Teorico 3
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Material teórico
Teoria da Narrativa: Conto, Crônica e Romance
Revisão Textual:
Profa. Ms. Helba Carvalho
Teoria da Narrativa: Conto, Crônica e Romance
• O Romance
Recomendamos que siga o seguinte roteiro para que tenha um melhor aproveitamento da unidade:
Recomendamos que siga o seguinte roteiro para que tenha um melhor aproveitamento da unidade:
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Teoria da Narrativa: Conto, Crônica e Romance
Além disso, o gênero permite que o sujeito da enunciação (entendida como ato
individual de utilização da língua pelo falante, ao produzir um enunciado, no caso a
construção da narrativa, num dado contexto comunicativo)se manifeste por meio das
descrições e da apresentação dos personagens ou ainda por meio da técnica de reproduzir, de
modo direto, indireto ou indireto livre, a voz dos próprios personagens.
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Unidade: Teoria da Narrativa: Conto, Crônica e Romance
Foco narrativo ou ponto de vista Quem conta e sob que perspectiva? Primeira pessoa (eu)
ou Terceira pessoa (ele)? Neste caso, trata-se de um
narrador que é capaz de entrar na mente dos
personagens, ou seja, possui onisciência?
Temos, ainda, acesso ao tempo por meio do tempo verbal, os fatos ocorrem no
passado, ainda que este não esteja determinado.
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O foco narrativo é de um sujeito que usa a terceira pessoa (ele) rumou, chegou etc.
Esse narrador limita-se a contar a história de forma objetiva, sem vasculhar os a mente dos
personagens, haja vista a concisão do gênero escolhido.
Note, porém, que essas informações nos ajudam a entender a narrativa, fazer uma
paráfrase dela (recontá-la com nossas palavras), mas apenas o exame da organização desses
elementos por meio da linguagem, neste caso a linguagem literária, é que nos dará uma
leitura mais profunda e evidenciará o caráter estético desse ato de comunicação. Isso significa
que, para além de uma visão superficial dada pelo levantamento dos elementos estruturais,
será a análise da língua em ação, da enunciação que nos conduz ao discurso, que nos
dará uma dimensão mais abrangente, embora não definitiva, do que o locutor (aquele que
conta a história ou o sujeito da enunciação) quer comunicar ao interlocutor (aquele que lê,
interage com o texto). Essa operação de leitura envolve questões mais complexas, como a
experiência que temos sobre viagens de metrô, escritórios de advogado, relacionamentos
amorosos e conflitos conjugais, divórcio entre outros elementos que envolvem a memória
coletiva.
Além disso, devemos considerar que o texto deve ser lido como uma peça literária, o
que nos obriga a ativar todo nosso conhecimento sobre linguagem conotativa.
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Unidade: Teoria da Narrativa: Conto, Crônica e Romance
As escolhas dos verbos (escolhas lexicais) contribuem para isso no texto. Menos força
teria o uso dos verbos “partiu da Ana Rosa e chegou à Liberdade”. O uso do verbo “deixou”
nos autoriza a pensar no fim do relacionamento, ao passo que o verbo “rumou”, associado à
Liberdade, nos autoriza a pensar que o divórcio será a possibilidade de o sujeito assumir ou
reassumir as rédeas de seu destino.
A natureza mais extensa da locução “havia saído” em lugar do termo mais conciso
“saíra” sugere a ideia de que o processo foi longo, doloroso, o que complementa a ideia da
viagem, do percurso, ação central da narrativa, viagem que agora pode ser entendida como
uma ação subjetiva, não mais como mero deslocamento físico.
Por tudo isso você deve ter percebido que devemos levar em consideração mais do
que a simples descrição dos elementos estruturais da narrativa, que não fornece uma leitura
competente da obra, mas constitui meio inicial de acesso ao texto. Observarmos como a
seleção e a organização desses componentes contribuem, além do significado prático eles que
têm, para uma leitura mais completa da obra, o que chamamos construção de sentido.
Aliás, é preciso notar que esta breve leitura não teve a pretensão de esgotar as
possibilidades de interpretativas que nos fornece a narrativa, mas procurou mostrar um
exemplo de como podemos partir dos elementos estruturais, que são os que objetivamente se
apresentam no texto, e procurar preencher as lacunas do material linguístico por meio de uma
abordagem cooperativa que ative as nossas experiências e conhecimentos. Essas lacunas só
podem ser preenchidas se concebermos a língua como ato comunicativo complexo que
envolve a memória, bem como nossa consciência da natureza específica do ato comunicativo
literário (como vimos na unidade que conceitua o fenômeno literário) e não apenas a visão do
texto como um sistema de códigos a serem decifrados.
