigo os traços da tradição, não transmite
experiências. O vidro é frio e homogêneo, “é difícil deixar rastros”. Eventuais vestígios
são apenas manchas a serem higienizadas.3 No mesmo sentido, Benjamin reflete sobre
os jornais. A informação jornalística só tem valor enquanto é nova: precisa se entregar
inteiramente ao momento presente e se explicar inteiramente nele. A informação é
explicativa, breve e objetiva. As notícias não se relacionam umas com as outras na
página do jornal, a informação é isolada das experiências do narrador e do leitor. Cada
indivíduo lê sozinho a notícia que lhe interessa, sem se envolver com as outras notícias
e com quem as relata. Fica presa no presente e desaparece amanhã. Pelo contrário,
uma narrativa não se entrega tão facilmente: conserva suas forças por muito tempo.
Admira Heródoto: ele não explica nada, seu relato é seco e, por isso, continua até hoje
suscitando espanto e reflexão.4 Os temas levantados por Benjamin orbitam esse
diagnóstico de época: a perda da capacidade de ter experiências decorrente da
racionalização da vida.
Assim interpreta Habermas o diagnóstico benjaminiano do empobrecimento
cultural: as culturas dos especialistas passam a desvalorizar, descredibilizar e romper
as conexões com a cultura tradicional, provocando rigidez das práticas e desolação. 5 Se
as linguagens especializadas (ciências, economia, direito, filosofias etc.) adquirirem
um significado intrínseco, com lógicas independentes (eigensinnig), também se
dissociam do mundo da vida cotidiano, gerando empobrecimento cultural. “Aquilo que
se acrescenta à cultura, mediante elaboração e reflexão, não chega sem mais ao
domínio da prática do dia a dia. Ao contrário, com a racionalização cultural, o mundo
da vida, desvalorizando em sua substância tradicional, ameaça empobrecer”. 6 O lado
reverso da autonomia das áreas do saber é a fragmentação das correntes da tradição
cultural que alimentam a vida cotidiana.7 O empobrecimento cultural manifesta-se,
Vernunft. Bend 2. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1981, VIII, 1, p. 483 [doravante TkH-II].
6 HABERMAS, Jürgen. Kleine politische Schriften I-IV. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1981, p.
8
TkH-II, VI, 1, p. 215-6.
9
BENJAMIN, Walter. Über den Begriff der Geschichte. In: ________. Gessamelte Schriften. Rolf Tiedemann
und Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. I. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1974, pp. 693-704 [as traduções
foram retiradas, com algumas alterações, da já referida edição BENJAMIN, Magia e técnica, arte e política].
10
BENJAMIN, Walter. Eduard Fuchs, der Sammler und der Historiker. In: ________. Gessamelte Schriften.
Rolf Tiedemann und Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. II. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1977, p. 478.
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FELIPE MORALLES E MORAES
histórico, assim como a teologia judaica, são modelos de que se vale Benjamin, entre
outros, para corrigir as concepções sistemáticas, mecanicistas e deterministas da
história.
A ideia de progresso é suspeita, reconhece Habermas: “o que se apresenta como
progresso pode logo significar a intenção de perpetuação dos reputados vencidos”. A
liberação das forças produtivas, que supostamente daria cabo ao capitalismo, ainda
não significa a criação de interações não coagidas. A libertação da miséria, fome, fadiga
decorrentes da implosão do capitalismo não equivale à libertação da dominação e da
infelicidade. A crítica benjaminiana ao progresso tem razão em exigir uma ideia mais
intensa e enfática, que não se deixa cegar pela mera aparência de emancipação.11
Habermas concorda que essa busca no passado pela motivação transformadora
que sobrevive na cultura é o que mais bem traduz o projeto da modernidade – como
escreve em Modernidade - um projeto inacabado.12 “Desde sempre se considerou o
clássico aquilo que sobrevive aos tempos: no entanto, o testemunho moderno, em
sentido enfático, já não extrai tal força da autoridade de uma época passada, mas
unicamente da autenticidade de uma atualidade passada”. A consciência moderna do
tempo é, a um só tempo, destruidora e produtiva: não exprime só a experiência de
aceleração, efemeridade e descontinuidade, mas também “a nostalgia de um presente
imaculado, imóvel”.13 O moderno não poderia ser definido só pela negação do antigo,
do contrário, estaria destinado a se tornar obsoleto e envelhecido. A linha de
demarcação tenderia a se apagar, ao se transformar, cada vez mais rapidamente, em
seu contrário. Benjamin apreende bem o moderno. Esse não se limita à
descontinuidade, à ruptura com o passado e com a tradição, porque precisa ver na
continuidade do presente com o passado a possibilidade de renovação. Apenas um
inacabado. In: ARANTES, Otilia Beatriz Fiori; ARANTES, Paulo. Um ponto cego no projeto
moderno de Habermas: arquitetura e dimensão estética depois das vanguardas. São Paulo:
Brasiliense, 1992, p. 101-2].
