2008 - Potencialidades do meio físico evidenciadas na História Ambiental

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TEMA: Potencialidades do meio físico evidenciadas na História Ambiental

Evolução econômica de Triunfo - Áreas de exceção

DISCUSSÃO TEÓRICA

O meio físico passou a ser notado nas análises e artigos científicos, no início do
século XIX e XX, devido às críticas promovidas aos estados nacionais em busca de riqueza
e poder e sua atuação deteriorante frente ao meio físico. Desse modo, “os historiadores
começaram a perder um pouco da sua certeza de que o passado tivesse sido tão
integralmente controlado ou representado por alguns poucos grandes homens ocupantes
de cargos do poder nacional” e começaram a se interessar e dedicar por vidas e
pensamentos de pessoas comuns1, buscando (re)conceituar a história “de baixo para cima”,
dissecando as camadas ocultas de classe, de gênero, de raça e de casta, valorizando cada
vez mais conceitos como “território”, “territorialidades”, aproximando-se de categorias até
hoje tão próprias da geografia.
Os historiadores ambientais surgiram nesse período como estudiosos das camadas
ocultas que procuravam entender a terra como “um agente” que possuía “uma presença
histórica”, tendo por trás de seus interesses objetivo moral e forte compromisso político.
Por isso, começaram a reconstruir as paisagens do passado, verificando seu funcionamento
antes que a sociedade humana atuasse e a transformasse, buscando entender “como as
comunidades humanas modificam as paisagens em que vivem e como as pessoas ao redor
são afetadas pelas mudanças ocorridas nas condições geológicas, climatológicas,
epidemiológicas, e ecológicas”2. Acerca disso, Worster destaca a possibilidade de ampliar
o estudo desse campo, afirmando que:

A história ambiental parte de um esforço revisionista para tornar a


disciplina histórica inclusiva em suas narrativas, de modo que as
consequências ecológicas dos feitos passados possam ser
trabalhados. É preciso assumir postura, não podemos ser tão
inocentes3.

1 WOSTER, Donald. Para fazer uma história ambiental. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, vol.4, n.8, 1991,
p. 198
2 CRONON, William. The Trouble with Wilderness; or Getting Back to the Wrong Nature, in Environmental
History, Jan. 1995, pp.7-28 apud FREITAS, Inês. História Ambiental e Geografia. XII Encontro Regional de
HIstória da ANPUH, 2006.
3WOSTER, Donald, Op. cit, 1991, p. 199
O historiador ambiental além de fazer “novas perguntas”, precisava aprender a falar
“línguas novas’, precisava “reconstruir a paisagens” a partir de fontes novas e com
recursos diversos, verificando como eram e como funcionavam. Esse esforço histórico
revisionista de colocar a natureza dentro da história – a história das pessoas, sociedades,
culturas e economias – procura investiga a “ecologia do passado”. Na historiografia, a
inclusão do ambiente físico e das ações humanas deve compreender a paisagem como um
ambiente histórico sob a qual são inscritas ideais e idéias, por meio das quais o ambiente
construído expressa uma cultura, e é fruto de um processo de construção de uma
determinada sociedade. “A natureza não é uma idéia, mas muitas idéias, significados,
pensamentos, sentimentos, empilhados uns sobre os outros”4, é construção de imaginário,
fruto de um modo de vida e organização social.
Quando se procura entender per exemplo, as áreas de exceção do semi-árido no
Nordeste Brasileiro e os contrastes entre as paisagens geográficas (Zona da Mata e Sertão),
é possível refletir sobre os diferentes aspectos dos seus condicionantes ecológicos, de
ambientes úmidos, subúmidos e semi-áridos, inserido no universo seco do Nordeste, com
condições ecológicas e/ou agroecológicas privilegiadas. Analisando os elevados potenciais
dos eco e agrossistemas, particularmente no aproveitamento diversificado, no uso de seu
clima, recursos hídricos, topográficos e cobertura vegetal, no uso do solo e condições de
vida de suas populações.
Para Drummond essa análise torna-se viável, pois “a história ambiental revela
ligação também com a história regional, pois focaliza processos sociais (e naturais)
geograficamente circunscritos”5, procurando trabalhar em associação direta com os
cientistas naturais. Essa relação interdisciplinar permite que o historiador combine estudos
históricos, geomorfológicos, climatológicos, meteorológicos, biológicos, de engenharia e
ocupação do espaço habitado, bem como um maior entendimento do ambiente físico e
ecológico das regiões estudadas e analisadas.
Nessa perspectiva, segundo propões Fernand Braudel, “seria necessário prestar
atenção aos mínimos fatos, e não apenas aos físicos”, mas a ação do tempo, na construção
do ambiente. Pois, todas as características geográficas tem sua historicidade e são parte de
um processo temporal histórico, fruto da interação do ambiente como o humano. “Estas
variações tem, umas e outras, o seu valor”, pois não seria possível “encontrar mais ou