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Considerações sobre os elementos estruturais da narrativa
c) Espaço: responde à pergunta onde aconteceu? O espaço pode ser interior ou exterior,
pode ser mais fechado ou mais amplo e, geralmente, concentra elementos significativos
a respeito do personagem que o ocupa, principalmente nos romances naturalistas, em
que a influência do meio é ressaltada como expressão do pensamento determinista
vigente na segunda metade do século XIX. De qualquer modo, como a literatura é um
fenômeno essencialmente simbólico, nenhum elemento espacial deve ser considerado
como meramente decorativo, mas produtor de sentido se analisado em relação aos
outros, isso vale, obviamente, para todos os outros aspectos estruturais. No caso, vimos
que metrô é um espaço que agrega forte sentido simbólico: pelo aspecto de viagem, de
percurso que sugere; pelo aspecto subterrâneo de sua natureza em contraste com o
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escritório do advogado; pelo aspecto de transporte coletivo que se conecta à ideia da
do divórcio (ato oficial, certificado pela autoridade pública)como reconhecimento
social da separação..
d) Personagem (substantivo de dois gêneros, portanto você pode dizer a personagem ou
o personagem): personagens são seres fictícios, pessoas imaginárias que se movem no
espaço da narrativa. O termo vem da palavra latina persona, que se significava a
máscara do ator de teatro. Os personagens são agentes das ações e são delineados,
portanto, não só pela descrição que deles faz o narrador, mas pelo que dizem ou não,
pelo que fazem ou deixam de fazer.
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Unidade: Teoria da Narrativa: Conto, Crônica e Romance
Podemos encontrar o narrador onisciente, aquele que pode, como um deus, revelar
a vida interior dos personagens. Ele serve-se da terceira pessoa para isso. Veja como
exemplo este fragmento inicial do conto “As Voltas do Filho Pródigo”, de Autran
Dourado:“Alguma coisa no ar dizia que Zózimo estava para chegar. Desde longe, antes
mesmo de qualquer anúncio, João pressentia: não demorava muito e tio Zózimo estaria de
volta.” (BOSI, 1978, p. 199). O narrador fala de uma terceira pessoa, João, e é capaz de
saber o que esse personagem está pressentindo no momento.
Outro modo de narrar é utilizando a primeira pessoa (eu/nós) e, nesse caso, esse eu
pode ser assumido por uma personagem secundária, que funciona como testemunha, ou
pelo protagonista, personagem principal da narrativa, a quem denominamos narrador-
personagem.
Cabe notar que o uso desses diferentes pontos de vista aproxima ou afasta a figura do
narrador dos acontecimentos: um maior afastamento da ação se dá no foco em terceira
pessoa, teoricamente a perspectiva que permitiria maior objetividade; um afastamento
intermediário ocorre no caso do narrador-testemunha, uma vez que ao presenciar a ação ele
não se envolve tanto com ela quanto se envolve o personagem que a vive; um envolvimento
maior na ação se dá no caso do narrador em primeira pessoa, que pode transformar de modo
mais subjetivo, mais intenso, as emoções em linguagem.
Mais uma vez ressaltamos que essas classificações ou inferências a partir delas não são
estanques, têm apenas uma finalidade didática, e devem ser analisadas caso a caso. Na
narrativa moderna podemos encontrar em um único fragmento uma mescla mais de uma
perspectiva, configurando um discurso polifônico, porque as vozes narrativas soam
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simultaneamente ao longo do texto. Esse fato também é um índice interpretativo que deve ser
associado aos outros aspectos da narrativa para dele serem extraídos os significados.Veja um
exemplo do romance Memorial do Convento:
Repare que no exemplo que analisamos o tipo textual que prevalece é a narração. Não
há descrição, diálogos ou dissertação. Isso, contudo, não impede que o texto assuma uma
dimensão argumentativa, haja vista que as formas de construção da linguagem que
apontamos sugerem uma série de perspectivas sobre o fato narrado como observamos.
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Unidade: Teoria da Narrativa: Conto, Crônica e Romance
a) discurso direto, como no exemplo a seguir, extraído do conto “Os Três nomes de
Godofredo”, de Murilo Rubião:
Note que, neste caso, os diálogos são transcritos sem a interferência do narrador, que
dá voz aos personagens.
Repare que neste trecho o narrador reproduz de forma indireta as falas dele e do
personagem com quem conversa, servindo-se do que chamamos de verbos discendi, ou
verbos de dizer, tais como: perguntei, respondeu, disse, retrucou entre outros.
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Note que neste fragmento as observações “alvo fácil” e as impressões e
questionamento sobre o gato, se é bicho sonolento, se está a decifrar ou acordar, tanto podem
ser atribuídas ao narrador onisciente como ao personagem, o menino.
Nas próximas unidades serão feitas análises de textos narrativos de diferentes espécies
ou gêneros: o conto, o romance e a crônica. Essas análises terão como base os elementos
discutidos neste material, mas é muito importante que você amplie seus conhecimentos por
meio da leitura de obras da bibliografia que tratam mais especificamente de cada elemento da
narrativa.
Para que você tenha um melhor suporte teórico, faremos considerações breve sobre
dois tipos de narrativas bastante presentes na literatura, o conto e o romance.
Podemos dizer que os textos bíblicos ou ainda os vários episódios da epopeia homérica
são conjuntos de contos, o que reforça a antiguidade desse gênero. Há ainda os que
acreditam que os contos egípcios são os mais antigos, tendo aparecido por volta de 4000 anos
antes de Cristo.