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14 MENKE, Christoph. Aporien der kulturellen Moderne: »Die Moderne – ein unvollendetes Projekt«
(1980). In: BRUNKHORST, Hauke; KREIDE, Regina; LAFONT, Cristina (Hrsg.). Habermas
Handbuch. Stuttgart: J. B. Metzler, 2009, p. 206.
15 NO, p. 212-4.
16 NO, p. 215-7.
17 NO, p. 231.
18 NDII, p. 196.
19 NU, p. 161/ NO, p. 237.
20 HABERMAS, Jürgen. Die nachholende Revolution: kleine politische Schriften VII. Frankfurt am
Schriften. Rolf Tiedemann und Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. II. Frankfurt am Main:
Suhrkamp, 1977, p. 158.
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FELIPE MORALLES E MORAES
25 ROSEN, Michel. Benjamin, Adorno, and the decline of the aura. In: RUSH, Fred (ed.) The
Cambridge companion to critical theory. Cambridge: Cambridge University Press, 2004, p. 44.
26 BENJAMIN, Walter. Ursprung des deutschen Trauerspiels. In: ________. Gessamelte Schriften.
Rolf Tiedemann und Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. I. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1974,
p. 216-7 e BENJAMIN, Walter. Über Sprache überhaupt und über die Sprache des Menschen. In:
________. Gessamelte Schriften. Rolf Tiedemann und Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. II.
Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1977, p. 140-157.
27 PpP, p. 350.
28 BENJAMIN, Trauerspiel, p. 358.
29 Cf. GAGNEBIN, Jeanne Marie. História e narração em Walter Benjamin. 2. ed. 5. reimp. São
Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. I. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1974, p. 691 (44).
31 PpP, p. 359-61.
32 PpP, p. 361-3.
33 TkH-II, VIII, 2, p. 519-22.
34 TkH-II, VIII, 2, p. 521.
35 BENJAMIN, Über den Begriff der Geschichte, p. 693.
ideologia com crítica salvadora, porque a salvação não adquire uma relação imanente
à prática política.36 Ao se concentrar nos potenciais semânticos abertos pelo passado,
atribuiria à práxis política uma posição secundária. Como a violência mítica, a
violência revolucionária não mudaria as relações de produção, simplesmente se
expressaria publicamente.37 No mesmo sentido, Adorno já havia acusado que o flerte
com imagens utópicas arriscava uma consolação psicológica substitutiva para
sofrimentos objetivos. Assimilar progresso à redenção faria perder seu significado
perceptível, objetivo e sensível.38
Ao contrário do que as acusações dão a entender, porém, as imagens de
redenção não podem ser acusadas de fornecer consolações psicológicas. A felicidade
não pode ser obtida esotericamente, de modo místico e solitário. É essa precisamente
crítica benjaminiana à teocracia. Ela tem um sentido religioso e nenhum sentido
político: busca um consolo de imortalidade, não a felicidade atual. 39 Benjamin invoca
uma “iluminação profana”.40 Argumentando nesse sentido, Jeanne Marie Gagnebin
invoca a metáfora do mata-borrão com que explica sua relação com a teologia. Seu
pensamento absorve ensinamentos, mas torna o texto sagrado dispensável. “Como se
a tinta da primeira página estivesse sido totalmente apagada e só restasse para nós a
constelação de manchas e sinais que… deveriam ser suficientes, ainda que não haja
possibilidade de volta ao texto primitivo”. As figuras teológicas precisam ser absorvidas
ao ponto de desaparecerem enquanto figuras religiosas.41 Na segunda das Teses sobre
o conceito de história, o messias não é apresentado como um salvador esperado pelo
povo, mas cada geração mesma de cidadãos, a quem compete uma ação política
transformadora. A direção de uma busca política da felicidade tem muito mais força,
argumenta Benjamin, do que a intensidade da religião, que é atravessada de
sofrimento.42 A crítica salva exotericamente as experiências enfáticas e as
possibilidades de redenção profanas.