4 WOSTER, Donald, Op. cit, 1991, p. 210


5 DRUMMOND, José Augusto. A história ambiental: temas, fontes e linhas de pesquisa. Estudos Históricos,
Rio de Janeiro, vol.4, n 8, 1991, p. 5
menos por todo o lado os mesmos climas e os mesmos climas sazonais, a mesma
vegetação, as mesmas cores”, e até as mesmas paisagens e gêneros de vida 6. Para Fernand
Braudel, cada sociedade modifica a região, o ambiente em torno de si segundo padrões
culturais próprios, que o autor nomeia por “identidade das produções”. Assim, uma
identidade produtiva, uma identidade que determina o que deve ser produzido ou não. Esse
mecanismo age no tempo, moldando a vida humana segundo o processo de longa duração.
A cidade de Triunfo, como área de exceção do agreste pernambucano está
localizada a uma latitude 07°50’17’’ sul e a uma longitude 38°06’06’’ oeste, a uma altitude
média superior aos 1.000 metros, que proporciona temperaturas mais baixas que a média
da região. Com área de 191,516 km2, população de 15.006 habitantes, segundo o IBGE de
2000, com densidade demográfica de 78,35 hab/km2, a cidade de Triunfo pode ser
entendida como uma região com “identidade produtiva”, pois sua localização regional
permite uma construção social e produtiva diversificada do que ocorre em todo o Sertão
Nordestino.
Poucos municípios fornecem a possibilidade de se verificar tanta diversidade
climática como no caso de Triunfo, que dista 399 km de Recife, a começar pelo clima que
contradiz com a aridez do sertão nordestino, alcançando temperaturas que oscilam entre 5º
C no inverno e 28° C no Verão. A vegetação é completamente diferente da que predomina
na região, tornando-se conhecida como “O Oásis no Sertão”. A identidade da região é
responsável assim, por gerir a utilização dos recursos das regiões, determina o que é
produzido, como será produzida, a finalidade da produção. Utilizando um termo mais
atual, a cultura da região de Triunfo interfere no uso dos recursos e de sua
manipulação/utilização, pois “os recursos só se tornam recursos quando culturalmente
identificados e avaliados...Os recursos não se impõem unilateralmente à cultura”, eles são
percebidos por determinado sociedade em determinado ambiente e contexto sócio-
histórico7.
Partindo do pressuposto, de que a paisagem é fruto da intervenção e ação cultural
humana, Melosi prevê que “a história ambiental urbana deveria combinar o estudo da
história natural da cidade com a história dos processos de construção das cidades e as
possíveis interseções entre os dois”8. As redes das cidades não são apenas uma tarefa
6 BRAUDEL, Fernand. O mediterrâneo e o mundo mediterrâneo na época de Felipe II – 2° ed, Publicações
Dom Quixote, Lisboa, 1995, p. 262
7 DRUMMOND, José Augusto. Op. cit, 1991, p. 6
8 “that urban environmental history would combine ‘the study of the natural history of the city building
process and the possible intersections between the two” (MELOSI, M.V, 2004, p 126). MELOSI, M.V.
Effuent America. Cities, industry, energy and the environment, University of Pittsburgh Press, Pittsburg ,
técnica, elas são fruto de um processo sócio-cultural de adaptação, que se fundamenta em
padrões comportamentais dos indivíduos, e no uso dos recursos do ambiente. As idéias,
significados, pensamentos, sentimentos, empilhados uns sobre os outros, neste sentido nos
fornece um norteamento para o estudo das potencialidades do ambiente físico.
Todos os indivíduos e culturas criam aglomerados (idéias, significados,
pensamentos). A natureza é uma ordem e um processo que nós não criamos, e ela
continuará existindo na nossa ausência. Ela também é uma criação de nossas mentes, de
nosso imaginário, por mais que nos ofereçamos para ver o que ela é objetivamente de si
mesma, por si mesma e para si mesma. Nossa mente cria, ordena a natureza, representa
uma convicção. Desse modo, o historiador ambiental deve incluir em seu programa de
estudo aspectos da estética, da ética, do mito, do folclore, da literatura e do paisagismo, da
ciência e religião, deve ir a toda a parte onde a mente humana esteve envolvida com a
natureza, modificou-a, adaptou-a a sua cultura, as suas concepções político e sociais.
Ao historiador ambiental deve-se também o interesse de entender como a cultura
avalia a natureza. Pois, toda cultura contém um leque de percepções e valores variados,
como pode-se verificar no caso da região sócio-econômica de Triunfo – uma região
diferenciada em um ambiente diverso do Sertão Nordestino, em comparação à Zona da
Mata pernambucana. Essas percepções interferem na construção de idéias, e portanto,
refletem na organização da sociedade, os seus tecno-ambientes e a utilização dos recursos
humanos e materiais. As idéias variam de pessoa para pessoa dentro de uma sociedade, de
acordo com o gênero, classe, raça e região em que habita, de acordo com o ambiente
natural ocupado.
O historiador ambiental deve estar atento à essas mudanças, e deve resistir às
generalizações acerca da mentalidade e da população de um mesmo local. O historiador
deve, portanto, examinar as idéias como agentes ecológicos, que focaliza para o
funcionamento de pequenas comunidades de indivíduos, que opera em um ecossistema e
faz parte do mecanismo ecológico em operação. Em história, natureza, clima, terra,
ecossistema são entidades importantes, pois oferecem uma visão acerca do
desenvolvimento histórico da região.

2001, p. 126. apud SCHOTT, Dieter. Urban environmental history: what lessons are there to be learnt?.
Boreal Environment Research 9:519-528, 2004.

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