No conto, nenhum detalhe pode ser desprezado, como afirmaram Edgar Alan Poe
(1809-1849), escritor norte-americano, e Anton Thecov (1860-1904), escritor russo. Para Poe,
“Em toda composição (a ser considerada conto) não deverá haver uma palavra escrita cuja
tendência, direta ou indireta, não tenha um desígnio pré-estabelecido”. (apud LIMA,1958,
passim). Para Tchecov, “Uma história pode não ter princípio nem fim, mas se os autores
descreverem na primeira página um fuzil pendurado na parede, esse fuzil, mais cedo ou mais
tarde, terá de disparar”.(apud LIMA,1958, passim). Esse dado reforça o aspecto poético e ao
mesmo tempo lúdico da obra, que deve prender o interesse do leitor.
O Romance
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Unidade: Teoria da Narrativa: Conto, Crônica e Romance
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Bakhtin afirma ainda que a originalidade do gênero romanesco repousa na
combinação destas unidades, ao mesmo tempo subordinadas umas das outras, mas
relativamente independentes:
Lucien Goldmann, por sua vez, propõe uma abordagem do romance moderno
baseado na tensão entre o escritor e a sociedade e na pressuposição da existência de
homologias entre a estrutura da obra literária e a estrutura social. O dado inicial do qual parte
é a tensão entre o escritor e a sociedade.
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Unidade: Teoria da Narrativa: Conto, Crônica e Romance
atitude do herói, que pode empreender a busca de valores pessoais que subordinem a si a
hostilidade do meio; pode fechar-se na memória ou análise dos próprios estados de alma; ou
pode autolimitar-se e aprender a viver com o que o teórico denomina madura virilidade no
mundo difícil em que foi lançado.
Goldmann acredita, assim como Georg Lukács, outro grande teórico do gênero que o
romance, cultuado pela burguesia, seria a história de uma investigação degradada
(denominada demoníaca): trata-se da busca por valores autênticos em um mundo também
degradado, mas em um nível diversamente adiantado e de modo diferente. Assim, a
característica primordial do romance seria a ruptura insuperável entre o herói e o mundo,
ambos degradados.Como afirma Lucien Goldmann:
Assim, este novo herói é fruto da sociedade individualista que se estabeleceu apósa
Revolução Burguesa. O cerne da busca do herói problemático são os valoresautênticos, em
um mundo composto por conformismo e convenção. Você pode encontrar uma excelente
proposta de abordagem do romance brasileiro sob a perspectiva da teoria de Goldmann no
livro do prof. Alfredo Bosi, História Concisa da Literatura Brasileira, no capítulo sobre
Tendências Contemporâneas da Literatura Brasileira em “As Trilhas do romance: uma
hipótese de trabalho” (1997, p 440-445).
Como se percebe por estas observações que podem ser complementadas pela leitura
das obras citadas, o romance está vinculado a um momento histórico e, assim como as formas
clássicas que desapareceram com o mundo clássico, pode se transformar caso a sociedade
burguesa também se transforme. Discute-se, inclusive, a pertinência de se atribuir às narrativas
contemporâneas, pelo menos a grande parte delas, o rótulo de romance. De qualquer modo,
trata-se de um gênero que permitiu a produção de obras que serão eternas na literatura:
Madame Bovary, de Gustave Flaubert; O Vermelho e o negro, de Stendhal; Crime de
Castigo, de Fiódor Dostoiévski; D. Casmurro, de Machado de Assis entre outras.
A bibliografia a seguir, uma mescla de obras clássicas e atuais, embora parcial, abrange
as grandes questões sobre teoria da narrativa, o conto e o romance e pode levá-lo a outros
autores, propiciar um aprofundamento no assunto e fornecer instrumentos teóricos para
análises de textos ficcionais.
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Conclusão
Para Pensar
Ao ler o conteúdo teórico, você observou que foram apresentados os elementos
estruturais da narrativa, bem como características dos gêneros conto, crônica e romance.
Vamos pensar, agora, como este assunto pode ser inserido no seu cotidiano e no de seus
futuros alunos?
Você pode pedir para seus alunos escolherem uma notícia de jornal e orientá-los a
produzirem um microconto a partir dessa notícia. Trabalhe os elementos estruturais da
narrativa no momento em que estiver orientando-os na elaboração desse texto narrativo.
Assim, os alunos vão perceber a diferença entre o texto literário e o não literário. Para a
elaboração dessa atividade, você pode consultar os sites a seguir:
SEABRA, C. Microconto.
______. Microcontos.
Disponível em http://cseabra.wordpress.com/2010/02/25/microcontos-literatura-
minima. Acesso em 29-01-2013.
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Unidade: Teoria da Narrativa: Conto, Crônica e Romance
Material Complementar
Teoria da Narrativa:
Para que você possa entender melhor o romance sob a perspectiva Bakhtiniana e
compreender melhor a importância que esse filósofo da linguagem confere ao gênero, leia o
texto “A Teoria do romance e a análise estético cultural de M. Bakhtin” de Irene A. Machado,
publicado na Revista USP.
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Referências
Sobre o conto:
Sobreo romance:
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