36
PpP, p. 368.
37
PpP, p. 369.
38
ADORNO, Theodor W. Progresso. In: ______. Palavras e sinais: modelos críticos, 2. Trad. Maria Helena
Ruschel. Petrópolis: Vozes, 1995, p. 42.
39
BENJAMIN, Walter. Theologisch-politisches Fragment. In: ________. Gessamelte Schriften. Rolf
Tiedemann und Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. II. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1977, p. 203.
40
BENJAMIN, Walter. Der Sürrealismus: die letzte Momentaufnahme der europäischen Intelligenz. In:
________. Gessamelte Schriften. Rolf Tiedemann und Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. II. Frankfurt
am Main: Suhrkamp, 1977, p. 297.
41
GAGNEBIN, Jeanne Marie. Teologia e messianismo no pensamento de Walter Benjamin. In: _______.
Limiar, aura e rememoração: ensaios sobre Walter Benjamin. São Paulo: Editora 34, 2014, p. 190-1.
42
BENJAMIN, Theologisch-politisches Fragment, p. 204.
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49 PpP, p. 356.
50 HABERMAS, Jürgen. Conhecimento e interesse. Trad. Luiz Repa. São Paulo: Unesp, 2014, p.
68.
51 PpP, p. 357-8.
52 BENJAMIN, Über Sprache überhaupt, p. 156.
53 BENJAMIN, Über Sprache überhaupt, p. 213; cf. GAGNEBIN, Jeanne-Marie. Do conceito de
mimesis no pensamento de Adorno e Benjamin. Perspectivas, São Paulo, n, 16, 1993, p. 80-1.
54 BENJAMIN, Walter. Über einige Motive bei Baudelaire. In: ________. Gessamelte Schriften.
Rolf Tiedemann und Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. I. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1974,
p. 623.
G&A, João Pessoa, v.10, n.2, p.102-122, jul./dez. 2021 114
FELIPE MORALLES E MORAES
tempo de agora para o explodir para fora do curso homogêneo do tempo. Outro, ainda,
os franco-atiradores da revolução de 1830, que disparavam contra os relógios
localizados nas torres a fim de parar o tempo, nas célebres figuras das décimas quarta
e quinta teses. A dialética alegórica de Benjamin transforma o desprezo esotérico do
mundo terreno em seu oposto: um agarrar-se ao concreto e profano.55 A interrupção
messiânica do tempo nada tem a ver com um salto ingênuo de volta ao passado, nem
com uma mistificação dele, senão com a solidarização com os que foram
historicamente calados, marginalizados e exterminados.
Uma década mais tarde, remontando a obra benjaminiana, Habermas vai
reconhecer que sua teoria crítica defende, em vez do resgate da interlocução imediata
com a natureza, a criação de uma responsabilidade humana alargada. “...[T]oda a
natureza começaria a reclamar se lhe fosse emprestada a palavra” – onde “emprestar
a palavra” é mais do que “fazer falar”, acrescenta Benjamin. A natureza reclamaria
também da sua falta de fala.56 É dizer: defende-se uma solidariedade natural, histórica
e universal, em que a humanidade tem responsabilidade pelo mundo natural, em que
as gerações presentes têm responsabilidade simultaneamente pelas gerações futuras e
passadas.57 Os oprimidos não são apenas a classe operária e os atualmente dominados,
mas uma massa bem mais vasta: todos os que foram silenciados pela humanidade e
pela história.
A terceira objeção de Habermas – que ele não dissocia das anteriores, mas que
destaco como um refinamento – é que a filosofia benjaminiana ficaria aquém de uma
profanação, porque o materialismo histórico conta com um progresso na dimensão das
forças produtivas e da dominação política, o que “não pode ser coberto por uma
concepção de história antievolutiva como um capuz de monge”. Ao berlinense interessa
a experiência enfática da revolução mais do que suas mudanças objetivas, a evolução
social e o processo de transformações.58 O tempo de agora não chega a ser um tempo
politicamente originário, porque não funda novas instituições. Sua visão anarquista faz
com que prefira a “violência divina”, que abole todo direito, do que a “violência mítica”,
que funda um novo direito.59 O que questiona Habermas aqui é o teor dos esforços
emancipatórios da crítica: se não haveria uma emancipação relacionada não
necessariamente à felicidade de cada um, mas possivelmente ao bem-estar material e
ao fim da repressão. As conquistas na dimensão econômica e institucional não podem
ser recusadas como uma simples restrição do diferente e uma reprodução do mesmo.
De fato, a crítica de Benjamin dirige-se contra uma concepção do progresso
insensível à vida realizada, em vez da mera melhoria da reprodução da vida. A
verdadeira emancipação não poderia visar bem-estar material e liberdade, sem visar a
felicidade, como escreve: “a ordenação do profano deve-se erguer sobre a ideia de
felicidade. A relação dessa ordenação com o messiânico é um dos elementos
doutrinários essenciais da filosofia da história”.60 A felicidade é a única diretiva
possível da história. Essa é uma visão maniqueísta do progresso, acusa corretamente
Habermas. Ela mede os sistemas econômico e político com base unicamente na
dimensão cultural.61 Enreda-se em uma utopia irrealista ao confundir a infraestrutura
de intersubjetividade incólume, capaz de abrigar uma multiplicidade de formas de
vida, com a totalidade concreta de formas de vida bem-sucedidas.62 Falha em perceber
que progressos não desprezíveis ocorrem quando se supera a fome e a dominação,
mesmo que esses progressos não criem novas identificações, experiências e
lembranças. A crítica não pode ser orientada só pelo critério da felicidade, mas também
por instituições contra a opressão. Se essas transformações não realizam, apenas
aliviam, o alívio precede a realização pessoal e dissipa as identificações, experiências e
lembranças que eram catastróficas.63 A imagem de pessoa e de sociedade emancipada
invocada por Benjamin sobrecarrega os esforços críticos com pretensões sublimes de
felicidade, quando “o que é mais importante vem primeiro”.64
Em momento de releitura, Habermas obtempera. Se injustiças irrevogáveis
foram perpetradas em gerações passadas, permanece um espinho na ideia de uma
59 BENJAMIN, Walter. Zur Kritik der Gewalt. In: ________. Gessamelte Schriften. Rolf
Tiedemann und Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. II. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1977, p.
199.
60 BENJAMIN, Theologisch-politisches Fragment, p. 203.
61 PpP, p. 373-4.
62 NO, p. 238.
63 PpP, p. 374-5.
64 PpP, p. 375.
justiça construída no presente. Esse espinho não pode ser retirado do coração da
justiça, apenas esquecido. E o esquecimento deixaria traços dos reprimidos. Assim, há
um problema na ideia de sociedade justa. É um problema do qual já estava ciente Kant:
as velhas gerações seriam instrumentalizadas em favor das que vivem em uma
constituição perfeitamente justa, que teriam a sorte de habitar na mansão em que uma
longa série dos seus antepassados trabalhou, que não puderam partilhar da felicidade
que prepararam.65 O fardo histórico da realização da justiça precisa ser motivado pela
esperança das gerações atuais na possibilidade de realização plena da espécie humana
e, assim, pela lembrança daqueles que fracassaram ou sucumbiram na realização desse
plano pelas gerações futuras.66 O passado pode servir como o signum rememorativum
de uma história da realização possível da justiça.67 Benjamin chama atenção para
ambas necessidades subjetivas da filosofia da história: tanto que é necessária a imagem
de uma vida redimida para motivar as gerações presentes, quanto que as gerações
futuras só podem compensar as gerações passadas suplementando a universalidade
abstrata dos princípios de justiça com uma rememoração, a qual vai além da ideia de
justiça. A rememoração é uma lembrança por meio da compaixão solidária com os que
sofreram e não podem mais ser remediados. A compaixão pelos que sofreram violação
da integridade física e moral é um limite para as éticas universalistas.
Ainda assim, Habermas insiste que, embora esteja além da justiça, a relação
estabelecida pela solidariedade continua seguindo um postulado moral universalista –
que se aplica igualmente à relação com os animais não-humanos e com a natureza em
geral. Sua acessibilidade moral depende da extensão dos juízos de correção para além
das relações interpessoais, para relações com pessoas e outras criaturas que não podem
(mais) agir de modo responsável. Esses seres não podem sair da condição passiva de
afetados e assumir a posição de autores de normas aceitáveis e de participantes em
discussões morais.68 A solução para o impasse, do ponto de vista universalista, vai
depender de uma complementariedade entre questões de justiça e questões de
solidariedade.
65 KANT, Immanuel. Idee zu einer allgemeinen Geschichte in der weltbürgerlicher Absicht. In: ____.
Werke in zwölf Bänden. Band. 11. Wilhelm Weischedel (Hrsg.). Frankfurt am Main: Suhrkamp,
1977, A392, p. 37.
66 KANT, Idee zu einer allgemeinen Geschichte, A411, p. 50.
67 KANT, Immanuel. Der Streit der Fakultäten. In: ____. Werke in zwölf Bänden. Band. 11.
69
HABERMAS, Jürgen. A inclusão do outro: estudos de teoria política. Trad. Denilson Luís Werle. São Paulo:
Unesp, 2018, p. 76-7 [doravante IO].
70
IO, p. 44 e 77-9.
71
NR, p. 195-6.
G&A, João Pessoa, v.10, n.2, p.102-122, jul./dez. 2021 118
FELIPE MORALLES E MORAES
72NR, p. 203.
73NR, p. 200 e NO, p. 233.
74 HABERMAS, Jürgen. Noch einmal: Zum Verhältnis von Moralität und Sittlichkeit. Deutsche
REFERÊNCIAS
BENJAMIN, Walter. Über Sprache überhaupt und über die Sprache des Menschen. In:
________. Gessamelte Schriften. Rolf Tiedemann und Hermann
Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. II. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1977.
BENJAMIN, Walter. Zur Kritik der Gewalt. In: ________. Gessamelte Schriften.
Rolf Tiedemann und Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. II. Frankfurt am Main:
Suhrkamp, 1977.
BENJAMIN, Walter. Eduard Fuchs, der Sammler und der Historiker. In: ________.
Gessamelte Schriften. Rolf Tiedemann und Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.).
Bd. II. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1977.
BENJAMIN, Walter. Über einige Motive bei Baudelaire. In: ________. Gessamelte
Schriften. Rolf Tiedemann und Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. I. Frankfurt
am Main: Suhrkamp, 1974.
BENJAMIN, Walter. Über den Begriff der Geschichte. In: ________. Gessamelte
Schriften. Rolf Tiedemann und Hermann Schweppenhäuser (Hrsg.). Bd. I. Frankfurt
am Main: Suhrkamp, 1974.
KANT, Immanuel. Der Streit der Fakultäten. In: ____. Werke in zwölf Bänden.
Band. 11. Wilhelm Weischedel (Hrsg.). Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1977.
ROSEN, Michel. Benjamin, Adorno, and the decline of the aura. In: RUSH, Fred (ed.)
The Cambridge companion to critical theory. Cambridge: Cambridge
University Press, 2004.
RESUMO
Este artigo traz um recorte da dissertação intitulada “Consenso na gestão escolar:
contribuições para o exercício democrático”, texto de autoria de Moura (2021), sob a
orientação do professor Joaquim Gonçalves Barbosa, que teve como objetivo principal refletir
de que maneira o consenso, na perspectiva de Jürgen Habermas, contribui para o exercício da
gestão democrática, assumindo como contexto o processo de tomada de decisão. A
investigação foi realizada em parceria com a equipe gestora – integrada por diretor, vice-
diretor, coordenador pedagógico e coordenador financeiro - tendo como campo empírico uma
Escola de Ensino Médio em Tempo Integral da Rede Estadual localizada na região urbana da
Cidade de Mossoró-RN. A metodologia da produção em questão centrava-se na perspectiva
qualitativa, utilizando três recursos metodológicos, no entanto, nesta proposta
apresentaremos o resultado do mapeamento bibliográfico realizado nos portais de periódicos
da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) e do Portal de Periódicos da
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Nesta busca foram
utilizados os seguintes descritores e recursos booleanos: (“CONSENSO” OR “HABERMAS”)
AND (“GESTÃO ESCOLAR” OR “GESTÃO DEMOCRÁTICA”). Após a utilização de filtros
específicos e de um espaço temporal dos últimos dez anos (2009-2019), ainda foi preciso
elaborar alguns critérios de refinamento, sendo: a) consideráveis; b) não consideráveis; para
identificar trabalhos na área da Gestão Educacional que contemplem (ou não) a Ação
Comunicativa ou o consenso em Jürgen Habermas. E como resultado desta triagem, temos as
seguintes teses e dissertações: Bianchini (2011), Caires (2010), Pinheiro (2010 e 2017), Gomes
(2013) e Góes (2019). Esses estudos serviram como referências para compreender um pouco
sobre o que se discutia no âmbito acadêmico sobre os aspectos que fundam a gestão escolar
democrática e dos pressupostos habermasianos.
1 INTRODUÇÃO
1 Doutor emEducação: História, Política e Sociedade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo;
Mestre em Educação pela Universidade Federal Fluminense; Graduado em Pedagogia e Filosofia pela
Faculdade Ciências e Letras de Lorena. Lattes: http://lattes.cnpq.br/4049058992411561
seguintes teses e dissertações: Bianchini (2011), Caires (2010), Pinheiro (2010 e 2017),
Gomes (2013) e Góes (2019). Esses estudos serviram como referências para
compreender um pouco sobre o que se discutia no âmbito acadêmico sobre os aspectos
que fundam a gestão escolar democrática e dos pressupostos habermasianos.
Habermas (1997) defende que ação comunicativa é uma interação entre os
sujeitos da sociedade, permitidos a partir de atos de comunicação por meio de uma
interação linguística, atendendo a coordenação das ações e gerando assim uma ação
comunicativa. Na teoria habermasiana (1999), a argumentação tem a possibilidade de
formar o sujeito e objetiva o consenso, considerando a intersubjetividade, que é própria
a cada indivíduo. Destaca-se que a Teoria da Ação Comunicativa não trata
especificamente da temática gestão escolar, mas traz elementos que podem ser
refletidos para entender as relações do contexto atual.
O tema da gestão escolar democrática tem sido o enfoque de muitos estudos
atualmente. Isto ocorre pela mudança de paradigma entre os conceitos de “gestão” e
“administração”, assim como pela consolidação de seus dispositivos legais.
Consideramos, antes de analisar teoricamente os conceitos, compreender literalmente
o significado da palavra “gestão” no Dicionário Aurélio, que remete à “administração”;
ato de gerir”; gerência”. Por sua vez, “administração” significa “ação de administrar;
gestão de negócios públicos ou particulares; conjunto de princípios, normas e funções
que têm, por fim, ordenar e estruturar; funcionamento de uma organização (empresa,
órgão público etc); função de administrador; gestão; gerência”.
Por fim, destacamos que a pesquisa articula com a temática do I Simpósio
Internacional Jürgen Habermas, especificamente com a Temática Habermas e a
Educação. Isto, pois, além de adentrar em conceitos teóricos pertinentes ao Eixo
escolhido, integra os estudos e pesquisas da comunidade científica nacional e
internacional que investigam o pensamento habermasiano em meio a um panorama
pandêmico.
A Covid-19 (Coronavírus) perpassa um problema de saúde pública, atingindo também
outros campos como o econômico, cultural e, aqui especificamente, a educação. A investigação
em questão, diante desse novo cenário que passamos, teve que se adequar à restrição de
pesquisas presenciais devido ao isolamento social e reinventar estratégias para atingir o
objetivo principal, qual seja: refletir acerca de que maneira o consenso, sob a perspectiva
de Jürgen Habermas, contribui para o exercício da gestão democrática, tendo como
contexto o processo de tomada de decisão.
2 O Google surgiu no ano de 1998 como uma empresa privada que tinha a missão de organizar a
informação mundial e torná-la universalmente acessível e útil.
3 Plataforma Sucupira é uma ferramenta para coletar informações, realizar análises e avaliações e ser a
base de referência do Sistema Nacional de Pós-Graduação (SNPG). Disponibiliza em tempo real e com
muito mais transparência as informações, os processos e os procedimentos que a CAPES realiza no
SNPG para toda a comunidade acadêmica. A escolha do nome é uma homenagem ao professor Newton
Sucupira, autor do Parecer n. 977, de 1965. O documento conceituou, formatou e institucionalizou a pós-
graduação brasileira nos moldes atuais.
6
5
4
3
2
1
0
2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019
Fonte: MOURA (2021).
Com esse cenário, há uma concentração de pelo menos cinco (5) publicações no
ano de 2019, referentes aos seguintes temas: Aprendizagem dialógica, Aquisição da
Língua Materna, Economia Solidária e Avaliação no Ensino Superior, onde pelo menos
quatro (04) eram dissertações e uma (01), tese. Ademais, no ano de 2010, observe que
é ano que tem o maior número de trabalhos publicados (06), todas provenientes de
formação de Mestrado e que relacionavam-se com os seguintes temas: PROEJA4,
Avaliação Institucional, Diversidade Cultural e Comunidades de Aprendizagem (CA).
No entanto, nos anos de 2011 e de 2012 apenas uma (01) publicação foi observada e se
tratava de Gestão Escolar Democrática e Racionalidade/Racionalização, nessa ordem.
A Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR), tem um número significativo
nessas produções, representando pelo 69% (sessenta e nove por cento) dos trabalhos
encontradas no portal da CAPES, como mostra o gráfico 2.
PUC-GO
UFSC
ESTÁCIO
UFG-GO
UFSCAR
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9
0
2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019
Fonte: MOURA, 2021.
UNESP
UNB
UFSCAR
UFSC
UFRGS
UFMG
UFBA
UNISINOS
UCB
PUC-GO
METODIST
MACKENZIE
FIOCRUZ
FGU
0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4 4,5 5
5A SciELO – Scientific Electronic Library Online – é uma base de dados de uma biblioteca eletrônica
que abrange uma coleção selecionada de periódicos científicos brasileiros e resultante de um projeto de
pesquisa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), em parceria com o
Em quais espaços?
4 METODOLOGIA
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
Editores
Alba Lígia de Almeida Silva - Professora Adjunta
(UFPB)
Guilherme Ataíde Dias – Professor Titular (UFPB)
Capa
Marcílio Herculano da Costa (UFPB)
Editor de Design
Marcílio Herculano da Costa (UFPB)
Leitora de Prova
Profa. Alba Ligia de Almeida Silva (UFPB)
Normalização
Marcílio Herculano da Costa (UFPB)
Alba Ligia de Almeida Silva (UFPB)
ISSN 2317-9082
CONSELHO CONSULTIVO/AVALIADORES
Adriana Valéria Santos Diniz, Universidade Julio Afonso de Sá Pinho Neto, UFPB, Brasil
Federal da Paraiba, Brasil Lucilene Klênia Rodrigues Bandeira, Universidade
André Gustavo Carvalho Machado, Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Federal da Paraíba, Brasil Maria Salete Barboza Farias, Universidade
Carlo Gabriel Porto Bellini, Universidade Federal Federal da Paraiba, Brasil
da Paraíba, Brasil Mauricio Miguel Isoni, Brasil
Edna Gusmão de Góes Brennand, Universidade Pedro Jácome de Moura Júnior, UFPB, Brasi
Federal da Paraíba, Brasil Rosilene Paiva Marinho de Sousa, Universidade
Profa Dra Joana Coeli Ribeiro Garcia, Federal do Oeste da Bahia, Brasil
Universidade Federal da Paraiba, Brasil Wagner Junqueira de Araújo, Universidade
Emília Maria Trindade Prestes, Universidade Federal da Paraíba, Brasil
Federal da Paraíba, Brasil Solange Machado de Souza (UFES)
Welder Antonio Silva (UFMG)